UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL PROGRAMA DE EDUCAÇÃO PARA A DIVERSIDADE ESPECIALIZAÇÃO EM GESTÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS COM FOCO EM GÊNERO E RAÇA JOANE GOMES PEREIRA “O PROGRAMA DE INCLUSÃO PRODUTIVA DO MUNICÍPIO DE MARIANA(MG) – SEUS LIMITES E SUAS POSSIBILIDADES” Orientador: Prof. Ms. Weder Ferreira da Silva Ouro Preto 2012 JOANE GOMES PEREIRA “O PROGRAMA DE INCLUSÃO PRODUTIVA DO MUNICÍPIO DE MARIANA (MG) – SEUS LIMITES E SUAS POSSIBILIDADES” Monografia apresentada ao Programa de PósGraduação em Educação para a Diversidade da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), como requisito parcial à obtenção do grau de Especialista em Gestão de Políticas Públicas. Área de Concentração: Gênero e Raça. Orientador: Prof. Ms. Weder Ferreira da Silva Ouro Preto 2012 2 AGRADECIMENTOS A meu orientador, Professor Weder Ferreira, que tornou possível a realização deste trabalho através de seu conhecimento, paciência e dedicação. A Prefeitura de Mariana, em especial à Secretaria de Desenvolvimento Social e Cidadania que através da Lei nº 2.300 possibilitou que mulheres, chefes de família, tivessem acesso a um trabalho digno, permitindo, dessa forma, a sua autonomia e emancipação. As mulheres beneficiadas pelo Programa, seus familiares e todos os profissionais que contribuíram para o enriquecimento desta pesquisa. Obrigado por me propiciar este crescimento humano e profissional. Aos amigos e familiares que sempre estiveram presentes, oferecendo-me conforto, carinho e atenção, o meu muito obrigado. 3 Incluir socialmente os mais pobres significa dar-lhes dignidade, propiciar recursos para uma alimentação adequada e para suas necessidades básicas, zelar pela proteção de seus direitos, assegurar uma política de assistência social, de segurança alimentar e nutricional, por meio de uma rede de proteção e promoção social, na perspectiva de consolidação do exercício pleno de democracia (CAMPOS, 2006). 4 RESUMO PEREIRA, Joane Gomes. O Programa de Inclusão Produtiva do Município de Mariana (MG) – seus limites e suas possibilidades. Ouro Preto: UFOP, 2012. Esta monografia teve por objetivo analisar os limites e as possibilidades do Programa de Inclusão Produtiva do Municipio de Mariana (MG) através de uma análise da inserção das mulheres no mundo do trabalho. Pretendeu-se compreender o papel da família, das políticas públicas e do Estado em relação a esta inclusão, e estudou-se, dessa forma, o acesso às políticas públicas de assistência social, saúde e educação e suas conseqüências para a inserção das mulheres ao mundo do trabalho. A escolha do tema desta monografia justificou-se pelo expressivo impacto social que os programas de geração de renda exercem na população beneficiada, representando ainda, muitos desafios a serem superados. No âmbito do Serviço Social, observa-se vasta bibliografia e intervenções profissionais na área, por isso, considerou-se relevante, do ponto de vista teórico e social, o estudo sobre a inclusão das mulheres no mundo do trabalho, – seja no mercado formal ou através de outras modalidades - as dificuldades para esta inclusão e sua manutenção. Como alternativa de geração de renda, fez-se uma análise da economia solidária, do mercado de trabalho formal e informal. Verificou-se que a falta de acesso às políticas públicas dificulta a inserção das mulheres ao mundo do trabalho, seja por falta de informação, seja pelo baixo índice de escolaridade, evidenciando, assim, anseio de realização e satisfação pessoal e profissional, bem como a necessidade de sobrevivência e desejo de garantir sua qualidade de vida. Palavras-Chave: Mulheres. Geração de renda. Mundo do trabalho. 5 LISTA DE ABREVIATURAS BPC - Benefício de Prestação Continuada CF - Constituição Federal CMAS - Conselho Municipal de Assistência Social CRAS – Centro de Referência da Assistência Social IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística INSS - Instituto Nacional da Seguridade Social IPEA - Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas LOAS - Lei Orgânica da Assistência Social MDS - Ministério do Desenvolvimento Social e Combate a Fome MTE - Ministério do Trabalho e Emprego PBF - Programa Bolsa Família PEA - População Economicamente Ativa PNAD - Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios PNAS - Política Nacional de Assistência Social PSPS - Plano Simplificado de Previdência Social SENAC - Serviço Nacional de Aprendizagem do Comércio SESI - Serviço de Aprendizagem Industrial SINE – Sistema Nacional de Emprego SIS - Síntese de Indicadores Sociais SMDSC - Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social e Cidadania SPM - Secretaria de Políticas para as Mulheres SUAS – Sistema Único da Assistência Social 6 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO................................................................................................ 08 2 GÊNERO...........................................................................................................13 3 ASPECTOS DO MERCADO DE TRABALHO FORMAL E O INFORMAL..........................................................................................................15 4 AS MULHERES E O MUNDO DO TRABALHO.........................................17 4.1 Economia Solidária: uma alternativa para inserção das mulheres no mundo do trabalho...................................................................................................................20 4.2 Plano Simplificado de Previdência SOCIAL (PSPS): alternativa de inclusão previdenciária para as mulheres inseridas no mundo do trabalho fora do mercado formal.....................................................................................................................23 5 POLÍTICAS PÚBLICAS COM ENFOQUE NA QUESTÃO DE GÊNERO..............................................................................................................25 6 POLÍTICAS PÚBLICAS DE GERAÇÃO E TRANSFERÊNCIA DE RENDA..................................................................................................................28 7 O PROGRAMA DE INCLUSÃO PRODUTIVA NO MUNICÍPIO DE MARIANA (MG).................................................................................................31 8 CONCLUSÃO...................................................................................................36 REFERÊNCIAS...................................................................................................40 7 1 INTRODUÇÃO Os programas de geração de renda, também conhecidos como Programas de Inclusão Produtiva, possuem o objetivo de oferecer apoio institucional às unidades familiares em situação de vulnerabilidade social, com vistas à capacitação para o trabalho, auxílio econômico para erradicação da pobreza, promoção da dignidade e do desenvolvimento humano sustentável. Através do incentivo à geração de trabalho e renda, promovendo ações de capacitação, instrumentalização para o trabalho e formação de grupos de produção, buscam a autonomia das famílias usuárias da Política Nacional de Assistência Social (PNAS): (...) a assistência social, direito do cidadão e dever do Estado, é Política de Seguridade Social não contributiva, que provê os mínimos sociais, realizada através de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, para garantir o atendimento às necessidades básicas (Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS) nº 8.742, de 07 de dezembro de 1993, art. 1º). Os programas de geração de renda possuem estreita articulação com o Programa Bolsa Família (PBF), o Benefício de Prestação Continuada (BPC) do Governo Federal e de Benefícios Eventuais. Seu principal objetivo é promover estratégias, ações e medidas de enfrentamento a pobreza, por meio da elaboração, captação, execução e monitoramento de projetos articulados com diferentes parceiros e políticas públicas. Ainda, orienta, mobiliza e articula a capacitação de membros das famílias para posterior ingresso no mercado de trabalho, bem como avalia e acompanha o desenvolvimento das habilidades das pessoas que são capacitadas. Também articula parcerias com organizações governamentais e não governamentais que atuam de alguma forma com geração de trabalho e renda e elabora, capta e executa projetos de qualificação e geração de renda (Disponível em: www.saoluis.ma.gov.br. Acesso em: abril/2012). 