1 CONTRIBUIÇÕES DE JEAN PIAGET E DE LEV. S. VYGOTSKY PARA A PSICOLOGIA EDUCACIONAL E PARA O PROFESSOR Paulo Gomes Lima Prof. Adjunto da FAED/UFGD – MS. Área Fundamentos da Educação A Psicologia Educacional, orientada para o estudo do desenvolvimento do indivíduo enquanto ser que aprende, enquanto ser mobilizado pelas solicitações do meio que está inserido, por intermédio de diferentes escolas e abordagens sobre a Teoria do conhecimento e desenvolvimento (Behaviorismo, Neo-Behaviorismo, Gestalt, Psicanálise, Análise Transacional, dentre outras), tornou-se ao longo do tempo, área indispensável à compreensão dos processos de ensino-aprendizagem aplicados à educação escolar e instrumentalização imprescindível à formação do educador no que tange ao processo de intervenção pedagógica. De maneira específica a contribuição piagetiana, por sua abordagem construtivista e a vygotskiana, por sua abordagem sóciointeracionista, acrescentam elementos indispensáveis para entender o processo de aquisição e desenvolvimento da inteligência em sua totalidade. Neste caso, tanto para a psicologia educacional, como para o professor em sala de aula as teorias do conhecimento destes autores são imprescindíveis para a contextualização do desenvolvimento humano ao longo de seu processo vital, destacando-se, em nosso caso específico, o âmbito escolar. Jean Piaget nasceu no dia 9 de agosto em Neuchâtel, na Suiça no ano de 1896 e faleceu em 17 de setembro de 1980. Estudou na Universidade de Neuchâtel, obtendo a graduação em biologia e filosfia, tendo recebido o Título de Doutor em biologia com 22 anos de idade. Estudou a evolução do pensamento do indivíduo até a adolescência, procurando entender como se processava o desenvolvimento da inteligência da criança e como construía seu conhecimento incluindo neste último o estudo do pensamento lógico-matemático a partir de seus próprios filhos.Trabalhou com psicologia experimental, foi professor universitário, nas o seu teve maior impacto quando a partir de estudos de seus próprios filhos mapeou a construção do conhecimento da criança por meio de sua teoria. Para Piaget o conhecimento não é mero produto da observação, pois se visto desta maneira, desconsidera-se a estruturação devida às atividades do indivíduo, ou seja, o processo como se deu este conhecimento; também se descarta totalmente a existência 2 de estruturas cognitivas inatas, consideradas como potencialidades, e afirma que “só o funcionamento da inteligência é hereditário, e só gera estruturas mediante uma organização de ações sucessivas, exercidas sobre objetos” (o indivíduo não nasce com um potencial intelectivo, no entanto, com ‘possibilidades’ de desenvolvimento do conhecimento) , portanto, a linha piagetiana defende que a epistemologia da psicogênese não pode ser empírica e nem pré-formista, mas construtivista, uma vez que o conhecimento é construído mediante o processo das possibilidades da inteligência do indivíduo. Da maneira exposta por Piaget, o conhecimento procede da ação do indivíduo sobre o objeto e esta ação, que se repete ou se generaliza gera um “esquema” que ordenará as informações dos novos objetos (formando novos esquemas de ação); não por associação, mas por assimilação. A partir da assimilação aos esquemas de ação, obrigatoriamente ocorrerá uma acomodação às particularidades dos objetos, resultante de dados externos (aqui e somente aqui considera-se a experiência), portanto, não existe acomodação em estado “puro” ou “isolado”, mas a acomodação de um esquema de assimilação. Piaget refuta a pré-formação da inteligência ou as predeterminações, pela constatação de estágios no desenvolvimento da criança que testemunham uma construção contínua, a saber : 1. Estágio sensório-motor: anterior a linguagem- lógica das ações. 2. Estágio pré-operatório: (2-7 anos), conceptualização das ações (sem operações reversíveis ou conservações). 3. Estágio das operações concretas: (7-10 anos), ainda trabalha-se com o concreto, mas logicamente estruturado (com reversibilidade e conservação). 4. Estágio das operações formais ou Lógica proposicional hipotético-dedutiva: (11-12 anos), com combinatória, “conjunto de pares”, quaternidade, etc. Sobre as teorias de pré-formação da inteligência e o conceito empirista, Piaget diz que as teorias de pré-formação do conhecimento, parecem-nos tão desprovidas de verdades concretas quanto as interpretações empiristas, pois as estruturas lógicomatemáticas, em sua infinidade, não são localizáveis nem nos objetos, nem no sujeito em seu ponto de origem. Portanto, só um construtivismo é aceitável, mas incumbido da pesada tarefa de explicar simultaneamente o mecanismo de formação das novidades e o caráter de necessidades lógicas que elas adquirem no decorrer do processo. Os mecanismos que asseguram as construções de um estágio ao seguinte são: 3 1. Abstração empírica: (aquela que envolve objetos físicos, exteriores ao indivíduo). 2. Abstração reflexiva: (também chamada de lógico-matemática, procede a partir das ações e operações do indivíduo). 