A vantagem competitiva nas organizações financeiras: uma análise baseada na Teoria dos
Recursos
Autoria: Marcel Ginotti Pires, Reynaldo Cavalheiro Marcondes
RESUMO
Este artigo procura identificar na Teoria de Recursos elementos relevantes para examinar
questões referentes à capacidade competitiva no segmento bancário. Está apoiado em
pesquisa exploratória qualitativa em que foram entrevistados sete executivos da cúpula de
diferentes grandes bancos que operam no país. Foram aplicados entrevistas em
profundidade e os dados tratados com técnicas da Análise de Conteúdo. Os resultados
encontrados mostram que o conhecimento organizacional é pouco valorizado dentro dos
bancos participantes da amostra, que encontram dificuldades em identificar claramente o
papel e o valor deste para os negócios. Além disso, procura mostrar que a tecnologia da
informação é relevante para o sucesso das operações bancárias e possibilita a oferta de
novos produtos e serviços, mas apresenta uma grande dificuldade em criar uma vantagem
competitiva para as organizações. Finalmente, a ambigüidade causal parece ser um recurso
ainda mais significativo contra a prática corriqueira da imitação dentro do segmento
bancário, resultado de uma combinação de recursos que não podem ser facilmente imitados
ou substituídos, a denominada heterogeneidade da firma.
Palavras-chave:
bancos, recursos, tecnologia da informação,
conhecimento organizacional, estratégia organizacional.
1 INTRODUÇÃO
O presente artigo examina a contribuição dos componentes associados à Teoria dos
Recursos na manutenção da capacidade competitiva de um grupo de instituições
financeiras, envolvidas em um ambiente caracterizado pela elevada competição neste
segmento.
A Teoria dos Recursos ou Resource-based Theory - RBT, difundiu-se nos anos 80 com o
trabalho de Wernerfelt (1984) mas que, segundo alguns teóricos, têm seus fundamentos
teóricos relacionados inicialmente por Edith Penrose, em sua obra The Theory of the
Growth of the Firm (WERNERFELT, 1984; PETERAF, 1993). Segundo essa teoria os
fatores internos à firma são de grande relevância para a criação de uma vantagem
competitiva da organização sobre os demais concorrentes. A importância do RBT torna-se
ainda mais evidente quando se percebe que este modelo teórico procura identificar as
causas da performance superior da firma, e da obtenção de uma vantagem competitiva
sobre os demais concorrentes (PETERAF, 1993). Além disso, procura explicar a maneira
pela qual os recursos de uma companhia dirigem sua performance em um ambiente
competitivo (COLLIS e MONTGOMERY, 1995).
Neste artigo procura-se destacar dois recursos ligados a RBT, a tecnologia, especificamente
a da informação - TI, e o conhecimento, que será tratado sob a perspectiva organizacional.
A escolha desses dois elementos deve-se aos seus aspectos atuais e cada vez mais
relevantes dentro de um ambiente competitivo atual, inclusive podendo ser considerados
como recursos diferenciados e de grande influência no segmento bancário.
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No Brasil o setor bancário se apresenta como sendo o segundo setor em participação no
PIB nacional, além de caracterizar-se como um grande usuário das tecnologias da
informação. Davenport e Prusak (1998, p. 3) afirmam que “os bancos representam
organizações que dependem fortemente dos dados. O registro e a manutenção de dados
estão no cerne dessas culturas de dados e a efetiva gestão dos dados é fundamental para o
seu sucesso”.
Vale mencionar a tendência do segmento bancário no Brasil, relevante para este trabalho,
que é a concentração bancária que vem ocorrendo principalmente através de aquisições e o
grande aumento da participação do capital estrangeiro nesse setor.
Tendo em vista as considerações e justificativas feitas acima foi definido como o objetivo
principal deste artigo identificar os enfoques e as práticas dos bancos para tornarem-se
competitivos, identificando-os com a Teoria dos Recursos, sob o ponto de vista de altos
executivos. Como exemplos de recursos, podemos citar o conhecimento de tecnologia
interno à organização, o capital, a utilização de pessoal habilitado, marcas, contatos
comerciais e maquinário (WERNERFELT,1984).
2 REFERENCIAL TEÓRICO
A Teoria dos Recursos distinguiu-se da abordagem porteriana (PORTER, 1980) pelo
enfoque distinto que procurou atribuir à influência dos recursos e capacidades internas à
organização, ao contrário daquela que enfatiza a criação de uma vantagem competitiva
sustentável a partir da análise das características da indústria e posição da organização em
um contexto competitivo. Sob a perspectiva da RBT, o foco da análise foi deslocado para
os fatores produtivos internos à organização e a maneira pela qual estes fatores contribuem
para a criação de valor nas organizações por meio de seus recursos e competências. Essa
teoria visualiza a empresa como coleções muito distintas de capacidades e de ativos físicos
e intangíveis (COLLIS e MONTGOMERY, 1995). De maneira mais objetiva, recursos são
ativos que estão disponíveis e são úteis na detecção e resposta às ameaças e oportunidades
do mercado. Além disso, os recursos incluem também capacidades assim como outras
formas de ativos úteis e que estejam disponíveis (SANCHEZ, HEENE e THOMAS, 1996,
p. 8) enquanto que ativos compreendem qualquer coisa tangível ou intangível que a firma
possa utilizar nos seus processos de criação, produção e ou oferta de produtos, que incluem
bens e serviços ao mercado (SANCHEZ, HEENE e THOMAS, 1996, p. 7). Conforme
manifestado por Wernerfelt (1984), recurso deve ser compreendido como algo que pode ser
pensado como uma força ou uma fraqueza de uma dada firma.
