UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
A INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA E SUA
APLICABILIDADE NO DIREITO DO CONSUMIDOR.
AUTORA
DANIELLE PEREIRA NUNES
Orientador
PROF. JEAN ALVES
Rio de Janeiro
2010
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
A INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA E SUA
APLICABILIDADE NO DIREITO DO CONSUMIDOR
Monografia apresentada à Universidade Cândido
Mendes – Instituto A Vez do Mestre, como requisito
parcial para conclusão do curso de Pós-Graduação
“Latu Sensu”.
Por: Danielle Pereira Nunes
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AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente à Deus que me
deu força, saúde e vitalidade para obter
mais essa conquista.
Aos meus pais Sergio e Elyane que me
proporcionaram mais essa oportunidade
de estudo e crescimento intelectual e
ainda me deram apoio em todos os
momentos marcantes da minha vida.
4
DEDICATÓRIA
Dedico esse trabalho monográfico
ao meu filho João Sergio, que é a minha
razão
de
viver,
como
forma
de
recompensar todos os meus momentos
de ausência, momentos estes dedicados
com total empenho para o alcance dessa
vitória.
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RESUMO
O presente trabalho aborda o instituto da inversão do ônus da prova,
como direito básico do consumidor, parte hipossuficiente da relação de
consumo, manifestando-se como verdadeira inovação jurídica no instituto da
prova.
Nessa obra foi feita uma breve abordagem sobre o instituto da prova:
sua definição, características e objeto. Foi feito ainda um breve relato sobre a
evolução histórica do instituto e sua conceituação. Finalmente foi trabalhada a
aplicabilidade do instituto no Código de Defesa do Consumidor, como grande
inovação jurídica.
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METODOLOGIA
Para a elaboração dessa obra foi feita uma pesquisa bibliográfica
descritiva e exploratória nas obras dos principais doutrinadores brasileiros tais
como: Humberto Theodoro Junior, Luiz Guilherme Marinoni, Alexandre Freitas
Câmara, entre outros.
Os livros foram obtidos nas bibliotecas da Universidade Cândido
Mendes e da EMERJ – Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro.
Prevalecerão referências aos ensinamentos doutrinários, levando-se
também em consideração o exposto em revistas e artigos jurídicos publicados
na internet.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO................................................................................................8
CAPÍTULO I
BREVES CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DO INSTITUTO DA PROVA
1.1
CONCEITO DE PROVA.............................................................9
1.2
CARACTERÍSTICAS DA PROVA.............................................10
1.3
OBJETO DA PROVA.................................................................11
1.4
VALORAÇÃO DA PROVA.........................................................13
1.5
MEIOS DE PROVA ...................................................................15
1.6
PODER DE INSTRUÇÃO DO JUIZ ..........................................18
1.7
PROCEDIMENTO PROBATÓRIO ............................................19
1.8
DEVER DE COLABORAÇÃO COM A JUSTIÇA .......................20
1.9
PROVAS EM ESPÉCIE .............................................................21
CAPÍTULO II
INVERSÃO DO ÔNUS PROBATÓRIO
2.1 BREVE ABORDAGEM HISTÓRICA........................................................22
2.2 DEFINIÇÃO..............................................................................................23
2.3 ÔNUS DA PROVA DE FATO NEGATIVO................................................25
2.4 TEORIAS SOBRE A REPARTIÇÃO DO ÔNUS DA PROVA....................26
CAPÍTULO III
A INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA NO DIREITO DO CONSUMIDOR
3.1 REQUISITOS PARA CONCESSÃO..........................................................28
3.2 MOMENTO DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA .................................31
3.3 CONVENÇÃO SOBRE O ÔNUS DA PROVA............................................34
CAPÍTULO IV
CONCLUSÃO...................................................................................................36
8
INTRODUÇÃO
O presente trabalho consiste em um estudo detalhado sobre a inversão
do ônus da prova, presente no Código de Proteção e Defesa do Consumidor.
Cumpre analisar como se opera a medida do ônus probatório nas hipóteses
apresentadas nas relações consumeristas.
Antes da aplicabilidade do instituto no Código de Defesa do Consumidor
havia um desequilíbrio considerável entre fornecedores e consumidores em
geral, parte mais fraca na relação de consumo. Havia a necessidade de
criação de instrumentos adequados para contrabalancear a desigualdade
existente entre os empresários e consumidores.
Dessa forma os princípios fundamentais como o princípio da
transparência e o da honestidade com o consumidor passam a reger a matéria,
tendo em vista que toda e qualquer relação de consumo deve observar os
princípios básicos que informam a Lei Consumerista.
O Código de Defesa do Consumidor busca então o equilíbrio nas
relações de consumo, conferindo aos consumidores mecanismos de defesa
compatíveis com a necessidade do dia a dia.
No contexto houve a modificação de conceitos e de institutos
processuais objetivando a defesa de interesses dos consumidores, como a
inversão do ônus da prova. O código constitui-se num sistema autônomo e
próprio, tornando-se fonte primária do sistema da Constituição.
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CAPÍTULO I
BREVES CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DO
INSTITUTO DA PROVA
1.1
Conceito de prova
No Direito Processual Civil Brasileiro, mais especificamente no Processo
de Conhecimento o Juiz precisa formar o seu convencimento e decidir a lide
que é o objeto do processo.
Dessa forma tanto o autor quanto o réu precisam fundamentar seus
argumentos apresentando as provas dos fatos alegados, cuja apreciação pelo
Juiz fará com que o mesmo profira a sentença de mérito, que colocará fim a
fase cognitiva do processo.
Para melhor compreensão deste trabalho, mostra-se de extrema
relevância citar a definição do conceito de prova dada pelo ilustre professor
Alexandre Freitas Câmara: “Denomina-se prova a todo elemento que contribui
para a formação da convicção do juiz a respeito da existência de determinado
fato”. (Câmara, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil, vol I,
2006, P. 397).
Já para o doutrinador Humberto Theodoro Júnior existem dois sentidos
em que se pode conceituar a prova no processo, são eles:
a)
“um objetivo, isto é, como instrumento ou meio hábil,
para demonstrar a existência de um fato (os documentos, as
testemunhas, a perícia etc.);
b)
e o outro subjetivo, que é a certeza (estado psíquico)
originada quanto ao fato, em virtude da produção do
instrumento probatório. Aparece a prova, assim, como a
10
convicção formada no espírito do julgador em torno do fato
demonstrado.” (Junior, Humberto Theodoro. Curso de Direito
Processual Civil, vol I, 2008, P. 480).
