ESTRATÉGIAS DE APRENDIZAGEM EM PEQUENAS EMPRESAS: AS LEARNING
ORGANIZATIONS E O PAPEL DO EMPREENDEDOR
Maria Elisa Brandão Bernardes – École des Hautes Études Commerciales de Montreal
Resumo
Para as Pequenas Empresas Empreendedoras a realidade da concorrência globalizada as tornam
ainda mais frágeis, uma vez que por sua própria natureza não contam com todos os recursos
disponíveis pelas grandes empresas para sobreviverem e até interferirem significativamente no
ambiente a seu favor. No entanto, modelos gerenciais de sucesso têm sido objeto de estudo de um
número cada vez maior de pesquisadores que buscam oferecer a todo tipo de empresa e seus
dirigentes caminhos que viabilizem seu destaque neste contexto. Dentre eles, o modelo Learning
Organizations (Organizações de Aprendizagem) possui um coro de adeptos que acreditam que ele
ofereça, através de sua filosofia de aprendizagem contínua, uma opção especialmente atraente para
as PME’s. Podemos suspeitar, no entanto, que as peculiaridades dessas empresas exerçam
diferentes efeitos na adoção de tal estratégia. Este artigo relata a pesquisa realizada em pequenas
empresas empreendedoras de sucesso, cujas práticas se identificam com as preconizadas pelo
modelo learning organization. Foram investigadas as principais fontes de dificuldades e de
facilidades para a adoção das estratégias recomendadas e concluiu-se no determinante papel do
proprietário/empreendedor para seu sucesso.
1- Introdução
A globalização, levando à competitividade cada vez mais acirrada entre as empresas, faz com que o
mercado esteja cada vez mais poderoso sobre as ações organizacionais. Para acompanhar este
ritmo acelerado é preciso estar em constante processo de inovação. Para tal, modelos gerenciais
calcados em estratégias de aprendizagem têm sido objeto de estudo de um número cada vez maior
de pesquisadores no intuito de oferecer às empresas e seus dirigentes caminhos que as possibilitem
se destacar neste contexto. Dentre as estratégias propostas, a conhecida como Learning
Organization ou Organização de Aprendizagem se destaca por sua indicação de aprendizagem
contínua, que não exige grandes investimentos em estruturas para ser colocado em prática.
Em se tratando de exigência de investimentos, a situação das PME’s (pequenas e média empresas)
no cenário atual é ainda mais crítica, considerando que, por sua própria natureza, não contam com
todas os recursos utilizados pelas grandes empresas para se desenvolverem e/ou interferirem
significativamente no ambiente a seu favor. A posição das empresas brasileiras então, é cercada de
controvérsias, ainda mais em se tratando de adoção de novas estratégias de gestão. Muito ainda se
protesta sobre a precariedade do país, tecnológica e socialmente, para apoiar grandes saltos
empresariais. No caso das Pequenas Empresas, as bases institucionais oferecidas a elas ainda são
muito inferiores às que contam suas equivalentes nos países mais desenvolvidos. E ainda assim elas
são obrigadas a fazer frente ao cenário competitivo globalizado. Entretanto e apesar deste quadro,
encontramos no país pequenas empresas em ritmo de forte crescimento, que se destacam por seu
funcionamento dinâmico e otimizado. Explorar as peculiaridades destas empresas pode levar à
compreensão dos elementos que favorecem, estrategicamente, as pequenas empresas
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empreendedoras em geral. Foi com este intuito que foram pesquisadas duas pequenas empresas
empreendedoras cujas práticas se assemelham muito às preconizadas pelo modelo de organizações
de aprendizagem: são empresa que se sobressaem em um mercado altamente competitivo,
adotando políticas de inovação constante e orientando-se para o futuro. Este artigo é o resultado da
pesquisa que teve como objetivo averiguar a adoção de estratégias de aprendizagem por pequenas
empresas empreendedoras. Mais especificamente procurou-se nestes casos investigar: quais as
peculiaridades destas empresas que facilitam e quais dificultam a adoção do modelo de
Organização de Aprendizagem? Para tanto apresentaremos nossa concepção do modelo,
construído a partir da consolidação de vários autores (conforme Bernardes, 1999). Em seguida
apresentaremos uma breve discussão sobre as implicações de sua adoção por pequenas empresas
brasileiras e enfim apresentaremos os resultados e conclusões a propósito da transposição do
modelo. Espera-se assim contribuir no enriquecimento dos estudos de adoção de estratégias de
aprendizagem por pequenas empresas empreendedoras.
2- O modelo Learning Organization (Organização de Aprendizagem)
Os estudos sobre Learning Organizations contam com grande número de abordagens desde sua
grande voga nos anos 90, a linha assumida nesse trabalho porém, é a preconizada por Senge
(1990), Schein (1996) e Garvin (1993) entre outros, que consideram a implantação do modelo
como uma escolha e uma responsabilidade da organização. Senge (1990) define Learning
Organizations como instituições onde as pessoas se voltam para a aprendizagem coletiva,
comprometidas com resultados motivadores. Schein (1996b) trabalha enfatizando primordialmente a
construção de uma cultura de aprendizagem nas organizações e Garvin(1993) preocupa-se em
elucidar o significado de Learning Organization, como uma “organização habilitada na criação,
aquisição e transferência de conhecimentos e que modifica seus comportamentos a fim de
refletir os novos conhecimentos e insights”.
Ao assumir as práticas de uma organização de aprendizagem, é de importância fundamental para
uma empresa, que esta conte com um ambiente interno que incentive a aprendizagem, com
informações fluidas e claras perpassando toda a estrutura organizacional, que os membros
compartilhem do mesmo objetivo, que a empresa propague a visão sistêmica e que as ações de
mudança e aprendizagem sejam monitoradas. São estas as dimensões que propomos explorar, por
refletirem a prática de um gerenciamento priorizado no processo de aprendizagem, mesmo quando a
organização não se autodefina assim. É ainda importante ressaltar que é o caráter processual que irá
diferenciar uma Learning Organization de uma outra empresa que simplesmente realize
Treinamento & Educação com alguma regularidade. As dimensões do modelo, apesar de distintas,
se sobrepõem em várias instâncias (conforme procuramos retratar na FIG 1) e que serão melhor
exploradas em seguida.