Em um de seus artigos Wernerfelt (1984) analisa a organização sob uma perspectiva de
recursos, ou mais precisamente, de um “pacote” de recursos (DIERICKX e COOL, 1989;
AMIT e SHOEMAKER, 1993), tanto daqueles que ela possui, quanto daqueles que
precisam ser desenvolvidos, fazendo analogias entre as barreiras de entrada e as
denominadas barreiras de posições de recursos. De acordo com Wernerfelt (1984), as
barreiras de posição de recursos somente serão valiosas se puderem ser traduzidas em uma
barreira de entrada em, pelo menos, um mercado. Segundo ele “...an entry barrier without a
resource position barrier leaves the firm vulnerable to diversifying entrants, whereas a
resource position barrier without an entry barrier leaves the firm unable to exploit the
barrier”. O objetivo da firma é criar uma situação em que a sua própria posição de
recursos, direta ou indiretamente, torna-os mais difíceis de serem capturados pela
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concorrência, ou conforme relacionado por Wernerfelt (1984): “what a firm wants is to
create a situation where its own resource position directly or indirecly makes it more
difficult for others to catch up”. Essa atratividade do recurso, compreendida como a
capacidade da firma em suportar uma barreira de posição de recursos, é uma condição
necessária, mas não suficiente, para uma firma se interessar por este recurso. Afinal, as
barreiras de posição de recursos podem, analogamente, às barreiras de entrada, indicar um
potencial para altos retornos (WERNERFELT, 1984).
Mas quais são os elementos que podem ser classificados como recursos dentro de uma
firma? E de quê modo esses recursos podem influenciar na criação e ou manutenção de
uma vantagem competitiva para as organizações? Inicialmente, Barney (1991), ao avaliar
as implicações da RBT sobre a formulação das estratégias organizacionais, descreveu que
os recursos da organização incluem todos os ativos, capacidades, processos
organizacionais, atributos da organização, informação, conhecimento, etc., que são
controlados por uma organização, e que permitem a ela conceber e implementar estratégias
que desenvolvam sua eficiência e sua efetividade.
Grant (1991) apresenta seis categorias principais de recursos, que são descritas como
financeiros, físicos, humanos, tecnológicos, reputação da firma e os organizacionais, mas
que envolvem também a inclusão dos denominados ativos intangíveis. Esse autor destaca
ainda que os recursos e capacidades particularmente importantes para a organização são
aquelas relacionadas a quatro características de recursos, denominadas de “...durability,
transparency, transferability and replicability”, pois estas definem a sustentabilidade de
uma vantagem competitiva (GRANT, 1991). Deve-se compreender, conforme
entendimento de Grant (1991), que a durabilidade refere-se à capacidade da firma em
manter sua longevidade, decorrente da taxa de obsolescência e depreciação de seus recursos
e capacidades, além da habilidade de manter suas capacidades por meio da substituição dos
recursos, inclusive pessoas. A transparência refere-se à habilidade da firma em sustentar
sua vantagem competitiva, que depende da velocidade de imitação de sua estratégia por
outras firmas (GRANT, 1991). A transferibilidade está associada à facilidade ou não da
reprodução por parte de outras firmas dos recursos e capacidades necessárias que são
identificadas como fontes da performance superior da firma. Barney (1991) destaca ainda
que existem algumas fontes que criam imperfeições nessa transferibilidade, tais como:
imobilidade geográfica, informações imperfeitas, que se referem à heterogeneidade dos
recursos e do conhecimento imperfeito da produtividade potencial dos recursos individuais
da firma; os recursos específicos da firma e finalmente, a imobilidade das capacidades
organizacionais, que tornam as suas reproduções por outras firmas ainda mais incertas, pois
existe uma influência significativa do conhecimento tácito nesse processo (GRANT, 1991).
Finalmente, a replicabilidade dos recursos, que está associada a transferibilidade imperfeita
de recursos e capacidades, limitando a habilidade da firma em adquirir os meios necessários
para imitar o sucesso. Aqui, novamente Grant (1991) evidencia as particularidades
representadas pelos serviços financeiros, pois as inovações podem ser rapidamente imitadas
pelos competidores.
Ainda segundo Barney (1991), os recursos da firma poderiam ser classificados em três
categorias, que ele denominou de capital físico, capital humano e capital organizacional. Os
recursos de capital físico incluem tecnologia, a planta da firma e seus equipamentos,
localização geográfica e acesso a matérias-primas. Os recursos de capital humano incluem
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treinamento, experiência, discernimento, inteligência, relacionamentos e insights dos
gestores e trabalhadores da firma. Os recursos de capital organizacional incluem estruturas
formais, planejamento formal e informal, sistemas de controle e coordenação, assim como
as relações informais entre os grupos internos à organização e entre a firma e seu ambiente
externo (BARNEY, 1991). Ainda segundo Barney (1991), os recursos e capacidades mais
importantes da firma são aqueles duráveis, difíceis de serem identificados e compreendidos,
imperfeitamente transferíveis, não facilmente replicáveis e sobre os quais a firma possui
propriedade e controle.
Duas características ligadas aos recursos da firma podem se constituir em fontes de
vantagem competitiva sustentável para a organização (BARNEY, 1991; PETERAF, 1993;
BARNEY, FUERST e MATA, 1995; LADO e WILSON, 1994). Essas características
referem-se aos recursos da firma que são heterogêneos e imóveis, ou de imobilidade
imperfeita, conforme entendimento de Peteraf (1993). Para que isto aconteça, entretanto, os
recursos da firma precisam possuir alguns atributos que precisam ser raros, valiosos,
difíceis de serem imitados e para os quais não devem existir substitutos estratégicos
equivalentes (BARNEY, 1991).
Além disso, Barney (1991) destaca ainda duas considerações adicionais relativas à
vantagem competitiva e à vantagem competitiva sustentável, que é o objetivo desejável por
qualquer organização. Ele afirma que uma vantagem competitiva é decorrente da
implementação pela firma, de uma estratégia de criação de valor que não está sendo
implementada simultaneamente pela concorrência ou potenciais competidores, enquanto
que o acréscimo do termo sustentável ocorre quando a firma implementa uma estratégia
baseada na criação de valor que não está sendo implementada simultaneamente pela
concorrência ou potenciais competidores e quando estes são incapazes de reproduzir os
benefícios desta estratégia (BARNEY, 1991). Assim, a definição de sustentável de Barney
(1991) depende da possibilidade ou impossibilidade de duplicação competitiva, ou
conforme Peteraf (1993) argumentou, ela requer a preservação da condição de
heterogeneidade dos recursos da firma.
