UNIVERSIDADE LUSÍADA DE LISBOA
Faculdade de Arquitectura e A rtes
Mestrado integ rado em Arquitec tura
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eira e o plano do Chiaado
Realizado
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por:
João Migguel Antóniio Nascime
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Orientado por:
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Prof. Do
outor Arqtt. Joaquim José Ferrãão de Oliveira Braiziinha
Co-orientado por:
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aprovada em:
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Lisboa
2013
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I S B O A
Faculdade de Arquitectura e Artes
Mestrado Integrado em Arquitectura
Álvaro Siza Vieira e o Plano do Chiado
João Miguel António Nascimento
Lisboa
Novembro 2013
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I S B O A
Faculdade de Arquitectura e Artes
Mestrado Integrado em Arquitectura
Álvaro Siza Vieira e o Plano do Chiado
João Miguel António Nascimento
Lisboa
Novembro 2013
João Miguel António Nascimento
Álvaro Siza Vieira e o Plano do Chiado
Dissertação apresentada à Faculdade de Arquitectura e
Artes da Universidade Lusíada de Lisboa para a
obtenção do grau de Mestre em Arquitectura.
Orientador: Prof. Doutor Arqt. Joaquim José Ferrão de
Oliveira Braizinha
Co-orientador: Prof. Doutor
Rodrigues Mealha da Costa
Lisboa
Novembro 2013
Arqt.
Jorge
Virgílio
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Ficha Técnica
Autor
Orientador
Co-orientador
João Miguel António Nascimento
Prof. Doutor Arqt. Joaquim José Ferrão de Oliveira Braizinha
Prof. Doutor Arqt. Jorge Virgílio Rodrigues Mealha da Costa
Título
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Local
Lisboa
Ano
2013
Mediateca da Universidade Lusíada de Lisboa - Catalogação na Publicação
NASCIMENTO, João Miguel António, 1987Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado / João Miguel António Nascimento ; orientado por Joaquim
José Ferrão de Oliveira Braizinha, Jorge Virgílio Rodrigues Mealha da Costa. - Lisboa : [s.n.], 2013. Dissertação de Mestrado Integrado em Arquitectura, Faculdade de Arquitectura e Artes da
Universidade Lusíada de Lisboa.
I - BRAIZINHA, Joaquim José Ferrão de Oliveira, 1944II - MEALHA, Jorge, 1960LCSH
1. Centros históricos - Conservação e restauro - Portugal - Lisboa
2. Vieira, Álvaro Siza, 1933- - Crítica e interpretação
3. Chiado (Lisboa, Portugal) - Edifícios, estruturas, etc.
4. Chiado (Lisboa, Portugal) - História
5. Universidade Lusíada de Lisboa. Faculdade de Arquitectura e Artes - Teses
6. Teses - Portugal - Lisboa
1.
2.
3.
4.
5.
6.
Historic districts - Conservation and restoration - Portugal - Lisbon
Vieira, Álvaro Siza, 1933- - Criticism and interpretation
Chiado (Lisbon, Portugal) - Buildings, structures, etc.
Chiado (Lisbon, Portugal) - History
Universidade Lusíada de Lisboa. Faculdade de Arquitectura e Artes - Dissertations
Dissertations, Academic - Portugal - Lisbon
LCC
1. NA9053.H55 N37 2013
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
APRESENTAÇÃO
Álvaro Siza Vieira e o Plano do Chiado
João Miguel António Nascimento
Esta dissertação tem como objetivo o estudo sobre o plano de recuperação elaborado
pelo arquiteto Álvaro Siza Vieira para a área sinistrada do Chiado, após o grande
incêndio de 1988.
Com efeito, a cidade de Lisboa, teve dois momentos na sua história associados a
catástrofes que devastaram áreas inteiras e partes da cidade.
Em ambos os casos, no primeiro com o engenheiro Manuel da Maia e especialmente
no segundo, objeto deste trabalho, com Siza Vieira, o autor aproveitou da melhor
forma a transformação do Chiado, resolvendo problemas e dificuldades de diversa
ordem, provenientes do passado, que dificilmente teriam sido tao bem resolvidas não
tivesse havido uma ocorrência desta natureza.
Embora ainda não concluída, na sua totalidade, vinte e cinco anos depois da tragédia,
esta intervenção, representa certamente um dos maiores projetos da carreira do autor
pela sensibilidade que a zona sinistrada requer, resultante do balanço entre a memória
a preservar e a necessidade de adequação às novas dinâmicas sociais e urbanas.
Lisboa é atualmente considerada uma das cidades mais bonitas do mundo, e sem
dúvida que contribuem para esse facto, os seus 800 anos de história, tendo o Chiado
um papel muito importante nessa história.
Álvaro Siza Vieira, ao optar pela preservação do património existente, não quis cortar
com a história, antes quis contá-la às futuras gerações recriando-a para que possa
continuar a ser por elas vivida.
Palavras-chave: Chiado, Plano Urbano, Siza, Vieira, Projeto, Incêndio, Memória.
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
PRESENTATION
Álvaro Siza Vieira and Chiado’s Plan
João Miguel António Nascimento
This dissertation has the purpose to profoundly study the regeneration plan made by
the architect Álvaro Siza Vieira of the disastered area of Chiado, after the great fire of
1988.
With effect, the city of Lisbon, had two episodes in history related to devastating
catastrophes which shattered entire regions and parts of the city.
In both situations, firstly with the engineer Manuel da Maia and mostly in the second,
subject of this thesis, with Siza Vieira, the author took the best advantage in Chiado’s
reshaping, solving several problems and difficulties from the past, which hardly would
have been worked out if a misfortune as this had not occurred.
Although still not concluded in its fullness, twenty five years after the tragedy, this
intervention certainly represents one of the biggest projects of the author’s career by
the native sensibility of the region, resultant from the balance between retaining the
memoir and the need for adequacy to its modern social and urban dynamics.
