Anotações sobre a Lei seca - Suspeitas de embriaguez
A “Função Principal” de qualquer legislação “Nunca” é punir, mas,
sempre, disciplinar, educar e vedar a prática de atos danosos à sociedade. O
Estado mais uma vez, recusa se a assumir a responsabilidade pelo caos na
administração do trânsito em todos os níveis da federação.
Outrora, justificando para a instalação de radares nas ruas e estradas,
Brasil afora, o excesso de velocidade praticado pelos motoristas, como o
responsável pela maioria dos acidentes. Em outro determinado momento,
imputou se ao “novo” motorista a culpa pelos mesmos acidentes. A fiscalização
continuou falha e, então, diante da ineficácia da fiscalização e das péssimas
condições da malha viária brasileira. Passou-se a acusar o “motorista bêbado”
pelos mesmos acidentes.
Na prática o único sistema de fiscalização a funcionar mais efetivamente
são os dos radares, “instalados e mantidos” por empresas “remuneradas” pela
quantidade de autuações lançadas.
Infrações muito mais graves, de responsabilidade de Motoristas, Velhos,
Novos, Dopados, Estimulados, Embriagados, Nicotinados ou Sóbrios, deixam
de ser objeto de autuação. Exemplos como; o excesso de velocidade,
estacionar em locais proibidos, fazer ultrapassagens indevidas, avançar sinal
vermelho, não respeitar os pedestres nas faixas de travessia, sem contar com
a frota brasileira sucateada, em péssimo estado, Rodovias e vias públicas mal
dimensionadas, mal sinalizadas, mal iluminadas, uma demonstração de que o
maior responsável pelos acidentes fatais é o próprio governo, pela má gerencia
nas questões relativas ao transito.
De qualquer modo, as infrações, praticadas, ao contrário do que se
propaga, tanto por velhos, como por novos motoristas, embriagados ou não,
poderiam ser evitadas, em grande parte, com campanha educativa, através de
orientação pessoal de agentes da administração pública, melhorias na malha
viária e uma sinalização, mais informativa do que “ameaçadora”.
Ao direcionar o Código de Trânsito Brasileiro em um “Código Tributário”,
para a arrecadação e não para a “EDUCAÇÃO”, quanto mais infrações
existirem, melhor para o orçamento dos governantes. (Qual será a real
destinação dada à arrecadação das multas de trânsito que, de acordo com o
CTB, deve ser aplicada, exclusivamente, em sinalização, engenharia de
tráfego, de campo, policiamento, fiscalização e educação de trânsito.)
Ora, qualquer lei para tornar mais rigorosas as sanções contra os
motoristas ou restringir-lhes os direitos, deveria pressupor uma situação ideal
da malha viária e um sistema de fiscalização eficiente.
De forma que, só podemos aprimorar o que já funciona em condição de
regularidade. Não sendo possível melhorar o que não existe.
Diariamente em jornais e televisão, vemos imagens de pessoas presas
por supostamente estarem dirigindo “embriagadas”, não raro, motivo de
chacotas. Até onde está se resguardando a vida privada e a intimidade das
pessoas? E a honra e a dignidade? Nada valem as disposições constitucionais
que as asseguram?
A Lei n. 9.503, de 23 de setembro de 1997, que instituiu o Código de
Trânsito, foi parcialmente alterada pela Lei n. 11.705, de 19 de junho de 2008,
vulgarmente denominada de “Lei Seca”. A legislação foi alterada primeiramente
pela Lei n. 11.275, de 7 de fevereiro de 2006, e posteriormente pela Lei nº
11.705, de 19 de junho de 2008.
O advento da lei 11.705/2008, vem a tumultuar o Código de Trânsito
Brasileiro, dando margem a interpretações dúbias e questionamentos acerca
da inconstitucionalidade de alguns de seus artigos.
Segundo o disposto no artigo 276 do Código de Trânsito Brasileiro, a
simples conduta de dirigir “sob a influência de álcool”, não importando a
quantidade, configura infração de trânsito disposta no artigo 165 do mesmo
diploma legal, dando ensejo à aplicação das punições e medidas
administrativas consistentes, respectivamente, em multa quintuplicada e
suspensão do direito de dirigir por 12 (doze) meses, bem como na retenção do
veículo até a apresentação de condutor habilitado e no recolhimento do
documento de habilitação.
