COMO ESTIMAR A PROBABILIDADE DE UM ACONTECIMENTO POR SIMULAÇÃO
Maria Eugénia Graça Martins
[email protected]
Pretendemos com este pequeno texto dar a conhecer de uma forma simples e introdutória um processo que
pode ser utilizado para estimar a probabilidade de alguns acontecimentos — a simulação. Esta técnica, como
se verá, baseia-se na interpretação frequencista de probabilidade. O meio utilizado para proceder às simulações
foi a folha de Excel do computador.
A maior parte dos exemplos apresentados foram retirados de outros textos da minha autoria ou co-autoria,
que serão indicados no final como bibliografia.
Como texto introdutório, muito ficou por dizer e algumas vezes tive dúvidas de quais os exemplos que melhor poderiam ilustrar esta técnica. De qualquer modo fica sempre a minha disponibilidade para quaisquer dúvidas que possam ter sido suscitadas (ou não...) por estas folhas.
Como estimar a probabilidade de um acontecimento por simulação
Introdução
O termo Probabilidade é utilizado todos os dias de forma mais ou menos intuitiva, pois nos mais variados aspectos da
nossa vida, está presente a incerteza:
Dizemos:
􏰀 que é pouco provável que chova, se não avistarmos nuvens;
􏰀 que a probabilidade do próximo bebé, de uma determinada família, ser do sexo masculino é aproximadamente 50%; 􏰀 que a probabilidade de lançar uma moeda de 1 euro ao ar e sair a face Euro, é 50%;
􏰀que a probabilidade de ganhar no Euromilhões é quase nula.;
Todos estes exemplos têm uma característica comum:
􏰁 não se consegue prever com exactidão e de antemão, qual o resultado da situação de incerteza.
Ao emitirmos um juízo de valor (como fizemos em alguns dos exemplos considerados), estamos a exprimir o nosso grau
de convicção na realização de algum acontecimento, recorrendo, embora intuitivamente, à frequência relativa com que
o acontecimento se pode repetir.
A probabilidade está presente sempre que estivermos perante um fenómeno aleatório.
Fenómenos aleatórios.—São fenómenos para os quais os resultados das realizações individuais são incertos, mas
em que se admite ser possível encontrar um padrão genérico de comportamento, ou uma regularidade a longo termo,
isto é, para um grande número de realizações do fenómeno.
Experiência aleatória.—À realização do fenómeno aleatório chamamos experiência aleatória. Vamos admitir que
estas experiências se podem repetir as vezes que quisermos e sempre nas mesmas condições.
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Assim, no caso do lançamento da moeda a experiência aleatória consiste em lançar a moeda ao ar e verificar qual a
face que fica virada para cima. A experiência é aleatória porque não sabemos, em cada lançamento, se é a face Euro ou
a face Nacional que vai ficar virada para cima, embora a experiência se repita nas mesmas condições.
Em contrapartida, a experiência que consiste em lançar a moeda ao ar e ver se cai, já não é aleatória! Neste caso não
estamos perante um fenómeno aleatório…
Para fixar ideias.—A probabilidade é uma propriedade associada a um fenómeno aleatório, que se possa repetir um
grande número de vezes, nas mesmas condições, tendo por base o facto de que a aleatoriedade presente produz um padrão de comportamento, ao fim de muitas repetições, isto é, à medida que o número de realizações da experiência aleatória, associada a um fenómeno aleatório aumenta, o comportamento do fenómeno torna-se «previsível»!!!.
Afinal o acaso pode ser governado…!
Modelo de probabilidade.—A caracterização de um fenómeno aleatório pressupõe a definição de um modelo de
probabilidade, associado, que consiste:
􏰁 Na identificação de todos os resultados possíveis quando se realiza o fenómeno aleatório — espaço de resultados.
􏰁Na atribuição de um número a cada resultado, a que chama-mos probabilidade. Esta atribuição tem de satisfazer alguns critérios (uma probabilidade deve ser um número não negativo e a soma das probabilidades atribuídas a todos os
resultados – acontecimentos elementares, que compõem o espaço de resultados, deve ser 1).
