ORGANIZAÇÃO SETE DE SETEMBRO DE CULTURA E ENSINO LTDA
FACULDADE SETE DE SETEMBRO - FASETE
CURSO DE BACHARELADO EM DIREITO
FABIANA SANTOS DA SILVA
A CRIMINALIZAÇÃO DO USO DE DROGAS ENTORPECENTES E A
EFICÁCIA RESSOCIALIZADORA DA PENA: um estudo em Paulo
Afonso-BA
Paulo Afonso-BA
2014
FABIANA SANTOS DA SILVA
A CRIMINALIZAÇÃO DO USO DE DROGAS ENTORPECENTES E A
EFICÁCIA RESSOCIALIZADORA DA PENA: um estudo em Paulo
Afonso-BA
Monografia apresentada a Faculdade Sete de
Setembro – FASETE, como requisito para
obtenção do grau de no curso de Bacharel em
Direito.
Orientador: Prof. João Batista Santos Filho
.
Paulo Afonso-BA
2014
FABIANA SANTOS DA SILVA
A CRIMINALIZAÇÃO DO USO DE DROGAS ENTORPECENTES E A
EFICACIA RESSOCIALIZADORA DA PENA: um estudo em Paulo
Afonso-BA
Monografia apresentada ao corpo docente do
curso de Bacharelado em Direito da Faculdade
Sete de Setembro – FASETE, como requisito para
obtenção do título de Bacharel em Direito.
Orientador: Prof. João Batista Santos Filho
Paulo Afonso-Ba, 21 de novembro de 2014.
_______________________________________________
Prof. João Batista Santos Filho, Especialista (Orientador)
_______________________________________________
Prof. Jadson Correia de Oliveira, Mestre
_______________________________________________
Prof. Moacir Silva do Nascimento Júnior, Especialista
Dedico este trabalho primeiramente а
Deus, pоr ser essencial na minha vida,
autor da minha história, a luz que
ilumina o meu caminho, socorro bem
presente nаs horas de angústia.
Aоs mеυs pais por me ensinarem a ser
uma pessoa com caráter e batalhadora,
por investirem esforços imensuráveis
na concretização de meu sonho, pois, o
tornaram deles também.
AGRADECIMENTOS
Ao Criador e detentor da minha fé, pela sua infinita misericórdia em conceder-me
sabedoria para concluir mais uma etapa de vida, glórias ao único e verdadeiro Deus,
pois sempre me faz mais que vencedora.
Aos meus pais, Arnóbio e Quitéria, que desde sempre acreditou em mim, e deu-me
muita força para a concretização desta e de outras conquistas. A minha família
maravilhosa e abençoada, em especial aos meus irmãos, Arnaldo e Marcos Fábio,
por sempre torcerem por meu sucesso e felicidade; as minhas primas-irmãs, Simone
e Aracélia por serem tão presentes nos momentos de alegrias ou de tristezas, por
serem meu apoio constante; a minha sobrinha Beatriz e cunhada Berlândia, pelo
incentivo; e a minha tia Severina, com quem amo compartilhar todas as minhas
conquistas, pois sempre acredita na minha capacidade de conquista.
Aos grupos de whatsapp formados por colegas da faculdade, visto que foi o meio de
comunicação utilizado por muitos de nós, transmitindo mensagens de orientação
necessárias para a construção desse trabalho e de incentivo nas madrugadas
quando perpassam pensamento de desistência.
A todos оs professores dо curso qυе foram tãо importantes nа edificação da minha
vida acadêmica, na constituição do meu conhecimento, por fim, na preparação e
construção positiva do saber pessoal e profissional. Em especial, sou grata, ao meu
orientador o Professor João Batista Santos Filho que se dedicou com paciência na
orientação e supervisão desse trabalho, e compartilhou do seu conhecimento para
tornar possível a conclusão desta Monografia. Na construção deste Trabalho
agradeço ainda ao meu amigo do coração Lúcio Flávio que não medio esforços para
ajudar-me com seu conhecimento exímio em informática.
As amizades construídas ao logo dessa jornada acadêmica, em especial a Aldo,
Lucicleide, Giovaldo e Ariston, enfim, a todos aqueles qυе dе alguma forma
estiveram е estão próximos a mim, fazendo esta vida valer cada vеz mais а pena.
A todos o meu muitíssima obrigada!
O mundo é salvo todos os dias por
pequenos gestos. Diminutos, invisíveis. O
mundo é salvo pelo avesso da
importância. Pelo antônimo da evidência.
O mundo é salvo por um olhar. Que
envolve e afaga. Abarca. Resgata.
Reconhece. Salva.
Eliane Brum
SILVA, Fabiana Santos. A criminalização do uso de drogas entorpecentes e a
eficácia ressocializadora da pena: um estudo em Paulo Afonso – BA. 2014. 84f.
Monografia (Curso de Bacharelado em Direito) – Faculdade Sete de Setembro,
FASETE. Paulo Afonso-BA.
Este trabalho tem como objetivo refletir sobre o tratamento direcionado ao usuário de
drogas na atual legislação brasileira. A lei 11.343/06 tipifica a conduta de portar
drogas para consumo pessoal como ilícita, visto que, do contexto do uso de
entorpecentes decorrem crimes de perigo abstrato, que vitimiza a sociedade. Apesar
disso, o infrator felizmente é reconhecido como pessoa doente, e não como
delinquente, assim, necessita de atenção e cuidados que envolvam todas as esferas
de governo. Diante disso, o Direito Penal com o artigo 28, da lei em comento, prever
penas restritivas de direito, que consistem na tentativa de despertar o infrator para
os prejuízos causados pelo uso de drogas, objetivando reeducá-lo e reintegrá-lo a
sociedade, com uma postura diversa da recriminada. Inquietante a aplicabilidade
dessas sanções, deste modo, o presente estudo pretende verificar a eficácia
ressocializadora das punições com base na realidade do município de Paulo
Afonso/Ba. Como metodologia de estudo e apresentação dos resultados, foi feita
uma pesquisa quantitativa e qualitativa, pautada na análise da movimentação de
processos, que não tramitam em segredo de justiça, com a realização de entrevista
com operador do direito da área, abordando a temática em questão. A meta deste
estudo é contribuir com mais uma leitura para aprofundamento e conhecimento da
realidade do tema aqui mencionado.
Palavras – chave: Leis de Drogas. Dependência Química. Penas. Ressocialização.
SILVA, Fabiana Santos. The criminalization of the use of narcotic drugs and the
efficacy of a resocializing punishment: a study in Paulo Afonso - BA. 2014. 84f.
Monograph (course of Bachelor of Laws) - Faculdade Sete de Setembro, FASETE.
Paulo Afonso-BA.
This paper has as objective to reflect on the targeted treatment for drug users in the
current Brazilian legislation. The Law 11.343 / 06 criminalizes the conduct of carrying
drugs for personal use as unlawful, since the context of use of narcotics crimes
derive abstract danger that victimizes society. Nevertheless, the offender is thankfully
acknowledged as a sick person, and not as offenders, thus, requires attention and
care involving all levels of government. On this, the Criminal Law with Article 28 of
the law under discussion, provide penalties restricting rights which consist in an
attempt to awaken the offender for the harm caused by the use of drug, aiming to
reeducate him and reinstate him to society, with a different attitude of the one
disallowed. Disturbing are the applicability of these sanctions, therefore, the present
study investigated the effectiveness of a resocializing punishment based on the
reality of the city of Paulo Afonso / Ba. The methodology of the study and
presentation of the results, a quantitative and qualitative approach was done, based
on analysis of the process that does not proceed in Justice secrecy, with the
execution of an interview with a professional in this area, addressing the issue in
question. The goal of this study is to contribute to further reading and deepening
knowledge of the reality on the issue mentioned here.
KEY-WORDS: Narcotics Laws. Chemical Dependence. Punishment. Resocialization.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
JECRIM – Juizado Especial Criminal
OMS – Organização Mundial de Saúde
PROJUDI – Processo Judicial Digital
RE – Recurso Extraordinário
STF – Supremo Tribunal Federal
TCO – Termo Circunstanciado de Ocorrência
INDICE DE GRÁFICOS
Gráfico 1: Período entre a data do fato e a data da distribuição ...................... 65
Gráfico 2: Período entre a data do fato e a realização da distribuição com
balizamento anual ............................................................................. 66
Gráfico 3: Audiência Preliminar ........................................................................ 67
Gráfico 4: Efetividade Processual .................................................................... 68
Gráfico 5: Audiência Sem Conciliação ............................................................. 69
Gráfico 6: Propostas para Transação Penal ..................................................... 71
Gráfico 7: Prestação Pecuniária ....................................................................... 71
Gráfico 8: Prestação de Serviço ....................................................................... 72
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 12
1 O UNIVERSO DAS DROGAS ................................................................................ 14
1.1 ORIGEM DAS DROGAS NO BRASIL E NO MUNDO ......................................... 14
1.1.1 Uso das drogassem rituais sagrados ........................................................... 14
1.1.2 Difusão das drogas do consumo medicinal para o uso recreativo ........... 15
1.1.3 Breve histórico da legislação brasileira ....................................................... 18
1.2 CONCEITO DE DROGAS ................................................................................... 21
1.3 CONCEITO DE DEPENDÊNCIA QUIMICA ........................................................ 24
2 USUÁRIO E PORTADOR DE DROGAS SEGUNDO A LEI 11343/06 .................. 28
2.1 CONDUTAS INCRIMINADORAS À LUZ DO ART. 28 DA LEI 11.343/06 ........... 31
2.2 DESCRIMINALIZAÇÃO OU DESPENALIZAÇÃO DO USUÁRIO DE DROGAS . 36
2.3 TEORIA GERAL DA PENA ................................................................................. 41
2.4 SANÇOES ATRIBUIDAS AO USUÁRIO DE DROGAS....................................... 45
3 LEI DE DROGAS E O JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL ...................................... 53
3.1 APLICAÇÃO DA NOVA LEI DE DROGAS DO BRASIL ...................................... 53
4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS............................................................... 58
4.1 ABORDAGEM METODOLOGICA ....................................................................... 58
5. ANALISE DA REALIDADE DE PAULO AFONSO ACERCA DA EFICÁCIA DAS
MEDIDAS PUNITIVAS .............................................................................................. 62
5.1 PROCESSO JUDICIAL DIGITAL - PROJUDI ..................................................... 62
5.2 PERFIL DA 1ª VARA ESPECIAL DA COMARCA DE PAULO AFONSO/BA ...... 63
5.3 ANÁLISE DOS DADOS ....................................................................................... 64
CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 75
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 78
APÊNDICE ................................................................................................................ 82
ANEXOS ................................................................................................................... 83
12
INTRODUÇÃO
Ao longo da trilha do tempo, no resgate do contexto histórico quanto à gênese da
droga, iremos ver que as substâncias psicoativas sempre fizeram parte da história,
os motivos para consumi-las envolve uma série de circunstâncias individual e/ou
social. O desejo da mudança do estado de consciência, desde os primórdios dos
tempos, surge com o primeiro objetivo se aproximar das divindades, em seguida
abre-se um leque de outras finalidades, as substâncias psicoativas passam a ser
utilizadas no âmbito medicinal, de modo que em grande escala invadem as ruas e
ganham cunho recreativo.
O presente estudo será construído a partir da figura do usuário de drogas, que ao
portar a substância entorpecente, é qualificado no ordenamento jurídico como
portador de drogas para consumido pessoal pela Lei 11.343/06, no artigo 28. E
assim, com a criminalização das condutas nela previstas estabelecem medidas
punitivas de cunho sócio-educativo, como a prestação de serviços à comunidade, a
admoestação verbal ou comparecimento a programa ou curso prevenção ao uso
indevido de substâncias psicoativas. Assim sendo, as punições são pautadas em
mecanismos de reintegração social dos usuários ou dependentes químicos.
Acerca do tema “A criminalização do uso de drogas entorpecentes e a eficácia
ressocializadora da pena: um estudo em Paulo Afonso-ba” é relevante salientar o
conceito de pena que é a sanção imposta pelo Estado, por meio do devido processo
legal, utilizando-se do principio da proporcionalidade na aplicabilidade da sanção, ao
agente do crime praticado. Data Vênia é essencial pontuar sua função que consiste
na retribuição ao delito perpetrado, na prevenção a novos crimes e na
ressocialização social.
Nesse passo, a teoria da pena relativa será trabalhada e explanada quanto à
utilidade da pena com ênfase na ressocialização social que vislumbra reeducar o
agente e reintegrá-lo ao convívio social, e por fim, reafirmar os valores protegidos
pelo Direito Penal, que em ação, objetiva intimidar a sociedade para que o crime
13
seja evitado, cumprindo assim a sua finalidade no que se refere à eficácia de
controle social.
A relevância desse tema reside em demonstrar a configuração das mais novas
sanções destinadas ao usuário de drogas portador, que, propõe penas alternativas
de reinserção e reintegração social calcadas na Justiça Terapêutica.
Contudo, a ausência das penas privativas de liberdade na Lei 11.343/06 provocou
discussões polêmicas no mundo do Direito Penal quando foi promulgada, assim,
será discutido os posicionamentos de vários doutrinadores acerca dos institutos da
descriminalização ou despenalização das condutas incriminadoras do artigo 28, que
se encerrou com o posicionamento do Supremo Tribunal Federal.
Sendo assim, o objetivo geral deste estudo é analisar a eficácia e a aplicabilidade
das punições previstas no artigo 28 da Lei nº 11.343/2006, quanto ao potencial
ressocializador na cidade de Paulo Afonso/Ba.
Para tanto, o texto esta dividido em cinco partes, no capítulo I narra-se a gênese das
drogas, abordando a evolução legislativa, o conceito desta, bem como a definição e
distinção entre usuário e dependente químico, no II abordou-se a Lei 11.343/06 e
aspectos no direito penal, com ênfase no artigo 28, no capítulo III discorre sobre a
aplicabilidade das penas e o rito processual que são submetidas, o capítulo IV traz
as considerações sobre o conceito de metodologia, caracterização e delimitação das
pesquisas utilizadas. Nos capítulos seguintes, finalmente, as relevâncias imperiosas
para a conclusão deste trabalho, que se pode extrair após o confronto dos dados
com as doutrinas pertinentes ao tema.
Ao final são apresentadas as breves considerações no que tange cada capítulo
explanado, com o intuito de evidenciar se os objetivos do estudo foram ou não
alcançados, deixando clara a controvérsia provocada pela atual Lei Antitóxica.
A metodologia empregada foi à investigação por fonte indireta, amparando-se em
pesquisas bibliográficas e documentais, bem como em artigos da Internet e pesquisa
de campo.
14
1 O UNIVERSO DAS DROGAS
1.1 ORIGEM DAS DROGAS NO BRASIL E NO MUNDO
1.1.1 Uso das drogas em rituais sagrados
O uso de drogas parece ser tão antigo quanto à humanidade, acredita-se ser tão
ancestral quanto o surgimento da flora disponível ao ser humano que na sua busca
aventureira por plantas para alimentar-se resultou no encontro acidental de
alimentos que provocavam efeitos psicoativos, ou seja, que causa alguma reação ao
cérebro.
Depois de estabelecida a relação com as drogas, presume-se que por milhares de
anos os seres humanos vêm a utilizando com basicamente três finalidades: utilidade
sagrada, empregada em ritos religiosos ou de passagem; medicinais e recreativas.
Contudo é relevante fazer a citação a seguir, pois irá abranger outras motivações
para o uso abusivo de substâncias psicoativas:
O uso de drogas que alteram o estado mental, aqui chamadas de
substâncias psicoativas (SPA), acontece a milhares de anos e, muito
provavelmente, vai acompanhar toda historia da humanidade. Quer seja por
razões culturais ou religiosas, quer por recreação ou como forma de
enfrentar problemas, para transgredir ou transcender, como meio de
socialização ou para se isolar, o homem sempre se relacionou com as
drogas (DUARTE E MORIHISA, 2013, p.45).
Historiadores afirmam que a maior parte das crenças religiosas, tem na sua origem a
utilização de algum tipo de substância considerada sagrada. Seria uma espécie de
alimento psíquico, pois se usava plantas alucinógenas com o intuito de alimentar o
espírito, e poder conectar-se com um ser supremo.
[...] certas plantas, com efeitos alucinógenos ou visionários, desempenham
importante papel nos rituais de cultos antigos que envolviam estados de
consciência alterada ou transes em países como Grécia, Roma e Índia,
assim como entre feiticeiros da Sibéria, de regiões do norte da Europa e da
America Indígena (MACRAE, 2014, p.32)
Importante se faz ressaltar, a mudança de percepção buscada nas assembleias
gregas, pois ocorria à queima de incenso utilizando substâncias psicotrópicas, a fim
15
de induzir o espírito descontraído para assim discutir política. Entretanto, causar este
efeito psicotrópico no organismo não poderia ser motivo de recreação, caso
ocorresse o indivíduo em questão era penalizado com a morte.
Intoxicar-se era algo importante, que deveria ser feita de forma racional. Drogar-se
não era uma questão de certo ou errado, não se tratava de uma questão moral
quanto ao uso, pois reconhecia nesta época que o prazer era parte central de como
se viver. Entretanto, entendiam que o uso delas indevidamente poderia ser perigoso,
onde uma mesma substância pode ser excepcionalmente boa ou ruim.
Essa sofisticada relação, dos gregos com a droga pode ser visualizada no símbolo
utilizado pela medicina moderna, onde traz duas cobras enroladas no bastão, onde
enfatiza o veneno de cobra, droga mais comum na antiguidade, o qual pode ser letal
ou remédio precioso, ou seja, tem o poder de prejudicar ou curar.
1.1.2 Difusão das drogas do consumo medicinal para o uso recreativo
No que toca o uso medicinal, não poderia deixar de citar a civilização egípcia, que
na antiguidade eram conhecidos como o armarinho de remédios do mundo, pois os
mesmos detinham conhecimento sobre um vasto número de toxinas, e de
substâncias psicoativas e suas complexidades. Conhecimento este registrado no
Papiro Ebers, documento medicinal mais antigo do mundo escrito por volta de 1500
a.C., onde menciona milhares de substancias familiares utilizadas como remédios
paliativos.
No século XVI, durante as expansões marítimas, o ópio é uma das drogas que
cruzaram os altos mares e se espalharam pelo globo, e tem como principal função
aliviar a dor, visto que em 1806 o químico alemão Friedrich Serturner, faz uma
grande descoberta na historia das drogas, ele isolou o principio ativo desta planta
narcótica, descobrindo assim outro principio ativo a morfina, que é a medicação de
maior potencial para a dor, entretanto trouxe junto seu caráter viciante.
16
O ópio, produzido a partir da seiva da papoula, vem sendo usado há mais
cinco mil anos. Originários da Ásia Menor e da Europa, seu uso se espalhou
até a China. Apesar de ser, atualmente, considerado pernicioso, foi
considerada, até o século XIX, uma dádiva divina para aliviar inúmeras
mazelas do ser humano, especialmente a dor (MACRAE, 2014, p.31)
Na década de l880 a 1890, abriu-se caminho para os boticários, que se tratava de
pessoas, donas de formulas sigilosas de preparados que vendiam como remédio
para toda e qualquer enfermidade, eram medicamentos que pertenciam à indústria
do remédio patenteado. A ausência da descrição do conteúdo poderia até ajudar na
cura de alguma enfermidade, mas com certeza, a curto, ou a logo prazo, iria
prejudicar em outro âmbito a saúde.
