ATUALIZAÇÃO
Análogos do GnRH: Bases Moleculares
e Aplicações em Reprodução Assistida
GnRH Analogues: Molecular Basis and Applications in Assisted
Reproduction
Lauriane Giselle de Abreu
Alessandra Aparecida Vireque
José Carlos dos Santos
Omero Benedito Poli Neto
Ana Carolina Japur de Sá Rosa e Silva
Marcos Felipe Silva de Sá
Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP), USP,
Ribeirão Preto, São Paulo
Resumo
O decapeptídeo GnRH é o iniciador central
da cascata hormonal reprodutiva. É gerado em neurônios hipotalâmicos a partir de um polipeptídeo
precursor por processamento enzimático e liberado
de maneira pulsátil na circulação portal para
estimular a biossíntese e secreção dos hormônios
luteinizante (LH) e folículo-estimulante (FSH) pela
hipófise. Baixas doses de GnRH aplicadas de maneira pulsátil equivalem à liberação fisiológica portal e
restauram a fertilidade em diferentes condições de
anovulação. Por outro lado, altas doses de GnRH
causam desensibilização do gonadotrofo e inibem
a liberação hipofisária com conseqüente inibição
da função ovariana. Pequenas modificações na
molécula original do GnRH originam substâncias
conhecidas como análogos do GnRH, que podem ser
agonistas ou antagonistas. Os agonistas provocam
uma liberação inicial de gonadotrofinas (flare-up)
seguida de desensibilização do gonadotrofo (down
regulation). Já os antagonistas agem diretamente
sobre o gonadotrofo, através de inibição competitiva
dos receptores do GnRH. Este fenômeno de quiescência hipofisária provocada pelos análogos do GnRH
tem extensivas aplicações clínicas e o conhecimento
sobre a fisiologia do GnRH é importante para a apli-
Femina - Junho 2006 vol 34 nº 06
cação mais racional destes análogos. Este artigo visa
a descrever os mecanismos de ação destes análogos
do GnRH, bem como revisar as diferentes indicações
clínicas de seu uso em reprodução assistida.
PALAVRAS-CHAVE: GnRH. Agonistas e antagonistas do GnRH. Infertilidade.
Introdução
A identidade e estrutura do hormônio liberador de gonadotrofinas (GnRH) foram primeiro
descritas nos trabalhos de Schally e Guillemin
(Schally et al., 1971; Amoss et al., 1971). Entre
os acontecimentos marcantes, posteriores a esta
descoberta, se inclui a descrição de que o GnRH é
secretado em forma de pulsos na circulação portal
(Knobil, 1974) e a demonstração de que essa pulsatilidade é fundamental para manter a síntese e
secreção de gonadotrofinas e, portanto, a função
reprodutiva (Knobil, 1980). O GnRH humano é
um decapeptídeo com a seguinte seqüência de
aminoácidos: Glu-His-Trp-Ser-Tyr-Gly-Leu-ArgPro-Gly. A molécula deste decapeptídeo tem forma de V, o que facilita a sua ligação ao receptor
de membrana.
401
Análogos do GnRH: bases moleculares e aplicações em reprodução assistida
Biossíntese e Mecanismo de Ação do GnRH
A rede principal de neurônios secretores de
GnRH está localizada no hipotálamo basal medial.
O padrão cíclico de atividade elétrica e biossintética
nos neurônios GnRHérgicos é dependente das flutuações cíclicas nos níveis circulantes de estrógenos.
Uma vez liberado, o GnRH penetra diretamente os
vasos do sistema porta-hipofisário e chega à hipófise
anterior. Nesse local, o GnRH se liga a um receptor
expresso nas células gonadotróficas hipofisárias que
secretam LH e FSH. Como dito acima, a molécula
do GnRH consiste de uma seqüência de 10 resíduos
de aminoácidos, sendo os quatro primeiros resíduos
fundamentais para a liberação do LH e FSH, conferindo especificidade ao hormônio, e altamente
conservados durante o processo evolutivo.
