A Administração no Contexto da Gestão da Inovação Tecnológica
Antônio José Botelho
Especialista em Ciência Política e Mestre em Engenharia de Produção
Servidor da Suframa e Professor do Cesf/Fucapi
Contextualizando o Problema
As duas mais modernas teorias da firma podem estar vinculadas às perspectivas shumpeteriana e neoschumpeteriana.
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Chamam-se A Teoria da Agência e a Economia dos Custos de Transação. A associação da
primeira Teoria à fase jovem da intelectualidade de Schumpeter reserva certa dose de ousadia histórica, na
medida em que suas reflexões sobre a Inovação foram iniciadas no início do Século XX e a lógica organizacional
resulta da evolução administrativa propriamente dita, portanto, se aproxima desta contemporaneidade. Já a
segunda associação contém maior clareza histórica, pois tanto a percepção da fase madura de Schumpeter quanto
a pertinência da Economia dos Custos estão ainda em processo de evolução, especialmente em países de
industrialização tardia, como o Brasil.
A intenção, portanto, é alinhavar argumentos para um posicionamento organizacional, tanto no interior da firma,
quanto à sua postura estratégia extra-muros.
A transição para a maturidade de Schumpeter passa pela transformação da função do empreendedor como agente
fundamental do processo de inovação para a caracterização das grandes firmas operando em forma de oligopólios
durante o Século XX, culminando com as empresas multi e transnacionais deste início de Século, cuja melhor
representação são as 500 maiores do Mundo. Nessas grandes empresas, o processo de inovação está
representado pela ação em Pesquisa & Desenvolvimento, mormente desenvolvimento, nos seus Departamentos
de Engenharia. Mais do que isso, o processo na realidade se confunde com Sistemas Locais de Inovação, os quais
interagem positiva, e até mesmo negativamente, com os Sistemas Nacionais e Supranacionais de Inovação.
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Então, como deve se posicionar a Administração – e claro, o Administrador – no contexto da gestão da Inovação
Tecnológica, adotando Manaus e o Pólo Industrial de Manaus [PIM] como cenários?
Caracterizando as Teorias 3
A Teoria da Agência parte do princípio de que a gestão das grandes firmas está dividida em profissionais ou
grupos de profissionais do capital onde se podem observar convergências de interesse. Sob esse princípio operase uma delegação de competência decisória do proprietário para o agente, que deve seguir os interesses daquele
principal. Assim, a Agência deve dispor de uma gerência que esteja em sintonia com os propósitos do proprietário.
Neste contexto, a Teoria da Agência exige soluções inovadoras, face a assimetria de informações num ambiente
de incerteza. Tendo em vista, ainda, a complexidade imanente das grandes firmas, os poderes decisórios são
observados ao longo da cadeia de relações do tipo gerente-proprietário.
Essas relações, fundamentalmente conflituosas, são garantidas com o desenvolvimento de várias tecnologias
sociais. Em nível intermediário, por exemplo, a remuneração do gerente da área fica vinculada aos resultados em
equipe, as quais estabelecem concorrência entre si visando ampliação permanente da eficiência e eficácia na
operacionalidade das firmas.
Assim, a Teoria da Agência resvala positivamente na inovação tecnológica dentro da firma, pois tal cultura
transcende, necessariamente, para as relações entre proprietário-gerente. Neste particular, os autores do artigo
registrado na nota n° 3 afirmam [p. 323]:
Tome-se o caso de um inventor que busca recursos para viabilizar comercialmente sua
invenção. Resolver potenciais problemas de Agência é crucial para a sua empreitada. A
relação entre inventor e financiador pode enquadrar-se num caso de Agente-Principal.
Pode ser que o inventor precise delegar a concepção e execução de partes do processo
de inovação a certos agentes. Tais agentes podem criar ou ampliar assimetrias de
informação (o mesmo pode ser feito pelo inventor com relação ao financiador),
aproveitando-se das mesmas em benefício próprio e não do projeto como um todo.
É nesta perspectiva oportunizada pela Teoria da Agência, que se pode encaixar a abordagem da Economia dos
Custos de Transação, pois considera as firmas juntamente com os mercados e as interações entre os entes
econômicos, via, no que interessa a idéia dessa reflexão, as alianças e parcerias estratégicas em torno da gestão
da inovação tecnológica.
