CF1005
BuscaPé: do empreendedorismo à inovação aberta
Carlos Arruda, Anderson Rossi, Erika Penido
C
riado no “boom” da internet por três estudantes universitários,
o BuscaPé é uma empresa brasileira de comparação de preços
e outras informações para a compra de produtos e serviços,
com atuação na América Latina. “Nossa missão é auxiliar o
consumidor a realizar a melhor decisão de compra para as
suas necessidades. Para isso, alimentamos o consumidor com
um grande número de variáveis, como a distância em relação
à sua casa, dados do uso do produto, preço e financiamento”,
destaca Romero Rodrigues, presidente da empresa.
Quando entrou no ar, há mais de uma década, o BuscaPé listava
35 lojas e 30 mil produtos. Em 2010, a empresa era capaz de
atualizar, diariamente, as informações de 500 mil empresas
listadas, incluindo 14 milhões de produtos. O número médio
de usuários por mês passou de 55 mil em 1999 para mais de
20 milhões em 2010. Com 370 colaboradores, o grupo estava
presente em toda a cadeia do e-commerce brasileiro, auxiliando
todos aqueles que procuravam fazer um bom negócio na
Internet, seja na compra de um produto ou na contratação de
um serviço. Reunia marcas como Bondfaro, QueBarato!, e-bit,
CortaContas, Fcontrol e Pagamento Digital, e ostentava a 18a
posição no ranking comScore dos 25 sites latino-americanos
com maior número de visitantes únicos1
A história do desenvolvimento do BuscaPé ilustra a
capacidade empreendedora e de inovação da empresa,
tanto do ponto de vista tecnológico como mercadológico. A
empresa, que sobreviveu ao estouro da “bolha” e às gigantes
empresas de tecnologia do setor, conseguiu manter sua
capacidade de inovação durante seu processo de crescimento,
que contou com o aporte de capital de grandes grupos
empresariais. Após se tornar um dos mais importantes sites
A comScore é uma empresa de pesquisa de mercado que fornece
dados de marketing e serviços a empresas de Internet.
1
do mercado brasileiro, façanha jamais alcançada por um site
de comparação de preços em outros países, o BuscaPé estava
certo que, mais do que nunca, precisava inovar para manter
o seu desenvolvimento. Dada essa sua posição de destaque
como site de comparação de preços, o uso de benchmarking
com empresas americanas, muito válido para a empresa nos
primeiros anos de suas atividades, tornara-se menos relevante
para o BuscaPé.
Ao mesmo tempo, os sócios do BuscaPé se preparavam para
uma forte concorrência com multinacionais do setor que tinham
planos de investir agressivamente no mercado brasileiro.
Enquanto a compra da empresa pela Naspers fortalecia o
BuscaPé nesse contexto, as grandes apostas para a manutenção
da capacidade de inovação do BuscaPé eram a “Garagem
BuscaPé”, divisão do BuscaPé criada com a missão de
desenvolver projetos para a empresa e iniciativas de inovação
aberta através do site “developer. buscape.com”.
Histórico de desenvolvimento2
A história do BuscaPé não apenas se confunde com a história
do comércio eletrônico no Brasil, mas ajuda a defini-la,
remontando a 1998, quando a utilização de navegadores
(browsers) como Netscape ainda era pouco difundida.
É neste ano de 1998 que três colegas do curso de engenharia
da computação da Escola Politécnica da Universidade de São
Paulo, aficionados por tecnologia, começam a delinear ideias
que, anos mais tardes, resultariam no maior site de comparação
de preços da América Latina.
Esta parte foi adaptada, mas diretamente extraída das seguintes
referências: TASIC, I. A. B. (2007) e DORNELAS, J. C. (2008).
2
Romero Rodrigues, Rodrigo Borges e Ronaldo Takahashi,
então estudantes, desde muito cedo na faculdade sempre
estiveram envolvidos com projetos de pesquisa relacionados a
novas tecnologias. A internet, por se tratar de um tema novo e
ter na Escola Politécnica um dos primeiros centros de pesquisa
sobre o assunto (LARC - Laboratório de Arquitetura e Redes
de Computadores), foi um assunto pelo qual naturalmente
Romero, Rodrigo e Ronaldo se interessaram.