Indaga-se, então, porem: como deverá proceder a autoridade policial
para constatar a presença de álcool no sangue do condutor? Nesse aspecto,
os procedimentos são os mesmos (caput do artigo 277 do CTB), e a lei nada
alterou: testes de alcoolemia, exames clínicos, perícia ou outro exame que, por
meios técnicos ou científicos, em aparelhos homologados pelo CONTRAN,
permitam certificar seu estado. (Um dos instrumentos mais usados pelos
agentes para a constatação de possíveis substancias psicoativas (incluindo se
ai, a NICOTINA), é o Etilômetro, conhecido popularmente como bafômetro,
elegendo, porem, somente uma dessas substancias psicoativas, no caso o
Álcool, para verificação, de possível uso pelo motorista, de substancias que
causem dependência, a que não deveria fazer uso. Sendo ineficaz, por
exemplo, para constatação do uso de “Cocaína”, “LSD”, conhecido
popularmente como acido ou doce, “MDMA”, conhecido como êxtase,
derivados da coca, como o “Diabólico” CRACK, dentre outras substancias, com
poder muito mais perverso para causar acidentes!).
A Lei Federal conhecida como Lei Seca, que, dentre outras disposições,
instituiu a total intolerância à presença de álcool no sangue do condutor de
veículo
automotor,
inovando
desastrosamente
ao
penalizar
administrativamente a conduta daquele que se recusar a se submeter a
exames que certifiquem o seu estado etílico (art. 277, § 3º, do Código de
Trânsito Brasileiro. Levantando, sérios questionamentos acerca da sua
legalidade. Ao motorista que se recusar a se submeter a qualquer dos
procedimentos previstos no caput do artigo, serão aplicadas as penalidades e
medidas administrativas estabelecidas do artigo 165. Desconsiderando o
princípio constitucional da presunção de inocência, passando a considerar o
motorista, de plano, réu confesso.
A enormidade é ainda maior se considerado que, mesmo havendo a
recusa, pode o agente de trânsito indicar a existência de “notórios sinais de
embriaguez, excitação ou torpor apresentados pelo condutor” (art. 277, § 2º,
CTB) e, assim, caracterizar a infração administrativa prevista no artigo 165 do
Código de Trânsito Brasileiro, que diz: “dirigir sob a influência de álcool ou de
qualquer outra substância psicoativa que determine dependência”.
Para a apuração do cometimento desta infração de trânsito, o artigo 165
do Código de Trânsito dispõe em seu parágrafo único que "A embriaguez
também poderá ser apurada na forma do art. 277". Percebe-se, então, que,
além dos métodos descritos no artigo 277, há outros que podem ser utilizados
para tanto. Todavia, o citado artigo 165 não trouxe em seu bojo meio algum de
averiguação do cometimento da infração. Diante disso, em interpretação
conjunta do artigo 165, parágrafo único, c/c o art. 277, § 2º, ambos do Código
de Trânsito Brasileiro, ressai que a expressão "também", constante daquele
parágrafo único, refere-se à fé pública inerente aos atos do agente público. Eis
aqui a questão principal a ser versada. Sendo objeto de discução mais adiante.
Antes porem abordaremos aqui mais alguns comentários.
Os métodos de averiguação do cometimento da infração dispostos no
caput do artigo 277 do Código de Trânsito Brasileiro são eminentemente
técnicos, ou seja, meios pelos quais se comprova tecnicamente a ingestão de
bebida alcoólica. Entretanto, alternativamente, a infração "poderá ser
caracterizada pelo agente de trânsito mediante a obtenção de outras provas
em direito admitidas, acerca dos notórios sinais de embriaguez, excitação ou
torpor apresentados pelo condutor", a teor do § 2º do mesmo dispositivo legal.
Aqui ingressa a fé pública dada aos atos do agente público.
(A fé pública é um instrumento público dotado de habilidade diversa da
produção de provas para fins de punição, seja penal, seja administrativa. Na
realidade, a sua razão de existir é permitir ao Estado o cumprimento das
obrigações impostas por sua atividade-fim, que é a de governar a sociedade
brasileira, e não a de punir a todo custo, mediante violação dos direitos
previstos legalmente).