8 A Prefeitura de Mariana, através da Lei nº 2.300/2009, desenvolve ações para atender o público mais vulnerável inscrito em programas sociais da administração municipal. O segmento atendido são mulheres com baixa escolaridade e sem experiência no mercado de trabalho e que desempenham a função de chefes de família. De acordo com a referida Lei, as participantes recebem uma bolsa-auxílio correspondente a 50% do menor piso salarial do município, por um período de no máximo dois anos. As beneficiárias executam atividades laborativas na própria Prefeitura (serviços gerais, serviços administrativos, garis, monitoras de creches e escolas, cantineiras, etc.) por um período de 24 horas semanais. Além disso, participam de cursos de capacitação profissional ofertados pelo Município, com o objetivo de uma melhor colocação profissional e ampliação das oportunidades de inserção social e produtiva, intermediando ações de trabalho, geração de renda e qualificação. O Município de Mariana situa-se na região central do Estado de Minas Gerais, na vertente sul da Serra do Espinhaço, na zona Metalúrgica de Minas Gerais, conhecida como Quadrilátero Ferrífero, a 697 metros de altitude. Faz limite com os municípios de Ouro Preto, Barra Longa, Acaiaca, Diogo de Vasconcelos, Catas Altas, Piranga e Alvinópolis. É distrito-sede que dá nome ao município, com nove distritos históricos (Bandeirantes, Cachoeira do Brumado, Cláudio Manoel, Camargos, Furquim, Monsenhor Horta, Padre Viegas, Passagem de Mariana e Santa Rita Durão), totalizando uma área de 1.199.37 km2. Apresenta clima tropical de altitude, com temperaturas médias anuais entre 22º (no verão) e 13º (no inverno). As noites mais frias podem chegar a 2ºC e as chuvas ocorrem, sobretudo, de dezembro a março. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Mariana possui população de 52.688 mil habitantes, renda per capita de R$ 41.16 (Quarenta e um reais e dezesseis centavos), mas um índice de pobreza de 32,06% (IBGE, 2010). Diante do contexto socioeconômico do Município, percebe-se o despreparo da mão de obra e a falta de oportunidades no mercado de trabalho, o que leva a pobreza de parte da população. Consequências disso é a exclusão social e a violência urbana. E neste processo de exclusão social, como se sabe, as mulheres são as principais vítimas. Cabe destacar que, compreende-se exclusão como um fenômeno resultante do processo de urbanização acelerado das cidades, 9 do colapso do sistema escolar, das desigualdades de renda, das disparidades de acesso aos serviços e da degradação do mercado de trabalho (DIOGO & COUTINHO, 2006). Desta forma, fundamentando-se no Artigo 203 da Constituição Federal do Brasil (CF), na LOAS e na demanda pela assistência social municipal, a Prefeitura de Mariana cria em 2001 o “Programa de Garantia de Renda Mínima”, que oferece às mulheres, chefes de família em situação de vulnerabilidade, meios de subsistência e manutenção de suas famílias por meio da prestação de serviços à Prefeitura e a organizações não governamentais devidamente inscritas no Conselho Municipal de Assistência Social (CMAS). Desde sua implementação, o Programa beneficiou aproximadamente 1.000 famílias em situação de vulnerabilidade social, concedendo auxílio financeiro para suprir suas necessidades básicas de alimentação, vestuário, higiene pessoal e saúde, com o objetivo de fortalecer o protagonismo e a autonomia familiar. O Programa promoveu reinserção no mercado de trabalho para diversos provedores em potencial da família e oportunidade de reintegração ao processo educacional como um meio de promoção e desenvolvimento humano. Embora o Programa tenha significado um marco importante na política social do município, nesses onze anos houve diversas transformações sociais, políticas e econômicas, tanto no âmbito municipal, quanto estadual e nacional que, direta e indiretamente, implicam na forma com que se devem constituir as políticas públicas. Neste sentido, em 2009, o Programa passa por uma reformulação e pensase que o foco deve ser a qualificação para o mercado, mesmo que em detrimento da prestação de serviços a órgãos públicos, uma vez que o Programa estará contribuindo de forma mais efetiva e sustentável para a melhoria da qualidade de vida de centenas de famílias. Assim, ao analisar o Programa de Inclusão Produtiva de Mariana, pretende-se verificar em que medida as iniciativas do município têm contribuído para autonomia e emancipação das mulheres beneficiadas. Destaca-se que, a iniciativa, apesar de pioneira na região, apresenta lacunas quanto aos cursos de capacitação e as condicionalidades do Programa. Importante destacar que, os cursos oferecidos no momento, não condizem 10 com a realidade do município (cabeleireiro, costureira, manicure, artesanato e culinária). As mulheres, ao concluírem os cursos, na maioria das vezes, não conseguem se inserir no mercado de trabalho, por ser tratarem de profissões já defasadas na região. Agrega-se a isso, a baixa escolaridade e a falta de qualificação profissional. Partindo desta leitura da realidade, caberia ao Programa desenvolver a formação continuada nas esferas política, técnica, produtiva e de gestão. Pensando-se em cursos que trarão retorno financeiro tanto para as beneficiadas como para o próprio município. Torna-se imprescindível que a Prefeitura firme convênios com empresas conceituadas no mercado, quais sejam, o Serviço de Aprendizagem Industrial (SESI) e o Serviço Nacional de Aprendizagem do Comércio (SENAC), cursos esses com certificação e reconhecimento. Portanto, pretende-se analisar em que medida os projetos de geração de renda, enquanto política pública pode incidir sobre a estrutura das relações de poder entre os sexos e sobre a organização do trabalho na perspectiva de gênero. A expectativa é contribuir no sentido de ampliar o debate da real incorporação de gênero no conteúdo das políticas públicas, mais especificamente àquelas que se referem à geração de renda, já que, o processo de formulação e execução das políticas públicas, acontece principalmente na esfera municipal, onde se operacionalizam tais projetos. Diante do exposto, destaca-se que o Programa de Inclusão Produtiva tem como principal objetivo, oferecer apoio institucional às unidades familiares em situação de vulnerabilidade social com vistas à capacitação para o trabalho, auxílio econômico para erradicação da extrema pobreza, promoção da dignidade, com vistas ao desenvolvimento sustentável e emancipação humana. Importante ressaltar que o Programa tem a função de criar possibilidades de trabalho e renda para as mulheres em situação de risco social, além de propiciar espaços de convivência e debates que visem à formação crítica dessas mulheres. Destacando-se o incentivo ao empreendedorismo, por meio de ações cooperativistas e/ou associativistas como uma das formas de garantir a emancipação das beneficiárias, contribuindo assim, para a prevenção e o enfrentamento de situações de vulnerabilidade social, além de ser um instrumento 11 que beneficiará as mulheres em uma possível inserção no mercado formal ou de geração de renda alternativa. Com o intuito de aprofundar e ampliar os conhecimentos obtidos optou-se, nesta monografia, pela abordagem do tema gênero e o mercado de trabalho. Como alternativa de geração de renda, fez-se uma análise da economia solidária e do mercado de trabalho formal e informal, e as possibilidades da inclusão previdenciária das mulheres trabalhadoras fora do mercado de trabalho formal. Consequentemente buscou-se analisar as políticas públicas com enfoque na questão de gênero, as políticas de geração e transferência de renda e o impacto dessas políticas no âmbito municipal. 