Lisbon is actually considered one of the most beautiful cities of the world, and its 800
years of history definitely contribute to this, having Chiado a very important role in it.
Álvaro Siza Vieira, by choosing to preserve the existent patrimony, decided to keep the
history in order to share it with the future generations, reinventing it, so that it would not
be forgotten.
Key words: Chiado, Urban Design, Siza, Vieira, Project, Fire, Memoir.
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Ilustração 1- Olisipo quae nunc Lisboa, civitas amplíssima Lusitaniae, at Tagum, totis
orientis et multarum Insularum et Aphricoeque et Americae emporium nobilissimum.
Autor: Georgie Braunio,1593 ...................................................................................... 25
Ilustração 2 – Planta da Cidade de LX.º em que se mostram os muros de vermelho
com todas as ruas e preaças da Cidade dos muros adentro com as declarações
postas em seu lugar. Autor: Arquiteto João Nunes Tinoco, 1650. ............................... 30
Ilustração 3 – Planta da Baixa Pombalina por Eugénio dos Santos, Carlos Mardel e E.
S. Poppe (adaptado a partir de: Atlas de Lisboa: A Cidade no espaço e no tempo /
Gabinete de Estudos Olissíponenses, 1993) .............................................................. 32
Ilustração 4 – Olisipo quae nunc Lisboa, civitas amplíssima Lusitaniae, at Tagum, totis
orientis et multarum Insularum et Aphricoeque et Americae emporium nobilissimum.
Autor: Georgie Braunio,1593 (Pormenor adaptado) .................................................... 33
Ilustração 5 – Vorstellung von Lisabon vor und in dem erbenden des 1 Novembris
1755. Autor: Desconhecido. Exposto em: Museu da Cidade, Lisboa .......................... 37
Ilustração 6 – Planta da Baixa Pombalina por Eugénio dos Santos, Carlos Mardel e E.
S. Poppe, 1780. Atlas de Lisboa: A Cidade no espaço e no tempo / Gabinete de
Estudos Olissíponenses, 1993.................................................................................... 42
Ilustração 7 – Planta nº1. Planta da Baixa Pombalina por Gualter Fonseca e Pinheiro
da Cunha. 2000, Álvaro Siza e a reconstrução do Chiado .......................................... 44
Ilustração 8 – Planta nº2. Planta da Baixa Pombalina por Sebastião e Domingos
Poppe. 2000, Álvaro Siza e a reconstrução do Chiado ............................................... 45
Ilustração 9 – Planta nº3. Planta da Baixa Pombalina por Eugénio dos Santos e Carlos
Andrea. 2000, Álvaro Siza e a reconstrução do Chiado) ............................................. 45
Ilustração 10 – Planta nº4. Planta da Baixa Pombalina por Gualter Fonseca. 2000,
Álvaro Siza e a reconstrução do Chiado ..................................................................... 46
Ilustração 11 – Planta nº5. Planta da Baixa Pombalina por Eugénio dos Santos e
Carlos Mardel. 2000, Álvaro Siza e a reconstrução do Chiado ................................... 46
Ilustração 12 – Rua Garrett, Lisboa, Portugal, Estúdio Horácio Novais, 193?-198?
(Estúdio Horácio Novais) ............................................................................................ 50
Ilustração 13 – Rua Garrett, Lisboa, Portugal, Estúdio Horácio Novais, 193?-198?
(Estúdio Horácio Novais) ............................................................................................ 51
Ilustração 14 – Largo do Chiado, Lisboa, Portugal, Estúdio Mário Novais, 193?-198?
(Estúdio Mário Novais) ................................................................................................ 51
Ilustração 15 – Rua Garrett, Lisboa, Portugal, Estúdio Mário Novais, 193?-198?
(Estúdio Mário Novais) ................................................................................................ 52
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Ilustração 16 – O Incêndio do Chiado, Revista de Lisboa, 1988, Revista municipal de
Lisboa ......................................................................................................................... 53
Ilustração 17 – Incêndio Chiado, Bombeiros de Lisboa, 1988 (Bombeiros Lisboa) ..... 54
Ilustração 18 – Armazéns Grandela, Fachada Rua do Carmo, 2000, Álvaro Siza e a
reconstrução do Chiado .............................................................................................. 55
Ilustração 19 – Armazéns Grandela, Após o Incêndio, 2000, Álvaro Siza e a
reconstrução do Chiado .............................................................................................. 55
Ilustração 20 – Armazéns do Chiado, Ruínas, 2000, Álvaro Siza e a reconstrução do
Chiado ........................................................................................................................ 56
Ilustração 21 – Armazéns do Chiado, Ruínas, 2000, Álvaro Siza e a reconstrução do
Chiado ........................................................................................................................ 56
Ilustração 22 – Fotografia aérea sobre a frente marítima de Leça da Palmeira, 2013,
ilustração nossa .......................................................................................................... 64
Ilustração 23 – Edifícios do Chiado em chamas,1988, Revista municipal de Lisboa ... 70
Ilustração 24 – Fachada dos Armazens do Chiado destruídas pelas chamas, 2013,
Chiado em Detalhe (esquerda) ................................................................................... 70
Ilustração 25 – Fachada do edifício Grandella destruída pelas chamas, 2013, Chiado
em Detalhe (direita) .................................................................................................... 70
Ilustração 26 – Vista aérea sobre o Chiado, 2013, Ilustração nossa ........................... 73
Ilustração 27 – Corte entre a Rua do Ouro e a Rua Ivens, 2013, Chiado em Detalhe . 73
Ilustração 28 – Alçado da Rua do Carmo pertencente ao Cartulário Pombalino, 2013,
Chiado em Detalhe ..................................................................................................... 75
Ilustração 29 – Esquisso ilustrativo do Chiado, 2013, Chiado em Detalhe .................. 76
Ilustração 30 – Blocos de intervenção na recuperação do Chiado, 2013, Chiado em
Detalhe ....................................................................................................................... 78
Ilustração 31 – Cortes demonstrativos da função urbanizadora dos Armazéns Chiado e
Grandella, 2000, A Recuperação do Chiado ............................................................... 79
Ilustração 32 – Vista aérea sobre o Chiado demonstrando a nova ligação, 2013,
Ilustração nossa.......................................................................................................... 80
Ilustração 33 – Alçado dos Terraços do Carmo, 2013, Chiado em Detalhe ................ 81
Ilustração 34 – Vista aérea sobre o Chiado com ilustração da divisão da área de
