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COMUNIDADE NEGRA RURAL­RINCÃO DO SANTO INÁCIO­RS SOB A ÓTICA
DO CAMPESINATO: UMA ALTERNATIVA DE DESENVOLVIMENTO SOCIO­
AMBIENTAL E CULTURAL SUSTENTÁVEL ATRAVÉS DO PARADIGMA DA
AGROECOLOGIA
Aline Beatriz Stock Eich¹
Lauro César Figueiredo²
Introdução
O passado cultural é importante para definir espaços, auto­estima, reafirmação social
tanto no espaço regional quanto no local, não com a intencionalidade de restauração
sociocultural, mas de reencontrar valores que promovam atitudes, projetos de vida,
integrações, configurando padrões de vida, traumatismos culturais frutos de mudanças
significativas no grupo, alterando o modo de vida e a ordem dos valores existentes
(TEDESCO, 1999).
Assim, sabe­se, que através da criação de gado e do desenvolvimento das
charqueadas, que se concentravam principalmente na cidade de Pelotas por volta de 1780,
foi intensificado o tráfico de escravos no Rio Grande do Sul, outra área de grande
concentração foi à estrada dos tropeiros, como ficou conhecida a estrada que ligava o
extremo sul de Rio Grande ao restante do Estado, ao longo da qual se encontravam as
maiores estâncias, local para onde era trazida a maioria destes escravos que chegavam ao
Estado (MAGNOLI, 2001).
Com o início do século XIX, após a abolição da escravatura e da Revolução
Farroupilha, muitas mudanças continuaram a ocorrer no espaço geográfico e a divisão
fundiária foi uma delas. Nesse sentido, povos de origem africana, antes refugiados em
fazendas, começavam a formar pequenas comunidades denominadas de quilombos,
outros permaneciam nas fazendas, pois a abolição ao contrário do que se pensava havia
gerado outros tipos de conflitos, tanto no âmbito territorial quanto étnico­racial.
Neste sentido, o Rincão do Santo Inácio destaca­se por ser um espaço social
marcado pela terra e pelo parentesco, uma vez que, constitui­se num quilombo localizado
em área rural, sendo que, nele se estabelecem relações que despertam elementos
históricos de organização da família negra, incorporado a uma história de tradição que
etnicamente os diferencia (GUSMÃO, 1995).
¹ Artigo desenvolvido na disciplina de Seminários de Mestrado ­ Programa de Pós­Graduação em Geografia e Geociências
(PPGGeo), sob orientação do Profº.Drº.Lauro César Figueiredo.
² Aluna de Mestrado Programa de Pós­Graduação em Geografia e Geociências (PPGGeo)­UFSM.
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Comunidade negra rural­ Rincão do Santo Inácio­RS sob a ótica do campesinato: uma alternativa de desenvolvimento
Entretanto, passado mais de 300 anos desde o fim da escravidão no Brasil, algumas
comunidades negras, ainda refletem limitações impostas historicamente no pensamento
social brasileiro e os entraves relativos a vários aspectos que envolvem este segmento
étnico em particular. As considerações que segue, têm por proposta repensar a realidade
do espaço rural negro na perspectiva do campesinato, na comunidade negra rural Rincão
do Santo Inácio, localizada no município de Nova Palma – RS, seus muitos caminhos e
lutas para permanecerem como um grupo ligado a uma terra em particular.
O espaço rural das comunidades negras no contexto do campesinato
Cabe­nos destacar que a vigência da escravidão como relação de trabalho única e
absoluta durante o período colonial nas Américas é um mito. Mesmo antes da colonização
brasileira, os portugueses já haviam estabelecido em outras colônias, como a ilha de São
Tomé, uma forma de mão­de­obra mista entre a escravidão e o campesinato. Nesse caso,
o escravo possuía pequenas cotas de terra, que podia cultivar uma vez por semana e cuja
a produção lhe pertencia, podia vendê­la no mercado e, assim, arrecadar o dinheiro
necessário para comprar sua carta de alforria. Esta figura pouco conhecida, metade
escravo, metade camponês esta bem presente no Sul dos EUA e no Caribe.
(CARDOSO,2004).
Neste contexto, surgem diversos autores que buscam conceituar as comunidades
rurais e conseqüentemente a figura do camponês, assim, Kroeber também caracteriza a
sociedade camponesa como uma forma de organização social, constituindo sociedades
parciais com culturas parciais. Carecem de isolamento, da autonomia política e autárquica
dos grupos tribais, mas suas unidades locais conservam sua velha identidade, de
integração e apego á terra e aos cultivos (1948, p.284).
