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112.
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DA PARAÍBA
GABINETE DO DESEMBARGADOR JOÃO BENEDITO DA SILVA
ACÓRDÃO
APELAÇÃO CRIMINAL N°. 200.2005.046214-8/001 — tla Vara Criminal da
Capital
Relator : Exmo. Des. João Benedito da Silva
Apelante : Fernando de Oliveira Rodrigues (Adv.: Rougger Xavier G. Júnior)
Apelada : Justiça Pública
APELAÇÃO CRIMINAL Crime contra os costumes. Atentado
violento ao pudor. Presunção de violência. Vitima menor de 14
anos. Autoria e materialidade comprovadas. Procedência da
denúncia. Condenação. Irresignação defensiva. Preliminar de
nulidade absoluta do processo em razão do cerceamento de
defesa. Ausência de intimação do defensor para apresentação da
defesa prévia. Prejuízo demonstrado. Acolhimento. Declaração
da nulidade do processo. Provimento do apelo.
O princípio da ampla defesa caracteriza-se pelo exercício real e
efetivo da defesa do acusado, principalmente no âmbito do
processo penal, em razão da possível restrição da liberdade do
réu.
Constatado o prejuízo decorrente da não intimação do defensor
público para apresentação da defesa prévia, impõe-se a nulidade
do processo a fim de garantir ao réu o pleno exercício da ampla
defesa e do contraditório.
•
•
VISTOS, RELATADOS E DISCUTIDOS os autos identificados
acima;
(
ACORDAa Egrégia Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do
Estado da Paraíba, em desarmonia com o parecer da douta Procuradoria de Justiça,
anular o processo a partir das fls. 70, inclusive, determinando-se sua remessa ao
Juízo a quo para prosseguimento, nos termos do voto do relator. Unânime.
•
RELATÓRIO
Trata-se de Apelação Criminal que se fizera interposta por
Fernando de Oliveira Rodrigues, às fls.131/133 contra sentença proferida pelo Juízo
de Direito da 4a Vara Criminal da Comarca da Capital (fls. 122/129) que o condenou a
uma pena de 07 (sete) anos de reclusão, em regime inicialmente semi-aberto, pela
prática do crime previsto no artigo 214, c/c o artigo 224, alínea "a", todos do Código
Penal.
•
Alega o apelante, às fls. 102/119, preliminarmente, nulidade
absoluta do processo, em face da deficiência técnica, uma vez que o Defensor Público,
às fls. 42, ao invés de defender, contribuiu parjt acusá-lo da pratica delituosa, pois
trouxe apenas como peça de defesa um "MOD LO', sem qualquer vinculação com o
,
,
.
•
caso em tela, haja vista não fazer alusão ao crime imputado, as características pessoais,
contradições do caso, não questionar qualquer uma das imputações atribuídas ao
mesmo, nem tampouco arrolar qualquer testemunha de defesa, resumindo-se esta apenas
em cinco linhas grotescas de fundamentação, e ainda, que os defensores dativos em
todo processo, permaneceram inertes.
I
1
Aduz ainda que ocorreu nulidade absoluta do feito pela ocorrência
de cerceamento de defesa, eis que referido processo foi redistribuído para a Vara
Distrital de Cruz das Armas e reaberto o prazo para o defensor público apresentar a
defesa previa, este nunca apresentou, conforme relatado na sentença, às fls. 123,
restando caracterizado o prejuízo, pugnando a sua nulidade, a possibilitar a apresentação
da defesa técnica de que trata o art. 396 do CPP, no prazo legal.
IIII,
(I
Finalmente, alega também, em preliminar, que o Magistrado
incorreu em erro quando o condenou nas sanções do art. 214, c/c o artigo 224, alínea
"a" , todos do Código Penal, pois a Lei 12.015/09, modificou o capitulo que trata dos
crimes contra os costumes, revogando o artigo da presunção de violência, assim como o
enquadramento no seu tipo penal, pugnando que caso não seja acolhida a preliminar de
nulidade absoluta do processo, por deficiência de defesa, que seja adequado a sentença
ao novo enquadramento determinado por lei, devendo ser Condenado nos termos do art.
218 do CPB, e ainda, que quando da aplicação da reprimenda o magistrado violou o
sistema trifásico, tendo em vista ter fixado a pena acima do mínimo legal sem qualquer
fundamentação legal.