O citado doutrinador em sua obra ainda cita o entendimento do
professor João Monteiro que entende que prova não é somente um fato
processual, “mas ainda uma indução lógica é um meio com o que se
estabelece a existência positiva ou negativa do fato probando, e é a própria
certeza dessa existência”. (Junior, Humberto Theodoro. Curso de ..., cit.,p.
480)
Ainda sobre o tema Humberto Theodoro Junior argumenta que:
“Não é raro a parte produzir um grande volume de
instrumentos probatórios (documentos, perícia, testemunhas,
etc.) e mesmo assim a sentença julgar improcedente o pedido
por “falta de prova”. De fato quando o litigante não convence o
Juiz da veracidade dos fatos alegados, prova não houve, em
sentido jurídico: houve apenas apresentação de elementos
com que se pretendia provar, sem, entretanto, atingir a
verdadeira meta da prova – o convencimento do Juiz.” (Junior,
Humberto Theodoro. Curso de Direito....,cit., p. 480).
Em suma, pode-se afirmar que o objetivo da prova é a de formar a
convicção do magistrado sobre a veracidade dos fatos, a fim de que este faça
incidir a norma jurídica ao fato.
1.2
Características da prova
Humberto Theodoro em sua obra ainda elucida as características do
instituto da prova afirmando que:
11
“Toda prova há de ter um objeto, uma finalidade, um
destinatário, e deverá ser obtida mediante meios e métodos
determinados. A prova judiciária tem como objeto os fatos
deduzidos pelas partes em juízo. Sua finalidade é a formação
da convicção em torno dos mesmos fatos. O destinatário é o
Juiz, pois é ele que deverá se convencer da verdade dos fatos
para dar uma solução jurídica ao litígio. Os meios legais de
prova são os previstos nos art.s 332 a 443; mas além deles,
permite o Código outros não especificados, desde que
moralmente legítimos (art. 332).
Há, outrossim, um método ou sistema processual preconizado
legalmente para o emprego dos meios de prova que forma o
procedimento probatório minuciosamente regulado pelo Código
e que deve ser observado pelas partes e pelo juiz para que a
apuração da verdade fática seja eficaz para fundamentar e
justificar a sentença” (Junior, Humberto Theodoro. Curso de
Direito ..., cit., p. 481).
1.3
Objeto da prova
A prova incide como regra sobre a matéria fática. Os meios legais de
prova e os moralmente legítimos são empregados no processo para provar a
verdade dos fatos em que se funda a ação ou a defesa (art. 332). (Brasil.
Código de Processo Civil. Organização Editoria Jurídica da editora Saraiva. 13ª
Ed. 2007).
Conforme dito as provas devem recair sobre os fatos, entretanto essa
regra comporta uma exceção, em que pode haver provas sobre a matéria de
direito, ou seja, há hipóteses que também pode haver prova sobre matéria de
direito, conforme determina o art. 337 do Código de Processo Civil Brasileiro:
12
Art. 337. “A parte que alegar direito municipal, estadual,
estrangeiro ou consuetudinário, provar-lhe-á o teor e a
vigência, se assim o determinar o Juiz.” (Brasil. Código de
Processo Civil. Organização Editoria Jurídica da editora
Saraiva. 13ª Ed. 2007).
Frise-se que na hipótese mencionada pelo art. 337 do CPC, o Juiz
poderá dispensar a produção de tal prova, pois não é obrigado a fazê-lo, pois o
magistrado pode já ter conhecimento sobre a norma invocada.
Só os fatos relevantes para o deslinde da causa devem ser provados,
ou seja, aqueles que influenciarão na sentença final.
O art. 334 do Código de Processo Civil determina que: “não
dependem de prova os fatos:
I-
notórios;
II-
afirmados por uma parte e confessados pela parte
contrária;
III-
admitidos, no processo, como incontroversos;
IV - em cujo favor milita a presunção legal de existência ou de
veracidade.” (Brasil. Código de Processo Civil. Organização
Editoria Jurídica da editora Saraiva. 13ª Ed. 2007).
A primeira hipótese refere-se aos fatos notórios, que são de
conhecimento geral, como por exemplo: acontecimentos políticos, datas
comemorativas e históricas e etc.
Sobre o tema Humberto Theodoro cita em sua obra a determinação de
Couture que afirma:
“Podemos considerar fatos notórios aqueles que entram
naturalmente no conhecimento, na cultura ou na informação
13
normal dos indivíduos, com relação a um lugar ou um círculo
social, no momento em que o juiz tem que decidir.” (Junior,
Humberto Theodoro, apud Couture, Fundamentos Del Derecho
Procesal Civil, 1974, nº 150, p. 235.)
Os fatos afirmados por uma parte e confessados pela parte contrária,
descrito no inciso II do Código de Processo Civil, dispensa maiores
comentários, pois há concordância de ambas as partes sobre a ocorrência do
suposto evento.
No caso dos fatos incontroversos a produção de prova se mostra
desnecessária, pois prová-los é desnecessário e protelatório.
Já no inciso IV refere-se aos fatos cujo favor milita presunção legal de
existência ou veracidade, que também dispensam a produção de prova e
podem ser exemplificados pelo caso do devedor que possui em seu poder o
título de crédito e não precisa provar o respectivo pagamento. (Junior,
Humberto Theodoro. Curso de Direito..., cit., p. 482).
1.4
Valoração da prova
Os sistemas de valoração da prova permitirão que o magistrado forme
seu convencimento sobre os fatos ou o seu juízo de valor.
O primeiro sistema de valoração conhecido no direito processual foi o do
critério positivo ou legal no qual se acreditava existir um tarifamento das
provas.
Sobre o assunto Fredie Didier Jr. argumenta que:
“As regras legais estabelecem os casos em que o juiz deve
considerar provado, ou não, um fato; em que atribui, ou não,
valor a uma testemunha; quando já prova plena ou semiplena.
14
Há o tarifamento das provas, uma vez que cada prova tem
como que tabelado o seu valor, do qual não há como o
magistrado fugir. O juiz não passa de mero aplicador da
norma, preso ao formalismo e ao valor tarifado das provas.”