intervenção em blocos, 2013, Chiado em Detalhe ...................................................... 83
Ilustração 35 – Corte que longitudinal à Rua Garrett a passar pelo interior do
quarteirão mostrando a distancia entre o pátio e o acesso ao metro, 2013, Chiado em
Detalhe ....................................................................................................................... 85
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Ilustração 36 – Planta do Bloco A, 2013, Chiado em Detalhe, ilustração nossa .......... 86
Ilustração 37 – Acesso ao Bloco A através da Calçada de São Francisco, 2013,
Ilustração nossa.......................................................................................................... 87
Ilustração 38 – Escadas de acesso à parte superior do pátio, 2013, Chiado em Detalhe
................................................................................................................................... 87
Ilustração 39 – Corte longitudinal ao acesso entre o Pátio A e a Rua Ivens, 2013,
Chiado em Detalhe ..................................................................................................... 88
Ilustração 40 – Fotografia do Pátio A, 2013, Ilustração nossa..................................... 88
Ilustração 41 – Fotografia do acesso entre a Rua Ivens e o Pátio A, 2013, Ilustração
Nossa ......................................................................................................................... 88
Ilustração 42 – Esquisso ilustrativo do Pátio A, 2013, Chiado em Detalhe .................. 89
Ilustração 43 – Planta do Bloco B, 2013, Chiado em Detalhe, Ilustração nossa.......... 90
Ilustração 44 – Vista aérea sobre o Chiado. A amarelo está delimitado o Largo do
Carmo, a azul a Rua Garret e a Vermelho a Rua do Carmo, 2013, Ilustração nossa .. 91
Ilustração 45 – Bloco B – a verde está o edifício José Alexandre, a rosa está o edifício
Lionel, a vermelho está a ligação entre o pátio e a Rua do Carmo, a azul está o
primeiro momento do Pátio e a Laranja está o segundo momento do Pátio , 2013,
Ilustração nossa.......................................................................................................... 92
Ilustração 46 – Primeiro momento do Pátio B marcado pelo ritmo do edifício José
Alexandre, 2013, Ilustração nossa .............................................................................. 93
Ilustração 47 – Fachada em ruinas que demarca a transição entre momentos do Pátio
B, 2013, Ilustração nossa ........................................................................................... 93
Ilustração 48 – Alçado da Rua do Carmo com a entrada para o Pátio B, 2000, Álvaro
Siza e a recuperação do Chiado ................................................................................. 93
Ilustração 49 – Pormenor do corrimão do acesso entre a Rua do Carmo e o Pátio B,
2013, Chiado em Detalhe ........................................................................................... 94
Ilustração 50 – Adaptação da imagem de Giorgie Braunio sobre Lisboa. Imagem
adaptada para focar as existentes Escadinhas da Piedade, 2013, Ilustração nossa ... 95
Ilustração 51 – Corte explicativo da ligação entre o Pátio B e a Porta Sul do Convento
do Carmo, 2000, Álvaro Siza e a reconstrução do Chiado .......................................... 96
Ilustração 83 – Esquisso sobre o Pátio B, 2013, Chiado em Detalhe (esquerda) ........ 97
Ilustração 53 – Planta da ligação entre o Pátio B e a porta sul do Convento do Carmo,
2000, Álvaro Siza e a reconstrução do Chiado ........................................................... 97
Ilustração 54 – Planta do Bloco C, 2013, Chiado em Detalhe, Ilustração Nossa ......... 98
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Ilustração 55 – Alçado frontal dos Armazéns do Chiado, 2013, Chiado em Detalhe (em
cima)........................................................................................................................... 98
Ilustração 87 – Alçado tardoz dos Armazéns do Chiado, 2013, Chiado em Detalhe (em
baixo) .......................................................................................................................... 99
Ilustração 57 – Corte que demonstra a permeabilidade do edificio entre a Rua do
Crucifixo e a Rua nova do Almada, 2013, Chiado em Detalhe .................................... 99
Ilustração 58 – Fotografia Do acesso ao metro pela Rua do Crucifixo, 2013, Ilustração
nossa (esquerda) ...................................................................................................... 101
Ilustração 59 – Corte pelas Escadinhas do Espirito Santo, 2013, Chiado em Detalhe
................................................................................................................................. 101
Ilustração 60 – Esquisso ilustrativo da plataforma de metropolitano Baixa-Chiado,
2013, Chiado em Detalhe ......................................................................................... 102
Ilustração 61 – Vista aérea sobre o Chiado com assinalação dos acessos ao
metropolitano, 2013, Ilustração nossa ...................................................................... 103
Ilustração 62 – Esquisso ilustrativo da ligação interna da estação Baixa-Chiado, 2013,
Ilustração nossa........................................................................................................ 103
Ilustração 63 – Fotografias da estação de metro, mostrando o corredor de circulação
(esquerda) por cima da plataforma (direita), 2013, Ilustração nossa ......................... 104
Ilustração 64 – Alçado frontal do edificio Grandella, 2000, Álvaro Siza e a reconstrução
do Chiado ................................................................................................................. 105
Ilustração 65 – Planta do edifício Grandella à cota da Rua do Ouro, 2000, Álvaro Siza
e a reconstrução do Chiado (esquerda) .................................................................... 106
Ilustração 66 – Planta do piso tipo do edifício Grandella, 2000, Álvaro Siza e a
reconstrução do Chiado (direita) ............................................................................... 106
Ilustração 67 – Corte perpendicular à Rua do Ouro, sobre o edifício Grandella, 2000,
Álvaro Siza e a reconstrução do Chiado (direita) ...................................................... 107
Ilustração 68 – Esquisso ilustrativo do Chiado, 2013, Chiado em Detalhe ................ 108
Ilustração 69 – Vista aérea sobre Algés, 2013, Ilustração nossa .............................. 109
Ilustração 70 – Limite da área de intervenção, 2013, Ilustração nossa ..................... 110
Ilustração 71 – Linha preexistente que originou o novo limite, 2013, Ilustração nossa
................................................................................................................................. 113
Ilustração 72 – Novo sistema viário, 2013, Ilustração nossa ..................................... 114
