Por que não ensinar gramática?
Diego Camargo Saraiva1
Adriana Soares2²
Resumo: Este estudo quer analisar a questão do ensino da gramática, sua importância na aquisição
de uma segunda língua ou L2, neste caso o inglês, bem como a forma que é concebida pelos
estudantes. Diante de um idioma com tantas heranças linguísticas, torna-se imprescindível conhecer
suas regras e como tais se comportam para se obter uma comunicação correta e eficiente.
Palavras-chave: gramática, ensino, importância, comunicação.
Abstract: This study wants to examine the grammar’s teaching issue, its importance in acquiring a
second language or L2, in this case English, and the way that it is conceived by students. In view of a
language with so many linguistic inheritances, it becomes essential to know its rules and how they are
worked to obtain a correct and efficient communication.
Keywords: grammar, teaching, importance, communication.
A língua inglesa tem origem no idioma dos anglos e saxões, povos bárbaros
(germanos) que no século V de nossa era invadiram a Britânia, o atual Reino Unido
da Grã-Bretanha. Em 1500 anos de evolução, o inglês sofreu influências de outras
línguas, entre elas o celta, o latim e o francês. Por isso sua estrutura e gramática
obedecem a um conjunto de regras relacionadas a diferentes heranças linguísticas.
Segundo Holden e Rogers (2001), esse é um problema enfrentado no ensino de
gramática da língua inglesa, a qual, normalmente, parece ser tão diferente da nossa
língua nativa, neste caso, o português.
A gramática pode ser concebida como um conjunto de regras que organiza um
idioma, e pode ser de várias maneiras: regras que devem ser seguidas (gramática
normativa ou prescritiva) - gramática pedagógica e de livros didáticos -, com as quais
os leitores aprendem a falar e escrever corretamente; conjunto de regras que são
seguidas (gramática descritiva) – aquela que guia o trabalho dos linguistas -, que
tem o papel de descrever como as línguas são faladas.
De acordo com Possenti (1996), o conhecimento do conjunto de regras que o falante
tem e domina de uma língua, e que a torna compreensível e reconhecida como
pertencente a uma língua, refere-se à gramática internalizada. Chomsky (Apud
1
Graduando do Curso de Letras da FACOS.
Profª Orientadora Disciplina Estágio Supervisionado em Língua Inglesa no Ensino Fundamental /
Ensino Médio - Mestre em Letras - Linguística Aplicada.
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HARMER, 1991) denomina “usuários competentes da língua”, os falantes que
sabem de alguma forma o sistema gramatical de regras, e “desempenho”, o modo
como este conhecimento é compreendido. Por exemplo, o fato de um falante
produzir diferentes sentenças com a mesma relação entre sujeitos e objetos, ou até
mesmo, no caso de um falante nativo, construir uma sentença gramaticalmente
complexa sem ter consciência de quais regras está usando.
Em determinado momento da história do ensino de línguas, a gramática foi vista por
alguns autores como sinônimo de correção e o professor era caracterizado como
aquele que ditava as regras para que o uso se tornasse correto. Atualmente, essa
concepção tem mudado e muitos gramáticos têm sido mais cuidadosos ao falar
sobre gramática, focalizando o modo como ela é usada ao invés de descrever como
ela deveria ser usada.
Além disso, observa-se uma contínua controvérsia no que diz respeito a ensinar ou
não gramática dentro da pedagogia de L2. Conforme afirmam Amorim e Magalhães
(1998, p. 131),
Os que a defendem dizem que a gramática é parte indissociável do idioma e
que, portanto, não há como aprender uma língua estrangeira sem aprender
gramática. Aqueles que a condenam argumentam que, se o estudo da
gramática fosse mesmo essencial, as crianças não aprenderiam a falar
antes de ingressarem na escola [...].
Alguns autores adotam uma posição contrária à instrução formal e à correção para a
aquisição. Eles defendem que o ensino de gramática tem um efeito mínimo sobre a
aquisição da L2. Essa posição é conhecida como “posição de não-interface”. Já a
“posição de interface forte”, implícita no ensino tradicional de gramática, assume que
os alunos adquirem o que está sendo ensinado e que, com a prática, são capazes
de utilizar a estrutura em situações comunicativas, havendo, assim, uma conexão
entre prática e uso. Em contrapartida, existe a “posição de interface fraca”, que
sugere que a instrução chama a atenção dos alunos para características da língua e
permite que eles desenvolvam seus conhecimentos dessas características, porém,
eles não as incorporarão em sua interlíngua até que alcancem o estágio de
desenvolvimento exigido e adequado. Holden e Rogers (2001) mencionam que a
idéia subjacente em uma atividade faz com que as pessoas se lembrem mais
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daquilo que descobriram sozinhas do que de algo que alguém lhes contou, o que
denomina de gramática dedutiva. Além disso, pode-se entender muito mais
claramente a lógica subjacente.