É nesta época que surge a cocaína como droga de enorme potencial para o
mercado farmacológico, tornando-se a substancia comercial mais utilizada e
presente em todo e qualquer medicação milagrosa. A cocaína chegou sendo
inserida em diversos produtos, como pastilhas, tônica, tranquilizantes para bebes, e
remédio para dormir. Eram empurradas para todos os públicos, porém, o
preocupante era que os químicos tinham pouquíssimo conhecimento sobre os seus
efeitos a longo prazo.
No ano de 1886, a receita patenteada da Coca-Cola, incluía folhas de coca, quando
em 1906 ao observar seus efeitos negativos a cocaína é retirada da receita da Cocacola. Ainda, na mesma época, o vinho Mariani, o mais famoso vinho de coca da
Europa, foi agraciado com o selo Papal de qualidade.
Em 1883, a heroína é descoberta na Inglaterra, e no ano de 1898 o laboratório
farmacêutico Bayer, inicia a produção comercial de heroína utilizando-a como
supressor para tosse. O discurso era calcado na garantia de ser seguro e não
viciante, como a morfina. Porém, assim como a cocaína e a morfina, a heroína
demonstrou ser causadora, em potencial, da dependência fisiológica, pois a
interrupção da ingestão de tal substância ocasionava sensações desagradáveis.
Todo esse contexto histórico ensejou o aparecimento de casos de uso indevido, que
culminaram em dependência química e overdose, vindo a despertar preocupação e
atentar para ações de saúde pública, dando surgimento às clínicas de tratamentos
17
especializadas,
como
também fundamentou
o
surgimento
de
movimentos
proibicistas.
No início, o vício era atribuído à ausência de força de vontade do usuário, mas em
seguida, a responsabilidade foi direcionada ao acesso facilitado as drogas, e
passam a ser observados como algo altamente tóxico, sendo assim restringida.
Destarte, no inicio do século XX as drogas começam a ser vistas como realmente
eram, um problema que deveria ser enfrentado, mas a preocupação estava em
como deveria combatê-la. Então, surgem as primeiras condutas de repressão
regulamentada, ou seja, reagindo as drogas se utilizando da lei.
Como observado no decorrer do texto, o fornecimento irrestrito iniciada no âmbito
farmacológico, onde se estabeleceu o império das drogas que alimentavam as
economias, as quais, ninguém imaginou que tamanha disponibilidade da droga
levaria a verdadeiros problemas sociais.
Segundo Olmo (1990, p.30) na década de 1950 começou-se a escutar a voz dos
especialistas internacionais, através da Organização Mundial de Saúde e da
Organização das Nações Unidas, que emitiam suas primeiras observações e
mediadas de controle em termos farmacológicos, médicos e jurídicos, para qualificar
a droga como problema de saúde pública. Eram as primeiras tentativas de difundir
internacionalmente os modelos éticos jurídicos e médico-sanitário pra enfrentá-la.
O conceito, a percepção humana e o julgamento moral sobre o consumo de
drogas evoluíram constantemente e muitos se basearam na relação
humana com o álcool, por ser ele a droga mais difundida e a antigo. Os
aspectos relacionados à saúde só foram mais estudados e discutidos nos
últimos dois séculos, predominando, antes disso, visões preconceituosas
dos usuários, visto muitas vezes como ‘possuídos por força do mal’,
portadores de graves falhas de caráter ou totalmente desprovido de ‘força
de vontade’ para não sucumbirem ao ‘vício’(DUARTE E MORIHISA, 2013,
p.45).
Diante dos comentários histórico-geográfico, citados no trabalho, que se demonstra
à relação do homem com os mais variados tipos de drogas, em todas as partes do
mundo, desde os primórdios dos tempos. O que se observa, é que a princípio as
drogas costumavam iniciar sua funcionalidade como remédios, mas logo passam a
levantar polemicas no âmbito da sociedade, vindo escapar da esfera da
18
espiritualidade, como também da medicina, e entram no reino das ruas onde é
utilizada indevidamente, descontroladamente, onde as pessoas começam a usá-la
para fins recreativos.
De acordo com Olmo (1990, p.33), a década de mil novecentos e sessenta, “era o
inicio da rebeldia juvenil, da chamada contracultura, da busca mística, dos
movimentos de protestos políticos, das rebeliões dos negros, dos pacifistas, da
Revolução Cubana e dos movimentos guerrilheiros na América Latina, da Aliança ao
Progresso e da guerra do Vietnã”.
Desse modo, as drogas na década 1960 foram responsáveis por mudanças sociais
imensas, onde os jovens estavam preferindo por sexo, droga e rock roll. Nesta
mesma década, nos EUA, o uso de drogas como a cocaína, heroína, ópio, entre
outras, se propaga entre os soldados que participam da Guerra do Vietnã. Ocorre
então, uma espécie de cultura das drogas, que até hoje vivenciamos, que culminou
na busca por cápsulas da felicidade, pílulas para estimular o sexo, para trazer
alegria, para dormir, entre outros.
1.1.3 Breve histórico da legislação brasileira
No Brasil, são nas Ordenações Filipinas, com data de 1603, que se encontram a
primeira legislação brasileira em relação aos tóxicos, que em seu título 89
dispunham: “Que ninguém tenha em casa rosalgar, nem venda, nem outro material”
(FILHO E RASSI, 2007, p.01)
O primeiro Código Penal, no Brasil, que puniu a conduta de realizar a
comercialização ou manipular substâncias nocivas, sem licença e sem as
formalidades previstas nas normatizações sanitárias foi o Código de 1890. Desse
modo relata Almeida (2012, 12), no “Código Penal de 1890 estava previsto o delito
de expor a venda ou ministrar substâncias venenosas sem a legítima autorização e
sem as formalidades previstas”, no que concerne sobre a pena prevista, era apenas
a pecuniária.
19
Na Primeira Convenção de Ópio em Haia, no ano de 1911, o Brasil assume o
compromisso de construir estratégias de fiscalização e controle sobre o consumo da
cocaína e do ópio. Contudo, o uso indevido de drogas continuou crescendo no país,
quando com a finalidade de combater este problema social, foi instaurado o Decreto
de nº 4.294/21, inspirado na Convenção de Haia realizada em 1921. De acordo com
Almeida (2012, 12), “por esta Lei, quem vendesse, expusesse à venda ou
ministrasse tais substâncias, sem os trâmites legais, estaria sujeito à pena de prisão
de um a quatro anos”. Posteriormente, no ano de 1930 a maconha foi proibida e em
1933 foram realizadas às primeiras prisões por uso de droga no Rio de Janeiro.
Quanto ao texto do Decreto-Lei n. 891, de 1938, Filho e Rassi (2007, p.3) colocam a
seguinte consideração, que teve como inspiração a Convenção de Genebra de 1936
cujo traz a relação das substâncias consideradas entorpecentes, normas restritivas
de sua produção, tráfico e consumo, bem como trata da internação e interdição civil
dos toxicômanos.
Entrementes, diante dos frustrados resultados de repressão as drogas, em 1932,
pelo Decreto n.º 22.213, foi instituída a Consolidação das Leis Penais cujo art. 159
punia ações parecidas com as do art. 281 do Código Penal de 1940.
No que concerne ao Código Penal de 1940, este traz previsto um capítulo que versa
sobre “Crimes contra a saúde pública” e dentro deste esta o instituto "Comércio
clandestino ou facilitação de uso de entorpecente". No art. 281 são tipificadas as
condutas, assim, disciplinada a seguinte matéria em seu caput:
[...] importar ou exportar, vender ou expor à venda, fornecer ainda que a
título gratuito, transportar, trazer consigo, ter em depósito, guardar, ministrar
ou, de qualquer maneira, entregar ao consumo substância entorpecente, se
autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar
(ALMEIDA, 2012, p.13)
Dentro desse contexto, é necessário resaltar a Lei nº 5.726 que foi promulgada em
29 de outubro de 1971, a qual começou a refletir sobre a prevenção de drogas.
Filho e Rassi traz a seguinte contribuição dobre à lei em comento:
[...] dispôs sobre medidas preventivas e repressivas ao tráfico e uso de
substâncias entorpecentes ou que determinem dependência física ou
psíquica, deu nova redação ao art. 281 do Código Penal e alterou o rito
20
processual para o julgamento dos delitos previstos nesse artigo,
representando a iniciativa mais completa e válida na repressão aos tóxicos
no âmbito mundial. (FILHO E RASSI, 2007, p.03)
A lista de entorpecentes trazida pelo Decreto-lei 891, de 1938, foi completada e
adotada pelo SNFMF, Serviço Nacional de Fiscalização da Medicina e Farmácia, o
qual baixou instrumentos relativos à fiscalização e ao controle das substâncias que
determinam dependência física ou psíquica (FILHO E RASSI, 2007, p.4).
Promulgada em 21 de outubro de 1976, a Lei nº 6.368 surge para substituir a Lei nº
5.726/71. Uma das inovações da referida Lei consiste na conduta prevista no artigo
16, o qual invoca a figura do porte de entorpecentes para uso pessoal, cujo crime
tem por punição a detenção de seis meses a dois anos e multa. Este tipo penal se
diferencia do tráfico, visto que será alvo de uma pena mais severa, a de reclusão de
três a quinze anos.
As condutas criminalizadoras definidas na Lei nº 6.368/76 são praticamente
as mesmas das figuras tipificadas nos estatutos precedentes. A mudança,
porém, está no que concerne à graduação das penas com uma
concretização moralizadora de estereótipos consumidor-doente e traficantecriminoso. Também apareceu a figura do narcotraficante, surgida pelo
efeito globalizante do controle penal sobre drogas ilícitas. Apesar do grande
esforço repressivo da política externa, os índices de consumo e tráfico
domésticos não foram observados (ALMEIDA, 2012, p.15).
A Convenção contra o Tráfico Ilícito e Estupefacientes é realizada no ano de 1988, e
neste mesmo ano, foi promulgada a Constituição Federal da República do Brasil,
que previu como crime inafiançável o tráfico ilícito de entorpecentes, no artigo 5°,
inciso XLIII:
Art. 5º. [...]XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de
graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e
drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles
respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se
omitirem.
A Lei nº 10.409, promulgada em 11 de janeiro de 2002, pretendeu, na modalidade
de projeto, revogar por completo a Lei nº 6368/76. Devido à péssima qualidade no
seu aspecto mais importante, no que se refere à definição de crimes, o Poder
Executivo foi obrigado a vetar o Capítulo III, “Dos crimes e das penas” e também o
artigo 59 do projeto, que disporia sobre a revogação da lei precedente. Isso permitiu
21
concluir que esse diploma continuou em vigor, em parte (FILHO E RASSI, 2007,
p.06).
Assim, ambas estavam em vigor, uma complementando a outra. Podemos dizer que
nesse período, aplicava-se a Lei nº 6.368/76 quando se referia aos crimes e a Lei nº
10.409/02 no que se tratava dos procedimentos, o que suscitou polêmicas.
Diante da péssima situação legislativa no que se refere às drogas, Vicente Greco
Filho defendeu que o melhor seria a elaboração de outra lei inteira, revogando-se a
Lei n. 6.368 e a Lei n. 10.409, o que acabou acontecendo com a promulgação da
Nova Lei de Droga (FILHO E RASSI, 2007, p.07), a 11.343/06 que será estudada
mais adiante.
1.2 CONCEITOS DE DROGAS
De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), “droga” é qualquer
substância não produzida pelo organismo que tem a propriedade de atuar sobre um
ou mais de seus sistemas, causando alterações em seu funcionamento (apud
NICASTRI, 2013, p.19). É um conceito abrangente, pois inclui todo tipo de
substância seja de efeito maléfico e/ou benéfico, a exemplo podemos citar os
medicamentos que possuem substâncias que provocam melhoras a saúde, mas em
outros momentos podem ser prejudiciais devido às toxinas. É nesta celeuma que
Olmo comenta:
Na linguagem cientifica, representada pela Organização Mundial de Saúde,
a palavra droga significa toda substância que, introduzida em um organismo
vivo, pode modificar uma ou mais funções deste. É um conceito
intencionalmente amplo, pois abraça não apenas os medicamentos
destinados, sobretudo, ao tratamento de um enfermo, mas também outras
substâncias ativas do ponto de vista farmacológico. (OLMO, 1990, p.21)
E Olmo, segue discorrendo sobre essa generalização excessiva dada a terminologia
droga e enfatiza os males advindos de tal problemática,
Trata-se, pois, de uma palavra sem definição, imprecisa e de uma excessiva
generalização, porque em sua caracterização não se conseguiu diferenciar
os fatos das opiniões nem dos sentimentos. Criam-se diversos discursos
22
contraditórios que contribuem para distorcer e ocultar a realidade social da
‘droga’, mas que se apresentam como modelos explicativos universais[...]
A palavra droga não pode ser definida corretamente porque é utilizada de
maneira genérica para incluir toda uma série de substâncias muito distintas
entre si, inclusive em sua “capacidade de alterar as condições psíquicas
e/ou físicas”, que têm em comum exclusivamente o fato de haverem sido
proibidas. Por outro lado, a confusão aumenta quando se compara uma
série de substâncias permitidas, com igual capacidade de alterar essas
condições psíquicas e/ou físicas, mas que não se incluem na definição de
droga por razões alheias à sua capacidade de alterar essas condições,
como por exemplo o caso do álcool (OLMO, 1990, p. 22).
Atualmente, as drogas provocam polêmica, sendo apontadas como causa dos vários
males sociais, seja por ser motivo para a realização da pratica de crimes
gravíssimos, até a responsável por patrocinar o crime organizado. O que se percebe,
é que o tema de discussões se arrasta por séculos, é um assunto que interessa a
todo mundo, mas, ainda não se chegou a um consenso de como lidar com esta
problemática na sociedade, devido a sua complexidade, portanto, sendo causa de
grandes inquietações. É na construção de um consenso que se convida a refletir
sobre os diferentes discursos, que perpassa em torno da droga trazido por Olmo:
O importante, portanto, não parece ser nem a substância nem sua definição,
e muito menos sua capacidade ou não de alterar de algum modo o ser
humano, mas muito mais o discurso que se constrói em torno dela. Daí o
fato de se falar da droga, e não das drogas. E continua: Ao agrupá-las em
uma única categoria, pode-se confundir e separar em proibidas ou
permitidas quando conveniente. Isto permite também incluir no mesmo
discurso não apenas as características das substâncias, mas também as do
ator – consumidor ou traficante, indivíduo que se converterá, no discurso, na
expressão concreta e tangível do terror. Algumas vezes será vítima e
outras, o algoz. Tudo depende de quem fale. Para o médico, será “o
doente”, ao qual deve-se ministrar em tratamento para reabilitá-lo; o juiz
verá nele o “o perverso” que se deve castigar como dejeto. Mas sempre
será útil para a manifestação do discurso que se permita a estabelecer a
polaridade entre o bem e o mal – entre Caim e Abel – que o sistema social
necessita para criar consenso em torno dos valores e normas que são
funcionais para a sua conservação. Por sua vez, desenvolvem-se novas
formas de controle social, que ocultam outros problemas muito mais
profundos e preocupantes. (OLMO, 1990, p. 22/23)
No entanto, Vicente Greco Filho, traz o conceito legal de drogas se respaldando no
artigo 1º da lei em comento, que dispõe em seu parágrafo único que para seus fins,
entenda-se inclusive, os criminais, considera-se como drogas as substâncias ou os
produtos capazes de causar dependência, assim, especificados em lei ou
relacionados em lista atualizada, periodicamente, pelo Poder Executivo da União. E
continua garantindo que o conceito legal está de acordo com aquele apresentado
pela doutrina. Por fim, busca respaldo citando Francis Cabellero, que estabelece a
qualificação jurídica de droga segundo a doutrina; é toda substância natural ou
23
sintética suscetível de criar: a) um efeito sobre o sistema nervoso; b) uma
dependência psíquica ou física; c) um dano à saúde pública social. (apud FILHO E
RASSI, 2007, p.12).
Diante da sistemática do artigo 1º, parágrafo único da Lei 11.343/06 trata-se de uma
norma penal em branco, que segundo Bitencourt (2012, p.97) “são as leis penais de
conteúdo incompleto, vago, lacunoso, que necessitam ser completadas por outras
normas jurídicas, geralmente de natureza extra penal”. Deste modo, o órgão
governamental regulador é a ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária),
pois se trata do aparelho governamental regulador, que submetida ao Ministério da
Saúde é o responsável pela publicação da relação das drogas que causem
dependência, como também, pelo controle.
Assim, as drogas quando analisadas em razão do critério da legalidade, podem ser
classificadas em drogas lícitas, que são as permitidas à comercialização, podendo
ou não ser submetida a alguma limitação legal, a exemplo do álcool, com venda
proibida para menores de 18 (dezoito) anos. E as ilícitas, que são as proibidas por
lei. Na oportunidade, é precípuo apresentar, a crítica realizada por Olmo quanto ao
critério de elegibilidade no que tange a criminalização de algumas drogas:
[...] a ilicitude ou licitude de uma substância está condicionada à
conveniência de quem detém o poder e os meios de criminalizá-la.
Determinam, por meio das leis, o que é bom e o que é ruim para todos,
suprimindo, assim, a liberdade de cada indivíduo fazer de sua saúde o que
melhor lhe aprouver. Por esta razão, a criminalização depende dos
interesses que estão em jogo, em outras palavras, a proibição ou permissão
do uso de uma droga está condicionada por fatores, principalmente,
econômicos e políticos. (OLMO, 1990, p. 22/23)
O rol de substâncias prescritas, de uso proibido, esta na portaria da ANVISA
SVS/MS nº 334 de 12 de maio de 1998, a qual é atualizada quando há mudança no
elenco, em concordância com o art. 66 da Lei 11.343/2006, ou seja, a portaria
especificada ganhou força de Lei.
Por fim, Gonçalves (2011, p.41), esclarece que as portarias e decretos que
completam o tipo penal não precisam fazer menção ao nome comercial ou popular
(maconha, lança-perfume), bastando que contenham o nome do princípio ativo, que
24
é o componente tóxico que causa a dependência (tetra-hidrocanabinol, cloreto de
etila).
1.3 CONCEITO DE DEPENDÊNCIA QUIMICA
O Conceito de dependência química surge com o modelo-sanitário da década de
sessenta, pois é neste período que as drogas são consideradas sinônimo de
dependência. Relata Olmo (1990, p. 33), que “desde 1961 as Nações Unidas
apresentam sua Convenção Única sobre Estupefacientes na cidade de Nova Iorque,
e em 1962 a Corte Suprema da Justiça dos Estados Unidos que o consumo não era
delinquente, mas doente”.