As duas primeiras consequências da recusa em fazer o exame:
(a) multa;
(b) suspensão do direito de dirigir por 12 meses – são tratadas no CBT
como penalidades, e, por tal natureza, dependem da instauração de um
procedimento administrativo (arts. 280 e seguintes do CBT), no curso do qual o
motorista pode se defender por escrito. Após apresentada a defesa, caso o
órgão de trânsito, ao final, decida por efetivamente aplicar aquelas
penalidades, o motorista pode ainda interpor recurso às Juntas Administrativas
de Recursos de Infrações – JARI (art. 16 do CBT), como acontece hoje em dia
com qualquer multa ou penalidade prevista na legislação de trânsito.
As outras duas consequências:
(c) apreensão da carteira
(d) retenção provisória do veículo – são medidas administrativas, e
podem ser aplicadas de imediato pela autoridade de trânsito no próprio ato de
abordagem do motorista. Em relação à retenção do veículo, é interessante
notar que, para a liberação, basta que o condutor solicite a outra pessoa que
dirija o automóvel em seu lugar. Pode ser um amigo que venha ao local a seu
chamado ou até mesmo um carona que o esteja acompanhando no momento.
A apreensão da carteira e a retenção do veículo são as únicas medidas
a serem aplicadas de imediato ao motorista que se recusa a se submeter aos
exames solicitados pela autoridade policial. Não cabe pela simples recusa a
prisão do motorista.
Note-se ainda que o motorista pode se recusar a se submeter a qualquer
exame, seja o teste do bafômetro, seja qualquer outro procedimento previsto
no artigo 277 do CBT, a exemplo de exames clínicos ou de sangue. Assim,
caso o condutor do veículo se negue a participar de qualquer procedimento de
avaliação de seu estado de embriaguez, sequer caberia a condução coercitiva
do motorista à delegacia de polícia ou a outro local onde se poderia realizar um
exame médico. Mas, em qualquer caso de recusa, serão aplicadas as
penalidades e medidas administrativas mencionadas acima.
Como se o fato de recusar-se a produzir prova contra si mesmo, direito
também assegurado pela Carta Constitucional, representasse sua nota de
culpa. Segundo, Magalhães Gomes Filho o que tal mudança na legislação de
trânsito representa aos direitos assegurados pela carta constitucional; “O direito
à não auto-incriminação constitui uma barreira intransponível ao direito à prova
de acusação; sua denegação, sob qualquer disfarce, representará um
indesejável retorno às formas mais abomináveis da repressão, comprometendo
o caráter ético-político do processo e a própria correção no exercício da função
jurisdicional”.
Trata-se de matéria consubstanciada em convenções ratificadas pelo
Brasil e em normas constitucionais. Aliás, segundo o artigo 8º, parágrafo 2º, g,
do Decreto 676, de 6 de novembro de 1992, “toda pessoa tem o direito de não
ser obrigada a depor contra si mesma, nem a declarar-se culpada”. Disso
subtrai-se que o privilégio contra a auto-incriminação — Nemo tenetur se
detegere — é uma manifestação eloquente (i) da cláusula da ampla defesa
(CF, artigo 5º, LV); (ii) do direito de permanecer calado (CF, artigo 5º, LXIII)” e;
(iii) da presunção de inocência (CF, artigo 5º, LVII). No campo doutrinário,
assim como no jurisprudencial, o entendimento é unânime e incessantemente
repetido no sentido exposto.
Ademais, ainda no que tange ao princípio de que ninguém pode ser
obrigado a produzir provas contra si, o Ministro Celso de Mello assim se
posicionou em bem fundamentado Habeas Corpus julgado em 14.02.2006:
“Com o explícito reconhecimento dessa prerrogativa, constitucionalizouse, em nosso sistema jurídico, uma das mais expressivas consequências
derivadas da cláusula do “due process of Law”“. Qualquer pessoa que sofra
investigações penais, policiais ou parlamentares, ostentando, ou não, a
condição formal de indiciado - ainda que convocada como testemunha (RTJ
163/626 - RTJ 176/805-806) -, possui, dentre as várias prerrogativas que lhe
são constitucionalmente asseguradas, o direito de permanecer em silêncio e de
não produzir provas contra si própria, consoante reconhece a jurisprudência do
Supremo Tribunal Federal (RTJ 141/512, relator ministro Celso de Mello).