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Ambiente que
Incentive a
Aprendizagem
Democratização das
Informações
Ação
Monitorada
CULTURA
Visão
Sistêmica
Objetivo
Compartilhado
FIGURA 1 - DIMENSÕES DE UMA LEARNING ORGANIZATION
2.1- Ambiente que Incentive a Aprendizagem
O ambiente organizacional influencia no comportamento das pessoas, mas uma organização pode
identificar e escolher comportamentos que deseja reforçar em seus membros através da adoção de
estratégias específicas para tal. Em uma Learning Organization é característica a existência de um
ambiente interno que facilite e incentive a aprendizagem. Assim, a organização define políticas tais
onde a aquisição e a prática da aprendizagem sejam recompensadas como um comportamento
inteligente (Peters, 1993), oferecendo estímulo para a troca de idéias, criatividade na solução de
problemas (Wick W. & Léon 1995) e promovendo eventos designados primordialmente para
revisões estratégicas em conjunto (Garvin, 1993). Além do mais, sendo o contexto externo
imprevisível e turbulento, estruturas orgânicas (mutáveis, com tomada de decisão descentralizada,
cargos sendo continuamente redefinidos, confiança nas comunicações informais, predomínio de
interação horizontal e clima calcado no coleguismo) são consideradas mais inteligentes e inovadoras.
De maneira mais objetiva, podemos enumerar maneiras onde a capacidade para aprender pode ser
desenvolvida na organização (Fleury & Fleury 1995; Morris 1995; Tobin 1996):
• Através da Prática – aprendizagem passiva, virtualmente automática e de menor custo;
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• A partir da Mudança – na transição de uma rotina conhecida para outra nova e potencialmente
melhor;
• Através da Análise de Desempenho – através dos feedbacks das performances passadas;
• Através do Desenvolvimento do Conhecimento – programas internos de treinamento e
educação, contratando consultores, expandindo conhecimentos existentes na empresa;
• Através da Contratação – de pessoas que já possuam conhecimentos e habilidades, de
consultorias; obtendo assistência de centros de tecnologia e/ou educacionais;
• A partir da Aquisição – pela transferência de tecnologia, estabelecendo parcerias ou
comprando o serviço de empresas que possuam o conhecimento necessário.
Práticas consagradas de aprendizagem, a partir de fontes externas à organização podem ser
utilizadas, como o Benchmarking (Garvin, 1993; Wick & León, 1995) e Alianças Estratégicas
(Child 1996) além da aprendizagem com os próprios clientes pela atualização de informações,
comparações com concorrência, acompanhamento de mudanças nas preferências e pela busca de
feedbacks imediatos sobre serviços e atendimento (Garvin, 1993; Wick & León, 1995). O
ambiente que propicie a aprendizagem facilita a troca com o ambiente externo e reforça
comportamentos receptivos não-defensivos. A aprendizagem também se operacionaliza através da
recuperação e retenção (por meio de Bibliotecas, Banco de Dados, documentação de
aprendizagens) intencional de conhecimentos vários, através da memória organizacional, que deve
ser habilitada para salvar e armazenar os conhecimentos da organização, de modo a que a
empresa aprenda com as experiências e não repita erros. É preciso atentar ainda para o
armazenamento das aprendizagens nas rotinas, nos modelos de comportamentos reforçados e nas
estratégias (Child, 1996). É esperado que os conhecimentos identificados e gerados pelos membros
da organização sejam disponibilizados para todos, bem como que a empresa ofereça infra-estrutura
e instalações físicas tais que propiciem clima de aprendizagem, de troca e de experimentação.
2.2 - Democratização das Informações
Pode-se dizer que informações são dados considerados relevantes e úteis para algum propósito.
Quando a informação é colocada em prática pode ser classificada como conhecimento. Quando as
empresas lidam com novos tipos de informação e são capazes de colocá-las em prática, mudando
seu comportamento, as empresas estão aprendendo. Ora, quando uma empresa pretende que
muitas pessoas participem do processo de tomada de decisão é de se esperar que ela viabilize,
para todas essas pessoas, o acesso às informações relevantes. A importância da democratização
das informações para adoção do modelo Learning Organizations é ponto central da abordagem
de Sligo (1996), que centra sua análise na relação entre aprendizagem, conhecimento e poder. Ele
enfatiza que a aprendizagem só é possível em uma empresa cujo acesso às informações é livre para
todos os níveis organizacionais, de forma que o staff esteja consciente de sua performance, o
poder de decisão seja democratizado e os objetivos sejam verdadeiramente compartilhados. As
informações que interessam às empresas são as mais variadas (Wick & León, 1995) desde que a
divulgação seja livre e clara (não se admitindo que algumas informações possam ser reservadas
apenas para o alto escalão gerencial). Interessam as informações externas (como a satisfação dos
clientes, as novidades nos mais diversos campos, o que têm feito os concorrentes, entre outras) e
as internas (conhecimento claro de seus pontos fortes e fracos). Fracassos e sucessos devem ser
igualmente comunicados, revisados e esclarecidos em uma Learning Organization, (Garvin, 1993)
com a finalidade de que o conhecimento seja espalhado rápida e eficientemente, registrando as
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lições aprendidas indiscriminadamente. Como destaca Huber (1991), quando a informação é
largamente distribuída na organização, fontes variadas aparecem, os esforços são recompensados e
é provável que mais indivíduos e unidades se capacitem para aprender. Combinar informações de
diferentes fontes não só leva a novas informações, mas a novas compreensões. É importante notar
que a aprendizagem exige um ambiente receptivo (contrário a posturas defensivas) e aberto às
críticas e más notícias, “cultivando a arte da abertura e da escuta atenta” (Garvin, 1993). Como
também salienta Morgan (1997), há grande risco de perda do controle, mas a aprendizagem requer
um grau elevado de abertura e ainda maior de autocrítica.