Assim, ocorre o reconhecimento pelo modelo médico-sanitarista do consumidor de
drogas, como dependente químico, ou seja, os usuários não seriam mais
visualizados somente como criminosos, mas, também, como pessoa doente, visto
que, diante do crescente número do uso indevido de drogas, pelas classes médias e
altas, e sendo esta conduta apontada como responsável pela elevação da violência,
agressividade e criminalidade, desperta para a necessidade de tornar o jovem
branco inimputável. É neste liame que narra Olmo,
O problema da droga se apresenta como “uma luta entre o bem e o mal”,
continuando com o estereótipo moral, com o qual a droga adquire perfis de
“demônio”; mas sua tipologia se tornaria mais difusa e aterradora, citandose o pânico devido aos “vampiros” que estavam atacando tantos “filhos de
boa família“. Os culpados tinham de estar fora do consenso e ser
considerados “corruptores, daí o fato do discurso jurídico enfatizar na época
o estereótipo criminoso, para determinar responsabilidades; sobretudo o
escalão terminal, o pequeno distribuidor, seria visto como o incitador ao
consumo, o chamado Pushe ou revendedor de rua. Este indivíduo
geralmente provinha dos guetos, razão pela qual era fácil qualificá-lo de
“deliquente”. O consumidor, em troca, como era de condição social distinta,
seria qualificado de doente graças à difusão do estereótipo de dependência,
de acordo com o discurso médico que apresentava o já bem consolidado
modelo médico-sanitário. (OLMO, 1990, 34)
É neste contexto, que Olmo afirma ser estabelecida uma distinção nítida, entre o
jovem negro favelado que vende a droga (criminoso) e o jovem branco e bem
situado que adquire; para o primeiro, cadeia, para o segundo, tratamento (OLMO,
1990, p. 10). Mesmo pautado em concepção marginalizada e preconceituosa, foram
os primeiros passos para construção do conceito de Dependência Química.
25
Atualmente, as propostas da Organização Mundial de Saúde (OMS) e as políticas
públicas brasileiras, se unem no que concerne na abordarem do dependente
químico, que, como já vimos, são pessoas caracterizadas como doentes e não mais
como delinquentes. Assim sendo, passam a serem consideradas pessoas
vulneráveis em todos os aspectos, e que precisam de apoio, monitoramento,
aconselhamento e direcionamento.
Partindo do pressuposto, que nem todo usuário de droga é dependente, Silveira e
Silveira realiza a distinção, pautada na frequência do uso e na proporção dos
resultados danosos, assim, diferencia o uso experimental, do uso ocasional e a
dependência:
De maneira geral, as pessoas que experimentam drogas o fazem por
curiosidade e as utilizam apenas uma vez ou outra (uso experimental).
Muitas passam a usá-las de vez em quando, de maneira esporádica (uso
ocasional), sem maiores consequências na maioria das vezes. Apenas um
grupo menor passa a usar drogas de forma intensa, em geral quase todos
os dias, com consequências danosas (dependência). O grande problema é
que não dá para saber, entre as pessoas que começam a usar drogas,
quais se tornaram dependentes (2014, p.97).
O dependente diferencia-se dos demais, pelo descontrole do uso indevido de
drogas, motivado pela impulsividade, de maneira repetitiva. Silveira e Silveira (2014,
p. 97), conceitua dependência como “impulso que leva a pessoa a usar uma droga
de forma continua (sempre) ou periódica para obter prazer”. No que tange o uso
habitual, continua o autor, trata-se “do uso frequente da substância, porém, sem que
haja ruptura afetiva, social ou profissional, nem perda de controle quanto ao
consumo” (2014, p.101).
Com fundamentação na OMS, o conceito de Dependência é estabelecido como uma
doença primária, crônica, progressiva e de determinação fatal, que atinge o individuo
em diversos níveis no âmbito físico, mental, emocional e espiritual. Assim, trata-se
de um estado psíquico e físico, que sempre incluem uma compulsão de modo
contínuo ou periódico, podendo causar várias doenças crônicas físico-psíquicas,
com sérios distúrbios de comportamento. Diante do exposto, decorre mais de uma
pane na química cerebral, do que um colapso do caráter. A Classificação
26
Internacional de Doenças – CID-10 a define como transtornos mentais e de
comportamento
decorrentes
do
uso
de
substâncias
psicoativas
(DEPENDENCIAQUIMICAMT, 2014, p.01)
O doutrinador Capez, aponta duas modalidades de dependência química, a física e
a psíquica e as retrata da seguinte forma:
Dependência física é uma relação de natureza fisiológica que se estabelece
entre o indivíduo e a droga, pela qual o primeiro, devido ao uso inicial da
substância, acaba por desenvolver uma patológica necessidade de
continuar a consumi-la, dependendo do psicotrópico tal ponto que a brusca
interrupção do seu consumo provoca distúrbio fisiológico capazes de
provocar intenso sofrimento físico, com possibilidade de levar o usuário ao
coma e à morte.
Dependência psíquica é a vontade incontrolável de usar a droga
independente de existir alguma dependência física. É compulsão invisível,
um desejo mais forte que o autocontrole ditado pela razão (CAPEZ, 2004,
p.138).
Em consonância, Gonçalves contribui também com os conceitos das respectivas
modalidades de dependência, no âmbito dos entorpecentes (expressão a ser
conceituada mais a frente) e considera:
Para que uma substância seja incluída como entorpecente basta que
provoque dependência física ou psíquica. Dependência física é um estado
fisiológico alterado com uma adaptação do organismo à presença
continuada da droga, de tal forma que sua retirada desencadeia distúrbios
fisiológicos, com sentido geralmente oposto ao dos efeitos farmacológicos
da droga. É a chamada síndrome de abstinência, que se verifica quando
ocorrem alterações orgânicas geradas pela supressão mais ou menos
súbita do uso da droga e que se caracteriza pelo aparecimento de sinais e
sintomas algumas horas após o término dos efeitos da última dose.
Conforme já mencionado, tem sempre forma de sofrimento com sensações,
em geral, opostas àquelas conferidas pela droga. Dependência psíquica,
por sua vez, é manifestada por alguns indivíduos pela “ânsia” ou desejo
intenso de usar a droga, cujo uso periódico tem por objetivo a obtenção de
prazer, alívio de tensão ou evitar um desconforto emocional. A maconha
costuma ser usada como exemplo de substância que, apesar de causar
apenas dependência psíquica, é considerada entorpecente (GONÇALVES,
2011, p.42)
Com base na dependência química, Nicastri (2013, p. 22) conceitua tolerância
afirmando que se trata de uma necessidade de quantidade progressivamente
maiores das substâncias para produzir o mesmo resultado desejado ou intoxicação,
e quanto à síndrome de abstinência são sintomas desagradáveis que ocorrem com a
redução ou com a interrupção do consumo da substância.
27
Diante do exposto, concluiu-se que, os males causados pela síndrome de
abstinência, provoca o desconforto, e assim induz o dependente, “fissurado”,
retomar ao consumo da substância que foi cessada por ora, o seu uso. Então, a
busca incessante pela droga passa a ser impositiva e desesperadora. O depende
químico, ao ter ciência da compulsão é capaz de realizar qualquer conduta, mesmo
que ilegal, para obter a substância psicoativa. Em razão disso, a tolerância é
aumentada progressivamente, ou seja, há necessidade de doses cada vez maiores,
para alcançar o mesmo resultado de sensações da dose inicial.
28
2. USUÁRIO E PORTADOR DE DROGAS SEGUNDO A LEI 11343/06
Promulgada em 23 de agosto de 2006, a Lei 11.343, trata-se da nova Lei Antidrogas
que revoga, expressamente, a Lei de nº 6.368/76 e a Lei de nº 10.409/02. Essa lei
adota medidas de prevenção para o uso de drogas, instaura ações de reinserção de
usuários e dependentes químicos, estabelece sanções de repressão para a
produção de substâncias proibidas, e mecanismos de controle e regulamentos para
as autorizadas, acentua a punição para tráfico ilícito, estabelecendo o aumento da
pena mínima para este crime, como também versa determinando os respectivos
ilícitos penais.
A primazia da lei é a prevenção do uso indevido de drogas, para tanto, instaura o
SISNAD (Sistema Nacional de Políticas sobre Drogas) que consiste em construir
Políticas Públicas Sobre Drogas, que tem como objetivo integrar os órgãos e entes
da Administração Pública Federal, Estadual e Municipal para prevenção do uso
indevido, atenção e reinserção social e de dependentes de drogas, e a repressão da
produção não autorizada e do tráfico ilícito (artigo 3º). Seus princípios e objetivos
estão previstos nos artigos 4º e 5º, respectivamente, da presente lei. (FILHO E
RASSI, 2007, p.10).
Dessa forma, pensando na qualidade de vida do indivíduo, a nova lei de drogas traz
de forma salutar as atividades de prevenção, e reconhece o uso indevido de drogas
como fator de interferência negativa na preservação da saúde, e nas relações
sociais. Para superar a problemática, a lei estabelece parcerias entre o setor público
e as instituições privadas, para cooperação mutua e divisão de responsabilidades,
bem como, no que diz respeito aos investimentos em ações de inclusão social, e de
atividades de promoção de qualidade de vida.
No âmbito criminal Gonçalves (2011, p.13), afirma que as principais inovações foram
o tratamento diferenciado em relação ao usuário, a tipificação de crime específico
para a cessão de pequena quantia de droga para consumo conjunto, o agravamento
da pena do tráfico, a tipificação do crime de financiamento ao tráfico, bem como a
regulamentação de novo rito processual.
29
Merece destaque ainda, a contribuição trazida por Luiz Flávio Gomes no que se
refere à Nova Lei de Drogas, pois coloca que surge pautada no seguinte anseio:
Pretensão de se introduzir no Brasil uma sólida política de prevenção ao uso
de drogas, de assistência e de reinserção social do usuário; eliminação da
pena de prisão ao usuário (ou seja: em relação a quem tem posse de droga
para consumo pessoal); rigor punitivo contra o traficante e financiador do
tráfico, clara distinção entre o traficante “profissional” e o ocasional; louvável
clareza na configuração do rito procedimental; inequívoco intuito de que
sejam apreendidos, arrecadados e, quando o caso, leiloados os bens e
vantagens obtidos com os delitos de drogas (GOMES, 2007, p.07)
A Lei 11.343/06 inova ainda na terminologia, pois o legislador busca dar uma
nomeclatura mais abrangente, então sobrevém o termo “Droga”, ou seja, não mais
utiliza-se o vocábulo entorpencente, pois este passa a ser visto e considerado como
uma espécie do gênero da droga. Assim, esclarece Guimarães (2008, p.15/16):
Abandandonou-se a expressão “substância entorpecente ou que determine
dependência fisica ou psíquica” da revogada lei 6368/76 e deixou-se de
confirmar a que constava no projeto de Lei 7.134/02 (“substância ou produto
capas de causar dependência física ou psiquica”). Utiliza-se o termo droga
que tem uma acepção abrangente, que ultrapassa a de entorpecente, ou de
estupefaciente, ou de alucinógenos. Droga será qualquer substância
manipulada pelo homem, nele intoduzida, aplicada ou ingerida, cujos os
princípios químicos possam causar alterações, podendo inclusive, afeta-lhe
a saúde. (GUIMARÃES, 2008, p.15/16)
Em sentido estrito, o conceito de entorpecentes, segundo Di Mattei, são venenos
que agem eletivamente sobre o córtex cerebral, suscetíveis de promover agradável
ebriedade,
de
serem
ingeridos
em
doses
crescentes
sem
determinar
envenenamento agudo ou morte, mas capazes de gerar estado de necessidade
tóxica, graves e perigosos distúrbios de abstinência, alterações somáticas e
psíquicas profundas e progressivas. (apud FILHO E RASSI, 2007, p.11).
Estabeleceu-se ainda, a definição de toxicomania que segundo a OMS, é um estado
de intoxicação periódica ou crônica, nocivo ao indivíduo e à sociedade, pelo
consumo repetido de uma droga natural ou sintética (apud FILHO E RASSI, 2007,
p.10)
Consoante ao exposto é relevante apresentar a organização do referido diploma
legal pelo legislador, assim Filho e Rassi, apresenta a divisão da seguinte forma:
30
nos Títulos I (Disposições Preliminares) e II (Do sistema nacional de
políticas sobre drogas), previu normas buscando organizar o SISNAD
(Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas), sendo certo que o
Título II foi dividido em seis capítulos: no Título III (Das atividades de
prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e
dependentes de drogas), tratou dos princípios e diretrizes que devem guiar
as atividades de prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social
dependentes de drogas. Referido títulos foi dividido em três capítulos, sendo
o Capítulo III (Dos crimes e das penas) reservado para incriminar tão
somente a conduta de quem adquire, guarda, tem em depósito, transporta
ou traz consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em
desacordo com determinação legal ou regulamentar, deixando clara a
separação de tratamento entre o usuário ou dependente e o traficante; no
Título IV (Da repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de
drogas), cuidou das medidas de repressão à produção não autorizada e ao
trafico ilícito de drogas, cujo Capítulo II tratou dos crimes, e o Capítulo III,
dividido em seções, do procedimento penal; os Títulos V e VI foram
reservados, respectivamente, para tratar d cooperação internacional e das
disposições finais e transitórias (FILHO E RASSI, 2007, p.07/08).
Observou-se, muitos aspectos inovadores introduzidos pela Lei nº 11.343/06,
entretanto, somente será destacado e analisado com profundidade, o artigo 28, visto
que, o referido dispositivo legal revoga o antigo artigo 16 da Lei n° 6.368/76, que
estipulava ao crime de porte de substância entorpecente, para uso próprio a pena de
encarceramento. Com a nova lei, passou a incidir sanções de cunho sócio educativo,
como a prestação de serviços à comunidade, a admoestação verbal ou
comparecimento a programa ou curso. E nessa égide, Filho e Rassi, quanto à
conduta incriminadora em destaque:
Retirou o crime de trazer consigo para uso pessoal das proximidades
topológicas do crime de trafico, colocando-o no título relativo prevenção do
uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de
drogas, a fim de abrandar o estigma da pena criminal, mas mandou bem em
não descriminalizar a conduta a fim de não enfraquecera repressão,
permitindo sua atuação para a cessação da atividade criminosa.[...] Houve
substituição da expressão “para uso próprio” por “para consumo pessoal”. A
alteração é relevante porque amplia a possibilidade do enquadramento no
tipo mais benéfico das condutas quando para consumo próprio ou de
outrem em caráter pessoal, ou seja, sem o animus da disseminação (FILHO
e RASSI, 2007, p.44).
Assim sendo, modificações basilares no tocante a disciplina jurídica das condutas,
associadas ao consumo indevido, pois, vislumbram uma redução do comportamento
reprimido através de políticas de prevenção. Quanto ao Direito Penal, que passa a
ser cauteloso no que diz respeito a sua intervenção, buscando viés na Justiça
Terapêutica. Nesse aspecto, Guimarães faz a seguinte narrativa:
A Justiça Terapêutica, que teve seu nascedouro no direito norte americano,
regido pelo commow low que dá mais plasticidade à experiência jurídica,
31
inclusive na construção normativa pela experiência jurídica jurisdicional, é
consubstanciada por uma alternativa à pena, aplicada aos delinquentes
leves envolvidos com drogas. Assim, em vez da pena de segregação, a
decisão judicial determina o tratamento da pessoa usuária ou dependente
de drogas. (2008, p.31/32)
É bem verdade, que dependendo do tratamento destinado ao usuário de drogas ou
dependente, no âmbito penal, e que, ao serem tratados como legítimos criminosos,
poderão ser alvos de estigmas negativos permanentes. Como reflexo disso, é
repensado e demonstrado através da mudança da punibilidade, o qual o legislador
não prever mais a pena privativa de liberdade, passando a optar por penas mais
brandas, pautadas na reinserção social. E assim finaliza Guimarães (2008, p. 32), “a
Justiça Terapêutica pode ser caracterizada não apenas pelo tratamento médicohospitalar ou ambulatorial, mas também através de qualquer outro meio, como os
programas de reeducação, cursos ou atendimento psicológico”.
2.1 CONDUTAS INCRIMINADORAS À LUZ DO ART. 28 DA LEI 11.343/06
Antes de iniciar a reflexão faz-se necessário transcrever o caput do art. 28 do
respectivo diploma legal, in verbis:
Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer
consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo
com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes
penas [...]
Como é possível observar, são cinco as condutas típicas qualificadas em: a) adquirir,
que consiste em obter a propriedade, a título oneroso ou gratuito, o exemplo mais
comum é a compra; b) trazer consigo é sinônimo de portar, conduzir pessoalmente a
droga; c) guardar e ter em depósito é manter a droga em algum local; e por fim, d)
transportar que significa conduzir de um local para outro em algum meio de
transporte. (GONÇALVES, 2011, p.32). O autor continua afirmando que o tipo penal
é misto alternativo, bastando para a configuração do crime que o agente pratique
uma das condutas previstas no artigo (2011, p.105).
As figuras típicas “guardar”, “tiver em depósito”, “trazer consigo” e “transportar” são
crimes de mera conduta. De acordo com Gonçalves (2011, p.35), não comportam a
tentativa, uma vez que, trata-se de delito unissubsistente, ou seja, realizado por
32
ação única, não comportando o fracionamento da conduta. Constituem-se como
crimes permanentes e consumam-se no momento em que o agente tem a posse da
droga, protraindo-se no tempo enquanto ele a mantiver, nessa modalidade
permanente a tentativa é inadmissível.
No que tange a modalidade “adquirir”, de acordo com Gonçalves (2011, p.35) é
considerada instantânea e consuma-se quando há o acordo de vontades entre o
vendedor e o comprador. Existem várias interpretações, para alguns teóricos, se a
pessoa procura o traficante para comprar a droga e é preso nesse momento, antes
de recebê-la, responde por tentativa, para outros, o fato é atípico, pois seria
pressuposto do delito o recebimento da droga.
Silva (2008, p.29) retrata a figura do tipo “adquirir”, afirmando que a consumação se
dá pela vontade do agente e a intenção que são antecedentes do resultado,
independente do seu perfil em cada caso concreto, e a tentativa é possível quando
não houver outras ações típicas antes da aquisição.
Quanto ao sujeito que pode praticar o ilícito penal pode ser qualquer pessoa, pois
trata-se de crime comum:
O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, portanto, trata-se de crime
comum. Abrange o usuário eventual e o viciado. A co-autoria é possível
quando ocorre, por exemplo, que duas pessoas comprem determinada
quantia de droga para uso conjunto. (GONÇALVES, 2011, p.34).
Nesse liame, Nobrega (2013, 65/66) afirma que é preciso mencionar que as
condutas analisadas só são punidas na forma dolosa, sendo atípica a sua realização
do tipo culpa. E elucida explicando que o agente deve ter consciência, de que portar
substância entorpecente ou psicotrópica ilícita (elemento cognitivo do dolo) e querer
fazê-lo (elemento volitivo), e acrescenta afirmando, que, o crime somente se
configura se presente o fim especial de agir (dolo específico) consubstanciado na
expressão “para consumo próprio”.
Convêm ressaltarmos, as motivações jurídicas que enseja a punição para tais
condutas incriminadoras. De acordo com Filho e Rassi, são as seguintes,
33
A razão jurídica da punição daquele que adquire, guarda, tem em depósito,
transporta ou traz consigo para uso próprio é o perigo social que sua
conduta representa. Mesmo o viciado, quando traz consigo a droga, antes
de consumi-la, coloca a saúde pública em perigo, porque é fator decisivo na
difusão dos tóxicos. O toxicômano normalmente acaba traficando, a fim de
obter dinheiro para aquisição de droga, além de psicologicamente estar
predisposto a levar outros ao vício para que compartilhem ou de seu paraíso
artificial ou do seu inferno. (FILHO E RASSI, 2007, p.45).