Acontecimento.—É um conjunto formado por um ou mais resultados do espaço de resultados. Um acontecimento
elementar é aquele que é constituído por um único resultado.
Probabilidade de um acontecimento.—A probabilidade de um acontecimento A representa-se por P(A) e é
igual à soma das probabilidades dos acontecimentos elementares que compõem A. Por exemplo, se considerarmos o fenómeno aleatório do lançamento de um dado equilibrado e definirmos o modelo de probabilidade que associa a cada
face a probabilidade 1/6, então a probabilidade da saída de uma face com um número par de pintas é 3/6, já que o acontecimento de interesse é constituído por 3 acontecimentos elementares, cada um com probabilidade 1/6.
No entanto, mesmo tendo-se definido o modelo associado a um fenómeno aleatório, nem sempre é fácil obter a probabilidade de um acontecimento A, que lhe esteja associado. Por exemplo, se lançarmos 10 vezes uma moeda de um euro,
equilibrada, o cálculo teórico da probabilidade do acontecimento «obter 4 ou mais faces Euro ou Nacional seguidas»
não é acessível a este nível.
Como obter então a probabilidade do acontecimento?
A única solução será repetir muitas vezes a experiência de lançar a moeda 10 vezes e estimar a probabilidade do acontecimento, pela proporção de vezes em que a face Euro ou a face Nacional aparece 4 ou mais vezes seguidas, em sequências de 10 lançamentos.
O processo que acabámos de descrever tem por base a essência do que é um fenómeno aleatório (pode-se repetir…),
tornando possível a definição de:
Probabilidade.—(experimental ou frequencista) do acontecimento A como sendo o valor à volta do qual tende a estabilizar a frequência relativa da realização de A, num grande número de repetições da experiência aleatória(realizações
do fenómeno aleatório…).
O que é a simulação?
No exemplo anterior, será então necessário estar com este trabalho de lançar a moeda muitas e muitas vezes?
Não! O comportamento aleatório do lançamento da moeda pode ser imitado, utilizando a tecnologia, e neste caso dizemos que estamos a simular a realização do fenómeno.
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Simulação
Simulação.—processo artificial utilizado para imitar o comportamento de um fenómeno aleatório, utilizando, de
um modo geral, números aleatórios.
Dígitos aleatórios.—Uma tabela de dígitos aleatórios é uma listagem dos dígitos 0, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8 ou 9 tal que:
• qualquer um dos dígitos considerados tem igual possibilidade de figurar em qualquer posição da lista;
• a posição em que figura cada dígito é independente das posições dos outros dígitos
Exemplo de uma parte de uma tabela de dígitos aleatórios:
101 19223
95034 05756
28713
96409 12531
42544 82853
102
103
104
105
106
107
108
47150
71709
38889
94007
35013
57890
72024
01927
00095
60227
91481
72765
47511
24943
27754
32863
40011
60779
85089
81676
61790
82425
82226
48767
17297
50211
94383
87964
73676
5467
52711
95592
68417
82739
60940
99400
77558
93074
69971
15529
20807
17868
42648
29485
85848
53791
57067
55300
90656
36290
90056
52573
59335
47487
14893
18883
A partir da tabela de dígitos aleatórios podem-se obter números aleatórios de 2 dígitos — qualquer par dos 100 pares
possíveis 00, 01, …, 98, 99, tem igual probabilidade de ser seleccionado; de 3 dígitos — qualquer triplo dos 1000 triplos
possíveis 000, 001, …, 998, 999, tem igual probabilidade de ser seleccionado, etc., tomando os dígitos da tabela 2 a 2, 3
a 3, etc., a partir de uma linha qualquer e percorrendo-a da esquerda para a direita.
Hoje em dia, existe a possibilidade de utilizar o computador ou uma simples máquina de calcular para gerar os números aleatórios. No entanto, convém ter presente que os números que se obtêm são pseudo-aleatórios, já que é um
mecanismo determinista que lhes dá origem, embora se comportem como números aleatórios.