2.3 - Objetivo Compartilhado
A importância de as empresas trabalharem orientadas para objetivos é grande, por isso muito se tem
estudado sobre a melhor maneira de se determinar alvos que mobilizem o comprometimento dos
membros da organização. Sabe-se que o grau de concordância com as metas e finalidade do grupo
reflete no grau de coesão da equipe, influenciando conseqüentemente a eficácia da mesma. Senge
(1990a) ressalta que a comunhão de propósitos em torno de objetivos concretos e legítimos leva as
pessoas a se empenharem em conjunto e por livre vontade, despertando inclusive, um sentimento de
companheirismo e pertença. Para que a empresa sinta estes efeitos, é preciso investir no
desenvolvimento de inteligência e habilidades coletivas - que são maiores do que a soma das
inteligências e habilidades individuais. Quando os membros da organização estão comprometidos e
as equipes estão alinhadas com os objetivos estratégicos, as pessoas passam a entender seu papel
de ajudar a empresa a alcançar estes objetivos, com vontade, entusiasmo, capacidade e utilizando
apropriadamente os recursos que precisam para trabalhar e até superar as metas (Tobin, 1996).
Assim, segundo Fulmer (1994) a determinação coletiva dos objetivos implica na visualização da
empresa à médio ou longo prazo, no estabelecimento de programas detalhados para seu alcance,
definindo resultados esperados concretos (vendas, lucros, novos produtos e serviços), em âmbitos
processuais (pesquisa e desenvolvimento, tecnologia e ciclos de vida) e qualitativos (satisfação no
trabalho, qualidade do trabalho em equipe, criatividade). Tais programações contribuem para
objetivar as contribuições individuais e o comprometimento dos membros nas diferentes etapas da
caminhada. É ainda importante ressaltar que o planejamento do futuro precisa sobretudo, contar
com um sistema de acompanhamento e medição, pois este mantém a visão de futuro presa à
realidade (Wick & Leon, 1995). As Learning Organizations trabalham cuidando da monitoração
de seus progressos, de forma a direcionar suas responsabilidades.
2.4 - Visão Sistêmica
Outra dimensão fundamental para a operacionalização de uma Learning Organization é a
existência da visão sistêmica. Por Visão Sistêmica entende-se como um tipo de posicionamento
dos membros da organização que sempre considere os impactos das ações individuais nos
resultados setoriais e globais (e mesmo suas repercussões no ambiente). Implica na atenção para as
conseqüências das ações externas dos componentes ambientais, de outras empresas, de outros
setores internos e da própria atitude das pessoas para a organização. Além do mais a abordagem
sistêmica considera a capacidade de auto-regulação das empresas, isto é, a capacidade de
readeqüação a partir dos feedbacks recebidos (e do processamento dos mesmos) a fim de gerarem
resultados cada vez mais otimizados. Buckley (1974) ressalta a importância dos intercâmbios para
que tal sistema seja eficaz e Senge (1990a) enfatiza a interdependência bem como a necessidade
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de colaboração entre as partes. Nonaka & Takeuchi (1995) e Morgan (1997) assinalam ainda o
papel da redundância, como a capacidade de as partes da empresa conterem informações umas
das outras e serem capazes de exercerem o papel do todo, atentos ao sentido em que todos os
membros da organização compartilhem a mesma identidade e a mesma orientação para a
aprendizagem. Uma empresa pode adquirir a visão sistêmica encorajando a análise e solução de
problemas complexos em conjunto e reconhecendo a importância da exploração de diferentes
pontos de vista. Conforme salienta Morgan (1997), assuntos encarados pelas organizações em
ambientes complexos são multidimensionais, assim, explorar várias questões, permitindo o conflito
construtivo e o debate, é mais que enriquecedor e faz com que toda a empresa aprenda.
2.5 - Ação Monitorada.
O significado de Learning Organization reside na aplicabilidade e na geração de mudanças
provocadas pela aprendizagem (Garvin, 1993) que se reflete na modificação de comportamentos e
práticas (Campbell & Cairns, 1994). Segundo Schein (1996b) a aprendizagem organizacional “é
um processo social que ocorre em uma comunidade de prática” onde, portanto, as idéias em si não
são suficientes. Uma aprendizagem só acontece quando resultar em uma ação modificada. E,
adotando o modelo de Learning Organization as organizações aprendem através da
experimentação, da viabilização de idéias e da persistência. Em quaisquer dos casos é preciso
monitorar, para verificação não só da eficiência dos métodos (ou do quanto realmente tais
processos contribuem para mudar os comportamentos) quanto da eficácia dos mesmos (se a
aprendizagem ocorreu no sentido da melhoria de resultados). Por outro lado, um intenso processo
de inovação pode gerar paralisia por parte dos membros por causa da insegurança do novo. Por
isso a aprendizagem deve estar vinculada à ação monitorada - enquanto processo intenso e contínuo
para oferecer frutos concretos (Figueiredo, 1994). Contar com um sistema de recompensas é
também um instrumento de reforço, pois a organização precisa apresentar interesse claro e
específico no desenvolvimento das pessoas, para que exista a aplicação prática e reforço do
aprendido (Peters,1993). São importantes as avaliações e remunerações vinculadas à aprendizagem
e de tal forma flexíveis que seja recompensado o talento e não o cargo (Galbraith, 1997). Em suma,
aprender é aumentar a capacidade de agir eficazmente, logo, é função da empresa conduzir para tal
otimização. O monitoramento da prática, segundo bem coloca Schein (1996b), mais do que uma
opção é uma necessidade.