No conteúdo, em comento, vale ressaltar a conduta de trazer consigo que irá
oferecer perigo à saúde pública, enquanto estiver em poder da pessoa, mas que
desaparece com o consumo, consequentemente, esvanece a situação de flagrância.
É o que defende Almeida (2012, p.21), em seu trabalho cientifico,
O fato de apenas consumir droga poderia ser considerado atípico, pois não
faz parte do núcleo do tipo. A ação de usar, por si só, não seria passível de
punição. Somente quem estiver de posse da droga poderá ser apenado. Se
não houver apreensão e caracterização da droga como ilícita, será
impossível provar a idoneidade tóxica, ficando prejudicada a comprovação
da materialidade do evento.
No tocante, merece destaque o comportamento de “autolesão” produzida pelo uso
de drogas, que nos remete ao principio da alteridade, pois o usuário ao receber a
droga, vindo a realizar o consumo imediato, perde com isso a materialidade de ser
considerado crime, ou seja, será fato atípico. Assim, não poderá ocorrer a
intervenção repressiva do Estado, pois a ação praticada acarreta dano somente à
saúde do próprio usuário, sem provocar prejuízo a terceiros. O princípio da
alteridade ou transcendentalidade é descrito por Capez (2004, p.162) da seguinte
maneira:
Proíbe a incriminação de atitude meramente internado agente e que, por
essa razão, só mal a ele mesmo e mais ninguém. Se quem a conduta
transcenda a figura do autor e se torne capaz de ferir o interesse do outro
(altero) é impossível ao Direito Penal de castigar o comportamento de
alguém que está prejudicando apenas a sua própria saúde e interesse de
terceiros, de forma que séria inconcebível, por exemplo, punir-se um suicida
mal sucedido ou um fanático que se açoita. É por isso que a auto lesão não
é crime, salvo quando houver intenção de prejudicar terceiros, como na
auto-agressão cometida com o fim de fraude ao seguro, em que a instituição
seguradora será vitima de estelionato (171, § 2º, V, do CP).
Concluindo, o bem jurídico tutelado é a incolumidade pública, particularmente a
saúde pública, sendo assim o sujeito passivo do crime em abstrato é a coletividade,
a sociedade. Nesse contexto, provoca Gonçalves quanto ao risco social da conduta
típica,
34
Mais absurdo é o entendimento de alguns no sentido de que a incriminação
ao mero porte de entorpecente para uso próprio seria inconstitucional, por
ser vedado ao Estado interferir na liberdade de as pessoas fazerem o que
quiserem com sua própria saúde.[...] o porte de entorpecente representa um
perigo para toda a coletividade e não apenas para o réu. A pessoa drogada,
além de danos à sua própria saúde, pode ficar violenta, causar vários tipos
de acidentes e, até mesmo, em face da necessidade de sustentar seu vício,
cometer crimes contra o patrimônio ou de outra natureza. Por essas razões,
conclui-se não haver qualquer inconstitucionalidade no dispositivo
(GONÇAVES, 2008, p.34)
Existem ainda, verbos previstos como crime tanto no artigo 28, que faz referência ao
usuário de drogas, portanto sanções mais brandas, como no artigo 33, que qualifica
o tráfico de drogas, com punições mais severas. Aparentemente há um conflito
quanto à literalidade das normas, pois aquele que traz consigo a droga, pode estar
praticando um dos crimes. Assim, estabelece no artigo 28 § 2º, da lei em comento,
os elementos a serem observados e analisados para possível enquadramento. Em
concordância, reflete Gonçalves, quanto ao elemento subjetivo do tipo,
O art. 28 exige que a droga seja exclusivamente para uso do agente
(consumo próprio). O art. 33, caput, também descreve as condutas adquirir,
guardar, ter em depósito, transportar ou trazer consigo, diferenciando-se do
art. 28, porque naquele a intenção do agente é a entrega ao consumo de
outrem (tráfico), enquanto neste, é o consumo pelo próprio agente. De
acordo com o art. 28, § 2º, para determinar se a droga destinava-se a
consumo pessoal ou ao tráfico, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da
substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a
ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos
antecedentes do agente. Se o juiz ainda assim ficar na dúvida a respeito da
intenção, deve condenar o agente pelo crime menos grave, ou seja, pelo
porte — princípio do in dubio pro reo. (GONÇALVES, 2011, 33)
Outra problemática a ser analisada, quanto à classificação da conduta a ser
enquadrada, seja no artigo 28 ou no artigo 33, é a quantidade que é aprendida com
o portador de drogas. Esse aspecto subjetivo, deve despertar o magistrado para que
aprecie todas as circunstâncias do crime e não somente a quantidade da substância
apreendida.
De acordo com Filho e Rassi (2007, p. 47/48), é justamente neste ponto, que
maiores dificuldades têm enfrentado a jurisprudência no que se refere à prova de
exclusividade da destinação para uso pessoal, pois mesmo que o § 2º do artigo se
refira a outras circunstâncias, que deverão ser consideradas para a caracterização
do delito, na pratica, sabemos que todas ficarão reduzidas a quantidade,
especialmente em comarca em que o movimento forense impede exame profundo
35
da causa, e finaliza, fazendo um alerta para o fato de que nem a pequena
quantidade, nem o exame psiquiátrico, são suficientes para a conclusão a respeito
da finalidade que determina a incidência da infração mais leve.
Em razão do exposto, o artigo em comento, delineia crime de perigo em abstrato,
visto que, independente da quantidade que detém quem porta o entorpecente é
punido, pois traz risco à saúde pública. Entretanto, para se configurar crime, é
necessária à constatação da existência do princípio ativo. Filho e Rassi (2007, p.51)
afirmam que cabe consignar, que o Supremo Tribunal Federal repeliu com firmeza
algumas decisões, que descriminalizam a quantidade de menos de um grama de
maconha. O crime é de perigo abstrato, daí a irrelevância da quantidade. Finaliza
afirmando, que, basta que seja encontrado o princípio ativo, no caso da maconha, o
“tetrahidrocanabinol”.
Cabe ainda, realizar algumas considerações, no que se refere ao elemento subjetivo
do tipo configurado no artigo 28, e este, determina que, a droga tenha a finalidade,
exclusiva, do consumo próprio, e que o elemento normativo do tipo se encontrada
incluído na expressão “sem autorização ou em desacordo com determinação legal
ou regulamentar”. Assim, o objeto material é a substância entorpecente, ou que
determine dependência física ou psíquica, elencada legalmente, contudo, o princípio
ativo que compõe a droga apreendida deve ser constatado, posteriormente, em
exame químico-toxicológico.
No que tange a figura equiparada, Gonçalves (2011, p.33) explana que o § 1º, do
artigo em explicação, institui o mesmo tratamento penal a quem, para seu consumo
pessoal, semeia, cultiva ou colhe plantas destinadas à preparação de pequena
quantidade de substância, ou produto capaz de causar dependência física ou
psíquica. O dispositivo é aplicado, em geral, para pessoas que plantam algumas
poucas mudas na sua própria residência, com o fito de consumo pessoal. Note-se,
que, se a intenção do agente for à venda ou entrega a consumo de terceiro, a
conduta será enquadrada no art. 33, § 1º, II, que é equiparada ao tráfico.
Neste liame, Filho e Rassi, destaca problemas de diferenciação entre o artigo 28 e
os artigos. 33 ou 34, e discorre com a seguinte suscitação:
36
Punir alguém com maior brandura aquele que traz consigo para uso próprio
é uma solução justa, mas traz problemas de difícil solução para a prática
judiciária. O primeiro deles é o referente ao concurso da infração do art. 28
com a dos art. 33 ou 34. O traficante pode ser viciado e,
concomitantemente, guardar ou trazer consigo para uso próprio e para a
disseminação do vício; por outro lado, o viciado também pode ser
instrumento de difusão do mal, quando fornece a droga a outrem
comercialmente. Em ambas as hipóteses acima referidas prevalecerá o
delito mais grave [...] Tanto no caso de traficante que traz consigo para uso
próprio como no caso de alguém que, trazendo originalmente para uso
próprio, vem a desviar essa destinação fornecendo-a a outrem, o bem
jurídico atingido é a saúde pública em sua forma substancialmente grave,
não podendo o que dissemina o vício beneficiar-se, arguindo sua condição
de usuário de drogas [...] (FILHO e RASSI, 2007, p.46/47)
Para o verbo do tipo “semear” e “colher”, são inadmissíveis tentativas e se
enquadram em crime de mera conduta, pois só faz referência ao comportamento
típico, sem menção ao resultado. Já “cultivar” trata-se de crime permanente, visto
que, a conduta se prolonga enquanto o agente mantém o lavrado do solo em que a
semente foi disseminada, mas também não comporta tentativa.
2.2 DESCRIMINALIZAÇÃO OU DESPENALIZAÇÃO DO USUÁRIO DE DROGAS
A respectiva lei traz entranhada, como vimos anteriormente, a discussão acerca das
penas impostas pelo legislador no artigo 28, o qual muitos doutrinadores, levantam
inúmeros questionamentos sobre a descriminalização, da conduta de portar droga
para uso pessoal. O principal foco a ser debatido, consiste na ausência do cárcere,
visto que, com a Nova Lei Antidrogas, torna o usuário de drogas imune as penas
privativas de liberdade. É neste liame que discorre Andreucci:
Para a mínima parcela da doutrina pátria, a nova redação descriminaliza o
porte de drogas para consumo próprio, uma vez que não prevê mais pena
privativa de liberdade ao usuário de drogas, trazendo apenas a pena de
advertência e duas penas restritivas de direito. Não houve, entretanto, a
descriminalização da posse de droga para consumo próprio, mas apenas a
diminuição da carga punitiva, pois a nova lei, mesmo tratando mais
brandamente o usuário, manteve a conduta como crime, fixando lhe, dentre
outras medidas, a pena de medida educativa de comparecimento a
programa ou curso educativo, obrigando-o a se tratar, coisas que não
acontecia na legislação anterior, onde, ante a permissitividade da Lei nº.
9.099/95 poderia ele transacionar com o Ministério Público, recebendo
apenas pena de multa ou pena restritiva de direitos. (ANDREUCCI, 2007,
p.29/30)
37
Colabora neste aspecto dialético e evolutivo, CAPEZ, quando afirma não ter ocorrido
à figura do abolitio criminis (descriminalização) para a conduta de porte de drogas
para uso pessoal, especificada no artigo 28 da Nova Lei de Antidrogas, assim
fundamenta sua assertiva no rito processual, que obedece ao devido processo legal:
Entendemos, no entanto, que não houve a descriminalização da conduta. O
fato continua a ter natureza de crime, na medida em que a própria lei o
inseriu no capítulo relativo aos crimes e às penas (Capítulo III), além do que
as sanções só podem ser aplicadas por Juiz Criminal, e não por autoridade
administrativa, e mediante o
devido processo legal (no caso, o
procedimento criminal do Juizado Especial Criminal, conforme expressa
determinação legal do art. 48, §1º, da nova lei). A Lei de Introdução ao
Código Penal está ultrapassada nesse aspecto e não pode ditar os
parâmetros para a tipificação legal do século XXI. (CAPEZ, 2007, p.132)
De acordo com Bitencourt (2012, p.96), a abolitio criminis se configura quando a lei
nova deixa de considerar crime, fato anterior tipificado como ilícito penal. A lei nova
retira a característica de ilicitude penal de uma conduta precedentemente
incriminada, é o que trata o artigo 2º do Código Penal.
Entretanto, a questão não se mostra pacifica quanto ao não surgimento da figura do
abolitio criminis. Destarte, apregoou o maior defensor da descriminalização Luiz
Flavio Gomes o seguinte:
A conduta descrita neste art. 28, antes achava-se contemplada no art. 16 da
Lei nº. 6368/76, que dizia: “Adquirir, guardar ou trazer consigo, para uso
próprio, substância entorpecente ou que determine dependência física ou
psíquica, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou
regulamentar: Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e
pagamento de 20 (vinte) a 50 (cinqüenta) dias-multa”. O fato que acaba ser
descrito era considerado “crime” (em razão da cominação da pena de
detenção). De qualquer maneira, praticamente ninguém era preso por esse
delito, porque a ele incidia a Lei dos Juizados Criminais. No novo texto legal
(art. 28) já não se comina a pena de prisão, o fato deixou de ser criminoso
(em sentido estrito). Houve descriminalização “penal” (abolitio criminis),
porém, sem a concomitante legalização. Se as penas cominadas para a
posse de droga para consumo pessoal são exclusivamente alternativas, não
há que se falar em “crime” ou em “contravenção penal” (por força do art. 1º
da Lei de Introdução ao Código Penal). O art. 28, conseqüentemente,
contempla uma infração sui generis (uma terceira categoria, que não se
confunde nem com o crime nem com a contravenção penal). Constitui
exemplo de direito judicial sancionador. (GOMES, 2006, p.118/119)
Em contraponto, Copobianco advoga no sentido de não ter ocorrido à
descriminalização do uso de drogas, e para reforçar a sua tese utiliza-se, a título de
exemplo, do tratamento que o judiciário destina aos sujeitos, praticantes do crime de
furto privilegiado,
38
O Código penal prevê a possibilidade de três espécies de penas: privativa
de liberdade, restritiva de direito e multa. Dessa forma, ao impor restritiva de
direitos, também há uma sanção penal.
Alias, por exemplo, para o crime de furto privilegiado (art. 155, § 2º, do CP),
o legislador previu a possibilidade do cumprimento de uma pena só de
multa, e ninguém duvida de um furto privilegiado e crime.
Por outro lado, o próprio legislador colocou o art. 28 da lei de Drogas no
Capitulo III intitulado: “Dos Crimes e das Penas”. Portanto, não houve a
descriminalização da conduta e sim uma imposição de uma pena mais leve,
que é a alternativa. (COPOBIANCO, 2011, p.105)
Neste
consenso,
há
um
despertar
para
figura
da
novatio
legis
in
mellius (despenalização) que segundo Bitencourt (2012, p.96) “ocorre quando lei
nova, mesmo sem descriminalizar, dê tratamento mais favorável ao sujeito”. Deste
modo, Cunha, contribui explicando, que, a conduta somente ganhou um
abrandamento na sanção reprimenda, mas não deixou de ser configurada como
conduta penal incriminadora,
A Lei nº. 11.343/06 trouxe despenalização ao crime de possuir drogas para
consumo próprio, o qual já havia passado também por despenalização com
o surgimento das Leis nº. 9.099/95 e 10.259/02, na medida em que o novo
diploma legal vedou a aplicação de qualquer espécie de pena privativa de
liberdade, fixando somente penas restritivas de direitos que podem ser
aplicadas tanto na fase consensual (transação penal) quanto ao final do
procedimento conflitivo (sentença condenatória) (CUNHA, 2007,p.1).
No ápice da discussão, que percorre os dois institutos, o da descriminalização e o da
despenalização, Filho e Rassi, contribui afirmando que não houve a configuração de
tais figuras do Direito Penal, que os argumentos em torno do polêmico conflito por
ambos os institutos, são falhos e insuficientes de fundamentação.
A lei não descriminalizou nem despenalizou a conduta de trazer consigo ou
adquirir para uso pessoal nem a transformou em contravenção. Houve
alteração, abrandamento [...], mas a conduta continua incriminada. A
denominação do Capítulo é expressa. As penas são próprias e específicas,
mas são penas criminais. Não era porque as penas não eram previstas na
Lei de introdução ao Código Penal de 1941, e, portanto não se enquadram
na classificação prevista em seu art. 1º que lei posterior, de igual hierarquia,
não possa criar penas criminais ali não previstas. Desde que apena não
seja infamante, cruel ou perpetua, pode ser criada por lei e ter
compatibilidade constitucional, causando estranheza interpretação que
sustenta que a lei não possa atribuir a conduta criminosa, penas que não
sejam a reclusão, a detenção ou a contravenção, seja por lei ordinária e que
lei mai recente não possa alterar (FILHO E RASSI, 2007, p.43)
Gonçalves (2011, p. 32) reforça a linha de raciocínio quando versa sobre a natureza
jurídica, pois a Lei ao abordar o tema classificou a conduta como crime, e afirma que
o próprio procedimento estabelecido, junto ao Juizado Especial Criminal, também
leva a essa conclusão. Além disso, ao tratar da prescrição dessa modalidade de
39
infração penal, o artigo 30, determina que se apliquem as regras do artigo 107 do
Código Penal, reforçando, portanto, a condição de crime. Por fim, afirma não ser
possível aceitar a tese de que o fato não é mais considerado ilícito penal,
simplesmente porque não prevê pena privativa de liberdade em abstrato, apenas
com base no artigo 1º da Lei de Introdução ao Código Penal, que considera crime os
fatos ilícitos a que a lei comine pena de reclusão ou detenção. E alega, com efeito, a
finalidade deste dispositivo, era apenas a de diferenciar crimes e contravenções por
ocasião da entrada em vigor concomitante do Código Penal e da Lei das
Contravenções Penais, em 1º de janeiro de 1942.
Contudo, Gomes, apresenta argumentações, coerentes, incisivas e precisas, que
rebate as fundamentações baseadas no procedimento, e na localização das
sanções no corpo do texto do respectivo diploma legal. Assim, conclui:
[...] a nova lei de drogas, no art. 28, descriminalizou formalmente a
conduta da posse de droga para consumo pessoal. Retirou-lhe a
etiqueta de "crime" porque de modo algum permite a pena de prisão.
Conseqüência natural: o usuário já não pode ser chamado de
"criminoso". Ele é autor de um ilícito (porque a posse da droga não foi
legalizada), mas já não pode receber a pecha de "criminoso". A não ser
assim, cai por terra toda a preocupação preventiva e tendencialmente
não punitivista da lei, em relação ao usuário. O fato de a própria lei ter
intitulado o capítulo III, do Título II, como "dos crimes e das penas" não
impede a conclusão acima exposta porque nosso legislador há muito
tempo deixou de ser técnico. Ele também fala em crime de
responsabilidade na Lei 1.079/1950 e aí não existe nenhum crime.
Infração "sui generis": diante de tudo quanto foi exposto, conclui-se que
a posse de droga para consumo pessoal passou a configurar uma
infração “sui generis”. Não se trata de "crime" nem de "contravenção
penal" porque somente foram cominadas penas alternativas,
abandonando-se a pena de prisão. De qualquer maneira, o fato não
perdeu o caráter de ilícito (recorde-se: a posse de droga não foi
legalizada). Constitui um fato ilícito, porém, "sui generis". Não se pode
de outro lado afirmar que se trata de um ilícito administrativo, porque as
sanções cominadas devem ser aplicadas não por uma autoridade
administrativa, sim, por um juiz (juiz dos juizados ou da vara
especializada). Em conclusão: não é "crime" nem é "contravenção" nem
é um ilícito "administrativo": é um ilícito "sui generis" (GOMES, 2006,
p.01).
Dando continuidade, faz-se necessário ressaltar, que a Carta Magna, em seu artigo
5º, inciso XLVI, dispõe sobre as espécies de penas existentes em nosso
ordenamento jurídico, o qual tem a seguinte redação: à lei regulará a
individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: a) privação ou
restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e)
suspensão ou interdição de direitos;
40
Assim sendo, as penas previstas no artigo 28 da lei 11.343/06 estão em perfeita
consonância, com a Constituição Republicana Federativa do Brasil de 1988, pois,
são penas com caráter de prestação social alternativa, restrição de direitos e multa.