Em paralelo ao crescente envolvimento com a Internet, os três
estudantes buscavam maneiras de criar um negócio próprio. A
primeira ideia, que não evoluiu, foi tentar trazer um negócio
de automação residencial para o Brasil. A segunda tentativa
foi desenvolver uma software-house focada em empresas de
pequeno porte que precisavam de customização. Esse negócio
atuou na informalidade por cerca de três anos e gerava alguma
receita aos sócios. Entretanto, eles perceberam que não teriam
como crescer, pois não conseguiam ganhar escala. Mesmo sem
obter êxito, a tentativa não foi vista como frustração, mas sim
como uma oportunidade de aprendizado. “Aprendemos desde
como tratar o cliente, como lidar com ele, como cobrar [...] e
até entender que é mais difícil fazer as coisas do que parece.”,
destaca um dos fundadores da empresa.
Mesmo diante dos resultados não muito animadores, os três
estudantes continuaram juntos à procura de um negócio
que pudesse prosperar. “O BuscaPé surgiu com os sóciosfundadores buscando algo inovador. Não replicávamos
nenhum modelo americano ou de outro lugar, como faziam
muitas empresas de Internet da época.”, explica Romero
Rodrigues. “Estávamos fazendo brainstorming e, em um
determinado momento, o Rodrigo estava procurando uma
impressora para comprar. Ele entrou na Internet, pesquisou
em alguns sites de busca da época e encontrou de tudo
menos o preço das impressoras...Então decidimos explorar
a ideia de um site que ajudasse a responder questões
típicas de uma decisão de compra. Um ano depois, com
investimento médio de R$ 300,00 ao mês e muitas noites
de trabalho, foi lançado o BuscaPé”, completa.
Empolgados com o projeto, os três colegas, agora sócios na
empreitada, começaram com uma ideia muito simples: coletar
informações de produtos e preços de lojistas e disponibilizálas em um único site. Passaram, então, a desenvolver um
software, apelidado internamente de programa cliente, que
ao ser instalado na máquina do lojista, leria os preços do seu
sistema de gerenciamento e enviaria para o site constantemente.
Entretanto, quando iniciaram os contatos com os varejistas a
resposta foi negativa. A ideia de que os lojistas teriam ladoa-lado seus produtos e preços comparados com os de seus
concorrentes não parecia ter um apelo comercial interessante.
Com isso, os sócios rapidamente percebam que o modelo de
negócio não poderia seguir por este caminho.
O desenvolvimento da tecnologia Spider
A saída encontrada foi aproveitar as poucas lojas on-line
existentes até então para criar um banco de dados que atraísse
Casos FDC - Nova Lima - 2011 - CF 1005
os consumidores, e, conseqüentemente, os demais lojistas.
Com esse objetivo, os três sócios começaram a desenvolver
uma tecnologia que automatizasse a busca e a organização de
informações sobre produtos e preços na internet. Assim, de
junho de 1998 a junho de 1999, desenvolveram a tecnologia
apelidada de Spider.
Crucial no modelo de negócio do BuscaPé, esta tecnologia
permite a coleta e armazenamento sistêmicos de informações
em sites de comércio eletrônico e as organiza de modo a
permitir a comparação de preços pela internet. O modelo de
negócios adotado era baseado no pagamento por cliques. Os
sócios acreditavam que a loja poderia pagar para aparecer no
sistema e isso seria proporcional ao número de cliques que ela
recebesse. “Nós tínhamos muita noção de que agregaríamos
diferenciais à cadeia de valor da indústria, para o varejista e
para o consumidor.”, destaca Romero Rodrigues.
Com a tecnologia testada e totalmente funcional, em junho
de 1999 foi lançado oficialmente o site BuscaPé, com a
missão de ser um site de comparação de preços e produtos na
internet. Neste momento, a empresa agregou um novo sócio.
Com perfil menos técnico, Mario Letelier, que é formado
em Administração pela EAESP-FGV, assumiu o desafio de
ajudar a estruturar o plano de negócios e formatar os aspectos
administrativos da empresa.
O “boom” da internet
Neste mesmo ano, a internet já era vista como o grande canal
de marketing e comércio do futuro. É o período que seria
conhecido como o “boom” da internet. Milhares de empresas
em todo o mundo surgiram com a intenção de gerar e atrair
investimentos de milhões de dólares a partir de ideias simples,
mas baseadas em conteúdo disponibilizado na internet.