Esse direito, na realidade, é plenamente oponível ao Estado, a qualquer
de seus Poderes e aos seus respectivos agentes e órgãos. Atua, nesse
sentido, como poderoso fator de limitação das próprias atividades de
investigação e de persecução desenvolvidas pelo Poder Público (Polícia
Judiciária, Ministério Público, Juízes, Tribunais e Comissões Parlamentares de
Inquérito, p. ex.). Cabe registrar que a cláusula legitimadora do direito ao
silêncio, ao explicitar, agora em sede constitucional, o postulado segundo o
qual "Nemo tenetur se detegere", nada mais fez senão consagrar, desta vez no
âmbito do sistema normativo instaurado pela Carta da República de 1988,
diretriz fundamental proclamada, desde 1791, pela Quinta Emenda que
compõe o "Bill of Rights" norte-americano.
Na realidade, ninguém pode ser constrangido a confessar a prática de
um ilícito penal (HC 80.530-MC/PA, Rel. Min. CELSO DE MELLO). Trata-se de
prerrogativa, que, no autorizado magistério de ANTÔNIO MAGALHÃES
GOMES FILHO ("Direito à Prova no Processo Penal", p. 111, item n. 7, 1997,
RT), "constitui uma decorrência natural do próprio modelo processual paritário,
no qual seria inconcebível que uma das partes pudesse compelir o adversário a
apresentar provas decisivas em seu próprio prejuízo...". O direito de o
indiciado/acusado (ou testemunha) permanecer em silêncio — consoante
proclamou a Suprema Corte dos Estados Unidos da América, em Escobedo v.
Illinois (1964) e, de maneira mais incisiva, em Miranda v. Arizona (1966) —
insere-se no alcance concreto da cláusula constitucional do devido processo
legal".
A partir da Lei Federal 11.705, ao condutor não somente será imputada
a infração do artigo 165 do CTB, com base no parágrafo 2º do artigo 277 do
CTB, como também o mesmo seria penalizado pela recusa a se submeter aos
testes de alcoolemia. O condutor teria à frente, somente dois caminhos a
seguir: ou se submeter aos testes e não exercer o direito de não produzir
provas contra si mesmo; ou exercer o direito, não se submeter aos testes e
ainda ser punido pelo exercício de um direito. Tertio non datur.
Ora, evidente que ninguém está obrigado a produzir prova contra si
mesmo, ou seja, não há obrigação legal e constitucional para realização do
teste do bafômetro ou qualquer outro exame que tenha por escopo averiguar a
presença ou não de álcool no organismo do indivíduo.
Como bem colocou Damásio de Jesus, “... se o direito à não - auto incriminação adquiriu um status constitucional, é evidente que nenhuma outra
regra, muito menos de cunho administrativo, pode servir de instrumento de
persuasão para que o indivíduo viole as suas próprias convicções e,
especialmente, os seus direitos fundamentais”.
Grinover Et Al acrescentam que “a tutela constitucional da intimidade, da
honra e da imagem parece justificar, mais do que nunca, a recusa do suspeito
ou acusado em submeter-se a exames de partes íntimas, bem como a provas
degradantes, como o ‘bafômetro’, até porque ninguém pode ser obrigado a
fazer prova contra si mesmo”.
Em razão do status de que desfruta — de direito fundamental
propriamente —, não pode nenhuma outra regra, muito menos de natureza
administrativa, servir de instrumento de coação para que o indivíduo viole os
seus próprios direitos fundamentais. Esclareça-se, desde já, que nenhuma
sanção criminal, seja penal ou processual penal, poderá advir da recusa dos
condutores de veículo automotor a se submeter a exames que certifiquem o
seu estado etílico.
Tampouco há como ser caracterizado o crime de “embriaguez ao
volante”, previsto no artigo 306 do CTB, a partir das indicações do agente de
trânsito de “notórios sinais de embriaguez, excitação ou torpor apresentados
pelo condutor”, conforme disposto pelo parágrafo 2º do artigo 277 do CTB. E
isso porque a infração que a lei permite caracterizar por tais expedientes é a
prevista no artigo 165 do CTB, de natureza administrativa, cujas penalidades
são multa e suspensão do direito de dirigir por 12 meses.
