Anais Eletrônicos do IV Seminário Nacional Literatura e Cultura
São Cristóvão/SE: GELIC/UFS, V. 4, 3 e 4 de maio de 2012. ISSN: 2175-4128
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CONTEXTO DA ESCRITA DE JANE AUSTEN
Dignamara Pereira de Almeida Sousa (UFCG)
No final do século XVIII e ao longo do século XIX ocorreram mudanças
fundamentais na ordem social britânica. A aristocracia cedeu lugar à nova classe em
ascensão que tinha o capital proveniente das atividades comerciais e industriais e
das colônias, e não mais propriedades e herança, como suporte à sua supremacia.
Nesse período de transição, a classe média tentou sua consolidação por meio do
dinheiro, do poder e também da hegemonia cultural. Um novo conjunto de valores
e conceitos morais foi necessário a essas modificações, e uma nova concepção de
casamento foi difundida – o casamento por amor. Esse sentimento aliado à
fidelidade foi muito importante para a nova postura na relação conjugal. Nesse
contexto surge um modelo referencial da mulher: ela seria a dona de casa exemplar;
àquela que instruiria seus filhos numa educação básica sobre a moral, a religião e
bons modos para que eles pudessem se comportar diante da sociedade. Ela seria o
anjo do lar, um exemplo a ser seguido.
Posto isso, sabe-se que durante um longo período as vozes femininas foram
escassas, contudo, após o século XVIII um número cada vez maior de mulheres
conseguiu deixar provas de sua existência na história, não apenas como senhoras
do lar, mas, muitas vezes através da própria escrita, tanto de diários e cartas,
quanto da escrita literária ou filosófica.
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Mesmo sendo a literatura predominantemente escrita por homens –
sobretudo até o século XIX - poucas foram às mulheres que puderam ou
conseguiram ir contra este fato, se aventurando no campo literário. As que optaram
pela escrita sofreram tanto com as pressões da família e da sociedade por tal escolha
quanto com críticas relacionadas à suposta falta de qualificação e capacidade de
produzirem obras de boa qualidade. Devido a isso, poucas mulheres seguiram por
esse caminho, sendo que boa parte delas optou por permanecer anônima, uma
forma de sofrer menos represálias por parte da crítica e até de familiares contrários
à produção literária feminina.
Com relação ao uso do pseudônimo pelas mulheres escritoras, Showalter
(1977, p.19; nossa tradução) considera que:
Uma das muitas indicações de que esta geração viu o desejo de escrever
como uma vocação em conflito direto com o status delas enquanto
mulheres é o surgimento do pseudônimo masculino. Como a folha de figo
de Eva, o pseudônimo masculino assinala a perda da inocência. Em sua
compreensão radical do jogo de encenação necessário pelos esforços das
mulheres para participarem da cultura literária predominante, o
pseudônimo é um forte marcador da mudança histórica.
Foi, de certo modo, o sentimento de castidade que ditou o anonimato às
mulheres escritoras. Alguns exemplos delas são: Currel Bell, pseudônimo de
Charlotte Brontë (1816-55), George Eliot, pseudônimo de Mary Ann Evans (1819-80)
e George Sand, pseudônimo de Amandine-Aurore-Lucile Dupin (1804-76), todas
vítimas de conflito interno e externo acerca do papel, condição e lugar das mulheres
na sociedade, de modo que buscaram se esconder atrás de nomes masculinos, até
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certo ponto, rendidas às convenções implantadas pelo sexo dominante ou levadas
pela opressão imposta por ele para iniciar uma busca pelo próprio espaço no
universo editorial. De fato, grande parte delas não era incentivada a ser artista e, se
elas tivessem um pendor para a escrita literária eram levadas a crer que uma
mulher escrever um livro seria ridículo, e até mesmo mostrar-se-iam perturbadas,
conforme discutem Woolf (2004) e Gilbert & Gubar (1984).