A função RAND() e a função RANDBETWEEN(A;B) do Excel
Hoje em dia já não há necessidade de se utilizarem as tabelas de dígitos aleatórios e sempre que necessário utilizamos
o computador ou a máquina de calcular para os gerar. No entanto, convém ter presente que os números que se obtêm
são números pseudo aleatórios (NPA), já que é um mecanismo determinista que lhes dá origem, embora se comportem
como números aleatórios (passam numa bateria de testes destinados a confirmar a sua aleatoriedade)
Mais geralmente, quando falamos em números aleatórios, sem qualquer outra referência, não nos estamos a referir
explicitamente a números inteiros, mas sim a números reais do intervalo [0, 1]. Os algoritmos de geração de números
pseudo-aleatórios estão concebidos de modo a que ao considerar uma qualquer sequência de números gerados se obtenha aproximadamente a mesma proporção de observações em sub intervalos de igual amplitude do intervalo [0,1]. Assim, por exemplo, se se fizer correr o algoritmo 100 vezes, é de esperar que caiam 25 dos números gerados em cada quarto do intervalo [0,1].
A função RAND
No Excel, os números pseudo-aleatórios (no intervalo [0,1]) são gerados utilizando a função RAND():
Exemplo de 100 números pseudo-aleatórios obtidos através da função RAND() do Excel:
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Para contar quantos números pertencem a cada intervalo, usamos a função COUNTIF, do Excel:
Como se verifica da tabela anterior, 25 números pertencem ao intervalo [0;0,25[, 24 ao intervalo [0,25;0,50[, 26 ao intervalo [0,50;0,75[ e 24 ao intervalo [0,75;1[. Se gerarmos outros 100 números obteremos outros valores, não necessariamente tão próximos (ou iguais) de 25 como os anteriores.
Nota.—Para obter números reais entre a e b basta utilizar a expressão RAND()*(b-a)+a
A função RANDBETWEEN
Para obter números pseudo-aleatórios inteiros entre M e N, utiliza-se a função RANDBETWEEN(M;N), com M e
N inteiros e M menor que N.
Por exemplo, para simularmos o lançamento de um dado (equilibrado), inserimos a função RANDBETWEEN(1;6)
em 500 células (de A1 até J50) da folha de Excel
Utilizando mais uma vez a função COUNTIF, obtivemos a distribuição de frequência dos números gerados.
Às frequências absolutas e relativas do 1, 2, ... e 6, respectivamente nas colunas M e N, juntámos na coluna O as probabilidades de, no lançamento de um dado equilibrado, se obter uma face com aquele número de pintas:
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O gráfico anterior permite comparar as probabilidades estimadas para a saída de cada face do dado, com as probabilidades teóricas respectivas. Se em vez de 500, fizéssemos mais repetições, seria de esperar que as probabilidades estimadas se aproximassem melhor das teóricas. No gráfico seguinte as frequências relativas para a saída de cada face foram
obtidas a partir de 1000 repetições:
Nota.—Na simulação do lançamento do dado (com 500 repetições), ao utilizar o Excel para construir o diagrama de
barras para os valores obtidos que se apresentam na tabela abaixo
surgiu-me a seguinte representação gráfica, a qual me deixou razoavelmente «alarmada», já que me «pareceu» obter
uma distribuição de frequências muito longe da uniforme, como estava à espera! (Em vez de olhar para os valores da tabela, olhei logo para o gráfico — um gráfico vale mais que mil palavras, como se costuma dizer, mas nem sempre é assim…)
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Na realidade a representação anterior não está correcta — basta ver que a escala no eixo dos y’s, escolhida automaticamente pelo Excel, não se inicia no ponto 0. O gráfico correcto é o seguinte:
Normalmente os gráficos apresentados pelo Excel têm os eixos a cruzarem-se no ponto 0, mas quando isso não acontece, se se pretende manter o gráfico assim, deve chamar-se a atenção para esse pormenor.
Exemplos de como utilizar a simulação para estimar a
probabilidade de acontecimentos
Exemplo 1.—Estimar a probabilidade de em 10 lançamentos de uma moeda de um euro, a face Euro ou a
face Nacional aparecer 4 ou mais vezes seguidas.
