UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ
Caroline Jarzynski da Rosa
AS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA NA LEI Nº 11.340/06 –
LEI MARIA DA PENHA
CURITIBA
2010
Caroline Jarzynski da Rosa
AS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA NA LEI Nº 11.340/06 –
LEI MARIA DA PENHA
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao
Curso de Direito da Faculdade de Ciências
Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná, como
requisito parcial para a obtenção do título de
bacharel em Direito.
Orientador: Dalio Zippin Filho
CURITIBA
2010
AS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA NA LEI Nº 11.340/06 –
LEI MARIA DA PENHA
CURITIBA
2010
TERMO DE APROVAÇÃO
Caroline Jarzynski da Rosa
AS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA NA LEI Nº 11.340/06 –
LEI MARIA DA PENHA
Esta monografia foi julgada e aprovada para a obtenção do título de Bacharel em
Direito no Curso de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná.
Curitiba, ______ de ____________________ de 2010.
_________________________________
Prof. Dr. Eduardo de Oliveira Leite
Coordenador do Núcleo de Monografia
Orientador:
_________________________________
Prof. Dr. Dalio Zippin Filho
Universidade Tuiuti do Paraná
___________________________________
Prof.
Universidade Tuiuti do Paraná
___________________________________
Prof.
Universidade Tuiuti do Paraná
Dedico esta monografia a minha família
pelo apoio irrestrito em todos os momentos
de minha vida.
Agradeço a Deus pela oportunidade de
estar realizando este trabalho.
Aos meus pais que sempre acreditam e me
incentivam a alcançar meus ideais e que
não mediram esforços para que eu
chegasse até esta etapa de minha vida.
As minhas irmãs Fabi pelo apoio e carinho
de sempre, e Karine por ter me ajudado
tantas vezes com os livros que eu precisei.
Aos colegas de classe pela espontaneidade
e alegria na troca de informações e
materiais numa rara demonstração de
amizade e solidariedade.
Ao meu orientador por estar disposto a
ajudar sempre, e todos os demais
professores
pela
dedicação
e
o
conhecimento que foi transmitido ao longo
desses anos.
RESUMO
O presente trabalho tem o objetivo de mostrar uma das principais mudanças na
legislação brasileira, após a entrada em vigor da Lei nº 11.340/06, também chamada de
Lei Maria da Penha, a violência doméstica e familiar contra a mulher passou a ser trata
com uma atenção especial, pois veio com o principal objetivo de coibir e prevenir as
agressões contra as mulheres. Discute questões relacionadas desde o surgimento da
Lei, até o procedimento judicial, levando em consideração, as formas de violência,
conceitos e as medidas protetivas em detalhes. Como principal fonte de pesquisa,
utiliza-se pesquisas bibliográficas e consulta a legislações e jurisprudências. É
importante o estudo das Medidas Protetivas a vitima de violência doméstica e familiar,
já que muitas delas não denunciam seus parceiros por não saber como ocorre todo o
tramite do processo, desde o pedido até a sua execução.
Palavras chave: Lei nº 11.340/06; Lei Maria da Penha; violência doméstica; Medidas
Protetivas.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................08
2 A HISTÓRIA DE MARIA DA PENHA ................................................................09
3 O SURGIMENTO DA LEI Nº 11.340/2006 ..........................................................09
4 COMO ERA TRATADA A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA ANTES DA LEI Nº
11.340/06 ......................................................................................................................13
4.1 A APLICAÇÃO DA LEI Nº 9.099/95 NO COMBATE A VIOLÊNCIA
DOMÉSTICA ...............................................................................................................14
5 A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA ..............................................................................16
6 FORMAS DE VIOLÊNCIA ...................................................................................18
7 SUJEITOS ...............................................................................................................19
7.1 SUJEITO PASSIVO ...............................................................................................19
7.2 SUJEITO ATIVO ...................................................................................................21
7.3 MINISTÉRIO PÚBLICO .......................................................................................22
8 MEDIDAS PROTETIVAS .....................................................................................23
8.1 DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA QUE OBRIGAM O
AGRESSOR .................................................................................................................24
8.1.1 Suspensão da posse ou restrição ao porte de armas ............................................25
8.1.2 Afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida .............25
8.1.3 Vedação de condutas ...........................................................................................26
8.1.4 Restrição ou suspensão de visitas ........................................................................28
8.1.5 Fixação de alimentos provisionais ou provisórios ...............................................29
8.2 DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA À OFENDIDA ......................31
8.2.1 Encaminhamento a programas de proteção e atendimento .................................31
8.2.2 Recondução ao domicílio ....................................................................................32
8.2.3 Afastamento do lar ..............................................................................................32
8.2.4 Separação de corpos ............................................................................................33
8.2.5 Medidas de Ordem Patrimonial ...........................................................................33
9 EFETIVIDADE DAS MEDIDAS PROTETIVAS ...............................................37
10 REPRESENTAÇÃO, RENÚNCIA OU DESISTÊNCIA ...................................39
11 PROCEDIMENTO E ATUAÇÃO JUDICIAL E POLICIAL ..........................41
11.1 ÂMBITO JUDICIAL ...........................................................................................41
11.2 ÂMBITO POLICIAL ...........................................................................................43
12 Conclusão ...............................................................................................................45
Referências ..................................................................................................................47
Anexos ..........................................................................................................................49
8
1 INTRODUÇÃO
A violência doméstica e familiar contra a mulher é um fenômeno histórico.
Havia a figura patriarcal, em que o pai era o eixo da família e todos os demais eram
submissos a ele, o homem crescia com a idéia de que também quando chegasse a fase
adulta iria se tornar aquela figura, e sua mulher, consequentemente será submissa.
Assim, a mulher era tida como um ser sem expressão, que não podia manifestar a sua
vontade, e por isso sempre foi discriminada, humilhada e desprezada.
Por mais que a sociedade lute para não haja desigualdade entre homens e
mulheres, como visa a própria Constituição Federal, ainda é cultivada essa idéia da
família patriarcal e de desigualdade entre os sexos, assim, como conseqüência a
criança que cresce vendo sua mãe sendo vitima da violência doméstica, e considera a
situação natural.
Mesmo após as lutas promovidas pelo movimento feminista, a integração da
mulher no mercado de trabalho exercendo funções que antes pertenciam só aos
homens, e até mesmo a criação de métodos contraceptivos, grande parte das mulheres
têm medo, vergonha, temor de não serem compreendidas, se sentem incapazes,
impotentes, e assim não fazem nada para que a violência sofrida por elas não cesse.
Por muitos anos a violência doméstica foi tratada pelo governo com
indiferença. Porém, após a história de luta de uma vitima dessa brutalidade, chamada
Maria da Penha, é que o tema em questão foi visto de maneira diferente. Chegou um
ponto em que a violência estava tão banalizada e sem controle, que o governo
brasileiro tinha que tomar uma atitude.
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O caso de Maria da Penha tomou grandes proporções por extrapolar o
território nacional, pois a vitima foi buscar ajuda que o governo brasileiro não prestou,
diante órgãos internacionais.
Em 07 de agosto de 2006, o Presidente da República sancionou a Lei Maria da
Penha, criada com o intuito de coibir e prevenir as agressões contra as mulheres, a Lei
trouxe diversas e consideráveis inovações, dentre elas o Juizado de Violência
doméstica e Familiar contra a Mulher, e a fundamental para garantir a proteção e
integridade, física, psicológica, patrimonial, moral ou sexual da mulher, as chamadas
Medidas Protetivas de Urgência.
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2 A HISTÓRIA DE MARIA DA PENHA
A Lei nº 11.340/06 logo após ser editada passou a ser conhecida como Lei
Maria da Penha pelo episódio ocorrido em Fortaleza, Estado do Ceará, quando a
história de vida da farmacêutica Maria da Penha Maia Fernandes, apenas mais uma
mulher vítima da violência doméstica, tornou-se pública.
No ano de 1983, por duas vezes o seu então marido, Marco Antônio Heredia
Viveiros, economista e professor universitário tentou matá-la. Na primeira vez, Maria
da Penha ficou paraplégica, após a simulação de assalto realizada por seu marido, que
desferiu-lhe um tiro de espingarda fazendo com que sua coluna fosse obstruída. Já na
segunda tentativa de morte, o ataque ocorreu quando a vítima tomava banho e recebeu
uma descarga elétrica.
Seguindo atitude de várias outras mulheres vítimas de violência doméstica,
Maria da Penha também denunciou o seu marido pelas agressões que sofrera, e que lhe
deixaram marcas físicas (paraplegia irreversível) e psicológicas.
Em junho de 1983 as investigações pela primeira tentativa de homicídio foram
iniciadas, porém a denúncia só foi oferecida em setembro do ano seguinte perante a 1ª
Vara Criminal de Fortaleza. (2008, p.13)
No dia 31 de outubro de 1986 o réu foi pronunciado e em 1991 foi condenado
pelo Tribunal do Júri. A defesa do réu apelou pedindo a nulidade, alegando falha na
elaboração dos quesitos, e o então recurso foi acolhido e no dia 15 de março de 1996,
Marco Antônio foi submetido a um novo julgamento, sendo imposta pena de dez anos
e seis meses de prisão. Novamente a sentença foi alvo de apelação e o réu continuou
recorrendo em liberdade, porém, passados mais de dezenove anos após da data dos
11
fatos, o réu foi preso, e cumpriu dois anos de prisão. (2008, p.14)
3 O SURGIMENTO DA LEI Nº 11.340/2006
A repercussão do caso de violência doméstica sofrida por Maria da Penha foi
além do âmbito nacional, inconformada com a omissão da Justiça Brasileira, por não
ter aplicado medidas de investigações e nem mesmo punição ao agressor dentro de um
prazo razoável de duração do processo, Maria da Penha juntamente com o Centro pela
Justiça e o Direito Internacional (CEJIL) e o comitê Latino-Americano de Defesa dos
direitos da Mulher (CLADEM), formalizou uma denúncia contra o Brasil à Comissão
Interamericana de Direitos Humanos, órgão da Organização dos Estados Americanos
(OEA). (2009, p.22)
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos tem como principal tarefa
analisar as petições apresentadas, denunciando violações aos direitos humanos.
Possuem legitimidade para formular tais petições qualquer indivíduo, grupo ou ONG
legalmente conhecida por pelo menos um Estado-membro do OEA, a vítima da
violação também tem legitimidade para peticionar. (2008, p.23)
O governo brasileiro apresentou-se omisso perante as indagações formuladas
pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Em 19 de outubro de 1998, a
Comissão solicitou informações ao Estado, não obtendo qualquer resposta. Em 04 e
agosto de 1999, reiterou o pedido anterior, novamente sem sucesso. Tornou a fazê-lo
em 7 de agosto de 2000 e também desta vez não obteve qualquer esclarecimento.
