Mecanismos de Governança Corporativa e a Relação com o Valor de Mercado e
Desempenho das Empresas Brasileiras
Autoria: Paula Carolina Ciampaglia Nardi, Ricardo Luiz Menezes da Silva, Evandro Marco Saidel Ribeiro,
Silvio Hiroshi Nakao
Resumo
Governança corporativa é um tema que vem sendo amplamente desenvolvido no meio
acadêmico, principalmente no que se refere à relação entre seus conjuntos de mecanismos e o
impacto no desempenho da empresa, no valor de mercado, na liquidez de seus ativos etc.
Nesse contexto, o estudo objetiva verificar a relação entre a dispersão de controle e dispersão
de propriedade (como mecanismos de governança adotados pelas empresas), com o valor de
mercado e o desempenho de todas as companhias abertas no mercado brasileiro. O estudo
considerou como variáveis de valor e desempenho o índice Q de Tobin, o ROI e o RSPL.
Assim, por considerar que as variáveis possuem naturezas distintas e valores com
probabilidades diferentes de ocorrerem, foi feito um estudo de suas distribuições antes de
verificar a relação entre elas, com o intuito de dar melhor tratamento aos dados e trabalhar
com as características dos elementos da população. Dessa forma, com a distribuição das
variáveis caracterizada, o resultado advindo foi a confirmação de concentração de controle e
propriedade das empresas brasileiras, bem como uma correlação negativa entre os
mecanismos de governança aqui considerados com o desempenho e com o valor de mercado
das companhias.
Introdução
Governança corporativa é um tema que vem obtendo destaque no campo acadêmico,
principalmente no que tange à vinculação da adoção de mecanismos de governança
corporativa, tais como: proteção aos acionistas de forma a alinhar os interesses entre todos
eles e entre acionistas e gestores, conselho de administração, política de remuneração,
publicação de relatórios regulares e mais transparentes, estrutura de propriedade e controle
etc.; com o desempenho das empresas, o impacto em seus valores, geração de riqueza entre
outros. Evidenciando uma grande extensão sobre o assunto, segundo Silva (2004).
Apesar disso, autores como Silveira (2004) afirma que ainda faltam fundamentações e
evidências para se concluir e para se chegar a um consenso sobre o tema relacionando
mecanismos de governança com os possíveis benefícios por eles gerados.
Diante desse contexto, a presente pesquisa procura averiguar a possível relação entre
medidas de governança, desempenho e valor das empresas, com o intuito de dar continuidade aos
estudos sobre o tema, mais propriamente sobre as características das empresas brasileiras quanto à
dispersão de propriedade e de controle e a relação com seu valor de mercado e seu desempenho.
Contudo, sabendo que as variáveis utilizadas como proxies de governança,
desempenho e valor possuem naturezas diferentes, ou seja, podem ser discretas ou contínuas,
além de possuírem probabilidades diferentes de ocorrerem, é necessário que se faça um
melhor tratamento aos dados para que se possa trabalhar com as características dos elementos
da população ao se verificar a correlação entre as variáveis. Assim, o presente estudo faz uma
análise e descrição das distribuições de probabilidade de cada variável utilizada antes de
verificar a correlação entre elas.
Portanto, como destaca Silveira (2002), ao entender melhor as práticas de governança
e, se confirmada a hipótese de que elas sejam importantes para as empresas, para o mercado e
para a sociedade como um todo, é útil para ajudar as empresas a serem mais eficientes e para
impactar positivamente no mercado de capitais.
1
1. Governança, Desempenho e Valor
1.1. Mecanismos de Governança
A governança corporativa possui mecanismos que, segundo Silveira (2004), objetivam
garantir e aumentar o retorno sobre os investimentos dos investidores. Dessa forma, há
mecanismos de proteção aos acionistas de forma a alinhar os interesses entre todos eles e
entre acionistas e gestores. Como exemplo, tem-se: conselho de administração, política de
remuneração, publicação de relatórios regulares e mais transparentes, estrutura de propriedade
e controle etc., o qual, segundo Silveira (2004), é um dos principais mecanismos.
Jensen e Meckling (1976) desenvolveram uma linha de raciocínio sobre a relação entre
acionistas e gestores das empresas, no denominado conflito de interesses entre as partes, ou
“Conflito de Agência”. Esse conflito pode ser percebido entre um agente e um principal cujos
interesses divergem dentro de uma mesma empresa por ocuparem posições diferentes e que
um depende do serviço de outro, ou seja, há a separação entre propriedade e controle.
Baseado nisso, para Shleifer e Vishny (1997) a governança corporativa surge com
vários mecanismos que tentam reduzir os conflitos de agência nas empresas, mecanismos
como a proteção aos acionistas minoritários, para que eles sejam garantidos de que ao estarem
investindo seus recursos em determinada companhia possam obter retorno de seus
investimentos e não terem seus direitos expropriados por acionistas majoritários.
Com uma garantia ou maior segurança sobre seus investimentos, os investidores
provavelmente se sentirão mais motivados a alocarem seus recursos para ações de empresas, o
que, por si só, pode aumentar a liquidez desses ativos, em um mercado de capitais mais
participativo, aumentando o valor da empresa no mercado e até impactando no retorno do
patrimônio líquido (redução do custo de captação) e no retorno de seus investimentos.