Primeiro passo.—Definir o modelo de probabilidade para o lançamento de uma moeda:
1) Admitimos que a moeda é equilibrada
2) Os lançamentos são independentes uns dos outros
Segundo passo.—Utilizar os dígitos da tabela para simular um lançamento:
1) Cada dígito simula um lançamento da moeda
2)Se um dígito for 0, 1, 2, 3 ou 4 simula a saída da face Euro; se for 5, 6, 7, 8 ou 9 simula a saída da face Nacional. Poderíamos ter utilizado como metodologia a seguinte: se o dígito for par (considerando o 0 como par) simula-se a saída da
face Euro; se for ímpar simula a saída da face Nacional.
Terceiro passo.—Simular muitas repetições – percorrer a tabela, começando na 1a linha, da esquerda para a direita:
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Na tabela anterior, assinalámos a vermelho sempre que se veri- fica um sucesso, ou seja, sempre que se realiza o acontecimento em causa — pelo menos 4 faces euro ou nacionais seguidas.
Em 36 repetições, verificaram-se 18 sucessos, pelo que uma estimativa para a probabilidade pretendida é 18/36 =0,5
ou 50%.
Aproveitando as simulações anteriores, fomos obter uma estimativa para a probabilidade de obter 3 faces euros ou nacionais (pelo menos) seguidas, em 10 lançamentos.
Agora os sucessos, além dos assinalados a vermelho, são também os assinalados a azul. Temos 30 sucessos nas 36 repetições, pelo que uma estimativa para a probabilidade de obter pelo menos 3 faces euro ou nacionais seguidas é 30/36≈0,83
(De acordo com o modelo, a probabilidade teórica deste acontecimento é 0,826).
Como é que se pode saber se as estimativas obtidas são estimativas razoáveis para as probabilidades pretendidas?
Que garantia é que temos que a estimativa de 50%, obtida para a probabilidade de em 10 lançamentos obter 4 faces
euro ou nacionais seguidas, seja uma estimativa razoável? O problema prende-se com o facto de saber se 36 repetições
são suficientes, já que se fala em muitas repetições..., para obter a probabilidade experimental de um acontecimento!
De acordo com o que se disse anteriormente, a probabilidade experimental ou frequencista é o valor à volta do qual
tende a estabilizar a frequência relativa com que o acontecimento se verifica, à medida que o número de repetições aumenta.
Vejamos, na simulação anterior, a evolução da frequência relativa, com o número de repetições da experiência (chamamos a atenção para que, neste caso, a realização de uma experiência consiste em simular 10 lançamentos da moeda):
Decididamente não se nota que a frequência relativa tenha estabilizado à volta de 50%, pelo que as 36 repetições não
são suficientes. Sendo assim, é necessário repetir mais vezes a experiência que leva, ou não, à realização do acontecimento que se está a estudar.
Realizámos uma nova simulação com 500 repetições — desta vez utilizámos o Excel (veremos à frente o processo
utilizado), tendo-se obtido o seguinte gráfico que mostra a evolução da frequência relativa com o número de repetições:
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Apresentamos ainda para melhor visibilidade, as últimas linhas da tabela onde se registou a evolução da frequência relativa do acontecimento em causa (a partir da qual se construiu o gráfico anterior):
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Do gráfico e da tabela, verifica-se que a frequência relativa estabilizou à volta de 45%, pelo
que consideramos este valor como a estimativa para a probabilidade de em 10 lançamentos
se verificar pelo menos 4 faces euro ou 4 faces nacionais seguidas.
Aproveitámos ainda a simulação feita para estimar a probabilidade de em 10 lançamentos obter 3 ou mais faces euro ou faces nacionais seguidas. O gráfico que mostra a evolução
da frequência relativa à medida que o número de repetições aumenta, apresenta-se a seguir:
De acordo com os resultados obtidos, consideramos que 83% é uma estimativa razoável
para a probabilidade de em 10 lançamentos de uma moeda equilibrada, a face euro ou a face nacional surgir 3 ou mais
vezes seguidas.
