Coletânea Luso-Brasileira Volume 3 EDUCAÇÃO, GESTÃO DA INFORMAÇÃO E SUSTENTABILIDADE Organizadores Francisco Alberto Severo de Almeida Armando Malheiro da Silva Mário José Batista Franco Carla Conti de Freitas Copyright © 2012 por Francisco Alberto Severo de Almeida Armando Malheiro da Silva Mário José Batista Franco Carla Conti de Freitas Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro pode ser reproduzida sob quaisquer meios existentes sem a autorização por escrito dos organizadores. Este livro foi escrito por autores brasileiros e portugueses em suas línguas nativas. Em respeito a este fato, os organizadores optaram por manter a linguagem dos capítulos tal como foi escrita. Impresso no Brasil pelo SENAI Goiás Editor: Faculdade de Letras da Universidade do Porto (Porto, Portugal) Projeto Gráfico e Capa: Leize Oliveira Dias Bruno Carvalho Tiago Alves Mota Comitê Editorial Prof.ª Dr.ª Fernanda Ribeiro Prof. Dr. George Leal Jamil Prof. Dr. José Luiz de Freitas Júnior Prof.ª Dr.ª Maria Helena Guimarães Prof. Dr. Manuel Ennes Ferreira Prof. Dr. Manoel Pereira da Costa E24 Universidade do Porto - Portugal Universidade FUMEC, Minas Gerais, Brasil Faculdade de Tecnologia SENAI de Desenvolvimento Gerencial – Goiás - Brasil Escola de Economia e Gestão, Universidade do Minho - Portugal Instituto Superior de Economia e Gestão, Universidade Técnica de Lisboa – Portugal Diretor de Educação e Tecnologia SESI/SENAI Goiás - Brasil EDUCAÇÃO, GESTÃO DA INFORMAÇÃO E SUSTENTABILIDADE. FRANCISCO ALBERTO SEVERO DE ALMEIDA, ARMANDO MALHEIRO DA SILVA, MÁRIO JOSÉ BATISTA FRANCO E CARLA CONTI DE FREITAS (ORGS.). PORTO (PORTUGAL): UNIVERSIDADE DO PORTO, 2012. 323 P. ISBN 978-972-8932-99-2 1. EDUCAÇÃO 2. INFORMAÇÃO-GESTÃO. 3. SUSTENTABILIDADE I. ALMEIDA, FRANCISCO ALBERTO SEVERO DE...[ET AL.]. II. TÍTULO. CDU: 37:504.06 Sumário PREFÁCIO José Veiga Simão INTRODUÇÃO Manoel Pereira da Costa 7 9 EDUCAÇÃO Capítulo 1 - O MODELO QUADRIPOLAR APLICADO À EDUCAÇÃO MEDIADA POR TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO: UM ESTUDO EMPÍRICO Francisco Alberto Severo de Almeida, Armando Malheiro da Silva, Antonio Teodoro Ribeiro Guimarães 11 Capítulo 2 - O PAPEL DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIÁS E O DESENVOLVIMENTO LOCAL Yara Fonseca de Oliveira e Silva, Carla Conti de Freitas, Julia Paranhos, Lia Hasenclever 29 Capítulo 3 - ITINERÁRIOS DE APRENDIZAGEM COLABORATIVA/ COOPERATIVA EM CONTEXTO ON LINE Sofia Sant’Ana Lopes Malheiro da Silva 31 Capítulo 4 - A NOÇÃO DE COMPETÊNCIA E SUAS VÁRIAS IMPLICAÇÕES Manoel Pereira da Costa retirar parentesis sumario 41 GESTÃO DA INFORMAÇÃO Capítulo 5 - A GESTÃO DA INFORMAÇÃO COMO FERRAMENTA ESTRATÉGICA DE GESTÃO DA ESCOLA SUPERIOR DE TECNOLOGIA E GESTÃO DE ÁGUEDA Sónia Catarina Lopes Estrela Capítulo 6 - FATORES QUE LEVAM AS ORGANIZAÇÕES A OPTAREM OU NÃO PELA TERCEIRIZAÇÃO DOS SERVIÇOS DE TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO Gislaine Fernandes, Rita de Cássia da Silveira Marconcini Bittar, Oswaldo Luiz Agostinho Capítulo 7 - REDES DE COOPERAÇÃO COMO UM MECANISMO PARA O REFORÇO DA COMPETITIVIDADE TERRITORIAL: O CASO DA ASSOCIAÇÃO QUALIFICA Manuel Belo, Mário José Batista Franco Capítulo 8 - UMA POLÍTICA PÚBLICA DE INTELIGÊNCIA ECONÓMICA: UM INSTRUMENTO PARA A COMPETITIVIDADE DAS EMPRESAS PORTUGUESAS André Magrinho, Joaquim Ramos Silva, Mário José Batista Franco 113 135 151 175 Capítulo 9 - POR UM NOVO PROFISSIONAL PARA O SETOR DE INFORMAÇÃO-DOCUMENTAÇÃO: COMPETÊNCIAS E ATITUDES EXIGIDAS PELO MERCADO DE TRABALHO BRASILEIRO José Antonio Moreiro González,Waldomiro Vergueiro Capítulo 10 - INFORMAÇÃO, CONHECIMENTO E SERVIÇO PÚBLICO: UM ESTUDO DE CASO EXPLORATÓRIO COM CONTRIBUTOS PARA A GESTÃO DA INFORMAÇÃO E DO CONHECIMENTO NA CÂMARA MUNICIPAL DE VISEU Sofia Vasques, Maria Manuel Borges, M. Cristina V. de Freitas 199 213 SUSTENTABILIDADE Capítulo 11 - PRODUÇÃO DE BIOCOMBUSTÍVEL NO CERRADO Christiano de Oliveira e Silva, Dimas Moraes Peixinho, Suzana Ribeiro Lima Oliveira, William Ferreira da Silva Capítulo 12 - INFLUÊNCIA DA POLÍTICA DE REGULAÇÃO AMBIENTAL NO DESEMPENHO ECONÔMICO E SOCIOAMBIENTAL DA INDÚSTRIA DE LACTICÍNIO EM GOIÁS BRASIL Francisco Alberto Severo de Almeida, Isak Kruglianskas, Antonio Teodoro Ribeiro Guimarães, Felipe Martins Severo de Almeida Capítulo 13 - MOTIVAÇÕES PARA O DESENVOLVIMENTO DE CONTRATOS DE DESEMPENHO ENERGÉTICO NA UNIÃO EUROPÉIA: UMA PERSPECTIVA DE COOPERAÇÃO EMPRESARIAL Victor Santos, Mário José Batista Franco Capítulo 14 - USO SUSTENTÁVEL E ECONOMIA RURAL NA ERA DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS GLOBAIS: UM ESTUDO DO PEQUI CARYOCAR BRASILIENSE EM MUNICÍPIOS BRASILEIROS João Carlos Nabout, Jordana Moura Caetano, Maria Tereza Ribeiro Alves, Gislene Oliveira, Mara Rúbia Magalhães 247 265 283 307 Prefácio O livro “Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade” conduz-nos, através de estudos de diagnóstico e prospectivos e de experiências-piloto em espaços diferenciados, portugueses e brasileiros, a reflexões úteis sobre novos conceitos e práticas em áreas vitais do “conhecimento”, como alimento do “crescimento económico e desenvolvimento cultural”. Assim acontece quando se analisam modelos de educação mediados pelas tecnologias de informação e comunicação e itinerários de aprendizagem colaborativa/cooperativa em ambientes virtuais de construção do conhecimento. Assim acontece ao sugerirem-se perspectivas de gestão da informação como ferramenta de sucesso para o desenvolvimento de organizações e mecanismos inovadores conducentes a terciarização de tecnologias de informação para aumentos de competitividade organizacional. Neste contexto compreendem-se melhor a natureza das mudanças permanentes na cultura de profissionais da informação e documentação, adequadas à evolução da sociedade do conhecimento. Noutros capítulos deste excelente livro são tratados temas com óbvia conexão com os anteriores, relacionados com a competitividade entre nações no quadro do desafio da globalização. E assim a Universidade emerge como actor estratégico do desenvolvimento, inserida numa Hélice Tripla que privilegia espaços de cooperação entre o poder político, o poder académico e o poder económico, em prejuízo das esferas clássicas de competência; a inteligência económica, colocada no coração da estratégia e das políticas públicas para o desenvolvimento, aponta para a valorização da criação do conhecimento associada à sua transformação em bens de riqueza económica e cultural, assente em reformas estruturais, de modo a valorizar os activos de bens e estratégias para atrair investimento estrangeiro; as redes de cooperação estratégica dirigidas para a valorização dos aspectos distintivos e diferenciadores dos territórios e para reforço da competitividade territorial. Neste quadro, como era de esperar, clarifica-se a noção de competência como conceito mais abrangente que a qualificação numa lógica empresarial em matrizes de referência do condutivismo, do funcionalismo e do construtivismo. E por que, parafraseando Boltzman, a energia está na base do progresso na vida humana e no centro de mudanças civilizacionais este livro contem dois capítulos relacionados com o binómio desenvolvimentonatureza, um sobre a produção de energia através de biocombustível (uma grande aposta na matriz energética brasileira) e outro relacionado com a cooperação empresarial, associada a contratos de desempenho energético como determinantes da competitividade regional. E como era exigido o último capítulo ligado ao desenvolvimento humano elucida-nos sobre o impacto de mudanças climáticas relacionado com a disseminação de doenças e com a agricultura e a segurança alimentar no mundo rural. Em síntese, da leitura destes catorze capítulos autónomos, surgem com naturalidade sugestões para o leitor sobre novos trabalhos de investigação e demonstração, determinantes para a competitividade entre nações, como sejam os binómios educação-formação, gestão da informação-gestão do conhecimento e desenvolvimento-meio ambiente. Como pano de fundo situa-se a questão da criação de riqueza com o valor acrescentado para mercados em mudança, e, naturalmente, a justa repartição dos rendimentos. Numa visão mais longínqua verificamos que na base desta questão se encontram as razões porque algumas nações são tão ricas e outras tão pobres. David S. Landes responde a esta questão afirmando que “instituições e cultura, primeiro; a seguir, o dinheiro; mas desde o princípio e cada vez mais o factor essencial e recompensador cabe ao conhecimento”. Eis o desafio permanente que se coloca ao Brasil, país do Futuro e emergente no presente, a Portugal, país do Amanhã com Presente incerto, e aos outros países de língua portuguesa, países da esperança, alguns com sinais claros de forte desenvolvimento humano. José Veiga Simão Introdução Ao se falar em educação, gestão da informação e sustentabilidade fala se numa mudança de modelos mentais na busca incessante de passagem de trabalhadores mudos a equipes falantes. Max Weber assim se expressa: “O destino de uma época que comeu da árvore do conhecimento é ter de... reconhecer que as concepções gerais da vida e do universo nunca podem ser os produtos do conhecimento empírico crescente, e que os mais elevados ideais, que nos movem com mais vigor, sempre são formados apenas na luta com outros ideais que são tão sagrados para os outros quanto os nossos para nós”. A imagem do apertador de parafusos compulsivo, física e psicologicamente deformado pela hiperespecialização da fábrica taylorista, foi imortalizada por Charlie Chaplin, no filme Tempos Modernos e, até bem pouco tempo atrás, dramatizou o modelo de expectativas de desempenho associadas ao trabalho industrial. Hoje, porém, verificam-se drásticas mudanças nesse cenário, com a exigência crescente de um trabalhador pró-ativo e polivalente, capaz de responder e, em alguns casos, até mesmo antecipar-se à volatilidade do ambiente tecnológico e econômico e à realidade de equipes cada vez mais enxutas para compensar, com ganhos de produtividade, o estreitamento generalizado das margens de lucro. A base técnico-científica da era mecânica teve seu desenvolvimento acelerado em dois momentos de progressão, considerando-se a estrutura básica de um equipamento genérico: transmissão/ferramenta/ controle. O primeiro momento foi quando, progressivamente, a eletricidade (motores elétricos) tornou possível a separação entre mecanismos de transmissão e a ferramenta da máquina, simplificando os projetos mecânicos. Com o aparecimento da válvula, abriu-se a possibilidade da separação do terceiro elemento, o controle. No primeiro momento (transmissão), com a difusão do uso da eletricidade e dos motores elétricos, houve a expansão da organização e racionalização do trabalho, nos moldes tayloristas e fordistas, incluindo a divisão de funções propagadas por Fayol – planejamento, produção, manutenção – que caracterizaram a Era da Mecânica. Nessa era o trabalhador semiqualificado desempenhava tarefas rotineiras que não exigiam mais que uma preparação profissional elementar; o trabalhador qualificado e o técnico desempenhavam uma gama mais ampla de tarefas de maior complexidade, dentro de uma estrutura relativamente fixa de qualificação. No segundo momento (ferramenta), instaurado pelo aparecimento da válvula e, posteriormente, com o uso dos dispositivos de estado sólido, foi possível, progressivamente, separar o terceiro elemento da máquina – o controle, que pode ser programável e que vai ser alimentado por informações. É o advento da Era da Cibernética, que facilita e acelera o “transporte” da informação, com profundas implicações na organização do trabalho. Vale, cada vez menos, o que a pessoa diz saber fazer e, cada vez mais, o que ela é capaz de fazer em situação real de trabalho. A produção em massa (ou em grande escala) perde o privilégio de ser a grande diferença de competitividade predominante. A partir daí, desestabilizaram-se os sistemas de produção de trabalho, entendidos como “a combinação de tecnologias, de modos de organizar o trabalho e de tipos de qualificação”. Os gestores se aperceberam logo da produção em massa, em outras economias, tornava a tecnologia, por si só, variável insuficiente para garantir o diferencial de produtividade exigido pela concorrência. O tempo de resposta das equipes de trabalho frente a uma meta a cumprir passa a ser a variável estratégica,substituindo o controle dos movimentos, da destreza e velocidade de operação do trabalhador individual, relacionados à configuração de um posto de trabalho homem-máquina. Essa tendência teórica é denominada de “sistemas sócioprodutivos”. Manoel Pereira da Costa Capítulo 1 O MODELO QUADRIPOLAR APLICADO À EDUCAÇÃO MEDIADA POR TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO: UM ESTUDO EMPÍRICO Francisco Alberto Severo de Almeida Armando Malheiro da Silva Antonio Teodoro Ribeiro Guimarães Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade A 12 compreensão do fenômeno da educação, mediada pelas tecnologia da informação e comunicação, transcende os preceitos culturais, econômicos e políticos que norteiam os princípios e fundamentos relacionados à educação tradicional. A Educação tradicional, com a sua organização didáticopedagógica rígida e com a estrutura espacial e temporal limitada ao uso de infraestrutura física disponível, tem dificuldade para flexibilizar e ampliar as ações de ensino. Entretanto, já o fenômeno da educação à distância, mediada por tecnologia da informação e comunicação, alicerça-se em paradigmas que dimensionam o processo de ensino aprendizagem sob a ótica da educação sem fronteiras. Por isso, a Educação à Distância firma-se como a alternativa viável para enfrentar esse desafio da educação contemporânea de romper as barreiras de espaço e tempo. É a adoção da concepção de educação centrada na escola-função – a escola que vai ao encontro do aluno onde quer que se encontre, com a flexibilidade das condições de aprendizagem e fundamentos no auto-estudo, no estudo independente e orientado e com respeito ao ritmo de cada um. (MAFRA, 1998). Por outro lado, democratiza o acesso à educação a um número significativo de pessoas que não são assistidas pela educação na modalidade presencial. Para Lobo (1991), a educação à distância é estratégica para ampliar o acesso à educação, pois deve sedimentar e aprofundar o compromisso do projeto pedagógico com o projeto histórico, político e social de uma nação. Desta forma, hão de se pensar as contribuições que um modelo institucional de educação a distância, via web, implementado em uma Instituição Pública de Ensino Superior, traz para sedimentar e fortalecer as suas políticas educacionais. As contribuições da Educação à Distância - EAD são importantes para vencer o obscurantismo social forjado na falta de oportunidade de acesso à educação de uma parcela significativa da sociedade, mediante a oferta de cursos de graduação, pós-graduação e de educação continuada. Há de se pensar, também, na ampliação das novas fronteiras do conhecimento em relação às questões relacionadas à aplicação de modelos de educação mediada pela tecnologia da informação e comunicação, principalmente no que concerne à sua estrutura e funcionamento, desde a definição das diretrizes metodológicas e dos conteúdos interdisciplinares das disciplinas curriculares, à aplicação de recursos de multimídias, análise de consistência do material didático até a inserção e aplicação, via ambiente virtual de aprendizagem. Problema de pesquisa e objetivos Os paradigmas da educação, mediada por tecnologia da informação e comunicação, relacionados às questões de educação a distância, apresentam alguma associação com a performance do sistema de educação a distância via web ? Sendo este o problema ou a questão basilar da nossa pesquisa, fixamos como um objectivo geral já acima expremo e objectivos específicos que importa especificar: ◊Analisar como os paradigmas da educação, mediada por tecnologia da informação e comunicação, são percebidos pelos alunos de educação a distância via web; ◊Analisar os efeitos da aplicação dos paradigmas da educação, mediada por tecnologia da informação e comunicação, no sistema de educação a distância da UEG; ◊Verificar como os elementos que compõem os paradigmas da educação, mediada por tecnologia da informação e comunicação, relacionam-se com a performance dos sistema de educação à distância via web da UEG; ◊Identificar aspectos dos paradigmas da educação mediada, por tecnologia da informação, que possam ser objeto de aprimoramento das práticas de gestão do sistema de Educação a Distância, objeto deste estudo. O modelo quadripolar aplicado à Educação mediada por Tecnologia da Informação e Comunicação: um estudo empírico Neste contexto, as contribuições do presente estudo serão relevantes sob dois aspectos: sob o ponto de vista de avaliar o desempenho da gestão de um sistema de Educação via web e, também, no que se refere à aplicação de conhecimentos científicos baseados nas abordagens da teoria de sistemas e do método quadripolar de investigação para explicar o construto da educação mediada por tecnologia da informação e comunicação. Com base neste cenário, é que se processa a investigação sobre o modelo de educação a distância mediada por tecnologia da informação e da comunicação da Universidade Estadual de Goiás (UEG), Brasil, centrado no construto de uma abordagem do método quadripolar sob o enfoque da teoria de sistemas. Neste contexto, o objetivo da investigação é aprofundar o conhecimento sobre a relação entre a educação mediada tecnologicamente e a performance do sistema de educação à distância via web da UEG, com vistas a contribuir para o avanço do conhecimento das Ciências da Informação e da Comunicação e verificar como os elementos que compõem os paradigmas da educação, mediada por tecnologia relacionam-se com a performance dos sistema de educação a distância via web da referida universidade. 13 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 1. A Dinâmica Quadripolar: do método ao modelo 14 Com base no cenário exposto, ensaia-se algo que aguardava ser feito depois que três autores canadenses ligados às Ciências da Educação adaptaram a este campo científico a proposta pouco conhecida, se bem que não completamente ignorada, de três autores belgas e publicada pelas credenciadas Presses Universitaire de France (PUF) em 1974 – a proposta de um método pós-positivista e holítisco pensado para a investigação qualitativa em Ciências Sociais e Humanas1. E o que aguardava ser feito era simplesmente converter em modelo de aplicação a um construto estratégico – o Sistema de Ensino à Distância – as traves-mestras da metodologia quadripolar. Com efeito, em 1990, os referidos autores canadianos publicaram Recherche qualitative: fondements et pratiques, traduzida para português e editada em 1994 pelo Instituto Piaget (LESSARD-HÉBERT, GOYETTE & BOUTIN, 1994). O prefácio que apresenta a obra sublinha que os autores se empenharam em trazer para uma discussão profunda e séria a problemática da metodologia qualitativa, contrariando a ideia comum de que a atividade científica que explora problemas sociais e humanos é uma atividade “jornalística”, de “segunda categoria” ou até posta de lado sob pretexto de não ter ainda demonstrado a sua “credibilidade científica”. Na Introdução os autores começam logo por dizer que se interessam pelas questões metodológicas levantadas pela investigação qualitativa no campo da educação. E na busca de respostas mais eficazes e eficientes enfrentaram o debate epistemológico, urgente nesse campo, indo buscar a três autores belgas uma grelha de análise que lhes permitissem organizar, enquadrar e aperfeiçoar os dados relativos às abordagens qualitativas recolhidas no decurso da revisão de literatura: essa grelha tem, pois, por base um modelo geral de compreensão da metodologia da investigação. Trata-se do modelo quadripolar, ou seja, Paul De Bruyne, Jacques Hermam e Marc De Schoutheete (1974) conceberam a prática metodológica como um espaço quadripolar desenhado em um determinado campo de conhecimento.Eles situaram-se em nível de uma metodologia geral, ficando-se mais pelas directrizes orientadoras e não tanto pela inscrição numa perspectiva instrumental e tecnológica ou lógica, que reduziria a investigação a um conjunto de procedimentos ou etapas lineares (como as sete etapas de QUIVY; CAMPENHOUDT, 1998: 30). 1. Com quatro pólos: o epistemológico; o teórico; o técnico; e o morfológico. O processo de investigação desenvolve-se, pois, a partir de um campo estruturado nesses quatro pólos ou diferentes instâncias metodológicas, que o submetem a exigências próprias, sem se constituirem em momentos separados, antes articluando-se entre si em cada etapa de investigação alcançada (ideia extraída da contra-capa - DE BRUYNE; HERMAN, Jacques; DE SCHOUTHEETE, Marc, 1974). Figura 1 - A Quadripolaridade de um Método concebido para a investigação qualitativa imprescindível nas Ciências Sociais, em cujo campo largo a Ciência da Informação se insere Antes dos canadianos, já o livro de De Bruyne e colaboradores tinha atraído a curiosidade de investigadores e editores que o traduziram e publicaram no Brasil (DE BRUYNE, HERMAN, DE SCHOUTHEETE, 1977), chegando à quinta edição em 1991 com o título traduzido literalmente da edição francesa: Dinâmica da pesquisa em ciências sociais: os pólos da prática metodológica (Rio de Janeiro: Francisco Alves). Este sinal de interesse pela proposta quadripolar culmina na publicação recente de um manual de investigação de dois universitários brasileiros Gilberto de Andrade Martins e Carlos Renato Theophilo concecbido para as Ciências Sociais Aplicadas (MARTINS, THEOPHILO, 2007). Na introdução do manual os seus autores falam de um “modelo paradigmático” e salientam algo que é fundamental para se perceber a originalidade e importância da proposta quadripolar de De Bruyne e colaboradores: a complexidade da problemática nas Ciências Sociais Aplicadas impede que a investigação não seja reduzida a uma sequência de operações baseadas em procedimentos ou etapas imutáveis. Pelo contrário, a construção de um trabalho científico exige interpretações e voltas constantes entre as diferentes instâncias dos vários pólos. Gilberto Martins e Carlos Theophilo (2007) aos quatro pólos conhecidos decidiram acrescentar mais dois – pólo metodológico e pólo de avaliação -, num excesso didáctico que não se justifica, mas que não cabe aqui discutir (MARTINS; THEOPHILO, 2007:4) As vantagens da metodologia quadripolar decorrem do pensamento pós-positivista, O modelo quadripolar aplicado à Educação mediada por Tecnologia da Informação e Comunicação: um estudo empírico Fonte: SILVA, 2002: 29. 15 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 16 sistémico e construtivista que lhe é subjacente e convém, por isso, que nos detenhamos um pouco sobre a relação desta base filosófica com a necessidade de construirmos um modelo flexível e holístico aplicável à EAD. A Teoria Geral de Sistemas veio revolucionar a maneira de se conhecer e compreender os fenômenos sociais. A principio é vista como o contraponto do pensamento lógico, que se alicerçou nos princípios cartesianos da evidência, análise, síntese e de enumeração, na representação de suas partes como o somatório que forma o todo. Entretanto, a teoria de sistemas com os seus princípios fundamentados em conceitos de que o todo não se constitui da simples somatória das partes, revoluciona a forma de pensar os fenômenos sociais. A corrente da teoria de sistemas sustenta idéias contrárias a dialética cartesiana, onde o todo é representado pelo conjunto de suas partes e as suas relações e interações entre si e o ambiente (BERTALANFFY, 1975; CHURCHMAN, 1971; CAPRA ,1999 e VASCONCELLOS, 2007). Assim, o pensamento sistêmico é formado pela compreensão analítica do conjunto das partes inter-relacionadas que constituem um processo dinâmico de interação entre as diversas divisões que tem um determinado fenômeno. No pensamento sistêmico busca-se a compreensão de um fenômeno a partir do todo que ele representa e não pelo comportamento de suas partes, sendo, portanto, uma antítese ao pensamento cartesiano onde as leis que governam o comportamento do todo são consideradas fundamentais (RAPOPORT, 1976, p. 27). Le Moigne (apud VIEGAS, 1977: 8-23) apresenta um paralelismo entre a visão cartesiana e sistêmica que retrata essa dicotomia. Quadro 1 - Visão Cartesiana e Visão Sistêmica: um paralelismo Todavia, a dualidade entre o pensamento cartesiano e o pensamento sistêmico, como forma de pensar dos educadores, apresenta-se como uma barreira para a compreensão dos fenômenos educacionais nas organizações modernas, principalmente quando se trata da Educação à Distância. O universo das organizações modernas tem sua gênese no modelo de pensamento cartesiano. Daí que ao se materializarem os processos educacionais em modelos lógicos prescritivos, fundados nos preceitos da educação tradicional, bloqueiase a capacidade dos profissionais da educação compreenderem o universo da educação à distância sob o prisma da abstração. Pensar a EAD sob o prisma de uma dicotomia — da dialética cartesiana ou sistêmica — transcende as perspectivas da compreensão dos fenômenos educacionais, pois, procedendo assim, direciona-se o pensamento para a compreensão das realidades distintas sob pontos de vistas específicos. O modelo lógico (cartesiano) descreve a realidade pelas partes sem abranger o todo, portanto, é reducionista; já o modelo sistêmico amplia essa abrangência pela visão do todo. Mas as duas abordagens muitas vezes não tornam possível a operacionalidade dos modelos concebidos devido a incapacidade do educador de entender e de construir as relações e interações dos fenômenos referenciados, seja pela descrição lógica ou de uma abstração cognitiva de uma realidade observada. São construtos eivados de um viés centrado na forma de pensar lógica com o substantivo (a razão) ou forma de pensar abstrata como o verbo (agir) para conceberem seus modelos de gestão da educação. As abordagens da educação e suas principais correntes ensejam essa dualidade: positivismo versus construtivismo. Entretanto, faz-se mister entender essas diferenças metodológicas dessa dualidade entre a dialética cartesiana e a sistêmica para a compreensão adequada dos fenômenos relacionados à educação tradicional e à distância. São, todavia, métodos científicos complementares na construção dos modelos educacionais. Enquanto a abordagem sistêmica, pela sua interpretação das interações orgânicas e sociais de determinados fenômenos, busca a compreensão do todo e permite a construção de modelos abstratos que demonstram todas as interações entre um conjunto hierarquizado de sistemas, a abordagem cartesiana, pela perspectiva substantiva da razão, O modelo quadripolar aplicado à Educação mediada por Tecnologia da Informação e Comunicação: um estudo empírico Fonte: Viegas (1977, p.8-23) 17 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 18 permite a operacionalidade e a descrição desses modelos abstratos em representações lógicas da realidade observada. A necessidade de construção de um modelo que satisfaça esses requisitos filosóficos essenciais leva-nos a entrar, finalmente, no texto da proposta quadripolar original com uma brevíssima chamada de atenção para o Prefácio do professor da Universidade de Louvaina, Jean Ladrière, que considerou o livro “obra de reflexão, esclarecimento de um caminho, esforço prospectivo, contribuição à autoconstituição da razão científica, mas, verdadeiramente, pensada. Por detrás do discurso sobre o método anuncia-se, a palavra do fundamento” (DE BRUYNE; HERMAN & SCHOUTEETE, 1974: 19). E destaca um aspecto relevante que não pode passar desapercebido: a conceção epistemológica subjacente à proposta metodológica dos três autores não é a de uma doutrina analítico-normativa que poderia se apresentar como espécie de cânone da razão científica. É, antes, uma tomada de consciência metodológica que, por ser animada por um cuidado eficaz de radicalidade, tende a estar sempre inacabada, a ficar suspensa de uma exigência indefinida de autocompreensão ou a permanecer sempre insatisfeita. De Bruyne e colaboradores atacaram o problema delicado e central de discutir a cientificidade das Ciências Humanas e Sociais, rompendo com o complexo que os praticantes destas disciplinas se habituaram a sofrer em face do poder “objectivo e esmagador” das ciências naturais, capazes de imporem critérios e formalismos metodológicos. A alternativa não reside, segundo eles, na cópia, mas na busca de uma autonomia da pesquisa científica, efectiva e própria, em articulação com o princípio construtivo da interdisciplinaridade. Seguindo por aqui chegaram à ideia de que “a autonomia da prática científica, autonomia cuja precaridade é aparente, pode ser concebida do ponto de vista metodológico como a articulação de diferentes instâncias, de diferentes pólos determinando um espaço em que a pesquisa se apresente como implicada num campo de forças, submetida a certos fluxos, a certas exigências internas” (DE BRUYNE; HERMAN & SCHOUTHEETE, 1974: 34). Distinguiram, por isso, quatro pólos metodológicos no campo da prática científica: o epistemológico, o teórico, o morfológico e o técnico. Segundo os autores, o primeiro e decisivo pólo em toda a dinâmica de pesquisa é o epistemológico que “exerce uma função de vigilância crítica” (DE BRUYNE; HERMAN & SCHOUTHEETE, 1974: 34). Ao longo da investigação, garante da objetivação – ou seja da produção – do objeto científico, da explicação das problemáticas da pesquisa. Encarrega-se de renovar continuamente a rotura dos objetos científicos com os do senso comum. Em última instância, decide as regras de produção e de explicação dos fatos, da compreensão O modelo quadripolar aplicado à Educação mediada por Tecnologia da Informação e Comunicação: um estudo empírico e da validade das teorias (DE BRUYNE; HERMAN &SCHOUTHEETE, 1974: 34). Tem na sua órbita uma “gama de processos discursivos”, de “métodos” demasiado gerais que impregnam com a sua lógica as iniciativas do investigador. São, nomeadamente, a dialéctica, a fenomenologia, a lógica hipotético-dedutiva, a quantificação – processos que não se excluem mutuamente, alguns até podem ser omnipresentes, outros podem nem aparecer em pesquisas específicas. O pólo teórico guia a elaboração das hipóteses e a construção dos conceitos. È o lugar da formulação sistemática dos objetos científicos. Propõe regras de interpretação dos fatos, de especificação e de definição das soluções provisoriamente dadas às problemáticas. Lugar, enfim, da elaboração das linguagens científicas e que determina o movimento da conceitualização (DE BRUYNE; HERMAN & SCHOUTHEETE, 1974: 35) e que é vizinho de “quadros de referência” que fornecem inspirações e problemáticas provenientes das contribuições teorético-práticas das disciplinas e dos “hábitos” adquiridos. Estes quadros de referência desempenham um papel paradigmático implícito. Eis alguns: o “positivista”, o “compreensivo”, o “funcionalista” e o “estruturalista”. O pólo morfológico é a instância do enunciado das regras de estruturação, de formação do objecto científico, impondo-lhe uma certa figura ou forma, uma certa ordem entre os seus elementos. Permite colocar um espaço de causalidade em rede em que se construam os objetos científicos, seja como modelos/cópias, seja como simulacros de problemáticas reais (DE BRUYNE; HERMAN & SCHOUTHEETE, 1974: 35). Suscita, também, diversas modalidades de quadros de análise, diversos métodos de ativação dos elementos constitutivos dos objetos científicos: a tipologia, o tipo-ideal, o sistema, os modelos estruturais. Estas diversas formas de configuração comprometem, na maior parte dos casos, a pesquisa nas escolhas mutualmente exclusivas. A causalidade é pensada de maneira particular em cada um destes quadros de análise. O pólo técnico controla a recolha dos dados, esforça-se por constatá-los para pô-los em confronto com a teoria que foi suscitada. Exige a precisão na constatação, mas não garante, por si só, a exactidão (DE BRUYNE; HERMAN & SCHOUTHEETE, 1974: 3536). Estes modos de investigação indicam escolhas práticas pelas quais os investigadores optam por um tipo particular de encontro aos fatos empíricos. A interacção dialética dos diferentes pólos constitui a essência do Método proposto que inspira concretamente a modelização que aqui opracionalizamos tendo em conta a implementação aberta e sistémica da EAD. Método/teoria e modelo são conceitos distintos e cabe, aqui, lembrá-lo sumariamente (SILVA, 2010). 19 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 20 No verbete modelo do DeltCI – Dicionário Eletrônico de Terminologia em Ciência da Informação, a estratégia seguida estava limitada à partida pela meta que se pretendia atingir no imediato: colocar o conceito operatório de modelo no arsenal teóricometodológico da Ciência da Informação, campo emergente e carente de apropriações teórico-conceptuais, devidamente ajustadas aos seus temas e problemas específicos, e até de formulações teórico-conceituais próprias. Para isso, convém partir do campo envolvente das Ciências Sociais e estabelecer os elos e as especificações mais adequadas. No entanto, a abordagem é demasiado curta e restrita, quando é certo que modelo e modelização constituem um filão rico que acompanha o desenvolvimento científico desde meados do séc. XIX, merecendo debates e reflexões epistemológicas aprofundadas. E qual o panorama a este respeito? A escassez domina, ainda que date de 1969 um pequeno livro do filósofo francês Alain Badiou intitulado Le concept de modèle, introduction à une épistémologie matérialiste des mathématiques (BADIOU, 1969), que colocou o tema no campo das discussões sobre o projecto estruturalista nas Ciências Sociais e Humanas e fez que o conceito de modelo chamasse a atenção para uma questão filosófica essencial: a relação instituída pela Ciência Moderna entre epistemologia e ontologia e que se multiplica em várias interrogações como sejam “que é um modelo?”, “que “significa modelizar um problema?”, “estas expressões tem o mesmo sentido em lógica que em física?”, “o mesmo sentido em biologia que nas engenharias?”, “o mesmo sentido em climatologia que em economia?”, “o mesmo sentido nas ciências do ambiente que nas ciências políticas?”. Na resposta a esta e a outras questões se desenlaça e se vai esclarecendo os meandros da questão essencial acima enunciada. Aqui importa, sobretudo, frisar a distinção entre teoria, modelo e método, sendo que em Ciências Sociais conceber e operacionalizar um modelo não prescinde de uma base teórica clara, assim como não se esgota numa praticidade meramente instrumental. A teoria emerge como um instrumento de explicação geral dos fenômenos que visa responder, uma vez corretamente formulada, a múltiplas questões relativas “sistemas concretos diversos”, enquanto modelo cinge-se, com frequência, a objectivos precisos e bem delimitados. Mas, como enfatiza o autor, numa grande parte da literatura científica moderna, esbateu-se e até tende a desaparecer a diferença semântica, existindo, antes, uma confusão para a qual muito contribuiu o empirismo, depois da Renascença, e o cepticismo “que devia inevitavelmente resultar das conclusões duma boa parte da filosofia das ciências e da epistemologia quanto à dificuldade de alcançar certezas indiscutíveis quando se trata de conhecimentos científicos e da sua conformidade a uma realidade última e unívoca” (DELATTRE, 1992: 270). O relativismo acabou propiciando o uso extensivo do termo “modelo”, entendido, então, como “uma espécie de understatement do conceito de teoria” (DELATTRE, 1992: 270). Posto isto, em termos genéricos, sublinha-se que a metodologia quadripolar serviu não apenas de inspiração mas de referencial à iniciativa legitima e necessária de se encontrar um instrumento teórico-prático – um modelo - que ajude a implementar e a rever em permanência a EAD como sistema formativo. É, sem dúvida, importante salientar o papel das novas tecnologias para a democratização da Educação a Distância, pois amplia o universo do conhecimento e insere o aluno como sujeito de seu processo de aprendizagem, com a vantagem de que ele também pode descobrir a forma de tornar-se sujeito ativo da investigação e do compartilhar de conteúdos. Entretanto, cabe ressaltar que os sistemas de e-learning são ferramentas tecnológicas importantes para o desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem nos sistemas de educação à distância - são meios e não fins, propriamente ditos; posto que a educação à distância constitui-se em um processo que transcende para além do ensino à distância. Enquanto o ensino à distância centra-se no processo da aprendizagem, da socialização da informação e da instrução, a educação assenta-se no processo da formação humana, o saber pensar, criar, inovar e a construção do conhecimento (MAFRA, 1998). Neste sentido, o sistema e-learning constitui-se em uma parte desse todo, a que denominamos de educação mediada por tecnologia da informação e comunicação. Daí a necessidade de se ver a Educação a Distância sob o prisma da teoria de sistemas. Desta forma, ao tratar de educação a distância mediada por tecnologia da informação e comunicação, pode-se ter como referência, para uma determinada realidade educacional observada, o construto Sistema de Educação a Distância sob o enfoque do modelo quadripolar. O modelo quadripolar aplicado à Educação mediada por Tecnologia da Informação e Comunicação: um estudo empírico 2 . Um Modelo Quadripolar para a EAD 21 Figura 2 - Sistema de Educação a Distância sob o Enfoque do Método Quadripolar Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Fonte: Autores 22 O Pólo Epistemológico tem como pressuposto o desenvolvimento de uma ação diagnóstica fundamentada na atitude questionadora e interrogativa quanto às questões temáticas a serem abordadas e os pré-requesitos pedagógicos necessários para a definição do objeto do conhecimento a ser explorado na organização e construção de uma unidade do saber curricular. Por outro lado, centra-se em elementos que conduzem à identificação de métodos e práticas relacionadas com o processo ensino aprendizagem para atender aos preceitos do projeto pedagógico, em referência ao conjunto de habilidades e competências a serem transmitidas ao discente. O Pólo Teórico, em referência às diretrizes metodológicas do componente curricular, estabelece o conjunto de abordagens teóricas e práticas para a fundamentação da unidade do saber curricular, estabelecendo uma sistemática trans e interdisciplinar para os conteúdos temáticos dos componentes curriculares. O Pólo Técnico é o referencial de análise da pertinência e da consistência da unidade do saber curricular, quanto à aplicação da trans e interdisciplinaridade aos conteúdos temáticos da componente curricular e a interatividade de uso dos recursos de multimídias. O Pólo Morfológico fundamenta-se na teleologia da aprendizagem em ambiente virtual via web. A finalidade do ambiente virtual de aprendizagem é estabelecer condições propícias para o desenvolvimento de um espaço que promova a interlocução e a interação entre o tutor e o discente, como o uso de ferramentas de multimédias, de tal forma a promover, de maneira satisfatória, o processo de ensino aprendizagem. Portanto, a forma de pensar sistêmica a educação à distância, sob o prisma do método quadripolar e através de um modelo correlato, amplia a compreensão dos fenômenos da educação mediada por tecnologia da informação e comunicação ao introduzir a proposição de unificação entre a intuição e a razão, como uma síntese derivada do resultado analítico da razão observante, expressa na ótica de sistema, e que representa a construção de modelos abstratos de realidades observadas e a razão operante, a lógica, que descreve analiticamente a estrutura lógica do modelo abstrato observado. O desenho formal da investigação, para o levantamento de dados primários, foi estruturado no Sistema de Educação a Distância a partir do modelo quadripolar com o objetivo de identificar, sob o ponto de vista dos alunos de EAD, evidências, isto é, se há associação entre os paradigmas da educação mediada por tecnologia da informação e comunicação e a performance do sistema de educação à distância via web da UEG. Figura 3 - Paradigmas da Educação à Distância mediada por tecnologia da informação e comunicação e a performance do respectivo sistema Fonte: Autores O modelo quadripolar aplicado à Educação mediada por Tecnologia da Informação e Comunicação: um estudo empírico 2.1.O Modelo Aplicado à Investigação 23 Os resultados da investigação empírica foram analisados mediante a utilização da estatística inferencial. Os dados foram obtidos por intermédio da aplicação do questionário estruturado aos alunos participantes do curso de capacitação para elaboração de material didático, na modalidade de educação à distância via web, da UEG. A análise foi baseada na aplicação da técnica de Correlação de Pearson para determinar o grau de associação entre as variáveis estudadas. Aplicou-se, também, a correlação de Pearson e o alfa Cronbach para a validação do instrumento de investigação aplicado, bem como mensurar o grau de confiabilidade interna dos dados coletados. Do universo dos alunos pesquisados obteve-se o retorno de 84 (oitenta e quatro) questionários. Descartaram-se 4 (quatro) questionários por erros e omissões no preenchimento do instrumento de coleta de dados. Portanto, a amostra compõe-se de 72, 73% dos participantes do referenciado curso, o que nos permite inferir a representatividade da amostra. O grupo não respondente é homogêneo ao grupo respondente, considerando os critérios estabelecidos para definição da amostra, ou seja, alunos participantes do curso de Elaboração e Produção de Material Didático-Pedagógico. O teste de validação do questionário, medido por intermédio do Alfa Cronbach, obteve uma classificação de grau de consistência bom. Esse resultado confirma a validação e confiabilidade do instrumento de coleta de dados. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 2.2 Análise das Correlações entre as Variáveis 24 Confirma-se a existência do grau de associação positiva entre as variáveis do construto, paradigmas da educação mediada por tecnologia da informação e comunicação e a performance do sistema de educação a distância via web, a partir do modelo conceitual denominado sistema de educação à distância sob o enfoque do modelo quadripolar. Para inferir o grau de associação entre as variáveis explicativas, paradigmas da educação mediada por tecnologia da informação e comunicação (VI) e as variáveis explicadas de performance do sistema de educação a distância via web (VD), fez-se a correlação múltipla entre as variáveis independentes designadas diretrizes metodológicas para disciplina curricular (VI.1); dinâmica interdisciplinar da disciplina curricular (VI.2); pertinência interdisciplinar da disciplina curricular (VI.3) ; teleologia da aprendizagem virtual (VI.4) e as variáveis dependentes nomeadas de método de ensino (VD. 1), material didático pedagógico (VD. 2), recursos multimídias (VD. 3) e tutoria (VD. 4) . Desta análise obtiveram-se os seguintes resultados: O modelo quadripolar aplicado à Educação mediada por Tecnologia da Informação e Comunicação: um estudo empírico As correlações são todas significativas para p ≤ 0, 05, embora com intensidades diferenciadas entre elas. Portanto, infere-se que há associação positiva entre as variáveis independentes: diretrizes metodológicas para disciplina curricular (VI. 1), dinâmica interdisciplinar da disciplina curricular (VI.2), pertinência interdisciplinar da disciplina curricular (VI.3); teleologia da aprendizagem virtual (VI.4) e as variáveis dependentes de método de ensino (VD. 1), material didático pedagógico (VD. 2), recursos multimídias (VD. 3) e tutoria (VD. 4). A associação positiva da variável explicativa, diretrizes metodológicas para disciplina curricular e para as demais variáveis explicadas sinaliza que o mapa conceitual da disciplina e a designação dos recursos de multimídias têm influência direta nas variáveis de performance do sistema de educação via web. Desta forma, pode-se inferir o grau de relevância do pólo epistemológico para o sistema de educação a distância via web; A variável explicativa dinâmica interdisciplinar da disciplina curricular tem associação positiva com as demais variáveis explicadas. Portanto, há evidências que a fundamentação teórica e prática construída, a partir das diretrizes metodológica da disciplina curricular, tem influência direta nas variáveis de performance do sistema de educação à distância via web. Por isso, infere-se o grau de relevância do pólo teórico para o sistema de educação à distância; A pertinência interdisciplinar da disciplina curricular, variável explicativa, está associada às demais variáveis explicadas de forma positiva. Desta forma, a análise de consistência interdisciplinar do material didático pedagógico e a interatividade interdisciplinar das multimídias têm influência direta nas variáveis de performance do sistema de educação à distância via web. Razão pela qual se pode inferir o grau de relevância do pólo técnico para o sistema de educação à distância; Há associação positiva entre a variável explicativa ambiente virtual da aprendizagem e as demais variáveis explicadas. Portanto, o ambiente virtual de aprendizagem tem influência direta nas variáveis de performance do sistema de educação à distância via web. Dessa forma, infere-se o grau de relevância do pòlo morfológico para o sistema de educação a distância como na Tabela 1. 25 26 Fonte: Autores Tabela 1 – Matriz de correlação múltipla das variáveis independentes de paradigmas da educação mediada por tecnologia da informação e as variáveis dependentes de performance do sistema de educação a distância via web, em nível de significância de 5% Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade O modelo quadripolar aplicado ao sistema de educação à distância é uma proposta exequível, que retrata a perspectiva de integração da educação mediada por tecnologia da informação e comunicação e as teorias e práticas da educação. Os dados desta investigação corroboram essa assertiva, pois o construto sistema de educação à distância sob enfoque do modelo quadripolar se mostra consistente, quando submetido a testes estatísticos para a determinação do grau de associação entre as variáveis explicativas e as explicadas do construto analisado. A seguir, os pontos de destaque da investigação: Confirma-se a validade do construto sistema de educação à distância sob o enfoque do modelo quadripolar, mediante aplicação dos paradigmas da educação mediada por tecnologia da informação e comunicação: diretrizes metodológica para disciplina curricular (polo epistemológico), dinâmica interdisciplinar para disciplina curricular (polo teórico), pertinência interdisciplinar da disciplina curricular (pólo técnico) e teleologia da aprendizagem virtual (pólo morfológico); Os paradigmas da educação, mediada por tecnologia da informação e comunicação, exercem influência positiva na performance do sistema de educação à distância via web em relação às questões focada no método de ensino, no material didático pedagógico, nos recursos de multimédia e na tutoria;. Na percepção dos alunos há evidências de que a organização e estruturação de um curso sob o enfoque do modelo quadripolar tem efeito positivo no processo de ensino aprendizagem em cursos na modalidade à distância via web . Finalmente, os resultados da investigação sinalizam com evidências que o sistema de educação à distância sob o enfoque do modelo quadripolar é factível, tendo como parâmetro a metodologia aplicada pela UEG – Brasil, nos cursos de modalidade à distância via web. Porém, esses resultados obtidos nesta investigação não devem ser universalizados, sem antes promover uma ampla aplicação em outros sistemas de educação na modalidade à distância. Por isso, recomenda-se a reaplicação dessa investigação em outras Instituições de Ensino para servir de base comparativa para novos estudos. REFERÊNCIAS ALMEIDA, Francisco A.S; KRUGLIANSKAS, Isak; ARANTES, Luis A; GUIMARÃES, Antonio T.R.(2009). O pensamento sistêmico: uma forma de pensar a gestão da tecnologia da informação. In: Governança Estratégica, Redes de Negócios e Meio Ambiente: fundamentos e aplicações. Coleção Luso-brasileira, Anápolis: O modelo quadripolar aplicado à Educação mediada por Tecnologia da Informação e Comunicação: um estudo empírico Considerações Finais 27 Universidade Estadual de Goiás. BERTALANFFY, Ludwing Von. (1976). Teoria dos sistemas. Rio de Janeiro, FGV. Série Ciências Sociais. CAPRA, Fritjof. (1998). O ponto de mutação – A ciência, a sociedade e a cultura emergente. São Paulo, Cultrix. CHURCHMAN, C. West. (1971) Introdução a teoria de sistemas. Petrópolis, Vozes. DE BRUYNE, Paul; HERMAN, Jacques; & DE SCHOUTHEETE, Marc (1974). Dynamique de la recherche en sciences sociales: les pôles de la pratique méthodologique. Paris, Presses Universitaires de France. DE BRUYNE, Paul; HERMAN, Jacques; DE SCHOUTHEETE, Marc (1977). Dinâmica da pesquisa em ciências sociais: os pólos da prática metodológica. Prefácio de Jean Ladrière. Tradução de Ruth Joffily. Rio de Janeiro, Livraria Francisco Alves Editora S.A. DELATTRE, Pierre (1992). Teoria/Modelo. In Enciclopédia Einaudi. Vol. 21 – Método-Teoria/Modelo. Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, p. 223-287. KATZ, D; KAHN, R. (1987) . Psicologia social das organizações, 3 ed., São Paulo Atlas. LESSARD-HÉBERT, Michelle; GOYETTE, Gabriel; BOUTIN, Gérald (1990). Investigação qualitativa: fundamentos e práticas. Lisboa, Instituto Piaget. LOBO NETO, Francisco José da Silveira. (1991) A filosofia do ensino à distância e seu papel social. In: Educação a Distância, Roberto /Balalai (org.), Niteroi – RJ, Centro Educacional de Niterói. MAFRA, Mário S. (1998). Educação a Distância Conceitos e Preconceitos. In: Educação Básica Pós LDB, Eurides Brito (org). São Paulo: Pioneira. RAPOPORT, A. (1976) Teoria de sistemas. Rio de Janeiro, FGV. Série Ciências Sociais. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade SILVA, A. M. (2009). A Gestão da informação na perspectiva da pesquisa em ciência da informação: retorno a um tema estratégico. In: Governança Estratégica, Redes de Negócios e Meio Ambiente: fundamentos e aplicações. Coleção Luso-brasileira. Anápolis: Universidade Estadual de Goiás. 28 _______________(2006) A informação: da compreensão do fenômeno e construção do objeto científico. Porto, Edições Afrontamento. ________________(2010). Modelos e modelizações em ciência da informação: o modelo eLit.pt e a investigaçãoo em literacia informacional. Prisma.Com, Porto, 13. ISSN 1646-3153. Url: http://revistas. ua.pt/index.php/prismacom/article/view/785 VASCONCELLOS, M. J. E. (2002). Pensamento sistêmico, o novo paradigma da ciência, 6ª ed. Campinas, SP, Papirus. VIEGAS, Waldir. (1977). Visão cartesiana e a visão sistêmica: um paralelismo. Brasília: Unb, pp.8-23, s/d memeo Capítulo 2 O PAPEL DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIÁS E O DESENVOLVIMENTO LOCAL Yara Fonseca de Oliveira e Silva Carla Conti de Freitas Julia Paranhos Lia Hasenclever Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade A 30 sociedade moderna tem como recurso fundamental o conhecimento e, nessa conjuntura socioeconômica, discute-se a condição da universidade, suas formas de produção e difusão do conhecimento e sua contribuição para o desenvolvimento do país. A universidade, assim como a empresa, é um dos principais atores estratégicos no contexto de reestruturação produtiva e inovação em países em industrialização na medida em que o progresso técnicocientífico é considerado importante para o desenvolvimento. Este capítulo discute o papel da universidade e sua parceria com a empresa por se considerar que tanto a universidade quanto a empresa são necessárias para o fortalecimento dos sistemas nacionais de inovação nos países em desenvolvimento.O foco deste estudo é a Universidade Estadual de Goiás (UEG) e isso se justifica pela urgência da discussão do papel desta universidade na sociedade, cada vez mais baseada no conhecimento, e de suas parcerias que visam a contribuir com o desenvolvimento local. Para isso, a partir da pesquisa que será brevemente descrita aqui, investiga-se o tipo de estrutura e de práticas da UEG e se estas se aproximam (ou não) do modelo de universidade empreendedora, isto é, de universidade que contribui diretamente para o desenvolvimento socioeconômico de uma região. Este estudo, ao considerar os papéis que diferentes atores como governo, universidade e empresa representam no desenvolvimento econômico e social do Estado, busca compreender como a UEG tem consolidado sua proposta de ampliação do acesso ao ensino superior em sua primeira década e como contribui para o desenvolvimento do Estado de Goiás no contexto de reestruturação produtiva e do Sistema Regional de Inovação. Nesse sentido, analisa-se a UEG em seu contexto, como caso único a ser investigado, para buscar definir seu papel como instituição universitária e sua interação e relação com o desenvolvimento local. Entende-se que a UEG resulta de uma política de governo e que a sua criação se deu a princípio em atendimento a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN - 9.394/96, que preconizava a obrigatoriedade do ensino superior a todo professor da educação básica. Essa iniciativa ao possibilitar acesso aos cursos superiores, principalmente 1. O modelo da Hélice Tríplice A universidade tem sido redefinida por várias abordagens que a compreendem de diferentes maneiras. Para abordagem da hélice tríplice, a universidade é entendida como O papel da Universidade Estadual de Goiás e o Desenvolvimento Local de licenciaturas, garantiu a formação dos professores no Estado e, portanto, provocou melhorias na condição social e, consequentemente, diminuiu o atraso econômico. Assim, considera-se que o governo, ator central da consolidação da UEG, criou uma instituição que contribuísse com o desenvolvimento econômico local, mas em sua gênese não vislumbrou a cooperação com as empresas locais, pois não investiu em sua infraestrutura científica inicial e pouco desenvolveu a criação, a produção e o uso do conhecimento para um futuro sistema regional de inovação. No decorrer de sua evolução, a UEG tem apresentado uma mudança incremental por estar à sombra das políticas públicas e por ser uma instituição que tem tido interação direta com o desenvolvimento local, neste processo de reestruturação produtiva que a direciona para uma proposta de nova economia, novo ensino e perspectivas políticas a partir de um diálogo entre esses atores, governo e empresa. Este estudo utiliza-se de uma abordagem sistêmica, presente nas teorias evolucionária e institucionalista que consideram a análise histórica, a importância das instituições e também a compreensão do relacionamento dos atores envolvidos no contexto de mudanças tecnológicas e do papel que a inovação assume no desenvolvimento socioeconômico local. Adota-se, então, o modelo da hélice tríplice, a partir dos autores Etzkowitz (1995) e Leydesdorff (2000) que defendem a universidade como atora do desenvolvimento econômico e o relacionamento de três esferas: a universidade, empresas e o governo. O caminho metodológico inclui um processo de investigação qualitativa. Conforme Yin (2001), essa metodologia pode ser classificada de acordo com o seu conteúdo e objetivo final, sendo assim, considera-se a adoção dos dois tipos caracterizados por descritivos e interpretativos. Quanto à amostra, consideram-se as quarenta e duas Unidades Universitárias da UEG no primeiro momento e, posteriormente, selecionam-se as Unidades Universitárias que apresentam nas atividades de ensino, pesquisa e extensão, relacionamento com as empresas locais. A população e o universo estudados incluem os profissionais da UEG e os atores que se relacionam com a universidade e com o local. Como dados secundários são considerados os documentos institucionais (Plano de Desenvolvimento Institucional, Projeto Político Pedagógico e outros) e como dados primários, as observações, as entrevistas estruturadas e os questionários nas três esferas consideradas. 31 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 32 ator do desenvolvimento econômico e criadora de empresas (Etzkowitz; Leydesdorff, 1995; 2000). Outras abordagens também discutem o papel da universidade como a abordagem latino-americana que a considera ator do desenvolvimento social (Dagnino, 2003; Arocena; Sutz, 2005) e a abordagem dos sistemas de inovação que a considera formadora de recursos humanos qualificados e parceira das empresas para a inovação (Lundvall, 2002; Rosenberg; Nelson, 1994; Mowery; Sampat, 2005). A abordagem principal que sustenta este estudo e que será discutida a seguir é a do modelo de hélice tríplice, a partir do referencial de Etzkowitz e Leydesdorff (1995; 1997; 1998; 2000) que formalizaram este modelo para explicar o relacionamento entre os atores. Esse modelo se constitui de três esferas de influências que representam as universidades como criadoras de conhecimento, as empresas como os usuários do conhecimento e o governo que através de suas políticas e agências impõe e influenciam regulação e estimula ações e atividades empreendedoras. Assim, os estudiosos adicionam um terceiro papel à universidade que é o de desenvolvimento econômico e social além dos papéis de ensino e pesquisa. Esse modelo é definido como não-linear e, ao propor a interação entre universidade, empresa e governo, visa a melhorar as condições para a inovação numa sociedade baseada no conhecimento. Conforme Etskowitz e Leyderdorff (1998, p. 198), “a hélice tríplice é principalmente um modelo para analisar a inovação em uma economia baseada no conhecimento”. Portanto, o sistema de inovação pode ser representado por esse modelo que surge em resposta ao crescimento técnico-científico e sua importância para o desenvolvimento. No contexto da década de 1990, em que o mundo se organiza para pensar o futuro de seus países e, portanto, o seu desenvolvimento econômico, a tendência foi reorganizar os papéis das instituições e propor estratégias de desenvolvimento baseadas no conhecimento. Assim, a mudança na sociedade atual tem sido motivada pela relevância do conhecimento, ou seja, as estratégias de desenvolvimento se baseiam no conhecimento e não mais apenas em estratégias do setor industrial ou governamental. A sociedade atual conta com uma parte de sua infraestrutura baseada na economia do conhecimento e daí a relevância do papel da universidade (Etskowitz e Leyderdorff, 2000). Diante disso, as definições sobre o papel da universidade, que por um longo período manteve-se focada em ensino e pesquisa, sugerem uma reorganização que inclua a missão empreendedora e um dos argumentos para essa transição é que as atividades empreendedoras contribuem com o desenvolvimento nacional e regional na sociedade O papel da Universidade Estadual de Goiás e o Desenvolvimento Local baseada nos avanços tecnológicos e no conhecimento. Nesse sentido, o empreendedorismo acadêmico é, por um lado, uma extensão das atividades de ensino e pesquisa e, por outro lado, uma proposta de inversão de papéis quanto a capacidade de transferência de tecnologia, tradicionalmente desempenhado pela indústria, que passa a ser também atribuído à universidade. É evidente que a discussão a partir desse modelo provoca divergências entre estudiosos da academia, pois, de um lado, alguns teóricos sinalizam a perda da condição de criticidade da universidade caso assuma o papel de empreendedora, submetendo-se à lógica do mercado e, por outro lado, há os que defendem que não há como separar ensino, pesquisa e atividades de negócio, reafirmando o paradigma empreendedor esperado em diversos cenários acadêmicos (Etskowitz e Leyderdorff, 2000). O modelo de hélice tríplice pode ser usado para interpretar o processo de mudança interna da universidade e, de certa forma, estimula a cultura empreendedora dessa instituição. A concepção de universidade empreendedora apresenta uma estrutura e uma função acadêmica que é revisada através do alinhamento do desenvolvimento econômico com as missões da academia como pesquisa e ensino. O paradigma empreendedor não é confinado às novas tecnologias inventadas ou às pesquisas intensivas nas universidades porque ele necessita de relacionar-se tanto com o ensino quanto com a pesquisa universitária, gerando inovações. Conforme Etzkowitz (2000), a emergência da universidade empreendedora é uma resposta para a crescente importância do conhecimento no sistema de inovação nacional e regional e o reconhecimento de que a universidade é ator principal, um inventor criativo e um agente de transferência tanto do conhecimento quanto da tecnologia. Os estudos de Etzkowitz e Leydesdorff (1998) afirmam que o modelo da hélice tríplice é apropriado para abordar o atual sistema de pesquisas em seu contexto social e destacam a importância dos pesquisadores das universidades como elementos chave que influenciam o resultado da transferência do processo de tecnologia no desenvolvimento econômico regional, pois a ciência e a tecnologia têm assumido um papel essencial para o desenvolvimento dos países e que os sistemas de inovação têm sido historicamente importantes no que se referem ao alcance de competitividade nacional. A construção do modelo pode ser interpretada a partir da evolução do conceito, sendo que, inicialmente, houve a definição das esferas institucionalmente, que são o estado, indústria e a universidade. Em seguida, a criação de um foco comunicativo entre as instituições que podem ser institucionalizada para um grau maior ou menor, com 33 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 34 essa proposta de adicionar o componente comunicativo. As interfaces entre as diferentes funções operam em um modelo distribuído que produz potencialmente novas formas de comunicação como em uma interface de transferência de tecnologia. E, por último, a compreensão de que as esferas institucionais, da universidade, indústria e governo, além de suas funções tradicionais, sejam capazes de assumir os papéis das outras, sendo um complexo conjunto de tópicos organizacionais entre as esferas que crescentemente quebram as barreiras entre elas, além das ligações entre as esferas institucionais, exemplo disso seria a universidade criando uma penumbra industrial ou assumindo o papel do governo que é de desenvolver uma inovação para o local. Ao considerar esse movimento é preciso destacar que a hélice tríplice não propõe mesclar as comunicações diferentes, mas permitir uma reflexão delas nos diferentes sistemas de valor e, ao definir cada instituição, reitera a ideia que cada uma tem suas funções próprias e novos códigos de comunicação são desenvolvidos na transição que elas causam pelas interações (Etskowitz e Leyderdorff, 2000). A justificativa para o modelo de hélice tríplice, de acordo com Etskowitz e Leyderdorff (1998), se fundamenta em diversos argumentos como o de que a oposição dos lados tem um custo maior para o país e o da importância de se considerar as dimensões global e local, pois o desenvolvimento global induz o desenvolvimento local e as recombinações locais constituem a variação para o sistema numa ordem maior, que é o global. Etskowitz (2000) afirma que este é um modelo que representa o sistema de inovação em que os atores assumem um movimento em espiral que captura múltiplas relações recíprocas como pontos diferentes no processo de captação de conhecimento. As três hélices, representadas pela universidade, empresa e governo, têm múltiplas formas de se relacionar e o autor apresenta três dimensões. A primeira dimensão se refere à transformação interna que ocorre dentro de cada uma das hélices, como o desenvolvimento de laços laterais entre companhias através de alianças estratégicas ou o reconhecimento da missão de desenvolvimento econômico pelas universidades. A segunda dimensão é a influência de uma hélice sobre a outra e a terceira é a criação de um envolvimento de redes e organizações trilaterais a partir do envolvimento das três hélices, formado com o propósito de fazer surgir novas ideias e formatos para desenvolvimento de alta tecnologia. 2. A Universidade Estadual de Goiás O final do século XX foi palco de reivindicação por reformas do Estado e conforme dito na seção anterior, a década de 1990 apresenta um relevante crescimento no campo econômico e, isso reflete no ensino superior. Nesse período, o Estado de Goiás vivencia um desenvolvimento econômico e um incremento tecnológico que ocasionam mudanças nas relações de produção e de trabalho. Para Dourado (2001, p. 63), Assim, são criadas em Goiás iniciativas de políticas de expansão e interiorização do ensino superior, implementadas em decorrência da necessidade de desenvolvimento regional de cidades consideradas polos econômicos. Avolumam-se, então, os atos de criação de faculdades estaduais, de fundações municipais e de outras instituições de ensino superior no Estado. Tem-se como argumento legítimo dessas políticas o crescimento populacional, com tendência predominante urbana e a expansão da fronteira agrícola, o que aumenta o dinamismo dos setores agropecuário e industrial. O Estado de Goiás até 1979 contava apenas com duas universidades – a Universidade Federal de Goiás e a Universidade Católica de Goiás – e nove estabelecimentos de ensino superior isolados, entre privados, estaduais e municipais, criando-se, a partir de então, inúmeras instituições isoladas, com diferentes dependências administrativas – federal, estadual e municipal. O crescimento do ensino superior se dá, portanto, a partir de documentos oficiais como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9.394/96 e o Plano Nacional de Educação, os quais definem a obrigatoriedade do curso superior para os profissionais da educação brasileira. De um lado tem-se a rápida proliferação das instituições particulares, com frágil regulação do Estado e, por outro, a criação da UEG em 1999 como uma instituição pública e gratuita. A criação da UEG pode ser entendida como uma resposta a antigas mobilizações de diversos segmentos e atores da sociedade, tendo suas primeiras manifestações expressas na década de 1950, por ser interesse dos movimentos sociais, estudantis e de professores a interiorização do ensino superior em Goiás. Essa criação se deu a partir das faculdades isoladas já existentes no Estado de Goiás e verifica-se que os atores, tanto professores como alunos, mantêm-se, ou seja, a instituição se modifica, pois agora redireciona seu propósito enquanto instituição interiorizada, pública e formadora, promovendo sua condição de universidade com a ampliação de suas unidades universitárias, sua infraestrutura, O papel da Universidade Estadual de Goiás e o Desenvolvimento Local essas alterações passaram a exigir novos padrões de qualificação para o trabalho, justificando as políticas de expansão e interiorização de serviços. Nesse sentido, destacam-se os serviços educacionais, particularmente a oferta do ensino superior, vista como emblema de modernização e progresso. 35 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 36 como prédios, material permanente (carteiras, quadros, armários e outros) e os recursos audiovisuais são reorganizados para possibilitar a expansão da formação em nível superior em todo estado goiano. O objetivo se modifica na medida em que muda sua estrutura, pois a UEG, uma vez consolidada, assume a responsabilidade definida pelo governo do Estado de Goiás que, conforme a Lei n. 16.272./2008 (PDI-UEG, 2010-2019), em seu Art. 6º, define que a UEG deve oferecer “a qualificação e a capacitação de profissionais nas mais variadas áreas de abrangência do ensino, da pesquisa e da extensão universitária”. A UEG se compõe por quarenta e duas Unidades Universitárias em diversos municípios. Cada uma apresenta uma estrutura, cultura e forma de gerir o conhecimento e a questão central deste estudo se refere à interação da UEG com o desenvolvimento local, particularmente, as empresas locais e os impactos e resultados provocados por suas ações no Estado de Goiás. A criação da UEG ocorreu também a partir da dinâmica do processo político, da atuação e dos interesses dos atores que promovem as decisões. A coordenação dos atores em nível estadual e federal e a estrutura de poder dessas esferas definem certo nível de consenso para a mudança, pois ambos teriam de cumprir a formação em nível superior dos profissionais da educação brasileira a partir da legislação (LDB 9.394./96). Importa também destacar o tempo, pois, no contexto de liberalização, esses atores interessavam-se pelas políticas de expansão do ensino superior, bem como pela ampliação da formação dos seus cidadãos, contribuindo para o crescimento do Estado. Essa mudança institucional é resultado de uma política pública gestada à luz do modelo capitalista neoliberal, com priorização para o mercado de trabalho competitivo imposto pelas mudanças e pelas exigências da atual conjuntura. As reformas educacionais em curso desde a década de 1970, tanto no Brasil como em outros países da América Latina, apresentam como principais objetivos adequar o sistema educacional ao processo de reestruturação produtiva e à nova organização do Estado. A compreensão da política pública de governo e seu processo de mudança servem para pensar a atuação da UEG no contexto regional e suas possíveis contribuições não apenas para o crescimento, mas para o desenvolvimento do Estado de Goiás. De acordo com a CAAI1 (2005), a UEG é uma das maiores universidades brasileiras em quantidade de campi, o que pode ser positivo na medida em que promove acesso ao ensino superior, pois, 1. Comissão de Autoavaliação Institucional O papel da Universidade Estadual de Goiás e o Desenvolvimento Local para Pinheiro (2011), a UEG, na década de 1999 a 2009, formou 36.010 alunos nos cursos de graduação regular, 28.027 na Licenciatura Plena Parcelada (formação de professores) e 8.879 nos cursos sequenciais. Segundo dados do INEP/MEC, de 1999 a 2007, registrou-se um aumento de 2.411 vagas, pois, de 3.039 vagas em 1999, tem-se, em 2007, 5.450 vagas. Percebe-se que o foco da política da UEG foi da expansão periférica, aumentando significativamente o número de unidades e de atendimentos. A UEG, ao promover o incremento de vagas no ensino superior, participa do contexto das transformações econômicas que ocorreram após a década de 1990 e, ainda, das políticas que se relacionam à expansão desse nível de ensino. A UEG pode ser considerada como uma instituição que favorece o crescimento da região, na medida em que possibilita ao indivíduo o acesso e conclusão de uma formacão acadêmica e que antes se mantinha isolado e distante da formação superior e, com isso contribuí para o desenvolvimento do Estado, mas é preciso investigar quais são suas expectativas para alcançar o desenvolvimento em parceira com os atores local, como exemplo, as empresas, no sentido de contribuir com a economia dos municípios goianos. Em seus 11 anos, a UEG já é a segunda instituição com maior participação em redes de pesquisa no Estado. Nesse sentido, é preciso verificar o tipo de relacionamento entre a pesquisa e a empresa local e se isso tem realizado “transformações” nos municípios goianos. Neste sentido, quanto à análise do papel da UEG no desenvolvimento socioeconômico local do Estado de Goiás, pode-se observar que essa instituição tem se modificado no contexto atual no qual a criação, produção e a transferência de conhecimento, inovação e de tecnologia são fundamentais para o desenvolvimento local. É possível visualizar o desenvolvimento de pesquisa e tímida interação entre os atores econômicos dos municípios onde as unidades universitárias desenvolvem pesquisas. A UEG também tem investido, ainda que de forma incipiente, em formação docente e em pesquisa básica e aplicada, mesmo sem investir em uma infraestrutura científica adequada. Assim, a instituição requer liderança comprometida com ensino e pesquisa de qualidade. O desafio é ter foco no contexto de mudanças, tendo a pesquisa como potencial diferencial competitivo. Para tanto, é preciso harmonizar uma cultura de inovação com uma visão de longo prazo que seja sustentável. O Estado de Goiás atualmente acompanha o contexto de economia acelerada e recentemente tem investido no sistema regional de inovação. Isso indica que o trabalhador pode acompanhar as modificações constantes e buscar que novas competências sejam 37 adquiridas para sua atuação profissional. O ensino superior em Goiás, assim como no Brasil, em sido amplamente reformado e a pesquisa em questão espera conseguir, a partir de seus resultados finais, analisar, na evolução da UEG, uma trajetória de instituição articulada com o modelo regional integrado à experiência prática do local. Assim, contribuir para ações estratégicas e implementação de políticas públicas em prol do desenvolvimento local. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 3. Contribuições da Universidade para o desenvolvimento local 38 A partir da investigação sobre as condições da UEG, especialmente quanto às atividades de pesquisa, de ensino e de extensão; à contribuição para o desenvolvimento econômico e social; e ao custo para o processo de inovação em parceria com os atores do desenvolvimento local, poderá se compreender o papel da universidade. Espera-se encontrar durante a evolução da UEG, uma trajetória de instituição articulada com a demanda regional integrado à experiência prática do local. E, ainda, descobrir o tipo de relacionamento entre a Universidade e a Empresa e a articulação com a nova estrutura do Sistema Regional de Inovação em Goiás, além de sinalizar as atividades que tem ou que podem ter relacionamento com o desenvolvimento local. A pesquisa sobre a UEG pode contribuir para algumas questões: revelar as adversidades locais e esclarecer questões relacionadas à estagnação econômica histórica do Estado; reverter ou diminuir a disparidade do nível de desenvolvimento científico em relação a outros estados brasileiros; incentivar a melhoria da estruturação de atividades de pesquisa da universidade goiana e a interação com o desenvolvimento local. A UEG, caso de fato tenha relacionamento com as empresas locais, pode ser considerada estratégica para o desenvolvimento do Estado de Goiás e as alianças entre a universidade, o estado e as empresas podem facilitar o sistema de inovação. Para analisar o seu papel na produção de inovação é necessário também analisar o seu relacionamento com as empresas, pois se constata duas questões fundamentais. A primeira é a de que a empresa é o objeto central, o motor da economia capitalista, e a segunda é que a inovação está ligada ao desenvolvimento da empresa que, ao produzir inovação, lança no mercado novas combinações de invenções antigas e invenções novas. A proximidade com a universidade e uma maior interação com as empresas são fundamentais para o processo de concorrência no mercado. Considerações Finais As conclusões deste estudo são preliminares, mas é possível visualizar que em Goiás, um dos principais desafios para o desenvolvimento local é a construção e a articulação do sistema de inovação. A prática de pesquisas realizadas na Universidade, por ser relativamente pequena e com pouca participação com as empresas no fomento público à P&D está aquém do esforço de inovação. Em suma, acredita-se que essa investigação seja proveitosa por analisar o contexto da universidade e, consequentemente, sua relação com o desenvolvimento socioeconômico do Estado de Goiás em relação à formação dos recursos humanos, em especifico o papel da UEG, na medida em que se elucida o papel dessa instituição superior na criação, produção e transferência do conhecimento, os atores envolvidos podem repensar novas pesquisas que divulguem ações estratégicas e políticas públicas em prol do desenvolvimento local. REFERÊNCIAS AROCENA, R.; SUTZ, J. Conhecimento, inovação e aprendizado: sistemas e políticas no Norte e no Sul. In: LASTRES, H.; CASSIOLATO, J.; ARROIO, A. (Org.) Conhecimento, sistemas de inovação e desenvolvimento. Rio de Janeiro: Editora UFRJ/Contraponto, 2005. BRASIL, INEP/MEC, de 1999 a 2007. DAGNINO, R. A relação universidade-empresa no Brasil e o “argumento da hélice tripla”. Revista Brasileira de Inovação, v. 2, n. 2, p. 267-307, jul-dez. 2003. DOURADO, L. F. 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American universities and technical advance in industry. Research policy, v. 23, p. 323-348, 1994. UEG, Universidade Estadual de Goiás. Plano Estratégico de Desenvolvimento Institucional – PEDI 2001 a 2004 – no processo da implantação e consolidação da UEG. Anápolis: 2000. UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIÁS. Plano de Desenvolvimento Institucional (2010 -2019). Disponível em: <http://dirplan.ueg.br>. Acesso em: 03 ago. 2010. __________________________________ Relatório da comissão de autoavaliação institucional da UEG CAAI (2005). Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade YIN, R. K. Estudo de caso: planejamento e métodos. Trad. Daniel Grassi. 2a ed. Porto Alegre: Bookman, 2001. 40 Capítulo 3 ITINERÁRIOS DE APRENDIZAGEM COLABORATIVA/COOPERATIVA EM CONTEXTO ON LINE Sofia Sant’Ana Lopes Malheiro da Silva Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade C 42 om o dealbar de um novo contexto de ensino / aprendizagem – o virtual –, bem como de todo o grupo de factores satélite que circulam em suas órbitas interdependentes, agregado ao facto de acreditarmos que o e-learning permite desenhar um novo cenário, de potencial impacto, na utilização das tecnologias na formação e na educação de todos nós, o presente estudo procura debruçar-se sob estes enredos de forma a fazer emergir as dimensões pedagógicas que revestem o envolvimento e a participação, numa comunidade de aprendizagem em espaço virtual, ao assumir-se os alunos como actores empreendedores na construção do seu próprio conhecimento, facilitada pela relação empática, via Web, enquanto tecnologia de suporte. Assim sendo, esta pesquisa pretende constituir-se como um contributo para a abordagem aos Itinerários de Aprendizagem colaborativa / cooperativa em ambientes virtuais de construção de conhecimento, no contexto específico dos cursos de formação dos tutores em e-learning, ministrados em regime online na Universidade Aberta em Portugal. Esta problemática específica centra-se na procura de repostas para duas macro questões norteadoras da investigação desenvolvida: “Na especificidade do Ciberespaço, num contexto de sala de aula virtual: • Quais os factores facilitadores / inibidores da aprendizagem colaborativa / cooperativa? • Que dimensões e subdimensões pedagógicas emergem, como fundamentais, na construção e design de uma actividade, para que o trabalho colaborativo / cooperativo seja potenciado?” Para que pudessem ser atingidos os propósitos conducentes às respostas que se procuravam, foi necessário “mergulhar”, pelos meandros de olhares disciplinares diversos. Deste modo, através de “atalhos” e “caminhos complementares” adequados à natureza do objecto da investigação, foi construída uma moldura teórica, interdisciplinar, que nasce no tronco da especificidade da Pedagogia e das Ciências da Educação. Fica a consciência de que esta investigação constitui apenas e somente uma contribuição que abre a porta a uma das mais ricas experiências de aprendizagem – “aprender juntos” – na especificidade de um ciberespaço – online – em que já reside muito do oxigénio que, dia-a-dia, nos fornece energia para construir conhecimento. Não há educação sem raízes, o futuro de qualquer pedagogia conquista-se, antes de mais, pela capacidade de criar alicerces no tempo histórico. A ideia de juntar os estudantes em pequenos grupos de trabalho, dentro da sala de aula, para que obtenham melhores resultados nas aprendizagens, não é nova. Já no século XVII Comenius provocava a reflexão em torno das metodologias de ensino / aprendizagem quando, metaforicamente, associava a Botânica à Educação, proferindo as seguintes palavras: “(…) não se consegue de uma só semente produzir a mesma árvore? De um só método farei estudantes capazes!(…)”. Comenius revolucionou a linha de pensamento da época, levando o Homem a procurar um novo método universal de “ensinar tudo a todos”. Reencontrar as ideias deste grande pedagogo, pode auxiliar-nos a entender melhor os desafios da Educação contemporânea. Se transferirmos as suas convicções para os dias de hoje, percebemos que, com as novas tecnologias e com a democratização do acesso à informação, esse antigo sonho parece cada vez mais real. Actualmente conceitos como “educação permanente”, “democratização do ensino”, “aprendizagem global”, “estimulante e significativa”, “diferenças individuais”, “inteligências múltiplas”, ou “condições apropriadas para a aprendizagem”, são muito frequentes e reais. O surpreendente é o facto de há quatro séculos atrás, estas questões já estarem patentes nas obras de Comenius. Uma proposta interessante para criar aprendizagens significativas e motivantes reside nas teorias que enfatizam a aprendizagem em grupo nas suas dimensões colaborativa e cooperativa. A premissa básica deste paradigma fundamenta-se na epistemologia construtivista. Cada uma destas dimensões representa um extremo do espectro do processo de ensino / aprendizagem que percorre um trajecto que se inicia no “altamente estruturado” pelo professor (cooperativo) e termina na transferência da “responsabilidade pela aprendizagem” quase que exclusivamente para o estudante (colaborativo). 