DIFICULDADE DE APRENDIZAGEM: O QUE HÁ POR TRÁS DISTO?
Nereida da Silveira Rocha Otten1
RESUMO: É fundamental ter em conta que a pessoa só aprende porque trabalha
intelectualmente através de processos que envolvem conflitos, reflexões, retrocessos, novas
reflexões e, então, um conseqüente progresso. Para a psicopedagogia clínica o problema de
aprendizagem está vinculado às formas singulares de cada pessoa pensar. Não é considerado
como um desvio, mas como um sintoma ou uma reação ao ambiente, um sinal de que algo –
inconscientemente - não está bem.
PALAVRAS CHAVES: Psicopedagógica Clínica, Singularidades, Significações
Inconscientes.
Questões como o conhecimento da criança, o seu “estilo” de aprender, a história
individual de aprendizagem e a importância da simbolização do mundo, ainda hoje, precisam
ser discutidas e apropriadas pelos professores, pais e profissionais da saúde. Posicionar-se ao
lado da criança é aceitar e compreender que as diferenças que cada criança traz são
singularidades pertinentes a ela, sem que isto suponha comparações constantes com as outras.
É levar em consideração que não se aprende somente dentro da escola e que o “aprender” não
é efeito somente da consciência.
Para que essa discussão avance é fundamental ter em conta que a pessoa só aprende
porque trabalha intelectualmente através de processos que envolvem conflitos, reflexões,
retrocessos, novas reflexões e, então, um conseqüente progresso. Durante estes processos a
pessoa se vincula com os objetos de conhecimentos sempre mediada pelas significações
inconscientes e nunca de maneira direta. Ou seja, quando aprende a pessoa se coloca inteira
como sujeito e não somente com algumas partes do corpo ou cérebro.
A aprendizagem é considerada a matriz da própria vida e, por isso, a compreensão e o
tratamento que damos às pessoas - com ou sem transtornos de desenvolvimento - não devem
mais se apoiar nos pressupostos que trazem consigo a idéia de menos-valia e de diferença.
Esses só adicionam preconceitos! Para sair disso, cada pessoa necessita ter um novo olhar a
1 Professora da turma de progressão do I ciclo (AP) da EMEF José Loureiro da Silva, Psicóloga e
Psicopedagoga Clínica com atuação em consultório particular - [email protected]
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respeito das suas próprias diferenças consideradas “deficiências” (pelos outros e por si
mesma), transformando-as em “diferenças-vantagens”, trilhando assim, um novo caminho.
Em função desse entendimento, é que o tratamento psicopedagógico clínico é o mais
indicado no caso de se tratar de um transtorno de aprendizagem. Nesse tipo de tratamento não
se trabalha com reeducação escolar - refazendo o trabalho que é unicamente do professor.
Trabalha-se abrindo possibilidades de mudança a partir da diferenciação, tirando a pessoa do
lugar já marcado, resgatando o prazer de aprender e tornando-o único a seus próprios olhos,
aos olhos de sua família e da escola. Psicopedagogo e Paciente vão construindo juntos
estratégias para um melhor desempenho, segundo suas potencialidades e interesses.
Os recursos são, geralmente, jogos, atividades de expressão artística, linguagem oral e
escrita, dramatização, criação de maquetes simbólicas e todo tipo de recursos que facilitem o
desenvolvimento da capacidade de aprender com autonomia e prazer. Ao se abrir um espaço
de brincar durante o diagnóstico e o tratamento psicopedagógico, já se está possibilitando um
movimento na direção da saúde, da cura. O brincar como espaço de criação, de invenção, de
produção é um espaço constituinte da operação psíquica e isto é indispensável no tratamento
das dificuldades de aprendizagem!
Para a psicopedagogia clínica, o problema de aprendizagem está vinculado às formas
singulares de cada pessoa pensar. Não é considerado como um desvio, mas como um sintoma
ou uma reação ao ambiente, um sinal de que algo – inconscientemente - não está bem. Não
existe, aqui, a comparação com um “normal” e não existe uma única causa, nem uma só
situação determinante do problema de aprendizagem. O que existe é a historicidade dessa
pessoa (do ponto de vista psicológico, pedagógico e clínico). Nessa história particular estão
incluídos o lugar subjetivo dela na família, a forma de circular o amor e o conhecimento na
família, na escola e nos diversos grupos do qual ela faz parte. Todos esses aspectos
contribuíram, de alguma maneira, para que ela não se percebesse inteligente e não se sentisse
capaz de aprender com autonomia e com prazer, produzindo assim a dificuldade para
aprender.
Assim, a avaliação e o diagnóstico psicopedagógicos começam com um conjunto de
hipóteses que se constroem a cada encontro com a pessoa, com os pais e com a escola. Isto
nos permite observar a dinâmica da modalidade de aprendizagem individual e familiar e como
esta foi interpretada por ele e seus pais. A postura, o olhar e a escuta do psicopedagogo clínico
são dirigidas para a pessoa e para sua história de aprendizagens e de não aprendizagens
sempre levando em conta que é alguém único e especial que está diante dele. Por isso é uma
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escuta atenta, que vai além das evidências geralmente já observadas pela família e pela escola.
A compreensão dos múltiplos fatores envolvidos no processo é bastante complexa e
requer, necessariamente, um enfoque multidisciplinar a partir do qual são colhidos, pelo
psicopedagogo clínico, conhecimentos de várias áreas como a Psicologia, a Pedagogia, a
Medicina, a Fonoaudiologia e outras, necessárias para cada caso. Assim, o entendimento da
origem das dificuldades de aprendizagem e das significações inconscientes delas na família,
na escola e nas relações, leva o psicopedagogo clínico, junto com os demais profissionais que
avaliaram o paciente a determinar as prioridades de tratamento.
O objetivo será sempre de abrir caminhos onde a autoria de pensamento seja possível,
ou seja, onde possa surgir uma pessoa capaz de aprender, satisfeita consigo mesma e que se
perceba inteligente!
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