Além disso, muitas mulheres escritoras – a exemplo da própria Jane Austen que publicaram suas obras no fim do século XVIII e início do século XIX, optou pelo
anonimato em suas obras, sobretudo devido ao fato de que havia, na sua época,
uma concepção generalizada de que homens e mulheres possuíam capacidades
naturais bastante diferenciadas e, por esse motivo, não haveria igualdade entre os
sexos, principalmente em relação à educação, negócios e postura perante a
sociedade, pois, para as mulheres “haveria sempre aquela afirmativa - você não
pode fazer isto, você é incapaz de fazer aquilo - contra a qual protestar e a ser
superada” (WOOLF, 2004, p. 61).
Ainda assim, a luta silenciosa de algumas precursoras inglesas, como Fanny
Burney (1752- 1840) e Aphra Behn (1640-89), contribuiu para uma extrema e rica
produção literária escrita por mulheres no final do século XVIII. A partir dessa
época elas começaram a ganhar dinheiro como escritoras. Escrever tornou-se não
um mero sinal de loucura, como muitos diziam acerca das escritoras, mas passou a
ser um sinal prático. O certo é que muitas delas passaram a viver do que saia da
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própria pena e passaram a contribuir financeiramente para o pagamento de
despesas domésticas e/ou pessoais.
Como as publicações eram e são uma ocupação pública, as mulheres
escritoras entraram em choque com os papéis de esposa, mãe e filha que cabiam a
elas, atacando as características mais frisadas da educação de uma moça deste
período: a modéstia e a castidade. Ainda assim, a crescente produção e valorização
do gênero romanesco, bem como a intensificação da presença da escrita feminina no
mundo das letras, principalmente a partir dos anos 1840, tornou o trabalho de
romancista uma profissão reconhecida, o que, de fato, abriu muitas portas no
universo literário para ambos os sexos.
Contudo, grande parte dos romances femininos foi esmagada pela tradição
literária masculina, pois muitos desses escritos tratavam de temas considerados
insignificantes para a cultura falocêntrica. As romancistas que conseguiram se
sobressair foram duramente atacadas pela crítica androcêntrica, já que toda a
estrutura do romance do início século XIX era levantada e avaliada por essa
autoridade externa, muitas delas alteraram seus próprios valores em respeito à
opinião alheia. Entretanto, como afirma Woolf (2004, p.83):
Apenas Jane Austen conseguiu, e Emily Brontë (...) Elas escreveram como
as mulheres escrevem, e não como os homens. Dentre todos os milhares de
mulheres que escreveram romances na época, somente elas ignoraram por
completo as admoestações perpétuas do eterno pedagogo _ escreva isto,
pense aquilo. Somente elas foram surdas àquela voz persistente, ora
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resmungona, ora paternalista, ora dominadora, ora pesarosa, ora chocada,
ora enraivecida, ora avuncular.
Entre as escritoras inglesas do século XIX, Jane Austen pode ser considerada
uma porta voz do universo feminino dessa época. Ela nasceu em 16 de dezembro de
1775, em Steventon, Hampshire, Inglaterra, sendo a sétima filha do reverendo
George Austen e de sua esposa Cassandra. A família da escritora pertencia à classe
denominada gentry (classe média ou baixa aristocracia). O pai de Austen teve certas
dificuldades financeiras que o impossibilitaram de deixar recursos para suas filhas
sobreviverem no futuro, deixando-as, após a sua morte, à mercê da ajuda dos
irmãos.
A família Austen era formada por oito filhos, sendo Jane e sua irmã mais
velha, Cassandra, as únicas mulheres. Entre 1785 e 1786, as duas jovens foram
alunas de um internato em Reading; a educação que as duas irmãs receberam ali foi
a única recebida fora do âmbito familiar. Por outro lado, sabe-se que o reverendo
Austen tinha uma ampla biblioteca em casa, o que estimulou a todos os membros
da família a tornarem-se ávidos leitores, sobretudo de romance. Austen
apresentava-se como uma leitora assídua de grandes escritores. A lista de autores
mencionados nas cartas, trocadas entre ela e seus familiares, é imensa: Fanny
Burney, Ann Lennox, Cowper, Crabble, e os grandes Richardson, Scott, Goldsmith,
Pope, Byron, além de uma infinidade de outros nomes que aparecem e reaparecem
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ao longo das cartas, evidenciando uma escritora, também leitora, experiente e
atenta.