(2008, p.25)
Desta maneira como se passaram mais de 250 dias desde a transmissão da
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petição ao Brasil e este não havia apresentado observações sobre o caso, os fatos
relatados na denúncia seriam presumidos verdadeiros. O governo brasileiro teria nova
chance, para dentro de um mês se manifestar, porém nenhuma resposta foi obtida.
Em virtude disto, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos publicou
um relatório em 16 de abril de 2001, nesse relatório nº 54/2001 é realizada uma
profunda análise do fato gerador da denúncia, e também as falhas cometidas pelo
governo brasileiro, já que é parte da Convenção Americana e Convenção de Belém do
Pará e assim assumiu perante a comunidade internacional o compromisso de implantar
e cumprir os dispositivos constantes desses tratados. Deste modo, concluiu a Comissão
que a ineficácia judicial, a impunidade e a impossibilidade de a vitima obter uma
reparação mostram a falta de cumprimento do compromisso do governo brasileiro de
reagir adequadamente a violência doméstica do crime até a elaboração do relatório nº
54/2001, a impunidade verificada por conta, principalmente da lentidão da justiça e da
inutilização desenfreada de recursos, revela que o Estado brasileiro, de fato, não
aplicou internamente as normas constantes das convenções por ele ratificadas. (2008,
p.24)
Assim, foi imposto ao governo brasileiro o pagamento de indenização no valor
de 20 mil dólares em favor de Maria da Penha, e foi responsabilizado por negligencia e
omissão em relação à violência doméstica, recomendando a adoção de várias medidas,
entre elas a simplificação dos procedimentos judiciais penais a fim de que possa ser
reduzido o tempo do processo. (2008, p.14)
Com a pressão que o governo brasileiro sofreu perante órgãos internacionais
passou a cumprir os tratados e convenções dos quais faz parte.
13
O projeto inicial da lei Maria da Penha começou em 2002, e foi elaborado com
a participação de 15 ONGs que trabalhavam com a violência doméstica. O Grupo de
Trabalho Interministerial que elaborou o projeto foi criado pelo Decreto 5.030/2004, e
tinha a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres como coordenadora.
A Deputada Jandira Feghali, relatora do projeto da Lei contra a violência
doméstica realizou audiências públicas em vários Estados, foram feitas alterações e o
Senado Federal substituiu o projeto original (PLC 37/2006), após a Lei nº 11.340 foi
sancionada pelo Presidente da República em 07 de agosto de 2006, e está em vigor
desde 22 de setembro de 2006.
Assim, com esta Lei, o Brasil passou a cumprir com as Convenções as quais é
signatário, atendeu à recomendação da Comissão Interamericana de Direitos Humanos
da Organização dos Estados Americanos e também à Convenção sobre a eliminação de
todas as formas de discriminação contra a mulher e a Convenção Interamericana para
Prevenir, Punir e Erradicar a violência contra a Mulher.
Esta Lei trouxe um avanço nos procedimentos de acesso à Justiça, deu
transparência ao fenômeno da violência doméstica e provocou acalorados debates
sobre o tema perante a sociedade e no meio jurídico. (2009, p.2)
Os avanços da nova lei são muito significativos. Uma das grandes novidades
foi a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher –
JVDFMs, com competência cível e criminal, outro ponto importante é que foi
devolvida à autoridade policial a prerrogativa investigatória, cabendo-lhe instalar o
inquérito. A Lei proíbe a aplicação de pena pecuniária, multa ou a entrega de cesta
básica e permite a prisão preventiva do ofensor, também permite que o juiz determine
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o comparecimento obrigatório do agressor a programas de recuperação e reeducação.
Além de que o juiz deve adotar medidas que façam cessar a violência, como
determinar o afastamento do agressor do lar e impedi-lo que se aproxime da vitima.
(2008, p.25)
4 COMO ERA TRATADA A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA ANTES DA LEI Nº
11.340/06
Adriana Ramos de Mello comenta que é de muitos anos atrás o histórico de
violência doméstica, já que na sociedade antiga a mulher era um ser que não podia se
expressar e nem podia ter vontade própria, deveria apenas aceitar as ordens dadas por
seu pai e posteriormente de seu marido. (2009, p.3)
Conforme a legislação da época, o homem tinha o direito de castigar a esposa,
um exemplo disso é o que ocorreu na América colonial, em que a lei autorizava
expressamente castigos físicos como forma de disciplina, desencadeando a violência
dentro de seus lares.
Segundo Bárbara Soares (1999, citada por MELLO, 2009, p. 4), durante o
século XIX os Estados Unidos extinguiu o direito dos homens de disciplinar sua
mulher através da violência física, visando a diminuição da intensidade e freqüência
das agressões sofridas pelas mulheres, porém não havia punição para quem
continuasse a praticá-la.
Após o ano de 1970, o movimento feminista tonou-se muito questionável em
relação a violência contra a mulher trazendo ao público muitos debates, pois até os
dias de hoje esse tema é considerado um problema de grandes proporções.
15
No Brasil, após a criação das Delegacias Especializadas no Atendimento à
Mulher, e com a entrada em vigor da Lei dos Juizados Especiais Criminais nº
9.099/95, a violência doméstica passou a ter maior foco
No entanto, só recebeu devida atenção com a entrada em vigor da Lei nº
11.340/06, embora que a Constituição Federal de 1988 se manifestasse a violência
doméstica e familiar contra a mulher.
4.1 A APLICAÇÃO DA LEI Nº 9.099/95 NO COMBATE A VIOLÊNCIA
DOMÉSTICA
As soluções para os casos de violência doméstica antes da Lei nº 11.340/06
entrar em vigor eram na maioria das vezes realizadas nos Juizados Especiais
Criminais, fato que gerava opiniões contraditórias entre os operadores do direito e até
mesmo do movimento feminista. Uma parte acreditava que a nova lei traria maior
visibilidade para os casos de violência doméstica, já que antes a maioria dos casos não
chegavam ao judiciário. A outra parte acreditava que os Juizados viam a violência
doméstica com indiferença, e contribuíam para a impunidade decorrente da
condenação alternativa de cestas básicas. (2009, p.2)
A Lei dos Juizados Especiais nº 9.099/95 foi criada para dar efetividade e
revolucionar ao sistema processual penal brasileiro. Os crimes considerados de
pequeno potencial ofensivo tiveram seus julgamentos agilizados, pois houve a criação
de medidas despenalizadoras, a adoção do rito sumaríssimo, e a possibilidade da pena
ser aplicada antes de ser oferecida acusação e sem discutir a culpabilidade. Assim, a
Justiça tornou-se mais ágil e conseguiu conquistar a credibilidade do Poder Judiciário.
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Porém, com a tentativa de acabar com a impunidade, o legislador deixou de dar
prioridade a pessoa humana, preservar sua vida e sua integridade física. (2008, p.21)
O Estado omitiu-se no seu papel de punir, já que a representação ficou
condicionada às lesões corporais leves e as lesões culposas, ou seja, caberia a vitima a
iniciativa de buscar a pena para o seu agressor.
O legislador acabou esquecendo que não é possível condicionar a ação penal à
iniciativa da vitima quando há desequilíbrio entre o agressor e o agredido, sendo
assim, não há como exigir que o desprotegido formalize queixa contra o seu agressor.
É fato que, apesar da igualdade prevista na Constituição Federal, a discriminação à
mulher é evidente, ela é sempre colocada em posição de inferioridade e subordinação
frente ao homem. Desta maneira, o legislador deixou de dar um tratamento
diferenciado às mulheres vitimas de violência dentro do âmbito familiar.
Pensando assim é que foram criadas as Delegacias da Mulher a partir do ano
de 1985, o atendimento especializado, feito quase sempre por mulheres, estimulava as
vitimas a denunciarem os maus tratos sofridos, e, o fato de os agressores serem
chamados perante a autoridade policial fazia com que os mesmos ficassem
intimidados. A instauração do inquérito policial e a posterior ação penal
desempenhavam papel pedagógico, já que em muitos casos as mulheres não
pretendiam a separação do companheiro, nem mesmo o seu afastamento do lar,
queriam apenas que as agressões fossem cessadas. Mas com a Lei dos Juizados
Especiais as Delegacias da Mulher foram esvaziadas.
O Procedimento dos Juizados Especiais funcionavam de tal maneira que na
audiência preliminar, a conciliação era imposta ensejando simples composição de
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danos. Caso não fosse obtido acordo, a vítima poderia representar apenas na presença
do agressor, após, o Ministério Público podia transacionar a aplicação de multa ou
pena restritiva de direitos, o que geralmente resultava a doação de cestas básicas. Se a
proposta fosse aceita, o crime desaparecia, não ensejava reincidência, pois não
constava na certidão de antecedentes e nem tinha efeitos civis.
Como o procedimento adotado pela Lei dos Juizados Especiais era mínimo,
foi preciso inovações. Surgiu então a Lei nº 10.455 de 2002 que criou uma medida
cautelar, de natureza penal, que admitia a possibilidade de o juiz decretar o
afastamento do lar conjugal, caso houvesse violência doméstica.
E em 2004, veio a Lei nº 10.886 de 2004, que acrescentou um subtipo a lesão
corporal leve, decorrente de violência doméstica, aumentando a pena mínima de três
para seis meses de detenção.
As alterações legislativas foram praticamente nulas, nenhuma das mudanças
fizeram com que a violência doméstica fosse amenizada, muito pelo contrário, a
violência
doméstica
continuou
aumentando
em
decorrência
dos
institutos
despenalizadores da Lei nº 9.99/95. Já que como a violência familiar era tratada como
um crime de menor potencial ofensivo, não era possível o flagrante se o autor se
comprometesse a comparecer no Juizado Especial Criminal, e, além disso, era possível
a transação pena, a concessão de sursis, a aplicação das penas restritivas de direito, e,
se a lesão fosse leve, a ação dependia de representação. (2008, p.23)
5 A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
A Lei nº 11.340/06 surgiu para impedir a continuação da violência doméstica e
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familiar contra a mulher, desta maneira é necessário identificar o âmbito de
abrangência desta Lei, ou seja, saber o que realmente é a violência doméstica.