1.2. Fundamentos epistemológicos da aprendizagem Ao longo dos tempos, o conceito de aprendizagem foi sofrendo alguma evolução quanto ao seu entendimento. Entendida como “substância” da educação, a aprendizagem pode ser posta em prática de diferentes formas, sendo que a diversidade dos modos “como Itinerários de Aprendizagem Colaborativa/Cooperativa em Contexto On line 1. Colaboração e Cooperação: Sinergias para uma definição de conceitos 43 aprendemos” está relacionada com o maior ou menor ênfase que atribuímos a processos e / ou a produtos. A Tabela 1, adaptada de Ramsden (1992), (Cf. Aires, 2007), apresenta, de forma clara, estes paradigmas emergentes. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Tabela 1 – Paradigmas de Aprendizagem 44 Fonte: adaptada de Ramsden (1992) Itinerários de Aprendizagem Colaborativa/Cooperativa em Contexto On line Pela leitura da Tabela 1, podemos concluir que as teorias cognitivas têm vindo a preocupar-se com a forma como cada indivíduo recebe, percebe, interpreta e armazena mentalmente a informação, dedicando-se ao estudo dos processos de desenvolvimento cognitivo dos indivíduos. Os primeiros estudos sobre a influência da interacção social nesse mesmo desenvolvimento cognitivo individual surgiram com as abordagens teóricas que defendem uma visão de interacção do desenvolvimento cognitivo. Estas abordagens contribuem para a fundamentação e compreensão da Aprendizagem Cooperativa / Colaborativa, atribuindo especial relevância à participação social e à colaboração no desenvolvimento cognitivo do indivíduo. A implementação das tecnologias da informação e da comunicação no âmbito da Educação também revolucionaram as formas e as modalidades de trabalho, questionando a natureza do próprio conhecimento e, consequentemente, as formas de o adquirir através da aprendizagem (Aires, 2007). Em 1995, Bates afirma que o modelo de transmissão da informação do professor para o estudante não responde às necessidades de aprendizagem numa sociedade onde o conhecimento muda rapidamente e onde as competências necessárias ao trabalho e às nossas vidas sociais estão a tornar-se cada vez mais complexas. Para Tiffin, & Rajasingham (1995), o modelo tradicional é baseado no ensino presencial, onde os estudantes estão organizados numa sala de aula, isolados do mundo externo por quatro paredes, que os distancia de qualquer forma de interrupção que os possa distrair, escola essa que reflecte “arquipélagos de solidões”. O posicionamento do professor é o de mediador principal entre a informação do mundo e os estudantes. Bates (1995) defendia a necessidade de um modelo educacional que fornecesse aos indivíduos as competências para comunicarem efectivamente, trabalharem em equipa, procurarem e analisarem novos conhecimentos, participando activamente na sociedade, ao mesmo tempo que assimilam conhecimento. Autores como Vigotsky, Bruner, ou Paulo Freire, deram contributos muito relevantes à intersubjectividade e à criação colectiva de significados, implicando a interacção social como fonte que alimenta a aprendizagem. Para Aires (2007), esta fonte – a interacção social – fundamenta as teorias dialógicas que tornam a dialogicidade a substância da linguagem e do conhecimento. Para melhor compreendermos o processo de aprendizagem, apresentamos na Tabela 2 uma síntese das principais linhas orientadoras que caracterizam os modelos de ensino / aprendizagem de cariz tradicional e os de natureza socio-construtivista, 45 equacionando uma análise comparativa dos dois tipos de Paradigmas de Aprendizagem que lhe estão subjacentes. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Tabela 2 – Análise comparativa de Paradigmas de Ensino / Aprendizagem 46 2.2. Fundamentos epistemológicos da Aprendizagem Colaborativa/ Cooperativa Após a breve resenha teórico-epistemológica no âmbito das teorias da aprendizagem em geral, que apresentámos anteriormente, pretendemos, neste ponto, focar a nossa atenção sobre a mesma fundamentação no âmbito da aprendizagem colaborativa / cooperativa. Nesta área, inerente às formas e modos de aprender, têm sido defendidas múltiplas teorias, sendo que para qualquer uma delas a aprendizagem está intimamente ligada ao termo Itinerários de Aprendizagem Colaborativa/Cooperativa em Contexto On line Fonte: Autora 47 “relação”, exigindo-a de forma uni ou multidireccional (Aires, 2007). No que diz respeito à aprendizagem colaborativa / cooperativa o foco de aprendizagem é o grupo e a relação estabelecida assume uma natureza multidireccional. Neste contexto, Dillenbourg et al. (1996) que têm teorizado sobre estas questões sustentam e defendem a Colaboração / Cooperação com base nas teorias do socio-construtivismo, social e da cognição partilhada, conforme ilustra a Figura 1. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Figura 1 – Teorias Raiz da Cooperação / Colaboração 48 Fonte: Dillenbourg et al. (1996) Autores como Garrison & Anderson (2005) realçam o conceito de “paradigma construtivista cooperativo” assente exactamente na influência que as três teorias descritas anteriormente têm tido na aprendizagem. A relação educativa reconstrói-se e beneficia da existência desta interdependência estreita entre a construção pessoal de significado e a influência que o ambiente social exerce sobre a mesma. Também Koschman (1996) se refere à aprendizagem colaborativa / cooperativa online como um paradigma em fase de crescimento. O autor defende que a convergência das teorias anteriormente descritas, com o potencial inovador das tecnologias, produz um terreno fértil para a criação de novos cenários de comunicação, interacção, relação social e trabalho colaborativo / cooperativo. 2.3. Colaboração / Cooperação: Conceitos e Preconceitos (…) acção de colaborar com alguém; trabalho em conjunto; trabalho em comum com outrem; cooperação; participação; ajuda; auxílio (…)”. O conceito de cooperação descreve-se como “(…) acto de colaborar para a realização de um projecto comum ou para o desenvolvimento de um campo de conhecimento; acto de unir esforços para um assunto ou problema, facilitando o acesso aos meios práticos para o conseguir (...) (Dicionário Porto Editora, 2006). Na verdade, sendo domínios de investigação cruzados e sobrepostos, nasce uma tendência para se confundirem significados, o que explica a existência de autores que se referem indistintamente tanto ao termo cooperação, como ao conceito de colaboração, considerando-os sinónimos, enquanto outros procuram distingui-los (Aires, 2007). Seguidamente, iremos debruçar-nos sobre o carácter híbrido destes conceitos. De facto, o debate “colaboração” versus “cooperação” é complexo. Numa primeira abordagem, é possível afirmar que ambos os paradigmas assentam numa epistemologia construtivista, com especial preponderância para o “papel activo do sujeito aprendente”. Para tornar clara a distinção entre os termos “colaboração” e “cooperação”, é importante destacar a discussão que os envolve. Segundo Dillenbourg, & Schneider (1995), os termos colaboração e cooperação são utilizados como se tivessem o mesmo sentido, o que não corresponde à verdade. Também Aires (2007) salienta o facto destes dois termos terem raízes distintas: a palavra colaboração fixa-se em processos, isto é, vai acontecendo, desenvolvendo-se, seguindo determinadas trajectórias, enquanto o conceito de cooperação visa produtos, ou seja, é uma técnica de Itinerários de Aprendizagem Colaborativa/Cooperativa em Contexto On line É inegável que o fenómeno da aprendizagem ocorre a nível individual, mas quase todos os teóricos nesta matéria, entre eles Piaget e Vygotsky, enfatizam a importância das trocas sociais para a promoção e enriquecimento desse mesmo fenómeno. Estas “actividades colectivas de aprendizagem” são também designadas por “aprendizagem em grupo (group learning)” e são, normalmente, divididas em aprendizagem cooperativa, quando o processo é imposto e existe uma certa ordenação nas tarefas, ou aprendizagem colaborativa, quando os elementos possuem uma meta em comum e não existe uma hierarquia pré-definida. Tanto na língua francesa, como na inglesa, os termos cooperar e colaborar parecem sinónimos, na medida em que, ambos significam “trabalhar conjuntamente para alcançar uma tarefa comum”. De igual modo, no dicionário da língua portuguesa define-se colaboração como 49 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 50 trabalho utilizada de forma consciente para alcançar determinados objectivos. Estes autores afirmam que, seguindo este entendimento, é frequente afirmar-se que a cooperação é “mãe da colaboração”. Ainda Dillenbourg, & Schneider (1995), diferenciam os termos pela forma como a actividade é executada pelo grupo. Assim, a cooperação seria caracterizada como uma actividade em que existe divisão do trabalho entre os participantes, sendo que cada indivíduo é responsável por uma parte da resolução do problema. Por outro lado, a colaboração caracterizar-se-ia pela participação mútua dos participantes, num esforço coordenado, para juntos resolverem o problema, sem necessidade de uma hierarquia pré-estabelecida. Porém, a diferença não reside, apenas, na divisão de tarefas, mas na forma como a divisão é feita, ou seja, como se coordena a divisão de actividades. Na cooperação, cada tarefa é dividida hierarquicamente em sub-tarefas independentes, sendo a sua coordenação apenas obrigatória na montagem dos resultados parciais (Dillenbourg, & Schneider, 1995). Na colaboração (…) o processo pode ser dividido em camadas entrelaçadas, coordenadas e sincronizadas, que é resultado de um esforço contínuo para construir e manter uma concepção partilhada de um problema. (Dillenbourg, & Schneider, 1995). Na distinção proposta por Panitz (1996), o termo colaboração corresponde a uma “(…) filosofia de interacção e de estilo de vida pessoal, onde os indivíduos são responsáveis pelas suas acções, respeitando as capacidades e os contributos dos seus pares”. O termo cooperação é entendido, segundo o mesmo autor, como uma (…) estrutura de interacção que visa facilitar a realização de uma meta ou fim específico, através do qual os indivíduos trabalham, conjuntamente, em grupos”. A aprendizagem cooperativa é, então, definida por um conjunto de processos que ajudam os indivíduos a interagirem entre si, para alcançarem um objectivo específico (Panitz, 1997). Também para Dillenbourg (1999), o termo colaboração é diferente do conceito de cooperação. Para este autor a colaboração é uma actividade sinergética e contínua por parte dos indivíduos, para criar e manter uma concepção partilhada com vista à resolução de uma determinada tarefa ou problema. Já o termo cooperação, para o mesmo autor, pode, e deve, ser compreendido como a divisão de trabalho entre os participantes, onde cada um Itinerários de Aprendizagem Colaborativa/Cooperativa em Contexto On line terá, à sua inteira responsabilidade, uma determinada tarefa ou parte de um problema que se pretende ver resolvido. Sendo assim, este autor distingue os dois conceitos ao nível de três características principais: grau de simetria na interacção; objectivos partilhados; divisão do trabalho. Para Dillenbourg, as situações podem ser caracterizadas como mais ou menos colaborativas, ou mais ou menos cooperativas, conforme se posicionem em relação aos três critérios acima enunciados. Assim, para o autor: as situações de simetria na interacção (acção, conhecimento e estatuto), analisadas do ponto de vista objectivo e/ou subjectivo podem ditar a classificação da tarefa como sendo mais colaborativa ou mais cooperativa; a existência, ou não, de objectivos partilhados no seio do grupo conduz-nos à definição de um indicador suficientemente forte, para que possamos classificar a tarefa como colaborativa ou cooperativa; a forma como os diferentes elementos do grupo estabelecem a divisão do trabalho também nos conduz à distinção de que, na cooperação, os parceiros dividem o trabalho de forma vertical, em subtarefas independentes, resolvem-nas individualmente e depois juntam o trabalho final e, na colaboração, os parceiros trabalham conjuntamente, podendo, todavia, ocorrer algumas subdivisões horizontais. Interessante verificar ainda, analisando as opiniões dos autores até agora mencionados, que tanto a aprendizagem colaborativa, como a cooperativa, estão também ancoradas no Paradigma Interpessoal, cujo objecto de estudo se centra no aspecto relacional dos indivíduos quando são capazes de promover o desenvolvimento de competências de partilha, entreajuda, construção de comunidade, gosto e motivação para aprender juntos, aprendendo harmoniosamente sobre a atmosfera da interdependência e da pertença (Aires, 2007). Cooperação é uma forma de colaboração, é trabalhar em conjunto para alcançar uma meta (Johnson, & Johnson, 1999). Enquanto o processo de colaboração se pode observar em pequenos ou grandes grupos, a cooperação refere-se, principalmente, a pequenos grupos de indivíduos que trabalham juntos. Na esfera educativa temos professores que têm já adoptado a cooperação como uma estrutura fundamental para a aprendizagem em contexto de sala de aula. Parece, assim, pertinente tentar distinguir os dois conceitos e arriscar afirmar que aquilo a que poderemos chamar de aprendizagem colaborativa é consequência da assumpção de princípios de solidariedade e empatia para com os outros, sem que existam, no entanto, outras obrigações explícitas. A aprendizagem colaborativa desenvolve-se no âmbito da comunidade que veicula as relações, os seus membros sentem que “(…) ensinam uns aos outros (…)” e “(…) aprendem uns com os outros (…)” (Aires, 2007), enquanto que a aprendizagem 51 cooperativa tem como elementos essenciais princípios claros que regem as técnicas de forma a serem usadas pelos grupos: a presença de objectivos / metas comuns a todos os elementos e uma divisão fixa e explícita, à partida, do trabalho de cada elemento do grupo. Na sequência do que ficou referido anteriormente, parece-nos ser o conceito de cooperação mais complexo do que o de interacção e colaboração, pois, o primeiro, para além de pressupor ambos, requer relações de respeito mútuo, não hierárquicas entre os envolvidos, uma postura de tolerância e convivência com as diferenças num processo de negociação constante, mas, também, objectivos e actividades / acções conjuntas, coordenadas e comuns. Em seguida, passaremos a analisar separadamente os dois conceitos, de forma a melhor entendê-los. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 2.3.1. Na encruzilhada da Aprendizagem Cooperativa 52 A aprendizagem cooperativa desvendou, pacientemente, as filiações e juntou as teias de homens e mulheres que marcaram a Pedagogia e a Psicologia, sobretudo, durante os séculos XIX e XX, criando, assim, um passado, do qual se fez, legitimamente, herdeira. A aprendizagem cooperativa pode ser definida como uma aproximação estruturada e metódica que, por um lado, define o encaminhamento educacional dos aprendentes e, por outro lado, determina as técnicas de ensino utilizadas. Assim, os estudantes caminham, em pequenos grupos, na procura de aprendizagens de níveis de cognição variados, sendo o professor o elemento que fornece as indicações para favorecer a cooperação e a interdependência entre os grupos (Legendre, 1993). A Tabela 3 pretende dar uma visão geral, embora simplista, dos fundamentos teóricos da aprendizagem cooperativa, na medida em que foi nosso propósito, no âmbito deste trabalho, sustentar as suas raízes mais profundas nos constructos histórico-filosóficos em que este tipo de estratégia está alicerçada Esse desenvolvimento foi objecto do sub-capítulo anterior. Contudo, e uma vez que pretendemos desvendar os significados e as ambiguidades inerentes aos conceitos “colaboração” e “cooperação”, pareceu-nos pertinente reforçar com um “olhar pedagógico” o cenário de enquadramento teórico destes conceitos. Fonte: adaptado de Johnson, & Johnson (1999) A Tabela 4 procura sintetizar os elementos básicos constituintes da aprendizagem cooperativa. Itinerários de Aprendizagem Colaborativa/Cooperativa em Contexto On line Tabela 3 – Aprendizagem Cooperativa – Fundamentos Teóricos 53 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Tabela 4 – Elementos básicos da Aprendizagem Cooperativa 54 Fonte: adaptado de Johnson, & Johnson (1999) Estudos levados a cabo no âmbito de uma ampla variedade de tarefas de aprendizagem comprovam as grandes vantagens da aprendizagem cooperativa sobre a aprendizagem individualizada (Ferreiro, & Calderón, 2006). Quando comparada com a aprendizagem individualizada e competitiva, a aprendizagem cooperativa evidencia alto aproveitamento individual, alta qualidade de estratégias de raciocínio, maior frequência na transferência para o grupo, alto nível de novas ideias e soluções na resolução de problemas. Para além disso, os participantes que trabalham em grupos cooperativos tendem a estar mais motivados e intelectualmente mais activos. Sabemos hoje que estes momentos de aprendizagem cooperativos fazem também emergir, nos estudantes, um conjunto de competências cooperativas essenciais que se apresentam na Tabela 5. Itinerários de Aprendizagem Colaborativa/Cooperativa em Contexto On line Tabela 5 – Descrição das Habilidades / Competências Cooperativas 55 Fonte: Autores A Tabela 6 exemplifica algumas das habilidades/competências referidas na Tabela 5. Tabela 6 – Exemplificação de Habilidades / Competências Cooperativas HABILIDADES RELACIONADAS COM A INTERACÇÃO Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade FORMAÇÃO 56 HABILIDADES RELACIONADAS COM A ELABORAÇÃO COGNITIVA FUNCIONAMENTO FORMULAÇÃO Respeitar as opiniões dos outros elementos. Dar apoio e energia ao grupo quando Manter o nível de ruído. Controlar o tempo de realização da tarefa. Permanecer com o grupo. pressar pontos de vista respeitando a tarefa que se está a realizar. Cuidar dos materiais com que se está a trabalhar. membros do grupo que e pliquem rientar o trabalho de grupo Dar atenção ao elemento que fala. Manter uma postura corporal correcta em relação aos outros. Chamar pelo nome os outros elementos do grupo. controlando o tempo para o trabalho oferecendo procedimentos sobre as formas de realização mais Disponibilizar se para esclarecer d vidas ou aclarar ideias. ceitar os contributos de outro elemento do grupo. omar decisões baseadas na negociação e no consenso. . para desenvolver a tarefa. ssim consegue se que esse raciocínio se a evidente e se mostre aberto correcção e discussão. Corrigir o resumo de outro e agregar a informação importante não incluída no resumo. consiste o con seus componentes pensando Fomentar a . sua consequ ncias e elegendo a melhor. Pedir a uda e aclararno que diz respeito ao que se está fazendo dentro do grupo. entar gerar outras soluções inventariar outras possíveis soluções que possamos escolher. conclusão dada por um dos elementos do grupo. Resumir se acabou de ler. Comentar de forma o mais completa possível sem recorrer a notas ou a material original. odos os elementos do grupo devem resumir com base na mpliar a resposta ou a conclusão de outro elemento do grupo agregando informação ou implicações. assim a sua mem ria. Formar os grupos rapidamente e sem grandes ruídos Fazer perguntas que conduzam a uma compreensão análise mais profunda. laborar. Procurar relações entre o que se está a aprender e outros conte dos apreendidos anteriormente. pressar apoio e aceitação Respeitar as regras / vezes de intervir. CONSOLIDAÇÃO Procurar formas inteligentes de recordar ideias e factos importantes. Recorrer a desenhos imagens a mentais e outras a udas para a há las com o grupo. plicar. Descrever como se há de realizar a tarefa sem dar as respostas e pedir aos colegas que o façam. Fonte: Autora ntegrar ideias diferentes numa nica conclusão. No termo da revisão de literatura, sintetizam-se na Tabela 7 as vantagens que a aprendizagem cooperativa tem vindo a realçar, quando aplicada como estratégia promotora do sucesso escolar. Itinerários de Aprendizagem Colaborativa/Cooperativa em Contexto On line Tabela 7 – Vantagens da aprendizagem cooperativa 57 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 2.3.2 – Nos percursos em Teias de Aprendizagem Colaborativa 58 Considerando o trabalho colaborativo como uma forma de organização deliberada, complexa, que se constrói na inteligência da acção, com o intuito de encadear determinadas actividades que envolvem vários elementos, aqui considerados actores, trabalhar colaborativamente com os outros não tem sido uma prática frequente nem evidente. Neste empreendimento, a motivação, a comunicação e a interacção constituem o núcleo duro do trabalho colaborativo eficaz (Levan, 2004). A aprendizagem colaborativa tem como objectivo fundamental desenvolver a dimensão social da própria aprendizagem dos estudantes. Um dos aspectos chave no âmbito desta dimensão social da aprendizagem é o valor da relação entre iguais, que afasta a convicção de que para aprender é indispensável seguir as concepções de alguém dito mais competente. A aprendizagem colaborativa é, assim, uma estratégia segundo a qual um pequeno grupo de estudantes trabalha para atingir um determinado fim. Contrariamente ao que acontece na aprendizagem cooperativa, a aprendizagem colaborativa não pressupõe a divisão de tarefas, na medida em que todos os elementos do grupo trabalham de forma conjunta para a realização da tarefa do grupo. Nos grupos colaborativos, os membros discutem as suas estratégias para solucionar um problema, expõem as suas razões e definem o seu trabalho. Percebendo o que um formando expressa, outro colega pode apresentar a saída alternativa, pode pedir-lhe que explique melhor as suas ideias, que torne o seu pensamento público. Desta forma, os formandos desenvolvem um processo contínuo de reavaliação das suas ideias através do diálogo, da interacção, conseguindo maiores e melhores resultados em salas de aula colaborativas, do que nas salas ditas tradicionais. Os professores, assumindo o papel de mediadores, dedicam mais do seu tempo ao estabelecimento de interacções com os estudantes, orientando o grupo na procura da informação e na partilha das suas próprias experiências e conhecimentos, do que na transmissão de um saber hermeticamente considerado. Estes mediadores em acção movem-se num grupo, modelando estratégias de aprendizagem, intervindo na discussão e reforçando as interacções. A aprendizagem colaborativa destaca, assim, a participação activa e a interacção tanto de estudantes, como de professores. O conhecimento é visto como uma construção social e, como tal, o processo educativo é favorecido pela participação social em ambientes que propiciem a interacção, a colaboração, a avaliação e, consequentemente, o crescimento do grupo. Os estudantes assumem-se, assim, com um novo papel no processo de ensino / aprendizagem, que consiste em colaborar e participar no grupo de forma entusiasta e activa. O docente apenas 2.3.3 – Semelhanças e Diferenças entre Aprendizagem Cooperativa e Aprendizagem Colaborativa Vejamos agora alguns dos principais aspectos em que a aprendizagem cooperativa e a aprendizagem colaborativa se assemelham e/ou diferem. Na verdade, ambas são abordagens pedagógicas de grupo nas quais se partilham tarefas a realizar, de forma a construir novos conhecimentos. No entanto, tal processo apresenta-se mais formal no modelo cooperativo e menos formal no modelo colaborativo, na medida em que, na primeira abordagem, após cada elemento ter realizado a sua tarefa, os membros do grupo colocam o “todo” em comum. Na abordagem colaborativa o produto final da tarefa a realizar constrói-se ao longo do processo (Ragoonaden, 2001). Em qualquer uma destas abordagens socio-construtivistas, o papel/função do professor/formador experimenta importantes modificações, deixando de ser um transmissor de conhecimentos e assumindo-se como facilitador/animador do grupo e Itinerários de Aprendizagem Colaborativa/Cooperativa em Contexto On line desempenha a função de mediador ajudando os formandos no cumprimento dessa função. A colaboração envolve sinergias e parte da premissa de que “o todo é maior que a soma das partes individuais”. Assim, aprender de forma colaborativa produz ganhos superiores à aprendizagem dita “solitária”. Aprender colaborativamente não significa aprender em grupo, mas implica a possibilidade de poder contar com outras pessoas para apoiar a sua aprendizagem e dar retorno, se e quando necessário, no contexto de um ambiente de aprendizagem não competitivo. O objectivo destes trabalhos, ditos colaborativos, é permitir aos estudantes que trabalhem de forma autónoma sem intervenções directas do professor, que utilizem mecanismos de colaboração como o compromisso, o encorajamento e a negociação para interagirem entre si. Aprende-se em grupo e pelo grupo, partilhando e construindo conhecimentos. Estas eficientes interacções permitem explorar as forças dos pares e contrariar as fraquezas individuais num ambiente equitativo e democrático. Valoriza-se as habilidades de pensamento crítico tais como as de clarificação, elaboração, análise e síntese, para chegar finalmente a um entendimento. As interacções, suscitadas pela colaboração entre pares, criam um contexto propício para a construção de novos conhecimentos. Para Aires (2007), a aprendizagem colaborativa desenvolve-se, então, segundo um processo de participação, de partilha, com e pelo diálogo. Trata-se de uma aprendizagem dialógica, baseada na interacção entre todos os participantes envolvidos. 59 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 60 organizador dos parâmetros do ambiente cooperativo e/ou colaborativo, facilitadores da aprendizagem dos estudantes. O professor/formador clarifica os objectivos dos conteúdos a apreender, fornece instruções sobre o material necessário e estrutura o ambiente, com o objectivo de potenciar ao máximo as interacções entre os aprendentes. É ainda o professor/ formador quem se ocupa da distribuição dos trabalhos, da estrutura, seja cooperativa, seja colaborativa, da observação e do acompanhamento das interacções entre os estudantes. Por seu lado, os formandos devem procurar, não só adaptar-se ao novo papel desempenhado pelo professor/formador, assumindo-o como membro de uma equipa cooperativa e/ou colaborativa, como devem, também, procurar “saborear” a sua aprendizagem e a dos seus parceiros, partilhando o seu conhecimento com os seus pares, ao invés de “declarar” a aprendizagem como fruto de um cenário de competição (Ragoonaden, 2001). Aqui o estudante aprende não com o intuito de obter uma boa nota no exame/teste, mas porque está interessado na apreensão de conteúdos, quer em cooperação, quer em colaboração, com os seus pares, aperfeiçoando os seus conhecimentos (Ragoonaden, 2001). O grupo funciona como agente motivador dos estudantes, estimulando-os a ir para além das exigências inerentes ao trabalho dito académico. Estes processos proporcionam um apoio ao estudante isolado geográfica ou socialmente, permitindo-lhe manter a comunicação com os seus pares, dando-lhe oportunidade para fazer parte de uma pequena comunidade de aprendizagem. A aprendizagem cooperativa e/ou colaborativa permite, ainda, aos estudantes, tornarem-se participantes activos nas actividades dos seus cursos. Os estudantes, organizados em pequenos grupos, assumem, efectivamente, a responsabilidade da sua própria aprendizagem. Eles aprendem em grupo e pelo grupo (Ragoonaden, 2001). As investigações neste âmbito mostram, ainda, que os reagrupamentos cooperativos e/ou colaborativos permitem que os estudantes trabalhem a um nível de cognição mais Em qualquer uma destas abordagens socio-construtivistas, o papel/função do professor/ formador experimenta importantes modificações, deixando de ser um transmissor de conhecimentos e assumindo-se como facilitador/animador do grupo e organizador dos parâmetros do ambiente cooperativo e/ou colaborativo, facilitadores da aprendizagem dos estudantes. O professor/formador clarifica os objectivos dos conteúdos a apreender, fornece instruções sobre o material necessário e estrutura o ambiente, com o objectivo de potenciar ao máximo as interacções entre os aprendentes. É ainda o professor/formador quem se ocupa da distribuição dos trabalhos, da estrutura, seja cooperativa, seja colaborativa, da observação e do acompanhamento das interacções entre os estudantes. Por seu lado, os formandos devem procurar, não só adaptar-se ao novo papel Itinerários de Aprendizagem Colaborativa/Cooperativa em Contexto On line desempenhado pelo professor/formador, assumindo-o como membro de uma equipa cooperativa e/ou colaborativa, como devem, também, procurar “saborear” a sua aprendizagem e a dos seus parceiros, partilhando o seu conhecimento com os seus pares, ao invés de “declarar” a aprendizagem como fruto de um cenário de competição (Ragoonaden, 2001). Aqui o estudante aprende não com o intuito de obter uma boa nota no exame/teste, mas porque está interessado na apreensão de conteúdos, quer em cooperação, quer em colaboração, com os seus pares, aperfeiçoando os seus conhecimentos (Ragoonaden, 2001). O grupo funciona como agente motivador dos estudantes, estimulando-os a ir para além das exigências inerentes ao trabalho dito académico. Estes processos proporcionam um apoio ao estudante isolado geográfica ou socialmente, permitindo-lhe manter a comunicação com os seus pares, dando-lhe oportunidade para fazer parte de uma pequena comunidade de aprendizagem. A aprendizagem cooperativa e/ou colaborativa permite, ainda, aos estudantes, tornarem-se participantes activos nas actividades dos seus cursos. Os estudantes, organizados em pequenos grupos, assumem, efectivamente, a responsabilidade da sua própria aprendizagem. Eles aprendem em grupo e pelo grupo (Ragoonaden, 2001). As investigações neste âmbito mostram, ainda, que os reagrupamentos cooperativos e/ou colaborativos permitem que os estudantes trabalhem a um nível de cognição mais elevado (Hertz-Lazarowitz et al., 1980; Sharan, & Shachar, 1988; Johnson, Johnson, & Holubec, 1990, citados por Ragoonaden, 2001). O intercâmbio entre estudantes reforça a interacção e permite-lhes trabalharem conjuntamente na realização de uma determinada tarefa. Os estudantes aprofundam técnicas de análise, de interpretação, de negociação e de comunicação e têm oportunidade de explorar ideias novas, justificar as suas opiniões e fazer a síntese dos seus conhecimentos num ambiente de aprendizagem enraizado de respeito mútuo. Eles não são encorajados a competir, mas, pelo contrário, a compartilhar o seu conhecimento, a entre ajudarem-se para produzirem um trabalho de qualidade superior (Ragoonaden, 2001). Atendendo a que a interacção / comunicação é fortemente encorajada, o nível de socialização entre os estudantes também é muito elevado (Slavin, 1995), especialmente entre aqueles que estão inscritos num programa de formação à distância, onde o enquadramento dos aprendentes é de primordial importância. Slavin (1995) demonstrou que a cooperação e a colaboração afectam de maneira positiva o rendimento académico, as relações sociais, o conceito de si mesmo e as relações interculturais entre os aprendentes. Este autor referiu, no entanto, que, para que isso seja possível, a aprendizagem cooperativa e/ou colaborativa deve estar estruturada de forma a favorecer a interacção e a motivação necessária para 61 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 62 um trabalho em grupo, pelo que é necessário criar, com rigor, ambientes pedagógicos que permitam aos aprendentes a utilização de determinadas habilidades cognitivas que facilitem o trabalho em grupo. Resumindo, observa-se, através de diversos conceitos, que os termos “cooperação” e “colaboração” designam actividades de grupo cujo objectivo é comum. Apesar das suas diferenças teóricas e práticas, ambos os conceitos derivam de dois postulados principais: por um lado, a rejeição ao autoritarismo, à condução pedagógica com motivação hierárquica, unilateral. Por outro lado, trata-se de concretizar uma socialização, não só “pela” aprendizagem, mas, principalmente, “na” aprendizagem. Desta forma, os dois postulados organizam-se mediante um instrumento que equaciona a comunicação directa, contínua e construtiva. Contudo, embora as abordagens cooperativa e colaborativa salientem a participação activa dos estudantes no processo de aprendizagem, encorajem comportamentos sociais como a clarificação, a negociação, o encorajamento e o compromisso, e desenvolvam competências cognitivas como as associadas à investigação, à análise e à síntese, as aplicações destas abordagens pedagógicas são diferentes. De acordo com Bruffee (1995), a abordagem colaborativa tem as suas origens num construtivismo social em que o enfoque é colocado na construção dos saberes com base nas interacções que se estabelecem no seio de uma comunidade de aprendizagem (cf. Ragoonaden, 2001). Para além do “Grupo de Consenso de Sala de Aula” de Bruffee (1995), existem poucos modelos colaborativos escritos. Na abordagem colaborativa, a tónica é sempre colocada nos procedimentos de negociação e compromisso entre os estudantes. O papel do professor no grupo torna-se, por isso, bastante diminuto. Assim, segundo Panitz (1997), a aprendizagem colaborativa é uma filosofia pessoal e não apenas uma estratégia de trabalho pedagógico. Em todas as situações colaborativas emerge uma forma de ser e de estar que respeita e enaltece as competências e contribuições individuais de todos os elementos do grupo. Deste modo, a premissa básica da aprendizagem colaborativa é a construção do consenso através da cooperação dos membros do grupo. A actividade colaborativa é, antes de mais, voluntária, apela à autonomia e combina processos de trabalho individual e colectivo. É um processo mais democrático do que a cooperação, concedendo mais poder ao formando, num clima de responsabilidade e autonomia. Na colaboração, a ênfase é colocada na realização da tarefa pelo formando, podendo utilizar o grupo como recurso. Por seu lado, a cooperação é, para o mesmo autor, uma estrutura de interacção Itinerários de Aprendizagem Colaborativa/Cooperativa em Contexto On line desenhada para facilitar o alcance de um(a) objectivo/meta/finalidade específico(a) por um grupo de indivíduos que trabalham juntos. Na cooperação, a ênfase recai na realização da tarefa pelo grupo, baseada nas subtarefas de cada formando. A aprendizagem cooperativa consiste, assim, num conjunto de processos que ajudam os elementos do grupo a interagirem para alcançar o resultado final, sendo um processo mais dirigido e controlado do que um sistema colaborativo. A cooperação é uma abordagem muito mais estruturada, isto é, tanto os estudantes, como o professor/formador, assumem o desempenho de papéis específicos. Na perspectiva cooperativa dita mais formal, nem o professor, nem os estudantes, podem divergir do percurso traçado pelo modelo a seguir. Ainda que o objectivo mais importante, quer da aprendizagem cooperativa, quer da colaborativa, seja tornar os estudantes responsáveis pela sua própria aprendizagem, para Bruffee (1995) a aprendizagem colaborativa tende a diminuir essa mesma responsabilidade, dado o tipo de procedimentos que se vão estabelecendo no trabalho de grupo. As relações estabelecidas entre estudantes e professores permanecem as mesmas no agrupamento colaborativo, ou no agrupamento cooperativo. Os aprendentes são conjuntamente responsáveis pelas suas aprendizagens. No entanto, é possível evidenciar uma interdependência positiva nas metodologias ditas cooperativas e uma independência nas abordagens mais colaborativas. Ainda que seja reconhecido que, tanto no processo da cooperação, como no da colaboração, o professor tenha que gerir os parâmetros e deva fazer a avaliação do trabalho individual e de grupo, há duas pequenas distinções a estabelecer quanto aos papeis do professor e dos aprendentes: (a) na abordagem cooperativa, o professor integra-se no grupo de trabalho, enquanto que (b) na abordagem dita colaborativa, o professor distancia-se do grupo. Tal como o professor, também os aprendentes têm papéis específicos a desempenhar, ou seja, assumem vários papéis numa equipa de trabalho cooperativo, enquanto que, numa equipa de trabalho tipicamente colaborativo, têm apenas o papel de animador. As grandes distinções entre as duas abordagens situam-se ao nível da aplicação dos modelos pedagógicos, traduzindo-se num percurso muito estruturado para a aprendizagem cooperativa e num percurso muito mais flexível para a aprendizagem tipo colaborativa. Bruffee (1995) analisa estes dois enfoques com base numa linha de continuidade (Figura 2), que vai de um sistema muito controlado e centrado no professor (cooperativo) a um sistema centrado no estudante, onde o professor e os estudantes dividem a responsabilidade, a autoridade e o controlo do processo ensino / aprendizagem (colaborativo). 63 Figura 2 – Linha de Continuidade Colaboração / Cooperação Fonte: Autora O facto de a abordagem colaborativa favorecer a independência do aprendente, torna-a suficientemente adequada para o ensino à distância. Mais adiante iremos ver as razões que sustentam esta afirmação. As semelhanças e as diferenças entre as aprendizagens colaborativa e cooperativa são as que se resumem na Tabela 8, pese embora o facto de nos enunciados, propostos por Bruffee (1995), algumas das distinções entre as duas abordagens se revelarem controversas. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Tabela 8 – Aprendizagens colaborativa e cooperativa. Semelhanças e diferenças 64 Fonte: adaptado de Oxford, 1997, p. 444 Itinerários de Aprendizagem Colaborativa/Cooperativa em Contexto On line Pela análise dos dados contidos na Tabela 8, constata-se que Bruffee (1995) enaltece as principais características que definem as aprendizagens colaborativa e cooperativa, emergindo aspectos muito interessantes em torno de alguns indicadores: • em ambos os cenários, os estudantes são conjuntamente responsáveis pelas suas aprendizagens; • embora sendo reconhecido que o professor tenha de gerir os parâmetros de cooperação e colaboração e deva fazer a avaliação do trabalho individual e de grupo, registam-se duas pequenas distinções quanto aos papéis do professor e dos estudantes: • na abordagem cooperativa, o professor deve integrar-se no grupo de trabalho, enquanto que, na abordagem colaborativa, se deve distanciar do grupo; • também os estudantes assumem funções específicas em cada uma das abordagens, ou seja, desempenham vários papéis numa equipa de trabalho cooperativo, mas, numa equipa de trabalho colaborativo, têm apenas o papel de animador; • de acordo com o que ficou apresentado na Tabela 8, as únicas grandes distinções entre as duas abordagens são ao nível da aplicação dos modelos pedagógicos, o que se traduz num percurso muito estruturado para a aprendizagem cooperativa e num percurso muito flexível para a aprendizagem colaborativa. Para completar de forma mais enriquecedora a moldura em torno das sinergias para a definição daqueles dois conceitos, apresenta-se na Tabela 9 a distinção proposta por Henri, & Lundgren-Cayrol (1997) baseada num conjunto diversificado de elementos diferenciadores. 65 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Tabela 9 – Comparação entre a abordagem cooperativa e colaborativa 66 Fonte: adaptado de Henri, & Lundgren-Cayrol, 1997 Para completar de forma mais enriquecedora a moldura em torno das sinergias para a definição daqueles dois conceitos, apresenta-se na Tabela 10 a distinção proposta por Henri, & Lundgren-Cayrol (1997) baseada num conjunto diversificado de elementos diferenciadores. Tabela 10 – Comparação entre a abordagem cooperativa e colaborativa Fonte: adaptado de Henri, & Lundgren-Cayrol, 1997 Mais recentemente, Barbosa & Pessoa (2007) elaboraram um quadro comparativo entre a aprendizagem cooperativa e a aprendizagem colaborativa, conforme se transcreve na Tabela 11. Fonte: adaptado de Barbosa & Pessoa, 2007 Pela análise da Tabela 11, é possível observar que, tanto a aprendizagem cooperativa, quanto a colaborativa, estão direccionadas para actividades de grupo com um mesmo objectivo. As diferenças são percebidas, fundamentalmente, na regularidade da troca, na organização do trabalho em conjunto e na coordenação, a saber: a colaboração implica um processo mais aberto; a cooperação exige uma maior organização do grupo, com controlo da situação pelo professor / formador. Embora, do ponto de vista conceptual estes dois conceitos consigam ser enunciados Itinerários de Aprendizagem Colaborativa/Cooperativa em Contexto On line Tabela 11 – Comparação entre aprendizagem cooperativa e aprendizagem colaborativa 67 de forma a evidenciar semelhanças e diferenças, nos contextos de prática educacional nem sempre tal diferenciação se torna por demais evidentes o que se reflecte na constante controvérsia em torno do significado destes dois termos. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 3 – Um novo contexto do processo de ensino aprendizagem: o virtual 68 O facto do ensino online pressupor o uso de ferramentas informáticas promotoras de interacção, faz despontar um novo “contexto” do processo ensino / aprendizagem onde se estabelece um binómio interrelacional de partilha e combinação de traços identitários, quer do Ensino a Distância – a independência do espaço e do tempo e a comunicação centrada no texto –, quer do ensino presencial – a comunicação baseada no grupo-classe. Tal contexto de virtualização proporciona uma comunicação não só bidireccional, como também multidireccional, onde professor e alunos iniciam e respondem a interacções de todos os participantes (comunicação um – para – um, um – para – muitos, muitos – para – muitos), caracterizando-se, por isso, pelo desenvolvimento de um elevado nível de interacção (e-feedback) entre indivíduos. A reflexão que tem vindo a ser feita no âmbito do presente estudo mostra um claro e evidente consenso para a necessidade e urgência em transformar os sistemas de educação / formação vigentes para conseguir dar resposta às exigências actuais da sociedade da informação e do conhecimento. Tal transformação coloca ao ensino online um conjunto de desafios que se destacam em torno da emergência do grupo enraizado na comunicação mediada por computador. Este factor introduz alterações suficientemente profundas relativamente a aspectos estruturantes do Ensino a Distância dito convencional. Alguns autores sustentam, mesmo, a ideia de uma mudança de paradigma no universo do Ensino a Distância. Outros realçam, apenas, um novo domínio educativo. De acordo com a tese de Morgado (2003, 2005), é a emergência do grupo e do aprender juntos que abre, verdadeiramente, as portas a um vasto conjunto de metodologias de trabalho até então não aplicáveis na Educação a Distância e que se enraízam na interacção e colaboração entre os membros desse grupo. Na opinião de Garrison & Anderson (2005), a característica fundamental da Educação online não se restringe ao facto de facilitar o acesso à informação, mas sim de potenciar a comunicação e a interacção. No contexto do Ensino a Distância, onde a socialização estava omissa, estes desafios sustentam o aumento e a diversificação exponencial de variáveis como: a possibilidade de Itinerários de Aprendizagem Colaborativa/Cooperativa em Contexto On line interacção (aluno / conteúdos, aluno / aluno e aluno / professor); a partilha de informação; a construção individual e colectiva do conhecimento. O leque de “mais valias” conquistadas com o Ensino online e com a existência do “grupo” na Educação a Distância vai permitir redimensionar o “olhar pedagógico” numa perspectiva de construção e implementação de uma maior diversidade de actividades, materiais e formas de trabalho, combinando o estudo individual com uma forte componente colaborativa – a génese de uma comunidade de saber(es) – , o que pode afirmar-se como sendo um dos traços identitários do Ensino online. Com efeito, a definição de uma área de interesses e de objectivos comuns fomentará a noção de que todos os elementos da comunidade partilham uma identidade de grupo. A criação desses laços potenciará relações de interdependência que permitirão uma resolução mais eficaz de problemas (partindo da contribuição de cada um dos elementos da comunidade), o que tenderá para a tal construção e (re)construção colectiva de conhecimentos já prevista por Teilhard de Chardin e defendida por Lévy (1999). Por outro lado, o Ensino online reúne os processos de ensino / aprendizagem e reintroduz o professor como elemento fundamental na condução, orientação e validação das aprendizagens. A boa ou má mediação depende muito do professor, não havendo tecnologia que “salve” a situação quando ele não for capaz de colocar os grupos de trabalho a funcionarem de modo a que todos aprendam, individualmente e em conjunto. Estes aspectos parecem aproximar o Ensino a Distância do ensino presencial, no que concerne o papel e funções desempenhadas pelo professor, na medida em que o processo de ensino / aprendizagem vai, nestes novos contextos, depender, tal como acontece no ensino presencial, do perfil de competências profissionais do professor / formador. Para Harasim (2000) o Ensino online permite reunir todas as possibilidades técnicas e pedagógicas para se afirmar como um novo domínio, pedagogicamente superior ao sistema de ensino presencial e à modalidade de Educação a Distância tradicional, juntando as mais valias daquele e desta. A Tabela 12 apresenta uma tentativa de caracterização do potencial da Educação online, demonstrando os benefícios emergentes das convergências possíveis entre as mais valias do ensino presencial e as do Ensino a Distância dito convencional. 69 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Tabela 12 – Convergências do Ensino Presencial (EP) e do Ensino a Distância (EaD) para o Ensino Online 70 Fonte: Autora 4. Investigação Empírica 4.1. Dimensões para a construção da problemática O presente projecto de investigação pretende constituir-se como um contributo para o estudo da problemática dos Itinerários de @prendizagem colaborativa / cooperativa em ambientes virtuais de aprendizagem, no contexto específico dos cursos de formação de tutores em e-learning, ministrados em regime online, na Universidade Aberta portuguesa. Esta problemática específica centra-se nas dimensões histórico-filosoficopedagógicas, em contexto de ensino / aprendizagem online, que influenciam o trabalho colaborativo / cooperativo numa sala de aula virtual. 4.2. Objectivos e questões de partida geradoras de investigação Tendo em consideração a problematização atrás descrita, constitui-se objectivo deste estudo analisar e estudar a forma como, os oitenta e sete formandos dos cursos de e-tutores, ou seja, os futuros e-tutores a integrar nas turmas dos cursos das licenciaturas oferecidas pela Universidade Aberta Portuguesa, vivenciam e analisam o trabalho cooperativo e colaborativo desenvolvido no âmbito das diferentes actividades do curso de formação de Itinerários de Aprendizagem Colaborativa/Cooperativa em Contexto On line Para Garrison e Anderson (2005), o Ensino online transforma, inevitavelmente, a forma de abordar a Educação e a aprendizagem no século XXI. Em virtude da sua natureza inovadora, ele produz novos modos de organizar as actividades e de gerir o tempo, alterando as relações entre os elementos intervenientes nos processos de formação. Tudo isto pode transformar profundamente os anteriores cenários de formação e tornar outros actuais, com características próprias, ainda não passíveis de delimitação. 71 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 72 tutores em e-learning que frequentam antes de iniciarem a sua actividade profissional nesta instituição universitária num total de cinco semanas de formação. Interessava-nos compreender, tendo em conta o curso de formação / preparação que frequentaram, o que nele destacam, quer do ponto de vista positivo, quer do ponto de vista dos problemas/constrangimentos. Pretendemos, desta forma, identificar os elementos facilitadores e os elementos inibidores da aprendizagem colaborativa / cooperativa, em contexto online e, eventualmente, equacionar perspectivas de reflexão, no que concerne às dimensões e sub-dimensões pedagógicas que lhe são subjacentes no âmbito do design das respectivas actividades presentes na especificidade destes cursos. Do problema de estudo e dos objectivos, fizemos emergir, neste contexto, as seguintes macro questões que norteiam esta investigação: “Na especificidade do Ciberespaço, num contexto de Sala de Aula Virtual desenhada exclusivamente para os Cursos de Tutores em E-learning da Universidade Aberta • Quais os factores facilitadores/ inibidores de aprendizagem colaborativa / cooperativa? • Que dimensões e sub-dimensões pedagógicas emergem como fundamentais, na construção e design de uma actividade, para que o trabalho colaborativo/cooperativo seja potenciado?” • Que variáveis influenciam a organização e a condução das actividades colaborativas / cooperativas em contexto de “sala de aula virtual”? • Quais os elementos essenciais que influenciam o trabalho colaborativo/ /cooperativo ao nível de uma comunidade virtual de aprendizagem? • Será que os formandos (estudantes) percepcionam as diferenças teóricas entre trabalho colaborativo e cooperativo (defendidas por muitos autores na literatura) ao vivenciarem a especificidade deste curso de formação? Foi na procura de algumas possíveis soluções para o problema em estudo, bem como de algumas respostas às questões norteadoras deste estudo que empreendemos esta investigação. 4.3. Opções metodológicas Enquadrando a moldura deste estudo no âmbito do espírito científico, entendido como uma rectificação do saber, um alargamento de quadros de conhecimento, percorremos os Itinerários de @prendizagem colaborativa / cooperativa em ambientes virtuais de aprendizagem, no contexto específico dos cursos de formação de tutores em e-learning, ministrados em regime online na Universidade Aberta, definindo-o como “palco” da investigação única a desenvolver. Num total de 87 formandos, este cenário de investigação permitiu acompanhar a 3ª edição do Curso de Tutores em e-learning, constituído por quatro turmas virtuais, que vivenciaram um design de curso, composto por três actividades de natureza distinta: colaborativa, individual e cooperativa. Foram construídos, aplicados e tratados os dados recolhidos com a aplicação de três inquéritos (questionários) a cada um dos formandos participantes, de forma a fazer emergir a suas opiniões, tendo em consideração as diferentes actividades do curso pelas quais passaram. Da mesma forma procedemos a um extenso e moroso processo de análise de conteúdo das intervenções destes mesmos formandos em Fórum Colaborativo (Actividade 1) e em Fórum de Equipas (Actividade 3). A consequente análise de dados permite-nos responder com total transparência, às questões que deram sentido à “bússola” que norteou esta investigação. “Na especificidade do Ciberespaço, num contexto de sala de aula virtual: • Quais os factores facilitadores / inibidores da aprendizagem colaborativa / cooperativa?” No que diz respeito a esta questão, o estudo por nós conduzido alerta-nos para o facto de não ser, na verdade, e ao contrário do que nos faria supor por uma intuição contagiada pela experiência do presencial, um factor inibitório o desconhecimento dos elementos do grupo / equipa; nem o facto desta aprendizagem ser realizada através da mediação da tecnologia, nem o factor tempo, motivação ou formação prévia. Assumemse estes como elementos neutros no processo por estes formandos vivenciado. Contudo, parece-nos facilitar este tipo de aprendizagem aspectos relacionados com o design do curso (clareza de objectivos, natureza das tarefas, qualidade de recursos disponibilizados pelo formador, entre outras) e com as interacções sociais online ocorridas não só entre colegas como também entre estes e o formador. Sendo que, este último, se assume com carácter facilitador ao processo se desempenhar a importante função de mediador da comunicação ou de elemento de bastidor estruturante de toda esta dinâmica. • Que dimensões e sub dimensões emergem, como fundamentais, na construção e design de uma actividade, para que o trabalho colaborativo / cooperativo seja potenciado?” Relativamente a esta macro questão, o estudo por nós desenvolvido fez enaltecer a Itinerários de Aprendizagem Colaborativa/Cooperativa em Contexto On line Considerações Finais 73 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade dimensão de design instrucional do curso como aquele que nos parece mais responsável pelo sucesso, quer da actividade colaborativa, quer da cooperativa em contexto online. Se bem que líder de todas as sinergias sentidas em cada uma das actividades, esta dimensão controlou as rédeas de todo o “palco” onde as “personagens” interagiram no processo de construção do conhecimento. É a dimensão instrucional que se afirmou como motivo e motor das restantes dimensões, favorecendo o exponenciar da dimensão da interacção social (e consequentemente da dimensão pessoal) minimizando, de forma explícita, o factor que poderia apresentar-se como inibitório e que se prende com a dimensão tecnológica. Mais uma vez afirmamos convictamente que, a aprendizagem colaborativa/cooperativa em contexto online assenta em premissas de design instrucional muito consciente e articulado entre todos os seus elementos curriculares, ditando a eficácia, ou não, da aprendizagem colaborativa e/ou cooperativa nestes contextos virtuais, com base na eficaz utilização das ferramentas tecnológicas de comunicação que podemos ou não ter ao dispor de uma determinada situação do processo ensino-aprendizagem online. A este propósito e com base em todo o processo de investigação empírica construído neste estudo, ousámos desenhar uma figura piramidal que transmite, de forma clara e hierarquizada (pela quantidade de intervenções ocorridas em fórum) as dimensões inerentes à especificidade da aprendizagem colaborativa emergentes neste contexto de investigação 74 Figura 3 – Dimensões da Actividade Colaborativa emergentes do contexto específico desta investigação Fonte: Autora Tendo em consideração a dimensão do design instrucional que se apresentou como “motivo e motor” da figura piramidal acima apresentada, verificamos que os formandos Figura 4 – Dimensões da Actividade Cooperativa emergentes do Contexto específico desta investigação Fonte: Autora A actividade cooperativa surge-nos com uma nova engenharia de dimensões. Embora e mais uma vez o design instrucional do curso fosse “o leme” de estruturação do que se vivenciou em fóruns de equipa, verificámos que o início do princípio nasce numa dimensão psicológica de cariz motivacional explícito, em que se deseja a coesão do grupo/ Itinerários de Aprendizagem Colaborativa/Cooperativa em Contexto On line iniciaram todo o seu processo colaborativo através de uma fase de trabalho autónomo, individual, tendo em conta a temática a tratar, a natureza da tarefa a realizar, os recursos disponibilizados e os objectivos a alcançar. De seguida, esta fase da actividade dá lugar a uma dimensão pedagógica de natureza mais colaborativa onde os formandos são convidados de forma espontânea a interagir uns com os outros, concordando, discordando, comentando, complementando, enriquecendo, questionando a fase anterior. Lançar dúvidas sobre o pensamento do outro, questionar o nosso próprio pensamento até então…. Enfim: reflectir. De uma forma menos presente mas espelho da existência de uma ligação contínua entre os indicadores mais colaborativos com os indicadores mais cooperativos, damos conta de que a actividade colaborativa permitiu aproximar-nos de um fugaz momento de produção colectiva, de síntese construída, de conhecimento filtrado e partilhado. Uma actividade em que a dimensão pedagógica se impôs pela sua vitalidade recorrendo espontaneamente à natureza da participação em grande grupo também ela geradora de motivação oculta, não necessariamente explícita em indicadores escritos. Procedemos de igual modo para a Actividade cooperativa deste curso desenhando uma figura que apresentamos de seguida. 75 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 76 equipa, se ousa chamar a si o seu “semelhante”, se desenha uma necessidade oculta de sentir “colo” nos seus pares. Assim que este novo “nicho ecológico” se arquitecta, há que orientar a “alcateia”, há que liderar a tarefa, há que organizar o espaço, o tempo, o grupo em torno de um objectivo comum: conseguir. Assim que a dimensão psicológica está enraizada numa plataforma de segurança ousa-se avançar para a dimensão pedagógica de natureza individual em que cada um cumpre religiosamente a sua tarefa de forma autónoma e independente. Mas… o “porto de abrigo” torna-se um íman…atrai de forma espontânea os seus elementos, em diferentes momentos como se de um sistema solar se tratasse. O Sol é o Fórum de Equipa que atrai os formandos - planetas que giram com total independência à sua volta num espaço virtual imenso mas que, pela força da gravidade se mantêm em órbitas próximas. É esta metáfora que nos ajuda a demonstrar a existência da fase seguinte em que a dimensão psicológica da entreajuda se desenha em grande número de intervenções. Por fim, a dimensão pedagógica volta a surgir numa apresentação de produto final conseguido pela forma cooperativa com que todos desempenharam a sua função. Numa procura mais cirúrgica de respostas às questões mais particulares, entretanto definidas para este estudo, a saber: • Que variáveis influenciam a organização e a condução das actividades colaborativas / cooperativas em contexto de “sala de aula virtual. Transparece que as variáveis mais influentes na condução de actividades de cariz colaborativo e/ou cooperativo online se prendem com a natureza da actividade em si, com os objectivos a alcançar e com o tipo de tarefas que lhe estão subjacentes, na medida em que, são estas que “ditam”a necessidade maior ou menor interacção e construção conjunta de conhecimento. Dentro deste conjunto de variáveis salientam-se: a definição de objectivos claros e operacionalizáveis; a qualidade dos recursos científicos e tecnológicos promotores de diálogo e interacção assíncrona, que enquadram a respectiva tarefa; o tempo planificado para a mesma e o papel do formador não como transmissor de conteúdos mas como mediador da distância transacional desejada. • Quais os elementos essenciais que influenciam o trabalho colaborativo / cooperativo ao nível de uma comunidade virtual de aprendizagem? Compreender bem os objectivos inerentes à actividade, fazer uma boa gestão do tempo, utilizar de forma potenciada os recursos tecnológicos e científicos disponibilizados, participar de forma regular e motivada nas tarefas que exigem essa solicitação bem como nutrir sentimentos de entreajuda e compreensão pelos colegas, assente num diálogo Itinerários de Aprendizagem Colaborativa/Cooperativa em Contexto On line constante e na manutenção de uma distância transacional adequada, parecem assumiremse como elementos essenciais a um estudante online que, no âmbito de uma comunidade virtual de aprendizagem, poderá tirar benefício acrescido de toda a dinâmica colaborativa e/ou cooperativa instalada num cenário desta natureza. • Será que os formandos (alunos) percepcionam as diferenças teóricas entre trabalho colaborativo e cooperativo (defendidas por muitos autores na literatura) ao vivenciarem a especificidade deste curso de formação? É interessante notar que a investigação desenvolvida neste estudo sublinha, na generalidade, todas as premissas teóricas que sustentam o sucesso da aprendizagem colaborativa / cooperativa em contexto presencial ou online. Demarca-se a importância da participação, da partilha com e pelo diálogo (Aires et al; 2007) e da produtividade não só na construção de conhecimento como também no estabelecimento de interacções sociais que relevam a postura de que “aprender juntos” é mais motivante, mais produtivo e desafiador do que “aprender sozinho”. Contudo, salientamos que, nesta investigação os resultados não apontam para uma diferença nítida de opiniões entre os formandos relativamente à separação teórica inerente ao design da Actividade de cariz colaborativos e ao da Actividade de cariz cooperativo, não sendo muito clara a distância de separação entre a eficácia, produtividade, interacções, etc, entre estes dois tipos de aprendizagem vista pelo olhar de opinião dos formandos. Concluímos assim que, no cenário palco deste estudo de investigação, a natureza do design instrucional das actividades não permitiu aos formandos posicionarem-se de forma mais nítida e clara quanto o desejaríamos relativamente às diferenças teóricas entre um tipo de aprendizagem e o outro. Tal como Brufee (1995) refere, existe uma linha de continuidade entre estes dois tipos de enfoques pedagógicos, sendo que, neste curso, somos levados a pensar que estas duas actividades se situam em pontos muito próximos desta mesma linha imaginária. Numa sociedade já com mais de uma década de vivência no século XXI nascem, crescem e desenvolvem-se contextos e pretextos para o processo ensino / aprendizagem online ser considerado, hoje em dia, o cerne do debate em agenda, a propósito dos temas educacionais que perspectivam a sua utilização eficaz e potenciada em termos de formação/ educação num mundo global com espaços de arquitectura virtual. “Dar novos mundos ao mundo” é o grito da flexibilidade na aprendizagem por itinerários de colaboração / cooperação online, onde o berço do virtual parece ser o “nicho ecológico” ideal para a construção do conhecimento que se deseja colectivamente construído e partilhado através 77 da génese das comunidades virtuais formais ou informais que se despoletam em redes sociais, via Web. Urgiu tomar consciência reflexiva sobre algumas contradições e tensões associadas a este novo desabrochar do mundo. Em contexto online, a acção de colaborar/cooperar, por si só, não conduz necessariamente a novos conhecimentos, há que desenhar um processo de encaminhamento, de mediação pedagógica de modo a que sejam desencadeadas todas as variáveis potenciadoras e facilitadoras desta emergência, bem como prever todo um cenário de controlo dos factores inibitórios adjacentes a esta situação. O dealbar de um novo contexto de ensino aprendizagem – o online, bem como de todo o grupo de factores satélite ao nível da comunicação, que circulam em suas órbitas interdependentes, de forma a potenciar (ou não) a aprendizagem em contexto colaborativo e/ou cooperativo, fizeram deste estudo uma “lupa”. Esta “lente” procura aumentar a nitidez sobre as dimensões que revestem o envolvimento e a participação, dos estudantes, numa comunidade de aprendizagem online específica, onde estes se assumiram como actores empreendedores na construção do seu próprio conhecimento, facilitada pela relação empática, via Web, enquanto tecnologia de suporte e assente num design instrucional solidamente sustentado do ponto de vista teórico. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade REFERÊNCIAS 78 Aires, L. (Coord.) (2007). Comunidades virtuais de aprendizagem e identidades no ensino superior. Lisboa: Universidade Aberta. Barbosa, F. & Pessoa, S. (2007). Educação e crescimento: o que a evidência empírica e teórica mostra. Bates, A. W. (1995). Technology, open learning and distance education. London: Routledge. Bruffee, K. (1995). “Collaborative Learning: Higher Education, Interdependence, and the Authority of Knowledge”. Baltimore and London: The John Hopkins University Press. 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Toda uma cadeia de eventos emana da decisão, fazendo vir em nosso favor todo tipo de encontros, de incidentes e de apoio material imprevistos, que ninguém poderia sonhar que surgiriam em seu caminho. Começa tudo o que possas fazer, ou que sonhas poder fazer. A ousadia traz em si o gênio, o poder e a magia. (Goethe) O 82 propósito deste capítulo é o de buscar entender competências nas matrizes de referências do condutivismo, do funcionalismo e do construtivismo. Busca-se, também, verificar a correlação existente entre modelos do mundo do trabalho e a noção de competência, e, no final, mostrar que competência é mais abrangente que qualificação. As questões que orientam a reflexão são: os objetivos do ensino visam a eficiência social? Até que ponto? Como superar o objetivismo? Como deslocar o foco dos processos educativos de conteúdos para o sujeito que aprende? O segundo bloco de questões atém-se a correlação do significado de competência e seu atrelamento ao taylorismo, toyotismo, neo-taylorismo e holismo: como manifestase ela em cada um dos modelos? O terceiro bloco: competência e qualificação são semas idênticos? Em que diferenciam? No mundo da educação, a que acolheu a competência foi a educação profissional. Mas a polissemia e a plasticidade da noção de competência permitiram que ela se adaptasse a vários contextos. Tanguy (1997, p. 38-39) observa: A união com a noção de competência efetuou-se mais facilmente no meio escolar porque já parecia naturalizada pela difusão que conhece em outros meios, e porque sua plasticidade permitia a cada um fazer prevalecer um cuidado partilhado de mudança sobre diferenças de concepção pedagógica. A ambivalência dessa noção é, sem dúvida, a origem de transposições específicas ou aplicações, algumas vezes muito afastadas da Carta, que foram feitas nos diferentes graus de ensino (ensino secundário geral, técnico e profissionalizante) e nas próprias disciplinas [...] Por outro lado, no ensino geral, assim como no ensino profissionalizante que o precedeu nesse domínio, a noção de competências e aquelas que lhe estão associadas (saber, savoirfaire, objetivos) é acompanhada de um explicação das atividades (ou tarefas) em que elas podem se materializar e compreender; explicitação essa que revela a impossibilidade de dar uma definição a essas noções separadamente das tarefas nas quais elas se materializam. Isso ocorre porque a “abstratização”, que está na base de seu uso social requer, na prática, a operação oposta: sua tradução em uma lista de tarefas elementares. Essa visão de uma lista de tarefas elementares refere-se apenas à iniciação profissional, pois, como ver-se-á, ela se complexifica nas habilitações técnicas de nível médio e nas graduações tecnológicas de nível superior. Segundo Ramos (2002), três são as principais matrizes de referências dos métodos de investigação de competência: a “condutivista”6 (Skinner, Bloom e Mager), utilizada predominantemente nos Estados Unidos; a “funcionalista”7 , que se tem tornado hegemônica; e a “construtivista”8 (Piaget), de origem francesa. O aprofundamento dessas matrizes é o que veremos a seguir. A tendência condutivista considera que o uso da noção de competência deve-se à necessidade de se expressarem claramente os objetivos de ensino em termos de condutas e práticas observáveis. Essa associação estaria fundada sobre uma homologia entre os objetivos operacionais de formação e os objetivos operacionais de produção, alimentada por uma cultura psicológica dominada pelo behaviorismo de Skinner (1970), apropriada pedagogicamente por Bloom (1984) e Mager (1974). Em meados da década de 1960, nos Estados Unidos, argumentava-se que os tradicionais exames acadêmicos não garantiam nem o desempenho no trabalho, nem o êxito na vida, postulando-se a busca de outras variáveis para predizer um certo grau de êxito. Bloom (1984), em seu artigo “Aprendizagem para o Domínio”, declarava que 90 a 95% dos alunos teriam possibilidade de aprender tudo o que lhes fosse ensinado, desde que lhes oferecessem condições para isso e que o ensino fosse orientado por três objetivos comportamentais: pensar, sentir e agir, englobados em três áreas: cognitiva, afetiva e psicomotora. Ramos (2002, p. 89-90) ressalta que: A noção de competência e suas várias implicações 1. Competência: Processos Cognitivos e de Aprendizagem 83 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade A matriz condutivista de análise do trabalho advém da mesma estrutura comportamentalista que nasce nos Estados Unidos por meio de Skinner na psicologia, e de Bloom, Mager e outros, na pedagogia, que se estenderam a diversos países e campos de atuação. Guarda forte relação com o propósito da eficiência social e se manifesta, mais fortemente, também nos Estados Unidos, na elaboração de um modelo genérico de competência gerencial. A competência é definida como as características de fundo de um indivíduo que guarda uma relação causal com o desempenho efetivo ou superior no trabalho. O desempenho efetivo é um elemento central na competência e se define como a forma de alcançar resultados específicos com ações específicas, em um contexto dado de políticas, procedimentos e condições da organização. As competências são as características que diferenciam um desempenho superior de um desempenho médio ou pobre. Aquelas características necessárias para realizar o trabalho, mas que não conduzem a um desempenho superior, são denominadas habilidades mínimas. A análise condutivista parte das pessoas que fazem bem seu trabalho de acordo com os resultados esperados. Passando do âmbito das competências gerenciais para os trabalhadores em geral e seguindo alguns dos princípios da análise condutivista, preparou-se, ao início dos anos 90 nos Estados Unidos, um informe sobre as mudanças que se deveriam fazer nas escolas para que delas saíssem jovens melhor preparados para os desafios da competitividade e produtividade do futuro próximo, assim como para definir a agenda de capacitação e requalificação de trabalhadores para os postos avançados do futuro. 84 Os objetivos de ensino expressam, portanto, a forma como as teorias sobre o comportamento humano desenvolvidas por Skinner (1970) foram inicialmente apropriadas pela pedagogia. Para esse autor, a noção de comportamento não se distingue dos mecanismos da sua instalação, confundindo-se com o próprio domínio do saber que estruturaria o comportamento. Bloom (1984), um pedagogo com estudos baseados na obra de Skinner, definiu os objetivos como a formulação explícita dos métodos que visam transformar o comportamento dos alunos; em outras palavras, os meios pelos quais estes modificarão a sua maneira de pensar, os seus sentimentos e as suas ações. Mager (1974), por sua vez, tenta afastar-se do behaviorismo preferindo a noção de performance ou desempenho à de comportamento. Para ele, os objetivos do ensino são as ações manifestas, descritas minuciosamente. Um objetivo útil definese pelo desempenho (o que o estudante é capaz de realizar), pelas condições nas quais deve transcorrer o desempenho e pela qualidade ou pelo nível de performance considerado aceitável. Os principais problemas detectados no condutivismo, decorrentes da análise A noção de competência e suas várias implicações da teoria de Mager, são: 1) a redução dos comportamentos humanos às suas aparências observáveis; 2) a redução da natureza do conhecimento ao próprio comportamento; 3) a consideração da atividade humana como uma justaposição de comportamentos elementares cuja aquisição obedeceria a um processo cumulativo; 4) o ocultamento da efetiva questão sobre os processos de aprendizagem que subjazem aos comportamentos e desempenhos: os conteúdos da capacidade. O condutivismo respalda, então, os primeiros estudos sobre currículo realizados por Bobbitt (1972), em 1918, os quais, em nome da eficiência econômica, transferem para o trabalho escolar os princípios tayloristas-fordistas de organização do trabalho industrial na forma dos princípios lógicos de Tyler (1971) de organização curricular. Por essa perspectiva, o currículo tomava por base as deficiências dos indivíduos, no sentido de superá-las em benefício do desenvolvimento racional e eficiente do trabalho. Desses padrões, originaram-se os métodos de análise ocupacional utilizados para a elaboração de currículos da formação profissional. Esses padrões assentam-se no preestabelecimento de objetivos, na seleção e no direcionamento das situações de ensino e na avaliação precisa da aprendizagem. Em outras palavras, a educação era dirigida e controlada por propósitos que estavam fora dela, como as necessidades econômicas da produção capitalista. A economia da educação e a teoria do capital humano constituíramse numa precisa sistematização econômica de como e por quê adequar perfeitamente a produção científica dos recursos humanos num contexto socioeconômico de pleno emprego. A tendência funcionalista é a tentativa de analisar a associação entre competências e objetivos, na perspectiva de superar o condutivismo. A análise, nesse caso, preocupa-se não com a educação em geral, mas com a formação do adulto, destacando que, diferentemente daqueles que estão na formação inicial, os adultos recorrem a novos períodos de formação em função das exigências explícitas de sua ação social e profissional. Dessa forma, a formação orienta-se para as finalidades, e esse processo aparece como um processo de produção das capacidades necessárias ao exercício das atividades sociais e profissionais que os formandos exercerão no final de sua formação. Deduz-se que a formação deve produzir efeitos necessariamente ligados à atividade futura dos formandos. Esta atividade mobiliza capacidades ou competências que a formação pode e deve visar, e que se tornam, portanto, seus próprios objetivos. Malglaive (1995), entretanto, faz uma distinção entre a perspectiva adotada na América e na Europa sobre os objetivos, considerando que os pedagogos europeus teriam sido muito mais influenciados por Rousseau e por uma psicologia ainda literária ou 85 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 86 filosófica, centrada mais na pessoa, do que por uma psicologia condutivista. Considera, ainda, que a fonte de muitos mal-entendidos ou equívocos posteriores sobre os objetivos ocorreram devido à extrapolação que se fez de seu uso em relação à esfera a que, efetivamente, eles atendem: a da avaliação. Malglaive (1995) considera também ultrapassada a problemática da definição dos objetivos, devido tanto à evolução do trabalho quanto ao advento da psicologia cognitiva. Nesse novo contexto, a noção de comportamento, antes confundida com o próprio conteúdo da capacidade, daria lugar à de competência. Segundo ele, a noção de objetivos em pedagogia teria evoluído do controle normal da aquisição de conhecimentos à determinação de conteúdos de formação ordenados pelas atividades – mais freqüentemente profissionais – para as quais eles são supostamente preparados. Perrenoud (2002) é menos enfático sobre a possível superação da problemática relativa à definição dos objetivos. Ele não considera que as abordagens advindas da tradição da pedagogia do domínio estejam em absoluto superadas, mas sim que seus excessos – behaviorismo sumário, taxonomias intermináveis, excessivo fracionamento dos objetivos, organização do ensino por objetivo, dentre outros – foram controlados. Sendo assim, falar a respeito de competência pode não acrescentar muita coisa à idéia de objetivo, pois é possível ensinar e avaliar por objetivos sem se preocupar com a transferência dos conhecimentos e, menos ainda, com sua mobilização diante de situações complexas. Ou, ainda, como afirma o próprio Malglaive (1995), é possível descrever um conjunto de ações que remeta para a competência subjacente sem se perguntar como ela funciona. É o que acaba ocorrendo quando se tenta nomear, classificar, repertoriar as competências ao acrescentar ao verbo “saber” ou à locução “ser capaz de” uma expressão que caracteriza uma ação ou um conjunto de ações. Isso designaria, de fato, uma atividade e não uma capacidade ou competência. Conseqüentemente, mantém-se aberta a questão de saber o que devem adquirir os estudantes para serem capazes de fazer o que se pretende que eles façam. Essa questão tem sido equacionada por Malglaive (1995) pelo que ele denomina de estrutura dinâmica das capacidades. Esta baseia-se na idéia de “saberes em uso”, compreendida como a ação do pensamento sobre os saberes que orientam uma ação material ou simbólica, estruturante de novos saberes. Os saberes em uso incluem o saber teórico ou formalizado e o saber prático. O saber teórico - que, a partir da realidade, define o que é -, investido na ação, desdobra-se em saber técnico - que, define o que se deve fazer - e saber metodológico - como se deve fazer. A noção de competência e suas várias implicações O saber prático é o conhecimento gerado da ação, não formalizado, expresso mais em atos do que em palavras. Relaciona-se com os primeiros, mas não se reduz a eles, podendo ser de ordem tácita. O agrupamento desses saberes, então, estruturaria as capacidades ou competências, cujo aspecto dinâmico está na mobilização desses saberes por uma inteligência prática, que orienta o investimento dos saberes em uso na ação, e por uma inteligência formalizadora, definida como a ação autônoma do pensamento sobre os saberes em uso, afastada da ação quando a amplitude, o ritmo e a duração do trabalho do pensamento requerido para a aquisição de novos saberes são incompatíveis com o tempo da ação. Portanto, enquanto a inteligência prática realiza-se a partir da ação, a inteligência formalizadora é o processo por meio do qual se desenvolve a problematização e o pensamento abstrato. A competência, tal como compreendida por Malglaive (1995), tem relação com o que Zarifian (2001) chama de competências em último-plano ou competências recurso, ou seja, aquilo que se apreende de mais estável e de mais durável das atitudes, em face do real e da vida social que poderia sustentar as competências mais especificamente profissionais. A tendência construtivista representa a estrutura dinâmica das competências na perspectiva da superação do condutivismo. Incorpora ela a idéia da construtividade do conhecimento, com base na teoria da equilibração de Piaget (2002), pela qual se compreende ocorrer um “desequilíbrio” quando o sujeito se defronta com situações desconhecidas ou desafiadoras. Diante de um desequilíbrio estruturalmente perturbador, o aluno reorganiza seu pensamento num nível mais elevado do que o previamente atingido, num processo recursivo que conduz a um crescimento indefinido dos conhecimentos, quer no plano quantitativo, quer no plano qualitativo. As competências seriam, portanto, as estruturas ou os esquemas mentais responsáveis pela interação dinâmica entre os saberes prévios do indivíduo – construídos mediante as experiências – e os saberes formalizados. Compreendidas como um atributo subjetivo, as competências exigiriam o deslocamento do foco dos processos educativos dos conteúdos disciplinares para o sujeito que aprende, gerando a possibilidade de uma efetiva e contínua transferência das aquisições cognitivas. É nesse ponto que tomam importância as teses sobre as aprendizagens significativas que destacam a relevância de todo tipo de aquisições cognitivas, desde os saberes e conhecimentos formalizados até os saberes e conhecimentos tácitos. O construtivismo, com suas diversas nuanças, constitui-se no aporte psicológico da pedagogia das competências que se apresenta com finalidades também socioeconômicas, decorrentes do reconhecimento, pela sociedade, das competências adquiridas na vida 87 profissional do indivíduo. Vale registrar que as pedagogias psicológicas, das quais o construtivismo é a expressão contemporânea, aplicam-se tanto aos processos intra-escolares de ensino e aprendizagem, quanto aos processos mais globais de justificação e organização da ação educativa, nas mais diversas expressões, compondo fortemente o discurso educacional contemporâneo. Um dos princípios da metodologia construtivista que visa regular a aquisição de competências em coerência com as competências requeridas é que a capacitação individual só tem sentido dentro de uma capacitação coletiva. Ramos (2002, p. 95) observa: Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Por isso supõem-se que a definição das competências e da capacitação deve realizar-se segundo uma investigação participante. Compreendese, também, que o envolvimento do pessoal não qualificado repercute em evolução dos seus próprios comportamentos. A identificação das competências e dos objetivos do trabalho começam por identificar e analisar as disfunções próprias a cada organização. 