A constituição das monarquias corporativas
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Normalmente, ao discutir as questões relativas à constituição reino cai-se
inevitavelmente na questão do pactismo ou do "dualismo" – a
constituição como um pacto político entre rei e reino;
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Isto não é senão o resultado da retro-projecção da teoria constitucional
do séc. XIX (parlamentarismo; dupla-representatividade);
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A constituição (e a representação) como factos de vontade.
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A ideia de um governo pactado não era desconhecida do período
medieval e primo-moderno "respublica per viam contractus", “quod
omnes tangit ab omnibus approbari debet” [aquilo que toca a todos deve
ser aprovado por todos] – Aragão, Regime foral dos Países Bascos,
certas cidades italianas, Portugal.
Representação
A representação – relação natural entre o representante e o representado.
“Repraesentatio est quaedam fictio, per quam unus loco alterius ponitur“ [a representação é
aquele ficção pela qual se põe um no lugar do outro]"; V. Gama 1578, dec. 59, n. 4:
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"Repraesentatio non admittitur in dispositione hominis [...] quia repraesentatio est fictio« [a
representação não se admite estra na disposição do homem, pois a representação é uma
ficção] , M. Febo, 1619, dec. 191, n. 5.
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"Filius cum patre eadem persona censetur, eundem gradu, & qualitatem") M. A. Pegas,
1669., t. 10, ad II,35, c. 39, n. 49:; ("[patronus non censetur una persona cum liberto]; sicut
censetur pater, & filius" [... & sic] filia repraesentat patrem cum qualitate masculinitatis [na
representação não se considera a qualidade do representante mas a da pessoa representada
(... e assim) a filha representa o pai com a qualidade masculina] ; M. Febo, 1760 dec. 22, n.
27)
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"In repraesentatione non considerantur qualitates repraesentantis, sed personae
representatae [... & sic] filia repraesentat patrem cum qualitate masculinitatis [!]« [considerase qu o filho é a mesma pessoa do pai, do mesmo grau e qualidade] , M. Febo, 1760, dec. 22,
ns. 13-14.
Neste sentido os órgãos representativos eram realmente o reino, mas por uma relação de
necessidade que não passava pela ideia do contrato social, mas pela da unidade ou presença
mística (tal como a cabeça representa o corpo; o pai, a família, a bandeira, o país.
A constituição como razão natural
A concepção naturalista da constituição:
Ordem política enraizada na natureza das coisas, criando uma relação
indisponível entre governantes e governados.
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Magna Charta, 1215: John, by the grace of God, king of England, lord of
Ireland, duke of Normandy and Aquitaine, and count of Anjou, to the
archbishop, bishops, abbots, earls, barons [...] . Know that, having
regard to God and for the salvation of our soul, and those of all our
ancestors and heirs, and unto the honour of God and the advancement
of his holy Church and for the rectifying of our realm, we have granted
as underwritten by advice of our venerable fathers, [...]

1. In the first place we have granted to God, and by this our present
charter confirmed for us and our heirs forever that [...] “.
A constituição como razão natural
John of Salisbury, Policraticus, Book Four (selections)
 CHAPTER I
OF THE DIFFERENCE BETWEEN A PRINCE AND A TYRANT AND OF WHAT IS MEANT BY A
PRINCE.
Between a tyrant and a prince there is this single or chief difference, that the latter obeys the
law and rules the people by its dictates, accounting himself as but their servant. It is by virtue of
the law that he makes good his claim to the foremost and chief place in the management of the
affairs of the commonwealth and in the bearing of its burdens; and his elevation over others
consists in this, that whereas private men are held responsible only for their private affairs, on
the prince fall the burdens of the whole community. Wherefore deservedly there is conferred on
him, and gathered together in his hands, the power of all his subjects, to the end that he may be
sufficient unto himself in seeking and bringing about the advantage of each individually, and of
all; and to the end that the state of the human commonwealth may be ordered in the best
possible manner, seeing that each and all are members one of another. [...] Therefore the
prince stands on a pinnacle which is exalted and made splendid with all the great and high
privileges which he deems necessary for himself. And rightly so, because nothing is more
advantageous to the people than that the needs of the prince should be fully satisfied; since it is
impossible that his will should be found opposed to justice. Therefore, according to the usual
definition, the prince is the public power, and a kind of likeness on earth of the divine majesty.[...]
To quote the words of the Emperor, "it is indeed a saying worthy of the majesty of royalty that
the prince acknowledges himself bound by the Laws." [Justinian, Codex I.14.4] For the authority
of the prince depends upon the authority of justice and law; and truly it is a greater thing than
imperial power for the prince to place his government under the laws, so as to deem himself
entitled to do nought which is at variance with the equity of justice.
A constituição como vontade
A constituição como vontade.

A constituição como uma decisão dos comícios (lex regia de imperio).