Entre os seis livros principais de Jane Austen, pode-se perceber o retrato da
vulnerabilidade de jovens tendo que viver sob as regras e responsabilidades a favor
do bom nome de suas famílias e suas próprias reputações. Através das situações
vividas por suas heroínas, algumas ridículas, muitas engraçadas, desafiadoras e
outras dignas de pena, o universo feminino do século XIX é apresentado de maneira
clara e, de modo geral, representa a universalidade da experiência humana.
Austen deixou seis obras acabadas e três inacabadas. Sua fama perdura
através dos seus seis melhores trabalhos: Sense and Sensibility (Razão e Sensibilidade,
1811), Pride and Prejudice (Orgulho e Preconceito, 1813), Mansfield Park (1814), Emma
(1815), Persuasion (Persuasão, 1818) e Northanger Abbey (A Abadia de Northanger, 1818),
sendo essas duas últimas publicadas após a morte da autora por seu irmão Henry
Austen. Nas quatro obras publicadas ainda em vida da autora, os livros são
assinados “By a Lady” – essa questão do anonimato nas publicação será discutida
adiante - mas quando Northanger Abbey e Persuasion foram publicadas, seu irmão
explicou a autoria de todas as obras austenianas através de um prefácio assinado
por ele.
Lady Susan (escrito em 1794 e 1805), The Brothers (iniciado em 1817, deixado
incompleto e publicado em 1925 com o título de Sanditon) e Os Watsons (escrito por
volta de 1804 e deixado inacabado, foi terminado por sua sobrinha). Deixou
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também um esquema para um novo romance, intitulado Plan of a Novel. Em 1816 a
saúde da autora ficou debilitada, chegando a falecer em 1817, do que seria
atualmente o Mal de Addison ou de tuberculose bovina, aos 41 anos de idade. Suas
obras, todas publicadas até 1818, inauguraram um período de produção literária
sistemática escrita por mulheres, a exemplo de Mary Shelley, das irmãs Brontës, de
George Eliot, dentre outras, que culminou com a formação de uma tradição literária
de autoria feminina (GILBERT e GUBAR, 1996).
Austen foi uma escritora que, por meio de sua obra e postura pessoal,
contestou (mesmo que por muitas vezes reproduzindo a ideologia de seu tempo a
pretexto da crítica), a condição de invisibilidade conferida as suas iguais ou, pelo
menos, produziu uma posição emergente sobre a questão de gênero. Como afirma
Ferreira (2010, p. 4-5), ela:
(...) apresentou em sua obra um novo tipo de herói, um novo papel para o
homem, para a mulher e uma nova concepção de casamento no qual o
elemento amor é acrescentado. Na esfera do doméstico, mundo que ela
bem conheceu, Jane Austen apresentou visões alternativas para suas
heroínas e dramatizou a situação da mulher em seus romances.
Apresentou os conflitos de uma comunidade de mulheres que viviam
nesse contexto histórico de transição da aristocracia decadente para
burguesia em ascensão.
De fato, Austen valorizava em suas heroínas não o modelo de mulher
estereotipado pela sociedade patriarcal, tais como o de perfeição e sensibilidade, em
vez disso ela atentava para a predominância da racionalidade em suas
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protagonistas, a exemplo de Elizabeth Bennet em Orgulho e Preconceito e Elinor
Dashwood em Razão e Sensibilidade.
É importante lembrar que Austen escrevia num contexto patriarcal que
herdara do Iluminismo a naturalização da categoria de gênero e que via no
casamento e no amor a tentativa de perpetuação desse poder e da nova classe social
que surgia. Entretanto, em vez de uma intensificação dos sentimentos e da
celebração do amor, ela estava interessada nas mudanças pessoais e de conduta
(refletidas em suas relações sociais) pelas quais seus protagonistas deveriam passar,
na tentativa de mostrar que tanto os homens como as mulheres poderiam
relacionar-se igualmente. Como pode ser observado nas reflexões de Gilbert &
Gubar (1996, p.329; tradução nossa):
(...) ao se concentrar tanto no romance sentimental e na forma epistolar ou
romance gótico, Austen comicamente criticava a supervalorização do
amor, a falta de educação das mulheres, os subterfúgios do mercado de
casamento, a rivalidade entre mulheres pela aprovação masculina, o culto
feminino à fraqueza e dependência, a discrepância entre a esfera privada
das mulheres e a história (masculina) pública.