No mérito, pugna por sua absolvição, alegando que não há provas
suficientes para um decreto condenatório, tendo em vista as contradições nos
depoimentos da acusação, sendo o fato imputado, apenas mera fantasia de uma criança
de apenas 06 anos de idade, incentivada pela mãe.
Em Contra razões (fls. 156/163), o Ministério Público,
1110
pugna pela rejeição das preliminares, e, no mérito, que há provas suficientes para a
condenação do apelante, e que a aplicação da pena esta suficientemente fundamentada,
não merecendo qualquer reparo a sentença atacada.
(1
A douta Procuradoria de Justiça opinou pela rejeição da preliminar,
e no mérito, que há provas suficientes para um édito condenatório, devendo a sentença
condenatória ser mantida em todos os seus termos. (fls. 167/168).
É o relatório.
V O T O: Exmo. Des. João Benedito da Silva
Depreende-se dos autos que o apelante Fernando de Oliveira
Rodrigues foi denunciado pelo representante do Ministério Público que oficia perante o
Juízo de Direito da 4° Vara Criminal da Comarca desta Capital, pela prática do crime
previsto no artigo 214 c/c os artigos 224, alínea "a", ambos do Código PenaL
Consta da peça acusatória de fls. 03/04, que no dia 06 de julho do
ano de 2005, o acusado Fernando de Oliveira Rodrigues, conhecido por "Naldinho",
teria tentado beijar na boca da menor VM.S., de apenas 06 anos de idade, fazendo
para frente e para trás, principalmente
gestos obscenos,
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caracterizado.?itnentos
•
na área da genitália, encostando seu corpo na genitália da criança, sugestivos de um ato
sexual.
Finda a instrução criminal, o Juiz a quo condenou o recorrente a
uma pena de 07 (sete) anos de reclusão, em regime inicialmente semi-aberto, pela
prática do crime previsto no artigo 214, c/c o artigo 224, alínea "a", todos do Código
PenaL
Inconformado com o decisum condenatório, o apelante interpôs o
presente recurso.
•
(
Aduz o apelante, em preliminar, nulidade absoluta do processo por
cerceamento de defesa, porquanto, muito embora a douta Magistrada tenha determinado
a reabertura do prazo para o defensor público apresentar a defesa prévia, às fls. 69, este
nunca fora intimado, nem tampouco, tal defesa, fora apresentada, conforme relatado na
sentença, às fls. 123, restando configurado o prejuízo para o acusado. Requerendo ao
final, a declaração da nulidade de todos os atos processuais, a partir do interrogatório
prestado em juízo, bem como a abertura de prazo para oferecimento da defesa prévia.
Merece acolhimento a preliminar de nulidade absoluta por
cerceamento de defesa.
Compulsando os autos, verifica-se que o processo em tela, fora
redistribuído para a Vara Distrital de Cruz das Armas, onde a Magistrada, interrogou o
apelante, às fls.67/68, e no Termo de Audiência, às fls. 69, nomeou o Advogado
Leopoldo Marques D'Assunção, para aquele ato, determinando a intimação do Defensor
Público em atuação na referida Vara para no prazo legal apresentar a defesa prévia,
vejamos:
"Nesta audiência, foi realizada o interrogatório do denunciado.
Intime-se o Defensor Público em atuação nesta vara distrital para. no prazo legal,
apresentar defesa prévia. Outrossim, designo a audiência para o dia 19/04/2007 às
14:30 horas para a oitiva das testemunhas e declarantes do MP." - Grifo nosso.
•
(
Pois bem! Analisando o caderno processual, observa-se que não
consta a intimação acima referida do Defensor Público a fim de apresentar Defesa
Prévia do apelante, nem tampouco esta fora ofertada.
O artigo 5°, inciso LV, da Constituição Federal, estabelece que "aos
litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são
assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes".
Nos dizeres do constitucionalista Alexandre de Moraes', por ampla
defesa entende-se a garantia que é dada ao réu no sentido de lhe possibilitar trazer para
o processo todos os elementos tendentes a esclarecer a verdade dos fatos.
O princípio constitucional da ampla defesa, como se sabe,
desdobra-se em duas garantias: autodefesa e defesa técnica. A autodefesa significa a
participação pessoal do acusado no processo, como, por exemplo, no interrogatório. A
defesa técnica, por sua vez, cabe a um defensor devidamente habilitado.
MORAES, Alexandre de. Constituição d Brasil jnterpretada e Legislação Constitucional. 7 Edição.