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O cerne da questão daquela abordagem está no fato de que as interfaces das passagens de um bem ou serviço
tecnologicamente diversas representam exatamente os custos de transação. Recorrendo a contratos formais, isto
é, vínculos refletindo interações entre agentes dos Sistemas Locais, Nacionais e Supranacionais de Inovação, são
custos para localizar, estabelecer, manter, consolidar e desenvolver outro(s) agente(s) interessado(s) em aliança(s)
e parceria(s) estratégica(s).
Para os autores do artigo registrado na nota n° 3, os custos de transação resultam tanto de fatores humanos
quanto circunstanciais às formulações das alianças e parcerias estratégicas. Registram como exemplos o
conhecimento sobre fatos e relações causais, a capacidade de interpretar e associar dados e informações e
habilidades para decidir e prever. Argumentando outras fontes de custos de transação, como a incerteza e a
propriedade intelectual envolvidas na transação, fica claro a questão sobre qual tecnologia social deve ser
adotada. Essa busca perpassa pela elaboração de tecnologia organizacional combinadas com tecnologia física
visando a redução de custos de transação e de transformação. Ao fim, surgem diferentes arranjos institucionais
entre firmas, mercados e contratos.
Os desdobramentos dessas rotinas oferecem importantes fontes de inovações, que são exatamente as atividades
de P&D, que podem ser conduzidas dentro da própria firma ou dentro de outra organização especializada em P&D
[ou até mesmo em outra firma parceira, quer fornecedora, quer até mesmo concorrente, de forma integral e
parcialmente dividida]. O produto de tais alianças e parcerias estratégicas é vendido a outros entes econômicos via
mercado ou outros tipos de contrato.
A conclusão assegura no que interessa a essa reflexão, que as firmas, segundo as modernas teorias, procuram,
em diferentes graus, incorporar inovações organizacionais (ocorridas dentro da firma) e institucionais (novas
formas de relacionamento entre firmas, entre firmas e mercados ou entre outros entes econômicos). Como
nenhuma inovação ocorre isoladamente, as inovações tecnológicas estão absolutamente relacionadas às
inovações organizacionais e institucionais.
Focando o Desafio
O Projeto ZFM estabeleceu em Manaus um processo de industrialização por transferência de estruturas de
produção, cuja gerência decisória e operacional não conta, em regra, com profissionais da Administração formados
em suas Faculdades. Por suas características regulatórias, pode ser considerado um conjunto de aglomerados
organizados de firmas. A consolidação dessa industrialização tardia pode ser conquistada transitando para
aglomerados inovadores.
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Essa transição haverá de exigir administradores – especializados na gestão da inovação - que possam dar conta
das exigências pertinentes aos Sistemas Manaus, Nacional e Supranacionais de Inovação. Tanto dentro, quanto
fora da firma, novos modelos contratuais estão sendo exibidos em Manaus. Prolifera a instalação de centros de
pesquisa. Amplia-se a capacidade de financiamento de projetos de P&D. Configuram-se projetos cooperativos e
alianças e parcerias estratégicas.
Essa infra-estrutura de inovação tecnológica deve ser apropriada especialmente pelas firmas de capital e
tecnologia local, as quais se situam com um atraso de quase cem anos, considerando a perspectiva histórica entre
o empresário-inovador da fase jovem de Schumpeter e a sua fase madura, que admite a função da inovação como
resultado dos projetos de P&D idealizado e realizado pelas firmas. O desafio pertinente é a transição de
aglomerados informais para aglomerados inovadores, admitindo a evolução contida nas análises e estudos de
cunho neo-schumpeteriano. Neste sentido, devem-se observar as noções do empresário inovador do jovem
Schumpeter para o desenvolvimento de um capitalismo endógeno. Contudo, poderá ser possível encurtar a
trajetória
de
desenvolvimento
desses
aglomerados
locais
pelos
efeitos
da
glocalização,
reduzidos
sociologicamente à capacidade endógena de mudança tecnológica.
De igual modo, as firmas globais e nacionais instaladas em Manaus passarão a exigir administradores –
necessariamente especializados na gestão da inovação - de melhor qualificação para que as inovações
tecnológicas possam fluir sob a égide da lógica dos Sistemas de Inovação, dominando as nuances da Economia
dos Custos de Transação. Tais inovações deverão surgir cruzando os esforços locais com o do Sistema Industrial
Global, cujos maiores recortes são os das Indústrias de Eletroeletrônica e de Duas Rodas. Nesse ínterim, tais
especialistas da gestão da inovação tecnológica formados localmente passarão a integrar as cadeias de relações
dessas firmas caracterizadas na Teoria da Agência, ao mesmo tempo em que oferecerão sustentação aos
processos de transformações dos aglomerados informais locais, que operarão as amazonidades [realização
sustentável de produtos e serviços no mercado a partir de insumos e saberes da floresta].