Ilustração 73 – Corte explicativo perpendicular à linha ferroviária, 2013, Ilustração
nossa ........................................................................................................................ 114
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Ilustração 74 – Relação de continuidade entre as ruas existentes e o novo Parque
Urbano, 2013, Ilustração nossa ................................................................................ 115
Ilustração 75 – Diagrama ilustrativo dos edifícios a recuperar e reintegrar, 2013,
Ilustração nossa........................................................................................................ 115
Ilustração 76 – Proposta de Plano urbano para a frente marítima do Dafundo, 2013,
Ilustração nossa........................................................................................................ 116
Ilustração 77 – Diagrama com novos espaços, novos usos e novos espaços, 2013,
Ilustração nossa........................................................................................................ 116
Ilustração 78 – Fotomontagem do limite desenhado pela ciclovia, 2013, Ilustração
nossa ........................................................................................................................ 117
Ilustração 79 – Sobreposição de cortes ilustrativa da transição através do nexo urbano,
2013, Ilustração nossa .............................................................................................. 121
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
SUMÁRIO
Sumário ...................................................................................................................... 22
Introdução................................................................................................................... 23
1. O Chiado ................................................................................................................ 25
1.1. O Chiado até ao terramoto de 1755 ................................................................ 26
1.2. O Chiado do terramoto ao incêndio ................................................................. 36
1.3. O Chiado após o incêndio ............................................................................... 53
1.4. O Convite Institucional ..................................................................................... 57
2. A Obra de Álvaro Siza Vieira .................................................................................. 59
3. A Reconstrução do Chiado..................................................................................... 69
3.1. Situação de Partida ......................................................................................... 69
3.2. Os objetivos..................................................................................................... 76
3.3. O Projeto ......................................................................................................... 83
3.3.1. Bloco A ..................................................................................................... 84
3.3.2. Bloco B ..................................................................................................... 90
3.3.3. Bloco C ..................................................................................................... 97
4. Projeto académico – Parque Urbano .................................................................... 109
5. Considerações Finais ........................................................................................... 122
6. Referencias .......................................................................................................... 125
7. Bibliografia ........................................................................................................... 129
8. Anexos ................................................................................................................. 131
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
INTRODUÇÃO
É objetivo desta dissertação, o estudo do plano de recuperação do Chiado, efetuado
pelo arquiteto Álvaro Siza Vieira, após o incêndio ocorrido em 1988 em que ficaram
destruídas uma enorme zona e diversos edifícios naquela parte da cidade,
compreendida entre a Rua do Carmo, Rua Nova do Almada, Rua do Crucifixo e Rua
Garrett.
Este plano, embora tratando-se de um projeto de grande complexidade, é de um
conceito e simplicidade ímpares, tendo em conta que se pretende recuperar parte da
cidade, com um grande peso histórico e cultural e que, por conseguinte, era
fundamental preservar para a posteridade.
Efetivamente Siza Vieira foi a pessoa indicada para desenhar este plano, sendo que a
proposta desenvolvida é uma solução simples, condição indispensável, para uma
intervenção deste tipo, que nunca poderia ser radical, sob pena de romper com a
história, e o património inquestionável daquela zona.
Trata-se de uma das áreas mais importantes da cidade de Lisboa, o que me suscitou o
interesse, ao escolher este tema, quer na qualidade de cidadão utente, quer por se
tratar de um exemplo de grande relevância para a conclusão final do meu percurso
académico, atendendo à minha clara preferência pelo estudo de arquitetura à escala
da cidade
Não sendo possível, nem objetivo deste trabalho, abraçar todas as vertentes desta
intervenção, que são diversas, e que era de todo impossível faze-lo, concentrar-me-ei
apenas na que diz respeito ao desenho urbano e às medidas inovadoras que o plano
introduz.
No que diz respeito à estrutura do trabalho, este organiza-se em cinco capítulos.
No primeiro capítulo é feita uma abordagem ao contexto histórico do Chiado, desde a
sua origem até aos dias que correm, dividido pelas duas grandes catástrofes que se
abateram sobre aquela área, ao longo da sua existência. É também neste capítulo que
se entende quais são os marcos territoriais, e qual a sua importância ao longo da
história do Chiado.
João Miguel Nascimento
23
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
No segundo capítulo, é feita um breve estudo sobre o arquiteto Álvaro Siza Vieira,
tentando, de algum modo, demonstrar a sua competência e mestria ao nível de ideia e
conceção de projeto.
No terceiro capítulo é profundamente analisado o Plano de Recuperação do Chiado,
em três tempos diferentes, a saber: a Situação de Partida, os Objetivos, o Projeto. No
que respeita à situação de partida, é referente às condições em que o arquiteto
encontra a área de intervenção, à data do incêndio, e qual é a sua leitura sobre o
fragmento urbano em que vai intervir. No subcapítulo dos objetivos faz-se a
abordagem, à ideia de Siza, para o Chiado, na base da continuidade entre Chiado e os
bairros adjacentes e a importância da sua memória. Este capítulo é concluído com o
estudo do projeto do Chiado, que está organizado em três partes, onde será analisada
cada intervenção, e que consequências desencadeou.
