INTERVENÇÃO DE MÁRIO FERNANDO PEREIRA , Presidente da Câmara Municipal de Alpiarça
Sr. Presidente da Assembleia Municipal
Sra Presidente da Junta de Freguesia de Alpiarça
Sr. Presidente da Assembleia de Freguesia
Sras e Srs deputados municipais, vereadores e demais eleitos nos órgãos autárquicos
Sras e Srs convidados
Caros conterrâneos,
Estamos a completar 40 anos sobre a data fundadora da nossa democracia. Uma vez mais,
cumprindo uma saudável tradição, esta Assembleia evoca solenemente o Dia da Liberdade – o
dia que despoletou a mais profunda e libertadora transformação da sociedade e da vida dos
portugueses. O dia – e as transformações – que, não tendo o mesmo significado para todos,
permitiu que possamos estar aqui hoje, de forma livre e democrática, a anunciar as nossas
ideias sobre a história que celebramos, o tempo que vivemos ou o futuro que projectamos
para a nossa terra e o nosso País.
Numa intervenção evocativa como é esta, impõe-se que se diga o que foi a Revolução de Abril:
quem a realizou, porquê, e a que regime pôs termo; o que de essencial marcou o processo
revolucionário que se seguiu à acção militar e ao levantamento popular; que evolução teve o
regime político que fundou; qual o rumo a seguir para cumprir Abril; qual a sua relação com
esta nossa comunidade alpiarcense que, tendo dado um importante contributo para a
realização dos ideais de Abril, também iremos hoje aqui homenagear colectivamente.
Assim, é fundamental que se comece por dizer claramente que o regime deposto a 25 de Abril
de 1974 era uma ditadura fascista. Um regime que oprimia os portugueses e subjugava outros
povos; que negava os mais elementares direitos políticos e sociais; que censurava o
pensamento, perseguia e violentava os que agiam no sentido de construir uma sociedade mais
justa.
Foram 48 anos que provocaram o atraso e o isolamento, a guerra, a emigração em massa, o
medo, a tortura, numa sociedade baseada na desigualdade.
Depois, é de elementar justiça saudar o movimento militar libertador, todos os militares de
Abril, que heroicamente saíram à rua para derrubar a ditadura, e que souberam assumir o
desígnio histórico de devolver ao povo português a dignidade que lhe tinha sido retirada. Eram
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jovens marcados pelo horror e pela injustiça de uma guerra que parecia sem fim, que vitimou
milhares de portugueses e muitos mais de entre os povos africanos que se levantaram contra o
colonialismo, pela autodeterminação e independência. Uma guerra colonial que consumiu
grande parte dos recursos do Estado, condenando Portugal ao atraso, ao subdesenvolvimento,
e a maior parte da sua população à pobreza e à miséria.
Mas esses corajosos militares de Abril, tiveram atrás de si décadas de resistência e de luta dos
trabalhadores e dos democratas; trabalhadores e democratas que se lhes associaram de
imediato, fazendo a Revolução.
Uma Revolução que alterou profundamente as estruturas do País e foi factor de progresso
social, derrotando o fascismo e afirmando direitos políticos e sociais: ao voto; ao trabalho; à
habitação; ao salário digno; à saúde e educação para todos; à protecção social, entre muitas
outras conquistas. Promoveu a reforma agrária e a nacionalização dos sectores fundamentais
da economia; criou um modelo de Poder Local democrático que desenvolveu e qualificou o
território; assumiu a independência dos povos de Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, São
Tomé e Príncipe e Timor-Leste. A Constituição da República, promulgada a 2 de Abril de 1976 –
dia do nosso concelho – é a letra viva desta transformação democrática.
No entanto, esta Revolução, as suas conquistas, com que quase todos diziam estar de acordo,
porque percebiam ser esse o genuíno sentimento popular, foi sendo golpeada, travada, por
actos de alguns sectores políticos e medidas de governos que, desde 1976, a foram
desvirtuando e a fizeram retroceder, conduzindo, de crise em crise, à situação: mais de 2
milhões de portugueses a viver na pobreza; mais de 1 milhão de desempregados; emigração a
atingir níveis que se assemelham aos tempos da ditadura; cortes nos salários e pensões;
desregulação dos direitos laborais e sociais; fecho generalizado de serviços públicos; dívida
pública insustentável; soberania nacional em causa; ataques constantes à autonomia e ao
papel do Poder Local.