Uma última ponderação a propósito do modelo diz respeito à abordagem adotada por Schein
(1996a,b) que estuda as Learning Organizations inteiramente pelo prisma cultural. O autor ressalta
que a cultura é tanto conseqüência das experiências e das aprendizagens das organizações quanto
alicerce para sua capacidade ao contínuo aprendizado. Destacando a importância e riqueza desta
abordagem, consideramos que adotá-la, mereceria atenção específica. Dessa forma, optamos neste
trabalho, por considerar a cultura organizacional voltada para a aprendizagem como a base
que permeia todo o processo de uma Learning Organization, vista através de seus aspectos
operacionais (explorados em cada dimensão do modelo apresentado). Por isso ela está
representada no centro e como interseção das dimensões, conforme FIG. 1.
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Uma vez apresentada à concepção do modelo estratégico organizacional, podemos fazer algumas
considerações sobre a viabilidade de sua adoção por pequenas empresas empreendedoras
brasileiras.
3- A Pequena Empresa Brasileira
O campo de estudo da PME não é um campo consensual. Definições do que venha a ser uma
pequena empresa empreendedora tem sido motivo de grande debate. Oficialmente, os países, para
determinar políticas públicas específicas, separam as PME’s das grandes empresas pelo viés do
número de empregados. No entanto, para as pessoas que estudam as pequenas empresas
empreendedoras, defini-las não é assim tão simples (Julien, 1997 ; Torrès, 1998). É bem verdade
que todos trabalham com a premissa de que uma pequena empresa não é uma grande empresa
em miniatura. Assim, acredita-se, que as pequenas empresas possuem características específicas
tais, que seu tamanho reduzido implica em distinções na natureza das operações organizacionais e
não simplesmente na escala de sua execução. Reconhecendo os debates em torno do conceito,
adotamos a posição de Sexton (1987) que afirma que uma definição uniforme do que é uma PME é
menos importante do que a definição de critérios adequados que delimitem a amostra da pesquisa.
Ora, o interesse pela estratégia de pequenas empresas empreendedoras força a escolha de critérios
que tenham maior impacto no processo estratégico - objeto de estudo. Assim, no escopo deste
trabalho, uma pequena empresa se define por apresentar as seguintes características:
• possuir um número reduzido de empregados - (Julien, 1997 );
• for altamente controlada pelo empreendedor/dirigente, com gestão altamente personalizada
(Baumback, 1983; Bauer, 1983; Miller & Toulose, 1986 e Julien, 1997);
• lidar com recursos restritos (Neilsen, 1974; Schuman & Seeger, 1986; Lounsbury & Glynn,
2001 e Anderson & Atkins, 2001 );
• possuir uma estrutura orgânica, pouco burocratizada, onde a relação entre as pessoas é
basicamente informal (Starbuck, 1965; Julien, 1997 e Marchesnay, 1997 )
• estar em situação de grande dependência face ao ambiente externo, com grande importância
acordada aos stakeholders (Starbuck, 1965; Marchesnay, 1997; {Lindsay & Rue, 1980;
Borcieu, 2000 e Anderson & Atkins, 2001).
Evidentemente, em se tratando de estratégias de PME’s não se pode deixar de mencionar o
preponderante papel do empreendedor-dirigente. Com efeito, acredita-se que desde a criação da
empresa ele possua uma idéia do tipo de organização que deseja construir e da cultura que queira
infundir (Schein, 1983). Além do mais, em se interessando por estratégias de aprendizagem, é
importante ressaltar que todas as definições de empreendedor o vinculam à inovação empresarial.
Segundo Filion (1996) os processos de gestão dos empreendedores são necessariamente marcados
pela criatividade, pela aprendizagem e pelo desenvolvimento integral da organização.
No Brasil, as PME’s representam 99,35% das empresas constituídas e são responsáveis por
43,63% do PIB (Sebrae, 1995). Os índices de mortalidade, porém, são alarmantes. Uma pesquisa
realizada no estado de Minas Gerais por Vale, Aguiar, et al. (1998) detectou que em cerca de 83%
das empresas extintas, a mortalidade aconteceu antes de completarem 2 anos de vida. Além do
mais, por estudos do SEBRAE (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro Pequenas Empresas)
constatou-se que a maioria das pequenas empresas brasileira ainda está fracamente preparada para
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enfrentar os desafios do complexo cenário mundial. Segundo o Sebrae (2000) somente 1,7% da
receita das PME’s são investidas em pesquisa e desenvolvimento e menos de 1,5% são aplicados
no treinamento e educação dos empregados. Enquanto as próprias empresas apontam que 27% das
sugestões de melhoria da qualidade vêem dos empregados, o treinamento formal médio do pessoal
nas pequenas empresas brasileiras é de 17 horas por ano, mais 10 horas por ano “on the job”. Ora,
este quadro reflete muito das características de uma administração autoritária, inflexível e imediatista
quanto aos resultados, identificada por Hickson & Pugh (1995). É uma situação que tem mudado,
mas a passos lentos, considerando o contexto em que vivemos. Mas, podemos sim, identificar no
cenário brasileiro, “Ilhas de excelência”, caracterizadas pela “cultura da qualidade” dos últimos anos
(Fleury & Fleury, 1995). Vemos, no país, empresas que a despeito de uma série de fatores
dificultadores, têm conseguido implantar modelos avançados de gestão, apresentando posturas
compatíveis com as exigências da modernidade e alcançando resultados ótimos. Estas práticas são
mais comumente associadas a aprendizagens defensivas para atender objetivos de curto prazo de
correção de deficiências (Fleury e Fleury, 1995). No entanto a pesquisa que propomos aqui se
interessa por uma forma mais pró-ativa de gestão de aprendizagens, representada pelo modelo
learning organization elaborado anteriormente. Esperamos através dela compreender melhor a
adoção de estratégias de aprendizagem por pequenas empresas empreendedoras de sucesso, que
têm sido exceções em seu contexto institucional. São os detalhes desta pesquisa que
descreveremos a seguir.