Portanto, da recusa a se submeter aos testes de alcoolemia nenhuma
penalidade poderá recair sobre o condutor de veículo automotor, forte no
entendimento de que ninguém está obrigado a produzir, e nesse caso de forma
antecipada, provas contra si mesmo. Daí decorrendo, ainda, que o parágrafo 3º
do artigo 277 do CTB é inconstitucional, por ofensa ao artigo 5º, LVII e LXIII, da
Constituição da República, do artigo 8, 2, g, da Convenção Americana sobre
Direitos Humanos e do artigo 14, 3, g, do Pacto Internacional sobre Direitos
Civis e Políticos.
Sujeitar-se ou não ao teste do bafômetro, é uma faculdade concedida ao
indivíduo, e não uma imposição. Como se o objetivo principal fosse multar e
prender o maior número possível de cidadãos, acarretando em risco latente ao
Estado Democrático de Direito.
É ilegal, arbitrária e discriminatória, muitas vezes a forma de abordagem
dos agentes públicos aos motoristas, por estar sendo violado o princípio da
presunção da inocência. Ou seja, cidadão algum pode ter cerceado seu direito
de exercer sua liberdade de locomoção, a menos que esteja cometendo
flagrante delito, ou exista ordem judicial para sua privação do direito de ir e vir.
Autoridades competentes e seus agentes não “podem” presumir que
condutores de veículos, que não tenham praticado qualquer infração no
trânsito, estejam alcoolizados. A abordagem deve ocorrer quando constatada
prática de ilicitude.
Não é razoável, sob o ponto de vista legal, as medidas desmotivadas de
abordagem, sem qualquer critério objetivo, mas, ao contrário, realizadas
indiscriminadamente, (O Afunilamento da via, como exemplo pratico). Deveria a
fiscalização ser aplicada a todos que cometam infrações no trânsito, para
somente assim, ser possível levantar suspeitas sobre “possíveis” motoristas
alcoolizados, pois, sabidamente, muitos motoristas sóbrios são mais perigosos
que alguns com pequena dosagem de álcool no sangue (Não defendo aqui que
se deva beber e dirigir).
Ou seja, infringido o Código Nacional de Trânsito, justifica-se, a
abordagem, com exigência da apresentação de documentação, podendo, ai
sim, a avaliação sobre eventual estado de alcoolismo do condutor, sem já mais
impor ao suspeito a realização de prova, de qualquer natureza, contra si
próprio, principalmente constrangendo-o na via pública.
Deveria somente depois da lavratura do auto de infração, pela violação
da norma de trânsito “motivadora da abordagem”, constatado indício de
alcoolismo no motorista, deverá ser ele conduzido à delegacia policial para
outros procedimentos dentro dos princípios processuais.
Se não tratar se de uma situação de notória embriaguez, comete abuso
de autoridade o agente que “prende” ou “conduz coercitivamente” o motorista
para fazer um exame ao qual ele se recusa.
O que a lei diz em seu artigo 165, que é proibido dirigir sob a "influência
do álcool". Mas, é preciso ver o que REALMENTE significa esse estado de
"influência", que não pode ser quantificado como está na lei, pelos decigramas
ali mencionados. Como se sabe, a capacidade de resposta ao álcool, varia
segundo a conformação metabólica e física de pessoa para pessoa. É preciso
verificar, em cada caso, como se comporta o motorista que bebeu algo. Não se
pode, desde logo, estabelecer que, se você bebeu duas latas de cerveja, está
inapto para dirigir. Isso é um preconceito e não uma atitude científica.
É como, dizer que determinada raça, ou tipo de pessoa é maléfica e
portanto, deve-se exterminá-los a todos, já mesmo antes de nascer. Como
outrora ocorreu no Nazismo. Não se deve legislar movido pelo TERROR. Vejase o caso de alguém que resolve se suicidar atirando-se à frente de um veículo
que passa na via pública, então, se o motorista desse veículo tiver bebido algo,
ele deverá ser condenado. É estabelecer uma responsabilidade objetiva ao
extremo, com a qual não se pode concordar.