(Junior, Fredie Didier. Curso de Direito Processual Civil. Vol 2;
Salvador, 2009, P. 39).
Nesse caso o juiz pratica uma atividade jurisdicional mecanizada onde
seus atos não são precedidos de reflexão, de uma avaliação, somente efetua o
cálculo da somatória das provas apresentadas.
Alexandre Câmara, em sua obra, ilustra perfeitamente a questão
conforme demonstrado a seguir:
“Por este sistema, a lei atribui “valores” fixos aos meios de
prova, os quais devem ser seguidos pelo juiz ao formar seu
juízo de valor. Assim, exemplificando, se a lei atribuísse à
prova testemunhal peso um, à prova documental peso dois e à
confissão peso três, o juiz, ao final do processo, deveria
verificar quantos de cada um desses meios probatórios cada
parte dispõe, para que possa declarar então quem teve a
melhor sorte no processo. Tal sistema, hoje inteiramente
superado, transformou o processo em verdadeiro jogo, onde o
sucesso ficaria ao lado do melhor estrategista.” (Câmara,
Alexandre Freitas. Lições de Direito ..., cit., p. 405).
Já o segundo sistema de valoração das provas é o a livre convicção,
onde o juiz é totalmente livre para apreciar as provas apresentadas nos autos.
Segundo Alexandre Câmara o juiz deve julgar de acordo com o seu
convencimento, deverá ser formado através de quaisquer elementos.
15
Nesse caso o magistrado não fica preso às provas apresentadas aos
autos podendo formar seu convencimento através impressões e fatos que
tomou conhecimento informalmente.
O último sistema é o da persuasão racional ou livre convencimento
motivado, adotado pelo nosso Código de Processo Civil brasileiro, segundo o
qual:
“Não obstante apreciar as provas livremente, o juiz não segue
suas impressões pessoais, mas tira sua convicção das provas
produzidas, ponderando sobre a qualidade e a força probante
desta; a convicção está na consciência formada pelas provas.”
(Junior, Fredie Didier. Curso de ..., cit., p. 40)
O juiz ao formar seu convencimento deve levar em consideração
somente as provas constante dos autos e ao proferir sua decisão deverá
fundamentá-la, como forma de propiciar um controle a fim de auferir se a
decisão foi tomada com base nas provas carreadas ao processo.
1.5
Meios de prova
Alexandre Câmara cita em sua obra a definição dada por Amaral
Santos, segundo a qual: “Meios de prova são os instrumentos através dos
quais se torna possível a demonstração da veracidade das alegações sobre a
matéria fática controvertida e relevante para o julgamento da pretensão.”
(Câmara, Alexandre Freitas. Lições de ..., cit., p. 406).
O doutrinador cita que é comum encontrarmos a distinção entre meios e
fontes de prova, onde os meios são os instrumentos que permitem que se leve
ao juiz os elementos que irão participar da formação da convicção e as fontes
são as coisas e pessoas de onde se promana a prova.
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O art. 332 do nosso Código de Processo Civil determina que sejam
utilizados meios juridicamente idôneos (meios legais de prova), bem como dos
moralmente legítimos.
Os meios legais de prova são aqueles típicos, ou seja, definidos em lei,
como por exemplo: a prova testemunhal, a prova documental, depoimento
pessoal e etc.
Já os meios moralmente legítimos são aqueles que apesar de não
estarem descritos em nenhuma norma, podem ser usados no processo por
não contrariarem a moral e os bons costumes.
O mesmo autor ainda faz uma severa crítica ao art. 212 do Código Civil
pois apresenta um elenco menor de provas. Afirma que a norma veiculada pelo
artigo é criticável sob diversos aspectos, primeiro por misturar meios com
fontes de prova, em segundo por não fazer distinção entre meios e fontes de
prova, em terceiro por não fazer alusão aos meios atípicos de prova.
A exclusão dos meios atípicos de prova implica em uma restrição ao
direito à prova, o qual é uma garantia constitucional, corolário da garantia do
contraditório.
“Sendo o contraditório, como visto anteriormente, a garantia
que os interessados no provimento poderão participar do
processo influindo no seu resultado, o direito a prova é
elemento integrante daquela garantia, já que através da prova
as partes podem interferir no resultado do processo de
conhecimento.”(Câmara, Alexandre Freitas. Lições de Direito
..., cit., p. 407).
Ressalta-se que a Constituição Federal proíbe a utilização de meios de
prova obtidos por meio ilícito (art. 5°, LVI), podendo acarretar a nulidade da
prova apresentada nos autos.
17
Os meios de prova elencados pelo Código de Processo Civil são:
I – “depoimento pessoal (arts. 342-347)
II – confissão (arts. 348-354)
III- exibição de documento ou coisa (arts. 355 e 363)
IV – prova documental (arts. 364-391)
V – prova testemunhal (arts. 400-419)
VI – prova pericial (arts. 420-439)
VII-
inspeção judicial (arts.440-443).”
(Junior,
Humberto
Theodoro. Curso de Direito..., cit., p.490).
1.6. Poder de instrução do juiz
Afirma Humberto Theodoro Junior em sua obra que: “o juiz no processo
moderno deixou de ser simples árbitro diante do duelo judiciário travado entre
os litigantes e assumiu poderes de iniciativa para pesquisar a verdade real e
bem instruir a causa.” (Junior, Humberto Theodoro. Curso de Direito...., cit., p.
485).
Porém esse poder não é ilimitado, pois na maioria das vezes a conduta
da parte influencia decisivamente sobre a prova e afasta a iniciativa do juiz
nessa matéria.
“Assim acontece quando o réu deixa de contestar a ação e
esta não versa sobre direitos indisponíveis, ou quando, na
contestação, deixa de impugnar precisamente os fatos ou
alguns fatos narrados na inicial.
Nesses casos ocorre a presunção legal de veracidade dos
fatos que se tornaram incontroversos (art. 319 e 302) e ao juiz
18
não será dado produzir prova de sua iniciativa para contrariar a
presunção.” (Junior, Humberto Theodoro. Curso de Direito...,
cit., p. 485).
Dessa forma, hodiernamente o Juiz não pode permanecer ausente da
pesquisa da verdade material e como afirma Fritz Baur: “antes fica autorizado e
obrigado a apontar às partes as lacunas nas narrativas dos fatos e em caso de
necessidade, a colher de ofício as provas existentes”. (Baur, Fritz.