Neste sentido, devemos estar atentos á algumas questões teóricas metodológicas que
permeiam o contexto desta síntese, uma vez que serão analisados ao longo deste estudo,
alguns aspectos que buscam aproximar o negro da figura do camponês, inferindo tratar­se
do mesmo sujeito, porém com histórias de vida diferentes. Assim, as terras de preto, as
comunidades negras rurais ou o quilombo, entre outras denominações, constituem­se no
nosso recorte espacial e não podem ser compreendido apenas como um espaço histórico,
único ou fisicamente definido. Neste sentido, é válido lembrar e compartilhar da mesma
idéia do antropólogo Almeida (1996, p. 18), que sustenta:
O conceito de quilombo não pode ser territorial apenas, ou fixado num
único lugar geograficamente definido, historicamente ‘documentado’ e
arqueologicamente ‘escavado’. Ele designa um processo de trabalho
Aline Beatriz Stock Eich; Lauro César Figueiredo
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autônomo, livre da submissão dos grandes proprietários. Neste sentido,
não importa se está isolado ou próximo das casas grandes. Há uma
transição econômica do escravo ao camponês livre, que só
indiretamente passa pelo quilombo no caso do Frechal. O que não foi
concebido no lugar onde se ergueu o quilombo foi obtido a partir de
debilitado o poder da casa grande, bem junto a ela. Este talvez seja o
elemento mais controvertido e que dificulta aos historiadores
tradicionais entender a essência do significado de quilombo. Tais
historiadores sempre querem colocá­lo numa camisa de força
geográfica, como se fora sempre isolado, longínquo, distante dos
mercados e produzindo para a subsistência. Ao contrário, aqui se tem
uma afirmação econômica de produzir para o mercado, de a ele se ligar
e de reverter domínios fundiários reconhecidos pela Lei de Terras de
1850, devido ao fato de os grandes proprietários perderem,
circunstancialmente, o poder e buscarem um acordo verbal, prometendo
alforria e terra, ante a incapacidade de proverem os recursos para a
escravaria se alimentar e produzir.
Nesta mesma linha, visando, desfazer a idéia equivocada de que o quilombo (terras
de preto, comunidade negra rural...) é um espaço estático, cuja autonomia foi colocada em
dúvida, por muitos pesquisadores, sobretudo aqueles que foram os pioneiros nesta
temática, Almeida (2002, p. 53), assevera que:
O quilombo já surge como sobrevivência, como ‘remanescente’.
Reconhece­se o que sobrou, o que é visto como residual aquilo que
restou, ou seja, se aceita o que já foi. Julgo que, ao contrário, se deveria
trabalhar com o conceito de quilombo considerando o que ele é no
presente. Em outras palavras, tem que haver um deslocamento. Não é
discutir o que foi, e sim discutir o que é e como essa autonomia foi
sendo construída historicamente. Aqui haveria um corte nos
instrumentos conceituais necessários para se pensar a questão do
quilombo, porquanto não se pode continuar a trabalhar com uma
categoria histórica acrítica nem com a definição de 1740.
Assim, buscamos retomar o texto original, com a finalidade de compreender o que foi
reportado pelo Conselho Ultramarino ao rei de Portugal em 1740, como definição de
quilombo: “toda habitação de negros fugidos, que passem de cinco, em parte despovoada,
ainda que não tenham ranchos levantados e nem se achem pilões nele.” Essa visão
reduzida que se tinha das comunidades negras rurais refletia, na verdade, a “invisibilidade”
produzida pela história oficial, cuja ideologia propositadamente, ignora os efeitos da
escravidão na sociedade brasileira. (GUSMÃO, 1995).
A permanência deste sujeito, numa área rural bastante afastada dos centros urbanos,
não o torna vítima de um isolamento cruel que poderia ter­ se dado como conseqüência do
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Comunidade negra rural­ Rincão do Santo Inácio­RS sob a ótica do campesinato: uma alternativa de desenvolvimento
seu passado escravista ou pela má preparação da sociedade em aceitá­lo enquanto
homem livre. Tampouco, permanecem nestas terras por obra do acaso; não, ele existe ali
enquanto sujeito da própria história, porque, não se trata de qualquer terra, é uma terra
impregnada de simbologia, afetividade, que lhes foi passada pela geração anterior que,
também cultivava esse vínculo com a mesma, justificando a resistência e a reprodução da
unidade familiar sob esse território.
Neste aspecto, muitas comunidades negras rurais privilegiaram áreas distantes dos
centros urbanos para estabelecerem seu território, isolando­se da convivência diária do
modo de produção e de vida das cidades. Entretanto, segundo O’dwyer (2002), o que não
pode acontecer, é, confundir esse isolamento como sendo um regresso ao passado ou um
isolamento inconsciente. Devemos considerar que existe ali, uma troca entre os saberes do
campo e da cidade, presente na realidade desses grupos, bem como uma ligação com os
conhecimentos e hábitos pertinentes a atividade urbana, que proporcionam de certa forma,
uma reprodução mais organizada e legitima dos indivíduos nesse território. Refiro­me aqui
a questões relacionadas a fluidez das informações, velocidade de informações, entre
outros que os colocam á par de assuntos importantes para o grupo, como por exemplo, a
interação com outras comunidades negras rurais, que se encontram em níveis mais
avançados em relação à certificação das terras e mesmo aos aspectos que envolvem a
infra­estrutura È neste sentido, que O’dwyer (2002, p.256), afirma tratar­se
... De um isolamento defensivo, que se propõe a obstaculizar a entrada
de pessoas vistas como de fora nos círculos mais íntimos do cotidiano
de seus territórios. Entre tais grupos, o isolamento é mantido atualizado
de forma consciente, sem ser confundido com o isolamento primitivo,
muito pelo contrário, o isolamento consciente visa à seleção e o
controle, por parte da comunidade, das relações com o exterior e um
domínio do espaço. Trata­se da permeabilidade das fronteiras étnicas,
que, ao invés de isolar, elege momentos nas quais as mesmas se
abrem.