Ainda sobre a heterogeneidade dos recursos, Mahoney e Padian (1992) desenvolveram uma
abordagem abrangente sobre este tema, onde procuraram apresentar algumas visões
teóricas sobre como explicá-las, e a influência que possuem na criação de uma vantagem
competitiva. Uma das abordagens citadas é que a característica de heterogeneidade dos
recursos pode criar um desequilíbrio vantajoso para a firma, situando-o como uma quarta
dimensão dos recursos associados a terra, capital e força de trabalho.
Deve-se destacar ainda que diversos autores (McEVILY, 2000; COLLIS e
MONTGOMERY, 1995; BARNEY, 1991; DIERICKY e COOL, 1989) ressaltam que as
dificuldades de imitação e de substituição dos recursos da organização contribuem para a
manutenção de retornos acima da média e conseqüentemente, de manutenção de suas fontes
de vantagens competitivas, podendo se tornar duráveis se estes recursos forem bem
protegidos.
No contexto deste artigo, os recursos organizacionais ou competências (BARNEY, 1991;
BARNEY, FUERST e MATA, 1995) são considerados heterogêneos quando eles estão
desigualmente distribuídos e se desdobram através de outras organizações dentro de um
determinado ambiente competitivo (LADO e WILSON, 1994) ou ainda quando os recursos
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e habilidades dos concorrentes podem diferir entre si e imóveis quando estas diferenças
podem ser duradouras (BARNEY, FUERST e MATA, 1995).
2.1 Conhecimento
O conhecimento pessoal pode ser compreendido como “uma mistura fluída de experiência
condensada, valores, informação contextual e insight experimentado, a qual proporciona
uma estrutura para a avaliação e incorporação de novas experiências e informações”
(DAVENPORT e PRUSAK, 1998, p. 6). Ele é valioso, pois está próximo da ação
(DAVENPORT e PRUSAK, 1998, p. 7), constituindo-se também na “informação mais
valiosa e, conseqüentemente, mais difícil de gerenciar. É valiosa precisamente porque
alguém deu à informação um contexto, um significado, uma interpretação” (DAVENPORT
e PRUSAK, 1998, p. 19).
O conhecimento pode conduzir a níveis superiores no desenvolvimento e produção de bens
e serviços. Nesse sentido, o conhecimento organizacional pode ser o fundamento de uma
vantagem competitiva sustentável para a organização (DAVENPORT e PRUSAK, 1998, p.
20), vantagem essa compreendida como a obtenção de “desempenho superior” (McGEE e
PRUSAK, 1994, p. 26) de uma organização sobre suas demais concorrentes.
Polanyi desenvolveu uma teoria do conhecimento humano em que, além de avaliar os
processos mentais que conduzem à sua criação, propõe a sua divisão em dois tipos
distintos, denominados de tácito e explícito. Essa divisão se constituiu em uma referência
na literatura de criação e gestão do conhecimento e que tem se difundido desde a sua
apresentação (POLANYI, 1959, 1983). Polanyi afirma que aquilo que usualmente é
descrito como conhecimento, tais como palavras escritas ou fórmulas matemáticas,
compreendem somente um tipo, denominado de explícito (1959, p.12). O outro tipo seria o
não formulado ou tácito (aquele que é compreendido sem ser expresso diretamente) que foi
considerado como o princípio dominante de todo o conhecimento (POLANYI, 1959, p.12).
Nonaka e Takeuchi enfatizaram a criação do conhecimento organizacional. Fizeram isto
entendendo que o ponto fundamental da organização corresponde à “busca por processos
contínuos de inovação”, pois isto permite a criação de novos conhecimentos. Ao
conceituarem-no, esses autores consideraram necessário destacar três aspectos envolvidos
(1997, p. 63): a) ele se refere-se a crenças e compromissos, sendo função de uma atitude,
perspectiva ou intenção específica; b) ele está relacionado à ação, ou seja, é sempre o
conhecimento “com algum fim”, argumento este também referendado por Davenport e
Prusak (1998, p. 7) que destacam que a sua importância está no fato dele estar próximo da
ação, isto é, “ele pode e deve ser avaliado pelas decisões ou tomadas de decisões às quais
ele leva”, e c) ele se refere ao significado, sendo específico ao contexto e relacional.
A Teoria dos Recursos pressupõe a definição do conhecimento organizacional como um
dos componentes das competências distintivas de uma organização, pois ele é percebido
como uma fonte fundamental para a obtenção de retornos acima da média (SPENDER,
1996; McEVILY, 2000). Alguns autores sugerem que as vantagens baseadas no
conhecimento são difíceis de serem imitadas quando as razões para a performance superior
de uma empresa sobre os seus concorrentes não podem ser controladas ou identificadas
(DIERICKY e COOL, 1989). Isso é também conhecido como ambigüidade causal. No
contexto desse trabalho, a ambigüidade causal existe quando o link entre os recursos
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controlados pela firma e a vantagem competitiva sustentável da firma não é compreendido
ou é compreendido de modo muito imperfeito (BARNEY, 1991). Além disso, os recursos
controlados pela firma são muito complexos e interdependentes (BARNEY, 1991).
Mas quais fatores poderiam ser associados à criação de uma performance superior da
empresa? McEvily (2000) argumenta que ela é conseqüência do conhecimento
organizacional único da empresa sobre como organizar as atividades produtivas,
transformar recursos físicos e combiná-los em específicas necessidades dos clientes.
2.2 Tecnologia da Informação
Embora a tecnologia da Informação fosse inicialmente apresentada como um recurso a
partir do qual a organização poderia criar uma vantagem competitiva sustentável (PORTER
e MILLAR, 1985), esse posicionamento não permaneceu aceitável para os teóricos da
administração. Porter (1997) reiterou que o único modo de se ter uma vantagem
competitiva é através da inovação e aperfeiçoamento, envolvendo uma direção estratégica
visionária, pois a fonte de vantagem está mais associada à habilidade de aplicar a
tecnologia e para isto, torna-se necessário integrá-la com as demais tecnologias existentes.