A lei 11.343/06, envolta a esta polêmica, quanto à descriminalização ou
despenalização do consumo de drogas, em virtude do abrandamento da pena, para
a conduta de usuário de drogas ilícitas, tem pacificação do posicionamento na
jurisprudência acerca do tema quando em decisão proferida nos autos do Recurso
Extraordinário nº 430.105-9, do Rio de Janeiro, o Supremo Tribunal Federal se
manifesta com a seguinte ementa da decisão:
A Turma, resolvendo questão de ordem no sentido de que o art. 28 da Lei
11.343/2006 (Nova Lei de Tóxicos) não implicou abolitio criminis do delito de
posse de drogas para consumo pessoal, então previsto no art. 16 da Lei
6.368/76, julgou prejudicado recurso extraordinário em que o Ministério
Público do Estado do Rio de Janeiro alegava a incompetência dos juizados
especiais para processar e julgar conduta capitulada no art. 16 da Lei
6.368/76. Considerou-se que a conduta antes descrita neste artigo continua
sendo crime sob a égide da lei nova, tendo ocorrido, isto sim, uma
despenalização, cuja característica marcante seria a exclusão de penas
privativas de liberdade como sanção principal ou substitutiva da infração
penal. Afastou-se, também, o entendimento de parte da doutrina de que o
fato, agora, constituir-se-ia infração penal sui generis, pois esta posição
acarretaria sérias conseqüências, tais como a impossibilidade de a conduta
ser enquadrada como ato infracional, já que não seria crime nem
contravenção penal, e a dificuldade na definição de seu regime jurídico.
Ademais, rejeitou-se o argumento de que o art. 1º do DL 3.914/41 (Lei de
Introdução ao Código Penal e à Lei de Contravenções Penais) seria óbice a
que a novel lei criasse crime sem a imposição de pena de reclusão ou de
detenção, uma vez que esse dispositivo apenas estabelece critério para a
distinção entre crime e contravenção, o que não impediria que lei ordinária
superveniente adotasse outros requisitos gerais de diferenciação ou
escolhesse para determinado delito pena diversa da privação ou restrição
da liberdade. Aduziu-se, ainda, que, embora os termos da Nova Lei de
Tóxicos não sejam inequívocos, não se poderia partir da premissa de mero
equívoco na colocação das infrações relativas ao usuário em capítulo
chamado “Dos Crimes e das Penas”. Por outro lado, salientou-se a
previsão, como regra geral, do rito processual estabelecido pela Lei
9.099/95. Por fim, tendo em conta que o art. 30 da Lei 11.343/2006 fixou em
2 anos o prazo de prescrição da pretensão punitiva e que já transcorrera
tempo superior a esse período, sem qualquer causa interruptiva da
prescrição, reconheceu-se a extinção da punibilidade do fato e, em
conseqüência, concluiu-se pela perda de objeto do recurso extraordinário.
(Grifo nosso) (RE 430105 QO/RJ, rel. Min. Sepúlveda Pertence,
13.2.2007.) (BRASIL, 2007, p.01)
Na sessão, estavam presentes os Ministros Marco Aurélio, Carlos Britto, Ricardo
Lewandowski e a Ministra Cármen Lúcia, sendo esta Primeira Turma do Supremo
Tribunal Federal, presidida pelo Ministro Sepúlveda Pertence, na qual foi decidida
41
por unanimidade pela não descriminalização da conduta do usuário de drogas, vindo
a concluir que ocorreu na verdade foi a despenalização.
2.3 TEORIA GERAL DA PENA
O conceito de pena, trata-se de sanção imposta pelo Estado, por meio do devido
processo legal, utilizando-se do principio da proporcionalidade na aplicabilidade da
sanção, ao agente do crime praticado. Diante da ênfase dada ao princípio da
proporcionalidade, visto que, a lei não deve prever um ato de extrema violência, mas
proporcional ao delito. Assim, considera Capez:
O princípio da proporcionalidade rechaça o estabelecimento de cominações
legais (proporcionalidades em abstrato) e a imposição de penas
(proporcionalidade em concreto) que careçam de relação valorativa com o
fato cometido considerado em seu significado global. Tem, em
consequência, um duplo destinatário: o Poder legislativo (que tem de
estabelecer penas proporcionais, em abstrato a gravidade do delito) e o juiz
e as penas que os juízes impõem ao autor do delito têm que ser
proporcionadas à sua concreta gravidade). [...] São extraídas duas
importantes vertentes, a saber: a proibição do excesso (übermasserbort) e a
proibição de proteção deficiente (untermasserbot) (CAPEZ, 2004,p.10)
Para Moraes, trata-se de sanção penal a maneira pela qual o Estado reage contra o
violador da norma. A pena é conseqüência jurídica do crime, ou seja, é a sanção
prefixada que decorre da violação de um preceito penal. E completa dizendo que
possui as seguintes finalidades:
-Retributiva: a pena é uma retribuição proporcional ao mal praticado pelo
autor de um crime;
-Preventiva: a pena visa evitar a prática de crimes por meio de intimidação
do delinquente, pela aplicação da pena (prevenção social), e de toda a
sociedade, pelo receio de as mesmas sanções impostas e criminosas
(prevenção geral)
-Ressocializador, a pena à readaptação social do criminoso (MORAES,
2011, P.21).
Em
verdade,
existe
várias
teoria
da
pena,
umas
legitimadoras,
outras
deslegitimadoras do poder de punir, mas, por ora, só nos interessa as teorias
legitimadoras, que são divididas em absoluta, o qual é observada no Direito Penal,
com o fim em si mesmo, livre de quaisquer razões preventivas ou utilitárias, ou seja,
castiga-se porque simplesmente pecou. Entretanto, esta ainda não nos interessa,
uma vez que, a teoria que versa sobre doutrinas finalisticas são as realistas, que
42
considerando a utilidade da pena, estas são vislumbradas como subsídios a serviço
de determinados fins. Assim, pondera Queiroz:
Fim da pena é principalmente a prevenção de novos delitos, daí porque são
também conhecidas como teorias de prevenção ou prevencionistas.
Dividem-se em teorias da prevenção geral – positiva ou negativa – e teoria
de prevenção especial. No primeiro caso (de prevenção geral positiva) a
finalidade da pena é fortalecer os valores éticos-sociais veinculados pela
norma, estabilizar o sistema social ou semelhante; no segundo (de
prevenção geral negativa), a norma tem por objetivo motivar os seus
destinatários a se absterem da prática de novos delitos; finalmente, para as
teorias da prevenção especial, o fim é evitar a reincidência por meio da
ressocialização do condenado ou similar. (Queiroz, 2011, p.350)
No que fere, as finalidades em virtude do tema em questão, será ressaltado a
ressocialização e a prevenção, quanto a esta última, como vimos na citação anterior,
que existem duas modalidades que Maíllo (2009, p.169) explica, de forma mais
sucinta, ser a prevenção geral, a qual as penas fazem com que os indivíduos se
abstenham de cometer delitos, pelo temor a elas e a prevenção especial, a qual
quando se impõe uma pena a um sujeito que delinquiu, no futuro tenderá ele a
respeitar mais a lei, visto que já sofreu os rigores de uma sanção e sabe melhor os
riscos que enfrenta.
Ao tentar responde a pergunta: Têm as penas, efeitos preventivos? Crespo, no
âmbito da Teoria da Prevenção Relativa esboçada da seguinte forma:
Basea-se na necessidade de atribuir um caráter utilitário as penas, a fim de
que fosse possível promover uma pratica funcional a estas, tanto no seu
aspecto abstrato como concreto. O sujeito não deve simplesmente pagar
pelo mal realizado, mas extrai algo da pena [...] Estas teorias visavam
intimidar o indivíduo para que não praticasse o crime, ou corrigir o
condenado, para que não voltasse a praticá-lo” (CRESPO, 2009, p.13 e 14)
Maíllo, diz que está utilidade pode ser visualizada no contexto da prevenção
especial, quando retrata a possibilidade de evitar a reincidência, ou seja, a prática de
novos delitos por temor a sanção já vivenciada. E assim discorre,
[...] a que a imposição de uma pena a quem delinquiu tenderá a reduzir
seus delitos no futuro porque seu temor (a voltar) a sofrer uma sanção terá
aumentado com a condenação. Sendo maior o temor, os custos de reincidir
serão mais sensíveis [...] Mediante uma sanção se pode favorecer a
reabilitação de quem delinquiu, reabilitação no sentido de quem
delinquiu,reabilitação no sentido que possa viver em sociedade sem ter de
recorrer ao delito. (MAÍLLO, 2009, p.179/180)
43
Ainda dentro desse tema, que aborda a eficácia preventiva da pena, é mister tecer
alguns esclarecimentos sobre os efeitos do controle social informal ou sanções
informais, que não encontram sua origem em uma disposição legal nem são
impostas pelas autoridades públicas competentes, seguindo um procedimento
previamente estabelecido pela lei (na verdade este conceito diz respeito as sanções
formais). E elucida Maíllo ao citar Anderson, que a maioria das pessoas não
delinque, porque caso descoberta teria que enfrentar a desaprovação familiar e de
seus amigos, e colocaria em perigo seu trabalho e muitas outras coisas, e desperta
para o fato de estas sanções, em virtude de ser pautado em valores morais, terem
um custo elevadíssimo na percepção do sujeito. (MAÍLLO, 2009, p.170).
Dentro dessa configuração interessante, nos convida a analisar a eficácia preventiva
da pena, e nos leva a reconhecer que a maioria das pessoas não delinque, não pelo
temor às possíveis sanções penais, mas porque seu sistema de valores os impede
de fazê-lo. Neste contexto, afirma Maíllo (2004, p.169) “tratar-se de indivíduos, para
os quais não é necessárias nenhuma ameaça, pois sua moral choca-se com toda
possibilidade de poder violar a norma”.
No momento seguinte, diante da assertiva, Maíllo (2004, p.170) conclui: os efeitos
desses fatores morais e informais podem ser mais poderosos que as das sanções
jurídico-penais (sanções formais), previne o delito mais eficazmente que o Direito
Penal.
Giacomine em seu artigo publicado no portal de âmbito jurídico, alerta sobre o
aumento preocupante da prática criminosa, ao mesmo tempo que diz não ser
possível erradicar a violência, mas é preciso diminuí-la, e assim nos convida a
repensar em medidas punitivas mais eficazes, que produza ao mesmo tempo o
sentimento de justiça e a reintegração do praticante da conduta delitiva :
A prática criminosa é um vício que devasta a sociedade e um dos
problemas mais graves da atualidade.
Durante muitos anos se vem buscando soluções para conter essa crescente
violência, seja na deturpação de valores sociais ou no próprio instinto
humano, e o resultado de tantas teorias leva à conclusão de que a
criminalidade não pode ser erradicada.
Contudo, mesmo que não se possa excluir este vício social, ele pode ser
amenizado se tratado com medidas eficazes.
44
Todavia, medida eficaz não é sinônimo de medida severa. Eficaz é à
medida que, além de servir de exemplo e de ressarcir a vítima, produzindo o
sentimento de justiça, reeduca e reintegra o criminoso, de maneira que ele
perca a vontade delitiva e passe a contribuir para a realização da paz social
(GIACOMINE, 2014, p.01)
É neste contexto de crítica reflexiva, sobre as sanções mais eficazes, o qual não é
sinônimo de severidade, que nos reportamos à prevenção geral, pois por temor a
pena o indivíduo é coagido a não praticar determinados delitos, assim, vale ressaltar
as penas privativas de liberdade tão arguida, em virtude de sua ausência no artigo
em explanação, desse modo é imprescindível destacar a análise de Crespo,
Se o Estado visa proteger os indivíduos e a lei lhe concede os instrumentos
necessários, a ocorrência do crime não deveria despertar somente o
interesse pela reação, muito menos uma reação violenta, como ocorre
atualmente com a aplicação desmedida da pena de prisão. Deveria estar
em jogo à perspectiva de alteração do quadro social, isto é, a diminuição da
criminalidade, mediante a efetivação de ações que produzem uma
verdadeira alteração na vida do sujeito infrator, o que poderia resultar num
outro quadro do cotidiano[...] (CRESPO, 2009, p.114)
Nesse sentido, explanamos ainda, com ênfase na ressocialização, a teoria de
prevenção especial, pois em sua versão mais radical, pretende a substituição da
justiça penal por uma espécie de medicina social, com o fito de promover um
saneamento social, seja pela aplicação de medidas terapêuticas, seja pela
segregação por determinado tempo, seja pela submissão a um tratamento
ressocializador apto a inibir as tendências criminosas. De acordo com Queiroz o
representante desta tendência é Dorado Montero, que se utiliza da seguinte
assertiva, “o saneamento social, uma função de higienização e profilaxia”
(QUEIROZ, 2011, p.355). Mas coube em especial a Fraz Von Liszt universalizar esta
teoria que é configurada da seguinte forma:
[...] fim das penas e das medidas de segurança era prevenir eficazmente a
prática de futuros delitos, conforme as peculiaridades de cada infrator.
Assim, missão da pena para os delinquentes ocasionais, que não prática de
futuros delitos, conforme as peculiaridades de cada infrator. Assim, missão
da pena para os deliquentes ocasionais, que não precisam de correção, é
ressocializá-los com a educação durante a execução penal (função
ressocializadora); para o deliquente incorrigível ou habitual, fim da pena é
torná-lo inócuo por tempo indeterminado (função de inocuização), enquanto
dure a necessidade inocuizadora. (QUEIROZ, 2011, p.356)
É salutar citar Molina (apud Gomes, 2010, 391), que versa sobre o paradigma
ressocializador o qual este reclama uma intervenção positiva no condenado, que
facilite o seu digno retorno à comunidade, isto é, sua plena reintegração social. E
continua considerando os fundamentos teóricos da ressocialização, no qual o centro
45
do debate, da reflexão científica, é o homem, sendo este o culpado e não mais o
sistema, então, o decisivo, acredita-se, não é castigar implacavelmente o
responsável, senão orientar o cumprimento da execução do castigo, de maneira tal,
que possa conferir-lhe alguma utilidade. E finaliza, com a assertiva de que, não
interessam os fins ideais da pena, muito menos o delinquente abstrato, senão o
impacto real do castigo, o modo como é cumprido, no condenado concreto do seu
tempo; assim, não lhe interessa a pena nominal que determina os códigos, senão a
que efetivamente se executa. Nesta esteira, transcrevo:
O paradigma ressocializador propugna, portanto, pela neutralização, na
medida do possível, dos efeitos nocivos inerentes ao castigo, por meio de
uma melhora substancial do seu regime de cumprimento e de execução e,
sobretudo, sugere uma intervenção positiva no condenado que, longe de
estigmatizá-lo com uma marca indelével, o habilite para se integrar e
participar da sociedade, de forma digna, sem traumas, limitações ou
condicionamentos especiais.[...] Cuida-se, isso sim, de algo pensado no
interesse exclusivo e real do condenado. Contando com sua colaboração
efetiva, não somente com seu consentimento formal, adotam-se técnicas e
terapias cientificamente valoradas que facilitam a posterior integração social
do infrator, que não lhe limitam, mas que incrementam suas expectativas e
possibilidade de participação social (GOMES, 2010, p.392).
Como já foi colocado, é nesta lógica que a legislação brasileira opera sobre as
drogas, o qual provocou uma mudança de paradigma na abordagem de usuários e
dependente, que em lugar de pena de prisão, eles serão submetidos a penas
alternativas e encaminhados a tratamento médico gratuito não compulsório.
2.4 SANÇÕES ATRIBUIDAS AO USUÁRIO DE DROGAS
Em consonância com a temática em destaque, foi visualizado que a maior mudança
realizada pelo legislador na nova Lei de Drogas foi à configuração da penalização do
usuário. Vale ressaltar que a Lei nº 6.368/76 repousava na seguinte redação, in
verbis:
Art. 16. Adquirir, guardar ou trazer consigo, para o uso próprio, substância
entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica, sem
autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:
Pena - Detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e pagamento de (vinte)
a 50 (cinquenta) dias-multa (JUSBRASIL, 2014, p.01).
Por sua vez, a nova lei de drogas, pautada na prevenção, não encontra guarida nas
penas privativas de liberdade destinadas ao sujeito qualificado como usuário de
46
drogas. Assim, encontra-se estatuída no recente dispositivo legal a seguinte
composição, in verbis:
Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer
consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo
com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes
penas:
I - advertência sobre os efeitos das drogas;
II - prestação de serviços à comunidade;
III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.
Ao analisar os dispositivos, é possível visualizar com clareza a realização de
mudança no modelo de justiça, que anteriormente era retributiva, pautada no
castigo, no encarceramento, e passa a ser suprida pela justiça restaurativa, ou seja,
com o fito precípuo na ressocialização por meios de penas alternativas.
Dessa forma, Duarte e Dalbosco (2013, p. 221) afirma que a justiça retributiva,
concentra-se no foco punitivo ao infrator e há o predomínio de penas privativas de
liberdade, enquanto, a justiça restaurativa incide sobre a conciliação e existe o
predomínio da reparação do dano causado ou da prestação de serviços
comunitários.
No que tange a mudança do modelo repressivo para o modelo preventivo, vale
ressaltar os argumentos de Guimarães (2008, p.22), que se reporta ao sistema
punitivo com reservas, afinal, segundo ele, o legislador passou para uma solução
dúbia, em que as condutas conducentes ao uso são pontuadas no capítulo referido
aos crimes, mas, ao invés de sujeitarem o autor a sanções penais, determinam
medidas de caráter educativo. E prossegue o raciocínio, afirmando que tem a
impressão de haverem optado por um regime não punitivo de tratamento destinado,
pois quem se enquadra nas condições de uso, lhe são atribuídas medidas
educativas. É neste contexto de incoerência, que finaliza chamando atenção para o
posicionamento do legislador, pois na redação final da Lei, prefere o uso do termo
“pena” para medidas que a rigor, não possuem caráter punitivo.
Importante se faz mencionar o artigo 27 da Lei 11.343, que estabelece a
aplicabilidade das penas, o qual podem ser concretizadas de forma isolada ou
47
cumulativamente, bem como substituídas, uma pela outra,
ouvidos o Ministério
Público e o defensor.
Em resumo, transcrevo Copobianco (2011, p.105) sobre as penas, que poderão ser
impostas de três maneiras:
I – advertência sobre os efeitos das drogas (admoestação verbal reduzida a
termo); II – prestação de serviço à comunidade (tarefas gratuitas em
hospitais, escolas creches que se ocupem, preferencialmente, da prevenção
do consumo ou da recuperação de usuários ou dependentes de drogas,
etc); III – medida educativa de comparecimento a programa ou curso
educativo (e por que não programa de tratamento).
Assim, como podemos visualizar, as punições são pautadas em mecanismos de
reintegração social dos usuários e dependentes químicos. Com base nos
argumentos elencados serão ponderadas a seguir, as respectivas sanções.