A interação do GnRH com seu receptor estimula o sistema efetor intracelular da proteína
kinase C/Ca++ intracelular de maneira bifásica. A
primeira fase consiste em um aumento intenso do
Ca++ intracelular livre que induz a exocitose dos
grânulos secretórios que contêm LH e/ou FSH. Essas ocorrências de secreção de gonadotrofinas são
geralmente chamadas de pulsos de gonadotrofinas.
Em longo prazo, a ligação do GnRH e a ativação da
proteína kinase C provocam a expressão de genes
que codificam a subunidade beta do FSH e do LH,
sustentando, assim, um nível de secreção tônica
(não pulsátil) das gonadotrofinas (Conn, 1995).
Os níveis séricos de gonadotrofinas são, portanto,
mantidos por processo de secreção constante - secreção tônica - e por freqüentes pulsos de secreção
hipofisária - secreção pulsátil -, permitindo um
controle mais dinâmico dos eventos ovarianos.
A meia-vida do GnRH é de 2 a 4 min e a ação
hormonal limitada por vários mecanismos como
degradação por proteases associadas à membrana,
proteólise lisossômica ou inativação primária no
hipotálamo por endopeptidases.
Estrogênios como Moduladores da Secreção do GnRH
Embora os mecanismos de feedback clássicos
estejam bem estabelecidos, a natureza precisa da
influência dos estrogênios sobre os neurônios do
GnRH ainda permanece obscura. Entre os esteróides ovarianos, o 17B-estradiol (E2) é o principal
modulador dos padrões de secreção dos neurônios
GnRHérgicos, via mecanismos de feedback clássicos. Estes mecanismos regulatórios são mediados
no hipotálamo via interneurônios ou neurônios de
associação estrogênio-receptivos (Herbison, 1998).
402
Recentemente, o conceito do mecanismo
transsináptico como via operante única da ação
dos estrógenos na regulação da secreção do GnRH
tem sido questionado, uma vez que a expressão
de receptores de estradiol (RE) em neurônios
GnRHérgicos, in vivo, é incerta. Estudos imunohistoquímicos têm consistentemente falhado em
detectar as proteínas dos receptores de estrogênios
nos neurônios GnRHérgicos de muitas espécies
(Herbison, 1998) e igualmente, há pouca evidência
de acúmulo de estradiol radioativo por estas células
in vivo (Shivers et al., 1983). Contudo, a identificação de imunorreatividade para o receptor alfa de
estradiol (ARE) (Buttler et al., 1999), RNAm do RE
(Skynner et al., 1999) e sítios de ligação de estrogênios marcados com I125 em neurônios do GnRH
em roedores apontam uma possível ação direta dos
estrógenos em neurônios GnRHérgicos.
Ensaios in vitro sugerem outros mecanismos e vias modulatórias da secreção do GnRH
mediadas pelos esteróides circulantes ou neuroesteróides. Moléculas de origem astrocitária
influenciam a liberação do GnRH, bem como os
processos de diferenciação e crescimento dos
neurônios secretores de GnRH (Zwain et al.,
2002). Astrócitos do tipo I expressam receptores
de esteróides, o que indica possível ação destes
hormônios sobre os neurônios do GnRH, pela
via astrocítica (Zwain et al., 2002). Essas células
liberam uma variedade de fatores neuroativos,
incluindo TGFA e TGFB, IGF-I, PGE2 e o neuroesteróide 3A-hidroxi-5A-pregnan-20-ona (allopregnane). Cada um destes fatores é capaz de estimular
a liberação de GnRH e possuem receptores nos
neurônios GnRHérgicos.
Controle Neuroendócrino da Secreção GnRH
A regulação da secreção do GnRH é complexa
e consiste de ações estimulatórias e inibitórias de
esteróides e neurotransmissores para modificar a
secreção pulsátil intrínseca dos neurônios do GnRH.