Deste modo, partindo­se do pressuposto de que a cultura negra é responsável por
singularidades, que (re) criam­se sobre esse território, é importante destacar a autonomia
exercida por estas comunidades negras rurais. Salientando­se que, esta autonomia é
determinante no controle sobre os modos de produção, sobre o trabalho, e
conseqüentemente sobre a reprodução dos seus meios de vida. Não podemos, porém
aceitar esta autonomia como única e verdadeira; tampouco, privilegiar a dicotomia
existente entre o campo e a cidade trabalhando­os como realidades independentes, visto
que estes sujeitos estão de alguma forma submetidos a fatores externos que influenciam
na organização do seu território.
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Nesta mesma linha, Oliveira (2002, p.74), Afirma que
...o território deve ser entendido como síntese contraditória, como
totalidade concreta do processo/modo de produção/ distribuição/
circulação/ consumo e suas articulações e mediações...O território é
assim produto concreto da luta de classes travada pela sociedade no
processo de produção que dão configuração histórica específica ao
território.Logo o território não é um prius ou a um priori , mas a continua
luta da sociedade pela socialização igualmente continua da natureza.
Assim, o território também pode ser compreendido, como a projeção espacial de
relações do poder, mas não pode ser jamais compreendido e investigado, no que se refere
a sua origem e as causas de suas transformações, sem que o aspecto material do espaço
seja devidamente considerado. SOUZA (1995, p.64)
Ainda, sobre o território e suas projeções espaciais, Raffestin (1978, p.144), afirma
que:
Qualquer projeto no espaço que é expresso por uma representação
revela a imagem desejada de um território, de um local de relações,
assim, todo projeto é sustentado por um conhecimento e uma prática,
isto é, por ações ou comportamentos que é claro, supõem a posse de
códigos, de sistemas sêmicos. E são por esses sistemas sêmicos que
se realizam as objetivações do espaço, que são processos sociais.
Neste sentido, as comunidades negras rurais, apresentam um conjunto de
características, de códigos e simbologias, muito particulares á este segmento étnico. No
entanto, seus modos de produção, seus meios para produzir, as formas de organização do
território, a maneira como se deu ao longo dos tempos a apropriação da terra, e até mesmo
a estrutura das propriedades, acabaram gerando (de) semelhanças, entre as mesmas.
Aspectos Culturais do negro rural e/ou camponês
Quando observamos a distribuição espacial das comunidades negras rurais no Rio
Grande do Sul, e até mesmo no restante do país, verificamos que embora exista uma
relevante distância geográfica entre muitas destas, inferimos que algumas características
apresentam­se de forma homogênea entre as mesmas, outras já diferem em alguns
aspectos. A questão cultural é uma delas, visto que permanecem quase inalteradas entre
este grupo étnico; com algumas diferenças entre os ramos religiosos, visto que, algumas
comunidades ainda manifestam a religião dos seus antepassados, ligados a cultos
africanos, como o candomblé, umbanda, enquanto outros grupos aderiram a religiões mais
tradicionais como as evangélicas ou católicas, entre outras.
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Comunidade negra rural­ Rincão do Santo Inácio­RS sob a ótica do campesinato: uma alternativa de desenvolvimento
No entanto, a evolução do grupo enquanto unidade de produção, bem estar dos
iindivíduos, educação, saúde, infra­estrutura das moradias, entre outros, apresentam­se
bem mais desenvolvidas em apenas algumas comunidades, principalmente naquelas onde
a busca pela legitimação do território e a abertura das fronteiras para os de “fora” deu­se
concomitante aos primeiros debates sobre a posse das terras onde hoje se configuram os
territórios quilombolas. Um exemplo desse desenvolvimento e autonomia é a comunidade
negra rural de Morro Alto, localizada no litoral norte do nosso Estado, onde a infra­estrutura
local e a o trabalho coletivo foram alcançados com êxito, e isto só foi possível entre outros
fatores, á abertura que a comunidade promoveu para um grupo de fora, que reunia
pesquisadores de universidades e órgãos de apoio do governo, que tinham como único
interesse o resgate da cultura negra e a preservação da identidade quilombola bem como
sua reprodução territorial.
As condições materiais de produção desse modo de vida, associadas ao meio e as
relações sociais que se constroem a partir disso, asseguram processos sociais nucleados
em torno da família, da organização do trabalho, da comunidade, da vizinhança e do
parentesco, do mundo exterior, da organização social para a sobrevivência, para a
sociabilidade, para o domínio da natureza e para a construção da individualidade.