Transformações do Processo Civil em nosso tempo. Vol. VIII, pags. 58-59).
Porém ressalta-se a observação feita por Humberto Theodoro Jr.:
“O juiz, porém, deve cuidar para não comprometer sua
imparcialidade na condução do processo. A necessidade da
prova, ordenada de ofício, deve surgir do contexto do processo
e não de atividade extra-autos, sugerida por diligências e
conhecimentos
pessoais
ou
particulares
auridos
pelo
magistrado fora do controle do contraditório. O juiz pode
ordenar a produção de provas não requeridas pela parte mas
não pode tornar-se um investigador ou um inquisidor”. (Junior,
Humberto Theodoro. Curso de Direito..., cit., p. 487).
1.7
Procedimento probatório
Alexandre Câmara conceitua que denomina-se procedimento probatório
a seqüência logicamente ordenada de atos que tende á produção da prova. Tal
procedimento é formado por três atos: propositura, admissão e produção.
A propositura é o momento em que as partes indicam de forma
individualizada, os meios de prova que pretendem produzir para contribuir na
formação da convicção do Juiz. Devem ser especificadas na inicial e na
contestação.
19
A admissão da prova ocorre no momento em que o Juiz dispõe sobre os
meios de prova que entende que devam ser utilizados para que seu
convencimento possa se formar. Tal fato ocorre no despacho saneador do
processo.
O último ato do procedimento probatório é a produção da prova, ou seja,
a carreação aos autos do meio de prova cuja utilização foi deferida.
“Em regra a produção da prova se dá na audiência de
instrução e julgamento (art. 336 do CPC), havendo exceções
no tocante à prova documental (que deve ser produzida em
regra, junto com a apresentação da petição inicial e da
contestação – art. 396- só se admitido a juntada posterior de
documentos quando sua não apresentação no momento
oportuno
foi
devida
a
legítimo
impedimento
(como
o
desconhecimento da existência do mesmo, caso fortuito e a
força maior), á prova pericial e a inspeção judicial (que devem
ser realizadas após a decisão de saneamento do processo,
mas antes da audiência de instrução e julgamento)”. (Câmara,
Alexandre Freitas. Lições de Direito..., cit., p.410).
1.8
Dever de colaboração com a justiça
Humberto Theodoro Júnior afirma que a realização da justiça é um dos
objetivos principais do Estado moderno. Acima dos interesses das partes há
um interesse de ordem pública, na justa composição do litígio e na prevalência
da vontade concreta da lei, como forma de buscar a paz social e o império da
ordem jurídica.
Para o alcance dessas metas é necessário que todo cidadão cumpra
com o seu dever de colaborar com o poder Judiciário na busca da verdade.
“Trata-se de uma sujeição que atinge não somente às partes, mas todos que
20
tenham entrado em contato com os fatos relevantes para a solução do litígio”.
(Junior, Humberto Theodoro. Curso de Direito..., cit. p.493).
Sobre o tema dispõe o art. 339 do Código de Processo Civil que
“ninguém se exime do dever de colaborar com o Poder Judiciário para o
descobrimento da verdade”.
Ressalta-se que o art. 340 do mesmo diploma legal ainda dispõe os
seguintes deveres às partes, em matéria de instrução do processo:
I- O de comparecer em juízo, respondendo ao que lhe for interrogado;
II- O de submeter-se à inspeção judicial, que for julgada necessária; e
III- O de praticar ato que lhe for determinado.
O art. 341 impõe o dever com relação à terceiros;
I- Informar ao juiz os fatos e as circunstâncias de que tenha
conhecimento;
II- Exibir coisa ou documento que esteja em seu poder.
1.9
Provas em espécie
Será abordado nesse momento as provas em espécie, ou seja, todos os
meios de prova regulamentados em sede legislativa. Será usado para ilustrar o
trabalho as definições dadas pelo professor Alexandre Câmara em sua obra
doutrinária:
Depoimento pessoal:
É o testemunho prestado por uma das partes (autor ou réu) em juízo.
Possui dois objetivos: trazer esclarecimentos acerca dos fatos da causa – isto
é, sobre os fatos controvertidos e relevantes alegados pelas partes e provocar
a confissão.
Não comparecendo a parte a fim de prestar depoimento pessoal, deverá
ser aplicada ao ausente a “pena de confissão”, ou seja, a parte contumaz
21
confessou (presumidamente) os fatos sobre os quais deveria prestar
depoimento.
Confissão:
É a admissão, por alguma das partes, de fato contrário aos seus
interesses e favorável ao adversário, segundo determinação fornecida pelo art.
348.
A confissão somente pode versar sobre os fatos concernentes a direitos
disponíveis e oriunda de erro, dolo, ou coação pode ser invalidada, através de
ação anulatória quando ainda estiver pendente o processo que foi feita e por
ação rescisória, se já tiver sido formada a autoridade da coisa julgada.
Prova documental:
É toda atestação escrita ou gravada de um fato. Alcança não só os
documentos escritos como também as fotografias, gravações de sons, filmes e
etc. deve ser produzida com a petição inicial e com a contestação e só é
admissível a juntada posterior de documentos quando sua apresentação no
momento oportuno não foi possível por legítimo impedimento.
Prova testemunhal:
É a produzida por testemunhas. Testemunha é a pessoa estranha ao
feito que vai em juízo dizer o que sabe sobre os fatos da causa. Ressalta-se
que não se admite a prova exclusivamente testemunhal nos negócios jurídicos
que exceda o décuplo do salário mínimo no momento de sua celebração.
Poderá por exemplo ser usada como complemento da prova documental.
Prova pericial:
Há determinados casos em que o julgamento do mérito da causa
depende de conhecimentos técnicos de que o juiz não dispõe. Nesses casos
será necessário o auxílio de um especialista, o perito, auxiliar da justiça, que
dispondo
do
conhecimento
técnico
necessário,
transmitirá
jurisdicional o seu parecer sobre o tema posto à sua apreciação.
ao
órgão
22
“Assim por exemplo, num processo em que se pretende a
renovação de uma locação empresarial, um perito analisará o
valor do imóvel locado, com o fim de verificar qual o valor de
mercado do aluguel do prédio onde funciona a empresa.”