In vivo, o padrão de pulsos do GnRH varia fisiologicamente em função do status hormonal e estágio do
ciclo reprodutivo. O estímulo à secreção de gonadotrofinas é dependente da liberação pulsátil do GnRH,
enquanto a exposição contínua ao GnRH regula para
baixo a secreção de LH e FSH (Bédécarrats & Kaiser,
2003). As freqüências exatas e quantidades de GnRH
requeridas para produzir estimulação ótima dos
gonadotrofos variam entre espécies, entretanto, em
todas é primordial o estímulo intermitente.
Observam-se diferenças qualitativas e quantitativas entre os padrões pulsáteis de secreção das
Femina - Junho 2006 vol 34 nº 06
Análogos do GnRH: bases moleculares e aplicações em reprodução assistida
gonadotrofinas nas diferentes fases do ciclo. Nas
fases folicular e lútea inicial verifica-se um pulso
a cada 1 ou 2 h, enquanto nas fases lútea média e
tardia, a freqüência oscila entre 3 e 8 h. Estudos em
várias espécies demonstram que o padrão de sinais
de pulso do GnRH regula diferencialmente a expressão gênica das subunidades A, LHB e FSHB, atuando
na transcrição e estabilidade do RNAm (Kaiser et al.,
1997). Mais especificamente, pulsos de freqüências
rápidas ou intermediárias estimulam a expressão
dos genes A e LHB, enquanto baixas freqüências
estimulam, seletivamente, o FSH (Haisenleder et
al., 2002). Alterações na amplitude e freqüência dos
pulsos do GnRH também regulam diferencialmente
outros genes nos gonadotrofos, incluindo receptor
de GnRH (GnRHr), folistatina e subunidades da
activina (Haisenleder et al., 2002).
Os gonadotrofos são capazes de distinguir
as freqüências de pulsos do GnRH e ativar vias de
transdução de sinal apropriadas para estimular diferentemente a expressão dos genes A, LHB e FSHB
(Bédécarrats & Kaiser, 2003). Estudos indicam ainda
que a freqüência de pulsos do GnRH regula o número
de receptores de GnRH (GnRHr) na superfície da
célula (Bédécarrats & Kaiser, 2003). Enquanto GnRH
pulsátil aumenta os sítios de ligação, a estimulação
contínua com GnRH durante 10 h resulta em redução
(down-regulation) do número de receptores.
A resposta dos gonadotrofos ao GnRH correlaciona-se, em parte, com a densidade de receptores de GnRH (GnRHr) na superfície da célula.
Muitos fatores regulam a expressão do gene do
GnRHr, sobretudo o próprio GnRH. Existe evidência crescente que, em adição ao GnRH, a ativina é
o mais importante estimulador da expressão dos
genes do GnRHr e LHB e da liberação do FSH
(Norwitz et al., 2002), com influências modulatórias
adicionais da inibina e folistatina (Depaolo et al.,
1991). A inibina também tem ação sinérgica com
o estradiol, aumentando o número de receptores
de GnRH (Rispoli & Nett, 2005).
Ainda existem resultados conflitantes entre
estudos in vivo e in vitro quando se avalia a ação
de inibina e os efeitos recíprocos da ativina e inibina sobre a regulação dos receptores de GnRH
ainda não estão devidamente esclarecidos, sendo
necessárias outras avaliações para definir o papel
fisiológico da inibina na regulação da síntese de
GnRHr. Como observado em estudos recentes, o
mais importante regulador hormonal do número
de receptores de GnRH talvez seja o próprio GnRH
(Rispoli & Nett, 2005).
Mudanças no número de receptores têm
sido propostas como o principal mecanismo envolvido na regulação variável da expressão gênica
Femina - Junho 2006 vol 34 nº 06
das subunidades das gonadotrofinas (Kaiser et
al., 1995). Bédécarrats et al., 2003, sugerem que a
regulação do gene promotor do FSHB pelo GnRH
é diretamente influenciada pelo número de seus
receptores e estes regulados pela freqüência de
pulsos do GnRH.