O que se deve fazer é, dado o acidente, verificar se o motorista estava
alcoolizado, incapaz de evitá-lo e aí, aplicar-lhe a pena AUMENTADA pelo fato
acontecido, e não GENERALIZAR.... A generalização, nas ciências sociais, não
encontra apoio em nenhum sistema. É mero raciocínio SIMPLÓRIO esse de
simplesmente dizer: está bêbado, É CULPADO, ou VAI CAUSAR ACIDENTE.
Assim, o indivíduo surpreendido ao volante após ingerir álcool, e desde que
esteja conduzindo seu veículo calcado pelas regras básicas de trânsito, ou
seja, sem perturbar ou por em perigo terceiros – sem estar sob a influência do
álcool - jamais poderá ser levado preso em flagrante ou responder
administrativamente, nos termos do artigo 165. Não basta a embriaguez, sendo
necessário, também, o estar sob influência.
Damásio de Jesus, ao discorrer sobre o Art. 276 do CTB, que diz que
qualquer concentração de álcool por litro de sangue sujeita o condutor às
penalidades previstas no artigo 165, assim expôs: O dispositivo leva ao falso
entendimento de que, encontrado o motorista dirigindo veículo na via pública,
com “qualquer concentração de álcool por litro de sangue”, fica sujeito “às
penalidades previstas no artigo 165 do CTB.”. Quer dizer, bebeu e dirigiu,
cometeu a infração administrativa. Conclusão errada, pois são exigidas três
condições:
1.ª) que o condutor tenha bebido;
2.ª) que esteja sob a “influência” da bebida;
3.ª) que, por causa do efeito da ingestão de álcool ou substância análoga, dirija
o veículo de “forma anormal” (“direção anormal”).”
Evidente trata-se de requisitos cumulativos para a aplicação da lei, e não
alternativos. O ilustre jurista, prossegue com seu entendimento da seguinte
maneira: “surpreendido o motorista dirigindo veículo, após ingerir bebida
alcoólica, de forma normal, “independentemente do teor inebriante”, não há
infração administrativa, não se podendo falar em multa, apreensão do veículo e
suspensão do direito de dirigir. Exige-se nexo de causalidade entre a condução
anormal e a ingestão de álcool.”
Sendo, a letra da lei, clara ao dispor que a infração apenas se configura
se o indivíduo conduzir o veículo sob a influência do álcool, não há que se
aplicar a penalidade do artigo 165 simplesmente pelo fato de o sujeito estar
dirigindo após ingerir bebida alcoólica. Tanto a sanção administrativa, como a
responsabilidade criminal, só poderão ser apuradas se o indivíduo enquadrarse na conduta descrita na norma, qual seja, conduzir veículo sob a influência
de álcool ou substância entorpecente. Assim, estando o condutor dirigindo
normalmente, sem causar danos à outrem, não há que ser responsabilizado na
forma dos artigos 165 e 306 do CTB.
Um cidadão que conduz seu veículo após ingerir bebida alcoólica, em
velocidade permitida pela via, adequadamente, sem por em risco vidas alheias,
não deve ser punido por uma infração que “poderia” ter cometido. Falta o
caráter concreto de proteção ao bem jurídico. O indivíduo só pode ser punido
pelo que fez, ou ao menos começou a fazer (no caso da tentativa), e não pelo
que poderia ter feito, pois, caso contrário, o simples pensar em estacionar em
local proibido, geraria uma sanção administrativa, o que é um absurdo.
Outro disparate é fundar-se no princípio administrativo de presunção de
legitimidade ou de veracidade, para incriminar cidadãos. A presunção que paira
sobre o agente público, vale frisar, é juris tantum, ou seja, admite prova em
contrário. Assim, o simples “achismo” das autoridades de trânsito não podem
ter o condão de privar a liberdade individual.
Normalmente, a declaração do agente público, no sentido de o condutor
de veículo automotor estar sob a influência de bebida alcoólica, ocorre nos
casos em que o motorista se recusa a se submeter aos testes técnicos.
Ocasião em que o agente público "apura" sinais de ingestão de bebida
alcoólica e declara que o condutor infringiu as regras de trânsito.