12 2 GÊNERO O tema gênero se refere às construções e às expectativas sociais sustentadas em relação aos homens e às mulheres. Em outras palavras, gênero diz respeito ao modo como nossa sociedade constrói representações sobre ser homem e ser mulher e pressupõe que sejam naturalmente estabelecidas. O termo foi criado para distinguir a dimensão biológica da dimensão social, baseando-se no raciocínio de que há machos e fêmeas na espécie humana, mas que a maneira de ser homem e de ser mulher é instituída pela cultura. Assim, o conceito de gênero contribui para pensarmos as relações sociais estabelecidas entre homens e mulheres e aponta para o conjunto de fatores socioculturais atribuídos aos corpos, estabelecendo a ideia de masculino e feminino (Disponível em: http://www.amde.ufop.br. Pág. 14. Acesso em: abril/2012). O conceito de gênero contribui para a análise da sociedade, ao questionar os padrões sociais estabelecidos para homens e mulheres. Ao provar que as diferenças de padrões foram construídas historicamente, os estudos de gênero evidenciam a possibilidade de reverter injustiças e construir um horizonte equânime na relação entre homens e mulheres (HEILBORN, 1999; 2004). Dessa forma, cabe dizer que gênero não está dissociado da posição de classe social. O campo de estudos de gênero consolidou-se no Brasil no final dos anos 1970, concomitantemente ao fortalecimento do movimento feminista no país (FARAH, 2003). A história desses movimentos é também a da constituição das mulheres como sujeito coletivo, em que estas deixam a esfera privada e passam a atuar no espaço público, tornando públicos temas até então confinados à esfera privada. Na esfera pública, o movimento feminista possibilitou questionar a divisão sexual do trabalho, caracterizada pela desigual repartição de tarefas, salários e poder entre homens e mulheres, presente nas diversas sociedades. Ao questionar as posições inferiores e menos valorizadas que as mulheres ocupavam, o movimento expôs as desigualdades de gênero em diversas esferas, tais como nas áreas do trabalho, da educação, saúde, na organização da vida política, no ordenamento jurídico da sociedade e na produção de conhecimentos científicos. A 13 participação das mulheres nessas esferas demonstra que uma persistente hierarquia de gênero organiza as relações sociais no espaço público, destinando lugares, postos, posições de prestígio, funções específicas, direitos e deveres a cada sexo (Disponível em: www.amde.ufop.br. Pág. 23. Acesso em: abril/2012). A atuação do movimento feminista foi e é uma importante força social para despertar a consciência das mulheres para os seus problemas e para questões que as cercam e as afetam direta e indiretamente. Assim, apesar das evidências da destacada atuação do movimento feminista no processo de emancipação da mulher pelo trabalho fora do lar, pela educação e pela participação em esferas públicas, ainda persiste inúmeros preconceitos, de homens e mulheres, em relação ao feminismo. 14 3 ASPECTOS DO MERCADO DE TRABALHO FORMAL E O INFORMAL O emprego é considerado fator de ajustamento psicossocial e a empregabilidade é vista como importante indicação de competência social. O fato de estar empregado implica construção de identidade e senso de ser útil, de ter um valor. Estar empregado em tempo integral é um propiciador de bem-estar e o desemprego contribui para problemas emocionais e comportamentais. Estes dados apontam para a importância da inserção no mercado de trabalho como fator de integração social, econômica e de realização pessoal (SALGADO & SOUZA, 2002). No Brasil, como em todo o mundo, o modelo tradicional do trabalho vem modificando-se radicalmente. A forma mais pura da palavra “emprego”, a cada dia, vem perdendo suas características, sendo que o trabalho de carteira assinada está sendo substituído pelo trabalho informal, principalmente por pessoas que possuem limitações, como a baixa escolaridade, problemas de saúde, etc. O chamado trabalho “informal”, que hoje absorve metade ou mais da População Economicamente Ativa (PEA) na maior parte dos países latino-americanos, incluindo o Brasil, é um universo novo, complexo e quase desconhecido, no qual o trabalho em geral e as ocupações em particular assumem formas que a análise sociológica convencional nem sempre consegue reconhecer (LEITE, 2003). Dados do IBGE de 2010 mostram que grande parte do aumento de trabalhadores formais na década passada deve-se ao fato de que as vagas criadas foram majoritariamente formais, e não a uma maior regularização de postos tidos como informais. Ainda, que o número de postos formais passou de 28,5 milhões em 2001 para 41 milhões em 2009, aumento de 43,5%, sendo que a maior parte se deu por conta do crescimento do número de empregados com carteira de trabalho assinada, que subiu 46%. O número de trabalhadores domésticos formalizados subiu 30%. A pesquisa também aponta que mesmo com a crise financeira de 2009, o processo de formalização não foi interrompido: conforme o estudo, em termos proporcionais, o avanço dos postos de trabalhos formais passou de 37,9% do total, em 2001, para 44,2% em 2009 (IBGE, 2010). 15 Importante destacar que o número de postos de trabalho não formalizados aumentou entre 2001 e 2009, mas a um ritmo consideravelmente menor. As ocupações informais passaram de 43,7 milhões em 2001 para 47,7 milhões em 2009, um aumento de 9,2%. Mesmo com o maior avanço dos postos formais, as ocupações informais ainda são em maior número. Das posições na ocupação não formalizadas, o maior aumento ocorreu entre os trabalhadores domésticos sem carteira (20%), seguidos dos trabalhadores por conta própria (12,1%) e dos empregados sem carteira (10,3%). A queda dos postos informais se deu a partir de 2006. Já o peso das ocupações informais, por sua vez, caiu de 57,9% para 51,5%. A queda absoluta da informalização aconteceu por conta do menor número de pessoas que se declararam ocupadas sem remuneração (IBGE, 2010). Em que pesem as mudanças, o trabalho continua tendo um valor ou uma referência importante na sociedade atual. Não se trata aqui de uma questão ética, de “satisfação pelo dever cumprido”, mas de motivações bem práticas: a) o trabalho é essencial à sobrevivência e ao consumo, visto que a maioria dos países está longe de possuir sistemas de proteção social comparáveis aos europeus - aqui, “quem não trabalha, não come”; b) é também espaço de socialização, de aprendizagem e construção da identidade pessoal e grupal, em suma, uma referência básica de inclusão social (LEITE, 2003). Os trabalhadores do setor formal, protegidos pela lei, conseguem vantagens trabalhistas não acessíveis aos trabalhadores do desregulamentado setor informal, o que resulta na ampliação do diferencial de salários entre os dois grupos. Estar no trabalho informal significa, principalmente, uma forma de discriminação, mas, também, uma opção racional (CAVALHO, 2003). Segundo Ramos (2007), os dados do IBGE mostram que a ocupação por grau de escolaridade indica um maior grau de exigência e seletividade no mercado de trabalho brasileiro. Em contrapartida, os trabalhadores menos escolarizados vêm perdendo espaço no contingente total de ocupados, ano após ano. Assim, observa-se que mais gente procura trabalho em um mercado cada vez mais apertado. As empresas tornam-se mais seletivas. Fica mais difícil adquirir e comprovar experiência. Tudo é ainda mais difícil para quem não tem escolaridade básica, que está praticamente universalizada como exigência de contratação no mercado. 16 4 AS MULHERES E O MUNDO DO TRABALHO Muitos motivos têm levado as mulheres para o mercado de trabalho: a emancipação feminina e a opção por um projeto profissional, o desemprego ou a perda de renda do cônjuge e o crescimento do número de mulheres chefes de famílias. Este ingresso da mulher no mercado de trabalho, no entanto, não tem sido fácil, devido à conjuntura político-econômica dos últimos anos, que tem criado muitas barreiras para todas as pessoas que procuram ocupação. Outras adversidades, porém, agravam ainda mais a situação da participação feminina no mercado de trabalho (SANCHES & GEBRIM, 2003). Traduzidas em diversas formas de discriminação, revelam-se por meio de baixos salários, ocupação de postos precários, discriminação e desemprego. Ao longo da história, as mulheres têm sido as principais responsáveis pelo trabalho doméstico e familiar, sendo os homens considerados os provedores econômicos da família. A inserção das mulheres no mercado de trabalho brasileiro, em meados dos anos de 1970, ocorreu em condições desiguais de tratamento, de tempo, de mobilidade, de espaço e de remuneração em relação aos homens, principalmente devido às mulheres serem as executoras das atividades vinculadas às esferas dos cuidados da família e da casa (SILVA, 2009). A intensificação da presença feminina no mercado de trabalho tem ocorrido em uma conjuntura político-econômica extremamente adversa, que se traduz para todas as pessoas que procuram ocupação, na escassez e má qualidade dos postos de trabalho. A segregação no mercado de trabalho capitalista destinou às mulheres empregos mais precarizados, geralmente informais ou em tempo parcial, os salários mais baixos, menor cobertura dos serviços de seguridade social e dificuldades de acesso aos direitos trabalhistas. Aliado a esses fatores, o trabalho profissional das mulheres é sempre visto como complementar às suas “responsabilidades” domésticas, ratificando-se assim, a concretização do patriarcalismo (PESSOA; PEIXOTO; RAMOS, 2008). Em 2010, a Síntese de Indicadores Sociais (SIS), realizou uma análise das condições de vida no país, tendo como principal fonte de informações a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2009, que abordou entre outros 17 temas, a situação das mulheres no Brasil. A SIS apontou que, mesmo mais escolarizadas que os homens, o rendimento médio delas continua inferior