Um dos aspectos da inovação tecnológica, aquele relacionado à informação, foi destacado
por Porter e Millar (1985), que afirmaram que a TI poderia modificar as regras da
competição, através da mudança da natureza da competição na indústria, inclusive na
bancária; da geração de novos negócios e do fato que ela pode ser considerada uma
alavanca que as companhias poderiam utilizar para criar vantagem competitiva, pois
afetariam as suas atividades de valor. A TI também oferece a perspectiva de criação de
novos negócios baseados na tecnologia, podendo propiciar uma vantagem competitiva
através de uma gestão cuidadosa dos elos de ligação entre as organizações. Porter e Millar
(1985) enfatizam a influência das novas tecnologias da informação, pois elas estão
alterando a relação entre escala, automação e flexibilidade presentes nas indústrias.
Em um estudo efetuado em 1995, Barney, Fuerst e Mata avaliaram a relação entre a
Tecnologia da Informação e a possibilidade dela criar uma vantagem competitiva
sustentável para a organização. Nesse estudo, foram avaliados quatro atributos da TI, que
são: necessidades de capital, tecnologia proprietária, habilidades técnicas de TI e
habilidades administrativas de TI. Esses autores concluíram que não era exatamente a TI
que possibilitaria essa condição, mas um conjunto de fatores que presentes, permitiriam às
organizações atingirem esse estágio. Dos atributos avaliados, afirmaram que somente as
habilidades administrativas de TI seriam capazes de criar uma sustentabilidade. Habilidades
administrativas de TI incluem habilidades gerenciais para conceber, desenvolver e explorar
aplicações de TI para suportar e ampliar outras funções de negócios. Além disso, afirmam
que se as habilidades administrativas de TI forem valiosas e heterogeneamente distribuídas
pelas organizações, então elas usualmente serão uma fonte de vantagem competitiva
sustentável, uma vez que estes relacionamentos são desenvolvidos no tempo, são
socialmente complexos e não estão sujeitos a imitações de baixo custo (BARNEY,
FUERST e MATA, 1995).
Pennings e Harianto (1992) desenvolveram trabalhos de pesquisa em bancos que
examinaram as práticas destas organizações na adoção de inovações tecnológicas. Esses
autores destacaram a facilidade e rapidez de imitação dos produtos bancários, posição
manifestada também por Grant (1991). Segundo Pennings e Harianto (1992) uma exceção a
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essa interpretação é a própria TI. Isso decorre do fato de que a TI demanda um tempo
longo para ser implementada e representa uma evolução no estoque de habilidades
acumuladas no tempo pela organização, posição esta partilhada por Brown e Hagel III
(2003); sua adoção é dependente das habilidades técnicas, estratégicas e administrativas
que a empresa possui combinadas com know-how externo de outras organizações. Esses
autores mencionam ainda que a principal variável independente da inovação nos bancos é
representada pelo acúmulo de experiências em TI e em conexões com outras empresas,
principalmente fornecedoras, característica essa praticamente única dessas organizações.
No trabalho publicado em 1992, Pennings e Harianto estabeleceram dois conjuntos de
fatores de inovação, os quais foram definidos como rede externa (external networking) e
acúmulo de know-how, como os elementos centrais de sua visão teórica em inovação no
segmento de bancos comerciais. Isso decorre do fato de que a TI está alterando
significativamente as operações internas e a entrega de serviços financeiros. Esses autores
concluíram que as habilidades internas e externas são cruciais para a inovação nos bancos,
pois representam a recombinação do know-how existente. Afirmaram ainda que a
capacidade de inovação em relação à tecnologia de informação depende muito mais de
como os bancos têm atuado no desenvolvimento de suas habilidades computacionais, que
são cumulativas no tempo (PENNINGS e HARIANTO, 1992). Isso ocorre devido ao fato
de que, quando uma tecnologia anterior é parte integral de uma nova, a imitação é
dificultada, gerando uma vantagem competitiva para a primeira empresa a implantá-la (first
mover).
A facilidade de imitação no segmento financeiro decorre do acesso fácil das organizações
às informações, tornando as vantagens competitivas baseadas na diferenciação e inovação
fugazes (GRANT, 1991). Nesse contexto, as organizações têm um breve momento de
oportunidades explorando suas vantagens antes dos imitadores as desgastarem (Grant,
1991).
Ainda em relação aos bancos, Collis e Montgomery (1995) afirmam que a durabilidade da
maioria das suas competências essenciais está em risco, pois grande parte dos seus recursos
tem um tempo de vida limitado, permitindo a obtenção somente de lucros temporários.
Contudo, a discussão sobre o papel e a influência da TI na criação de uma vantagem
competitiva tornou-se ainda mais relevante pela divulgação de que cerca de 50% dos gastos
de capital efetuados pelas organizações teriam sido utilizados em TI, no final da década de
90 (CARR, 2003). Embora o montante de recursos aplicados tenha sido considerado
excessivo, Carr argumentou que ele teve uma influência reduzida na criação de novas
oportunidades de negócio. Esse autor sugere ainda que as organizações deveriam rever os
seus gastos com TI, buscando uma posição de seguidores e focalizando nas
vulnerabilidades ao invés das oportunidades. Destaca ainda que a característica que torna o
recurso verdadeiramente estratégico, que deve ser compreendido aqui como aquele que se
torna base para a obtenção de uma vantagem competitiva sustentável, é a sua escassez.
3 PROCEDIMENTOS METODOLOGICOS
Este artigo está fundamentado em uma pesquisa exploratória qualitativa por não se dispor
ainda de uma sistematização de teorias e conhecimentos desenvolvidos em conformidade
com os objetivos do estudo. Nesse caso, não se trabalhou com a correlação entre as
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variáveis, mas com a sua caracterização qualitativa, dado o interesse principal em conhecer
como elas são percebidas e tratadas no ambiente dos bancos (KÖCHE, 1997, p. 126).