88 A definição de competências requeridas e a perspectiva de capacitação permitem gerar um ambiente de motivação fundamental para a aprendizagem. Percebese, então, o quanto essa teoria pedagógica confere uma excessiva ênfase aos aspectos subjetivos dos alunos, em especial àqueles relacionados à aprendizagem, negligenciando o conjunto das determinações históricas e sociais que incidem sobre a educação, promovendo uma certa despolitização de todo o processo formativo e de inserção social. Portanto, à medida que o foco do processo educativo é o sujeito, seu projeto e sua personalidade, com vista à adaptação e à instabilidade social, evidencia-se um conceito de homem como ser natural e biológico voltado para si e para sua sobrevivência. A crítica, então, afeta a compartimentação disciplinar do conhecimento e, como conseqüência, a defesa de um currículo que ressalte a experiência concreta dos sujeitos como situações significativas de aprendizagem. Pelo fato de a competência implicar a resolução de problemas ou o alcance de resultados, defende-se que a pedagogia das competências poderia promover a oportunidade de se converter o currículo em um ensino integral, mesclando-se nos problemas os conhecimentos gerais, os conhecimentos profissionais, as experiências de vida e de trabalho que, normalmente, são tratadas isoladamente. Do ponto de vista das relações pedagógicas, a epistemologia construtivista apresenta um modelo que, além de resgatar a importância dos pólos da relação, conquista uma dinâmica própria no processo do conhecimento. O suporte desse modelo encontra-se na psicologia genética de Piaget (2002). Segundo Moraes (2003, p. 94), a percepção das concepções e do significado concreto se dá no construtivismo, como se expressa a seguir: Essa auto-organização possibilitará autonomia do sujeito de aprender a aprender. Isso significa que no construtivismo o indivíduo reflete, analisa e toma consciência dos seus saberes, conectados às transformações que estão ocorrendo no undo. Desse ponto de vista, a educação promove as condições básicas ancoradas no manejo e na produção do conhecimento, mediante o desenvolvimento de atitude de investigação e de competência para a criação de sua própria competência. O construtivismo tem origem nas propostas de Piaget (2002) com sua Epistemologia Genética, em que o conhecimento é gerado (e não herdado) e construído pelo indivíduo na sua progressiva descoberta do mundo e na sua interação com ele. Em relação à competência, o “construtivismo” vê o desempenho final competente como um processo único e original de “construção pessoal”. Tal construção depende basicamente das experiências conquistadas pelo indivíduo no processo de seu desenvolvimento, a dos conhecimentos por ele adquiridos através de suas descobertas no decorrer do exercício da atividade profissional, de suas realizações e criações pessoais e do reconhecimento pela sociedade dos frutos de toda a sua vida profissional. A abordagem construtivista não abandona totalmente a análise da realidade ocupacional. Apenas, não considera essa análise um produto acabado, mas, sim, o resultado de diversas experiências profissionais que estão sendo constantemente modificadas pela ação das mudanças tecnológicas, pelas descobertas que os profissionais realizam na sua experiência diária e pela constante negociação travada nas relações trabalho versus capital. Para os construtivistas, as normas não são vistas como metas absolutas, mas como “construtos”, que estão sujeitos a constantes mudanças, revisões e negociações. Não podem ser vistas como objetivos finais de um processo de formação, mas como sinalizadores importantes que podem orientar uma espiral de currículo para atingi-lo ou ultrapassá-lo. O processo de formação não pode ficar restrito a elementos finais de competência, mesmo A noção de competência e suas várias implicações Para o construtivismo, o conhecimento se constitui pela interação do indivíduo com seu meio ambiente, pela força de sua ação, pela capacidade de atuação, reconhecendo, portanto, o diálogo existente entre o indivíduo e o meio ambiente, a existência de uma dependência do ser em relação ao ambiente, ou seja, o contextualismo. Esse diálogo faz parte da teoria piagetiana de construção do conhecimento no qual o homem é visto como uma organização viva, um sistema aberto que, embora possua uma estrutura de auto-regulação, de auto-organização, que lhe é inerente, não é de nenhuma forma um ser auto-suficiente; ele está inserido no meio biológico no qual vive e com o qual interage. 89 porque a competência é individual e inédita. A competência, na visão construtivista, é entendida como a capacidade de mobilizar os conhecimentos, as habilidades, atitudes e emoções para exercer uma ou várias funções de forma eficiente, eficaz e criativa. A abordagem construtivista não é de todo incompatível com a análise funcional. Apenas ela não a toma como um objetivo absoluto do processo de formação, pois qualquer fixação de objetivos é limitador do processo de construção educativa. No caso da análise de competências, o levantamento das funções não é suficiente para o estabelecimento das normas, pois essas só serão definidas no decorrer do processo de desenvolvimento das atividades no ambiente de trabalho e como fruto de negociações. Uma vez definidas, as normas sempre podem ser revistas por um novo processo. Na busca pelos pressupostos fundantes sobre a noção de competência, há que se refletir sobre os movimentos do mundo do trabalho nas últimas décadas. É o que se fará a seguir. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 2. Mundo do Trabalho e Noção de Competência 90 O modelo das competências profissionais, segundo Deluiz (1995), começa a ser discutido no mundo empresarial a partir dos anos 1980, no contexto da crise estrutural do capitalismo que se configura, nos países centrais, no início da década de 1970. Essa crise expressa-se pelo esgotamento do padrão de acumulação taylorista e fordista, pela hipertrofia da esfera financeira na nova fase do processo de internacionalização do capital, por uma acirrada concorrência intercapitalista, com tendência crescente à concentração de capitais devido às fusões entre as empresas monopolistas e oligopolistas, e pela desregulamentação dos mercados e da força de trabalho, resultantes da crise da organização assalariada do trabalho e do contrato social. As noções estruturantes do modelo das competências no mundo do trabalho são a flexibilidade, a transferibilidade, a polivalência e a empregabilidade. Para o capital, a gestão por competências implica em dispor de trabalhadores flexíveis para lidar com as mudanças no processo produtivo e para enfrentar imprevistos, requerendo, para tanto, a polivalência e a constante atualização de suas competências, o que lhes dá a medida correta de sua empregabilidade. 2.1. Organização clássica – modelo taylorista clássico: competência de especialista Essa organização traz em seu bojo as tendências capitalistas da organização do trabalho que podem ser assim resumidas: a desqualificação (mediante a destruição do trabalho artesanal); o parcelamento do trabalho em tarefas simples e repetitivas; a redução [...] Taylor expressa com brutal cinismo o objetivo da sociedade americana: desenvolver em seu grau máximo, no trabalhador, os comportamentos maquinais e automáticos, quebrar a velha conexão psicofísica do trabalho profissional qualificado, que exigia uma certa participação ativa da inteligência, da fantasia, da iniciativa do trabalhador, e reduzir as operações produtivas apenas ao aspecto físico A noção de competência e suas várias implicações dos custos do trabalho (aspecto econômico); a hegemonia do capitalismo no local de trabalho e na sociedade como um todo (aspecto político); a separação do trabalho mental do manual pela máquina; a subordinação do trabalhador às condições de trabalho (ritmo e jornada), conseqüência necessária do emprego da tecnologia; o trabalhador como um apêndice para uma já existente condição material de produção. Percebe-se, então, as características marcantes das competências que caracterizam o condutivismo. O período de 1945 a 1973, chamado de fordista-keynesiano, teve como base um conjunto de práticas de controle de trabalho, tecnologias, hábitos de consumo e configurações de poder político-econômico. A partir de 1973, iniciou-se um período de rápida mudança, de fluidez e de incerteza, tornando significativa a passagem do fordismo para um regime de “acumulação flexível”. Gramsci (2001) observa que o americanismo e o fordismo equivaliam ao maior esforço coletivo até para criar, com velocidade sem precedentes, e com uma consciência de propósito sem igual na história, um novo tipo de trabalhador e um novo tipo de homem. Os novos métodos de trabalho são inseparáveis de um modo específico de viver e de pensar e sentir a vida. Questões sobre sexualidade, família, formas de coerção moral, consumismo e ação do Estado estavam vinculadas, na visão de Gramsci (2001), ao esforço de forjar um tipo particular de trabalhador adequado a um novo tipo de trabalho e de processo produtivo. O fordismo se deparou com dois fatores que o impediram de se expandir nos anos entre-guerras: a) o estado das relações de classe, no mundo capitalista, que dificilmente era propício à fácil aceitação de um sistema de produção que se apoiava muito na familiarização do trabalhador com longas horas de trabalho puramente rotinizado; b) o modo e mecanismos de intervenção estatal. O problema, como via o economista Keynes9, era chegar a um conjunto de estratégias administrativas científicas e de poderes estatais que estabilizassem o capitalismo, ao mesmo tempo que se evitassem as evidentes repressões e irracionalidades, bem como toda beligerância e todo nacionalismo estreito que decorriam das soluções nacionalsocialistas. Gramsci (2001, vol. 4, caderno 22, p.266-267) assim se expressa: 91 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade maquinal ... é certo que os industriais americanos não se preocupam com a “humanidade”, com a “espiritualidade” do Keynes (18821946) defendia a tese de que as exigência salariais dos empregados contribuíam para a normalização da economia por meio do pleno emprego. trabalhador, que, no nível imediato, são esmagadas. Esta “humanidade e espiritualidade” só pode se realizar no mundo da produção e do trabalho, na “criação” produtiva; ela era máxima no artesão, no “demiurgo”, quando a personalidade do trabalhador se refletia inteiramente no objeto criado, quando era ainda muito forte a ligação entre arte e trabalho. 92 O problema da configuração e do uso próprios dos poderes do Estado só foi resolvido depois de 1945. Isso levou o fordismo à maturidade como regime de acumulação plenamente acabado e definitivo. O fordismo aliou-se firmemente ao keynesianismo, e o capitalismo teve um surto de expansões internacionalistas de alcance mundial que atraiu para a sua rede inúmeras nações descolonizadas. O Estado teve de assumir novos (keynesianismo) papéis e construir novos poderes institucionais; o capital corporativo teve que se ajustar para a obtenção de uma lucratividade mais segura; o trabalho organizado teve de assumir novos papéis e funções relativos ao desempenho nos mercados de trabalho e nos processos de produção. Com seu principal adversário sob controle (os sindicatos), os interesses da classe capitalista resolveram o que Gramsci (2001) denominara antes de problema de “hegemonia”e, dessa forma, estabeleceram uma base aparentemente nova para relações de classe conducentes ao fordismo. Notável é a maneira pela qual os governos nacionais de tendências ideológicas bem distintas (gaulista, trabalhista, democrata-cristão) criaram tanto um crescimento econômico estável como um aumento dos padrões materiais de vida através de uma combinação de estado do bem-estar social, da administração social keynesiana e do controle de relações de salário. O fordismo dependia da assunção pela nação-Estado, como Gramsci (2001) previra, de um papel muito especial no sistema geral de regulamentação social. A legitimação do poder do Estado dependia, cada vez mais, da capacidade de levar os benefícios do fordismo a todos e de encontrar meios de oferecer assistência médica, habitação e serviços educacionais adequados em larga escala, respeitando o ser humano. A condição de fornecimento de bens coletivos dependia da contínua aceleração da produtividade do trabalho no setor corporativo. Só assim o Estado keynesiano do bem-estar social poderia ser fiscalmente viável. A aplicação das novas tecnologias contribuiu muito para a superação da rigidez do fordismo e para a aceleração do tempo de giro, desde a crise aberta, em 1973. A aceleração na produção foi alcançada por mudanças nas organizações, tais como subcontratação, transferência de sede etc., que reverteram a tendência fordista de integração vertical, produzindo um caminho cada vez mais indireto na produção, mesmo diante da crescente centralização financeira. Outras mudanças, como o sistema de entrega just-in-time,11 que reduz os estoques, associado à produção em pequenos lotes, diminuíram os tempos de giro em muitos setores da produção (eletrônica, máquinas-ferramenta, automóveis, construção, vestuário etc.). Para os trabalhadores, tudo isso implicou na intensificação dos processos de trabalho e na aceleração da desqualificação e requalificação necessárias ao atendimento de novas necessidades de trabalho. A aceleração do tempo de giro na produção envolve acelerações paralelas na troca e no consumo. Sistemas aperfeiçoados de comunicação e de fluxo de informações, associados com racionalizações nas técnicas de distribuição, possibilitaram a circulação de mercadorias no mercado a uma velocidade maior. Gramsci (2001) afirma que a partir da “nova forma” do processo de trabalho tem-se a “nova forma” da organização social moderna. A nova fábrica inicia e sintetiza a nova totalidade social porque reúne as três produções fundamentais de sua constituição e reprodução. De fato, ela é no americanismo: 1) produção material de mercadorias; 2) produção do nexo social de salário e lucro, ou seja, da relação de classe central da sociedade contemporânea e, por fim, é 3) produção de um imaginário, de uma visão do mundo; ou seja, a partir de seus ritmos e de suas modalidades organizativas racionais e mecanizadas, produz um estilo de vida capaz de uma ética puritana em oposição a comportamentos dissipadores e improdutivos. Braverman (1987) lembra o princípio de Adam Smith de que a divisão do trabalho é limitada pela extensão do mercado. Por essa razão, o taylorismo não podia difundirse em qualquer indústria ou ser aplicado em situações particulares, somente quando a A noção de competência e suas várias implicações A transição para a acumulação flexível trouxe novas formas organizacionais e tecnologias produtivas. A esse respeito Harvey (2004, p. 179-181) assim se manifesta: A desvalorização da força de trabalho sempre foi a resposta instintiva dos capitalistas à queda de lucros. Mas a generalidade dessa afirmativa esconde alguns movimentos contraditórios. As novas tecnologias aumentaram o poder de certas camadas privilegiadas; ao mesmo tempo sistemas alternativos de produção e de controle do trabalho abrem o caminho para a alta remuneração de habilidades técnicas, gerenciais e de caráter empreendedor. 93 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 94 escala de produção fosse adequada a arcar com os esforços e custos implicados na sua “racionalização”. É por isso, observa Braverman (1987), que o taylorismo coincide com o aumento da produção e sua concentração em unidades industriais cada vez maiores, na última etapa do século XIX e durante o século XX. Coerentemente com sua crítica, ele descola a atenção do problema da distribuição desigual de riqueza para o problema da distribuição injusta de poder no local de trabalho. Em 1913, Henry Ford começou a aplicar na prática os princípios de Taylor em sua “indústria criadora” da produção em série racionalizada. Adotou a observação, os tempos perdidos pelos operários em movimentos desnecessários, como por exemplo, buscar parafusos no depósito. O problema foi solucionado com medidas simples, como trazer os parafusos para junto do operário. Para acelerar o processo de montagem de automóveis, fragmentou-se as tarefas e introduziu-se uma esteira rolante na qual as partes do automóvel passavam enquanto os operários, em posições fixas, iam montando as peças. Pode-se afirmar que, na organização clássica, o termo competência está relacionado com especialista, em decorrência de como se organiza a produção. Os trabalhadores passam a desempenhar funções que exigem cada vez mais ações operativas, acompanhando a mecanização imposta pela produção. A esse respeito Braverman (1987) afirma que a maquinaria, além da função técnica de aumentar a produtividade do trabalho, tem, também, a função de destituir a massa de trabalhadores de seu controle sobre o próprio trabalho. A função competência de especialista vem a ser a fonte não de liberdade, mas, sim, de domínio e de confinamento do trabalhador dentro de um círculo onde a máquina aparece encarnando o desenvolvimento e provoca o alienamento do trabalhador na sua especificidade e por causa de sua especialização. 2.2. Organização enxuta - modelo toyotista japonês: competência de flexibilidade As mudanças introduzidas na indústria nipônica, segundo Deluiz (1995), e que provocaram a reviravolta na economia mundial, podem ser assim sintetizadas: os empregados passaram a desempenhar tarefas anteriormente atribuídas aos supervisores, engenheiros e especialistas, adquirindo, assim, novas responsabilidades nos processos de decisão; foram introduzidos os círculos de controle de qualidade com equipes autônomas e semi-autônomas, que assumiam algumas funções de supervisão direta e substituíam as estruturas formais da gestão; foi feita a substituição das tradicionais linhas de montagem de tarefas fragmentadas para a produção em equipes, que trocam tarefas por rotatividade dos trabalhadores e treinamento cruzado, tornando a produção mais versátil e exigindo uma Uma grande quantidade de estatísticas colhidas ao longo dos últimos cinco anos, questionam seriamente os méritos de muitas das “novas” técnicas gerenciais sendo introduzidas em fábricas e escritórios em todo o mundo. Nas fábricas japonesas, por exemplo, onde a jornada de trabalho anual é de 200 a 500 horas mais longa do que nos Estados Unidos, o ritmo na linha de montagem é tão acelerado e estressante, que a maioria dos trabalhadores sente uma fadiga significativa. Segundo um levantamento feito em 1986 pela All Toyota Union, mais de 124 mil dos 200 mil trabalhadores da empresa sofriam de fadiga crônica. Deve ser salientado que os princípios da gerência científica há muito já são conhecidos no Japão. Os fabricantes de automóveis japoneses começaram a usá-los intensamente ao final da década de 1940. Em meados da década de 1950, as empresas japonesas haviam criado uma forma híbrida de Taylorismo, ajustada exclusivamente às suas próprias circunstâncias e metas de produção. Na produção pós-Fordismo, as equipes de trabalho compostas de funcionários em cargos administrativos e de produção participam das decisões de planejamento para melhorar a produtividade. Uma vez que um consenso é alcançado, no entanto, o plano de ação é automatizado no processo de produção e executado sistematicamente por todos na linha de montagem. Os trabalhadores também são encorajados a parar a linha de produção e tomar decisões imediatas referentes ao controle de qualidade, novamente com a finalidade de aumentar o ritmo e a previsibilidade das operações. As novas leis trabalhistas, introduzidas no Japão pela ocupação norteamericana, fortaleceram os trabalhadores na negociação das condições de emprego com as empresas, restringindo, com isso, o direito das empresas de demitir empregados. Se na América a maioria da força de trabalho de produção era constituída por imigrantes temporários ilegais, no Japão não existiam trabalhadores hóspedes. Além do mais, o governo havia proibido investimentos externos diretos na indústria automobilística, garantindo, assim, espaço para a indústria nacional. Nesse clima favorável, Taiichi Ohno, o principal engenheiro da Toyota, introduziu A noção de competência e suas várias implicações capacitação mais diversificada; foram introduzidas políticas de incentivo à produtividade, através de participação nos lucros, programas de segurança no trabalho, remuneração de acordo com o desempenho e formação da capacidade de relacionamento e comunicação. Estas características conotam as competências sintagmatizadas nas tendências condutivista e funcionalista. A esse respeito, é importante relacionar as observações de Rifkin (2001, p. 202-203): 95 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 96 uma nova técnica para troca de moldes com carrinhos, utilizando para isso os trabalhadores que estavam ociosos. No final da década de 1950, ele conseguiu reduzir, de um dia para três minutos, o tempo necessário para a troca. Além disso, ele conseguiu que o custo por peça prensada se tornasse menor, devido à substituição do processo de lotes imensos por produção de pequenos lotes, já que produzir apenas poucas peças, antes de montá-las no carro, fazia com que os erros de prensagem aparecessem quase que instantaneamente. Esse novo sistema gerava apenas duas horas (ou menos) de estoques e exigia uma força de trabalho muito qualificada e altamente motivada. Quando o Japão passou por uma forte recessão inflacionária, a Toyota teve que demitir a quarta parte de sua força de trabalho. Isso levou os trabalhadores a uma greve prolongada e à ocupação da fábrica. Após muitas negociações, empregados e a empresa chegaram a um acordo de compromisso que eliminava um quarto da força de trabalho, mas os empregados remanescentes receberiam dupla garantia: emprego vitalício e pagamentos gradualmente crescentes, conforme o tempo de serviço. Os empregados também concordaram em ser flexíveis na atribuição das tarefas, além de promoverem os interesses da companhia como sendo parte de uma comunidade. O segredo dessa produção, denominada “enxuta”, é coordenar esse processo de modo que tudo combine na hora certa, com alta qualidade e baixo custo. A Toyota passou a organizar os fornecedores em níveis funcionais, concedendo a cada firma um nível de responsabilidade. Os fornecedores de 1º nível participavam integralmente do desenvolvimento do novo produto junto à equipe responsável, descentralizando, assim, as decisões de engenharia de peças. A Toyota passou, então, a compartilhar seus recursos humanos com as demais empresas de autopeças. Hoje, os fornecedores participam do controle acionário da empresa. Em 1953, a Toyota introduziu o sistema denominado Kanban, que consistia num sistema de fichas de controle de material com o objetivo de eliminar o excesso de estoque em cada unidade de produção. O estoque nunca devia ultrapassar as necessidades específicas de reposição de peças. Esse processo foi denominado “método do supermercado” porque imitava a prática dos supermercados americanos, onde os clientes compravam o que quisessem e quando quisessem. A gerência, em vez de armazenar as peças, apenas recolocava-as após serem utilizadas. Já antes de 1950, a Toyota havia criado o sistema just in time para a montagem e entrega de componentes. Em 1963, os operários passaram a operar uma média de cinco máquinas cada um. Em 1965, a empresa estendeu o sistema Kanban a todos os fornecedores de peças. Em 1971, adotou a prática de mover os operários para posições diferentes, de acordo com as necessidades das linhas de montagem. Finalmente, em 1973, permitiu aos fornecedores entregar as peças diretamente nas linhas de montagem, ligando-os ao sistema interno de colocação de peças. Os fornecedores, mais próximos da fábrica, já estavam conectados com terminais de computadores on-line. Chesnais (1996, p. 34-35), ao falar da tecnologia e das relações capital-trabalho, assim se expressa: Pode-se afirmar que, na organização enxuta, o termo competência está relacionado com flexibilidade em decorrência do regime de acumulação. Harvey (2004) entende que a emergência de modos mais flexíveis de acumulação do capital mostra-se como uma forma de viabilização de obtenção de sucesso do sistema econômico capitalista e necessária para o controle sobre o emprego da força do trabalho. Conforme o glossário de mecatrônica e processos de manufatura (SENAI/ SP,1997), flexibilidade, em mecânica, é entendida como a propriedade de máquinas ou robôs de serem adaptáveis ou reprogramáveis de forma a serem utilizados em diferentes tarefas. A correlação de competência com flexibilidade é entendida como sendo a capacidade de adaptar-se para trabalhar com mudanças rápidas no ambiente e nos processos consensuais e interativos. A noção de competência e suas várias implicações É nesse contexto que deve ser situada a implementação, pelos grupos industriais (tanto os do setor manufatureiro quanto os das grandes atividades de serviços), das oportunidades proporcionadas pelas novas tecnologias, a começar pelas tecnologias informacionais aplicadas à produção industrial e às atividades de gestão de finanças. Beneficiandose, simultaneamente, do novo quadro neoliberal e da programação por computadores, os grupos puderam reorganizar as modalidades de sua internacionalização e, também, modificar profundamente suas relações com a classe operária, particularmente no setor industrial... Cada passo dado na introdução da automatização. contemporânea, baseada nos microprocessadores, foi uma oportunidade para destruir as formas anteriores de relações contratuais, e também os meios inventados pelos operários, com base em técnicas de produção estabilizadas, para resistir à exploração no local de trabalho. Em cada fábrica e em cada oficina, o princípio de “lean production”, isto é, “sem gorduras de pessoal” tornou-se a interpretação dominante do modelo “ohnista” de terceirização e o “just-in-time” foram adotadas ainda mais rápida e facilmente. 97 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 2.3 Organização flexível - modelo neo-taylorista americano: competência de Multicompetências 98 As características principais da organização flexível desse modelo neotaylorista foram influenciadas pelo modelo toyotista japonês. São elas: linhas de montagem, adotando o just-in-time; qualidade assegurada pela responsabilidade de cada estação de trabalho; aplicação do sistema de aperfeiçoamento contínuo (kaisen); inclusão de um programa ativo de sugestões, um refinamento de procedimentos e a designação de grupos kaisen especiais para estudar as sugestões pessoais ou desenvolver projetos específicos de aperfeiçoamento; análise minuciosa de cada posto de trabalho pelos métodos tradicionais para conseguir a máxima eficiência e qualidade; treinamento dos trabalhadores nas funções dos demais e permissão aos grupos para mudarem de uma tarefa para outra. A denotação desse modelo é de que a competência situa-se na tendência funcionalista. A noção de competência, nesse caso, tem sua significação restrita à inteligência prática. Essa restrição é bastante propícia ao uso dessa noção, num sentido instrumental ou funcionalista, posto que a supressão da inteligência formalizadora da estrutura dinâmica da competência admite sua identificação direta com o comportamento e desempenho, retornando-se, assim, ao princípio fundamental do behaviorismo skinneriano, o que pressupõe que comportamentos se confundem com o próprio domínio do conhecimento. Em fevereiro de 1983, a General Motors - GM - resolveu fazer um joint venture13 com a empresa japonesa Toyota, criando a New United Motor Manufacturing Inc. Em setembro daquele ano, a GM reuniu-se com o Sindicato dos Trabalhadores automotrizes e assinou uma carta de intenções bipartite. Por parte da empresa, ela reconhecia o sindicato como o único agente de barganha para a força de trabalho da nova empresa, especificamente os salários e benefícios e estipulando que a maioria da força de trabalho deveria ser contratada entre os trabalhadores provenientes da GM-Fremont, garantindo o emprego. Em troca, o sindicato concordava em apoiar a implementação do novo sistema de produção e negociar um novo contrato. Esse fato inaugurou uma mudança tanto na política quanto nas relações trabalhistas. Isso representou uma guinada da estratégia do controle e do conflito para a estratégia do compromisso e da negociação. Tal medida evidenciou uma completa reviravolta no paradigma das relações trabalhistas. A partir daí, muitas fábricas norte-americanas começaram a substituir trabalhadores e máquinas, de simples função, por trabalhadores multicompetentes e máquinas de multifunções. Além disso, novas práticas, como o just-in-time e a customização,14 foram sendo adotadas rapidamente em todas as áreas. Esse modelo começou a ser adotado em muitas indústrias americanas, recebendo a denominação de “Práticas de Trabalho de alta Performance”, utilizando o capital humano. Nessa direção, Wallerstein (2001, p. 73) afirma que: Entretanto, no que se refere à mudança de paradigma da produção, a coisa não era tão simples como quando começou a ser difundido até tornar-se opinião corrente. Adler (1993), estudando as transformações ocorridas na fábrica GM-Toyota, afirmou que o que a empresa adotou foi uma forma inovativa do sistema taylorista de tempos e movimentos. Essa opinião soou como uma grande surpresa porque, durante anos, sustentou-se a crença de que quando as tarefas são rotineiras e repetitivas, a eficiência e a qualidade requerem a estandardização dos procedimentos de trabalho. Entretanto, altos níveis de estandardização tiram dos trabalhadores o seu interesse intrínseco, reduzindo a motivação e a criatividade. Para Adler (1993), a desmotivação do trabalho levava a uma série de comportamentos disfuncionais do empregado, entre eles, o absenteísmo, o alcoolismo, alto turnover, pouca atenção, greves e até sabotagens. Tal comportamento seria responsável por uma reação autoritária da gerência, com aumento dos níveis hierárquicos e até mesmo altos níveis de estandardização. Chegou-se à conclusão de que o taylorismo levava ao descontentamento dos trabalhadores e à beligerância dos sindicatos e, em conseqüência, à elevação dos níveis de excesso burocrático. Adler (1993) argumentou que a segunda parte desse raciocínio era falsa. Na verdade, estandardização do trabalho formal, desenvolvida pelos engenheiros industriais e imposta aos trabalhadores, é alienada. No entanto, os procedimentos, quando são designados pelos próprios trabalhadores em um contínuo e bem sucedido esforço de aumento da A noção de competência e suas várias implicações O processo de racionalização, central para o capitalismo, exigiu a criação de um estrato intermediário que abrangesse os especialistas dessa racionalização, como administradores, técnicos, cientistas e educadores. A própria complexidade não só da tecnologia mas do sistema social tornou essencial que esse estrato fosse grande e, com o tempo, passível de ampliação. Os recursos usados para sustentálo foram tirados do excedente global extraído por empreendedores e Estados. Neste sentido – elementar, mas fundamental -, esses gerentes são parte da burguesia, e sua reivindicação de participar na partilha do excedente ganhou forma ideológica precisa no conceito – do século XX – de capital humano. 99 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 100 produtividade, qualidade, habilidades e entendimento, podem humanizar mesmo as mais disciplinadas formas de burocracia. A experiência da New United Motor, segundo ele, mostra que a hierarquia pode prover suporte e expertise, em vez de uma mera estrutura de comando. A diferença entre o taylorismo tradicional e a versão orientada para a aprendizagem aplicada na GM-Fremont, compara Adler (1993), é a mesma que há entre os programas de computador considerados “à prova de idiota” e aqueles que levam em conta a capacidade dos usuários. Os primeiros desqualificam as tarefas dos operadores até virtualmente eliminar a possibilidade de erro. Assim, porém, acaba eliminando a habilidade do operador de responder a situações imprevistas e às novas maneiras de usar o sistema ou adaptar-se a novas aplicações. O sistema “à prova de idiota” pode ser fácil de usar, mas também é estático e monótono. Nos sistemas da New United Motor Manufacturing Inc - NUMMI -, levava-se tempo para aprender. Requeria mais reflexão e qualificação para funcionar, mas era imensamente flexível e conseqüente, satisfazendo ao operário, uma vez que atingisse seu domínio. Além disso, no sistema anterior, a relação entre o sistema de produção e o trabalhador era adversa. Os padrões e a hierarquia serviam para coerção dos trabalhadores relutantes. Havia pouco com que o operador pudesse melhorar e o sistema era inteiramente rígido, quando falhava, tudo parava, até que um especialista chegasse para fazer os reparos. Adler (1993) defende que dois aspectos do modelo taylorista ainda persistem e são essenciais para que haja eficiência e qualidade: a disciplina do sistema de tempos, os movimentos e as estruturas burocráticas formais. Pode-se afirmar que, na organização flexível, o termo competência está relacionado com multicompetência, em decorrência da implantação das máquinas de múltiplas funções e das práticas de trabalho de alta performance. A multicompetência relaciona-se à necessidade de dar respostas rápidas a situação de eficiência e qualidade. O trabalho mais responsabilizado e precário exige a multiqualificação e a adaptação a situações diversas. 2.4 Organização autônoma - modelo holístico sueco: competência de polivalência As principais características, segundo Deluiz (1995), do modelo holístico sueco, podem ser traduzidas nos aspectos relacionados a seguir: 1) Arquitetura Ambiental — A gerência da Volvo convocou arquitetos que trouxeram novas idéias de um edifício que facilitasse o trabalho de equipe. As salas eram claras e bem arejadas e o nível de ruído reduzido. Era uma grande inovação em relação às fábricas tradicionais que eram montadas A noção de competência e suas várias implicações em um grande galpão; 2) Eliminação da linha de montagem — A maior inovação estava no sistema de transporte, mais flexível que uma esteira mecânica. Era feita por veículos elétricos guiados automaticamente (Automatic Guided Vehicles – AGV), que era a maior invenção de Kalmar. Os veículos não eram controlados pelas equipes, mas por uma central de computação; 3) Planejamento Ergonômico — A nova fábrica levou em conta, também, os aspectos ergonômicos, sendo que um meio ambiente harmônico levaria à motivação da equipe, capaz de cooperar para o aumento da eficiência. A fábrica de Kalmar separava cada equipe em seu próprio ambiente e atendia aos requisitos da moderna ergonomia. Isso significava uma grande inovação em relação às fábricas tradicionais; 4) Novas relações interpessoais — O objetivo era criar uma fábrica que, sem nenhum sacrifício da eficiência ou de custo da empresa, desse oportunidade aos empregados de se comunicarem livremente, trabalhar em grupos, mudarem de um posto para outro (com a finalidade de se identificarem com o produto e variarem o ritmo de trabalho). Assim, conscientizar-se-iam da responsabilidade pela qualidade do produto e influenciariam seu próprio ambiente de trabalho; 5) Salário baseado em resultados - A empresa introduziu, em 1980, um salário baseado em resultados para todos os empregados. Dez anos depois, o tempo de montagem por carro era 25% menor que na fábrica Toshiba, sendo reduzido em uma hora e meia. A qualidade era maior e os custos eram mais competitivos. A flexibilidade do novo sistema elevou a intensidade do trabalho, reduziu as conseqüências dos erros e conseguiu atingir um elevado nível de eficiência. Em 1985, os trabalhadores de Kalmar eram ocupados, produtivamente, 95% do tempo. No mesmo ano, o tempo total de ajuste mecânico era de 2.5 horas em Kalmar versus 4 horas em Gotemburgo. É preciso assinalar que o sistema de Kalmar incluía, também, flexibilidade nas mudanças do produto. As equipes organizadas por funções eram uma pequena fábrica dentro da fábrica. A idéia original era a de que cada grupo deveria montar uma função completa, como por exemplo, um sistema elétrico. O sistema salarial não se relacionava com o sistema de empregos e, sim, de acordo com a posição (skill rate). Freqüência, permissões de tempo de serviço e bônus de produtividade eram também considerados. Não eram considerados nem a competência individual, dentro dos postos, nem o bônus grupal, para incremento de responsabilidade. Esse modelo, que conota a tendência funcionalista e construtivista, é espelhado na experiência desenvolvida, na Suécia, pela fábrica de caminhões Volvo, entre 1974 e 1985. É um caso clássico, no sentido de que trouxe muitos esclarecimentos tanto sobre as tensões da transformação organizacional do trabalho de montagem, quanto sobre os efeitos contraditórios da chamada “especialização flexível” (BERGGREN, 1992). 101 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade A experiência sueca partiu de conceitos totalmente novos: organização de grupo e alto grau de delegação de funções e responsabilidade coletiva. A fábrica da Volvo, em Kalmar, era pequena para os padrões internacionais de 1974, mas significava muito para os seus idealizadores, pois foi a primeira fábrica de automóveis do mundo construída sem linhas de montagem. Os engenheiros começaram projetando uma fábrica tradicional. A gerência criativa, entretanto, tomou a iniciativa de organizar a produção de automóveis, fazendo com que cada empregado encontrasse significado e satisfação no seu trabalho. Entretanto, não encontrou, nessa ocasião, apoio dos sindicatos. Pode-se afirmar que, na organização autônoma, o termo competência está relacionado com polivalência em decorrência do alto grau de autonomia e criatividade, bem como a exigência do trabalhador em ser capaz de articular conhecimentos específicos, aplicando-os em situações diversas. Conforme glossário de metodologias (SENAI/DN-p.28), polivalência designa o atributo de pessoa com diferentes habilidades e repertórios profissionais para a realização de atividades de vários níveis de complexidade em áreas afins. Implica alto grau de criatividade e autonomia e a capacidade de articular conhecimentos específicos com seus fundamentos mais gerais, aplicando-os a outras situações. Após análise feita nas organizações do mundo do trabalho, no qual competência, em sua fluidez e polissemia, assumiu as conotações várias, entre elas, mais significativamente, as de flexibilidade, especialista, multicompetência e polivalência, nessa construção semântica há que se fazer uma reflexão entre competência e qualificação. 102 3. Competência e Qualificação Ao se falar em competência profissional, é necessário abordar a relação existente entre qualificação e competência. De acordo com Zarifian (2001), a noção de qualificação, noção chave da esfera do trabalho, apareceu desde os primórdios do pensamento econômico com Smith (1723-1790), que promoveu uma abordagemda atividade industrial, retomada mais tarde pelo taylorismo, que buscava a eficácia das operações na linha de produção. Percebese, então, que tanto qualificação quanto competência são termos polissêmicos. É preciso também registrar a abrangência de cada um e a forma como a competência passou a ser realizada nas qualificações. Relacionar a qualificação ao taylorismo é falar da qualificação intrínseca ao indivíduo, que se torna extrínseca e aparece relacionada ao trabalho teórico, e não apenas a um trabalho efetivo. Por não se tratar apenas de qualidades do indivíduo, mas de características da atividade, Forté (1992) relaciona a qualificação ao determinismo tecnológico, societal e princípio da eficiência produtiva. Ao se falar do progresso técnico que permite uma modernização do aparelho de produção e uma intensificação da taylorização na indústria de série, falasse do “determinismo tecnológico” que traz a inquietação no que se refere ao empobrecimento da atividade e à redução da formação necessária para cumprir a tarefa. Deplorando a depreciação da mão-de-obra, Dadoy (apud Roche, 2004, p.35) retoma essa constatação nos seguintes termos: Concomitantemente aos trabalhos sobre o empobrecimento ou o enriquecimento das tarefas, consecutivos ao progresso técnico, os debates sobre a qualificação organizamse também em torno das relações sociais e da luta pelas condições de trabalho e pela determinação; é o chamado “determinismo societal”. Fala-se, então, da avaliação da qualificação numa lógica macroeconômica, em detrimento do conteúdo intrínseco dela própria. Nesse caso, afirma-se que o déficit da análise do conteúdo da qualificação é ainda mais sensível e afeto à mudança, no momento atual, quando o conceito de competência tende a suplantar o de qualificação. Tanto o determinismo tecnológico quanto o determinismo societal mostram-se inoperantes a partir dos anos 1980 quando importantes mudanças intervêm na organização do trabalho: abandono dos princípios de divisão do trabalho, introdução da informática e das novas tecnologias em organizações complexas. A partir desse momento, a qualificação entra numa fase em que se adquire uma função estratégica de condição da “eficiência produtiva” e reencontra a dimensão individual, rompendo com a idéia da produtividade adquirida pela intensidade do trabalho. Para Dadoy (1990), a qualificação remete antes de tudo à pessoa e vai além da relação social estabelecida entre as capacidades profissionais do trabalhador e da sua faixa de salário. Segundo essa autora, a qualificação é também o conjunto do saberes e do saberfazer realmente empregados pelos operários. Ela remete ao indivíduo, à sua especificidade, à originalidade de sua trajetória pessoal, à sua experiência, às suas capacidades, e mesmo às suas potencialidades. A noção de competência e suas várias implicações Desde então, a capacidade de um novo contratado de substituir com sucesso, em algumas semanas, um operário cuja longa experiência no trabalho era, ao mesmo tempo, o capital e o orgulho, só poderia parecer, para a vítima, a prova de sua desqualificação, aliás, geralmente sancionada por uma desclassificação nas grades hierárquicas, e o índice de uma política sistemática de depreciação da mão-de-obra operária. 103 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 104 O deslocamento da qualificação para a competência explica-se não somente pelas mudanças dos conteúdos da atividade, mas também por uma perda de referência na definição dos postos de trabalho em sua classificação e na remuneração que lhes corresponde. Constata-se, então, uma crise no que constitui a essência própria da qualificação: a valorização dos indivíduos e dos conteúdos da atividade industrial. Significa que os empregos, progressivamente reelaborados, não são caracterizados mais por critérios tradicionais, nem se identificam, no que se refere à extensão das capacidades, à relação dos conteúdos de formação ou de experiência. Percebe-se que, nessas condições, há uma concorrência semântica no que se refere à competência e qualificação. A dimensão experimental da qualificação cede, então, lugar a numerosos escritos desde os anos 1980, a partir do momento em que é percebida como condição da eficiência produtiva nas indústrias. As discussões mantidas, então, sobre a noção de qualificação são reativas, pois a categoria fundante da qualificação, pertença ela ao determinismo tecnológico societal ou ao da eficiência produtiva, mantém um estatuto reativo como atributo do conceito de trabalho que flutua no mesmo ritmo que este último. Nesse caso, não se pode mais pensar a qualificação com base na tarefa, devendo ser pensada como fundamentada no indivíduo. Essa mudança de lógica tem conseqüências importantes sobre a gestão dos recursos humanos. Na verdade, quando se conhece alguma coisa é por toda a vida; quando se é alguma coisa é, momentaneamente, de maneira transitória e contingente. Passando de uma lógica do “ter” a uma lógica do “ser”, o indivíduo evolui de uma lógica de certeza a uma lógica de incerteza, de uma lógica de estabilidade a uma lógica de instabilidade, de uma lógica de permanência a uma lógica de transformação. O indivíduo competente em uma dada situação, em um dado momento, pode não o ser em uma outra situação. Competente aos 30 anos, ele pode não mais ser aos 40, se não evoluiu. Essa lógica do ser impõe uma dinâmica, uma atitude adaptadora permanente, uma visão da transformação, ausente na concepção da qualificação. A ligação entre a qualificação adquirida com diploma e as competências requeridas para exercer uma atividade profissional não é colocada em questão por nenhum dos parceiros, nem na esfera do trabalho, nem na esfera educativa, nem pelos interessados que são os jovens. A formação teórica, validada pelo diploma, traz os conceitos, as noções, os princípios gerais que descrevem o real, o que Malglaive (1995) chama de “saber teórico que se mostra suficiente para assegurar o emprego”. A noção de qualificação é construída com base na sociologia e, após um grande esforço para conceituá-la, parece haver, há algum tempo, um consenso entre os sociólogos de que se trata de uma noção em aberto, em evolução permanente, porque tem na noção de trabalho, esta também em aberto, uma referência fundamental. Assim, se antes se limitava ao saber e ao saber-fazer, e era, ainda, historicamente relacionada às operações de classificação dos trabalhadores e determinante dos seus salários, agora ela trata da especificidade do indivíduo, da sua originalidade, trajetória profissional, experiência, das suas capacidades e potencialidades. Seu caráter aberto de noção mostra-se, portanto, importante para a sua sobrevivência e para o estabelecimento de uma diferenciação em relação à competência. A competência, ao contrário, como afirma Tomasi (2004, p. 157-158) é: uma demanda do patronato, e o termo é empregado por ele e não Para o novo modo de produção e acumulação flexível, com a organização e gestão das empresas em redes, é preciso um novo trabalhador. Não basta mais o trabalhador que desempenha funções repetitivas, mecânicas e sem iniciativa. Mesmo o trabalhador que exerce as atividades mais simples, hoje, além de fazer, deve ser capaz de pensar, dominar conhecimentos gerais relacionados ou não ao seu trabalho, interpretar textos, gráficos e tabelas, ter conhecimentos na área de informática, capacidade de interpretação de dados, iniciativa e crítica, e ser capaz ainda de trabalhar em equipe. Assim, além da educação formal, ou seja, da qualificação profissional, é necessária toda uma gama de habilidades relacionadas a novas tecnologias, bem como atitudes e comportamentos. É nessa nova lógica que surge a noção de competência. A noção de competência tem sido colocada como uma alternativa mais adequada do que a de qualificação, pois está mais sintonizada com as “novas necessidades” do mercado A noção de competência e suas várias implicações pelos sociólogos. Ela trata das exigências de cada posto, que as empresas já não sabem definir e cuja ausência se manifesta em uma pane ou no prolongamento da pane. Ela independe das especificidades do indivíduo e diz respeito às capacidades profissionais, à sua formação sistemática e socialmente controlada. A competência se define, portanto, pelo posto de trabalho. Ela prioriza o trabalho e constitui medida de desempenho do trabalhador. Trata-se de um campo de conhecimento partilhado com outras disciplinas e profissões: psicólogos, antropólogos, ergonomistas, lingüistas, educadores etc. A competência encontra-se, também, e sobretudo, nos comportamentos, nas atitudes que têm por característica fundamental antecipar-se aos problemas e não apenas solucioná-los. 105 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade de trabalho, introduzidas pelo progresso técnico e pelas novas formas de gestão, ligadas não mais ao modo taylorista de produção, mas ao modelo baseado na organização japonesa do trabalho, batizada de toyotista. Para ganhar competitividade num mercado em crise, as empresas teriam de aumentar a qualidade e a diversidade de seus produtos e aumentar o número de lançamentos e variedades de um mesmo produto, visando nichos cada vez mais particulares do mercado. O novo modelo de competências, do ponto de vista das empresas, com relação aos trabalhadores, combinaria, variando conforme o caso, os seguintes elementos: normas de recrutamento que privilegiam o nível de diploma; valorização da mobilidade e do acompanhamento individualizado da carreira; introdução de processos de avaliação contínua do desenvolvimento do funcionário na empresa; novos critérios de avaliação que privilegiam as qualidades pessoais e relacionais como responsabilidade, autonomia, capacidade de trabalhar em equipe, etc.; instigação à formação contínua, ou seja, aprender sempre; desvalorização dos antigos sistemas de classificação fundada nos níveis de qualificação e originados nas negociações coletivas; privilégio das negociações individuais. Ramos (2002, p. 193-194) problematiza a qualificação enquanto relação social, colocando as competências no plano da responsabilidade do indivíduo. Afirma ela: 106 Tensionada teoricamente com a qualificação, a competência, como um conjunto de propriedades instáveis que devem ser submetidas à prova, opõemse à qualificação avaliada socialmente pelo diploma, título adquirido para sempre, e pela antigüidade e à própria idéia de profissão. Opõem-se, portanto, à dimensão conceitual da qualificação. Essas competências podem ter sido adquiridas em experiências diferentes da educação formal, sendo tratadas como características do indivíduo. Não remetendo a uma categoria formalizada, a noção de competência não justificaria a reivindicação de direitos coletivos. A competência passa a estar no princípio da organização do trabalho, no lugar da qualificação/profissão. Enquanto o domínio de uma profissão, uma vez adquirido, não pode ser questionado, as competências são apresentadas como propriedades instáveis dentro e fora do exercício do trabalho. Significa dizer que uma gestão fundada na competência encerra a idéia de que um assalariado deve se submeter a uma validação permanente, dando constantemente provas de sua adequação ao posto, de seu direito a uma promoção ou a uma mobilidade promocional. Nessa linha de pensamento, o desempenho individual passa a ser critério de sucesso. Segundo Dupas (2003), o desempenho individual passa a ser o supremo critério de sucesso, num contexto em que a sociedade oferece aos cidadãos cada vez menos oportunidades. A noção de competência e suas várias implicações Carnoy (2002) afirma que a mundialização exerceu um impacto considerável sobre a educação, principalmente através das reformas de caráter financeiro defendidas pelas instituições monetário-internacionais. Tais reformas propunham-se, antes de tudo, a reduzir os gastos com o ensino público. Nessa versão do ajuste estrutural, a expansão da educação e o ensino de melhor qualidade inscrevem-se, portanto, no âmbito de um financiamento público, restrito nessa área. No novo ambiente mundial, é essencial que os responsáveis pelas políticas educativas tenham pleno conhecimento de que o Estado está realmente impossibilitado de aumentar o orçamento da educação e de que essa “penúria” representa uma preferência ideológica em favor do investimento privado no setor de educação. Segundo o mesmo autor, as consequências dessa nova organização do trabalho são importantes para a educação. Se uma pessoa é levada a trocar com freqüência de emprego, quanto melhores conhecimentos gerais tiver adquirido, tanto mais facilmente conseguirá adquirir as competências exigidas para os diferentes postos que vier a ocupar. Por outro lado, os empregadores preferem sempre contratar pessoas que, além de possuírem competências particulares, aprendem rapidamente. O ensino profissionalizante nunca criou empregos, pois quando existem postos vacantes, a preferência é dada em geral aos jovens com formação profissional que acabam recebendo uma remuneração mais elevada. A flexibilidade na organização do trabalho significa que é mais valorizado um ensino geral de melhor qualidade que ajuda o indivíduo a coletar e interpretar informações, além de lhe proporcionar condições para resolver os problemas. No entanto, isso significa também que a formação profissional deve ser fundamentada em um ensino geral e polivalente. É forçoso constatar, igualmente, que os talentos de comunicação e cooperação são tanto mais recompensados quanto mais flexível for o quadro de trabalho. A noção de competência não se instalou, no entanto, apenas na lógica empresarial. Este modelo chegou também a todos os segmentos da cultura e aos modelos de educação de diferentes estados nacionais. É o que se tentará mostrar no tópico que abordará competências no contexto internacional. No Brasil, as competências estão definidas nos documentos do MEC na Lei Federal nº 9394/96 — LDB, bem como nas Diretrizes Curriculares Nacionais— DCNs15 — de Ensino Fundamental e de Ensino Médio, publicados como guias e enviados a todos os professores do país. Na esfera da educação, a noção de competência vem conectada com “a defesa da democracia da cidadania, de justiça social, de combate às desigualdades e respeito às diferenças”. Para o MEC - Ministério da Educação16, o problema de diminuição da qualidade está muito vinculado à falta de recursos. Constata referido Ministério que a gestão privada 107 do sistema priorizou uma visão economicista, com “loteamento de recursos a partir de uma relação tempo/custo, substituindo o tempo de aprender, gerando um processo de mercantilização do ensino”. A maneira como o setor público desempenha seu papel na expansão e aprimoramento da educação repercute, de forma bastante diferenciada, na manutenção das tarefas educativas. Depreende-se que, no contexto atual, as qualificações, segundo Ramos (2002), são modalidades de formação profissional e que competência é mais abrangente porque articula conhecimentos, habilidades e valores. Na busca por princípios fundantes sobre a noção de competência, verificar-se-á como é definida ou construída em alguns países. É o que se fará a seguir. REFERÊNCIAS ADLER, P. Time-and-motion regained. Havard business review, N.Y., Jan/Feb-1993, p.97-108. AJELLO, A. M. La Competenza. Bolonha: Società Edítrice il Molino, 2002. ALCÂNTARA, A. A entidade Senai. Rio de Janeiro/RJ: SENAI/DN/DR, 1991. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade ANTUNES, R. Os sentidos do trabalho: ensaio sobre a afirmação e a negação do trabalho. 3 ed. São Paulo: Boitempo Editorial, 2000. APPLE. M. W. Educação à direita mercados, padrões, Deus e desigualdade. Trad: Dinah de Abreu Azevedo. São Paulo: Cortez, Instituto Paulo Freire, 2003. ARROYO, M. 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Surge então a expressão Sociedade da Informação1, noção operatória usada fundamentalmente por sociólogos para designar os impactos sócio-económicos das novas tecnologias da informação e comunicação (TIC), realçando a importância que a informação detém no desenvolvimento com êxito das organizações. Com efeito, o sucesso das organizações está relacionado com a eficiência e a eficácia da utilização da informação no seu dia a dia e com a capacidade que estas têm em armazená-la e recuperá-la.A informação só é útil se estiver devidamente tratada e organizada. Para isto é fundamental uma boa gestão da mesma, pois esta nova sociedade exige respostas rápidas e tomadas de decisão fundamentadas. Assim, este artigo resulta do estudo de Gestão da Informação na Escola Superior de Tecnologia e Gestão de Águeda (ESTGA) e visa propor um modelo de Gestão de Informação para a ESTGA com o objetivo de a apoiar nas respostas aos desafios que a Sociedade da Informação lhe coloca. Refutamos a visão tradicionalista e passiva dos serviços de informação - garantir que a informação esteja disponível sempre que um utilizador a solicitar e defendemos a visão de autores conceituados da Gestão da Informação como Choo, Davenport, Drucker, McGee e Prusak, que veem a informação como um recurso estratégico e a 1. O conceito de Sociedade da Informação surgiu inicialmente nos trabalhos de Alain Touraine (1969) e de Daniel Bell (1973) sobre as influências dos avanços tecnológicos nas relações de poder, mas apenas se afirmou no Livro Branco sobre “Crescimento, Competitividade, Emprego – os desafios e as pistas para entrar no séc. XXI”. Este documento, publicado em dezembro de 1993 na sua versão original, dedica uma secção à Sociedade da Informação. Aí é afirmado que a Europa dispõe do know-how e da experiência indispensáveis para a implementação de um espaço comum da informação (http://ec.europa. 114 eu/communication_white_paper/doc/white_paper_pt.pdf, consultado em 31/01/08). sua gestão como uma ferramenta estratégica. Defendemos uma Gestão da Informação baseada em políticas que assentam na definição de critérios na produção, organização, armazenamento, seleção, disseminação e uso da informação que permitirá à organização ser mais competitiva no cumprimento dos seus objetivos e da sua missão. Para o efeito adotamos o modelo de Gestão de Informação Sistema Integral de Informação Ativa e Permanente (SIAP) proposto por Pinto & Silva. Superior de Tecnologia e Gestão de Águeda Sendo a informação a promotora da nova economia esta é um recurso que nenhuma organização deve negligenciar. Mas de que falamos quando usamos a expressão Gestão da Informação? Esta compreende um conjunto diversificado de atividades: produção, tratamento, registo e guarda, comunicação e uso da informação, pressupondo que se lide, administre e encontre soluções práticas. Choo define Gestão de Informação como “um ciclo contínuo de seis atividades estreitamente ligadas: identificação das necessidades de informação; aquisição de informação; organização e armazenamento da informação; desenvolvimento de produtos e serviços de informação; distribuição da informação; utilização de informação. (…) A conceptualização da gestão de informação como um ciclo de atividades de informação interligadas que devem ser planeadas, concebidas e coordenadas, oferece uma perspetiva de base processual que complementa as ideias mais convencionais de gestão de informação como gestão de tecnologia de informação ou gestão de recursos de informação. (…) O modelo processual de gestão de informação devia abarcar toda a ideia de valor da informação (…)”2. Da análise da definição podemos concluir que o autor não vê a Gestão da Informação como uma disciplina científica, uma vez que estamos perante um conjunto de atividades sequenciais e relacionadas com a produção /aquisição, tratamento, registo e guarda, a comunicação e o uso da informação. O mesmo se verifica ao analisarmos a definição de Zorrinho: “função que interliga e conjuga a conceção dos Sistemas de Informação com a conceção dinâmica da organização. É, em consequência, uma função de nível estratégico, que deve ser desempenhada ao mais alto nível da estrutura da organização (vice-presidência ou assessoria direta do presidente ou diretor-geral). As A Gestão da Informação como ferramenta estratégica de gestão da Escola 1. Gestão da Informação: revisão da literatura 2. CHOO, Chun Wei - Gestão de informação para a organização inteligente : a arte de explorar o meio ambiente. Lisboa : Caminho, 2003. p. 58-60. 115 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade suas atribuições são múltiplas e diferenciadas, sendo o gestor da informação, antes de mais, um controller estratégico”3. “(…) Para além das capacidades pessoais de liderança e comunicação, o gestor de informação deve deter uma sólida formação de base em gestão, uma boa formação em planeamento, conceção e gestão de Sistemas de Informação e alguns conhecimentos sobre tecnologias informáticas e sua evolução”4. Davenport, por sua vez, refere que a “Gestão da Informação é um processo que trata de um conjunto estruturado de atividades que incluem o modo como as empresas obtêm, distribuem e usam a informação e o conhecimento. Como processo, é necessária entre os vários setores da organização. No entanto, o enfoque principal do processo deve estar nas necessidades e na satisfação dos clientes da informação, o que torna a administração informacional realmente efetiva”5. Esta perspetiva alerta para o facto de a Gestão da Informação envolver permutas, relações entre os vários setores, o que na prática significa envolver toda a organização. Nesta sequência, McGee & Prusak propõem um modelo processual de Gestão da Informação (Figura 1) e reafirmam a convicção de que a Gestão da Informação desempenha um papel fundamental na definição da estratégia organizacional, porque poderá possibilitar oportunidades e alternativas de estratégias que tornarão a organização mais competitiva6. Este modelo apenas reafirma a perceção de muitos autores de que a Gestão da Informação é um processo que se inicia com a identificação de necessidades de informação, seguindo uma determinada tramitação que permitirá a análise e uso da mesma. Este modelo processual subentende o desenvolvimento de um conjunto de atividades: recolha da informação; classificação, armazenamento; tratamento e apresentação da informação (a partir dos quais serão desenvolvidos os produtos e serviços de informação e que permitirão a sua disseminação e distribuição) -, que depois de concretizadas deverão dar uma resposta efetiva às necessidades dos que procuram a no seu duplo papel: o de utilizadores e de beneficiários dessa mesma informação. 3. ZORRINHO, Carlos – A Gestão da Informação. Lisboa : Editorial Presença, 1997. p. 21. 4. Idem, p. 21-22. 5. ASSIS, Wilson Martins de – Metodologia para construção de produtos de informação nas organizações [Em linha]. Belo Horizonte : UFMG, 2006. [Consult. 12 Dez. 2007]. Disponível em WWW:<URL:http://www.bibliotecadigital.ufmg.br/dspace/ bitstream/1843/ VALA-6T7QWL/1/mestrado___wilson_martins_de_assis.pdf>.p. 29. 116 6. Idem. Ibidem. Figura 1 - Modelo processual de Gestão da Informação Superior de Tecnologia e Gestão de Águeda Os mesmos autores afirmam que a criação de um Sistema de Informação7 é relativamente fácil quando se baseia em necessidades pré-determinadas, mas que a dificuldade tende a aumentar, exponencialmente, quando se tenta ir além dessa análise: quando se tentam antecipar essas necessidades. É aqui que os novos profissionais da informação se devem afirmar e fazer a diferença já que lhes pode permitir alcançar um valor estratégico8. Pinto & Silva vão um pouco mais longe que Mcgee & Prusak na sua proposta de modelo para o estudo da Gestão da Informação e apresentam o Sistema Integral de Informação Ativa e Permanente (SIAP)9. Modelo este que nos servirá de referência para o presente caso e que foi o modelo seguido em outros casos, nomeadamente a análise relativa à Universidade do Porto: estudo orgânico-funcional10, seguindo-se o Sistema de Informação Municipal Ativa de Indaiatuba - SIMAI11 e o Sistema de Informação Municipal de Vila do Conde12. O SIAP é um modelo de Gestão de Informação (Figura 2) que abarca e apela ao envolvimento de toda a organização. Exige o conhecimento do contexto, da estrutura, das relações e dos fluxos informacionais que se estabelecem entre os agentes que os produzem. Tem o seu sustentáculo no pensamento “sistémico, holístico e complexo, encontrando a sua fundamentação ontológica e epistemológica na Ciência da Informação”13, o que permite estudar todo o processo informacional desde a sua origem, passando pela sua A Gestão da Informação como ferramenta estratégica de gestão da Escola Fonte: (Mcgee & Prusak cit. por Assis). 117 tramitação, até ao seu destino final. Figura 2 - SIAP (adap. de Pinto & Silva, p. 8) Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade O SIAP, que tem a sua matriz fundadora no método quadripolar, é constituído por quatro módulos. O primeiro módulo encerra toda a investigação científica que incide 7. Um Sistema de Informação é “uma totalidade formada pela interacção dinâmica das partes, ou seja, possui uma estrutura duradoura com um fluxo de estados no tempo. Assim sendo, um Sistema de Informação é constituído pelos diferentes tipos de informação registada ou não externamente ao sujeito, não importa qual o suporte (material ou tecnológico), de acordo com uma estrutura (entidade produtora/receptora) prolongada pela acção na linha do tempo” (SILVA, Armando Malheiro da - A informação : da compreensão do fenómeno e construção do objecto científico, p. 162). 8. ASSIS, Wilson Martins de – Metodologia para construção de produtos de informação nas organizações [Em linha]. Belo Horizonte : UFMG, 2006. [Consult. 12 Dez. 2007]. Disponível em WWW:<URL:http://www.bibliotecadigital.ufmg.br/dspace/ bitstream/1843/VALA-6T7QWL/1/mestrado___wilson_martins_de_assis.pdf>. p. 37. 9. PINTO, Maria Manuela Gomes de Azevedo; SILVA, Armando Malheiro da – Um modelo sistémico e integral de gestão de informação nas Organizações [em linha]. [Consult. 30 Dez 2007]. Disponível em WWW: < URL:http://ler.letras.up.pt/uploads/ ficheiros/3085.pdf>. 10. RIBEIRO, Fernanda; FERNANDES, Maria Eugénia Matos - Universidade do Porto : estudo orgânico-funcional : modelo de análise para fundamentar o conhecimento do Sistema de Informação arquivo. Porto : Reitoria da Universidade, 2001. ISBN 972-8025-12-2. 11. MASSON, Sílvia Mendes – Projeto SIMAP – SIMAI : SIMAP – Sistema de Informação Municipal Ativa e Permanente : SIMAI – Sistema de Informação Municipal Ativa de Indaiatuba [Em linha] .[Consult. 12 Dez. 2005]. Disponível em WWW:<URL:http:// ler.letras. up.pt/uploads/ficheiros/artigo5641.PDF>. 12. PINTO, Maria Manuela Gomes de Azevedo – Gestão integrada do Sistema de Informação municipal: um estudo de caso. 118 Páginas a&B. ISSN 0873-5670. nº 12 (2003), p. 91-114. 13. Idem. p. 1. Superior de Tecnologia e Gestão de Águeda A Gestão da Informação como ferramenta estratégica de gestão da Escola sobre a organização objeto de estudo, sobre o “fenómeno e processo infocomunicacional ocorrido no seu interior”, o ambiente onde esta se movimenta e sobre os problemas inerentes à Ciência da Informação com o objetivo de compreender e explicar o caso ou os problemas a abordar14. Neste módulo são formuladas hipóteses/teorias (pólo teórico do método quadripolar), a adotar e usar e técnicas de obtenção de elementos para a pesquisa/estudo científico (operações técnicas do pólo técnico), com o objetivo de compreender e explicar o caso organizacional ou o tema/problema/situação colocados em estudo15. No módulo II verifica-se o ajustamento e adequação prática da investigação teórica ao caso concreto da implementação do Modelo. Como referem Silva & Pinto, deve ser elaborado e desenvolvido um “esquema-pivot” que congregue, por um lado, os resultados obtidos metodologicamente de acordo com os preceitos inscritos no primeiro módulo e, por outro, as evidências empíricas que importa ter presentes quando se pretende intervir numa organização. É usual as organizações necessitarem de: a) descentralizar as suas atividades (logo os postos de trabalho) através da sua crescente informatização; b) aumentar a segurança e o controlo do acesso ao Sistema de Informação; c) garantir um maior controlo da autenticidade, integridade e fiabilidade das transações e do seu Sistema de Informação; d) assegurar o uso da informação a médio e longo prazo; e) distribuir os serviços de forma consistente e equitativa; f) documentar as políticas, decisões e resultados de todas as partes envolvidas; g) proteger os interesses e direitos da organização, dos seus colaboradores e clientes, etc; h) prevenir situações de emergência ou desastre e preservar a memória organizacional16. Estas questões têm, obrigatoriamente, de serem equacionadas. De tal forma que a intervenção na Gestão da Informação deve ser antecedida e definida por um plano detalhado em que seja focado como a informação deve ser produzida/recebida, reproduzida e difundida/acedida. Após a elaboração deste plano, efetua-se a sua transposição para o caso concreto de forma faseada17. Na primeira fase, e resultante dos módulos I e II, é obtido o quadro orgânico-funcional que reflete a estrutura e as atividades da organização 119 ao longo dos tempos. De seguida, é necessário conhecer toda a informação produzida, independentemente do suporte e da idade18. A implantação do modelo SIAP é a etapa que se inscreve no terceiro módulo (independentemente de se tratar de uma intervenção global ou parcial, num ou em vários setores mais críticos no funcionamento da organização). A sua implantação deve ser feita por setores, privilegiando aqueles anteriormente identificados (considerados prioritários nesta reestruturação), que determinarão a sequência dessa implantação aos restantes. Para realizar esta tarefa, é fundamental a constituição de uma equipa interdisciplinar que garanta não só a avaliação do fluxo informacional mas também dos instrumentos de recuperação da informação19. Por fim, temos o módulo IV, no qual se processa a investigação científica sobre o Modelo implantado e respetivo monitoramento. No fundo, é uma avaliação permanente desse Modelo, porque se trata de uma realidade dinâmica. Ao adotarmos o SIAP, temos como objetivo principal o desenhar das linhas diretrizes para a reformulação do Sistema de Informação (SI) da ESTGA, com vista a um funcionamento mais eficiente e eficaz que apoie a política global da organização. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 2. Caracterização do caso Tendo presente todo o percurso teórico e institucional relacionado com a Ciência da Informação (pólo epistemológico) e partindo, metodologicamente, de uma perspetiva de racionalidade indutiva, tomando-se como referência um contexto teórico baseado no novo paradigma pós-custodial, dinâmico, informacional e científico (pólo teórico) e na metodologia quadripolar, realizamos o nosso estudo de caso (pólo técnico) começando por adotar os três primeiros módulos do SIAP. O módulo I abarca a investigação científica (teórico-técnica) sobre uma organização, o fenómeno e o processo info-comunicacional ocorridos no seu interior e/ou na sua interação com o ambiente exterior. No módulo II procede-se ao ajustamento ou adequação prática da investigação teórica (adquirida no decurso da formação) ao desafio concreto da implementação do Modelo20. 14. Idem. p. 16. 120 15. Idem. p. 10. 16. SILVA, Armando Malheiro da ; PINTO, Manuela Azevedo – Ob. Cit. p.10-1. Superior de Tecnologia e Gestão de Águeda 17. Idem. p.14. A Gestão da Informação como ferramenta estratégica de gestão da Escola O terceiro módulo consiste na implantação do modelo SIAP na ESTGA, sendo selecionado como “sector-piloto”, para o início da referida implantação, a Secretaria Administrativa porque se afigurava como sector prioritário já que acaba por centralizar uma parte significativa das atividades da organização. Este módulo é composto por quatro fases: a primeira tem como resultado a análise orgânico-funcional (desde 1994), o que permite o conhecimento e a compreensão dos objetivos, competências e funções dos diferentes órgãos (mediante a recolha e análise de legislação e regulamentos; análise de documentação produzida e entrevistas aos funcionários); a segunda fase exige que seja considerada toda a informação, independentemente do suporte e da idade, para que se possa pensar nas soluções tecnológicas com a necessária articulação dentro de todo o SIAP, o que torna imperativo o levantamento de toda a informação produzida, recebida e expedida e um conjunto de tarefas de parametrização rigorosa de requisitos e funções exigidas pela informatização integrada no Modelo; a terceira fase pressupõe a implantação por sectores, escolhendo o “sector-piloto” e estratégico que irá determinar a sequência dos restantes; a fase quatro pressupõe a constituição de um grupo interdisciplinar com vista ao acompanhamento da implantação sectorial do Modelo e a avaliação do fluxo informacional e dos instrumentos de recuperação da informação21. Entre as etapas na execução prática do estudo de caso, inscritas no módulo III podemos referir: - o recenseamento da informação /documentação produzida (nos diversos suportes) e cruzamento com os quadros orgânico-funcionais, daqui resultando a quantificação e tipificação da produção informacional e respetivos suportes; - a análise do sistema tecnológico de informação existente (hardware e software); - o levantamento, análise e representação dos processos organizacionais, definindo circuitos, agentes e produção informacional (esta fase é fundamental para o conhecimento e descrição da organização nas suas múltiplas facetas. Efetivamente, é a base para a análise e conceção de novos processos, permitindo identificar os aspetos que deveriam ser redefinidos e funcionando, ainda, como um excelente meio de conhecimento organizacional); 18. Idem. p.11-2. 19. Idem. p.12. 121 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade - a estruturação do serviço de Gestão de Informação/Arquivo; - o controlo de toda a produção informacional (nos diferentes suportes), acompanhando todo o ciclo de vida da informação, a uniformização dos modelos de documentos utilizados e convertê-los (os poucos que ainda não existem) em formato eletrónico e a criação de meta-informação (que deve obedecer a critérios e princípios rigorosamente definidos); - o desenvolvimento de uma classificação que permita classificar a informação no ato da sua produção; - a avaliação da informação de acordo com os critérios e parâmetros do modelo teórico concebido por Silva & Ribeiro22; - a adoção de ferramentas de gestão eletrónica de documentos e Workflow com vista a uma racionalização de tarefas e a uma efetiva comunicação informacional interna e externa; - a adoção de um sistema integrado de gestão de informação, tendo em conta as especificidades da organização, sustentado na aplicação das Tecnologias da –informação e da Comunicação. Esta solução deverá permitir, entre vários aspetos: rápido acesso aos documentos (com pesquisa em metadados e texto livre); controle do fluxo de trabalho; maior segurança no acesso aos documentos; maior produtividade e redução de custos (tempo, papel, cópias)23; - o acompanhamento dos serviços produtores e a sua participação nos processos de mudança organizacional (além das questões associadas à adoção de novas metodologias e formas de trabalho, deve incluir ações de sensibilização junto dos funcionários, alertando-os para as implicações decorrentes do facto de trabalharem diariamente com documentação oficial); - a identificação das estratégias, instrumentos e soluções a implementar no sector que considerámos prioritário: a Secretaria Administrativa; Estas etapas têm como objetivo final uma redefinição do Sistema de Informação da ESTGA que, como parte integrante desse Sistema mais global (a própria organização), deve estar em sintonia com o todo (organização) e com o modelo de gestão adotado por e para esse todo. As partes convergem para o todo, numa perspetiva sistémica: todos os 20. SILVA, Armando Malheiro da ; PINTO, Manuela Azevedo – Ob. Cit. p. 16-7. 122 21. PINTO, Manuela Azevedo , SILVA, Armando Malheiro da – Ob. Cit. p. 12. a&b. ISSN 0873-5670. Nº 14 (2004), p. 7-37. Estes autores defendem uma avaliação realizada por parâmetros científicos, que incida no fluxo de informação do sistema em que está inserido e tem o seu apoio e fundamento em 3 tipos de indicadores: 1. A pertinência dos atos informacionais em função dos objetivos da organização; da estrutura orgânica e competências/funções Superior de Tecnologia e Gestão de Águeda 22. SILVA, Armando Malheiro da ; RIBEIRO, Fernanda - A avaliação de informação : uma operação metodológica. Páginas A Gestão da Informação como ferramenta estratégica de gestão da Escola subsistemas que compõem a organização estão em uníssono e o Sistema de Informação não é exceção. Cada organização é única, tem uma cultura própria que lhe dá um carácter singular e o seu próprio modelo de gestão do Sistema de Informação. O modelo é indissociável dessa organização em concreto porque é o indicador da sua unicidade e particularidade, tornando-se percetível através do conhecimento do seu contexto, da sua estrutura e dos seus processos. Ao conhecer estes fatores, estamos na posse de um instrumento que permite descrever e perceber como é a realidade atual (que promove o seu desempenho atual) e, simultaneamente, estamos a conceber uma ferramenta para atuar e conseguir convergir para os resultados desejados. Ao desenhar um modelo de funcionamento de uma organização com base na análise dos processos, estamos a fazer uma representação dessa organização, no fundo, a “fotografar” essa realidade. É esta aproximação (este modelo) que promove o desempenho atual e que, por isso, gera os resultados atuais. A filosofia subjacente a esta análise pressupõe que, se pretendermos atingir outras metas, tenhamos de criar uma nova realidade, aperfeiçoar o modelo, modificar e transformar um ou mais processos desse modelo. É essencial conhecer os processos atuais para determinar os pontos críticos e as melhorias a incluir com vista ao desenvolvimento do modelo futuro. Os resultados pretendidos obter-se-ão detetando os pontos críticos do modelo atual e identificando as transformações que importa introduzir. Muitas vezes, para se conseguir gerar os resultados desejados, não é necessário modificar todos os circuitos, basta melhorar alguns, ou, pontualmente, criar novos circuitos ou, em última instância, conceber um novo modelo organizacional. Para que se compreenda e interprete o modelo organizacional importa conhecerse a ligação entre os circuitos informacionais e as atividades desenvolvidas, a estrutura formal com os sistemas de relações internas informais, os desejos e expectativas dos agentes intervenientes (internos e externos) e a sua ligação com as variáveis organizacionais e de gestão. do órgão; da memória institucional; 2. A densidade dos atos informacionais de acordo com o seu “volume” informacional; 3. A frequência, isto é, periodicidade de uso/acesso à informação, quer na fase de produção/receção (fase genésica ou ativa), quer na fase posterior (pós-genésica, estável). 123 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Ao conhecer e compreender o seu modelo organizacional atual, as organizações terão um instrumento para poderem recriar ou redefinir novas políticas e orientações estratégicas, para desenvolverem novas metodologias e ferramentas de trabalho e de gestão. O conhecimento do modelo atual pode levar também a uma reestruturação da própria organização e a uma reanálise dos objetivos a alcançar. Um modelo de gestão eficiente é, portanto, primordial, porque vivemos momentos em que a concorrência é feroz e, para sobreviver, é necessário demonstrar qualidade e competência em tudo o que se faz – na atual conjuntura, a excelência é fator determinante. Longe vão os tempos em que os clientes se cingiam ao que o mercado lhes oferecia. Atualmente, os clientes têm as suas opiniões, ideias, necessidades, expectativas e gostos bem definidos. Compete às organizações ir ao encontro dos desejos dos clientes e, inclusive, oferecer-lhes produtos/serviços que estes não esperariam, antecipando e criando novas carências. Os clientes ou potenciais clientes possuem um leque abrangente de opções para dar resposta às suas necessidades e se a organização não conseguir corresponder às suas expectativas, estes irão, certamente, procurar junto de organizações concorrentes soluções mais adequadas às suas exigências e necessidades. Assim sendo, cada organização deve procurar novas formas de gestão com vista a garantir que os clientes a procurarão pela sua qualidade e excelência, caso contrário ver-se-á constantemente ultrapassada pelos seus concorrentes e desaparecerá porque não consegue cativar nova clientela, não cumprindo assim os objetivos para que foi criada. É fundamental a qualquer organização monitorizar o ambiente externo, porque se por um lado o ambiente interno pode ser controlado pelos gestores da organização (já que este resulta das estratégias de atuação por eles definidas), por outro o ambiente externo não está sob controlo da organização. Tal facto não deverá significar alienamento da organização em relação ao exterior, antes pelo contrário, esta deve conhecê-lo e proceder 23. Entre as funcionalidades que o programa deve apresentar podemos destacar algumas fundamentais: Gestão integrada de documentos; Pesquisa em Meta dados ou Texto livre; Classificação de Documentos; Histórico de Versões de Documentos; Automatização de Ações sobre o Documento: Conversão para outro formato; Envio de e-mails de notificação; Contadores automáticos; Possibilidade de definir ações personalizadas; Requisição e Devolução de Documentos; Agregar documentos a processos e processos a processos; Configuração de Regras e Workflow; Definição de templates com estrutura e regras; Integração com diversos motores de base de dados e Integração com sistemas de autenticação da informação. É igualmente importante garantir a articulação e gestão integrada de toda a informação independentemente da sua idade e da época em que foi produzida, associando-a ao processo histórico em que ela se insere. O que não é possível com o presente programa, cujo objetivo fundamental é a gestão corrente da organização UA, que procura gerir, num contexto de rápidas alterações, o 124 processo informacional, assim como o seu produto - a informação. à sua monitorização com frequência, de forma a aproveitar as oportunidades e evitar as ameaças. Com efeito, apesar de nem sempre ser possível evitar as ameaças, é possível, se for feito um planeamento adequado, minimizar os seus efeitos. Superior de Tecnologia e Gestão de Águeda A Escola Superior de Tecnologia e Gestão de Águeda (ESTGA) está localizada na cidade de Águeda. Esta é a maior cidade da região da Bairrada e situa-se a 50 Km de Coimbra, a 20 km de Aveiro e a 75 km do Porto. Águeda é o terceiro concelho mais populoso do Baixo Vouga, sendo apenas ultrapassado por Aveiro (com 19% do total da população residente no Baixo Vouga) e Ovar (com 14,3%), apresentando uma população mais jovem do que o resto do continente. É num concelho altamente industrializado e com necessidade de mão-de-obra qualificada. Tais características levaram a que, desde 1983, se começasse a discutir a possibilidade de existência de um estabelecimento de ensino superior politécnico em Águeda. Porém, um conjunto de fatores levou a que apenas tal se verificasse em finais de 1994, registando-se o ato fundador da ESTGA, em 19 de Dezembro de 1994, com a publicação do Decreto-Lei n.º 304/9424. Após muitas vicissitudes, iniciaram-se, em outubro de 1997, as atividades da ESTGA, depois de o Decreto-lei n.