ao deles (as mulheres ocupadas ganham em média 70,7% do que recebem os homens), situação que se agrava quando ambos têm 12 anos ou mais de estudo (nesse caso, o rendimento delas é 58% do deles). As mulheres trabalham em média menos horas semanais (36,5) que os homens (43,9), mas, em compensação, mesmo ocupadas fora de casa, ainda são as principais responsáveis pelos afazeres domésticos, dedicando em média 22 horas por semana a essas atividades contra 9,5 horas dos homens ocupados (IBGE, 2010). Em relação ao trabalho, a pesquisa mostrou que o emprego informal prevalece entre mulheres jovens e idosas. O percentual de mulheres no mercado de trabalho formal (que têm carteira assinada, incluindo domésticas, militares e funcionárias públicas estatutárias, são empregadoras ou trabalhadoras por conta própria que contribuíam para a previdência social) subiu de 41,5%, em 1999, para 48,8% no ano passado. Entre os homens, houve um incremento de 45,9% para 53,2%. No mesmo período, a participação feminina na categoria empregado com carteira assinada passou de 24,2% para 30,3%. A participação das trabalhadoras não remuneradas, que trabalham na produção para o próprio consumo ou que exercem atividades na construção para o próprio uso, por sua vez, caiu de 18,7% para 11,6% (IBGE, 2010). Entre as jovens de 16 a 24 anos, 69,2% das ocupadas estavam em trabalhos informais. A taxa era mais elevada entre as mulheres de 60 anos ou mais: 82,2%. As diferenças eram ainda mais expressivas na comparação regional: no Sudeste, 57,2% das mulheres jovens estavam inseridas em trabalhos informais no Nordeste chegava a 90,5%. No que tange à cor ou raça, a inserção das mulheres também se dava de forma diferenciada. Entre as de cor branca, cerca de 44,0% estavam na informalidade; percentual que era de 54,1% entre as pretas e de 60,0% entre as pardas. A maior diferença na taxa de formalidade entre as mulheres, segundo sua cor ou raça, ocorreu na região Norte, onde 55,9% das brancas estavam no mercado informal contra 67,1% das pretas e 68,3% das pardas. A menor diferença era a do Sul, cujos percentuais eram de 44,2% para brancas, 43,4% para pretas e 50,5% para pardas (IBGE, 2010). 18 Segundo Sanches & Gebrim (2003), a situação das mulheres no mercado de trabalho é revelada por meio de três indicadores: a) Dificuldades de inserção – o desemprego se tornou um dos maiores problemas sociais na década de 1990 e é óbvia a ligação entre a capacidade de gerar novos postos de trabalho e o nível de atividade econômica. As dificuldades para obtenção de emprego, porém, são maiores para as mulheres do que para os homens, tanto que suas taxas de desemprego são sistematicamente superiores às masculinas. Além de suas taxas de desemprego serem mais elevadas, as mulheres costumam ficar longos períodos sem conseguir uma colocação. b) A vulnerabilidade na inserção feminina – as dificuldades que as mulheres enfrentam para se inserir no mercado de trabalho refletem-se na qualidade dos empregos por elas obtidos. O trabalho feminino encontra-se, em maior proporção, em postos de trabalho vulneráveis, representados pelo assalariamento sem carteira assinada, trabalho doméstico, autônomos que trabalham para o público e trabalhadores familiares. c) A desigualdade na remuneração entre os sexos – os rendimentos da mulher no mercado de trabalho são sempre inferiores aos dos homens, mesmo quando exercem a mesma função e têm a mesma forma de inserção. Nem mesmo a maior escolaridade média feminina elimina essa diferenciação, indicando clara discriminação em relação ao seu trabalho. Isso significa que, apesar de o nível de instrução ser um fator fundamental de diferenciação salarial, a escolaridade da mulher não garante um salário melhor (2003). Percebe-se a relevância desses dados na realidade brasileira, mais especificamente, devido ao crescimento, nos últimos anos, do número de lares brasileiros em que o trabalho feminino passa a representar a principal fonte de sustento econômico da família. Vale ressaltar que esse fenômeno é bastante amplo e atinge, basicamente, as camadas menos favorecidas em nosso país (FLECK & WAGNER, 2003) 19 Dessa forma, parte significativa das mulheres que ingressam no mercado de trabalho vão para o setor informal, onde estas não têm acesso a garantias trabalhistas e a previdência social (FARAH, 2003). O desemprego, a menor remuneração e acesso ao mercado, sobretudo das mulheres negras e pobres, são indicativos da desigualdade de gênero e raça que se acentuam cada vez mais nas periferias das grandes cidades, resultado da divisão sexual do trabalho que estrutura as relações de desigualdade de gênero na sociedade (PESSOA; PEIXOTO; RAMOS, 2008). A crescente inserção das mulheres no mercado de trabalho foi um dos fatores que trouxeram novos debates com relação ao trabalho feminino (CARLOTO & GOMES, 2011). O fato de terem salários menores que os dos homens, ou até mesmo dupla jornada, são elementos que aparecem para discussão do lugar assumido pela mulher no mundo do trabalho e que estão relacionados às possibilidades que elas têm de enfrentar riscos sociais e situações de vulnerabilidades provocadas pela situação de pobreza. 4.1 Economia Solidária: uma alternativa para inserção das mulheres no mundo do trabalho Diante da atual realidade brasileira, a economia solidária a cada dia se torna um grande apoio para aqueles que, de alguma forma, não conseguem acessar o mundo do trabalho formal. Esta modalidade de organização surgiu na Inglaterra, na metade do século XIX, devido à necessidade das pessoas de se organizarem em torno do trabalho. É uma forma específica de organização das atividades econômicas que se caracteriza pela autogestão, ou seja, pela autonomia de cada indivíduo ou empreendimento e pela igualdade entre os seus membros, baseada nos conceitos de cooperação, dimensão econômica e solidariedade. Nela podem participar homens e mulheres, de qualquer idade, raça ou orientação sexual, sem qualquer tipo de exclusão (AMORIM & ARAÚJO, 2004). Definir o conceito de economia solidária torna-se uma tarefa difícil quando se percebe a diversidade de organizações e de perspectivas que vêm sendo realizadas. Arilson Favareto (2000) compreende que: 20 (...) trata-se de um tipo de movimento social ou, em outros termos, de uma idéia força,capaz de mobilizar diferentes sujeitos. Economia solidária, sócio economia solidária, economia social, economia popular: estes termos não são exatamente sinônimos, cada qual apresenta nuanças e acentos diferenciados em relação aos demais, mas todos têm em comum o fato de estarem se referindo às formas de organizar a produção, a distribuição, a comercialização e o crédito por princípios solidários. (FAVARETO, 2000, p.21). A organização da economia solidária acontece da seguinte forma: a) não existe patrão e empregado; b) as responsabilidades são divididas entre os participantes; c) os recursos materiais são usados de forma consciente e responsável e; d) funciona como sistema de autogestão. Destaca-se que, a economia solidária possui uma finalidade multidimensional, que envolve uma dimensão social, econômica, política, ecológica e cultural, pois, além da visão econômica de geração de trabalho e renda, as suas experiências se projetam no espaço público, no qual estão inseridas, tendo como perspectiva a construção de um ambiente socialmente justo e sustentável (AMORIM & ARAÚJO, 2004). No Brasil, a economia solidária, surge na década de 1980, devido ao grande aumento de trabalhadores sem carteira assinada, o que caracterizava naquele momento, uma fragilização do mercado de trabalho brasileiro, se expandindo com apoio de instituições e entidades para a articulação de cooperativas populares e redes de produção. Na década de 1990, tornou-se tema para discussão dos governos municipais e estaduais como um meio de executar ações de geração de trabalho e renda, e desde então, passou a ser prioridade do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) (AMORIM & ARAÚJO, 2004). Em 2004 é criado o Programa Economia Solidária em Desenvolvimento, como um meio de implantação de políticas públicas na área de geração de emprego e renda ambientalmente sustentável e redutor das desigualdades sociais, com o objetivo de promover o fortalecimento e a divulgação da economia solidária, mediante políticas integradas. A economia solidária vem se mostrando um instrumento importante no combate à pobreza e na geração da inclusão social, se constituindo em política transversal no Governo Federal (SANCHEZ, 2009). 