A respeito disso, o doutrinador Sérgio Ricardo de Souza define:
“O termo “violência doméstica” se apresenta com o mesmo significado de
“violência familiar” ou ainda de “violência intrafamiliar”, circunscrevendo-se aos
atos de maltrato desenvolvidos no âmbito domiciliar, residencial ou em relação a um
lugar onde habite um grupo familiar, enfatizando prioritariamente, portanto, o
aspecto espacial no qual se desenvolve a violência, não deixando expressa uma
referencia subjetiva, ou seja, é um conceito que não se ocupa do sujeito submetido à
violência, entrando no seu âmbito não só a mulher, mas também qualquer outra
pessoa integrante do núcleo familiar (principalmente mulheres, crianças, idosos,
deficientes físicos ou deficientes mentais) que venha a sofrer agressões físicas ou
psíquicas praticadas por outro membro do mesmo grupo. Trata-se de acepção que
não prioriza o fenômeno da discriminação a que a mulher é submetida, dispensando
a ela tratamento igualitário e relação aos demais membros do grupo familiar
privado.”(2009, p.29)
Este mesmo autor argumenta que:
Na “violência contra as mulheres” é que tem-se a garantia da proteção da mulher,
enquanto ser humano mais suscetível de sofrer com o fenômeno da violência, aqui é
expressada não só no âmbito das relações do grupo familiar que integra, bem como
nos demais âmbitos sociais, conforme texto fixado no texto da Convenção de Belém
do Pará (art.1º), alcance este que não foi adotada pela Lei nº 11.340/06.” (2009,
p.29)
Da mesma forma, Guilherme de Souza Nucci considera que:
“O conceito legal de violência doméstica e familiar é a ação (fazer algo) ou omissão
(não fazer alguma coisa) baseada no gênero (este termo, utilizado no art. 5º, caput,
desta Lei é ininteligível para o contexto e totalmente inapropriado) que lhe cause
morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial.
O conceito é lamentável, pois mal redigida e norma extremamente aberta.”(2009,
p.1163)
Por outro lado Maria Berenice Dias acredita que:
“Para se chegar ao conceito de violência doméstica é necessária a conjugação dos
artigos 5º e 7º da Lei Maria da Penha. Deter-se somente no art. 5º é insuficiente, pois
são vagas as expressões: “qualquer ação ou omissão baseada no gênero”; “âmbito de
unidade doméstica”; âmbito da família” e “relação intima de afeto”. De outro lado,
apenas do art. 7º também não se retira o conceito legal de violência contra a mulher.
A solução é interpretar os artigos 5º e 7º conjuntamente e então extrair o conceito de
violência doméstica e familiar contra a mulher. Deste modo violência doméstica é
qualquer das ações elencadas no art. 7º (violência física, psicológica, sexual,
patrimonial ou moral) praticada contra a mulher em razão de vínculo de natureza
familiar ou efetiva.” (2008, p.40)
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Nesse sentido observa-se que a Lei define o significado da violência
doméstica em seu artigo 5º e posteriormente regula a sua abrangência, sendo que se
tem a violência doméstica quando a ação ou omissão é praticada dentro da unidade
doméstica, no âmbito familiar e até mesmo em qualquer tipo de relação intima de
afeto. (2008, p.40)
Assim Maria Berenice Dias também se manifesta:
“É obrigatório que a omissão ou a ação ocorra na unidade doméstica ou familiar ou
em razão de qualquer relação intima de afeito, na qual o agressor conviva ou tenha
convivido com a ofendida, independentemente de coabitação. Modo expresso,
ressalta a Lei que não há necessidade de vitima e agressor viverem sob o mesmo teto
para a configuração da violência doméstica ou familiar. Basta que agressor e
agredida mantenham, ou já tenham mantido, um vínculo de natureza
familiar.”(2008, p.40)
Apesar de a Lei se referir em âmbito “doméstico”, a agressão, desde que esteja
qualificada pela afetividade e intimidade, tanto presente quanto passada, é
caracterizada como violência doméstica ou familiar, e pode inclusive ocorrer fora do
lar ou domicilio das partes, ou seja, pode consubstanciar-se na rua, no cinema, em um
estádio, no teatro, na praia, no fórum, etc. Caso não haja vinculo intimo entre as partes,
serão aplicadas regras processuais gerais, incluindo as da Lei 9.099/95. (2009, p.48)
6 FORMAS DE VIOLÊNCIA
As formas de violência doméstica que caracterizam as agressões no âmbito da
Lei Maria da Penha estão explicitas em seu artigo 7º e incisos, e elas podem ser:
violência física, violência psicológica, violência sexual, violência patrimonial, além de
violência moral:
Art. 7o São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:
I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade
ou saúde corporal;
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II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano
emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno
desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos,
crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação,
isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem,
ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio
que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;
III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a
presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante
intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a
utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método
contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição,
mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o
exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;
IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure
retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de
trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos,
incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;
V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia,
difamação ou injúria.
Os estudiosos do Direito, Rogério Sanches Cunha e Ronaldo Batista Pinto
definem a esses tipos de violência, da forma que:
“Violência física é o uso da força, mediante socos, tapas, pontapés, empurrões,
arremesso de objetos, queimaduras etc., visando, desse modo, ofender a integridade
ou a saúde corporal da vitima, deixando ou não marcas aparentes, naquilo que se
denomina, tradicionalmente, vis coporalis. São condutas previstas, por exemplo, no
Código Penal, configurando os crimes de lesão corporal e homicídio e mesmo na Lei
das Contravenções Penais, como a vias de fato. (2008, p.61)
Por violência psicológica entende-se a agressão emocional (tão ou mais grave que a
física). O comportamento típico se dá quando o agente ameaça, rejeita, humilha ou
discrimina a vitima, demonstrando prazer quando vê o outro se sentir amedrontado,
inferiorizado e discriminado, configurando a vis compulsiva.Dependendo do caso
concreto, a conduta do agente pode, v.g. caracterizar o crime de ameaça. (2008,
p.61)
O inciso III, de forma ampla, entende por violência sexual qualquer conduta que
constranja a mulher a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não
desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso de força; que a induza a
comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de
usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimonio, à gravidez, ao
aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou
que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos. Agressões
como essas provocam nas vitimas, não raras vezes, culpa, vergonha e medo, o que as
faz decidir, quase sempre, por ocultar o evento. No Código Penal tais condutas
configuram os crimes de atentado violento ao puder e estupro, entre outros.” (2008,
p.61)
Já a violência patrimonial e a violência moral são tratadas por Maria Berenice
21
Dias, como:
“A Lei Maria da Penha reconhece como violência patrimonial o ato de “subtrair”
objetos da mulher, o que nada mais é do que furtar. Assim, se subtrair para si coisa
alheia móvel configura o delito de furto, quando a vitima é mulher com quem o
agente mantém relação de ordem afetiva, não se pode mais reconhecer a
possibilidade de isenção de pena. O mesmo se diga com relação à apropriação
indébita e ao delito de dano. É violência patrimonial “apropriar” e “destruir”, os
mesmos verbos utilizados pela lei penal para configurar tais crimes. Perpetrados
contra a mulher, dentro de um contexto de ordem familiar, o crime não desaparece e
nem fica sujeito a representação. Além de tais condutas constituírem crimes, se
praticados contra a mulher com quem o agente mantém vincula familiar ou afetivo,
ocorre agravamento da pena (CP, art. 61, II).(2008, p.51)
A violência moral encontra proteção penal nos delitos contra a honra: calúnia
difamação e injuria. São denominados delitos que protegem a honra mas, cometidos
em decorrência de vinculo de natureza familiar ou afetiva, configuram violencia
moral. Na calunia, o fato atribuído pelo ofensor a vitima é definido como crime; na
injuria não há atribuição de fato determinado. A calúnia e a difamação atingem a
honra objetiva; a injúria atinge a honra subjetiva. A calúnia e a difamação
consumam-se quando terceiros tomam conhecimento da imputação; a injúria
consuma-se quando o próprio ofendido toma conhecimento da imputação. Estes
delitos, quando são perpetrados contra a mulher no âmbito da relação familiar ou
afetiva, devem ser reconhecidos como violência doméstica, impondo-se o
agravamento da pena (CP, art. 61, II, f). De um modo geral são concomitantes à
violência psicológica.” (2008, p.54)
7 SUJEITOS
7.1 SUJEITO PASSIVO
Deixa claro a Lei nº 11.340/06, no decorrer de seus artigos e principalmente no
preâmbulo, que o sujeito passivo é somente a mulher vitima da agressão advinda da
violência doméstica, e é o critério hormonal que identifica a mulher.
Como se pode observar, Adriana Ramos de Mello, afirma que:
“Esta norma visa proteger os Direitos Humanos da Mulher previstos em várias
Convenções Internacionais, em especial a Convenção de Belém do Pará (1994). A
mulher a que se destina esta Lei é aquela que venha a sofrer violência no âmbito
familiar ou doméstico, bem como a que nunca tenha convivido com o autor da
agressão, mas que tenha mantido relação intima com o agressor (a), desde que a
violência decorra de algumas dessas relações, não importando que ocorra no âmbito
doméstico ou mesmo fora dele.” (2009, p.42)
22
.
Como se verifica no artigo 5º da Lei nº 11.340/06, a violência doméstica é a que
ocorre dentro de um ambiente doméstico, e pode envolver pessoas com vinculo ou até
mesmo sem, envolve também pessoas que esporadicamente se agregam a unidade
doméstica, como no caso das empregadas domésticas.