º 180/9725, de 24 de julho, a ter desafetado do Instituto Politécnico de Aveiro e de ter autorizado a sua integração na Universidade de Aveiro, salvaguardando o respeito pela natureza e pelos objetivos do ensino superior politécnico e nos termos do nº 3, in fine, do artigo 14.º da Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei n.º 46/86, de 14 de outubro). Assim, a ESTGA foi a primeira escola superior26 a ser inserida na Universidade de Aveiro, dando cumprimento ao estipulado no artigo 2., ponto 1 da Lei n.º 54/90, (Estatuto e autonomia de Estabelecimentos de Ensino Superior Politécnico): “as escolas superiores são centros de formação cultural e técnica de nível superior, às quais cabe ministrar a preparação para o exercício de atividades profissionais altamente qualificadas e promover o desenvolvimento das regiões em que se inserem”27. Este foi, indubitavelmente, um dos objetivos que esteve subjacente à criação da ESTGA. Com efeito, a sua criação visava contribuir, em particular, para o desenvolvimento integrado da região de Águeda e para a revitalização do tecido produtivo existente. A Escola tinha como objetivo a formação orientada para novas técnicas, em particular A Gestão da Informação como ferramenta estratégica de gestão da Escola 2.1. Contexto 125 nas tecnologias polivalentes, especialmente nos domínios industriais de forte implantação distrital e regional, e em domínios particularmente carentes a nível nacional. Estas linhas de orientação permitiram traçar as diretrizes implementadoras dos diferentes cursos a ministrar na ESTGA. Assim, no ano letivo de 1997/98, a ESTGA iniciou a sua atividade letiva com os cursos de Engenharia Eletromecânica e Engenharia Geográfica. Em 2000/01, passaram a ser ministrados na ESTGA mais quatro cursos: Engenharia Eletrotécnica, Estudos Superiores de Comércio, Gestão Pública e Autárquica e Secretariado de Direção e, por fim, em 2002/03, o curso de Documentação e Arquivística28. Simultaneamente, a ESTGA assegura cursos de formação especializada (CFE), cursos de pós-graduação nas áreas da Engenharia Geográfica e da Engenharia Eletrotécnica. Na área da Engenharia Geográfica, os cursos em Modelação Tridimensional e em SIG (Sistema de Informação Geográfica) Municipal e, na área de Eletrotécnica, o CFE de Instalação de Redes de Comunicações. Além dos CFE, a ESTGA fornece cursos de especialização tecnológica (CET), cursos de formação pós-secundária não superior que conferem qualificação profissional de nível 4. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 2.2. Estrutura 126 Para dar cumprimento aos seus objetivos e à sua missão a ESTGA necessita “estruturase” e adaptar-se às mudanças que se vão registando. A estrutura de uma organização encontra-se intimamente relacionada com o contexto dentro do qual funciona, uma vez que a modificação verificada nela pode ser explicada por fatores ou variáveis do contexto. A estrutura constitui um conjunto de variáveis complexas, sobre as quais os administradores e gestores fazem escolhas e tomam decisões. Define a forma como as tarefas devem ser destinadas, especifica quem depende de quem e estabelece os mecanismos formais de coordenação e controlo29. Após a análise das fontes para conhecer a estrutura da ESTGA e a sua evolução constatámos que, desde o ano da sua criação até ao ano letivo de 2006/07, teve duas fases diferentes em termos estruturais (Cfr. Figura 3). A primeira fase, que podemos designar de regime ou fase de instalação, estendeu-se desde a sua criação30 até ao fim do ano letivo de 2005/06, com a aprovação dos Estatutos a 26 de Setembro de 2006, seguindo-se a segunda fase, logo após a aprovação e consequente publicação no Diário da República, que se encontra a decorrer, e que designamos de período de Afirmação. Figura 3 - Barra cronológica das fases orgânico-funcionais da ESTGA 24. Este diploma criou igualmente o Instituto Politécnico de Aveiro, no qual foi integrada a ESTGA. 25. Decreto-Lei n.º 180/97. D.R. I Série-A. 169 (1997-07-24) 3735-3736. 26. Além da ESTGA são ainda escolas politécnicas da UA a ESAN (Escola Superior de Design, Gestão e Tecnologia de Produção Superior de Tecnologia e Gestão de Águeda A ESTGA é um Sistema inserido no macro sistema Universidade de Aveiro (UA) com estatuto equivalente ao dos Departamentos. Nos termos dos seus estatutos, a UA é estruturalmente organizada em Departamentos/Secções Autónomas31 e em Escolas Politécnicas que constituem unidades organizacionais dotadas de recursos humanos e materiais com vista à realização das funções da Universidade. Os departamentos gozam de autonomia científica, pedagógica, administrativa e financeira, nos termos dos Estatutos da UA e da lei, cabendo-lhes “propor o orçamento respeitante às dotações orçamentais que lhes sejam atribuídas e as alterações aos efectivos de pessoal que lhes estejam afectos”; “celebrar contratos de tarefa com vista à realização de trabalhos técnicos, científicos e outros, de carácter eventual, necessários à prossecução das suas atribuições”; “participar na prestação de serviços e na realização de trabalhos efectuados por entidades públicas ou privadas, nacionais ou estrangeiras, relacionados com as suas actividades e de reconhecido interesse para a prossecução dos seus fins” e “ elaborar o relatório anual de execução administrativa e financeira”32. A Gestão da Informação como ferramenta estratégica de gestão da Escola Fonte: ESTGA Aveiro Norte), A ESSUA (Escola Superior de Saúde da Universidade de Aveiro e o ISCA-UA (Instituto Superior de Contabilidade e Administração da Universidade de Aveiro). 27. Lei nº 54/90 Lei nº 54/90. D. R. I Série. 205 (1990-09-05) 35-80 – 3589. 127 A mudança da estrutura da ESTGA responde a imperativos legais (o período legal definido para o regime de instalação tinha sido prorrogado por sucessivos despachos do Reitor da UA) e ao crescimento e consequente complexidade da própria escola. A mudança no percurso da ESTGA é patente quando comparamos a diferença no que se refere a determinados elementos da estrutura: introdução de novos e eliminação de alguns da primeira para a segunda fase e as mudanças a nível das competências de determinados órgãos que se mantem em ambas as fases. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 2.3. Processos organizacionais Todas as áreas orgânico-funcionais desenvolvem atividades para dar cumprimento aos objetivos da organização. Devemos ter sempre presente que, apesar de cada área orgânico-funcional ter processos e atividades característicos e específicos, há que ter em conta que o processo também se caracteriza por ser transversal, isto é, pode “correr” a estrutura funcional da organização, ligando setores distintos e recorrendo a atividades de diferentes setores, pressupondo inúmeras interações. O conhecimento dos processos e atividades é fundamental para o estudo que nos propomos fazer porque para se efetuar uma Gestão da Informação eficaz, é essencial “determinar que informação deve ser produzida em cada processo de negócio... decidir sobre a forma e estrutura dessa informação... as tecnologias a utilizar... a meta-informação que a acompanha... quais os requisitos para a recuperação, utilização e transmissão dessa informação”33. Um processo pode ser regulamentado e definido através de um procedimento que consiste quer numa forma específica de descrever uma atividade ou um processo, quer o próprio documento que descreve, de modo formal, as tarefas a cumprir, para se atingir 28. Desde a sua criação até ao ano letivo de 2006/07 a ESTGA ministrou sete bacharelatos. Com a implementação do Processo de Bolonha a escola passou a ministrar seis licenciaturas: Documentação e Arquivística, que resulta da adequação do bacharelato com o mesmo nome; Técnico Superior de Secretariado, que resulta da adequação do curso de Secretariado de Direção; Tecnologias da Informação (com Ramos de Sistemas de Informação Empresariais, Tecnologias da Informação e da Comunicação e Tecnologias da Informação Geográfica), Gestão Pública e Autárquica, que resulta da adequação do bacharelato com o mesmo nome; Comércio, resultante da adequação do bacharelato de Estudos Superiores de Comércio; Engenharia Eletrotécnica (com Ramos de Instalações Elétricas e Mecatrónica), que resulta da fusão dos cursos de Bacharelato em Engenharia Eletromecânica e em Engenharia Eletrotécnica e, no ano letivo de 2010/11, a licenciatura em Gestão da Qualidade. 29. BILHIM, João Abreu de Faria - Teoria Organizacional : estrutura e pessoas. Lisboa : Instituto Superior de Ciências Sociais 128 e Políticas, 2005. p. 246. Superior de Tecnologia e Gestão de Águeda 30. A ESTGA foi criada formalmente em Dezembro de 1994, mas só iniciou as suas atividades letivas no ano letivo de 1997/98, A Gestão da Informação como ferramenta estratégica de gestão da Escola os objetivos fim de determinado processo. Com as normas da qualidade ganha força a expressão “procedimentos documentados” em que se entende que devem ser formalizados e registados os procedimentos dos processos chave da organização para que sejam conhecidas por todos. Os decisores, ao deterem informação sobre o ambiente externo e sobre as características internas organizacionais, estão munidos da base para a gestão e planeamento estratégico de uma organização. Daqui decorre a importância de conhecer os circuitos informacionais decorrentes do exercício das atividades da organização e do qual resulta informação produzida. Assim, para que a sua interpretação e análise sejam mais simples, procedemos à sua representação gráfica, mediante o recurso a fluxogramas, indicando os intervenientes e os documentos produzidos. Esta técnica de modelação de processos organizacionais para o conhecimento e descrição da organização é a base fundamental para a análise e conceção de novos processos, uma vez que, ao permitir identificar os aspetos que devem ser redefinidos, funciona, igualmente, como um excelente meio de discussão, controlo e difusão do conhecimento organizacional. Estes processos resultam de uma série de atividades logicamente interrelacionadas que quando executadas produzem resultados esperados, e que visam responder às necessidades e expectativas dos clientes. O conhecimento destes circuitos permite, então, compreender a informação gerada no exercício das atividades da ESTGA com o intuito de realizar os respetivos objetivos e de cumprir a sua missão. A nossa atenção inicial centrou-se nas atividades mais diretamente relacionadas com a Secretaria Administrativa porque este foi, segundo as linhas orientadoras do modelo SIAP, o “sector-piloto” elegido porque esta acaba por funcionar como o epicentro do funcionamento da ESTGA. Partindo da análise das funções que competem à Secretaria Administrativa, estudámos e representámos as suas tarefas e a forma como decorrem com vista à aferição do modo de funcionamento. Com a deteção de algumas anomalias foram introduzidas alterações que agilizam a Gestão da Informação e o funcionamento da própria organização e que visam atingir, mais facilmente, os seus objetivos. Promover a Gestão da Informação de modo eficiente e eficaz exige que se faça uma reflexão meticulosa, transversal a toda a organização, de modo a implementar um em regime de instalação. 31. A UA é constituída por 15 Departamentos e 2 Secções Autónomas, que se interrelacionam consoante a interdisciplinaridade dos cursos que integram ou das áreas de investigação que partilham. 129 sistema de gestão de toda a documentação/informação, disciplinando, de modo integrado e contínuo, todo o processo de produção/receção, gestão e conservação/eliminação da informação produzida/recolhida, independentemente do seu suporte. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Considerações Finais 130 A importância da Informação exige que as organizações olhem a sua gestão como um investimento no seu sucesso, porque se trata de um recurso tático e a sua gestão uma ferramenta estratégica. O contexto em que a ESTGA está inserida exige a flexibilização e a modernização da sua estrutura organizacional, a aposta incondicional na Gestão da Informação e no aperfeiçoamento do seu Sistema de Informação. Esta aposta deve ser assumida como uma atitude estratégica que a ajude a fomentar e ampliar os horizontes em termos de oportunidades e lhe permita a deteção e defesa das ameaças provenientes do ambiente externo. Desta forma, poderá atingir um novo equilíbrio no seu funcionamento e afirmar-se enquanto organização moderna e competitiva. Em jeito de súmula, podemos destacar algumas ideias principais resultantes do estudo realizado, no sentido de disciplinar a gestão documental e informacional: - Reformular alguns circuitos, nomeadamente os da correspondência expedida e da correspondência recebida, com particular destaque no controlo de entradas e saídas (nem toda a correspondência recebida, por exemplo, é registada). Isto, porque se trata da esmagadora maioria da documentação produzida/recolhida pela ESTGA no exercício das suas atividades; - Erradicar a divisão da informação segundo a tecnologia e suportes utilizados, passando toda ela a receber o mesmo tratamento (a informação é organizada de acordo com a tecnologia usada. Por exemplo: e-mails faxs, etc); - Numerar toda a correspondência oficial expedida (incluindo os e-mails); - Adotar um sistema de Workflow com vista a uma racionalização de tarefas, já que permitirá a automatização de processos, de acordo com um conjunto de regras definidas, permitindo que estes possam ser transmitidos de um posto de trabalho para outro de acordo com algumas regras (celeridade de distribuição e troca de pautas são um exemplo das vantagens desta ferramenta); 32. Artigo 28.º do Despacho Normativo N.º 52/89. D.R. I Série. 140 (1989-06-21). p. 2403-10. 33. NP 4438-1. 2005 - Informação e documentação : gestão de documentos de Arquivo. Caparica: IPQ, 2005. p. 13. Superior de Tecnologia e Gestão de Águeda A Gestão da Informação como ferramenta estratégica de gestão da Escola - Apostar em plataformas tecnológicas e nos documentos eletrónicos (incluindo a uniformização dos modelos de documentos e convertê-los (os que ainda não existem) em formato eletrónico; igualmente, apostar na digitalização da documentação e distribuição pelas pessoas a que se destina com recurso à certificação digital; - Controlar toda a produção informacional acompanhando todo o ciclo de vida da informação e de criação de meta-informação; - Desenvolver uma classificação que permita disciplinar e classificar a documentação no ato de produção (desenvolvimento da classificação já usada na correspondência e alargá-la a toda a informação), em comunicação com a UA; - Adotar um sistema integrado de Gestão da Informação que ajude, por exemplo, a agilizar processos que exigem uma constante troca de informações, incluindo entre a Escola e a Universidade, tendo presentes as especificidades da organização, sustentado na aplicação das TIC; Atendendo que está a ser implementado o programa de gestão da informação Docushare em três “departamentos-piloto” e que o objetivo é alargá-lo às restantes unidades orgânicas da UA, este será a resposta à necessidade de simplificar e agilizar a Gestão da Informação. Trata-se de uma solução que está a ser desenvolvida e melhorada, atendendo às especificidades da organização. Todavia, esta solução não inclui, ainda, a necessária articulação com massas documentais que foram sendo produzidas e acumuladas ao longo da existência da UA e das suas unidades orgânicas, nem as necessidades inerentes à gestão da informação nas fases a jusante do termo da tramitação. Esta situação deve ser igualmente ponderada com vista à sua resolução. Para que a utilização desta solução seja pautada pelo sucesso, é importante que esta implementação seja acompanhada por um conjunto de medidas, entre as quais destacamos: - o seguimento dos serviços produtores de informação e a promoção de ações de sensibilização/formação no sentido de estes compreenderem a importância e a mais valia que poderá resultar da introdução de novos procedimentos e tecnologias; 131 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 132 - a criação do regulamento de Arquivo que determine os procedimentos a seguir para a transferência dos documentos dos setores produtores; - a definição dos critérios e o estabelecimento de uma grelha de seleção, avaliação e eliminação que deve ser desenvolvida em articulação com a UA. Este processo deverá ser devidamente acompanhado. E para o efeito, sugerimos a constituição de uma equipa interdisciplinar que deverá intervir e atuar neste processo com o apoio das chefias (consideramos que podíamos aproveitar o grupo constituído pela Unidade para a Informática, Avaliação, Acreditação e Qualidade (UNIAAQ), grupo interdisciplinar de que fazem parte elementos de formação na área da ciência da Informação, Informática, Direito, Gestão da Qualidade e ainda elementos como, por exemplo, a atual Secretária de Departamento). Uma organização, especialmente de ensino superior, deve ser dotada de determinados serviços fundamentais como são os casos da Biblioteca e do Arquivo. Estas entidades produzem/recebem e tratam informação (recurso ativo e potenciador) que, se devidamente valorizados, contribuirão para a eficácia de todo o Sistema de Informação com altos níveis de competitividade na prossecução dos objetivos da organização. Mais, são alimentadores da própria organização e do respetivo Sistema de Informação. Esta valorização deverá ter subjacente um conjunto de transformações em que sejam ponderadas: - a determinação e preparação de um espaço para o Arquivo (com condições indispensáveis em termos ambientais/materiais); - a aquisição de estantes e de unidades de instalação mais adequadas para a conservação e armazenamento da documentação; - a criação de um espaço para a instalação definitiva da Biblioteca, com todos os meios imprescindíveis ao seu funcionamento; - a contratação de um profissional de informação. Da análise realizada, constatámos a falta de autonomia da Escola relativamente à UA. Há situações concretas em que esta condição provoca perdas de tempo e atrasos de determinados procedimentos. Uma maior autonomia da ESTGA, sem ter que estar dependente da unidade “mãe” em tantos pontos e aspetos, estamos certa, significará uma mais-valia para todas as partes, porque diminui os circuitos e os intervenientes. Esta reclamação de maior autonomia para a ESTGA aumenta a sua responsabilidade para com os seus utilizadores e para com a UA e exige uma definição clara das competências dos vários serviços e dos vários funcionários para que estes sejam responsabilizados pelas suas ações enquanto intervenientes no processo infocomunicacional. Tendo presente os desafios colocados às organizações em plena Sociedade da Informação, esta é um elemento essencial para a solução de problemas da organização, para a formulação das estratégias e para a tomada de decisões. No fundo, deve ser usada para apoiar processos e decisões e melhorar o desempenho organizacional. É aqui que marcamos a nossa posição enquanto adeptos do paradigma científico-informacional que coloca de lado uma prática que vigorou durante séculos, em que a informação tinha um peso essencialmente de memória. Mas não estamos satisfeitos com esta visão e os tempos que vivemos reforçam esta convicção, porque é fundamental transformar a informação em conhecimento, qual fluxo sanguíneo sustentáculo da vida, do crescimento e do desenvolvimento do organismo ESTGA. A informação é resultado de toda a atividade humana e a capacidade do Homem de a produzir e usar, independentemente do seu suporte, tornou possível a sua difusão e a sua continuidade ao longo dos tempos. É isso que queremos que continue a verificar-se na ESTGA, contribuindo para que esta se torne uma instituição de referência no sistema de ensino superior português. BILHIM, João Abreu de Faria - Teoria Organizacional : estrutura e pessoas. Lisboa : Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas, 2005. ISBN 972-8726-62-7. CANAVARRO, José Manuel – A organização : teorias e paradigmas. Aveiro : ISCIA, 1996. ISBN 972-804606-5. CHOO, Chun Wei - Gestão de informação para a organização inteligente : a arte de explorar o meio ambiente. Lisboa : Caminho, 2003. (Das bibliotecas e Informação). ISBN 972-21-1506-5. PORTUGAL. Ministério da Ciência e da Tecnologia. Missão para a Sociedade da Informação - Livro Verde para a Sociedade da Informação em Portugal [Em linha]. Lisboa : Missão para a Sociedade da Informação, 1997. [Consult. 12 Dez. 2005]. Disponível em WWW:<URL:http://www.posc.mctes.pt/documentos/pdf/ LivroVerde.pdf>. MASSON, Sílvia Mendes – Projeto SIMAP – SIMAI : SIMAP – Sistema de Informação Municipal Ativa e Permanente : SIMAI – Sistema de Informação Municipal Ativa de Indaiatuba [Em linha] .[Consult. 12 Dez. 2005]. Disponível em WWW:<URL:http://ler.letras. up.pt/uploads/ficheiros/artigo5641.PDF>. NP 4438-1. 2005 - Informação e documentação : gestão de documentos de arquivo. Caparica : IPQ, 2005. 31 p. PINTO, Maria Manuela Gomes de Azevedo; SILVA, Armando Malheiro da – Um modelo sistémico e integral de gestão de informação nas Organizações [Em linha]. [Consult. 30 Dez 2007]. Disponível em Superior de Tecnologia e Gestão de Águeda ASSIS, Wilson Martins de – Metodologia para construção de produtos de informação nas organizações [Em linha]. Belo Horizonte : UFMG, 2006. [Consult. 12 Dez. 2007]. Disponível em WWW:<URL:http://www. bibliotecadigital.ufmg.br/dspace/bitstream/1843/ VALA-6T7QWL/1/mestrado___wilson_martins_de_assis. pdf>. A Gestão da Informação como ferramenta estratégica de gestão da Escola REFERÊNCIAS 133 WWW:<URL:http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/3085.pdf>. PIRES, António Ramos – Qualidade : Sistemas de gestão da qualidade. Lisboa : Edições Sílabo, 2004. ISBN 9726183332. RIBEIRO, Fernanda – Da arquivística técnica à arquivística científica: a mudança de paradigma. Revista da Faculdade de Letras : Ciências e Técnicas do Património, Porto : Faculdade de Letras da Universidade do Porto. ISSN 1645-4936. I Série, vol. 1 (2002), p. 97-110. RIBEIRO, Fernanda - O perfil profissional do Arquivista na Sociedade da Informação [Em linha]. 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Legislação Decreto-Lei n.º 304/94. D.R. I Série-A. 291 (1994-12-19) 7281. (Criação da ESTGA). Decreto-Lei n.º 180/97. D.R. I Série-A. 169 (1997-07-24) 3735-3736. (Desafeta a ESTGA do Instituto Politécnico de Aveiro e autoriza a UA a integrá-la). Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Despacho (extracto) n.º 25 745/2002. D.R. I Série (2002-12-04). 19962-19963. (Regulamento da ESTGA, regime de instalação). 134 Deliberação n.º 1499/2006. D. R. II Série. 208 (2006-10-27) 23596-23599. (Criação dos Estatutos da ESTGA, da UA). Despacho N.º 52/89. D.R. I Série. 140 (1989-06-21). 2403-10 (Estatutos da Universidade de Aveiro). Despacho normativo nº 51/97. D.R. I Série. 192 (1997-08-21) 4338-39. (Estatutos da Universidade de Aveiro). Capítulo 6 FATORES QUE LEVAM AS ORGANIZAÇÕES A OPTAREM OU NÃO PELA TERCEIRIZAÇÃO DOS SERVIÇOS DE TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO Gislaine Fernandes Rita de Cássia da Silveira Marconcini Bittar Oswaldo Luiz Agostinho Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade A 136 área de Tecnologia da Informação (TI), há algum tempo, deixou de exercer um papel técnico e de suporte às atividades meio, que não gerava qualquer retorno para o negócio. Diante do cenário atual, no qual a velocidade das mudanças e a disponibilidade de informações crescem de forma dinâmica e globalizada, o gerenciamento da informação passou a ser um componente estratégico para se obter vantagens e diferenciais competitivos. Desta forma, as organizações perceberam a necessidade de gerir os negócios de forma que possibilitasse ter eficiência e eficácia no uso da tecnologia, face às áreas do negócio que estão exigindo cada vez mais a diminuição dos tempos de resposta, agilidade e flexibilidade. Neste contexto, a TI passou a ser percebida como ferramenta de alavancagem dos negócios (SANTOS JUNIOR; FREITAS; LUCIANO, 2005; COSTA e ALMEIDA, 2011; AGOSTINHO, 2011). A eficiência no uso da tecnologia está associada ao uso dos recursos e a sua eficácia com a satisfação de metas, objetivos e requisitos (LAURINDO, et al., 2001). O sucesso da gestão da área de Tecnologia da Informação, seu desenvolvimento, instalação e operação de computadores e sistemas de informação, não dependem somente da eficiência dos equipamentos e softwares, obtida pelos analistas e engenheiros de projetos de tecnologia, mas também da eficácia, que compatibiliza os objetivos dos sistemas de informação e do uso dos computadores às necessidades da organização e dos usuários finais (BORGES, et al., 2005). Se antes a tecnologia era usada apenas para automatizar tarefas e eliminar o trabalho humano, aos poucos ela começou a enriquecer todo o processo organizacional, auxiliando a otimização das atividades e a eliminação de barreiras de comunicação. Dessa forma, o conceito usual de Tecnologia da Informação ligado estritamente a aspectos técnicos dá lugar a uma interpretação mais ampla, que leva em consideração aspectos humanos, administrativos e da organização (LAURINDO et al., 2001). Por esta razão, a gestão de TI, antes baseada somente em aspectos tecnicistas (BORGES, et al., 2005), passa a levar em consideração a integração entre as diferentes áreas da organização, o fortalecimento do 1. Gestão de TI A Tecnologia da Informação surgiu em meados de 1960 e foi mudando ao longo do tempo por meio da quebra de barreiras de comunicação entre empregados e consumidores, passando do mainframe para os microcomputadores, se tornando uma importante ferramenta de auxílio à tomada de decisão (ATTARAN, 2004; LOPES e COSTA, 2006). O que se observa atualmente é que, segundo Roberts e Sikes (2008) em pesquisa realizada pela McKinsey, o desempenho da TI ainda está muito aquém do esperado pelos executivos, pois ainda não satisfazem as estratégias de negócio das empresas. Entretanto, em razão das mudanças ocorridas no ambiente corporativo nos últimos anos, a Gestão de TI, que deve ser entendida como o “gerenciamento e o controle sobre a Tecnologia da Informação” (DETLOR, 2010: 105), está alterando seu foco, explorando a TI como uma Fatores que levam as organizações a optarem ou não pela terceirização dos serviços de Tecnologia da Informação relacionamento com os fornecedores e a criação de alianças estratégicas com os clientes (PEREIRA e FRAZÃO, 2009; PIANA e ERDMANN, 2011). Uma vez que a TI tem uma rápida evolução e passou a ser parte integrante do planejamento do negócio, o modelo de sua gestão passa a ser rediscutido. A globalização e a competitividade mudaram o pensamento gerencial, que por sua vez tem procurado se adequar às tendências e solicitações do mercado a fim de satisfazerem um conjunto cada vez mais exigente de requisitos (PEREIRA e FRAZÃO, 2009; FERREIRA e LAURINDO, 2009b). Por este motivo, as organizações passaram a buscar alternativas para seu gerenciamento e a terceirização começou a ganhar espaço no setor de TI (FARIA, 2008), conforme destacado por Saad (2006), como uma ferramenta gerencial que pode trazer benefícios àqueles que demonstrem competências no exercício de sua prática. Os motivos que levam as organizações a optar ou não por esta abordagem são diversos, e o seu sucesso depende de uma série de fatores que devem ser observados pela organização antes mesmo de sua adoção. A revisão bibliográfica sobre este assunto levou a diferenciar as abordagens de como o assunto vem sendo tratado, tendo como base o método de análise de conteúdo (Vergara, 2005). O objetivo deste capítulo é destacar os fatores que conduzem os responsáveis pelo processo decisório dentro das organizações a optarem, ou não, pela terceirização dos serviços de TI, bem como discutir quais seriam os fatores determinantes para que a terceirização seja efetivamente uma prática que favoreça o desenvolvimento da organização. 137 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 138 ferramenta competitiva, plenamente alinhada ao negócio (CRAIG e TINAIKAR, 2006). Segundo Craig et al. (2007), é possível identificar três diferentes focos para a estratégia de TI. Em um primeiro momento, a TI atua simplesmente como fornecedora de serviços, focando basicamente as questões da informação para a empresa, sem um envolvimento direto nos processos de negócio. Em uma outra vertente, que já é adotada por algumas empresas, a TI envolve-se com os interesses do negócio e contribui para a empresa alcançar suas metas. Finalmente, e talvez o próximo estágio para a gestão de TI, esta deve agir como diferenciador competitivo, no qual se projeta além das necessidades dos negócios, considerando tendências tecnológicas e o entorno competitivo para assumir um papel próativo na formulação da estratégia das atividades da empresa. É a partir do alinhamento estratégico da TI com o negócio, e não somente de aplicações específicas, que será possível obter tal vantagem competitiva (LAURINDO e ROTONDARO, 2008). Dessa forma, a área de TI deverá seguir a linha estratégica de negócios da organização, mudando de um setor de suporte para o negócio, para um setor de integração entre o ambiente produtivo da empresa e a maximização da utilização dos recursos operacionais tecnológicos em favor do atendimento da demanda do usuário final. Essa nova vertente também é identificada por Smith e Mckeen (2006), que, a partir de pesquisas realizadas desde 1990, apontam para uma mudança na Gestão da TI, buscando aumentar a sua flexibilidade a fim de obter uma maior adaptação de suas atividades, processos e estrutura aos interesses do negócio. É importante ressaltar, no entanto, que esse novo papel desempenhado pela TI requer uma nova mentalidade do Gestor de TI, também conhecido como CIO (Chief Information Officer), exigindo um conjunto de habilidades e competências que vai além do conhecimento puramente tecnológico, atuando como facilitador para realização das estratégias de negócio (PRAHALAD, 2006). De qualquer forma, para que a TI possa, de fato, servir como diferencial competitivo, é recomendado que as empresas gerenciem os investimentos em TI da mesma forma que gerenciam seus investimentos financeiros, considerando investimentos de baixo, médio e alto riscos (CRAIG e TINAIKAR, 2006). A maior parte dos investimentos em TI deve ser destinada a manter ou melhorar serviços básicos, estritamente necessários para a manutenção dos negócios. Outra parte dos investimentos (que pode variar entre 10~30% do total de investimentos, dependendo da estratégia da empresa) deve ser empregada para ajudar o negócio a reduzir os custos ou aumentar a produtividade em relação aos seus concorrentes, alinhando, portanto, a TI aos interesses do negócio. E, finalmente, uma pequena parte dos investimentos deve ser destinada a uma categoria de alto risco, buscando inovações que possibilitem a abertura de novos mercados ou gerem novos produtos, mais atrativos que os dos concorrentes. O termo terceirização, do inglês outsourcing, se refere ao processo de transferência, para terceiros, de funções que podem ser executadas por outras empresas possibilitando a concentração em tarefas ligadas ao negócio em que atua (STAIR e REYNOLDS, 2006; WEIMER e SEURING, 2008). Desde o século XVIII e XIX, as organizações transferem, de forma parcial ou total, suas atividades para empresas ou pessoas externas à organização. Porém, em meados dos anos 60, com o advento dos computadores e sua utilização comercial, a terceirização das atividades passa a estar presente na forma de compartilhamento dos recursos computacionais e na alocação de mão de obra especializada. Na década de 70, observou-se a terceirização de programadores, em razão do aumento da demanda por sistemas computacionais, assim como pela falta de pessoal especializado na área de programação. Na parte organizacional a integração e o controle de todo o ciclo da produção, deram a TI, um novo papel como supridora das necessidades dos sistemas que surgiam (GROVER et al., 1996; LEE e KIM, 2003; BERGAMASCHI, 2005). Nos anos 80, ocorreram mudanças importantes no pensamento gerencial. Isso porque a produção em massa e em grande escala garantia custos mais baixos e competitivos no mercado, até o momento em que concorrentes externos começaram a colocar produtos de qualidade com menor preço no mercado. Em 1989, por exemplo, a Eastmann Kodak, passou a terceirizar seus mainframes, contratando a ISSC, subsidiária da IBM. Nesse sentido, a terceirização contribuiu para uma redução no custo dos recursos humanos e materiais, além de propiciar uma maior flexibilidade na adequação desses recursos às direções estratégicas das organizações, como por exemplo, nas competências centrais (PRADO e TAKAOKA, 2002; ROUSE, 2009). Saad (2006) denomina esse tipo de uso da terceirização de “Terceirização Operacional”, que possui o foco nas atividades operacionais da organização contratante, no qual são observados impactos positivos sobre seus custos de operação, bem como sobre a qualidade dos serviços de TI utilizados pelos usuários da organização. Nesse caso, as justificativas para o uso da terceirização estão normalmente associadas a problemas específicos enfrentados pela organização contratante, como escassez de recursos financeiros Fatores que levam as organizações a optarem ou não pela terceirização dos serviços de Tecnologia da Informação 2. Terceirização de TI 139 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 140 para efetuar investimentos ou uma reestruturação para promover a redução de seu quadro pessoal. A partir dos anos 90, as organizações mudaram o enfoque de uma tendência a ser auto-suficientes, por meio da integração vertical e do controle sobre todos os recursos, para a integração vertical e horizontal, formando parcerias com outras organizações. Dessa forma, passa-se a falar de uma “Terceirização Estratégica”, na qual a adoção da terceirização tem seu foco sobre os processos de negócio da organização contratante, com benefício sobre os custos e receitas do negócio e sobre a qualidade dos serviços de TI alcançada pelos clientes da organização. Nesse caso, a organização se libera da responsabilidade de gerenciar recursos associados a competências não essenciais para dar maior foco nas competências centrais da empresa, visando criar um diferencial frente aos competidores. O relacionamento entre a organização (cliente) e o provedor de serviços (ou simplesmente provedor) assume características de uma parceria estratégica de médio a longo prazos, onde o provedor é um componente-chave da estrutura do contratante, tornando-se parte integrante da estratégia dos negócios da organização. Diante disso, a terceirização das atividades de TI, seja parcial ou total, dos softwares, hardwares, pessoal e/ou serviços, passou a ser vista como uma decisão estratégica que pode levar a mudanças estruturais, culturais e de procedimentos da empresa (PRADO e TAKAOKA, 2002; SAAD, 2006; OLIVEIRA, 2007; FERREIRA e LAURINDO, 2009b). Finalmente, a partir de 2000, observa-se uma nova mudança no enfoque dado à terceirização. Nesse cenário, denominado de “Terceirização Revolucionária”, os serviços de terceirização são utilizados como agentes de mudança, e podem ser empregados para alterar radicalmente a definição do negócio, abrindo novos mercados, aumentando a base de clientes e criando novos produtos. Nesse caso, tanto provedor como cliente assumem a responsabilidade gerencial conjunta pela entrega dos serviços, baseado, por exemplo, em uma filosofia de compartilhamento de riscos e recompensas entre as organizações (SAAD, 2006). É importante destacar que, além de uma mudança de foco dependendo do tipo de terceirização observada, a evolução observada no enfoque dado para a terceirização também se reflete em um maior valor agregado ao produto. Mesmo assim, apesar dos potenciais benefícios, a terceirização é um processo de mudança. Sua adoção exige, portanto, intenção, cooperação e apoio, e a sua eficiência depende da absorção de todo o potencial e expectativa dos funcionários (SAAD, 2006; OLIVEIRA, 2007; ST. AMANT, 2009). Parte da motivação para a terceirização é justificada pelos possíveis ganhos efetivos que ela pode trazer para a organização, bem como alguns efeitos positivos externos à organização (XAVIER e RODRIGUES FILHO, 2001). Dentre os fatores internos, pode-se citar: •Uma maior agilidade no processo decisório, devido à simplificação da estrutura organizacional por meio do estabelecimento de parcerias. Isso, além de refletir em uma redução dos custos, confere à empresa uma maior flexibilidade econômica e adaptabilidade a mudanças, devido à redução de custos fixos; •Melhoria da administração do tempo da empresa, fazendo com que seja possível focar a atenção naquilo que a empresa faz de melhor (corecompetence); •Objetividade e definição das prioridades em TI, além da elevação do nível de serviços em TI, muitas vezes inatingíveis pela empresa no estágio atual de desenvolvimento. Isso aumenta a flexibilidade técnica da organização, fazendo com que seja mais fácil implantar outros sistemas sem prévio desenvolvimento interno; •Maior objetividade de análise custo e benefício envolvidos em novos projetos de TI; •Maior possibilidade de controle sobre especificações técnicas (prazo, preço, qualidade, volume da produção, etc) devido à visibilidade contratual e financeira que é diretamente relacionada a uma maior previsibilidade de gastos (custo x investimento) em TI. Além das vantagens exclusivas para a empresa que contrata os serviços de terceirização, há indiretamente alguns benefícios externos, como a possível criação de novas empresas, o que se refletiria em uma maior arrecadação fiscal para o governo, além da possibilidade de enxugamento de grandes organizações, principalmente as públicas. Em outro estudo, realizado por Lacity et al. (2009), observou-se que a decisão para terceirização de TI em larga-escala está usualmente ligada a um desempenho financeiro insatisfatório das organizações, sugerindo que a intenção “estratégica” da terceirização é simplesmente reduzir ou controlar os custos. Em outras palavras, a despeito da retórica de usar a terceirização estrategicamente, a redução de custos ainda continua sendo um Fatores que levam as organizações a optarem ou não pela terceirização dos serviços de Tecnologia da Informação 3. Motivação para Terceirização 141 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade fator importante em um grande número de empresas. Mesmo assim, é possível identificar exemplos na literatura nos quais a terceirização foi motivada por outros fatores, como: •Alinhamento dos Sistemas de Informação à estratégia do negócio: talvez a razão mais promissora dentre as demais. Isso porque, devido ao mercado competitivo, globalizado e turbulento, as organizações necessitam, cada vez mais, de informações oportunas e conhecimentos personalizados que auxiliem de forma inteligente a sua gestão. Para tanto, é preciso que seu planejamento empresarial e de Tecnologia da Informação (TI) sejam coerentes e estejam integrados, e as respectivas estratégias plenamente alinhadas entre si. •Foco em competências centrais: a empresa pretende focar suas atenções apenas nas competências centrais, dedicando-se integralmente à atividade principal do negócio; •Necessidade de especialistas: a organização necessita especificamente de algum conhecimento/expertise da empresa provedora de serviços. •Melhora do desempenho do negócio: a organização busca parcerias para contribuir com o desempenho do negócio, processos ou capacidades. •Razões técnicas: a organização necessita de alguma tecnologia de ponta, somente acessível por meio da terceirização. 142 4. Fatores Determinantes na Terceirização Conforme ressalta Saad (2006: 10), “o relacionamento contratante-provedor se caracteriza por ter alto valor agregado, ser permanente e de longa duração”. Os provedores vendem o conceito de terceirização como uma parceria e o valor por eles agregado vem do fato de que necessitam entender os negócios dos clientes (seus fatores críticos e suas prioridades), assim como satisfazer seus requisitos e antecipar as futuras necessidades das empresas. Desse modo, as decisões relacionadas à terceirização acarretam fortes impactos sobre os negócios da organização. Por esse motivo, é importante que as organizações tenham antes um plano estratégico que descreva a missão, a visão, as competências centrais e os fatores chaves de sucesso. Para se tomar uma decisão segura com relação à terceirização de uma função é necessário, antes de tudo, conhecer o estado atual da empresa, identificando as competências e habilidades atuais. A partir disso, é possível identificar, quais são as áreas potencialmente terceirizáveis, e assim avaliar o alinhamento estratégico entre os diversos setores do negócio, Quadro 1- Características vitais para implementação de projetos eficazes de terceirização Fatores que levam as organizações a optarem ou não pela terceirização dos serviços de Tecnologia da Informação especialmente os setores que são identificados como terceirizáveis (OLIVEIRA, 2007). De maneira resumida, Saad (2006) destaca que a análise a ser realizada para apoiar a decisão de se terceirizar ou não determinado setor da empresa deve englobar diferentes questões, das quais pode-se destacar: •Quais são os objetivos de negócio e, alinhados a ele, os objetivos de TI? •Qual o desempenho interno por meio de benchmarking comparando com seus pares? •Qual o nível profissional de sua equipe e dos perfis necessários? •Qual a capacidade dos provedores existentes no mercado? •Além disso, é preciso observar outros pontos relevantes, a fim de facilitar o alinhamento da área de negócios à de TI, como: •Fomentar o diálogo entre a área de TI e as áreas de negócio da organização. •Realizar medições detalhadas acerca dos custos e dos níveis de desempenho. •Realizar levantamentos sobre as tendências do mercado de terceirização e de sua aplicabilidade ao setor em que atua a organização (SAAD, 2006). É interessante notar que organizações bem sucedidas no processo de terceirização normalmente apresentam características semelhantes às descritas no Quadro 1, que define um conjunto de pré-requisitos a serem estabelecidos pelas organizações que pretendem obter bons resultados com a terceirização. 143 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 144 Fonte: SAAD, 2006, p. 23 5. Riscos da Terceirização das Atividades de TI A terceirização das atividades de TI causa impactos no valor de mercado das empresas (WILLCOCKS, 2010). E, caso não seja realizada de forma satisfatória, a gestão de um Fatores que levam as organizações a optarem ou não pela terceirização dos serviços de Tecnologia da Informação provedor externo poderá trazer riscos à organização, tais como: a) perda de competências centrais, caso a organização não compartilhe com o provedor externo sua visão de quais são as competências centrais e não centrais; b) permitir que o provedor externo utilize o relacionamento apenas para obter benefícios para si; c) levar a uma dependência do provedor externo que resulte em perda de flexibilidade estratégica e de agilidade operacional da organização (SAAD, 2006). Cabe ressaltar que iniciar a terceirização das atividades de TI acreditando ser uma função utilitária é diferente de entender que a terceirização tem um papel estratégico e de valor agregado para a organização. Dessa forma, uma vez decidido o que terceirizar, é importante considerar os riscos dessa decisão (FERREIRA, 2005). Diferentes trabalhos na literatura lidam especificamente com essa questão, e pode-se destacar (LACITY e HIRSCHHEIM, 1993; FERREIRA, 2008; LACITY et al., 2009;): •A contratação de serviços terceirizados pode gerar insatisfação do “staff” de TI interno a organização. •Uma vez que parte dos serviços não está sendo mais desenvolvido e executado na empresa, há o risco de dela não ser capaz de reter as capacidades e habilidades. •Dificuldades na realização de acordos para a adaptação rápida com relação às mudanças tanto do negócio como da tecnologia, o que pode limitar o desenvolvimento de novas tecnologias. •Expectativas de qualidade de serviço e resposta rápida não são atendidas adequadamente, fato que também pode estar relacionado a diferenças culturais entre cliente e provedor (principalmente observado em terceirização “offshore”). •Corte de gastos inexpressivos ou custos de transação excessivos. •Quebra de contrato por parte do provedor, que pode estar ligada a uma baixa capacidade, qualidade, estabilidade financeira do provedor, ou mesmo a problemas com funcionários. •Dificuldade em se gerenciar grupos remotos e garantir a segurança/ privacidade. •Provedor possui muito poder sobre o cliente, acarretando uma perda de autonomia e controle sobre decisões de TI por parte da empresa contratante. Outros autores, como Ferreira e Laurindo (2009a), ainda mencionam que os riscos da terceirização têm uma relação direta com os outros aspectos, como, por exemplo, os 145 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 146 custos ocultos que estão diretamente relacionados aos riscos de falhas. Da mesma forma, a perda de informações de privacidade e de segurança, assim como a perda de experiência técnica de TI, também se relaciona com as questões estratégicas. Embora não seja possível antever os resultados da terceirização frente a uma lista extensa de possíveis condições adversas, é possível gerenciar os riscos associados a tal decisão. O gerenciamento dos riscos, nesse caso, pode ser entendido como um “conjunto de atividades que visam identificar, avaliar e controlar, eventos de risco que possam dificultar ou impedir o alcance de um resultado desejado” (SAAD, 2006: 179). Mesmo tendo essa precaução, conforme ressalta Tho (2005), o gerenciamento dos riscos na terceirização de TI é uma combinação da arte de gerenciar e a ciência de calcular eventos indefinidos. Ainda assim, é possível encontrar na literatura uma ampla gama de trabalhos explicitando práticas para a redução do risco, que são normalmente definidas especificamente para cada risco considerado. De qualquer forma, embora a lista de possíveis riscos e práticas para a redução dos mesmos seja extensa e até mesmo intimidadora, Lacity et al. (2009) argumenta que a melhor forma de mitigar os riscos é por meio da experiência, pois não há substituto para o conhecimento tácito adquirido através dela. Muitas vezes, executivos optam por realizar parcerias piloto, com o intuito de obter maiores informações sobre as novas opções de terceirização. Porém, cabe ressaltar que se o teste for reduzido, as capacidades dos provedores podem ser totalmente avaliadas, e os benefícios esperados podem não ser concretizados. Há, portanto, um compromisso entre a mitigação de riscos e a obtenção de benefícios substanciais com a terceirização. Discussão Conforme apresentado anteriormente, a terceirização de TI pode trazer benefícios à organização e, até mesmo, de uma maneira global, para o mercado. Dentre as vantagens que podem ser obtidas pela empresa tem-se a redução dos custos, que por muito tempo foi considerada a principal vantagem, além de uma maior disponibilidade para se dedicar às suas core-competences, um dos fatores preponderantes no processo de inovação das empresas. Embora a análise a ser realizada a fim de balizar a decisão pela terceirização ou não dos serviços seja elaborada, com base nos dados apresentados é possível construir uma tabela (apresentada no Quadro 2) resumindo alguns prós e contras ligados a essa decisão. Fonte: Adaptado de XAVIER e RODRIGUES FILHO, 2001; FERREIRA, 2008; LACITY et al., 2009 As vantagens e desvantagens deverão ser avaliadas caso a caso, de acordo com a estrutura das empresas contratada e contratante. Mesmo assim, o sucesso ou o fracasso na terceirização das atividades de TI, além de estar associado à capacidade da organização contratante conduzir de forma eficaz a decisão acerca de quais funções deve ser ou não terceirizadas, depende também do gerenciamento dos riscos inerentes ao processo (SAAD, 2006). Do ponto de vista da estratégia, a construção de alianças entre cliente e fornecedor é importante no processo de terceirização e pode trazer benefícios como: a utilização das inovações dos clientes e de suas competências profissionais, diminuição dos riscos, possibilidade de mudanças rápidas no mercado e no cenário tecnológico, além do atendimento imediato às necessidades dos clientes. No entanto, a escolha da terceirização implica, necessariamente, em mudanças no estilo de gestão da função de TI. Antes da terceirização, as pessoas envolvidas na operação têm habilidades técnicas para garantir a Fatores que levam as organizações a optarem ou não pela terceirização dos serviços de Tecnologia da Informação Quadro 2 – Vantagens e Desvantagens da terceirização de TI 147 operação do serviço. Mas após a terceirização, a habilidade técnica das pessoas se altera: de técnica para administrativa (FERREIRA e LAURINDO, 2009b). Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Considerações Finais 148 A partir do objetivo estabelecido para este estudo, foi realizada a análise descritiva sobre o papel que a terceirização de TI tem desempenhado nas organizações. É apontada como ferramenta de gestão, e deve ser encarada não só pelo seu aspecto econômicofinanceiro, mas também como solução que possibilita o aumento da competitividade organizacional, o desenvolvimento de parcerias e a evolução tecnológica. Um dos maiores desafios para o sucesso organizacional e o da terceirização como estratégia, buscando maior adaptabilidade e sintonia entre os participantes da cadeia produtiva com a característica da organização, respeitando o estilo, as crenças e os valores de cada um. A linguagem que predomina nas organizações é a da mudança contínua e do aperfeiçoamento constante. Além das organizações estarem mais enxutas, a antiga forma de estrutura organizacional centrada em áreas funcionais cede lugar à gestão por processos, que passou a privilegiar a integração e a orientar a consecução dos objetivos e fins almejados. Muda-se radicalmente a forma de se relacionar e de ser das pessoas e das organizações. Por isso, é importante que o Gestor tenha uma visão holística, tanto para entender o processo de competição no qual está inserido e agir no sentido de tornar o negócio mais produtivo quanto para compreender as estruturas formais e funcionais. É preciso rever práticas com objetivo de tornar a gestão mais próxima das necessidades dos negócios. Antes de a organização decidir terceirizar os serviços de TI, é de grande relevância que seja feita análise detalhada das vantagens e desvantagens da terceirização, mas também da sua capacidade de desenvolvimento interno das atividades de TI. Uma das preocupações das organizações é a transferência do gerenciamento das atividades críticas a terceiros, que pode colocar em risco o controle dos processos e as informações consideradas competitivas para o negócio. Não há um processo preciso para terceirização, pois as adaptações são necessárias e ocorrem ao longo do tempo em razão do dinamismo da política econômica e do avanço da tecnologia. 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A capacidade de valorizar colectivamente os bens locais e de manter os motores de crescimento, coloca novos desafios à competitividade das regiões (Figueiredo et al., 2009). Na globalização da economia, o Território é geralmente formado por uma rede de lugares ou por uma rede de empresas (Chesnais, 1996). Deste modo, governar a sustentabilidade de um território, implica mudar a programação de apoios de uma escala local e ao nível das organizações/entidades, para uma escala regional (Potts, 2010). Uma política desta natureza implica o estabelecimento de relacionamentos entre empresas, universidades, autoridades municipais e grupos de cidadãos, actuantes numa escala e enfoque regional (Burstrom and Korhonen, 2001). Esta perspectiva requer uma mobilização social determinada, bem como uma eficiente coordenação institucional (Berger, 2004). Neste contexto, tem sido possível testemunhar uma viragem nas políticas adoptadas, destacando-se o trabalho em rede, enquanto novo paradigma de medidas a implementar e como pressuposto para o desenvolvimento regional. Através da constituição de redes estratégicas, no âmbito de determinados territórios, é possível melhorar as condições para o desenvolvimento de negócios (Lundberg, 2010). Neste particular, Figueiredo et al. (2009) destacam a adopção de estratégias de eficiência colectiva. Estas estratégias são, segundo os mesmos autores, a ilustração de dois tipos de ajustamentos de perspectiva na política regional: (1) trata-se de assumir que a coesão se promove através da promoção da competitividade, o que significa passar da lógica assistencialista a uma visão de política que pretende impulsionar as regiões a formarem as suas próprias capacidades de competir no mercado assegurando actividades economicamente sustentáveis; e (2) trata-se de assumir O restante paper está estruturado como se segue. Começa-se por fazer um breve enquadramento teórico sobre competitividade territorial e redes de cooperação. Seguidamente apresentam-se os procedimentos metodológicos adoptados no presente estudo e, posteriormente apresentam-se os resultados e análise do estudo de caso. Finalmente, apresenta-se a discussão dos resultados e as conclusões. Redes de Cooperação como um mecanismo para reforço da competitividade territorial: o caso da Associação Qualifica o princípio de que a competitividade não radica apenas nas instituições individuais, mas também no conjunto, ou seja, a competitividade territorial assente na eficiência do todo, que é mais do que a soma das partes. Enquanto os académicos têm vindo a estudar as estruturas de redes interorganizações, os políticos e gestores territoriais têm mostrado preocupação crescente com o papel das infra-estruturas institucionais no incremento destas redes, bem como na facilitação do seu funcionamento, como instrumentos de estímulo ao desenvolvimento económico (Huggins, 2001). No entanto, é verificável e patente uma falta de estudos nesta área - que emerge da crescente aplicabilidade do conceito de rede a uma diversidade crescente de actividades - entre o discurso académico sobre redes inter-organizacionais e a perspectiva dos gestores enquanto membros de redes de organizações (Huggins, 2001). Para além disso e sendo o desenvolvimento de redes regionais um facto, não tem sido possível identificar modelos claros, caracterizadores e descritivos, antes crenças e opiniões generalizadas (Lundberg, 2010). Nestas circunstâncias, dada a importância das redes de cooperação na competitividade dos territórios, o presente estudo pretende ser mais um contributo para este particular. Mais precisamente, o objectivo deste estudo passa por aferir e identificar, a partir de um caso concreto, a estrutura de relacionamentos de uma rede inter-organizacional e o seu papel no reforço da competitividade dos territórios. Para este efeito, foi seleccionada uma rede de parceiros designada por a “Associação Qualifica”. Em função deste desiderato, foram estabelecidas duas questões de investigação: 1) Será que a estrutura de relacionamentos e respectivas resultantes traduz uma efectiva colaboração e cooperação entre actores?; 2) Será que a estrutura de relacionamentos existente na rede constitui um instrumento importante para o reforço da capacidade competitiva dos territórios? 153 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 1. Competitividade e Competitividade Territorial 154 O termo competitividade assenta na articulação de um conjunto de instituições, políticas e factores que determinam o nível de produtividade de um território. Este estabelece o nível de sustentabilidade da prosperidade que pode ser conquistada por uma economia, ou seja, economias mais competitivas tendem a possibilitar níveis elevados de rendimentos aos seus cidadãos (Schwab et al., 2009). Esta perspectiva significará um melhor nível salarial e atractivos retornos de investimento. A prosperidade é determinada pela produtividade de uma economia, que por sua vez é medida pelo valor dos bens e serviços produzidos num espaço territorial, em função dos seus recursos humanos, naturais e em capital. Assim, a competitividade será medida pela produtividade (Porter et al., 2008, p.43). Existem de facto ligações fundamentais entre o conceito de competitividade territorial e o mais tradicionalmente considerado conceito de desenvolvimento económico, particularmente, quando se analisa o desenvolvimento económico centrado no crescimento económico. Esta visão implica uma estreita relação entre uma análise focada na produtividade e a competitividade territorial (Wilson, 2008). Por outro lado, a capacidade competitiva de um território e a consequente alavancagem da sua produtividade são consequência: (1) do desempenho produtivo ao nível de bens e serviços característicos de um território; (2) do envolvimento da comunidade empresarial local, o que depende de uma boa estratégia de governança ao fomentar a articulação de dinâmicas públicas e privadas, bem como a criação de um ambiente favorável à iniciativa empresarial. A vantagem competitiva de um território consiste na qualidade do ambiente que proporciona para a obtenção de níveis elevados de crescimento da produtividade. Desta forma, Porter (1998) estabelece os princípios que considera fundamentais para o aumento da competitividade territorial (constituindo, no seu conjunto e de forma interdependente, a fonte de vantagem competitiva desse território) e, consequentemente, para melhoria dos índices de produtividade, determinantes da qualidade de vida no território e vem realçando o papel da criação de redes de cooperação como importante fonte vantagem competitiva das regiões e empresas (Porter, 1998). Mateus (2005) propõe um modelo que permite medir os contributos de diferentes factores para o nível de competitividade territorial, articulando condições e nível de competitividade e que denominou “Pirâmide da Competitividade Territorial”, onde o território constitui um factor determinante. Redes de Cooperação como um mecanismo para reforço da competitividade territorial: o caso da Associação Qualifica Este último investigador considera como basilares, os seguintes domínios da competitividade territorial: (a) a especialização das actividades económicas e as dinâmicas empresariais; (b) as infra-estruturas de suporte; (c) o potencial humano; (d) as redes institucionais e de governança; e (e) a articulação entre a inovação e a qualidade ambiental. Estas dimensões podem-se materializar em condições de competitividade, já que embora inter-relacionadas, podem ser aglutinadas em duas ordens diferenciadas de condições, considerando o seu contributo subsequente para o nível de competitividade do território. Se, por um lado, a ênfase é colocada na dimensão das “pessoas“ e na sua “utilização”, ou seja, o nível de utilização dos recursos humanos (demografia, mercado de trabalho, qualificações - aferidos em função da actividade da população e empregabilidade) , por outro, realça-se a componente mais dinâmica de utilização dos factores por parte das “pessoas” , ou seja, o nível de produtividade (inovação, dinâmica empresarial, infraestruturas de suporte - aferidos em função da capacidade organizativa e de iniciativa, bem como do progresso tecnológico). Isto significa que não basta produzir com eficiência, mas também é importante a capacidade de criar emprego que mobilize os recursos humanos disponíveis (Ferreira et al., 2008). Existindo um sistema territorial de produção, torna-se evidente, que a sua competitividade dependerá de dois grupos de factores, os recursos materiais (infraestruturas, matérias-primas, qualificação do trabalho e a disponibilidade de capital) e imateriais (conhecimentos, competências, capital relacional e de cooperação), que quando combinados traduzem os recursos específicos de um território, reflectindo a autonomia e o modo como o sistema territorial orienta a sua política de desenvolvimento e, consequentemente, a sua competitividade (Maillat, 2003). Considerando que o emprego, a produtividade e o nível de vida são interdependentes, quando a produtividade e o emprego aumentam simultaneamente, existem condições para se conseguir um crescimento significativo e sustentado de uma dada economia (Mateus, 2005) e, assim, melhorar a sua competitividade, ou seja, o nível de vida num dado território. As perspectivas apresentadas – os contributos de Porter (1998, 2004) e de Mateus (2005) – permitem identificar dois pilares fundamentais onde assenta a competitividade dos territórios. Por um lado, os recursos, os activos tangíveis e intangíveis de dado espaço territorial. Por outro, as pessoas, bem como a forma como se organizam, interagem e se relacionam na exploração e aproveitamento daqueles recursos. De realçar a importância das comunidades locais e os seus actores (pessoas e/ou redes organizacionais de carácter formal ou informal) que, de forma integrada, definem 155 e procuram uma estratégia de desenvolvimento, perseguindo de uma forma partilhada soluções para os seus problemas, ao identificar, valorizar e aproveitar a suas potencialidades e riquezas, construindo estratégias competitivas capazes de permitir a sua inserção num mercado volátil e integrado (Cox, 1997). Assim, as estratégias competitivas de dado espaço territorial devem ter em conta os seus aspectos particulares e os seus activos territoriais (Dyer, 1996). Relativamente à competitividade territorial e ao desenvolvimento regional, Diniz e Gerry (2005) realçam dois paradigmas em que assentam as correntes teóricas que marcam a política regional e, por consequência, o desenvolvimento regional. Um de base exógena – contemplando as correntes neoclássica e Keynesiana – outro de base endógena, territorialista, também designado por teoria do desenvolvimento endógeno. Estas duas abordagens, uma mais voltada para explicações de foro economicista e por via de vantagens comparativas regionais e a outra situando o centro da decisão na própria região e na proximidade com os actores locais (recurso ao capital social) colocam a tónica na valorização dos recursos de cada território e na sua exploração racional e sustentável (Dinis, 2006) tendo-se afirmado a partir da década de 80 do Séc. XX (Alberto, 2008). Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 2. Redes de Cooperação 156 As redes são constituídas por um conjunto de actores - pessoas, serviços, empresas/ organizações e países - interagindo e mantendo relações estruturais – familiares, sociais, comunicativas, financeiras, estratégica e de natureza comercial (Iacoucci, 1996). As redes contemporâneas representam uma nova era na evolução progressiva da sociedade, reflectindo a experiência quotidiana da condição humana (Thorne, 2009). Caracterizadas pelo conjunto de influências que decorre do funcionamento de dado sistema, num determinado espaço, em função de dado processo dinâmico de acumulação de experiências e aprendizagem (Imai, 1989), as redes são consideradas uma importante forma de criar oportunidades e transferir conhecimento. A formação de extensas redes de relacionamentos possibilita, directa ou indirectamente, ter uma maior percepção do meio envolvente (Franco, 2006). As redes são constituídas por um conjunto de organizações/ empresas que se encontram conectadas através de qualquer forma de interacção sustentável e que apresenta um determinado grau de comunalidade. As redes pressupõem a existência de duas ou mais organizações a trabalhar em conjunto para resolver problemas comuns durante um dado período de interacção que seja sustentável (Huggins, 2001). A existência Redes de Cooperação como um mecanismo para reforço da competitividade territorial: o caso da Associação Qualifica de uma rede pressupõe o estabelecimento de contactos e relacionamentos entre actores, organizações, sendo factual que as empresas de sucesso são aquelas que criam e mantêm relacionamentos (Rutten and Boekema, 2007). Uma das virtudes das redes de cooperação é a capacidade universal em espelhar a realidade, mostrando a sua complexidade, contexto e dinamismo (Gummeson, 2006), pelo que tem sido objectivo dos investigadores entender a estrutura dos seus relacionamentos, os seus processos de interacção, a sua dimensão, os seus comportamentos, influência e capacidades (Iacobucci, 1996; Coviello, 2005). As organizações operam num contexto relacional, num ambiente de interconectividade, pelo que a sua sobrevivência e desempenho dependem de ligações e relações críticas com outras organizações (Oliver, 1990). Segundo Granovetter (1992), os parceiros ou actores não se comportam ou decidem fora de dado contexto social, estando as suas atitudes enraizadas num concreto sistema de relações sociais em andamento. Este autor defende ainda que a sociedade não consegue funcionar sem os homens colaborarem em função de objectivos que se traduzam em benefícios mútuos. Ibarra (1992) distingue entre redes formais e informais, em função do grau de rigor e oficialidade dos acordos e contratos estabelecidos entre os parceiros constituintes da rede. Rosenfeld (1996) identifica as redes ”hard” - de âmbito mais formal, envolvendo empresas que se agregam para co-produzir, co-comercializar, co-comprar e co-operar no desenvolvimento de produtos e de mercados – e as redes “soft”, mais informais – que se aproximam para superar problemas comuns, partilhar informação ou adquiri novas competências. A conectividade económica entre parceiros ocorre num contexto de interacções sociais e de redes sociais (Granovetter, 1985), pelo que é importante não desprezar o contributo de aspectos sociais, muitas vezes contingencais, na mudança da lógica económica (Hakansson e Prenkert, 2004). A teoria da rede social enfatiza processos e contextos sociais, de modo a entender comportamentos individuais (Chae et al., 2005). Esta abordagem orbita em torno de duas perspectivas. Uma assente na identificação de laços fortes e fracos entre os actores de dada rede (Granovetter, 1973) – onde a intensidade da força dos laços depende da combinação de diversos factores como a quantidade de tempo investido, o nível emocional colocado, a intimidade conquistada e o tipo de reciprocidade manifestada e que caracterizam os laços existentes – outra, que investigando a significância dos relacionamentos, enquanto recurso para a acção social (Nahapiet and Ghoshal, 1998), realça a importância do capital social, conquistado e manifestado pelos membros de dada 157 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 158 rede social. Existem estudos que apontam para a existência de uma relação positiva entre a acumulação de capital social e os desempenhos dos membros da rede social (Edelman et al., 2002). Coleman (1988) considera que as redes, independentemente da sua densidade, são fundamentais na criação deste capital social, pois constituem estruturas facilitadoras e estimuladoras de confiança entre os diversos actores envolvidos na rede. Segundo Ford e Hankansson (2005), as interacções no âmbito dos negócios e das empresas devem ser estudadas sob o paradigma das redes. De facto, as relações resultantes daquelas interacções não podem ser entendidas na perspectiva individual de cada empresa ou organização. Estas redes reconhecem que cada actor, cada componente, é heterogéneo relativamente aos seus próprios recursos, necessidades e objectivos, não sendo o fluxo desses recursos linear ou controlado por apenas um dos actores envolvidos (Akaka, 2007). Assim, a cooperação entre empresas permite-lhes, em domínios diversos, reforçar ou complementar recursos limitados, não pondo em risco a sua individualidade (Franco, 2005, 2011), constituir a disponibilidade de activos regionais um factor decisivo na efectividade de uma rede de cooperação (Rutten and Boekema, 2007). Deste modo, o espaço e o território constituem factores impulsionadores do estabelecimento de redes. De uma forma generalista e abrangente, Doz et al. (2000) identificam dois tipos de situações podem levar ao aparecimento das condições iniciais para o estabelecimento de redes de cooperação: (a) a combinação de mudanças no ambiente externo com a ocorrência de pontos de vista e interesses similares entre organizações e/ou grupos de organizações; e (b) o emergir de entidades fomentadoras do espírito colaborativo para o aproveitamento de oportunidades ou para a resolução de determinados problemas Oliver (1990), após vasta revisão de literatura, particularizando e agregando em determinantes, aponta seis razões para a ocorrência de comportamentos interactivos entre actores, e que, de alguma forma, abrange e congrega perspectivas organizacionais, sistémicas e contingenciais sobre redes, ao nível das organizações/actores (Quadro 1). Quadro 1 – Determinantes no estabelecimento de redes Ainda para Oliver (1990), embora estes determinantes possam individualmente motivar relacionamentos, eles podem actuar em simultâneo e assim o estabelecimento de relações entre actores é baseado em múltiplas contingências. Em suma, o estabelecimento de relacionamentos colaborativos entre entidades, de redes de cooperação, representa uma forma de parceria estratégica, apresentando um denominador comum: a união de uma ou mais organizações, agregando valor de forma sinérgica (Crotts et al., 2000). Como constatou Axelrod (1984), quando existe, da parte de parceiros ou potenciais parceiros, a percepção de que os relacionamentos serão de longo prazo e não fruto de aspectos conjunturais, as probabilidades de cooperação e de não deserção são substancialmente maiores. 3. Tipo de Estudo e Selecção do Caso Neste estudo adoptou-se a abordagem qualitativa (Cheuk et al., 2010; Holanda, 2006) e dentro desta a estratégia do estudo de caso. Seleccionou-se um estudo de caso único (Yin, 2010), por força da tentativa de entender um fenómeno – mapear a existência de pistas que evidenciem o contributo de dada rede de cooperação como um mecanismo para o reforço da competitividade territorial – atendendo a um contexto particular e eventualmente contingencial: os produtos e as produções materiais e imateriais tradicionais Redes de Cooperação como um mecanismo para reforço da competitividade territorial: o caso da Associação Qualifica Fonte: Oliver, 1990 159 como um activo territorial, distintivo e diferenciador. Deste modo, a unidade de análise foi uma associação sem fins lucrativos: “A Associação Qualifica”, sediada numa região do Centro de Portugal: Portalegre. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 3.1. Recolha da Informação 160 Após as questões de partida estarem formuladas, é fundamental definir quais os dados relevantes, os que devem ser recolhidos e como analisar (Philliber et al, 1980). Assim, as fontes de evidência, seguindo o roteiro proposto por Barañano (2008), foram de origem primária, mediante a realização de uma entrevista à Secretária Geral da Associação/ Rede seleccionada e, de uma origem secundária, através da observação e interpretação de formatos existentes de informação e comunicação desenvolvidos pela organização (sítio na internet, os estatutos constitutivos da entidade e um documento que enquadra a constituição da entidade). A entrevista baseou-se numa conversa guiada e as questões abordadas revestiram-se da necessária fluidez (Rubin e Rubin , 1995), embora seguindo uma linha de investigação pré-determinada, ou seja, na procura de indícios sobre a estrutura de relacionamentos e suas resultantes. Seguindo a proposta de Yin (2010), foram adoptados três princípios de recolha de dados, a) o uso de múltiplas fonte de evidência, b) a criação de modelos de registo e sistematização da informação recolhida – as tabelas, de forma a facilitar, e c) o encadear de evidências. 3.2. Análise e Interpretação da Informação A análise dos dados recolhidos, mediante a sua triangulação, já que houve mais do que uma fonte de evidências (Patton, 2002), foi realizada à luz da articulação entre as evidências mapeadas a partir do trabalho de campo e a revisão da literatura efectuada, fundamentando descrições, propostas de explicação e a construção de um quadro conclusivo final. Por outro lado, a informação obtida (análise de documentos e entrevistas) foi encadeada, permitindo melhorar o seu índice de confiabilidade (Yin, 2010). A informação foi sistematizada em tabelas criadas de modo a permitir um efeito tendencialmente comprobatório relativamente à consistência da informação e do seu contributo para as questões de investigação formuladas. 4.1. Caracterização da Qualifica Composta por 65 membros ou associados, a Associação Nacional de Municípios e de Produtores para a Valorização e Qualificação dos Produtos Tradicionais Portugueses – QUALIFICA, é uma associação sem fins lucrativos com sede em Portalegre, tendo por missão e objectivo principais: “a valorização, qualificação, defesa, promoção e dignificação da identidade dos produtos tradicionais portugueses e subsidiariamente, dos seus produtores e território” (Estatutos da Qualifica, 2008, p. 2). Desta forma e mediante a definição de critérios concretos, um conjunto diverso de actividades e/ou seus resultados são objecto de qualificação, por forma a garantir a sua valorização e promoção junto do mercado, obtendo assim os associados o reconhecimento da qualidade das suas e seus actividades/produtos e/ou do seu território. Assim, tratandose de uma associação de dimensão nacional, o seu impacto é local/regional mediante a valorização de recursos endógenos, emblemáticos e idiossincráticos de um território. Numa lógica de funcionamento integrado, a Associação é composta por parceiros com diferentes características, não podendo ser considerada uma associação sectorial ou representativa de classes ou de interesses corporativos. Nesta Associação (caso) existem 3 tipos de associados: a) Membros Efectivos – Agrupamentos de Produtores (gestores de DOP – Denominação de Origem Protegida ou de IGP – Indicação Geográfica Protegida, ou em processo de protecção, Agrupamentos de Produtores de Especialidades Tradicionais Garantidas (ETG), ou em processo de protecção; Agrupamentos de Produtores em Modo de Produção Biológico ou em Produção Integrada, já reconhecidos ou em vias de reconhecimento; Agrupamentos de Produtores utilizadores das menções e qualificativos tutelados pela Qualifica ou em processo de utilização) e Câmaras Municipais; b) Membros Aderentes - Entidades públicas ou privadas, nacionais, Redes de Cooperação como um mecanismo para reforço da competitividade territorial: o caso da Associação Qualifica 4. Estudo de Caso: Uma Rede/Parceria para a Qualificação dos Produtos Tradicionais 161 regionais ou locais de cariz sócio-cultural, económico ou profissional que se identifiquem com os objectivos da Qualifica; c) Membros Beneficiários - Produtores, preparadores, comerciantes, industriais de restauração, etc.) utilizadores ou em vias de utilização das menções e qualificativos tutelados pela Qualifica, apenas enquanto não exista um Agrupamento que os represente. A figura seguinte resume o âmbito da qualificação levada a cabo pela Associação Qualifica. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Figura 1 – Âmbito de Qualificação 162 Fonte : Adaptado de www.qualifica.pt (consultado a 13/06/2011) A origem geográfica dos diversos associados não constitui uma exigência estatutária (a não ser a sediação em território nacional) não conferindo, portanto, à organização uma dimensão regional. A figura 2 resume o trabalho que desenvolve esta Associação Figura 2 – Vectores fundamentais das Actividades da Qualifica Fonte : Documento de Constituição da Associação Qualifica Este estudo de caso foi baseado na análise de três documentos, de modo a melhor se preparar a entrevista realizada junto da secretária geral da Qualifica. As tabelas 1 e 2 estão organizadas de forma a destacar aspectos mapeados nos documentos (ver Tabela 1) e na entrevista (ver Tabela 2), de modo a referenciar tipologias, orientações e motivações de e para a rede de cooperação. Tabela 1 – Recolha de Dados - Fonte de Evidência Redes de Cooperação como um mecanismo para reforço da competitividade territorial: o caso da Associação Qualifica 4.2. Resultados 163 Fonte: Qualifica Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Tabela 2 – Recolha de Dados - Fonte de Evidência – Entrevista 164 A entrevista realizada, junto do informante-chave desta Associação, permitiu despistar evidências meramente intencionais vertidas em documentos cujos textos traduzem uma ambição determinada e importante. Em função da auscultação da Secretária Geral, tentouse perceber a concretização de tais objectivos, através de que formas de cooperação e qual a sua intensidade. A partir das evidências que foram sendo recolhidas, foi possível agregá-las em torno de resultantes da estrutura e do funcionamento – em função de linhas de orientação da Associação – e enquadrar estas resultantes nas abordagens que foram realizadas sobre os relacionamentos – Motivações – Orientações – Intensidade - Tipologia. Nestas circunstâncias, resulta claro que existe uma cooperação evidente entre actores, que embora esteja sujeita às formalidades previstas na legislação, ocorre com um grau substancial de informalidade, atendendo a algumas interacções que ocorrem ao nível da transferência de conhecimento, comunicação e informação (o caso da identificação de novos produtos e formas de produzir e comercializar) e que traduzem uma orientação horizontal de relacionamento, no caso dos produtores. A própria disseminação de experiências pode ocorrer formal (cursos de formação) ou informalmente (promovendo contactos, muitos deles em ambiente de clara descontracção, outros propondo a consulta de manuais). Desta forma, inicia-se um percurso de fortalecimento dos laços intra-rede, que permite conquistar e construir o capital social. Envolvidos na rede, os associados/parceiros ganham estabilidade e legitimidade, pois passam a dispor de uma nova respeitabilidade e quadro de garantias que lhes é dado pelos projectos desenvolvidos, dos quais fazem parte integrante. A centralidade das autarquias e o papel da estrutura Qualifica conferem uma orientação vertical à cooperação, permitindo aos restantes associados ganhos ao nível das Redes de Cooperação como um mecanismo para reforço da competitividade territorial: o caso da Associação Qualifica Fonte: Qualifica 165 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 166 restantes resultantes, como seja a aprendizagem, a certificação de produtos e criação de marcas, a disponibilização de estruturas, equipamentos e recursos humanos e técnicos – que permitem o aumento da eficiência - para projectos relacionados com a cadeia de valor dos activos tangíveis e intangíveis tradicionais e regionais, específicos e distintivos de dados territórios. Este facto reflecte numa maior capacidade dos associados produtores em conquistar novos mercados, ganhando escala. A reciprocidade é evidente. Se há ganhos associados aos produtores (já referenciados), as autarquias beneficiam da visibilidade e da notoriedade que o seu território recolhe, bem como das novas oportunidades de negócio que surgem e da sustentabilidade dos existentes a partir dos activos locais. A orientação da actividade da Qualifica tem uma forte componente estratégica que é do conhecimento e da qual beneficiam todos os envolvidos, mediante a sua operacionalização. As evidências recolhidas são claras nesta questão. O desenvolvimento de programas de progressiva certificação do património tradicional e diferenciador é factual. O envolvimento dos produtores na operacionalização desta estratégia confere a confiança necessária para o estabelecimento de relacionamento a prazo, condição para o sucesso. Todo o projecto nasce da intenção das autarquias em se agruparem. Constatando uma progressiva desertificação do território, origem e resultado do encerramento de unidades de negócio directamente envolvidas no desenvolvimento e comercialização de produtos locais e tradicionais, assumiu-se o seu papel de gestores e implementadores de políticas de planeamento e desenvolvimento regional. Desta forma, valorizando os seus activos territoriais, tangíveis e intangíveis, melhorando a sua visibilidade e notoriedade, percebendo que só contando com a participação activa dos agentes económicos locais é possível levar a cabo tal objectivo. Neste sentido, foram as mudanças no ambiente externo e os interesses similares entre actores que fomentaram a constituição da rede, aproveitando estes a oportunidade para resolver problemas comuns. O Documento de Constituição e a Secretária Geral mencionam que: - “Para inverter esta tendência de decréscimo abissal de actividades e produções tradicionais e genuínas, as Autarquias têm um papel decisivo, sobretudo se aliarem esforços entre si e com os produtores/transformadores/comerciantes interessados, fazendo, como sempre, o papel de motor de desenvolvimento e de agente cultural de mudança” (Documento de Constituição). - “Foi intenção objectiva unir esforços entre as Autarquias – interessadas no Redes de Cooperação como um mecanismo para reforço da competitividade territorial: o caso da Associação Qualifica desenvolvimento económico, na manutenção/criação de emprego na área do município, em evitar a desertificação do seu território e as associações sectoriais, interessadas em potenciar a sua produção e promover acções de forma sustentável” (Entrevista). Esta análise permitiu determinar as seguintes resultantes da actividade associativa, função da articulação entre os seus objectivos, estrutura e funcionamento: - Difusão e Disseminação de Experiências; - Centralidade e Articulação das e com as Autarquias locais; - Centralidade e Valorização dos activos materiais locais/regionais; - Informação, Conhecimento e Canais de Comunicação; - Valorização de activos territoriais intangíveis – O espaço relacional e o território como factores impulsionadores da rede; - A Qualifica como plataforma de reforços de laços de cooperação; - A estrutura organizacional da Qualifica – Componente Estratégica; - A estrutura organizacional da Qualifica – Componente Operacional. A tabela 3 recorrendo às resultantes já identificadas e mediante evidências provenientes das fontes identificadas, procura estabelecer conexões com pilares da competitividade territorial. Não foi difícil encontrar evidências, a partir da recolha efectuada e nas fontes seleccionadas e possíveis, sobre a conexão entre aspectos que os autores consideram determinantes no aumento da capacidade competitiva de um território. O funcionamento em rede, estimulando um comportamento colaborativo e cooperativo entre os actores, permite a valorização de activos materiais e imateriais distintivos e diferenciadores, especializando actividades. Esta valorização, em razão da intervenção em rede, é realizada numa perspectiva colectiva, complementando recursos e visões, tornando-se mais eficiente, alicerçando-se na centralidade da capacidade instalada e responsabilidades administrativas das autoridades locais, institucionalizando políticas. A aprendizagem e disseminação de informação e do conhecimento, de uma forma horizontal, permitem optimizar desempenhos produtivos. A centralidade (enquanto eixo e sem comportamentos paternalistas) da estrutura organizativa da Qualifica e das autoridades locais assegura e confere equilíbrio e estabilidade, mediante a participação de todos, construindo laços relacionais que indiciam a construção de um capital social que se prevê sólido e enraizável, sendo o “teatro de operações” um verdadeiro espaço relacional. 