UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM
PSICOLOGIA JURÍDICA
ALIMENTOS NA UNIÃO ESTÁVEL
por
PRISCILLA KRETZMANN BASTOS DOS SANTOS
2005.1
ALIMENTOS NA UNIÃO ESTÁVEL
por
PRISCILLA KRETZMANN BASTOS DOS SANTOS
Monografia apresentada
ao Curso de Psicologia
Jurídica da Universidade
Cândido Mendes.
2005.1
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À Lúcia, João, Fernanda e Júlio,
com amor, pelo carinho e
incentivo que sempre recebi.
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SUMÁRIO
Introdução............................................................................................................6
1. União Estável...................................................................................................8
1.1. Conceito.............................................................................................8
1.2. A União Estável e o Novo Código Civil............................................10
1.3. Requisitos.........................................................................................10
1.4. Características.................................................................................12
1.5. Distinções entre União Estável, União Livre,
Concubinato e Sociedade de Fato........................................................13
1.6. Efeitos da União Estável..................................................................14
1.7. Direitos Sucessórios.........................................................................15
1.8. Responsabilidade nas Obrigações Contraídas
Durante a União Estável........................................................................16
1.9. Adoção do Nome do Companheiro..................................................16
1.10. Indenização por Morte do Companheiro........................................17
1.11. Inventário por Morte do Companheiro............................................17
1.12. Competência para os Litígios sobre União Estável........................17
1.13. União de Pessoas do Mesmo Sexo...............................................18
2. Alimentos.......................................................................................................20
2.1. Introdução........................................................................................20
2.2. Obrigação de Prestar Alimentos......................................................21
2.3. Pressupostos da Obrigação Alimentar.............................................22
2.4. Características dos Alimentos..........................................................23
2.5. Modalidades dos Alimentos.............................................................25
2.6. Sujeitos da Obrigação Alimentar......................................................26
2.7. Alimentos aos Filhos Menores.........................................................27
2.8. Alimentos aos Filhos Maiores, Pais e Irmãos..................................28
2.9. Alimentos Decorrentes do Casamento
e da União Estável.................................................................................29
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2.10. Transmissão da Obrigação Alimentar............................................30
2.11. Conteúdo e Condições da Prestação Alimentícia..........................30
2.12. Ação de Alimentos – Lei 5478/68...................................................31
2.13. Execução de Alimentos – Prisão do Devedor................................32
3. Alimentos na União Estável...........................................................................34
3.1. Alimentos e União Estável:
Visão Constitucional................................................................................34
3.2. O Direito Regulamentado pela
Lei n° 8.971, de 29.12.1994...................................................................35
3.3. A Lei n° 9.278. de 10.05.1996..........................................................37
3.4. Direito dos Conviventes a Alimentos:
Novo Código Civil....................................................................................38
Conclusão..........................................................................................................41
Bibliografia.........................................................................................................44
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INTRODUÇÃO
Ao tratar do direito de família, a vigente Constituição Federal introduziu
importantes inovações, firmando de modo especial a aceitação da união
estável como entidade familiar.
Deste ponto, exsurgem importantes conseqüências, merecendo
destaque o aspecto concernente aos alimentos, que reciprocamente um
companheiro deve ao outro.
Do ponto de vista legal, antes da nova ordem constitucional, nem o
homem nem a mulher eram obrigados a dar alimentos um ao outro, em se
tratando de união de fato. No máximo, permitia-se requerer a dissolução de tal
sociedade de fato com a partilha do patrimônio formado, ou a indenização por
serviços
domésticos
prestados
por
um
dos
conviventes
ao
outro.
Especialmente esta última forma constituía um meio de contornar o vazio da
falta da lei frente a situações de graves injustiças. Como a lei não tipificava a
figura da sociedade conjugal de fato como instituto jurídico, não era possível
exigir dela o amparo de suas relações.
A partir da vigência da Constituição da República Federativa de 1988
teve início uma maior preocupação com a juridicização da união estável,
principalmente para efeitos de mútua assistência. Vieram as Leis n° 8.971/94 e
9.278/96, regulamentando a questão dos alimentos.
O direito a alimentos é direito fundamental e essencial de todos, é direito
à vida com dignidade. É princípio universal não apenas moral, mas jurídico.
Assim, se a união estável é entidade familiar, seria profundamente contraditório
negar o direito alimentar aos conviventes que vivem em estreita e íntima
relação.
O Código Civil, na parte de que trata os alimentos, especialmente no
artigo 1694, assegura sua prestação aos companheiros. Para a concessão tem
relevância também a aplicação do artigo 1.702, que a garante na dissolução,
desde que o convivente for inocente e desprovido de recursos. Já pelo
parágrafo único do artigo 1704, verificada a culpa do necessitado, o excompanheiro obriga-se a socorre-lo unicamente se não tiver aptidão para o
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trabalho nem parentes em condições de presta-los, fixando o valor
indispensável para sua sobrevivência.
Os alimentos têm como limites ou condicionamentos a necessidade do
alimentado e a possibilidade do alimentante.
Ao longo deste estudo, serão analisados os institutos da união estável e
dos alimentos e suas características, e principalmente, o dever de prestar
alimentos entre os conviventes.
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1. UNIÃO ESTÁVEL
1.1. Conceito
A Constituição Federal de 1988, encarando uma nova realidade
brasileira, tendo em vista conceitos consagrados em sistemas jurídicos
modernos, veio trazer novas conotações, destinando um capítulo à família, com
a afirmação de que ela é a base da sociedade e tem especial proteção do
Estado.
A par da família tradicionalmente conhecida constituída pelo casamento,
vislumbrou a “entidade familiar”, que conceituou no artigo 226, parágrafo 3o ,
nestes termos:
“Para efeito de proteção do Estado é reconhecida a união
estável entre o homem e a mulher como entidade familiar,
devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”.
Num primeiro plano, a Constituição Federal passou a considerar as
uniões extraconjugais como realidade jurídica, e não apenas como um fato
social. No momento em que as colocou “sob a proteção do Estado”, retirou-lhes
todo o aspecto estigmatizante. Nada mais fez a Carta Federal que reconhecer
um fenômeno social comum e generalizado em todo o País, tornando-se
necessária a sua regulamentação.
A união estável ou união livre, ou estado de casado, ou concubinato é
uma união sem maiores solenidades ou oficialização pelo Estado, não se
submetendo a um compromisso ritual e nem se registrando em órgão próprio.
A convivência, a participação de esforços, a vida em comum, a recíproca
entrega de um para o outro, ou seja, a exclusividade não oficializada nas
relações entre o homem e a mulher caracteriza este tipo de união.
“União estável” passou a constituir a denominação oficial, utilizada em
diplomas que tratam do assunto, constando na Constituição Federal, nas Leis
n°s 8.971, de 29.12.1994, e 9.278, de 13.05.1996, e no Código Civil de 2002. A
expressão corresponde à ligação permanente do homem com a mulher,
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desdobrada em dois elementos: a comunhão de vida, envolvendo a comunhão
de sentimentos e comunhão material; e a relação conjugal exclusiva de
deveres e diretos inerentes ao casamento.
A Lei 8.971/94, em seu artigo 1o e parágrafo único, constituiu-se no
primeiro diploma a fornecer elementos para caracterizar a união de fato,
estabelecendo que:
“À companheira comprovada de um homem solteiro,
separado judicialmente, divorciado ou viúvo, que com ele
viva há mais de cinco anos, ou dele tenha prole”, poderá
valer-se do disposto na Lei n° 5.478, de 25 de julho de
1968, enquanto não constituir nova união e desde que
prove a necessidade.
E o parágrafo único: “Igual direito e nas mesmas condições é
reconhecido ao companheiro da mulher solteira, separada judicialmente,
divorciada ou viúva”.
A nova lei estabelecia alguns requisitos como necessários às uniões
entre o homem e a mulher, para ensejar o direito a alimentos, os quais foram
estendidos para originar direitos sucessórios:
a) a condição de companheiro dos conviventes;
b) o estado de solteiro, separado judicialmente, divorciado ou viúvo;
c) convivência há mais de cinco anos ou surgimento de prole.
Porém, com o advento da Lei n° 9.278, de 10.05.1996, alguns requisitos
sofreram modificação, impondo como condição a convivência duradoura,
pública e contínua, no que se aproxima do Código Civil em vigor.
