PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO
ACÓRDÃO/DECISÃO MONOCRÁTICA
REGISTRADO(A) SOB N°
ACÓRDÃO
i nu mu mu um um um mi um mi mi
*C)^Ã.nf:\RR~7*
Vistos, relatados e discutidos estes autos de
Apelação n° 0011168-60.2010.8.26.0224, da Comarca de
Guarulhos,
MENDES
em
que
(JUSTIÇA
é
apelante
GRATUITA)
GERSON
sendo
DE
apelado
OLIVEIRA
JOAQUIM
MARQUES SALGUEIRO E OUTRO.
ACORDAM, em I a Câmara de Direito Privado do
Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte
decisão: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. V. U." , de
conformidade com o voto do(a) Relator(a), que integra
este acórdão.
O
julgamento
teve
a
Desembargadores DE SANTI RIBEIRO
participação
dos
(Presidente) e RUI
CASCALDI.
São Paulo, 01 de fevereiro de 2011.
PAULO EDUARDO RAZUK
RELATOR
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1 a CÂMARA DE DIREITO PRIVADO
Apelação:
990.10.378810-9
Comarca:
Guarulhos
Juízo de origem:
3a Vara Cível
Juiz prolator:
Adriana Porto Mendes
Processo:
355/2010
Apelante:
Gerson de Oliveira Mendes (AJ)
Apelado:
Joaquim Marques Salgueiro e outro
USUCAPIÃO ESPECIAL - Imóvel urbano - O
apelante pretende usucapir lote de terreno em
loteamento clandestino - Lote situado em área que não
foi objeto de regular parcelamento de solo - O lote tem
112,97 m2, área inferior ao do módulo urbano - O art.
183 da Constituição Federal, prevê o usucapião
especial urbano de imóvel urbano com área de até 250
m2, àquele que o possuir de maneira ininterrupta e sem
oposição, por cinco anos, desde que não seja
proprietário de outro imóvel urbano ou rural - O art. 182
da Lei Maior estatui que o parcelamento do solo urbano
deve atender as exigências do plano diretor, tendo em
vista a ordenação da cidade, como política de
desenvolvimento e de expansão urbana - O art. 4 a da
Lei 6.766/79 impõe requisitos mínimos para o
parcelamento do solo urbano, entre os quais área
mínima de 125 m2 - Interpretação sistemática - Não
pode ser admitido usucapião especial urbano de modo
contrário ao regramento do parcelamento do solo,
previsto na própria Constituição, na lei federal que
regula o tema e na lei municipal que estabelece o
módulo urbano - O usucapião não é via adequada à
regularização de loteamento clandestino - À falta de
matrícula, não é possível o registro de sentença que
concedesse o usucapião - Configurada a inutilidade do
provimento jurisdicional pleiteado - Sentença mantida Recurso improvido.
VOTO N° 22306
A sentença de fls. 35/38, cujo relatório é
adotado, indeferiu a petição inicial de ação de usucapião especial urbano.
Apela o autor, a fim de que o feito tenha
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prosseguimento.
O apelo foi recebido.
O Ministério Público opinou, em primeiro
grau, pelo desprovimento do recurso, em segundo grau, pelo seu provimento.
r
E o relatório.
O apelante pretende usucapir lote de terreno
em loteamento clandestino. O lote situa-se em área que não foi objeto de
regular parcelamento de solo, inexistindo matrícula. Além disso, o lote tem
112,97 m2, área inferior ao do módulo urbano.
De um lado, o art. 183 da Constituição
Federal, prevê o usucapião especial urbano de imóvel urbano com área de
até 250 m2, àquele que o possuir de maneira ininterrupta e sem oposição, por
cinco anos, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
De outro lado, o art. 182 da Lei Maior estatui
que o parcelamento do solo urbano deve atender as exigências do plano
diretor, tendo em vista a ordenação da cidade, como política de
desenvolvimento e de expansão urbana.
A Lei n° 6.766 de 19.12.79, que dispõe sobre
0 parcelamento do solo urbano, integra a eficácia do dispositivo
constitucional suso. O art. 4o impõe requisitos mínimos para o parcelamento
do solo urbano, entre os quais área mínima de 125 m2.