4 - Metodologia da Pesquisa
O Método de Pesquisa adotado foi o de Estudo de Caso, que segundo Yin (1994) permite
investigar um fenômeno contemporâneo dentro do seu contexto real. Apesar de não permitir
generalizações, buscou-se aprofundar na análise dos fenômenos elencados, a fim de determinar a
prática das estratégias a partir da compreensão das praxes das empresas. Foram escolhidas duas
empresas que atuam em ramos diferentes, observando como características comuns à adoção de
práticas de gestão que se aproximassem do modelo de Learning Organization: inovação
constante, sucesso em um mercado altamente competitivo (cada qual em seu ramo) e orientação
para o futuro, com planos de crescimento. Ambas são empresas de serviços e possuem menos de
50 empregados. A empresa A é jovem, criada em fevereiro de 1998 a partir da idealização de seus
quatro sócios. A empresa B pertence a um só proprietário e já está madura com seus 10 anos de
mercado. Ambas se localizam em Belo Horizonte (MG).
Os dados foram coletados através de análise dos poucos documentos disponíveis e de entrevistas
semi-estruturadas realizadas com os proprietários das empresas. Além do mais, todos os
empregados de ambas as empresas responderam a questionários estruturados, elaborados
parcialmente a partir das informações levantados nas entrevistas com os proprietários (de maneira a
permitir o cruzamento de respostas). O que se tentou foi identificar, para cada dimensão do modelo
elaborado de organização de aprendizagem, uma comparação com as organizações pesquisadas.
Os resultados desta investigação serão apresentados abaixo.
5 - Apresentação e Análise dos Resultados
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Apresentaremos, para cada empresa, os dados segundo as dimensões identificadas no modelo:
quanto ao ambiente interno que incentive a aprendizagem, quanto à democratização das
informações, à presença de visão sistêmica, de compartilhamento de objetivos e de monitoração das
ações.
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5.1 - Ambiente que Incentive a Aprendizagem
As duas empresas pesquisadas estimulam a aprendizagem como um comportamento desejável,
apresentando as seguintes características:
Empresa A
A empresa A atua em um mercado altamente competitivo e mutante, necessitando de intenso
acompanhamento dos avanços tecnológicos. Como é uma empresa jovem, sua estrutura já sofreu
várias alterações para poder se adequar melhor às respostas de demandas do mercado. Verificouse a presença de várias das formas de aprendizagem:
• Através da Prática – os novos funcionários são sempre treinados pelos mais velhos ou pelo
gerente técnico, no serviço; todos aprendem no dia-a-dia, buscando novas soluções para os
problemas inusitados. Segundo os proprietários, o aumento do número de contratos obriga a
todos a estarem sempre aprendendo e a serem cada vez mais autônomos na tomada de decisões.
• Através da Análise de Desempenho – são realizadas reuniões semanalmente entre os sócios e
destes com os funcionários, com a finalidade de análise de resultados, revisão de condutas e
reajustes.
• Através do Desenvolvimento do Conhecimento – o fato de a empresa ser pequena facilita
com que o conhecimento adquirido por um seja amplamente difundido para todos.
• Através da Contratação – hoje a empresa procura aplicar maior rigor nas contratações,
buscando funcionários tecnicamente mais preparados, exigindo maior escolaridade e maiores
responsabilidades do novato.
• A partir da Aquisição – há constante transferência de tecnologia dos fornecedores.
Outra característica de um ambiente interno que encoraje a aprendizagem é a freqüente prática do
Benchmarking – principalmente com empresas de São Paulo. Mesmo a criação da empresa só
ocorreu após visitas técnicas de um dos sócios a empresas similares nos Estados Unidos. A busca
de atualização porém, tem permanecido restrita à área técnica, onde há assinatura de revista
especializada internacional, contato constante com outras empresas e inclusive trocas de
experiências via Internet com empresas do mundo todo. Já as áreas de administração e marketing
são mais relegadas. Para se atualizarem nestas áreas, procuram revistas de grande circulação (em
bancas) não-científicas, o que resulta em aplicação de várias experiências sem o conhecimento
técnico adequado, como foi relatado o fracasso da tentativa de implantação do serviço de
telemarketing. Dois dos quatro sócios mantêm seus empregos em tempo parcial em outras empresas
que investem em cursos e atualizações para seus empregados. Estes sócios sempre aproveitam o
que aprenderam nos cursos fornecidos por estas outras empresas para repassarem para os outros
sócios e funcionários da empresa A, caracterizando assim um tipo de aprendizagem ou atualização
sem ônus para eles, mas que não atende suas necessidades específicas. Quanto à monitoração da
concorrência, ela já foi maior. Conforme relatado, na medida em que a empresa cresce e se firma no
mercado a monitoração tem diminuído. E no que diz respeito ao armazenamento das aprendizagens,
trabalha-se de tal maneira que, para cada problema discutido, são criadas respostas formais que ao
serem aprovadas são transformadas em rotinas com uso de formulários, etc. Como a empresa A é
uma empresa pequena, pode-se observar que as instalações propiciam a troca, apesar de não
possuírem locais específicos para reuniões e/ou treinamentos: a proximidade física com
sócios/gerentes permite agilidade na comunicação, trocas constantes e a conseqüente introdução de
novas idéias e criatividade. Todas estas ações ocorrem isoladas, porém, não se integrando através
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de uma política específica que favoreça a aprendizagem da organização, fazendo assim com que as
mesmas percam em eficácia conjunta.
Empresa B
A empresa B há dez anos no mercado, também apresenta uma estrutura fluida e mutável. Apesar de
ter apenas um dono, várias associações já foram feitas e desfeitas com o intuito de oferecer
respostas mais otimizadas para o ambiente. A intenção da empresa é de estar constantemente
inovando e de ser este o seu diferencial competitivo. Segundo o proprietário, ele lutou com
dificuldade para romper com o conservadorismo do mercado, mas após passar a contar com o
apoio da imprensa, é hoje procurado como referência nacional - para benchmarking e até para
franquia em outras cidades do Brasil.