E mais: para os autores registrados na nota n° 5, essas transformações deverão estar consubstanciadas por um
processo continuado de aprendizado via transferência de conhecimento entre agentes locais, estruturado e
articulado com o apoio governamental em todas as dimensões, especialmente ao empreendedorismo, sem perder
a própria disponibilidade para investimentos orientados para a inovação [p. 372].
Mas, para tanto, em ambos os casos, os profissionais deverão estar sendo formados na esteira da evolução das
teorias das firmas. Neste particular, o Instituto Superior de Ensino Fucapi – Cesf oferece ao capital social de
Manaus relevante contribuição para a formação de profissionais com a adoção em seu Curso de Administração, de
disciplinas de caráter inovador, enquanto introdução sistemática à especialidade vinculada ao tema desta reflexão:
Avaliação e Estratégias Tecnológicas, Empreendedorismo I e II; Gestão da Inovação I e II; Gestão de Projetos;
Mercados Emergentes, Política Industrial e Inovação Tecnológica, Propriedade Intelectual; Tecnologia da
Informação; e Tópicos Especiais com abordagens da Gestão do Conhecimento. Num contexto mais amplo, fica a
sugestão de que o Conselho de Administração [CRA] articule e coordene um processo de discussão sobre o papel
dos Cursos de Administração no contexto da gestão da inovação tecnológica, de tal sorte que a governança local
possa contar com efeitos de pertinência e continuidade junto às políticas e diretrizes públicas e privadas focadas
no desafio exposto nesta reflexão.
Referências Bibliográficas (adicionais)
1. Artigo “Conhecimento, Inovação e Desenvolvimento Regional/Local”, de autoria de Clélio Campolina
Diniz, Fabiana Santos e Marco Crocco, contido no livro Economia Regional e Urbana: contribuições
teóricas recentes, organizado por Clélio Campolina e Marco Crocco, publicado pela Editora UFMG, em
Belo Horizonte, em 2006 [p. 87 a 122];
2. Artigo “A Dinâmica do Aprendizado Tecnológico no Período de Substituição das Importações e as
Recentes Mudanças Estruturais no Setor Industrial da Argentina, do Brasil e do México”, de autoria de
Jorge Katz, contido no livro Tecnologia, Aprendizado e Inovação, organizado por Linsu Kim e Richard R.
Nelson, publicado pela Editora Unicamp, em Campinas, em 2005 [p. 413 a 448].
1
Uma percepção ampliada da contribuição intelectual de Joseph Alois Schumpeter pode ser obtida no artigo “A Herança
Schumpeteriana”, de autoria de Tamás Szmrecsányi, contido no livro Economia da Inovação Tecnológica, organizado por
Victor Pelaez e Tamás Szmrecsányi, publicado pela Editora Hucitec em parceria com a Ordem dos Economistas do Brasil, em
São Paulo, em 2006 [p. 112 a 134].
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Uma percepção ampliada da sobre o Sistema Industrial Global, composto de seus sistemas mesoindustriais, frente aos
Sistemas Sociais Nacionais pode ser obtida no artigo “Globalização e Glocalização: problemas para os países em
desenvolvimento e implicações para políticas supranacionais, nacionais e subnacionais”, de autoria de Marc Humbert, contido
no livro Conhecimento, Sistemas de Inovação e Desenvolvimento, organizado por Helena M. M. Lastres, José E. Cassiolato e
Ana Arroio, publicado pela Editora UFRJ em parceria com a Contraponto, no Rio de Janeiro, em 2005 [p. 259 a 289].
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A percepção foi colhida no artigo “Inovação e Teoria da Firma”, de autoria de Huáscar Fialho Pessali e Ramón García
Fernandez, contido no livro caracterizado na nota n° 1 [p. 302 a 332].
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Esta colocação é de responsabilidade deste autor frente a lógica da reflexão.
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Uma percepção ampliada sobre os temas relativos a aglomerados frentes ao processo de inovação pode ser obtida no artigo
“De Aglomerados Locais a Sistemas de Inovação”, de autoria de Lynn Mytelka e Fulvia Farinelli, contido no livro caracterizado
na nota n° 2 [p. 347 a 378].
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