21 Cabe destacar que, também o microcrédito, é uma das modalidades da economia solidária, tendo surgido na América Latina na década de 1970 e a partir daí foi se fortalecendo em vários países. No Brasil, o microcrédito alcançou uma grande expansão nos anos 1990, funcionando como incentivo para os microempresários que possuíam baixa renda e que atuavam no mercado de trabalho informal, podendo assim financiar a criação de novos empregos. É oferecido por “bancos” não oficiais, mostrando-se como uma boa opção para os trabalhadores que buscam sua reinserção no mercado ou a melhoria da qualidade de vida através do trabalho (BITTENCOURT, 2005). Nesta perspectiva, constata-se que, de fato, o microcrédito tem cumprido seu objetivo de ser uma alternativa de geração de emprego e renda e de propiciar a inserção no mercado, não pelo ângulo da competitividade, traço comum da sociedade moderna, mas no estímulo à capacidade empreendedora e à busca da auto sustentação (SILVA, 2009). Outra modalidade da economia solidaria é a cooperativa de trabalho. As cooperativas surgiram na época do antigo Egito, onde os agricultores e escravos, com o incentivo do Estado, se uniam para garantir enterros descentes àqueles que não tinham condições. Atualmente, no Brasil, existem vários tipos de cooperativas como, por exemplo, cooperativas de consumidores, bancos comunitários, os clubes de trocas, entre outras, que vão se consolidando conforme a necessidade de cada comunidade (RECH, 2000). Os princípios usados pelas cooperativas de trabalho são praticamente os mesmos da economia solidária, pois se trata de um grupo de trabalhadores que se unem para ter uma renda mensal e trabalho, na tentativa de superar a crise que estão vivendo naquele momento. A economia solidária, como alternativa para inclusão de mulheres no mundo do trabalho, possibilita a esse público um convívio com a comunidade. Este tipo de economia toca e alcança a subjetividade dos atores sociais envolvidos nesta trama, fomentando e despertando sentimento de autonomia, independência e auto-suficiência. Dessa forma, permite um convívio comunitário que se pauta no trabalho em grupo, onde as mulheres possam sentir-se úteis, exercendo suas atividades e possibilitando que, através de seu próprio trabalho consigam gerar renda para suprir suas necessidades. 22 Ao apresentar a economia solidária como alternativa econômica para as mulheres, acredita-se que esta é uma forma de resistência da classe trabalhadora, ao mesmo tempo em que deve ser um espaço de emancipação das mulheres. 4.2 Plano Simplificado de Previdência SOCIAL (PSPS): alternativa de inclusão previdenciária para as mulheres inseridas no mundo do trabalho fora do mercado formal Em consequência de uma nova cultura do mundo do trabalho, desenvolveram-se, de acordo com as necessidades dos cidadãos, novas leis que beneficiam os trabalhadores, como a Lei Complementar n° 123, de 14 de dezembro de 2006, que instituiu o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte e as Leis nº 8.212 e 8.213, ambas de 24 de julho de 1991, criando a alíquota de 11% para o contribuinte individual que trabalha por conta própria (antigo autônomo), sem relação de trabalho com empresa ou equiparada, e para o segurado facultativo. O cidadão que opta pela alíquota simplificada tem direito a todos os benefícios (aposentadoria por idade e por invalidez, auxílio doença, salário maternidade, pensão por morte, auxílio reclusão), exceto aposentadoria por tempo de contribuição (BRASIL, 2007). Devido ao grande número de pessoas no chamado mundo do trabalho informal, principalmente os de baixa escolaridade e pouca qualificação profissional, como é o caso de algumas mulheres, é de grande importância que elas possam assegurar a sua inclusão em alguns benefícios previdenciários. O Plano Simplificado de Previdência Social (PSPS) é, portanto, uma forma de inclusão previdenciária com percentual de contribuição reduzido de 11% para 5% sobre o salário mínimo vigente. Esse percentual que era de 20% foi reduzido em 2011 para 5%, através da Lei nº 12.470 de agosto de 2011, como forma de promover a formalização de profissionais liberais com baixa renda, como ambulantes e cabeleireiros. A referida Lei, também permite que donas de casa que têm renda familiar de até dois salários mínimos possam contribuir pagando apenas R$ 27,25 (Vinte e sete reais e vinte e cinco centavos) ao Instituto Nacional da Seguridade Social (INSS). Com 23 isso, elas poderão se aposentar por idade recebendo um salário mínimo. Além da aposentadoria, as donas de casa terão outros benefícios da Previdência, como salário-maternidade e licença-saúde. A família também receberá pensão em caso de morte da contribuinte (BRASIL, 2011). A população que não contribui com a Previdência Social fica desamparada e sem as garantias dos benefícios oferecidos por esta. A partir do PSPS, as mulheres que exerçam atividades fora do mercado de trabalho formal podem assegurar alguns benefícios através de sua inscrição e contribuição, garantindo assim seus diretos como segurado. É de extrema importância destacar que, fatores como a baixa escolaridade, falta de qualificação profissional e defasagem de vagas no mercado de trabalho, fomenta a necessidade das mulheres serem incluídas no PSPS, caso haja necessidade de serem amparadas por alguns dos benefícios oferecidos no Plano nos momentos de alguma situação de vulnerabilidade ou em ocorrência do afastamento das atividades que exerçam. 24 5 POLÍTICAS PÚBLICAS COM ENFOQUE NA QUESTÃO DE GÊNERO A política pública pode ser entendida como um processo, consolidado em um conjunto de atividades desenvolvidas, para atender às demandas e os interesses da sociedade. A sociedade civil tem como ação primordial, apontar os problemas a serem enfrentados, propor e colaborar na formulação das políticas mais adequadas para saná-los e, ainda, fazer o controle social da execução destas políticas por meio dos espaços de democracia participativa, como os conselhos, audiências públicas etc. (Disponível em: www.amde.ufop.br. Pág. 14. Acesso em: maio/2012). Observa-se o desenvolvimento de políticas públicas que apóiam a conciliação de trabalho e família, atenuando os efeitos negativos das transformações sobre a igualdade de gênero. No Brasil, o baixo desenvolvimento de serviços coletivos que possibilitem socializar os custos dos cuidados com a família penaliza a quantidade e a qualidade da inserção feminina no mercado de trabalho, especialmente das mães das classes menos favorecidas economicamente (CAMPOS, 2007). Destaca-se a importância de três tipos de políticas públicas que são mais disseminadas nos países desenvolvidos e que favorecem a conciliação de trabalho e cuidados familiares, são elas: 1) licenças do trabalho para cuidar dos filhos, sem perda do emprego e com a manutenção do salário ou de outros tipos de benefícios monetários equivalentes; 2) regulação do tempo do trabalho, o que permite aos pais reduzirem ou realocarem as horas de trabalho quando as necessidades de cuidados com os filhos são mais prementes, sem custos econômicos e para o desenvolvimento da carreira profissional e; 3) acesso a creches, pré-escolas e escolas em tempo integral como um arranjo alternativo para o cuidado dos filhos quando os pais estão no local de trabalho (FARAH, 2003). Considerando-se esta tipologia sobre políticas públicas, pode-se avaliar que no Brasil a temática da conciliação entre trabalho e família desfruta de fraca legitimação social e política. As políticas públicas são insuficientes e pouco abrangentes para possibilitar a socialização dos custos dos cuidados familiares. Aquelas com recorte de gênero, reconhecem a diferença de gênero e, com base 25 nesse reconhecimento, implementam ações diferenciadas para mulheres. Essa categoria inclui, portanto, tanto políticas dirigidas às mulheres – como as ações pioneiras do inicio dos anos 1980 – quanto ações específicas para mulheres em iniciativas voltadas para um público mais abrangente (FARAH, 2003). No Brasil, somente em 2004 e atendendo às reivindicações históricas das mulheres brasileiras, o ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva cria a Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM), cuja finalidade é a de promover e articular programas e ações voltados à implementação de políticas públicas para as mulheres, bem como estimular a transversalidade de gênero nas políticas públicas em todas as esferas do poder público. A área estruturante da SPM é aquela que desenvolve ações com vistas a coibir e combater todas as formas de violência contra a mulher. Assim, inspirada no princípio de igualdade de condições entre homens e mulheres, a SPM fomenta estratégias para o desenvolvimento de políticas para as mulheres e tem como atribuições propor, coordenar e articular um