O assessor parlamentar do Senado, Fabrício Mota Alves acompanhou essa
discussão no Parlamento:
“essa definição abrange, inclusive, os empregados domésticos, ou seja, os
‘esporadicamente agregados’ – assunto, aliás, muito debatido no Congresso
Nacional. O termo ‘esporadicamente’ aqui dá uma noção de relacionamento
provisório, típica da relação de emprego doméstico”. (citado por CUNHA,PINTO,
2008 p.49)
Assim também entendem os doutrinadores Damásio de Jesus e Hermelino de
Oliveira sobre a possível aplicabilidade da Lei Maria da Penha no caso de empregadas
domésticas que sofreram de violência doméstica frente a seu patrão:
“Não se pode afirmar que essas normas foram expressas visando a proteção da
empregada doméstica. De ver-se, entretanto, que não se pode dizer que a excluíram
de sua incidência, até porque o mandamento constitucional proíbe a violência no
âmbito das relações familiares. A questão é saber se a empregada doméstica inserese nesse contexto, uma vez que a nova lei ordinária delimita o campo da sua
incidência como sendo ‘o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem
vinculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas’ (...) Para que se possa
opinar sobre a questão proposta, é também necessário relembrar o conceito legal de
empregado doméstico como sendo ‘aquele que presta serviços de natureza contínua
e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família no âmbito residencial destas
(art.1º da Lei 5.859/72). Essa prestação de serviços no seio das famílias e no
ambiente residencial é que justifica o tratamento legal dado à relação de trabalho
doméstico e sua forma de proteção (...). A propósito, os escritores nunca
desprezaram os empregados domésticos. No passado, encontramos a figura do
mordomo fiel, que muito se prestou a tantas peças literárias, sendo amiúde, a chave
do deslinde de histórias policiais misteriosas. Hoje, diante das transformações da
família e da vida moderna, a figura da empregada da casa passou a ser objeto de
peças teatrais, algumas de muito sucesso, aparecendo como protagonista principal
do enredo, tal o seu envolvimento com a vida das pessoas da residência. De se
concluir, pois, que ela merece a proteção da Lei 11.340/2006.” (citado por
CUNHA,PINTO, 2008 p.49)
Pessoas jurídicas não se enquadram na Lei Maria da Penha como sujeito
23
passivo, por conta do âmbito de incidência desta Lei, relembrando, já que nela
compreendem apenas as agressões cometidas em uma unidade doméstica, em relações
familiares ou até mesmo intima de afeto. (2008, pg.85)
7.2 SUJEITO ATIVO
Importante observar que, por mais que a Lei expresse que a violência
doméstica é a que ocorre no âmbito familiar, e tem como característica a convivência
afetiva e intima tanto presente, quanto as relações que já se passaram, não sendo
necessário que haja coabitação, pode vincular no pólo ativo, qualquer pessoa,
conforme enfatiza Luiz Antonio de Souza e Vitor Frederico Kümpel:
“Embora a Lei 11.340/2006, em seus dispositivos, mencione o sujeito ativo com a
palavra ‘agressor’ (vide, por exemplo, o artigo 5º, inciso III), note-se que a lei se
refere ao sujeito passivo como ‘ofendida’, o que impõe interpretação no sentido de
que esta é tão-somente a mulher e que o ‘ofensor –agressor’ pode ser tanto o homem
como a mulher, ou seja, a palavra ‘agressor’ está colocada como gênero, abarcando
tanto o sexo masculino como o feminino. Essa interpretação deve ser utilizada em
todos os ramos de incidência da norma, inclusive no âmbito penal, pois muitas vezes
o Direito Penal e o Direito Processual Penal utilizam a palavra ‘ofendido’ como
gênero, abrangendo tanto o sujeito passivo masculino como o feminino. Para efeito
extrapenal, porém, sujeito ativo, além das pessoas físicas, compreende a pessoa
jurídica e todo aquele que praticar conduta que caracterize violência contra a
mulher, cumprindo os elementos formais e espaciais acima referidos, inclusive entes
despersonalizados (condomínio, massa falida, espólio)”. (2008, pg.83)
Assim, entende-se que a lei 11.340/06 levou em consideração a realidade
social e também a evolução da mesma, assim o legislador não deixou de levar em
conta as relações intimas existentes hoje, como no caso de lésbicas, travestis,
transexuais e até mesmo heterossexuais com suas relações parentais cada vez mais
diversificadas, como os parentes de diferentes graus que convivem juntos, e também as
pessoas que se agregam por questões econômicas, de trabalho e de amizade, além de
outras. (2009, p.47)
24
Nesse sentido, Sérgio Ricardo de Souza esclarece:
“As agressões praticadas por uma companheira de uma relação homoafetiva se
enquadra na norma, dentro do conceito de ‘qualquer relação intima de afeto, na qual
o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de
coabitação’, não deixando duvidas a este respeito o parágrafo único deste artigo ao
estabelecer ‘as relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação
sexual’.” (2009, p.48)
7.3 MINISTÉRIO PÚBLICO
O Ministério Público é indispensável nos casos de violência doméstica e
familiar contra a mulher, conforme menciona a lei nº 11.340/06 em seu artigo 25:
“Art. 25. O Ministério Público intervirá, quando não for parte, nas causas cíveis e
criminais decorrentes da violência doméstica e familiar contra a mulher.”
Nota-se que o dispositivo citado apresenta caráter de indisponibilidade, por ser
o Ministério Público obrigado a intervir, pois nesses casos há necessidade de
verdadeira proteção de ordem pública e interesse social, já que o Ministério Público é
órgão responsável pela garantia de ordem jurídica, do regime democrático, da
moralidade pública e dos direitos sociais e individuais. (2008, p.85)
Como nos orienta o doutor, Sérgio Ricardo de Souza :
“No que diz respeito aos crimes cuja competência consta desta Lei, o Ministério
Público agirá na sua principal função, que é de proteção da ordem jurídica quando
afetada na esfera criminal (CRFB, art. 129, I), agindo como parte, ao passo que, em
relação aos demais atos que reclamam a sua intervenção, estará agindo no resguardo
dos interesses sociais e individuais indisponíveis, principalmente da dignidade da
vitima de violência (CRFB, art. 1º, III e art.129, IX), na maioria das vezes, como
fiscal da lei (custos legis).” (2009, p. 146)
Quando se trata da Lei Maria da Penha, o Ministério Público ficou responsável
por três esferas: institucional, administrativa e também funcional. Assim enfatiza
Maria Berenice Dias, na esfera institucional estão ligadas as demais entidades que se
25
envolvem no decorrer da aplicação da Lei, trabalhando juntos órgãos públicos e
privados visando a proteção da mulher. No âmbito administrativo, destaca-se o poder
de policia, tendo o Ministério Público que fiscalizar os estabelecimentos públicos ou
particulares que estão em atendimento à mulher vitima da violência doméstica, e
também o cadastro dos casos ocorridos, a partir do recebimento do inquérito policial.
O Ministério Público também é responsável por requisitar o atendimento das vitimas
por esses serviços públicos a elas destinados. (2008, p.74)
Também afirma que, a presença do Ministério Público é necessária ainda que
a vítima seja maior e capaz, e mesmo que esteja acompanhada de advogado, pois se
encontra vulnerável por ter sofrido alguma forma de violência doméstica.
A mesma doutrinadora ainda a respeito considera, que:
“O Ministério Público dispõe de legitimidade para agir como parte na conciliação de
substituto processual e como fiscal da lei. Deve ser intimado das medidas protetivas
aplicadas, podendo requerer outras providencias ou a substituição por medidas
diversas. Essa possibilidade em nada se incompatibiliza com a previsão de que é de
iniciativa da vitima o pedido de adoção das medidas protetivas. Depois de buscada a
tutela de urgência, para garantir seu adimplemento é que cabe a ação vigilante do
agente ministerial. Quando a vitima manifestar interesse em desistir da
representação, o promotor precisa estar presente na audiência. Pode requerer a
prisão preventiva do agressor ou sua prisão temporária. Também pode pedir quebra
do sigilo bancário, sigilo telefônico bem como a interceptação telefônica, tanto na
fase de investigação criminal como durante a instrução processual penal. Igualmente
lhe cabe exercer a defesa dos interesses e direitos transidividuais.” (2008, p.75)
8 MEDIDAS PROTETIVAS
Dar efetividade à proteção da mulher vitima da violência doméstica e familiar
é uma das principais razões que inspira a Lei Maria da Penha. Embora, já se conhece
que esta Lei interfere não só no âmbito penal, mas também nas esferas civil,
administrativa e relações internacionais, porém sabe-se que o foco principal da Lei é a
repressão penal. (2007, p. 84)
26
Sendo assim, a Lei trouxe mecanismos para combater a impunidade do
agressor, e proteger de maneira mais eficiente a vitima, são as Medidas Protetivas de
Urgência, tratadas no Capítulo II da Lei nº 11.340/06 e podem ser concedidas de
ofício, com pedido do Ministério Público ou a requerimento da vitima, com ou sem
advogado.
Desta maneira, o legislador optou por distinguir as medidas protetivas em:
medidas que obrigam o agressor, limitando em vários aspectos a sua liberdade; e
medidas protetivas de urgência à ofendida, que autorizam algumas condutas a
ofendida, ou restitui a ela direitos que foram retirados pelo agressor.
Possuem legitimidade para pedir as medidas protetivas, o Ministério Público, ou
até mesmo a ofendida, esta que normalmente deverá vir elaborado pela polícia
judiciária. (2007, p.87)
Caso uma medida protetiva que obrigue o agressor seja imposta, isso não
impede que outras medidas sejam aplicadas, desde que a segurança da vitima esteja
ameaçada ou as circunstancias exigirem. (2008, p. 82)
As medidas protetivas de urgência não precisam de requisitos como a presença
do fumus boni juris e do periculum in mora. (2007, p.88)
8.1 DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA QUE OBRIGAM O
AGRESSOR
As medidas protetivas de urgência que obrigam o agressor estão elencadas no
artigo 22 da Lei nº 11.340/2006 – Maria da Penha:
“Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher,
nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou
27
separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras:
I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão
competente, nos termos da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003;
II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;
III - proibição de determinadas condutas, entre as quais:
a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite
mínimo de distância entre estes e o agressor;
b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de
comunicação;
c) freqüentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e
psicológica da ofendida;
IV - restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de
atendimento multidisciplinar ou serviço similar;
V - prestação de alimentos provisionais ou provisórios.
§ 1o As medidas referidas neste artigo não impedem a aplicação de outras previstas
na legislação em vigor, sempre que a segurança da ofendida ou as circunstâncias o
exigirem, devendo a providência ser comunicada ao Ministério Público.
§ 2o Na hipótese de aplicação do inciso I, encontrando-se o agressor nas condições
mencionadas no caput e incisos do art. 6º da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de
2003, o juiz comunicará ao respectivo órgão, corporação ou instituição as medidas
protetivas de urgência concedidas e determinará a restrição do porte de armas,
ficando o superior imediato do agressor responsável pelo cumprimento da
determinação judicial, sob pena de incorrer nos crimes de prevaricação ou de
desobediência, conforme o caso.
§ 3º Para garantir a efetividade das medidas protetivas de urgência, poderá o juiz
requisitar, a qualquer momento, auxílio da força policial.
§ 4º Aplica-se às hipóteses previstas neste artigo, no que couber, o disposto no caput
e nos §§ 5º e 6º do art. 461 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de
Processo Civil).”
Desse modo, verifica-se que são as medidas protetivas voltadas a quem pratica
a violência doméstica, ficando sujeitas as obrigações e restrições.
8.1.1 Suspensão da posse ou restrição ao porte de armas
O legislador demonstra preocupação em desarmar quem faz uso de arma de
fogo para a prática da violência doméstica, sendo admitido que Juiz suspenda a posse
ou restrinja o porte de arma. Usar ou possuir arma é proibido, conforme consta no
Estatuto do Desarmamento, e para ter a posse é necessário registro na Polícia Federal.
Caso o agressor possua posse devidamente registrada na Polícia Federal, o
desarmamento só pode ocorrer caso haja pedido de medida protetiva feita pela vítima,
porém caso o uso ou a posse não sejam legais e haja violação dos dispositivos legais, é
28
a autoridade policial a responsável pelas providencias a serem tomadas. (2008, p.82)
Como descreve a desembargadora Maria Berenice Dias:
“Sendo legal a posse e o uso da arma de fogo pelo agressor, denunciando a vitima à
autoridade policial a violência e justificando a necessidade de desarmá-lo, por temer
pela própria vida, será instalado expediente a ser remetido ao juízo. Deferido o
pedido e excluído o direito do ofensor manter a posse da arma, ou sendo limitado o
seu uso, deve-se comunicar a quem procedeu ao registro e concedeu a licença: o
Sistema Nacional de Armas (SINARM) e a Polícia Federal. Caso o agressor tenha
direito ao uso de arma de fogo, segundo o rol legal, o juiz comunicará ao respectivo
órgão, corporação ou instituição que impôs. O superior imediato do agressor fica
responsável pelo cumprimento da determinação judicial sob pena de incorrer nos
crimes de prevaricação ou desobediência. A restrição é valida para evitar tragédia
maior. Se o marido agride a esposa, de modo a causar lesão corporal, se possuir
arma de fogo, é possível que, no futuro progrida para o homicídio.” (2008, p.82)
8.1.2 Afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida
Já a medida protetiva encontrada no inciso II do mesmo artigo expressa que o
agressor pode ser afastado do lugar onde mantém a convivência com a ofendida, não
importando que seja uma casa, um apartamento, um sitio, um quarto de hotel, uma
barraca, etc., caso haja prática ou risco concreto de algum crime que possa vir a
acontecer, e não pode ser usado esse dispositivo apenas por capricho da ofendida.