A função RAND() para simular o lançamento de uma moeda (equilibrada)
Para estimar a probabilidade de no lançamento de uma moeda de um euro, equilibrada, aparecerem pelo menos 4 faces
euro ou 4 faces nacionais seguidas, utilizámos, no passo 2, a tabela de dígitos aleatórios, para fazer as 36 repetições. No
entanto, para simular o lançamento da moeda é mais prático utilizar a função RAND() do Excel, da seguinte forma:
Passo 2’.—Considerar a função RAND() do Excel
1. Cada número gerado simula um lançamento da moeda;
2. Um número <0,5 representa a face Euro e um número≥0,5 representa a face Nacional.
Esta atribuição de probabilidades está de acordo como modelo proposto, já que os intervalos [0, 0,5[ e [0,5, 1] têm igual
amplitude, pelo que a probabilidade de obter números em cada um desses intervalos é 0,5. Este foi o processo utilizado
para estimar a probabilidade do mesmo acontecimento, mas com 500 repetições.
Exemplo 2.—Estimar a probabilidade de numa família de 4 filhos todos serem rapazes.
Como no exemplo anterior, o primeiro passo é a definição de um modelo para o nascimento de um filho do sexo masculino.
Vamos admitir que a probabilidade de um filho ser rapaz é 50% e que os nascimentos são independentes uns dos
outros. Simula-se o nascimento de uma criança através da função RAND() da seguinte forma: sempre que o número
gerado for ≤0,5, considera-se que nasceu um rapaz; caso contrário admite- se que nasceu rapariga. De seguida geram-se
muitas repetições de 4 números, para simular os 4 nascimentos:
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continuação da tabela anterior
Repetimos a simulação anterior 1000 vezes, tendo obtido a seguinte tabela de frequências de que apresentamos parte,
assim como o gráfico respectivo:
Evolução da frequência relativa do acontecimento
«Nascimento de 4 rapazes»
De acordo com a tabela anterior, uma estimativa razoável para a probabilidade pretendida é 0,6 ou 60%.
De acordo como census 2001 (ainda não temos os resultados do último censo), a percentagem de nascimentos do
sexo masculino é ligeiramente superior à do sexo feminino e anda à volta de 51%. Admitindo então que a probabilidade
de nascer rapaz é 0,51, para estimar a probabilidade de nascerem 4 rapazes, numa família de 4 filhos, basta na simulação anterior considerar rapaz sempre que o resultado da função RAND() for um número ≤0,51. Fazendo esta alteração,
uma estimativa para a probabilidade de, na família de 4 filhos, todos serem rapazes, anda à volta de 68%.
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Exemplo 3.—Na sala de aula o professor propôs o seguinte jogo: lançam 2 dados e verificam a soma das pintas: Se a
soma for 2, 3, 4 ou 5 o João ganha um ponto; Se for 6, 7 ou 8 ganha a Rita um ponto; Se for 9, 10, 11 ou 12, ganha o Miguel um ponto. Ao fim de 100 jogadas, ganha quem tiver mais pontos. A Rita contestou o jogo dizendo que tinha menos “chance” de o ganhar! Teria a Rita razão?
A Rita contestou o jogo porque só tinha 3 possibilidades de ganhar, enquanto que os colegas tinham 4 possibilidades!
Mas será que todas estas (11) possibilidades são igualmente possíveis? Vamos então estimar a probabilidade de a soma
das pintas dos dois dados ser 2, 3,..., 11 ou 12.
Utilizamos a função RANDBETWEEN(1;6) em duas colunas do Excel para simularmos o lançamento dos 2 dados
(admitimos que os dados são equilibrados). Numa 3a coluna considerámos a soma das colunas anteriores e finalmente,
com a ajuda da função COUNTIF, construímos a tabela das frequências relativas (foram realizadas 1000 simulações
do lançamento dos 2 dados):
A partir da tabela anterior podemos concluir que as estimativas para as probabilidades do João, da Rita e do Miguel ganharem um ponto são, respectivamente, 29% (0,03+0,06+0,08+0,12), 44% (0,13+0,18+0,14) e 27% (0,11+0,08+0,05+0,03).
Daqui concluímos que, ao contrário do que a Rita pensava, ela é largamente beneficiada com estas regras do jogo.