(Câmara, Alexandre Freitas. Lições de Direito ..., cit., p. 426)
Inspeção Judicial:
Trata-se da prova através da qual o próprio Juiz através dos seus
sentidos examina uma coisa ou pessoa, a fim de obter esclarecimentos sobre
os fatos da causa. Pode ser feita de ofício ou a requerimento das partes, em
qualquer fase do processo.
“O juiz, ao realizar a inspeção, pode ser acompanhado por um
ou mais peritos e deverá ir ao local onde se encontre a coisa
ou pessoa objeto da prova, toda vez que julgar necessário para
poder melhor verificar ou interpretar os fatos a serem
observados, quando a coisa (ou pessoa) não puder ser
apresentada em juízo sem grandes despesas ou grandes
dificuldades ou quando determinar a reconstituição dos fatos.”
(Câmara. Alexandre Freitas. Lições de Direito..., cit., p.429).
Exibição de documento ou coisa:
Trata-se na verdade de demanda autônoma, de índole cautelar e não de
meio de prova. Será dispensada, segundo o art. 363, toda vez que seja lesiva
á intimidade e à honra do requerido, de sua família, bem como a dever de
sigilo seu.
23
CAPÍTULO II
A INVERSÃO DO ÔNUS PROBATÓRIO
2.1 Breve abordagem histórica
No Direito Romano prevalecia a regra que incumbe o ônus da prova a
quem afirma ou age, ficando dessa forma desobrigado de produzir qualquer
prova aquele que simplesmente nega o fato.
Sobre o tema é interessante ressaltar o artigo publicado pelo jurista
Rodrigo Neme Mira, que discorre sobre o ônus da prova na história;
“Já no Direito Português, ainda sob influência do pensamento
romano, as Ordenações Filipinas admitiam que, em regra, a
24
negativa não se pode provar, porém, quando se resolve em
afirmativa, torna-se fato que, ainda negado o direito alegado
por outra parte, é passível de prova.” (Mira, Rodrigo Neme.
www.direitonet.com.br / 20.06.2007).
Ainda sobre o tema o jurista continua sua exposição relatando:
“Das teorias que explicam a utilização do ônus da prova,
Chiovenda elege como critério dominante a oportunidade, ou
seja, o interesse da parte em fazer prova do que alega,
remetendo-se ao princípio do dispositivo supracitado, pelo qual
cabe à parte tomar a iniciativa das provas.
Carnelutti diverge da visão de Chiovenda afirmando que o ônus
da prova deve ser distribuído, não de acordo com o interesse
de provar, que é bilateral, mas de afirmar o fato que embasou
o pedido da parte. Logo, segundo Carnelutti, ao autor caberia
afirmar os fatos constitutivos de seu direito com o ônus de
prová-los, e ao réu, quando afirmando fatos extintivos,
modificativos ou impeditivos do direito do autor, teria o ônus de
fazer
prova
sobre
eles.”
www.dieitonet.com.br / 20.06.2007).
(Mira,
Rodrigo
Neme.
25
Dessa forma verifica-se que o sistema adotado pelo nosso atual Código
de Processo Civil pátrio, onde o art. 333 dispõe que:
“Art. 333 O ônus da prova incumbe:
I – ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu
direito;
II – ao réu, quanto à existência de fato impeditivo,
modificativo ou extintivo do direito do autor.” (Brasil.
Código de Processo Civil. Organização editoria
jurídica da editora Saraiva. 13ª Ed. 2007).
Em suma, a cada parte incumbe a tarefa de demonstrar a veracidade de
suas afirmações a fim de convencer o Juiz sobre a existência do direito
alegado.
2.2 Definição do conceito
Fredie Didier conceitua em sua obra que ônus da prova é uma regra de
conduta dirigida às partes, que indica quais os fatos que a cada um incumbe
provar. (Junior. Fredie Didier. Curso de Direito..., cit., p. 41).
O mesmo autor ainda sustenta a existência de dois sentidos para o
referido instituto, sendo o primeiro sentido o chamado ônus subjetivo e o
segundo o ônus objetivo.
No ônus subjetivo as partes possuem a tarefa de demonstrar, de
comprovar os fatos alegados, a fim de convencer o julgador a existência do
seu direito.
Já no ônus objetivo o ônus da prova é dirigido ao Juiz, que mesmo que
as provas existentes nos autos sejam insuficientes para formar seu
convencimento, deverá julgar a demanda proferindo sentença de mérito.
26
Didier ainda cita em sua obra a definição fornecida pelo jurista Barbosa
Moreira sobre o assunto:
“Explica o ônus subjetivo, Barbosa Moreira: O desejo de obter
a vitória cria para a litigante a necessidade, antes de mais
nada, de pesar os meios de que se poderá valer no trabalho de
persuasão, e de esforçar-se, depois para que tais meios sejam
efetivamente utilizados na instrução da causa. Fala-se ao
propósito, de ônus da prova, num primeiro sentido (ônus
subjetivo ou formal).
E segue comentando o ônus objetivo: A circunstância de que,
ainda assim, o litígio deva ser decidido torna imperioso que
alguma das partes suporte o risco inerente ao mau êxito da
prova. Cuida então a lei, em geral, de proceder a uma
distribuição de riscos: traça critérios destinados a indicar,
conforme o caso, qual dos litigantes terá de suportá-los,
arcando com as conseqüências desfavoráveis de não se haver
provado o fato que lhe aproveitava. Aqui também se alude ao
ônus da prova mas num segundo sentido (ônus objetivo ou
material)”. (Junior. Fredie Didier. Curso de Direito..., cit., p. 74).
Em suma, o ônus subjetivo é o sistema direcionado para as partes,
enquanto o ônus objetivo é a regra de conduta a ser adotada pelo Juiz em
caso de provas insuficientes apresentadas pelos litigantes.
Para finalizar o tema é relevante ressaltar a abordagem feita por Didier:
“Questiona-se, contudo, a utilidade de tal distinção. Afinal,
pouco importa quem, no curso da instrução, produziu a prova
trazida aos autos: se a parte que atendeu ao seu ônus, se a
parte adversária ou mesmo o magistrado, Não interessa uma
análise subjetiva da prova, de qual sujeito ela se originou. Deve
estar atento o juiz, ao final da instrução, para as provas que
27
foram objetivamente produzidas – independentemente de
quem as produziu – e aquel’ outras que não o foram, para
atribuir as conseqüências devidas àquele que não se
desincumbiu de tal ônus.” (Junior. Fredie Didier. Curso de
Direito ... cit., p.74).