Portanto, é oportuno verificar a relação existente entre o desempenho das empresas e
as variações em seu valor de mercado com a adoção de mecanismos considerados como “boas
práticas de governança corporativa”, com a finalidade de contribuir não apenas para um
acréscimo aos estudos ou discussões sobre o tema, mas também, por identificar relações entre
as variáveis já abordadas nos estudos nacionais, porém, podendo ter resultados diversificados
em vista da metodologia utilizada.
1.2. Ambiente Legal
Um dos pontos que influenciou o desenvolvimento das características da governança
corporativa no mundo foi o ambiente legal em que os países eram inseridos. Tanto é que por
volta do século XVIII, de acordo com Andrade e Rossetti (2004), a Inglaterra, Alemanha,
França e Itália aprimoraram a contabilidade focando em seus costumes, cultura e leis. Com o
passar do tempo, veio o surgimento da questão “Governança Corporativa”, com o intuito de
transparecer melhores informações e atender de forma equiparada todas as partes interessadas
na empresa. Porém, diante das particularidades sociais, econômicas e culturais de cada país, a
governança corporativa foi tomando formas distintas de modo a surgir diferentes modelos.
Silveira (2002) adverte que o modelo de governança corporativa de um país é
influenciado pelo ambiente institucional do mesmo. Ou seja, o Estado pode atuar e influenciar
no aperfeiçoamento da governança corporativa ao fazer alterações no ambiente institucional
criando leis de proteção aos investidores, o que irá gerar características específicas no modelo
de governança corporativa adotado no país, fazendo com que o sistema de governança seja
mais eficaz e o mercado de capitais mais desenvolvido.
Francis, Khurana e Pereira (2005) e La Porta, Shleifer e Lopez-de-Sinales (1999)
salientam que a origem legal de um país pré-determina e é altamente correlacionada com o
tipo de proteção legal dada aos investidores. Então, se há uma maior evidenciação e
transparência voluntária das informações, as empresas acabam por reduzir o custo de captação
externo. Porém, esse benefício pode não ocorrer, como no caso do Brasil, devido à fraca
2
proteção aos investidores e à falta de uma cultura de maior evidenciação. Característica que,
segundo Martins e Lisboa (2005), é derivada do tipo de financiamento das empresas
brasileiras, ou seja, por meio de instituições financeiras, as quais conseguem informações que
lhes são necessárias diretamente com a empresa. Assim, as companhias não se preocupavam
muito com a qualidade e o grau de evidenciação de seus demonstrativos para outros
interessados.
Nesse cenário, Silva (2006) afirma que o mercado de capitais brasileiros é pouco
desenvolvido e é caracterizado da seguinte forma:
1) baixa capitalização bursátil;
2) volume transacionado não expressivo;
3) poucas emissões primárias;
4) reduzido número de companhias abertas;
5) concentração das transações em poucas ações e
6) baixa liquidez.
Complementando, Carvalho (2002, apud Silva 2006, p.31) salienta que essa atrofia do
mercado de capitais brasileiro é causada pela baixa proteção legal aos acionistas minoritários.
Apesar disso, os autores acreditam que a governança corporativa é um fator que tende a
melhorar a situação do mercado, ainda que tenha seu efeito positivo barrado pela baixa
proteção aos acionistas minoritários.
1.3. Controle e Propriedade
Silva (2002) nota que a maioria dos estudos sobre o impacto da concentração de
propriedade e controle é feita em empresas em que o controle e a propriedade são difusos.
Porém, poucos são os países cujas empresas se comportam desta maneira.
Complementando a idéia, Silveira (2002) revela que o mercado de capitais brasileiro
não é tão desenvolvido quanto o mercado norte-americano, que a propriedade acionária ainda
é inquestionavelmente concentrada e que há uma baixa proteção aos minoritários.
Diante da concentração de propriedade acionária e baixa proteção aos acionistas
minoritários, características do Brasil, La Porta, Shleifer e Lopez-de-Sinales (1999)
esclarecem que em países com menor proteção legal aos investidores a concentração de
propriedade acaba sendo uma forma de afiançar o retorno dos investimentos. Uma questão de
causa e conseqüência.
No caso do Brasil, sabe-se que há alta concentração de capital e uma pequena
regulamentação para segurança dos acionistas minoritários, conforme Setúbal Júnior (2002).
O autor afirma também que a Lei das sociedades por ações consolidou o desinteresse dos
investidores, pois o controlador receberia mais em detrimento dos outros investidores e até
dos administradores. Um exemplo é o que afirma Silva (2002) ao dizer que, com a Lei 6.404,
as empresas podiam emitir ações dos tipos preferenciais em até 2/3 do capital total, o que quer
dizer que os acionistas controlavam a empresa com apenas 1/6 do capital total.
Da mesma forma, Silveira (2002) alerta que uma forte concentração das ações
ordinárias é característica das empresas brasileiras, e que cerca de 88% das ações ordinárias
das empresas estão nas mãos dos controladores. Afirma ainda que essa alta concentração de
posse de ações (free float) e da tomada de decisão (controle) juntamente com a falta de
proteção legal aos acionistas justifica um conflito existente entre acionistas majoritários e
minoritários. Assim, em países onde a legislação não protege os direitos dos acionistas
minoritários que aplicam seus recursos em ações de empresas, há a necessidade de se ter
acionistas com controle efetivo da companhia de forma a ter um alinhamento dos direitos
sobre fluxo de caixa e de controle.
