O JUSNATURALISMO e O DIREITO NATURAL
A Escola do Jusnaturalismo sempre causou discussões acerca de sua origem no mundo
do Direito, desde sua concepção até os dias atuais, entretanto não podemos deixar de
considerar o seu objetivo de proteção da raça humana, que sempre esteve em foco,
seja pelos que admitiam um sentido sobrenatural, religioso e até os mais racionalistas
que defendiam a razão como sentido natural de preservação.
Devemos considerar que a ideia de direito não pode estar dissociada de um dever,
com todo respeito ao entendimento do mestre ORLANDO GOMES, que diz: “A todo
direito corresponde, em tese, uma obrigação”. Há direitos nos quais, entretanto, a
faculdade de agir do titular não se correlaciona a uma prestação de outrem. São
denominados direitos potestativos... continuando nos afirma: "O direito potestativo
não é, propriamente falando, direito subjetivo, por lhe não ser uma obrigação.” 1
Com relação ao aspecto teológico defendido por Thomas Aquino2 (1225-1274, teólogo
e filósofo da Igreja Católica Romana), “a lei natural é promulgada pelo próprio Deus
que a instilou na mente do homem, de modo a ser conhecida naturalmente por ele...” 3
“Pelo contrário, Davi rezou a Deus para que pudesse Sua lei diante dele, dizendo (Sl
119:33) ‘Ponde diante de mim como lei o caminho de Vossas justificações, senhor’.” 4
“Réplica Obj. 1. Pela lei natural, participa-se da lei eterna proporcionalmente à
capacidade da natureza humana. Porém, para seu fim sobrenatural, o homem
necessita ser dirigido de uma maneira mais elevada. Daí a lei adicional dada por Deus,
pela qual o homem compartilha de maneira mais perfeita da lei eterna.” 5
Gomes,Orlando.Introdução ao direito civil. Rio de janeiro,Forense,2001,p.118. 1
2
Morris, Clarence. Os grandes filósofos do direito, São Paulo, Martins Fontes,2002,p.49
3
_____________.Ob.cit.,pág.53
4
_____________.Ob. cit.pág.56
5
_____________.Ob. cit.pág.56
Como podemos observar, Thomás de Aquino defendia a existência de uma lei divina
para sustentar sua posição religiosa da existência do jusnaturalismo, o que sem a
menor sombra de dúvida tinha razão em sua tese, pois para melhor compreendê-lo,
devemos nos socorrer da lógica jurídica, no que diz respeito à Semiótica Jurídica 6.
Apenas, a título de reflexão, consideremos a existência de Deus como ponto de partida
para justificar a existência do direito. “E Deus criou Adão à sua imagem e semelhança
(Gênese 1:27)”, e deu a ele domínio sobre tudo, mas vendo-o solitário criou a Eva e lhe
impôs um dever: não mexer na árvore do fruto proibido e o seu descumprimento teve
uma sanção, logo o primeiro sentido de direito possui fonte Divina.
Não queremos com isso polemizar, muito menos incitar os racionalistas, mas são
questões que devem ser consideradas.
Nos Séculos XVI a XVII, os filósofos Hugo Grócio (jurista holandês, 1583-1645), Thomás
Hobbes (filósofo inglês, 1588-1679), Punferdof (jurista alemão), Jean-Jacques Rousseau
(filósofo e literário francês, 1712-1778) e Immanuel Kant, (filósofo, 1724-1804),
conseguiram retirar a carga teológica que cercava o jusnaturalismo, criando a Escola
do Direito Natural, que não se deve confundir com o direito natural.
Nesta oportunidade devemos nos reportar na grande divisão do Jusnaturalismo, seja
como ontológico (enfatizando o direito como realidade divina) ou deontológico
(visando a ética, moral e sua imutabilidade), o que sem a menor sombra de dúvida, nos
ajudou a compreender melhor o sentido de convivência do homem.
O mestre Paulo Nader disse que "O Direito Positivo quando se afasta do Direito
Natural, cria leis injustas", demonstrando a importância do Direito Natural como
balizador da boa convivência social.
Hugo Grócio7, falando sobre os direitos de guerra e paz, em suas observações
preliminares, diz: “6”... O homem é de fato um animal, mas um animal de excelente
espécie, que difere muito mais de todas as outras tribos de animais do que um homem
difere do outro; o que se evidencia pelas muitas ações peculiares à espécie humana. E
entre essas propriedades que são peculiares ao homem, há um desejo de sociedade...
não meramente saciado de qualquer maneira, mas tranquilamente e de uma maneira
que corresponde ao caráter de seu intelecto. Os estoicos chamavam esse desejo de
instinto doméstico ou sentimento de parentesco. Por conseguinte, a afirmação de que
por natureza todo animal é impelido apenas a procurar sua própria vantagem, se dita
de maneira tão geral a ponto de incluir o homem, não pode ser admitida...
6
Fleury, Aidê Buzaid, Introdução à lógica Jurídica, fundamentos filosóficos, São
Paulo,LTR,2002,pág.194.
7
Morris, Clarence. Os grandes filófosos do direito, São Paulo, Martins Fontes,2002,p.476/77.
8. Essa tendência à conservação da sociedade, que expressamos agora de maneira
rude, e que está de acordo com a natureza do intelecto humano, é a fonte do Jus ou
Direito Natural [grifei], assim chamado corretamente. A esse Jus pertence a regra de
se abster daquilo que pertence a outras pessoas; e, se estivermos de posse de alguma
coisa de outro, a restituição dessa coisa ou de qualquer ganho que tenhamos tido com
ela; o cumprimento de promessas e a reparação do dano cometido por culpa; e o
reconhecimento de certas coisas como merecedora de punição entre os homens.