(TEDESCO 1999, p.49). Assim, ao repensar o território rural negro, buscando inseri­lo no
contexto do campesinato, encontramos na trajetória deste segmento étnico, em seu modo
de vida e na relação que este mantinha com a terra no período da escravidão; talvez o
primeiro quesito, digamos assim, que o colocaria como sujeito na perspectiva de ser
camponês. Trata­se da brecha camponesa, que diz respeito em parte “as atividades
agrícolas, realizadas por escravos nas parcelas e no tempo para trabalhá­las concedidos
para esse fim no interior das fazendas.” (CARDOSO, 1979. p. 145). Sendo assim, a brecha
camponesa nada mais era do que um incentivo por parte do proprietário da fazenda, então
dono dos escravos, que tinha por objetivo fixar a permanência destes em suas terras,
inibindo qualquer tipo de resistência, cumprindo, portanto, o que O’dwyer (2002)
denominou de função ideológica de manutenção da estrutura escravista.
Todavia, a brecha camponesa, também proporcionou ao escravo, uma determinada
autonomia econômica, uma vez que este passou a acumular um pequeno capital que era
utilizado na compra de produtos que ora os auxiliavam em sua modesta produção, como
sementes, por exemplo, ora serviam para satisfazer outras necessidades, como o
vestuário.
Desta forma, a relação do negro com a terra passa a ter um novo significado, pois, na
sua concepção, não existiria mais a idéia de fuga, luta, e resistência, visto que, o seu
senhor era bom. Então, fugir da fazenda para quê? Ir para onde? Considerando que,
encontravam­se, ali o que lhes era necessário para sua subsistência, ou seja, a terra e o
Aline Beatriz Stock Eich; Lauro César Figueiredo
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alimento que esta lhes dava; criando­se assim mais que uma relação de troca, mas de
reciprocidade e acima de tudo afetiva com esta terra, que mais tarde passa a ser o seu
território.
Neste contexto, o negro ex­cativo, passa a ser sujeito da sua própria história, uma vez
que se materializava no espaço o que circulava no seu imaginário, a liberdade •, e a
“propriedade” de uma parcela de terra na qual poderia produzir para seu autoconsumo bem
como da sua família e comercializar ou trocar o excedente, pelo que não tinham acesso,
conforme foi exposto anteriormente. É neste sentido, que Sidney Mintz (1974), de quem
Cardoso (1979) se dissocia no que se refere à dissolução das categorias escravo e modo
de produção escravista, defende que, o cativo poderia ser escravo e camponês, ao viver,
em forma alternada, as duas relações de produção.
Embora algumas linhas teóricas tenham preconizado o fim do campesinato, enquanto
classe social, Paulino (2006. p.3), é bastante firme em sua contribuição sobre este grupo
em particular, afirmando que
...alguns pressupostos ganharam força, sobretudo aquele que
vislumbrava o seu desaparecimento enquanto classe. Entretanto,
constata­se que o desenvolvimento capitalista não tem provocado o
desaparecimento do campesinato, mas sua recriação.
As discussões sobre as comunidades negras rurais e/ou camponês negro exigem uma
reflexão específica tendo em vista que ao longo das últimas décadas este termo, bem
como seu significado, vem sendo amplamente discutido, questionado e reconceituado,
soma­se a isto algumas hipóteses que surgiram a cerca da classe camponesa, entre elas,
a de que a figura do camponês teria deixado de existir; na medida em que o capitalismo
crescente tomou conta do espaço agrário de forma imensurável, estabelecendo­se nos
lugares mais remotos, fazendo uso massivo de variadas tecnologias (FERNANDES, 2001).
Desta forma, segundo essa concepção, o camponês submetido á este modo
capitalista de produção teria sofrido uma metamorfose, tornado­se um agricultor familiar,
que luta pela permanência no campo, visto as dificuldades encontradas neste setor.
No entanto, observando as considerações de autores como Tedesco (1999) e Gusmão
(1995), respectivamente sobre o colono italiano e os negros de comunidades rurais,
destaca­se a grande semelhança, entre essas duas diferentes categorias históricas de
análise. Diferentes, em sua trajetória de vida, em seus costumes e hábitos, em seu modo
de apropriação da terra (no momento da instalação). Porém muito próximas, no que se
refere ao sentimento pela terra, aos laços de parentesco, ao exercício da coletividade,
entre tantos outros aspectos que se assemelham e permeiam seus cotidianos,
configurando seu território e materializando­se no espaço, aproximando­os assim da figura
do camponês, e do ser camponês.
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Comunidade negra rural­ Rincão do Santo Inácio­RS sob a ótica do campesinato: uma alternativa de desenvolvimento
É válido observarmos as colocações de, (TEDESCO 1999, p.50), quando este
caracteriza o típico camponês italiano, que dentro desta lógica contracena com o sujeito
e/ou camponês das comunidades negras rurais
[...] a ordem social do colono fundava­se na ligação com a propriedade,
família e trabalho, este com sentido além do econômico, que ligado á
propriedade, formaria o espaço social e a trajetória seqüencial das
estratégias de reprodução familiar e organização da individualidade do
colono. As estratégias familiares, serão implementadas em função das
especificidades que se constroem nesse espaço de sociabilidade
preponderantemente rural, de reciprocidade, de laços pessoais e de
mercados débeis, de uma moral que fundamenta a solidariedade
familiar e comunitária e, de certa forma, o econômico. São construções
simbólicas no âmbito objetivo, e também ritualístico, que envolvem laços
de matrimônio e contato coma terra nas práticas de trabalho.