É sua política todo mês oferecer pelo menos uma novidade aos seus clientes – e para tal recruta
idéias dos funcionários. Exige que os funcionários realizem pelo menos um curso de reciclagem (à
escolha) a cada três meses, pelo qual a empresa paga total ou parcialmente. Segundo as respostas
no survey, tal prática é bem apreciada pelos membros da organização. Complementariamente os
funcionários são orientados a repassarem o que aprenderam nos cursos para os colegas. Além
disso, a empresa também aprende:
• A partir da Mudança – com a proposta de inovação constante, estão sempre
aprendendo/inventando novas maneiras de realizar o trabalho;
• Através da Análise de Desempenho – são feitos acompanhamentos dos resultados das
inovações;
• Através da Contratação – está em andamento um trabalho com profissional de Recursos
Humanos para buscar um gerenciamento mais eficaz dos funcionários.
Como expusemos anteriormente, porque eles foram os primeiros a inovar em determinados
segmentos, são mais procurados para fazerem benchmarking do que fazem em outras empresas. A
aprendizagem com o ambiente externo, no entanto, é mais direcionada para cursos específicos – ou
na competência técnica da empresa ou em gerenciamento – intensamente buscado pelo proprietário,
principalmente no Sebrae ou CDL. Ele acompanha também feiras e congressos internacionais e
busca a troca de informações com outros profissionais do ramo através de contatos em cursos e
seminários. A empresa tem ainda realizado parcerias com outras empresas para desenvolver mais
seu campo de atuação e incrementar a gama de serviços oferecidos aos clientes, bem como, na
relação de reciprocidade, captar mais clientes. Não assinam nenhuma revista técnica especializada,
mas o proprietário afirma realizar constantes pesquisas em livros e lançamentos. Alguns são
disponibilizados para os funcionários. Segundo ele, antigamente ele chegava a cobrar a leitura dos
seus colaboradores, através de provas testando seus conhecimentos, mas desistiu da prática ao
constatar o clima negativo que tal atitude desencadeava. Quanto aos funcionários, todos
responderam que é alto o nível de aprendizagem adquirido depois que entraram para a empresa.
5.2 - Democratização das Informações
Como são empresas pequenas, o fluxo de informações é intenso. Os funcionários acompanham
tudo, mas em geral, informalmente. Não foi detectada, em nenhuma das duas empresas, a intenção
de promover a participação no processo decisório: ele continua centralizado nos proprietários.
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Empresa A
A empresa A procura realizar reuniões entre os sócios duas vezes por semana, onde todos se
inteiram de tudo o que está acontecendo em todas as áreas. Também se reúnem todo sábado com
todos os funcionários. Apesar dessa troca constante, ela não é sistêmica. Não há troca de
informação sistematizada clara externa ou mesmo interna (pontos fortes x pontos fracos). Os
fracassos são comunicados e todos buscam soluções para os problemas. Quanto ao sucesso, é
esperado que os funcionários o percebam através das mudanças aparentes: troca de imóvel sede,
melhoria das instalações e aumento no volume do trabalho. Não há comunicação formal a respeito.
Não há também um critério definido para a escolha da informação que é comunicada ou não, aos
funcionários. As diversas fontes de informação são pouco exploradas. Os sócios que têm outro
emprego aproveitam fontes de sua empresa repassando clipings e material dos seminários
gerenciais. Um sócio chegou a afirmar que “as informações vêem” justificando a passividade da
empresa frente à sua captura. Utilizam um quadro mural para divulgarem informações ou práticas
interessantes, mas apenas metade dos funcionários afirmou ler o mural com regularidade. A busca
do conhecimento com os clientes, porém, é ininterrupta. Todos os clientes são contatados alguns
meses após a prestação do serviço para avaliar seu grau de satisfação. Se há algum problema, há
busca de solução imediata. No entanto não há uma sistematização desses dados em forma de
relatório ou algo que transmita o conhecimento adquirido para toda a organização. A tomada de
decisão decorrente é ágil, o repasse imediato, mas restritos à cúpula.
Empresa B
A empresa B busca informações externas através dos cursos e contatos constantes do dono com as
associações. Também com alguma freqüência, mas não sistematicamente, levantam informações da
clientela através do telemarketing. O tamanho da empresa facilita a troca entre os funcionários, mas
sem sistematização. A participação formal dos funcionários nas decisões é nula.
5.3 - Objetivo Compartilhado
As empresas pesquisadas nem sempre planejam claramente seu futuro e nenhuma delas convida os
funcionários a participarem do processo de planejamento ou de decisão, conforme assinalamos
anteriormente. No entanto, quando questionados, todos os funcionários de ambas as empresas
afirmaram se sentir comprometidos com o sucesso da mesma, munidos de um forte sentimento de
pertença.
Empresa A
O objetivo de crescimento da empresa A está claro para todos os sócios e funcionários, e todos se
dizem comprometidos com este objetivo. No entanto a empresa não possui um plano estratégico
claro, o que dificulta a compreensão, por parte dos funcionários, de seus papéis para consecução de
um futuro determinado. As metas são traçadas sem qualquer participação do corpo funcional, o que
afeta seu comprometimento. Interessante no entanto, é descrever que a necessidade deste norte, por
parte dos funcionários é tão forte, que eles mesmos começaram a estabelecer objetivos para si, de
produtividade e de crescimento, independente da orientação da empresa Apesar de tal prática ser
do conhecimento da cúpula, nada é feito para integrar tais esforços a um plano estratégico global da
empresa. O acompanhamento de resultados é apenas financeiro e de curto prazo, não possuindo as
características necessárias para que todos trabalhem por um futuro desejado comum - mesmo
porque ele é restrito ao conhecimento dos sócios.
13
Empresa B
Apesar do dono planejar o futuro da empresa a curto e longo prazo, tal planejamento é centralizado:
apenas ele toma as decisões. Ele afirma que tais decisões são claramente divulgadas aos
funcionários a fim de buscar o comprometimento de todos. No entanto, a ausência de participação
se reflete nas respostas dos funcionários aos questionários: apesar de todos assegurarem seu
comprometimento com a empresa, a metade dos funcionários apontou um objetivo diferente ao
relatado pelo dono, quando questionados. O acompanhamento do desempenho é feito por
programa sofisticado de computação, mas não inclui a participação dos funcionários nem é
apresentado a eles. Segundo o proprietário, há um acompanhamento motivacional e de
“desenvolvimento pessoal e até do lado espiritual” realizado periodicamente por uma psicóloga,
mas que de nenhuma forma está vinculado ao planejamento da empresa.