A advertência sobre os efeitos das drogas é única, e consiste em elucidar as
consequências no que se refere aos prejuízos causados pelas drogas, no âmbito da
saúde e das relações sociais. A mesma pode ser verbal ou escrita, e deve ser
provida por juiz competente. Guimarães, afirma que é possível vislumbrar a
fragilidade da advertência quanto sanção penal e comenta:
Parece-nos que o legislador cometeu um deslize ao prever a pena de
advertêcia e soa-nos bastante estranha a realização de um ato judicial com
o específico fim de o Juiz explicar os efeitos maléficos das drogras a um
infrator, aconselhando-o a não fazer seu uso. Primeiro, porque, muito
provavelmente, a simples advertência não terá efeito terapêutico e nem de
intimidação. Depois por que o Estado democrático de direito, como é
assumido pela Constituição da República, não pode se empenhar em
doutrinar as pessoas, nem pretender lhe dar orientação para a vida em
matéria que é de âmbito estritamente indivídual. O Estado deve, sim,
oferecer meios educacionais aos cidadãos, mas nunca a doutrina moral,
politica ou religiosamente. (GUIMARÃES, 2008, p. 20)
Resumindo Silva (2007, p.38), que se contrapõe a assertiva, e assim discorre que
certamente haverá reclamantes desta modalidade de sanção, com o fundamento de
que o juiz não é um “pai”, “professor”, etc., para advertir, mais sim um julgador, que,
no caso concreto, apresenta seu veredicto. Continua a defesa dizendo que, o juiz
para ser justo quanto à aplicabilidade da penalidade, há necessidade que faça às
vezes destas pessoas, especialmente quando lida com ramo do direito ligado a
questão social, que é o direito penal. E ilustra afirmando, que certamente um
48
Magistrado poderá ter o efeito que jamais uma pessoa comum alcançaria, podendo
resultar numa efetiva conscientização do agente, especialmente aquele ainda não
viciado.
A Prestação de Serviços a Comunidade estabelece a obrigação de o infrator prestar
serviços gratuitos nas entidades alistadas no artigo, o qual deve ser dado
preferência as que estão pautadas na prevenção do consumo ou da recuperação de
usuários e dependentes de drogas. Celebra o dispositivo legal, in verbis,
Art.28 [...]
[...]
§ 5o A prestação de serviços à comunidade será cumprida em programas
comunitários, entidades educacionais ou assistenciais, hospitais,
estabelecimentos congêneres, públicos ou privados sem fins lucrativos, que
se ocupem, preferencialmente, da prevenção do consumo ou da
recuperação de usuários e dependentes de drogas.
No que concernem as penas restritivas de direito, segundo Queiroz (2011, p.442) o
juiz deve levar em conta as aptidões do condenado, deve ser cumprida a razão de
uma hora de tarefa por dia de condenação, fixadas de modo a não prejudicar a
jornada normal de trabalho, até porque do contrário a pena poderia frustrar o fim a
que se propõe, de reinserção social.
A medida educativa de comparecimento a programas ou curso educativo não traz
determinações quanto a sua execução, sendo assim o juiz tem a discricionariedade
de estabelecer como será cumprida. De acordo com Silva (2007, p.40) a norma por
não indicar a modalidade de programa ou curso educativo, inclusive no que respeita
a estarem vinculados a tratamento de viciados em drogas ou outros vícios. Sendo
assim, o juiz não sofre limitação podendo, portanto, gozar da liberdade de escolher
os quais o infrator deve se submeter, quando esta medida for aplicada na sentença.
As penas de prestação de serviços e medida educativa de frequência a cursos serão
aplicadas pelo prazo máximo de cinco meses, contudo em se tratando de
reincidência poderão ter seu prazo dobrado, ou seja, máximo de dez meses (art. 28,
§§ 3º e 4º). Reza os dispositivos, in verbis:
Art. 28 [...]
[...]
49
§ 3o As penas previstas nos incisos II e III do caput deste artigo serão
aplicadas pelo prazo máximo de 5 (cinco) meses.
§ 4o Em caso de reincidência, as penas previstas nos incisos II e III do
caput deste artigo serão aplicadas pelo prazo máximo de 10 (dez) meses.
Não há previsão de reincidência no caso de a primeira pena ter sido a advertência,
contudo pelos critérios do art. 59 do Código Penal o juiz poderá deixar de aplicar
nova advertência para impor a prestação de serviço à comunidade que poderá
alcançar até dez meses (FILHO E RASSI, 2007, p.53).
O emprego das sanções de admoestação verbal e multa somente serão aplicadas
quando o autor do delito deixar de cumprir injustificavelmente a pena que lhe foi
estabelecida, seja por meio de proposta do Ministério Público ou pela sentença
imposta pelo juiz. Desse modo, transcreve o §6º do artigo 28, in verbis:
§ 6o Para garantia do cumprimento das medidas educativas a que se refere
o caput, nos incisos I, II e III, a que injustificadamente se recuse o agente,
poderá o juiz submetê-lo, sucessivamente a:
I - admoestação verbal;
II - multa.
A admoestação verbal, conforme Silva (2006, p.40) refere-se à chamada de atenção
do infrator que descumpriu as condições por ele aceita na transação penal, ou fixada
pelo juiz na sentença, o qual constará informações sobre as consequências do não
cumprimento desta conduta, que será a aplicação de sanção pecuniária, visto que
deverá primeiro ser aplicada a sanção de admoestação verbal e, somente após,
caso ela não surta efeito, poderá ser aplicada a pena de multa, haja vista que a
norma prevê a aplicação de forma sucessiva.
Comenta Guimarães de maneira reflexiva, quanto a não existência de eficácia:
[...]as penas (medidas educativas e de advertência) para inicio de
desenvolvimento do nosso raciocínio, que, em caso de descumprimento, o
condenado estará sujeito a admoestação verbal aplicada pelo Juiz (proh
dolor, Domine! Terá o Juiz de chamar a atenção de quem não cumprir as
medidas!). Mas com efetividade duvidosa, pois será pouquíssimo provável
que as palavras de admoestação do juiz tenham o poder de persuadir o
infrator a não mais fazer uso de drogas (GUIMARÃES, 2008, p.22)
Punir o usuário de drogas, só com discurso impessoal buscando reeducar, aparenta
ser uma medida sem potencialidade, sem persuasão, uma vez que, redimir
utilizando-se apenas de palavras, de diálogo, deve ser realizado, de forma
50
preventiva, por alguém de quem se confia, ou seja, das relações afetivas e,
principalmente, do âmbito familiar.
No que tange a pena de multa, é uma sanção que consiste em aplicação de pena
pecuniária, o qual, o juiz fixará, diante da reprovabilidade da conduta, entre um limite
mínimo de 40 (quarenta) e um máximo de 100 (cem) dias multas, de acordo com a
capacidade econômica do agente, no valor de cada dia, de um trinta avos até o
máximo de 03 (três) vezes o valor do maior salário mínimo vigente (art.49, § 1º, do
CP). Os cálculos serão realizados nos termos do art. 29 e os valores decorrentes da
imposição dessa multa serão creditados à conta do Fundo Nacional Antidrogas.
Em relação às penas em comento, Silva chama a atenção para o descuido do
legislador no que concerne o descumprimento das sanções aplicadas aos infratores,
que diante da fragilidade na pratica, poderá servir até mesmo de incentivo para o
agente deixar de cumprir. Desse modo, fundamenta a inconsistência como sanção
penal da pena de multa:
Esta previsão, a nosso ver, é muito inconsistente em termos de sanção
penal, seja preventiva, educativa etc...podendo, conforme for a condição
econômica do infrator e, ser escolhida para cumprimento, após
propositadamente descumprir as condições impostas e não dar valia para
admoestação.
Não há duvida de que um infrator abastardo financeiramente preferirá pagar
a multa, ainda que valor Máximo, do que prestar serviço a comunidade ou
comparecer a cursos ou programas educativos.
E isso pode ocorrer caso porque, caso o infrator descumpra as sanções
impostas ou pactuadas, a lei não prevê consequências, ainda que não haja
pagamento do valor aplicado título de pena de multa.
Mesmo não havendo o pagamento da pena de multa, esta falta de
cumprimento de sanção não poderá ser convertida em outra modalidade de
reprimenda [...] (SILVA, 2007, P. 41).
A pena de multa é uma prestação pecuniária, que de acordo com Silva não tem
qualquer caráter preventivo, pois não aflige o infrator ao ponto de causar sensação
de temor impositivo, que o impeça de reincidir, ao contrário, a sensação despertada
é a de impunidade, isso, em verdade, pode incentivar a realização do ilícito penal.
O artigo 30 dispõe sobre a prescrição das penas do artigo 28 é de (02) dois anos, da
imposição punitiva a da pretensão de execução, observado, no tocante as causas
interruptivas do prazo, aplicando-se o disposto nos artigos 107 e seguintes do
Código Penal.
51
O § 7º, do artigo 28, dispõe que o juiz determinará ao Poder Público que coloque à
disposição do infrator, gratuitamente, estabelecimento de saúde, preferencialmente
ambulatorial, para tratamento especializado em recuperação.
O tratamento em clínica especializada, não deve ser abrigado, ou seja, é uma
medida que não pode ser imposta ou coagida, pois esta alicerçada na aceitação do
agente ou do representante legal, que pautado na manifestação da vontade, busca
deixar o uso de drogas, encontrando guarida em clínicas gratuitas, o qual deveras,
por imposição normativa, ser ofertada pelo Poder Público.
Silva faz uma crítica severa ao dispositivo legal, pois impossibilita o magistrado de
coagir, na modalidade de sanção, o usuário de drogas para assim submeter-se a
tratamento especializado. Nesse sentido arrazoa,
È lamentável que a norma em comento não tenha previsto a aplicação de
medida de tratamento para os casos de infrator viciado, ainda que fosse
através de transação, fugindo com isso de toda a finalidade desse
normativo, que, pelo o que se depreende das medidas a serem aplicadas,
centra-se basicamente na prevenção.
Ao nosso ver, infelizmente, nem o Ministério Público poderá propor a
aplicação dessa medida, nem o juiz poderá determiná-la, porquanto as
modalidades de sanções foram postas de forma exaurível, não deixando
brecha para aplicação de outras.
[...]
Neste particular, observa-se com acero a norma obriga o juiz a determinar
ao Poder Público que disponibilidade ao infrator viciado tratamento
especializado. Entretanto, não possibilita ao julgado determinar
coercitivamente que o acusado se submeta a tal tratamento (SILVA, 2006,
p.36).
É de grande importância à garantia em lei, de que o Poder Público deve
disponibilizar tratamento gratuito especializado, mas como diz Silva (2006, p.37),
este não possui clínicas especializadas suficientes, para atender a demanda nesta
modalidade de tratamento, razão pela qual a norma acabará sendo letra morta
nesse particular, como ocorre com outras centenas de leis que garantem direitos ao
cidadão, mas não são cumpridas.
Dentro deste contexto, Olmo destaca, ao relatar os motivos ensejadores do
surgimento das primeiras clínicas de tratamento para usuários de drogas, traz uma
reflexão que se enquadra na realidade atual. Assim, afirma
52
[...]nos países centrais, com recurso disponível, o tratamento era uma
proposta exequível, enquanto nos países periféricos, com seu conhecido
déficit nos programas de saúde, busca-se resolver o impasse pela chave da
imputabilidade, que permitia, dentro da burocracia processual, nem punir
nem tratar (OLMO, 1990, p.10)
Assim, quando comparada à aplicabilidade da política de tratamento para
dependente químico, entre os países hipersuficientes e os países hipossuficientes, a
realidade é processada, no caso concreto, com positividade para este e de natureza
negativa para aquele, pois nos países sem recurso o ser esta longe do dever de ser.
53
3 LEI DE DROGAS E O JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL
3.1 APLICAÇÃO DA NOVA LEI DE DROGAS DO BRASIL
O crime de porte de drogas, para consumo pessoal é considerado de menor
potencial ofensivo, visto que se enquadra nos critérios estabelecidos pelo o art. 61
da Lei 9.099/95 que dispõe ser a infração a que a lei comine pena máxima não
superior a dois anos, cumulada ou não com multa, e os crimes descritos no art. 28
da lei de drogas nem admite pena privativa de liberdade. Desse modo, elabora-se
termo circunstanciado, e não inquérito policial, in verbis,
Art. 61. Consideram-se infrações penais de menor potencial ofensivo, para
os efeitos desta Lei, as contravenções penais e os crimes a que a lei comine
pena máxima não superior a 2 (dois) anos, cumulada ou não com multa.
O procedimento em relação a todas e qualquer conduta prevista no artigo 28 esta
estabelecido no artigo 60 da Lei n. 9.099/95, o qual determina a competência do
Juizado Especial Criminal, in verbis:
Art. 60. O Juizado Especial Criminal, provido por juízes togados ou togados
e leigos, tem competência para a conciliação, o julgamento e a execução
das infrações penais de menor potencial ofensivo, respeitadas as regras de
conexão e continência.
Os artigos acima elencados são aludidos no capitulo que trata do Procedimento
Penal, precisamente, no artigo 48, § 1º da Nova Lei de Drogas.
Art. 48. [...]
§ 1o O agente de qualquer das condutas previstas no art. 28 desta Lei,
salvo se houver concurso com os crimes previstos nos arts. 33 a 37 desta
Lei, será processado e julgado na forma dos arts. 60 e seguintes da Lei
no9.099, de 26 de setembro de 1995, que dispõe sobre os Juizados
Especiais Criminais.
Quem for flagrado na modalidade de conduta descrita no artigo 28 da lei em
comento, não deve ser submetido à prisão em flagrante, pois é vedada qualquer
modalidade de cerceamento de locomoção, devendo, com isso, o autor do fato ser
imediatamente direcionado ao juízo competente, ou, na falta de autoridade judicial, o
infrator deve assumir o compromisso de a ele se apresentar voluntariamente, assim,
lavrando-se termo circunstanciado e providenciado a autoridade policial, as
requisições dos exames e perícias necessários.
54
Concluída a lavratura do termo circunstanciado, o agente será submetido a exame
de corpo de delito se o requerer, ou, se a autoridade policial perceber conveniente,
e, em seguida, será liberado. Reza a letra da lei, in verbis:
Art. 48. [...]
[...]
o
§ 2 Tratando-se da conduta prevista no art. 28 desta Lei, não se imporá
prisão em flagrante, devendo o autor do fato ser imediatamente
encaminhado ao juízo competente ou, na falta deste, assumir o
compromisso de a ele comparecer, lavrando-se termo circunstanciado e
providenciando-se as requisições dos exames e perícias necessários.
o
§ 3 Se ausente à autoridade judicial, as providências previstas no §
o
2 deste artigo serão tomadas de imediato pela autoridade policial, no local
em que se encontrar, vedada a detenção do agente.
§ 4o Concluídos os procedimentos de que trata o § 2o deste artigo, o agente
será submetido a exame de corpo de delito, se o requerer ou se a
autoridade de polícia judiciária entender conveniente, e em seguida
liberado.
Pela previsão legal, o infrator seria encaminhado diretamente ao juízo competente,
entretanto, Silva nos reporta ao que realmente acontece na prática no que diz
respeito à utilização da coercitividade na condução do infrator até a autoridade
competente, e pondera:
[...]apenas não haverá lavratura do auto de prisão em flagrante, aos termos
previstos no Código de Processo Penal, mas que, de qualquer forma, o
infrator desta modalidade de conduta será capturado e conduzido
coercitivamente até a autoridade competente, se necessário algemado e
assim entender a autoridade policial autora da captura (SILVA, 2006, p.33).
A lei, regra que os Juizados Especiais devem ser baseados e direcionados segundo
os princípios informadores da simplicidade, informalidade, economia processual,
oralidade e celeridade. Os princípios estão previstos nos arts. 2º e 62º da lei
9.099/95. Assim, transcrevo:
Art. 2. O processo orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade,
informalidade, economia processual e celeridade, buscando, sempre que
possível, a conciliação ou a transação.
[...]
Art. 62. O processo perante o Juizado Especial orientar-se-á pelos critérios
da oralidade, informalidade, economia processual e celeridade, objetivando,
sempre que possível, a reparação dos danos sofridos pela vítima e a
aplicação de pena não privativa de liberdade.
De acordo com Copobianco (2011, p.144) as audiências são gravadas em sistema
de áudio (oralidade), o procedimento é mais célere (celeridade e economia
55
processual) e menos burocrático (simplicidade e informalidade). Acrescenta ainda
que o objetivo fundamental seja o consenso e a conciliação entre as partes.
A informalidade (§2º do artigo 65 e artigo 67) e a oralidade (§3º do art. 65) visam a
assegurar a necessária agilidade do processo, já que o procedimento escrito,
exigido desde o início da persecução penal (artigo 9 do CPP), revelou-se fonte
inesgotável da pretensão punitiva, pelo menos no que diz respeito à infração de
pequena monta. (JESUS, 2010, p.17)
No Juizado Especial cabe ao Promotor de Justiça, em audiência preliminar, onde se
desenvolve a fase consensual do processo, realizar a propositura da transação
penal, o qual será apresentado a titulo de imposição as penas de advertência sobre
os efeitos das drogas, prestação de serviços à comunidade e medida educativa de
comparecimento a programa ou curso educativo, na forma e conforme o que dispõe
o artigo 76 da Lei de nº 9.099/95.
Logo, na transação penal, quando o crime for de ação penal pública incondicionada,
o Ministério Público poderá propor a aplicação imediata das penas previstas no
artigo 28 da 11.343/06. Segue
Art. 76. Havendo representação ou tratando-se de crime de ação penal
pública incondicionada, não sendo caso de arquivamento, o Ministério
Público poderá propor a aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou
multas, a ser especificada na proposta.
Para melhor entender, Copobianco (2011, p.149) explica o seguinte, o procedimento
prever a propositura da transação penal pelo Ministério Público o qual oferecerá
denuncia ao autor do fato, e esta consiste no cumprimento imediato de uma pena
não privativa de liberdade (restritiva de direito ou multa) com a extinção do
procedimento criminal sem julgamento do mérito. E acrescenta:
Não se admite a transação penal se ficar comprovada que o autor do fato foi
beneficiado anteriormente, no prazo de cinco anos, pela aplicação da
transação penal e não indicarem as circunstâncias judiciais (art.59 do CP)
ser necessária e suficiente.
[...]
A parte descontente com a decisão da transação penal poderá apelar, no
prazo de dez dias.
Impossibilitada ou não aceita a transação penal, os autos serão conclusos
para o Ministério Público[...] (COPOBIANCO, 2011, p.149/150).
56
Se o condenado acolhe a sugestão e na sequencia for homologada pelo juiz, será
aguardado o cumprimento da medida pelo infrator e, ao final, será revelada extinta a
pena. Entretanto, se não houver êxito na transação penal, a denúncia será
apresentada verbalmente na própria audiência, o qual passará a ser observado, em
seguida, o rito processual sumaríssimo, estabelecido no artigo 77 e seguintes da
referida lei (GONÇALVES, 2011, p.37). Desse modo, segue o devido processo legal,
ressaltando o contraditório e a ampla defesa, até a sentença.
Quanto a este aspecto Silva (2006, p.34), afirma que é importante observar que para
o tipo de infrações aqui exposta não se aplica a vedação prevista no artigo 76 § 2º,
haja vista que a nova lei de drogas não fez esta restrição, visto que na transação
penal o Ministério Público apresentará propostas com a aplicação de uma das três
modalidades de sanções previstas no artigo 28, inciso I a III da lei 11.343/06. “Assim,
independente da condição do acusado infrator ser reincidente, ter maus
antecedentes, ter recebido esta mesma modalidade de benefício anteriormente etc.,
tem direito subjetivo as propostas atrás indicada”.
