Superior Tribunal de Justiça
RECLAMAÇÃO Nº 4.554 - RJ (2010/0141165-6)
RELATORA
RECLAMANTE
ADVOGADO
RECLAMADO
INTERES.
:
:
:
:
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
BANCO CRUZEIRO DOSUL S/A
AFONSO CESAR BURLAMAQUI E OUTRO(S)
PRIMEIRA TURMA RECURSAL CÍVEL DOS JUIZADOS
ESPECIAIS CÍVEIS DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
: PAULO SÉRGIO BALLERINE
EMENTA
JUIZADOS ESPECIAIS. PEDIDO LIMINAR. DIVERGÊNCIA ENTRE
ACÓRDÃO PROLATADO POR TURMA RECURSAL ESTADUAL E AS
SÚMULAS 381 e 382 / STJ. PERIGO DE DANO INEXISTENTE. LIMINAR
INDEFERIDA. PATENTE DIVERGÊNCIA ENTRE O ENTENDIMENTO
CONTIDO NO ACÓRDÃO RECLAMADO E A JURISPRUDÊNCIA
CONSOLIDADA DO STJ. PROCESSAMENTO DA RECLAMAÇÃO.
1. É vedado aos julgadores reconhecer, com fundamento no art. 51 do CDC e sem
pedido expresso, a abusividade de cláusulas nos contratos bancários. Súmula
381/STJ.
2. A alegação genérica de que a execução do acórdão impugnado poderá ser
iniciada a qualquer momento é insuficiente para a demonstração do periculum in
mora.
Liminar indeferida.
DECISÃO
Trata-se de reclamação com pedido de liminar ajuizada por BANCO
CRUZEIRO DO SUL, objetivando a reforma de acórdão proferido pela PRIMEIRA
TURMA RECURSAL CÍVEL DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS DO ESTADO DO
RIO DE JANEIRO.
Ação: de repetição de indébito cumulada com pedido de indenização
por danos morais ajuizada por PAULO SERGIO BALLERINI. Alega o autor que
“celebrou com a Empresa-ré uma novação” relativa a empréstimos pessoais consignados
em folha de pagamento. Segundo o autor, a reclamante passou a efetuar a cobrança de
valores excessivos, que não correspondiam aos contratos inicialmente celebrados entre as
partes, razão pela qual o consumidor pleiteou a devolução em dobro dos valores
indevidamente cobrados, nos termos do art. 42 do CDC, e a condenação da reclamante ao
pagamento de indenização por danos morais, no valor de 25 salários mínimos (fls. 61/65
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e-STJ).
Sentença: julgou parcialmente procedente o pedido, a fim de condenar
o reclamante ao pagamento de R$ 8.048,66 (oito mil, quarenta e oito reais e sessenta e
seis centavos), pois “a parte ré não logrou êxito em comprovar a inocorrência dos fatos
narrados na inicial, se restringindo à apresentação de alegações e documentos, incapazes
de contrariar os dizeres da inicial. (...) a versão do autor é muito mais verossímil do que a
do réu” (fls. 109/110 e-STJ).
Recurso inominado: a reclamante alega a inexistência de qualquer ato
ilícito capaz de autorizar a revisão judicial do contrato. Sustenta, ainda, a impossibilidade
de inversão do ônus da prova para a análise dos presentes autos (fls. 121/130 e-STJ).
Acórdão: a PRIMEIRA TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS
ESPECIAIS CÍVEIS DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO negou provimento ao recurso
do reclamante (fl. 151 e-STJ).
Reclamação: pugna pela concessão de liminar, a fim de suspender os
efeitos do acórdão impugnado, pois o entendimento nele manifestado vai de encontro aos
enunciados das Súmulas 381, 382 e 383 do STJ. Requer ainda o provimento da presente
reclamação “para caçar (sic) o acórdão proferido pela Primeira Turma Recursal dos
Juizados Especiais Cíveis do Estado do Rio de Janeiro nos autos do Recurso inominado
nº 0001092-87.2009.8.19.0003” (fls. 27/46 e-STJ).
É o relatório. Decido.
I. Do processamento desta reclamação
A presente reclamação deriva da decisão proferida pelo Pleno do STF
no julgamento dos EDcl no RE 571.572-8/BA, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ de 14.09.2009,
a qual consignou que “enquanto não for criada a turma de uniformização para os
juizados especiais estaduais, poderemos ter a manutenção de decisões divergentes a
respeito da interpretação
da legislação infraconstitucional
federal”, tendo, por
conseguinte, determinado que, até a criação de órgão que possa estender e fazer
prevalecer a aplicação da jurisprudência do STJ aos Juizados Especiais Estaduais, “a
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lógica do sistema judiciário nacional recomenda se dê à reclamação prevista no art.
105, I, f, da CF, amplitude suficiente à solução deste impasse”.