Assim sendo, Silveira et alli (2004) salientam que a existência de acionistas
controladores nas empresas possui implicações positivas para a empresa, ou o denominado
3
“efeito-incentivo”. Isso significa que o acionista controlador possui muitos recursos
investidos na empresa, o que incentiva obter melhores informações, fiscalizar ou monitorar os
gestores e que maior será seu empenho na maximização do valor da companhia.
Por outro lado Shleifer e Vishy (1997) destacam que, para conseguir captar recursos,
as empresas devem oferecer certo poder aos investidores, sendo que a proteção legal contra
expropriação de seus direitos é uma forma. Assim, quanto maior a proteção legal aos seus
direitos, mais investidores são atraídos a canalizar poupanças para ações de empresas. Os
autores advertem que, na falta de um sistema legal que proteja os investidores, as companhias
acabam optando por uma concentração de propriedade e de controle para incentivá-los, uma
vez que eles passam a deter o controle total sobre as decisões que serão tomadas na empresa.
Os autores concluem, então, que o equilíbrio entre uma proteção legal e certa concentração de
propriedade pode ser um passo para um melhor sistema de governança corporativa.
1.4. Desempenho e Valor
Muitos estudos relacionando governança corporativa, propriedade, controle, conselho
de administração entre outras variáveis, estão presentes na literatura nacional.
A título de exemplo, o estudo de Silveira (2002) parte do pressuposto de que os
mecanismos de governança corporativa influenciam o desempenho da empresa. O objetivo
principal foi verificar se existe alguma relação significativa entre governança corporativa,
valor da empresa e desempenho nas companhias brasileiras. Como resultado o autor verificou
que a relação entre governança e valor é diferente daquela entre governança e desempenho,
sendo mais forte com o valor da empresa.
Pesquisas como a de Silva (2004) concluem que as práticas de governança corporativa
estão relacionadas de forma positiva com o valor da empresa, pois acionistas controladores
acabam expropriando os direitos dos acionistas minoritários, reduzindo o valor das
companhias.
Okimura (2003), partindo da suposição de que a estrutura de propriedade é um fator
determinante de valor e desempenho das empresas, verificou que a variável de concentração
de capital apresentou relação negativa com as variáveis de valor, corroborando os autores
citados acima. Mas quanto ao desempenho da empresa, o autor concluiu que as empresas que
apresentam um acionista controlador com concentração de votos têm um desempenho
operacional mais favorecido. Esse segundo resultado de Okimura também foi encontrado por
Bohren e Odegaard (2003) com as empresas da Noruega o qual afirma que nem sempre há
uma correlação entre os mecanismos de governança e as variáveis de desempenho, quando
ocorre, essa correlação é negativa.
Füerst e Kang (2000) constataram que as empresas com controle nas mãos de poucos
têm um impacto positivo no seu desempenho. Por outro lado, no que se refere à relação da
estrutura de propriedade com valor, Jensen e Meckling (1976) chegam à conclusão de que a
concentração da propriedade tem efeito positivo na avaliação das empresas, pois os acionistas
majoritários podem monitorar de forma mais eficiente os administradores.
Pedreira e Santos (2006) de certa forma obtiveram resultados de acordo com a
conclusão de Jensen e Meckling (1976) ao garantir que não se pode afirmar que o fato de as
empresas terem aderido aos níveis diferenciados de governança corporativa da Bovespa
tiveram impacto positivo na valorização de suas ações. Da mesma forma, Chen e Ho (2000)
constataram que as empresas de Cingapura com maior concentração de propriedade possuem
valores de mercado maiores. Assim como o trabalho de Makhija e Spiro (2000) com as
empresas tchecas, cujo resultado foi que há uma relação positiva entre a concentração de
propriedade e o valor das empresas.
Os parágrafos anteriores evidenciaram várias pesquisas sobre o tema e os distintos
resultados alcançados pelos autores. Tais pesquisas corroboram as afirmações de Silveira
4
(2004) sobre a falta de fundamentações e evidências para concluir e para se chegar a um
consenso sobre o tema. Não se pode deixar de salientar que, embora a concentração de ações
ordinárias nas mãos de poucos acionistas possa gerar maior valor para empresas, como
afirmam algumas pesquisas, essa concentração pode acarretar em custos para uma
organização. O que ocorre é que os acionistas acabam não se diversificando e assim tendem a
minimizar seu risco por meio de excesso de conservadorismo em projetos a serem
empreendidos pela empresa, impedindo, talvez, alguma melhora no desempenho da mesma,
tanto operacional quanto financeiramente.
2. Objetivo, Problema e Hipóteses
O trabalho tem como objetivo verificar a relação entre a adoção de mecanismos de
governança corporativa em um país cuja proteção legal aos investidores é baixa, com o valor
de mercado da empresa, o retorno de seu patrimônio líquido e de seus investimentos. Isso leva
à seguinte questão: “O cumprimento de exigências da governança corporativa impacta no
desempenho e no valor das empresas brasileiras?”
Alguns autores, como Silva (2004), salientam que a governança corporativa é um tema
amplo, envolvendo os diversos mecanismos de proteção aos acionistas, mas que a
centralização dos estudos pode ser sobre a estrutura de propriedade e de controle das
empresas. Estudos abrangendo essas questões têm grande importância, já que essas estruturas
influenciam a eficiência do mercado, tanto na questão do grau de diversificação dos riscos dos
acionistas quanto no problema de agência que elas enfrentam.