Por fim, o ultimo instituto previsto esta no artigo 89 da lei 9.099/95, refere-se a
Suspensão Condicional do Processo, tratada por muitos de “sursis processual”, o
qual envolve toda e qualquer infração cuja pena mínima não seja superior a um ano,
in verbis:
Art. 89. Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a
um ano, abrangidas ou não por esta Lei, o Ministério Público, ao oferecer a
denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos,
desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido
condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que autorizariam
a suspensão condicional da pena.
Trata-se de oferta realizada pelo Ministério Público de suspensão do processo, caso
o réu atenda os critérios requeridos por lei. Por ser direito subjetivo do réu que ao
aceitar terá que cumprir as determinações por período probatório que deverá ser
estabelecido de 02 (dois) a 04 (quatro) anos. Esses requisitos também estão
previstos no artigo 77 do Código Penal, são as mesmas da suspensão condicional
da pena.
Art. 77 [...]
I - o condenado não seja reincidente em crime doloso;
57
II - a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e personalidade do
agente, bem como os motivos e as circunstâncias autorizem a concessão
do benefício;
III - Não seja indicada ou cabível a substituição prevista no Art. 44 deste
Código.
§ 1º - A condenação anterior a pena de multa não impede a concessão do
benefício.
Portanto, para ser proposta a Suspensão Condicional do Processo, o autor da
infração não pode ser reincidente em crime doloso, deve ter situação judicial ilibada
e responder a processo cuja pena não exceda há um ano.
As condicionalidades judiciais, descritas no § 2º, são definidas e aplicadas a critério
do Juiz que se utilizara da equidade e observará os princípios da razoabilidade e
proporcionalidade. No que fere as condicionalidades legais a previsão esta no nos
incisos do § 1º da lei em epigrafe, assim transcreve:
Art. 89. [...]
§ 1º Aceita a proposta pelo acusado e seu defensor, na presença do Juiz,
este, recebendo a denúncia, poderá suspender o processo, submetendo o
acusado a período de prova, sob as seguintes condições:
I - reparação do dano, salvo impossibilidade de fazê-lo;
II - proibição de freqüentar determinados lugares;
III - proibição de ausentar-se da comarca onde reside, sem autorização do
Juiz;
IV - comparecimento pessoal e obrigatório a juízo, mensalmente, para
informar e justificar suas atividades.
§ 2º O Juiz poderá especificar outras condições a que fica subordinada a
suspensão, desde que adequadas ao fato e à situação pessoal do acusado.
Realizada as condições satisfatoriamente, será extinto o processo sem julgamento
do mérito. Entretanto, caso seja descumpridas as condições será dado
prosseguimento ao processo normalmente. Vale ressaltar que a Suspensão
Condicional do Processo suspende o prazo prescricional.
58
4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A Metodologia do Trabalho Científico se refere ao estudo da ciência e sua relação
com o mundo em que vivemos. Privilegia assim, o ato de pesquisa como um sendo
um exercício cotidiano na vida acadêmica, capaz de facilitar o processo de ensino
através do estímulo ao ato de pesquisar. O que importa na metodologia em geral é
destacar, em primeiro lugar a definição e a natureza do método.
Dada à complexidade do método, fez-se dele uma disciplina de saber, denominada
metodologia. É, pois a metodologia o estudo dos métodos. Complementando, este
estudo de fundamento, se pergunta pelas espécies de método, principalmente a
espécie eminentemente formal, como análise e síntese. Finalmente se estabelecem
as regras fundamentais do método. Dali resulta os parágrafos Ordenando o esforço
mental, o método proporciona segurança em qualquer operação, do fazer, do agir,
do pensar. Sobretudo na pesquisa resulta em economia de tempo. Liberta o espírito
de sua variabilidade dispersiva e o torna vigorosamente eficaz.
4.1 ABORDAGEM METODOLOGICA
De acordo com os objetivos propostos, este trabalho é um estudo sistemático de
averiguação, sobre um tema específico; para que tenha o mérito de uma pesquisa
científica, é imprescindível que seja conduzido através de uma investigação de
forma planejada, e desenvolvida dentro das normas e o rigor da metodologia
científica.
Freire - Maia (1977, p.171), sinaliza as limitações da metodologia quando diz:
A metodologia científica é apenas uma maneira de analisar e
interpretar a realidade. Essa maneira está marcada por um
dogma, o dogma da insegurança, os produtos intelectuais da
visão científica não oferecem garantia de certeza, intimamente
ligado ao dogma da incredulidade, a fé que eles possam merecer
está eivada de dúvidas.
59
Percebe-se nesta colocação, que é preciso se desnudar da arrogância, se mostrar
um aprendiz humilde, buscar ter curiosidade, disposição pessoal, para consolidar as
suas qualidades de pesquisador. Portanto, o método cientifico, é em verdade, a
própria prática do saber fazer, que é ao mesmo tempo, a prática da ação do
investigador com o objeto investigado.
Toda investigação se adequada ao caráter científico, ampara-se em metodologias
que dão suporte e direcionamento à sua condução, visto que o estudo científico
carece de uma análise sistemática que proporcione a alcançar o resultados.
O pesquisador utiliza o conhecimento disponível a partir das teorias
publicadas em livros ou obras congêneres. O objetivo da pesquisa
bibliográfica é o de conhecer e analisar as principais contribuições teóricas
existentes sobre um determinado tema ou problema, tornando-se um
instrumento indispensável para qualquer tipo de pesquisa (KÖCHE, 1997, p.
122).
Ainda de acordo com Koche (1997, p. 121). Sua finalidade é colocar o pesquisador
em contato com tudo que já foi escrito, dito ou filmado sobre determinado assunto.
Segundo Bastos e Keller (1992, p.55), com a intencionalidade de se fazer uma
confirmação entre o referencial teórico construído e a realidade pesquisada, optouse por uma pesquisa de campo do tipo quantitativa, qualitativa e descritiva
exploratória.
Explicita-se
que,
a escolha por uma pesquisa
qualitativa,
justifica-se
pela
flexibilidade que a envolve, o que segundo as referências em Mazzotti (2002, p.163):
“As pesquisas qualitativas são caracteristicamente multimetodológicas, isto é, usam
uma grande variedade de procedimentos e instrumentos de coleta de dados”, e
ainda de acordo com Ludke e André (1986, p.34) “envolve a obtenção de dados
descritivos, obtidos no contexto direto do pesquisador com a situação estudada,
enfatizando mais o processo do que o produto e se preocupa em retratar a
perspectiva dos participantes”.
Ainda sobre as abordagens qualitativas de pesquisa, segundo Bogdan e Bilklen
(apud LUDKE E ANDRÉ 1986, p.12).
60
Os dados coletados são predominantemente descritivos. O material
obtido nessas pesquisas é rico em descrição de pessoas, situações,
acontecimentos; inclui transcrições de entrevistas e de depoimentos,
[...], e extratos de vários tipos de documentos. [...] o interesse do
pesquisador ao estudar um determinado problema é verificar como
ele se manifesta nas atividades, nos procedimentos e nas interações
cotidianas.
Assim sendo, buscou-se desenvolver esta pesquisa, compreendendo somente os
réus que respondem a processo por porte de drogas para consumo pessoal,
domiciliados na cidade de Paulo Afonso/Ba.
A coleta de dados foi realizada através do Sistema PROJUDI, o qual somente foi
acessado e impresso os processos cuja movimentação é pública, ou seja, não
tramitam em segredo de justiça. Contudo, Há restrições no que concerne aos
arquivos, então, se fez necessário posteriormente buscar maiores esclarecimentos
junto ao Juizado Especial Criminal da 1ª Vara do Sistema de Juizados Especial da
Comarca de Paulo Afonso/BA, cujo servidor possibilitou o acesso destes
documentos essenciais para efetividade da análise.
Este capítulo será dedicado a investigar e analisar a eficácia ressocializadora das
penas direcionadas ao portador de drogas para consumo pessoal. Devido à restrição
quanto ao acesso a alguns processos, visto que, o tramite ocorre em segredo de
justiça, o resultado da análise será por amostragem.
A pesquisa de início é quantitativa, mas, para confronto de dados, utilizou-se
inclusive, pesquisa bibliográfica, para facilitar a organização e mensurar resultados
processuais, e posteriormente recorra-se ao método qualitativo, objetivando realizar
a análise descritiva dos dados. Ambos trabalharam em conjunto, pois a pesquisa
não se resume somente em coleta de dados, mas também em fazer o exame dos
resultados obtidos, de forma crítica e reflexiva, procurando responder o
questionamento perpetrado pelo tema central deste Trabalho de Conclusão do
Curso.
Como dito, o estudo tem particularidades quantitativas, porque os dados coletados
incidirão nas técnicas estatísticas, mensurados com quantidades e percentuais, com
imagens ilustrativas em gráficos, se utilizado dos resultados.
61
Quanto à abordagem qualitativa será desenvolvida com o apoio dos métodos
quantitativos, visto que os estudos realizados podem evoluir da observação,
perpassando pela compreensão da complexidade de determinado problema, e
assim alcançar a descrição da situação com respaldo e segurança.
Objetivando maiores resultados foi realizada entrevista com um representante do
Ministério Público, a Promotora de Justiça, com o intuito de investigar hipóteses
dedutíveis e buscar fundamentação em experiências com a temática em epigrafe, e
assim tentar arquitetar a distância que há da prática com a teoria.
A entrevista foi realizada no dia 15 de outubro de 2014, composta por seis perguntas
subjetivas no que tange à temática. Antes de iniciar, foi explicado e levado ao
conhecimento da representante do Ministério Público que se tratava de uma
pesquisa importante, pois fundamentaria o Trabalho de Conclusão de Curso.
62
5. ANÁLISE DA REALIDADE DE PAULO AFONSO ACERCA DA EFICÁCIA DAS
MEDIDAS PUNITIVAS
5.1 PROCESSO JUDICIAL DIGITAL - PROJUDI
PROJUDI trata-se de processo judicial digital, também chamado de processo virtual
ou de processo eletrônico, pode ser definido como um sistema de informática que
reproduz todo o procedimento judicial em meio eletrônico, suprimindo o registro dos
atos processos realizados no papel em substituição passa a armazenar e manipular
os autos em meio digital. (PROJUDI, 2014,p.01)
A legislação que autoriza o uso de autos processuais na modalidade eletrônica é a
Lei nº 11.419/2006, a qual fundamenta a instauração da Resolução nº 14/2007 no
âmbito do Poder Judiciário do Estado da Bahia, que dispõe as seguintes
considerações para o estabelecimento do PROJUDI, in verbis: perfil
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA, em sua composição
plenária, no exercício da competência que lhe é atribuída pela Lei de
Organização Judiciária do Estado da Bahia e pelo seu Regimento Interno.
CONSIDERANDO que prevê a Lei nº. 11.419, de 19/12/2006, a implantação
e o desenvolvimento da virtualização nos trâmites processuais, propiciando
maior rapidez, segurança, eficiência e transparência no andamento dos
processos;
CONSIDERANDO a necessidade de agilizar a realização dos atos
processuais, em benefício das partes, com economia de tempo, numerário e
material, visando rapidez e qualidade da prestação jurisdicional;
CONSIDERANDO que o Supremo Tribunal Federal e o Conselho Nacional
de Justiça firmaram termos de cooperação técnica para a implantação do
sistema de processo eletrônico;
CONSIDERANDO que o processo eletrônico prevê a tramitação digital dos
processos judiciais, dispensando o uso de papel, e que com isso o
Judiciário conseguirá maior celeridade e também evitará o retrabalho.
(PROJUDI, 2014, p.01)
Diante do exposto, os objetivos desse sistema virtual que busca ser célere, resumese em agilizar a tramitação, alcançar com maior resolutividade a justiça, reduzir
custos, elevar a capacidade de execução das ações, aprimorar a qualidade do
atendimento para com as partes e promover aos advogados um trabalho menos
burocratizado possibilitando otimizar tempo.
Embora o PROJUDI observe o princípio da publicidade, tornando alguns atos
públicos a qualquer cidadão, entretanto há limitação quanto a essa publicização,
63
visto que, nem todos os arquivos do processo estão disponíveis para acesso da
população sem cadastro no sistema, ou seja, sem login, sendo restringida a
visualização somente da movimentação do processo. Assim, para acessar
determinados atos, se faz necessário dirigir-se ao cartório onde tramitam os
processos e solicitar ao serventuário, que este faça a visualização do conteúdo. No
que fere as formas de acesso com cadastro,
Somente usuários cadastrados previamente terão acesso ao sistema. A
consulta e a prática de atos processuais poderão ser realizadas na Internet
ou na sede do Juizado Especial. Os advogados que se cadastrarem
receberão senha de acesso ao sistema e também certificados digitais que
darão a garantia de identificação, segurança, autenticidade e fidedignidade
dos documentos (PROJUDI, 2014, p.01)
Vale ressaltar, que existem processos com tramite em segredo de justiça, portanto,
diante desta prerrogativa não podem ser acessados pelo PROJUDI.
5.2 1ª VARA DO SISTEMA DOS JUIZADOS ESPECIAIS DA COMARCA DE PAULO
AFONSO/BA
A 1ª Vara do Sistema dos Juizados Especiais da Comarca de Paulo Afonso, no
Estado da Bahia foi instalada nesta cidade na data de 20 de janeiro 2010, conforme
determinava o Decreto Judicial de nº 14 de 15 de janeiro de 2010, em cumprimento
da Resolução de nº 30 de 04 de dezembro de 2009.
Vale ressaltar que o Juizado Especial Civil e Juizado Especial Criminal desde a
fundação sempre estiveram atuando solidariamente nas mesmas instalações, mas a
unificação formal das duas Varas dos Juizados Especiais somente ocorreu em 07 de
agosto de 2013, através da Resolução nº 19 Tribunal de Justiça do Estado da Bahia.
Quanto à abrangência jurisdicional, além de Paulo Afonso, atende ainda as
demandas dos municípios de Glória/BA e Santa Brígida/BA.
O endereço de localização na Rua Floriano Peixoto, nº 500, no centro desta cidade,
com funcionamento estabelecido de segunda a sexta-feira,das 07:00 às 13:00 horas.
64
5.3 ANÁLISE DOS DADOS
Como dito anteriormente, a pesquisa é calcada em arrazoar os processos cuja
identidade das partes e as movimentações estão abertas ao público no sistema
virtual PROJUDI. O lapso temporal de realização foi de 01 a 14 de outubro de 2014,
no período, havia 144 (cento e quarenta e quatro) processos tramitando, destes 84
(oitenta e quatro) transitavam em segredo de justiça, restando somente 60
(sessenta) para serem visualizados. Contudo, vale resaltar que a 1ª Vara Especial
de Paulo Afonso/Ba presta atividade jurisdicional a outros municípios, por este
motivo apenas 56 (cinquenta e seis) estavam dentro dos campos de domicilio
estabelecido.
Entre os princípios que norteiam a Lei dos Juizados Especial, é salutar invocar o
princípio da celeridade o qual esta prevista na Constituição Republicana Federativa
do Brasil no art. 5º, inciso LXXVIII, cujo dispõe “a todos, no âmbito judicial e
administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que
garantam a celeridade de sua tramitação”. Desse modo, o processo deve ter uma
duração razoável, de acordo com a complexidade do caso concreto, em
consonância com o devido processo legal, mas que possibilite resultado satisfatório
da efetividade da justiça.
Nesse aspecto é possível apontar as fraquezas da Lei 9.099/95 na aplicabilidade da
lei 11.343/06, pois buscando dar celeridade aos feitos criminais o rito é sumário, a
confiança neste procedimento, quanto à agilidade é demonstrada no tempo de
prescrição que rege o artigo 28 da Lei de Drogas, em virtude de ter sido tabulado em
dois anos.
Diante do pequeno prazo prescricional, cada ato jurisdicional deve ser realizado de
forma ágil e se possível imediata, entretanto, já na primeira fase que trata da
constituição do processo, é razoável visualizar a primeira problemática quanto à
morosidade do sistema judiciário.
65
Quanto ao aspecto acima citado, no que se refere à lavratura do Termo
Circunstanciado, este deveria ser encaminhado imediatamente ao juizado, e se
possível, juntamente com o autor do fato, conforme art. 69 da Lei nº 9.099/95.
Contudo, na prática há um descompasso entre a norma e a realidade, visto que ao
analisarmos a movimentação dos processos há um lapso temporal extremamente
preocupante entre a data do fato e a data no cadastro do sistema de distribuição.
Passemos a analisar o gráfico a seguir:
PERÍODO ENTRE A DATA DO FATO E A DATA DO
CADASTRO NO SISTEMA PARA DISTRIBUIÇÃO
5; 9%
10; 18%
16; 29%
< 30 DIAS
ENTRE 1 E 3 MESES
ENTRE 3 E 6 MESES
ENTRE 6 E 1 ANO
> 1 ANO
8; 14%
17; 30%
Gráfico 1: Período entre a data do fato e a data da distribuição
Fonte: Pesquisa de campo realizada do período de 01 a 14 de outubro de 2014.
Ao fazemos uma análise comparativa no que concerne aos intervalos entre a data
do fato e o cadastro no sistema de distribuição, é alarmante, pois podemos notar a
existência de um percentual quanto ao aprazamento maior que 01 (um) ano, o qual
apesar de ser o menor, mas que somado ao aprazamento que vai de 06 (seis)
meses a 01 (um) ano totalizam um percentual considerável de 38% (trinta e oito por
cento) dos processos que estão em estado crítico de comprometimento quanto ao
lapso mortal.
É relevante ressaltar, que o prazo entre a data do fato e a distribuição deveria ser o
menor possível, mas, não é o que acontece, visto que, o menor aprazamento
66
visualizado foi de 03 (três) dias, havendo somente um único processo nessas
condições, os demais a máxima brevidade são de (10) dez dias.
É de extrema importâcia ser realizado a comparação no que se refere ao ano de tal
aprazamento, na tentativa de compreender a dificuldade para a não realização dos
registros em tempo hábil. Assim sendo, é percebível que o ano de 2012 é o que se
mostra mais moroso, visto que, o aprazamento que compõe o periódo superior a
(01) ano se concetra totalmente neste anuário, contudo, o ano de 2014 é marcado
por maior celerida, pois o periódo menor que trinta dias é o seu marco principal.
Em conversa informal com a serventuária, esta atribuiu a elevação do resultado
positivo, no que tange a celeridade, ao aumento do corpo de rercusos humanos que
ocorreu em virtude da adesão de mão de obra dos estagiários.
PERÍODO ENTRE A DATA DO FATO E A
REALIZAÇAO DA DISTRIBUIÇÃO COM
BALIZAMENTO ANUAL
< 30 DIAS
ENTRE 1 E 3 MESES
ENTRE 6 E 1 ANO
> 1 ANO
ENTRE 3 E 6 MESES
13
11
9
5
3
2
2012
3
3
3
3
1
2013
2014
Gráfico 2: Período entre a data do fato e a realização da distribuição com balizamento anual
Fonte: Pesquisa de campo realizada do período de 01 a 14 de outubro de 2014.
A Audiência Preliminar é a próxima fase do rito processual, entretanto a inércia da
justiça no que concerne à fase em evidência, desperta a sensação de possível final
com impunidade para com os autores dos ilícitos de menor gravidade.