A onda de investimentos de capitalistas de risco dedicados a
investir milhões de reais nas nascentes “ponto-com” beneficiou
o BuscaPé. De junho a dezembro de 1999, a empresa recebeu
sete ofertas de investimento. A gama de interessados no
projeto dos quatro sócios foi desde bancos de investimento a
investidores estratégicos (grandes portais da época).
Ao final do processo, o BuscaPé selecionou, no início de 2000,
a E-Platform como primeiro fundo investidor. Atuando como
uma espécie de incubadora, o investimento da E-Platform
não apenas proporcionou à empresa alguns recursos básicos
(escritório, assessoria de imprensa etc.), mas também foi
crucial na condução das negociações para a primeira rodada
de investimentos de maior por te.
Essencialmente, a E-Platform apoiava o BuscaPé em quatro
atividades básicas: captação de recursos junto a grandes
investidores, elaboração do plano de negócios, serviços gerais e
dúvidas do dia a dia (legais, administrativas etc.). A E-Platform,
em geral, não opinava estrategicamente no negócio, permitindo
que os sócios do BuscaPé pudessem concentrar seus esforços da
2
melhor forma possível, alavancando o espírito empreendedor
em torno do projeto.
Com a entrada da E-Platform, foi realizado o primeiro roadshow da empresa para vários potenciais investidores em
São Paulo, Rio de Janeiro e Nova York. Várias ofertas de
investimentos foram feitas, mas no final acabaram aceitando a
proposta de investimento de US$ 3 milhões feita pela Merrill
Lynch e pelo Unibanco. Segundo declaração dos investidores,
o caráter inovador do projeto, a sua tecnologia proprietária de
ponta e o imenso valor agregado trazido ao consumidor foram
os fatores de atratividade para o investimento.
Com esta injeção de capital, em meados de 2000 a empresa
passou a ter uma estrutura maior, com maior acesso a recursos
(ex: servidores próprios) e um planejamento de mídia e
marketing agressivo. O objetivo agora não era apenas crescer,
mas também cumprir com as metas de rentabilidade definidas
pelos novos sócios capitalistas.
O contato com os novos investidores era totalmente diferente
do contato direto existente com a E-platform. Existiam
apenas uma ou duas reuniões anuais de conselho para definir
orçamentos e metas. O planejamento e sua execução cabiam
apenas è equipe do BuscaPé, que tinha autonomia para fazer
a empresa crescer.
O “estouro da bolha”
No ano de 2001 as bolsas de valores de todo o mundo se
abalam com o que se tornou conhecido como “estouro da
bolha”. Grande parte das empresas de internet da época faliu,
gerando uma queda generalizada das ações de empresas afins
em todo o mundo.
“No início de 2002 houve uma reunião de conselho bastante
tensa, na qual os investidores cogitaram o fechamento
da empresa. Nós não aceitamos e propusemos adiantar
o breakeven (antes previsto para o final de 2003) para o
final de 2002. Nós começamos a empresa antes da bolha,
então quando aconteceu o aquecimento do mercado nós já
tínhamos a empresa estabelecida, e isso nos fazia acreditar
muito nela”.
A saída encontrada para adiantar o breakeven foi diversificar
os negócios da empresa, mesmo que isso significasse o risco
de perder o foco. A empresa deixou, então, de apostar no
mercado publicitário (no modelo de clique por mil ou CPM3,
patrocínio de banners e espaços publicitários no site) e passou
a licenciar sua tecnologia de busca para grandes portais da
Internet brasileira à época, alterando significativamente
De acordo com o modelo CPM, o anunciante paga uma quantidade
fixa para cada mil exibições de seu banner em um determinado site.
Neste modelo, espera-se que haja uma taxa de click-through ou
cliques nos banners que convertam internautas em visitantes no site
do anunciante.
o modelo de receitas. Já no final do ano 2000, as receitas
de licenciamento de tecnologia passaram a representar
praticamente 100% do total.
“Ainda não tínhamos escala para atingir o ponto de
equilíbrio no modelo de clique. Para equilibrar a empresa
naquele momento de pressão dos investidores, fizemos
um pouco de tudo. Licenciávamos tecnologia, vendíamos
relatório de informação de mercado. Em 2002, acho que
cerca de 8% a 9% da receita foi de clique. O resto foi uma
linha “outros”, que tinha de tudo.”