167 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Tabela 3 – Pontes e Contributos - Competitividade Territorial e Redes de Cooperação 168 Fonte: Qualifica Embora com dimensão nacional, esta rede de actores deve ser considerada de impacto regional, atendendo aos impactos parcelares do ponto de vista territorial. Numa perspectiva regional, a multiplicidade de razões e aspectos contingenciais que determina o relacionamento e a colaboração destes intervenientes, está na base do surgimento do seu trabalho conjunto, através da combinação de organizações de diferentes origens sectoriais e tipológicas. Estas organizações perseguem determinados objectivos comuns, assumindo que, em grupo, conseguem o que individualmente lhes estaria vedado (Roberts, 2003; Armistead and Pettitgrew, 2004). Estes modelos de parceria são, hoje, aceites como o método privilegiado de desenvolvimento local e regional, sendo aplicado frequentemente como forma de estimular a descoberta de novos recursos, trabalho conjunto, desenvolvimento de políticas e uma implementação integrada, ao nível regional, de prioridades acordadas (Roberts and Lloyd, 1998). No caso particular da valorização de produtos tradicionais (activos tangíveis) e de aspectos idiossincráticos de dado povo e/ou região (activos intangíveis), está-se, segundo Lundberg (2010), na presença de uma autêntica Regional Strategic Network (RSN) e que abrange as iniciativas de desenvolvimento regional. Esta rede ao basear-se na visão de que os actores regionais de determinados sectores se agruparem de forma a facilitar o desenvolvimento de relacionamentos e alavancando a sua densidade entre os intervenientes, as organizações envolvidas na rede acabam por beneficiar mutuamente. Uma das características importantes das redes regionais é a capacidade de colocar em contacto organizações complementares e autoridades locais e regionais (Mattsson and Johanson, 2006), tal como acontece nesta rede aqui estudada. Para recolher todos os benefícios que o estabelecimento de dada cooperação estratégica permite, fica claro, mediante a constatação da centralidade estrutural e organizacional da rede Qualifica, que foi fundamental definir prioridades, ter uma clara ideia do quê e para quem (Tickell et al., 1995). Esta parceria, para ser efectiva, definiu as capacidades requeridas, tanto individuais como organizacionais, de forma a potenciar os benefícios, exigindo um contexto institucional de suporte e de práticas estabelecidas. Roberts (2003) considera que só será possível envolver e motivar os actores locais/regionais chave, desempenhando estes um papel crucial na estratégia da parceria, daí que, neste estudo de caso, tenha sido o município a arrancar com a ideia e, posteriormente, foram de Redes de Cooperação como um mecanismo para reforço da competitividade territorial: o caso da Associação Qualifica Considerações Finais 169 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 170 imediato convocados produtores e respectivos agrupamentos. Estas autênticas plataformas de cooperação, englobando actores sectorialmente representativos e complementares – a Qualifica congrega autarquias, produtores, retalhistas e entidades provenientes da restauração e turismo - enraízam-se no território mediante a criação de cadeias e redes de actividades que agregam competitividade e valor a produtos e serviço (Potts, 2010). Lundberg (2010) considera que, no tempo, o incremento de políticas que estimulem o desenvolvimento de redes de cooperação estratégica à dimensão regional, implicará a melhoria da competitividade dos actores envolvidos, factor sustentador da própria competitividade territorial. Percebendo que o desenvolvimento da rede de cooperação estratégica assenta na valorização de aspectos distintivos e diferenciadores dos territórios (tangíveis e intangíveis) e que lhes proporcionam dadas vantagens competitivas, o estímulo da especialização produtiva em torno desses aspectos permitirá melhorar o desempenho dos agentes económicos. Por esta via, consegue-se aumentar a competitividade do território, resultado também de uma maior notoriedade e visibilidade para o exterior, em função da existência de activos materiais e imateriais condignamente qualificados. Este estudo não esteve isento de limitações e estas acabam por ser um contributo para futuras investigações a realizar. Uma das limitações foi resultado da ausência de mais fontes de evidência e a mais informadores/actores chave. Neste sentido, é importante realçar que todas as informações e dados recolhidos provêm de documentos públicos da Associação ou da responsabilidade de um único informante: a Secretária Geral. Teria sido crucial a triangulação de dados com uma pesquisa feita a jusante relativamente aos associados, tais como produtores e respectivos agrupamentos e comerciantes dos produtos tradicionais, de forma a percepcionar o real efeito de rede. Relativamente às autarquias, principais motores e impulsionadores do projecto, será que o seu território recolheu o benefício esperado? Será que se preocuparam em verificar essa relação? A auscultação da população em geral seria fundamental para avaliar a notoriedade da rede Qualifica. A informação que se obtém destas populações é por via indirecta, ou seja, a partir da opinião da entrevistada. Estáse perante uma investigação de natureza exploratória, contudo, existe a possibilidade de associar a este estudo um outro mais abrangente, de carácter quantitativo, onde outras regiões de Portugal e outros países possam ser vistos como novos contextos de análise. REFERÊNCIAS Akaka, M.A. (2007), The Value Co-Creation Crossroad of Service-Dominant Logic and Network Theory, UMI Number 1444486, ProQuest Information and Learning Company. Alberto, D. (2008), Modelos de Desenvolvimento Regional. In Leitão, J., Ferreira, J.J. and Azevedo, S.G. 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Todavia, os problemas da economia portuguesa estão longe de serem meramente conjunturais, de desequilíbrio das contas públicas. Portugal tem um problema de competitividade e de sustentabilidade da sua economia por resolver. Aliás, não é possível projetar o futuro replicando o modelo de desenvolvimento do passado, isto é, fazendo mais do mesmo. Neste sentido, o grande desafio que atualmente se coloca é o de conjugar de forma inteligente o imperativo do saneamento das contas públicas com uma agenda de crescimento devidamente focada no enriquecimento e alargamento da carteira de atividades transacionáveis com que Portugal se afirma perante a globalização. Melhor dizendo, trata-se de uma agenda de crescimento que dê corpo a uma grande campanha coletiva orientada para a globalização, o que obriga a mobilizar esforços e a encontrar espaços de cooperação estratégica em torno de uma Hélice Tripla que envolva a comunidade empresarial, as universidades (e demais centros de saber), e o governo (e as suas instituições). Esta é também a fórmula para valorizar o empreendedorismo, a qualificação e a inovação a fim de reforçar a cadeia de valor e o potencial de crescimento da economia. Numa perspetiva de médio e longo prazo, as condições mínimas de sustentabilidade da economia portuguesa, na opinião dos mais reputados economistas, passam por crescer a taxas médias anuais acima dos 2%, permitindo criar emprego e aumentar o peso das exportações para valores superiores a 40% do PIB. É certo que uma agenda de crescimento está hoje muito associada aos próprios desenvolvimentos da agenda e da estratégia da UE que não tem revelado a devida capacidade, celeridade e eficácia na gestão da crise das dívidas soberanas. A própria União Europeia é das regiões que menos cresce atualmente no contexto da economia global. Mas, independentemente do que ao nível da UE se competitividade das empresas portuguesas Uma política pública de inteligência económica: um instrumento para a espera, dos desenvolvimentos que possam vir a ocorrer em sentido positivo ou negativo, aquilo que Portugal pretende ser no futuro depende essencialmente dos portugueses, da sua vontade coletiva, da sua visão e ambição. Assim se justifica uma política pública de inteligência económica e estratégica para trilhar o caminho do crescimento, para valorizar os ativos de base e estratégicos que permitam um melhor posicionamento competitivo na economia global. De acordo com Amaral (2008) o problema já não é o da acumulação de capital físico, mas sim o da acumulação de conhecimento, o que tem consequências não despiciendas em termos da política económica e, designadamente, das políticas públicas de apoio à promoção do conhecimento, sendo a dinâmica de crescimento das economias determinada, em grande parte, pelo sucesso na acumulação de conhecimento. A inteligência económica “não custa nada, ou por assim dizer grande coisa: a sua eficácia repousa nas redes, nos circuitos de informação, na mobilização dos poderes públicos, na eliminação dos conflitos de capela e das divisões, num pouco de método. Também na valorização de quem dá a informação e não apenas de quem a utiliza, na compreensão pelas administrações públicas dos desafios da empresa e, para a empresa, das prioridades do Estado e portanto da Nação” (Carayon, 2003: 11). Falta-nos a “a inteligência das coisas” no dizer do heterodoxo Padre António Vieira. Ao longo das últimas décadas, as elites portuguesas convenceram-se que a União Europeia lhes resolveria todos os problemas, a nível financeiro, da inovação e dos mercados. Por isso, negligenciaram o pensamento estratégico. E, na ausência de estratégia, inviabilizou-se a construção de um projeto coletivo assente na sustentabilidade e competitividade da economia. Com igual leviandade é frequente confundirem-se os instrumentos com a estratégia, os meios com os fins. Isso tem sucedido ao longo do tempo e nada nos garante que não seja essa a trajetória atual. É certo que se deram passos importantes nos últimos 15 anos, com progressos notáveis, nomeadamente em relação a indicadores críticos associados à inovação, à tecnologia e ao conhecimento. A balança tecnológica passou a presentar saldos positivos nos últimos anos. Criaram-se empresas de elevado nível tecnológico, algumas delas a partir de spin offfs universitários, o que era muito pouco frequente na nossa sociedade. O próprio European Innovation Scoreboard da União Europeia reconhece esse progresso ao considerar-nos como “país moderadamente inovador”. Houve uma injeção de capital intelectual bastante significativa, como há muitas décadas não se verificava em Portugal, mas que pode não se traduzir em ganhos substantivos ao nível da cadeia de valor da economia, e no crescimento do PIB, se para tanto não existir inteligência económica para otimizar a ação estratégica. Tornou-se, por isso, frequente exibir tais progressos, traduzidos no exercício do benchmarking 177 (que é muito útil como instrumento analítico e de ação), confundindo-o com a própria estratégia. Pior do que isso, poderá suceder, caso se pretenda que o programa de assistência financeira negociado com a Troika, que, no essencial, é um programa de consolidação das finanças públicas e de proteção dos credores externos, seja a estratégia para a economia e para o país. Este trabalho pretende chamar a atenção para a premência de uma política pública de inteligência económica, evidenciando os seus contornos à luz da literatura sobre a matéria e de outras experiências e, bem assim, provocar uma reflexão sobre as prioridades a definir e os ativos de base e estratégicos que Portugal dispõe e que importa mobilizar para lhe conferir sustentabilidade. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 1. Elementos relevantes sobre a economia e a estrutura empresarial portuguesa: quatro indicadores críticos 178 Quando se analisa o desempenho da economia portuguesa ao longo das três últimas décadas com a preocupação de conhecer as suas principais fragilidades e constrangimentos, várias ilações são possíveis retirar: uma balança bens cronicamente deficitária; níveis de produtividade inferiores à média da UE, incompatíveis com o reforço dos indicadores de qualidade de vida; um modelo exportador frágil, reativo e relativamente pobre em valor acrescentado, embora com progressos positivos; défice de imagem-país e dos produtos portuguesas, nomeadamente relacionada com inovação, qualidade, cumprimento de prazos (…); falhas de informação e de ação, relacionadas com o Procurement das Instituições Multilaterais que Portugal integra; insuficiente focalização na atividade internacional e nos mercados-alvo; fraca atratividade de IDE e da sua ligação com a cadeia de valor da economia portuguesa; transferências significativas de recursos, competências e de relações de poder e influência das atividades transacionáveis para as não transacionáveis, ao longo das últimas duas décadas, face ao modelo de crescimento adotado; um tecido empresarial pouco produtivo e predominantemente centrado em atividades de baixo valor acrescentado traduzindo um perfil competitivo pouco adequado aos imperativos da globalização e da economia do conhecimento. Dada a sua importância para a alteração do perfil competitivo da economia portuguesa vale a pena atentar em três indicadores de base. Em primeiro lugar, a estrutura empresarial portuguesa: em 2009 cerca de 86,7% (303.287) do total das sociedades não financeiras eram microempresas; 13,3% (39.665) pequenas empresas; 1,7% (5.771) médias empresas; 0,3% (888) grandes empresas, de acordo com o Quadro 1. Quadro 1 - Estrutura Empresarial Portuguesa Naturalmente que uma estrutura empresarial com estas características em que o predomínio das PME e particularmente das microempresas é esmagador, coloca restrições numa pequena economia aberta que se pretende competitiva, necessitando para isso, no caso das PME, de “ganhar massa crítica e escala, nomeadamente por via do redimensionamento empresarial através de estratégias interempresas adequadas” (Magrinho, 2009: 344). Em segundo lugar, no que se refere à distribuição das empresas exportadoras: das 20.035 empresas exportadoras em 2011 (ver Quadro 2), apenas 106 exportaram mais de 50 M€ (47% do total das exportações); 140 exportaram entre 25 e 50 M€ (12% do total); 3.289 exportaram entre 1 e 25 M€ (36% do total); 16.500 exportaram menos de 1 M€ (5% do total). competitividade das empresas portuguesas Fonte: NE, Dados de Abril 2011 (pedidos para IAE 2011) Uma política pública de inteligência económica: um instrumento para a 179 Quadro 2 - Distribuição das Empresas Exportadores Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Fonte: INE, Operadores Comércio Internacional 180 De um modo geral a primeira grande ilação é a de que a base exportadora portuguesa é muito curta, pouco compaginável com o objetivo de incrementar o peso das exportações no PIB, para valores acima dos 40%, considerado o limiar de sustentabilidade para uma pequena economia aberta. Alargar a base exportadora é, pois, crucial, e esse desiderato implica que uma fatia bastante maior de pequenas e médias empresas, que já têm alguma massa critica, entrem no terreno da exportação. Em terceiro lugar, veja-se o peso das exportações no PIB (Quadro III): em 2011 de acordo com a orientação exportadora das principais economias europeias, o peso das exportações de bens e serviços no PIB de Portugal era apenas de 35,5 %, o que compara com 105, 6 % da Irlanda; 92,5% da Hungria; 89,1 % da Eslováquia; 82,7% dos Países baixos; 74,9% da República Checa; 72,3 % da Eslovénia; 57,3% da Áustria; 53,3% da Dinamarca; 50,1% da Alemanha; 44,8% da Polónia; 39,1% da Finlândia; 32,3% do Reino Unido; 30,1 % de Espanha; 28,8% de Itália; e, 27 % de França. Uma análise fina deste quadro permite concluir que a maioria das pequenas economias abertas e mais competitivas apresentam um peso das exportações no PIB bastante acima dos 40%, resolvendo assim por via das exportações os problemas resultantes da reduzida dimensão dos seus mercados domésticos. Facilmente se depreende que é insuficiente a participação das exportações portuguesas no PIB quando se compara com os parceiros europeus. Quadro 3 - Grau de Abertura da Economia, Orientação Exportadora e Exemplos de Economias Européias (2011) Não menos crítico é também a elevada concentração das exportações portuguesas nos mercados da União Europeia. Analisando o destino da exportações em 2011, de acordo com os dados do INE 2012, verifica-se que 74,1% têm lugar a nível Intra-UE. Acresce que a Espanha, Alemanha, França e Reino Unido absorvem cerca de 74% das exportações IntraUE. As exportações Extra-UE representam 25,9 %, onde os mercados da CPLP pesam 8,3%. A constatação desta elevada concentração em poucos mercados impõe naturalmente a necessidade de diversificação, tanto mais que os mercados da UE são atualmente dos que menos crescem à escala global. Alargamento da base exportadora e da carteira de bens e serviços transacionáveis, redimensionamento empresarial para ganhar escala, aumento do peso das exportações no PIB e diversificação de mercados, terão que fazer parte de um quadro de objetivos e de ação de uma política de inteligência económica. 1.http://www.intelligence-economique.gouv.fr/rubrique.php3?id_rubrique=6, acedido em 2008.07.08 competitividade das empresas portuguesas Fonte: Eurostat, Base de Dados Uma política pública de inteligência económica: um instrumento para a alterar tabela 181 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 2. A Inteligência Econômica: instrumento estratégico do estado, dos poderes públicos e das empresas 182 O Estado pelo facto de se situar no coração do sistema de inteligência económica desempenha um papel incentivador e catalizador. Por isso, faz sentido que as Administrações Públicas adaptem as suas missões aos novos desafios da globalização das economias. Como refere Juillet (2012), a inteligência económica não serve apenas para pesquisar a informação para construir uma estratégia ganhadora. Hoje uma boa estratégia não é suficiente para ter sucesso sendo necessário acrescentar ações de influência para gerar um ambiente positivo. Esta é a razão pela qual as empresas e as nações usam técnicas de influência nas suas estratégias. Também é verdade que “para ser credível num século em que o poder se difunde dos estados para os intervenientes não estatais, os esforços do governo para projetar poder suave terão de aceitar que o poder é menos hierárquico numa era da informação e que as redes sociais assumiram uma maior importância” (Nye, 2011: 123). No atual quadro da competição internacional a luta pela influência, o acesso e o controlo da informação revestem uma dimensão estratégica. Aliás, numa economia fortemente concorrencial, em que as estratégias de influência desempenham um papel importante, assim como o domínio da informação de suporte “é bastante lógico que a condução de uma ambiciosa política pública de inteligência económica constitua doravante um objetivo prioritário do Estado, tanto nas suas missões clássicas como no seu papel de regulador económico e social” (Canepa, 2006). Veja-se a propósito da inteligência económica, que o Alto Responsável da Inteligência Económica que passou a funcionar junto do primeiro-ministro francês a partir de 2004, Allain Juillet, propõe a seguinte formulação: “a inteligência económica consiste no controlo e na proteção da informação estratégica para todo o ator económico”1, com a tripla finalidade: a competitividade do tecido industrial, a segurança da economia e das empresas e o reforço da influência do país. A importância do investimento na inteligência económica, numa ótica de parceria público-privada, tem sido bastante enfatizada em França desde o Relatório Martre (2004) e com mais intensidade a partir da apresentação do Relatório Carayon (2003) e da sua consequente assunção como política pública. Assiste-se ao “aparecimento de verdadeiros sistemas de inteligência económica que constroem a sua finalidade estratégica, segundo vários eixos, declináveis à escala europeia, nacional, assim como a nível dos territórios” (Clerc, 2004: 2), cujos principais vetores no entendimento deste autor são: 2. www.businesslink.gov.uk/bdotg/action/directory, acedido em 2008-10-18 3. TPR (très petite entreprise), é a designação francesa para microempresa competitividade das empresas portuguesas Também no Reino Unido, cuja prática de inteligência concorrencial (competitor intelligence) e com maior acuidade a cultura ofensiva de informação económica estão bem ancoradas nos grandes grupos britânicos, onde o papel do Estado através dos mecanismos de inteligência económica não é negligenciável, pelo menos em dois domínios: o apoio aos exportadores e às PME. Estas são incitadas a desenvolverem práticas de inteligência económica encontrando para isso o apoio especializado que necessitam nos Business Links que funcionam como rede de apoio, lançadas no início dos anos 90 pelo governo de John Major. Os Business Links que processam informação para as PME, estão ligados a vários ministérios e departamentos e, fundamentalmente, “fornecem informação, conselho e o apoio necessário ao início, manutenção e crescimento do negócio. (...). O Business Links Service é uma parte crucial da campanha do governo para promover a empresa e fazer do Reino Unido o melhor lugar do mundo para iniciar e fazer crescer o negócio”2. Os Business Links afirmam-se, de acordo com Clerc (2004), como redes territorializadas de apoio e de difusão de práticas e de informações com valor acrescentado: exportação, inovação, tecnologia, business intelligence, orientadas para as PME e TPE3. A expressão dos poderes públicos em matéria de inteligência económica faz-se também sentir através das coletividades territoriais ou das autarquias. Por exemplo, a experiência do Quebec, Canada, que “consiste em montar, a nível governamental, uma rede de vigilância integrada sobre as políticas públicas, lembra-nos a urgência que existe hoje em pensar o futuro e reabilitar o pensamento estratégico, na base de uma prática de inteligência económica” (op. cit.). Assim, em 1999, o governo do Quebec toma a iniciativa de montar um dispositivo de inteligência económica, decidindo implementar uma rede de vigilância integrada, fazendo interagir cerca de trinta ministérios e organismos públicos, construindo redes de vigilância, estabelecendo competências para os vigias coordenadores Uma política pública de inteligência económica: um instrumento para a 1. “Produção de conhecimentos” adaptados aos desafios da globalização e “úteis às estratégias individuais e coletivas”; 2. “Desenvolvimento das organizações” mobilizando as capacidades do Estado, das coletividades territoriais e das empresas; 3. “Definição de uma doutrina de segurança económica” visando a proteção dos sectores chave e essenciais da economia; 4. “Definição e implementação de estratégias de influência” pela promoção do modelo cultural, económico, social, nacional e europeu. 183 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 184 colocados em cada unidade (ministérios, organismos públicos e cinco grandes cidades). Aliás, várias centenas de vigias passaram a alimentar uma rede que se ocupa da recolha de informação sobre temas alvo dessa rede (os efeitos da globalização, o papel e as funções do Estado, soberania, gestão das políticas públicas, a problemática da NAFTA) Os seus membros estão ligados por uma Intranet, tornando possível o funcionamento desta gigantesca rede de observação et alerta, de análise e de síntese. Numa visão de longo prazo “o Estado deve propor uma visão estratégica global e mobilizar os agentes económicos para as prioridades das acções definidas em função dos polos múltiplos da economia nacional” (Hypolite et al, 2003: 3), cabendo-lhe, na ótica da inteligência económica: • Definir, conceber, organizar e conduzir as estratégias sectoriais da nação por via da coordenação das forças nacionais; • Antecipar, utilizando todos os recursos da prospetiva e do planeamento; • Implementar estratégias de influência para projetar a sua voz a nível internacional; • Ganhar a guerra cognitiva e a guerra da informação num contexto de guerra económica, em que a informação se tornou um capital estratégico; • Favorecer a segurança global num mundo cada vez mais instável e incerto. Deste modo, cabe ao Estado apoiar a valorização e a defesa dos interesses nacionais e das suas empresas no mercado mundial, e configurar o seu enquadramento tecnológico e humano, a sua formação e a sua interação o mais eficaz possível em função dos constrangimentos que lhes são impostos e das oportunidades suscitadas. No mesmo sentido, cabe ao Estado lutar diplomaticamente (sobretudo por via da diplomacia económica) tendo em vista uma regulação internacional favorável aos interesses nacionais, designadamente através de mecanismos de diplomacia económica ágeis. Para esse fim, são implementadas diversas ações de inteligência económica, através de diferentes serviços públicos, de documentação, de pesquisa, de informação e de conselho, em relação aos quais, numa perspetiva de eficácia, se pressupõe capacidade de coordenação conjunta. Refira-se que em França, a fim de melhor concentrar os esforços sobre as empresas e as tecnologias essenciais, Juillet (2004), refere que o Estado foi levado a selecionar os sectores estratégicos, e as sociedades que deles fazendo parte vão ser integradas num dispositivo de vigilância e alerta. Importa referir que, da mesma maneira que uma orientação no sentido da inteligência económica progride lentamente nas empresas, o mesmo sucede com os poderes competitividade das empresas portuguesas Uma política pública de inteligência económica: um instrumento para a públicos em muitos países. De facto, as estratégias e as ações desencadeadas por alguns Estados mostram que tarda a impor-se uma postura de inteligência económica, enquanto instrumento de gestão das relações de força geoeconómicas internacionais e como instrumento de antecipação da gestão de crises, incluindo certas campanhas internacionais de desinformação. No atual estádio da globalização, a uniformização jurídica, induz a que os afrontamentos mais importantes se projetem na capacidade dos atores públicos e privados em impor a sua vontade, em criar as suas soft laws, em editar as normas. A batalha pelas normas oscila entre uma tentação hegemónica por parte das nações ocidentais a fim de regulamentarem a desregulação (sobretudo económica e comercial) e as aspirações das novas potências cuja estratégia consiste em “multiplicar as fontes normativas a fim de fragilizar um sistema universal pensado pelos Estados dominantes. Assim, a sobreposição de normas nacionais, internacionais, (com vocação regional ou mundial) de origem estatal, supra-estatal, ou privada, gera uma verdadeira proliferação de quadros jurídicos” (op. cit.). Sublinha-se ainda a proliferação de comunidades virtuais que vão sustentar novos movimentos não controláveis pelos Estados, conferindo protagonismo a actores não estatais. Em consequência “vamos assistir a um afrontamento larvar e assimétrico entre os Estados e os OSC (Open Source Centers) para a instauração de novos quadros normativos” (Harbulot e Lucas, 2006:12). Com a globalização do conhecimento as atividades internacionais tenderão a ser influenciadas pela produção de conhecimentos novos, o que também terá implicações nos modos de governance a nas políticas de responsabilidade social. Estas confrontar-se-ão com a resistência das novas grandes economias emergentes, mais interessadas num crescimento acelerado imediato, que as consideram expedientes moralistas do mundo ocidental. Na perspetiva da inteligência económica, “o papel do Estado não é o de se substituir às empresas, mas de lhes mostrar o caminho e ser um parceiro chave, graças aos seus recursos específicos, à sua capacidade de sintetizar, de definir estratégias globais e de coordenar. A proteção e a defesa económica são, por isso, um assunto da cooperação público-privada” (Naftalski, 2004: 37). Seriam objeto desta cooperação público-privada, a proteção do património nacional tecnológico, o controlo das tecnologias-chave, a proteção das pessoas e suas estruturas no estrangeiro, a luta contra os ataques desleais e, ainda, a luta contra os mecanismos fraudulentos internacionais. A nível da intervenção europeia, o papel do Estado em matéria de inteligência económica, coloca-se sobretudo ao nível da articulação e coordenação com os parceiros 185 da União, o que significa “determinar a nível nacional o que pode ser partilhado e o que não pode ser” (Daguzan, 2004: 103). Trata-se de um assunto que coloca sérias dificuldades, porque em muitos casos é cada vez mais difícil discernir, nomeadamente em relação aos grandes grupos industriais (EADS, Alcatel) qual a nacionalidade das empresas, colocando diversos condicionalismos em matéria de recolha e partilha de informação por parte dos Estados. Perante sociedades transeuropeias, coloca-se porventura a necessidade de rever comportamentos tradicionais forçando lógicas de cooperação, alicerçadas numa partilha de informações (intelligence sharing). Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 2.1.Missão dos Poderes Públicos em Matéria de Pesquisa de Informação 186 O efeito conjugado da globalização e da explosão das tecnologias da informação e da comunicação, sobretudo a Internet, faz com que as empresas e demais organizações, se confrontem com uma superabundância de informação. A questão que se coloca é a de saber, a partir deste fluxo de informações: como selecionar a mais útil? Na verdade o principal elemento de complexidade reside no “carácter proteiforme das fontes de informação quer elas sejam técnicas (escutas, análise dos sinais radar, imagens de satélite), ou humanas (correspondentes, agentes, documentação aberta” (Hervouët, 2004: 73). Impelidas pelos imperativos da inovação e da competitividade, as PME tomam lentamente consciência da importância de deter boas informações para vencer os seus concorrentes: conhecimento dos mercados, condições de acesso aos mercados, informações jurídicas, tecnológicas, normativas ou outras. Para conseguir uma vantagem competitiva, as empresas terão que saber utilizar a assimetria de informação a seu favor. As informações económicas não devem ser consideradas como um factor económico da mesma natureza dos outros. São efetivamente uma das matérias-primas mais preciosas utilizadas pela empresa. Por isso, cada vez mais as administrações são incitadas a partilhar e a fazer circular esse recurso essencial, verdadeira “alavanca do desenvolvimento económico” (Hypolite et al, 2003: 5). Cabe aos poderes públicos, de acordo com estes autores, assegurar a missão de pesquisar e analisar a informação económica, nomeadamente, a pesquisa de informações a nível nacional, cumprindo duas funções principais: • Organizar, recolher e interpretar as informações económicas e sociais a fim de publicar inquéritos (emprego), índices (preços) ou resultados (recenseamento); • Elaborar modelos económicos a fim de proporcionar instrumentos de análise e de previsão da evolução económica e social. Apesar do número crescente de intervenientes no ambiente institucional da empresa, tais como os peritos e outras autoridades científicas e técnicas, os media, as associações, os poderes públicos (europeus, nacionais e locais) afirmam-se como a fonte privilegiada das empresas para obterem informação específica. Estes já não são só autoridades, mas também atores do jogo económico.(Hypolite et al, 2003: 8). Em matéria de utilização, difusão e partilha da informação, de acordo com estes autores, o papel dos poderes públicos, abrange domínios bastante diversos, destacando-se “a pesquisa de informação a nível internacional” a qual envolve a “diplomacia económica” e a “assistência e o apoio às empresas” (informar sobre mercados de países-alvo, facilitar seleção de potenciais parceiros, promover as empresas e os produtos nacionais através da organização de seminários e exposições nos países em observação, melhorar a imagem competitividade das empresas portuguesas No atual contexto da globalização, em que o Estado se afasta cada vez mais da gestão direta dos sectores produtivos, perdendo significado muitas das atividades que até há poucas décadas atrás eram consideradas estratégicas e como tal pertença do Estado (telecomunicações, energia, ...), outras missões do Estado estão a ganhar relevância estratégica, nomeadamente a distribuição de informação pertinente junto das empresas nacionais e a diplomacia económica. O Estado está presente não apenas na distribuição da informação útil e estratégica, como também lhe compete favorecer os produtos e serviços nacionais fabricados por empresas nacionais, exercendo também a influência possível junto de líderes políticos ou agentes económicos internacionais e mundiais. Aliás, as empresas reivindicam frequentemente do Estado a necessidade de “reforçar o acesso das empresas às informações sobre os mercados externos (...)” (Naftalski, 2004: 33). Com efeito, esta missão coloca duas interrogações: como organizar a partilha equitativa das informações recolhidas? Como assegurar de forma perene esta ligação entre os serviços do Estado e o sector privado? Trata-se de questões às quais os poderes públicos pretendem responder sob a forma de diferentes projetos. Uma política pública de inteligência económica: um instrumento para a 2.2. Missão dos Poderes Públicos em Matéria de Difusão e Partilha da Informação 187 económica e industrial nacional nos diferentes países através de ações junto dos media e dos jornalistas e outras formas adequadas). A prática da inteligência económica e estratégica implica “a implementação de redes interativas destinadas a facilitar a perceção e a recolha de informação com vocação estratégica para a empresa. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 2.3. O Lobbying e a Diplomacia Económica 188 No contexto da globalização que se tem vindo a caracterizar, tanto as empresas, incluindo as PME, como os poderes públicos necessitam de equacionar o lobbying, com incidência nas relações com as diversas instituições ou entre as empresas, e muito particularmente na ação externa. É um facto que o seu campo de aplicação se alargou, os seus métodos são cada vez mais requintados, inserindo-se no quadro da comunicação estratégica. Interessa, a este propósito, ganhar não tanto em termos de jogo de soma nula, mas sobretudo num jogo de Win Win, na base de uma relação benéfica para as partes intervenientes. Significa que num jogo a vários, “não há performance individual sem inteligência coletiva” (Hypolite et al, 2003: 9). O lobbying consiste em realizar intervenções destinadas a influenciar diretamente ou indiretamente os processos de elaboração, aplicação ou de interpretação de medidas legislativas, normas, regulamentos e, de forma geral, de qualquer intervenção ou decisão dos poderes públicos. As estratégias e as táticas de lobbying que as empresas dispõem para agir em face dos poderes públicos são múltiplas, pragmáticas e evolutivas. As empresas em face de necessidades concretas podem, a curto prazo, optar por utilizar grupos de pressão que elas integram no seu sector de atividade, recorrer aos seus próprios serviços organizacionais, ou ainda contratar agências especializadas neste tipo de mediação. Aliás, na maior parte dos casos, o lobbying exerce-se através da ação conjugada destes três vetores. O lobbying está muito desenvolvido nos países anglo-saxónicos onde existem muitos lobistas que trabalham para empresas ou agências privadas especializadas nesta atividade. Junto dos principais organismos da União Europeia, em Bruxelas, existem grupos de interesses que praticam o lobbying quotidianamente. Por exemplo, estes grupos de interesses observam, analisam e aconselham as empresas que pretendem infletir a posição das Administrações que preparam as futuras normas industriais ou comerciais. Mas, também, de acordo com Hypolite et al (op. cit.), existem os gabinetes especializados no lobbying que actuam junto das instituições nacionais, como os governos e os parlamentos, com o propósito de defender interesses particulares. competitividade das empresas portuguesas Uma política pública de inteligência económica: um instrumento para a Noutra dimensão também se verifica a existência de células de lobbying , normalmente designadas células de influência que são a extensão de sistemas de inteligência económica com elevado desempenho. Estas células defendem, por exemplo, na ONU, junto de vários organismos internacionais (OMS, OMI, OMPI etc), interesses a longo prazo das empresas. O mesmo acontece junto das várias instâncias da UE em que várias estruturas de lobbying tentam influenciar a evolução, por exemplo, de determinadas normas que dizem respeito aos sectores que representam. Devem ser ainda mencionados outros organismos, a nível internacional, europeu, nacional, regional e sectorial, como são os casos dos sindicatos, das Associações, das Confederações, entre outros, que tratam e debatem problemas que interessam à empresa e que, por isso, são tomados em conta nas orientações estratégicas. Por exemplo a nível europeu, a BUSINESSEUROPE, a confederação europeia que defende os interesses dos empregadores tem o estatuto de parceiro social reconhecido pela UE o que lhe confere um poder funcional significativo em relação a muitos dossiers e matérias relevantes. Refira-se também que, os anos oitenta e noventa do século passado, designadamente após a queda do muro de Berlim, foram marcados por profundas transformações com fortes repercussões ao nível da matriz da diplomacia clássica, constatando-se que “os espaços diplomáticos atuais têm sido progressivamente transformados em áreas de apoio às atividades económicas no exterior, em particular das empresas” (Silva, 2002: 97). Em sentido amplo, os Estados estão em permanente negociação com diversos atores, sendo que “a ação da diplomacia económica pode ser observada segundo três eixos, consoante a importância relativa dos objetivos políticos ou económicos: a ação segurança onde os objetivos políticos são dominantes, a ação reguladora onde as duas ordens de objetivos se conjugam e a ação competitiva, de clara dominância económica” (Farto b, 2006:176). Farto (2006) desenvolve ainda um subtema da diplomacia económica, denominado diplomacia comercial, circunscrevendo-a à: Análise, avaliação e apoio: análise de situação; identificação de restrições e entraves; detecção de novas tecnologias; avaliação política de riscos de investimento (por exemplo o a avaliação do risco-país); exploração de oportunidades de negócio e apoio diplomático; etc.; Promoção do país em cada mercado-alvo: exportação de bens e serviços; atracção do turismo; captação de investimentos; gestão da ajuda ao desenvolvimento; entre outros; Activação dos canais de comunicação e influência: acompanhamento das empresas nacionais; organização do lobby nacional; estruturação do lobby de contactos, envolvendo associações empresariais, câmaras de comércio e agentes económicos nacionais estabelecidos 189 em determinado mercado externo; mobilização de apoios internacionais. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 2.4. A Missão dos Poderes Públicos em Matéria de Securização da Informação 190 A defesa da economia e a inteligência económicas estão hoje intrinsecamente ligadas, sendo consideradas necessárias para a prosperidade e o desenvolvimento de qualquer país. Recomenda que as empresas se protejam eficazmente contra as desestabilizações e protejam o seu património informacional. As novas tecnologias da informação e da comunicação, sobretudo a Internet, tornam ainda mais premente esta necessidade. A abordagem decorrente da inteligência económica mostra que não é apenas necessário adquirir boas informações, mas sobretudo saber protegê-las, tanto para os Estados como para as empresas. A segurança dos sistemas económicos representa, aliás, um vetor de grande sensibilidade no contexto da inteligência económica. As estratégias desenvolvidas pelos Estados para garantir a sua segurança e o seu poder, tanto a nível militar como a nível político e económico, necessitam da análise e tratamento de muita informação nomeadamente através dos serviços de informação. A este propósito relevamse, pela sua importância, as medidas de proteção: Face às ameaças descritas, torna-se necessário a proteção da informação e a securização das empresas, de modo a responder a um triplo desafio: • Prevenir-se contra eventuais ações ilícitas; • Proteger a sua informação sensível, isto é, montar no seio da própria empresa um sistema de contrainteligência ; • Cultivar uma “cultura de informação” no seio da empresa, nomeadamente incentivando a recolha, o tratamento e a difusão das informações úteis, evitando qualquer entrave por via de medidas de proteção excessivas ou desadequadas. A este propósito Amaral releva a importância de um serviço de informações na empresa, entendido como um conjunto de órgãos de estrutura constituído por profissionais de informações que executam todas as atividades estratégicas e de segurança que envolvem informações. Quando se fala em segurança está a considerarse a existência de espionagem, terrorismo e subversão. Para todas estas três vertentes, a produção de conhecimento sobre o que se está a passar no meio envolvente e as atividades de contraespionagem para recolha de dados e noticias, criação de conhecimento e difusão de informações, são comuns à vertente estratégica do serviço de informações (Amaral, 2008: 18). competitividade das empresas portuguesas Perante a espionagem industrial e comercial, a inteligência económica, utilizandose de procedimentos legais e éticos, acrescenta uma nova dimensão aos mecanismos que visam proteger a produção científica e tecnológica, pelo que “por via de um conjunto organizado de questões e respostas pertinentes, prepara as empresas para enfrentar toda a espécie de ameaças e agressões provenientes do meio externo e coloca-se à disposição para possibilitar a tomada de decisões estratégicas que garantam o alcance dos objetivos organizacionais” (Besson e Possin, 1999: 222) Existem ainda outros meios a que as empresas e os Estados podem recorrer para se proteger da espionagem: Utilização da legislação, como por exemplo faz os Estados Unidos abundantemente; Solicitação da proteção aos organismos competentes, consoante a matéria em causa; Construir mecanismos de segurança adaptados à empresa bem como a proteção de material e dos software da empresa; Sensibilizar os funcionários para os problemas da espionagem e das práticas ilícitas. Em síntese, de acordo com Juillet (2004) a inteligência económica, deve permitir às sociedades, às coletividades ou ao Estado que a praticam, a possibilidade de antecipar, de se proteger, e de conseguir uma vantagem concorrencial defensável e durável por via do domínio de quatro capacidades complementares no momento da decisão e da ação: A vigilância permanente de cada um dos atores da vida económica; A gestão da informação que pressupõe saber pesquisar dados, triar, analisar, avaliar e difundir as informações e toda as ordem permitindo detetar as oportunidades e as ameaças; A proteção do seu património imaterial que inclui o saber-fazer, a defesa da imagem, a segurança dos fluxos, e as informações estratégicas; Uma política pública de inteligência económica: um instrumento para a Ainda de acordo com este último autor, a espionagem industrial gerou três formas de luta contra as atividades ilegais dos agentes a soldo de países estrangeiros: • A contraespionagem repressiva, visando identificar e, em consequência, expulsar os agentes identificados; • A contraespionagem defensiva, com a função de obter infirmações sobre a atividade dos serviços secretos hostis; • Por último a contraespionagem ofensiva, encarregada de montar operações de “intoxicação”, nomeadamente através da manipulação dos agentes em relação aos quais se veiculam informações erradas. 191 A ação sobre as organizações e os atores que podem ter um impacto sobre a sua atividade através da comunicação, influência e as relações públicas. Nesta perspetiva, ainda seguindo o raciocínio de Juillet (2004), este dá razão ao adágio de Napoleão: «deixar-se vencer é escusado, deixar-se surpreender é imperdoável». Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 3. Vetores de uma política pública de inteligência econômica para Portugal 192 Uma análise das propostas avançadas na última década pelos meios associativos empresariais de referência em Portugal (CIP-Confederação Empresarial de Portugal, AIPCCI, AEP) para resolver o défice de competitividade e de internacionalização da economia portuguesa, verifica-se uma significativa convergência em torno do seguinte quadro de objetivos estratégicos: •Reforçar a cadeia de valor, alargar e densificar a base exportadora nacional, nomeadamente aproximando as capacidades existentes aos mercados com maior procura internacional e, bem assim, um melhor posicionamento nas cadeias globais que integram uma parte cada vez mais significativa dos bens e serviços exportáveis; •Diversificar as exportações a nível intra e extraeuropeu; •Mobilizar para o terreno da internacionalização uma faixa alargada das PME; •Redimensionar o tecido empresarial por via de estratégias colaborativas (fusões, aquisições, alianças estratégicas, etc.) para ganhar massa crítica para a internacionalização •Reforçar a atratividade do IDE (sobretudo de base tecnológica), nomeadamente atraindo investimentos para a valorização da posição geográfica portuguesa permitindo desempenhar funcionalidades importantes no interface entre as grandes regiões da economia mundial (Europa e Asia(s); Europa e América do Norte; e, Europa e Atlântico Sul). 3.2. Atrair Investimento Estrangeiro Nessa campanha à descoberta de novas funções, novos mercados, novas atividades e novas maneiras de realizar as atividades e de olhar o mundo, onde acumulou competências, o investimento direto estrangeiro (IDE), e particularmente as empresas multinacionais, é não só indispensável como permite fornecer escala em atividades que tenham forte procura internacional, empreguem recursos humanos qualificados e permitam a Portugal posicionar-se nas respetivas cadeias de valor. Enquanto isso, as PME e as start ups inovadoras competitividade das empresas portuguesas Em Portugal, o problema está também na incapacidade de se forjar (no passado e porventura no presente) um espaço de cooperação estratégica em torno de uma tripla hélice: governo (e as suas instituições); indústria (em sentido amplo, isto é todos os sectores da economia); e, a universidade (os centros de saber, particularmente as instituições de educação, ciência e tecnologia). E, na verdade, a riqueza e as vantagens competitivas das Nações, na nova era global, assentam cada vez mais na interação, na dinâmica e na inteligência em torno desta hélice tripla. É com inteligência económica e estratégica que esta hélice tripla pode ser instrumentalizada e dinamizada para potenciar uma nova visão e uma nova ambição para a economia portuguesa e para Portugal. Estamos a falar na necessidade de valorizar os nossos recursos, assim como a informação e o conhecimento atinente aos mercados, as parcerias e as redes de conhecimento que as suportam e permitem agir proactivamente, os mecanismos de influência, em particular a diplomacia económica, a gestão da perceção, da inovação e do conhecimento, enfim uma estratégia de poder para nos reposicionarmos na globalização. Para que Portugal possa fazer desta crise uma oportunidade para implementar as transformações estruturais de que carece, e voltar a crescer em novos moldes tem que organizar, como muito bem sintetiza um dos mais prestigiados economistas, Félix Ribeiro (2012), uma “expedição coletiva à internacionalização e globalização. Não pode crescer mantendo o seu foco exclusivamente no que já se exporta a partir de Portugal nem manter uma fixação absoluta na Europa, fazendo mais do mesmo. A presença atual de Portugal nos mercados internacionais é muito vulnerável à concorrência das grandes economias emergentes e a cada vez maior número de economias em desenvolvimento. Por isso tem que diversificar, inovar e subir na cadeia de valor para poder exportar de forma sustentável. Uma política pública de inteligência económica: um instrumento para a 3.1 Dinamizar a Tripla Hélice 193 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 194 fornecerão a variedade. Escala e variedade são as duas componentes chave numa vaga de internacionalização para que seja célere nos efeitos e ponderada no evitar dependência exclusiva de um número restrito de grandes operadores e países. Naturalmente que a atração de investimento direto estrangeiro (IDE) devidamente articulado com os polos de competitividade na economia portuguesa, constitui também a melhor via para se valorizarem os talentos e o conhecimento que foram incorporados na sociedade portuguesa nos últimos quinze a vinte anos numa escala sem precedentes. Refira-se que não existe na história portuguesa recente nenhuma vaga exportadora que não tivesse sido estimulada por uma forte atratividade de IDE. •Reposicionar-se na Globalização significa também estreitar relações de comércio, de investimento, de financiamento, e de transferência de tecnologia com países, regiões e operadores globais que permitam a Portugal: •Aprofundar as relações com o Atlântico Sul e dinamizar a CPLP, mediante uma política de valorização da língua portuguesa, aproveitando o potencial de oportunidades que o “mundo de expressão portuguesa” por si só confere, mas também as que resultarem da aproximação deste com o “ mundo anglosaxónico”, consolidando assim redes mundiais transversais de conhecimento que permitem maximizar a autonomia regional dos países que nelas se envolvem; •Reforçar o relacionamento com as economias mais exigentes e desenvolvidas, como é ocaso dos Estados Unidos e dos países da NAFTA de um modo geral, bem como uma maior diversificação das relações a nível intraeuropeu, excessivamente concentradas em quatro países; •Atrair investimentos que absorvam capital humano altamente qualificado e, e/ou permitam qualificar uma mão de obra jovem e escolarizada, mas sem qualificação significativa; •Atrair investimentos para a valorização da posição geográfica portuguesa, com uma aposta na conectividade internacional, permitindo a Portugal desempenhar funções de interface, ou de plataforma, entre grandes regiões da economia mundial (Europa e Ásia; Europa e América do Norte, Europa e Atlântico Sul). competitividade das empresas portuguesas Para esse reposicionamento na economia global, Portugal dispõe de um conjunto de Ativos de Base e Estratégicos que importa saber valorizar: •Uma língua universal que abrange diversos espaços do mundo, bem como a pertença à comunidade atlântica e o portefólio de conhecimento de mais de 500 anos com quatro dos BRICS (Brasil, Rússia, China, Índia, África do Sul), constitui uma das mais-valias portuguesas, que poderá ser transformada em elemento diferenciador de Portugal no projeto europeu; •Uma posição geográfica periférica na Europa mas localizada no Atlântico quando o Mediterrâneo/Médio Oriente podem caminhar para um período de instabilidade, e nesta perspetiva euro-atlântica, Portugal ocupa uma posição central, que pode e deve potenciar; •Recursos humanos e instituições de ensino superior e de investigação que se foram desenvolvendo nas últimas duas décadas naquele que foi o maior investimento em capital intelectual em Ciência e Tecnologia jamais feito nos últimos séculos em Portugal; •Uma estrutura de indústrias e serviços suficientemente diversificada para acolher e suportar novas atividades; •Recursos naturais, climáticos e ambientais que tornam Portugal atrativo param serviços de acolhimento e lazer, e um território que na sua variedade e património natural e histórico poderia gerar novos produtos ou conceitos no imobiliário residencial e turístico, potenciando o cluster turismo-lazer; •Um território urbano bem equipado e que em várias cidades já oferecem condições de vida muito atraentes, estando dotadas de infraestruturas de saúde, educação, lazer, telecomunicações e acessibilidades; • Um território rural, hoje em muitas zonas relativamente abandonado, que pode ainda ser recuperado para algumas funções agrícolas, juntando inovação e tradição; •Um espaço oceânico em fase de expansão territorial que permite avaliar, desenvolver e explorar no futuro recursos energéticos, minerais e biológicos de grande valor, investindo estrategicamente no hipercluster potencial da economia do mar. •Abundância e diversidade relativas de recursos minerais, incluindo Uma política pública de inteligência económica: um instrumento para a 3.3 Valorizar os Ativos de Base e Estratégicos 195 potencialidades significativas em minerais estratégicos. •Uma rede de portos que deve ser inteligentemente articulada com as rotas comerciais e as rotas energéticas, o que é tanto mais importante quanto é sabido que com o alargamento do canal do panamá a partir de 2014 vai incrementar o comércio na bacia do atlântico, reforçando o papel funcional dos portos portugueses nas ligações à Europa do Norte, e, potenciando igualmente as ligações ferroviárias à Europa. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Considerações Finais 196 Portugal confronta-se com o imperativo inadiável de conjugar uma política rigorosa de saneamento das contas públicas e de ataque às debilidades estruturais mediante um processo contínuo de melhoria das políticas públicas que determinam a qualidade do contexto (condição necessária), com políticas setoriais (condição suficiente) orientadas para a produtividade, a qualidade, a inovação e a competitividade. Para tal impõe-se uma estreita articulação em torno de uma hélice tripla geradora de espaços de cooperação estratégica entre, a indústria (e demais atividades económicas), o governo (e as suas instituições) e as universidades (e demais centros de saber) que permita em tempo oportuno transformar o conhecimento em bens transacionáveis, bem como valorizar os ativos de base e estratégicos, para uma melhor afirmação na economia global. Valorizar o espaço de língua portuguesa subjacente à CPLP como vetor importante de uma estratégia de diversificação de mercados e de internacionalização constitui uma oportunidade para Portugal. No mesmo sentido importa ganhar quotas de mercado nas grandes economias emergentes, particularmente os BRICS com os quais, à exceção da Rússia, Portugal desenvolveu relacionamentos históricos que podem ser uma base para se restabelecer novas relações de confiança. De igual modo se justifica uma política de redimensionamento empresarial que privilegie as estratégias colaborativas (fusões, aquisições, alianças estratégicas, …) para ganhar massa crítica. Um aspeto crítico consiste em reforçar a capacidade de atrair IDE (sobretudo de base tecnológica), nomeadamente investimentos para a valorização da posição geográfica portuguesa que permitam desempenhar funcionalidades importantes no interface entre as grandes regiões da economia mundial (Europa e Asia(s); Europa e América do Norte; e, Europa e Atlântico Sul). E, para isso, é fundamental que exista um espaço de entendimento estratégico em torno de uma visão de futuro, para que a estes Ativos de Base e Estratégicos se acrescentem os fatores de atratividade resultantes de uma política de inteligência económica devidamente focalizada e de reformas estruturais inadiáveis. Se assim for, Portugal revelar-se-á, de novo, com novos alicerces baseados numa economia mais internacionalizada, mais competitiva e mais inovadora. A base instrumental existe. É necessário saber valorizá-la. Neste quadro a inteligência económica é indispensável para pilotar os recursos informacionais do país e também do ponto de vista da gestão estratégica da informação aplicada à conquista de mercados pelas empresas. REFERÊNCIAS Amaral, L. (2008), Economia Tech: Da Indústria à Sociedade da Informação e do Conhecimento, Booknomics, Lisboa Amaral, P. (2008), Top Secret – Como Proteger os Segredos da sua Empresa e Vigiar os seus Concorrentes, Academia do Livro, Lisboa. Besson, B. e Possin, J-C. (1999). Do Serviço de Informação à Inteligência Económica. Instituto Piaget, Colecção: Economia e Política, Lisboa. Daguzan, J.-F. (2004). «Pour en finir avec l`intéligence économique», Intelligence économique ou renseignement?, Défense Nationale, Décembre, (10), pp. 91-104, Paris Farto, M. (2006 b), “Objectivos e tarefas da nova diplomacia económica”, UAL, Janus, nº 9, 3.2, (2), pp.176-177 Farto, M. (2006), A diplomacia Económica Contemporânea, UAL, Janus, nº 9, 3.2, (1), pp.174-175. 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(2002), Estados e Empresas na Economia Mundial, Editora Vulgata, Lisboa 198 Capítulo 9 POR UM NOVO PROFISSIONAL PARA O SETOR DE INFORMAÇÃODOCUMENTAÇÃO: COMPETÊNCIAS E ATITUDES EXIGIDAS PELO MERCADO DE TRABALHO BRASILEIRO José Antonio Moreiro González Waldomiro Vergueiro Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade O 200 s profissionais do setor da Informação e Documentação estão em permanente situação de mudança, devido principalmente às características da própria Sociedade da Informação. A isso não está alheio o ritmo marcado pelas ferramentas técnicas que empregam. As funções que realizam em seus centros de informação diversificaram-se e a profissão deixou de se limitar a um espaço concreto, abrindo-se, com frequência, a áreas decisivas, como o gerenciamento, a comunicação e a informática (FORREST, 2008). Isto ocorre de tal forma, que as próprias ferramentas profissionais utilizadas pelas disciplinas da área de informação envelhecem em curto espaço de tempo, obrigando os profissionais a se preocupar com a aprendizagem contínua, se quiserem continuar competentes nas tarefas que a profissão exige. A Sociedade muda depressa e em algumas áreas do conhecimento essa mudança é mais acelerada. Esta situação supõe uma redefinição, quase contínua, dos limites do mundo da informação-documentação que, de alguma forma, têm impactos nos programas de ensino. Esta situação supõe, também, a proposição de uma nova cultura acadêmica, que leve a uma adaptação nas universidades, tanto do sistema administrativo como de docentes e alunos. Com ela se busca uma convergência do ensino de nossos cursos com o papel social que devemos desempenhar, com a investigação que nos move e, portanto, com a realidade na qual trabalhamos. Nada é mais pernicioso na formação superior para uma especialidade que a dissociação profunda com a realidade social e profissional, ainda que devamos ser prudentes a respeito das modificações, que podem muitas vezes pecar por serem desenfreadas. Estamos convencidos de que os programas de estudo que são ministrados nas universidades formam bem os documentalistas no que diz respeito àquilo que é fundamental nas exigências profissionais. Contudo, não garantem o desempenho de todas as atividades que as empresas ou instituições públicas lhes solicitam. E algumas delas têm tanta força no emprego que é conveniente segui-las de perto. Empregando uma metodologia de gestão semântica do conhecimento, foi desenvolvido um projeto conjunto, entre a Universidade de São Paulo (USP) e a Universidad Carlos III de Madrid (apoiado pela FAPESP), com o objetivo de organizar ontologicamente as competências e habilidades necessárias àqueles que optem pelas vagas trabalho oferecidas. Para isso, foi necessário primeiramente identificar e analizar uma primeira amostra de 200 vagas anunciadas por empresas brasileiras por meio da Internet durante o ano de 2010. Os anúncios eram exclusivamente relacionados com serviços de informação-documentação em empresas e instituições. A amostra serve de exemplo para a mineração de dados (APPLEGATE, R., 2010) e sua análise está sendo ampliada a mais 1800. Este capítulo apresenta, portanto, a primeira amostra de resultados obtidos na fase de coleta de dados e análise de alguns aspectos oferecidos por esses dados. 1. Objetivos Seguiu-se o método descendente (JAGERMAN, 2006) para gerar as classes da taxonomia. Para isso, foi necessário contar com uma estrutura de classificação, à qual foram relacionados os conceitos a serem agregados. Essa estrutura taxonômica foi composta originalmente pelas descrições existentes nos programas das disciplinas ministradas pelo Departamento de Biblioteconomia e Documentação da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP), juntamente com as que constituem as eurocompetências em português (INCITE, 2005). Posteriormente, suas expressões foram revisadas tendo em vista o português brasileiro. Para fins deste capítulo, extraiu-se manualmente o vocabulário contido nos anúncios de trabalho (STARR, 2004), por meio de um processo de busca, identificação e normalização das ocorrências. A identificação dos conhecimentos que eram solicitados nesse tipo de anúncios seguiu as propostas de Cloonan-Norcott (1989) e Brimsek (1991). Tomando-se como parâmetro a primeira estrutura taxonômica, foram selecionadas 200 ofertas de emprego aparecidas durante o ano de 2010 nos portais: competências e atitudes exigidas pelo mercado de trabalho brasileiro 2. Metodologia Por um novo profissional para o setor de Informação-Documentação: Para realizar a taxonomia de competências, é necessário começar por classificar e hierarquizar os requisitos feitos por esses anúncios. Para isso, devem-se cumprir os seguintes objetivos: - Selecionar um corpus de anúncios aparecidos na Web no Brasil; - Tratar os conceitos neles contidos; - Identificar as exigências de contratação por parte das empresas; - Determinar os componentes ocupacionais e os novos perfis demandados. 201 Catho: http://www.catho.com.br/ Portal do bibliotecário: http://www.portalbibliotecario.com.br/. A busca foi feita nos anúncios de perfil profissional cujo título contivesse os termos bibliotecário, arquivista, museólogo ou documentalista. Foram selecionadas apenas aqueles que contassem com descrição de tarefas e competências. Todos os sinônimos encontrados foram aceitos, pois servem para expressar um conceito (CARLSON-NIRENBURGM, 1990). A amostra analizada foi suficiente para fornecer dados que permitem fazer uma primeira projeção das competências e habilidades requisitadas. Durante o processo, verificou-se a correção ortográfica e os campos vazios foram eliminados. Revisou-se também a normalização das formas de entrada nos campos de descrição. A partir daí, passou-se a considerar a informação que era relevante. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 3. As competências mais requisitadas 202 Ao selecionar todos os termos aparecidos nas ofertas, foi possível transferir toda a taxonomia da informação. Assim, ao relacionar todos os sinônimos com seu termo escolhido, foram preparadas as futuras recuperações automáticas, de forma a se atingir uma boa precisão (Z39.19: 2005). Um primeiro comentário nos leva a determinar que o emprego praticamente se estende a todos os setores de atividade (QUINT, 2009). Com somente 200 anúncios, foi possível identificar 23 setores que apresentaram 75 diferentes descrições de empresas. Os setores vão desde a alimentação aos restaurantes de comida rápida, passando pelos serviços mais diversos, os recursos humanos, a construção e até peças de reposição para automóveis. Destaca-se o número de ofertas de emprego em Educação/Idiomas, que alcança 23,5%, reflexo do peso do ensino privado no sistema educativo brasileiro. Também são representativas a demanda relacionada com Informática, setor do qual provêem 19% das colocações, e a das empresas Provedoras de Serviços, 16%. Cerca de 10% ofereceram os Recursos Humanos,enquanto que o agrupamento de ramos Jurídico/Auditoria/ Consultoria teve 7% e a área de Saúde 4,5%. Tabela 1 - Solicitação de experiência 3.1. Conhecimentos mais destacados Esta tabela agrupa em cada entrada uma classe inteira da taxonomia. O termo que define a classe é o que aparece aqui. Em cada uma delas são consideradas as atividades, conhecimentos e tarefas mais concretas e específicas. competências e atitudes exigidas pelo mercado de trabalho brasileiro A necessidade de experiência para obter uma colocação é solicitada em 53 ocasiões para os Arquivos, tanto genericamente, como para arquivos de empresa, escritórios de advocacia, de saúde, e inclusive para o uso de ferramentas Windows em arquivos. Nas Bibliotecas, aparece como exigência 59 vezes, tanto para o exercício profissional como em diferentes atividades, funções e serviços. O caso das bibliotecas escolares é muito destacado. Muitas vezes, também é um diferencial ter trabalhado em escritórios de advocacia. Ou conhecer os procedimentos de avaliação do Ministério de Educação e Cultura, contar com experiência em normalização, na área administrativa o u na Gestão eletrônica de documentos. Somente em quatro vezes é pedida experiência em museus, tanto em práticas administrativas como pedagógicas. Em Documentação, ela apareceu 21 vezes. Por ser uma atividade mais recente no setor, oferece maior variedade de denominações. Assim, gestão da informação e do conhecimento, técnicas de taxonomia e semântica, identificação e modelagem dos processos de negócio e até como Operadores de processamento de documentos. Em vista desses comentários, cabe refletir sobre a importância da experiência para os recém formados, que deverão ser perspicazes para ir com a maior bagagem possível de trabalhos anteriores quando respondam a um processo de contratação. Por um novo profissional para o setor de Informação-Documentação: Fonte: Autores 203 Tabela 2 - Atividades, conhecimentos e tarefas mais solicitadas Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Fonte: Autores 204 Evidencia-se aquí uma atividade mista entre as técnicas tradicionais dos sistemas de informação e as novas tarefas que colocam o profissional como gerador de informação, intermediário nos processos de comunicação, responsável pela imagem e comunicação institucionais e inclusive com participação direta nas atividades de formação e até nos processos de marketing. A formação comercial é um perfil que aparece significativamente no estudo, estando presente nas próprias Técnicas comerciais, mas também na Atenção aos clientes e no Fornecimento de informações. As atividades técnicas comuns mais às diferentes especialidades do setor ocupam grande parte das funções mais requisitadas, em especial as que têm que ver com a atenção aos clientes e usuários, pois, se somamos a elas as atividades próprias de treinamento de usuários, alcançam uma extraordinária importância. Isso é demonstrado pelo fato de que o conjunto de entradas sobre atenção e apoio a usuários e clientes alcançou um índice de 88 ocorrências. Ocupar este lugar de destaque é muito lógico, pois se compreende que, por se tratarem de anúncios provenientes de empresas e instituições, resulta fundamental prestar um bom serviço aos usuários e clientes. Trata-se de garantir a relevância dos produtos de informação que necessitam ou de que façam um emprego correto das buscas, pelo que é essencial que o profissional domine as técnicas de avaliação de recursos e serviços, assim como assegure a qualidade dos serviços prestados (19 ocorrências). A ele podem ser acrescentadas as 25 solicitações para treinamento de usuários em habilidades de informação, em vários casos de aprendizagem das habilidades de recuperação e representação da informação, para competências e atitudes exigidas pelo mercado de trabalho brasileiro Por um novo profissional para o setor de Informação-Documentação: transferi-los à atividade docente e de pesquisa (como defende Tiana, 1997). Não restam dúvidas da importância que tem para as organizações treinar seus membros no uso e na gestão da informação. Mas também os clientes ou usuários externos. O impacto das unidades de informação obriga ao aperfeiçoamento contínuo de nossa prática profissional e ao compromisso com os usuários para a aquisição de habilidades e destrezas na busca e compreensão da informação. Estamos entrando na mercadotecnia, pois se depende do departamento de vendas para solucionar qualquer dúvida dos clientes, mas também de atenção ao que pedem por meio dos pontos de atendimento, para atender às solicitações de informação sobre ofertas de serviços. Diretamente, as técnicas comerciais apareceram em 17 ocasiões. Por trás do bloco de atenção aos usuários aparecem, com notável presença, as técnicas de aquisição, possivelmente por ser um dos pontos mais pedidos nas vagas para profissionais de biblioteca. Logo em seguida vêm as atividades de digitalização de acervos. A necessidade de digitalizar afeta a todos os tipos de empresas e a todas as técnicas de preservação, tratamento e transmissão de informação. Por isso, sua significação nas atuações profissionais apresenta um indubitável crescimento. De caráter mais técnico é a seção que agrupa as tarefas de Organização, conservação e preservação (coincidindo com o afirmado por Heimer, 2002). Também é muito relevante a ocorrência do contexto legal e administrativo da atividade profissional, que integra conhecimentos sobre estrutura, funcionamento, missão, políticas, objetivos, produtos e serviços das unidades de informação. Outra exigência destacada é a preparação para a Gestão de recursos humanos, característica dos níveis de maior responsabilidade. Aparece como enfoque desejável associar a visão estratégica com uma excelente gestão de recursos humanos. A visão estratégica associada ao conhecimento da indústria e à intuição de mercado são as únicas formas de determinar que qualificações e capacidades serão necessárias no futuro. Além disso, será necessário que a organização saiba quais são as capacidades de cada pessoa e como relacionar os investimentos em recursos humanos com as habilidade e o conhecimento necessários. Constata-se, assim, que o futuro dos profissionais da informação dependerá do valor que possam agregar à sua instituição (como defendeu Barden, 1997). De forma que deverão estar muito capacitados: •Nas habilidades tecnológicas e na gestão de sistemas de informação. •Na atenção próxima e eficaz às necessidades dos usuários. •No armazenamento, na gestão e na recuperação dos suportes de informação. 205 Especialmente para cumprir esta última e ampla capacitação de nível operacional estariam as exigências das empresas no que se refere aos processos de gestão, avaliação, seleção, catalogação e descrição, classificação, organização, circulação e empréstimo, indexação e resumo. Cada um desses processos vem determinado pelo tipo de empresa no qual se levará a cabo, com normativas específicas e tratamento diferenciado conforme se trate de arquivos, bibliotecas, centros e documentação e inclusive de museus. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Tabela 3 - Processamento técnico 206 Fonte: Autores Esta tabela atende à solicitação de tarefas mais concretas, com uma presença marcante das técnicas operacionais profissionais. As entradas mostram uma relação imediata com os programas dos cursos de graduação na sua atenção às disciplinas técnicas. Sobre elas se baseia a estrutura da profissão, pois concedem as capacidades relacionadas com o tratamento e processamento documental. No âmbito das Tecnologias da Informação, o conhecimento mais solicitado foi o de Sistemas automatizados de informação. Conjuntamente ao saber manipular automaticamente os dados nos diferentes processos técnicas, aprecia-se a habilidade técnica e a boa compreensão das ferramentas informáticas para dominar o ambiente tecnológico e os processos em transformação. Daí a necessidade de saber disseminar informação por meio da Internet e de organizar informação em bases de dados. Estas habilidades exigem também dominar as técnicas multimídia, saber navegar pelas redes de comunicação e conhecer em profundidade as normas, formatos e métodos normalizados de descrição, apresentação e transmissão. Trata-se, em conclusão, de saber gerenciar os conteúdos e a edição de bases de dados em linha, tanto para Internet como para Intranet (MOREIRO, 2009). Sem esquecer que o ambiente tecnológico profissional requer saber aplicar o Software documental, com reiteração para o caso do programa Pergamum. Tabela 4 - Conhecimentos destacados em tecnologias da informação. Se relacionarmos estas exigências com as habilidades em Ofimática e com a desenvoltura para trabalhar com Linguagens de Programação, vê-se com clareza como está aumentando o peso dos conhecimentos informáticos, cada vez mais para além do que se pediria a um usuário de informática comum. Nesse sentido, é particularmente significativa a presença de onze solicitações de conhecimento sobre “Técnicas de edição Web”. Encarregar-se da gestão dos conteúdos e de seu posicionamento na Web requer um compromisso de atualização constante, pois sua visibilidade reflete de imediato na empresa ou entidade que se vê representada na arquitetura escolhida e nos conteúdos expostos. Cremos que a ocorrência de casos nesta seção é muito escassa ainda, como se deduz dos resultados deste mesmo projeto para o caso espanhol, no qual foi a tarefa mais solicitada e que reflete um perfil de atividade estreitamente unido às tarefas informáticas (MOREIRO, 2009). Talvez estejamos deixando alguns setores de atividade (Arquitetura Web, Posicionamento SEO,…) para os informáticos. Vemos esses setores com uma atitude bastante negativa, quando na realidade entram em cheio em nossas tarefas por se tratar da criação, manutenção e atualização de conteúdos. Existem âmbitos fronteiriços nos quais competências e atitudes exigidas pelo mercado de trabalho brasileiro Fonte: Autores Por um novo profissional para o setor de Informação-Documentação: 207 sempre iremos competir com outros profissionais e devemos fazer isso sem medo, desde que contemos com a preparação necessária. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 4. Atitudes Instrumentais 208 Trata-se de destrezas e habilidades cuja posse devem demonstrar aqueles que se candidatem a uma das colocações de trabalho convocadas (RUÉ, J., 2007). Englobam a “capacidade de análise e síntese”, com uma escassíssima presença de só quatro entradas em todo o corpus de anúncios; assim como a “capacidade de organização”, que é solicitada em dez ocasiões; e a “capacidade de comunicação oral e escrita”, cuja importância se destaca ao aparecer 19 vezes. Sem dúvida, o avançado conhecimento tecnológico e o domínio de outras línguas, além do domínio da técnica, fazem com que o salário possa dobrar em relação às demais ofertas de colocações. No conhecimento de línguas estrangeiras, deve-se salientar a importância do domínio fluente do inglês. Sua ocorrência de máxima exigência é três vezes maior que os casos de espanhol. O emprego correto do inglês resulta definitivo na hora de optar pelas melhores propostas salariais e de trabalho (já comprovado em Duarte, 2010). Se expressar em inglês está se tornando um requisito comum, dominá-lo és conclusivo para alcançar as vagas mais desejadas. Se, além disso, coincide com um espanhol avançado, a vantagem é grande. Tabela 5 - Colocações mais bem remuneradas. Fonte: Autores A oferta de emprego para os profissionais da Informação-Documentação pode vir de qualquer setor de atividade empresarial e institucional. Muitos anúncios solicitam experiência aos candidatos. A solicitação pode se fazer com relação a trabalhos prévios em arquivos, bibliotecas ou centros de documentação em geral, ou especificando a especialidade desses centros, assim como as tarefas e atividades nas quais se tem conhecimento prévio. Se avaliamos os requisitos que aparecem nos anúncios analisados, pode-se inferir as principais competências que os estudantes devem adquirir na Universidade para sair dela competências e atitudes exigidas pelo mercado de trabalho brasileiro Considerações Finais Por um novo profissional para o setor de Informação-Documentação: A metade destas colocações exige experiência nas atividades e serviços a serem desempenhados, três o fazem em tarefas de coordenação e gestão, assim como outras duas no uso de sistemas informáticos. O conhecimento em Programação, o desenho Web ou o domínio técnico de sistemas, junto a outros requisitos em tecnologias da informação são uma garantia para qualquer empresa. Ainda assim, pede-se um bom conhecimento da gestão empresarial em quatro casos, em três coordenação e execução de pesquisas e projetos, e inclusive uma pede um alto nível na prática técnica (como viu antes Fallis, 2008). Em sete ocasiões é exigida a capacidade e coordenação e de supervisão dos processos técnicos, assim como o conhecimento das normas internacionais do setor (OLIVEIRA, 2006). Muita importância é concedida à capacidade de comunicação oral e escrita, assim como ao domínio de línguas estrangeiras, de forma que, entre seus requisitos, repete-se dominar a expressão oral e escrita em português ou espanhol, e de maneira destacada em inglês. Quando não também noções de inglês, espanhol ou francês. Inclusive, uma dessas colocações é para um “Bibliotecário bilíngue”. Anteriormente se falou também das habilidades informáticas. Sua presença é alta e diversificada. Nas 63 entradas sobre esses aspectos os bons conhecimentos informáticos em geral são apreciados, mas também os relacionados com produtos específicos, como Prolink, Excel, Adobe, ou o pacote do Office. Com respeito às competências pessoais, destacam-se nos anúncios a “Capacidade de comunicação interpessoal”, com doze ocorrências. Seguem-se a “Formação para ações pedagógicas”, com nove, e o “Trabalho em grupo”, com seis. No caso das competências sistémicas, aparecem oito vezes “Iniciativa”, três “Atenção aos clientes” e “Liderança”, duas “Criatividade”, e uma vez “Flexibilidade”. 209 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 210 com um nível aceitável de atividade profissional: A preparação técnica que permita realizar com desenvoltura as atividades e funções mais próprias do setor. Neste sentido, destaca-se quando tem que ver com a atenção e treinamento de clientes e usuários, com as técnicas de aquisição e com os processos de digitalização. Em especial, o tratamento e gestão de suportes digitais ocupou um amplo espaço dos anúncios, pelo que se conclui que têm que ser atendidos com maior importância nos programas dos cursos de graduação. Outro grupo notório aproxima as tarefas de Organização, Conservação e Preservação dos acervos. Assim como a atenção aos conhecimentos sobre o contexto legal e administrativo da profissão. Continuam a ter a importância de sempre as técnicas de tratamento, como catalogação, descrição, indexação, resumo, classificação, arquivo, gestão e desenvolvimento de coleções… As tecnologias da informação aparecem como ferramentas e processos imprescindíveis. No que diz respeito a elas, solicita-se desde o domínio da ofimática até um emprego avançado da tecnologia, com clara vantagem dos programas e serviços automatizados relacionados com os sistemas de informação. E se destaca também a importância do desenho e criação de páginas web, assim como contar com um nível notável de usuário em Internet ou ser especialista na criação, gestão e manipulação de bases de dados, junto à presença de ambientes tecnológicos concretos. Outro fator decisivo é conhecer a organização e gestão empresarial. Tanto para as tarefas de gestão de processos e de recursos humanos, como de organização eficaz das unidades de informação, assim como para integrá-las ativamente na gestão das empresas a que servem. Alcança grande destaque o trabalho nos Centros de documentação de negócios e na gestão de projetos, para os quais se necessita dominar as técnicas de apresentação e elaboração de propostas. Aparece um novo profissional gerador, por vezes intermediário, nos processos de informação e comunicação, que participa diretamente na gestão das empresas e nas atividades de formação. A visão estratégica vem associada ao conhecimento da indústria e à intuição das linhas que seguirá o mercado, como únicas formas de determinar que qualificações e capacidades serão necessárias no futuro. Devido à especialização nas atividades desenvolvidas, os candidatos necessitam ter conhecimentos específicos de natureza pedagógica, jurídica, económica, de saúde… Pode-se notar um grupo de aptidões provenientes das relações humanas, das atitudes sociais e da comunicação interpessoal. Entre elas a capacidade de comunicação, a facilidade para as relações públicas, o domínio da expressão oral e escrita, assim como o conhecimento de línguas estrangeiras, particularmente do inglês. Além de outras atitudes ALMEIDA, O. F. de. Formação, formatação: profissionais da informação produzidos em série. Valentim, M. L. P. (Org.). Formação do profissional da informação. São Paulo: Polis, 2002. p. 133-148. APPLEGATE, R. Job ads, jobs, and researchers: Searching for valid sources. 