O quarto capítulo é uma inserção do projeto académico, desenvolvido ao longo do
quinto ano de curso, e que se entende que possui diversas similaridades com o tema
central desta dissertação.
No quinto, e último capitulo, são apresentadas as considerações finais sobre o tema
em estudo.
João Miguel Nascimento
24
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
1. O CHIADO
A cidade de Lisboa, situada ao longo da margem norte do rio Tejo, constrói-se nas
várias colinas e planaltos resultantes da topografia deste sítio. Vista do rio, Lisboa é
como um anfiteatro de grande escala, construída em socalcos nas encostas, e
priviligiando diversos pontos de vista sobre si mesma e do que a rodeia. Esta situação
pode ser visiualizada na gravura de G. Braunio, “Panorâmica sobre Lisboa”, do século
XVI, onde facilmente se percebe esta característica da cidade.
Ilustração 1- Olisipo quae nunc Lisboa, civitas amplíssima Lusitaniae, at Tagum, totis orientis et multarum Insularum et Aphricoeque et
Americae emporium nobilissimum. Autor: Georgie Braunio,1593
A zona do Chiado, incorporado na área central protegida da cidade de Lisboa,
conhecida como Baixa Pombalina, situa-se na colina a oeste, elevada sobre a parte
mais baixa da cidade, entre a atual Rua Garrett e o Largo das Duas Igrejas,
desenvolvendo-se das ruas do Carmo e Nova do Almada até à Boa-Hora, absorvendo
todos os arruamentos que nela convergem.
João Miguel Nascimento
25
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Ao contrário de outros sítios com grande relevância na cidade de Lisboa, como o
Rossio e o Terreiro do Paço, em que os seus contextos, urbano e arquitetónico, se
sobrepõem a todos os outros, o Chiado, transporta um quotidiano sociocultural de tal
maneira caracterizador que se pode toma-lo enquanto vivência e recordação, para
além da sua componente urbanística.
Na realidade, a força do quotidiano vivido no local, empolado por uma literatura que
quase o tornou lendário, apagou uma arquitetura pouco acima do banal e subverteu um
contexto urbanístico não delineado por artista ou imposto por qualquer decisão real,
mas que se rasgou, espontaneamente, através de pedreiras e socalcos, para dar
passagem e servir os homens que por ali se foram fixando. (Moita, 1988 p. 3).
Este desenho de “pé posto” feito pelos utilizadores ao longo do tempo, torna-se de tal
maneira forte e marcado naquela área, que leva os responsáveis pelo plano de
recuperação da Lisboa do pós-terramoto a apenas regularizar a marcação já existente.
Neste capítulo pretende-se contextualizar o Chiado no tempo e no espaço, abordando
a sua história, e evidenciando o seu cariz sociocultural.
1.1. O CHIADO ATÉ AO TERRAMOTO DE 1755
O nome “Chiado” tem origem no século XVI, e foi atribuído ao pequeno troço
compreendido entre a Rua Direita das Portas de Santa Catarina (atual Rua Garrett),
que vai dos Armazéns do Chiado até à Cordoaria Velha, junto da muralha Fernandina.
Segundo Alberto Pimentel1 e Matos Sequeira2, o nome «Chiado» surge como alcunha
de Gaspar Dias, que foi dono de uma taberna naquela subida.
1
Alberto Augusto de Almeida Pimentel, (1849-1925) foi um escritor e jornalista português, nascido no
Porto a 14 de abril de 1849. Inicia a sua carreira jornalística como tradutor e revisor no Jornal do Porto.
Enquanto escritor, publicou dezenas de romances, biografias, poesia, contos, teatro contos crónicas e
folhetins. Em 1901 escreveu uma biografia sobre António Ribeiro, “O Poeta do Chiado”. Faleceu em
Queluz, em 1925.
2
Gustavo Adriano Matos Sequeira, também conhecido apenas por Matos Sequeira, (1880-1962), foi um
jornalista, escritor e politico lisboeta. Em 1915 assume o cargo de comissário interino do governo, tendo
posteriormente sido promovido a comissário efetivo. Enquanto ocupou este cargo, foi autor de várias
investigações acerca da história do teatro, tendo publicado vários livros acerca do tema. Ainda em 1915,
torna-se chefe do gabinete do Ministro das Finanças. Em 1931 é preso, acusado de participar nas
preparações de uma revolução. Foi poeta, dramaturgo e escritor, escreveu diversos livros, sobre a
História de Lisboa. Faleceu a 21 de Agosto de 1962, com 81 anos de idade.
João Miguel Nascimento
26
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Porém, antes de Alberto Pimentel ter encontrado um documento que reforçava a teoria
anterior, Eduardo Freire de Oliveira3 explicava a origem do nome, afirmando que o
mesmo provinha do chiar das pesadas e pouco maleáveis viaturas ao vencer a rampa
em curva que dava acesso à Rua Direita.
Em inícios do século XVIII o topónimo já se referia a toda a Rua Direita das Portas de
Santa Catarina. Este nome só passa a ser confirmado pelo Município em 1859, no
Edital de 1 de Setembro, mas por muito pouco tempo visto que, em 1880, no Edital de
14 de Junho, se batizava a artéria de Rua Garrett, como ainda hoje a conhecemos, em
homenagem ao poeta Almeida Garrett4. Homenagem esta de certa maneira falhada,
visto que ainda hoje chamamos esta área de Chiado.
Na Idade Média, o sítio a que hoje chamamos de Chiado, era apelidado de Pedreira e
só mais tarde passa a designar-se por Pedreira de Santa Catarina. A Pedreira, era
uma plataforma rochosa que a poente terminava numa escarpa sobre Valverde e o
esteiro do Tejo.