2.3 O ônus da prova de fato negativo
Hodiernamente diz que só os fatos absolutamente negativos não são
passíveis de serem provados e devido ao fato de serem indefinidos.
Didier ensina em sua obra que todo fato negativo corresponde a um fato
positivo e vice e versa. Se não é possível provar a negativa, nada impede que
se prove a afirmativa correspondente.
O mesmo autor faz a distinção dos tipos de negativa, as negativas
absolutas das relativas:
“A negativa absoluta é a afirmação pura de um não-fato,
indefinida no tempo e/ou no espaço (ex. jamais usou um
“biquíni de lacinho”).
Já a negativa relativa é a afirmação de um não-fato, definida
no tempo e/ou no espaço, justificada pela ocorrência de um
fato positivo – fácil de perceber quando lembramos dos “álibis’
(ex. na noite de réveillon, não cometeu adultério no
apartamento 501, do Hotel Copacabana, pois estava com
amigas no Eco Resort, na Praia do Forte, Bahia).” (Junior,
Fredie Didier. Curso de Direito..., cit., p. 760
Como dito acima somente os fatos absolutamente negativos são
insuscetíveis de prova, porém já os fatos relativamente negativos são
totalmente aptos a serem provados.
28
2.4 Teorias sobre a repartição do ônus da prova
Fredie Didier em sua obra cita a síntese feita por Wilson Alves Souza
sobre as principais teorias sobre o ônus da prova:
1.
“Teoria de Jeremy Bentham: a obrigação de provar deve
ser imposta a quem tiver condições de satisfazê-la, com menos
inconvenientes – temporais, econômicos etc. Trata-se da teoria
seguida por DEMOGUE, com poucas variações. Aqui já se
encontram os primeiros sinais de uma teoria dinâmica do ônus
probatório.
2.
Teoria de Bethmann- Hollweg: a quem deduz um direito,
cabe provar sua existência – falando em prova de direito e não
de fato.
3.
Teoria de Gianturco: deve produzir prova aquele que dela
auferir vantagem.
4.
Teorias de Betti, Carneluttu e Chiovenda: que muito se
assemelham e, em linhas bem gerais, dispõem que o autor
deve provar fatos que fundam sua pretensão e o réu deve
provar fato que baseiam suas exceções. Essas teorias são
muito criticadas por Micheli, por levarem em consideração a
relação jurídica abstratamente colocada, ignorando a situação
real das partes da causa e suas possibilidades concretas de
produzir provas.
5.
Teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova (e a
similar teoria do principio da solidariedade e cooperação) de
Jorge W Peyrano e Augusto M. Morello (na verdade, seus
principais mentores): surgiu na Argentina onde os ditos
autores, a partir da concepção do processo como situação
jurídica de Goldschimdt, passaram a defender a repartição
dinâmica do ônus da prova. Baseando-se nos princípios da
veracidade, boa-fé, lealdade e solidariedade (com atuação do
juiz), defendem que é necessário levar em conta as
29
circunstâncias do caso concreto, para atribuir-se o ônus da
prova àquele que tem condições de satisfazê-lo; impõe-se uma
atuação probatória da parte que tem mais possibilidades de
produzi-la. E o Juiz verificando que houve uma violação ao
dever
das
partes
de
cooperação
e
solidariedade
na
apresentação de provas, deve proferir decisão contrária ao
infrator. Tudo isso, no intuito de que o processo alcance seus
fins, oferecendo prestação jurisdicional justa”. (Souza. Wilson
Alves. “Ônus da prova – considerações sobre a doutrina das
cargas probatórias dinâmicas” p. 243-244).
O nosso Código de Processo Civil adota a teria estática do ônus da
prova, teoria clássica, distribuindo prévia e abstratamente o encargo probatório
nos seguintes termos: ao autor incumbe provar os fatos constitutivos do seu
direito e ao réu provar os fatos extintivos, modificativos ou impeditivos.
CAPÍTULO III
A INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA NO
DIREITO DO CONSUMIDOR
3.1 Requisitos para concessão
Insta consignar que a lei consumerista possui determinações próprias
que tratam da questão da prova.
30
Rizatto Nunes em sua obra doutrinária preceitua que:
“Entender, então, a produção das provas em casos que
envolvam as relações de consumo é compreender toda a
principiologia da lei nº 8078, que pressupõe, entre outros
princípios e normas, a vulnerabilidade do consumidor, sua
hipossuficiência (especialmente técnica e de informação, mas
também econômica, como se verá), o plano geral da
responsabilização do fornecedor, que é de natureza objetiva
etc.” (Nunes. Rizzatto. Curso de Direito do Consumidor, 2005,
p.737)
O Ilustre doutrinador ensina que a primeira situação envolvendo provas
na lei consumerista é relacionada a responsabilidade civil objetiva do
fornecedor pelo fato do produto ou serviço, bem como à responsabilidade pelo
vício do produto ou serviço que se espraia por todo o sistema adotado pelo
CDC.
“Haverá, por exemplo, necessidade de o consumidor provar o
nexo de causalidade entre o produto, o evento danoso e o
dano, para pleitear a indenização por acidente de consumo.
E a produção dessa prova preliminar necessária se fará pelas
regras do Código de Processo Civil, a partir dos princípios e
regras estabelecidos no CDC.” (Nunes. Rizzatto. Curso de
Direito ... , cit., p.738).
A determinação da inversão do ônus da prova fica a critério do Juiz que
a concede sempre que verificar a existência de verossimilhança das alegações
do consumidor ou sua hipossuficiência. A interpretação gramatical impõe a
conclusão que vasta a verossimilhança ou a hipossuficiência.
VEROSSIMILHANÇA DAS ALEGAÇÕES
31
Rizzatto Nunes ensina que não basta somente o advogado ter uma boa
redação no momento de elaborar a peça inicial, não basta ter uma ótima
capacidade de escrita e confeccionar uma ótima petição. “É necessário que da
narrativa decorra verossimilhança tal que naquele momento da leitura se possa
aferir, desde logo, forte conteúdo persuasivo.” (Nunes. Rizzatto. Curso de
Direito..., cit., p. 739).