conjunto de políticas dirigidas à eliminação de todas as formas de discriminação de gênero, à consolidação de plenos direitos humanos e à cidadania para as mulheres (Disponível em: www.amde.ufop.br. Pág. 11. Acesso em: maio/2012). Quanto ao papel do Estado na promoção de políticas públicas que visem à autonomia econômica das mulheres, percebe-se o início de uma caminhada que necessita ser acompanhada pelo movimento social organizado e deve ser compreendida como meio para a superação da situação de desigualdade que vivem, sobretudo, no mundo do trabalho (PESSOA; PEIXOTO; RAMOS, 2008). Historicamente, a ação do Estado tem produzido e mantido essas desigualdades. Planejar a política pública a partir da perspectiva de gênero exige reconhecer, enfrentar e eliminar os mecanismos de perpetuação das desigualdades e construir alternativas, no sentido da realização plena e progressiva dos direitos humanos de todas as mulheres. Assim, torna-se necessário um diagnóstico das desigualdades para identificar os acessos diferentes ao trabalho, à proteção social, aos recursos produtivos, à propriedade da terra, à moradia, à justiça, aos bens e serviços necessários para uma vida digna, ao lazer, ao descanso, à participação política e ao poder, entre outros. Parte-se do reconhecimento de que toda política 26 tem impacto sobre as relações de gênero, portanto, pode e deve ser analisada através desta perspectiva (PESSOA; PEIXOTO; RAMOS, 2008). É possível e necessário que políticas públicas assumam postura afirmativa na construção da igualdade de gênero. É, portanto, estratégico o questionamento e a superação da economia de mercado, bem como, a invisibilidade da elaboração e contribuição que as mulheres trazem para a economia. Isso nos ajuda a construir uma prática que vislumbre uma nova lógica de desenvolvimento que deve contemplar a participação das mulheres no processo econômico, garantindo uma participação efetiva das mesmas em todas as instâncias (PESSOA; PEIXOTO; RAMOS, 2008). As políticas públicas atingem mulheres e homens de forma desigual, assim, inserir as perspectivas de gênero no orçamento é, portanto, reflexo da preocupação em implementar tais políticas, garantindo os recursos para sua execução. Dessa forma, planejar com perspectiva de gênero significa estruturar a ação a partir do desafio de promover a igualdade, enfrentando as estruturas que reproduzem as relações de dominação e subordinação de gênero. 27 6 POLÍTICAS PÚBLICAS DE GERAÇÃO E TRANSFERÊNCIA DE RENDA Incluir socialmente os mais pobres significa dar-lhes dignidade, propiciar recursos para uma alimentação adequada e para suas necessidades básicas, zelar pela proteção de seus direitos, assegurar uma política de assistência social, de segurança alimentar e nutricional, por meio de uma rede de proteção e promoção social, na perspectiva de consolidação do exercício pleno de democracia (CAMPOS, 2006). Em recente estudo realizado pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA), com base nos dados divulgados pela PNAD, do IBGE, constata-se que as políticas de transferência de renda, considerando o PBF e o BPC, ambos sob a responsabilidade do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate a Fome (MDS), têm forte impacto na redução da desigualdade social. Sem esses dois programas, a proporção de pobres em 2004 seria de 38% da população, e não os 31% identificados (SOARES, 2006). Mesmo partindo da constatação de que ainda há muito a ser feito para saldar efetivamente à pesada e longa dívida social acumulada no país, esses estudos reconhecem a importância e o peso dos avanços obtidos até então a partir das políticas públicas estabelecidas que confluem para formação e consolidação de uma rede de proteção e promoção social. Reafirmar as políticas públicas implantadas, garantir a sua ampliação e continuidade, propiciar que as famílias beneficiárias dos programas se emancipem social e economicamente é o desafio posto (CAMPOS, 2006). Nesse viés, os movimentos e entidades de mulheres no Brasil e no exterior passaram a defender a proposta de que as políticas de combate à pobreza e outras políticas sociais tenham as mulheres como um de seus alvos prioritários. Essa priorização das mulheres é defendida tanto pelos que enfatizam o impacto desse apoio no combate à pobreza como pelos que enfatizam a busca da autonomia das mulheres, vítimas da pauperização (FARAH, 2003). Políticas públicas articuladas entre si e com os programas de assistência social, segurança alimentar, saúde e educação compõem uma rede nacional de proteção e promoção social que estão sendo implantadas em todos os municípios 28 brasileiros com o objetivo de promover a emancipação das famílias que hoje precisam da ajuda do Estado para superar uma histórica situação de exclusão. Dessa forma, cabe destacar os programas de geração de emprego e renda, que constituem exemplos de focalização de políticas de combate à pobreza. Essa focalização parece decorrer de diversos fatores: em primeiro lugar, da influência da agenda atual de reforma das políticas públicas e da tendência de focalização das políticas de combate à pobreza; em segundo lugar, da influência do âmbito local da agenda formulada por movimentos e entidades de mulheres que recomendam que se privilegie o atendimento a mulheres nesse tipo de programa (CARLOTO & GOMES, 2011). Assim, as políticas de geração de renda possibilitam não apenas reduzir a desigualdade por meio da ampliação do acesso a serviços e direitos, mas também estender a responsabilização pública pelo bem-estar dos indivíduos e, neste sentido, rediscutir e colocar em xeque a responsabilidade atribuída às mulheres pela reprodução cotidiana (GODINHO, 2004). Como bem lembra o ex-ministro Patrus Ananias (2005), as políticas sociais, além do caráter ético de promover a vida, desempenham um importante papel dinamizador da economia, ao valorizar e estimular as economias locais e regionais. Estamos formando cidadãos e também novos consumidores. Com o esforço conjunto de governo e sociedade, estamos atingindo o objetivo de alcançar o desenvolvimento sustentável, com justiça social e em condições de igualdades para todos os brasileiros (CAMPOS, 2006). Por tudo exposto, cabe destacar que as principais diretrizes dos programas de geração de renda são: • Valorização de ações que contemplem a continuidade, o fortalecimento e/ou expansão de projetos, estabelecendo parcerias com instituições qualificadas; • Articulação com organizações públicas da sociedade civil ou empreendimentos que atuem no campo socioeconômico, com base nos princípios e diretrizes do Programa de Economia Solidária; • Articulação com as ações e programas co-financiados pelo MDS nos territórios atendidos pelo PBF, Segurança Alimentar, entre outros; 29 • Integração da execução do Programa às ações e políticas do Governo Federal no campo da geração de trabalho e renda, valorizando as discussões de temas transversais como gênero, raça, etnia, desenvolvimento sustentável, entre outros; • Trabalho em sintonia com a PNAS, envolvendo as ações da Proteção Social Básica e Especial, por meio do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS), beneficiando prioritariamente os usuários do Sistema Único da Assistência Social (SUAS). 30 7 O PROGRAMA DE INCLUSÃO PRODUTIVA NO MUNICÍPIO DE MARIANA (MG) De iniciativa do município de Mariana e coordenado pela Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social e Cidadania (SMDSC) o Programa de Inclusão Produtiva visa proporcionar, as mulheres a oportunidade de experiência profissional no mercado de trabalho, preparando-as para o exercício da cidadania. O benefício oferecido consiste em aprendizado e prática profissional, de preferência em órgão público municipal, concedendo-se as beneficiárias uma bolsa auxílio no valor de meio salário mínimo. A Prefeitura procurou inovar ao implementar políticas públicas que possibilitem a autonomia econômica das mulheres em vulnerabilidade social. O Programa atende atualmente 136 mulheres que moram em bairros caracterizados por alto grau de exclusão, vulnerabilidade e desigualdade social. Essas mulheres, assim como outras, representam o segmento de maior exclusão econômica, seja pelo menor acesso ao mercado de trabalho e ao exercício de empreendimentos econômicos, seja pela maior precariedade nas condições de trabalho e acesso aos direitos trabalhistas. Além da atividade de prestação de serviços em diversos setores da Prefeitura e em organizações não governamentais, o Programa tem como objetivo oferecer às suas beneficiárias: a) reuniões mensais abordando temas de seus interesses e de promoção social com apoio da equipe técnica da