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ID: 57007871
10-12-2014
Tiragem: 34943
Pág: 10
País: Portugal
Cores: Cor
Period.: Diária
Área: 25,70 x 30,75 cm²
Âmbito: Informação Geral
Corte: 1 de 1
Portugal é o país da União Europeia
onde mais se morre por pneumonia
Elevado índice de envelhecimento e cultura de encaminhar para os hospitais os doentes em fim de vida
podem justificar o elevado número de mortes por pneumonia no país, diz especialista
Saúde
Alexandra Campos
Ranking das doenças respiratórias na UE
Portugal tem a taxa de mortalidade por pneumonia mais elevada da
União Europeia (UE) e, no contexto das doenças respiratórias em geral, só o Reino Unido nos suplanta
na proporção de óbitos. “Portugal
encontra-se numa situação desfavorável quanto à mortalidade por
doenças respiratórias” e a principal
explicação reside “na elevada mortalidade por pneumonia” (49,9 por
100 mil habitantes, a maior no conjunto dos países europeus em análise, sublinham os autores do relatório
Portugal – Doenças Respiratórias em
Números 2014 que ontem foi apresentado, em Lisboa.
Os responsáveis do Programa Nacional para as Doenças Respiratórias
da Direcção-Geral da Saúde (DGS)
que elaboraram o documento não
adiantam explicações para este fenómeno. Frisam, apenas, que as doenças respiratórias estão relacionadas
com as faixas etárias mais afectadas
(os idosos), as condições atmosféricas e com a virulência do vírus da
gripe em cada ano. Por isso, voltam
a destacar a necessidade de aumentar a taxa de cobertura da vacinação
contra o vírus da gripe, sobretudo
nos idosos e nos chamados grupos
de risco.
A elevada taxa de mortalidade por
pneumonia nos hospitais portugueses não surpreende os especialistas.
“São dados que corroboram o que
já vinha acontecendo em anos anteriores”, afirmou ao PÚBLICO Carlos Robalo Cordeiro, presidente da
Sociedade Portuguesa de Pneumologia (SPP). Durante a apresentação
do anterior relatório, em 2013, os
responsáveis da DGS já tinham revelado que a taxa de mortalidade por
pneumonia era o dobro da média europeia e reconheciam a necessidade
de estudar os motivos que justificam
a situação nacional. Mas esse estudo
continua por fazer.
“Isto pode ter que ver com vários
factores: temos dos maiores índices
de envelhecimento da Europa e uma
cultura de encaminhar para os hospitais os doentes idosos com múltiplas complicações, em fim de vida”,
ensaia, em jeito de explicação, Carlos Robalo Cordeiro. A estas razões
soma-se “algum viés” na codificação
Mortalidade associada
às doenças respiratórias
Por 100 mil habitantes, em 2012
102,1
Portugal
92,3
Dinamarca
Taxa padronizada
de mortalidade por pneumonia
Por 100 mil habitantes, em 2012
49,9
Portugal
Holanda
30,4
Holanda
80,6
Polónia
30,4
Espanha
78,4
Dinamarca
28,6
62
R. Checa
Luxemb.
54,5
Alemanha
16,6
R. Checa
54,4
Suécia
16,1
Polónia
54,2
Espanha
15,3
Alemanha
53,4
Luxemb.
13,1
Suécia
49,6
Estónia
11,8
Hungria
38,3
Áustria
Finlândia
Estónia
23,8
Áustria
8,1
30,3
Hungria
7,4
29,1
Finlândia
n.d.
Bélgica
n.d.
Eslováquia
n.d.
Eslováquia
n.d.
Eslovénia
n.d.
Eslovénia
n.d.
França
n.d.
França
n.d.
Grécia
n.d.
Grécia
n.d.
Irlanda
n.d.
Irlanda
n.d.
Itália
n.d.
Itália
n.d.
R. Unido
n.d.
R. Unido
n.d.
Mortalidade associada às doenças
respiratórias em Portugal
Por 100 mil habitantes
98,2
das mortes nos hospitais
públicos em 2013 (12 .494
óbitos) ficaram a dever-se
a doenças respiratórias,
em Portugal
Taxa padronizada de mortalidade
por pneumonia em Portugal
Por 100 mil habitantes
102,1
100,3
2010
2011
Fonte: Direcção-Geral da Saúde
49,9
44
93,1
90,4
2008 2009
26%
4,2
Bélgica
43,4
40,2
2012
2008 2009
2010
das doenças que provocam a morte
no país. “Portugal pode estar a codificar melhor, ao apontar a pneumonia como principal causa de morte”,
sustenta.