2009, p.126)
Caso haja histórico de violência, uma das medidas mais eficazes para cessar a
violência doméstica é exatamente essa. Caso o sujeito passivo não acate esta medida,
vigorará o art. 359 do Código Penal, ou seja:
“Desobediência a decisão judicial sobre perda ou suspensão de direito
Art. 359 - Exercer função, atividade, direito, autoridade ou múnus, de que foi
suspenso ou privado por decisão judicial:
Pena - detenção, de três meses a dois anos, ou multa.”
E em casos em que o vínculo familiar já foi cessado, a medida será a do artigo
150 do Código Penal, ou seja, invasão de domicílio.
No mesmo sentido, Pedro Rui da Fontoura Porto esclarece:
29
“Tratando-se de crime de menor potencial ofensivo, conforme determina o art. 69,
parágrafo único, primeira parte, da Lei 9.099/95, não se imporá prisão em flagrante,
ao autor do fato que assumir o compromisso de comparecer em juízo. Todavia, tal
regramento não pode ser aplicado quando a desobediência recair sobre uma medida
de proteção à mulher, vitima da violência doméstica ou familiar contra a mulher.
Frise-se que esta desobediência a uma imposição judicial de medida protetiva,
sempre, de um modo ou outro, caracterizará uma das formas de violência contra a
mulher de que trata o art. 7º da Lei Maria da Penha.” (2009, p.95)
Assim, cabe a prisão em flagrante do agressor que tenha violado a lei e tenha
cometido uma desobediência de ordem judicial, sempre que a ação ou omissão se
depare com um dos elementos contidos nas medidas protetivas contidas na Lei nº
11.340/06. (2009, p.95)
8.1.3 Vedação de condutas
Através das Medidas Protetivas de Urgência da Lei, é possível que haja
proibição do sujeito ativo, para a prática de certas condutas, levando em consideração
que essa medida possa prevenir crimes e consequentemente proteger as reais vítimas
da violência. Porém, como menciona o mesmo autor:
“Há dificuldades estruturais do Estado em implementá-las. E, nesse ponto, é bom ter
presente que impor medidas que não poderão ser fiscalizadas ou implementadas com
um mínimo de eficácia é sempre um contributo para o desprestigio da Justiça. De
nada adianta o juiz justificar-se intimamente com escusas do tipo: ‘isso é problema
da policia, do poder executivo, etc.’, pois, na visão social, todos os órgãos – polícia,
Poder Judiciário, advogados, Ministério Publico – estão entre as imbricados e
compreendem o grande sistema de justiça, de modo que as falhas em quaisquer
dessas engrenagens depõem contra o todo sistêmico.” (2009, p.95)
Apesar de essas medidas protetivas serem de difícil fiscalização, elas devem e
podem ser deferidas, porém a imposição das mesmas deve ser bem refletida, afirma
Pedro Rui da Fontoura Porto:
“Por exemplo, a fixação de distancia entre agressor e agredida é uma dessas medidas
de escassa praticidade e difícil fiscalização. Já se viu pedidos em que, a deferir-se a
distancia de afastamento pleiteada pela ofendida, o suposto agressor teria que se
mudar para o meio rural, pois o perímetro urbano da pequena cidade onde ambos
moravam, não lhe permitiria continuar habitando a sede do município. Esta medida
parece todavia ter sentido naquelas hipóteses em que o agressor, obstinado em
acercar-se da vitima, segue-a teimosamente por todos os lugares, especialmente,
30
para o trabalho, causando apreensão e risco. Mas nesse caso em que o agressor
insiste em aproximar-se ou mesmo adentrar o local de trabalho da vitima, é possível
aplicar-lhe a proibição de frequência nesse local, conforme letra ‘c’.” (2009, p.95)
Quando há pratica de ameaças, ofensas e perturbação do sossego é cabível que
haja entre agressor e vitima, incluindo seus familiares e testemunhas, proibição de
comunicação, seja por qualquer meio, porém com o avanço da tecnologia, e com o
grande numero de aparelhos telefônicos, a vida social tornou-se por um lado mais
pratica e por outro mais conturbada, pois é notável a existência e o aumento de
criminalidade via telefone, pois há possibilidades de golpes, extorsões, determinações
dadas de dentro dos presídios, e até mesmo ameaças, crimes contra a honra e
perturbação do sossego, essas muito comuns no âmbito de violência doméstica.
E assim consequentemente surge mais um obstáculo para a aplicação da lei:
como se obter a prova das conversas telefônicas, Pedro Rui da Fontoura Porto
determina que:
“Com efeito, na maioria das vezes a ocorrência ou não de crimes, bem como se foi
extrapolado o limite entre uma acalorada discussão recíproca e a pratica de ameaça
ou ofensas refletidas e sérias é um tema de árdua elucidação. Em primeiro lugar, em
razão de à maioria desses delitos – ameaça, crimes contra a honra, perturbação do
sossego – ser aplicada penas de detenção ou prisão simples, já não se admite a
intercepção das comunicações telefônicas ou telemáticas (art. 2º, III, da Lei
9.296/96). Tem-se, contudo, possam ser requisitados os dados cadastrais dos
titulares de telefones utilizados para a pratica de tais infrações, quando a vitima,
através de recurso disponível em seu aparelho receptor, tiver identificado a origem
das chamadas. Assim, será possível conhecer o autor da ligação, embora não se
tenha acesso ao seu conteúdo. Porém, quanto a este, é possível que a vitima grave a
conversa por conta própria, utilizando a gravação como prova do delito contra si
praticado – ameaça, constrangimento ilegal, ofensas – pois tal proceder não constitui
interceptação telefônica de uma conversa entre terceiros, mas simples, meio de
prova de uma dada comunicação efetuada por um dos interlocutores.” (2009, p. 96)
Importante destacar que além do contato com a vítima poder constituir direito
de ameaça, constrangimento ilegal, crime contra a honra, ou perturbação do sossego,
também pode constituir crime de extorsão, existindo a possibilidade de se averiguar
por interceptação telefônica, além do delito de coação, quando o sujeito ativo, entra em
31
contato com vitima, seus familiares ou até mesmo testemunhas, constrangendo-as
mediante ameaças para que mudem seus depoimentos ou renunciem a representação.
8.1.4 Restrição ou suspensão de visitas
Quanto à medida da restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores,
deve ser aplicada quando a violência estiver direcionada a eles, principalmente quando
são vitimas de violência sexual, tentativa de homicídio, tortura, além de maus-tratos.
Se apenas um dos dependentes for vitima da violência doméstica, as medidas podem
ser estendidas aos outros, pois também estão sujeitos ao risco.
Caso haja apenas violência contra a mãe, entende-se que não há razões para
que as visitas sejam suspensas, portanto podem ser restringidas quanto ao local e
horário das visitas, além de ser proibida visitação, quando o agressor encontra-se em
estado de alcoolismo ou após o uso de substancias entorpecente, além de frequentar
determinados lugares não recomendados.
Se a mulher e seus filhos forem removidos para um abrigo ou até mesmo para
a casa de seus familiares, essa restrição será mais rígida, pois este lugar deve ser
mantido em sigilo, e até mesmo não deve ser mencionado no processo, justamente
para que o sujeito ativo não tome conhecimento. Em relação às visitas aos
dependentes, não serão proibidas, porém para que isto ocorra deverá ter um local
previamente indicado pela autoridade. (2009, p.98)
8.1.5 Fixação de alimentos provisionais ou provisórios
Outra Medida Protetiva de Urgência inovadora é a prestação de alimentos
32
provisionais ou provisórios, a Lei Maria da Penha determina que os alimentos
provisionais ou provisórios podem ser fixados pelo Juiz criminal ou pelo Juizado de
Violência Doméstica e Familiar.
Quando os alimentos provisionais ou provisórios Pedro Rui da Fontoura Porto
esclarece que:
“O legislador usou as duas expressões para eliminar as discussões semânticas sobre
a suposta diferenciação entre alimentos provisionais ou provisórios, visto que ambas
significam, em linhas gerais, a fixação de alimentos antes de uma decisão faz coisa
julgada, de modo que, demonstrada alteração no célere binômio necessidadepossibilidade pode o quantum ser revisto a qualquer momento.
[...]
Como regra, entende-se que alimentos provisórios são aqueles fixados
imediatamente pelo juiz, a titulo precário, ao receber a inicial, na ação de alimentos
do rito especial disciplinada pela Lei 5.478/68, ao passo que, provisionais, são
aqueles reclamados pela mulher ao propor, ou antes de propor, a ação de separação
judicial ou de nulidade de casamento, ou de divórcio direto, para fazer face ao seu
sustento durante a demanda. Chamam-se também provisionais os alimentos fixados
na sentença de primeira instancia, na ação de investigação de paternidade, de acordo
com o artigo 5º da Lei nº 883/49.” (2007, p.98)
A fixação dos alimentos torna-se imprescindível, pois a vida não pode esperar,
desta maneira, nota-se que a dependência econômica é o ponto que determina a
submissão da própria mulher e de seus filhos, ao patriarca agressivo. Portanto caso a
mulher tenha condições próprias de sobrevivência essa medida não se torna necessária
a ela, porém é fundamental para os filhos, por se tratar de um direito indisponível.
Essa medida cautelar se baseia na necessidade dos requerentes e também na
possibilidade que o requerido possui, desta maneira o Juiz deverá colher informações a
respeito de ambos, e também dos filhos, buscando obter as respostas sobre as
necessidades básicas da mulher e dos dependentes, ou seja, deve buscar informações
como, de saber se os requerentes estão em casa ou em abrigo. O Juiz também pode se
informar a respeito do requerido através de requisição a seu estabelecimento de
trabalho, sua declaração de renda, informações da previdência social.