3. Abstração refletida: (pensamento reflexivo para designar o que é operacional ou instrumental, está inter-relacionada com a 2. Através destas abstrações as estruturas lógico-matemáticas estarão sendo construídas, anterior, portanto a aquisição da linguagem. As abstrações reflexivas e refletidas corresponderão generalizações construtivas (completivas). As generalizações construtivas consistem em elevar uma operação a uma potência superior, assim, as combinações são classificações de classificações, as permutas são seriações de seriações, os conjuntos de partes são partições de partições. Convém buscar a explicação biológica das construções cognitivas na auto-regulação e não na hereditariedade, pois a auto-regulação é, em parte hereditária, mais a título de funcionamento do que de estruturas e sua natureza é construtiva e dialética. Piaget discorda de Chomsky, quando este propõe o “núcleo fixo inato”, pois para ele (Piaget), o que leva o indivíduo a aprender não é a predeterminação, mas a ação construtiva. Piaget concorda com a expressão “núcleo fixo”, mas como resultados das construções próprias da inteligência sensório-motora, anterior a linguagem e resultante de autoregulações, simultaneamente orgânicas e comportamentais que determinam a epigenesia. As construções da formação da razão tornam-se progressivamente necessárias, resultando estas necessidades das auto-regulações e traduz-se por uma equilibração igualmente progressiva das estruturas cognitivas; portanto, a necessidade é proveniente do “fechamento” dessas estruturas. Três formas de equilibração podem ser distinguidas: 1. Assimilação e acomodação: conserva o esquema e leva em conta as propriedades dos objetos. 2. Entre os subsistemas: a equilibração supõe uma distinção entre suas partes comuns e suas propriedades diferentes, e, portanto, uma regulação compensatória entre as afirmações e as negações parciais. 3. Construção de um novo sistema total: forma requerida pelo próprio processo de diferenciação de novos subsistemas, a qual exige uma providência compensatória de integração numa totalidade. 4 O estilo piagetiano busca um trabalho interdisciplinar (entre ciências vizinhas), que possibilite maior conhecimento sobre o objeto de estudo, que no caso específico, é o conhecimento humano. O objetivo principal da pesquisa de Piaget é provar que as categorias básicas da mente são construídas e de que as normas morais nascem da cooperação entre os indivíduos. A idéia central de Piaget é de que o sujeito constrói a sua inteligência, seus próprios conhecimentos de maneira ativa. Para Vygotsky o desenvolvimento cognitivo do indivíduo se dá por meio da interação do organismo com o meio, através da mediação de instrumentos e signos (mediação simbólica). Noutras palavras, o desenvolvimento da inteligência é fruto da interação entre o indivíduo e o meio social. Assim, o desenvolvimento das funções psicológicas superiores (pensamento, linguagem, atenção voluntária, ações intencionais, memorização) acontece num primeiro momento num plano social para, em seguida, serem reelaboradas no plano individual, isto é a fase de colaboração interpessoal (aprendizagem com o meio) é interiorizada, transformando-se num processo intrapessoal. Este processo é denominado de internalização. O processo de internalização do conhecimento é o elemento gerador da autonomia do pensamento, da possibilidade da reflexão, que vai se fazendo não de forma direta, mas pela mediação dos símbolos entre o sujeito que conhece e o mundo que é conhecido. O desenvolvimento cognitivo para Vygotsky é a transformação das relações sociais em funções mentais, ou seja, é na interação social que o desenvolvimento cognitivo é construído. Isto ocorre por meio da atividade mediada indireta por meio de instrumentos e signos. O instrumento é caracterizado como um objeto concreto, algo que pode ser usado para fazer alguma coisa. O signo é caracterizado como um símbolo ou representação do objeto que podem ser segundo Moreira (1999, p.111), entendidos em três conjuntos: a) signos indicadores: usados para indicar a relação causa efeito – a fumaça indica fogo, o efeito e o fogo e a causa e fumaça; b) signos icônicos: representados por imagens, figuras, desenhos de objetos reais; c) signos simbólicos: a representação numérica, a linguagem falada e escrita, etc. Assim Vygotsky defende que com a internalização de instrumentos e signos produzidos culturalmente é que se processa o desenvolvimento cognitivo. A interação social tem papel fundamental nesta dinâmica, articulando a construção do pensamento por meio da linguagem. Enquanto os instrumentos servem para o controle e domínio externo da natureza, os signos são orientados internamente para o 5 controle do próprio indivíduo. Para internalizar os signos o indivíduo precisa compartilhar os significados socialmente aceitos por meio da interação social. A aproximação da criança à linguagem falada, permite sua descontextualização do mundo concreto, favorecendo a relação entre signos e instrumentos num processo de internalização desenvolvendo assim o seu pensamento. Desta forma, pensamento e linguagem estão articulados convergindo-se a posteriori: inteligência pratica (uso dos instrumentos) e a inteligência abstrata (uso dos signos), resultando no pensamento verbal e linguagem racional, marcando a transformação do biológico no sócio-histórico. Nesta diretriz a interação social, provocadora da aprendizagem na criança se desdobra entre as tarefas ou relações que a criança é capaz de realizar de forma independente (esta etapa é chamada de Nível de Desenvolvimento Real - NDR) e o Nível de Desenvolvimento Potencial (NDP) isto é, a capacidade em desempenhar tarefas ou estabelecer relações com a ajuda de um adulto ou outra criança. A partir desses dois níveis Vygotsky acentua que há uma Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP) definida como a distância entre Nível de Desenvolvimento Real e Nível de Desenvolvimento Potencial. A ZDP define aquelas funções que ainda não amadureceram, mas que estão em processo de maturação, em forma latente. O que a criança consegue fazer com a ajuda dos outros hoje, conseguirá fazer sozinha amanhã. No processo ensino-aprendizagem cabe ao professor como mediador interagir com seu aluno: explorando a sua ZDP as funções mentais superiores e a linguagem. O ensino se consolidará quando professor e aluno compartilharem significados, isto é, o desenvolvimento esperado do pensamento elaborado.