Dentro dos temas abordados nas obras de Austen está a proposta por um
novo tipo de homem, através da busca pela igualdade, pelo respeito mútuo entre
ambos os sexos e por uma nova organização social. Visto por esta ótica, os textos
austenianos, através do uso da ironia e do tom cômico, não se tratam de romances
que supervalorizam o amor ou que apenas retratam mulheres em busca de um bom
casamento. Eles são, na verdade, uma critica perspicaz aos valores pregados pela
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sua sociedade que tornavam as mulheres seres domesticados e passivos, numa
busca frenética pelo casamento. Com sua sagacidade Austen foi aos poucos sendo
temida por sua linguagem irônica e atiçadora, de modo que foi “amada em casa,
mas temida pelos estranhos, de morder a língua, mas terna de coração” (WOOLF,
1963, p. 16; tradução nossa)
Moers, importante crítica feminista americana, discute em seu livro, Literary
women: the great writers (1976) – o primeiro grande estudo sobre mulheres escritoras
anglo-americanas - os temas abordados nas obras de Jane Austen. A autora enfatiza
que Austen preocupava-se em apontar os fatos sociais, mas principalmente, o
comportamento dos ingleses no século XIX e a crítica ao mercado matrimonial: “O
Casamento torna o Dinheiro um negócio sério na ficção de Austen; sua seriedade ao
tratar do dinheiro torna o casamento importante, como de fato ele era na Inglaterra
dos seus dias”, comenta Moers (1976, p. 67).
Moers (1976) aponta que Austen preocupava-se com a visão que algumas
mulheres tinham do matrimônio, já que para grande parte delas era o fim único, de
modo que, nenhuma mulher que tivesse a mente infestada pelo pensamento
patriarcal queria terminar sua vida como uma solteirona – o que significava um
opróbrio para qualquer mulher, visto que era sinônimo de rejeição completa e
dependência dos parentes que as quisesse sustentar. Assim, elas se arriscavam em
um casamento sem ter muita noção de como seria sua vida conjugal. Segundo
Moers, Austen:
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(...) se importava profundamente e primeiramente com as jovens, porque
ela tinha um profundo desrespeito por pais, especialmente pelas figuras
paternas, e por ver no ato da escolha na vida de uma mulher como o de
arranjar um casamento como algo que dependia sua saúde física e
espiritual, Austen se voltou contra (nesse caso era raramente satírica) a
vida econômica dos seus heróis. Heróis eram maridos em potencial, um
papel monumental. O que estou sugerindo é que o realismo de Austen ao
tratar do dinheiro era em seu caso um fenômeno essencialmente feminino,
o resultado de sua profunda preocupação com a qualidade da vida de uma
mulher no casamento (MOERS, 1976, p. 71; tradução nossa).
Além disso, de Razão e Sensibilidade à Persuasão, Austen retrata moças da
classe média inglesa que fogem das restrições da vida familiar através do
casamento. As irmãs Dashwood de Razão e Sensibilidade temem perder a
propriedade da família para seu meio irmão, John Dashwood. As irmãs Bennet de
Orgulho e Preconceito acreditam que após a morte do pai, os bens da família irão
passar para o primo Mr. Collins. O receio delas deve-se ao fato de que não
poderiam herdar nada, e como não tinham irmãos, os bens do pai passariam para o
parente homem mais próximo após a sua morte. Já Emma, heroína da obra
homônima, teve que aprender a respeitar a ética e autoridade econômica de Mr.
Knightley. Percebe-se que cada uma dessas protagonistas é, de alguma forma,
dependente do poder masculino, seja pela realidade econômica, caso das heroínas
dos primeiros romances, que não podem herdar os bens da família por serem
mulheres, seja pela necessidade de aprovação, caso de Emma, que ao descobrir-se
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apaixonada por Mr. Knightley tenta mostrar-se diferente para ele, que antes a
criticara.