A reclamação, da forma como prevista nos arts. 187 e seguintes do
RISTJ, contudo, não foi concebida para servir de instrumento de uniformização de
jurisprudência. Diante disso, a Corte Especial, em questão de ordem por mim suscitada,
determinou a elaboração de uma resolução delineando uma sistemática de processamento
específica para as reclamações desta natureza. Editou-se, então, a Resolução nº 12,
publicada em 14.12.2009, que se aplica ao presente julgamento.
II. O pedido liminar
Pretende a reclamante a concessão de liminar para determinar “a
suspensão
dos
efeitos
do
acórdão
proferido
no
Recurso
Inominado
nº
0001092-87.2009.8.19.0003 pela Primeira Turma Recursal Cível dos Juizados Especiais
Cíveis do Estado do Rio de Janeiro” (fl. 44 e-STJ).
A concessão da liminar exige a demonstração do periculum in mora,
que se traduz na urgência da prestação jurisdicional, bem como a caracterização do fumus
boni juris, consistente na plausibilidade do direito alegado.
Para tanto, está o Relator autorizado a proceder a um juízo prévio e
perfunctório de viabilidade do pedido principal. Apresentando-se este manifestamente
inadmissível ou contrário à jurisprudência dominante de Tribunal Superior, o seu
aparente insucesso prejudica a concessão da liminar.
No que tange ao periculum in mora, contudo, a petição inicial não
demonstrou o efetivo risco de ineficácia do provimento final pleiteado na presente
reclamação: a alegação genérica de que a execução do acórdão impugnado poderá ser
iniciada a qualquer momento é insuficiente para a demonstração do perigo de dano.
Inexistindo prova cabal de que a instituição financeira reclamante experimentará grandes
prejuízos se não obtiver o provimento provisório ora pleiteado, resta ausente o requisito
de fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação para a concessão da liminar.
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III – O mérito da presente reclamação
Na hipótese em exame, a pretensão da reclamante está aparentemente
resguardada pela jurisprudência desta Corte (Súmulas 381, 382 e 383 / STJ), segundo as
quais (i) é vedado ao julgador declarar abusivas as cláusulas de contrato bancário, sem
que haja requerimento específico formulado pelo consumidor nesse sentido e (ii) a
estipulação de juros superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade.
A posição relativa à Súmula 381/STJ foi melhor desenvolvida no
julgamento do REsp 1.061.530/RS, de minha relatoria, realizado nos moldes
implementados pelo art. 543-C do CPC. Fiquei vencida com relação ao reconhecimento
ex officio da abusividade das cláusulas de contratos bancários e fiz questão de registrar
em meu voto a minha divergência, no sentido de “admitir a revisão de ofício, pelos
julgadores das instâncias ordinárias, pois estes julgamentos, muitas vezes, limitam-se a
reconhecer proteções ao consumidor que já estão pacificadas pela jurisprudência do
STJ.”
A maioria dos i. Ministros integrantes da 2ª Seção, no entanto, assentou
que aos juízes não é permitido “julgar, com fundamento no art. 51 do CDC, sem pedido
expresso, a abusividade de cláusulas nos contratos bancários.” Assim, ressalvada a minha
reserva com relação a este entendimento, foi editada a Súmula 381/STJ.
A Súmula 382/STJ, por sua vez, teve origem no julgamento do mesmo
REsp 1.061.530/RS. Naquela oportunidade, os Ministros da 2ª Seção corroboraram o
entendimento segundo o qual a revisão das taxas de juros superiores a 12% ao ano é
admitida somente em situações excepcionais, nas quais haja relação de consumo e em
que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51,
§1º, do CDC) esteja cabalmente demonstrada.
Patente, portanto, a divergência entre o acórdão prolatado pela 1ª Turma
Recursal dos Juizados Especiais Cíveis do Estado do Rio de Janeiro – RJ e o
entendimento jurisprudencial já consolidado pelo STJ.
Forte em tais razões, indefiro a medida liminar pleiteada, determinando,
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contudo, o processamento da presente reclamação.
Oficie-se (i) o Presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de
Janeiro, (ii) o Corregedor Geral de Justiça do Estado do Rio de Janeiro e (iii) o presidente
da Turma Recursal prolatora do acórdão reclamado, comunicando o processamento desta
reclamação e solicitando informações (art. 2º, II, da Resolução STJ 12/09).
Dê-se ciência ao autor da ação principal, PAULO SÉRGIO
BALLERINE, a fim de que se manifeste, querendo, no prazo de 05 (cinco) dias (art. 3º
da Resolução STJ 12/09).
Publique-se edital no Diário da Justiça, com destaque no noticiário do
STJ na internet, a fim de cientificar os interessados sobre a instauração da presente
reclamação e possibilitar-lhes a manifestação nos autos, no prazo de 30 (trinta) dias (art.
2º, III, da Resolução 12/2009 do STJ).
Decorrido o prazo para informações, remetam-se os autos ao Ministério
Público Federal, para parecer, no prazo de 5 (cinco) dias.
Publique-se. Intimem-se.
Brasília (DF), 1º de setembro de 2010.
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora
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RJ - Contratos bancários - cláusulas abusivas