Neste caso em que os acontecimentos, de que pretendemos estimar a probabilidade, estão associados ao fenómeno
aleatório do lançamento de dois dados, é simples, uma vez definido o modelo de probabilidade, calcular essas probabilidades. Vejamos que assim é.
Para definir o modelo de probabilidade associado ao fenómeno aleatório do lançamento dos dois dados, comecemos
por descrever o espaço de resultados – para isso consideremos um dado vermelho e outro verde:
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O espaço de resultados é constituído por todos os pares (i,j) com i,j=1,...,6, em número de 36. No par ordenado (i,j) o
primeiro elemento do par refere-se ao dado vermelho e o segundo elemento ao dado verde. Assim, por exemplo, o par
(1,3) é diferente do par (3,1). Como todos estes resultados são igualmente possíveis, atribuímos a cada um a probabilidade 1/36 (Situação de simetria e Regra de Laplace), ficando o modelo de probabilidade perfeitamente definido:
Uma vez definido este modelo e tendo em conta o que dissemos na página 4 sobre a forma de calcular a probabilidade
de um acontecimento (soma das probabilidades dos acontecimentos elementares que o compõem), vem:
P(soma 2)=P{(1,1)}=1/36≈0,028
P(soma 3)=P{ (1,2), (2,1)}=1/36+1/36=2/36≈0,056
P(soma 4)=P{(1,3),(2,2),(3,1)}=1/36+1/36+1/36=3/36≈0,083
P(soma 5)=P{(1,4),(2,3),(3,2),(4,1)}=1/36+1/36+1/36+1/36=4/36≈0,111
P(soma 6)= ...=5/36≈0,139
P(soma 7)= ...=6/36≈0,167
P(soma 8)= ...=5/36≈0,139
P(soma 9)= ...=4/36≈0,111
P(soma 10)=...=3/36≈0,083
P(soma 11)=...=2/36≈0,056
P(soma 12)=...=1/36≈0,028
Então
P( João ganhar um ponto)=P(soma 2 ou soma 3 ou soma 4 ou soma 5) ≈0,028+0,056+0,083+0,111=0,278
P(Rita ganhar um ponto)=P(soma 6 ou soma 7 ou soma 8) ≈0,139+0,167+0,139=0,444
P(Miguel ganhar um ponto)=P(soma 9 ou soma 10 ou soma 11 ou soma 12) ≈0,111+0,083+0,056+0,028=0,278
No cálculo das probabilidades anteriores fizemos uso das regras da probabilidade, nomeadamente no cálculo da probabilidade da união de acontecimentos disjuntos. Repare-se que as estimativas obtidas anteriormente, por simulação, são
«boas» aproximações das probabilidades obtidas, agora, «teoricamente».
Exemplo 4.—Cinco amigas encontraram-se e uma delas disse para as outras: Aposto um almoço, em como 2 de nós
têm o mesmo signo. Alguém aceita esta aposta? Qual será a probabilidade de efectivamente, pelo menos 2 delas terem
o mesmo signo?
Para estimar a probabilidade de, pelo menos, 2 das 5 amigas terem o mesmo sigo, vamos utilizar o Excel para simular
cada um dos 12 signos das amigas, utilizando agora a função Randbetween(1;12) que inserimos em 5 colunas, cada coluna representando uma amiga. De seguida basta verificar quais as linhas que têm pelo menos 2 valores iguais (duas
amigas com o mesmo signo) e assinalar esse facto como um sucesso, que representamos por um 1, para no fim ser mais
fácil contabilizar o total de sucessos.
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Continuação da tabela
Continuação da tabela
Evolução da frequência relativa do número de sucessos com o número de repetições:
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Da tabela e gráfico anteriores concluímos que uma estimativa para a probabilidade de, pelo menos, duas das cinco amigas terem o mesmo signo, é de 62%. (Assumindo que qualquer das amigas pode ter qualquer dos 12 signos e que há
independência — hipótese que foi, aliás, considerada para proceder à simulação anterior, o valor da probabilidade do
acontecimento em causa é 0,618 [=1−(12/12)×(11/12)×(10/12)× (9/12)×(8/12)].)