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FUJINO, A.; LARA, M.; AMARO, R.; VERGUEIRO, W.; TEJADA, C.; MOREIRO, J. A. Perfil profissional e competências de informação em Biblioteconomia e Documentação: pesquisa competências e atitudes exigidas pelo mercado de trabalho brasileiro REFERÊNCIAS Por um novo profissional para o setor de Informação-Documentação: de caráter pessoal e de outras habilidades criativas que marcam a idoneidade para os postos oferecidos. Os anúncios supõem que os candidatos possuem uma série de qualidades técnicas adquiridas entre as competências básicas que outorgam os cursos universitarios, mas além disso lhes pedem, em geral, um alto manuseio da tecnologia e a adaptação a sua evolução, bem como conhecimento da ofimática e seu software mais habitual, experiência em ambientes tecnológicos concretos, um nível cultural próprio de quem passou pela universidade e, em exigência crescente, um bom domínio de idiomas. Não se observa uma demanda importante por um dos aspectos mais peculiares de nossa profissão, aspecto esse derivado de seu caráter de aplicação social. De fato, resulta estranho não encontrar maior representação das competências sociais e políticas, que refletem a função que os sistemas de informação devem cumprir no fomento da educação, da cultura e do desenvolvimento. Escasseia, por tanto, a demanda por aquelas atitudes de sensibilidade em relação ao comportamento com a comunidade a que se atende, de ética profissional e de compromisso social que o mundo atual parece reclamar, tal como identificou Valentim (2000). Pelo contrário, existem referências à responsabilidade e ao trabalho em equipe. 211 com egressos da ECA/USP. CONGRESSO BRASILEIRO DE BIBLIOTECONOMIA E DOCUMENTAÇÃO, 22, Brasília, 2007. Anais. Brasilia: FEBAB, 2007. INCITE. European council of Information Associations (ECIA). Euroreferencial I-D. Volume I. 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De acordo com Nonaka & Takeuchi, a Gestão do Conhecimento prevê a existência de quatro formas de conversão do Conhecimento (socialização, externalização, combinação e internalização) que se revelam essenciais para que a sua implementação na organização tenha êxito. Os principais objetivos desta disciplina prendem-se com a organização de um ambiente positivo onde a criação, a transferência e o uso do Conhecimento sejam valorizados, com a conceção de repositórios de Conhecimento, e com a melhoria no acesso à Informação e ao Conhecimento. A revisão bibliográfica realizada para este trabalho, explorada mais adiante, permite concluir que, de uma forma global, a abordagem à Gestão do Conhecimento é mais evidente no âmbito empresarial, mas tem-se assistido, nos últimos anos, a uma gradual preocupação das instituições públicas com esta área, atentas à modernização administrativa e à satisfação dos cidadãos, que passaram a ver vistos como clientes e não meros utentes, o que veio alterar as prioridades, a abordagem, e as políticas administrativas. Por outro lado, o próprio cidadão está mais consciente dos seus direitos e exige serviços públicos de qualidade, eficientes e transparentes. É neste contexto de mudança de paradigma que se enquadra este trabalho, que visa não só contribuir para a investigação na área da Gestão do Conhecimento em organismos públicos, como estudar a aplicação dos seus fundamentos numa organização concreta, a Câmara Municipal de Viseu. Assim, pretende-se analisar o impacto das práticas de modernização administrativa e da utilização de Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) na instituição referida, e apresentar propostas que integrem e potencializem as ferramentas existentes. Tais propostas visam constituir o ponto de partida para uma nova abordagem da Gestão da Informação e do Conhecimento na Câmara Municipal de Viseu. A constatação de que transformar o volume de Informação produzido em Conhecimento é um dos desafios que se impõe às organizações, que o acesso ao Conhecimento por parte dos decisores é uma das premissas da Gestão do Conhecimento, Municipal de Viseu A revisão da literatura permitiu verificar que dentre os autores que refletem sobre o tema, uma grande parte começa por expor os conceitos de Dado, Informação e Conhecimento de uma forma estratificada, referindo que a análise dos Dados (por exemplo tabelas, gráficos e relatórios) pode dar origem à Informação que, por sua vez, quando devidamente aplicada, se converte em Conhecimento. O Conhecimento é apresentado, desta forma, como algo mais do que Informação, porque envolve o entendimento obtido através da experiência e da aprendizagem (Martins, 2010, 17). Nesta linha, Almeida (2007) refere que os Dados são factos, descrevem acontecimentos, mas não os interpretam. Os mesmos convertem-se em Informação quando lhe são atribuídos significados, quando se associam a algo e se contextualizam. O Conhecimento ocorre quando se compreendem as relações de padronização entre os Dados e a Informação, assim como as suas implicações. com contributos para a Gestão da Informação e do Conhecimento na Câmara 1. Os Fundamentos da Gestão do Conhecimento Informação, Conhecimento e Serviço Público: Um estudo de caso exploratório e que a classificação arquivística se pode considerar um processo de organização da Informação e do Conhecimento leva-nos a propor (i) a conceção de um portal corporativo que congregue as várias ferramentas colaborativas e que possibilite uma fácil partilha da Informação/Conhecimento a todos os interessados e (ii) a criação de uma unidade de missão para a gestão do arquivo corrente e, consequentemente, a elaboração de um instrumento que promova o acesso direto à Informação e indireto ao Conhecimento - um plano de classificação parcial para o arquivo corrente, considerando que a organização investigada não dispõe, neste momento, de nenhum. De referir que, estruturalmente, este trabalho divide-se em três partes. Na primeira parte concretiza-se o enquadramento teórico-científico da Gestão do Conhecimento. Apresenta-se a revisão bibliográfica efetuada, acentuando os conceitos implícitos, os objetivos, a relevância e os sistemas de suporte da Gestão de Conhecimento. Na segunda parte são referidos alguns elementos subjacentes à modernização administrativa em curso nas últimas décadas, e apontados exemplos da aplicabilidade dos fundamentos da Gestão do Conhecimento em organismos públicos. Na terceira e última parte apresenta-se o estudo de caso realizado na Câmara Municipal de Viseu, que começa com a caraterização da organização em análise e finaliza com a apresentação de propostas que, espera-se, vão ao encontro de uma mudança positiva na cultura organizacional, e contribuam para a criação, partilha, acesso fácil e célere da Informação e do Conhecimento. 215 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 216 A mesma perspetiva é-nos dada por Sarmento & Correia (2002), que descrevem Dados como registos, que se transformam em Informação quando contextualizados e interpretados. Por sua vez, a associação entre os Dados e a Informação é suscetível de gerar Conhecimento. Apesar de os Dados, intrinsecamente, não apresentarem significado nem interpretação, são a base para criar Informação. A combinação e a organização de determinados Dados permitem a obtenção de Informação que se transforma em Conhecimento quando imbuída de interpretação, reflexão e síntese (Pinheiro, 2007, 61). Cong & Pandya (2003, 26) referem que os conceitos de Dado, Informação e Conhecimento são vulgarmente confundidos, apesar de possuírem significados diferentes. Os Dados são entendidos como meros factos, que apenas ganham valor quando são processados e, quando isso acontece, convertem-se em Informação. O Conhecimento é entendido como Informação relevante, com significado, que resulta de comparações, da identificação de consequências e de conexões. Os Dados e a Informação diferenciam-se pelo tipo de organização, e a Informação e o Conhecimento distinguem-se pelo teor de interpretação. De referir que estes autores acrescentam um quarto elemento: a Sabedoria (Wisdom), que é a consequência do Conhecimento acumulado. Desta forma, é estabelecido um processo contínuo entre os Dados, na base, e a Sabedoria, no topo, da pirâmide. Outros conceitos que importa discutir, porque são operacionalizados neste trabalho, são os de Gestão de Documentos, Gestão da Informação e Gestão do Conhecimento. Refira-se que se entende por Gestão de Documentos a execução de determinadas tarefas que compreendem todas as fases do ciclo de vida dos documentos, tendo por objetivo a eficiência e a eficácia na criação, avaliação, aquisição, organização, preservação, acesso e comunicação de arquivos (Portugal, 1997). Por seu lado, a Gestão da Informação apresenta-se como um conjunto de operações que tem por objetivo, numa primeira fase, o reconhecimento das necessidades da organização ao nível da Informação para, numa fase posterior proceder-se à sua recolha, organização, custódia e distribuição, tendo em vista o apoio à tomada de decisão e ao desenvolvimento de atividades rotineiras. Desta forma, a Gestão de Documentos prende-se com a realização de determinadas tarefas, tendo por objetivo a organização, a preservação, a comunicação, a avaliação, a seleção e a eliminação de documentos, e a Gestão da Informação com ações de diagnóstico de necessidades de Informação e com o armazenamento e o acesso à Informação produzida e recebida pela organização. Choo (2003) entende por Gestão da Informação “a gestão de uma rede de processos que adquirem, criam, organizam, distribuem e utilizam Informação” (Choo, 2003, 20). O autor salienta que o seu objetivo é transformar Informação em Conhecimento, abrangendo processos, recursos e tecnologias. Ainda faz uma interessante analogia com o corpo humano, referindo que o objetivo da Gestão da Informação é criar procedimentos que funcionem como o sistema circulatório, ao selecionar e difundir a informação importante, e como o sistema nervoso, ao sintetizar a informação que é introduzida, transformando-a em valor para a organização (Choo, 2003, 326). A Gestão do Conhecimento, por outro lado, visa a criação, a aquisição, a partilha e a utilização de ativos de Conhecimento, que auxiliem na tomada de decisões, na criação de ideias e na resolução de problemas da organização, representando, pois, um passo adiante, nos processos e objetivos institucionais. Municipal de Viseu com contributos para a Gestão da Informação e do Conhecimento na Câmara Inicialmente, cumpre referir que o conceito de Conhecimento é indissociável do autor Michael Polanyi (1881-1976), figura incontornável na área e uma das referências teóricas mais relevantes no âmbito do desenvolvimento do conceito. Na obra The Tacit Dimension (Polanyi, 1966), o autor refere a importância do Conhecimento tácito, isto é, o tipo de Conhecimento que possuímos mas não conseguimos explicar, ideia que expressa na emblemática frase we know more than we can tell (Polanyi, 1966, 4). Polanyi (1966) foi o primeiro investigador a debater, a desenvolver e a constatar a importância decisiva deste tipo de Conhecimento, que descreveu como pessoal e de difícil comunicação, em oposição ao Conhecimento explícito, que é sistematizado e pode ser formalizado em textos, desenhos, bases de dados ou publicações. Por influência de Polanyi, Nonaka & Takeuchi reconhecem, em definitivo, a diferença entre Conhecimento tácito e Conhecimento explícito, acentuando a importância da sua gestão, como se verifica na obra The Knowledge Creating Company (Nonaka & Takeuchi, 1995). Segundo os autores, ambas as definições do Conhecimento complementam-se. Enquanto o Conhecimento explícito pode ser transmitido numa linguagem sistemática e formal, estando contido em manuais e normas, o Conhecimento tácito é aquele que o individuo possui, mesmo que não tenha consciência de que o detém. É obtido pela experiência, sendo comunicado, indiretamente, por metáforas e analogias. Nonaka & Takeuchi (1995,15) afirmam que a criação do Conhecimento organizacional acontece na conversão do Conhecimento tácito em explícito, e deste em Informação, Conhecimento e Serviço Público: Um estudo de caso exploratório 1.1 A relevância da Gestão do Conhecimento 217 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 218 tácito, e identificam os protagonistas desse processo, defendendo que não deve haver um determinado setor responsável pela sua conceção, atribuindo a todos os colaboradores um papel, pois o Conhecimento é um produto que resulta da interação entre todos. Identificam os trabalhadores de primeira linha, que se preocupam com os detalhes de determinados produtos, mercados e tecnologias; os gestores de topo, que produzem instrumentos orientadores; e os gestores intermédios que sintetizam o Conhecimento tácito, a partir destes dois grupos, transformando-o em Conhecimento explícito e incorporando-o em novos produtos e tecnologias. Deste modo, a criação de Conhecimento organizacional é fruto da conversão do Conhecimento tácito em explícito, e vice-versa, num processo em espiral (Figura 1), que envolve tanto a dimensão epistemológica (que pressupõe quatro modos possíveis de conversão entre os dois tipos de Conhecimento: socialização; externalização; combinação e internalização) como a dimensão ontológica (que prevê quatro níveis de agentes criadores de Conhecimento: o indivíduo; o grupo; a organização e o nível interorganizativo). Nonaka & Takeuchi desenvolveram o processo em espiral - Socialização, Externalização, Combinação e Internalização (SECI) -, para explicar a criação do Conhecimento através das quatro formas de conversão entre o Conhecimento tácito e o Conhecimento explícito (Martins, 2010, 41-43): (i) a Socialização (de Conhecimento tácito para Conhecimento tácito), que pressupõe a aquisição de Conhecimento através da experiência; (ii) a Externalização (de Conhecimento tácito para Conhecimento explícito) onde o Conhecimento pode ser partilhado (através da reflexão ou diálogo) por outros indivíduos, gerando novo Conhecimento; (iii) a Combinação (de Conhecimento explícito para Conhecimento explícito), que acontece quando o Conhecimento explícito é processado de forma a ser distribuído por outros indivíduos; (iv) a Internalização (de Conhecimento explícito para Conhecimento tácito), que acontece quando o Conhecimento explícito é distribuído por todos os membros de uma organização, convertendo-se em Conhecimento tácito, podendo iniciar uma nova espiral de criação de Conhecimento. No âmbito da definição de Conhecimento, referimos, ainda, a perspetiva de Choo (2003, 281) que, além do Conhecimento tácito e do Conhecimento explícito, reconhece o Conhecimento cultural como algo fundamental para obter a coesão organizacional. Deste fazem parte as convicções e os pressupostos, as convenções e as expectativas, aspetos necessários “para atribuir valor e significado a Informação e Conhecimentos novos” (Choo, 2003, 281). Figura 1 – Espiral do Conhecimento de Nonaka & Takeuchi Municipal de Viseu com contributos para a Gestão da Informação e do Conhecimento na Câmara Para o autor, a organização inteligente será aquela que consegue congregar e gerir estas três formas de Conhecimento. Será uma “organização aprendente” que se propõe atingir os objetivos num ambiente competitivo e em mudança, ajustando a sua conduta ao autoconhecimento e à perceção do universo onde atua. Mentzas, Apostolou, Abecker & Young (2003) referem que, na atual economia do Conhecimento, grande parte das organizações dependem do desenvolvimento, utilização e distribuição de competências baseadas no próprio Conhecimento, para manter o seu valor e competitividade. Cada vez mais, as organizações necessitam de desenvolver estratégias, processos e instrumentos para a criação, transferência e desenvolvimento deste que vem sendo considerado como o principal recurso estratégico do futuro. O desafio é encontrar soluções que auxiliem as organizações a desenvolver, a beneficiar e a gerir o imenso potencial do seu Conhecimento, para que criem novos instrumentos e medidas para a sua reinvenção e inovação, de forma a destacarem-se no contexto. Neste sentido, consideram que tanto o Conhecimento explícito como o Conhecimento tácito são importantes e trazem valor para a organização. É do resultado da conversão do Conhecimento tácito em explícito e do Conhecimento explícito em tácito que surgem a criatividade e a inovação na organização. Drucker (1993), ao descrever a sociedade pós-capitalista, também enfatiza o Conhecimento, apresentando-o como o recurso económico básico das organizações, deixando para segundo plano os recursos tradicionais (trabalho, capital e recursos Informação, Conhecimento e Serviço Público: Um estudo de caso exploratório Fonte: www.dgz.org.br 219 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 220 naturais). Para o autor, na “Sociedade do Conhecimento” o valor assenta na inovação e na produtividade, e os principais grupos sociais são os “trabalhadores do Conhecimento”, os “profissionais do Conhecimento” e os “empregados do Conhecimento”. O Conhecimento é, assim, segundo o autor, a nova base da concorrência nessa sociedade. Davenport & Prusak (1998) afirmam que o elevado interesse pela área do Conhecimento deve-se a diversos fatores, nomeadamente à constante mudança, à competitividade, à exigência dos consumidores, o que leva as organizações a procurarem a vantagem que lhes permitirá sobressair. Martins (2010) refere que o sucesso é possível numa “organização aprendente”, isto é, aquela que utiliza o Conhecimento de todos os colaboradores e o partilha pela restante organização. E o processo de transferência do Conhecimento revela-se, pois, fundamental para a aquisição de vantagem competitiva. Este reconhecimento da importância do Conhecimento para a inovação e mudança organizacionais, partilhada por diferentes autores, vai estar na base dos projetos e iniciativas de Gestão do Conhecimento, em crescimento desde o início dos anos noventa do século passado. No que respeita à evolução da área, Bustelo Ruesta & Amarilla Iglesias (2001) referem que o conceito de Gestão do Conhecimento não é recente. Os fundamentos desta disciplina foram abordados, pela primeira vez, nos finais do século XIX pelo economista Alfred Marshall. No entanto, o desenvolvimento deste tipo de gestão nas organizações apenas se torna uma realidade com a inovação tecnológica e com a Internet. Entretanto, de acordo com Silva (2002), foi a partir da década de oitenta que a relevância dada ao estudo da Gestão do Conhecimento se intensificou, em parte graças ao advento do conceito de “Sociedade do Conhecimento” e de abordagens relacionadas com a gestão estratégica e a aprendizagem organizacional. Efetivamente, a transformação gradual da sociedade numa “Sociedade do Conhecimento” coloca às organizações novos desafios e a necessidade de garantir uma melhoria contínua tendo por base a inovação. Denota-se que as transformações e as inovações tecnológicas estão a obrigar as organizações a operar rápidas mudanças nas suas estruturas, a repensar as estratégias de negócio, as formas de gestão e de redes de relacionamento, para manterem-se competitivas e adaptadas às características dessa nova sociedade. No âmbito deste estudo, a pesquisa bibliográfica realizada sobre a Gestão do Conhecimento permitiu verificar a existência de vários pontos de vista e abordagens de Municipal de Viseu com contributos para a Gestão da Informação e do Conhecimento na Câmara Informação, Conhecimento e Serviço Público: Um estudo de caso exploratório autores de diferentes nacionalidades, vocações ou formações académicas que, de uma forma geral, destacam a crescente importância do Conhecimento no âmbito das organizações. De acordo com as suas asserções, a Gestão do Conhecimento apresenta-se como uma maisvalia para as organizações. Terra (2011), por exemplo, indo na linha dos autores previamente referenciados, menciona que a gestão proactiva do Conhecimento assume, atualmente, um papel fulcral na competitividade das empresas e dos próprios países, sendo esta uma perspetiva diferente daquela que era praticada no passado e que assentava em fatores como a localização, a acessibilidade da mão-de-obra, a existência de recursos naturais e a disponibilidade do capital financeiro. De acordo com o autor, a Gestão do Conhecimento tem um carácter universal (aplica-se a qualquer organização), e promove a participação ativa, a comunicação da administração, a mudança nos processos, nas estruturas, nos sistemas de informação e no incentivo individual e coletivo. Deste modo, a Gestão do Conhecimento pode ser uma mais-valia para as organizações, podendo aumentar a capacidade de gerar, difundir e armazenar Conhecimento (Terra, 2011). Rossetti, Pacheco, Salles, Garcia & Santos (2008) também salientam a importância da Gestão do Conhecimento e afirmam que as mudanças operadas na “Sociedade do Conhecimento” atingem diretamente as organizações, obrigando-as a repensar as estruturas, as estratégias de negócios, as formas de gestão e as redes de relacionamento. De acordo com os autores, no âmbito do projeto organizacional, é fulcral o papel dos indivíduos e da tecnologia, apresentando-se as organizações, desta forma, como sistemas sociotécnicos, nos quais o capital humano passa a ser, cada vez mais, valorizado. Pérez-Montoro Gutiérrez (2003) alerta para o facto de estarmos perante a globalização dos mercados, um cenário em que as empresas se veem forçadas a criar novas políticas de aliança e de cultura organizativa para conseguirem adaptar-se a este novo e competitivo ambiente. Desta forma, os ativos intangíveis apresentam-se como um valor acrescentado, podendo garantir o bom funcionamento e a sobrevivência das empresas num mercado globalizado. É neste contexto económico que surge, de acordo com o autor, a Gestão do Conhecimento, uma disciplina responsável, entre outros, pela conceção e implementação de um sistema que visa capturar e partilhar, sistematicamente, o Conhecimento de uma organização, de forma a ser convertido num valor para essa mesma organização. De uma forma geral, o Conhecimento torna-se num valor para a organização quando contribui para a persecução dos objetivos. 221 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 222 Mentzas, Apostolou, Abecker & Young (2003) referem que a Gestão do Conhecimento pode ser considerada como uma nova disciplina que visa permitir que indivíduos, equipas e organizações, de forma coletiva e sistemática, criem, partilhem e apliquem os ativos de Conhecimento, de forma a atingir a eficiência, a agilidade, a competência e a inovação organizacionais. Para os autores, a Gestão do Conhecimento é a chave para a inovação, para a produtividade e para o crescimento. De qualquer modo, cumpre ressalvar que as referidas opiniões sobre a Gestão do Conhecimento não são de todo pacíficas nem generalizadas. Bustelo-Ruesta & Amarilla Iglesias (2001) referem que existe alguma controvérsia, diferentes interpretações e definições, e aproveitamento comercial à volta da Gestão do Conhecimento, o que levou autores a apelidarem este tipo de gestão de uma contradição, de uma moda, que não traz nada de realmente novo. Pollard (2003) reflete sobre a temática e apresenta uma abordagem crítica sobre a Gestão do Conhecimento. De acordo com o autor, esperava-se que a Gestão do Conhecimento fosse capaz de melhorar, entre outros, o crescimento e a inovação nas organizações, a produtividade, e o relacionamento com os clientes, mas, segundo ele, apesar de o conceito ser bom e as expectativas serem altas, a sua aplicação prática, de algum modo, falhou. Para o autor, a razão para esse insucesso foi a expectativa, demasiado alta e irrealista, de que o comportamento humano organizacional poderia ser alterado, de forma positiva, ao convencer as pessoas da relevância da captura, da partilha e do arquivo do Conhecimento. Para Pollard (2003), a Gestão do Conhecimento ainda não provou ser um elemento crítico ou uma chave diferenciadora, no que respeita ao conhecimento do mercado, do negócio e das necessidades dos clientes e funcionários e ainda não demonstrou nenhuma vantagem competitiva para as organizações que investiram nela. Contudo, não existe unanimidade, já que há autores que apresentam a Gestão do Conhecimento como um elemento chave na competitividade das organizações. Almeida (2007, 50), por exemplo, refere que a Gestão do Conhecimento oferece vantagens de diferenciação que advêm do capital intangível, decorrente da criatividade, da aptidão, do instinto e da agilidade. A Gestão do Conhecimento está em consonância com a realidade da sociedade atual, mais universal e interativa, e caracteriza-se por privilegiar o Conhecimento, a criatividade e as aptidões dos trabalhadores, características importantes para conseguir a vantagem competitiva. A Gestão do Conhecimento deverá permitir a criação de competências e de valor. Almeida (2007, 60) enfatiza a importância das organizações usarem o Conhecimento como Municipal de Viseu com contributos para a Gestão da Informação e do Conhecimento na Câmara Informação, Conhecimento e Serviço Público: Um estudo de caso exploratório recurso estratégico e vantagem competitiva. Cabe aos gestores reconhecer os recursos e as aptidões singulares, promover novas ideias, assim como a criatividade, o talento e a inteligência emocional. Neste processo é também fundamental a correta utilização das TIC, preservar o Conhecimento, distribuir experiências e saberes, e incorporar as organizações em rede, onde o Conhecimento é partilhado e aperfeiçoado. Pina (2010) identifica na bibliografia relacionada com a Gestão do Conhecimento os benefícios que a sua prática pode trazer para a organização. O autor refere os três elementos de mudança em que assenta cada benefício da Gestão do Conhecimento: o Conhecimento; a tomada de decisão; e a execução de tarefas. Do ponto de vista dos colaboradores, os benefícios da Gestão do Conhecimento traduzem-se na partilha do Conhecimento, no processo de recompensa (financeiro ou não), e no reconhecimento da organização, no status. De uma forma geral, os benefícios que podem advir da sua prática são o aumento da competitividade; a eficiência na tomada de decisão; a melhoria da resposta ao cliente; a motivação dos trabalhadores; a melhoria da eficiência dos colaboradores, das operações, dos serviços e dos produtos; e a inovação. Outra perspetiva é-nos dada por Cong & Pandya (2003, 27) que referem que um dos objetivos da Gestão do Conhecimento é perceber o que deve ser partilhado, como, e com quem. Desta forma, a partilha do Conhecimento ganha importância quando este é utilizado e reutilizado. A Gestão do Conhecimento produz valor quando existe um ambiente de confiança e motivação que permite a partilha e utilização do Conhecimento, quando existem processos para o localizar e criar e quando há tecnologia que permite o seu armazenamento, localização e partilha, de forma a alcançar os objetivos de uma determinada organização. Como fica demonstrado, apesar de verificarmos alguma contracorrente, de uma forma global, os autores consultados enfatizam a importância da Gestão do Conhecimento para a inovação e mudança organizacionais, identificando três dos seus elementos chave: os indivíduos, os processos e a tecnologia. Em relação a este último, julgamos importante referir o estudo de Almeida (2007, 120-217) que identifica e desenvolve as principais ferramentas coadjuvantes da criação do Conhecimento, sintetizadas no Quadro1. 223 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Quadro 1 – Ferramentas de apoio à Gestão do Conhecimento 224 Fonte: Almeida, 2007. Davenport & Prusak (1998) também refletem sobre as ferramentas de apoio à Gestão do Conhecimento e destacam os mapas do Conhecimento, que o localizam mas Municipal de Viseu com contributos para a Gestão da Informação e do Conhecimento na Câmara Informação, Conhecimento e Serviço Público: Um estudo de caso exploratório não o contêm. Segundo os autores, para desenvolver uma ferramenta deste género é necessário primeiro localizar o Conhecimento relevante da organização, para depois criar um quadro que remeta para essa localização. Os mapas tanto apontam para pessoas, como para documentos ou bases de dados. O seu principal objetivo é mostrar aos colaboradores da organização como podem aceder às fontes do Conhecimento de que necessitam. Ainda neste âmbito, refira-se o estudo de Mentzas, Apostolou, Abecker & Young (2003, 5-8), que reconhecem duas diferentes abordagens, a saber, a do “produto” e a do “processo”, e referem de que forma as particularidades de cada uma se refletem nos instrumentos de apoio às iniciativas de Gestão do Conhecimento. Assim, os softwares colaborativos utilizados no âmbito de iniciativas da Gestão de Conhecimento que têm por base o “processo” visam a criação de locais de trabalho virtuais e partilhados, onde pessoas com o mesmo objetivo podem interagir, partilhar experiências e conhecimentos. Uma infraestrutura para a troca de mensagens e intercâmbio de informações, na forma de serviços de correio eletrónico, com funcionalidades de colaboração, tais como grupos de discussão, pastas partilhadas ou bases de dados e funções de calendário e de agenda seria um bom exemplo. Os autores referem também, neste âmbito, sistemas de Gestão Documental e workflow, que apresentam inúmeras vantagens em processos que requerem várias pessoas a tratar um conjunto de documentos. Por outro lado, o software que visa apoiar a abordagem do Conhecimento como um “produto” fornece ferramentas para o armazenamento do Conhecimento, de diferentes fontes, tais como sites da Internet e da intranet, servidores de arquivos, bases de dados e sistemas de Informação, essenciais para encontrar informações relevantes para o desempenho de algumas tarefas. Ainda segundo os autores, os sistemas baseados em Conhecimento que visam substituir o raciocínio humano com Inteligência Artificial são típicos de software de Gestão do Conhecimento centrado no “produto”. Estes sistemas refletem este tipo de abordagem porque o seu papel é substituir (pelo menos parcialmente) os seres humanos e o Conhecimento humano na realização de tarefas específicas. Neste primeiro ponto quisemos deixar clara a distinção entre os conceitos de Dado, Informação e Conhecimento, e entre os três patamares de gestão (de Documentos, de Informação e do Conhecimento), explicação necessária para compreender a vantagem da Gestão do Conhecimento nas organizações. Procurámos, ainda, expor os contributos dos diferentes autores para a caracterização da Gestão do Conhecimento, citar o modelo de criação do Conhecimento proposto por Nonaka & Takeuchi, processo fundamental que deverá estar na base dos projetos de Gestão 225 do Conhecimento, e mencionar os diferentes sistemas de suporte. De referir que o conteúdo desta primeira parte é a base teórica das propostas que serão desenvolvidas no ponto três deste trabalho. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 2. A aplicabilidade dos fundamentos da Gestão do Conhecimento em organismos públicos em face dos princípios da New Public Management 226 A Reforma da Administração Pública, encetada no final dos anos setenta início dos anos oitenta, teve como principal objetivo construir uma Administração Pública mais eficiente e eficaz, preocupada com a melhoria dos serviços prestados e com a proximidade aos cidadãos. Terá sido o insucesso, no início da década de setenta, do Welfare State ou “Estado Providência” (que se propunha resolver, em parte, os problemas económicos decorrentes da II Guerra Mundial), que esteve na base da reforma administrativa, isto devido, fundamentalmente, à recessão económica provocada pela crise petrolífera, e ao aumento da despesa pública (Madureira & Rodrigues, 2006). As reformas administrativas, acentuadas nas décadas de oitenta e noventa, baseavamse no conceito de que as organizações públicas deviam ser geridas de forma idêntica às empresas privadas, tendo como principais objetivos a descentralização, a desregulação e a delegação de competências. É neste contexto que surge a New Public Management, com novos conceitos e instrumentos de gestão, que defendem a substituição da gestão pública pela gestão empresarial, a descentralização, o controlo financeiro, a coordenação orçamental e a importância dada ao consumidor (Madureira & Rodrigues, 2006). As reformas do setor público assim obtidas caracterizaram-se, fundamentalmente, pela utilização dos métodos no setor privado, com a introdução de fatores de concorrência, o destaque na racionalidade económica e a valorização dos resultados obtidos (Mendes, 2001). Com a New Public Management nasce a noção de “cliente” do serviço público, e este novo conceito passa a comandar as decisões e os projetos na área. Este modelo denota o esforço feito pelos governos, a partir da década de oitenta, para modernizar e tornar mais eficaz o setor público. Este conceito baseia-se na tese de que uma gestão orientada para a satisfação do cidadão contribui para uma maior eficiência de custos por parte dos governos. No que respeita à sua evolução, as ideias e as ferramentas inovadoras promovidas pela New Public Management, tendo em vista a aplicação de contratos de direito privado para Municipal de Viseu com contributos para a Gestão da Informação e do Conhecimento na Câmara Informação, Conhecimento e Serviço Público: Um estudo de caso exploratório prestar serviços públicos, começaram por ser implementadas no Reino Unido, nos inícios dos anos oitenta, mas rapidamente se disseminaram por outros países como a Austrália, a Nova Zelândia, a Finlândia, Suécia, a França e a Alemanha. Nos Estados Unidos da América foram igualmente implementados os seus princípios, sob outra denominação. Em Portugal foram tomadas as mesmas medidas reformistas, apesar do contexto ser diferente daquele que caracterizava a generalidade dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE). De referir que é a partir da década de oitenta que se pode falar, efetivamente, em reforma da administração pública portuguesa. Esta teve como objetivos melhorar a ligação entre a Administração e os cidadãos, reduzir os procedimentos administrativos e promover a formação dos trabalhadores públicos (Araújo& Cândido, 2003). Nos últimos anos é notória, em Portugal, a preocupação com a qualidade dos serviços prestados ao cidadão, a orientação para os resultados, a introdução de novos instrumentos de gestão de recursos humanos como a avaliação de desempenho e a mobilidade, e a qualificação dos funcionários. No entanto, a aplicação destes princípios é complexa, muito em parte devido a diferenças de base entre o setor público e o setor privado, a saber: a clivagem entre a gestão empresarial e a gestão pública; a distinção entre consumidor e cidadão; o facto de a descentralização, aliada à necessidade de controlo financeiro e coordenação orçamental, trazer problemas à implementação de políticas públicas; e a dificuldade em avaliar e medir a eficiência e a eficácia dos serviços públicos (Rocha, 2000). A New Public Management pretende, em última análise, a responsabilização dos agentes públicos, para que seja assegurada a satisfação das necessidades dos cidadãos, e escrúpulo na gestão da “coisa pública”. De acordo com Giacomo (2005), as TIC devem ser incluídas nas práticas da New Public Management, dada a sua importância para as organizações e para a execução das tarefas. Não obstante a sua relevância, a implementação das reformas administrativas não tem sido pacífica, e denota-se que as medidas preconizadas não foram e não são consensuais. Efetivamente, apesar da reforma da administração pública acentuar a importância da adoção de critérios de gestão privada na gestão pública, houve vozes críticas que acentuaram o fosso entre os dois setores. São apontados obstáculos na identificação dos custos das atividades e na avaliação de resultados com base em critérios objetivos, para além de se referir que os novos paradigmas de gestão não são a solução para os problemas de prestação de serviços públicos essenciais. 227 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 228 De mencionar que da leitura dos textos consultados retém-se que as diferenças entre o setor público e o setor privado se acentuam nos seguintes pontos: objetivos (o interesse público e o cumprimento de determinadas normas, para o serviço público, e o lucro e os resultados para o privado); as limitações, de teor legal, impostas ao setor público; o fator político que está presente na gestão pública; as diferenças nas relações de poder, nos modelos organizacionais e na origem dos fundos; a concorrência, inerente ao setor privado. No entanto, de acordo com Mendes (2001), apesar das diferenças verificadas entre os dois setores, é possível adotar modelos de gestão similares, e a prova disso é o facto de a Administração Pública ser gerida tendo por base planos de atividades, relatórios de gestão e processos de avaliação de desempenho, e obter financiamentos em função dos resultados. Em relação à realidade portuguesa, Mendes (2001) refere que estão estabelecidos, na Administração Pública, princípios de gestão que fixam objetivos de eficiência, de eficácia e de economia. O autor apresenta critérios que devem estar na base da reforma da Administração: (i) descentralizar, tendo em vista a realização dos objetivos previamente delineados; (ii) evidenciar o papel dos dirigentes, proporcionando condições para que executem o seu cargo, destacando a sua avaliação e responsabilização; (iii) motivar os colaboradores para um bom desempenho, e aumento da autonomia; (iv) praticar uma gestão participada em todos os níveis da decisão, permitindo a identificação dos trabalhadores com os objetivos institucionais e funcionais; (v) promover o diálogo transversal entre dirigentes, chefias e trabalhadores; (vi) concretizar a avaliação do desempenho tendo por base os objetivos e os resultados obtidos, não descurando a remuneração, os complementos e a formação profissional adequados. De referir, por último, que consideramos que o novo paradigma da administração pública cria as condições para a implementação de projetos de Gestão do Conhecimento em organismos públicos, alguns dos quais fazemos referência no ponto seguinte. 2.1. A Gestão do Conhecimento no Setor Público A revisão bibliográfica que efetuámos revelou que são ainda escassos, fundamentalmente em Portugal, os estudos sobre a Gestão do Conhecimento em organismos públicos. No que se refere a outros contextos, localizámos iniciativas que merecem alguma menção de nossa parte. Pérez-Montoro Gutiérrez (2003) refere um estudo do qual participa, promovido pela Organização das Nações Unidas (ONU) e intitulado Latin-American Government Municipal de Viseu com contributos para a Gestão da Informação e do Conhecimento na Câmara Informação, Conhecimento e Serviço Público: Um estudo de caso exploratório Network on Information and Knowledge Systems (LAGNIKS). O referido projeto é uma tentativa de melhorar a governação em áreas desfavorecidas, utilizando para isso uma iniciativa de Gestão do Conhecimento baseada, entre outros fatores, nos recursos e benefícios que se obtêm através do tratamento documental e digital da Informação. Num outro estudo, Fresneda, Gonçalves, Papa & Fonseca (2009) apresentam alguns dados sobre o diagnóstico de Gestão de Conhecimento em organizações públicas brasileiras, utilizando o método designado Organizational Knowledge Assessment (OKA), uma ferramenta gratuita desenvolvida pelo Banco Mundial. Um dos objetivos deste estudo é estimular as organizações a não só aplicar o método OKA, como também a elaborar um plano de Gestão de Conhecimento, que lhes permita identificar, guardar, criar, usar e partilhar Conhecimento. Pretende-se, desta forma, avaliar a capacidade das organizações para ampliar os seus ativos intelectuais, através da conjunção de três elementos essenciais para gerar diferencial competitivo e atingir os objetivos organizacionais: pessoas, processos e sistemas. Os autores concluem que a utilização da ferramenta OKA pode potenciar a colaboração entre organismos brasileiros e entre estes e instituições internacionais (Fresneda, Gonçalves, Papa & Fonseca, 2009, 12). No âmbito das ferramentas de apoio à Gestão do Conhecimento, Amante & Segurado (2010) abordam a relação entre esta e os repositórios. As autoras apontam a importância que os mesmos assumem na Gestão do Conhecimento, nas Universidades, revelando-se como um importante sistema de Informação para a guarda, a preservação e a difusão da produção intelectual institucional. Segundo as autoras, a prática da Gestão do Conhecimento nas instituições de ensino visa a melhoria dos processos de criação (investigadores), de transferência (professores), de aprendizagem (alunos) e de utilização do Conhecimento. O Repositório Institucional é um instrumento que se enquadra nas iniciativas de Acesso Livre ao Conhecimento. É um sistema de Informação que permite o armazenamento, a preservação e a difusão de conteúdo intelectual produzido pela organização. Trata-se de melhorar o sistema de comunicação científica e facilitar o acesso às publicações científicas através da Internet. A diminuição das barreiras ao livre fluxo de Informação assume particular relevância no contexto de uma sociedade que se pretende do Conhecimento (2010, 3). Ainda neste mesmo âmbito, salienta-se um trabalho publicado no Brasil que revela a importância da Tecnologia da Informação para a Gestão do Conhecimento. Trata-se de uma curiosa ferramenta denominada Personal Brain, criada a pensar na sua aplicação 229 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 230 em instituições públicas, nomeadamente nas secretarias das “prefeituras municipais” (o equivalente às Câmaras Municipais, no contexto português). Este instrumento visa o mapeamento das informações, organizando-as com mecanismos similares aos que o ser humano utiliza para estruturar as suas ideias, possibilitando o estabelecimento de ligações entre elas (Araújo & Cândido, 2003, 41). Os autores da proposta afirmam que o Personal Brain poderá ser fundamental como suporte na tomada de decisões. Os estudos mencionados vão ao encontro das ideias de Benz & Sicsú (2010) para quem a Administração Pública deve: (i) estar alerta para a evolução da sociedade e promover, entre outros, a criação de uma “inteligência coletiva”, a melhoria da performance e das condições sociais e humanas, e o desenvolvimento sustentável; (ii) ambicionar o aperfeiçoamento contínuo e (iii) assegurar a prestação de serviços eficientes e de qualidade, otimizando os recursos de que dispõe. Neste sentido, os projetos de Gestão do Conhecimento são particularmente interessantes, considerando que podem trazer benefícios: desenvolvimento, identificação, captação, partilha e divulgação da Informação; otimização dos sistemas de trabalho e dos recursos públicos. Portanto, julga-se que as iniciativas de Gestão do Conhecimento podem criar as condições ideais para a obtenção de eficiência da Administração Pública, o equivalente, segundo os autores, à vantagem competitiva para as empresas privadas. Segundo os padrões atuais, não é suficiente que a Administração Pública cumpra legalmente as funções administrativas que lhe são adstritas. É fundamental que o serviço público apresente bons resultados e que dê uma resposta positiva às necessidades dos cidadãos, e com um mínimo de recursos possível. De acordo com Fresneda, Gonçalves, Papa & Fonseca (2009) os principais benefícios da implementação da Gestão do Conhecimento nas organizações públicas são a melhoria na qualidade e na eficiência dos procedimentos internos, a identificação e a partilha de boas práticas e, consequentemente, a criação de resultados positivos no atendimento ao cidadão. Estes mesmos autores identificaram cinco problemas relacionadas com a ausência de Gestão do Conhecimento nas organizações (2009, 4): (i) a existência de um grande volume de informações estratégicas que não é partilhado nem analisado, e por isso não é levado em conta nas tomadas de decisão; (ii) a anulação de aptidões individuais e coletivas; (iii) a ausência de colaboração; (iv) o facto de não ser explorado o trabalho em grupo, virtual e colaborativo; e (v) não ser promovida a aprendizagem coletiva, o que se traduz num entrave à inovação e à criação. Municipal de Viseu com contributos para a Gestão da Informação e do Conhecimento na Câmara Informação, Conhecimento e Serviço Público: Um estudo de caso exploratório Segundo referem estes autores, a implementação de medidas de Gestão do Conhecimento no setor público traz vantagens, pois vai ao encontro das expectativas tanto dos trabalhadores públicos como dos cidadãos, porque promovem a transparência no serviço público (através do acesso à Informação e capacidade de intervenção), a qualidade dos serviços e a redução de custos, e o desenvolvimento de uma cultura de partilha do Conhecimento (2009, 7). Cong & Pandya (2003) referem que a nova economia trouxe desafios e oportunidades tanto para o setor privado como para o setor público. A Administração Pública deve agarrar essas oportunidades adotando e adaptando ferramentas de gestão e métodos de trabalho do setor privado. Neste âmbito, a Gestão do Conhecimento pode e deve ser explorada pelo setor público, de forma a trazer benefícios. Os autores referem que os componentes chave da Gestão do Conhecimento são (i) os indivíduos - deve ser fomentada a partilha e o uso do Conhecimento, (ii) os processos - para identificar, criar, captar, partilhar e utilizar o Conhecimento -, e (iii) a tecnologia - para guardar e tornar acessível o Conhecimento e para promover o trabalho remoto -, afirmando que as organizações que introduzem os processos de Gestão do Conhecimento conseguem níveis de produtividade elevados, que ao nível do setor público se traduz na redução do custo dos procedimentos e na melhoria no atendimento ao público (Cong & Pandya, 2003, 30). Apesar da comprovação teórica e prática, nos últimos vinte anos, dos benefícios da Gestão do Conhecimento, verifica-se, através da análise da bibliografia consultada e referida ao longo deste trabalho, que, em Portugal, a investigação e a implementação de sistemas neste domínio é relativamente recente e algo pontual. De facto, no contexto português, denota-se que a Gestão do Conhecimento tem despertado o interesse da comunidade académica, o que se pode atestar pelo número de artigos, conferências, obras publicadas e sites dedicados à temática. Refira-se, no entanto, que alguns autores como Almeida (2007), Sarmento & Correia (2002), Lopes & Morais (2001) e Zimmermann (2010) apontam que, culturalmente, não há tradição colaborativa e de partilha do Conhecimento em Portugal, o que se pode traduzir num entrave ao êxito das iniciativas/projetos neste domínio. Não obstante este facto, Portugal está a dar importantes passos na criação e utilização de ferramentas de Gestão do Conhecimento, como o demonstra a distinção do país, na 8.ª edição do United Nations Public Service Awards, pelas “boas práticas” na administração pública, com o primeiro prémio na categoria “Fomentar a Gestão do Conhecimento na 231 Administração Pública”, com a “Rede Comum do Conhecimento”(RCC) . Esta Rede, a par da “Rede Interministerial para as Tecnologias da Informação e Comunicação”, da “Rede REAI - Regime de Exercício da Atividade Industrial” e da Rede Simplex Autárquico, é um projeto promovido pela “Agência para a Modernização Administrativa”(AMA) . De referir que a missão da AMA enquadra-se no desenvolvimento, coordenação e avaliação de “projetos nas áreas de modernização e simplificação administrativa e regulatória, de administração eletrónica e de distribuição de serviços públicos” (Quadro 2). Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Quadro 2 – Projetos da Agência para a Modernização Administrativa (AMA) 232 Fonte: Autores De ressalvar que estas iniciativas de modernização administrativa, integradas num governo que se pretende eletrónico, são fundamentais para a comunicação entre os diferentes atores, permitindo a melhoria contínua da qualidade dos serviços públicos e a agilidade do governo. Apesar de se verificar que ainda não funcionam em pleno, nomeadamente por razões que se prendem com a já referida falta de tradição colaborativa em Portugal e com o acesso tardio às ferramentas implementadas (Zimmermann, 2010), é inegável a pertinência destes projetos, tendo em vista o desenvolvimento de uma Sociedade da Informação e do Conhecimento. Municipal de Viseu com contributos para a Gestão da Informação e do Conhecimento na Câmara 3.1 Contexto Organizacional As autarquias locais portuguesas visam a satisfação das necessidades próprias das comunidades locais, sendo constituídas pelas freguesias, pelos municípios e pelas regiões administrativas. Atualmente existem, em Portugal, trezentos e oito municípios e quatro mil duzentas e cinquenta e nove freguesias. As principais atribuições das autarquias, definidas nas Leis n.ºs 159/99 de 14.09 e 169/99 de 18.09, alterada e republicada pela Lei n.º 5-A/2002 de 11.01, são o abastecimento público, o saneamento básico, a saúde, o desenvolvimento socioeconómico, o ordenamento do território, o ambiente, a educação, a cultura, e o desporto. O Município de Viseu persegue as atribuições definidas na legislação atrás mencionada, pretendendo criar as condições para um desenvolvimento socioeconómico inclusivo, competitivo e sustentado. De referir que, nos últimos anos, a Câmara Municipal de Viseu tem correspondido aos desafios da Sociedade da Informação e da modernização administrativa, integrando TIC, de acesso à totalidade dos colaboradores, e participando em programas e projetos nesse âmbito, ações que nos parecem muito positivas, e que no nosso entender têm em vista a promoção da cultura organizacional e uma gestão transparente, aberta e desburocratizada, além de melhorarem a resposta às necessidades dos seus munícipes. A Câmara Municipal de Viseu tem ao seu dispor ferramentas/iniciativas habitualmente relacionadas com a Gestão do Conhecimento: o Correio Eletrónico, a Intranet do Município, o Portal do Município, o Sistema de Gestão Documental e o Informação, Conhecimento e Serviço Público: Um estudo de caso exploratório 3. A Gestão do Conhecimento em organismos públicos: estudo de caso - Câmara Municipal de Viseu 233 Projeto Simplex (quadro 3). Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Quadro 3 – Ferramentas de apoio à Gestão do Conhecimento identificadas na Câmara Municipal de Viseu 234 No âmbito das TIC, salienta-se a posição de Carvalho (2006) que, após o estudo sobre intranets, portais corporativos e Gestão do Conhecimento, alerta para o facto das empresas de consultoria e dos fornecedores de software “venderem” o conceito de Gestão do Conhecimento, apesar de atualmente se verificar alguma tendência para colocar a ênfase no fator humano em detrimento da tecnologia nos projetos de Gestão do Conhecimento. Para o autor, esses projetos devem ser pensados a longo prazo e entendidos como um processo de Municipal de Viseu 3.3 Portal Corporativo com contributos para a Gestão da Informação e do Conhecimento na Câmara Os contributos que se apresentam resultam das ilações retiradas após a pesquisa/ revisão bibliográfica realizada no âmbito deste trabalho, e a caracterização e análise da organização em estudo. Concluiu-se que: (i) um dos desafios que se impõe às organizações é transformar o volume de Informação produzido em Conhecimento; (ii) para que a implementação da Gestão do Conhecimento tenha êxito é necessário que as quatro formas de conversão do mesmo sejam concretizadas; (iii) verifica-se, no contexto público, que os projetos de modernização administrativa, o desenvolvimento tecnológico e a necessidade de corresponder às necessidades dos cidadãos, obrigam as organizações a incluir, nas suas estruturas, TIC, muitas vezes sem um diagnóstico e avaliação prévios; (iv) observamos, na Organização em estudo, que não basta dispor de ferramentas tecnológicas, é necessário, a nosso parecer, integrá-las e dotá-las de outras que permitam, apoiem e promovam a Gestão do Conhecimento, envolvendo os colaboradores e a administração da organização. É, portanto, no seguimento destas constatações que surgem as propostas para a construção de um Portal Corporativo e para a Gestão do Arquivo Corrente. Alerta-se para o facto de que apenas serão apresentados contributos, com o objetivo de comprovar a diferença entre gerir documentos, gerir Informação e gerir Conhecimento numa organização pública, esperando que estas propostas sirvam de ponto de partida/ modelo para a, efetiva, implementação da Gestão do Conhecimento na Câmara Municipal de Viseu. Pretendemos, igualmente, que estes contributos vão ao encontro das premissas da Gestão do Conhecimento e do processo de conversão do Conhecimento (Nonaka & Takeuchi, 1995), descritos na primeira parte deste trabalho, fazendo corresponder, desta forma, as formulações teóricas ao estudo de caso realizado. Informação, Conhecimento e Serviço Público: Um estudo de caso exploratório 3.2 Contributos para a Gestão do Conhecimento na Câmara Municipal de Viseu 235 mudança organizacional, envolvendo tanto o fator humano como o tecnológico. Carvalho (2006) apresenta a contribuição das TIC para o processo de conversão do Conhecimento, conforme o quadro seguinte. Quadro 4 - Contribuição das Tecnologias da Informação para os processos de conversão do Conhecimento Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Fonte: Adaptado de Carvalho,2006. 236 Schons & Costa (2008) referem que os portais corporativos, ao integrarem tecnologia de rede e reunindo numa mesma plataforma serviços de comunicação e de acesso e partilha de Informação e Conhecimento, permitem que os utilizadores consigam extrair o valor da Informação e transformá-la em Conhecimento e, posteriormente, reutilizá-lo, tornando possível o processo de conversão. Os portais corporativos, ao promoverem troca de informações entre os indivíduos (tácito para tácito), permitem a socialização de uma ideia, Informação e/ou Conhecimento (que a princípio estava apenas no nível tácito, ainda não verbalizado) iniciando o processo de criação do Conhecimento. Os autores fazem, também, referência à capacidade de coexistirem dois diferentes espaços de acesso nos portais corporativos: um público, disponível a todos os utilizadores da Internet, e outro restrito, acessível aos colaboradores e fornecedores, “obedecendo a regras de personalização”, mediante o perfil de cada um (Figura 2). Figura 2 - Modelo de uso do portal corporativo e seus serviços Municipal de Viseu com contributos para a Gestão da Informação e do Conhecimento na Câmara Carvalho (2006) menciona que a análise de algumas intranets utilizadas em Portugal e no Brasil permitiu concluir que estas, apesar de integrarem recursos colaborativos, são, na grande maioria dos casos, ferramentas de apoio à Gestão da Informação e não de apoio à Gestão do Conhecimento como era expectável, acrescentamos nós. O autor refere que, nas organizações observadas, a administração da intranet faz-se de forma amadora e que os profissionais da Informação nem gerem nem integram equipas de intranets. De qualquer forma, o autor conclui que tanto as intranets como os portais contribuem para a criação do Conhecimento e para o desenvolvimento de projetos de Gestão do Conhecimento, mas deve ter-se em conta que não chega adquirir tecnologias e sistemas complexos, é preciso também investir e preparar os recursos humanos da organização. É necessário que as organizações percebam como se transforma Informação em Conhecimento e Conhecimento em ação. Considerando esta breve exposição sobre portais e intranets, e após análise das ferramentas atrás descritas (correio eletrónico, Intranet e Portal do Município) percebe-se que uma solução que centralizasse a documentação e a Informação necessária, tanto ao público interno como ao público externo, e integrasse as diferentes ferramentas de trabalho e de comunicação, responderia não só à necessidade de criar um espaço de colaboração interativa e de partilha do Conhecimento no Município, como também às premissas da Administração Pública eficaz, eficiente e de qualidade, voltada para o seu cliente, o cidadão. Propomos, desta forma, a criação de um Portal Corporativo na Câmara Municipal de Viseu que incorpore, numa mesma plataforma, serviços e aplicações de acesso reservado e de acesso público. O acesso reservado far-se-ia mediante a autenticação dos utilizadores, garantindo dessa forma a segurança e privacidade no acesso à documentação, à Informação Informação, Conhecimento e Serviço Público: Um estudo de caso exploratório Fonte: Schons & Costa, 2008 237 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 238 e às aplicações. Seria objetivo da plataforma possibilitar a partilha da Informação e do Conhecimento, evitar a redundância da Informação – o que se verifica com o portal e a intranet separados -, e a redução de custos com o papel e com a comunicação interna, ao incorporar ferramentas de comunicação como o e-mail e o instant messaging. Julgamos também importante a integração de ferramentas de colaboração como fóruns, partilha de Informação, de recursos e de “boas práticas” e a criação de uma área de consulta - dados pessoais, remuneração, férias, justificação de faltas -, integrando as funcionalidades do cartão do cidadão. O colaborador, ao autenticar-se, teria acesso aos novos e-mails, às notas de serviço e despachos, aos fluxos de trabalho, à agenda, aos alertas e a uma pasta pública com Informação indispensável à execução de tarefas. Por outro lado, o acesso público apresentaria documentação e informação geral de apoio ao atendimento (aos vários níveis, munícipes, turistas, cidadãos); um espaço para a autenticação de fornecedores e clientes; e a integração de serviços da competência do Município. Propõem-se alterações que visem a integração de ferramentas de comunicação e de sistemas de pagamento eletrónico, a realização de pedidos, o seu encaminhamento para os serviços competentes, e a consulta da tramitação desses mesmos pedidos. De referir que esta proposta apenas seria concretizável com a desmaterialização e a simplificação dos serviços e processos, impostas pela modernização administrativa, um procedimento que não está a ser ignorado pela organização. Para a concretização do Portal Corporativo, deveria ser constituída, antecipadamente, uma unidade de missão constituída por elementos da administração, profissionais de Informação, especialistas em tecnologias de redes e representantes dos departamentos e dos serviçospara (i) identificar as necessidades; (ii) analisar outras experiências, contribuindo para a escolha das melhores soluções tecnológicas; (iii) estruturar e atualizar o conteúdo e (iv) proceder à avaliação e controle contínuos da qualidade do portal nas vertentes de acesso e navegação, personalização, disponibilidade e partilha. Concluindo, a implementação de um portal corporativo, no âmbito da nossa proposta, deverá ser um processo contínuo, de atualização e manutenção permanente, com uma equipa adequada, analisando a satisfação das necessidades de Informação dos utilizadores através de mecanismos próprios. Propomos, desta forma, que o Portal não só permita o acesso à Informação, mas que Municipal de Viseu No atual panorama de modernização administrativa, desenvolvimento tecnológico e simplificação do relacionamento com o cidadão têm sido implementados, nos organismos públicos, sistemas de gestão de documentos eletrónicos. Como mencionámos atrás, a Câmara Municipal de Viseu não fugiu deste contexto e implementou, em janeiro de 2005, um Sistema de Gestão Documental, com aplicação prioritária para as áreas de Licenciamentos e Expediente, que teve como principal objetivo a tramitação e o acesso célere, eficaz e seguro da Informação. No entanto, esta implementação não teve em consideração, na nossa opinião, estudos prévios ou acompanhamento técnico necessário, pelo que se detetam algumas lacunas de normalização de procedimentos e de métodos arquivísticos, e práticas, de certa forma, arbitrárias e subjetivas, nomeadamente nas ações de indexação, criação de entidades e tramitação de documentos. Face às falhas detetadas no funcionamento do Sistema de Gestão Documental, à precariedade do Arquivo, e porque existe a possibilidade de aquisição de um novo sistema, com contributos para a Gestão da Informação e do Conhecimento na Câmara 3.4. Gestão do Arquivo Corrente Informação, Conhecimento e Serviço Público: Um estudo de caso exploratório seja, acima de tudo, uma plataforma interativa e colaborativa, um ponto de encontro virtual entre os trabalhadores da organização. O Portal Corporativo apresentar-se-ia não só como um repositório de documentos e informação, mas também como um espaço de interação e comunicação em tempo real, proporcionando a existência de grupos de discussão, de partilha de Conhecimento. Este portal deve ter uma interface amigável, intuitiva, com informações adequadas à função e perfil de cada utilizador, que melhore o nível de colaboração dos trabalhadores, a pesquisa e a localização da Informação, e a integração dos diferentes sistemas utilizados na organização, um espaço para a partilha de recursos, de documentação, de notícias relevantes para a organização, e de “boas práticas”. De ressalvar que esta proposta não se reveste de especificações técnicas, dado que não é esse o objetivo do presente trabalho. Pretendemos apenas propor algumas mudanças que, pela pertinência, viabilizem o aproveitamento das ferramentas já existentes no Município em prol da conversão do Conhecimento, nas suas formas clássicas (Nonaka & Takeuchi, 1995), e que apontem para a implementação de um projeto de Gestão do Conhecimento na organização, envolvendo os seus diferentes protagonistas. 239 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 240 propõe-se a criação de uma unidade de missão multidisciplinar, que envolva representantes da Administração e dos diferentes Departamentos e Serviços, do Setor de Arquivo e do Setor de Informática, e que se comprometa a: (i) identificar e analisar as necessidades gerais (através da recolha de dados e da elaboração de entrevistas junto dos serviços; (ii) identificar, analisar e aplicar os requisitos dos documentos eletrónicos; (iii) analisar outras experiências, de forma a tomar uma decisão mais realista; (iv) coadunar a escolha do sistema com os objetivos pré-identificados e com as necessidades dos utilizadores; (v) normalizar procedimentos administrativos; (vi) elaborar um regulamento que preveja esses procedimentos; (vii) participar na criação de um plano de classificação, e respetivo manual de procedimentos, tendo em vista a organização intelectual e hierárquica dos documentos capturados pelo sistema; (viii) participar na elaboração de uma tabela de seleção; (ix) introduzir, na aplicação informática, o plano de classificação; (x) determinar os workflow, consoante a documentação/processos; (xi) criar um plano de preservação digital; (xii) formar e sensibilizar os utilizadores do sistema; e, por fim, (xiii) aplicar técnicas de avaliação que permitam a identificação de lacunas e a redefinição de estratégias. Como ponto de partida para esse projeto, foi elaborado, de forma preliminar, um plano de classificação parcial e que esperamos sirva de mote para a continuidade deste trabalho. Para a concretização do referido plano foram concretizadas as fases descritas no Manual para a Gestão de Documentos, publicado pela Direção Geral de Arquivos (Portugal,1997). Assim, caracterizámos o organismo produtor (levantamento da legislação, de normas, de regulamentos, da estrutura orgânico-funcional); determinámos as funçõesmeio e as funções-fim da organização. Foi feita a análise macro das funções e atividades de forma a estabelecer as Classes e as Subclasses (classificação funcional), tendo também por base a Tabela de Seleção das Funções-Meio (Portugal, DGARQ, 2007). Posteriormente, foi reconhecida a extensa documentação produzida no âmbito das competências do Departamento de Planeamento e Gestão Urbanística. De referir que a escolha recaiu por esta fração da documentação por ser aquela que, neste momento, é custodiada e gerida pelo Setor de Arquivo. Assim, foi criado um quadro que estabelece 3 níveis hierárquicos (classe, subclasse e série), com a atribuição dos respetivos códigos de classificação, uma pequena descrição de conteúdo e um campo para estabelecer o destino final das séries documentais . Desta forma, identificámos 35 classes, ordenadas alfabeticamente e precedidas de um código de classificação, fruto da análise das funções-meio e das funções-fim, e reconhecemos as séries Municipal de Viseu Fonte: Autores com contributos para a Gestão da Informação e do Conhecimento na Câmara Quadro 5 - Plano de classificação parcial para a Câmara Municipal de Viseu Informação, Conhecimento e Serviço Público: Um estudo de caso exploratório documentais, também sujeitas a uma codificação, das subclasses “Loteamentos” e “Obras Particulares” (as quais integram a classe “Licenciamentos”), decorrentes do levantamento da documentação produzida no âmbito das competências do Departamento de Planeamento e Gestão Urbanística (Quadro 5). De referir, por último, que estes contributos enquadram-se nos pressupostos teóricos analisados, considerando que o Arquivo, além de desempenhar um papel importante como repositório do Conhecimento explícito, poderá contribuir para a implementação da Gestão do Conhecimento nas instituições. Constata-se que o Arquivo tem um papel fulcral no acesso e na reutilização do Conhecimento, na interação dos colaboradores e na tomada de decisão, premissas que são enfaticamente defendidas na Gestão do Conhecimento. Além disso, as tarefas intrínsecas a um serviço de arquivo, como a descrição, a avaliação, a conservação e a classificação, contribuem para o processo de organização do Conhecimento e para a Gestão da Informação, gerando produtos utilizáveis pela organização. De assinalar que o plano de classificação, à luz do explanado na primeira parte do trabalho, poderá ser entendido como um Mapa do Conhecimento, um instrumento que permite a localização do Conhecimento apesar de não o conter. 241 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Considerações Finais 242 A revisão da literatura elaborada para este trabalho permitiu confirmar a transversalidade da Gestão do Conhecimento e a crescente produção científica, nesta área, nos últimos vinte anos. É igualmente notória, ainda que pontual, fundamentalmente em Portugal, a preocupação das organizações com o desenvolvimento de projetos nesta área, reconhecendo-se a importância do Conhecimento e da sua gestão para a inovação e competitividade organizacionais. A Administração Pública, no âmbito da modernização administrativa em prática nos últimos anos, não ficou indiferente à Gestão do Conhecimento e, progressivamente, tem desenvolvido projetos e adquirido ferramentas que permitem a gestão da Informação, a criação, o desenvolvimento e a partilha de Conhecimento, para além de promover a comunicação e a colaboração, indo ao encontro das necessidades dos cidadãos. Verifica-se, neste setor, que Portugal está, ainda, a dar os primeiros passos, os quais consideramos importantes e relevantes, no que respeita à investigação e à aplicação de ferramentas de Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) no suporte à Gestão do Conhecimento nos organismos públicos. Exemplo disso é a, relativamente recente, distinção de Portugal na 8.ª edição do United Nations Public Service Awards, que premiou as boas práticas na administração pública, com o primeiro prémio na categoria “Fomentar a Gestão do Conhecimento na Administração Pública” com a “Rede Comum do Conhecimento” (RCC), um dos projetos de redes de colaboração da “Agência para a Modernização Administrativa” (AMA). É, pois, no âmbito da modernização administrativa e da Gestão do Conhecimento que encetámos esta missão, a qual pretendeu apresentar uma revisão bibliográfica, relacionada com a Gestão do Conhecimento, em geral, e com a Gestão do Conhecimento em organismos públicos, em particular, e realizar um estudo de caso que permitisse transpor a aplicabilidade das premissas desta disciplina para uma instituição pública. Desta forma, registámos os principais contributos dos autores que considerámos relevantes para a abordagem à Gestão do Conhecimento, e identificámos as ferramentas coadjuvantes da criação do Conhecimento. Quisemos também apontar as iniciativas mais relevantes a este nível em organismos públicos, enquadradas pela análise sumária das reformas a que esteve sujeita a administração pública, nas últimas quatro décadas. Por último, transpusemos para a realidade de uma organização em concreto a teoria explanada ao longo do trabalho. Apresentámos propostas – criação de um portal corporativo e a Municipal de Viseu com contributos para a Gestão da Informação e do Conhecimento na Câmara Informação, Conhecimento e Serviço Público: Um estudo de caso exploratório gestão do arquivo corrente - que, no nosso entender, promovem a colaboração e a partilha de Conhecimento. Estes contributos visam a captação e distribuição de boas práticas internas, a criação de uma inteligência coletiva. Pretende-se a otimização dos recursos disponíveis e dos sistemas de trabalho, a melhoria dos procedimentos administrativos, a sensibilização dos colaboradores para a Gestão do Conhecimento, para a colaboração, para a fomentação de um ambiente criativo, inovador, de confiança e que incentive a aprendizagem. Iniciativas que deverão, evidentemente, estar alinhadas com os objetivos e estratégias da organização. De referir, por fim, que este estudo permitiu retirar algumas ilações: (i) é fundamental distinguir Dados, Informação e Conhecimento, e Gestão de Documentos, Gestão da Informação e Gestão do Conhecimento considerando que é da confusão entre estes conceitos que resulta o insucesso de algumas iniciativas (Gerami, 2010); (ii) são três os elementos chave da Gestão do Conhecimento: os indivíduos, os processos e a tecnologia; (iii) transformar o volume de Informação produzido em Conhecimento é um dos desafios que se impõe às organizações; (iv) para que a implementação da Gestão do Conhecimento tenha êxito é necessário que as quatro formas de conversão do mesmo sejam concretizadas (socialização, externalização, combinação e internalização); (v) o novo paradigma da Administração Pública vem proporcionar a implementação de projetos de Gestão do Conhecimento em organismos públicos; (vi) os projetos de modernização administrativa, o desenvolvimento tecnológico e a necessidade de corresponder às necessidades dos cidadãos, obrigaram os organismos públicos a incluir, nas suas estruturas, TIC, muitas vezes sem um diagnóstico e avaliação prévios; (vii) julgamos que esses sistemas deverão ser utilizados de forma integrada e colaborativa para que correspondam às premissas e objetivos da Gestão do Conhecimento; (viii) concluímos que a Câmara Municipal de Viseu tem ao seu dispor TIC, mas é necessário, na nossa opinião, integrá-las e dotá-las de ferramentas que permitam, apoiem e promovam a Gestão do Conhecimento, de facto, envolvendo tanto os colaboradores como a administração da Organização. Em relação ao trabalho futuro, parece-nos fundamental, além da concretização das propostas acima referidas, a implementação de técnicas de avaliação que permitam a identificação de lacunas e a redefinição de estratégias. Propomos a aplicação da matriz formulada por Mentzas, Apostolou, Abecker, & Young (2003, 141) para avaliar a implementação e a presença da Gestão do Conhecimento na Organização e nas atividades dos colaboradores. Consideramos igualmente importante a conceção e a implementação do sistema de 243 arquivo da Câmara Municipal de Viseu, aprofundando as oito etapas referidas pela NP 4438-2:2005. No que respeita às futuras linhas de investigação, considera-se que o facto da investigação sobre a Gestão do Conhecimento nos organismos públicos em Portugal ser ainda escassa deverá ser, por si só, um incentivo à realização de novos estudos e o desenvolvimento de ferramentas na área da Gestão do Conhecimento. Assim, sugerimos o levantamento e a análise das ferramentas TIC de suporte à Gestão do Conhecimento nas Autarquias Locais portuguesas, podendo daí resultar propostas interessantes e inovadoras para projetos conjuntos. REFERÊNCIAS Almeida, M. A. (2007). Situação da gestão do conhecimento em Portugal: estudo exploratório e práticas governamentais, académicas e empresariais. Lisboa: Edições Colibri/Instituto Politécnico de Lisboa. ISBN 978972-772-782-7. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Amante, M. J., & Segurado, T. (2010). A gestão do Conhecimento nas universidades: o papel dos repositórios institucionais. 10.º Congresso da BAD. Guimarães: Associação Portuguesa de Bibliotecários, Arquivistas e Documentalistas. 244 Araújo, N., & Cândido, G. (2003). As tecnologias de informação como instrumento de viabilização da gestão do conhecimento através da montagem de mapas cognitivos. Ciência da Informação, 32 (3), 38-45. Benz, P. & Sicsú, A. (2010). 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Zimmermann, R. (2010). A colaboração e a Gestão do Conhecimento em instituições públicas. Dissertação de mestrado, Universidade de Aveiro, Portugal. Capítulo 11 PRODUÇÃO DE BIOCOMBUSTÍVEL NO CERRADO Christiano de Oliveira e Silva Dimas Moraes Peixinho Suzana Ribeiro Lima Oliveira William Ferreira da Silva Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade A 248 matriz energética brasileira é bastante diversificada, constituída basicamente por 37,8% de petróleo e seus derivados; 32% de energia da biomassa (apenas os derivados da cana-de-açúcar representam 18,1% do total); 15,3% de energia hidráulica; e 14,9% divididos entre gás natural, carvão mineral e urânio (EPE, 2009). Assim, somadas as fontes renováveis, próximo aos 50%, o Brasil está em uma situação privilegiada entre os demais países do mundo, que, juntos, têm uma média de 14% de fontes renováveis. No conjunto das fontes renováveis, os biocombustíveis (etanol e biodiesel) têm ocupado cada vez mais espaço na organização de culturas voltadas para a produção de combustíveis. A cana-de-açúcar, cultura que vem sendo explorada a mais de 400 anos no país, ganhou maior importância, especialmente a partir da década de 1970, com o Programa Nacional do Álcool (PROÁLCOOL) e a soja, nos últimos cinco anos, tornou-se a principal matéria prima da produção de biodiesel. Do ponto de vista da produção e da área ocupada, essas culturas tornaram-se as mais importantes do país, a primeira tendo o maior volume de produção 717 milhões de toneladas e segunda a maior área ocupada 23,3 milhões de hectares (IBGE, 2012). O Cerrado (savana), que nas últimas três décadas se consolidou como a principal área de produção de soja no Brasil, hoje, está se tornando a principal área de expansão da cultura da cana-de-açúcar do país. Portanto, nessa perspectiva, o Cerrado poderá se tornar a principal área de produção de biocombustíveis do Brasil, tanto para atender o mercado interno como para a exportação. O domínio morfoclimático do Cerrado, que ocupa aproximadamente 2 milhões de km² no Brasil Central, apesar de ser considerado o de maior biodiversidade do país, é o único, dos grandes complexos ambientais, que não tem a devida proteção legal garantida na constituição brasileira, ficando assim, sujeito a um ordenamento conforme os interesses dos setores agroexportadores de commodities e, agora, dos biocombustíveis. A partir desse cenário, pretende-se analisar a produção de biocombustíveis no Cerrado, considerando os diferentes processos produtivos da sua ocupação, assim como, as condições de logísticas instaladas nos respectivos processos produtivos, buscando avaliar como o Cerrado, enquanto domínio que carece de conservação ambiental, está sendo inserido na contradição da sua destruição para produzir biocombustíveis, ‘ambientalmente sustentáveis’. O interesse pela produção dos biocombustíveis é crescente no contexto global. Os vetores desse interesse são a diversificação da matriz energética, a redução da dependência em relação ao petróleo e a tentativa de amenizar a emissão de gases poluentes. No Brasil, condições de clima e solo favoráveis à produção em larga escala de matéria-prima, especialmente a soja e a cana-de-açúcar, criam condições para que novos espaços sejam incorporados aos circuitos produtivos dos biocombustíveis. De uma forma geral, significativa porção do território brasileiro reúne condições para a produção de biocombustíveis, no entanto, no Cerrado, as condições naturais se reúnem às econômicas e institucionais para formar espaço privilegiado para essa crescente atividade. A construção do espaço do Cerrado brasileiro, por atividades capitalistas, obedeceu a lógica das frentes de expansão, sustentadas inicialmente pela exploração mineral e posteriormente por atividades agropecuárias. Na medida em que essas atividades avançavam sobre o Cerrado, novas formas espaciais eram criadas para atender às demandas e proporcionar os fluxos, condições essenciais para a territorialização. Um momento de grande importância no processo de ocupação do Cerrado, segundo Barbosa (2002), foi a implantação da política de interiorização pelo então presidente da república, Juscelino Kubitschek, em 1956. A construção de Brasília, além de representar ação ordenadora do poder central e transformar as estruturas que fundamentavam a economia do país até então, os consideráveis investimentos na implantação de vias do modal rodoviário, abriram uma nova oportunidade para intensificar a ocupação das terras do Cerrado por atividades econômicas. Melo (2003) afirma que durante a década de 70, a política de integração nacional alcançou, com maior intensidade, as terras do Cerrado e abriu caminho para novas culturas agrícolas favorecidas pela modernização do setor agropecuário. A partir da implantação dos planos de integração nacional e da modernização da agropecuária, um conjunto de elementos espaciais, de forma articuladas, passou reordenar o espaço do Cerrado. A implantação de infra-estrutura básica como estradas e hidroelétricas, o uso de técnicas de correção dos solos, mecanização de operações agrícolas e, mais recentemente, a implantação de indústrias processadoras de carnes, grãos e leite, atraíram investidores e mão-de-obra e Produção de Biocombustível no Cerrado 1. Ocupar e metamorfosear o Cerrado: desafios para os biocombustíveis? 