Dessa forma, Silveira (2004) afirma que as pesquisas sobre o tema partem do princípio
de que seus mecanismos influenciam o desempenho e o valor das empresas, mas que ainda
não há fundamentações e evidências empíricas sobre essas influências e como os mecanismos
de governança se relacionam com o desempenho corporativo das companhias.
Assim, nasce o interesse em aprofundar a pesquisa sobre o tema, com a intenção de
aprimorar o conhecimento no assunto e induzir ou esclarecer comportamentos para estimular
as empresas e o mercado às mudanças, sejam elas de ordem cultural ou econômica.
Portanto, para verificar se a adoção de mecanismos de governança aqui utilizados,
como a dispersão de propriedade e controle, possui relação com o desempenho e valor das
empresas, partiu-se das seguintes hipóteses:
H0: As dispersões de propriedade e de controle diminuem o desempenho e o valor de
mercado das empresas.
H1: As dispersões de propriedade e de controle aumentam o desempenho e o valor de
mercado das empresas.
3. Metodologia
3.1. Variáveis Independentes
Assim sendo, uma das formas de verificar a relação da governança corporativa com
desempenho e valor das empresas pode ser com o uso da dispersão de propriedade e do
controle como proxies de governança corporativa. Então, no que se refere à dispersão de
propriedade, o nível de free floati será utilizado, enquanto que a dispersão de controle pode
ser representada pela diferença entre o total de ações ordinárias que a empresa possui com o
que está concentrado nas mãos dos dois maiores acionistas, ou seja:
DC = 1 − (
n°ON 2controladores
)
Total de ON
5
3.2. Variáveis Dependentes
Segundo a Bovespa, os mecanismos da governança corporativa trazem alguns
benefícios para: a empresa, a sociedade, o mercado e para os investidores, como: valorização
das ações das empresas, maior demanda, maior liquidez e até canalização da poupança na
capitalização das empresas. Esses benefícios acabam por impactar no valor de mercado da
empresa, elevando-o. Diante disso, para verificar a relação de mecanismos de governança
com o valor de mercado da empresa justifica-se o cálculo do valor de mercado por meio do
índice Q de Tobin, tal como utilizado em trabalhos como: Chung e Pruitt (1994), Silveira
(2002, 2004), Okimura (2003), Silva e Leal (2003), Bohren e Odegaard (2003), Silva (2004),
entre outros. Ou seja, uma proxy bastante utilizada como representativa do valor de mercado
das empresas, segundo Fama e Barros (2001). Neste trabalho o cálculo deste indicador segue
a formulação referenciada pelos seguintes trabalhos: Morck, Shleifer e Vishny (1988),
McConnell e Servaes (1990), Silveira (2002, 2004), Okimura (2003) e Silva (2004).
Lins (1999) salienta que a venda de milhares de ações para compradores imediatos é
difícil, principalmente quando essas ações estão concentradas nas mãos de uma pessoa. Por
causa disso, os investidores institucionais estão preocupados em atuarem mais próximos das
empresas onde investiram, influenciando a política corporativa e atuando nas decisões
estratégicas. Tudo isso para melhorar o retorno de seus investimentos. Dessa forma, pode ser
esperado que uma concentração do controle e da propriedade das empresas nas mãos de
poucos acionistas pode ter uma relação com o retorno dos investimentos da empresa, sendo
que o ROI pode ser utilizado como proxy desse retorno.
A variável RSPL é um índice de rentabilidade obtido pela empresa como remuneração
dos investimentos dos acionistas, bastante utilizado em outros estudos como variável para
indicar o desempenho da empresa, entre os quais: Silveira (2002), Setúbal Júnior (2002),
Silva (2003) e Silveira (2004). Em uma das formas de cálculo desse indicador, leva-se em
consideração o custo de capital de terceiros, o valor do patrimônio líquido da empresa e o
retorno dos investimentos. Como uma das premissas básicas de uma governança corporativa é
a redução no custo de captação da empresa e valorização das ações da empresa, pode-se
esperar uma relação entre mecanismos de governança com o desempenho da empresa, o qual
pode ser identificado utilizando como proxy o RSPL.
3.3. Coleta e Tratamento dos Dados
Para realização da pesquisa, utilizou-se todas as empresas de capital aberto presentes
no software Economática® no período de 1995 a 2005. Não foi feita uma segmentação pelos
níveis diferenciados de governança corporativa criados pela Bovespa por se considerar que as
medidas testadas se referem aos mecanismos de governança adotados pelas empresas em
geral, independentemente de haver ou não a intenção de adoção de boas medidas de
governança por parte das empresas.
O índice de free float, o número de ações ordinárias em poder dos dois maiores
acionistas, o valor de mercado das ações, todos utilizados para cálculo do valor de mercado
das empresas, assim como os demais dados, como ativo circulante, ativo total, dívidas, RSPL,
margem operacional, foram coletados diretamente do Economática®.
Quanto ao procedimento estatístico, este foi realizado considerando inclusive os dados
extremos, ou outliers. A idéia principal é extrair as informações com a qual se quer estudar,
com o objetivo de inferir sobre as características dos parâmetros da população coletada.