Nesta mesma linha, porém privilegiando o sujeito das comunidades negras rurais,
bem como o conjunto de particularidades que os diferenciam enquanto segmento étnico,
Gusmão (1990. p.116), sustenta que
[...] as especificidades de que são portadores os torna parte do universo
camponês brasileiro e, ao mesmo tempo os diferenciam a partir da
condição étnica da história particular que lhes deu origem... Constroem
coletivamente a vida sob uma base geográfica física e social formadora
de uma territorialidade negra. Dentro dela, elaboram­se formas
específicas de ser e existir enquanto camponês e negro.
Acrescenta­se, á isto, a cultura do envolvimento comunitário em torno de soluções
para os problemas que são uns das marcas do campesinato. Trata­se da ajuda mútua que
acontece independentemente desse esforço dirigido (PAULINO, 2006. p.280.), o vínculo
afetuoso que se estabelece com a terra, a forma como se teve acesso á ela seja por
herança, seja por doação, ou mesmo por apropriação, essa coletividade que se dá em
virtude do parentesco e das afinidades, os aproximam muito da perspectiva camponesa.
Neste sentido, Paulino (2006) também coloca que, por vezes, é a troca de
experiências na comunidade que garante a sua difusão, viabilizando a produção
camponesa e que o saber camponês conserva­se justamente porque o processo produtivo
se faz no interior da família, passando de geração a geração. Do mesmo modo, ocorre com
a autonomia, relacionada à forma de produção, e a manifestação de hábitos e costumes
pertinentes a cultura negra que dão configuração ao seu território e que perpassam os
paradigmas do capitalismo e de seus instrumentos tecnológicos dos quais a comunidade
Rincão do Santo Inácio, não possuí acesso. Baseado nestes aspectos é que chamamos
mais uma vez Gusmão (1990 p.117) que sustenta que
Aline Beatriz Stock Eich; Lauro César Figueiredo
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[...] em conseqüência da relação com a terra, tais famílias passaram a
vivenciar problemas próprios da economia de pequenos produtores (da
subsistência), problemas de parentesco e de propriedade. Com isso a
dupla estrutura que organiza a vida e existência de grupos rurais negros
contemporâneos é de mesmo sentido daquela que afeta todo e
qualquer grupo camponês... Um espaço social marcado pela terra e
pelo parentesco.
Assim, nesse processo de compreensão dos espaços e dos sujeitos, deste novo
mundo rural, as valorizações culturais e econômicas da cidade e das indústrias acabam
desqualificando saberes e outras racionalidades específicas deste grupo étnico em
particular (do negro camponês), conforme afirmou Gusmão anteriormente, surgem
problemas próprios. Principalmente no que se refere ao trabalho coletivo da terra, onde nas
últimas décadas, o homem que era responsável pela produção e cultivo, teve que sair da
“roça” em busca de emprego fora da comunidade e em muitos casos, até em outras
cidades, contribuindo para a permanência de outros moradores, pais, esposas, filhos e
irmãos na comunidade e colaborando para a permanência, ali, de uma campesinidade,
através da alteração do ethos do trabalho. Também nesta perspectiva, Tedesco (1999)
coloca que o espaço da casa, das visitas a parentes, entre outros, são atribuídos à mulher,
que reforça a visão de poder na esfera do lar. Porém nesta alteração de ethos, em
decorrência da saída do homem da roça, é a mulher que assume o papel de trabalhar a
terra e, portanto domina mesmo que por períodos, o território masculino. Assim, no modo
de vida camponês a representação social da dominação masculina é reforçada na medida
em que o grupo doméstico tem um papel fundamental na constituição e manutenção
econômica e moral, da unidade familiar. Estas e outras colocações a respeito da
organização de vida rural, dos camponeses, visam demonstrar a importância de alguns
fatores indispensáveis em suas vidas, tais como a terra, a família e o capital, que já foi
explanado por autores como Tedesco e aqui nesta síntese, procura aproximá­las do modo
de vida dos negros e/ou camponeses das comunidades rurais, buscando mostrar que
estes sujeitos há muitos séculos trabalham a terra e relaciona­se com ela na mesma
perspectiva do camponês tradicional e, portanto devem ser vistos como tais.
Também, a respeito das relações internas da agricultura camponesa, Chayanov
(1974) considera que as mesmas não reproduzem a lógica capitalista, e sim, visam
atender, primeiramente, às necessidades e expectativas da família. Guzmán e Molina
(2005) ressaltam que, ainda, vinculados ao mercado, mesmo que, a maior parte de sua
produção vai para o autoconsumo, seu traço central, é sem dúvida, constituído pela forma
de dependência que possui com a sociedade maior em termos de exploração.
Nesta mesma linha, o processo de trabalho aponta alguns significados para a
compreensão da trajetória do sujeito camponês nas sociedades capitalistas, cuja lógica
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Comunidade negra rural­ Rincão do Santo Inácio­RS sob a ótica do campesinato: uma alternativa de desenvolvimento
não foi capaz de extingui­los enquanto categoria histórica. Pois, a expansão deste modo de
produção é contraditória, marcada por relações sociais de produção capitalistas e também
não capitalistas que se reproduzem no seu interior. (FERNANDES, 2008), (MARQUES,
2008).