Seguindo essa ideia de raciocínio, como sustentam Holden e Rogers (Ibid., p. 34),
outra maneira de instigar o aluno a aprender gramática é escolher exemplos que
contenham alguma semelhança na sua própria língua, o que denomina de gramática
comparativa. Por exemplo, “I’m studying for the history exam.” é semelhante à
sentença “Estou estudando para o exame de história”, pois, ambos indicam uma
ação em desenvolvimento. Essa abordagem positiva da gramática vai torná-la muito
mais prazerosa e útil, tanto para o professor como para o aluno. No momento em
que observamos a aplicabilidade das regras gramaticais num contexto real e que,
consequentemente, conseguimos produzir na língua inglesa o que produzimos na
língua portuguesa, passamos a dar real importância à gramática.
Alguns linguistas mantinham que não era necessário ensinar gramática e que a
habilidade para usar a L2 se desenvolveria automaticamente se o aprendiz
focalizasse o significado ao utilizar a língua para se comunicar. Afirmam Amorim e
Magalhães (1998, p. 131) que “o meio termo é o mais sensato, mais democrático e
muito mais producente [...]”.
O aprendizado de um idioma estrangeiro demanda uma integração de uma grande
variedade de habilidades, atividades e processos de raciocínio. Não existe
justificativa para o ensino ou o aprendizado de um conjunto de regras se não
estiverem relacionados a outras atividades realizadas dentro do programa linguístico
(HOLDEN; ROGERS, 2001). Assim, podemos afirmar que o ensino da gramática
com abordagem comunicativa é parte integrante da teoria e da prática. Jacobs
(2002) menciona que no campo da comunicação verbal, o quesito gramática é
geralmente considerado o de maior importância. Com certeza, erros gramaticais
podem provocar falhas terríveis de comunicação. Para ilustrar, o autor nos traz um
exemplo em que um estudante de língua inglesa comete um erro de gramática
durante um diálogo com um amigo: “She has twenty years”. Neste caso, o
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conhecimento da regra gramatical torna-se imprescindível para a formulação correta
da sentença: “She is twenty” ou “She is twenty years old”. É certo que o domínio
puro e simples da gramática não garante que uma pessoa vá se comunicar
eficazmente com outros indivíduos. “A gramática está para aprendizagem de um
idioma como a habilidade de ler música está para um pianista: as partituras poderão
aumentar o seu repertório, mas jamais dar mais agilidade aos seus dedos”
(AMORIM; MAGALHÃES, Ibid., p. 131).
Larsen-Freeman (2003 apud PAIVA, 2005) define gramática como uma habilidade
ao invés de uma área de conhecimento. Isto recai sobre a importância do
desenvolvimento nos alunos de uma habilidade para se fazer algo, não
simplesmente armazenar conhecimento sobre a língua ou seu uso. Além disso, ela
coloca a gramática como sendo a quinta habilidade a ser desenvolvida no aluno, ao
lado da escrita, da leitura, da compreensão oral e da fala. Ser capaz de usar
estruturas gramaticais não significa saber usar as formas exatamente, mas, sim,
usá-las de forma apropriada e significativa. Para Hoden e Rogers (2001, p. 35), “ [...]
As regras são úteis, mas precisam estar fundamentadas no entendimento e na
utilização prática”.
A concepção que se tem atualmente é a de que a gramática não deve ser abolida do
ensino de línguas, mas que compartilhe seu espaço com as habilidades a serem
desenvolvidas, tais como a leitura, a escrita e a fala, munidos de significado e com
um propósito para os envolvidos (POSSENTI, 1996). Esses aspectos nada mais são
do que habilidades com as quais a habilidade gramatical deveria integrar-se para
determinarem o que os alunos podem fazer em determinado nível de proficiência,
não é o caso de quanto mais gramática, mais proficiente.
Para Widdowson (1990 apud PAIVA, 2005), a gramática, na Abordagem
Comunicativa, era para ser assimilada incidentalmente como uma função da
atividade comunicativa. Porém o fato de a abordagem exigir que o aluno adquira a
gramática por inferência tem causado uma desorientação por parte deles e,
portanto, a função dessas atividades gramaticais seria justamente fornecer as
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características gramaticais necessárias para ajudar os alunos a encontrarem seu
caminho. Além disso, os alunos deveriam ler muito e trabalhar a língua partindo de
suas próprias produções e conseguir dominar o maior número possível de regras
para poderem se expressar em diversas circunstâncias.
Our aim in teaching grammar should be to ensure that students are
communicatively efficient with the grammar they have at their level. We may
not teach them the finer points of style at the intermediate level, but we
should make sure that they can use what they know (HARMER, 1991, p.
23).