Foram entrevistados sete executivos de cinco grandes bancos, sendo quatro diretores e três
gerentes seniors que ocupavam cargos imediatamente abaixo da diretoria. A duração das
entrevistas variou entre uma hora e vinte minutos até duas horas e trinta minutos. Dos
bancos incluídos na pesquisa, quatro são bancos “de varejo” e um deles é um banco
especificado como banco “de atacado”. Os de varejo são dois bancos estatais, o Banco
Nossa Caixa e a Caixa Econômica Federal. Os bancos privados são o Itaú e o Unibanco,
tidos como de varejo, e pelo Lloyds TSB Bank, que é um banco de atacado, mas cuja filial
no Brasil foi adquirido pelo HSBC Bank Brasil, caracterizando ainda mais as suas
dificuldades de atuação no Brasil e a crescente concentração bancária no mercado nacional.
Todas as entrevistas seguiram um roteiro único previamente definido, com perguntas
abertas, cujas respostas foram gravadas em fita de áudio e transcritas ipsis litteris para que
não se perdesse nenhum detalhe dos depoimentos. O produto das entrevistas foi tratado de
maneira a resultar significativo e válido para a análise, conforme recomendação de Bardin
(1977, p. 101). O tratamento dos dados foi realizado por meio da aplicação das técnicas de
Análise de Conteúdo, em que se procedeu à codificação e categorização de todo o material
transcrito.
Vários são os critérios de categorização que podem ser utilizados na análise de conteúdo.
Os critérios utilizados neste trabalho foram: a) semântico, referente à categoria temática,
que é a “contagem de um ou vários temas ou itens de significação, numa unidade de
codificação previamente determinada” (BARDIN, 1977, p. 77), e onde se determinam
“núcleos de sentido” (BARDIN, 1977, p. 105); b) sintático, que está relacionado aos
verbos, adjetivos e substantivos (estes últimos não foram analisados neste trabalho), ou
seja, as palavras plenas, aquelas que são “portadoras de sentido” (BARDIN, 1977, p. 82) ;
e c) léxico, que é a classificação das palavras segundo o seu sentido, com emparelhamento
dos sinônimos e dos sentidos próximos.
Para ser considerado eficiente, um conjunto de categorias deve possuir algumas
qualidades, conforme descrito por Bardin (1977, p. 119-121): a) exclusão mútua; b)
homogeneidade; c) pertinência; d) objetividade e e) produtividade.
Somente após a conclusão de cada fase da análise, respectivamente sintática, léxica,
semântica e posteriormente a categorização, é que se avançou para a fase seguinte. A última
delas, correspondente à identificação das novas categorias, foi realizada pela manipulação
concomitante dos conjuntos relacionados nos quadros léxicos e semânticos para cada
questão.
4 ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DAS ENTREVISTAS
Na análise de conteúdo efetuada a partir das entrevistas dos executivos, buscou-se
identificar aqueles recursos ou fatores considerados mais relevantes dentro do contexto da
Teoria dos Recursos, conforme a literatura apresentada neste artigo.
Todos os executivos entrevistados confirmaram que seus bancos realizam pesquisas de
mercado visando identificar os níveis de satisfação dos clientes com a prestação de seus
serviços e a qualidade que eles apresentam, inclusive do atendimento. Procuram identificar
as necessidades e os desejos que este público apresenta. De certa forma, isso evidencia a
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percepção de que os dirigentes dos bancos objeto do estudo estão atentos à ação da
concorrência. Mais ainda, eles estão procurando evitar que algum concorrente crie ou
desenvolva junto aos seus clientes-alvo a percepção de que seria um banco mais eficiente
do que os demais existentes no mercado. É preciso, contudo, destacar que vários
entrevistados identificaram no Banco Personallité, pertencente ao Itaú, o banco que
conseguiu criar a percepção de um banco mais diferenciado do que os demais.
A busca pela criação e estabelecimento de diferenciais competitivos entre os bancos tem
exigido um permanente investimento na análise das informações existentes internamente
nas bases de dados destas instituições. Essas informações têm dado suporte ao
desenvolvimento de estratégias de criação e lançamento de produtos inovadores ou de
avaliação dos produtos lançados pela concorrência. Essas ações têm fornecido os requisitos
necessários para a inovação nos produtos financeiros e ou nos seus processos, indo em
“busca de diferenciais competitivos”, conforme afirmou o executivo do Unibanco. Além
disso, foram destacados o status e a importância que os executivos entrevistados atribuem
às bases de dados, por conterem praticamente todas as informações existentes sobre os
clientes. Consideram que um trabalho adequado de análise nessas bases de dados é um
valioso elemento na geração de novos produtos financeiros. Além disso, os executivos
demonstraram que seus bancos estão muito atentos à imagem e a reputação que estes detêm
junto ao mercado e ao público em geral.
Sobre o recurso conhecimento, não se percebeu uma preocupação relevante com a sua
gestão por parte dos entrevistados, mas os executivos dos dois grandes bancos de varejo da
amostra manifestaram o interesse e a preocupação de suas organizações em identificar, nas
empresas adquiridas, aqueles recursos humanos adequados, capacitados, habilitados e
identificados com os interesses dos novos controladores. Isso se deve, talvez, às sucessivas
aquisições que essas organizações fizeram no mercado brasileiro, de outras instituições
financeiras. Deve-se destacar, contudo, que um dos executivos foi bastante enfático na
importância para as organizações saberem selecionar aqueles recursos mais relevantes e
necessários de uma organização que foi adquirida, no sentido de preservar o conhecimento
específico que ela possui em algum negócio ou segmento que o banco tenha interesse. Por
outro lado, um dos executivos identificou que sua instituição, em um determinado
momento ocorreu uma significativa perda de conhecimento organizacional decorrente da
transferência involuntária de inúmeros funcionários para empresas concorrentes,
enfraquecendo a sua posição competitiva, confirmando uma observação de Cross e Baird
(2000).