A expressão apura está entre aspas porque não se trata de apuração
propriamente dita, mas sim de convicção subjetiva do agente público, sem
embasamento teórico ou científico algum. Por exemplo, a alegação de que a
apresentação, pelo condutor, de olhos vermelhos, roupas desalinhadas (o que
é um Absurdo!), é um sinal de embriaguez deixa de ser procedente, pois pode
o condutor estar sofrendo de conjuntivite (viral ou bacteriana) ou mesmo de
alergia oftalmológica, bem como pode estar cansado ou com sono. Portanto,
essas e outras características, como fala enrolada – que pode ser causada por
mistura indevida de remédios, entre outros fatores –, elencadas pelo agente
público que fiscaliza o condutor, são meros indícios e não provas do
cometimento da infração.
Além disso, fé pública é a "confiança pública na verdade ou legitimidade
duma coisa ou dum ato emanado da autoridade ou do poder público no
exercício das suas funções", segundo lição de Pedro Nunes. É, então, a fé
pública um instrumento jurídico posto à disposição da autoridade pública com o
intuito de dar ar de verdade ao que foi disposto e assim declarado por seus
agentes.
Ocorre que a fé pública existe para viabilizar o exercício da atividade
estatal, permitindo que documentos seus e atos de seus agentes sejam
legalmente dotados de presunção de veracidade, evitando-se, assim,
discussões desnecessárias sobre sua veracidade e acelerando o cumprimento
das obrigações estatais.
Foi para isso que ela foi criada e é para isso que ela existe. É
instrumento ao dispor do Estado para lhe permitir o cumprimento de sua
atividade-fim – e não para fazer prova com finalidade de punição administrativa
do cidadão brasileiro. A fé pública é instrumento de trabalho do Estado e não
meio de produção de prova de cometimento de ato ilegal.
Portanto, é para isso que serve a fé pública, jamais para outra coisa,
usar a fé pública com o intuito de fazer prova para punição (penal ou
administrativa) é descarado e absurdo desvirtuamento da natureza jurídica e
dos fins almejados para este instituto jurídico. É, inegavelmente, imputar ao
cidadão o ônus que cabe ao Estado.
Se o Estado é incapaz de, pelos meios legais, produzir a prova que lhe
compete, não pode fazer uso ilegal de um privilégio que lhe é conferido por
razões e com intuitos “diametralmente” opostos para acusar um cidadão
brasileiro de ter incidido em infração de trânsito ou em qualquer outro ato ilegal.
A declaração do agente público no sentido de o condutor estar
embriagado, com base nos "sinais" apresentados, é mero indício. E se na
seara processual penal indícios não possuem força para embasar a
condenação, quiçá na esfera administrativa.
Como então fundamentar e aplicar ao cidadão condutor quaisquer das
punições ou medidas administrativas previstas no artigo 165 do Código de
Trânsito? Qual é o embasamento legal para tanto?
Nessa senda, o que se quer dizer é que a fé pública não é instrumento
jurídico hábil a produzir prova contra o cidadão condutor quando ele dirigir
veículo automotor sob a influência de álcool. Em momento algum a Lei Magna
comporta exceção para essas regras. Como explicar então essa inversão
claramente inconstitucional por parte de órgãos do Estado que deveriam ser os
primeiros a cumprir a lei emanada pelo próprio Estado?
Se o Estado é incapaz de cumprir as obrigações que lhe imputam a lei,
não tem o poder, e menos ainda o direito, de impor verdade absoluta e
autoridade monárquica a seus atos e subverter as regras do jogo de modo que
lhe fique favorável e fácil cumprir com seu dever, colocando o cidadão
brasileiro em situação flagrantemente desfavorável e ilegal.
Fico indagando-me em um exercício mental, se por ventura em uma blitz
policial um escrivão cartorário, este detentor da fé publica, em seu uso correto
para os propósitos a que foi criada, lhe for injustamente imputado por seus
“supostos” notórios sinais de embriaguez atestados pelo agente publico
autuador, qual seria o desfecho do caso.
Alem disso Não há, na “lei seca”, a proporcionalidade exigida para a
imposição de uma penalidade, tanto no âmbito administrativo, como no penal.
Evidente que os abusos devem ser compelidos pela autoridade policial e
judiciária, mas sempre, dentro da razoabilidade e proporcionalidade, sob pena
de regressarmos na evolução do direito penal, mandando indivíduos para a
cadeia “a torto e a direito”.