Os Análogos do GnRH
A habilidade do GnRH pulsátil e contínuo
para up e down regular, respectivamente, a síntese
e a secreção das gonadotrofinas têm levado ao desenvolvimento de terapias para diversos distúrbios
reprodutivos, utilizando-se GnRH nativo ou seus
análogos. Os análogos do GnRH podem ser utilizados para o tratamento de várias doenças hormôniodependentes sejam elas benignas (por exemplo,
leiomiomas, endometriose e puberdade precoce
central), ou tumores malignos (carcinomas de mamas, ovários, endométrio e próstata). Também, o
efeito inibitório sobre a secreção gonadotrófica hipofisária é útil como adjuvante na hiperestimulação
ovariana controlada (HOC) utilizada nas técnicas de
reprodução assistida (Kiesel et al., 2002).
A substituição de um único aminoácido da
cadeia polipeptídica pode alterar a afinidade e a
atividade da molécula do GnRH formando um
agonista, via modificação da cadeia lateral que
interage com o sítio de ligação do receptor e/ou
alteração da conformação estrutural do peptídeo
(Huirne & Lambalk, 2001).
Os agonistas do GnRH têm relativamente
poucas modificações em relação ao GnRH nativo.
Basicamente, são feitas modificações na glicina da
posição 6 e na glicina-carboxiterminal na posição
10. A modificação na posição 6 aumenta a meia
vida da molécula, pois esta é a posição de clivagem
pelas peptidases, protegendo a sua degradação na
circulação sanguínea. As modificações na posição
10 aumentam a afinidade pelo receptor em 100-200
vezes em relação ao GnRH nativo (Shapiro, 2003).
Os antagonistas do GnRH têm múltiplas
substituições, dentre elas aquelas nos aminoácidos
das posições 1, 2 e 3. É esta a região da molécula que
se liga ao receptor do GnRH. São estas alterações
que tornam estes compostos mais antagonistas que
agonistas. A substituição na posição 6 aumenta a
sua vida média. As substituições nas posições 8 e
10 resultam na eliminação do problema de reações
alérgicas decorrentes da liberação de histamina no
local de aplicação da droga (Shapiro, 2003).
403
Análogos do GnRH: bases moleculares e aplicações em reprodução assistida
Mecanismo de Ação dos Agonistas
e Antagonistas do GnRH
Os análogos do GnRH também ligam-se a
receptores específicos de membrana nas células gonadotróficas da hipófise, como previamente descrito
para o GnRH nativo. Para conseguir 80% da resposta
biológica, é necessária a ocupação de apenas 5% de
todos os sítios de ligação GnRH-receptores. Após
a ligação ao receptor, uma internalização do complexo receptor-peptídeo leva à inativação biológica
e reciclagem do receptor (Kiesel et al., 2002). Os
análogos sintéticos agonistas do GnRH levam a uma
liberação intensa das reservas de LH e FSH (o efeito
flare-up). Quando se faz uma aplicação contínua
dessas substâncias há uma dessensibilização dos
gonadotrofos pela downregulation dos receptores de
GnRH e desregulação da sinalização intracelular. Os
antagonistas do GnRH inibem a secreção de gonadotrofinas por bloqueio competitivo dos receptores
do GnRH sem downregulation dos receptores. Os
antagonistas do GnRH não têm ação pós-receptor.
Existem então duas diferenças clinicamente relevantes dos antagonistas em relação aos agonistas
do GnRH: (1) a ausência do efeito flare-up e (2) a
resposta pituitária inalterada após a suspensão da
medicação (Kiesel et al., 2002).
As propriedades farmacocinéticas com relação à atividade antagonista máxima são lineares
seguindo doses únicas ou múltiplas. O clearance é
predominantemente metabólico e hepático. Cerca
de 80% destes compostos circulam na corrente
sanguínea ligados a proteínas. A vida média dos
antagonistas que não são de depósito varia de 5 a
30 h após a injeção subcutânea de doses clínicas e
esta é aumentada após a administração de doses
múltiplas (Huirne & Lambalk, 2001).