Apesar disso, os executivos enfatizaram haver disponível hoje um melhor conhecimento
sobre os clientes do seu banco, embora possa ser verificada uma certa disparidade entre os
níveis e profundidade deste conhecimento que eles alegam dispor, principalmente entre
bancos públicos e privados. Entretanto, transformar esse conhecimento sobre os clientes em
produtos financeiros adequados e bem sucedidos nem sempre tem sido conseguido pelos
bancos da amostra. Os executivos dos bancos privados alegaram que suas organizações têm
obtido excelentes resultados a partir das análises dos perfis das diversas tipificações dos
seus clientes, posição não compartilhada por aqueles dos bancos públicos. Isso talvez se
deva ao acúmulo de experiências distintas quanto à utilização dos recursos de TI e dos
níveis de conhecimento organizacional existentes nas instituições. Essa posição parece estar
mais de acordo com as abordagens de heterogeneidade e ambigüidade causal apresentadas
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neste artigo, de modo que as deficiências relacionadas ao conhecimento podem estar
influenciando a inovação dentro destas organizações.
Busca-se na inovação a criação de um valor novo para o cliente, não necessariamente
associado a novos produtos. Para os entrevistados, inovar não significa apresentar algo
absolutamente novo, mas sim oferecer diferenciais de valor para o cliente, corroborando os
conceitos de Drucker (1998) e de Porter (1985). Para os executivos desses bancos, parece
que as inovações têm sido incrementais e têm origens principalmente externas, no ambiente
dos negócios financeiros, na concorrência e nos clientes. Eles também foram unânimes em
afirmar que a ocorrência de inovações radicais nesse segmento não deveria ocorrer mais.
Consideram que as inovações devem ser pequenas, mas que deveriam ocorrer em maior
número, de modo a potencializar alguma influência benéfica sobre toda a organização. É o
conceito de pequenas e incrementais inovações, visando propiciar uma vantagem
competitiva, embora todos eles tenham a percepção de que esta vantagem no segmento
bancário seja ainda menos duradoura, conforme sugere Grant (1991).
Apesar da inovação ser considerada essencial por Drucker (1999) e Roberts (1998), que
afirmam ser ela a única maneira de se obter uma vantagem competitiva em relação à
concorrência, outros autores ligados à Teoria dos Recursos não admitem essa
exclusividade, particularmente no setor financeiro, conforme exposto por Grant (1991).
Mesmo entre os executivos existe uma certa ambigüidade. Eles ressaltaram a sua
importância, mas divergem sobre a ênfase que deve ser dada à inovação pelos seus bancos.
As opiniões dos entrevistados, contudo, coincidem com as de Gopalakrishnan e Damanpour
(2000), defensores da opinião de que as organizações precisam oferecer um conjunto
mínimo de inovações, mesmo sabendo que elas serão rapidamente copiadas pela
concorrência, como também com as afirmações feitas por Grant (1991) e Collis e
Montgomery (1995). Os custos associados à adoção de políticas inovativas e os riscos
inerentes a este posicionamento, assumidos diferentemente em cada um dos bancos,
provocam a diferença na ênfase que estes poderiam atribuir à inovação. As restrições
impostas pela legislação foram consideradas relevantes e novamente isso parece ser mais
agudo nos bancos estatais.
Em relação à identificação das características dos produtos inovadores, as opiniões foram
parecidas. Elas variaram entre “criação de valor” ou “agregação de valor” mencionadas
pelos executivos da Nossa Caixa e da Caixa Econômica Federal, bem como “atendimento
das necessidades dos clientes”, destacado pelos executivos do Itaú e do Unibanco, ou ainda
“antecipação das necessidades dos clientes”. Os clientes parecem estar no centro das
preocupações desses executivos embora alguns deles reconheçam que estes têm sido, em
muitos casos, direcionados a utilizarem determinados produtos ou serviços criados pelos
bancos, de certa maneira, impositivamente.
A percepção da rapidez com que os produtos são copiados no mercado foi outro ponto
comum destacado pelos os executivos. Práticas citadas anteriormente como as pesquisas e o
acompanhamento do mercado, favorecem esta situação, além do fato de que eles
reconhecem que os bancos precisam oferecer o mesmo conjunto de produtos
disponibilizados pela concorrência. Dessa maneira, a busca pelo “diferencial competitivo” é
marcada por uma certa alternância no lançamento de produtos pelos concorrentes que se
utilizam, como no caso dos bancos estatais, de vantagens que algumas vezes não podem ser
reproduzidas pela concorrência. Por um lado, isto têm gerado vantagens de atuação para os
10
bancos estatais, pois lhes permite ter acesso a recursos e vantagens operacionais junto às
empresas do estado, como a administração pública direta e com os chamados “serviços
delegados do governo”, expressão utilizada pelo executivo da Nossa Caixa. Por outro lado,
destacaram as dificuldades operacionais causadas pela condição de ser estatal. Isso faz com
que as decisões sejam sempre mais morosas quando comparadas aos bancos privados, pois
todos os processos são regidos por legislação específica e própria que norteia o
relacionamento destas instituições com o mercado. Contudo, segundo uma visão da RBT,
as vantagens decorrentes dos serviços delegados do governo possuem algumas
características, como serem difíceis de imitação, não serem facilmente replicáveis e serem
imperfeitamente transferíveis. Essas características geraram, para os bancos estatais,
algumas vantagens competitivas em vários momentos. Contudo, existe uma contrapartida
que é a execução de serviços que nem sempre oferecem uma margem de rentabilidade
apropriada para as instituições bancárias estatais.
Dois pontos de vista distintos foram percebidos entre os executivos entrevistados. Alguns
deles alegaram que suas organizações destacam-se no mercado como empresas inovadoras,
enquanto outras assumiam a condição de seguidoras. Dessa maneira, suas opiniões
coincidiram com aquelas manifestadas por Carr (2003) que propõem que as organizações
passem a atuar como seguidoras. Alguns executivos afirmaram que, em decorrência das
dificuldades competitivas, a posição de seguidores era mais interessante e conveniente, em
alguns casos. Afinal, seria possível imitar os produtos de sucesso da concorrência, com
mais facilidade e com menores custos.
Em relação à diferenciação, citada como um dos dois elementos centrais de estratégia das
organizações (PORTER, 1985), é oportuno destacar o fato de que, apesar dos executivos
considerarem difícil a inovação no segmento bancário, os bancos procuram desenvolver
estratégias que criem junto ao mercado elementos de diferenciação. As abordagens de
diferenciação no mercado, conforme expostas por eles, parecem estar mais associadas à
imagem, à marca e a reputação da organização do que propriamente às características dos
recursos definidos por Grant (1991), Barney (1991) e Wernerfelt (1984).