SMDSC; b) acompanhamento individual da equipe técnica (Assistente Social); c) acompanhamento psicossocial por meio de grupos; d) promoção da inclusão na rede formal de ensino; e) promoção da inclusão em benefícios e programas oferecidos pelo município; f) curso de relações humanas e interpessoais e; g) inserção no mercado de trabalho. A regulamentação do Programa se deu em 2001, através da Lei nº 2.300, sendo esta reformulada em 2009. Com esta reformulação, o Programa passa a ter como foco principal a qualificação para o mercado, mesmo que em detrimento da prestação de serviços a órgãos públicos, uma vez que estará contribuindo de forma mais efetiva e sustentável para a melhoria da qualidade de vida de centenas 31 de famílias. Embora o Programa tenha significado um marco importante na política social do Município, nesses onze anos houve diversas transformações sociais, políticas e econômicas, tanto no âmbito municipal, quanto estadual e nacional que, direta e indiretamente, implicam na forma com que se devem constituir as políticas públicas. Para o êxito do Programa, alguns desafios ainda necessitam ser superados, dentre eles cabe destacar: a) obedecer ao tempo limite de permanência no Programa; b) não há capacitação e conscientização real para que as beneficiárias deixem o Programa e se insiram no mercado de trabalho; c) o Programa é visto como “emprego” muitas vezes pelos próprios gestores; d) falta estrutura física, recursos materiais e humanos (técnicos) para melhor operacionalização e o consequente sucesso do Programa. Para o sucesso descrito acima, torna-se necessário que o Programa supere alguns pontos e que promova alternativas de geração de renda através de: a) qualificação profissional: promover capacitação profissional visando à inclusão no mercado de trabalho e à promoção da autonomia; b) reinserção profissional: criação de um serviço de informação, orientação e encaminhamento dos usuários as políticas, quanto às possibilidades de inserção no mercado de trabalho através de parcerias com o Sistema Nacional de Emprego (SINE) e; c) grupos de inclusão produtiva: organização de grupos de inclusão produtiva, gerando trabalho e renda a trabalhadores organizados em cooperativas e/ou associações, promovendo ações para o desenvolvimento de possibilidades e habilidades que favoreçam a autonomia pessoal, familiar e comunitária e o fortalecimento dos princípios do cooperativismo autogestionários. Importante destacar que, no ano de 2010, aproximadamente 350 mulheres eram beneficiadas pelo Programa, porém estas não tinham um acompanhamento efetivo e sistemático. Diversos fatores contribuíram para que o Programa deixasse de ter um caráter emancipador para que se tornasse um programa eleitoreiro. Os encaminhamentos para inserção das mulheres no Programa começaram a ser efetivados sem critérios, tanto que, até homens foram inseridos (hoje, ainda quatro não foram desligados). Para atender os critérios exigidos em lei, em fevereiro de 2012, realizou-se aproximadamente 103 desligamentos, sendo estes justificados pelo fato de que todas as beneficiárias do Programa já tinham excedido o tempo 32 limite de dois anos. Cabe informar que, apesar do Programa ter como público alvo as unidades familiares monoparentais, deve-se levar em consideração os diversos arranjos familiares existentes hoje. Entende-se que as transformações sociais contemporâneas e os novos arranjos familiares atingem a estrutura e os padrões de funcionamento familiar, a partir da inserção da mulher no âmbito profissional (FLECK & WAGNER, 2003). Assim, parece ser esse um tema relevante a ser investigado, já que os novos papeis desempenhados pela mulher na família têm resultado em mudanças na estrutura familiar. Além disso, as mudanças na composição das famílias, tradicionalmente chefiadas por homens, contribuíram para esse movimento. O crescimento de famílias com chefia feminina, seja pela dissolução do casamento, seja pela morte do marido ou, ainda, pela simples opção de viverem sozinhas, também impeliram a mulher para o mercado de trabalho (SANCHES & GEBRIM, 2003). O número de lares chefiados por mulheres está crescendo vertiginosamente no Brasil, revelando uma posição social cada vez mais ocupada por mulheres no contexto atual das famílias brasileiras: a de provedoras do sustento da família. Esta realidade cada dia mais comum no país caracteriza arranjos familiares que contrariam os preceitos do patriarcado, contestam modelos tradicionais e revelam paisagens até então desconhecidas ou pouco evidenciadas (PERUCCHI & BEIRÃO, 2007). O contexto atual caracteriza-se por todas essas transformações na família, que inevitavelmente se estendem para o mercado de trabalho. Entretanto, o mundo do trabalho, mesmo apresentando avanços, continua preso à lógica patriarcal. As mulheres chefes de família – cujas práticas sociais se apresentam como contradição ao modelo tradicional – sofrem as consequências da desvalorização do seu trabalho. É inegável o peso que as construções sociais de gênero têm sobre a sociedade, especialmente no que tange ao “ser mulher” como detentora da responsabilidade pelos trabalhos domésticos e pela educação dos filhos (CASTELLS, 1999). Atualmente, o Programa de Inclusão Produtiva do município de Mariana prevê o atendimento de até 500 unidades familiares, mas atualmente somente 136 mulheres estão inseridas. Cabe destacar que apesar do número expressivo de 33 possíveis contratações, o número de mulheres beneficiadas ainda é pequeno. Várias são as dificuldades que o Programa vem enfrentando para se concretizar enquanto política pública, sendo merecedora de destaque a falta de uma equipe técnica responsável para consolidação do Programa e a contratação de cursos profissionalizantes. Ressalta-se que, todas as beneficiárias do Programa, ao ingressarem, eram mulheres em situação de miserabilidade. No entanto, poucas foram as que passaram por um processo técnico de inserção, com análise de critérios, haja vista que o único critério considerado era sua situação de pobreza, e está possui outras formas de enfrentamento que não o Programa de Inclusão Produtiva. Assim, como meio de vincular o Programa a iniciativas do Governo Federal, torna-se pertinente que, em forma de contrapartida da beneficiária, os filhos em idade escolar sejam obrigados a frequentar a escola e que a Secretaria de Saúde oferte ações de prénatal, vacinação, acompanhamento do estado nutricional da criança, além de atividades educativas em saúde, métodos de contracepção, alimentação e nutrição. Uma das maiores dificuldades do Programa de Inclusão Produtiva ainda é a capacitação e o encaminhamento das beneficiárias para o mercado de trabalho. Tal dificuldade se deu, entre outros fatores, pelo tempo ilimitado de permanência das beneficiárias – que permite a acomodação no Programa, uma vez que “já estavam empregadas” -, da dificuldade de criação de parcerias para a capacitação das beneficiárias com entidades públicas e privadas e pela falta de estrutura física e recursos humanos para o Programa. Importante ressaltar que, a capacitação e o encaminhamento das beneficiárias para o mercado de trabalho (como funcionárias ou membro de grupos produtivos) é fator primordial para o alcance do objetivo do Programa. Para tanto, deve-se firmar parcerias com instituições qualificadas para criação de oficinas permanentes (criadas conforme demanda); construir uma articulação com o SINE, para encaminhamentos de mão de obra qualificada e realizar oficinas de esclarecimento e capacitação para o cooperativismo, uma vez que também se configura uma forma de inserção no mercado de trabalho. Assim, a fim de oferecer uma qualificação que fosse de interesse das beneficiárias do Programa, a equipe técnica realizou a construção de um diagnóstico que apontasse, inclusive, a escolaridade e o interesse profissional mais demandado. Tal diagnóstico apontou, entre outras coisas, dois fatores que 34 mereceram maior atenção: a pouca escolaridade das beneficiárias (129 beneficiárias possuem até o Ensino Fundamental) e o interesse por profissões que elas pudessem trabalhar como funcionárias efetivas de uma determinada organização ou mesmo por conta própria, em suas casas (95 beneficiárias); dentre as mais citadas está a de costureira. Dessa forma, pretende-se firmar convênios com empresas do município, o que possibilitará a oferta de alguns cursos, tais como: informática, horticultura, preparador de derivados do leite, avicultura, operador de processamentos de embutidos e defumados, padeiro e confeiteiro, almoxarife, cuidador de idosos, costureiro, jardineiro e técnicas de limpeza e organização de ambientes. Destaca-se também, como foco do Programa a geração de renda e o empreendedorismo, que se trata de uma questão já inserida na agenda nacional de políticas públicas, junto com a educação. Essa linha de atuação visa abrir oportunidades de ocupação, levando em conta a reestruturação produtiva da economia, os potenciais nichos de mercado, a criatividade, o esforço e as habilidades de cada indivíduo. Com estas ações a Prefeitura busca a autonomia e a emancipação das mulheres beneficiadas pelo Programa. Cabe destacar que, ações na área da educação visam o fortalecimento do capital humano. Essa linha de atuação vai além das atividades de ensino e aprendizagem, busca transferir e compartilhar conhecimentos e habilidades que contribuam para a sociabilidade, o aprimoramento da qualidade de vida das pessoas, sem limites etários. 