Assim, o campo sociocultural e a nova ordem neoliberal dos mercados podem abrir
espaço para uma revalorização do saber e do fazer camponês e até a uma ampliação do
setor camponês no contexto da sociedade, porém a perspectiva histórica indica que esta
revalorização só será viável se a apropriação deste conhecimento implicar em ganhos nas
esferas da acumulação capitalista, dentro desta análise, observa­se que a dominação
cultural e suas críticas conformam um campo de realidade polimorfa onde se valorizam
determinados saberes, desvalorizando outros. São construções sociais e humanas, que
foram e ainda são, historicamente determinadas. (MOREIRA, 2007).
Portanto, as comunidades negras rurais, da forma como as percebemos são espaços
de transformações constantes, de tensões com a cultura e a natureza, do distante e do
próximo, do familiar e do desconhecido, formando no seu conjunto, uma lógica da vida
cotidiana baseada em critérios e representações sociais, estabelecendo eixos culturais que
tentam, hoje, perpassar ou ser resgatados, com novas interpretações ou com
racionalidades adaptativas ao período em que vivemos. (TEDESCO, 1999).
O paradigma da agroecologia como alternativa de desenvolvimento
sustentável nas comunidades negras rurais e/ou camponesas.
Antes de iniciarmos o debate que segue, sobre o paradigma da agroecologia, nas
comunidades negras rurais, faz­se extremamente necessário, salientar que o objetivo
desta síntese, é demonstrar que, o desenvolvimento agroecológico e sustentável podem
ser aplicados e trabalhados com mais facilidade e melhor aceitação dentro das
comunidades rurais tradicionais. Uma vez que, segundo Sevilla (2001) é a fusão entre a
“empiria camponesa” e a “teoria agroecológica” que estabelece um desenvolvimento
alternativo, um desenvolvimento rural e sustentável. É neste sentido, através dos seus
saberes e práticas camponesas, que estes pequenos agricultores estabeleceram uma
relação com a terra que vai além da mesma como capital, a terra, neste universo
camponês, representa muito mais, que uma mercadoria, ela é símbolo de autonomia, de
domínio sobre a estrutura familiar. E, é a partir desta relação de afetividade que se
estabelece entre o camponês e a terra, no qual, o objetivo principal é a manutenção e a
perpetuação desta terra para os seus sucessores, que se torna viável aproximar e trazer
como sugestão para este debate o desenvolvimento das práticas agroecológicas nas
Aline Beatriz Stock Eich; Lauro César Figueiredo
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comunidades negras rurais. É válido porque ambos, buscam o mesmo interesse, baseado
num resgate de técnicas e saberes tradicionais, que colocados em prática, proporcionarão,
a sustentabilidade tanto do agroecossistema (local) quanto da cultura étnica dessas
comunidades negras e demais comunidades rurais tradicionais. Salientamos que, mesmo
que não existam ainda, no Brasil, comunidades rurais totalmente agroecológicas, existem
sim, comunidades negras desenvolvendo projetos em fase inicial, que visam à substituição
do modelo agrícola tradicional pelo agroecológico, como é o caso da Comunidade Negra
de Jatobá, localizada em Patu, no Rio Grande do Norte, onde a produção de hortaliças e
um banco de sementes crioulas e nativas estão dando início às práticas agroecológicas,
também como exemplos temos a comunidade quilombola “Terra dos Kalungas”, localizada
na Chapada dos Veadeiros, que da mesma forma tentam dar os primeiros passos em
busca de um desenvolvimento agroecológico.
Assim, o conceito de agroecologia vem buscando nas últimas décadas sistematizar
esforços e produzir uma proposta de agricultura abrangente, que seja socialmente justa,
economicamente viável e ecologicamente sustentável; um modelo que seja o (re) começo
de um novo jeito de relacionar do homem com a natureza, com os meios e modos de
produção. Nesta visão estabelece­se uma ética ecológica que implica no abandono de uma
moral consumista e individualista e que postula a aceitação e a reprodução da justiça e da
solidariedade como valores indispensáveis. (ROSA, 2004). Assim, as comunidades negras
rurais são parte integrante de um amplo mosaico étnico­social, ecológico e cultural do
cenário agrário brasileiro. Em sua maioria, estas comunidades negras apresentam
invariavelmente um quadro de agravante pobreza rural, sendo necessário a análise e o
estudo de possibilidades que busquem a inserção econômica desses pequenos
camponeses, a partir da elaboração de projetos que permitam a agregação de valor aos
produtos agrícolas e não­ agrícolas (GRAZIANO, 1999), e a partir de suas dinâmicas e
fatores de desenvolvimento
Nesta perspectiva, é a fusão entre a empiria camponesa e a teoria agroecológica que
estabelece um desenvolvimento alternativo e um desenvolvimento rural sustentável
(GUZMÁN, 2001), considerando que a agroecologia se assenta nas particulares condições
locais e na singularidade de suas práticas culturais, contribuindo para o delineamento de
um novo paradigma, que atenda as necessidades de uma crise ampla da sociedade
moderna e que abra espaço para uma nova visão sobre a questão ecológica (CANUTO,
2003).