Ao enfatizarem a influência dos fatores externos e internos na criação de uma fonte de
vantagem competitiva, os executivos destacaram o papel do acompanhamento da
concorrência na identificação de oportunidades de negócios. Citaram ainda a cultura
organizacional, a ação da alta administração, as competências individuais e a busca do
conhecimento relativo ao cliente como elementos mais significativos.
O valor da cultura organizacional (BARNEY, 1986) foi mais destacado pelos executivos
dos bancos privados como um elemento de grande relevância para suas instituições
desenvolverem processos de inovação contínua e, portanto, como um fator significativo
para a obtenção de uma vantagem competitiva. As entrevistas desta amostra corroboram a
Teoria dos Recursos (HALL, 1997; COLLIS e MONTGOMERY, 1995; BARNEY, 1991)
que destaca a influência que a cultura organizacional exerce sobre o desempenho das
organizações.
A ação da alta administração e a conseqüente qualidade do gestor foi também destacada
pelos executivos, sobre ela se constituir em um recurso chave na organização para a
obtenção de vantagens competitivas. Essa posição corrobora a afirmação de Barney (1991)
11
de que um gestor ou um time de gestores representam um recurso da firma que tem o
potencial de gerar uma vantagem competitiva sustentável.
A percepção do aumento da concorrência foi também um dos pontos de destaque nas
preocupações dos executivos. Praticamente todos eles ressaltaram a presente situação do
mercado nacional, embora as condições de desenvolvimento de competências em bancos
públicos e em privados sejam, sob alguns aspectos, distintas. O gestor do Lloyds TSB Bank
afirmou que durante vários anos este banco havia sido a principal financiadora
internacional de grandes contratos de exportação no país, tendo o banco lucrado muito com
essa “quase” exclusividade de financiamento a exportações de certos tipos de produtos de
alto valor agregado exportados pelo Brasil (ex: aviões da EMBRAER). Segundo ele, os
lucros auferidos foram muito superiores à média do mercado. Uma situação, contudo, que
foi revertida com a entrada de novos concorrentes no mercado, dotados de recursos
humanos qualificados para conduzirem essa categoria de negócios, obrigando-os a
buscarem outros segmentos de mercado para atuarem. Os executivos da Nossa Caixa e do
Unibanco destacaram que o aumento da concorrência tem sido benéfico para os clientes,
pois está exigindo dos bancos um maior dinamismo e uma maior atenção à satisfação de
suas necessidades, assim como uma melhoria nos produtos ofertados por eles.
A concentração bancária, outra questão tratada, é vista como facilitadora da incorporação
de maiores recursos, tanto aqueles relativos a conhecimento e capacidades para operarem
em determinados nichos de mercado que antes não operavam, bem como a ampliação de
seu capital físico e organizacional (BARNEY, 1991). Como exemplo, foi citada a aquisição
de bancos públicos estaduais por instituições financeiras privadas, que passaram a atuar
como agentes financeiros dos governos estaduais, situação essa de difícil imitação; o caso
do Banestado (Banco do Estado do Paraná), adquirido pelo Banco Itaú, serve como
exemplo. A aquisição de bancos estrangeiros também tem contribuído para que algumas
instituições nacionais ampliem a sua capacidade competitiva, pois passam a operar com
novos recursos internacionais, representados pelos relacionamentos previamente existentes
na instituição estrangeira adquirida.
A entrada de novos concorrentes, principalmente estrangeiros, tem preocupado os
executivos entrevistados, pois estas instituições possuem uma capacidade de alavancar
recursos no mercado internacional a um custo inferior àqueles obtidos pelas instituições
financeiras nacionais. Contudo, destacam ainda que alguns bancos nacionais estão
desenvolvendo uma significativa política de aquisições bancárias, ampliando, dessa forma,
sua capacidade de atuação nos mercados nacional e internacional.
Especificamente sobre a TI, ela é considerada relevante para a concepção de novos
produtos. Essa posição foi mais enfatizada por um dos bancos privados, tendo o executivo
entrevistado afirmado que todos os novos produtos da organização eram resultado do uso
intensivo dos recursos da TI e da análise inicial da respectiva carteira de clientes. Segundo
o executivo do Loyds TSB Bank, que é um banco de atacado, a TI é considerada apenas
como um recurso adicional e não necessariamente vital para o desenvolvimento dos seus
negócios, ainda que a instituição tenha a preocupação de disponibilizar aos seus clientes as
mais recentes tecnologias de informação existentes. Entretanto, a TI permite a criação de
produtos baseados puramente em tecnologia, evidenciando uma tendência de inovação que
está associada de maneira crescente à aplicação da TI em todas as operações bancárias.
12
Não obstante o valor da TI ser reconhecida pelos executivos, somente um deles enfatizou
que esta tem sido muito utilizada para identificar oportunidades de negócios. Isso talvez
esteja associado ao fato de que o seu banco implementa um conjunto de tecnologias
especificas para a análise de suas bases de dados de clientes há mais tempo que os demais
concorrentes. Pelo fato de ter adquirido maior experiência e eficiência nos processos
desenvolvidos, consegue criar produtos direcionados aos clientes-alvo de maneira mais
eficaz.
5 CONCLUSÕES
Uma das implicações diretas das características dos recursos relacionadas por Barney
(1991) e Grant (1991) é que a vantagem competitiva é mais facilmente sustentada em
mercados industriais do que em mercados financeiros. Grant (1991) reitera que nos
mercados financeiros o acesso fácil dos traders a financiamentos e informações torna a
vantagem competitiva fugaz. Essa percepção foi unânime entre todos os executivos que,
embora tenham afirmado que suas instituições apresentam uma grande capacidade
competitiva no mercado, evitaram utilizar a expressão “vantagem competitiva sustentável”
em relação aos demais concorrentes. Não obstante isso, algumas delas estavam
apresentando rentabilidades superiores à média do mercado (Bancos Itaú e Nossa Caixa).