O Código Civil de 2002, que passou a regular a matéria, preocupou-se a
reconhecer a união estável como instituto, trazendo a sua definição no artigo
1.723: “É reconhecida como entidade familiar a união entre o homem e a
mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e
estabelecida com o objetivo de constituição de família.
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1.2. A União Estável e o Novo Código Civil
A partir da Constituição Federal de 1988, a união estável foi inserida no
ordenamento jurídico como uma forma de família. Com isto, foi elevada à
categoria de entidade familiar, com a proteção do Estado. Nada mais fez a
Carta Magna que reconhecer um fenômeno social comum e generalizado em
todo o País, tornando-se necessária a sua regulamentação.
Seguiram-se, nesse intento, a Lei n° 8.971, de 29.12.1994, tratando do
direito dos companheiros a alimentos e sucessões; e a Lei n° 9.278, de
13.05.1996, com regaras sobre a conversão da união estável em casamento.
O Novo Código Civil, dentro do Livro IV da Parte Especial, no Título III,
disciplina o assunto em cinco artigos, com previsões um tanto diferentes do
que vem nas leis esparsas supra citadas. É reconhecida como entidade familiar
a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública,
contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituir família.
A união estável não se constituirá caso ocorram os impedimentos do
artigo 1521, que são os mesmos impedimentos para o casamento. Estabelecese que as relações pessoais entre os companheiros obedecerão aos deveres
da lealdade, respeito e assistência, e de guarda, educação e sustento dos
filhos. Consoante outra disposição, na união estável, salvo convenção válida
entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o
regime da comunhão parcial de bens. Consigna-se, outrossim, a possibilidade
de conversão da união estável em casamento, mediante pedido dos
companheiros ao juiz e assento no Registro Civil.
1.3. Requisitos
Para caracterizar os requisitos da união estável, mister analisar os
requisitos do Código Civil, já que não mais perduram as Leis n°s 8.971 e 9.278.
Os primeiros elementos impostos para a formação da união estável
estão previstos no artigo 1.723 do Código Civil, quais sejam, convivência
pública, contínua e duradoura de um homem e uma mulher, com o objetivo de
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constituir família. Não se inserem as exigências do período de tempo mínimo, e
nem o estado da pessoa com a qual se une.
A razão da desnecessidade do prazo era defendido pela doutrina,
surgida logo depois da vigência da Lei n° 9.278, em face da exigência do lapso
de cinco anos de duração da união que vinha prevista na Lei n° 8.971.
Revogado, portanto, o prazo de cinco anos estabelecido na lei anterior.
No entanto, certo que o período de convivência não poderá ser efêmero
ou curto. Para caracterização da união estável, necessária a sua duração por
alguns anos, revelando-se consolidada no tempo, de modo a se apresentar
como uma unidade familiar firme, estabelecida e duradoura. Assim, não
abrange as uniões efêmeras, superficiais e de curta duração.
Não se reconhece a união estável se presente qualquer dos
impedimentos para casar, nos termos do x1o do artigo 1723. Assim, não podem
formar união estável:
·
os ascendentes com os descendentes, seja o parentesco natural ou civil;
·
os afins em linha reta;
·
o adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem o
foi do adotante;
·
os irmãos, unilaterais ou bilaterais, e demais colaterais, até o terceiro
grau inclusive;
·
o adotado com o filho do adotante;
·
as pessoas casadas;
·
o cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa de
homicídio contra o seu consorte.
Se as pessoas se encontram separadas de fato ou judicialmente podem
constituir uniões estáveis. O mero fato da separação de fato não impede o
reconhecimento da união, em vista da segunda parte do x1o do artigo 1521 do
Código Civil. Embora não legalizadas as separações, as uniões posteriores não
impedem os efeitos que dela decorrem, o que é diferente se mantidas em
concomitância com a efetividade do casamento. Permitem o pedido de
alimentos e autorizam a partilha do patrimônio formado no período de sua
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vigência. Tais uniões vedam unicamente a conversão em casamento, enquanto
não dissolvido o vínculo existente.
As causas suspensivas da celebração do casamento não constituem
óbice para o reconhecimento da união, em vista do x2o do artigo 1723.
1.4. Características
Dentre as principais características da união estável está a affectio
societatis familiar, ou o ânimo, a intenção de formar uma sociedade familiar,
granjeando os esforços, os trabalhos e bens para a entidade familiar.
A segunda característica é a posse de estado de casado, consistente em
passar alguém na condição de uma união tal como se fosse casado.
Em seguida, a notoriedade do relacionamento e honorabilidade da
conduta, isto é, quando duas pessoas vivem juntas, aparecendo em público
com os sinais exteriores de pessoas regularmente casadas, vivendo como
marido e mulher, respeitando-se mutuamente. Exige-se uma vida comum
semelhante à normal de pessoas casadas, que vivem relativamente bem,
dentro de certo entendimento e compreensão mútuas.
O dever de fidelidade, a dedicação monogâmica, recíproca, vivendo em
more uxório, em atitude ostensiva de dedicação também caracteriza a união
estável.
A vida em comum sob o mesmo teto não é indispensável à
caracterização da união estável, conforme já decidido pelo Supremo Tribunal
Federal. O que interessa é a convivência more uxório, a aparência de marido e
esposa, a maneira de vida própria de pessoas casadas, os costumes e as
atividades exercidas se direcionando ao atendimento dos interesses da família.
A continuidade da união também é imprescindível, pois evidente que
uma união temporária, casual, passageira não resulta efeito jurídico nenhum. A
continuidade perdurará por um espaço de tempo suficiente para tornar-se
consolidada a união. Embora não se encontre estabelecido um padrão de
tempo exato, um certo período de duração mínimo se requer.
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Importa ainda a dependência efetiva de um companheiro ou convivente
em relação ao outro. Para caracterizar a atuação na formação do capital,
naturalmente cumpre se apresente a união de modo que um companheiro seja
dependente, em algum aspecto, do outro.
1.5. Distinções entre União Estável e União Livre, Concubinato
e Sociedade de Fato
A denominação união estável revela preferência no texto constitucional,
na legislação ordinária, na doutrina e jurisprudência. Representa a união de um
homem e uma mulher em situação de inexistência de impedimentos para o
casamento. Corresponde à união entre pessoas já separadas de fato ou de
direito, viúvas, ou divorciadas, ou solteiras, apresentando-se à sociedade como
constituindo uma união, com as qualidades da exclusividade, fidelidade, vida
em comum, ostensividade e durabilidade.
A expressão união livre tem um alcance maior, compreendendo todo
relacionamento sexual e afetivo de pessoas, sem interessar se estão
impedidas de casar. Significa simplesmente o relacionamento extramatrimonial.
Concubinária ou adulterina será a união quando há impedimento para
matrimônio. Desde que se dê a união prolongada, ou a convivência constante,
infringindo as disposições que impedem o casamento, transforma-se em
adulterina ou espúria a união, formando o concubinato.
De maior relevância destacar a diferença entre união estável e
concubinato, que se resolve pela mera análise da existência ou não de
elementos que disciplinam o casamento. O relacionamento sexual e amoroso
pode não redundar em união estável porque se desenvolve quando vigorava
plenamente o casamento, ou porque as relações ocorrem concomitantemente
com os impedimentos para casar. Nestes termos, preceitua o artigo 1.727 do
Código Civil: “As relações não eventuais entre o homem e mulher, impedidos
de casar, constituem concubinato”.
Já no pertinente à sociedade de fato, não é de relevância a convivência
more uxório, a notoriedade, o dever de fidelidade, a comunidade de leito. O
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elemento imprescindível é a affectio societatis, vínculo constituído na intenção
de associar-se. Para a formação de um fundo comum, em qualquer sociedade,
com o fim de repartirem-se os ganhos e as perdas que resultarem, se requer,
como elemento essencial, a affectio societatis, a intenção de formar sociedade.
Dentre os elementos da sociedade de fato, destacam-se:
·
A pluralidade de pessoas, que se unem para constituir um patrimônio
comum, ou um fundo geral pertencentes aos componentes da
sociedade;
·
Onerosidade, consistente na atuação para a obtenção de utilidade ou
bens;
·
A
comutatividade, revelada nos direitos e deveres mútuos para o
desiderato da formação do patrimônio;
·
A constituição em vista da pessoa dos contraentes, ou a união intuitu
personae;
·
A consensualidade, definido no mero consenso dos envolvidos na união,
sem necessidade de instrumentalizar-se por escrito o intuito.