A crise económica poderá também
ter algum impacto neste fenómeno,
mas Carlos Robalo Cordeiro defende que “não é fácil fazer essa ligação”. “A vacina antipneumocócica
é muito cara e não é comparticipada, o aquecimento das habitações é
insuficiente, a alimentação [com a
crise] não será tão equilibrada. Mas
[relacionar tudo isto com a crise] é
especulativo”, admite. Alterar os negros números de Portugal implicaria
reforçar os serviços domiciliários para que pessoas em fim de vida pudessem ficar em casa ou nas instituições
onde residem, como os lares, “com
um bom apoio médico e de enfermagem”, sem terem de ir parar aos
41,2
2011
2012
PÚBLICO
hospitais, recomenda o presidente
da SPP.
Ainda no que se refere à mortalidade, os autores do relatório da DGS
voltam a assinalar, como já tinham
feito no ano passado, as assimetrias
regionais, com as regiões autónomas
da Madeira e dos Açores a destacarse pela negativa, e a região de Lisboa
pela positiva. As doenças respiratórias são a principal causa de morte
nos hospitais (mais de um quarto do
total de óbitos).
Mas nem tudo é mau no documento do Programa Nacional das
Doenças Respiratórias. Na doença
pulmonar obstrutiva crónica (DPOC)
e na asma, duas das principais patologias respiratórias, a mortalidade
em Portugal até foi mais baixa do
que na generalidade dos outros países em análise. Entre 2009 e 2012,
observou-se também um decréscimo
da mortalidade por doenças respiratórias em geral na população abaixo
dos 65 anos e um aumento a partir
desta idade. Um fenómeno que permite concluir que a mortalidade por
doença respiratória não corresponde
à chamada mortalidade prematura,
tendo mesmo diminuído os anos de
vida potencial perdidos, acentuam
os autores do relatório.
Em 2013, ao que tudo indica sobretudo em resultado de uma época de gripe bem menos virulenta
do que a de 2012, verificou-se um
decréscimo acentuado no total de
internamentos por doenças respiratórias nos hospitais públicos, da
ordem dos 6%. Principal justificação?
A diminuição dos internamentos por
pneumonia (menos 1954), por doença pulmonar obstrutiva crónica
(DPOC), com menos 730 casos, e por
asma (271). Em sentido contrário, os
internamentos por fibrose pulmonar
aumentaram de forma consistente
desde 2009 (só entre 2012 e 2013 foram mais 282).
Mais espirometrias
Já nos centros de saúde têm aumentado os inscritos com diagnóstico de
asma e de doença pulmonar obstrutiva crónica, e, em geral, as espirometrias (exames que permitem medir o fluxo de ar que entra e sai dos
pulmões) mais do que triplicaram
entre 2011 e 2013.
No entanto, quando se analisa a
percentagem de inscritos com DPOC
baseado em espirometria, esta tem
crescido “muito discretamente nas
regiões norte, centro e de Lisboa e
Vale do Tejo”; e no Alentejo e no Algarve até tem decrescido, fenómeno
classificado como “preocupante” no
relatório. “Estes dados revelam uma
fraca capacidade diagnóstica para a
DPOC” nos centros de saúde, “o que
aumenta a probabilidade de internamentos evitáveis nos hospitais”,
justificam os autores, frisando que há
uma elevada taxa de segundos episódios de internamento associados
a estas patologias.
“Há poucas espirometrias sobretudo nas regiões onde o acesso é menor, como o Alentejo e o Algarve, que
têm menos médicos especialistas.
Mas é preciso criar condições [para
que estas aumentem]”, defende, a
propósito, Carlos Robalo Cordeiro.
Para definir medidas no futuro,
a DGS e a Sociedade Portuguesa de
Pneumologia pediram entretanto
uma análise económica para avaliar
o custo-efectividade do diagnóstico
precoce da DPOC e o eventual aumento do número de anos de vida
saudável.
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