As concentrações plasmáticas de LH e FSH
caem, respectivamente, 70 e 30% 6 h após a administração de antagonistas de GnRH (Huirne &
Lambalk, 2001). Contudo, quando se administra
algum agonista do GnRH a queda do LH e do
FSH pode demorar de 14-21 dias devido ao efeito
inicial de flare-up (Shapiro, 2003). O tamanho e
a duração da supressão das gonadotrofinas são
dose-dependentes. A supressão na administração
subcutânea e intramuscular é semelhante, porem
a utilização da via nasal exige doses maiores dessas substâncias. A porcentagem de declínio da
secreção do LH obtida com o uso dos análogos do
GnRH é maior que o declínio da secreção do FSH,
indicando a existência de um mecanismo adicional
de controle não dependente do GnRH (Huirne &
Lambalk, 2001).
404
Com relação à sua tolerância e tolerabilidade,
estudos toxicológicos têm demonstrado que a terceira geração destas drogas é segura. Os efeitos adversos
dos agonistas são os mesmos dos antagonistas, e são
atribuídos ao hipoestrogenismo na mulher e ao hipoandrogenismo no homem. Exposição prolongada aos
agonistas pode levar a perda da massa óssea após os
6 meses de uso desta medicação. Um efeito colateral
comum é uma reação de rubor e dor no local da injeção da medicação que usualmente desaparece após
uma hora (Huirne & Lambalk, 2001).
Impacto Clínico dos Análogos do GnRH
Os agonistas do GnRH, apesar de comprovado
benefício em reprodução assistida, possuem limitação de seu uso em patologias hormônio-dependentes
devido ao seu efeito flare-up, que provoca liberação de
gonadotrofinas com estímulo das gônadas e liberação
inicial de estróides. Neste sentido, os antagonistas do
GnRH poderão ter ampliação de sua aplicabilidade
clínica, já que apresentam mecanismo de ação diferente dos agonistas, causando um bloqueio imediato
da liberação das gonadotrofinas, sem o efeito flare-up
(Tabela 1) (Huirne & Lambalk, 2001; Shapiro, 2003).
Apesar desta variedade de possibilidades de
uso clínico e de inúmeros estudos se encontrarem
em fase adiantada em diversas patologias abaixo descritas, somente os antagonistas cetrorelix e ganirelix
encontram-se liberados para uso e só em reprodução
assistida (Hohmann et al., 2003; Shapiro, 2003).
Tabela 1 – Uso clínico possível dos antagonistas do GnRH
Principais indicações clínicas do uso de análogos do GnRH
Sistema Reprodutivo Feminino
Síndrome da hiperestimulação ovariana
Síndrome dos ovários policísticos
Endometriose
Leiomioma
Câncer ovariano
Câncer endometrial
Câncer de mama
Sistema Reprodutivo Masculino
Hipertrofia prostática benigna
Câncer de próstata
Contracepção masculina
Ginecologia Infanto-puberal
Puberdade precoce
Outros
Adenoma hipofisário
Proteção gonadal durante radiação ou quimioterapia
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Análogos do GnRH: bases moleculares e aplicações em reprodução assistida
Análogos do GnRH e Reprodução Assistida
Os agonistas do GnRH apresentam uso consagrado em reprodução assistida e seus benefícios
bem fundamentados na literatura. Seu emprego
desde a década de 1980 tem sido preconizado com
objetivo de prevenir a ovulação precoce através da
supressão da liberação das gonadotrofinas endógenas e, por conseqüência, do pico de LH pré-ovulatório em ciclos de estimulação ovariana controlada.
Desta forma, leva à redução no cancelamento dos
ciclos, aumento do número de oócitos captados e,
por fim, eleva sensivelmente as taxas de gravidez
(Dodson, 1990).