Para Triola (1998) a melhor maneira de entender um conjunto de dados é por meio de
suas características, sendo que três são essencialmente importantes e oferecem uma visão
muito satisfatória sobre dados: 1) a forma de distribuição dos dados; 2) um valor
representativo como a média; e 3) uma medida de dispersão ou variação, já que as variáveis
possuem naturezas diferentes, ou seja, há variáveis quantitativas discretas e variáveis
6
contínuas. Além disso, os valores obtidos possuem probabilidades diferentes de ocorrer.
Dessa forma, há a necessidade de descrever a distribuição de probabilidade das variáveis.
Assim, para estudar as distribuições de cada variável, alguns passos devem ser
seguidos, como: 1º) cálculo da freqüência relativa, estabelecendo blocos de dados e seus
respectivos intervalos (com essa freqüência, obtém-se a distribuição de probabilidade
acumulada de forma empírica) e 2º) encontrar a “função densidade de probabilidade” ou
“distribuição de probabilidade”, dividindo o valor da freqüência relativa do ponto por seu
intervaloii. Após determinação empírica das funções densidade de probabilidade e distribuição
acumulada, o passo seguinte foi estabelecer uma distribuição que melhor representasse os
dados empíricos.
No caso da variável ROI foi definida uma média e um desvio padrão arbitrário e
calculou-se a distribuição normal acumulada. Em seguida, utilizando a função
“SOMAXMY2” do Excel®, a qual retorna a soma dos quadrados das diferenças dos valores
correspondentes em duas matrizes, encontrou-se o erro, ou seja, a soma das diferenças entre
cada ponto empírico e cada ponto teórico ao quadrado. Então, para chegar à média dos dados,
utilizou-se a ferramenta “Solver”, variando a média e o desvio de forma a minimizar esse
erro. Essa média, então, foi utilizada para análise da pesquisa.
Como exemplo, segue a distribuição dos dados de 2002 com a função de distribuição
acumulada, obtidas empiricamente (pontos) e teoricamente (linha cheia):
ROI - Normal Acumulada
1
0,9
0,8
0,7
0,6
0,5
0,4
0,3
0,2
0,1
0
-30
-10
10
30
50
70
Gráfico 1: Função Distribuição Acumulada da variável ROI no ano de 2002
O cálculo da média das variáveis RSPL e Q foi realizado por meio da distribuição de
Cauchyiii. Essa distribuição se ajustou melhor aos dados das variáveis, principalmente nos
extremos. O que ocorreu foi que, como foram mantidos todos os dados coletados, inclusive os
outliers, a distribuição de Cauchy consegue descrever a densidade de probabilidade para esses
valores melhor que a distribuição normal.
Para o cálculo da média a partir dessa distribuição, os seguintes passos foram
seguidos:
1. A Função Densidade de Probabilidade p(x) foi reescrita na forma seguinte:
p ( x) =
α
, sendo μ a média a ser obtida;
π × (x − μ)2 + α 2
2. Calculou-se a distribuição dos pontos supondo uma média “ μ ” qualquer e um
parâmetro “ α ” qualquer;
3. Valendo-se da função “SOMAXMY2” do Excel® chega-se em um erro,
comparando a função densidade de probabilidade empírica com a teórica;
4. Com a função “Solver” variou-se a média “ μ ” e o parâmetro “ α ” de forma a
minimizar o erro calculado no passo anterior, gerando assim a média da distribuição.
7
A título de visualização e comparação desta distribuição com a distribuição normal,
segue o gráfico da variável RSPL:
RS PL
Cauchy
Normal
0,1
-60,00
-40,00
-20,00
0,00
20,00
40,00
60,00
0,01
0,001
Gráfico 2: Função Densidade de Probabilidade em escala logarítmica da variável RSPL no ano de 2003
Quanto às variáveis independentes, ambas possuem uma freqüência alta de
observações exatamente no ponto 0 (zero), o que caracteriza uma distribuição discreta. A
partir do zero, qualquer valor até 100 pode ser encontrado, passando de uma distribuição
discreta para uma distribuição contínua.
Para isso, utilizou-se a distribuição delta δ (utilizada para distribuições discretas)
centrada no ponto zero e uma soma de funções exponenciais para explicar as variações no
restante dos pontos. A equação geral para a função densidade de probabilidade ficou da
seguinte maneira:
p ( x) = C1δ ( x) + f ( x)
100
Sabendo que
∫ p( x)dx = 1 e
0
ou: 1 =
C1
+
2
100
∫ δ ( x)dx = 1 / 2 , então:
0
100
∫
100
p ( x)dx = (C1 ×1 / 2) +
0
∫ f ( x)dx
0
100
∫ f ( x)dx .
0
Portanto, C 1 / 2 é na verdade a probabilidade de ocorrer observações localizadas no
ponto zero, o que significa a não dispersão de controle e de propriedade.
A função delta δ (x) , segundo Arfken e Webwe (1995), é definida seguindo estas
propriedades: δ ( x) = 0 , para x ≠ 0 ;
+∞
∫
f ( x)δ ( x)dx = f (0) e
−∞
+∞
∫ δ ( x)dx = 1 .
−∞
A função f (x) foi encontrada da seguinte maneira:
f ( x) = F0 ( x) × F1 ( x) × F2 ( x) × C 2 .