Para melhor ilustrar a questão é relevante mencionar o exemplo citado
por Luiz Guilherme Marinoni em sua obra na qual o autor cita:
“No caso em que o autor alega que um defeito no sistema de
freios de seu veículo lhe acarretou um acidente com danos
materiais e pessoais, e o fabricante não demonstra a
inexistência
desse
defeito,
a
dificuldade
no
preciso
esclarecimento de que o dano foi gerado pelo defeito não pode
ser suportada pelo consumidor, bastando-lhe assim, fazer o
juiz acreditar na verossimilhança de que este defeito tenha
provocado o dano.
(...)
É por isso que basta a verossimilhança ou como quer
o art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor,
que o juiz inverta o ônus da prova, com base na
verossimilhança, na própria sentença.” (Marinoni, Luiz
Guilherme. Manual do Processo de Conhecimento,
2006. P. 279-280).
HIPOSSUFICIÊNCIA DO CONSUMIDOR
Sobre o tema Rizzatto Nunes dispõe que:
32
“(...) Mas a hipossuficiência, para fins da possibilidade de
inversão do ônus da prova, tem sentido de desconhecimento
técnico e informativo do produto e do serviço, de suas
propriedades, de seu funcionamento vital e/ou intrínseco, de
sua distribuição, dos modos especiais de controle, dos
aspectos que podem ter gerado o acidente de consumo e o
dano, das características do vício, etc.” (Nunes. Rizzatto. Curso
de Direito...., cit., p. 740).
Desta forma não se pode concluir que a hispossuficiência do
consumidor para fins de inversão do ônus da prova é uma espécie de proteção
ao mais pobre. “Ou, em outras palavras, não é por ser pobre que deve ser
beneficiado com a inversão do ônus da prova, até porque a questão da
produção da prova é processual e a condição econômica do consumidor diz
respeito ao direito material.” (Nunes, Rizzatto. Curso de Direito ..., cit., p. 740).
O juiz quando for analisar a verossimilhança das alegações ou a
hipossuficiência do consumidor o fará segundo as regras ordinárias de
experiência.
As regras de experiência são as denominadas presunções com base no
que ordinariamente acontece. O juiz ao utilizar as regras ordinárias de
experiência vai usar o seu prudente arbítrio e formação pessoal para observar
o fato conhecido levando em consideração o que ordinariamente acontece e
assim chegar a presunção da verdade.
3.2 Momento da inversão do ônus da prova
O magistrado, a requerimento da parte ou de oficio, analisará com base
nas regras ordinárias de experiência se há incidência de um ou dos dois
requisitos que possibilitem a inversão do ônus da prova proferindo sua decisão.
33
A doutrina e a jurisprudência divergem sobre qual o momento adequado
para se aplicar as regras de inversão do ônus da prova.
Rizzatto observa que a polêmica em torno do momento processual para
aplicação da regra da inversão do ônus da prova se dá em razão da falta de
rigorismo lógico e teleológico do sistema processual instaurado pela Lei 8.078.
O mesmo autor se opõe ao entendimento de que o momento da
aplicação da regra de inversão do ônus da prova é no julgamento da causa,
afirmando que esse pensamento está alinhado com a distribuição do ônus da
prova do art. 333 do Código de Processo Civil e não com aquela instituída pelo
Código de Defesa do Consumidor.
O doutrinador sustenta que as partes que litigam no processo civil, tem
clareza na distribuição do ônus e que não haverá qualquer surpresa para as
partes, porquanto elas sempre souberam a quem cabia a desincumbência da
produção da prova.
Porém não é essa certeza que prevalece no Código de Defesa do
Consumidor, pois a inversão não se dá de maneira automática, tal fato ocorre
somente diante da constatação da existência de verossimilhança das
alegações ou se for hipossuficiente o consumidor.
Dessa forma é necessário que o magistrado se manifeste no processo
para saber se existe verossimilhança das alegações ou se a hipossuficiência
do autor foi reconhecida.
O autor considera que o momento processual mais adequado para a
decisão sobre a inversão do ônus da prova é o situado entre o pedido inicial e
o despacho saneador. O doutrinador afirma que não vê qualquer sentido que
o juiz venha decidir a inversão somente na sentença, como se fosse uma
surpresa a ser revelada para as partes.
Sobre o tema Rizzatto ainda faz uma última abordagem sobre o
assunto:
34
“Como a lei não estipula a priori quem está obrigado a se
desonerar e a fixação do ônus depende da constatação da
verossimilhança
obrigado
a
se
ou
hipossuficiência,
manifestar
antes
o
magistrado
da
está
verificação
da
desincumbência, porquanto é ele que dirá se é ou não caso de
inversão.” (Nunes, Rizzatto. Curso de Direito ..., cit., p. 743)
Entretanto, para o aperfeiçoamento desta obra, abordaremos adiante a
inversão do ônus probatório antes e no momento da sentença.
Antes da sentença:
Sobre o assunto se mostra relevante citar o posicionamento adotado
pelo Prof. Andre Gustavo de Andrade, que de forma clara sintetiza a questão
em seu artigo da seguinte forma:
A idéia, por muitos sustentada, de que o disposto no art. 6º,
VIII, do CDC constitui regra de procedimento parte da premissa
de que, antes da manifestação do juízo acerca da inversão do
ônus da prova, o fornecedor ainda se encontra sob o regime
geral do art. 333 do CPC, ou, pelo menos, supõe que assim se
encontra. A manifestação prévia do juízo teria por finalidade
determinar ou estabelecer que o caso sub examen passará a
se submeter ao regime especial do art. 6° do CDC. A partir
dessa manifestação judicial – e só então – saberia o
fornecedor que é seu o ônus da prova, e a ele seria conferida a
oportunidade de se desincumbir do encargo que lhe é entregue
– e com o qual, até então, não contava. (Andrade, André
Gustavo.
A
inversão
do
ônus
da
prova
no
CDC.
www.tj.rj.gov.br).
O citado jurista considera ainda que não é acertado, todavia, o
entendimento de que, enquanto não estabelecida judicialmente a aplicação da
regra da inversão do ônus da prova, as partes estejam – ou necessariamente
suponham que estejam – sob a influência da regra geral do art. 333 do CPC.