Exemplo 5.—Num concurso é dada a escolher ao concorrente uma de 3 portas. Atrás de uma delas está um carro e
atrás de cada uma das outras duas está uma cabra. O concorrente escolhe uma das portas (sem a abrir) e o apresentador,
que sabe exactamente qual é a porta que esconde o carro, abre, de entre as duas portas que restam, uma onde está uma
cabra. Nesse momento pergunta ao concorrente se deseja ou não trocar a porta que escolheu pela outra porta que ainda está fechada. Se fosse o concorrente, o que é que faria? Trocava de porta ou mantinha a porta escolhida? Qual será a
estratégia mais vantajosa para ganhar o carro?
Vejamos como simular este problema: Não há dúvida que ao escolher uma porta ao acaso a probabilidade de ela esconder o carro é igual a 1/3. Para simular o decorrer de alguns destes concursos vamos utilizar a função RAND e considerar que o concorrente escolheu a boa porta sempre que o valor do número pseudo-aleatório obtido estiver entre 0 e 1/3.
Nestes casos, quando ele trocar de porta, ficará com a «cabra» mas, em compensação, ficará com o carro em todos os
outros casos. Eis o resultado da simulação ao fim de 500 e 1000 repetições:
Continuação da tabela
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Continuação da tabela
Ao fim de 500 repetições obtém-se como estimativa para a probabilidade de ganhar, trocando de porta, aproximadamente 65%. No entanto, se continuarmos o processo de simulação, ao fim de 1000 repetições obtém-se como estimativa
para essa probabilidade, aproximadamente 68%.
Este valor é muito próximo do valor exacto para a probabilidade de ganhar trocando de porta, que é igual a 2/3. Uma
simulação desta situação encontra-se em http://www.alea.pt/html/probabil/html/cap_04/html/cap4_1_72.html
Como estimar áreas utilizando a simulação
A utilização da simulação para estimar probabilidades, permite-nos estimar áreas de algumas figuras, uma vez que, em
determinadas circunstâncias, a probabilidade pode ser interpretada como uma área.
Por exemplo, consideremos um quadrado de lado unitário e uma figura inscrita nesse quadrado:
Como estimar a área dessa figura?
Um processo, é simular pares de números pseudo-aleatórios (entre 0 e 1) e calcular a frequência relativa dos que
caiem dentro da figura. Esse valor dá-nos uma estimativa da área da figura incluída no quadrado.
Vamos utilizar o processo descrito anteriormente para estimar a área do círculo de raio 0,5 unidades e comparar com
a área calculada a partir da fórmula 𝜋𝜋𝜋𝜋􏺾􏺾:
Geramos 100 números e estimámos a área da figura pela frequência relativa do número de pontos no interior do círculo.
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Neste caso foi mais fácil contar o número de pontos fora do círculo (=22) pelo que uma estimativa para a área do círculo com raio 0,5 unidades é 0,78 unidades2.
A área do círculo anterior é 3,1416x0,52=0,7854, pelo que o valor obtido como estimativa é bastante razoável.
Bibliografia
Graça Martins, Maria Eugénia; Introdução à Probabilidade e à Estatística, Departamento de Estatística e Investigação
Operacional da FCUL, Sociedade Portuguesa de Estatística, 2005.
Graça Martins, Maria Eugénia e Loura, Luísa; Modelos de Probabilidade, Material de apoio à disciplina de MACS
http://area.dgidc.min-edu.pt/mat-no-sec/doc/probabilidades_pag.doc ou,
http://area.dgidc.min-edu.pt/mat-no-sec/recursos_na_internet.htm
Graça Martins, Maria Eugénia e Ponte, João Pedro; Organização e Tratamento de Dados, 2010 — Novo Programa de
Matemática do Ensino Básico
http://area.dgidc.min-edu.pt/materiais_NPMEB/organizacao01brochuras.htm
www.alea.pt
em particular
http://www.alea.pt/html/probabil/html/cap_04/html/cap4_1_41.html
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Como estimar a probabilidade de um acontecimento por simulação