A sociedade cristaliza-se na comunhão de vida e interesses, que se
alcança com a conjugação de esforços em benefício de todos os que se
uniram.
1.6. Efeitos da União Estável
Uma vez caracterizada a união estável, apresentando todos os
requisitos e características necessários, nascem efeitos jurídicos, dentro os
quais o principal: constituição de uma família. Impõe-se uma postura, de parte
dos conviventes ou companheiros, de respeito, fidelidade, colaboração,
convivência, assistência moral e material, além daqueles deveres exigidos em
favor da prole comum, se houver. De certa maneira, compreendem os deveres
indicados para o casamento.
Neste sentido, preconiza o artigo 1724, do Código Civil: “As relações
pessoais entre os companheiros obedecerão aos deveres da lealdade, respeito
e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos”.
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A violação de qualquer dos deveres determina a proteção do Estado,
mediante as ações competentes, como a de alimentos, a de partilha do
patrimônio, e até dissolução da união, com a separação de corpos, em se
apresentando motivos, à semelhança do que ocorre no casamento.
1.7. Direitos Sucessórios
O Código Civil passou as disciplinar a matéria no artigo 1790 e incisos,
com o seguinte texto:
“A companheira ou o companheiro participará da sucessão
do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na
vigência da união estável, nas condições seguintes:
I – se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma
quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho;
II – se concorrer com descendentes só do autor da
herança, tocar-lhe-á metade do que couber a cada um
daqueles;
III – se concorrer com outros parentes, terá direito a 1/3
(um terço) da herança;
IV – não havendo parentes sucessíveis, terá direito á
totalidade da herança.
O patrimônio formado antes da união, e aquele herdado ou doado, não
ingressam na herança. O caput do artigo 1.790 limita a herança aos bens
recebidos onerosamente no curso da união estável. Assim, conclui-se que tais
patrimônios, que não integram a herança, não são transmitidos nas proporções
assinaladas ao companheiro ou à companheira sobrevivente. Vão para os
outros herdeiros, ou constituem a herança jacente, se inexistentes parentes
sucessíveis.
Desde que comprovada a união estável, mantida até a morte, vingam
tais direitos, mostrando-se de rigor observar os requisitos, inclusive a
continuidade da união até a morte do companheiro.
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No caso do convivente falecido ser separado de fato, haverá uma
concorrência entre o esposo, ou a esposa, e o companheiro, ou companheira.
Em favor do primeiro milita a força jurídica do assento do casamento não
desfeito; para o segundo, a união estável erigida pelos fatos.
1.8. Responsabilidade nas Obrigações Contraídas Durante a
União Estável
Vivendo os companheiros na mesma residência, aparentando o estado
de casados perante a sociedade, ambos respondem pelos compromissos
econômicos assumidos por qualquer um deles, desde que contraído em
proveito do conjunto familiar, nos termos dos artigos 1643 e 1644 do Código
Civil.
Assim, pela compra efetuada por um ou outro dos conviventes, seja de
gêneros alimentícios, de coisas e produtos aparentemente destinados a prover
o lar das necessidades cotidianas, seja de bens que requerem compromissos
mais sérios e envolvendo até financiamentos, qualquer dos partícipes da união
sujeita-se a suportar as dívidas.
1.9. Adoção do Nome do Companheiro
A mulher pode adotar o nome do companheiro, nos termos da Lei de
Registros Públicos (Lei n° 6.015/73), que dispõe sobre o assunto no parágrafo
2o do artigo 57:
“A mulher solteira, desquitada ou viúva, que viva com
homem solteiro, desquitado ou viúvo, excepcionalmente e
havendo motivo ponderável, poderá requerer ao juiz
competente que, no registro de nascimento, seja averbado
o patronímico de seu companheiro, sem prejuízo dos
apelidos próprios, de família, desde que haja impedimento
legal para o casamento, decorrente do estado civil de
qualquer das partes ou de ambas.”
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1.10 Indenização por Morte do Companheiro
Qualquer dos companheiros tem legitimidade para reclamar perante o
terceiro responsável, em nome próprio, a indenização pela morte do parceiro.
A convivência é admitida com o caráter de produzir efeitos, tanto que
imposto o dever de mútua assistência. O desfazimento da união causado por
elemento estranho à vontade das pessoas interligadas impõe a obrigação de
indenizar à pessoa que interrompeu a união.
Parte-se do princípio previsto no artigo 186 do Código Civil, de que toda
pessoa que prove um prejuízo ou uma injustiça em um ato ilícito tem o direito
de pedir a reparação, quer se trate de dano patrimonial ou moral. A pessoa que
era companheira do morto, que era por este auxiliada em suas necessidades
primordiais, faz jus ao direito.
1.11. Inventário por Morte do Companheiro
Atualmente, diante da proteção do Estado à união estável, que a elevou
à categoria de entidade familiar, será necessária a presença do companheiro
sobrevivente no inventário. Uma vez admitida a sociedade conjugal pelos
herdeiros, simplesmente reserva-se a meação do patrimônio constituído
durante à vigência da união estável a título oneroso; não concordando eles, é
imprescindível o reconhecimento pela via judicial. Nesse caso, após o
reconhecimento da união, desenvolve-se o inventário na forma comum, com a
entrega da parte cabível ao companheiro ou companheira, que pode, inclusive,
funcionar como inventariante.
1.12. Competência para os Litígios sobre União Estável
Em face da elevação da união estável ao nível de entidade familiar, a
solução de litígios envolvendo questões relativas a esta união são de
competência das varas de família. As demandas ligadas a pedido de alimentos,
à alteração das obrigações, à separação de corpos, e outras concernentes à
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convivência, têm profundo caráter familiar, daí a pertinência da vara
especializada. Mesmo a ação cognitiva, ou de conhecimento, normalmente
declaratória, para que se declare a união estável, processa-se no juízo de
família.
As ações que não cuidam da união estável, mas de meros efeitos
decorrentes do concubinato adulterino, não têm a competência atraída para a
vara de família. A possível indenização por um dos concubinos ajuizada para o
ressarcimento de eventuais prejuízos, ou a busca da remuneração dos serviços
prestados, tem a sede no juízo cível, eis que não decorrem da união estável,
tendo cunho obrigacional.
A sucessão causa mortis não se processa no juízo de família, e sim no
juízo orfanológico.
1.13. União de Pessoas do Mesmo Sexo
O direito brasileiro não admite o casamento nem a união estável entre
homossexuais. Nos termos da Constituição da República Federativa do Brasil,
a união estável reconhecida como entidade familiar é aquela circunscrita entre
um homem e uma mulher, excluindo inteiramente a abertura de se emprestar
reconhecimento às uniões entre homossexuais. O Código Civil, de forma
expressa, no artigo 1.723, reconhece a entidade familiar somente à união
estável entre o homem e a mulher.
Porém, mostra-se realidade concreta a existência de autênticas uniões
entre pessoas do mesmo sexo, nos moldes das relações matrimoniais ou
companheiras.
Todas as discussões que surgem são marcadas de importância
sociológica ou de matizes psicológicos, só interessando ao direito o aspecto
patrimonial dessas uniões. Os bens amealhados ou conseguidos durante a
convivência são divididos, desde que demonstrada a efetiva e real união e
participação mútua na realização de tarefas necessárias aos dois conviventes.
Mesmo quando comprovada a união convivência duradoura, pública e
contínua, é reconhecida somente a existência de uma sociedade de fato. Ao
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parceiro, no máximo, é deferida a metade do patrimônio adquirido durante a
vida em comum, e ainda assim, mediante a prova de mútua colaboração.
Não há que se falar em direito aos alimentos, por ausência de
sustentação no direito positivo brasileiro, e em razão de que se restringem
unicamente a pessoas unidas de sexos diferentes.
O Superior Tribunal de Justiça reconheceu apenas o direito à partilha
dos bens, mas não em face da união estável, e sim de uma sociedade de fato,
com base no artigo 981 do Código Civil, que contempla a sociedade quando as
pessoas se obrigam a contribuir com bens ou serviços, para o exercício de
atividade econômica e a partilha entre si dos resultados.