249 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 250 levaram a um salto na produção econômica nesse espaço. A agroindústria que se instalou a partir da década de 70, estabeleceu vínculos de complementaridade entre a produção de grãos e carne e, por consequência, potencializou o processo de construção espacial do agronegócio no Cerrado. Com a constituição do novo circuito espacial de produção houve a necessidade de investimentos no setor logístico viabilizando o escoamento e também o armazenamento da produção, além da formação de uma rede de sustentação que fornece desde os insumos para produção até a manutenção de toda estrutura. Sabe-se que tais investimentos foram insatisfatórios considerando a demanda que se estabeleceu. A partir da territorialização e das novas interações socioespaciais da cadeia carnegrãos no Cerrado brasileiro, ocorre a ampliação da escala de produção e a transformação socioeconômica da região. Um vetor de forte significado para esse processo é a incorporação de tecnologias de informação e comunicação, formando o que foi denominado por Aracri (2010) concordando com Chaparro (2004) como uma “nova fronteira digital rural”. O Cerrado foi palco da implementação tecnológica na agropecuária, para suprir expectativas de produção não apenas do local, mas aos também mercados externos. Com um potencial produtivo latente, principalmente no setor agroindustrial, a esse espaço estão sendo incorporadas novas atividades e técnicas que têm proporcionado a reorganização do espaço/território pela capacidade de gerar divisas para o Brasil (BERNARDES e ARACRI, 2010). A produção de biocombustíveis, fruto da expansão de uma matriz energética que tem como proposta suprir demandas e gerar divisas para o país com fins sustentáveis, vem se fortalecendo a cada dia e ocupando terras do Cerrado. A produção de etanol a partir da cana-de-açúcar e a produção de biodiesel a partir da soja são atividades que se tornam cada vez mais significativas no cenário produtivo do Cerrado e agregam a esse espaço novas possibilidades de incorporação a circuitos produtivos globais. As condições de clima, solo e relevo encontradas no Cerrado são adequadas à produção de soja e de cana-de-açúcar em larga escala, a incorporação de técnicas de correção de solo, de mecanização agrícola e de melhoramento genético de plantas potencializa a produtividade e remunera o capital aplicado nessas atividades. Nesse cenário onde reinam potencialidades produtivas, uma questão merece atenção: a infraestrutura de logística. Para Bowersox e Closs (2010, p.20) é “por meio do processo logístico que os materiais fluem pelos sistemas de produção de uma nação industrial e os produtos são distribuídos para os consumidores pelos canais de marketing”. Com o advento da economia global, Produção de Biocombustível no Cerrado impulsionado pelo desenvolvimento das redes, o que era necessário para o setor estratégico – a logística - se torna um dos fatores preponderantes para a tomada de decisões. Segundo Santos (2009), as redes são infraestruturas adaptadas para transmitir matéria, energia e informações com visão social, política e econômica. Por meio das redes é possível a interação entre as horizontalidades e as verticalidades. As verticalidades são espaços distantes, ligados pelos fluxos e as horizontalidades são as relações sociais do lugar. “Quanto mais avança a civilização material, mais se impõe o caráter deliberado na constituição das redes” (SANTOS, 2009, p. 265). Para cada novo segmento de mercado surgem novas demandas para (re) criação do sistema de redes vigentes e até mesmo o padrão geográfico ou territorial é definido pela circulação. Na atualidade, as redes ou a logística apropriada são “[...] elementos catalisadores dos novos arranjos produtivos” (SILVA, 2003, p. 84), e assim, a logística faz parte do território e essa se insere nas políticas públicas de desenvolvimento. O projeto de rede é uma responsabilidade básica da gerência de logística. Nesse sentido ela deve considerar os modais de transportes básicos existentes: o ferroviário, o rodoviário, o aquático, o dutoviário e o aéreo, e ainda, seus volumes e receitas. A maior parte dos biocombustíveis produzidos no interior do Brasil, onde se localiza o Cerrado, são transportados segundo Nazário (2008) por mais de um modal o que é conhecido tecnicamente como transporte multimodal ou intermodal. Usa-se mais de um tipo de meio para transporte conforme a necessidade estabelecida pelo cenário atual. Sabe-se que o Brasil necessita urgentemente de investimentos em infraestrutura de transporte, para que possa utilizar especificamente modais que atendam a demandas específicas de cada setor. O uso prioritário do modal rodoviário é fator que contribui para ampliar o custo operacional, onerando o preço final do produto ou inviabilizando a competitividade. Comparativamente, a logística requerida para a produção e distribuição de biocombustíveis nos ambientes do Cerrado brasileiro pode ser analisada em diferentes momentos, a produção da matéria-prima e a produção industrial. Quanto à produção agrícola, a soja e a cana-de-açúcar, as duas principais matériasprimas usadas para biocombustíveis, demandam sistemas de transporte articulados de tal forma a permitir que a lavoura e a unidade industrial sejam interligadas. Nesse caso, o modal rodoviário praticamente está sendo o único usado para esse fim. O armazenamento de matéria-prima apresenta-se como uma das principais distinções entre os dois biocombustíveis. A soja pode ser armazenada por períodos relativamente 251 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 252 longos sem perder as suas propriedades, enquanto a cana-de-açúcar deve ser utilizada no processo industrial logo após a colheita, por ser um produto perecível. Essa distinção faz com que a organização da logística para os dois biocombustíveis apresente como diferença principal os sistemas técnicos de armazenamento de grãos. O conjunto técnico formado pelos equipamentos de armazenamento e conservação de grãos requer a instalação de formas espaciais com funções específicas. Na região Centro-Oeste, onde está significativa parte do Cerrado, existem 3990 unidades armazenadoras de grãos, sua capacidade de armazenamento é de 48,8 milhões de toneladas (CONAB, 2012b). Quanto à produção do etanol, a setor sucroenergético realiza a colheita entre abril e novembro, no Cerrado, fato que demanda maior capacidade de logística entre a lavoura e a indústria durante todo esse período. Um desafio enfrentado pelo setor na atualidade, está na possibilidade de organizar as épocas de plantio e renovação dos canaviais e a escolha de variedades com diferentes ciclos para que a maturação dos canaviais ocorra em diferentes momentos. Uma vez realizada a produção industrial do etanol, seu armazenamento ocorre, principalmente, na unidade industrial. A distribuição se realiza pelo transporte da unidade industrial para as bases de distribuição estatais e, a partir daí, para os postos de combustível que realizam o varejo. Considerando que apenas cerca de 35% do etanol produzido no Centro-Oeste é consumido na própria região (UNICA, 2012), o transporte de etanol dessa região para os grandes centros consumidores, especialmente na região Sudeste do país, e para portos, quando destinado a exportação, requer equipamentos de transporte que sejam eficientes e viáveis economicamente. Petraglia et al. (2009) afirmam que é notória a importância do etanol para o mundo como um todo, e fica para o Brasil a responsabilidade de investimento em infra-estrutura de transportes, para eles: • duas opções são passíveis de aumentar a competitividade do etanol brasileiro expressivamente: a concentração da produção em clusters e o transporte por “alcooldutos”; • a criação de clusters (15 usinas, em média) permitiria a melhoria da logística; • essas agregações de usinas são, por sua vez, combinadas em áreas que congregam uma população de 200 mil habitantes, o que tornaria viável uma série de aparelhos de interesse social, tais como hospitais, escolas e centros de lazer (PETRAGLIA et al., 2009, p. 12). Existem previsões de realização de investimentos públicos e privados na melhoria de 2. A produção de etanol no Cerrado A produção de etanol no Brasil cresceu de forma rápida durante a primeira década desse século sustentada pela abertura de novas unidades industriais e pela ampliação de unidades mais antigas. Se comparada a primeira safra desse século a safra de 2010, a produção Produção de Biocombustível no Cerrado rodovias, na construção de ferrovias e portos fluviais no país para atender a essas demandas. A construção de um duto ligando o Cerrado a região Sudeste tem sido um projeto de destaque nesse contexto, onde se localiza a maior parte do consumo de etanol do país. Segundo informações da União da Indústria da Cana-de-Açúcar (UNICA), a obra está avaliada em US$ 5 bilhões, terá 850 quilômetros de extensão, levando o etanol das principais regiões canavieiras do Centro-Sul até Paulínia, e de lá para os portos de São Sebastião (SP) e do Rio de Janeiro. Participam do projeto Petrobrás, Copersucar, Cosan, Odebrecht que controlam a ETH Bioenergia, e a Uniduto que tem entre suas acionistas São Martinho, Santa Cruz, São João e Bunge. A capacidade de transporte instalada será de até 21 milhões de metros cúbicos de etanol por ano, permitindo a redução dos custos com o transporte do etanol em 57%, gerando um aumento significativo na competitividade do etanol brasileiro, tanto no mercado doméstico quanto no internacional (UNICA, 2011). A instalação desse equipamento técnico é a materialização de uma forma espacial que vem no sentido de atender a funções requeridas especificamente pelo setor sucroenergético. A presença do setor neste espaço modifica o padrão de organização espacial através da criação de novas formas no seu processo de territorialização. Esta forma espacial torna-se capaz de alterar os processos e as estruturas locais, ao propiciar a otimização do sistema de logística do setor sucroenergético e, consequentemente da rentabilidade do setor. A solução da limitação seria a intermodalidade, atualmente, para o Brasil, uma realidade tímida. Muito deve ser feito para atender as necessidades logísticas que possam agregar valores aos produtos competitivos ao mercado nacional e internacional. No entanto, a expansão da produção de biocombustíveis no Cerrado potencializa a pressão antrópica sobre um bioma já seriamente comprometido pela ação da produção agroindustrial. Cria-se um paradoxo, produzir “biocombustíveis” à custa da exploração de recursos naturais em um bioma que carece de proteção. Como visto, ocupar e metamorfosear o Cerrado não se coloca como um desafio intransponível para o setor de biocombustíveis, considerando que existem condições naturais, institucionais, técnicas e econômicas que facilitam esse processo. 253 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 254 saltou de 10,5 bilhões de litros para 27,7 bilhões de litros (CONAB, 2012a). Trata-se de mais um ciclo de crescimento desse setor, que está presente no Brasil praticamente desde o início da colonização e tem por característica ciclos de crescimento e crise (RAMOS, 1999). As condições que proporcionaram esse ciclo de crescimento do setor podem ser encontradas na conjunção entre fatores de ordem econômica, política e ambiental nas escalas nacional e global. De uma forma geral a expansão vem sendo justificada, no contexto global, pela necessidade de diversificar a matriz energética através da inserção de fontes renováveis. No contexto nacional, se acrescenta a criação de políticas públicas específicas para o setor de bioenergia como forma de garantir abastecimento a frota de veículos bicombustíveis e reduzir a dependência do petróleo e seus derivados. Diante do contexto apresentado, é possível identificar um movimento de expansão para a porção central do país, onde se encontra o domínio do Cerrado. Os estados de Goiás e Mato Grosso do Sul podem ser considerados como as principais áreas de expansão do setor no ambiente de Cerrado, visto que a área cultivada com cana-de-açúcar nesses dois estados cresceu 310% entre 2000 e 2010, enquanto o crescimento nacional foi de 88% no mesmo período (IBGE, 2012). Esses dois estados apresentam diversas características favoráveis à expansão do cultivo de cana-de-açúcar a partir de um movimento que parte do oeste paulista, principal área de produção no país, e alcança as terras do Cerrado goiano e sul-mato-grossense. Dentre as principais condições que permitem essa expansão, trataremos aqui das características naturais, da disponibilidade de terras e da ação do poder público. Os ambientes de cerrado apresentam aspectos naturais de clima, solo e relevo favoráveis a realização do cultivo de cana-de-açúcar, inclusive com a possibilidade de mecanização das atividades agrícolas. As mudanças recentes no processo de produção de etanol e açúcar dão origem à formação de espaço adequado ao novo patamar técnico. Considerando que a mecanização das operações agrícolas está cada vez mais presente na cultura da cana-de-açúcar, realidade induzida pela redução dos custos operacionais e pela legislação, o relevo passa a ser elemento de seletividade de áreas para o plantio de cana-de-açúcar. As máquinas usadas para colher a cana-de-açúcar possuem capacidade de operar apenas em terrenos com baixa declividade, fato que determina que a expansão deve ocorrer, prioritariamente, em áreas com declividade baixa. Ribeiro et al. (2009) realizaram estudo para identificar áreas propícias à expansão do plantio de cana-de-açúcar no país, no bioma Cerrado. Os requisitos de áreas desejáveis Produção de Biocombustível no Cerrado para a expansão deveriam ser áreas agricultáveis ocupadas por pastagens, com latossolo, declividade inferior a 6º e, ainda, que não ferissem a legislação ambiental vigente em 2009. Os resultados do estudo apontam área de 8,9 milhões de hectares nessas condições no domínio do Cerrado. Como visto, a presença de extensas chapadas se torna um fator que habilita o uso de áreas nesse domínio para o cultivo de cana-de-açúcar. Além do relevo, o solo e o clima predominante no Cerrado podem ser apontados como facilitadores da expansão da atividade. O clima tropical, com dois períodos distintos quanto a pluviosidade e temperatura, apresenta-se adequado ao desenvolvimento da canade-açúcar e a produção de sacarose, por sua vez, o predomínio de latossolos nesse ambiente oferece possibilidades de bons resultados no rendimento agrícola. Levando em conta as condições edafoclimáticas e do relevo, se torna possível afirmar que do ponto de vista das características naturais, o Cerrado oferece condições favoráveis a expansão do setor sucroenergético. O processo de ocupação capitalista que se realizou no Cerrado forjou uma organização do uso da terra na qual existe uma complementaridade entre a pecuária e a agricultura de grãos. Para ilustrar a formação dessa complementaridade entre pecuária e agricultura de grãos no processo de ocupação, vale levar em conta que a expansão da sojicultura possibilitou a ampliação de ganhos por parte de proprietários tradicionais através do arrendamento de terras pouco produtivas, quando usadas para a agricultura tradicional e para a pecuária, aos sojicultores. Por sua vez, a possibilidade de ter acesso a terras sem a necessidade de imobilizar capital com a sua aquisição era uma condição desejável aos produtores de soja, geralmente dependentes de financiamentos públicos para a realização da produção. Esse cenário é visto pelo setor sucroenergético como uma possibilidade de territorialização sem a necessidade de imobilização de capital na aquisição de terras. O arrendamento de terras usadas, atualmente, para a produção de grãos, ou mesmo aquelas usadas para a pecuária, se torna a principal estratégia de garantir terras suficientes para a territorialização. Devido a condições de mercado favoráveis ao setor sucroenergético, durante o período analisado, este passou a contar com grande capacidade de competição com os setores de grãos e carne, inclusive com a possibilidade de disputar territórios já solidamente controlados. O pagamento de arrendamentos por valores superiores aos que são pagos por outros setores, o oferecimento de vantagens a fornecedores e arrendatários, a realização de ações para convencer autoridades locais e a comunidade sobre as vantagens oferecidas pelo setor, fazem parte da estratégia do capital sucroenergético para se territorializar. 255 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 256 A ação do Estado para incentivar a produção de etanol pode ser avaliada em diferentes escalas. Políticas públicas nas diferentes esferas de governo não são novidades no setor sucroenergético brasileiro. Historicamente o Estado tem fomentado o setor através de diferentes instrumentos, como por exemplo, oferecimento de incentivos fiscais, mudanças ou criação de legislação, elaboração e execução de planos e programas específicos para o setor. No contexto da expansão recente para terras do Cerrado, destacaremos a realização do Zoneamento Agroecológico da Cana-de-açúcar (EMBRAPA SOLOS, 2009) pelo governo federal e os incentivos fiscais oferecidos pelo estado de Goiás, como exemplos de políticas públicas que incentivam a expansão. Em setembro de 2009, o Estado divulgou o Zoneamento Agroecológico da Cana-de-açúcar, um abrangente estudo com a intenção de identificar terras apropriadas para a expansão do cultivo de cana-de-açúcar e, a partir de seus resultados, programar políticas públicas para induzir o crescimento do setor nestas áreas. A possibilidade de que os empreendimentos que estejam nas áreas aptas para a expansão, pelo Zoneamento Agroecológico da Cana-de-açúcar, sejam enquadrados em programas de benefício fiscal, bem como o estabelecimento de sobretaxa a produção em áreas consideradas inaptas, se torna ferramenta estatal capaz de manter relativo controle sobre o processo de expansão. Os resultados do Zoneamento apontam como área prioritária de expansão, o Cerrado da porção central do país, visto que a região Centro-Oeste possui a maior área considerada apta a expansão (Figura1). Se considerarmos que foi excluído o Pantanal, a Amazônia e a bacia do Alto Paraguai, os mais de trinta milhões de hectares de área consideradas aptas à expansão no Centro-Oeste seriam áreas contidas no bioma Cerrado. Quando analisados os resultados do Zoneamento Agroecológico da Cana-de-açúcar na região Centro-Oeste, observa-se que, dentre as quatro unidades da federação aí presentes, o estado de Goiás ocorre a predominância de áreas aptas (41,6%), seguido por Mato Grosso do Sul (35,9%). Levando em conta que o Zoneamento teve como prerrogativa inicial não indicar a expansão do cultivo da cana-de-açúcar em áreas dos biomas Amazônia e Pantanal, além da Bacia do Alto Paraguai, os ambientes de Cerrado nos estados de Goiás e Mato Grosso do Sul se tornam alvo da expansão. Além das condições anteriormente descritas, a expansão, em parte, vem sendo guiada pela atuação direta do Estado na concessão de benefícios em áreas onde haja interesse de induzir o crescimento de uma atividade. Eventuais desvantagens de logística e produtividade podem ser compensadas pela participação estatal, concedendo vantagens fiscais e financiando a expansão de uma atividade. No caso do setor sucroenergético, os benefícios fiscais são diferenciais para atrair a atividade para alguma área distinta. Na região de expansão da atividade no Cerrado, podem ser identificados programas de renúncia fiscal. Figura 1 – Áreas aptas a expansão do cultivo de cana-de-açúcar segundo as grandes regiões do IBGE e detalhamento da Região Centro-Oeste (em ha). Castro (2007) analisa a expansão da atividade sucroenergética nos estados de Goiás, Minas Gerais, Paraná e Mato Grosso, denominando essa área como a de expansão da primeira onda. Dentre os estados analisados, o estado de Goiás vem sendo apontado como o que oferece maiores incentivos fiscais ao setor sucroenergético. O principal mecanismo de incentivo fiscal a disposição do setor no estado de Goiás é o Programa Produzir. As empresas que se beneficiam desse programa recebem, a título de financiamento subsidiado, o valor de até 73% do ICMS a ser recolhido. Mesmo se tratando de um financiamento, a lei que regulamenta o programa Produzir prevê que pode ser concedido um desconto que pode variar de 30% a 100% sobre o saldo devedor, a título de subsídio para investimentos na instalação ou expansão de unidades industriais. Dessa forma, o Estado oferece não apenas financiamento, mas passa a ter capacidade de subsidiar atividades industriais no estado. Entre os anos de 2003 e 2010, esse programa destinou R$ 28,1 bilhões à agroindústria canavieira através da assinatura de 50 contratos de concessão, que equivalem a 37,5% de Produção de Biocombustível no Cerrado Fonte: Zoneamento Agroecológico da Cana-de-açúcar – EMBRAPA SOLOS, 2009. 257 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 258 todas as concessões no período (Ministério Público do Estado de Goiás, 2010). Os subsídios oferecidos através do Produzir são significativos para proporcionar a expansão do setor em Goiás, que, nos últimos quatro anos, ampliou de 11 para 36 unidades industriais canavieiras em funcionamento, elevando o Estado à posição de segundo maior produtor de etanol do país, com aproximadamente 2,94 bilhões de litros na safra 2010/2011 (CONAB, 2012a). O cenário formado no contexto da expansão demonstra que o setor sucroenergético está passando por um momento de reordenamento em sua organização interna e na relação com outros setores e com a sociedade. Apesar das mudanças observadas no setor em sua organização interna, a necessidade de garantir território para a realização de sua produção em terras que estejam próximas à unidade industrial se mantém como característica. As estratégias de territorialização tem se alterado como resultado da necessidade de dar maior fluidez e flexibilidade ao território. No entanto, a necessidade de estabelecer territorialidades sobre áreas para a produção se mantém. As novas territorialidades impostas pelo setor sucroenergético modificam as territorialidades já estabelecidas e desencadeiam um processo de des-re-territorialização (HAESBAERT, 2006) que alcança diferentes dimensões. A conjunção entre a ação estatal, as condições naturais e a possibilidade de ocupar terras apontam para o Cerrado como a principal área a ser ocupada pela expansão. Esse bioma, já duramente castigado por ondas de expansão do agronegócio, tem intensificado o seu uso em nome de produção de energia ‘renovável e limpa’. 3. A produção do Biodiesel nos cerrados Quando o governo brasileiro instituiu o programa de estímulo à produção e o uso do biodiesel, em 2005, além da obrigatoriedade da aquisição de matérias-primas da agricultura familiar nos percentuais mínimos de 30% nas regiões Nordeste, Sudeste e Sul e de 10% das regiões Norte e Centro-Oeste até a safra 2009/2010, e de 15% a partir da safra 2010/2011, estabeleceu que as empresas receberiam, em contrapartida, incentivos fiscais, através do PIS (Programa de Integração Social) e COFINS (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social), sendo que: a) a mamona ou a palma, produzidas nas regiões Nordeste, Norte e no Semi-Árido teriam 100% de isenção; b) qualquer matéria-prima produzida pela agricultura familiar, independentemente da região, teria 67,9% da produção adquirida e a mamona ou a palma produzidas pelo agronegócio nas regiões Norte, Nordeste e no Semi- Produção de Biocombustível no Cerrado Árido teriam 30,5%. Percebe-se que essa política criou, ao mesmo tempo, obrigatoriedade e incentivos fiscais para a aquisição de produtos da agricultura familiar. Fora das regiões Nordeste e Norte não há incentivos para espécies vegetais específicas, valendo, portanto, quaisquer culturas para a produção de biodiesel produzidas pelos agricultores familiares. “Este vínculo declarado entre a oferta de matérias-primas para a produção de biocombustível e a geração de renda pela agricultura familiar – sob o patrocínio do Estado, sob a operacionalização de empresas privadas e com a legitimação contratual por parte do sindicalismo – parece ser inédito, no plano internacional” (ABRAMOVAY e MAGALHÃES, 2010, p. 2). Na região Centro-Oeste (região dos cerrados), de forma geral, a produção familiar volta-se para as culturas de alimentos e, entre essas, as culturas de oleaginosas são inexpressivas. No que se refere ao extrativismo, apesar da grande variedade de espécies do Cerrado, a extração de óleos de plantas do Cerrado para abastecer a produção de biodiesel não parece ser viável economicamente, seja pelo custo e/ou pela escala. Entretanto, a região é a maior produtora de soja do país, cultura que ganhou expressão na produção de biodiesel, mais pela escala de produção do que pelo teor de óleo em si, já que existem outras culturas com maior rendimento, como por exemplo, o girassol, que rende até 48% do peso em óleo, contra a soja que pode chegar a 18%. Mas, além da soja não estar entre as culturas que possam ser adquiridas do agronegócio com incentivos fiscais, no CentroOeste o seu cultivo pela agricultura familiar não foi estimulado, já que o modelo técnicoprodutivo e as diretrizes políticas, quando da sua implantação nos cerrados, da década de 1970 se voltaram para o incentivo de uma estrutura produtiva empresarial. Na época, os idealizadores desse modelo justificavam que essa cultura só seria viável em áreas acima de 400 hectares, por conta da escala de produção e dos altos investimentos, não sendo adequada para a produção familiar. Entretanto, com o programa do biodiesel, o que desconsiderado, parece ser a saída, ou seja, a produção de soja pela agricultura familiar está em expansão nos assentamentos de reforma agrária e em pequenas propriedades. Assim, a produção de biodiesel nos cerrados está articulada às seguintes variáveis: a) a soja representa mais de 85,5% da matéria prima, seguida da gordura bovina 8,3% (ANP, 2012); b) a produção de soja pela agricultura familiar está associada aos assentados da reforma agrária e c) o seu custo de produção não é competitivo, mesmo como combustível regional, portanto depende de subsídios públicos. Apesar do custo, a produção de biodiesel aumenta a oferta nacional desse combustível, consequentemente reduz a dependência da importação de diesel. Segundo 259 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 260 dados da Agência Nacional do Petróleo (2012), no período entre 2004 a 2011, o Brasil deixou de importar 7,9 bilhões de litros de diesel, o equivalente a um ganho de cerca de US$ 5,2 bilhões na balança comercial brasileira. Estimulado pelo aumento da mistura de biodiesel ao diesel, que passou para 5% a partir de 2010 e com perspectiva de chegar a 20% em 2020 (B20), a base industrial vem sendo ampliada, sendo que das 86 usinas em atividade vinte estão no Mato Grosso, sete em Goiás, oito em São Paulo e cinco no Rio Grande do Sul; juntos esses estados concentram 82% da produção do biocombustível (ANP, 2012). Os estados de Mato Grosso e Goiás, principais produtores de soja na região Centro-Oeste, respondem por 97,7% dos 1.036.557 m3 de biocombustível produzido na região, que por sua vez representa 37,8% de toda produção nacional (ANP, 2012). A produção de óleo de soja destinado ao biodiesel é cada vez maior. Segundo dados da Ubrabio/FGV (2012, p 14), “o Brasil produziu na safra 2009/10 aproximadamente 6 milhões de toneladas de óleo de soja, das quais 1,46 milhão foi exportado como óleo bruto. Do consumo interno de óleo de soja de 4,52 milhões de toneladas, 25% foram destinados para o mercado de biodiesel”. Entretanto, no Mato Grosso, a conversão passou de 30%, em 2009, para 49,3%, em 2010, do total do óleo de soja produzido no estado. A remuneração sobre o biodiesel certamente é um motivador para esse aumento. Pois, conforme informações do Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária (IMEA), que a produção de biodiesel proporciona, “pois enquanto a rentabilidade média de uma tonelada de soja transformada em óleo e farelo é de R$ 780, sendo convertida em biodiesel e farelo, o valor sobe para R$ 863” (Jornal Folha de São Paulo, 04/11/2010). O aumento da adição de biodiesel ao diesel, conforme proposição das políticas públicas, elevando a mistura para 10% em 2014 e 20% em 2020, a demanda por óleo de soja mais que triplicará, pois além de ser a matéria prima mais usada é, também, a que tem a capacidade instalada para atender essa demanda. Esse fato concorrerá para o aumento do processo da soja no país, reduzindo a sua exportação in natura. Esse aumento, ainda, implicará na expansão da área de soja, especialmente nos cerrados, e, também, pressionará a produção de soja na agricultura familiar, pois a política do “Selo Combustível Social” estabelece a obrigatoriedade da aquisição de pelo menos 15% da matéria prima da agricultura familiar para que a empresa possa participar dos leilões de compras da Agência Nacional do Petróleo (ANP) e Petrobras, bem como ter acesso aos incentivos fiscais e facilidades de crédito do governo federal. Há produção de soja em áreas de assentamento em Goiás, conforme Peixinho Considerações Finais O uso dos recursos naturais no ambiente do Cerrado brasileiro para a produção de energia, especialmente o etanol e o biodiesel, é uma das principais apostas do governo brasileiro para diversificar a matriz energética brasileira, garantir o abastecimento de energia Produção de Biocombustível no Cerrado e Scopel (2011), em março de 2010, a COPARPA (Cooperativa Mista do Rio Doce), que atua no Sudoeste de Goiás, já contava com um quadro de 500 cooperados, dos quais 350 produziam soja para o biodiesel. Segundo, Gilmar Katzer, presidente da Cooperativa, em 2010, nove assentamentos (Perolândia - o da Lagoa do Bom Fim e o Três Pontes; Rio verde - o Água Bonita e o Rio Verdinho; Vaianópolis: o Ponte de Pedra e o Pontal do Buriti; Jataí - o Rio Paraíso), produziam soja para o programa do biodiesel. Apesar do núcleo de produtores estar nos assentamentos, outros produtores familiares estão aderindo ao programa, especialmente em Rio Verde, onde há um grande contingente de produtores familiares. A produção do biodiesel nos cerrados está associada à produção de soja. A conversão do óleo de soja em biodiesel aumento o seu uso, elevando a sua condição frente ao farelo, considerado o produto nobre da soja. A escala de produção no Centro-Oeste, região nuclear dos cerrados (aproximadamente 70 milhões de toneladas na safra 2010/2011), torna-se um elemento de compensação sobre o baixo teor de óleo no grão de soja frente a outras culturas (gergelim, pinhão manso e girassol), que ainda estão em fase experimentais. A pressão para aumentar a quantidade de biodiesel no óleo diesel repercutirá na expansão de áreas para a cultura da soja nos cerrados, assim, como a sua produção em pequenas propriedades. Os impactos socioambientais dessa produção vão da pressão por abertura de novas áreas para a produção de soja à redução de outras culturas, ampliando assim, o espaço da monocultura no país. Com a expansão da cultura da cana-de-açúcar para os cerrados, especialmente a partir de meados da década de 2000, ampliou as disputas entre os setores da cadeia carne-grão e sucroenergético, podendo gerar uma redução em outras atividades, pois juntos, deverão alocar as áreas com as melhores condições produtivas. Assim, o que se pode visualizar a partir das disputas territoriais entre os setores da cadeia grane-grão é que as suas respectivas culturas e seus derivados estão ampliando cada vez mais suas áreas nos cerrados, gerando uma região monopolizada por essas commodities agrícolas, incorporando inclusive as áreas das pequenas e médias propriedades. 261 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 262 e se colocar como um dos países com a matriz energética mais “limpa”. O poder público se articula ao capital para potencializar a exploração dos recursos naturais energéticos desse bioma, já duramente castigado pela ação humana para produzir alimentos. Viabilizar a ocupação e exploração do Cerrado não é um objetivo recente. Desde meados do século XX consistentes programas públicos incentivaram a ocupação e a exploração desse espaço através da implantação de infraestrutura de transportes e comunicações. A ligação ferroviária e, mais consistentemente, rodoviária entre as áreas de Cerrado e os grandes centros consumidores no país e aos portos foi condição primordial para acelerar a ocupação do interior do país. As transformações que se instalaram no Cerrado brasileiro, são fruto do processo de ocupação capitalista e, como tal, sempre estiveram condicionadas às novas demandas econômicas. Vivemos, agora, um momento em que a demanda por energia possibilita que a produção de etanol e de biodiesel no Cerrado seja justificada pela necessidade de preservar recursos naturais através do uso de “energia limpa”. As questões ambientais no Cerrado ficam em segundo plano, em detrimento de uma ação capaz de mitigar impactos ambientais de alcance mais amplo. De forma contraditória, se promove a intensificação da exploração de um bioma nome da preservação ambiental. Apesar de vários estudos que mostram a importância do Cerrado como bioma, a sua inserção nas políticas públicas a partir da década de 1970, tornaram-no a principal região produtora de grãos e carnes do país e nos últimos anos está se tornando, a partir a inserção do Brasil no mercado mundial de energia renováveis, como uma região produtora de energia de biomassa. Essa expansão pressiona cada vez mais os recursos naturais desse bioma, que é o único que não tem proteção constitucional, ficando vulnerável aos diversos impactos ambientais decorrentes da sua intensa ocupação. Uma das poucas iniciativas para torná-lo bioma protegido tramita em um projeto de lei na Câmara dos Deputados, através do Projeto de Emenda Constitucional (PEC 115/95 Cerrado e Caatinga), que tem por objetivo torná-los patrimônio nacional. Porém, enquanto não se dá a sua aprovação os impactos ambientais continuam a repercutir sensivelmente em todas as áreas. Sabe-se que o Cerrado “é considerado corredor ecológico entre quase todos os biomas do Brasil. A sua destruição coloca em risco também a manutenção dos rios que compõem as maiores bacias hidrográficas brasileiras – do Amazonas, do São Francisco e Platina.” (MACHADO, 2010, p. 2). O Cerrado, por fim, está colocado em meio a uma grande contradição, ao mesmo tempo em que aparece como a maior região produtora de carnes e grãos, portanto alimentos, e mais recentemente, como região de expansão de energia renováveis, portanto, contribuindo para a produção de combustíveis “limpos”, é o bioma que recebe o maior impacto recorrente dessa produção. Neste sentido, Chaveiro (2008, p.75) afirma que “o cerrado se coloca no centro de uma disputa de sentido, de uso e de filiações simbólicas, econômicas e políticas”. REFERÊNCIAS ABRAMOVAY, R e MAGALHÃES, R. O acesso dos agricultores familiares aos mercados de biodiesel: parcerias entres grandes empresas e movimentos sociais. Disponível em: http://www.abramovay.pro.br/artigos_ cientificos/2007/Biodiesel_AIEA2_Portugues.pdf Acesso em: 25.06.2010. p. 1-22. AGÊNCIA NACIONAL DO PETRÓLEO, GÁS NATURAL E BIOCOMBUSTÍVEIS- ANP. Anuário Estatístico Brasileiro do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis 2012. Brasília; ANP, 2012. 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A comunidade com forte influência ideológica apregoa uma ação mais efetiva do Estado para combater os problemas gerados pela atividade econômica no meio ambiente. Já a corrente pragmática posiciona-se como conciliadora, entre os defensores do emprego dos recursos naturais pelas firmas e a atenção às reinvindicações da comunidade ambientalista. Couto (2009), em artigo publicado no Correio Brasiliense sobre as alterações no Código Florestal (Lei nº 4771/65), referenciando-se ao embate entre ruralista e ambientalista, pontua a divergência de opiniões entre os dois segmentos sobre as mudanças propostas na referida legislação, embora reconhecendo que os atores da discussão têm o consenso sobre a necessidade de aliar desenvolvimento à preservação da natureza. Entretanto, sob uma égide ideológica ou pragmática, o Estado se manisfesta como interlocutor da sociedade, mediante a elaboração e implementação de políticas públicas ambientais, seja introduzindo marco regulatório, seja no desenvolvimento de programas e projetos socioambientais focados nos principios do desenvolvimento sustentável ou mediante a ação de poder descricionário na aplicação da legislação ambiental, por intermédio dos órgãos dos sistema nacional e subnacionais de meio ambiente. Porém, políticas públicas ambientais e ações do poder público são instrumentos de governo para atender as demandas da sociedade e são operacionalizados mediante aplicação dos atos normativos e reguladores que impõem certas condicionantes para o ecossistema empresarial. Assim, tais regulações são agentes que interferem na dinâmica do ecossistema empresarial, podendo influenciar, de forma direta ou indireta, nos resultados dos subsistemas empresariais que compõem determinados segmentos da atividade econômica, em virtude de suas fronteiras espaciais ou geográficas. Não obstante, poderá vir a influenciar os resultados do desempenho empresarial, portanto, de forma explícita ou implícita, políticas públicas ambientais e ações do poder público, podem, via regulação 1. Política Pública e Ações Governamentais sob o Enfoque Ambiental O estado da arte para compreensão dos fenômenos ligados ao desenvolvimento empresarial econômico e socioambiental, dimensionados a partir de política pública ambiental e ações governamentais, fundamenta-se no complexo sistema da legislação ambiental e de decisões do Poder Público, emanados pelos órgãos nacional e subnacionais do sistema de Meio Ambiente. Segundo Sanches (1997), as políticas públicas norteiam as ações dos agentes de governo, enquanto que, para os agentes privados sinalizam os seus investimentos e os seus processos de produção e comercialização. Para Keohane, Revesz e Stavins (1998) uma política ambiental deve ser estabelecida a partir de duas questões centrais: qual o nível de proteção ambiental desejado e qual instrumento político deverá ser aplicado para realizar tal proteção, portanto, sob a gênese da legalidade e da legitimidade, o Poder Público norteia suas políticas públicas e as ações governamentais de cunho ambiental a um conjunto de diretrizes de carácter normativo e de regulação do uso, conservação e/ ou preservação dos recursos naturais pelo homem em prol da sociedade. Vários autores Influência da Política de Regulação Ambiental no desempenho econômico e socioambiental da indústria de lacticínio em Goiás - Brasil dos órgãos do sistema ambiental, interferir no desempenho econômico e socioambiental das empresas. Segundo Marcovitch (2006), há diferenças significativas entre o tempo da lógica política e da lógica empresarial. Razão pela qual, faz-se necessário buscar respostas para alguns questionamentos: 1) As políticas públicas ambientais afetam o desempenho econômico e socioambiental das empresas? 2) A legislação ambiental influência o desempenho econômico e socioambiental das empresas? 3) As ações do poder público, relacionadas às questões ambientais influenciam o desempenho econômico e socioambiental das empresas? As respostas a essas perguntas são de grande valia para se conhecer até que ponto as políticas públicas ambientais podem influenciar no desempenho econômico e socioambiental das empresas. Portanto, neste artigo, apresenta-se o resultado de uma investigação que buscou, mediante aplicação de pesquisa empírica no segmento de lacticínio, abrir novas fronteiras de conhecimento em relação à compreensão das questões ambientais, em especial, se as políticas públicas ambientais e as ações do poder público, fundamentadas no marco regulatório e normativo do Estado, exercem influências no desempenho econômico e socioambiental das empresas de beneficiamento e industrialização de produtos lácteos e seus derivados no Estado de Goiás-Brasil. 267 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 268 denominam esse processo de sistema de comando e controle (GU, 2000; ANDRADE, MARINHO E KIPERSTOK, 2001; POLIZELLI, PETRONI E KRUGLIANSKAS, 2003). São também intrínsecos ao contexto de formulação das Políticas Públicas Ambientais os instrumentos institucionais de regulação direta no mercado prescritos pela ação do Estado no ditamento de regras e padrões técnicos para os sistemas de produção e comercialização de bens, produtos e serviços destinados ao mercado (CORREA, 1998; COUTINHO, NOYA E NOBREGA, 2002). Associa-se, também, às questões de Políticas Públicas Ambientais o conjunto de normas de sansões administrativas e penais aplicadas sob o enfoque da prática de condutada e de atividade lesiva ao Meio Ambiente (Lei Federal nº 9.605/98). Nesse sentido, a não observação ou a transgressão das normas ambientais por parte da gestão empresarial ser-lhe-á imputada responsabilidade por danos ambientais, mediante aplicação de sansões administrativas em compensações financeiras por danos ambientais, multas por infrações ambientais; embargo de obras por danos ambientais e até a suspensão de venda e/ou da atividade de produção por infração ambiental (SANTILI, 2007; PHILIPPI, 2002). A governança institucional do sistema de Meio Ambiente é descrita na Lei 6938/81 de criação do PNMA – Política Nacional do Meio Ambiente, a qual instituiu o Sistema Nacional de Meio Ambiente, estabelecendo as competências dos órgãos nacionais e subnacionais para atuarem com as questões ambientais em nível Federal, Estadual e Municipal. Segundo Azevedo, Pasquis, Burzstyn (2007), a lei de Política Nacional do Meio Ambiente definiu os cenários de atuação dos entes federativos em referência às ações relativas à formulação de política e execução de Políticas Públicas Ambientais e da ação judiciária. Os autores, no Quadro 1 abaixo, descrevem os entes e as suas competências. Alicerçam, ainda, esse cabedal de normatização e regulação ambiental as ações do Poder Público com instrumentos econômicos de intervenção direta no mercado por meio de incentivos creditícios e financeiros, para favorecer ou descriminar produtos ou processos produtivos, sob um enfoque de promover a redução do uso e a demanda por recursos naturais. Instrumentos econômicos são classificados em taxas e impostos, autorizações de comercializáveis ou subsídios para produtos (CORRÊA 1998, COUTINHO, NOYA E NOBREGA, 2002). A geração da Lei nº 11. 284, de criação das Flonas, denominada - Lei de Gestão de Florestas, é um exemplo de ação do Poder Público, instituindo um instrumento econômico composto de taxas, royalties e imposto sobre lucro, com vistas a promover a exploração dos recursos naturais das florestas nacionais de forma sustentável (POSTALI e NISHIJIMA, 2008; MARCOVITCH, 2006). Quadro 1 - Entes Federativos e suas Competências Inserem-se, também, ao contexto das ações do Poder Público, os acordos internacionais e regionais, relacionados às questões ambientais. Estes atos normativos e/ou reguladores, implementados via acordos multilaterais ou bilaterais de comércio internacional, estabelecem padrões governamentais ou voluntários para produtos, processos produtivos e na comercialização de bens e serviços. Os padrões oriundos dos acordos internacionais socioambientais transformam-se em instrumentos de barreiras técnicas que impactam o desempenho empresarial. Apresentam-se sob a forma de exigências em aplicação de certificação ISO 14000, certificado de conformidade de análise de ecoeficiência, rotulagem ambiental para produtos e de barreiras técnicas ambientais do selo verde. Segundo Burnquist et al. (2007), as empresas brasileiras exportadoras percebem as exigências técnicas como um fator altamente restritivo para o desenvolvimento de uma política comercial mais do que as barreiras tarifárias. Políticas Públicas Ambientais e Ações Governamentais são elementos que, direta ou indiretamente, podem exercer influência no desempenho empresarial econômico e socioambiental das firmas. O arcabouço regulador do Estado, mediante ação de controle e comando ou por intermédio de aplicação de instrumentos econômicos ou também em razão de acordos internacionais ou regionais, induz a uma sistemática intervenção no sistema de produtivo das Empresas, seja pela via de investimento em infraestrutura para atender às demandas dos órgãos do sistema ambiental ou pela necessidade em modernizar métodos Influência da Política de Regulação Ambiental no desempenho econômico e socioambiental da indústria de lacticínio em Goiás - Brasil Fonte: Adaptado de Azevedo et al apud Burstyn e Burzstyn, 2007 269 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 270 e processos produtivos com vista a atender aos padrões ambientais para uso e conservação dos recursos naturais. Todavia, as firmas buscam estabelecer uma relação de interação com o ambiente sob o prisma da sustentabilidade. Os princípios da sustentabilidade estão baseados em três dimensões: a econômica, a ambiental e a social. Não obstante, o binômio: atividade empresarial e sustentabilidade - apresenta-se como um fator relevante para as definições do portfólio de produtos das empresas. O alinhamento das decisões estratégicas corporativas ou genéricas das firmas, com foco em gestão ambiental, torna-se essencial para atender às demandas do mercado por produtos designados ecologicamente corretos. Segundo Epelbaum (2004), o investimento em Meio Ambiente contribui para elevar a competitividade empresarial com resultados tangíveis e intangíveis. Por outro lado, a aplicação da legislação ambiental por parte das empresas traz no seu bojo uma série de investimentos ligados ao ciclo de vida dos produtos, podendo impactar os orçamentos das firmas. Entretanto, associado a esses investimentos, há também melhoria de produtividade pelas práticas de gestão e de métodos e processos de produção, via inovação tecnológica, que elevam a qualidade dos produtos. Tais fatores podem, de forma direta ou indireta, elevar a competitividade das firmas. Para Almeida, Kruglianskas e Guimarães (2008), as empresas, que adotam como estratégia a produção sustentável estão preparadas para a nova realidade e prontas para atender às exigências do mercado. Também são organizadas para atender aos requisitos de auditoria de gestão ambiental. Destacam-se, também, os aspectos sociais relacionados à questão da sustentabilidade sob a ótica da Responsabilidade Social Empresarial que se alicerçam nas crenças e valores éticos que norteiam as relações da Empresa com as partes interessadas da sociedade (stakeholders), de forma participativa e transparente. A responsabilidade social das empresas é, essencialmente, um conceito segundo o qual as empresas decidem, numa base voluntária, contribuir para uma sociedade mais justa e para um ambiente mais limpo (COMISSÃO DA COMUNIDADE EUROPÉIA, 2001). Já a Confederação Nacional das Indústrias – CNI assim define a responsabilidade social empresarial: A Responsabilidade Social Empresarial consiste num conjunto de iniciativas por meio das quais as empresas buscam – voluntariamente – integrar considerações de natureza ética, social e ambiental às suas interações com clientes, colaboradores, fornecedores, concorrentes, acionistas, governos e comunidades – as chamadas “partes interessadas” – visando ao desenvolvimento de negócios sustentáveis. A pesquisa foi organizada com o objetivo de verificar se o fenômeno política de regulação ambiental baseado na legislação socioambiental guarda alguma associação com o desempenho econômico e socioambiental das empresas de beneficiamento e industrialização de leite e derivados no Estado de Goiás-Brasil. Aplicou-se um questionário estruturado elaborado em uma escala do tipo Likert, com valor de pontuação de 1 a 5, em 118 empresas registradas no Serviço de Inspeção Federal, da Superintendência Federal da Agricultura, Pecuária e Abastecimento no Estado de Goiás-Brasil, nas categorias de fábrica de laticínios, usina de beneficiamento e posto de refrigeração . Estas empresas de produtos lácteos se enquadram na Resolução nº 237/97, do Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA, como empresas que necessitam de licenciamento ambiental para exercerem suas atividades econômicas. Do universo das empresas pesquisadas obteve-se o retorno de 92 questionários. Portanto, a amostra compõe-se de 77, 97% do universo das empresas do segmento da indústria de lacticínio em Goiás, inscritas no Sistema de Inspeção Federal –SIF, o que nos permite inferir que ela é representativa para o referido segmento. O grupo não respondente é homogêneo ao grupo respondente, considerando os critérios estabelecidos para definição da amostra, ou seja, empresas fiscalizadas pelo Sistema de Inspeção Federal – SIF e sujeitas a aplicação da resolução nº 237/97, do Conselho Nacional do Meio Ambiente. Desta forma, o resultado amostral atende aos requisitos estatísticos para definição da amostra por população conhecida ao nível de confiança de P≤0, 05. Os resultados da pesquisa empírica foram analisados mediante a utilização da estatística inferencial. A análise indutiva ou inferencial é baseada na aplicação da técnica de Correlação de Pearson para determinar o grau de associação entre as variáveis estudadas.e do uso da estatística F para se obter o teste de significância das hipóteses. Aplica-se, também, a correlação de Pearson e o alfa Cronbach para validação do instrumento de pesquisa utilizado, bem como mensurar o grau de confiabilidade interna dos dados coletados. Os dados da pesquisa foram tratados mediante o uso do software estatístico Sphinx e da planilha eletrônica Excel. Estabeleceu-se,também, o conjunto de hipótese com objetivo de verificar se a politica de regulação ambiental expressa via a legislação ambiental guardam alguma associação com o desempenho econômico e socioambiental das firmas pesquisadas. São as seguintes hipótese levantadas: H1 - Há associação entre a variável independente, denominada legislação Influência da Política de Regulação Ambiental no desempenho econômico e socioambiental da indústria de lacticínio em Goiás - Brasil 2.Metodologia da Pesquisa 271 socioambiental e a variável dependente, denominada marketing ambiental das empresas de beneficiamento e industrialização de leite e derivados do Estado de Goiás; H2 - Há associação entre a variável independente, denominada legislação socioambiental e a variável dependente, denominada desempenho econômico das empresas de beneficiamento e industrialização de leite e derivados do Estado de Goiás; H3 - Há associação entre a variável independente, denominada legislação socioambiental e a variável dependente, denominada desempenho ambiental das empresas de beneficiamento e industrialização de leite e derivados do Estado de Goiás; H4 - Há associação entre a variável independente, denominada legislação socioambiental e a variável dependente, denominada desempenho social das empresas de beneficiamento e industrialização de leite e derivados do Estado de Goiás. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 3 - Teste de consistência do instrumento de coleta de dados 272 3.1- Variável independente legislação ambiental Os itens da questão sobre legislação ambiental apresentam o grau de associação, medido pelo coeficiente de correlação de Pearson, classificado com positivo muito forte, com uma variação entre 0, 85 a 0, 96. O Alfa Cronbach tem grau de densidade interno determinado como bom e excelente. Portanto, pode-se aferir como consistente o conjunto de dados referentes aos itens do instrumento de coleta de dados sobre legislação ambiental. Tabela 1 - Matriz de validação da dimensão Legislação Socioambeintal 3.2. Variável dependente marketing ambiental (VD 1) Os itens que compõem a questão marketing ambiental apresentam o grau de associação, medidos pelo coeficiente de correlação de Pearson, classificado com positivo muito forte. O Alfa Cronbach tem grau de densidade interno determinado como bom. Portanto, pode-se aferir como consistente os dados relacionados aos itens da questão sobre marketing ambiental. Tabela 2 - Matriz de validação da dimensão Marketing Ambiental Fonte: Autores Influência da Política de Regulação Ambiental no desempenho econômico e socioambiental da indústria de lacticínio em Goiás - Brasil Fonte: Autores 273 3. 3. Variável dependente desempenho econômico (VD 2) O grau de associação, medido pelo coeficiente de correlação de Pearson, para os itens da questão desempenho econômico é classificado com positivo muito forte, com uma variação entre 0, 82 a 0, 97. O Alfa Cronbach tem grau de densidade interno determinado como excelente. Portanto, pode-se aferir como consistente os dados referentes aos itens da questão sobre desempenho econômico Tabela 3 - Matriz de validação da dimensão Desempenho Econômico Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Fonte: Autores 274 3.4. Variável dependente desempenho ambiental (VD 3) Os itens que compõem a questão desempenho ambiental têm o grau de associação, medido pelo coeficiente de correlação de Pearson, classificado com positivo muito forte, com uma variação entre 0, 72 a 0, 91. O Alfa Cronbach tem grau de densidade interno determinado como bom. Portanto, pode-se aferir como consistente os dados referentes aos itens da questão sobre desempenho ambiental. Tabela 4 - Matriz de validação da dimensão Desempenho Ambeintal Fonte: Autores 3.5.Variável dependente desempenho social (VD 4) Os itens que compõem a questão desempenho social têm o grau de associação, medido pelo coeficiente de correlação de Pearson, classificado com positivo muito forte, com uma variação entre 0, 81 a 0, 86. O Alfa Cronbach tem grau de densidade interno determinado como bom. Portanto, pode-se aferir como consistente os dados referentes aos itens da questão sobre desempenho social. Fonte: Autores 4. Teste de significância das hipóteses Todos os coeficientes Fo calculados das hipóteses que compõem o grupo I foram maior do que os Fc críticos. Por isso, em nível de significância de P ≤ 0, 05, pode-se rejeitar as hipóteses nula H0: b2 = b3 =. . . . . . . bk = 0 e aceitar as hipóteses experimentais de H1: b2 = b3 =. . . . . . . bk ≠ 0. Portanto, pode-se inferir que há evidências de associação entre a variável explicativa, VI. 1 (Legislação Socioambiental) e as variáveis explicadas, VD. 1 Influência da Política de Regulação Ambiental no desempenho econômico e socioambiental da indústria de lacticínio em Goiás - Brasil Tabela 5 - Matriz de validação da dimensão Desempenho Ambeintal 275 (marketing ambiental); VD. 2 (desempenho econômico); VD. 3 (desempenho ambiental); VD. 4 (desempenho social) das empresas de beneficiamento e industrialização de leite e derivados do Estado de Goiás. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Tabela 6 - Teste de Hipóteses 276 Fonte: Autores 5. Análise das correlações entre as variáveis Nesta seção, buscou-se inferir o grau de associação entre a variável explicativa de legislação socioambiental (VI) e as variáveis explicadas de desempenho econômico e socioambiental das empresas (VD) mediante a análise de correlação múltipla, cujos resultados são mostrados a seguir. As correlações são todas significativas para p≤ 0, 05, embora com intensidade diferenciada entre elas. Portanto, infere-se que há associação entre a variável independente legislação socioambiental e as variáveis dependentes de marketing ambiental, desempenho econômico, desempenho ambiental e desempenho social. Baseado nesta evidência de associação pode-se ainda inferir: • Sob o contexto de uma política ambiental de comando e controle, observa-se a eficácia da Legislação Socioambiental (indicadores VI. 1. 1; VI 1. 2 e VI 1. 3), mediante a influência sobre as ações de marketing ambiental(VD1) das empresas de beneficiamento e industrialização de leite em Goiás. Por outro lado , como há influência positiva, deduz-se que as firmas pesquisadas vêem as questões relativas ao licenciamento ambiental não como fatores que possam afetar diretamente o desempenho mercadológico , mas sim como contributo para a comercialização de produtos com a marca ecológica, o que denota a internalização da normativa por parte das empresas do setor. • O indicador da variável intensidade dos dispêndios para atender a Legislação Socioambiental (VI. 1. 3) exerce influência, positiva e diretamente proporcional, no desempenho econômico das empresas pesquisadas. Portanto, infere-se que a aplicação da Legislação Socioambiental, no que se refere aos estudos e ao relatório de impacto Influência da Política de Regulação Ambiental no desempenho econômico e socioambiental da indústria de lacticínio em Goiás - Brasil Tabela 7 - Teste de Hipóteses 277 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 278 ambiental, investimentos em controle ambiental e social e nas compensações ambientais, produz resultados positivos no desempenho econômico das empresas. • Os indicadores das VI 1. 2 e VI 1. 1 tem uma associação negativa com o indicador da VD. 2 - desempenho econômico. Correlação negativa pressupõe uma inversão proporcional entre a variável explicada e a variável explicativa. Assim, considerando, por exemplo, os elementos que compõem o indicador da variável VI 1. 2 com correlação negativa: tempo de liberação para licença prévia, tempo de liberação da licença de instalação e tempo de liberação de licença de instalação, à medida que há uma elevação do tempo de liberação dessas licenças, tal fato induz em redução da atividade produtiva da empresa. Desta forma, infere-se que, sob tais circunstâncias, há probabilidade de afetar o resultado de desempenho econômico das firmas. Portanto, baseado nesses dados, pode-se inferir que os indicadores VI 1. 1 e VI 1. 2 influenciam, sobremaneira, para a redução do resultado do desempenho econômico das empresas de beneficiamento e industrialização de leite em Goiás. • Com relação à VD 3 observa-se a influência positiva da dos indicadores da VI 1. 3 no desempenho ambiental das empresas de beneficiamento e industrialização de leite em Goiás, exercida pelos seguintes elementos: estudo de impacto ambiental, relatório de impacto ambiental, investimento em controle ambiental e compensações financeiras. Todavia, há evidências de correlação negativa para alguns dos indicadores VI 1. 1 e VI 1. 2. Por isso, considerando que há correlação negativa, pode-se inferir que decisões e ações do órgão do sistema ambiental que estabelecem condições de exigências técnicas e temporal para liberação da licença prévia; licença de instalação, bem como a ampliação do tempo de liberação da licença de instalação, influenciam tanto na redução quanto no aumento do desempenho ambiental das empresas de beneficiamento e industrialização de leite em Goiás. Portanto, maior rigor da legislação na liberação das licenças ambientais pressupõe redução do desempenho ambiental das firmas. • Pelas evidências dos dados correlacionais é possível deduzir que os indicadores de VI 1. 2 e VI 1. 3 exercem uma influência positiva no desempenho social (VD 4) das empresas de beneficiamento e industrialização de leite em Goiás. Todavia, cabe destacar as correlações negativas de dois elementos da VI 1. 1: licença prévia e licença de instalação. Assim, pode-se inferir que o grau de exigências técnicas / legais do órgão do sistema ambiental tem uma relação inversa com o desempenho social das firmas. Portanto, no caso elevação do grau de exigência técnica/ legal para obtenção da licença ambiental induz-se que haverá uma provável redução nas ações de responsabilidade social empresarial. Por outro lado, caso haja flexibilização aumentam-se as probabilidades dessas ações por parte das empresas. À luz das evidências apresentadas, embasado nos resultados da pesquisa empírica, verifica-se que Políticas Públicas e Ações Governamentais relacionadas as questões de legislação socioambientais guardam, sim, uma associação com o resultado de desempenho empresarial econômico e socioambiental das empresas do setor lácteo de Goiás. Portanto, pode-se inferir que as políticas ambientais exercem influência no desempenho econômico e socioambiental das empresas de beneficiamento de leite e derivados em Goiás. Por isso, pode-se concluir em relação as firmas pesquisadas: a) Estudo de impacto ambiental, relatório de impacto ambiental, investimento em controle ambiental e investimentos em compensações ambientais são instrumentos de grande valia para gestão ambiental e empresarial. Pois, pode-se inferir que a intensidade dos dispêndios realizados pelas empresas para atender a Legislação Socioambiental não se constitui em um fator relevante que possa afetar de forma negativa o desempenho econômico e socioambiental. Mas sim, atributo para elevar a eficiência econômica e socioambiental da empresa. b) O desempenho econômico das empresas pesquisadas sofre a influência negativa da Legislação Socioambiental no que se refere as dificuldade em atender exigências técnicas do órgão ambiental e o tempo de análise e expedição da licença ambiental. Portanto, pode-se inferir que os padrões técnicos e/ ou burocráticos relacionados a Legislação Socioambiental, no que se refere a obtenção da licença ambiental, contribui de forma negativa para o resultado econômico das empresas pesquisadas, com a probabilidade de gerar Influência da Política de Regulação Ambiental no desempenho econômico e socioambiental da indústria de lacticínio em Goiás - Brasil Considerações Finais 279 perdas de receitas operacionais ou influir na margem operacional e demais indicadores econômicos; c) O desempenho ambiental tem influência positiva do indicador de legislação ambiental . O indicador intensidade de dispêndio para ampliação atividade e/ou na implantação de novo empreendimento sinaliza para a evidência que quanto maior for o nível de dispêndio efetuado, quanto maior será o resultado do desempenho ambiental focado na redução de consumo de matéria-prima, energia, água, emissões de efluentes e gases de efeito estufa. Por outro lado, há também uma associação negativa em relação ao licenciamento ambiental , o que denota quanto maior a demora em liberar o licenciamento, maior a probabilidade de afetar o desempenho ambiental das empresas; d) O tempo de liberação do licenciamento ambiental, componente de Legislação Socioambiental, tem associação positiva no desempenho social. A relação de associação diretamente proporcional entre Legislação Socioambiental e desempenho social denota o quanto a legislação ambiental tem um papel significante para fomentar as ações de responsabilidade social empresarial; Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade REFERÊNCIAS ALMEIDA, Francisco Alberto Severo de et al. Estratégia Empresarial e Sustentabilidade: uma Visão Prospectiva sobre o Econegócio. In: XXI Congreso Internacional de la Sociedad Latino Americana de Estratégia. Universidad Diego ANDRADE, José Célio Silveira, e tal. 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São Paulo: EdUSP: Saraiva, 2006. 281 Capítulo 13 MOTIVAÇÕES PARA O DESENVOLVIMENTO DE CONTRATOS DE DESEMPENHO ENERGÉTICO NA UNIÃO EUROPÉIA: UMA PERSPECTIVA DE COOPERAÇÃO EMPRESARIAL Victor Santos Mário José Batista Franco Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade N 284 o actual quadro do mercado e concorrência global, emerge o conceito de competitividade como objectivo a alcançar quer por indivíduos, empresas/organizações, países, regiões e sectores de actividade, quer de âmbito nacional ou supranacional (Ribeiro e Santos, 2001). Paradoxalmente uma das respostas estratégicas ao incremento da concorrência tem vindo a ser o incremento da cooperação entre concorrentes, emergindo o conceito de coopetição (Cooperar para competir) (Astley, 1984), como forma de designar as diferentes formas de cooperação entre concorrentes. No alinhamento do “Dilema do Prisioneiro” (Axelrod, 1984), a adequação da teoria das estratégias colectivas, nas suas diferentes formas e âmbitos de cooperação, como motor de desenvolvimento e incremento da competitividade das entidades cooperantes, tem vindo a ser defendida por políticos, responsáveis de diferentes áreas e académicos, veja-se a título de exemplo, os apoios previstos a projectos Estratégicos de Eficiência Colectiva previstos no QREN (Quadro de Referência Estratégico Nacional). Esta adequação é sustentada na avaliação de situações concretas nas investigações efectuadas no âmbito da cooperação (e.g., Astley, 1984; Oliver, 1988; Academy of Management, 1990; Franco, 2003, 2010, 2011; Ring et al., 2010; Zeng et al., 2010). Numa década marcada pela consciência ambiental, a poupança energética através da redução dos consumos, da eficiência energética e do recurso às energias endógenas são hoje objectivos prioritários numa Europa com elevada dependência energética de outros países (Annual Energy Outlook 2011). O desempenho ambiental e os custos da energia assumem um papel de relevância na competitividade das empresas, países e regiões. Neste contexto, a eficiência energética, associada à utilização racional da energia, assume uma importância crescente. O conceito de eficiência energética pressupõe a adopção de medidas que permitem uma melhor utilização da energia, tanto no sector doméstico, como nos sectores de serviços e indústria. A nível empresarial, uma eficiente política de eficiência energética conduz a significativas poupanças de energia, permitindo aumentar produtividade das actividades dependentes de energia, com vantagens do ponto de vista económico e ambiental, (Renssen, 2011). Motivações para o desenvolvimento de contratos de desempenho energético na União Européia: uma perspectiva de cooperação empresarial As directivas e regulamentação europeia apontam para uma crescente exigência do desempenho energético, que, para as empresas, representa níveis de investimento em equipamentos e gestão muito difíceis de suportar (Beckman, 2011). A gestão e racionalização energética não é um tema novo, já nos anos 70 surgiram empresas de serviços de energia, as chamadas ESCO (Energy Service Companies), numa lógica de segurança de preços, para o fornecimento de energia com valores fixos ou indexados, de forma a contrariar as oscilações dos valores do petróleo. Mais tarde, as ESCO diversificaram a sua oferta e, para além do fornecimento de energia, avançaram para parcerias onde as melhorias de desempenho e objectivos de eficiência energética passaram a assumir uma forma contratual. No contexto actual, em que a “International Energy Agency” (IEA) prevê que entre 2004 e 2030 a procura de energia cresça 53% (o equivalente a 5,9 biliões de toneladas de petróleo) e a eficiência energética é apontada como uma solução inadiável para controlar o aumento da procura e reduzir os consumos, as empresas ESCO tornar-se-ão parceiros imprescindíveis e decisivos na gestão energética das empresas e organizações europeias (Dawson, 2010). De entre os múltiplos serviços passíveis de serem prestados pelas empresas ESCO, tem vindo assumir especial relevância os contratos de performance energética (EPC´s), contratos de médio e longo prazo, nos quais as empresas ESCO assumem parte ou a totalidade do investimento necessário para desenvolver e gerir projectos de eficiência energética, envolvendo a racionalização, poupança ou produção descentralizada de energia, partilhando com as organizações e instituições clientes, as economias energéticas obtidas. Os modelos de contratos de performance energética estão a ser encarados como grandes dinamizadores do sector energético, especialmente importante em momentos como o actual, com políticas de apoio no seio da União Europeia (UE). Em Portugal, as preocupações com a eficiência energética estão patentes no compromisso assumido no contexto das políticas europeias relativas às alterações climáticas (Pacote Energia -Clima 2020), no âmbito das quais, entre outras medidas, Portugal se comprometeu, até 2020, a reduzir em 20% o seu consumo de energia final. Relativamente aos contratos de performance energética, a legislação Portuguesa enquadrante começa agora a ser publicada, pelo que assume especial relevância a análise e compreensão dos modelos existentes noutros países da UE. Dadas as características dos modelos de contratos de performance energética, quer pela sua duração temporal, quer pela partilha de riscos (podendo envolver a empresa ESCO, a empresa cliente, entidade(s) financiadora(s) e outras empresas prestadoras de serviços), quer pelos desafios à gestão operacional na implementação dos projectos de eficiência 285 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 286 energética (incerteza e interactividade entre ESCO e cliente ao longo do processo), representa, um novo paradigma face á tradicional relação contratual. Neste contexto, a compreensão dos modelos de cooperação empresarial pode assumir importância muito relevante para a análise e compreensão das motivações no estabelecimento de contratos de performance energética, bem como, na identificação e compreensão de estrangulamentos e obstáculos à sua dinamização. Neste âmbito, consideramos que o Know-how, modelos e experiências de diferentes formas de cooperação empresarial, poderão desempenhar um papel fundamental para a compreensão e conceptualização dos aspectos motivacionais e de liderança dos processos inerentes aos contratos de performance energética, aspectos que consideramos determinantes para dinamização e internacionalização das empresas ESCO portuguesas. O presente artigo visa a apresentação dos aspectos mais relevantes da investigação bibliográfica efectuada no âmbito da cooperação e dos Contratos de Performance Energética adoptados na UE, nomeadamente, a caracterização dos conceitos, a identificação teórica dos principais estrangulamentos e obstáculos á implementação dos processos de cooperação em geral e dos Contratos de Performance Energética em particular. Por último, apresentase uma proposta para adaptação do modelo de cooperação proposto por Swierczek e Hirsch (1994), aos Contratos de Performance Energética, realçando os aspectos teóricos fundamentais em cada uma das diferentes fases do modelo. Finalmente, importa referir, a nossa vontade de que o presente artigo venha a constituir a base teórica da investigação empírica que pretendemos desenvolver, na qual pretendemos identificar e conceptualizar os aspectos motivacionais e de liderança determinantes para o sucesso dos Contratos de Performance Energética, enquanto processos de cooperação empresarial, que, consideramos estratégicos para as empresas europeias. 1. Caracterização do mercado de energia na União Europeia A Europa encontra-se na actualidade numa fase crítica do seu desenvolvimento. A actual crise económico-financeira instalada, praticamente em todo o mundo, associada à grande dependência de muitos países de combustíveis fosseis, tornaram as questões energéticas factores de grande enfoque e importância. Esta constatação desencadeou uma preocupação crescente, ao longo dos anos, em torno de assuntos não só ambientais, como já se previa há algumas décadas, mas também aos assuntos relacionados com a estabilidade energética dos países, o recurso dos mesmos a fontes ecológicas e renováveis para extracção 1.1. Alemanha O mercado alemão das ESCO é considerado o mais bem sucedido e maduro da Europa. O modelo de contrato mais usual na Alemanha é o de fornecimento de energia Motivações para o desenvolvimento de contratos de desempenho energético na União Européia: uma perspectiva de cooperação empresarial de energia e, principalmente, com a gestão dessa mesma energia (Renssen, 2011). A lógica do Desenvolvimento Sustentável (Rivera-Lírio e Muñoz-Torres, 2010) exige que a gestão da energia deva ser específica e minuciosa, para que atinja a eficiência e eficácia necessária, para preencher os requisitos mundialmente impostos, cada vez mais rígidos. É neste âmbito que surge a necessidade dos serviços das empresas ESCO, ou seja, empresas especializadas que, em parceria com os clientes, façam o balanço energético, assumam a responsabilidade de implementação e operacionalização dos projectos de eficiência energética, demonstrem capacidade técnica, garantam resultados e assumam parte dos riscos, permitindo às organizações e instituições, economias energéticas e consequente optimização de investimentos e diminuições do valor da factura de energia. A racionalização da energia é, desde há algum tempo, uma prioridade para Portugal, com forte investimento ao nível das energias limpas. A União Europeia consome e importa cada vez mais energia, decorrendo da sua insuficiente capacidade de produção de energia, o que resulta numa crescente dependência energética. Esta dependência, naturalmente preocupante, representava em 1999 algo como 240 biliões de euros, ou seja, 6% do total das suas importações. Em termos geopolíticos, 45% dos produtos importados provêm do Meio Oriente e 40% do gás provém da Rússia. Das actuais necessidades, apenas 6% da energia tem origem em fontes renováveis e, mantendo-se a dinâmica actual, em 2030 este valor deverá apenas crescer para 8%. Este quadro pressiona os países no sentido de procurarem soluções de Eficiência Energética e do incremento da produção de energia baseada em fontes renováveis. Neste âmbito, as empresas ESCO tem vindo a ser encaradas como resposta adequada para dinamizar o sector energético, especialmente importante em momentos como o actual, em que a economia exige uma forte especialização e concentração de recursos (Status Report 2010). De acordo com o relatório “Energy Services Europe - Status Report 2010” da European Commission's Directorates - General Joint Research Centre (JRC), o mercado europeu de eficiência energética, período 2007/2010, mostra-nos que, na União Europeia, a Alemanha apresenta o mercado com mais dinâmica ao nível das empresas ESCO, seguida pela Itália e Reino Unido, nomeadamente. 287 (“Energy Supply Contract” – ESC), sendo que o modelo de contrato de desempenho energético (“Energy Perfomance Contracting” – EPC) apenas representa uma pequena fracção. O valor do mercado de eficiência energética alemão está avaliado entre 1.7 a 2.4 biliões de euros/ano, disputado por cerca de 500 empresas ESCO. 1.2. Itália No mercado de eficiência energética Italiano predominam as empresas ESCO resultantes de parcerias regionais, com carácter público-privado. Ao parceiro público cabe a responsabilidade da agregação da procura, da garantia da implementação das medidas de eficiência energética e a compensação pelo risco de perdas financeiras. Normalmente, os bancos locais e regionais participam nesta parceria. O mercado de eficiência energética Italiano atingiu o valor de 387M euros em 2009, sendo disputado por cerca de 150 empresas, das quais, apenas 50 têm capacidade técnico financeira para efectuar contratos de longo prazo (“Energy Perfomance Contracting” – EPC). Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 1.3. Reino Unido 288 O mercado de eficiência energética do Reino Unido é um dos mercados de “Third Party Financy” - financiamento por terceiros – mais bem implementado e activo. O mercado de contratação de serviços de energia existe desde 1984, quando as subsidiárias das grandes empresas de energia e de engenharia, começaram a incluir na sua oferta, serviços de valor acrescentando, nomeadamente, projectos de financiamento para os seus serviços tradicionais. Desde essa altura, o mercado das ESCO britânico tem sido por vezes reestruturado devido às alterações no mercado energético. O mercado de eficiência energética do Reino Unido está avaliado em 400M euros/ ano, disputado por 20 empresas ESCO. 1.4. Mercado Português De acordo com o relatório do General Joint Research Centre (JRC), já referido, o mercado português de eficiência energética começou a ganhar expressão em 2008, com a Motivações para o desenvolvimento de contratos de desempenho energético na União Européia: uma perspectiva de cooperação empresarial introdução de medidas e incentivos por parte do Governo. Até 2009, o mercado das ESCO, em Portugal, centrava-se sobretudo em projectos no sector industrial, no qual, os projectos de eficiência energética são obrigatórios para consumos superiores a 500 TOE`s (toneladas equivalentes de petróleo) /ano. O mercado de eficiência energética está avaliado entre 3 a 10M euros/ano, existindo de acordo com o relatório referido entre 10 a 12 empresas ESCO em Portugal. A Estratégia Nacional para a Energia com o horizonte de 2020 (ENE 2020), aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 29/2010, de 15 de Abril, prevê, como um dos seus principais objectivos, o desenvolvimento de um cluster industrial associado à promoção da eficiência energética, assegurando a criação de postos de trabalho e gerando um investimento previsível de 13 000 milhões de euros até 2020. Em termos de metas nacionais de eficiência energética, o Decreto -Lei n.º 319/2009, de 3 de Novembro, que transpôs a Directiva n.º 2006/32/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de Abril de 2006, estabelece que Portugal deve procurar atingir, globalmente, a nível nacional, um objectivo de economias de energia de 9 % para 2016. De uma forma mais ambiciosa, o Plano Nacional de Acção para a Eficiência Energética (PNAEE) — Portugal Eficiência 2015, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 80/2008, de 20 de Maio, prevê uma melhoria da eficiência energética equivalente a 10% do consumo final de energia até 2015. Além das metas referidas, Portugal comprometeu -se, no contexto das políticas Europeias de combate às alterações climáticas (Pacote Energia - Clima 2020), entre outras medidas, a reduzir em 20 % o seu consumo de energia final até 2020. No âmbito do Plano de Acção Nacional para a Eficiência Energética de 2008, foi recentemente lançado o Programa de Eficiência Energética na Administração Pública (ECO-AP), programa que pretende atingir mais de 20% de eficiência energética nos edifícios públicos. Com base neste programa, as empresas ESCO passam a dispor, desde Janeiro deste ano, de um novo mercado na área do Estado, enquadrado e sintonizado com a sua actividade, estabelecendo o Decreto-Lei n.º 29/2011de 28 de Fevereiro, o regime jurídico aplicável aos contratos de gestão de eficiência energética, a celebrar entre os serviços e organismos da Administração Pública e as empresas de serviços energéticos. De referir que o conceito de poupanças partilhadas só agora está a ganhar alguma expressão, sendo raras as empresas ESCO que já disponibilizam o modelo de negócio EPC (“Energy Perfomance Contracting”). Idênticas considerações se podem fazer relativamente às entidades financeiras e/ou bancárias, que, começam a demonstrar interesse em participar como parceiros financeiros deste modelo de negócio. 289 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 2. Caracterização do Modelo de Contrato de Performance Energética 290 No âmbito da pesquisa bibliográfica efectuada, são raros os estudos disponíveis, e os existentes, abordam essencialmente o mercado dos Estados Unidos da Americana. Pese embora não seja o mercado alvo desta pesquisa, tivemos de nos socorrer destes estudos, face á inexistência de trabalhos académicos sobre contratos de performance energética no âmbito do mercado europeu. Dos vários serviços passíveis de serem fornecidos pelas empresas ESCO, conforme já referido, assumem especial relevância os contratos de performance energética, os quais deverão possuir quatro características específicas, nomeadamente (Frenkil 2010): Deverão garantir poupanças de energia e/ou a prestação do mesmo nível de energia a um menor custo, através da implementação de adequados projectos de eficiência energética; Os riscos deverão ser partilhados entre a empresa ESCO e o cliente, sendo a remuneração dos serviços directamente ligada às economias de energia alcançadas; A empresa ESCO deverá financiar ou viabilizar a obtenção dos financiamentos necessários para a instalação e implementação das soluções de poupança energética contratualizadas com o cliente, sendo o risco financeiro sustentado nas poupanças energéticas que virão a ser alcançadas; Ao longo do prazo de implementação dos projectos de poupança energética, a empresa ESCO e o cliente são parceiros na gestão operacional com impacto energético, competindo à empresa ESCO a gestão da energia do cliente, a assessoria técnica e coresponsabilização nas decisões com impacto energético, as medições e verificações da poupança de energia ao longo do projecto. O estabelecimento de um “contrato de performance”, no qual uma empresa ESCO se obriga, face ao Cliente, a alcançar um resultado proposto a partir da implementação de um plano estratégico de eficiência em áreas como a iluminação, quantidade de água quente, temperatura da água, temperatura do ar, etc., constitui, para o cliente, uma decisão estratégica porquanto, pode focar sua atenção no seu negócio, delegando a gestão dos seus serviços de energia, numa entidade especializada no sector, com melhores condições técnicas e económicas na aquisição de equipamentos e energia. O cliente, para além de beneficiar de uma percentagem das mais-valias geradas com a poupança energética, não tem de fazer investimentos e minimiza o risco técnico e o risco financeiro, constituindo a partilha do risco do projecto, a garantia de que a empresa ESCO irá procurar as soluções mais adequadas. No final do contrato, o cliente será proprietário da solução energética e equipamentos. Conforme referido, o actual quadro do mercado e concorrência global obriga à procura contínua de elevados níveis de inovação e competitividade, quer por indivíduos, empresas/organizações, países, regiões e/ou sectores de actividade, quer de âmbito nacional ou supranacional, contexto que tem conduzido ao incremento da cooperação e interdependência entre concorrentes (Astley, 1984). No plano individual, o contexto mais explicativo, remete-nos para a explosão do número de redes sociais e permanente crescimento dos seus utilizadores (Breiger, 2004). Também no plano institucional, o contexto da cooperação e o seu contínuo incremento e interrelação são múltiplas, quer falemos de relações internacionais de âmbito global, envolvendo praticamente todos os países e domínios (ex. ONU – Organização das Nações Unidas), de organizações não governamentais de âmbito global (ex. Greenpeace), de âmbito regional (UE) (Rocha, 2002), entre Países (CPLP – Comissão dos Países de Língua Oficial Portuguesa), entre regiões ou cidades do mesmo país (ex. Associações de Municípios) ou de diferentes países (ARFE – Associação de Regiões Fronteiriças Europeias) (Caramelo, 2007), ou de organizações locais (ex. Comissões de Protecção de Jovens em Risco). Também a nível empresarial, o fenómeno da cooperação teve um desenvolvimento semelhante, seja qual for a óptica de observação (ex, Associações Internacionais, Regionais e/ou Locais de comercio/industria/sectores de actividade) (Azevedo, 2000; Eiriz, 2005), bem como, merece referência, as formas de cooperação entre empresas e instituições e/ou pessoas, nomeadamente as designadas parcerias público-privadas1. A importância do fenómeno da cooperação, seja qual for o âmbito considerado, fica patente no número crescente, importância e diversidade das estruturas, formas e processos de cooperação, bem como nos financiamentos necessários à sua manutenção e políticas de incentivo e apoio, quer dos poderes locais, nacionais e internacionais (Caramelo, 2007). A nível académico esta importância é materializada no elevado número e diversidade dos estudos e artigos sobre esta temática (Dyer et al., 2001; Matos, 2008; Augustine and Cooper, 2009; Culpan, 2009; Franco, 2010, 2011). O carácter estratégico da cooperação foi abordado na literatura por vários autores, nomeadamente nos trabalhos de Stafford (1994) e de Borys e Jemison (1989). Segundo Ring (2000), Nurula e Dunning (1998), Hagedoorn e Nerula (1996) e Kogut (1988), uma aliança tem carácter estratégico quando é estabelecida para possibilitar aos parceiros, a Motivações para o desenvolvimento de contratos de desempenho energético na União Européia: uma perspectiva de cooperação empresarial 3. Cooperação Empresarial como respota estratégica aos desafios da concorrência global 291 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 292 prossecução de objectivos que eles definiram no decurso do seu processo de tomada de decisão estratégica. Segundo os autores referidos, uma aliança estratégica diferencia-se de qualquer outro tipo de acordo por afectar, a longo prazo, a posição de mercado da empresa e contribuir para aumentar o seu valor no futuro. Segundo Morasch (2000), no caso dos acordos tecnológicos, o carácter estratégico implica a transferência de conhecimento, pelo menos, por parte de um dos parceiros. Para Ring (2000), as alianças/acordos não são a estratégia em si mesma, mas sim a forma de a implementar. Dos objectivos estratégicos identificados por Hermosilla e Solá (1989), salientamos a melhoria na utilização de equipamentos e a prática de técnicas de gestão inovadoras, bem como as economias de escala e as economias de experiência, referidas por autores como Narula e Hagedoorn, (1999), Borch (1994), Morris e Hergert (1987), Porter e Fuller (1986). Para Porter (1986) e Ireland et al. (2002), é importante alcançar vantagens competitivas na cooperação. Hax e Majluf, Jojnson e Scholes, citados por Eiriz (2001), argumentam que para um acordo de cooperação ser considerado estratégico, deverá resultar de um conjunto coerente de decisões, visando desenvolver uma vantagem competitiva sustentável, com impacto organizacional de longo prazo. Conforme referido por Franco (2001), a cooperação empresarial tem sido sugerida como uma estratégia viável para elevar o nível de competitividade das (PME´s), podendo constituir uma forma organizativa de superação das limitações de ordem dimensional, estrutural e financeira que caracteriza este grupo de empresas. Esta mesma abordagem consta do Plano Operacional da Economia (POE), no qual é salientada a importância da cooperação empresarial e a lógica das parcerias, como forma de melhorar a “eficiência colectiva”, constituindo novas formas de iniciativa empresarial com bons resultados em vários pontos do globo (Filho et al., sd). Dada a complexidade e o vasto âmbito da cooperação, importa desde já caracterizar alguns conceitos de forma a definir o âmbito da futura investigação e da pesquisa bibliográfica. 