35
“A despeito do que parece indicar, o texto do art. 6°, VIII, do
CDC não está a conferir ao juízo um poder discricionário, de
inverter ou não o ônus da prova. A inversão do ônus da prova é
produzida ope legis, ou seja, decorre da própria lei, uma vez
presentes os requisitos estabelecidos em lei, os quais são
apenas reconhecidos no caso concreto pelo juízo (no momento
de proferir a sentença).” (Andrade, André Gustavo. A inversão
do ônus da prova no CDC. www.tj.rj.gov.br).
Justifica-se a inversão do ônus da prova anteriormente a sentença, já
que, decidindo o juiz pela inversão somente na sentença, estaria retirando do
fornecedor o direito de se defender - o que, conseqüentemente ofende o
princípio constitucional da ampla defesa e do contraditório.
No momento da sentença
Alguns doutrinadores fundamentam sua tese afirmando que as regras
da inversão do ônus da prova são de julgamento da causa e que, somente
após a instrução do feito, no momento da valoração das provas, estará o juiz
habilitado a determinar a inversão ou não do ônus probatório.
Para o ilustre doutrinador Nelson Nery Jr, o ônus da prova é regra de
juízo. Este renomado autor, ao manifestar-se acerca do tema em debate,
afirma que a sentença é o melhor momento para a inversão. Sustenta este
renomado jurista que "a parte que teve contra si invertido o ônus da prova (...)
não poderá alegar cerceamento de defesa porque, desde o início da demanda
de consumo, já sabia quais eram as regras do jogo e que, havendo non liquet
quanto à prova, poderia ter contra ela invertido o ônus da prova." (Nery e Nery.
Nelson Junior e Rosa Maria de Andrade.CPC comentado, São Paulo, 2002, p.
696).
Conclui-se que a maioria dos doutrinadores defende o posicionamento
em que a sentença não é o momento mais adequado para a inversão, sendo o
36
momento mais adequado aquele que antecede a sentença, preferencialmente
antes de iniciada a instrução probatória, decidindo através do despacho
saneador.
3.3 Convenção sobre o ônus da prova
Humberto Teodoro Junior explica em sua obra doutrinária que as partes
podem convencionar sobre os critérios próprios a respeito do ônus da prova,
desde que tratem de direitos disponíveis, senão vejamos:
“Como as partes tem disponibilidade de certos direitos e do
próprio processo, é perfeitamente lícito que, em cláusula
contratual, se estipulem critérios próprios a respeito do ônus
da prova, pra a eventualidade de litígios a respeito do
cumprimento do contrato.
Isto porém só será admissível quando a cláusula referir-se a
direitos disponíveis, ou quando não tornar impraticável o
direito da própria parte.” (Junior. Humberto Theodoro. Curso
de Direito ... , cit., p. 490.
Importante salientar que o art. 333 em seu parágrafo único declara nula
a convenção das partes que distribua o ônus da prova de forma diversa
daquela prevista em seu caput quando: recair sobre direito disponível da parte
ou tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício do direito.
Fredie Didier argumenta:
“O art. 51,VI, do CDC cuida da nulidade de convenção quando
imponha ao consumidor o ônus da prova das suas alegações.
Trata-se de norma que complementa o art. 333, parágrafo
único do CPC, que expressamente permite negociação da
distribuição do ônus da prova, limitando-a, nos dois incisos
previstos neste dispositivo. É como se houvesse um terceiro
37
inciso no parágrafo único do art. 333 do CPC. Esse dispositivo
“não proíbe a convenção sobre o ônus da prova, mas sim,
tacha de nula a convenção se trouxer prejuízo ao consumidor.”
(Junior, Fredie Didier. Curso de Direito ..., cit., p. 86).
Conclui-se que as partes podem convencionar a respeito do ônus
probatório desde que tratem de direitos disponíveis ou tornar extremamente
oneroso a uma das partes o exercício do direito.
CAPÍTULO IV
CONCLUSÃO
Devido à existência da vulnerabilidade e a hipossuficiência do
consumidor foi criada a norma que permite o acesso do mesmo uma justiça
justa, proporcionando equilíbrio no âmbito processual.
O art. 6, inciso VIII do Código de Defesa do Consumidor preceitua uma
melhoria na defesa dos direitos do consumidor, sendo a mais importante a
inversão do ônus probatório em prol da parte mais frágil.
A aplicação da inversão do ônus probatório depende do convencimento
do magistrado quanto às provas apresentadas pelas partes, dependerá da
verossimilhança
das
alegações
ou
quando
este
for
considerado
hipossuficiente.
Uma vez invertido o ônus probatório, ocorre a desoneração do
consumidor do encargo de provar o evento danoso, ficando ao encargo do
fornecedor a produção de tal prova.
38
Conforme citado nesse trabalho monográfico existem divergências
doutrinárias a respeito de qual deve ser o melhor momento para a aplicação da
inversão do ônus da prova. É necessário que ocorra um consenso dos
doutrinadores para que se chegue a uma conclusão sobre o tema,
proporcionando total proteção aos direitos do consumidor.
A Lei n° 8078/90 veio com o objetivo de regulamentar a situação do
consumidor face a sua vulnerabilidade e hipossuficiência nas relações de
consumo.
BIBLIOGRAFIA
1. Andrade, André Gustavo. A inversão do ônus da prova no CDC.
www.tj.rj.gov.br
2. Baur, Fritz. Transformações do Processo Civil em nosso tempo. Vol.
VIII, Revista Brasileira de Direito Processual.
3. Brasil. Código de Processo Civil. Organização Editoria Jurídica da
editora Saraiva. 13ª edição, 2007.
4. Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF:
Senado Federal, 1988.
5. Câmara, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. Vol. I.
Editora Saraiva, 15ª edição, 2006.
6. Junior, Fredie Didier. Curso de Direito Processual Civil. Vol 2. Editora
Juspodivm, 5ª edição, 2010.
7. Junior. Humberto Theodoro. Curso de Direito Processual Civil. Vol I.
Editora Forense, 48ª edição, 2008.
8. Marinoni, Luiz Guilherme. Manual do Processo de Conhecimento.
39
Editora Revista dos Tribunais, 5ª edição, 2006.
9. Mira, Rodrigo Neme. A inversão do ônus da prova no processo do
trabalho. www.dieitonet.com.br / 20.06.2007.
10. Nery e Nery. Nelson Junior e Rosa Maria de Andrade. CPC Comentado,
3ª edição, 2002.
11. Nunes, Rizzatto. Curso de Direito do Consumidor. Editora Saraiva,2ª
edição, 2005.
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