Não há qualquer registo ou conhecimento de quaisquer povoações que habitassem
este sítio até à data da conquista de Lisboa aos mouros. Anterior a esta apenas há
rumores de um suposto palácio de um cônsul romano de Olissipo, situado onde
posteriormente se ergueram os Paços dos Duques de Bragança.
Já existente e certamente uma herança da época romana, era a estrada da pedreira o
eixo que fazia a ligação entre o Olissipo aos lugares mais a oeste: Orta Navia, o
Santuário dos Santos Mártires, Fonte Santa, entre outros. A esta estrada foi
posteriormente acrescentado um troço de acesso ao interior da Muralha Fernandina, a
mais recente, Rua Direita de Santa Catarina. Esta rua, já anteriormente mencionada, é
a antecessora da Rua Garrett dos nossos tempos.
3
Eduardo Freire de Oliveira, arquivista da Câmara Municipal de Lisboa, e autor da publicação Elementos
para a História do Município de Lisboa, para comemoração do centenário de Marquês de Pombal em
1882.
4
João Baptista da Silva Leitão de Almeida Garrett (1799-1854), nascido no Porto a 4 de fevereiro de1799,
foi escritor e dramaturgo romântico, orador, par do reino, ministro e secretário de estado honorário
português. Foi um grande impulsionador do teatro em Portugal, e uma das maiores figuras do romantismo
português. Foi Almeida Garrett que propôs a edificação do Teatro Nacional D. Maria II e a criação do
Conservatório de Arte Dramática.
João Miguel Nascimento
27
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Este antigo caminho do alto da Pedreira, foi, até às obras do Aterro da Boavista5 no
século XIX, o único acesso a sítios como Alcântara e Belém. Constitui assim, um eixo
de ligação com grande importância na história de Lisboa, por ter servido todos e de
todo o tipo de acontecimentos que por ali passaram.
De acordo com Irisalva Moita6, data de 1147, a primeira construção erguida na
Pedreira. A Ermida de Nossa Senhora dos Mártires, sobre o que hoje é o Largo do
Corpo Santo, ergue-se no sítio onde os cruzados saxónicos acamparam, e onde
enterraram os seus mortos.
Só em 1217, se volta a construir junto da Ermida, durante o reinado de D. Afonso II7. O
Convento de São Francisco, que durante os seus seis séculos de existência, foi alvo
de vários retoques, embelezamentos e sucessivas ampliações. Este convento ganhou
popularidade e o carinho dos fiéis, e foi de tal maneira influente que até aquela área da
pedreira passou a chamar-se a Barroca de São Francisco.
A norte da Rua Direita, existia a pequena Ermida de Santa Catarina, reminiscente das
primeiras monarquias. No século XIII, sob influência de D. Soeiro Viegas8, a ermida é
doada aos frades da Ordem da Santíssima Trindade da Redenção dos Cativos, que
junto a esta vão construir um hospital e um albergue. Esta pequena ermida é a origem
do grande Convento da Trindade, que depois de muito danificado pelo terramoto
acaba por ficar ao abandono com a extinção das ordens religiosas em 1834, deixando
assim no local várias referências ao seu nome, como exemplo a Rua da Trindade, o
teatro da Trindade, a cervejaria Trindade, entre outros.
Ao início da Rua Direita da Pedreira, existia desde data anterior a 1279, a Casa do
Santo Espirito da Pedreira, onde pontificava uma irmandade de nobres e mercadores
e funcionava também um hospital. Mais tarde, a edificação é transformada no
5
Aterro da Boavista, ou o Grande Aterro foi uma intervenção urbanística em Lisboa, e constitui uma das
maiores obras públicas na cidade do século XIX. Esta obra permitiu a ligação do Cais do Sodré a
Alcântara, através da Avenida 24 de Julho.
6
Irisalva Moita (1924-2009), investigadora lisboeta. Publicou diversos artigos, catálogos, exposições e
relatórios de campanhas arqueológicas. A sua obra, é em grande parte dedicada a Lisboa. Foi Irisalva
que dirigiu as escavações pioneiras do Teatro Romano, do Hospital de Todos-os-Santos e da Casa dos
Bicos.
7
D. Afonso II de Portugal (1185-1223), com o cognome de O Gordo, foi o terceiro rei de Portugal, filho de
Sancho I e sua mulher D. Dulce de Aragão. D Afonso II foi coroado em 1211. Casou com D. Urraca de
Castela. Foi durante o seu reinado que as cidades de Alcácer do Sal, Borba, Vila Viçosa e Veiros, foram
tomadas aos Mouros.
8
D. Soeiro Viegas (1232) foi o quarto Bispo de Lisboa pós restauração da diocese em 1147. Com uma
enorme ascensão na carreira episcopal, tornou-se conselheiro principal do rei D. Afonso II, tendo sido
imprescindível ao rei nos seus conflitos com as suas irmãs.
João Miguel Nascimento
28
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Convento do Espírito Santo da Pedreira, ficando a fazer barreira à Rua Direita, e
cortando a ligação direta entre a Baixa e o Chiado. Após a extinção das ordens, passa
a designar-se por Palácio dos Barcelinhos.
Hoje, são conhecidos como os Armazéns do Chiado.
São também de grande importância as casas que D. Dinis mandou construir para a
Fundação Estudo Geral9 em 1290, que mais tarde, com a transferência da fundação
para Coimbra, são doadas a Manuel Passanha10. Já no século XIX, após doações,
trocas e descendências, o estado acaba por comprar estas casas. Nelas estiveram
sediadas várias entidades, como: a Administração dos Caminhos de Ferro, o Liceu
Nacional, o Liceu feminino Dona Maria Amália Vaz de Carvalho e uma secção do liceu
Passos Manuel.