São essas características socioculturais que reproduzidas no espaço (re) criam as
formas endógenas advindas do conhecimento e que perpassam as gerações, sendo que
está inserido neste contexto o negro e/ou camponês, portador de especificidades culturais
que nas últimas décadas vem mudando a paisagem rural brasileira e regional,
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Comunidade negra rural­ Rincão do Santo Inácio­RS sob a ótica do campesinato: uma alternativa de desenvolvimento
conformando realidades singulares do seu modo de ser, produzir e reproduzir­se no
espaço.
Assim, na “agroecologia a agricultura é vista como um sistema vivo e complexo,
inserida na natureza rica em diversidade, por isso a agricultura familiar com enfoque
agroecológico é sem dúvida uma das formas de expressão do atual ecologismo popular”,
visto sua diversificação de culturas e cuidados com preservação do solo em unidades de
produção familiar. (CANUTO, 2003, p.131).
Nesta perspectiva a agroecologia “é como um paradigma que se abre para a
democracia participativa como forma de superar a assimetria social entre incluídos e
excluídos” (Canuto, 2003, p.128), é nesse aspecto, que a agroecologia também surge
como uma alternativa para os camponeses e/ou negros obterem mais renda de suas
terras, uma vez que dependem menos do capital externo ao da sua unidade de produção
familiar.
Devemos considerar que as comunidades devem explorar características e
potencialidades próprias, na busca de diversificação de atividades que lhes tragam
vantagens, tanto no âmbito natural, quanto econômico, social, político, e
conseqüentemente respeitando a preservação dos recursos.
Neste sentido, Guzmán (2005), atenta para a necessidade de se valorizar as culturas
tradicionais, neste caso específico (dos negros) que resgatam a trajetória histórica das
famílias, devido ao amplo debate que se formou em função da utilização de técnicas
modernas de produção, concomitante ao aumento do número de comunidades tradicionais
que tem afirmado suas territorialidades. Pois, mesmo que a distância geográfica entre a
rede urbana e as comunidades rurais seja pequena, as comunidades negras rurais e as
demais comunidades tradicionais mantém sua identidade e sua cultura local, ou seja, a
proximidade entre ambas não interferiu em suas características culturais que se
transformam com as dinâmicas e reorganizações do espaço, mas permanecem num
conjunto de valores que se reproduzem socialmente. Atrela­se a isto, o fato da maioria das
comunidades negras, manterem uma relação sustentável no manejo dos recursos naturais,
aproximando, portanto, o campesinato da proposta Agroecológica.
Entretanto, Gusmão (1996. p. 13), afirma que,
...para além da condição de pequeno produtor de subsistência e força
de trabalho disponível para o capital, deve­se descobrir a existência de
mecanismos próprios de uma condição histórica que permitiu, não só
a existência de grupos rurais negros, mas também sua resistência no
tempo. Outra função atribuída à agricultura camponesa é o aspecto
sócio­cultural, que equivale ao resgate de um modo de vida que associa
conceitos de cultura, tradição e identidade.
Aline Beatriz Stock Eich; Lauro César Figueiredo
107
Também faz parte desse contexto a valorização do desenvolvimento local, baseado
em processos endógenos, com o aproveitamento racional dos recursos disponíveis em
unidades territoriais delimitadas pela identidade sócio­cultural (ALTAFIN, 2003).
Assim, os saberes agroecológico são uma constelação de conhecimentos, técnicos,
saberes e práticas dispersas que respondem as condições ecológicas, econômicas,
técnicas e culturais de cada geografia e de cada população, entendendo que cada
comunidade tem um perfil específico e deve ser valorizada como verdadeira guardiã na
construção de modelos de desenvolvimento alternativos. Compreendendo que a
diversidade não é apenas biológica, mas também étnico­cultural e religiosa sendo, decisiva
para a manutenção da vida. (CANUTO, 2003)
Deste modo, conforme afirma Leff, (2001, p. 43)
...na reapropriação de saberes tradicionais e sua hibridação com
conhecimentos científicos e modernos, o elemento aglutinante não é o
desejo de lucro, senão a reprodução ecológico­cultural do
agroecossistema e do território.
Neste contexto, em suas aplicações pontuais, a agroecologia contribui para
desmontar os modelos agroquímicos tradicionais, mas sua ação transformadora implica a
inserção de suas técnicas e suas práticas em uma nova teoria da produção (LEFF, 1994),
configurando­se através
...de um novo campo de saberes “práticos para uma agricultura mais
sustentável, orientada ao bem comum e ao equilíbrio ecológico do
planeta, e como uma ferramenta para a auto­subsistência e a
segurança alimentar das comunidades rurais” (LEFF. 2001 p. 37)
Dessa maneira considerando o camponês, detentor do seu espaço de produção, ou
ainda, possuidor de uma territorialidade particular, podemos dizer que ele também se
constitui como classe dentro do processo de acumulação capitalista. Assim, sua crescente
desterritorialização é resultado das desigualdades entre os atores hegemônicos desse
capitalismo.
Assim, enquanto a sociedade avança rumo ao consumismo e ao individualismo no
anseio de satisfazer as necessidades materiais, o campesinato aparece como uma forma
do camponês/negro, enquanto sujeito, se relacionar com a natureza, ao considerar­se
agente transformador, dentro de um processo, que visa à união do conhecimento
tradicional e conhecimento científico.