33
Desta maneira o mesmo autor ainda afirma:
“Conforme já assinalado ao introduzir o tema das medidas cautelares, o deferimento
dos alimentos provisionais pressupõe o ingresso, por parte da ofendida, por si ou em
representação de seus dependentes, da competente ação principal no prazo de trinta
dias, na Vara de Família ou cível, visto que não compete ao Juiz Criminal e nem
mesmo ao Juizado de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher examinar
ação de alimentos que, notoriamente, não tem a violência doméstica por causa de
pedir. No seio da ação principal, ou até mesmo em seu exame liminar, poderá o juiz
cível ou de família, à vista de melhores elementos, rever os alimentos provisionais
fixados pelo juiz criminal, corrigindo eventual excesso ou insuficiência.” (2007, p
100)
Existe a possibilidade dos alimentos gravídicos, que não aqueles destinados a
cobrir despesas adicionais durante o período de gravidez, desde a concepção até o
parto. Esses alimentos cobrem despesas referentes à alimentação especial da mãe,
assistência médica e psicologia, exames, internações, parto, medicamentos, etc.
As despesas devem ser custeadas pelo futuro pai sendo ele o agressor, e após o
nascimento da criança, os alimentos gravídicos são convertidos em pensão alimentar,
sendo que a prova da paternidade pode ser baseada em indícios. (2009, p.132)
8.2 DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA À OFENDIDA
As medidas protetivas de urgência ligadas à ofendida estão elencadas nos
artigo 23 e 24 da Lei nº 11.340/2006 – Maria da Penha:
“Art. 23. Poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas:
I - encaminhar a ofendida e seus dependentes a programa oficial ou comunitário de
proteção ou de atendimento;
II - determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao respectivo
domicílio, após afastamento do agressor;
III - determinar o afastamento da ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos relativos
a bens, guarda dos filhos e alimentos;
IV - determinar a separação de corpos.
Art. 24. Para a proteção patrimonial dos bens da sociedade conjugal ou daqueles de
propriedade particular da mulher, o juiz poderá determinar, liminarmente, as
seguintes medidas, entre outras:
I - restituição de bens indevidamente subtraídos pelo agressor à ofendida;
II - proibição temporária para a celebração de atos e contratos de compra, venda e
locação de propriedade em comum, salvo expressa autorização judicial;
III - suspensão das procurações conferidas pela ofendida ao agressor;
IV - prestação de caução provisória, mediante depósito judicial, por perdas e danos
34
materiais decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a ofendida.
Parágrafo único. Deverá o juiz oficiar ao cartório competente para os fins previstos
nos incisos II e III deste artigo.”
Desse modo, o legislador estabeleceu que o artigo 23 está ligado a proteção à
vitima, e o artigo 24 trata do patrimônio do casal bem como dos outros bens
particulares da ofendida.
8.2.1 Encaminhamento a Programas de Proteção e Atendimento
Para a efetividade dessa medida protetiva, é necessário que haja esses
Programas de Proteção e Atendimento e esteja funcionando corretamente, estes
Programas não precisam ser específicos para as vitimas de violência doméstica, e
podem ser criados não somente através de ações de grupos de apoio à mulher ou
organizações não governamentais, mas pode, porém, ser criado pelo Estado.
Nos Programas de Proteção e Atendimento deve haver uma estrutura para
atendimento multidisciplinar, além de possuir devida segurança, já que as vitimas
encontram-se em situação de risco. (2009, p. 137)
Nesse sentido, um exemplo é dado por Pedro Rui da Fontoura Porto:
“A Secretaria Municipal de Assistência Social pode ter programas de auxílio
habitacional ou alimentar para pessoas necessitadas. A Secretaria de Saúde pode
atender a vitima ou seus dependentes se necessitarem algum tratamento médico ou
mesmo acompanhamento psicossocial através dos Centros de Atendimento
Psicossocial (CAPS).” (2007, p.100)
8.2.2 Recondução ao Domicílio
A recondução da vitima e de seus dependentes ao domicílio é uma
consequência do inciso II do artigo 22 da mesma Lei, assim pressupõe que houve o
afastamento do lar decorrente do medo, em relação à violência sofrida ou que a vitima
poderia vir a sofrer. A recondução é possível principalmente quando não há o
35
recolhimento da vitima em Programa Oficial ou Comunitário de Proteção.
Há casos, em que é necessário por conta do risco, transportar a vitima e seus
dependentes do domicilio para um local seguro, este transporte deve ser providencia
tomada de oficio pela polícia, e depois, requerer judicialmente a pedido da própria
vitima ou do Ministério Público, o afastamento do agressor. Caso seja deferido o
pedido, a vítima poderá retornar.
8.2.3 Afastamento do Lar
Ao contrário do que expressa o inciso III do artigo 23, o legislador teve o intuito
de sustentar a idéia que, a vitima pode ser afastada do lar, pelo juiz, sem prejuízo de
seus direitos relativos aos bens, guarda dos filhos e até mesmo alimentos.
Pedro Rui da Fontoura Porto sustenta:
“Onde se lê, ‘determinar’ deve-se entender ‘autorizar’, isto porque o juiz não
pode obrigar a vitima a afastar-se do lar; só o agressor pode ser compelido a tanto,
caso contrário, estar-se-ia vitimizando-a duplamente. ‘Autorizar’ significa aqui
legitimar o famigerado ‘abandono do lar’, tido, tradicionalmente, como atitude que
atentava contra os deveres matrimoniais. Na realidade, a mulher que abandona o lar,
especialmente levando consigo os filhos, tendo depois como provas que o fez por
razões de segurança, não pode por isso mesmo ser acusada de haver desentendido
obrigações inerentes ao matrimonio, porque o fez em situação de necessidade,
sendo-lhe inexigível conduta diversa, sequer a de que aguardasse uma autorização
judicial para sair de casa.” (2007, p.101)
8.2.4 Separação de Corpos
A separação de corpos poderá ser deferida, tanto nos casos em que agressor e
ofendida sejam casados, quanto na possibilidade de viveram em união estável. A
ofendida que pretenda tornar efetiva essa medida protetiva, deverá buscar autorização
judicial para se afastar do marido ou companheiro, durante o processo de separação,
dissolução de união estável e até mesmo anulação do casamento. Com a separação de
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corpos, os deveres de coabitação e convivência, ficam suspensos. (2007, p.101)
Mesmo após a separação de corpos a ação principal de separação judicial,
dissolução de união estável e até mesmo anulação do casamento deve ser proposta
com o prazo de 30 dias, contados a partir da efetivação da medida.
8.2.5 Medidas de Ordem Patrimonial
A Lei Maria da Penha prevê a possibilidade da aplicação de medidas protetivas
no âmbito patrimonial, são as destinadas a proteção dos bens do casal ou também dos
bens particulares da mulher, determináveis com base na lei civil. (2008, p.101)
Assim demonstra Sérgio Ricardo de Souza:
“O art. 24 prevê a possibilidade de o juiz do Juizado de Violência Doméstica e
Familiar contra a Mulher conceder em favor da vitima, medidas protetivas de
natureza eminente patrimonial, voltadas a impedir a pratica comum de o cônjuge,
companheiro ou convivente, dilapidar o patrimônio comum ou simular
transferências de bens, em prejuízo da vitima. O legislador valeu-se do método
empírico e normatizou medidas que já vinham sendo diuturnamente requeridas,
principalmente nos juízos de família, mas que, agora, poderão ser aplicadas no
mesmo juízo detentos da competência criminal, pois os novos JVDFCM são órgãos
detentores de uma competência ampliada, com vistas a possibilitar a almejada
proteção integral para a vítima, que agora poderá resolver praticamente todas as
questões vinculadas com a agressão doméstica e familiar sofrida, em um único
lugar.” (2009, p.140)
A primeira dessas medidas impõe ao suposto agressor, que restitua os bens
que tenha subtraído do patrimônio da ofendida, essa situação configura o furto, e será
considerada violência patrimonial pela Lei Maria da Penha. Já que, a mulher é a
vitima, e o autor do delito de furto, é a pessoa com quem possuiu um vinculo de
natureza familiar, os artigos 181 e 182 do Código Penal não serão aplicados. (2008,
p.89)
A expressão “subtrair”, refere-se apenas a bens moveis, pois bens imóveis não
estão sujeitos ao crime de furto. Essa transferência de bens pode ocorrer de maneira
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bem simples, em curto espaço de tempo (2009, p.141)
Porem, esse dispositivo pode ter a sua interpretação ampliada, pois o juiz pode
até mesmo autorizar a reintegração de posse no imóvel pertencente a vitima, e que o
agressor esbulhou, quando a expulsou do lar.
Caso haja discussão quanto a propriedade ou posse do imóveis, deve ser
ajuizada ação principal de caráter possessório ou dominial, no juízo cível, em 30 dias
após a efetiva reintegração de posse. (2007, p.102)
A medida que visa a proibição de celebrar negócios jurídicos encontra-se no
inciso II do artigo 24 da Lei Maria da Penha, para a sua real eficácia é necessário que a
vitima de violência doméstica indique os bens que pretende, que fiquem interditados
da alienação ou locação por parte do agressor.
Há casos em que é necessário que haja publicidade dessas medidas protetivas,
feitas através da imprensa, porém, isso só ocorre quando não tem outra maneira mais
discreta para evitar a exposição dos envolvidos.
Nos casos de união estável, por mais que a compra dos bens, se de durante o
estado de comunhão, não é possível fazer o controle do patrimônio comum que não
estiver no nome do casal. Caso um imóvel seja adquirido em nome de apenas um dos
companheiros durante a união, e seja utilizado pelos dois, não há como saber que o
bem é dividido, pois, quem o adquiriu, é tratado como proprietário, assim pode alienálo livremente. (2008, p.89)
Nesse sentido, Maria Berenice Dias ainda afirma:
“Não vendo o magistrado justificativa suficiente para conceder a restituição
reclamada pela vítima, o juiz tem faculdade (art. 22, § 1º) de determinar tão só o
arrolamento dos bens ou o protesto contra alienação de bens, como forma de
assegurar a higidez do patrimônio. Desta forme evita a probabilidade de dano
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irreparável.” (2008, p.89)
Por outro lado, para a venda de bens imóveis se faz necessária a concordância
do cônjuge, então não há a possibilidade de o agressor desfazer-se do patrimônio sem
que a vítima assine a escritura. A vítima, além de ter a possibilidade de vedar a venda,
poderá também se manifestar contra a compra de bens. Por mais que o bem adquirido
por um dos cônjuges ou companheiros, seja comum no patrimônio do casal, esse
negocio pode ser prejudicial aos interesses da vitima ou da própria família. Desta
maneira, quando for realizado o pedido de medidas protetivas haverá a possibilidade
de que essa medida protetiva seja requerida.
Para o caso de locações, é necessária outorga do cônjuge apenas quando a
locação por superior a dez anos, porém a Lei nº 11.340/06 tornou possível, que a
mulher vitima de violência doméstica busque em sede liminar a proibição de o
agressor locar bem comuns.