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2. ALIMENTOS
2.1. Introdução
O termo alimentos pode ser entendido, em sua conotação vulgar, como
tudo aquilo necessário para a subsistência de um indivíduo, tudo aquilo que
nutre, que serve como sustento dos seres vivos. No entanto, a compreensão
do termo é mais ampla, pois além de abranger alimentos propriamente ditos,
deve referir-se também a satisfação de outras necessidades essenciais da vida
em sociedade. Acrescenta-se a esta noção o conceito de obrigação que tem
uma pessoa de fornecer estes alimentos à outra.
O Código Civil de 2002 disciplina os alimentos nos artigos 1694 a 1710.
Nenhum destes dispositivos se preocupou em definir o que se entende por
alimentos. Porém, no art. 1920 encontramos o conteúdo legal de alimentos: “O
legado de alimentos abrange o sustento, a cura, o vestuário e a casa, enquanto
o legatário viver, além da educação se ele for menor”.
Os alimentos traduzem-se em prestações periódicas fornecidas a
alguém para suprir tudo quanto é indispensável às necessidades da vida, como
alimentação, moradia, vestuário, assistência médica e instrução, etc. A palavra
“alimentos” compreende todo o necessário para o sustento, habitação,
vestuário, tratamento por ocasião de moléstia e, se o alimentário for menor, as
despesas com a sua educação e instrução. Nesse quadro, a doutrina distingue
os alimentos naturais e os alimentos civis.
Os alimentos naturais ou necessários são aqueles que possuem alcance
limitado, compreendendo estritamente o necessário para a subsistência. São
os alimentos indispensáveis, compreendendo a alimentação, vestuário, saúde
e educação. O art. 1694, parágrafo 2o do Código Civil Brasileiro permite ao juiz
que fixe apenas estes alimentos indispensáveis em determinadas situações
restritivas: “Os alimentos serão apenas indispensáveis à subsistência, quando
a situação de necessidade resultar de culpa de quem os pleiteia”
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Os alimentos civis ou côngruos incluem os meios suficientes para a
satisfação de todas as outras necessidades básicas do alimentando, segundo
as possibilidades do obrigado. São os alimentos necessários, que abrangem as
necessidades morais e intelectuais do alimentando.
A
regra
geral
é
dos
alimentos
amplos –
alimentos
naturais
(indispensáveis) cumulado com alimentos civis (necessários), segundo
disposto no art. 1694, parágrafo 1o, do Código Civil Brasileiro: “Os alimentos
devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos
recursos da pessoa obrigada”.
2.2. Obrigação de Prestar Alimentos
O dever de assistência em favor daquele que não pode prover sua
própria
subsistência
deixou de ser um simples imperativo moral de
solidariedade humana para se transformar em obrigação jurídica prevista em
lei.
A obrigação alimentar interessa ao Estado, à sociedade e à família. O
Estado designa em primeiro lugar os parentes para fazê-lo, aliviando em parte
seu encargo social. Cuida-se de um instituto básico do direito de família,
considerado de ordem pública e protegido de modo especial pelo Estado.
Por esta obrigação, coloca-se a pessoa no dever de prestar à outra o
necessário para sua manutenção, para tender as necessidades fundamentais
do cônjuge, companheiro ou parente.
Os parentes podem exigir uns dos outros os alimentos e os cônjuges
devem-se mútua assistência. A mulher e o esposo, não sendo parentes,
devem-se alimentos com fundamento no vínculo conjugal. Também os
companheiros em união estável estão na mesma situação.
21
Neste sentido, reza o artigo 1694, caput, Código Civil:
“Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir
uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver
de modo compatível com a sua condição social, inclusive
para atender às necessidades de sua educação”.
Existe, pois, uma distinção entre a obrigação alimentar entre parentes e
aquela entre cônjuges ou companheiros. Ambas, porém, são derivadas da lei.
No tocante à obrigação alimentar a ser prestada pelos parentes, o
simples laço sanguíneo não a obriga, sendo necessário que os parentes
estejam dentre os delimitados por lei, alcançando a responsabilidade somente
aos mais próximos.
Sobre o tema, a lição do ilustre doutrinador, Orlando Gomes1:
“Não são todas as pessoas ligadas por laços familiares que
estão sujeitas a prestar alimentos, mas somente os
ascendentes, os descendentes, os irmãos, assim germanos
como unilaterais, e os cônjuges. Limitando aos colaterais
de segundo grau de obrigação proveniente de parentesco”.
2.3. Pressupostos da Obrigação Alimentar
Reza o artigo 1695 do Código Civil:
“São devidos os alimentos quando quem os pretende não
tem bens suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, à
própria mantença e aquele, de quem se reclamam, pode
fornece-los, sem desfalque do necessário ao seu sustento”.
Um dos princípios básicos da obrigação alimentar é aquele que
determina que o montante dos alimentos deve ser fixado de acordo com as
necessidades do alimentando e as possibilidades do alimentante, nos termos
do artigo 1694, parágrafo 1o do Código Civil.
Só pode reclamar alimentos quem comprovar que não pode sustentar-se
com seu próprio esforço. Do lado do alimentante, importa que ele tenha meios
1
GOMES, Orlando. Direito de Família.Rio de Janeiro: Forense, 2004.
22
de fornecer os alimentos. O alimentante os prestará sem desfalque do
necessário ao próprio sustento. Daí dizer-se que tanto se exime de presta-lo
aquele que não o pode fazer sem sacrifício da própria subsistência, quanto
aquele que porá em risco de sacrifica-la se vier a dá-los.
As condições de fortuna de alimentado e alimentante são mutáveis,
razão pela qual também é modificável, a qualquer momento o montante dos
alimentos fixados, como também a obrigação alimentar pode ser extinta,
quando se altera a situação econômica das partes. Daí por que sempre é
admissível a ação revisional ou de exoneração de alimentos. A decisão que
concede ou nega alimentos nunca faz coisa julgada.
Neste sentido, dispõe o artigo 1699 do Código Civil:
“Se, fixados os alimentos, sobrevier mudança na situação
financeira de quem os supre, ou na de quem os recebe,
poderá o interessado reclamar ao juiz, conforme as
circunstâncias, exoneração, redução ou majoração do
encargo”.
Além do pressuposto básico, binômio necessidade/possibilidade, os
alimentos hão de ter, na devida conta, as condições pessoais do alimentante e
do alimentado. Vale dizer: serão fixados na proporção das necessidades do
reclamante e dos recursos da pessoa obrigada, Não tem cabida exigi-los além
do que o credor precisa, nem pode ser compelido a presta-los com sacrifício
próprio ou de sua família.
A obrigação alimentar, além de condicional e variável, é recíproca, no
sentido de que, na mesma relação jurídica familiar, o parente que, em princípio
seja devedor poderá reclama-los se vier a necessitar.
2.4. Características dos Alimentos
O direito aos alimentos é pessoal e intransferível, personalíssimo,
visando preservar a vida do necessitado. Sua titularidade não se transfere, nem
se cede a outrem. O direito não se transfere, mais uma vez materializadas as
prestações periódicas como objeto da obrigação, podem elas ser cedidas.
23
Neste sentido, o artigo 1700 do Código Civil: “A obrigação de prestar
alimentos transmite-se aos herdeiros do devedor, na forma do art. 1694”.
O direito aos alimentos pode deixar de ser exercido, mas não pode ser
renunciado, mormente quanto aos alimentos derivados de parentesco. O
encargo alimentar é de ordem pública. O beneficiário pode, contudo, renunciar
aos valores dos alimentos vencidos e não pagos.
È o que preconiza o artigo 1707 do Código Civil: “Pode o credor não
exercer, porém lhe é vedado renunciar o direito a alimentos, sendo o respectivo
crédito insuscetível de cessão, compensação ou penhora”.
Não há direito à repetição dos alimentos pagos, tanto os provisionais
com os definitivos. O pagamento dos alimentos é sempre bom e perfeito, ainda
que recurso venha modificar decisão anterior, suprimindo-os ou reduzindo seu
montante. No entanto, no caso de pagamento feito com evidente erro quanto à
pessoa, é evidente que o solvens terá direito à restituição.
As obrigações alimentícias não se compensam, nos termos do artigo
373, inciso II do Código Civil. Contudo, se admite a compensação com
prestações de alimentos pagas a mais, tanto para os provisórios, como para os
definitivos.