Senhoras e senhores,
Tal como hoje, em que os partidos e as forças políticas não são todas iguais e não têm o
mesmo grau de responsabilidade nas consequências de políticas que, no essencial têm traído
Abril, também durante a ditadura salazarista e marcelista houve os que lutaram por um País
livre e justo e os que defenderam a tirania ou dela beneficiaram. Temos a obrigação de saber
quem foram uns e outros. Mas esta verdade objectiva, particular, não nos pode impedir de ver
o todo.
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Ao longo do último século – o século que completamos como Município – um grande número
de alpiarcenses desempenhou um destacado papel na luta antifascista, pela dignidade como
seres humano e como trabalhadores, pela liberdade. É nosso dever, enquanto beneficiários de
um valioso património de luta, testemunhar todo este percurso e honrá-lo. Por ser justo.
Porque marca o carácter desta terra e desta gente.
Como disse Álvaro Cunhal – símbolo maior do combate do povo português por uma
democracia avançada –, “Alpiarça é um nome gravado a letras de ouro na história da luta da
classe operária e das forças democráticas em Portugal. (…) O povo de Alpiarça conheceu bem,
pela sua própria experiência, o que significam a fome, o desemprego, as perseguições, a
clandestinidade, a brutalidade das forças repressivas, a separação de pais, companheiras e
filhos, a tortura, a prisão e a morte. Os trabalhadores, os democratas e o povo de Alpiarça
combateram sempre corajosamente contra a exploração, contra a repressão fascista, pela
instauração das liberdades e da democracia”.
No ano em que comemoramos o Centenário do concelho, no ano em que comemoramos os 40
anos de Abril, quem poderia estar em melhores condições para ser distinguido com a Medalha
Municipal da Liberdade?
Qual a entidade que, em todo o século que passou, em toda a nossa história contemporânea,
mais é merecedora da nossa homenagem, enquanto comunidade? Qual a entidade, ainda que
abstracta, que melhor corporiza uma memória colectiva de gente trabalhadora e persistente,
resistente à injustiça, veículo de valores e ideais que deverão continuar a ser projectados no
futuro?
O Povo de Alpiarça é, pela forte marca identitária que uma parte significativa de si transmitiu
ao todo, o justo depositário da homenagem dos que aqui vivem hoje, 40 anos depois do 25 de
Abril – 100 anos depois da elevação desta terra a concelho. As crianças que daqui a pouco
virão receber a Medalha da Liberdade são os filhos e os netos dos que cá nasceram, viveram e
vivem; serão os pais e os avós dos alpiarcenses de amanhã.
Senhoras e senhores, caros eleitos autárquicos,
Desde sempre olhei para o 25 de Abril e para a Revolução de Abril como o momento mais
importante na história contemporânea de Portugal: o momento em que se concretizaram
anseios milenares da nossa população. Cresci com Abril, numa comunidade que valorizava as
suas conquistas. Pertenço à primeira geração que, graças ao 25 de Abril, teve a oportunidade
de crescer em liberdade e num regime democrático, de estudar, de afirmar ideias e opiniões
sem receio; de beneficiar de um sistema de saúde e de segurança social que dava passos de
gigante; de usufruir de novos equipamentos desportivos e culturais construídos para todos.
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É algo que nunca esqueço. Estarei para sempre grato a todos os que contribuíram para que
pudesse ter sido assim: a todos os que lutaram contra a ditadura de Salazar e Caetano, contra
o fascismo; a todos os militares que prepararam e executaram a acção militar libertadora; a
todos os que, no período revolucionário, procuraram construir uma democracia plena no
nosso País.
Por tudo isto, considero urgente um regresso às políticas que representam os ideais e os
valores de Abril, as únicas que correspondem aos interesses dos portugueses.
Este Município de Alpiarça – num concelho da República; numa terra de Liberdade –
continuará ao lado dos que persistem em procurar os caminhos traçados pela Revolução de
Abril.
Viva o Povo de Alpiarça – construtor da Democracia!
Viva o 25 de Abril!
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Intervenção escrita de Mário Pereira, Presidente da Câmara Municipal