Os agonistas mais utilizados são o leuprolide,
a buserelina e a triptorelina. O uso é diário pela
via subcutânea (leuprolide 1 mg/dia, triptorelina
0,1 mg/dia) ou nasal (buserelina 0,9 mg/dia no
protocolo longo e 0,45 mg/dia no curto). Existem,
basicamente, 2 protocolos para uso dos agonistas
do GnRH em reprodução assistida: 1) protocolo
longo, mais utilizado, consiste na aplicação do
agonista desde a fase lútea do ciclo prévio ao ciclo
de estimulação com gonadotrofinas; e 2) protocolo
curto, em que o agonista é iniciado no 1º dia do
ciclo de indução ovariana juntamente com as gonadotrofinas (Figura 2).
O protocolo longo apresenta melhores resultados com maior número de folículos estimulados,
oócitos captados, embriões formados e melhores
taxas de implantação e gestação (Salat-Baroux
et al., 1988). O protocolo curto apresenta vantagens quanto custo do procedimento, pois utiliza
menor quantidade de gonadotrofinas e pode ser
indicado àquelas mulheres más respondedoras,
pois se aproveita o efeito flare-up para obtenção
de maior recrutamento folicular. Além disso,
os agonistas do GnRH também vêm sendo utilizados como “promovedores” de pico de LH
pré-ovulatório no lugar do hCG: Fauser et al.,
2002, observaram que o pico do LH após o uso
do agonista (valor médio 118,5 UI/mL) ocorre
após cerca de 4 h da sua administração, e com
uso do hCG (valor médio de 240 UI/mL) é após
24 h da sua administração. Não houve diferenças
na taxa de fertilização entre as duas drogas estudadas (Fauser et al., 2002).
O esquema utilizado do antagonista do GnRH
nos ciclos de hiperestimulação ovariana controlada
primeiramente ocorreu de maneira fixa no sexto
dia do ciclo, e recentemente vem sendo mudado
de acordo com o tamanho folicular, sendo aplicado quando o folículo atinge o diâmetro de 14 mm
(Shapiro, 2003).
As vantagens do antagonista do GnRH em
relação ao agonista do GnRH em reprodução assistida incluem: tratamento mais curto com menor
quantidade de antagonista e também de gonadotrofina usados na estimulação ovariana (Zikopoulos
et al., 2005), maior aceitação pela paciente, rápida
reversibilidade, ausência de efeito flare-up e de
efeitos de privação estrogênica (Shapiro, 2003;
Griesinger et al., 2005b).
pGIu
LOCAL DE
SUBSTITUIÇÃO
POR ANÁLOGOS
ANTAGONISTAS
His
{
LOCAL DE
ATIVAÇÃO DA
ADENILCICLASE
Longo
Trp
Ser
Curto
Tyr
Gly
LOCAL DE
DEGRADAÇÃO
Leu
LOCAL DE
SUBSTITUIÇÃO
POR ANÁLOGOS
AGONISTAS
Arg
Pro
Gly-NH2
Fas
e lú
tea
( ± ciclo p
dia
21) révio
CARBONO
NITROGÊNIO
HIDROGÊNIO
OXIGÊNIO
LOCAL DE
SUBSTITUIÇÃO
POR ANÁLOGOS
Figura 1 – Molécula original de GnRH e locais de substituição de agonistas
e antagonistas
Femina - Junho 2006 vol 34 nº 06
Antagonista
Dia
1 do
Folí
culo
clic
lo
> ou
= 14
hCG
mm
Figura 2 – Esquemas de uso de análogos do GnRH em ciclos de hiperestimulação ovariana controlada para reprodução assistida. Os agonistas estão
representados conforme protocolo longo (iniciado na fase lútea do ciclo
prévio) e curto (no primeiro dia do ciclo) e o antagonista utilizado conforme
tamanho do folículo (> ou = 14 mm diâmetro)
405
Análogos do GnRH: bases moleculares e aplicações em reprodução assistida
Além disso, o uso de antagonista de GnRH
seria uma boa opção nos casos de pacientes más
respondedoras à indução ovariana (D’Amato et
al., 2004; Mohamed et al., 2005), podendo, inclusive, ser usado junto ao citrato de clomifeno na
estimulação ovariana com gonadotrofina, apresentando resultados favoráveis no que diz respeito à
melhora do número de oócitos captados, menores
taxas de cancelamento de ciclo, melhores níveis
de estradiol e melhora das taxas de implantação
e gestação quando em comparação ao protocolo
longo (D’Amato et al., 2004). Também no caso de
pacientes hiper-respondedoras (síndrome do ovário
policístico), o uso dos antagonitas do GnRH reduz
a possibilidade de síndrome de hiperestimulação
ovariana e a taxa de cancelamento de ciclos (Merviel et al., 2005; Ragni et al., 2005).