Como são destinados á sobrevivência, os créditos de alimentos não
podem ser penhorados, segundo dispõe o artigo 694, inciso II do Código de
Processo Civil. Essa impenhorabilidade, no entanto, não atinge os frutos.
O direito de alimentos não pode ser transacionado. O quantum doas
alimentos já devidos pode ser transigido, pois trata-se de direito disponível. O
direito em siso, não o é. O caráter personalíssimo do direito afasta a transação.
O direito a alimentos é imprescritível; não se subordina a um prazo de
propositura. No entanto, uma vez fixados judicialmente o quantum, a partir de
então inicia-se o lapso prescricional de dois anos. As prestações alimentícias
prescrevem em dois anos, conforme artigo 206, parágrafo 2o do Código Civil.
Outra característica marcante é a variabilidade. A pensão alimentícia é
variável. Modificadas as situações econômicas e as necessidades das partes,
deve ser alterado o montante da prestação, podendo ocorrer sua extinção
(artigo 1699 do Código Civil).
24
Quanto à periodicidade, o pagamento da obrigação alimentícia deve ser
periódico. Geralmente, cuida-se de prestações mensais, mas outros períodos
podem ser fixados. Porém, não se admite que um valor único seja o pago, nem
que o período seja longo, anual ou semestral.
A obrigação alimentar é, ainda, divisível entre os vários parentes, de
acordo com os artigos 1696 e 1697 do Código Civil. Desse modo, vários
parentes podem contribuir com uma quota para os alimentos, de acordo com
sua capacidade econômica, sem que ocorra solidariedade entre eles.
2.5. Modalidades de Alimentos
Os alimentos são derivados de direito de família, do casamento e do
companheirismo. São obrigação legal, nos termos do artigo 1694, caput, do
Código Civil.
Em suas modalidade os alimentos podem ser classificados nos
seguintes termos:
a) Quanto à Finalidade:
* Alimentos Provisionais: são aqueles que precedem a uma demanda de
separação judicial, divórcio, nulidade ou anulação de casamento, ou mesmo
ação de alimentos.
Os alimentos provisionais estão previstos no artigo 1706 do Código Civil:
“Os alimentos provisionais serão fixados pelo juiz, nos termos da lei
processual”
* Alimentos Provisórios: são aqueles que são concomitantes a uma
demanda de separação judicial, divórcio, nulidade ou anulação de casamento,
ou mesmo ação de alimentos.
Os alimentos provisórios podem ser requeridos sempre que movida a
ação de alimentos, com fixação initio litis, por força do art. 4o da Lei n°
5.478/68, desde que já haja prova pré-constituída do dever de presta-los
A finalidade dos alimentos provisionais e provisórios é propiciar meios
para que a ação seja proposta e prover a mantença do alimentando e seus
dependentes durante o curso do processo.
25
* Alimentos Regulares ou Definitivos: são os alimentos estabelecidos
como pensão periódica, ainda que sempre sujeitos à revisão judicial.
b) Quanto ao Tempo:
* Alimentos Futuros: são aqueles a serem pagos após a propositura da
ação;
* Alimentos Pretéritos: são aqueles que antecedem a ação – em nosso
sistema, não são possíveis alimentos anteriores á citação, por força do artigo
13, parágrafo 2o, Lei n° 5478/68.
Reza o artigo 1701 do Código Civil:
“A pessoa obrigada a suprir alimentos poderá pensionar o
alimentando, ou dar-lhe hospedagem e sustento, sem
prejuízo do dever de prestar o necessário á sua educação,
quando menor”.
O dispositivo faculta ao devedor prestar alimentos sob a forma de
pensão periódica ou sob a forma de concessão de hospedagem e sustento ao
alimentado. Essa modalidade só se aplica aos alimentos derivados do
parentesco e não se aplicará, em princípio, aos alimentos decorrentes do
casamento ou da união estável.
O fornecimento direto de alimentos no próprio lar do alimentante
caracteriza a denominada obrigação alimentar própria, pouco utilizada na
prática.
Embora a lei faculte ao alimentante escolher a modalidade de prestação,
o juiz poderá impor a forma que melhor atender ao caso concreto, nos termos
do parágrafo único do artigo 1701 do Código Civil.
2.6. Sujeitos da Obrigação Alimentar
Segundo determina o artigo 1696 do Código Civil:
“O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e
filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a
26
obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de
outros”.
Existindo vários parentes do mesmo grau em condições de alimentar,
não existe solidariedade entre eles. A obrigação é divisível, podendo cada um
concorrer com parte do valor devido e adequado ao alimentando.
Na falta dos ascendentes, caberá a obrigação aos descendentes,
guardada a ordem de sucessão e, faltando estes, aos irmãos – art. 1697 do
Código Civil. A falta de parente alimentante deve ser entendida não somente
como inexistência e ausência de capacidade econômica dele para alimentar.
Neste sentido, o artigo 1698 do Código Civil:
“Se o parente que deve alimentos em primeiro lugar, não
estiver em condições de suportar totalmente o encargo,
serão chamados a concorrer os de grau imediato; sendo
várias pessoas obrigadas a prestar alimentos, todas devem
concorrer na proporção dos respectivos recursos, e,
intentada ação contra uma delas, poderão as demais ser
chamadas a integrar a lide”.
Atende-se ao princípio da divisibilidade da obrigação alimentícia,
permitindo-se que, no mesmo processo, sejam outros alimentantes chamados
a integrar a lide.
De qualquer forma, são chamados a prestar alimentos, primeiramente,
os parentes em linha reta, os mais próximos excluindo os mais remotos. Assim,
se o pai puder prestar alimentos, não se acionará o avô.
Não havendo parentes em linha reta, ou estando estes impossibilitados
de pensionar, são chamados para a assistência alimentícia os irmãos.
2.7. Alimentos aos Filhos Menores
É dever dos pais proverem a subsistência e educação dos filhos. Esse
dever
transmuda-se
na
obrigação
legal
de
prestar
alimentos.
O
descumprimento contumaz do dever alimentar pode até mesmo autorizar a
suspensão ou perda do poder familiar.
27
Arnaldo Rizardo defende a possibilidade do nascituro receber a
prestação alimentícia, sob o fundamento de que a lei ampara a concepção.
Desde que presentes os requisitos próprios e a certeza de quem é o pai,
mesmo os alimentos provisionais, é possível conceder, com que se garantirá
uma adequada assistência pré-natal ao concebido.
Para os filhos havidos fora do casamento, a regra está no artigo 1705 do
Código Civil:
“Para obter alimentos, o filho havido fora do casamento
pode acionar o genitor, sendo facultado ao juiz determinar,
apedido de qualquer das partes, que a ação se processe
em segredo de justiça”.
2.8. Alimentos aos Filhos Maiores, Pais e Irmãos
Com relação aos filhos que atingem a maioridade, a idéia que deve
preponderar é que os alimentos cessam com a maioridade. Entende-se, porém,
que a pensão poderá distender-se por mais algum tempo, até que o filho
complete os estudos superiores ou profissionalizantes, com idade razoável, e
possa prover a própria subsistência. Neste sentido, o artigo 1694 do Código
Civil, que determina que os alimentos devem atender, inclusive, às
necessidades de educação.
Tem-se entendido que, o pensionamento deve ir até os 24 anos. Outras
situações excepcionais, como a condição de saúde, poderão fazer com que os
alimentos possam ir além da maioridade.
Com relação aos irmãos, nos termos do artigo 1697 do Código Civil,
podem eles acionar-se reciprocamente para pedir alimentos, mas somente nas
hipóteses de não existirem ascendentes ou descendentes em condições de
alimenta-los. Afora esses colaterais irmãos, nenhum outro parente ou afim tem
direito de pedir alimentos.
28
2.9. Alimentos Decorrentes do Casamento e da União Estável
Por força do artigo 1566 do Código Civil, os cônjuges devem-se mútua
assistência.
Já o artigo 1724 do mesmo diploma legal determina que as relações
pessoais entre os companheiros obedecerão aos deveres de lealdade, respeito
e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos.
Daí o direito de alimentos. A regra geral é que, em caso de separação
judicial ou de fato, o marido prestará pensão alimentícia à mulher. Mas, com a
igualdade de direitos entre os cônjuges, estabelecida no ordenamento
constitucional, nada obsta, perante os pressupostos legais, que o homem
venha pedir alimentos à mulher. Não subsiste o direito alimentar se ambos os
cônjuges desfrutam de igual situação financeira.