35 8 CONCLUSÃO Esta monografia teve por objetivo identificar os limites e possibilidades do Programa de Inclusão Produtiva do Município de Mariana (MG) e refletir sobre a participação das mulheres no mundo do trabalho. Com o intuito de aprofundar e ampliar os conhecimentos obtidos optou-se, pela abordagem do tema gênero e mercado de trabalho. Como alternativa de geração de renda, fez-se uma análise da Economia Solidária e do mercado de trabalho formal e informal, e as possibilidades da inclusão previdenciária das mulheres trabalhadoras fora do mercado de trabalho formal. Consequentemente buscou-se analisar as políticas públicas com enfoque na questão de gênero, as políticas de geração e transferência de renda e o impacto dessas políticas no âmbito municipal. Para o acesso das mulheres ao mundo do trabalho, torna-se necessário uma política pública ampla, integrada e que enfrente o desafio do mercado, ou seja, através de políticas que proporcionem aos trabalhadores em qualquer idade, e com suas limitações, oportunidades de adquirir e comprovar qualificação e experiência que possam servir como credencial para o acesso ao mercado de trabalho. Percebe-se a importância diante das políticas sociais, no âmbito da Assistência Social, a criação de programas para geração de renda, através da economia solidária, em suas diversas práticas econômicas e sociais. Faz-se necessário uma política pública de trabalho que implique em ações que extrapolem a área de emprego propriamente dita, mas que proporcionem condições para a dignidade e a cidadania (LEITE, 2003). A ausência de escolas e creches de qualidade, a precarização dos serviços públicos de saúde, a incipiente política de assistência aos idosos e demais segmentos sociais, contribuem para que a presença das mulheres no mercado de trabalho se perpetue de forma subordinada em relação aos homens. Deste modo, além das mulheres serem historicamente responsáveis pela gestão cotidiana das necessidades da família, assumem as tarefas ora não executadas pelo Estado (SILVA, 209). Trata-se de desafios complexos e de grande escala, entre os quais se destacam: 36 • A consolidação da rede pública de proteção social (saúde, educação, segurança, assistência social, previdência, qualificação, orientação e colocação profissional) que se estenda à totalidade da PEA, e não apenas ao segmento denominado de “formal”; • Atenção permanente à promoção da igualdade de oportunidades (gênero, raça/cor, idade, portadores de deficiências, moradores de periferias) e o combate a todas as formas de preconceito e discriminação na sociedade e no trabalho. Como alternativa de geração de renda, fez-se uma análise da economia solidária e do mercado de trabalho formal e informal. Percebe-se que em se tratando de dados positivos em relação ao mercado de trabalho no Brasil, as mulheres, em razão das restrições de emprego - em particular, para aquelas dos extratos populares mais pobres - recorrem habitualmente à economia informal e ao subemprego, quando não permanecem na dependência econômica da família, dos cofres públicos ou da mendicância, o que contribui para aumentar os níveis de pobreza e diminuir a auto estima, além de engrossar a ampla parcela de trabalhadores marcados pela exclusão social e pela vulnerabilidade econômica. Estes fatores fomentam a necessidade das mulheres se incluírem no PSPS, caso haja necessidade de serem amparadas por alguns dos benefícios oferecidos pelo Plano nos momentos de maior vulnerabilidade social e no afastamento das atividades. A economia solidária, como alternativa para inclusão das mulheres no mundo do trabalho, possibilita um convívio com a comunidade. Este tipo de economia toca e alcança a subjetividade dos atores sociais envolvidos nesta trama, fomentando e despertando sentimento de autonomia, independência e autosuficiência. Dessa forma, permite um convívio comunitário que se pauta no trabalho em grupo, onde as mulheres possam sentir-se úteis, exercendo suas atividades e possibilitando que, através de seu próprio trabalho consigam gerar renda para suprir suas necessidades. A economia solidária mostra-se como alternativa de promoção do desenvolvimento sustentável, onde a produção, distribuição e preservação dos recursos naturais e das relações sociais sejam dimensões de um processo de 37 emancipação, instituição de direitos sociais, a partir de uma visão de alteridade, valorização e agregação das diferentes etnias, das relações de gênero, criando uma nova cultura de cooperação nas relações humanas. Partindo desta leitura da realidade, o Programa de Inclusão Produtiva deveria desenvolver a formação continuada nas esferas política, técnica, produtiva e de gestão. Pensando-se em cursos que trarão retorno financeiro tanto para as beneficiadas como para o próprio município. Alguns desafios terão de ser superados para que o Programa tenha sucesso, dentre eles destaca-se: • Criação de mais vagas em creches para que as beneficiárias tenham onde deixar seus filhos; • Apoio da Prefeitura, a projetos produtivos voltados à capacitação e organização das mulheres; • Garantia de acesso e crédito para a criação ou continuidade de pequenos negócios e associações. A capacitação e o acesso ao crédito são condições básicas de uma inserção autônoma no mercado de trabalho, seja na vertente que privilegia a mulher como agente multiplicador, por seu papel na família, seja na vertente que enfatiza a perspectiva de direitos (FARAH, 2004); • Garantia de direitos trabalhistas e combate à discriminação nos diversos níveis da administração pública e fiscalização do setor privado; • Criação de programas de capacitação profissional; • Acesso ao poder político. Compreendeu-se também, o significado social da promoção de ações para a elevação do nível de escolaridade da população para a expansão da cidadania e como parte constitutiva de uma política pública de emprego e renda. Além disso, o sucesso do Programa baseia-se em: promover um bem público de caráter universal às populações que não tiveram oportunidade social de concluir a educação básica na idade adequada; propiciara elevação do estoque de capital humano e, por conseguinte, aumento da produtividade da mão-de-obra e; ampliar o escopo do sistema público de emprego para além de atividades de capacitação profissional e intermediação de mão-de-obra. 38 Quanto ao papel do Estado na promoção de políticas públicas que visem à autonomia econômica das mulheres, percebe-se o início de uma caminhada que necessita ser acompanhada pelo movimento social organizado e deve ser compreendida como meio para a superação da situação de desigualdade que vive, sobretudo, no mundo do trabalho. É possível e necessário que políticas públicas assumam postura afirmativa na construção da igualdade de gênero, numa perspectiva feminista. Conclui-se, com este estudo, que serão necessárias políticas públicas não apenas para garantir o emprego e a seguridade social, mas de torná-los acessíveis a todos os membros da sociedade, em igualdade de condições. Dessa forma, será promovida uma inclusão social que não contemple só os âmbitos de emprego formal, mas que se dissemine para as demais esferas da vida pública. Trata-se de combinar a cidadania com a efetividade de direitos. REFERÊNCIAS 39 AMORIM, Bruno Marcus F.; ARAUJO, Herton Ellery. Economia Solidária no Brasil: novas Formas de Relação de Trabalho. IPEA: Mercado de Trabalho, agosto 2004. ANANIAS, Patrus. Compromisso de uma geração. Correio Braziliense, Brasília, 10 out. 2005. BITTENCOURT, Gilson. Microcréditos e Micro-finanças no Governo Lula – 2005. Disponível em: www.fazenda.gov.br/spe/publicações/reformasinstitucionais. Ações do Governo – Rural. Acesso em: abril/2012. BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego, e dá outras providências. 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