No início do século XV, aparece neste núcleo religioso da Pedreira, o Convento de
Nossa Senhora do Carmo, construído por ordem de D. Nuno Álvares Pereira11. É um
monumento que pretende honrar as conquistas frente aos castelhanos. É também
nesta época que surge o Palácio dos Duques de Bragança, que se situa a poente do
Convento de São Francisco, junto da atual Rua Serpa Pinto. O Palácio acaba por ruir
em 1755 com o terramoto e não volta a ser construído.
Foram estes núcleos aglutinadores de devotos e centralizadores de populações que,
em conexão com a pré-existente Rua Direita, eixo acionador de todo o urbanismo
local, vão condicionar o espectro viário e habitacional do Bairro da Pedreira. Venerável
antepassado do Chiado. (Moita, 1988 p. 9)
9
Escola superior criada em Lisboa, em 1290, por iniciativa do clero e com apoio do rei D. Dinis. É
considerada a 1ª universidade portuguesa.
10
Micer Manuel Passanha, vindo de Génova, entrou ao serviço em Portugal durante o reinado de D. Dinis
com a função de reorganizar a armada portuguesa. Tornou-se detentor do titulo de Almirante de Portugal.
Participou nas batalhas que opuseram Castela a Portugal, e foi feito prisioneiro depois da batalha do
Cabo de São Vicente em 1337, tendo sido libertado em 1339. Foi também comandante da Armada
Portuguesa na Batalha do Salgado (1340). Foi assassinado em 1383 no Castelo de Beja.
11
D. Nuno Álvares Pereira (1360-1431), também conhecido como o Santo Condestável foi um
guerreiro português que desempenhou um papel fundamental na independência de Portugal
contra Castela. O guerreiro, foi também o 2º Condestável de Portugal, 38º Conde de Barcelos,
3º Conde de Ourém e 2º Conde de Arraiolos. Camões faz várias vezes referência ao
Condestável em “Os Lusíadas”, gabando-o do serviço prestado a Portugal. Após a morte da
sua mulher, tornou-se Carmelita. Entrou na Ordem por volta de 1423 no Convento do Carmo e
lá permaneceu até à sua morte.
João Miguel Nascimento
29
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
De facto, a estrutura viária existente, resulta da necessidade de criar acessos entre a
parte baixa da cidade e a Rua Direita e também, entre esta e as casas nobres e
conventos, ou mesmo entre os vários conventos e a parte baixa.
Observamos facilmente essa necessidade, através do pormenor retirado da planta de
Lisboa de 1650, do arquiteto João Nunes Tinoco.
Ilustração 2 – Planta da Cidade de LX.º em que se mostram os muros de vermelho com todas as ruas e praças da Cidade dos muros
adentro com as declarações postas em seu lugar. Autor: Arquiteto João Nunes Tinoco, 1650.
É desta maneira que se começam a estruturar as quatro vias principais de acesso à
Pedreira. Para quem vinha de norte, chegava à Pedreira a partir da Calçada de Paio
de Novais, que na sua parte final coincide com a atual Rua do Carmo.
A Calçada de Paio de Novais, aquando da bifurcação, seguindo pela via à direita vai
desembocar diretamente à rua direita da Pedreira, se seguir a via da esquerda vai dar
diretamente ao Rocio (Rossio), através do Caracol do Carmo.
João Miguel Nascimento
30
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Designa-se por Caracol do Carmo à parte do troço, muito ingreme, pertencente à
Calçada de Paio de Novais, que se constrói através de vários lanços de escada, para
vencer a topografia. Este era o caminho mais curto entre o Rossio e o Convento do
Carmo.
Para quem queria chegar à Pedreira vindo de sul, o acesso era feito a partir da
Calcetaria (antigo Canal de Flandres), sítio onde se construiu o Convento de Nossa
Senhora da Boa-Hora no século XVII (por Morrás e Fangas da Farinha) até às Casas
do Espirito Santo, hoje conhecidas como Armazéns do Chiado. Este caminho é hoje a
Rua Nova do Almada, mandada construir mais tarde, no século XVII por Rui
Fernandes de Almada12.
Quem chegava vindo da Barroca de São Francisco, apenas bastava subir a íngreme
Calçada de São Francisco, e tomar o caminho anterior, equivalente à Rua Nova do
Almada.
Na Pedreira, a partir da Rua Direita, arrancam várias ruas na perpendicular. Numa
tentativa de paralelismo sobre si mesmas, estas ruas procuram fazer ligação a norte
com os Conventos do Carmo e da Trindade, e a sul, com o Convento de São
Francisco, a Igreja da Nossa Senhora dos Mártires, e já mais para oeste com o
Palácio dos Duques de Bragança.
Depois da catástrofe de 1755, a reconstrução do Bairro da Pedreira, trouxe alguns
condicionamentos urbanísticos ao revolucionário traçado pombalino.
A reconstrução da pré-existente Rua do Chiado, assim como dos principais edifícios
que anteriormente já traziam as pessoas à Pedreira, nomeadamente: Os Conventos
de São Francisco, Carmo, Trindade e do Espírito Santo, levaram a que os arquitetos
responsáveis pela intervenção pombalina, respeitassem a organização já existente,
limitando-se apenas a regulariza-la e adequa-la ao novo projeto.
12
Rui Fernandes de Almada, Fidalgo do século XVII, provedor da casa da Índia. Enquanto presidente do
Senado de Lisboa, em 1665 manda abrir uma rua perpendicular à Rua Garrett, no Chiado, que acabaria
por herdar o seu nome, Rua Nova do Almada.
João Miguel Nascimento
31
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Ilustração 3 – Planta da Baixa Pombalina por Eugénio dos Santos, Carlos Mardel e E. S. Poppe (adaptado a partir de: Atlas de Lisboa: A
Cidade no espaço e no tempo / Gabinete de Estudos Olissíponenses, 1993)
Muitas das ruas que hoje existem naquela zona, coincidem ainda com a estrutura
anterior, ou, pelo menos, a sua existência foi relevante aquando da reconstrução. A
imagem anterior é um pormenor da sobreposição da planta de Lisboa medieval e da
intervenção pombalina, onde é fácil observar que as estruturas coincidem.