Manoel Gonçalves Ferreira Filho, assim dispõe: “do princípio da igualdade
construiu-se a apreciação da razoabilidade da norma. De fato, se a igualdade
consiste no tratamento igual para os iguais, desigual para os desiguais, a lei
desarrazoada desigualiza, arbitrariamente, os indivíduos”.
O motorista dirigindo bêbado deve responder na proporção dos seus
atos, mas quem fez uso de cerveja ou outras bebidas não pode ter tratamento
igualitário tal como apresenta a Lei Seca, de quem fez uso exagerado de
qualquer substancia psicoativa. Todos os argumentos que se levantam para
sustentar a viabilidade da Lei Seca ou qualquer ângulo que se analise a
questão não resistem a fria e jurídica interpretação. "São falhas as premissas
que não se sustentam se analisarmos outros fatos, que em tese também
causam prejuízos à sociedade e situações das mais diversas.”
O que não pode é pegar o mínimo pelo geral, tal como fez a lei. Não se
pode punir de forma tão severa quem simplesmente faz uso de uma latinha de
cerveja, isto na mesma proporção de quem se encontra absolutamente
embriagado. Ferem de morte os princípios da proporcionalidade e a
razoabilidade.
Para comprovar o ferimento do princípio da proporcionalidade, avoco a
Lei de Tóxico com a Lei Seca.
Trazer consigo para uso próprio substância entorpecente que causa
dependência física ou psíquica, o infrator é levado para a delegacia, nada
sofrerá, apenas se compromete a comparecer em juízo, quando lhe será
proposto tratamento, se aceito, arquiva-se o procedimento, ao contrário o MP
apresentará proposta de transação com meras penas alternativas, mas não é
imposta pena privativa de liberdade, portanto trazer consigo entorpecente para
uso é crime.
Já beber não é crime. Mas se bebeu e dirigir veículo passa a ser, se
pego é autuado em flagrante, pagará fiança, que pode ter um valor
considerável para algumas pessoas, responderá a um processo criminal, não
terá direito a transação penal ou sursis processual, face a vedação da Lei
Seca, art. 291, não se aplica a lei 9099/95. Seu carro será apreendido e pagará
multa de quase mil reais, sua CNH é apreendida e ficará suspensa por 01 ano.
Enfim, para algo que não é tão grave, digamos, o Padre que celebrou a missa
e tomou o vinho, poderá ser vítima dessa situação.
É evidente então que a lei não observou a proporcionalidade. No
magistério da insuperável Maria Sílvia Zanello Di Pietro, ensina: “... a
proporcionalidade deve ser medida não pelos critérios pessoais, mas segundo
os padrões comuns na sociedade em que vive...” Portanto, não guarda
proporcionalidade punir com mesmo rigor condutas que em tese não violam
bens jurídicos de maior relevo.
Também não é razoável adotar punições para o mesmo fato, em todas
as searas do direito, seja penal, administrativo ou civil. No caso de dirigir "sob
efeito" de álcool tem uma conduta com repercussão drástica, tanto que é
punido com multas, apreensão do veículo e CNH, além da suspensão por 12
meses. Tem punição privativa de liberdade, com pena de 06 meses a 03 anos
e também a suspensão da CNH, verdadeiro bis in idem.
Não é razoável e nem proporcional permitir que quem comete um crime
contra Administração Pública, como o peculato, corrupção passiva, tenha pena
de 02 a 12 anos, tem direito aos benefícios da lei 9099/95, como sursis
processual, art.88 do CPB, ou seja, verdadeiramente não é punido, tem a
conduta despenalizada dependendo do valor auferido, pode ser beneficiado
pela insignificância, face a excludente de tipicidade, mas se tomar “uma gota”
de álcool terá severíssima punição.
ALCOOLISMO É DOENÇA! E no entanto deveria ser tratado como tal!
POR FIM é necessário considerar, que deveria-se ter, alem de uma
malha viária e uma sinalização sem falhas, também ter um transporte
adequado para servir a população, sendo este uma premissa básica para a
imposição da referida norma de transito, para os que se privem dos automóveis
particulares, ou sejam impedidos de usufruir de um “bem Móvel” de sua
propriedade, inclusive com o ESTADO recebendo pagamentos de muitos
tributos e demais formas de arrecadação.
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Anotações sobre a Lei seca - Suspeitas de embriaguez