6. ULPIANUS libro I. Institutionum. - Ius civile est, quod neque in totum a
naturali vel gentium recedit, nec per omnia ei servit; itaque quum aliquid
addimus vel detrahirnus iuri communi, ius proprium, id est civile, efficimus (o
direito civil é aquele que nem se afasta em tudo do direito natural ou das gentes,
nem lhe corresponde em tudo; e assim, quando acrescentamos ou tiramos algo
ao direito comum, constituimos direito próprio, ou seja, civil [da cidade].
§ 1 - Hoc igitur jus nostrum constat aut ex scripto, ant sine scripto, ut apud
Graecos [legum aliae scriptae, aliae non scriptas] (Por isso, este nosso
direito decorre de normas escritas ou não escritas, ou, como diziam os
gregos graphón e agraphón).

7. PAPINIANUS libro II. Definitionum. - Jus autem civile est, quod ex legibus,
plebiscitis, senatusconsultis, decretis principum, auctorltate prudentum venit.
A constituição como razão natural

Embora, em última análise, produto de vontade de Deus, o poder político faz parte
da natureza das sociedades humanas : « o direito natural [est] necessário à conservação
da sociedade humana, tal como o exige[appetit] a própria natureza do homem", I,7) ;
"Supposita societate civili, singularum personarum ad publicam potestatem seu
principatum politicum subjectio, naturalis est tanquam consentanea recta rationi
naturali, et ad convenientem humanae naturae conservationem necessaria“ (suposta
a sociedade civil, a sujeição das pessoas singulares ao poder ou principado
político é tanto natural como consentânea com a recta razão natural, bem como
necessária à conveniente conservação da natureza humana" ] (I,8) *.

O papel do rei e dos súbditos estão definidos por natureza, não havendo lugar para
o arbítrio.

A unidade do poder. ("tribunal vel potestatem unam, sive illa in una naturali persona,
sive in uno consilio seu congregatione plurium", I,5,6) ** é incompatível com a ideia
de pactismo.

* Francisco Suarez, Defensio fidei catholicae adversus anglicanae sectae errores, cum responsione ad Apologiam pro iuramento fidelitatis
(Jaime I), et Epistolam ad Principes Christianos Serenissimi Jacobi Angliae Regis (Idem), Coimbra, 1613).
A garantia da constituição

A manutenção dos equilíbrios naturais é assegurada pelo
funcionamento da justiça (ius suum cuique tribuere). Pela
existência de tribunais e de uma ordo judiciorum (i) bem
estabelecida e (ii) omni-compreensiva.

Elementos de perturbação : "[...] Vemos - escreve - a cada paso
eligirse juntas de gravissimos ministros para este mismo fin de
hazer justicia, y sustentar intacta la pureza de la Real conciencia,
cosa utilissima y santissima, y en que los oprimidos con injusticias,
tienen cierto remedio de sus daños, fundado en uno y otro derecho,
y aun con dictamen en el natural, y divino [...]" (I,121, p. 44) *.

Se se fala em representação é só na medida em que rei e cortes
apresentam (tornam visível) publicamente o reino.
* João Salgado de Araújo,, Ley regia de Portugal, Madrid, 1627.
Constituição e regime

No entanto, há outros níveis de organização da república, em que os
membros do corpo político já podem ter poderes de disposição - o
regime político para o qual Aristóteles (Aristote, Politica, I, 7, 1327b):

"quod principi placuit legis habet vigorem: utpote cum lege regia, quae
de imperio eius lata est, populus ei et in omne suum imperium et
potestatem conferat" [D., I,4,1; transcrit en Inst., I,2,6]).

Mas esta atribuição do poder ao rei visaria « la administración de las
cosas a que se obligaron [pela natureza do seu ofício mais do que por
um pacto expresso], que es hazer, y distribuir justicia, sustentar, y
defender la Religión, de suerte que son a ello obligados por ley natural
y de las gentes, respecto del contrato celebrado con los pueblos, y por
ley divina, porque toda esta obligación les confirmò Dios nuestro
Señor" (I, 21, p. 6).
A justiça extraordinária ou graça

"[...] en esto no puede dezirse, que se pervierte orden alguno, o resiste à la
jurisdicción ordinaria, y se trastueca su curso contra razõ, y justicia [...]"(I,
121)."Porque, como el Principe soberano, es la mar de toda jurisdicción
temporal de sus Reynos [...] puede, y deve en qualquier caso que toque a la
Real obligación, y conciencia secar los caños de la jurisdicción ordinaria, y
difundirla por otras, en orden todo al mejor modo de apurar la verdad, y
administrar justicia, sin qe contra allo pueda arguirse cõ la formalidad que
tienen las ultimas apelaciones, revistas, y rescriptos de gracia, ò de justicia,
por ser esto Regalia muy mas alta y soberana, y lo esencial del pacto
celebrado en la ley Regia [...]"(I, 123).
Os limites no plano do governo
1.
As funções de controle das cortes; o consentimento dos
impostos (costume e transmissão de direitos).
2.
O sistema da verificação e do controlo (checks and balances;
entangled jurisdictions).
3.
O processo justo (due process)
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A constituição como razão natural