5.4 - Visão Sistêmica
Como sublinhamos diversas vezes, o tamanho das empresas facilita a troca sistêmica e o
conhecimento das diversas competências. O trabalho em equipe, porém, é muito limitado.
Empresa A
Todos os quatro sócios da empresa A são muito preocupados em compartilharem seus
conhecimentos entre si e em tomarem decisões em conjunto. Eles realizam duas reuniões de cúpula
por semana, além da reunião semanal com os funcionários, já mencionadas. Nesta reunião com
todos os funcionários, cada semana uma pessoa é designada para falar aos outros sobre seu
trabalho, suas dificuldades e suas dependências em relação ao trabalho dos outros. Esta atitude
favorece enormemente a presença da visão sistêmica na organização. Além do mais, foi possível
notar que os discursos dos quatro sócios quanto a objetivos, as idéias e mesmo os exemplos, são
bem coerentes e mutuamente afinados. O trabalho em equipe, porém, existe muito incipiente,
apesar de ter sido relatado um esforço para integração entre as diferentes tarefas dos funcionários.
Todos os funcionários afirmaram no survey que aprendem com “todo mundo” na empresa, o que é
um indício de que os funcionários vêem todos da empresa como fonte de aprendizagem. Tal atitude
também favorece a troca sistêmica e a redundância.
Empresa B
A empresa B atua em uma atividade em que a natureza do trabalho dos funcionários é especializada
e personalizada. Há troca de idéias informalmente entre eles, mas não há trabalho em equipe.
Também não se detectou a consciência do impacto do trabalho individual para o sucesso de toda a
empresa. Por outro lado, o conhecimento redundante acontece e a substituição é possível. Quanto
às reuniões, elas só acontecem em caso extraordinário, pois o proprietário afirma que os
funcionários têm preconceito contra reunião e que ele acredita mais nas conversas informais.
5.5 - Ação Monitorada
O dinamismo dos mercados, o arrojo das pequenas empresas lidando com a experimentação, a
atitude humilde quanto à aprendizagem e o caráter gerencial não punitivo, são fatores que
contribuem para que a aprendizagem nestas empresas gere constante mudança. A insipiência da
14
monitoração, no entanto, acaba comprometendo a intencionalidade da aprendizagem e o
conseqüente controle e direcionamento das mudanças conquistadas.
Empresa A
Há algum acompanhamento das mudanças e da aprendizagem por parte da empresa em questão,
uma vez que ela se esforça para implantação de controles formais: há planos de trabalhos para
resolução de problemas, atas de reuniões com acompanhamento de soluções, acompanhamento dos
custos e receitas, acompanhamento de reclamações e satisfação dos clientes, relatórios sobre a
produção e sobre a satisfação dos clientes. No entanto tais informações não são consolidadas e
acompanhadas do ponto de vista do processo evolutivo da empresa. Os sócios mantêm uma atitude
de aprendizagem com as experiências malsucedidas e a empresa consegue estimular um
comportamento positivo em torno das experimentações e mudanças, em grande parte devido a sua
atitude não-punitiva face às falhas. Não há ambiente de punição: admite-se que o erro é constante e
leva a aprendizagem - procuram tratar o erro como inerente ao esforço desde que se busque
soluções. Eles se dizem focados nas inovações e que seu maior objetivo a curto prazo é fazer com
que o cliente seja bem atendido por todas as áreas da empresa, independente da responsabilidade
direta técnica ou comercial. Também estariam buscando difundir uma filosofia de maior autonomia
dos funcionários, independência e despersonalização das tarefas. Unanimemente os funcionários
responderam que a empresa está “mudando para melhor” ao longo de tempo.
Empresa B
A experimentação, método defendido como importante em uma Learning Organization, vem
sendo uma característica inconteste na empresa B. Estão continuamente alterando propostas a partir
das informações do mercado. O acompanhamento é mensal e o planejamento semestral – com
possibilidade de alterações da dinâmica para adaptação ao contexto, experimentando sem medo de
erro ou punições. Os funcionários têm total liberdade para criatividade no trabalho e também
afirmaram todos que a empresa tem mudado para melhor.
6- A Adoção de Estratégias de Aprendizagem por Pequenas Empresas Empreendedoras
A partir do que acaba de ser apresentado, podemos inferir que algumas características do modelo
Learning Organization é privilegiado em sua adoção por PME’s devido a algumas características
intrínsecas dessas empresas. Podemos imaginar também que existem outros aspectos das pequenas
empresas que acabam por constituir um obstáculo para a adoção deste tipo de estratégia. Ora, para
fins de nossa pesquisa, consideramos como características intrínsecas às PME’s o fato de possuírem
um numero reduzido de empregados; de serem controladas pelo empreendedor/dirigente com
gestão altamente personalizada; de terem pouca disponibilidade de recursos; de possuírem uma
estrutura orgânica, pouco burocratizada, onde a relação entre as pessoas é mais informal e de serem
muito dependentes do ambiente externo. Assim, a partir desta concepção, podemos comparar os
elementos propostos do modelo Learning Organization e sua relação com as características
específicas das PME’s, tendo como base os casos pesquisados. Desta forma consolidaremos
compreensões sobre as dificuldades e facilidades na adoção de estratégias avançadas de
aprendizagem organizacional por pequenas empresas empreendedoras. Estas reflexões que
procuramos representar no Quadro 1. Indicamos os principais elementos do modelo, sua presença
ou ausência nas empresas pesquisadas e sua possível relação com as características de uma PME.
15
Evidentemente, o score computado não tem relação com a eficácia do modelo, uma vez que não
exploramos pesos de cada elemento.