São Paulo: Editora Atlas, 2007, p. 314.
i
I
1
I
1
,
Entretanto, o advogado constituído deve, efetivamente, envidar
esforços para carrear aos autos elementos favoráveis ao acusado, uma vez que o
princípio da ampla defesa caracteriza-se pelo exercício real e efetivo da defesa do
acusado, principalmente no âmbito do processo penal, em razão da possível restrição da .
liberdade do réu.
1
'
1
Neste sentido, observe-se o entendimento do Superior Tribunal de
Justiça:
II
(
1
"O princípio da ampla defesa, assegurado pela Constituição
Federal em seu art. 5°, inciso L'V, deve ser caracterizado pelo
exercício real e efetivo da defesa do acusado, ainda mais no
âmbito do processo penal, por estar em jogo o status libertatis do
indivíduo". 2
"Todo e qualquer réu, não importa a imputação, tem direito a
efetiva defesa no processo penal (arts. 261 do CPP e 5°, inciso LV
da Carta Magna). O desempenho meramente formal do defensor,
em postura praticamente contemplativa, caracteriza a insanável
ausência de defesa Precedentes do Pretório Excelso". 3
Na esteira de jurisprudência dos Tribunais, embora a
apresentação da defesa prévia não seja imprescindível para a validade do processo
penal, a intimação do defensor do réu para o oferecimento da referida peça
defensiva é obrigatória e a sua inobservância constitui nulidade absoluta. Senão
vejamos:
STJ: HABEAS CORPUS. NULIDADE. CRIMES DE
EXTORSÃO MEDIANTE SEQÜESTRO E FORMAÇÃO DE
• QUADRILHA. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DO DEFENSOR
DO PACIENTE. APRESENTAÇÃO DE DEFESA PRÉVIA.
NULIDADE ABSOLUTA.CERCEAMENTO DE DEFESA.
LIBERDADE PROVISÓRIA. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA.
/
MATÉRIA NÃO DECIDIDA NO TRIBUNAL DE ORIGEM. 1.
Na esteira da jurisprudência desta Corte, embora a apresentação
da defesa prévia não seja imprescindível para a validade do
processo penal, a intimação do defensor do réu para o
oferecimento da referida peça defensiva é obrigatória e a sua
inobservância constitui nulidade absoluta. 2. Por esse motivo,
torna-se imperativa a declaração de nulidade dos atos
processuais a partir do momento processual em que deveria ter
sido intimado o defensor para apresentar a defesa prévia,
observando-se a sua regular intimação. 3. O pedido de liberdade
provisória não foi objeto de análise no decisum impugnado, o
que inviabiliza o exame da matéria por esta Corte, sob pena de
indevida supressão de instância, por força do que dispõe o art.
105 da Constituição FederaL 4. Habeas Corpus parcialmente
conhecido e, nessa extensão, concedida parcialmente a ordem,
mas apenas para declarar a nulidade de todos os atos
processuais, exclusivamente em relação ao ora paciente, a partir
•. 20/11/2006, DJ 18/12/2006, p. 422.
2 HC 57425/RI, 5' Turma, rel. Ministro GILSON DIPP,i
2 HC 19192/SP, 5' Turma, rel. Ministro FELDC FISCHE , j. 16/04/2002, DJ 06/05/2002, p. 299.
95,,
.
. .
,
do momento processual em que deveria ter sido intimado o seu
defensor para apresentar a defesa prévia, bem como determinar a
abertura de prazo para o oferecimento desta, observando-se a
regular intimação do patrono, mantida, contudo, a segregação do
paciente. (HC 84919 / CE- HABEAS CORPUS 2007/0136464-1 Relator(a) Ministro NAPOLEÃ.0 NUNES MAIA FILHO (1133) T5 - QUINTA TURMA - Data do Julgamento 06/03/2008 -Data da
Publicação/Fonte Die 07/04/2008).- Grifo nosso.
Ill
(1
STJ: HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL
HOMICÍDIO. DEFESA PRÉVIA. INEXISTÊNCIA DE
CERCEAMENTO. PRISÃO PREVENTIVA. JULGAMENTO
POPULAR SUPERVENIENTE. 1. A jurisprudência dos
Tribunais Superiores, incluidamente do Pretório Excelso, é
pacífica no sentido da prescindibilidade da apresentação da
defesa prévia do acusado, sendo obrigatória, apenas, a
respectiva intimação para tanto.(...).Writ prejudicado em
parte e denegado (RHC 19.376/ES, Rel. Min. HAMILTON
CARVALHIDO, DJU 19.12.2002).- grifei
STJ: CRIMINAL HC. NULIDADE. DEFESA PRÉVIA.
AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DO ADVOGADO DO RÉU.
CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONFIGURADO.
CUSTÓDIA MANTIDA. PERSISTÊNCIA DOS MOTIVOS
AUTORIZADORES. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
I. Reconhece-se a ocorrência de nulidade absoluta, se o
defensor do paciente não foi regularmente intimado para a
apresentação de defesa prévia. II. Não ilididos os motivos
autorizadores da custódia preventiva, tem-se como descabida
1 • a expedição de alvará de soltura em favor do paciente. HL
Recurso parcialmente provido para, mantida a segregação do
paciente, anular o processo criminal a partir do momento de
apresentação da defesa prévia, com observância da regular
intimação do defensor (RHC 11.916/SP, Rel. Min. GILSON
(I
1
DIPP, DJU 04.02.2002).
.
TJMG:"APELAÇÃO CRIMINAL - PRELIMINAR ACOLHIDA
- DEFESA PRÉVIA - AUSÊNCIA INTIMAÇÃO - DEFENSOR NULIDADE DECLARADA. É de se declarar nulo o processo,
por infringência aos princípios constitucionais do contraditório e
da ampla defesa se, nomeado defensor público, este não é
intimado para apresentação da defesa prévia." (Apelação
Criminal n. 1.0702.04.1802814-7/001 - Rel. Des. Walter Pinto da
Rocha -j. Em 04/07(007). - Grifei.
Como visto acima, verifica-se que o Defensor Público em atuação
na referida Vara Distrital, não foi intimado para apresentação da defesa prévia, o que, de
fato, prejudicou o acusado em seu direito à plenitude de defesa.
Está tão claro, como luz meridiana, que o réu tem direito à efetiva
defesa no processo penal, conforme dispõem oiazigo 261 do Código de Processo Penal
e o art. 5°, inciso LV, da Lex Major, o que n - fora obedecido nos presentes autos,
fl'.5
.'.
..
.
,
, restando demonstrado que não foi dado ao acusado o direito de rebater os fatos
apurados no caderno processual, ou seja, não lhe fora dado o direito de arrolar
testemunhas
ou trazer aos autos qualquer elemento para provar a sua inocência.
,
I
Dá-se ênfase a que não é a ausência de apresentação de defesa
prévia ou a deficiência da defesa do réu no curso do processo penal que acarretará a
nulidade do feito, e sim, a total ausência de defesa ou a deficiência que
comprovadamente lhe acarrete prejuízo.
Assim sendo, não poderia o MM. Juiz Sentenciante, proferir sua
decisão sem que fosse dada vista dos autos ao Defensor Público nomeado para
apresentação de sua defesa prévia, conforme ocorreu no caso em apreço.
•
Assim, em face da inobservância dos princípios constitucionais da
ampla defesa e do contraditório, impõe-se a decretação de nulidade do feito.
Pelo exposto, acolho a preliminar levantada pelo recorrente para
11 anular o processo, pelas razões expostas, a partir das fls. 70, inclusive, observando-se a
regular intimação do defensor do apelante para oferecimento da defesa prévia, restando
prejudicada a preliminar de nulidade absoluta pela deficiência de defesa técnica, como
também o mérito, em desarmonia com o parecer da Procuradoria da Justiça.
É
como voto.
Presidiu o julgamento o Exmo. Des. João Benedito da Silva, que
também funcionou como relator. Participaram ainda do julgamento o Exmo. Dr. Eslu
Eloy Filho, Juiz de Direito convocado para substituir o Exmo. Des. Nilo Luís Ramalho
Vieira, e o Exmo. Des. Leôncio Teixeira Câmara.
Presente à sessão o(a) Exmo.(a) Dr.(a) Álvaro Cristino Pinto
Gadelha Campos, Procurador(a) de Justiça.
•
( 1
Sala de Sessões da Egrégia Câmara Criminal do Colendo Tribunal
de Justiça do Estado do Estado da Paraíba, em João Pessoa, Capital, aos 30 (trinta) dias
do mês de março de 2010.
,
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TRIBUNAL
Coordenadoria Judiciária
Registrado
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•
•
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Apelante : Fernando de Oliveira Rodrigues (Adv.: Rougger Xavier G