67
AUDIÊNCIA PRELIMINAR
Processo prescrito sem
agendamento
Agendada, mas o prazo
prescricional é < 03 meses
3; 16%
6; 32%
Sem previsão de
agendamento, prazo
prescricional < 03 meses
6; 31%
Agendada, mas com
tramitação > 01 ano
3; 16%
1; 5%
Sem previsão de
agendamento com tramitação
> 01 ano
Gráfico 3: Audiência Preliminar
Fonte: Pesquisa de campo realizada do período de 01 a 14 de outubro de 2014.
Como podemos observar, aproximadamente 30% (trinta por cento) dos processos, o
que equivale a 19 (dezenove), estão em extremo atraso no que se refere a
realização do primeiro ato, como já foi dito, a audiência preliminar. É relevante
destacar que 03 (três) destes prescreveram sem ao menos ter sido agendada,
somada-se mais 01 (uma) que esta sem previsão de marcação e mais outras 06
(seis) que embora programada o lapso mortal é inferior a 03 (três) meses. Assim,
temos mais de 50% (cinqueta por cento) do total na direção da extição da
punibilidade.
É imprescindível ressaltar, que a lentidão da Justiça Comum alcançou os Juizados
Especiais, visto que este é regulado com o objetivo de prestar serviço ágil à
sociedade, apesar disso, se presume que em virtude do grande volume processual
que vem obtendo, não consegue acolher a demanda com a eficiência almejada.
Nesse entorno, vale ressaltar o princípio da eficiência que é interligado ao art. 37,
caput, da Constituição Federal de 1988 cujo foi integrado por imposição da Emenda
Constitucional nº19/98 o qual deve orientar a organização da Administração Pública
e assim devem ser calcados nas seguintes atribuições:
A atividade administativa deve ser desemenhada de forma rápida, para
atingir os seu propositos com celeridade e dinâmica, de modo a afastar
qualquer ideia de burocrácia.
68
Deve ser perfeita, no sentido de satisfatória e completa [...].
Ademais, é preciso ser rentável, pois ela deve atuar da forma menos
onerosa possível, porém com máxima produtividade, para alcançar
resultados ótimos (JUNIOR, 2011, p.44)
Buscado lograr o melhor resultado, alcançar o sucesso ao final, ou seja, a
efetividade no âmbito da Administração Pública envolve os dois princípios a
eficiência (utilização dos meios e recursos adequados) e a eficácia (preocupa-se
com o sucesso no fim). É nesta esteira que Junior (2011, p.45) vincula os três:
A ideia que decorre do princípio constitucional da eficiência que deve
abranger tanto o sucesso dos meios (eficiência), como o sucesso dos fins
(eficácia), visando atender aquilo que a doutrina contemporânea vem
chamando de efetividade administrativa. Isso porque, a efetividade surge
quando se alcançam os resultados através dos meios adequados.
Quando invocado os princípios acima explanados, para o âmbito do Juizado
Especial Criminal, para que haja uma reflexão sobre a deficiência organizacional do
sistema processual em tela, visto que a morosidade implicará admiravelmente na
efetividade da condenação, consequentemente, causará ausência de aplicabilidade
da pena ressocializadora.
O contexto em pauta será arrazoado nos próximos elementos dedutivos obtidos.
EFETIVIDADE PROCESSUAL
Nº DE PROCESSOS
Nº DE AUDIÊNCIAS PRELIMINAR REALIZADAS COM TRANSAÇÃO PENAL
Nº DE AUDIÊNCIAS SEM CONCILIAÇÃO
Nº DE AUDIÊNCIAS NEGATIVAS
28
15
13
4
7
2
2012
1
5
2013
3
3
2
5
2014
Gráfico 4: Efetividade Processual
Fonte: Pesquisa de campo realizada do período de 01 a 14 de outubro de 2014.
O que se observou, foram 56 (cinquenta e seis) processos analisados, destes 32
(trinta e dois) foram submetidos à sessão de audiência, entretanto, 09 (nove)
69
consistem em audiência negativa, o que significa que o réu não compareceu, seja
por negligenciar a ordem judicial, ou seja, por não ter sido localizado, visto que a
serventuária relatou, informalmente, que muitos apresentam o endereço errado na
delegacia.
Então concluímos que somente 43% (quarenta e três por cento), aproximadamente,
são passíveis de sanção. Sendo assim há um afunilamento na direção da redução
dos autores imputáveis.
Diante desse escopo, é plausível mencionar uma das perguntas direcionada a
Promotora de Justiça, visto que, em virtude da morosidade e ineficiência do sistema
penal a ação está culminando para a exoneração da condenação. Nessa celeuma,
foi-lhe questionado se há efetividade na aplicação da pena no caso do usuário de
drogas diante da finalidade da lei. Como resposta, a entrevistada foi objetiva:
“__não, justamente por não haver condenação suficiente/adequadamente” (Fonte:
Entrevista realizada no dia 15 de outubro de 2014/Apêndice).
Quanto às audiências que não ocorreram à conciliação, por determinação legal,
deveria ser sequenciada, com máxima brevidade, para o agendamento da audiência
de instrução e julgamento. Não obstante, a análise demonstra mais uma vez o
descompasso com a norma processual.
AUDIÊNCIAS SEM CONCILIAÇÃO
1; 20%
1; 20%
Prescreveu sem agendar
audiência de instrução e
julgamento
Há mais de 1 ano em
tramitação, sem previsão
de agendamento.
3; 60%
agendada, mas o prazo
prescricional tem
vencimento menor que
seis meses.
Gráfico 5: Audiência Sem Conciliação
Fonte: Pesquisa de campo realizada do período de 01 a 14 de outubro de 2014.
70
O total de audiência sem conciliação são 09 (nove), dentre estas 05 (cinco), que
corresponde a 60% (sessenta por cento), é percebível a precariedade no prazo
prescricional, visto que 01 (um) processo prescreveu sem ao menos ser marcada a
audiência de instrução e julgamento, 01 (um) outro processo está caminhando na
mesma direção deste. Por fim, os 03 (três) últimos processos estão programadas,
mas o limite para extinção sem resolutividade tem vencimento menor que (06) seis
meses. Data Vênia é oportuno questionar se o período restante é suficiente para o
Estado exercer o direito de punir, quando ainda existem inúmeros atos legais a
serem esgotado no rito ilustrado.
Ao subtrairmos as audiências sem conciliação restam apenas 14 (quatorze) que na
audiência preliminar realizou transação penal, cuja traz em seu escopo o sistema de
consenso, sendo competência do Ministério Público, que ao representar a sociedade
propõe ao infrator, em critério de escolha, dentre às sanções estabelecidas no artigo
28 da Lei de Drogas, elencadas nos incisos I, II e III. Todavia, é facultada ao réu a
aceitação.
Destarte, a proposta do Ministério Público se concentra, com base nos casos em
concreto observados, em escolher entre a prestação pecuniária ou a prestação de
serviço em órgão público ou privado com finalidade social (observar modelo de
proposta
de
transação
penal
em
anexo).
Para
fins
de
posicionamento
posteriormente, é imprescindível destacar que a maioria, o que equivale a um
percentual de aproximadamente 64% (sessenta e quatro por cento) optaram pela
prestação pecuniária. Passemos agora ao gráfico:
71
PROPOSTAS PARA TRANSAÇÃO PENAL
5; 36%
Prestação pecuniária
Prestação de serviço a
comunidade
9; 64%
Gráfico 6: Propostas para Transação Penal
Fonte: Pesquisa de campo realizada do período de 01 a 14 de outubro de 2014.
É indispensável, ainda, salientar que mesmo transacionado quase a metade não
cumpriu o acordado, e o mais agravante, dois dos processos já prescreveram e
outros dois estão com o lapso temporal inferior a dois meses para esgotar o direito
de pretensão do Estado em produzir o efeito da condenação.
PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA
1; 10%
4; 45%
PRESTAÇÕES CUMPRIDAS
PRESTAÇÕES NÃO
CUMPRIDAS
4; 45%
AGUARDANDO
COMPROVAÇÃO DE
CUMPRIMENTO
Gráfico 7: Prestação Pecuniária
Fonte: Pesquisa de campo realizada do período de 01 a 14 de outubro de 2014.
Entrementes, é relevante ressaltar que a Nova Lei de Drogas objetivando evitar o
estigma marginalizador, que gira em torno da condenação que se encerra com o
72
encarceramento, assim, adota uma política que visa a ressocialização fundamentada
na Justiça Terapêutica, com intuito de reeducar e promover a reinserção social, do
portador de drogas para consumo pessoal. Para tanto, estabelece sanções que
possam alcançar a finalidades para o qual foi promulgada.
Nesse escopo, se faz necessário refletir sobre a prestação pecuniária cuja
demonstração fática, dentre todas, é a de maior incidência de aplicabilidade por
opção do autor, contudo, independente de ser adimplida ou não pelo praticante do
ilícito penal, é imperativo o legislador repensar quanto a sua existência no artigo 28
da lei em comento, uma vez que, não contribui para a edificação de resultados
terapêuticos, ou seja, não há nenhuma consonância com a finalidade da lei em
epígrafe.
No que concerne à prestação de serviço com finalidade social, 05 (cinco) optaram
por tal sanção, destes 04 (quatro) não realizaram a medida admitida em consenso e
01 (um) o setor competente do órgão esta aguardando a comprovação do
cumprimento ou não da concordância estabelecida.
PRESTAÇÃO DE SERVIÇO
1; 20%
0; 0%
MEDIDAS CUMPRIDAS
MEDIDAS NÃO
CUMPRIDAS
4; 80%
AGUARDANDO
COMPROVAÇÃO DE
CUMPRIMENTO
Gráfico 8: Prestação de Serviço
Fonte: Pesquisa de campo realizada do período de 01 a 14 de outubro de 2014.
É salutar fazer as seguintes considerações: 01 (um) dos processos prescreveu
recentemente sem que o réu executasse a prestação de serviço; 01 (um) outro
73
processo esta com o lapso temporal no limite, menos de dois meses, para ser
plenamente extinto com situação favorável ao infrator, pois será inseto de qualquer
condenação; e, por fim as outras duas ações tem um tempo maior pra prescrição,
seis meses, entretanto, esta sem qualquer movimentação há três meses.
Embora tenha ocorrido uma incidência para opção da prestação de serviço a
comunidade, que apesar de representar uma versão com maior potencialidade para
desenvolver a reinserção social, se faz necessário, ressaltar que o seu cumprimento
é quase nulo. O mais evidente e inquietante, é que a lei não determina qualquer
medida repressiva com poder contundente, de forçar o cumprimento das
penalidades, uma vez que, caso o condenado não às execute, somente lhe serão
atribuídas às penas de admoestação verbal e multa, e assim, mais uma vez há um
tropeço na prestação pecuniária, à punição totalmente desprovida de caráter
ressocializador.
Quanto ao posicionamento da entrevistada, a Promotora de Justiça, demonstrou
descrença, com o pseudo sistema de Justiça Terapêutica, imputada ao usuário de
drogas, portador, ao abordar se os institutos da Transação Penal, Suspensão
Condicional e Aplicação da Pena condizem com o específico objetivo terapêutico da
lei 11.343/06 com relação ao usuário. A resposta da inquirida se resumiu em __
“não, não há órgãos específicos por não haver condenações, já que o TCO se
encerra antes com a transação penal ou suspensão, que não prevêem fins
terapêuticos” (Entrevista realizada no dia 15 de outubro de 2014/Apêndice).
Na pergunta seguinte, a entrevistada foi arguida sobre a possível existência de
potencial ressocializador nas penas do art. 28 da Lei 11.343/06. Mas uma vez,
rebateu negativamente, entretanto, concluiu de forma propositiva ao destacar a
prevenção__“Nenhum. A ação deve ser preventiva” (Entrevista realizada no dia 15
de outubro de 2014/Apêndice).
Destarte, conclui-se que a ineficácia da lei 11.343/06 combinada com a deficiência
da lei 9.099/95, associada à ausência do trinômio eficácia, eficiência e efetividade na
organização do Poder Judiciário torna quase impossível galgar qualquer resultado
que culmine na condenação da conduta ilícita, portar droga para consumo pessoal.
74
E, mesmo que o infrator seja alcançado pela punição, o potencial ressocializador
que a nova lei de drogas advoga na literatura é inexistente na prática da jurisdição
do município de Paulo Afonso/Ba.
75
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Embora
a
legislação
brasileira,
galgue
meios
alternativos
às
penas
de
encarceramento, adotando medidas que pareçam ser efetivas na concretização dos
fins penais, a que se propõe no que tange a responder os anseios preconizados
pelos princípios e literalidade da lei 11.343/06, podemos concluir, que a atuação do
sistema penal, na pratica, não está contribuindo para a redução do consumo de
drogas, muito menos para a solução do problema do seu uso indevido.
Ao se reportar às notícias publicadas nos meios de comunicação, que ilustram sem
piedade em seu enunciado, trajetórias pessoais e dramas familiares nos quais, a
droga atua como protagonista de conflitos; responsável pela ruptura de laços
afetivos e sociais; mentora e fiadora da criminalidade levam-nos a pensar que a
dependência química, é um dos fatores em potencial na geração de delinquentes,
pois, acredita-se que em virtude do uso indevido de entorpecentes, perde-se o
domínio, os valores morais, a vergonha, a dignidade e até a alma.
É inquestionável o reconhecimento da sociedade quanto ao perigo da drogadição, e
dos danos advindos ao adotar tal hábito, como reflexo disso, há inquietações que
consiste em como pode ser resolvida na esfera penal, esta epidemia social que
atinge as mais variadas e distintas classes. Nesse escopo, as contribuições aqui
difundidas podem transportar para uma melhor reflexão, pautadas não somente em
princípios ideológicos, mas, na aplicabilidade pratica que possibilite fazer uma
releitura dos instrumentais legais e processuais.
Como visualizamos, a Transação Penal é uma solenidade processual, que de certa
forma, abrevia a execução das penas restritivas de direitos. É bem verdade, que
nesse instituto traz benesses ao infrator, pois o empodera da faculdade de escolher,
dentre as propostas estabelecidas pelo Ministério Público, a sanção que desejar
cumprir. É relevante refletir sobre esse sistema, pautado no consenso, pois permite
ao pseudo condenado, ser legitimado a escolher a sua medida punitiva, dessa forma
decidirá pela mais benéfica e não pela mais eficaz.
76
Com base na realidade posta, se imagina, que mesmo ao avaliar o caso em
concreto, pautado no hábito patológico, o representante do Estado, na ocasião,
desejar incluir no seu rol de elegibilidade o Tratamento em Clínicas Especializadas
de Recuperação para dependentes químicos, a possibilidade de o infrator escolher
tal medida é quase nula.
Desse modo, é defeso lembrar que diante da previsão da norma, de que o
tratamento para os toxicômanos não pode ser compulsório, e sim realizado
espontaneamente, a lei não criou mecanismos de imposição judicial, para a
realização de medidas terapêuticas, sobretudo, para fazer jus à repressão estatal de
forma coercitiva, a exemplo dos que descumpre determinação judicial. Situação
demonstrada na pesquisa, pois ninguém que optou pela prestação de serviço como
medida punitiva se submeteu a realização, e o mais agravante é que não há meios
legítimos de ordem persuasiva.
Nesta celeuma, se faz necessário, relacionar com os verdadeiros problemas do
sistema punitivo, pois, apesar das inovações positivas no sentido de minorar o
estigma criminalizador da conduta do porte de drogas para consumo pessoal, o
artigo 28 da Lei nº 11.343/06, adota na norma uma política menos centralizada nas
ações penais, implementando medidas terapêuticas de ressocialização que
possibilite a transformação do comportamento delituoso, para condutas socialmente
apropriadas, o legislador não estabeleceu, como já foi dito, instrumentais
processuais e estruturais que viabilize a efetivação do fim objetivado.
O que se percebe, é que das punições não se pode esperar fins extraordinários,
mas, devem-se estabelecer, de maneira plausível, pelo menos os potenciais efetivos
da pena, ou seja, se há nela estabelecida um despertar de consciência no usuário
de droga, quanto aos danos causados a si próprio e a sociedade, se inclusive, é
suficiente para intimidar o agente, e fazê-lo refletir sobre as consequências dos
delitos, para com isso, não cometer infrações maiores, caso contrário, se há
necessidade de outros instrumentais de coação que possibilite ao consumidor de
drogas, construir um novo projeto de vida, onde as drogas não façam parte. Por fim,
repensar qual a melhor intervenção.
77
Diante disso, foi constatado que não há aplicabilidades de qualquer das punições
ressocializadoras, assim, não há como verificar a eficácia, calcada nos indicadores
elencados no parágrafo anterior. A política criminal precisa acordar dessa letargia e
visualizar o fenômeno das drogas, com mais atenção e compromisso, por se tratar,
de problemas complexos no aspecto social, familiar e pessoal, levando, sobretudo, a
prática da criminalidade.
Outro aspecto a ser refletido, é a ausência de acompanhamento na execução das
penas alternativas por órgão competente e específico. As medidas punitivas para os
usuários/portador de drogas são executadas no regime aberto, que ao ser
condenado, se faz necessário uma estrutura organizacional no sistema punitivo, no
que foi percebido, não haver em Paulo Afonso/Ba.
Portanto, o que se observa na pratica, são sequelas jurídicas penais que não
solucionam os problemas das drogas, a ineficácia das medidas punitivas para
portador de drogas, para o consumo pessoal, é visível, pois não há aplicabilidade,
consequentemente, não tem como cumprir a finalidade para as quais foram
sancionadas, assim, é imprescindível repensar as penas e, principalmente, sua
forma de funcionabilidade e execução, para que deste modo, se cumpra
verdadeiramente seu desempenho ressocializador, através da criação de estruturas,
que efetive a tão sonhada Justiça Terapêutica, para assim permitir o retorno do
infrator ao convívio em sociedade, sem anseio de cometer mais delitos.
78
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para conselheiros e lideranças comunitária. 6 ed. Brasília: SENAD, 2014.
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APÊNDICE
QUESTIONÁRIO
1ª) Nome: M.V.C.T
2ª) Profissão: Promotora Estadual de Justiça
3ª) Qual a relação com a temática? Atualmente não trabalho, mas trabalhei 9
(nove) anos.
4ª) Qual a relação com o processo de aplicabilidade e/ou execução das
sanções para usuários de drogas? Nenhuma. Só em 2014 passou a existir a
central de aplicação de penas alternativas.
5ª) Na sua percepção há um numero considerável de usuários de drogas na
cidade? Sim.
6ª) Se é visível o grande numero de usuários, porque não há processo numa
maior proporção? Se existe uma discrepância fática, dá-se devido à sub-registro.
7ª) Os institutos da Transação Penal, Suspensão Condicional e Aplicação da
Pena condizem com o específico objetivo terapêutico da lei 11.343/06 com
relação ao usuário? Não, não há órgãos específicos por não haver condenações, já
que o TCO se encerra antes com a transação penal ou suspensão que não preveem
fins terapêuticos.
8ª) Há efetividade na aplicação da pena no caso do usuário de drogas diante
da
finalidade
da
lei?
Não,
justamente
por
não
haver
condenação
suficiente/adequadamente.
9ª) Na sua percepção qual o potencial ressocializador das penas do art. 28 da
Lei 11.343/06? Nenhum. A ação deve ser preventiva
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ANEXOS
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