Pode-se observar, contudo, conforme manifestado pelos executivos, que todas as
instituições têm procurado desenvolver respostas mais ágeis à concorrência, inclusive
lançando novos produtos ou redesenhando os seus processos de negócios, ou mesmo uma
solução inovadora incremental junto ao mercado, caracterizando-se como um first mover.
Ressalta-se, porém, que a busca por ser um first mover não é prioridade entre os executivos,
estando mais de acordo com Carr (2003), e não corroborando as afirmações de Drucker
(1998), de Porter (1997), de Roberts (1998). A inovação nos produtos não é percebida
claramente como um fator de diferenciação competitiva para esses bancos, pois outros
aspectos são tidos como mais relevantes, tais como a confiança e a conveniência que
buscam proporcionar aos seus clientes. Além disso, também não se observou preocupação
com investimentos na melhoria da capacidade de inovação nestas instituições embora
alguns autores afirmem que a TI cria possibilidades que não eram economicamente viáveis
no passado (BROWN e HAGEL III, 2003). As inovações são consideradas necessárias,
mas os fatores organizacionais que poderiam facilitá-las não parecem estar sendo
enfatizados. Os riscos presentes nas operações bancárias reforçam ainda mais a postura
cautelosa observada neste segmento.
A prática de imitação, comum no segmento bancário, pode contribuir para a manutenção da
competição entre as instituições, mas não permite a elas a obtenção de vantagens
competitivas. Como praticamente não existem barreiras à imitação, torna-se ainda mais
pertinente o conservadorismo demonstrado pelos executivos em relação aos riscos
envolvidos em políticas de inovações. Além disso, e de modo distinto de outras indústrias,
o produto financeiro criado não dispõe de mecanismos efetivos de proteção, tais como
patentes ou marcas registradas, que possam garantir-lhe um considerável nível de proteção
intelectual contra a imitação nesse segmento. A maior relevância nesse caso parece estar de
acordo com a afirmação de Brown e Hagel III (2003) de que a extração de valor da TI
requer inovação nas práticas de negócios e que os impactos econômicos da TI são oriundos
principalmente de inovações incrementais ao invés de iniciativas do tipo “big bang”, alusão
13
a inovações radicais, bem como à influência que as habilidades administrativas de TI
podem exercer sobre a organização, de modo a obter uma vantagem competitiva. Essa
postura em relação a inovações incrementais foi reforçada pela maioria dos executivos
entrevistados.
Certamente a TI afeta a competitividade no segmento bancário, mas a diferenciação que
poderia proporcionar está mais associada às habilidades que as organizações possuem no
seu manuseio, na sua administração, conforme afirmado por Barney, Fuerst e Mata (1995).
Essas habilidades estão associadas, segundo a literatura, à ambigüidade causal, à cultura
organizacional, a um acúmulo histórico de experiências e capacitações únicas para aquele
banco e que dificilmente poderiam ser reproduzidas de modo igual pela concorrência, como
destacam Hall (1997), Barney, Fuerst e Mata (1995), e Diericky e Cool (1989). A
influência desses fatores na criação de competências essenciais foi percebida nas
entrevistas, confirmando as manifestações presentes na literatura da importância que eles
adquirem. Como essas habilidades foram citadas aleatoriamente, isso talvez evidencie as
dificuldades que alguns desses bancos possuem para avaliarem e utilizarem os recursos da
TI como um diferencial competitivo, posição discutida por Carr (2003), ao negar a
possibilidade desses recursos gerarem uma vantagem competitiva sustentável. Além disso,
e em concordância com a manifestação de Carr, os executivos apresentaram posições
distintas em relação à importância da TI como um elemento de criação de novas
oportunidades de negócios, o que talvez revele uma significativa diferenciação do momento
tecnológico vivenciado pelos bancos da amostra. Alguns deles foram enfáticos ao
afirmarem que a TI não tem criado essas oportunidades, embora os executivos dos bancos
privados nacionais tenham alegado que parte da alta rentabilidade verificada nos últimos
anos deve-se, em parte, à grande automação das operações dos bancos e da implementação
das novas tecnologias ligadas à internet.
A tecnologia que os produtos financeiros agregam, representada principalmente pelos
softwares, pode ser adquirida livremente no mercado e, com freqüência, as empresas que os
comercializam oferecem serviços de suporte e consultoria. Como a implantação de novas
tecnologias pode ser agilizada de maneira quase simultânea entre concorrentes, ao serem
disponibilizadas soluções muito similares para clientes de bancos diferentes, torna-se ainda
mais reduzida a possibilidade de que estes recursos criem, por si só, fontes de vantagens
para qualquer um deles, corroborando a afirmação de Barney (1991), que a tecnologia não
está incluída como uma fonte de imitabilidade imperfeita.
Quanto ao setor estatal, o exercício das atividades bancárias para este grupo de empresas
enfrenta dificuldades na contratação de pessoal habilitado para o exercício de novas
funções, principalmente ligadas àquelas atividades novas, o que acaba tornando-os menos
competitivos em relação ao mercado, pois muitas vezes não oferecem todos os produtos e
serviços disponibilizados pelos bancos privados. No que se refere às questões do
conhecimento, observou-se haver uma certa desvantagem da parte dos bancos estatais, que
não manifestaram claramente a existência de estratégias específicas para realizarem a
gestão deste recurso.Finalmente, a ambigüidade causal, embora não garanta a manutenção
da vantagem competitiva (REED e DeFILLIPI, 1990) parece ser um recurso ainda mais
significativo contra a prática corriqueira da imitação dentro do segmento bancário,
resultado de uma combinação de recursos que não podem ser facilmente imitados ou
substituídos, a denominada heterogeneidade da firma, o que talvez possa ser assumido que
14
os ativos intangíveis dessas organizações sejam mais significativos e importantes do que
aqueles manifestados pelos entrevistados, ou conforme expresso por Reed e DeFillipi
(1992), que as firmas de sucesso na maioria das indústrias possuem um ou mais tipos de
ativos intangíveis, tais como o know-how tecnológico.
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1 A vantagem competitiva nas organizações financeiras