Em 2002, 15 meses antes do primeiro prazo sugerido pelos
investidores, a empresa conseguiu atingir o breakeven e,
gradualmente, começou a voltar ao modelo principal da
companhia, de cobrança por lojas, porém em um novo modelo
de receitas, conhecido como Custo por Clique (CPC)4. Em
dois ou três anos houve uma inversão, na qual clique passou a
representar 90% das receitas e a linha “outros” 10%.
Um modelo de negócios inovador
Para viabilizar o cadastro de produtos, o BuscaPé criou a
Central de Negócios, que funciona como uma espécie de
leilão online, em que varejistas definem o valor que pretendem
investir para obter um melhor posicionamento nos resultados
de busca.
A Central de Negócios funciona da seguinte forma: a empresa
se cadastra e obtém uma conta na Central de Negócios BuscaPé,
passando a ter total acesso a cliques, dados da sua empresa,
concorrentes, contrato, área de atuação e outras informações. A
empresa define o quanto deseja investir para começar a vender.
Suas ofertas serão capturadas e publicadas na Rede BuscaPé,
com as informações sobre a empresa, políticas de preços,
parcelamento e disponibilidade. Suas ofertas aparecem em
centenas de milhares de buscas realizadas pelos consumidores
todos os dias. A empresa só paga quando o consumidor clica
em sua oferta e é direcionado para sua empresa. Com acesso
à Central de Negócios BuscaPé, a empresa ajusta e define
o custo por clique (CPC) a qualquer momento. Existe um
valor de CPC mínimo, mas acima deste valor, a empresa
pode variar de acordo com suas necessidades. Quanto maior
o valor do CPC melhor sua posição na página de respostas e,
conseqüentemente, mais vendas.
“O modelo atual é um leilão de cliques. Quem pagar mais
aparece primeiro e com mais destaque. Não é preciso ter
uma equipe comercial para negociar os preços com os
varejistas. Eles podem ter acesso em seu espaço privado a
3
Casos FDC - Nova Lima - 2011 - CF1005
No modelo CPC, o anunciante paga uma quantidade fixa pelos
cliques de internautas que de fato visitam seu site, buscando produtos
ou serviços. Neste caso, interessa a taxa de conversão destes cliques
em compras.
4
3
quanto seus concorrentes estão pagando e em que posição
eles irão aparecer”, explica Romero.
Todo cliente passa um código identificador para o BuscaPé.
Esse código é incluído na Spider no redirecionamento do clique
do site BuscaPé para o site do varejista. Segundo Romero
Rodrigues, com esse “tagueamento” o cliente identifica cada
compra finalizada por um usuário do BuscaPé. Dessa forma,
o varejista pode calcular o retorno do seu investimento, já que
ele sabe quanto gastou no BuscaPé e quanto vendeu através
de cada clique recebido por meio do site. “Além dessa conta
rápida e prática, tem também a latência que o BuscaPé gera
para cada varejista. Latência significa outras vendas geradas
que não são finalizadas na mesma sessão”, explica o presidente
da empresa.
O terceiro aporte de capital
De 2003 até 2006, o que se observou na empresa foi uma
consolidação das estratégias iniciadas com o novo modelo de
negócio e a expansão para a América Latina. Com a saída dos
investidores originais (Merril Lynch e Unibanco) no final de
2005 e a entrada de um novo investidor estrangeiro de grande
porte (Great Hill Partners), o BuscaPé iniciou uma nova etapa
de sua história.
A aquisição por parte da Great Hill Partners mudou a forma
de conduzir o negócio e os investidores passam a acompanhar
de perto as ações estratégicas da empresa. Houve um processo
grande de profissionalização do BuscaPé, com a definição e
separação do papel de sócio e de executivo. O contato com o
investidor passou a ser mais direto, com reuniões mensais e
possibilidades de auxílio à empresa, especialmente no que se
refere a networking.
A aquisição do Bondfaro
Em maio de 2006, como parte de sua estratégia de crescimento,
o BuscaPé adquiriu seu principal concorrente no mercado
brasileiro, o site Bondfaro, que tinha cerca de 1/3 do tamanho
do BuscaPé. Com isso, ampliou ainda mais sua carteira de
produtos pesquisados e bases de cliente.