Importa ressaltar o artigo 1704 e parágrafo único do Código Civil:
“Se um dos cônjuges separados judicialmente vier a
necessitar de alimentos, será o outro obrigado a presta-los
mediante pensão a ser fixada pelo juiz, caso não tenha sido
declarado culpado na ação de separação judicial”.
Parágrafo único – “Se o cônjuge declarado culpado vier a
necessitar de alimentos, e não tiver parentes em condições
de presta-los, nem aptidão para o trabalho, o outro cônjuge
será obrigado a assegurá-los, fixando o juiz o valor
indispensável à sobrevivência”.
Assim, os alimentos necessários (apenas aqueles estritamente
imprescindíveis para a sobrevivência – art. 1694, parágrafo 2o, CCB) somente
serão devidos por um cônjuge ao outro culpado quando este não tiver parentes
em condições de prestar alimentos ou não tiver aptidão para o trabalho.
O casamento e a união estável, por si só, não implicam dever de
alimentar. Em qualquer situação, devem ser provados a necessidade e demais
requisitos da obrigação.
29
Com o casamento, a união estável ou o concubinato do credor, cessa o
dever de prestar alimentos. Com relação ao credor, cessa também o direito de
alimentos, se tiver procedimento indigno em relação ao devedor.
2.10. Transmissão da Obrigação Alimentar
Segundo dispõe o artigo 1700 do Código Civil Brasileiro, “a obrigação de
prestar alimentos transmite-se aos herdeiros do devedor na forma do artigo
1694”.
Para Arnaldo Rizardo2, não há sucessão da pensão alimentícia além das
forças da herança. Os herdeiros devem fazer o inventário, justamente para
discriminar o patrimônio próprio e os bens recebidos na herança. Os herdeiros
jamais devem concorrer com os seus próprios bens para alimentar o credor do
morto.
Cabe ao credor tomar as medidas procedimentais cabíveis para que se
assegure a manutenção da pensão, conforme os ativos da herança.
Há, porém, outras interpretações do dispositivo, inclusive no sentido
extremado que entende que a transmissão da obrigação alimentar é integral e
incondicionada, bem como outra corrente que defende que essa obrigação
refere-se apenas às prestações vencidas até a data da morte.
2.11. Conteúdo e Condições da Prestação Alimentícia
Os alimentos devem ser fixados de acordo com a necessidade de
alimentando e as possibilidades do alimentante.
O pagamento da pensão é periódico, tendo em vista a natureza da
obrigação. Não há norma jurídica que imponha um valor ou padrão ao
magistrado quanto ao montante da pensão. Quando se tratar de pessoa
assalariada, regularmente, os tribunais têm fixado a pensão em torno de 1/3
2
RIZARDO, Arnaldo. Direito de Família: Lei n° 10.406, de 10.01.2002.Rio de Janeiro: Editora
Forense, 2005.
30
dos vencimentos. Por outro lado, os alimentos devem ser fixados com base nos
rendimentos do alimentante, e não com fundamento em seu patrimônio. A
prova dos ganhos do alimentante é fundamental.
A prestação alimentícia pode ser alterada a qualquer tempo. Questão é
a correção monetária. O artigo 1710 do Código Civil determina: “As prestações
alimentícias, de qualquer natureza, serão atualizadas segundo índice oficial
regularmente estabelecido”
Nada impede, porém, que os reajustes tenham com base as majorações
que sofrem os proventos do alimentante. No entanto, impo-se um critério justo
a partir da fixação dos provisórios, pois o inadimplemento pode dar margem à
grave sanção civil da prisão.
Importa também que o juiz analise as condições de quem pede: ainda
que seja a mulher, hoje sua situação na sociedade exige que se insira no
mercado de trabalho. Diferente será a situação se o alimentando é criança,
inválido ou pessoa de avançada idade, alijada do mercado de trabalho.
2.12. Ação de Alimentos – Lei n° 5478/68
A ação de alimentos disciplinada na Lei 5478/68 tem rito procedimental
sumário especial, e destina-se àqueles casos em que não há necessidade de
provar a legitimação ativa do alimentando. Refere-se aos alimentos dito
provisórios, ou seja, aqueles alimentos que constituem adiantamento de tutela,
que o juiz concede no início da ação que há de seguir, a fim de que, nos autos
respectivos, se decida afinal, sobre o direito aos alimentos e sua fixação
definitiva.
É a ação que compete a uma pessoa para exigir de outra, em razão de
parentesco, casamento ou união estável, os recursos de que necessita para
subsistência, na impossibilidade de prover por si o próprio sustento.
A ação de alimentos pode ser ajuizada pelo interessado, por seu
representante legal e pelo MP. Cabe ao MP intentar ação em favor de menores
de 18 anos, sempre que se fizer necessário, nos termos do artigo 201, inciso
III, Estatuto da Criança e do Adolescente.
31
A partir da citação, a obrigação torna-se exigível. O juiz fixará de plano a
prestação a ser paga. Após, designada a audiência, o réu terá prazo fixado
para contestar a ação. Caso o réu não compareça à audiência, sofrerá pena de
revelia e de confissão quanto à matéria de fato. Não havendo acordo, haverá a
instrução sumária. Ao final, as partes aduzirão razões finais. Neste momento,
o juiz tentará nova conciliação e prolatará sentença.
2.13. Execução de Alimentos – Prisão do Devedor
Reza o artigo 5o, LXVII da Constituição Federal: “Não haverá prisão civil
por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e
inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel”.
O artigo 19 da Lei 5478/68 permite que o juiz tome todas as providências
possíveis para a satisfação dos alimentos determinados, inclusive, a
decretação de prisão do devedor até sessenta dias. Já o artigo 733 do Código
de Processo Civil, lei posterior, fixa o prazo de um a três meses de prisão.
O cumprimento dessa pena de prisão não exime o devedor do
pagamento das prestações vincendas e vencidas e não pagas. A prisão é meio
coercitivo para o pagamento, mas não o substitui.
O ordenamento jurídico coloca à disposição do credor várias
modalidades de execução de dívida alimentar, a fim de facilitar a satisfação do
credor de pensão alimentícia.
A forma mais cômoda de execução, recomendada pelo artigo 16 Lei
5478/68 é o desconto em folha de pagamento, quando o devedor for
funcionário público, militar, diretor ou gerente de empresa, bem como
empregado sujeito à legislação do trabalho. O juiz mandará descontar em folha
de pagamento a importância da prestação alimentícia, conforme reza o artigo
734 do Código de Processo Civil. A comunicação ao órgão encarregado do
desconto será feita por ofício.
Não sendo possível o desconto, a execução se fará pelos outros meios
estabelecidos pelos artigos 732, 733 e 735 do Código de Processo Civil
32
Na execução de sentença de decisão de obrigação alimentícia, o juiz
mandará citar o devedor para, em três dias, efetuar o pagamento, provar que o
fez ou justificar a impossibilidade de efetua-lo, segundo disposto no art. 733,
Código de Processo Civil.
Todavia, a jurisprudência somente tem admitido a execução nos termos
do artigo 733 do Código de Processo Civil, com a prisão do alimentante, para
cobrança das prestações alimentares dos últimos três meses ou no máximo
seis meses; para as mais antigas, exige-se que a execução seja nos termos do
artigo 732 do Código de Processo Civil.
33
3. ALIMENTOS NA UNIÃO ESTÁVEL
3.1. Alimentos e União Estável: Visão Constitucional
O direito aos alimentos na união estável passou por inúmeras fases no
Direito Brasileiro, tendo como base norteadora a Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988. Antes da nova ordem constitucional, nem o
homem e nem a mulher eram obrigados a dar alimentos um ao outro, em se
tratando de uma união de fato.No máximo, permitia-se requerer a dissolução
da tal sociedade de fato, com a partilha do patrimônio formado, ou a
indenização por serviços domésticos prestados por um dos conviventes ao
outro. O instituto do companheirismo pertencia ao campo obrigacional, sem
repercussão no Direito de Família.
Com a entrada em vigor do artigo 226, x3o da Constituição Federal, o
direito dos companheiros aos alimentos passou a ser questão de Direito de
Família, uma vez que se reconheceu expressamente a união estável como
sendo espécie de família.