Em que:
F0 ( x) =
F1 ( x) =
1
1+ e
−( x − x0 )×α 0
1
−( x − x1 )×α1
1+ e
F2 ( x) = e −α 2 x
, a qual é uma função do tipo degrau, que vai de zero a 1;
, a qual é uma função do tipo degrau, que vai de 1 a zero e;
8
A função f (x) foi otimizada, minimizando o erro entre a distribuição empírica e a
teórica, calculado pela função “SOMAXMY2” e variando os parâmetros: C 2 , x0 , α 0 , x1 , α1
e α 2 de forma que se tenha um melhor ajuste para descrever a distribuição de probabilidade
das variáveis.
A seguir é apresentado o gráfico para as funções densidade de probabilidade da
variável de dispersão de propriedade, como ilustração:
Delta e Exponenciais
Free Float
0,02
Normal
0,015
0,01
0,005
0
0,00
20,00
40,00
60,00
80,00
100,00
Gráfico 3: Função Densidade de Probabilidade da variável “free float” no ano de 1997.
4. Resultados e Análise dos Dados
4.1. Perfil das variáveis de governança corporativa
Por meio da população de empresas utilizadas neste trabalho, também foi possível
confirmar as características do mercado brasileiro verificada por outros estudos, tais como a
concentração de propriedade e a concentração de controle.
A tabela seguinte apresenta, em suas colunas, “blocos” de dispersão de propriedade
estabelecidos de zero a 30% e de zero a 40% de grau de dispersão, bem como a média dos
onze anos analisados, a título de simplificação.
(%)
1995
1996
1997
1998
Tabela 1: Grau de dispersão da propriedade das empresas
Free Float
0-30 0-40
(%) 0-30 0-40
(%) 0-30 0-40
37,42 48,68
1999 55,9 65,26
2003 57,8 67,2
41,77 50,00
2000 55,9 64,39
2004 56,95 65,67
49,61 60,98
2001 57,28 66,02
2005 52,63 63,16
49,45 59,42
2002 59,09 67,93
Média 52,16 61,7
Pela tabela anterior constata-se que, a partir de 1999, mais de 50% das empresas
possuem no máximo 30% de pulverização da propriedade, o que quer dizer que 70% da
propriedade é concentrada. Estendendo para 40% de pulverização de propriedade (ou 60% de
concentração), apenas no ano de 1995 há menos de 50% das empresas e a partir de 1996 temse mais de 60% de empresas.
Por meio dessa análise fica evidente que o mercado de capitais do Brasil ainda possui
concentração de propriedade, o que corrobora os estudos de La Porta, Shleifer e Lopez-deSinales (1999) ao salientarem que se ocorrer a dispersão da propriedade em países com baixa
proteção legal aos investidores, será uma rara exceção, bem como os estudos de Silveira
(2002) e Silva (2004).
Analisando a dispersão de controle das empresas estudadas, porém agora detalhando
mais o “bloco” de dispersão, tem-se o seguinte resultado, por ano e a média dos onze anos:
9
(%)
1995
1996
1997
1998
0-10
27,86
30,95
34,19
35,31
0-20
43,93
47,96
50,14
53,95
0-30
60,36
64,63
67,52
66,89
Tabela 2: Grau de dispersão do controle das empresas
Dispersão de Controle
0-40
(%) 0-10 0-20 0-30 0-40
(%) 0-10
75,36
1999 38,95 56,84 69,05 80,21
2003 45,11
78,57
2000 38,07 57,82 70,37 80,66
2004 45,16
79,20
2001 41,87 59,76 71,95 81,71
2005 45,70
78,51
2002 42,94 61,69 73,59 82,06
Média 38,74
0-20
63,87
63,18
62,52
56,51
0-30
74,85
73,84
74,00
69,73
0-40
82,24
83,14
82,41
80,37
No geral, em todos os intervalos, a porcentagem de empresas presentes é crescente. O
grau de pulverização de ON de 0% a 10% possui números significantes de empresas, sendo
que o aumento dessa participação está, aparentemente, tendendo a 50%.
A partir do intervalo de 0% a 20% verifica-se, em média, mais de 50% das empresas.
De 0% a 30% de pulverização de ações do tipo ordinária, não há mais dúvida de que a maioria
das empresas está nesse intervalo. Finalizando, com um intervalo de 0% a 40% se obtém, até
o ano mais recente (2005), 82,41% das empresas do país.
As análises anteriores confirmam que as empresas brasileiras possuem concentração
de controle, e com isso, baixa pulverização ou dispersão de ações com direito a voto no
mercado de capitais, o que ratifica outros estudos citados neste trabalho, tais como Silveira
(2002).
As análises permitidas neste tópico quanto à pulverização de propriedade e controle
está de acordo com Silveira (2002) e Silva (2004) ao verificar que as companhias abertas
brasileiras têm alta concentração de ações ordinárias e uma ausência de pulverização de
propriedade. Corroboram, também, Shleifer e Vishy (1997), os quais advertem que a falta de
um sistema legal de proteção aos investidores (características do Brasil) leva as empresas a
concentrarem a propriedade e o controle para incentivar alguns investidores (aqueles que
controlam), pois eles terão como poder a tomada de decisões dentro da companhia.