Conforme exposto anteriormente, o acúmulo de conhecimentos tanto tradicionais
quanto científicos é significativo, neste novo paradigma, caracterizando
108
Comunidade negra rural­ Rincão do Santo Inácio­RS sob a ótica do campesinato: uma alternativa de desenvolvimento
[...] o conhecimento cotidiano como produto tanto da acumulação
pessoal, como do acúmulo das sucessivas gerações, e sua circulação
depende diretamente da memória e da sabedoria [...] essa forma de
produção e de circulação de conhecimentos como epistemologia
natural, o que significa que esses conhecimentos ou saberes cotidianos
são dotados de valor epistêmico e de grande importância para a própria
produção de conhecimento científico (Gomes, 2005, p.90).
Quando abordamos o tema comunidade negra rural e/ou camponesa e/ou agricultura
familiar, é intrínseco que o conhecimento tradicional depende da reprodução por meio do
surgimento de novos sujeitos e do aprendizado sobre o modo de reprodução que os
caracterizam, definindo assim um contexto histórico especifico dos grupos étnicos.
É a partir do resgate desses elementos que se permite fundamentar a proposta de um
pluralismo metodológico na produção de um conhecimento agrário, tomando como base
epistemológica a agroecologia. Esta síntese aborda uma variedade de contextos para a
produção e a circulação do conhecimento agrário, bem como busca revalorizar o aspecto
social e suas demandas pertinentes as comunidades negras rurais e demais comunidades
rurais tradicionais. Neste sentido, os agroecossistemas desenvolvidos a muitas gerações
pelos camponeses permitem satisfazer as necessidades locais baseando­se nos princípios
da sustentabilidade, muitas vezes nem sabem que o estão fazendo, são atitudes e
atividades rurais cotidianas, porém desenvolvidas com muito cuidado, no sentido de
preservar para suas gerações futuras, estas unidades familiares, que são reproduzidas aos
seus sucessores.
Contudo, conforme (Caporal & Hernandéz, 2004).
É considerado também que a matriz comunitária ao qual o agricultor
está inserido é de suma importância, já que por meio da matriz
sociocultural o agricultor é dotado de uma práxis intelectual e política
que define sua identidade local e sua rede de relações sociais; que
permitem elaborar propostas de ação social coletivas
Portanto, devem ser reconhecidas e legitimadas como exemplos de aplicação do
conhecimento ecológico de certa forma avançado, quando comparado a outras formas de
produção.
Assim, os moradores das comunidades rurais negras e os camponeses tradicionais,
que optem por uma produção agroecológica de alimentos diversificados devem procurar
inserir­se dentro de uma lógica comercial que pague preços justos para garantir a
reprodução do sistema bem como da unidade de produção. Neste contexto, os sujeitos
sociais, representados aqui pelos negros e/ou camponeses, buscam políticas públicas
fundamentadas na multifuncionalidade da agricultura, visando o fortalecimento das
Aline Beatriz Stock Eich; Lauro César Figueiredo
109
comunidades composta por unidades de produção familiares e sustentáveis no tempo.
Vista como solução, na agroecologia os camponeses são partes de um todo, podem
colocar seus conhecimentos à prova; não a prova científica, mas à prova do cotidiano, das
estações do ano, da colheita, da memória coletiva dos antepassados. Nela, os
camponeses detêm o conhecimento que o pesquisador/cientista quer valorizar e, se
possível, aprimorar a partir de estudos que evoquem a antiga produção do espaço cujas
bases estejam alicerçadas para um desenvolvimento do território mais humanizado.
(ROSA, 2004).
Neste contexto, depois de decorrida esta síntese, sabe­se que, o desenvolvimento de
um modelo agrícola baseado totalmente no paradigma da agroecologia, não é uma tarefa
muito fácil de realizar, porém deve ser trabalhado aos poucos, somando­se as técnicas e
saberes tradicionais, ás novas técnicas que o modelo agroecológico nos traz, incorporado
nas comunidades negras rurais e demais comunidades camponesas futuramente poderá
vir a ser uma prática cotidiana, já que muitas organizações não governamentais e
governamentais estão lançando políticas de apóio á este tipo de desenvolvimento.
Assim, a comunidade Rincão do Santo Inácio, nossa área de estudo, não faz parte
das comunidades que estão dando inicio á essa prática agrícola, tão pouco é sustentável,
porém, tentamos com essa abordagem inseri ­ lá nesta perspectiva, sugerindo como foi
mencionado ao longo do texto, que por se tratar de uma comunidade camponesa, dotada
de particularidades e considerando a relação afetiva que se estabelece com a terra, neste
território, o desenvolvimento agroecológico é viável e aplicável. E, assim como nos dois
exemplos mencionados, da comunidade do Jatobá e da Terra dos Kalungas, o Rincão do
Santo Inácio poderia dar inicio a projetos agroecológico simples, como o cultivo de
hortaliças agroecológicas e bancos de sementes crioulas, e talvez assim em longo prazo
venha tornar­se a primeira comunidade negra rural totalmente agroecológica.
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O passado cultural é importante para definir espaços