Esse é um papel importante das escolas, o de fornecer condições para que o aluno
aprenda aquelas convenções as quais não tenha contato ou familiaridade, e não
apenas apresentar uma variedade no lugar da outra. Fazendo-se um paralelo entre
esta visão de Possenti (1996) e o ensino de língua inglesa, tem-se a Abordagem
Comunicativa sustentando a perspectiva de que o aluno deve saber se comunicar
nas diferentes situações com que possa se deparar. Além disso, utilizando as
próprias palavras do autor, “não existem línguas mais simples ou mais complexas,
existem línguas diferentes” (Ibid., p. 26). Possenti (Ibid.), afirma que saber falar é
saber uma língua e saber esta língua é saber sua gramática, mas este fato não se
resume em saber regras desta língua e, sim, ao fato de saber o necessário para ser
capaz de se comunicar efetivamente nesta língua. Pode-se dizer ainda, que saber
uma gramática é saber compreender frases e dizê-las, e quem faz isso tem certo
domínio de estruturas da língua.
Sendo assim, as escolas não deveriam privilegiar apenas as aulas de gramática
direcionadas para o vestibular, pois esses testes já não priorizam essa prática, mas
sim exercícios com textos e literatura. O autor ainda recomenda que se faça uma
reorganização e uma discussão sobre o assunto e não abolir a gramática, mas
alterar prioridades. Tudor (2001 apud PAIVA, 2005), considera que a palavra
gramática é, às vezes, usada para se referir à aspectos do sistema da língua,
enquanto em outros é relacionada à aspectos do processo de ensino ou a uma
determinada atividade de aprendizagem. O autor se refere à gramática como
regularidades estruturais ou modelos na língua por meio dos quais os falantes
organizam as mensagens. Nas definições apresentadas acima, a gramática é vista
como parte do processo de uso da língua e não como a língua em si. No entanto,
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em muitos livros didáticos, ela constitui a base para a aprendizagem. É o centro em
torno do qual se estrutura um programa de aprendizagem e ao qual são adicionados
outros elementos.
Os professores de língua inglesa devem ter a consciência de que precisam se
atualizar em relação ao ensino da gramática, “a grande vilã”, vista muitas vezes
pelos mesmos e pelos alunos, já que a crença dos últimos é um reflexo das crenças
dos professores. É preciso que deixem de lado costumes herdados por professores,
cuja formação está calcada em princípios tradicionais, como o ensino da língua
inglesa estar resumido em ensinar gramática. Devemos produzir aulas orientadas
pela leitura. Isso faz com que os alunos aprendam as estruturas de linguagem e a
gramática de forma contextualizada. Além disso, músicas, seminários e teatros
fazem com que a gramática deixe de ser o foco. Para Harmer (2001), se
apresentarmos as regras através de padrões estruturais (sintagmas), as regras
podem ser facilmente explicadas.
Embora o nível de sabedoria de regras não seja equivalente a capacidade de um
estudante de inglês se comunicar bem, o estudo da gramática, de forma organizada,
é muito eficaz na produção de textos comunicativamente eficientes. Além disso, “[...]
uma vez aprendidas, as regras gramaticais tornam-se algo que proporciona
segurança. Os alunos sentem que, conhecendo as regras dominam o idioma”
(HOLDEN; ROGERS, 2001, p. 33). Porém, o estudo destas regras, bem como os
exercícios para praticá-las, deve ter alguma ligação com a realidade dos alunos. Os
alunos precisam ter consciência da língua e como ela é usada.
Referências
AMORIM, Vanessa; MAGALHÃES, Vivian. Cem aulas sem tédio: sugestões
práticas, dinâmicas e divertidas para o professor de língua estrangeira. Santa Cruz:
Pe. Reus, 1998.
HARMER, Jeremy. The Practice of English Language Teaching. First published.
United States: Longman, 1991.
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HOLDEN, Susan; ROGERS, Mickey. O ensino da Língua Inglesa. São Paulo:
Special Book Services Livraria, 2001.
JACOBS, Michael A. Como não aprender inglês. 7ª Ed. Rio de Janeiro: Elsevier,
2002.
OXFORD, University. Dicionário Oxford Escolar: para estudantes brasileiros de
Inglês - Português/Inglês – Inglês/Português. 1st ed. New York: Oxford University
Press, 1999.
POSSENTI, S. Por que (não) ensinar gramática na escola. São Paulo: Mercado
de Letras, 1996.
PAIVA, V.L.M.O. Como se aprende uma língua estrangeira? In: ANASTÁCIO,
E.B.A.; MALHEIROS, M.R.T.L.; FIGLIOLINI, M.C.R. (Orgs). Tendências
contemporâneas em Letras. Campo Grande: editora da Uniderp. Disponível em:<
http://www.veramenezes.com/como.htm> Acesso em: 4 jul. 2010.
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