4.2. Correlação entre as variáveis de governança, valor e desempenho
A correlação entre as variáveis de governança, valor e desempenho das empresas foi
feita utilizando a média de cada ano e de cada variável por meio do estudo de suas
distribuições.
Dessa forma, a correlação entre free float e valor e desempenho das empresas
apresentou o seguinte resultado:
Tabela 3: Correlação entre as médias das variáveis free float, valor e desempenho
Correlação
Free Float
Free Float
Free Float
Q -63,46%
RSPL -50,70%
ROI -43,60%
Uma análise geral da tabela anterior permite verificar que a variável dispersão de
propriedade possui correlação negativa com as variáveis de desempenho e valor. Isso quer
dizer que as empresas que possuem maior dispersão acionária acabam tendo um menor valor
de mercado e menor desempenho.
Esse resultado corrobora o resultado de outros estudos, como: Jensen e Meckling
(1976), ao afirmarem que a concentração de propriedade tem efeito positivo na avaliação das
empresas, pois os acionistas majoritários monitoram mais eficientemente os administradores;
La Porta, Shleifer e Lopez-de Sinales (1999), que alegam que países com baixa proteção legal
aos investidores têm na concentração da propriedade uma forma de afiançar seus
investimentos; Claessens et alli (1999), ao declararem que empresas com maior concentração
de propriedade terão maior valor em seus ativos, portanto maior valor de mercado; bem como
os trabalhos de Chen e Ho (2000) e de Makhija e Spiro (2000).
10
A próxima análise foi relacionar as variáveis de valor e desempenho com a dispersão
de controle das empresas, a qual pode ser observada em seguida:
Tabela 4: Correlação entre as médias das variáveis “DC”, valor e desempenho
Correlação
DC
DC
DC
Q -68,01%
RSPL -56,01%
ROI -72,71%
Da mesma forma que os resultados da variável free float, verifica-se que as empresas
com controle mais concentrado apresentam melhores desempenhos e maior valor de mercado.
Silva (2006) adverte que, quando grandes acionistas controlam uma empresa, suas
políticas podem resultar na expropriação dos acionistas minoritários, reduzindo o valor da
empresa. Contudo, conforme observado nas tabelas 3 e 4 deste trabalho, a correlação entre o
valor da empresa e de seus retornos com a pulverização da propriedade e do controle é
negativa, indo ao contrário do exposto no trabalho de Silva (2006).
Porém, Silva (2003) teve como resultado que, quanto maior a concentração de poder
de votos, maiores são os valores de mercado das empresas, medido pelo Q de Tobin. Dessa
forma, o resultado encontrado no presente trabalho corrobora o estudo de Silva (2003).
Esses resultados podem ser explicados pela falta de proteção legal aos acionistas. Sem
proteção legal, mesmo com uma possível dispersão do controle, os pequenos investidores ou
poupadores não têm interesse em investir em ações de empresas, o que pode impactar em
menor liquidez, pois há pouca valorização das ações, logo menor valor de mercado. Outro
impacto da falta de proteção legal é influenciar a própria empresa e aqueles investidores que,
embora sejam minoritários, possam ser prejudicados no caso da compra de uma empresa por
outra no mercado de ações.
Mercado de capitais com proteção legal aos minoritários é um incentivo para que eles
canalizem suas poupanças em ações de empresas. Isso fará com que as ações tenham mais
procura, aumentando a liquidez e impactando no valor de mercado da empresa. Porém, o
Brasil não possui um sistema legal desse tipo, não incentivando os investidores e a população
a criar uma cultura de investimento em ações empresariais. Logo, o país não tem um mercado
de capitais com alto desempenho e suficientemente desenvolvido como em outros países,
segundo Novaes (2005, apud Silva 2006). Isso pode explicar a correlação negativa existente
entre a dispersão de controle e a variável Q. Sem um amparo legal, pode não adiantar
dispersar ações para o mercado, uma vez que elas não terão procura pelos investidores e pela
população, não aumentando a liquidez, logo não aumentando o valor de mercado da empresa.
Setúbal Júnior (2002) corrobora expondo que os países com maior proteção legal aos
minoritários acabam por expandir o mercado acionário e pulverizando a propriedade, o que
impacta em melhor avaliação de mercado das empresas na relação valor patrimonial (RSPL) e
valor de mercado. Desse modo, pode-se dizer que uma das peças fundamentais para que as
empresas tomem a atitude de pulverizar capital e controle seria a proteção legal aos
investidores, para assim ter um impacto positivo no valor da empresa e em seu desempenho.
No que se refere à relação entre a dispersão de controle e da variável ROI, a correlação
negativa pode ser explicada pelo benefício, conforme salienta Silveira (2004) e La Porta,
Shleifer e Lopez-de Sinales (1999). O que ocorre é que o Brasil tem baixa proteção legal e
alta concentração de propriedade, ou seja, os acionistas possuem muitos recursos alocados à
empresa. Isso gera um efeito incentivo para o controlador fiscalizar melhor a empresa, suas
atividades, os gestores, procurar fazer com que ela tenha melhor desempenho, maximizar a
eficácia, ter melhores resultados, portanto elevando o ROI. Assim, a correlação negativa entre
ROI e a dispersão de propriedade e a dispersão de controle é explicada.