‘O Bondfaro tinha uma estrutura com cerca de um terço
do nosso tamanho. Eles têm uma história parecida: eram 5
pessoas, recém-formados, que montaram um site, seguindo
os modelos já existentes nos Estados Unidos, pois surgiram
só em 2000, e que se polarizou como uma alternativa
bastante interessante para o BuscaPé. Eles tinham um
modelo de negócio idêntico ao nosso e uma estratégia de
seguidor bastante inteligente, que consistia em não arriscar
nada e desenvolver o que nós tivéssemos desenvolvido e
tivesse dado certo. Com isso, eles conseguiram ser muito
mais rentáveis e ter menos gente na equipe. O Bondfaro
Casos FDC - Nova Lima - 2011 - CF 1005
pertencia a sete acionistas, sendo dois Angel investors
e cinco fundadores. Desses, apenas dois continuaram
trabalhando na empresa como diretores do BuscaPé’, relata
Romero Rodrigues.
Após a aquisição, as marcas BuscaPé e Bondfaro continuaram
existindo, mas o BuscaPé se manteve como uma marca
horizontal, que oferece serviço de comparação de preços de
todos os tipos de produtos, desde postos de gasolina, lojas de
rua, serviços, até lojas online, enquanto o Bondfaro passou a
ser uma marca vertical que só inclui a comparação de preços
de produtos disponíveis em lojas online.
Pagamento digital e e-bit
A aquisição do Bondfaro foi seguida da aquisição de outras
marcas do setor de internet nos anos de 2007 e 2008, com
serviços interessantes para pequenas e médias empresas.
Em julho de 2007, o BuscaPé adquiriu a e-bit, empresa
pioneira na realização de pesquisas sobre hábitos e tendências
de consumo no e-commerce, criadora do sistema de avaliação
e qualificação de lojas online através da suas medalhas
(bronze, prata, ouro e diamante). Segundo Romero, “obter
esta qualificação é cada dia mais importante para qualquer
varejista que pretende construir uma história de longo prazo
na internet. Os usuários realmente procuram esta qualificação
antes de decidir suas compras.”.
No início de 2008, a Pagamento Digital e a FControl passaram
a fazer parte do grupo BuscaPé. O Pagamento Digital é um
gateway de pagamento que reúne todas as bandeiras de cartão de
crédito e todos os principais bancos.” Isso diminui a burocracia
do pequeno empresário e ainda garante o recebimento do
dinheiro do cliente em 14 dias mesmo se o parcelamento for
feito em 24 vezes”, explica o presidente.
A FControl é um sistema de gestão de fraude que indica para
o lojista qual é o nível de risco de uma determinada transação.
Segundo Romero Rodrigues, o sistema evita que o lojista
entregue o produto e não receba o pagamento, tipo de fraude
responsável por mais de 80% da “mortalidade’ das pequenas
e médias empresas de varejo online.
A compra pela Naspers
Em setembro de 2009, o grupo de mídia sul-africano Naspers
anunciou a aquisição de 91% das ações do BuscaPé, por US$
342 milhões. Três dos fundadores do site, além do criador do
Bondfaro, permaneceram como sócios e executivos do negócio.
A equipe administrativa do BuscaPé foi mantida.
“Eles aceitaram que continuássemos no comando,
desenvolvendo um produto com programadores brasileiros.
Não queríamos “tropicalizar” o nosso produto e mudar a
cultura da empresa”, conta Rodrigo Borges, sócio-fundador
e vice-presidente do BuscaPé.
4
A preocupação em preser var a cultura da empresa também é
destacada pelo presidente da empresa:
com medo de alguém lançar no Brasil algo parecido antes
da gente”, destaca o presidente da empresa.
“Se tivéssemos feito uma associação com uma grande
empresa de internet ou de software ou de tecnologia, para
não citar nomes, mas se imagina (...) Seja no Vale do Silício,
ou em Seattle ou onde fosse, provavelmente em seis meses
não ia ser BuscaPé, ia ser alguma coisa Preços, Shopping...
ia virar um canal de alguma coisa maior. Ao invés de ter
150 engenheiros desenvolvendo tecnologia de ponta,
brasileira, que a gente exporta para 27 países, a gente ia ter
engenheiros tropicalizando coisas que são feitas lá fora (...)
A cultura da companhia ia sumir, a marca iria sumir.”