QUADRO 1 - LEARNING ORGANIZATION NAS PEQUENAS EMPRESAS
EMPREENDEDORAS ESTUDADAS: FACILIDADES E OBSTÁCULOS
Elementos do Modelo
Presença nas
Empresas
A
B
Características de Pequena Empresa Empreendedora
Reduzido
numero de
empregados
Recursos
restritos
Gestão
personalizada
centralizadora
Estrutura
orgânica e
informal
Dependente
do ambiente
externo
Ambiente que Incentive a Aprendizagem
•
Estrutura orgânica
•
Exploração de diferentes
formas de aprendizagem
Adoção de políticas que
incentivem aprendizagem
contínua
Instalações físicas que
convidem à troca
•
•
√
√
√
√
+
+
+
√
+
-
Parcial
-
-
Democratização das Informações
•
•
Conteúdo rico (sucesso e
fracasso)
Fontes variadas
•
Fluxo mulitidirecional
•
Variedade de mecanismos
para transmissão das
informações
Parcial
-
√
√
Parcial
√
√
+
+
Objetivos Compartilhados
•
Planejamento
•
Comprometimento
•
Comunhão de propósitos
√
-
-
+
-
Visão Sistêmica
•
•
•
Autoregulação a partir de
feedbacks
Interdependência entre as
partes
Redundância
√
√
-
√
+
+
+
Parcial
√
√
+
+
+
Ação Monitorada
•
Experimentação
•
Monitoração regular
Parcial
•
Geração de mudança
√
√
√
√
13
11
Score
Legenda:
+
4+
√ Elemento presente
+ favorece a adoção do modelo
- prejudica na adoção do modelo
3+ / 2 -
+
-
+
+
5-
6+ / 3 -
4+
16
7- Conclusões
Alguns aspectos podem ser inferidos a respeito da adoção de estratégias avançada de gestão,
particularmente de modelos de aprendizagem, por pequenas empresas empreendedoras a partir dos
resultados desta pesquisa. Antes de qualquer coisa podemos afirmar que as empresas pesquisadas
estão próximas do modelo, uma vez que apresentam mais de dois terços dos dezessete elementos
identificados no modelo. Todavia, podemos também remarcar que os elementos menos presentes
nas duas referem-se à democratização das informações. As empresas pesquisadas não têm
preocupação de utilizar diferentes fontes nem diferentes mecanismos de difusão de informação para
seus membros e, mais marcante, o conteúdo das informações não é priorizado. É interessante notar
que apesar do número reduzido de membros favorecer à que as informações fluam facilmente por
toda a empresa, a centralização da gestão por parte dos empreendedores-dirigentes impede as
participações nas decisões, inibindo o compartilhamento de conhecimentos e de aprendizagens
consolidadas pela organização. Por outro lado, o número reduzido de empregados facilita ainda a
adoção de estratégias como as do modelo de learning organizations, favorecendo uma estrutura
orgânica, o fluxo multidirecional das informações, o comprometimento e sentimento de pertença das
pessoas na organização e a existência de redundância de funções.
No que diz respeito à restrição de recursos, de um lado é claro que existem os efeitos negativos
para adoção deste tipo de modelo: dificuldades de financiamento de projetos e políticas de
aprendizagem, custos de treinamentos e de instalação de uma infra-estrutura que facilite as trocas
entre as pessoas. Por outro lado, a restrição age com um desafio que obriga as empresas a
explorarem novas formas de agir, a encorajarem a experimentação, a inovação e a criatividade, e a
serem redundantes (no sentido de Nonaka & Takeuchi, 1995), isto é, ter pouca gente capaz de se
responsabilizarem por praticamente tudo.
Por possuírem estruturas informais e pouco burocratizadas, as PME’s podem absorver bem
aspectos do modelo como: contar com uma estrutura orgânica, disseminar informações
multidirecionalmente, ser capaz de gerar e absorver mudanças, além da adaptabilidade aos
feedbacks do ambiente externo, de lidar bem com a interdependência das partes e com a
redundância já mencionada. A falta de formalidade porém, torna-se um obstáculo quando dificulta a
adoção de políticas contínuas que incentivem a aprendizagem, quando não exige a plena difusão do
planejamento e quando as monitorações não são praticadas.
Surpreendentemente, a forte dependência do ambiente externo, nas empresas pesquisadas,
demonstrou exercer influencia benéficas para adoção de estratégicas de aprendizagem na medida
em que ela obriga a empresa a explorar diferentes oportunidades de aprendizagem, a se auto-regular
a partir dos feedbacks do mercado, a experimentar continuamente e a gerar mudanças eficazes.
Interessante notar que alguns elementos de uma estratégia de aprendizagem, não se relacionam
forçosamente a nenhuma característica da pequena empresa empreendedora. Por exemplo, o fato
de a empresa utilizar fontes externas variadas de aprendizagem, independe do tamanho, mesmo que
nenhuma das empresas pesquisadas utilize, não podemos atribuir tal fato à sua condição de PME.
17
No entanto, das análises que podemos extrair da pesquisa, o que mais se destaca é o obstáculo que
pode representar para adoções de estratégias de aprendizagem, a personalização da gestão, por
vezes demasiadamente centralizada, por parte dos empreendedores-dirigentes. É esta característica
intrínseca às pequenas empresas empreendedoras a mais nociva à que estas adotem estratégias mais
avançadas de gestão, centradas na aprendizagem contínua e desenvolvimento coletivo. Esta
centralização faz com que as informações importantes se concentrem nas mãos do empreendedor
dirigente e em conseqüência impede a democratização das decisões, dos conhecimentos e do
compartilhamento de objetivos comuns. A centralização impede ainda a comunhão de esforços em
torno de objetivos coletivos, onde os ânimos são todos direcionados aos mesmos fins.
Paradoxalmente, como pudemos destacar dos estudos a respeito das pequenas empresas
empreendedoras, é a capacidade inovadora dos empreendedores, uma de suas características mais
marcantes. Concluímos assim, que é de sua responsabilidade e decisão fazer com que sua empresa
se torne uma empresa que aprenda ou não, uma empresa de evolução coletiva ou uma empresa que
tenha lances isolados de inovação.
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