Entretanto, neste período de início de vigência do dispositivo, prevaleceu
o entendimento pela inadmissibilidade da obrigação alimentar entre
companheiros. O entendimento majoritário, à época, era de que havia a
necessidade de norma expressa que estabelecesse o dever alimentar entre os
conviventes, ou seja, havia necessidade de elaboração de uma lei ordinária
que estabelecesse tal obrigação alimentar em nosso ordenamento jurídico.
Em posição minoritária, porém bastante convincente, defendia-se que o
direito a alimentos estaria incluído na imediata proteção pelo Poder Público,
malgrado a inexistência de lei que disciplinasse o assunto. Efetivamente, a
partir do advento do reconhecimento como entidade familiar, resta evidente o
cabimento da mútua assistência, e daí, dos alimentos.
34
3.2. O Direito Regulamentado pela Lei n° 8.971, de 29.12.1994
O direito aos alimentos na união estável só foi devidamente
regulamentado pela Lei n° 8971/94, representando efetivo avanço no
ordenamento jurídico pátrio ao reconhecer o direito aos alimentos no o art. 1o:
“À companheira comprovada de um homem solteiro, separado judicialmente,
divorciado ou viúvo, que com ele viva há mais de cinco anos, ou dele tenha
prole”.
O mesmo direito foi estendido aos companheiros, se preenchidas as
condições do caput da regra acima, consoante seu parágrafo único: “Igual
direito e nas mesmas condições é reconhecido ao companheiro de mulher
solteira, separada judicialmente, divorciada ou viúva”.
Para se valer desse direito aos alimentos, era necessário o cumprimento
de determinados requisitos, consoantes a lei em exame. E que perduram para
as controvérsias nascidas de uniões existentes antes do Código Civil de 2002:
a) A efetiva união estável, isto é, duradoura, perene, contínua, notória,
conhecida, constante, com fidelidade, de modo a formar uma
comunidade ou comunhão de vida, um compartilhamento de interesses,
trabalhos, ideais, embora, não seja dispensável a vida em comum sob o
mesmo teto;
b) Convivência por tempo superior a cinco anos, ou, independentemente
do decurso de prazo, a existência de prole comum;
c) A condição de ser livre o parceiro, isto é, que o homem e a mulher
deveriam ser solteiros, separados judicialmente, divorciados ou viúvos;
d) A temporariedade do direito alimentar, isto é, o dever alimentar cessava
desde que o beneficiado viesse a constituir nova união. Aqui o legislador
não foi preciso, não esclarecendo se a “nova união” seria matrimonial ou
extramatrimonial. A doutrina e jurisprudência da época concluíram que o
direito aos alimentos deixava de subsistir, mesmo quando se tratava de
união livre.
e) A
subordinação
do
direito
alimentar
ao
binômio
necessidade/possibilidade, conditio legis de todo crédito alimentar, nos
35
termos do artigo 1694 do Novo Código Civil. Correlato ao requisito da
necessidade está forçosamente a possibilidade de prestá-los, pois
nenhuma lei pode impor a alguém a prestação de alimentos com
sacrifício de sua própria subsistência.
A Lei n° 8971/94 ainda autorizou a aplicação do procedimento relativo ao
rito especial de alimentos – Lei n° 5478/68, uma vez comprovada a união
estável e cessando o relacionamento entre companheiros, enquanto não
constituída nova união e dede que provada a necessidade.
Uma vez que a Lei n° 8971/94 reportou-se à Lei n° 5478/68 e
considerando que esta última impõe comprovar o parentesco e a obrigação
alimentar do devedor, tornou-se necessária a prova pré-constituída dos seus
requisitos, Portanto, deverá, sempre, ser comprovada a relação de fato para se
recorrer aos princípios da lei Especial de Alimentos.
Apesar de não estar previamente estabelecido na lei, prevaleceu a
norma geral da proporcionalidade, na razão das necessidades do reclamante e
dos recursos da pessoa obrigada. O crédito alimentar não pode constituir
motivo de enriquecimento do alimentando, nem se justifica venha a exceder
desproporcionalmente ao status econômico habitual do reclamante.
Questão que se colocou quando da entrada em vigor da Lei n° 8971/94
e que prosseguiu até os nossos dias, sempre objeto de questionamento,
consiste em definir quando cessa o direito de pleitear alimentos. Comprovada a
união estável e cessando o relacionamento entre os companheiros, foram
assegurados os benefícios da Lei 5478/68, para o futuro. O requerente deve
comprovar que viveu em união com seu parceiro, e, enquanto subsistiu a
união, recebeu assistência alimentar, tendo satisfeito seu direito durante a vida
em comum. Fundamental será sempre a prova da necessidade e da
dependência econômica de quem os pleiteia.
Alimentos pelo tempo decorrido não lhes cabem, porque os alimentos
não se concedem para o passado. Os mesmos devem ser requeridos tão logo
consubstanciado o rompimento da vida em comum. Quanto ao futuro, a
continuidade dos alimentos cessa se o alimentado vier a constituir nova união,
36
ou se provar a desnecessidade por qualquer meio: exercício regular de uma
atividade laborativa, recebimento de herança, etc.
3.3. A Lei n° 9.278 de 10.05.1996
Com o advento da Lei n° 9278/96, regulamentando o x3o do artigo 226
da Carta Magna, trouxe alterações à matéria, estabelecendo em seu art. 2o:
“São direito e deveres iguais dos conviventes: ... II - A assistência moral e
material recíproca”.
O art. 7o da Lei n° 9278/96 ainda determinou: “Dissolvida a união estável
por rescisão, a assistência material prevista nesta Lei será prestada por um dos
conviventes ao que dela necessitar, a título de alimentos”.
Ficou assegurado o direito a alimentos ao convivente necessitado, após
a dissolução, como decorrência da imposição à assistência moral e material
recíproca enquanto vigorante a união.
Todavia, dispensou-se a exigência de operar-se a união com uma
pessoa solteira, separada judicialmente, divorciada ou viúva, bem como não
mais se exigiu um período de união de cinco anos. È o que se conclui da
análise do artigo 1o da Lei n° 9.278: “É reconhecida como entidade familiar a
convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher,
estabelecida com o objetivo de constituir família”.
Assim, pelo menos para fins de alimentos, não interessa a categoria de
pessoa com a qual se dá a convivência, desde que de sexo diferente. Mesmo
que casados ou separados de fato um ou ambos os conviventes, exsurge o
direito a alimentos.
Outrossim, não mais persistiu o requisito de um prazo mínimo de
duração da convivência de cinco anos. Não se coloca um prazo mínimo, mas
parece inquestionável que deveria a união ter uma prolongada duração, de
modo a demonstrar que não se tratou de uma fugaz relação. Para satisfazer a
exigência da união com o objetivo de constituir família, impunha-se que se
revelasse séria, duradoura e longa a união.
37
E justamente em razão da finalidade da união dirigida à constituição de
família, inserida no tópico final do artigo 1o transcrito da Lei n° 9.278,
depreendia-se que a vida em comum se desenvolveria sob o mesmo teto, ou
que se manifestasse em forma de coabitação. Unicamente desta maneira
reconhecia-se a constituição de família, envolvendo a comunidade formada por
um homem e uma mulher.
A mera circunstância de existir filho não dispensava a prova da união por
certo espaço de tempo , pois a prole pode decorrer de mero relacionamento
sexual, não equivalendo que tenham convivido os progenitores.
3.4. Direito dos Conviventes a Alimentos: Novo Código Civil
O Código Civil de 2002 trouxe flagrantes avanços no que concerne aos
alimentos. Ao estabelecer no art. 1694 o direito de os “parentes, cônjuges ou
conviventes pedirem uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver
de modo compatível com a sua condição social”, acabou por estender a todos
os companheiros todo o tratamento dos alimentos decorrentes das relações de
parentesco ou do rompimento da sociedade conjugal. Assim, restou garantido o
direito recíproco dos companheiros aos alimentos na hipótese de dissolução da
união estável.
Constitui dever de ambos os conviventes a “mútua assistência”, em
dimensão bem mais vasta que o simples ato de fornecer alimentos. Abrange os
cuidados que um convivente está obrigado a devotar ao outro, tanto na doença,
nas adversidades, no âmbito afetivo, como no setor material, concentrando-se
o cuidado nos alimentos, que abrangem a alimentação, o vestuário, o
transporte, os medicamentos, a moradia e até as doenças.