Essa cultura de inovação, segundo Romero, promove
uma inovação natural do negócio, sem a adoção de
processos muito claros com esse objetivo. Entretanto, a
empresa possui uma estratégica de inovação, com linhas
de caminho definidas. As atividades de 150 engenheiros
e desenvolvedores de produtos seguem um pipeline de 2
a 3 anos. Assim, para inovações incrementais e diárias o
Conselho da empresa define uma estratégia que direciona
as inovações. Os principais estímulos para as melhorias
ocorrem através de reuniões constantes da gerência com as
equipes. “Quase todas as sugestões de melhorias são dadas
pelos times de desenvolvimento”, revela Romero.
Para a Naspers, que vinha fazendo aquisições em mercados
emergentes, o negócio foi uma forma de avançar na área
de comércio eletrônico na América Latina, onde, segundo
avaliação da empresa, a penetração da internet ainda era baixa.
Segundo o diretor de Internet da Naspers, Antonie Roux, o
BuscaPé agregava à Naspers operações em rápido crescimento
nos mercados mais importantes da América Latina, em linha
com o foco do grupo em e-commerce.
O grupo sul-africano, que tinha negócios em mídia impressa e
eletrônica, havia comprado operações de comércio eletrônico
no Leste Europeu. Também atuava na China, Rússia, Índia e
África subsaariana.
A marca BuscaPé continuou existindo e a empresa passou a
buscar sinergias com outras empresas do grupo com atividades
similares. A oportunidade de intercâmbio de conhecimento com
outras empresas do grupo Naspers é destacada por Romero
Rodrigues:
“A Naspers têm a maior empresa chinesa de internet, a
primeira ou segunda maior da Rússia e uma das maiores da
Índia. O intercâmbio de conhecimento entre essas empresas
é fantástico.(...) Estou vendo o que está acontecendo, por
exemplo, na China, em primeira mão. E nem o Google
sabe direito o que está acontecendo na China, porque a
operação deles na China é minúscula (...)não tem nem 4%
do mercado.”
Desenvolvendo a capacidade de inovação
O principal drive para a criação do BuscaPé era o desejo de
criar algo inovador, o que acabou tornado parte da cultura
da empresa.
“Não existia nenhum site similar ao BuscaPé quando
começamos a desenvolver a empresa em junho de 1998.
Em outubro de 1998, surgiu o mySimon, site americano
de comparação de preços. Ficamos duas vezes tristes: uma
porque queríamos ser o primeiro....nunca quisemos atacar
o mercado americano, mas era aquele desejo de criação
mesmo; e segundo porque ficamos desesperados, paranóicos,
Casos FDC - Nova Lima - 2011 - CF1005
Uma das questões relevantes em relação às inovações
incrementais na empresa refere-se ao fato de a estrutura de
desenvolvimento de produtos ser dividida entre as marcas da
empresa. Novas tecnologias podem ser testadas e desenvolvidas
de forma diversa dentre as marcas. Isso gera um trade-off, já
que traz velocidade, mas dificulta a integração das iniciativas.
Assim, não há uma única plataforma de desenvolvimento na
empresa. A busca da integração ocorre via a adoção da SOA
(Service-Oriented Architecture” Arquitetura Orientada para
Serviços), que permite a integração de softwares que utilizam
diferentes plataformas.
Já as inovações de ruptura ocorrem de forma menos processual
do que as incrementais e incluem duas iniciativas principais
da empresa: a Garagem BuscaPé e o site developer.buscape.
com.br.
Garagem BuscaPé
“Tentamos desengessar para não limitar a criatividade”,
destaca Romero. Desde 2006, quando foi criada a
Garagem BuscaPé, a equipe multidisciplinar dessa
divisão da empresa, formada por engenheiros, designers,
administradores e outros profissionais, têm a liberdade de
criar e desenvolver projetos, dentro de diretrizes técnicas.
Assim, busca-se promover uma inovação bottom-up.
“Reservamos uma área extremamente criativa para pensar
em coisas totalmente fora da caixa. Com o Garagem,
ganhamos dinamismo para desenvolver projetos web
que ainda não são o core business da empresa”, afirma
Romero Rodrigues.
Dentre os projetos desenvolvidos pela Garagem BuscaPé
estão o QueBarato! (www.quebarato.com. br), o Corta Contas
(CortaContas.com.br) e o Wiki2Buy.
“Em uma reunião na Garagem mencionamos a ideia de
entrar no mercado de classificados gratuitos e, para nossa
surpresa, alguém disse que o produto já estava sendo
desenvolvido ali. Dessa forma, o QueBarato!, que seria
5
desenvolvido em seis meses, ficou pronto em seis horas.”,
relembra Romero.