11
Além dos trabalhos citados anteriormente, outros tiveram resultados semelhantes com
o obtido no presente estudo, bem como resultados contraditórios. A respeito dos resultados
contraditórios de outras pesquisas, pode-se citar: Claessens et alli (1999), Silva e Leal (2003),
Okimura (2003), Silva (2002 e 2004) e; Silveira (2002). Por outro lado, o resultado
encontrado neste trabalho corrobora outros trabalhos tais como: Shleifer e Vishny (1986),
Füerst e Kang (2000), Okimura (2003), Bohreen e Odegaard (2003).
La Porta et alli (2000) já afirmavam que, em um país onde o sistema legal não protege
os investidores, a governança corporativa pode não ser muito eficiente. Talvez por isso, no
Brasil, apenas a governança corporativa ainda não seja suficiente para melhorias nas empresas
e no mercado de capitais como ocorre em países com maior proteção aos investidores, pelo
menos a curto prazo. Porém, é um passo para que esse quadro possa se reverter, no longo
prazo, o que por si só já é um avanço, pois, segundo Andrade e Rossetti (2004), um bom
sistema de governança corporativa pode reforçar as competências e ampliar as bases de valor
da empresa ao harmonizar interesses e contribuir para os resultados corporativos, aumentando
a confiança dos investidores e fortalecendo o mercado de capitais, o que resulta em um maior
crescimento econômico.
5. Considerações Finais
Dentro do contexto sobre o tema “Governança Corporativa”, o presente estudo
levantou a seguinte questão: “O cumprimento de exigências da governança corporativa
impacta no desempenho e no valor das empresas brasileiras?”. Dessa forma, o objetivo
principal do trabalho foi identificar a existência de relação entre mecanismos de governança
corporativa, desempenho operacional e alterações no valor de mercado das empresas
brasileiras que adotam tais mecanismos e verificar como se dá tal impacto.
Para isso, utilizou-se como proxies de governança corporativa o grau de dispersão da
propriedade medido pelo valor do free float e o grau de dispersão de controle medido pelo
número de ações ordinárias que não estão nas mãos dos dois maiores acionistas,
caracterizando, dessa maneira, as variáveis independentes do trabalho. Como variáveis
dependentes e representantes do valor de mercado das empresas e de desempenho utilizou-se
o Q de Tobin, RSPL (retorno sobre o patrimônio líquido) e ROI (retorno sobre investimento).
Porém, antes de verificar a correlação existente entre as variáveis foi feito um estudo
das distribuições de probabilidade de cada uma, por saber que as variáveis possuem
características díspares e mesmo valores com probabilidades diferentes de ocorrerem. Dessa
forma, encontrou-se que a variável ROI possui uma distribuição normal, as variáveis RSPL e
Q seguem uma distribuição de Cauchy e as variáveis de governança se adaptaram melhor a
uma soma de distribuição delta com exponenciais. Com esse tratamento foi possível trabalhar
com toda a população de dados.
Nos resultados que objetivaram verificar o comportamento da dispersão de controle e
de propriedade do Brasil ficou evidente que as empresas do país ainda possuem características
de concentração de propriedade e de controle.
Na análise utilizando a média retirada do estudo da distribuição das variáveis para
fazer uma correlação entre variáveis dependentes e independentes, obteve-se como resultado
uma correlação negativa entre elas.
Esses resultados, principalmente no que refere ao índice Q e ao RSPL, podem ser
explicados pela questão da falta de proteção legal aos investidores. Sem essa proteção, os
investidores, principalmente os minoritários, não têm interesse e incentivo em investir em
ações de empresas, o que pode impactar em menor liquidez, pois há pouca valorização das
ações, logo menor valor de mercado para a empresa.
Por outro lado, essa baixa dispersão de controle e propriedade, juntamente com a falta
de proteção aos investidores, acaba por gerar um efeito-incentivo, como mencionado por
12
Silveira et alli (2004), de que os investidores controladores se empenhem mais em buscar
melhores resultados para a companhia, o que impacta em um melhor retorno sobre
investimento. A governança corporativa, então, acaba por encontrar um obstáculo que a
impeça de ser totalmente eficiente: a baixa proteção legal aos investidores, confirmando La
Porta et alli (2000).
Apesar disso, pode-se dizer que a governança é uma forma ou um passo para
modificar as características do mercado de capitais brasileiro. Seu impacto pode não estar
ainda muito claro de ser observado, devido ao pequeno número de empresas de capital aberto
no país, e um menor número de empresas com padrões de governança ou presentes em um
dos níveis diferenciados de governança corporativa criados pela Bovespa. Assim, um ponto
que poderia ser relevante neste estudo, ou mesmo para uma pesquisa futura, seria separar a
amostra de empresa em dois grupos: a) empresas do mercado tradicional; e b) empresas
presentes nos níveis diferenciados de governança corporativa; com a intenção de verificar se
há diferenças nos resultados.
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TRIOLA, M. F. Introdução à Estatística. 7 ed. Rio de Janeiro: LTC, 1998.
i
O índice de free float representa o total do capital da empresa disperso no mercado, sem fazer distinção entre os
ativos.
ii
È importante ressaltar que todo esse procedimento foi aplicado para cada variável em cada ano com o intuito de
perceber que grupos de variáveis poderiam ser melhores explicadas por distribuições diferentes
iii
α
A distribuição de Cauchy, segundo Milone (2004) pode ser definida da seguinte maneira: p ( x ) =
π (α 2 + x 2 )
15
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