9. Dessa significação resultou um outro sentido maior de Jus; porque, na medida em
que o homem é superior aos outros animais, não apenas no impulso social... mas
também em seu juízo e poder de avaliar vantagens e desvantagens..., podemos
compreender que é congruente com a natureza humana seguir... um juízo
corretamente formado; não ser desencaminhado pelo medo ou pela tentação do
prazer presente, nem ser arrebatado por impulso cego e irrefletido; e que aquilo que é
claramente repugnante a tal juízo também é contrário a Jus, ou seja, ao Direito
Natural Humano [grifei].
12. ... Somos levados a uma outra origem de Jus, além dessa fonte natural; a saber, o
livre-arbítrio de Deus ao qual, como nossa razão nos diz de maneira irresistível,
estamos fadados a nos submeter... O Direito Natural do qual falamos, seja aquele que
liga comunidades ou do tipo frouxo... pode assim ser corretamente atribuído a Deus;
porque foi a Sua vontade que tais princípios chegaram a existir em nós...
14. Ademais: A História Sagrada, além daquela parte que consiste em preceitos,
oferece uma outra visão que excita na mesma medida o sentimento social de que
falamos; porque nos ensina que todos os homens nasceram dos mesmos pais.
Podemos, portanto, dizer corretamente nesse sentido também, aquilo que Florentino
diz em outro sentido, que há um parentesco estabelecido entre nós por natureza: e
em virtude dessa relação é errado o homem tencionar o dano do homem...
Continuando, citamos outro ponto de vista do Direito Natural, dito por Thomás
Hobbes8: "O direito de natureza, que em geral os autores chamam de Jus Naturale, é a
liberdade que cada homem tem de usar seu próprio poder, como quiser, para
preservação de sua própria natureza, o que vale dizer, de sua própria vida; e, por
conseguinte, de fazer tudo aquilo que seu próprio julgamento e razão concebam ser os
meios mais apropriados para isso.
Por liberdade entende-se, de acordo com o próprio significado da palavra, a ausência
de impedimentos externos; impedimentos estes que com frequência, tiram parte do
poder do homem de fazer o que faria; mas que não podem impedi-lo de usar o poder
que lhe estou, de acordo com o seu julgamento e razão lhe ditarem.
8
_____________.Ob.cit.,pág.106
Uma lei da natureza (Lex Naturalis) é um preceito geral ou regra geral, descoberto pela
razão pelo qual um homem é proibido de fazer aquilo que pode destruir sua vida ou
privá-lo dos meios de preservá-la; e de omitir aquilo que ele pensa que melhor pode
preservá-la. Porque, embora aqueles que tratam desse tema costumam confundir jus e
lex, direito e lei, eles devem ser diferenciados; porque direito consiste na liberdade de
fazer ou de abster-se; ao passo que a lei determina ou obriga a uma dessas coisas; de
modo que a lei e o direito se distinguem tanto como obrigação e liberdade, que são
incompatíveis quando se referem a uma mesma e única matéria."
O jusnaturalismo, sem a menor sombra de dúvida, é inato à espécie humana, mesmo
que a escola do Direito Natural, que teve seu papel fundamental na laicização desse
direito possa negar, não podemos concordar com as palavras de Grócio, que disse: “O
Direito Natural existiria mesmo que Deus não existisse ou que, existindo, não cuidasse
dos assuntos humanos” 9, porque e nos parece ser contraditório, quando o mesmo
Grócio diz: “O Direito Natural do qual falamos, seja aquele que liga comunidades ou do
tipo frouxo... pode assim ser corretamente atribuído a Deus; porque foi a Sua vontade
que tais princípios chegaram a existir em nós...”, então, desta feita, continuamos com
a grande discussão acadêmica.
O jusnaturalismo a par das grandes transformações sofridas, seja em Atenas com
Sófocles (quando no diálogo de Antígona com o rei Creonte, que não queria sepultar
seu irmão Polinice, a mesma teria dito que as ordens do rei não valiam mais do que as
dos deuses que eram imutáveis) ou até os dias atuais, sempre ocupará seu espaço na
Ciência do Direito.
Assim como a História Natural da Criação, que teve seu início com Lamarck e Goethe e
foi mal compreendida mais tarde pelo poderoso cérebro de Darwin, teve seu
reconhecimento, podemos afirmar que o Jusnaturalismo e o Direito natural evoluem
no tempo e espaço com um único objetivo, que é a preservação da espécie.
Ousamos discordar, como querem alguns tratadistas, que o direito natural seria uma
evolução do jusnaturalismo, pois não podemos confundir o direito natural, inerente
não só à espécie humana, mas a todo ecossistema, com a escola do Direito Natural.
Diríamos que a evolução do Jusnaturalismo superou a Escola do Direito Natural, pois
desde a Independência dos Estados Unidos (1776), a Revolução Francesa (1789),
chegamos a Kioto com a preservação do meio ambiente, o jusnaturalismo se encontra
muito forte como fonte de todas as demais correntes e escolas que se seguiram. Nem
mesmo o mestre Hugo Grócio, com todo respeito, deixaria de concordar com a
9
trecho citado na obra de Paulo Nader, Introdução ao estudo do direito, editora forense, 22 edição,
pág.362.
evolução do jusnaturalismo, a ponto de termos que nos reportamos à criação do
mundo como descrito em Gênese, tratando do equilíbrio entre os homens e o meio
ambiente.
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