Na Verdade, Austen foi uma escritora impessoal e muitas vezes
incompreensível para aqueles que buscavam nos seus romances apenas histórias de
amor ou algo que fosse incompatível com os valores sociais. As obras dela abrem
uma brecha para futuras manifestações dos direitos das mulheres enclausuradas
por uma sociedade opressora. Entretanto, através do uso da ironia ela apresenta a
submissão feminina nas entrelinhas dos diálogos dos seus personagens. Por isso, ela
foi incompreendida por romancistas posteriores, tais como Charlotte Brontë (181655), a qual criticava duramente as obras da sua conterrânea, por tratar apenas – na
visão de Brontë - de mulheres conformadas com sua condição.
Outro crítico de Asuten foi o escritor e filósofo americano Ralph Waldo
Emerson. Emerson acreditava que Austen não deixava suas heroínas atingir a
verdadeira liberdade da alma das convenções sociais. Mas isso era entender mal a
autora inglesa, a qual “compreendia que a função da convenção era liberar a
vontade, mesmo que a tendência da convenção fosse sufocar a individualidade, sem
a qual a vontade não tinha importância” (BLOOM, 2001, p. 250). Ainda assim, ela
fez o que era possível dentro dos seus limites, sobretudo porque
Jane Austen manteve-se compacta; ela nunca traspassou suas fronteiras.
Nunca, mesmo na idade emocional de quinze anos, ela atacou alguém com
vergonha, nem obliterou um sarcasmo em um espasmo de compaixão,
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nem manchou um esboço numa névoa de rapsódia (...) e a linha limite é
perfeitamente distinta (WOOLF, 1963, p. 17-18; tradução nossa).
O certo é que, sem Jane Austen, George Sand, George Eliot, e as Brontë, não
haveria o que, decisivamente, hoje se chama de uma tradição literária feminina.
Cada uma dessas escritoras contribuiu à sua maneira, seguindo o próprio estilo,
enfrentando e desconstruindo a idéia de cânone literário ocidental que silenciou
muitas das suas iguais. Ao criarem heróis e anti-heróis, essas mulheres quebraram,
ou pelo menos, colocaram em vista, os estereótipos criados por essa cultura
patriarcal que excluía os que eles consideravam está à margem da cultura: as
mulheres, os negros e estrangeiros, soltando a voz que por muitos anos permaneceu
calada.
REFERÊNCIAS
AUSTEN, Jane. Orgulho e Preconceito. São Paulo: Editora Landmark, 2008(Tradução e
notas Marcella Furtado)
BLOOM, Harold. O cânone ocidental: o livro e as escolas do tempo. Rio de Janeiro:
Editora Objetiva, 2001.
FERREIRA, Carla Alexandra. Jane Austen revisitada: além de histórias de amor e
casamento. In: 1 COLÓQUIO INTERNACIONAL DE ESTUDOS LINGUÍSTICOS E
LITERÁRIOS e 4 COLÓQUIO DE ESTUDOS LINGUÍSTICOS E LITERÁRIOS, 1,
2010, Maringá. Jane Austen revisitada: além de história de amor e casamento. Maringá:
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UEM-PLE, 2010. p. 1-10. Disponível em: < http://anais.cielli.com.br/ficha > Acesso:
15 de março de 2012.
GILBERT, Sandra & SUSAN, Gubar. The Norton anthology of literature by women: the
traditions in English. 2nd edition. New York: W.W. Norton & Company, Inc, 1996.
_____. The Madwoman in the attic: the woman writer and the Nineteenth-century
literary imagination. Boston: Yale University Press, 1984.
MOERS, Ellen. Literary women: the great writers. New York: Oxford University Press,
1976.
SHOWALTER, Elaine. A literature of their own: British women novelists from Brontë
to Lessing. New Jersey: Princeton University Press, 1977.
WOOLF, Virginia. Jane Austen. In: WATT, Ian. Jane Austen: A Collection of critical
essays. Englewood Cliffs, N.J.: Prentice-Hall, INC., 1963.
_____. Um teto todo seu. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2004(Tradução de Vera
Ribeiro).
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CONTEXTO DA ESCRITA DE JANE AUSTEN