O QueBarato! foi lançado em 2007 e com pouco mais de um
ano de funcionamento atingiu 1,8 milhão de internautas por
mês, recebendo mais de 720.000 anúncios. Segundo Rodrigo
Borges, sócio fundador e vice-presidente do BuscaPé, com a
entrada da classe C na internet essa modalidade do classificado
grátis tendia a se popularizar.
A criação do Cor taContas em 2008 contribuiu para consolidar
e reforçar a missão de ajudar o consumidor a realizar a melhor
escolha de produtos ou ser viços. O website permite que os
consumidores pesquisem e comparem produtos financeiros e
serviços presentes no dia-a-dia e peçam propostas competitivas
online no mercado para tomar a melhor decisão de compra.
Já o Wiki2Buy, primeiro guia de compras colaborativo da
Internet, lançado em 2009, teve como base o padrão wiki e
permite que os consumidores troquem informações sobre
produtos, serviços e lojas de forma colaborativa.
O projeto do Wiki2Buy foi desenvolvido utilizando o
MediaWiki, a mesma plataforma da Wikipedia, em que todos
podem contribuir, criando e editando artigos com facilidade.
No caso do Wiki2Buy, seu conteúdo é especifico sobre
produtos, serviços, empresas e tudo que seja relacionado a
uma tomada de decisão de compra.
“Com essa nova iniciativa, queremos permitir a troca livre
de informações sobre produtos entre todos os consumidores.
Essa coletividade permite a criação de um conteúdo vivo
sobre decisão de compra. Quanto mais consumidores
participam, mais as informações se tornam precisas,
atualizadas e úteis”, afirma o presidente do BuscaPé.
Após lançar novos produtos, a Garagem BuscaPé desenvolve
suas funcionalidades para promover um crescimento inicial.
Para tanto, são realizadas inovações incrementais. Dados os
projetos recentemente lançados pela divisão, atualmente a sua
equipe está com menos tempo livre para a criação de novos
projetos. O objetivo da empresa é fazer, aos poucos, a transição
desse desenvolvimento para outras equipes. Para manter o
ritmo de inovação, focando em novos projetos, o BuscaPé
criou, em 2010, uma nova Garagem BuscaPé. A fim de explorar
talentos locais, a unidade está localizada em Uberaba.
“Ao abrir nosso banco de dados para outros parceiros,
paralelizamos o desenvolvimento e ganhamos velocidade.
Essa abertura é interessante para o BuscaPé até do
ponto de vista de defesa, porque nunca conseguiríamos
manter ou pagar tantos desenvolvedores, dedicados a
diferentes applications. Muitas das pessoas mais talentosas
eventualmente não estão a fim de ter um emprego. O cara
quer estar sentado na casa dele, pode não ser brasileiro ou
estar em outro lugar do mundo.”, explica Romero.
Através do site developer.buscape.com, desenvolvedores
externos podem utilizar o WebService disponível pelo
BuscaPé para criar suas próprias aplicações para a internet,
celulares, TV Digital e Blogs, customizadas de acordo com
a sua necessidade.
Se as aplicações são capazes de gerar receitas, essas são
divididas entre o BuscaPé e o desenvolvedor externo.
Eventualmente, pode ser também de interesse do BuscaPé
negociar a compra da tecnologia desenvolvida externamente.
A ousadia da iniciativa refere-se ao grande potencial de
canibalização dos produtos da empresa.
“Com essa abertura, um desenvolvedor externo poderia
criar um BuscaPé melhor do que o próprio BuscaPé, porque
ele tem acesso a todo o banco de dados do BuscaPé e pode
criar sua própria interface. Ele também pode criar um
aplicativo de iPhone que esteja melhor ranqueado do que
o próprio BuscaPé.”, explica Romero.
Desde o lançamento dessa iniciativa, em 2006, a empresa já
colhe bons resultados. O BuscaPé na Hora e o BuscaPé Mobile
são exemplos de produtos gerados através do site developer.
buscape.com. O BuscaPé na Hora é um plugin (para Firefox e
Internet Explorer) que faz a comparação de preços enquanto o
usuário navega nas lojas. O BuscaPé Mobile é um aplicativo
que permite a disponibilização do BuscaPé em iPhone de uma
maneira fácil e rápida, sem precisar abrir qualquer browser.