Há situações em que determinadas mulheres depositam imensa confiança em
seu cônjuge ou companheiros que até mesmo os autorizam a tratar de seus “negócios”,
assim concedem a eles, procurações com plenos poderes, ficando assim dependentes a
vontade do cônjuge ou companheiro, que têm a liberdade de fazer o que quiser. E
quando nesse meio ocorre violência, pode surgir o sentimento de vingança do homem,
e assim é possível que aconteça de serem usadas as procurações, para o desvio de
patrimônio.
Nesse sentido, Maria Berenice Dias observa:
“Ainda que a Lei fale em suspensão, a hipótese é de revogação do mandato, até
porque ‘suspensão da procuração’ é figura estranha no ordenamento jurídico. De
qualquer modo, seja suspensão, seja revogação, o fato é que o agressor não mais
poderá representar a vitima”. (2008 p.90)
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Consequentemente, o Juiz poderá também suspender procurações outorgadas
pela vitima ao agressor, em sede liminar, após a denuncia feita na policia, e
consequentemente deverá ocorrer a suspensão das procurações no prazo de 48 horas.
A possibilidade de suspensão de procuração pode ocorrer inclusive ao
mandato judicial conferido ao agressor quando ele for advogado, porém quando a
procuração esteja outorgada a figura de advogado que tenha ligação com o agressor,
não há como a mesma ser revogada.
A estudiosa Maria Berenice Dias esclarece:
“A proibição de celebração de contrato de compra, venda ou locação do patrimônio
comum deve ser comunicada ao Cartório de Registro de Imóveis. Já a suspensão da
procuração precisa ser informada ao Cartório de Notas. Em todas as hipóteses, para
que a decisão possa ser oponível a terceiros, é aconselhável também a comunicação
ao Cartório de Registro de Títulos e Documentos.” (2008, p.90)
Como garantia do cumprimento de um dever ou de uma obrigação, e garantir
posterior pagamento de indenização torna-se necessária a exigência de caução, assim a
caução consiste em colocar à disposição do juízo bens ou um fiador que possa
assegurar tal finalidade. Trata de uma medida acautelatória, para garantir a satisfação
de um direito que o juiz tenha reconhecido.
Para a fixação do valor da caução, o juiz deverá seguir o bom senso,
juntamente levando em consideração os princípios da razoabilidade e da
proporcionalidade, onde deverá levar em conta a condição financeira da vitima e do
agressor, a violência que tenha acontecido, além do valor do bem que foi desviado,
destruídos ou apenas retirados da posse da vitima. (2009, p.144)
A doutora Maria Berenice Dias, ainda destaca:
“Todas estas são medidas com natureza extrapenal, que podem ser formuladas
perante a autoridade policial quando do registro da ocorrência. Desencadeiam o
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procedimento de medida protetiva de urgência a ser enviado a juízo (art.12, III).
Essas mesmas pretensões podem ser veiculadas por meio das ações cautelares de
sequestro, busca e apreensão, arrolamento de bens, ou mediante outras medidas
provisionais. Ainda que se tratem de ações cíveis, como a causa de pedir é a
ocorrência de violência doméstica, devem ser propostas perante o JVDFM. Nas
comarcas em que esses juizados não estiverem instalados essas ações devem ser
propostas pela vitima no juízo cível ou de família e não na Vara Criminal.”(2008,
p.91)
9 EFETIVIDADE DAS MEDIDAS PROTETIVAS
As medidas protetivas de urgência contidas no artigo 22 da Lei, trazem ao
suposto agressor, obrigações de fazer ou não fazer, estas que estão destacadas no
artigo 461 do CPC:
“Art. 461/CPC: Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer
ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o
pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao
do adimplemento.”
Porém, para que haja a efetividade das medidas protetivas necessárias, se dará
a aplicação especificamente do parágrafo 5º do mesmo artigo: (2009, p.133)
“§ 5º Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático
equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas
necessárias, tais como a imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão,
remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade
nociva, se necessário com requisição de força policial. (Redação dada pela Lei nº
10.444, de 7.5.2002).”
Desta forma, para as medidas serem aplicadas serão observados os princípios
da razoabilidade e da legalidade, pois o que está inserido no §5o é apenas
exemplificativo, assim poderão ser adotadas outras providencias conforme o
entendimento do Juiz, lembrando apenas que a norma constante no art. 20 da Lei nº
11.340/06, poderá somente ser aplicada quando todas as demais medidas forem
insuficientes para garantir a proteção dos bem jurídicos tutelados e em decorrência a
vitima esteja em situação de risco.
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A multa diária é uma das alternativas para a efetividade do processo, pois tem
a natureza de execução indireta, ou seja, força o devedor a cumprir a obrigação. Essa
multa pode ser imposta pelo juiz mesmo que a vitima não tenha pedido, além de ter a
possibilidade de modificar o valor ou a periodicidade. (2008, p.92)
Os prazos de vigência das ordens de medidas protetivas que visam a proteção
ou a restrição devem perdurar por um prazo razoável, porém não toda eternidade.
Entende-se que a medida aplicada, deve ser válida durante a vigência da ação penal ou
cível respectiva, cessando com o transito em julgado da sentença proferindo na esfera
cível. (2009, p.134)
Porém, caso seja necessário, o juiz por ocasião da sentença penal condenatória
pode prorrogar a duração da medida protetiva predominantemente de natureza penal
aplicada, desde que seja dentro do período da execução da pena.
É nesse sentido que a jurisprudência tem entendido sobre o tempo que as
medidas protetivas devem perdurar:
“TJRJ: As medidas protetivas de urgência devem perdurar no tempo enquanto
necessárias à proteção da ofendida e inibição do ato agressor. Se as medidas
protetivas de proibição de aproximação e de comunicação com a vítima foram
deferidas em razão de um histórico de agressões, dentre as quais a última e mais
grave, sofrida a facadas, objeto de registro de ocorrência do crime de tentativa de
homicídio, nada justifica que, há menos de dois meses da concessão das cautelas,
com base nas declarações da vitima de que não tem mais problemas e nem medo do
agressor, sejam revogadas as medidas. Se a vitima afirma que o agressor não mais a
importunou, é porque a medida se mostrou eficaz, causa de sua manutenção, e não
de revogação. Periculum in mora não desconvalescido pelas declarações da vitima.
Manutenção da cautelar. Ordem que se denega. (HC 2007.059.08520 – Rel. Des.
Carlos Augusto Borges – j. em 22.01.2008)”
10 REPRESENTAÇÃO, RENÚNCIA OU DESISTÊNCIA
A Lei Maria da Penha também trouxe grande discussão sobre a natureza do
delito de lesões corporais leves e lesões culposas, afirma Maria Berenice Dias. (2008,
42
p.110)
A dúvida se consubstancia em saber se a lesão penal continua ser
condicionada à representação ou voltaria a ser publica incondicionada, isto porque a
lei menciona a expressão “renúncia a representação”:
“Art. 16. Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de
que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em
audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da
denúncia e ouvido o Ministério Público.”
A doutrina tem questionado exatamente sobre essa expressão, vejamos
que Maria Berenice Dias explica que primeiramente é necessário explicar qual o real
significado das palavras “desistência”, “renuncia” e “retratação:
“Desistência é o gênero que compreende a renúncia e a retratação. Desistir é tanto se
quedar inerte, deixar escoar a possibilidade de manifestar a vontade como tem o
sentido de renunciar, abrir mão da manifestação já levada a feito, voltar atrás do que
foi dito. Na esfera penal, ‘renúncia’ significa não exercer o direito, abdicar do direito
de representar. Trata-se de ato unilateral que ocorre antes do oferecimento da
representação. Já ‘retratação’ é ato posterior, é desistir da representação já
manifestada. Retratação é o ato pelo qual alguém retira a sua concordância para a
realização de determinado ato, que dependia de sua autorização.” (2008, p.110)
Desta maneira, apenas quando os delitos estão sujeitos a representação é que
se pode falar em desistência, renuncia ou retratação, sendo assim não há possibilidade
de representação nos casos de ação penal publica incondicionada e estas expressões
não tem sentido.
A representação é uma condição para haver procedimento de caráter objetivo, e
que se aplica em relação aos crimes que fazem necessária a sua exigência, como os
crimes de ameaça, lesão corporal leve ou culposa, tendo previsão legal no artigo 39 do
Código de Processo Penal:
“Art. 39. O direito de representação poderá ser exercido, pessoalmente ou por
procurador com poderes especiais, mediante declaração, escrita ou oral, feita ao juiz,
ao órgão do Ministério Público, ou à autoridade policial.
§ 1o A representação feita oralmente ou por escrito, sem assinatura devidamente
autenticada do ofendido, de seu representante legal ou procurador, será reduzida a
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termo, perante o juiz ou autoridade policial, presente o órgão do Ministério Público,
quando a este houver sido dirigida.
§ 2o A representação conterá todas as informações que possam servir à apuração do
fato e da autoria.
§ 3o Oferecida ou reduzida a termo a representação, a autoridade policial procederá
a inquérito, ou, não sendo competente, remetê-lo-á à autoridade que o for.
§ 4o A representação, quando feita ao juiz ou perante este reduzida a termo, será
remetida à autoridade policial para que esta proceda a inquérito.
§ 5o O órgão do Ministério Público dispensará o inquérito, se com a representação
forem oferecidos elementos que o habilitem a promover a ação penal, e, neste caso,
oferecerá a denúncia no prazo de quinze dias.”
Para os crimes de ação privada é necessária a realização de queixa-crime, e a
representação fica condicionada a instauração da ação penal, assim o inquérito não
pode ser instaurado antes da manifestação real da vitima. A representação é levada a
efeito no momento em que é realizada a ocorrência, e levada a termo pela autoridade
policial. Caso a vitima não se manifeste, será entendido que ela “renunciou” ao direito
de representar contra o ofensor, ou seja, a vítima abriu mão do seu direito de ver o
agressor responder pelo ato que praticou. Assim, a “renúncia a representação”
significa que a vitima não exerceu o seu direito de representar. (2008, p.111)
Após a representação ser realizada é possível a retratação da vitima, ou seja,
ela pode desistir de que seu agressor seja processado. Desta maneira “retratação”
significa a desistência da representação já manifestada. A Lei Maria da Penha admite
que essa retratação seja feita até o momento em que o Juiz receber a denúncia, ao
contrário do que consta no Código Penal, que a retratação pode ser feita até o
oferecimento da denúncia pelo Ministério Público.