3.1.Conceito e âmbito da cooperação Ribeiro e Santos (2001) propõem a classificação do fenómeno da cooperação, quanto à forma, âmbito e natureza. Quanto à forma, os autores consideram a cooperação interpessoal (entre indivíduos), a cooperação empresarial (entre empresas) e a cooperação institucional (entre entidades). Quanto ao âmbito da cooperação, os investigadores centram Motivações para o desenvolvimento de contratos de desempenho energético na União Européia: uma perspectiva de cooperação empresarial a classificação em termos da localização geográfica dos cooperantes, sendo que outros autores consideram outras dimensões, tais como a área funcional (Emulti e Kathawala, 2001; Das e Teng, 1998; Hermosilla e Solá, 1989; Morris e Hebert, 1987) ou a cadeia de valor (Das e Teng, 1997; Root, 1988; Porter e Fuller, 1986), em que se centra o acordo de cooperação. Quanto á natureza, a cooperação é classificada em formal ou informal, classificação também adoptada por Menguzzato e Renau (1991). Dado o âmbito da investigação empírica que nos propomos efectuar, quanto às formas de cooperação, a pesquisa bibliográfica focaliza-se na cooperação empresarial e na cooperação institucional. No âmbito da cooperação empresarial assume especial relevância a “Teoria dos Recursos e Capacidades”, como teoria explicativa do sucesso empresarial (Angel e Pulido, 2010) e a cooperação como forma de alavancar os recursos e capacidades internas de cada empresa. Neste trabalho iremos assumir a definição de cooperação empresarial proposta por Franco (2001, p. 3), segundo a qual, um acordo de cooperação empresarial (formalizado ou não) é definido como “decisão estratégica adoptada por duas ou mais empresas independentes, entre as quais não existe uma relação de subordinação, e que unindo ou repartindo parte das suas capacidades e/ ou recursos, sem chegar a fundir-se, estabelecem um certo grau de interrelação para alcançar um objectivo previamente definido”. No âmbito da cooperação institucional são de realçar, de acordo com os múltiplos estudos empíricos referidos por Angel e Pulido (2010), os factores externos e da envolvente das instituições formais e informais que, de acordo com a “Teoria Económica Institucional”, são passíveis de influenciar o êxito empresarial. O enfoque na pesquisa, análise e compreensão da influência dos factores externos e da envolvente das instituições formais e informais, assume grande importância, pois, poderão ser determinantes no mercado emergente da racionalização energética, nomeadamente, no estabelecimento e na implementação de EPC´s (“Energy Perfomance Contracting”). Neste trabalho iremos assumir a definição de cooperação institucional proposta por Braillard (1990), segundo a qual, um acordo de cooperação institucional “ocorre quando dois ou mais Estados, entidades sub-nacionais, entidades transnacionais ou certas organizações internacionais, estabelecem acordos de cooperação num ou vários domínios (económico, político, cultural ou outro), com o objectivo de satisfazer interesses mútuos”. Dada a investigação empírica que nos propomos efectuar, quanto ao âmbito da cooperação, a pesquisa bibliográfica focaliza-se na gestão dos processos, nomeadamente, nos aspectos motivacionais e de liderança de processos de cooperação empresarial, 293 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 294 institucional ou mista, bem como, a influência dos processos de cooperação na cadeia de valor dos parceiros. De referir a escassez de literatura sobre este âmbito da cooperação. A maioria da literatura sobre cooperação inter-organizacional centra-se fundamentalmente em determinar e estabelecer as condições favoráveis ao estabelecimento e á formação de acordos de cooperação (Das e Teng, 2003; Narasimhan e Nair, 2005), em examinar os aspectos internos dos parceiros no acordo (Emden, et al., 2005), e em investigar os factores externos que contribuem para a formação da cooperação (Chung et al., 2000). Mais recentemente, alguns autores abordam aspectos relacionados com a partilha de conhecimento e a aprendizagem conjunta dos parceiros (Dussauge et al., 2000; Grant e Baden-Fuller, 2004; Kim e Inkpen, 2005). Dado o âmbito da investigação atrás definido, mereceram especial atenção na revisão bibliográfica efectuada, os trabalhos de Doney et al. (1998), que concluem que a confiança baixa os custos de transacção e facilita o relacionamento interorganizações, propondo um processo de construção de confiança entre empresas, de Yan et al. (2009), que defendem a confiança entre PME´s e o conhecimento pessoal como elementos facilitadores de ambientes de cooperação, de Bonet e Pechuán (2011), que estudaram a importância do comportamento individual, social e institucional dos gestores e outros membros das organizações, no estabelecimento de contratos e garantias, como mecanismos de controlo nas organizações em geral e nas relações de agência em particular. De referir ainda, no âmbito revisão bibliográfica efectuada, a relevância da “Teoria dos Recursos e Capacidades” (Angel e David, 2010) e da “Teoria dos Custos de Transacção” (Klein 1999), para a compreensão da influência dos processos de cooperação na cadeia de valor dos parceiros. Quanto á natureza da cooperação, dado o carácter formal dos Contratos de Eficiência Energética (EPC), a pesquisa a pesquisa bibliográfica efectuada incidiu sobre os contratos formais de cooperação empresarial, institucional ou mista. Dada a semelhança das características dos EPC´s com as dos contratos de agência, nomeadamente o formalismo (contrato escrito), a duração (longo prazo) e a extensão (incompletos e aspectos contratuais implícitos), (Volery 1996), mereceu especial atenção o estudo da teoria da agência. Este foi o âmbito da pesquisa bibliográfica que se procurou seguir, de forma a identificar os aspectos motivacionais e de liderança de processos de cooperação empresarial, institucional ou mista, em áreas e protagonistas com alguma(s) característica(s) semelhante(s) aos modelos decorrentes dos EPC´s, bem como, os impactos teóricos dos EPC´s na gestão de energia das empresas clientes. Apresenta-se uma breve síntese das principais teorias no âmbito de cooperação, que mais poderão contribuir como suporte teórico para a compreensão dos Contratos de Eficiência Energética (EPC), enquanto contratos de cooperação empresarial. a) Teoria dos Custos de Transacção Hennart, citado por Reus e Ritchie (2004), usou a teoria dos custos de transacção para explicar porque é que as empresas formam e desenvolvem acordos de cooperação, sugerindo, assim, a diminuição dos custos de transacção como motivação para a cooperação. Contudo, segundo Reus e Ritchie (2004), o conceito de custo de transacção já não oferece uma explicação suficiente do comportamento organizacional, pois, segundo os autores referidos, as empresas suportam custos relacionais decorrentes das incertezas na parceria. Os custos relacionais, para cada empresa, ocorrem porque os parceiros têm que ajustar os seus negócios e operações ao acordo. Participar num processo de cooperação pode exigir reorganizações e/ou redução ou cessação de outros negócios. Neste âmbito, considera-se importante compreender e identificar quais os custos de transacção e relacionais que poderão estar associados aos Contratos de Eficiência Energética (EPC). b)Teoria dos Recursos e Capacidades Segundo Angel e David (2010), os recursos e capacidades/competências básicas das empresas, constituem a base das suas vantagens competitivas. Os recursos são definidos como o conjunto de factores disponíveis que a empresa possui e/ou controla, tornando-se necessário a sua integração em rotinas operativas adequadas ao ambiente externo em que se inserem, de forma a poderem constituir uma vantagem competitiva sustentável (Angel e Pulido, 2010). A literatura sobre cooperação revela que, inicialmente, a teoria dos recursos e capacidades (Wernerfelt, 1984; Barney, 1991; Peteraf, 1993; Das e Teng, 2000a, 2000b) explicava amplamente o fenómeno da cooperação. A teoria dos recursos permite ao investigador compreender como é que as alianças podem alcançar os objectivos estratégicos centrais, para criar ou manter a vantagem competitiva e, assim, obter economias de custos ou aumentar a rentabilidade em relação aos concorrentes. A cooperação é um meio essencial para expandir as capacidades centrais da empresa através de um relacionamento com outra empresa. Das e Teng (2000a) relacionaram a formação e o desenvolvimento das Motivações para o desenvolvimento de contratos de desempenho energético na União Européia: uma perspectiva de cooperação empresarial 3.2. Correntes teórias sobre a cooperação 295 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade alianças estratégicas com os recursos detidos pelos parceiros. Para estes autores, o conjunto de recursos possuídos pela empresa é imperfeito, pois a sua troca eficiente nem sempre é possível. Alguns recursos não são negociáveis, imitáveis ou substituíveis, uma vez que estão inseridos na organização ou agregados a outros recursos, como por exemplo, a imagem, a reputação e a utilização de tecnologia altamente inovadora. Assim, para se trocar, negociar ou obter acesso a este tipo de recursos, as empresas formam relacionamentos inter-empresas. Neste âmbito, considera-se importante compreender e identificar teoricamente os impactos dos Contratos de Eficiência Energética (EPC), nos recursos e capacidades das empresas clientes, nomeadamente, se as economias de custos energéticos alcançadas nos contratos, poderão constituir uma vantagem competitiva sustentável. 296 c) Teoria Económica Institucional Segundo Angel e Pulido (2010), de acordo com a Teoria Económica Institucional, o desempenho empresarial é profundamente influenciado e condicionado pela envolvente externa. O conceito de instituição refere-se a todo e qualquer factor externo à organização, formal ou informal, idealizado pelo homem, para configurar e guiar a interacção e comportamento humano. Neste âmbito, a instituição corporiza as normas e as regras que regem a sociedade e definem as relações que nela se estabelecem (Angel e Pulido, 2010). As instituições evoluem no tempo e integram os aspectos legais, as crenças culturais, valores, costumes, moral, ética etc.. A Teoria Económica Institucional relaciona a teoria da conduta humana com a teoria dos custos de transacção, para explicar as funções e papel das instituições na economia. Segundo Klein (1999), na nova teoria económica institucional, a envolvente institucional (aspectos legais, científicos, políticos, económicos, normas sociais e convenções, etc) fornece os fundamentos às diferentes teorias organizacionais existentes, para explicar as funções e papel das instituições na economia Neste âmbito, considera-se importante compreender e identificar, teoricamente, os factores institucionais com impacto no mercado de Eficiência Energética da EU. De salientar a crescente consciencialização da população europeia para os problemas ambientais associados ao consumo de energia, com reflexos na interiorização social do conceito de Desenvolvimento Sustentável, conceito que não poderá deixar de estar presente na evolução da legislação europeia para o sector da energia. d) Teoria da Agência Segundo (Volery 1996), toda a relação de cooperação empresarial corresponde a 3.3. Cooperação - Motivação e Liderança A relevância da motivação e da liderança na condução dos processos é matéria obrigatória em qualquer curso de gestão, aspectos que num qualquer processo de cooperação não poderão ser ignorados, tal como defende Astley (1984) no seu artigo, no qual faz uma apreciação da evolução histórica da gestão estratégica. Este autor parte da gestão estratégica em que, cada empresa, com base nas suas forças e fraquezas, procura circunscrever as ameaças e explorar as oportunidades (PEST análise), numa lógica de confronto e de estratégia militar, para uma gestão estratégica baseada na lógica da cooperação e complementaridade dos concorrentes, sustentada em estratégias colectivas, nas quais, a auto-motivação dos participantes e a liderança estratégica, assumem um papel central. Idênticas conclusões poderão ser retiradas de Osborn e Marion (2009) e do estudo da Academy of Management (1990), relativo á aplicabilidade da teoria das estratégias colectivas a indústrias fragmentadas, ou no estudo de Matos e Afsarmanesh (2008), em que os autores propõem um modelo de referência para a modelização de redes de cooperação. Mertins e Will (2008) concluem que a motivação e a liderança desempenham um Motivações para o desenvolvimento de contratos de desempenho energético na União Européia: uma perspectiva de cooperação empresarial uma relação de agência que M. Jensen e W. Meckling, citados pelo autor, definem como “contrato formal ou implícito, segundo o qual, uma ou mais pessoas (principal) recorre aos serviços de uma outra pessoa (agente), para, em seu nome, assegurar uma qualquer tarefa. Segundo o autor, a teoria da agência visa o desenvolvimento de estruturas contratuais que minimizem os custos de transacção com origem no oportunismo dos parceiros, na sua racionalidade limitada e assimetria de informação. Os problemas de agência surgem logo que divirjam os objectivos do principal e do agente e quando se tornar difícil ou oneroso, para o principal, verificar/controlar o comportamento do agente. De forma a minimizar estes problemas emergem os custos de agência, ou seja, custos de controlo, custos de obrigação/confiança e os custos de oportunidade. Neste âmbito, considera-se importante compreender os referenciais teóricos da Teoria da Agência, que potencialmente poderão estar associados aos Contratos de Eficiência Energética (EPC), nomeadamente, o grau de assimetria, os formalismos, a duração e extensão dos contratos de cooperação (incompletos e aspectos contratuais implícitos), grau de divergência de interesses dos parceiros, bem como, os problemas de agência e os mecanismos concebidos no âmbito da teoria para os limitar, nomeadamente, os mecanismos das garantias contratuais, a reputação e a confiança nos parceiros. 297 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 298 papel tão ou mais importante que o know-how especializado, nas estratégias de inovação e competitividade das PME´s, e Barczak et al. (2009) argumentam o mesmo relativamente á inovação e desenvolvimento de novos produtos. Burke et al. (2007) argumentam sobre a importância da liderança em todos os níveis organizacionais, como elemento determinante da eficiência organizacional. Estes investigadores argumentam ainda que, uma componente fundamental da liderança, é o grau de confiança dos subordinados e co-trabalhadores no líder, apresentando os mecanismos de desenvolvimento da confiança no líder, bem como, os factores que moderam essa relação. Westaby (2010), com base nas teorias da racionalidade do comportamento, aborda os processos de tomada de decisão e comportamento dos líderes e seu impacto na motivação e desempenho organizacional. Swierczek, é um dos autores, que em parceria com outros autores muito se tem debruçado sobre a importância da motivação e da liderança para o desempenho organizacional. Dos seguintes trabalhos do autor referido, Swierczek (1991), Swierczek e Hirsch (1994), Swierczek, Quang e Chi (1998), Swierczek e Rodsutti (2002) e Swierczek e Cuong (2008), é possível sintetizar que para estes autores, a satisfação e comprometimento dos trabalhadores, com reflexos no desempenho individual e organizacional, estão essencialmente relacionados com a cultura organizacional e competências de liderança das organizações. Neste âmbito, considera-se importante compreender e conceptualizar os aspectos motivacionais e de liderança susceptíveis de influenciar o desempenho organizacional das empresas, nas parceiras estabelecidas no âmbito dos Contratos de Eficiência Energética (EPC). 4. Proposta de Modelo de Cooperação Assumida a importância do conceito de cooperação, torna-se pertinente referir as principais condições de sucesso e as principais barreiras aos processos de cooperação empresarial, identificadas na literatura. Segundo Franco (2010), da revisão bibliográfica e das experiências de cooperação estudadas, as principais condições de sucesso nos processos de cooperação são: a compatibilidade nos objectivos dos parceiros; a existência de sinergias; a contribuição das partes para a cadeia de valor dos parceiros e o equilíbrio nas contribuições dos parceiros. De acordo com a pesquisa efectuada, a cooperação empresarial apresenta, sob o lustração 1 - Fases do Processo de Cooperação Motivações para o desenvolvimento de contratos de desempenho energético na União Européia: uma perspectiva de cooperação empresarial ponto de vista teórico, várias vantagens, contudo, são também referidas desvantagens/ obstáculos que poderão condicionar os processos de cooperação. A primeira e talvez mais importante natureza de obstáculos prende-se com questões inerentes à baixa sensibilidade dos gestores para a importância da cooperação, com reflexos na motivação e liderança dos processos. Quanto ao processo de cooperação, merecem realce na bibliografia consultada, eventuais conflitos sobre o acordo inicial, incompatibilidades culturais, complexidade na coordenação das actividades, indefinições na estratégia e estrutura, falta de apoio dos organismos oficiais, custos mais elevados do que o previsto, divergências nos objectivos/ estratégias/controlo, dificuldades de comunicação e resistência interna nas empresas parceiras (Franco, 2001, 2010, 2011). Quando confrontadas as características dos modelos de contratos de performance energética (EPC´s), com as principais condições de sucesso e as principais barreiras aos processos de cooperação, identificadas na literatura, constata-se que os EPC´s reúnem as principais condições para se poderem constituir como processos de cooperação bem conseguidos, bem como, os mesmos poderão fracassar, em virtude das barreiras identificadas na literatura em outros modelos de cooperação empresarial. Assumindo os contratos de performance energética como modelos de cooperação empresarial, importa agora, ainda que de forma pouco profunda, reflectir sobre os aspectos essenciais para a gestão e planeamento da cooperação. Esta reflexão será baseada na seguinte adaptação do modelo proposto por Swierczek e Hirsch (1994). 299 4.1. Negociação As questões chave na fase de negociação passam pela identificação e quantificação dos ganhos de energia, identificação e quantificação dos riscos técnicos e financeiros das soluções a implementar, modelos de partilha de ganhos e riscos, bem como, os princípios que iram nortear os processos de tomada de decisão e de interacção interempresarial ao longo do contrato, nomeadamente, as responsabilidades e a autoridade individual e colectiva dos parceiros e respectivas estruturas. Dadas as características dos contratos de performance energética referidas, nomeadamente, a sua duração temporal, a partilha de riscos e a incerteza presente na gestão operacional dos projectos de eficiência energética, com elevados níveis de interactividade entre a empresa ESCO e a empresa cliente, exigem que as diferentes fases do processo nunca sejam encerradas, nomeadamente, a renegociação dos acordos deve estar prevista sempre que necessário para atingir os objectivos acordados e/ou as circunstâncias exijam a renegociação dos objectivos acordados. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 4.2. Acordo 300 O acordo, materializado num contrato formal de performance energética (EPC´s), deverá especificar todos os aspectos acordados na fase de negociação, nomeadamente, a definição formal do âmbito, propósitos e finalidades do contrato de performance energética (EPC´s), definição das políticas e objectivos a prosseguir, especificação e calendarização das medidas e recursos, processos e procedimentos de implementação e controlo. Definição formal do modelo de partilha de informação, de tomada de decisão e de interacção interempresarial, nomeadamente, as responsabilidades e autoridade individual e colectiva dos parceiros e respectivas estruturas, na condução dos projectos contratualizados, bem como, nas alterações necessárias e/ou propostas por cada uma das partes. Definição formal dos critérios de distribuição dos ganhos e dos riscos técnicos e financeiros do projecto. Conforme referido, a renegociação dos acordos deve estar prevista sempre que necessário para atingir os objectivos acordados e/ou as circunstâncias exijam a renegociação dos objectivos acordados 4.3. Implementação 4.4 Desempenho e Controlo As questões chave do desempenho e controlo prendem-se com o acompanhamento e monitorização dos processos, procedimentos e canais estabelecidos, visando assegurar os objectivos acordados. No conceito de parceria subjacente aos EPC´s, a monitorização das metas e objectivos contratualizados é uma responsabilidade da empresa ESCO. A adequada monitorização das metas e objectivos contratualizados pressupõe a produção de informação, numa base regular, para a gestão da empresa cliente, relativa ao grau de cumprimento das metas e objectivos contratualizados, bem como, o grau de cumprimento dos procedimentos e instruções e/ ou constrangimentos ao seu cumprimento, aspectos fundamentais, para a construção da indispensável confiança entre as partes. Os dados obtidos nesta fase constituem os inputs para as alterações e ajustamentos dinâmicos das restantes fases do processo. Motivações para o desenvolvimento de contratos de desempenho energético na União Européia: uma perspectiva de cooperação empresarial Esta fase é caracterizada pela, implementação dos processos e procedimentos que viabilizem a efectivação do(s) acordo(s) contratualizado(s). As questões chave na implementação dos EPC´s prendem-se com a liderança da interacção diária das estruturas de cada uma das empresas, de acordo com os processos, procedimentos e canais estabelecidos. Nesta interacção diária, de acordo com a revisão bibliográfica efectuada, assumem especial relevância a motivação e compatibilização das culturas organizacionais e lideranças das empresas parceiras, aspectos determinantes para o comprometimento organizacional das suas estruturas, relativamente aos objectivos do contracto. Nesta fase é determinante a permanente adequação dos processos e procedimentos às culturas organizacionais e aos objectivos acordados. A renegociação dos acordos deve estar prevista sempre que a implementação dos processos e procedimentos acordados se revelem inadequados para atingir os objectivos acordados e/ou as circunstâncias exijam a renegociação desses objectivos. 301 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Considerações Finais 302 A pesquisa bibliográfica efectuada evidencia a importância da eficiência energética, no actual contexto económico e social, caracterizado pela crescente interiorização do conceito de Desenvolvimento Sustentável. Numa década marcada pela consciência ambiental, a racionalização energética não pode deixar de estar presente nas opções estratégicas das empresas, com relevância na sua competitividade. A nível empresarial, a implementação de adequadas medidas de eficiência energética, exigem um grau de especialização, recursos e know-how que, dificilmente as empresas possuem internamente, tornando quase inevitável, o recurso à contratação de serviços externos. Por outro lado, a pesquisa mostra a evidência empírica, da existência de vantagens na adopção de modelos de cooperação empresarial, para a superação das limitações referidas. Deste modo, a conjugação dos aspectos referidos, com as dificuldades inerentes á operacionalização e liderança de contratos imperfeitos de médio e longo prazo, justificam o propósito da investigação empírica que nos propomos desenvolver, no sentido de identificar e conceptualizar os aspectos motivacionais e de liderança determinantes para o sucesso dos Contratos de Performance Energética, numa óptica de cooperação estratégica, adequada à gestão da energia a nível empresarial. Tem-se consciência das muitas limitações da investigação que nos propomos fazer, desde logo, porque os processos de cooperação, no âmbito da racionalização energética, são um tema pouco estudado, a que acresce o facto de limitarmos a nossa investigação a um único modelo de contrato (EPC). Idênticas considerações poderiam ser efectuadas quanto á motivação e liderança dos processos de cooperação. Entendemos que a importância do tema justifica estudos sobre o verdadeiro alcance da cooperação empresarial, na melhoria do desempenho energético e, consequentemente, no desempenho empresarial. Neste âmbito, consideram-se pertinentes estudos empíricos, que suportem ou não, a cooperação como estratégia adequada para a gestão energética, modalidades, metodologias, modelos de motivação e liderança dos processos, requisitos e âmbitos de cooperação, “actores”, abordagens por sectores, dimensão dos intervenientes, etc. Dado o impacto significativo que a melhoria do desempenho energético empresarial tem na economia em geral, consideram-se estes impactos, uma outra área muito importante de investigação, a par de estudos de mecanismos e modelos de apoio à sua dinamização. REFERÊNCIAS Academy of Management (1990), The Evolution of Collective Strategies in Fragmented Industry, The Academy of Management Review, Vol. 15, pp. 266-286. Anderson, J.E. e Gerbing, D.W. (1988), Structural equation modelling in practice: a review and recommended two-step approach, Psychological Bulletin, Vol. 103, No. 3, pp. 411–423. Angel, M. e Pulido, D. 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Inúmeros trabalhos tem avaliado o impacto das mudanças climáticas globais, como o aquecimento global, sobre a distribuição geográfica das espécies (Diniz-Filho et al. 2010; Beaumont et al. 2007; Nabout et al. 2009; Nabout et al. 2011), conservação biológica (Diniz-Filho et al. 2009) e invasão de espécies (Bradley et al. 2010; Thuiller et al. 2005). Além desses problemas relacionados a distribuição das espécies, trabalhos recentes tem discutidos o impacto das mudanças climáticas relacionados diretamente a humanidade, como a disseminação de doenças (Lafferty 2009) e impacto na agricultura e segurança alimentar (Assad et al. 2008). Os impactos das mudanças climáticas sobre as espécies, tais como alterações na distribuição geográfica ou nas características biológicas (i.e. intensidade de frutificação, floração e outros) pode diretamente afetar populações humanas, pois diversas espécies nativas de plantas e animais são utilizadas como alternativa econômica, contribuindo para a manutenção da biodiversidade e na atividade econômica familiar. Até o momento grande parte dos estudos acadêmicos têm avaliado o impacto das mudanças climáticas sobre características biológicas e de distribuição geográfica das espécies (ver revisão em Elith & Leathwick 2009), enquanto que carece de estudo que investiguem explicitamente o efeito dessas alterações climáticas em espécies de uso sustentável e a magnitude desses impactos sobre comunidades rurais. O extrativismo sustentável é uma prática que tem ganhado grande espaço e apoio das entidades governamentais, principalmente porque no extrativismo sustentável é possível auxiliar na manutenção e conservação da biodiversidade e contribuir nas atividades econômicas rurais (Scherr & McNeely 2008). No Brasil, leis como Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC, Lei 9.985/00) regulamenta sobre a manutenção e criação de unidades de conservação e as classifica como de Proteção Integral ou Uso Sustentável (essas ainda com outras subdivisões). Ações políticas e atividades práticas das comunidades rurais locais têm contribuído (apesar de ainda pouco) na conservação biológica das espécies de biomas brasileiros. Dentre os biomas fortemente ameaçados, destaca-se o Cerrado, Uso sustentável e economia rural na era das mudanças climáticas globais: um estudo do Pequi (Caryocar brasiliense) em municípios brasileiros que inclusive foi classificado como um Hotspot mundial de biodiversidade, ou seja, uma área prioritária para conservação (Myers et al. 2000). Ainda assim, o Cerrado apresenta inúmeras espécies de plantas nativas que são utilizadas como um recurso sustentável por comunidades rurais. Essas comunidades têm utilizado a flora nativa do Cerrado para venda de frutos, óleos, sabão e inúmeras outras aplicações (Almeida et al. 1998). Uma espécie de planta do Cerrado muito utilizada no uso sustentável é o Pequi (Caryocar brasiliense). Essa espécie distribui-se amplamente no Cerrado brasileiro sendo frequentemente encontrada nos Estados da Bahia, Ceará Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Piauí, São Paulo, Tocantins e Distrito Federal (Almeida et al. 1998). O Pequi tem sido explorado de inúmeras formas, e apresenta contribuição importante na renda das famílias rurais. O fruto dessa espécie tem muitas aplicações econômicas, por exemplo, o pericarpo (i.e. casca) pode ser utilizado na ração animal, composto orgânico e na produção de sabão. Os putâmens, por sua vez, são empregados no uso culinário, na produção de licor, sabão (Almeida et al 1998; Oliveira 2009). Dessa forma, essa espécie contribui significativamente na renda familiar das famílias rurais, além disso, o Pequi é um importante símbolo cultural para muitos estados brasileiros (e.g. Goiás, Minas Gerais, Bahia). O período de exploração econômica sustentável do Pequi consiste principalmente nos períodos de frutificação da planta, que frequentemente ocorre entre os meses de Outubro e Março (Almeida et al. 1998). Durante os outros períodos do ano as comunidades promovem outras atividades sustentáveis, como a exploração de outras espécies nativas (e.g. mangaba, baru e etc.) ou práticas agrícolas, como plantio e colheita de soja, milho, mandioca dentre outras. Recentemente, técnicas de modelagem de nicho, baseado no conceito teórico de Nicho (Hutchinson 1957) têm sido empregadas para investigar a distribuição geográfica potencial de espécies e conseqüente impacto das alterações climáticas sobre a distribuição das espécies. Na literatura encontram-se inúmeras dessas técnicas de modelagem de nicho, tais como: Maxent, GARP, Randon Forest, GLM, Bioclim, Domain. De forma geral, os modelos de nicho são capazes de indicar a distribuição geográfica potencial de uma espécie, bem como, quais regiões são climaticamente mais (ou menos) favoráveis para a ocorrência da espécie. Em outras palavras, os modelos de nicho indicam a “adequabilidade ambiental” (Suitability em inglês) das regiões de ocorrência da espécie (Peterson et al. 2011). Apesar da aparente certeza, os modelos podem conter falhas, indicadas principalmente por erros de omissão e comissão (ver detalhes em Elith & Leathwick, 2009). Além disso, os modelos de nicho empregam somente condições ambientais, ou seja, indicam somente o nicho grineliano das espécies (Soberón 2007). É importante salientar que outras características 311 Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade além do ambiente determinam a distribuição geográfica das espécies, tais como interações biológicas e processos históricos (Araújo & Luoto 2007). Apesar da incertezas geradas pelos modelos de nichos, essa técnica tem sido muito utilizada para prever a distribuição geográfica das espécies em cenários futuros de mudanças climáticas (Nabout et al. 2012). Dessa forma, tendo como base a importância do Pequi para o uso sustentável e economia de populações locais do bioma Cerrado, o objetivo desse trabalho foi avaliar o impacto das mudanças climáticas globais sobre a distribuição geográfica do Pequi e relacionar a mudança na distribuição geográfica dessa espécie no cenário futuro como os municípios que atualmente utilizam o Pequi como exploração sustentável. Especificamente buscou-se: i) Investigar a quantidade de extração de Pequi nos municípios produtores dessa espécie e relação entre extração e o valor econômico (em Reais) do Pequi e o coeficiente de Gini dos municípios; ii) Avaliar a distribuição geográfica de Pequi considerando o cenário climático atual e futuro (projetado para 2050) e conseqüentemente investigar adequabilidade ambiental (em ambos cenários climáticos) dos municípios que extraem pequi; iii) Determinar a relação entre a adequabilidade ambiental (considerando o cenário atual) e extração de Pequi nos municípios e estimar a equação da reta dessa relação; e iv) Utilizando essa equação da reta estimar a produção do Pequi nos cenário climático futuro e comparar com a produção de Pequi registrada atualmente. 312 1. Materiais e Métodos 1.1 O Pequi A espécie utilizada no presente trabalho foi Caryocar brasiliense Camb., pertencente a família Caryocaraceae. A espécie apresenta ampla distribuição geográfica, com freqüente ocorrência nas fitofisionomias de campo sujo, cerrado sentido restrito e cerradão distrófico (Ratther et al. 2003). O Pequi é uma planta decídua, com floração entre os meses de junho e janeiro e frutificação entre outubro e março (Leitê et al. 2006). O fruto é uma drupa de 12 cm de diâmetro e 100 gramas (aproximadamente). 1.2. Uso sustentável e economia de municípios exploradores de Pequi O Pequi tem sido utilizado como exploração sustentável em vários municípios 1.3. Modelo de distribuição geográfica potencial Para modelar a distribuição geográfica potencial da espécie em questão, necessitou-se: i) dados de ocorrência da espécie (i.e. coordenadas geográficas); ii) dados climáticos, no caso do presente estudo, clima atual e clima futuro (considerando os cenários climáticos futuros de mudanças globais) e, iii) o método de modelagem (i.e. um algoritmo computacional). Dessa forma, seguindo essas etapas, inicialmente os dados de ocorrência do Pequi foram obtidos da literatura (artigos, livros, dissertações e teses) e de um banco de dados do Centro de Referência Informação Ambiental (CRIA; http://www.cria.org.br/). Ao todo foram obtidos 312 pontos de ocorrência de Pequi, sendo esses pontos utilizados na Uso sustentável e economia rural na era das mudanças climáticas globais: um estudo do Pequi (Caryocar brasiliense) em municípios brasileiros brasileiros. Os dados de extração de Pequi por município brasileiro foram obtidos no sítio do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, www.ibge.gov.br) no sistema de recuperação automático (SIDRA) e no acervo de “Extração Vegetal”. Para cada município obteve-se os valores de extração de Pequi para os anos de 2000 a 2009. Posteriormente foi feita uma média da extração de Pequi destes 10 últimos anos. Como os municípios têm tamanhos geográficos distintos, a extração média de Pequi por município foi dividido pela área do mesmo município (de acordo com IBGE). Dessa forma, a extração média de Pequi por município foi dada em kilogramas por quilômetros quadrado (kg/km2). No sítio do SIDRA também foi obtido o valor (em Reais) da extração de Pequi por município para o ano de 2008 (o ano mais recente disponível). Esse valor foi relativizado com o valor do Produto Interno Bruto (PIB) dos municípios no mesmo ano, gerando o Percentual de Contribuição Econômica do Pequi (PCEP). Assim, foi possível determinar o quanto (em Reais), a produção de Pequi contribui para o PIB dos municípios, e dessa forma estimar para quais municípios a produção de Pequi é economicamente importante. Posteriormente, PCEP foi relacionado com a Extração de Pequi (kg/km2). No sítio do IBGE também foi obtido o coeficiente de Gini, que é uma métrica que avalia o nível de desigualdade de renda entre os habitantes do município. O coeficiente varia de zera (0) a um (1). No qual o zero indica que não há desigualdade na renda dos habitantes, ao passo que um (1) indica que completa desigualdade de renda, ou seja, uma única pessoa detêm toda a renda dos municípios, enquanto que as demais não tem renda. No presente trabalho o coeficiente de Gini foi correlacionado com a produção média do município, buscando investigar se os municípios que produzem mais são aqueles com maior desigualdade de renda. 313 modelagem de distribuição geográfica potencial (Figura 1). Os dados (coordenadas) dos municípios que extraem o pequi não foram inseridos a fim de evitar problemas circulares nas análises. Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Figura 1 - Pontos de ocorrência utilizados para a modelagem de nicho do Pequi. 314 Fonte: CRIA Os dados climáticos são baseados em nove variáveis climáticas (temperatura máxima no mês mais quente, temperatura mínima no mês mais frio, variação da temperatura anual, precipitação anual, precipitação no mês mais seco, precipitação no mês mais úmido, desvio padrão da precipitação, temperatura máxima média e temperatura mínima média). Essas variáveis foram utilizadas no cenário climático atual e no cenário climático futuro. Para o cenário climático futuro, essas variáveis climáticas foram derivadas do modelo climático global CCCma (Canadian Center for Climate Modelling and Analysis), com projeções obtidas para o cenário pessimista (A2a), ou seja, com maior emissão de gases de efeito estufa (ver Karl & Trenberth 2005). Os dados de cenários climáticos (atual e futuro) foram obtidos do sítio do WORDCLIM (www.wordclim.org), com os valores estimados 2. Análise de dados As análises de dados consistem determinar a relação por município, por meio de uma correlação, entre extração média de Pequi (kg/km2) e a adequabilidade ambiental no cenário climático atual (obtidas pelo modelo gerado pelo Maxent, com valores variando de 0 a 1). Para reduzir a dimensionalidade dos dados, ambas as variáveis (extração e adequabilidade ambiental) foram log-transformadas (LogX+1). Além disso, as variáveis PECP e extração média do Pequi (kg/km2) foram correlacionadas e ambas foram logtransformadas. Após a determinação da relação entre as variáveis citadas acima, utilizou-se a equação da reta (Y= a +bX+e) para determinar a produção de Pequi por município no cenário futuro de mudança climática. Na equação da reta, os valores de Y (variável resposta) indicam a produção de Pequi, enquanto que os valores e X indicam a adequabilidade ambiental Uso sustentável e economia rural na era das mudanças climáticas globais: um estudo do Pequi (Caryocar brasiliense) em municípios brasileiros para o ano de 2050. Todas as variáveis climáticas foram convertidas para uma malha com resolução de 0,0417 graus. O método de modelagem empregado para estimar a distribuição geográfica atual e futura do Pequi foi o Maxent (Maximum Entropy) utilizando um programa com o mesmo nome (Phillip et al., 2006). O Maxent é um programa recente, sendo um método de aplicação geral para fazer previsões ou inferências a partir de informações incompletas. O Maxent tem como base uma técnica conhecida como Máxima Entropia. O método parte do conceito que a distribuição que se conhece de uma espécie é a representação adequada do seu nicho ecológico, a partir dai o método atribui valores de 0 a 1 para os demais quadrantes (pixels) da área geográfica. Dessa forma, valores próximos de 0 indicam regiões geográficas em que as condições climáticas não são favoráveis para a ocorrência da espécies, enquanto que valores próximos de 1 sugerem que as condições climáticas são favoráveis para a ocorrência da espécie. Diferentemente de outros métodos o Maxent modela a distribuição das espécies apenas com dados de presença. Os parâmetros utilizados para o modelo do Maxent foram os padrões (default), exceto por 1000 iterações e remoção de duplicatas. Para a avaliação do modelo utilizou-se o AUC (Area Under the Curve), no qual os seus valores variam de 0 a 1. Valores próximos a 1 indicam alto desempenho do modelo, enquanto que valores menores do que 0,5 indicam baixo desempenho do modelo (Elith et al., 2006; Allouche et al., 2006). 315 no cenário atual. Como no cenário futuro, os municípios podem alterar os valores de adequabilidade ambiental, é possível usar a equação da reta, e após determinar os parâmetros a e b, adicionar os novos valores de X (adequabilidade ambiental) para prever a produção de Pequi (Y) nos municípios. Posteriormente, foi obtida a diferença entre a extração atual e futura de Pequi (D extração) e estimado o quanto cada município aumentará ou reduzirá a extração de Pequi em relação a sua produção atual (valores percentuais). Em análises de regressão, como outras análises estatísticas, deve-se atentar aos pressupostos da análise. Dessa forma, em análises cujas variáveis apresentam uma relação espacial pode-se comprometer o pressuposto da “independência das unidades amostrais”. No presente trabalho, os municípios são as unidades amostrais, assim, a não independência das unidades amostrais (identificada pela autocorrelação espacial), pode ocasionar um aumento do erro tipo I e, consequentemente gerar interpretações errôneas em testes de significância baseado em hipótese nula (Hawkins et al. 2007). Dessa forma, o teste de significância foi baseado nos graus de liberdades geograficamente efetivos, que foram obtidos utilizando o método de correção de Dutilleul (Dutilleul, 1993). Os testes estatísticos, bem como a correção de Dutilleul foram feitas no programa SAM v.4 (Rangel et al. 2010). Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade 3. Resultados & Discussão 316 3.1. Uso Sustentável do Pequi e Economia Rural Analisando os municípios brasileiros observou-se que 150 municípios apresentam atividades de extração sustentável do Pequi. Esses municípios estão distribuídos em 10 Estados brasileiros, sendo 70 municípios são do Estado de Minas Gerais, 39 da Bahia, 17 do Mato Grosso, 7 de Goiás, 6 do Ceará, 3 do Pará, 3 do Tocantins, 2 do Pernambuco, 2 do Piauí e 1 do Maranhão (Figura 2). Além disso, os municípios que registraram maiores valores de extração de Pequi estão principalmente concentrados nos Estados de Minas Gerais, Bahia e Ceará. Figura 2. Municípios brasileiros que apresentam dados de extração de Pequi. Cada círculo indica a posição central do município. O tamanho dos círculos demonstra a magnitude de extração de Pequi por município. A produção média de todos os municípios analisados foi de 30,89 kg/km2. O município que apresentou maiores valores de extração de Pequi foi Lontra (526,09 kg/ km2) e o município com menor extração foi Santa Fé de Minas (0,03 kg/km2), ambos os municípios do Estado de Minas Gerais. Uma análise do PIB dos municípios produtores de Pequi e o valor (em Reais) da produção de Pequi do ano de 2008 permitiu determinar o quanto a extração do Pequi contribui para o PIB do município (Percentual de Contribuição Econômica do Pequi – PCEP). Dessa forma, 0,09% (valor médio) do PIB dos municípios brasileiros analisados no ano de 2008 foram devido à extração de Pequi. Além disso, o município que apresentou o maior PCEP foi Santana do Pirapama (Estado de Minas Gerais), no qual 1,38% do PIB desse município foi devido a extração sustentável do Pequi. Ademais, o PCEP esteve positivamente relacionado com a extração média de Pequi (r=0.459; P=<0.001; corrigido pelo método de Dutilleul), evidenciando que municípios que extraem maiores quantidades de Pequi, contribuem mais para o PIB do mesmo município. Além disso, a correlação do coeficiente de Gini com a produção de Pequi, foi também positiva e marginalmente significativa (r=0.18; P=0,07), indicando que os municípios que extraem mais Pequi são aqueles que apresentam maior desigualdade de renda. Esses resultados evidenciam a importância do Pequi para os municípios que mais Uso sustentável e economia rural na era das mudanças climáticas globais: um estudo do Pequi (Caryocar brasiliense) em municípios brasileiros Fonte: CRIA 317 produzem sustentavelmente essa planta, pois são municípios em que essa prática contribui para o PIB do município e, além disso, são municípios com maiores desigualdades de renda. Além disso, esses resultados demonstram uma relação intrigada entre ecologia e economia (Goodland 1995), pois certamente os municípios com maiores produções de pequi têm maior preocupação ambiental, já que essa planta contribui para a economia local. 3.2. Distribuição geográfica potencial atual e futura Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade O modelo de distribuição geográfica atual do Pequi demonstrou que essa espécie possui de fato uma ampla distribuição geográfica, cobrindo todo o bioma Cerrado. O modelo também demonstra que as regiões como centro de São Paulo, sul de Minas Gerais e nordeste de Goiás apresentam condições climáticas muito favoráveis para a ocorrência do Pequi (Figura 3A). Em um cenário futuro de mudança climática, observa-se uma grande redução na distribuição geográfica da espécie, ou seja, muitas regiões do centro e noroeste do Cerrado diminuirão a adequabilidade ambiental para essa espécie. Além disso, mesmo regiões com São Paulo, Minas Gerais e Goiás, tenderão a perder adequabilidade ambiental (Figura 3B e 3C). A análise de desempenho demonstrou que o modelo gerado Maxent apresentou AUC igual a 0,98. 318 Figura 3. Mapa de distribuição geográfica potencial de Caryocar brasiliense, considerando cenário climático atual (A) e futuro (B). Em (C) a diferença entre adequabilidade ambiental futuro e atual (D adequabilidade), evidenciando regiões onde ganharão (valores positivos; cor escura) e perderão (valores negativos; cor clara) adequabilidade ambiental. O modelo apresentou alto desempenho, como indicado pelo AUC, e claramente evidenciou perda na distribuição geográfica da espécie em um cenário de mudança climática projetado para 2050. É importante salientar que o presente modelo, considerou somente aspectos climáticos para modelar a distribuição geográfica atual e futura da espécie. Dessa forma, outras variáveis determinantes na distribuição geográfica das espécies, como padrão de dispersão, mudanças evolutivas e interações ecológicas, não foram utilizadas para modelar a distribuição potencial da espécie estudada (Hannah et al. 2002; Pearson & Dawson 2003). Além disso, os resultados da alteração da distribuição geográfica do Pequi, por mais que tenham sido preocupante, ainda é bastante conservador, pois outras variáveis como o uso do solo não foram consideradas (Hannah et al. 2002). Assim, apesar do modelo indicar presença da espécie no cenário atual ou futuro, eventualmente, a espécie pode não ocorrer no local determinado, pois neste local o solo pode ter sido convertido para agricultura e pecuária, eliminando a vegetação natural. No presente modelo, isso fica claro para a região sul e sudeste do Bioma Cerrado (englobando estado de Mato Grosso, Goiás e São Paulo), no qual o modelo sugere ter condições climáticas favoráveis para a ocorrência do Pequi, entretanto, essa região apresenta elevado impacto antrópico e conversão do uso do solo (Silva et al., 2006; Sawyer, 2008 ), assim, diminui a possibilidade de ocorrência dessa espécie nessa região. Uso sustentável e economia rural na era das mudanças climáticas globais: um estudo do Pequi (Caryocar brasiliense) em municípios brasileiros Fonte: CRIA 319 Figura 4. Histograma evidenciando a adequabilidade ambiental registrada nos municípios que extraem Pequi, considerando os cenários climáticos atuais e futuros. Adequabilidade am biental no cenário futuro Adequabilidade no cenário atual 40 35 Número de cidades 30 25 20 15 10 0.9 0.8 0.7 0.6 0.5 0.4 0.3 0.2 0.0 0 0.1 5 Adequabilidade am biental Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Fonte: CRIA 320 Para cada município com dados de extração de Pequi, obteve-se os dados de adequabilidade ambiental no cenário climático atual e futuro. Assim, analisando os modelos de nicho por municípios, observou-se que em cenário climáticos futuros a maior parte dos municípios irão perder adequabilidade ambiental (figura 4). No cenário atual, a maior parte dos municípios tinha adequabilidade ambiental entre 0,5-0,6; entretanto, no cenário futuro a maior parte terá adequabilidade entre 0,4-0,5. Além disso, mais de 30 municípios terão adequabilidade próxima de zero (0), ou seja, em um cenário futuro, não apresentarão condições climáticas favoráveis para a ocorrência do Pequi. 3.3. Relação entre extração e distribuição do Pequi nos cenários atual e futuro Após fazer uma descrição da extração de Pequi por município brasileiro e da distribuição geográfica potencial dessa espécie, o próximo passo foi avaliar a relação entre essas duas variáveis (extração e adequabilidade ambiental). A análise de correlação entre essas duas variáveis evidenciou uma relação positiva e significativa (usando correção de Dutilleul), indicando que regiões climaticamente favoráveis para a ocorrência do Pequi (de acordo com os modelos de nicho) são regiões que têm se registrado maiores quantidades de extração natural do Pequi (Figura 5). Figura 5. Correlação entre o log da adequabilidade ambiental e log da extração de Pequi, por município. 3.0 Log da Extração de pequi (kg/km2) 2.8 2.6 R2 = 0.146 r=0.382 P= 0.032 y=0.374 + 3.928*x + e 2.4 2.2 2.0 1.8 1.6 1.4 1.2 1.0 0.8 0.6 0.4 0.2 0.26 0.24 0.22 0.20 0.18 0.16 0.14 0.12 0.10 0.08 0.06 0.04 0.02 0.00 0.0 Log da adequabilidade ambiental A princípio fazendo um cruzamento de informações, no qual os municípios irão perder adequabilidade ambiental e, como essa variável está relacionada positivamente com a extração de Pequi, espera-se que em cenários climáticos futuros esses municípios analisados perderão ou diminuirão a extração de Pequi, o que geraria conseqüente impacto econômica nas populações rurais. Para determinar a magnitude da perda na extração do Pequi no futuro, foi utilizada a equação da reta obtida na relação da figura 5. Assim, utilizou a adequabilidade ambiental de cada município registrada no futuro que corresponde a variável X da equação da reta para estimar a produção de Pequi no cenário futuro (variável Y). Por último analisou-se o quanto da extração de Pequi no cenário futuro se diferenciou da produção atual (em percentual). Observou-se que a maior parte da extração de Pequi irá diminuir de tal forma que a grande parte dos municípios irão reduzir em 50% a extração do Pequi, além disso, aproximadamente 60 municípios perderão aproximadamente 100% da extração de Pequi (figura 6). Uso sustentável e economia rural na era das mudanças climáticas globais: um estudo do Pequi (Caryocar brasiliense) em municípios brasileiros Fonte: CRIA 321 Figura 6. Histograma da diferença da extração de Pequi no cenário futuro em relação ao cenário atual (D extração) obtido em percentual. Valores negativos indicam redução na extração de Pequi, enquanto que valores positivos indicam aumento na extração de Pequi. 80 70 Número de cidades 60 50 40 30 20 401 351 301 251 200 150 100 50 0 (100) -100 0 (50) -50 10 D Extração (%) Educação, Gestão da Informação e Sustentabilidade Fonte: CRIA 322 Apesar desse cenário ruim, alguns poucos municípios investigados ganharão condições climáticas para ocorrência do pequi e consequentemente poderão aumentar a extração do Pequi em relação a sua produção atual. Esse é o caso do município de Brotas de Macaúbas (Estado da Bahia) no qual, se mantidas as relações iniciais, a produção de Pequi pode aumentar em 400%. Esses resultados permitiram observar que as mudanças climáticas globais diminuirá a distribuição geográfica do Pequi, afetando dessa forma os municípios que atualmente usam essa planta como uso sustentável, prejudicando a economia local. Projeções futuras do impacto econômico da diminuição e perda do Pequi são difíceis de serem mensuradas, uma vez que o presente trabalho considerou somente a distribuição geográfica da espécie. Certamente outras variáveis afetam a economia dos municípios produtores de Pequi, como inflação, relação procura e oferta. Essas variáveis não foram inseridas no presente modelo. Por fim, o impacto das mudanças climáticas globais na economia mundial tem sido recentemente alvo de grande discussão. De fato, algumas previsões futuras tem desenhado cenários no qual a economia passará fortes alterações (Grossmann et al. 2009). Sendo assim, é de grande importância a previsão do impacto das mudanças climáticas globais em um contexto global, regional ou até mesmo local, entretanto, estratégias para minimizar os seus efeitos devem ser feitos em uma escala global, por meio de parcerias científicas e tratados políticos internacionais (p.ex. protocolo de Quioto) (Reid et al. 2010; Grossmann et al. 2009). O presente trabalho associou a produção extrativista (e a economia) com a distribuição geográfica potencial (adequabilidade ambiental) de uma espécie do Cerrado e ainda estimou alterações na produção extrativistas considerando os cenários futuros de mudanças climáticas. É importante salientar que o presente trabalho utilizou como espécie modelo o Pequi, entretanto, a metodologia empregada no presente estudo pode ser aplicada para qualquer espécie de animal ou planta de interesse econômica e sustentável. Considerando as particularidades do presente trabalho que utilizou o Pequi, observou-se que o Pequi apresentará grande perda na sua distribuição geografia para o ano de 2050, além disso, inúmeros municípios exploradores de Pequi, não apresentarão condições climáticas para o estabelecimento dessa planta, comprometendo conservação dessa espécie e a economia de populações rurais. Dessa forma, algumas considerações e orientações finais devem ser destacadas: 1. Conservação do Pequi – Estratégias como a criação de Unidades de Conservação e extrativismo sustentável são importantes para conservação da biodiversidade. Além disso, considerando as futuras mudanças na distribuição geográfica da espécie, torna-se importante delinear Unidades de Conservação futuras, ou seja, regiões onde futuramente apresentaram adequadas para a ocorrência dessa espécie. 2. Medidas pró-ativas – Algumas medidas, em instância federal, estadual ou municipal podem ser tomadas para diminuir os riscos de perda do Pequi. Tais como, seleção de plantas resistentes, bancos de germoplasma, além de criação de áreas de conservação em regiões adequadas considerando as condições climáticas futuras como destacada no item anterior. 3. Novos municípios produtores – Estimular novos municípios que atualmente estão em condições climáticas adequadas e extraírem o Pequi, e assim contribuir para a economia local, pois o presente trabalho evidenciou que o Pequi tem um potencial para contribuir para o PIB dos municípios. È importante salientar, que apesar de alguns municípios apresentarem boas condições climáticas para o Pequi, o modelo em questão não considerou aspectos relacionados ao uso e ocupação do solo, dessa forma, alguns municípios podem atualmente apresentar o solo convertido, o que impossibilitaria ou Uso sustentável e economia rural na era das mudanças climáticas globais: um estudo do Pequi (Caryocar brasiliense) em municípios brasileiros Considerações Finais 323 reduziria o uso sustentável da planta. 4. Aumento da produção e manejo – A extração de Pequi e a adequabilidade apresentaram relação positiva significativa, além disso, foi possível observar que alguns municípios apresentam condições climáticas favoráveis para a extração de Pequi, no entanto a quantidade extraída ainda é reduzida. Dessa forma, um estudo importante para ser associado aos resultados encontrados nesse trabalho é o manejo das populações dessa espécie objetivando estudar os limites de extração permitida para a manutenção dos indivíduos dessa espécie. O estudo do manejo é de grande importância para delinear estratégias de aumento da produção em quilos e econômica e ainda de conservação da espécie. REFERÊNCIAS Allouche O; Tsoar A; Kadmon R. 2006. Assessing the accuracy of species distribution models: prevalence, kappa and the true skill statistic (TSS). Journal of Applied Ecology 43: 1223-1232. Almeida SP; Proença CEB; Sano SM; Ribeiro JF. 1998. Cerrado: espécies vegetais úteis. Planaltina: EmbrapaCPAC. 464 p. 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Licenciado e Mestre em Economia pelo Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG). É docente no Instituto de Estudos de Segurança da ULHT e no ISLA Campus de Lisboa. É adjunto do presidente da Fundação AIP e do Conselho Geral da AIP-CCI. Vogal do Conselho de Administração do CINEL - Centro de Formação Profissional da Indústria Eletrónica, Energia, Telecomunicações e Tecnologias da Informação. Desempenhou funções de Assessor para a Indústria, Comércio e Turismo do Gabinete do Primeiro-Ministro entre 1995 e 2001. É signatário de várias publicações especializadas sobre a economia portuguesa, nomeadamente as Cartas Regionais da Competitividade, referentes a todo o Continente português e, também, da Região Autónoma dos Açores (2012). E-mail: andre. [email protected] Antonio Teodoro Ribeiro Guimarães - Doutor em Administração pela Universidade de São Paulo (2009). Professor da Universidade Estadual de Goiás. É pesquisador associado do GPEADE - Grupo de Pesquisa em Administração Avançada e Empreendedorismo/FEA/USP/CNPQ, pesquisador do MACKLOGS - Núcleo de Estudos em Logística e Gestão de Cadeia de Suprimentos/Mackenzie e do Grupo de pesquisa Estratégia em Gestão,Educação e Sistemas de Informação. Estuda estratégia nas empresas e em modelos supra-empresariais (redes e clusters de negócios) e gestão de cadeias de suprimentos. Experiência em estratégia e logística. E-mail:teodoroguimaraes@ uol.com.br Armando Malheiro da Silva - Doutor em História Contemporânea pela Universidade do Minho. É Professor Associado do Departamento de Jornalismo e Ciências da Comunicação da Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Docente da Graduação em Ciência da Informação, do Mestrado em Ciência da Informação e do Programa Doutoral Informação e Comunicação em Plataformas Digitais. Publicou, pelas Edições Afrontamento, em 2002 e em co-autoria com a Prof.ª Fernanda Ribeiro, o livro Das “Ciências” Documentais à Ciência da Informação: ensaio epistemológico para um novo modelo curricular e em 2006, pela mesma Editora, A Informação: da compreensão do fenômeno e construção do objecto científico. Em 2010 e em co-autoria com Fernanda Ribeiro foi publicado pela Universidade Aberta Recursos de Informação: serviços e Utilizadores. Coordenou um projecto de investigação financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia intitulada A Literacia Informacional no Espaço Europeu do Ensino Superior: estudo das competências de informação em Portugal. E-mail: malheiroletras.up.pt Carla Conti de Freitas - Graduada em Letras Português Inglês (1995), Mestre em Letras e Linguística pela Universidade Federal de Goiás (2003) e Especialista em Psicopedagogia, Avaliação Institucional e Docência Universitária. Cursa Doutorado em Politicas Públicas, Estratégia e Desenvolvimento na UFRJ/UEG. Atua como Docente e como Coordenadora de Projetos e Publicações, na Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação da Universidade Estadual de Goiás. Participa do Grupo de Pesquisa em Gestão Estratégica, Educação e Sistemas de Informação (EGESI/UEG/CNPQ). Email: [email protected]. Christiano de Oliveira e Silva - Professor e Diretor da Unidade Universitária de Jatai da Universidade Estadual de Goiás.Possui graduação em Administração pelo Centro de Ensino Superior de Jataí (2000), graduação em Tecnologia em Logística pela Universidade Estadual de Goiás (2008) e MBAE em Gestão e Estratégia em Marketing pela Universidade Federal do Rio de Janeiro.Tem experiência na área de Administração de empresas, Gestão empresarial e Marketing. E-mail: dir.jatai@ueg. Dimas Moraes Peixinho - Professor Adjunto da Universidade Federal de Goiás .Possui graduação em Geografia pela Universidade Federal de Mato Grosso (1991), mestrado em Geografia (Geografia Humana) pela Universidade de São Paulo (1998) e doutorado em Geografia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2006). Tem experiência na área de Geografia, com ênfase em Geografia Regional, atuando principalmente nos seguintes temas: sistemas produtivos (setor sucroenergético e cadeia carnes-grãos) dinâmica socioespacial nos cerrados, políticas públicas, processos de arenização em áreas dos cerrados. E-mail: [email protected]. Felipe Martins Severo de Almeida - Graduado em Comunicação Social e pós graduando em Gestão de Projetos pela Faculdade SENAC de Brasília e estuda a temática marketing com foco em desenvolvimento social e ambiental. E-mail: [email protected]. Francisco Alberto Severo de Almeida. - Doutor em Administração pela Universidade de São Paulo (2010).e Pós doutorado pela Universidade do Porto - Portugal (2011). Professor e Diretor da Unidade Universitária de Educação a Distância da Universidade Estadual de Goiás. Experiência na área de Administração em Finanças Públicas e Estratégia Empresarial , atuando principalmente nos seguintes temas: cooperação e estratégia empresarial, tecnologia da informação, diagnóstico sócio-econômico , rede de negócios, educação a distância e orçamento público. Lider do grupo de pesquisa em Gestão Estratégia, Educação e Sistemas de Informação EGESI/UEG/CNPQ. E-mail: [email protected]. Gislaine Fernandes - Possui graduação em Administração de Empresas pela Sociedade Educacional Fleming (2004), Especialização em Gestão e Estratégia de Empresas pela Universidade Estadual de Campinas (2008), e mestranda em Engenharia Mecânica na Universidade Estadual de Campinas. Atua como auxiliar administrativo pela Fundação de Desenvolvimento da UNICAMP desde 2001 e seus interesses de pesquisa englobam as áreas de Gestão de Tecnologia da Informação, Terceirização de Serviços e Gestão de Riscos. (Universidade Estadual de Campinas, São Paulo, Brasil). E-mail: gislaine@fee. unicamp.br. Gislene Lisboa de Oliveira - Graduação em Biologia Bacharel e Licenciatura pela Pontifícia Universidade Católica - GO (1992) e mestrado em Biologia pela Universidade Federal de Goiás (2000). Atualmente é professora efetiva da Universidade Estadual de Goiás (UEG), lotada na Unidade de Educação a Distância (UnUEAD) onde está como professora e coordenadora adjunta de estágios e prática profissional dos cursos de graduação. Está como professora titular da Faculdade Araguaia (FARA) no curso de Ciências Biológicas (licenciatura). Tem experiência na área de Educação, com ênfase em tópicos específicos de educação presencial e a distância, atuando principalmente nos seguintes temas: formação de professores, ensino e aprendizagem em Biologia, educação a distância, educação ambiental, espeleologia e sensibilização ecológica. E-mail: [email protected] Isak Kruglianskas - Doutor em Administração e Professor Titular do Departamento de Administração da FEA/USP, Universidade de São Paulo. Coordenador do PROGESA - Programa de Gestão Estratégica Socioambiental .Membro do PGT - Programa de Gestão da Inovação e Projetos Tecnoloógicos . Coordenador dos curso MBA-CTI - Conhecimento, Tecnologia e Inovação e Pós Graduação em Sustentabilidade da FIA- Fundação Instituto de Administração.Membro de conselhos editoriais de revistas nacionais e internacionais. Autor de mais de 330 publicações entre artigos em periódicos e em anais de reuniões científicas, capítulos de livros e livros sobre temas de Administração relacionados com gestão da inovação, gestão de projetos e gestão ambiental. E-mail: [email protected] João Carlos Nabout - Graduação em Biologia pela Universidade Católica de Goiás (2003), mestrado em Ecologia e Evolução (2006) e Doutorado em Ciências Ambientais (2009) ambos pela Universidade Federal de Goiás e Pós-Doutorado (PNPD/CNPq) no laboratório de Ecologia Teórica e Síntese (UFG). Atualmente é professor da Universidade Estadual de Goiás (UEG/ UnUCET). Experiência na área de Ecologia, com ênfase em ecologia aquática e macroecologia. Na área de ecologia teórica e macroecologia interessa em avaliar o impacto das mudanças climáticas globais sobre a distribuição geográfica das espécies. Dessa forma, em linhas gerais atua principalmente nos seguintes temas: Fitoplâncton, Limnologia, Métodos filogenéticos comparativos, Modelagem de distribuição geográfica potencial, Mudanças climáticas e Cienciometria. E-mail: [email protected] Joaquim Ramos Silva - Professor Associado com agregação do Instituto Superior de Economia e Gestão, Universidade Técnica de Lisboa e investigador do SOCIUS. Doutoramento em “Análise e Política Económicas” pela École des Hautes Études en Sciences Sociales, Paris. Publicou quatro livros, onde se destaca Portugal/Brasil: Uma Década de Expansão das Relações Económicas, 1992-2002 (2002), sendo também editor de cinco obras. No conjunto, é autor mais de uma centena de publicações, incluindo várias dezenas de capítulos de livros e mais uma vintena de artigos em revistas com arbitragem científica. Foram concluídas sobre a sua orientação oito teses de doutoramento e quarenta e cinco dissertações de mestrado. Professor e investigador visitante em várias universidades estrangeiras, participou ainda em numerosos projectos internacionais. E-mail: [email protected] Jordana Moura Caetano - Possui graduação em Engenharia Agrícola pela Universidade Estadual de Goiás (2011). Atualmente é Mestranda em Engenharia Agrícola na área de Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental pela Universidade Estadual de Goiás. E-mail: [email protected] José Antonio Moreiro González - Professor catedrático de Biblioteconomia e Ciência da Informação e decano da Faculdade de Ciências Humanas, Comunicação e Ciência da Informação, Universidade Carlos III de Madrid. Possui doutorado em Historia(1980-85), e pós-doutorado pela Universidade de São Paulo (1989), da Universidade Federal da Paraíba (1998), e da Universidade Estadual de São Paulo (2001). Professor visitante nas Universidades de Antioquia e Norte (Colômbia), e da Federal do Paraná e da Bahia (Brasil); Católica de Lima (Peru) e na UNAM, México. É o autor de três livros biobibliográficos sobre Agostinho Milhares Carlo (1989, 1991, 1997), uma introdução biográfica e estudo de desenvolvimento conceitual de Documentação (1990), Introdução ao estudo de outras informações e Documentação (1998 e 2002) , um manual de Documentação de Informação (2000). E-mail: [email protected] José Veiga Simão - PhD Cambridge University (1957); Doutor em Ciências Físico-Quimicas (1957); Professor Extraordinário (1959), Professor Catedrático (1961), Universidade de Coimbra. Reitor da Universidade de Lourenço Marques (1963-70). Ministro da Educação Nacional (1970-74). Embaixador de Portugal nas Nações Unidas (1974-75).Research Fellow e Visiting Professor, Yale University (1975-78); Fellow, Lesley College (19761978); Director da Portuguese Heritage Foundation (1975-1978).Presidente Conselho de Avaliação das Universidades Públicas (1993-97); Conselheiro do “Legislative Reform Program” do Conselho da Europa (1994-1997). Ministro da Defesa Nacional (1997-99). Doutor honoris causa por várias universidades portuguesas e estrangeiras. Julia Paranhos - Professora Adjunta da Universidade Federal do Rio de Janeiro e coordenadora do Grupo de Economia da Inovação do Instituto de Economia da UFRJ. Graduada em Ciências Econômicas pela UFRJ (2004), mestre em Economia Industrial pela Universidade Federal de Santa Catarina (2006) e doutora em Economia da Indústria e da Tecnologia pela UFRJ (2010) com período de doutorado sanduíche no Science and Technology Policy Research - SPRU (2009). Tem experiência na área de Economia, com ênfase em Inovação, atuando principalmente nos temas: gestão da inovação e relação universidade-empresa, em especial no setor farmacêutico, e desenvolvimento econômico local no estado do Rio de Janeiro. E-mail:[email protected] Lia Hasenclever - Graduada em Economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1977), mestrado em Economia Industrial pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1988) e doutorado em Programa de Pós Graduação Em Engenharia de Produção pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1997). Atualmente é Professor Associado I da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Tem experiência na área de Economia, com ênfase em Organização Industrial e Estudos Industriais, atuando principalmente nos seguintes temas: desenvolvimento econômico local, inovação, Nova Friburgo, indústria farmacêutica e competitividade. E-mail: [email protected] Mara Rúbia Magalhães - Graduação em Biologia Bacharelado e Licenciatura pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (2002), especialização em Formação de Professores - Educação Ambiental pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (2003), especialização em Métodos e Técnicas de Ensino pela Universidade Salgado de Oliveira (2005) e mestrado em andamento em Sociedade, Tecnologia e Meio Ambiente pela UniEvangélica. Atualmente é Professora titular da Secretaria do Estado da Educação, Coordenador de Curso da Universidade Estadual de Goiás, Coordenadora Geral da UnUEAD da Universidade Estadual de Goiás e Professor Titular da Universidade Estadual de Goiás. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Ensino-Aprendizagem e pesquisa na área de avaliação do impacto das mudanças climáticas globais sobre a distribuição geográfica das espécies. E-mail: [email protected] Maria Manuel Borges - Doutorada em Letras, área de Ciências Documentais, especialidade de Tecnologias da Informação pela Universidade de Coimbra- Portugal onde lecciona, desde 1995.É actualmente Subdirectora do Departamento de Filosofia, Comunicação e Informação, Coordenadora Departamental Sócrates/Erasmus para a área de Ciência da Informação e Directora dos Serviços de Biblioteca e Documentação.É, ainda, Directora de Curso 2º ciclo em Informação, Comunicação e Novos Media e do Curso de Especialização em Ciências Documentais da Universidade de CoimbraPortugal. E-mail: [email protected] Maria Cristina Vieira de Freitas - Doutora em Bilbioteconomia e Documentação pela Universidade de Salamanca – Espanha.Professora auxiliar convidada da Faculdade de Letras e Membro do Conselho de Redação do Arquivo da Universidade de Coimbra. E-mail: [email protected] Maria Tereza Ribeiro Alves. Possui graduação em Engenharia Florestal pela Universidade Estadual de Goiás (2009). Tem experiência na área de Recursos Florestais e Engenharia Florestal, com ênfase nas áreas de florística e de solos. E-mail: [email protected] Mário José Batista Franco - Professor Auxiliar no Departamento de Gestão e Economia da Universidade da Beira Interior (UBI) e investigador do NECE. Doutoramento em Gestão pela UBI, com especialização em Cooperação Empresarial. Em 1997, frequentou o European Doctoral Programme in Entrepreneurship and Small Business Management in Barcelona (Espanha) e Vaxjo (Suécia). Faz parte do conselho editorial de revistas de Gestão e é autor e co-autor de vários artigos publicados em journals com arbitragem científica internacional, tais como Long Range Planning, Management Decision, European Journal of International Management, entre outros. Áreas de investigação: alianças estratégicas, empreendedorismo, redes inter-organizacionais e gestão de PME. E-mail: [email protected] Manoel Pereira da Costa - Doutor em Educação pela Universidade Federal de Goiás.Diretor de Educação e Tecnologia SESI/SENAI Goiás. Membro do Conselho Estadual de Educação desde 2002, onde exerce atualmente a função de Presidente da Câmara de Educação Profissional. Pesquisador do Núcleo de Estudos e Pesquisa da FATESG – Faculdade de Tecnologia do Senai de Desenvolvimento Gerencial. E-mail: [email protected] Manuel Belo - Doutorando em Gestão na Universidade da Beira Interior que iniciou em Outubro de 2010. Recebeu o diploma de Mestre em Marketing pela mesma Universidade, em Julho de 2010. A sua Tese de Doutoramento encontra-se em desenvolvimento e pretende investigar os factores estruturantes da proposta de valor do produto território na perspectiva dos diversos stakeholders. É também formador de Branding e Marketing na Escola Hotelaria e Turismo de Portalegre e técnico superior na Escola Profissional de Nisa, tendo sido seu Director Geral entre 1995 e 2009. Oswaldo Luiz Agostinho - Possui Graduação em Engenharia Mecânica pela Universidade de São Paulo (1966), mestrado em Engenharia Mecânica pela Universidade Estadual de Campinas (1979), Doutorado em Engenharia Mecânica pela Universidade de São Paulo (1985), e Livre Docência em Engenharia Mecânica pela Universidade Estadual de Campinas (1995). Atualmente é Professor Associado da Universidade Estadual de Campinas, e Professor Doutor da Universidade de São Paulo. Em atividades empresariais, foi Gerente Corporativo de Tecnologia da Informação da Eaton América do Sul e atualmente é sócio proprietário da ORA Consultoria em Gestão Empresarial Ltda. Suas linhas de pesquisa são: Competitividade, Estratégias ligadas à Competitividade, Gestão de Tecnologia para Competitividade, Flexibilidade e Integração dos Sistemas Produtivos , e Planejamento de Processos. (Universidade Estadual de Campinas, São Paulo, Brasil). E-mail: [email protected] Rita de Cássia da Silveira Marconcini Bittar - Possui graduação em Engenharia Mecânica Enfase Produção pela Universidade Federal de Itajubá (1987) e mestrado em Engenharia Mecânica pela Universidade Estadual de Campinas (1993), cursando doutorado em Engenharia Mecânica pela Universidade Estadual de Campinas (início 2010). Atualmente é Professora Assistente da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Tem experiência na área de Engenharia de Produção, com ênfase em Planejamento, Projeto e Controle de Sistemas de Produção, atuando principalmente nos seguintes temas: Tecnologia da Informação, Gestão da Empresa Estendida e Gestão dos Processos de Negócio. (Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil). E-mail: [email protected] Sofia Sant’Ana Lopes Malheiro da Silva - Doutora em Ciências da Educação pela Universidade Aberta, Portugal. Mestre e Licenciada em Ciências da Educação pela Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Lisboa. Professora Auxiliar Convidada do Departamento de Educação e Ensino a Distância da Universidade Aberta; Docente na Pós Graduação em Educação Especial do Instituto D. Afonso III, Loulé, Portugal. E-mail: [email protected] Sofia Vasques - Licenciada em História pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Pós-graduada em Património Cultural pela Universidade Católica Portuguesa e especialização pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, em Ciências Documentais (opção Arquivo). Mestrado em Informação, Comunicação e Novos Media pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Iniciou a sua atividade profissional em 1999 como Historiadora do Gabinete Técnico Local. Desde 2005 é coordenadora do Setor de Arquivo na Câmara Municipal de Viseu. Sónia Catarina Lopes Estrela - Licenciou-se em História , na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. No ano de 2003 concluiu o curso de especialização em Ciências Documentais -ramo de Arquivo na mesma universidade e, no ano seguinte, o ramo de Bibliotecas e Documentação. Defendeu a dissertação de mestrado em 2008, na Universidade de Évora, intitulada "A Gestão da Informação na Escola Superior de Tecnologia e Gestão de Águeda."Desenvolveu várias actividades profissionais, nomeadamente no Centro de Documentação e Informação da Cena Lusófona, em Coimbra, nos anos de 2003 e 2004. Iniciou a sua actividade profissional como docente na Escola Superior de Tecnologia e Gestão de ÁGueda- Universidade de Aveiro no ano lectivo de 2004/05.Encontra-se actualmente a desenvolver a tese de doutoramento no âmbito da Gestão da Informação. Suzana Ribeiro Lima Oliveira - Professora Assistente da Universidade Federal de Goiás.Realizou sua graduação em Geografia na Universidade Federal de Goiás (1998) e graduação em Normal Superior na Faculdade Albert Einstein (2006), Especialização em Metodologia do Ensino de Geografia no Processo Educativo pela Faculdade de Educação São Luiz(2000) e Supervisão Escolar pela Faculdade Albert Einstein (2006), Mestrado em Geografia pela Universidade Federal de Goiás (2012). Tem experiência na área de ensino de geografia, atuando principalmente nos seguintes temas: Educação, ensino de Geografia e Gestão Escolar. Email: [email protected] Victor Santos - Doutorando em Gestão na UBI e tem Mestrado em Gestão/MBA (1998) e a Licenciatura em Gestão de Empresas (1994) no I.S.E.G., o Curso Geral Naval de Guerra no I. S. N. G. (1995), a Especialização em Electrotecnia no G.1E.A. (1990) e a Licenciatura em Ciências Militares Navais na E. N. (1987). Frequentou diversos cursos, seminários e palestras nas áreas da Gestão, tecnologias da formação, Qualidade, Ambiente e Segurança Industrial, tendo desenvolvido actividades nestas áreas como consultor e formador. Oficial da Marinha, até 2004, desempenhou funções de direcção, chefia e comando em diversos organismos e unidades navais. No âmbito da actividade docente, foi de Professor efectivo da E. N. (2005 a 2010), tendo colaborado com o I. S. C. S. – Sul (2000 a 2003) e com a U. A. (2004 a 2005). Actualmente é Consultor e Formador nas áreas de Gestão, Qualidade, Ambiente e Segurança Industrial. E-mail: [email protected] Yara Fonseca de Oliveira e Silva - Graduada em Pedagogia pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (1988); especialista em Psicopedagogia (ULBRA/RS, 1998) e em Avaliação Institucional (UEG/GO, 2005) e mestrado em Educação pela Universidade Federal de Goiás (2005). Atualmente é doutoranda no curso de Políticas Públicas, Estratégias e Desenvolvimento (UFRJ/PPED/UEG) e professora titular da Universidade Estadual de Goiás.Tem experiência e realiza pesquisa na área de Educação atuando principalmente nos seguintes temas: políticas públicas, produção e difusão do conhecimento da universidade no desenvolvimento regional/local, inovação, avaliação institucional, inclusão e diversidade. Waldomiro Vergueiro - Possui graduação em Biblioteconomia e Documentação pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (1977), mestrado em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo - ECA/USP (1985), doutorado em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (1990) e pós-doutorado pela Loughborough University of Technology (Inglaterra). Atualmente é professor titular ECA/USP, além de coordenador do Observatório de Histórias em Quadrinhos, também na ECA/USP. Atua como membro do corpo editorial da Revista Interamericana de Bibliotecología e da International Journal of Comic Art . Produz principalmente nos seguintes temas: historias em quadrinhos, historias em quadrinhos - brasil, biblioteconomia, desenvolvimento de coleções e bibliotecas - qualidade. William Ferreira da Silva - Professor Assistente da Universidade Federal de Goiás. Possui graduação (Licenciatura) e Mestrado em Geografia pela Universidade Federal de Goiás é doutorando do curso de Geografia do Instituto de Estudo Sócio Ambientais da Universidade Federal de Goiás. Tem experiência na área de Geografia Humana, atuando principalmente nos seguintes temas: ensino de Geografia e expansão do setor sucroenergético no Sudoeste de Goiás. Este livro foi composto em Goudy Old Style Regular, corpo 11. Impresso pelo SENAI GOIÁS - Rua Professor Lazaro Costa 348 - Vila Nova Canaã Goiânia - GO, CEP: 74415-420 - sobre papel off-set 75g/m2.