Tais
normas
devem
ser
objeto
de
interpretação sistemática, isto é, a descoberta da mens legislatoris da norma
jurídica em conexão com as demais do estatuto onde se encontra1. É contra o
1
Rubens Limongi França, Formas e Aplicação do Direito Positivo, p. 48, RT, S. Paulo, 1969.
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Direito julgar ou emitir parecer, tendo diante dos olhos, ao invés da lei em
conjunto, só uma parte da mesma2. Com efeito, a norma jurídica não existe
isoladamente, estando ligada por íntimo nexo a outras normas e princípios
que integram o sistema jurídico do ordenamento. A interpretação sistemática
serve a enfrentar as questões de compatibilidade do todo estrutural3.
Assim sendo, não pode ser admitido
usucapião especial urbano de modo contrário ao regramento do
parcelamento do solo, previsto na própria Constituição, na lei federal que
regula o tema e na lei municipal que estabelece o módulo urbano. O
contrário seria legitimar, via usucapião, o loteamento clandestino, levando
ao caos na ocupação do solo.
No sentido:
CIVIL - RECURSO ESPECIAL - USUCAPIÃO
EXTRAORDINÁRIO - ÁREA INFERIOR AO
MÓDULO URBANO - LEI MUNICIPAL VEDAÇÃO - ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AOS
ARTS. 550 e 552 DO CC/16 - INOCORRÊNCIA. 1 In casu, como bem ressaltado no acórdão impugnado,
"o imóvel que se pretende usucapir não atende às
normas municipais que estabelecem o módulo
mínimo local, para parcelamento do solo urbano."
(fls. 168/169), não constituindo o referido imóvel,
portanto, objeto legalizável, nos termos da lei
municipal. Conforme evidenciado pela Prefeitura
Municipal de Socorro, no Oficio de fls. 135, o
módulo mínimo para o parcelamento do solo urbano
daquele município é de 250m2, e o imóvel em
questão possui apenas 126m2. Ora, caso se admitisse
o usucapião de tal área, estar-se-ia viabilizando, de
forma direta, o registro de área inferior àquela
permitida pela lei daquele município. Há, portanto,
2
Carlos Maximiliano, Hermenêutica e Aplicação do Direito, 9a ed., p. 129, Forense, Rio, 1979.
Hamilton Elliot Akel, O Poder Judicial e a Criação da Norma Individual, p. 41, saraiva, S.
Paulo, 1995.
3
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vício na própria relação jurídica que se pretende
modificar com a aquisição definitiva do imóvel. 2 Destarte, incensurável o v. acórdão recorrido (fls.
169) quando afirmou que "o entendimento do pedido
implicaria em ofensa a norma municipal relativa ao
parcelamento do solo urbano, pela via reflexa do
usucapião. Seria, com isso, legalizado o que a Lei não
permite. Anotou, a propósito, o DD. Promotor de
Justiça que, na Comarca de Socorro, isso vem
ocorrendo "como meio de buscar a legitimação de
parcelamento de imóveis realizados irregularmente e
clandestinamente." 3 - Recurso não conhecido (STJ Quarta Turma - Resp. n° 402.792-SP - Rei. Min.
Jorge Scartezzini - j . 26.10.2004)
Posto que assim não fora, o usucapião não é
via adequada à regularização de loteamento clandestino, consoante os
seguintes precedentes:
USUCAPIÃO - Indeferimento da inicial Impossibilidade jurídica do pedido e ilegitimidade de
parte - Condomínio que não está devidamente
averbado junto ao registro imobiliário - Irregularidade
que não pode ser suprida por meio de prescrição
aquisitiva - O condomínio não tem capacidade
aquisitiva para exercer direito de propriedade Inexistência jurídica que impede a aquisição por
usucapião - Sentença mantida - Recurso improvido.
(TJSP - Apelação Cível n. 311.947-4/9 - Campinas 4a Câmara de Direito Privado - Relator: Carlos
Stroppa-12.02.04-V.U.).
USUCAPIÃO - O usucapião não é o meio
apropriado para regularização de loteamento
clandestino e sim modo de aquisição de propriedade
pela posse animus domini. Recurso provido para
julgar improcedente a ação. (TJSP - Apelação Cível
n° 84.792-4 - Rei. Ênio Zulianni - 27.07.99 - V.U.).