Assim melhor explica Maria Berenice Dias:
“A representação é oferecida pela vitima quando ela comparece à delegacia. Neste
momento a autoridade policial procede ao registro da ocorrência, ouve a ofendida,
lavra o boletim de ocorrência e toma por termo a representação (art.12, I). A partir
daí o inquérito policial deve ter andamento (CPP, art. 5º, §4º). Ou seja, o inquérito se
instaura mediante a manifestação da vitima. Encaminhando o inquérito a juízo, o
Ministério Público oferece a denuncia. Até o momento de a denuncia ser recebida,
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há a possibilidade de a vitima retratar-se, desistir da representação, desde que o faça
atendendo os requisitos legais (art.16): em audiência, perante o juiz e com a ouvida
do Ministério público.)” (2008, p.114)
Além de ser manifestada pela vitima, a desistência pode também ser
manifestada por seu procurador. Deverá ser feita através de petição, e encaminhada ao
juiz designado ao caso, porém a vitima pode comunicar ao juiz pessoalmente e
oralmente. Caso haja a retratação, o juiz marcará audiência com a vítima e intimará o
Ministério Público, o agressor ou seu defensor não será intimado e mesmo que se
encontrem presentes no fórum, não poderão participar da solenidade, já que não se
verifica ofensa ao principio da ampla defesa e a lei resguarda a ampla garantia da
independência da vitima no momento da retratação.
Assim, Maria Berenice Dias se manifesta:
“A retratação pode ocorrer na audiência realizada no procedimento da medida
protetiva. Feito acordo sobre as questões familiares, revelando a vitima que não tem
mais interesse na representação, será conduzida a outro local, ou o agressor deve ser
afastado do recinto. Além do juiz estará presente a vitima, seu defensor e o
representando do Ministério Público. Homologada a desistência, será comunicada a
autoridade policial para que arquive o inquérito, eis ter ocorrido a extinção da
punibilidade (CP, art. 107, VI). Se o inquérito policial já tiver sido remetido a juízo,
a renuncia só pode ser aceita até o recebimento da denuncia.” (2008, p.115)
11 PROCEDIMENTO E ATUAÇÃO JUDICIAL E POLICIAL
11.1 ÂMBITO JUDICIAL
O maior avanço da lei nº 11.340/06 foi a criação dos Juizados de Violência
Doméstica e familiar contra a Mulher, pois tirou a violência doméstica do âmbito dos
Juizados Especiais Criminais, porém não ficou imposta a implantação e nem mesmo o
prazo para que fossem instalados. (2008, p. 134)
Dessa forma, estabelece Sérgio Ricardo de Souza:
“O legislador fixou claramente que os Juizados de Violência Doméstica e Familiar
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contra a Mulher são órgãos jurisdicionais, integrantes da ‘justiça ordinária’ dos
Estados e do Distrito Federal, excluindo a integração deles a alguma justiça
especializada ou mesmo à Justiça Federal, já que prevê expressamente que eles
poderão ser criados ‘pela União, no Distrito Federal e nos Territórios, e pelos
Estados...’. O legislador preferiu ‘facultar’ a criação desses Juizados, já que usou o
verbo ‘poderão’ e não, ‘deverão’, isso provavelmente para evitar alegação de
desrespeito à autonomia das Unidades Federadas, (CRFB, art. 96, I, ‘d’ e II) mas em
contrapartida gerou o sério risco de que não haja a efetiva e funcional
imprescindível ao seu funcionamento. Não obstante isso, os juizados vem
lentamente sendo instalados, principalmente nas capitais e nas regiões
metropolitanas, principalmente através de convenio entre os Tribunais de Justiça e a
Secretaria de Reforma do Judiciário, que vem cumprindo papel essencial na
instalação dos juizados.” (2009, p.90)
Os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher possuem
competência tanto criminal quanto cível. Esses juizados foram criados vinculados a
idéia de proteção ampla à mulher vitima de violência doméstica e familiar, para que
todo o procedimento ocorra de maneira mais simples, rápida e eficaz, e tem
competência para julgar e executar ações cíveis e criminais. (2009, p.90)
Antes da existência desses Juizados, a vítima após fazer o registro de
ocorrência na policia, precisava procurar um advogado ou ir a Defensoria Pública, para
que fosse tomada alguma providencia, assim era proposta ação junto à Vara de
Família. Para que o sujeito fosse afastado do lar em comum, era necessária uma ação
cautelar de separação de corpos, ou um pedido de antecipação de tutela na ação de
separação. Como o registro de ocorrência era documento produzido apenas com
informações da vitima, havia dificuldade de juízes aceitarem para que medidas
liminares fossem concedidas. Para se obter alimentos, era necessária uma nova ação. E
caso a vitima não tivesse para onde ir e nem como subsistir, após o elaborado o
boletim de ocorrência, a única maneira era voltar para a casa de seus familiares e
aguardar uma audiência no Juizado Especial Criminal. (2008, p.135)
Agora, ao comparecer a delegacia, a vítima recebe informações de seus
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direitos e já lhe é assegurada proteção policial. Seu depoimento é colhido e a
representação é tomada a termo. Caso a vitima requeira medidas protetivas de
urgência, a polícia deve formular o pedido e enviar ao Juizado de Violência Doméstica
e Familiar contra a Mulher e remeter a juízo no prazo de 48 horas.
Ao verificar o recebimento do pedido de Medidas Protetivas, o juiz tem o
prazo de 48 horas para analisar o pedido, deferir, indeferir ou designar audiência de
justificação. A audiência de justificação consiste na faculdade que o juiz possui de
designar audiência por não estar formando convicção da necessidade ou pertinência
das medidas pleiteadas pela vitima.
Caso não haja esses Juizados em determinadas comarcas, os pedidos de
Medidas Protetivas devem ser enviados às Varas Criminais, mesmo que a maioria dos
pedidos feitos seja no âmbito do Direito de Família.
11.1 ÂMBITO POLICIAL
Para propiciar um melhor e mais completo tratamento à mulher vitima de
violência doméstica, a Lei Maria da Penha, acrescentou outros dispositivos além dos
contidos no artigo 6º do Código de Processo Penal a respeito das providências que
devem ser tomadas pela autoridade policial:
“Art. 12- Lei 11.340/06: Art. 12. Em todos os casos de violência doméstica e
familiar contra a mulher, feito o registro da ocorrência, deverá a autoridade policial
adotar, de imediato, os seguintes procedimentos, sem prejuízo daqueles previstos no
Código de Processo Penal:
I - ouvir a ofendida, lavrar o boletim de ocorrência e tomar a representação a termo,
se apresentada;
II - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e de suas
circunstâncias;
III - remeter, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, expediente apartado ao juiz
com o pedido da ofendida, para a concessão de medidas protetivas de urgência;
IV - determinar que se proceda ao exame de corpo de delito da ofendida e requisitar
outros exames periciais necessários;
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V - ouvir o agressor e as testemunhas;
VI - ordenar a identificação do agressor e fazer juntar aos autos sua folha de
antecedentes criminais, indicando a existência de mandado de prisão ou registro de
outras ocorrências policiais contra ele;
VII - remeter, no prazo legal, os autos do inquérito policial ao juiz e ao Ministério
Público.
§ 1o O pedido da ofendida será tomado a termo pela autoridade policial e deverá
conter:
I - qualificação da ofendida e do agressor;
II - nome e idade dos dependentes;
III - descrição sucinta do fato e das medidas protetivas solicitadas pela ofendida.
§ 2o A autoridade policial deverá anexar ao documento referido no § 1o o boletim de
ocorrência e cópia de todos os documentos disponíveis em posse da ofendida.
§ 3o Serão admitidos como meios de prova os laudos ou prontuários médicos
fornecidos por hospitais e postos de saúde.”
A autoridade policial deverá então lavrar boletim de ocorrência e tomar a
termo a representação, esta que não exige excesso de formalismo e poderá ser inserida
no corpo do próprio documento, mas deve estar expresso de forma nítida a vontade da
vitima. (2009, p.75)
Conforme descreve Pedro Rui da Fontoura Porto:
“Convém, pois, proceder-se a uma analise mais detalhada de cada um desses
procedimentos atribuídos à autoridade policial, que, em seu conjunto, relacionam-se,
basicamente, a dois aspectos preponderantes: a) a conclusão do inquérito policial, e
b) a elaboração do pedido da ofendida, direcionado ao juízo, para o deferimento de
medidas protetivas de urgência.” (2007, p.76)
A grande novidade da lei, segundo Pedro Rui Fontoura, é que a autoridade
policial tem o dever de remeter ao juiz, no prazo de 48 horas, um apartado com o
pedido da ofendida para que as medidas protetivas de urgência sejam concedidas. Esse
apartado consiste na elaboração material do pedido feito pela ofendida, que deve ter
características de uma petição inicial de ação cautelar, juntamente com copia do
boletim de ocorrência (2007, p.83)
É também possível que a vitima procure a policia apenas para elaborar o
boletim de ocorrência, pois é cabível que o requerimento de medidas protetivas seja
desenvolvido por um advogado ou defensor publico.
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49
CONCLUSÃO
Com base nas pesquisas realizadas para a elaboração da presente pesquisa,
pode-se perceber que a violência doméstica e familiar contra mulher iniciou-se
juntamente com a humanidade, e encontra-se presentes até os dias de hoje, tanto que o
governo brasileiro foi forçado a criar uma medida que combatesse esse tipo de
violência.
Após diversas agressões sofridas, Maria da Penha, apenas mais uma vitima
dessa brutalidade, inconformada com a impunidade de seu agressor, procurou soluções
em órgãos internacionais, formalizando uma denuncia à Comissão Interamerica de
Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos, que pressionou o Brasil a
cumprir os tratados internacionais que combatem a violência doméstica, os quais é
signatário.
Como medida para o combate da violência doméstica e familiar contra a
mulher, entrou em vigor em 2006, a Lei nº 11.340/06 que cria mecanismos para coibir
a violência doméstica e familiar contra a mulher, entre elas está o Juizado de Violência
Doméstica e Familiar contra a Mulher e as Medidas Protetivas de Urgência.
As Medidas Protetivas de Urgência visam proteger de maneira mais eficiente a
vitima, e também trouxe mecanismos para combater a impunidade do agressor. O
legislador se mostrou preocupado em proteger a vítima, não só da violência física, mas
também de outros tipos de violência, como a moral, sexual, psicológica e até mesmo a
violência patrimonial e até mesmo.
Para a melhor efetividade, a Lei conta com o apoio dos Juizados de Violência
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Doméstica e Familiar contra a Mulher, que atuam juntamente nas áreas cível e
criminal, e
Para a aplicação da Lei Maria da Penha, é necessário que se configura a
violência doméstica e familiar , e para isso agressor e ofendida devem manter, ou já
tenham tido um vínculo intimo de afeto, pode inclusive ocorrer fora do lar ou
domicilio das partes, ou seja, pode consubstanciar-se na rua, no cinema, em um
estádio, no teatro, na praia, no fórum, etc.
Desta maneira, o objetivo da Lei 11.340/06 é a proteção da mulher vitima de
violência doméstica, dando a ela apoio para que possa lutar por seu principal direito, o
de sua dignidade. Após a chegada da Lei Maria da Penha, a mulher não deve mais
temer em denunciar o seu agressor, pois ela está amplamente amparada pela lei.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA
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Lei 11.340/06
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