Dentre os desafios dessa iniciativa, Romero Rodrigues destaca
a necessidade de criação de um modelo sustentável de atração
de desenvolvedores externos talentosos para o developer.
buscape.com. “O papel da área de Recursos Humanos nesse
contexto de inovação aber ta terá que mudar. Não conhecemos
os desenvolvedores externos, mas precisamos saber como
retê- los’, explica Romero.
Inovação aberta através do Developer.
buscape.com
Seguindo em frente
Outro projeto com o intuito de promover inovações de ruptura
para o BuscaPé consiste na disponibilização, de forma aberta,
da grande base de dados de produtos, ofertas e serviços do
BuscaPé, para desenvolvedores externos à empresa. Dessa
forma, a empresa aumenta a sua capacidade de fornecer a seus
afiliados aplicações novas, que talvez não surgissem dentro da
área de desenvolvimento interna da empresa.
Desde a sua fundação, o BuscaPé havia passado por fases
diferentes em termos de inovação. Nos primeiros anos a
inovação era top-down, pois o mercado era muito novo. Além
disso, a empresa fazia benchmarking internacional com sites
de e-commerce americanos. Em um segundo momento, após
atingir grande importância no Brasil, feito jamais realizado por
um site de comparação de preços em outros países, a empresa
Casos FDC - Nova Lima - 2011 - CF 1005
6
passou a inovar através de uma maior escuta do time e dos
usuários. Há 4 anos, a empresa havia acrescentado a inovação
aberta às suas atividade de desenvolvimento e criado uma
divisão dedicada à busca de inovações radicais.
idioma, até o final de 2010. “Na primeira fase, estaremos
testando cada mercado, os que se mostrarem mais promissores,
pretendemos montar escritórios e iniciar uma operação física
até o final de 2010”, explica Rodrigues.
Em 2010, o BuscaPé possuía os desafios de integrar as noves
marcas que havia adquirido e de internacionalizar a empresa.
Da mesma forma como a inovação havia permitido que o
BuscaPé se destacasse no Brasil, a empresa contava com sua
capacidade de inovação para crescer no mercado nacional cada
vez mais competitivo e nos mercados internacionais.
A expectativa era de que o BuscaPé estivesse presente em 27
países na América, incluindo os Estados Unidos, e em países
da África e da Ásia, que têm o português ou o espanhol como
Anexo 1 – QueBarato!
http://www.quebarato.com.br/
Casos FDC - Nova Lima - 2011 - CF1005
7
Anexo 2 - CortaContas
http://www.cortacontas.com.br/
Anexo 3 – Wiki2Buy
http://www.wiki2buy.com.br/wiki/
P%C3%A1gina_principal
Casos FDC - Nova Lima - 2011 - CF 1005
8
Anexo 4 - Developer.buscape.com
http://developer.buscape.com/
REFERÊNCIAS
BATTIBUGLI, A. O barato do BuscaPé. INFO. 22 de maio
de 2009. Acesso em: 24/04/2010. Disponível em: http://info.
abril.com.br/professional/redes-sociais/o-barato-do-buscape.
shtml?2
CRUZ, R. Naspers compra o site BuscaPé. O Estadão de S. Paulo.
30 de setembro de 2009. DALPICOLO, S. Sucesso na rede.
Carreiras & Negócios. 11/03/2010. Acesso em: 24/04/2010.
Disponí v el em: h ttp://www.portaloempreendedor.com.br/
empreendedor/ler_historias. php?ordem=141
ROITMAN, S. Ponto de Vista: Romero Rodrigues – Fundador
do BuscaPé. Plantão Online. 16/06/2009. Acesso em:
24/04/2010. Disponível em: http://plantaoonline.wordpress.
com/2009/06/16/ponto- de-vista-romero-rodrigues-fundadordo-buscape/
TASIC, I. A. B. Estratégia e empreendedorismo: decisão e
criação sob incerteza. Dissertação de mestrado. Escola de
Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio
Vargas. São Paulo, 2007.
DORNELAS, J. C. A. Empreendedorismo: Transformando
idéias em negócios. 3. ed. Elsevier, 2008. Estudo de Caso:
BuscaPé – uma empresa brasileira que faz sucesso na Internet.
68-77.
Casos FDC - Nova Lima - 2011 - CF1005
9
Download

C BuscaPé: DO EMPREENDEDORISMO À INOVAÇÃO ABERTA