Os requisitos para concessão dos alimentos na união estável são iguais
aos impostos para o casamento. A exemplo do que ocorre com alimentos em
decorrência do casamento, trata-se apenas de uma possibilidade de
concessão. O simples fato da existência dessas relações não significa que
delas necessariamente decorrerão alimentos. É preciso o requisito da
necessidade, da possibilidade, e mais, de uma relação de dependência
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econômica existente entre as partes na constância da relação. Não mais se
aceita a dependência presumida da mulher em relação ao homem.
Da análise do Código Civil, concluem-se os seguintes requisitos:
a) A efetiva união estável, isto é, duradoura, perene, contínua, notória,
conhecida, constante, com fidelidade, de modo a formar uma
comunidade ou comunhão de vida, sendo indispensável a vida em more
uxório (como se casado fossem);
b) A duração da convivência por um prazo razoável, de modo a ficar
caracterizada a constituição de uma entidade ou comunidade familiar;
c) A união formada entre um homem e uma mulher;
d) A necessidade do convivente, de modo a não revelar condições do
sustento ou subsistência pelos meios próprios, e a possibilidade do
alimentante, revelando condições para prestar a assistência material;
e) A não constituição de nova união, e muito menos que se case o
convivente, porquanto nem no casamento situações equivalentes
comportam a prestação alimentaria.
No tocante á exclusão do dever de alimentar entre os conviventes,
diversas causas o exoneram, porém a mais relevante é a situação de igualdade
entre eles. Não há dever de alimentar entre companheiros se ambos estão em
pé de igualdade financeira. Cessada a necessidade do alimentando, cessa o
dever de prestar alimentos.
A contrário sensu, se o devedor de alimentos ficou impossibilitado de
prestá-los, o edido de exoneração também será acolhido.
De sorte que a generalidade dos requisitos previstos para
o
reconhecimento do direito a alimentos no casamento se estende a união
estável. Nesta concepção, revelam-se idênticas as causas de exoneração,
conforme reza o artigo 1708 do Código Civil: “Com o casamento, a união
estável ou o concubinato do credor, cessa o dever de prestar alimentos”.
Nesses casos, a exoneração do dever alimentar reside na constituição
de novo vínculo familiar, em que deve ser obtida mútua assistência. Ademais,
não é razoável que quem estabelece nova família perceba alimentos de seu
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anterior companheiro, já que no âmbito desta nova união que se devem
resolver as necessidades.
A conduta livre e desrespeitosa, a ponto de descambar para o
procedimento indigno em relação ao ex-convivente, também conduz à
cessação do dever, por força do parágrafo único do artigo 1708: “Com relação
ao credor cessa, também, o direito a alimentos, se tiver procedimento indigno
em relação ao devedor”.
A morte do alimentante, por si só, não exclui a obrigação alimentar, por
força do artigo 1700 do Código Civil, que garante ao alimentando pleitear
alimentos dos herdeiros. Já a morte do alimentando exclui a obrigação, pois
sendo esta personalíssima, deixa de existir com a morte do credor.
O artigo 1709 determina a permanência da obrigação de prestar
alimentos na hipótese de “novo casamento do cônjuge devedor”. O mesmo
dever se aplica na hipótese de novo relacionamento familiar daquele que os
deve, mesmo que não haja casamento.
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CONCLUSÃO
A partir da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, a
união estável passou a ser reconhecida como entidade familiar, merecedora de
proteção estatal. Aliadas à Carta Magna, duas leis foram elaboradas para
regulamentarem os direitos dos companheiros, garantindo direitos e deveres
entre aqueles que se unem estavelmente, assimilando-os aos cônjuges unidos
pelo casamento.
Por ocasião da ruptura da vida em comum entre os companheiros,
nasce a obrigação alimentar, tendo como alicerce a comprovação da efetiva
existência da união de fato, ou seja, a prova que efetivamente existiu o vínculo
familiar. A pensão alimentícia é um prolongamento do dever de assistência
material e moral recíproca. O direito a alimentos constitui um corolário do dever
de assistência.
Inicialmente, a obrigação alimentar vinha contemplada no art. 1o da Lei
n° 8.971, que determinava a prestação dos alimentos no caso de união
perdurada por mais de cinco anos, e desde que unido o companheiro ou a
companheira a uma pessoa de sexo diferente solteira, ou separada
judicialmente, ou divorciada, ou viúva.
Com o advento da Lei n° 9.278, a assistência material, a título de
alimentos, pressupunha a união revelada na convivência duradoura, pública e
contínua de um homem e uma mulher, estabelecida com o objetivo de
constituição de uma família, ou seja, não para meras relações sexuais, Não se
inseria o requisito de um prazo mínimo, nem o estado civil que autorizasse o
casamento.
Já com o Novo Código Civil, o direito aos alimentos está regrado na
parte que disciplina o direito patrimonial no direito de família. O artigo 1694
inclui os alimentos decorrentes da união estável ou de fato:
“Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir
uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver
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de modo compatível com a sua condição social, inclusive
para atender às necessidades de sua educação”.
Não há mais restrições quanto ao estado civil de qualquer dos parceiros,
tanto faz credor ou devedor. Os alimentos podem existir entre parceiros, em
relação na qual um ou ambos sejam apenas separados de fato de antigos
cônjuges. O que importa é que entre eles tenha existido família.
O requisito de que a convivência tenha subsistido por certo tempo ou
que dela tenha resultado prole também foi banido pelo Novo Código Civil, que
passou a entender que a estabilidade em casa caso concreto é um elemento
variável, que não deve ser rigidamente fixado por lei, e a presença de filhos
não é indispensável para a configuração de uma família informal.
Importa ressaltar que o direito a alimentos condiciona-se à necessidade
daquele que pleiteia e à possibilidade do convivente obrigado, nos termos do
artigo 1695 do Código Civil:
“São devidos alimentos quando quem os pretende não tem
bens suficientes, nem pode prover, pelo trabalho, à própria
mantença, e aquele, de quem se reclamam, pode fornecêlos, sem desfalque do necessário ao seu sustento”.
A necessidade dos alimentos deve ser comprovada satisfatoriamente
por quem os postula. Se o credor dos alimentos tiver condições de prover sua
própria subsistência, em condições normais, muito provavelmente não terá
êxito no seu pedido.. O Juiz concluirá, diante das provas, pela existência ou
não da necessidade de pensão alimentícia. Também o devedor de alimentos,
deve ter a possibilidade econômica de prestá-los, sem que isso se torne um
sacrifício ou conduza a privações pessoais. A fixação do valor deve levar em
conta a proporcionalidade das necessidades do alimentado e ao mesmo tempo
as possibilidades do alimentante.
O parágrafo único do artigo 1704 do Código Civil revela regra peculiar,
da qual se extrai que mantém–se a obrigação de prestar alimentos ao
convivente considerado culpado pela separação, mas restritamente no valor
indispensável para a sobrevivência, e desde que não tenha parentes em
condições de fornece-los e aptidão para o trabalho.
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No mais, o Código Civil determina que deverá ser aplicado à obrigação
alimentar decorrente da dissolução da união estável os mesmos princípios e
regras aplicáveis à dissolução do matrimônio.
De observar que, para admitir-se o direito aos alimentos decorrentes de
união estável, a ligação deve revelar os elementos da união estável. Não se
compactua com o direito positivo em vigor admitir a obrigação alimentar no
desfazimento de meras uniões concubinárias, embora esporádicas decisões
emprestem interpretações vulgares aos ditames que regulamentam a união
estável.
O elemento diferenciador que a doutrina estabelece entre uma relação
concubinária dita pura ou impura está na manutenção do vínculo do matrimônio
paralelamente ao concubinato. Se o concubinato é mantido paralelamente ao
casamento, diz-se concubinato impuro ou concubinatagem; se os conviventes
não tem qualquer impedimento matrimonial , diz-se que vivem em concubinato
puro. Considera-se também concubinato impuro a situação em que um ou os
dois componentes mantém uma união de fato paralelamente a um casamento
ou a uma união estável.
É inegável que o relacionamento adulterino não configura união estável,
que é a entidade familiar e deve ter o objetivo de constituição de uma família. A
aceitação de duas ou mais famílias paralelas significa a recepção da poligamia
no ordenamento jurídico brasileiro, o que é inconcebível já que todo o direito
pátrio de família está estruturado, pois, na compreensão da família
exclusivamente monogâmica.
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3. alimentos na união estável