USUCAPIÃO - Indeferimento da inicial Impossibilidade jurídica de ação em face de o imóvel
usucapiendo se encontrar em loteamento irregular ou
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clandestino - Apelo provido - Inexistência de
fundamento legal de proibição à ação - Sentença
anulada. (TJSP - Apelação n° 443.618-4/6-00 - Rei.
Edmundo Lellis Filho - 7a Câmara de Direito Privado
B - j . 17.12.08).
USUCAPIÃO DE LOTE DE TERRENO DE
DESMEMBRAMENTO
CLANDESTINO, EM
DESACORDO COM OS REQUISITOS DO
ARTIGO 18 DA LEI 6.766/79 - Impossibilidade de
registro, a inviabilizar o pedido de reconhecimento da
prescrição aquisitiva - Apelo do Ministério Público
provido, para julgar improcedente a ação Comunicada a Corregedoria Geral da Justiça das
irregularidades apuradas no Registro Imobiliário
local. (TJSP - Apelação n° 157.508-4/4-00 - Rei.
Luiz Ambra - 8a Câmara de Direito Privado - j .
27.03.09).
Sem parcelamento regular, não é possível
abrir a matrícula. Sem a matrícula, a sentença que deferisse o usucapião não
poderia ser registrada.
A jurisprudência do Conselho Superior da
Magistratura recusa o registro de título de aquisição de lote de terreno, sem a
prévia regularização do loteamento:
REGISTRO DE IMÓVEIS - Escritura de venda e
compra - Loteamento não registrado - Abertura de
matrícula - Impossibilidade - Imóvel com descrição
precária e, sua área maior, vendido em parte
segregada - Necessidade de apuração do
remanescente Ausência de controle da
disponibilidade e da especialidade - Identificação do
proprietário e de sua mulher - Necessidade de
adequação dos dados qualificativos do título com os
do registro - Averbação que se faz necessária Recurso não provido (Conselho Superior da
Magistratura, Apelação n.° 118-6/0, Rei. Des. Luiz
TâmbaraJ. 25.11.2003).
Apelação n° 990.10.378810-9
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REGISTRO DE IMÓVEIS. Recusa de registro de
escritura pública de compra e venda de lotes que
integram loteamento não inscrito, mantida na
sentença de procedência da dúvida suscitada pelo
Oficial. Lotes destacados de área maior, que
apresentam descrição precária. Necessidade de
apuração da área e devida delimitação e
caracterização dos lotes, de modo a permitir o
ingresso seguro, no registro imobiliário, evitar
sobreposição de área e possibilitar o controle da
disponibilidade. Recurso não provido (Conselho
Superior da Magistratura, Apelação n.° 651-6/2, Rei.
Des. Gilberto Passos de Freitas, j . 22.2.2007).
REGISTRO DE IMÓVEIS - Dúvida julgada
procedente - Negado registro de escritura de venda e
compra de lote destacado de área maior - Loteamento
clandestino - Indispensável a prévia regularização do
parcelamento - Ocorrência de destaques anteriores Inviabilizado o controle de disponibilidade e
especialidade - Necessidade de apuração do
remanescente e da correta localização do lote na área
de que foi destacado - Recurso não provido
(Conselho Superior da Magistratura, Apelação n.°
810-6/9, Rei. Des. Ruy Camilo, j . 27.5.2008)
REGISTRO DE IMÓVEIS - Dúvida - Fração ideal
de imóvel a que atribuída área certa - Elementos
registrários que demonstram a implantação de
parcelamento irregular do solo urbano - Registro
inviável - Recurso não provido (Conselho Superior
da Magistratura, Apelação n.° 857-6/2, Rei. Des. Ruy
Camilo, j . 3.6.2008).
Sem possibilidade de registro, por falta de
matrícula, que não poderia ser aberta, sem a regularização do loteamento, a
sentença concessiva do usucapião seria um título inútil. Não se concebe que
se possa acionar o aparato judiciário, sem que dessa atividade se possa
extrair algum resultado útil (Cintra, Grinover e Dinamarco, Teoria Geral do
Apelação n° 990.10.378810-9
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Processo, T ed., p. 230, RT, S. Paulo, 1990).
Destarte, a sentença deve ser mantida, tal
como lançada.
Posto isso, nego provimento ao recurso.
São Paulo, Io de fevereiro de 2011.
PAULO EDUARDO RA^UK
Relator
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