Diante de tantas vantagens, parece desejável
adotar o antagonista do GnRH como rotina nos
ciclos de hiperestimulação ovariana controlada em
reprodução assistida, contudo, a Cochrane Review
(Al-Inany & Aboulghar, 2005), que avaliou 5 estudos
comparando o uso de antagonistas no GnRH com
esquema de dia fixo e os agonistas do GnRH no
protocolo longo, observou uma taxa de gestação
reduzida no caso dos antagonistas, menor número
de oócitos captados, menor número de embriões
obtidos, menor nível de estradiol sérico no dia de
aplicação do HCG.
O uso do antagonista de acordo com o tamanho folicular (cetrorelix iniciado quando > 14 mm)
também mostra redução do número de folículos
recrutados e de níveis de estradiol sérico (Ragni et
al., 2005; Griesinger et al., 2005b). Outro esquema
analisado por metanálise foi o uso do flare-up do
agonista do GnRH ao invés do HCG com o intuito
de completar a maturação oocitária naquelas mulheres em que a indução ovariana foi realizada com
antagonista do GnRH; e verificou-se uma redução
na taxa de gestação e aumento de aborto no primeiro trimestre de gestação neste novo esquema
(Griesinger et al., 2005a).
Portanto, não existem evidências consistentes de que o antagonista utilizado nos esquemas de
dia fixo ou de acordo com o tamanho folicular, ou
ainda combinado com o agonista do GnRH aproveitando o seu flare-up em substituição ao hCG;
seja superior ao agonista do GnRH em protocolo
longo de hiperestimulação ovariana controlada.
Talvez, com a melhora da curva de aprendizado
nos centros de reprodução assistida ou do uso do
antagonista em casos selecionados (más respondedoras e aquelas mulheres com risco aumentado de
síndrome de hiperestímulo ovariano), possa ocorrer
mudança neste contexto (Shapiro, 2003; D’Amato
et al., 2004; Ragni et al., 2005).
406
Abstract
GnRH decapeptide is the central initiator
of the reproductive hormonal cascade. It is generated in hypothalamic neurons starting from a
precursory polypeptide through enzymatic process and then released of pulsate mode in the portal circulation to stimulate the biosynthesis and
secretion of the luteinizing-hormone (LH) and
follicle-stimulating hormone (FSH) by pituitary.
GnRH low doses applied by pulsate way are equal
to the portal physiologic liberation and restore
the fertility in different anovulation conditions.
On the other hand, GnRH high doses cause desensitization of the gonadotroph and inhibit the
pituitary liberation with consequent inhibition of
the ovarian function. Small modifications in the
original molecule of GnRH originate known substances denominated GnRH analogues that can
be agonists or antagonists. The agonists provoke
an initial liberation of gonadotropins (flare up)
following by desensitization of the gonadotroph
(down regulation). Otherwise, the antagonists
act directly on the gonadotroph, through competitive inhibition of the GnRH receptors This
phenomenon of pituitary quiescency provoked
by the GnRH analogues has extensive clinical
applications and the knowledge on the physiology
of GnRH is essential for the most rational application of them. This article seeks to describe the
mechanisms of action of these GnRH analogues,
as well as to revise the different clinical indications of its use in Assisted Reproduction.
KEYWORDS: GnRH. GnRH agonists and antagonists. Infertility.
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