Por volta de inícios do século XV, D. Manuel13, em tentativa de combater o
despovoamento das zonas ruralizadas em torno do centro da cidade, inicia fora das
muralhas a urbanização de Vila Nova de Andrade (Bairro Alto).
Como se pode observar no pormenor retirado da panorâmica de Braunio, existe um
enorme contraste entre a estrutura medieval no interior da muralha fernandina, com a
malha regular do Bairro Alto.
13
D. Manuel (1469-1521), também conhecido pelo seu cognome de O Venturoso ou O Afortunado, foi
décimo quarto rei de Portugal. Em 1495, em circunstâncias especiais, ascende ao trono sucedendo o seu
primo D. João II. A sua investida na expansão do império português levaram a que durante o seu reinado,
fosse descoberto por Vasco da Gama, o caminho marítimo para a India e, em 1500, do Brasil por Pedro
Álvares Cabral. Realizou diversas obras de arquitetura, com uma enorme ligação ao mar, cujo estilo ficou
apelidado de Manuelino.
João Miguel Nascimento
32
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Ilustração 4 – Olisipo quae nunc Lisboa, civitas amplíssima Lusitaniae, at Tagum, totis orientis et multarum Insularum et Aphricoeque et
Americae emporium nobilissimum. Autor: Georgie Braunio,1593 (Pormenor adaptado)
Nesta altura, a Pedreira, devido à sua localização central, e à proximidade de
conventos e espaços religiosos, passa a ser um sítio fortemente procurado pela alta
nobreza do reino. Este facto levou à construção de vários palácios na Pedreira durante
os séculos XVI e XVII, sendo que, grande parte destes ruiu em 1755, dando então
lugar à reconstrução pombalina, que salvaguardou apenas a reconstrução dos
conventos, das igrejas e do Palácio dos marqueses de Valadares.
As Portas de Santa Catarina marcavam a entrada na antiga Lisboa. A sua demolição
em 1702, assim como o facto de a muralha fernandina estar parcialmente destruída,
ou incorporada em construções mais recentes, foram fatores que deram o mote para a
extensão do Bairro da Pedreira até aos bairros mais a oeste, principalmente ao Bairro
de Vila Nova de Andrade, situado imediatamente a seguir à Pedreira.
João Miguel Nascimento
33
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
O Bairro da Pedreira/Chiado era, pois, já antes do Terramoto de 1755, portador de
potencialidades que, mercê de várias circunstâncias, irão desenvolver-se a partir de
finais do século XVIII, explodindo no século XIX no mítico Chiado oitocentista, centro
de janotas e de boémia intelectual, de lazer e de requinte, onde ia toda a Lisboa
quando pretendia adquirir o melhor e o mais raro. (Moita, 1988 p. 17)
Assim, a conjuntura do quotidiano do Chiado apontava já para o tornar um bairro
privilegiado de Lisboa.
A abrangência das suas Igrejas que reuniam a mais alta nobreza, os Conventos e as
poderosas irmandades nestes instaladas, eram procurados tanto pelos ricos, como por
pobres, em busca de sopa que os frades distribuíam. Assim, todas as classes
acabavam por frequentar aquelas ruas, fortificando o quotidiano acima referido.
Por outro lado, o Chiado era também uma zona de habitacional, onde muitas famílias
da nobreza e alta burguesia tinham os seus palácios. Bem situado quanto ao centro
económico da cidade, era um ponto obrigatório de passagem, originando assim muito
comércio fixo e ambulante nas suas ruas, mas que se manifesta com maior incidência
na Rua Direita das Portas de Santa Catarina.
[…] Possuía importantes centros artesanais, como a Cordoaria Velha e a Cordoaria
Nova que deixaram vestígios na toponímia, e numerosas oficinas de ferrador, latoeiro,
marceneiros, barbeiros, dentistas, sangradores, carvoeiros, etc., nomeadas nos «Rois
dos Confessados» e «Registos Paroquiais», largamente citados por Matos Sequeira, e
bem servido de boticas, leitarias, confeitarias, tabernas e até uma casa de venda de
neve que remontava ao século XVII, reclamadas nas Gazetas, que abasteciam os
moradores locais e animavam o comercio. (Moita, 1988 p. 17)
No que diz respeito ao meio cultural, tanto o Chiado como o Bairro Alto, estão agora
recheados de Livrarias e Tipografias, como a Bertrand fundada em 1747 e ainda hoje
em funcionamento. Para além destas lojas, os Conventos da Trindade e São
Francisco são detentores de autenticas bibliotecas-arquivo, disponíveis não apenas
para os frades, mas também, para os mais interessados.
Foi ainda desenvolvida uma escola, pelos membros do Convento do Espírito Santo,
equipada com uma bela biblioteca e um departamento de ciências, onde exerceram
homens de renome, como: Bartolomeu de Quental14, Manuel Bernardes15 e J. Baptista
14
Bartolomeu de Quental (1626-1698), foi um padre e escritor religioso português do século XVII.
Estudou na Universidade de Évora as disciplinas de Teologia e Filosofia. Em 1653 é nomeado Sacerdote,
e em 1654 é nomeado por D. João IV, Capelão, Confessor e Pregador da Capela Real. Recebe do Papa
Clemente XI, o titulo de Venerável.
15
Manuel Bernardes (1644-1710), foi um presbítero da Congregação do Oratório de S. Filipe Neri.
Escreveu diversas obras sobre a espiritualidade cristã. As suas obras, caracterizam-se pela pureza da
João Miguel Nascimento
34
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
de Castro, alguns dos quais foram responsáveis pelo ensino da filosofia e ciências
experimentais em Portugal.
Desde cedo que a vida artística pública mostra interesse naquelas ruas, antecedendo
o Theatro de Opera do Bairro e os Pateos das Comédias que eram palco de atuações
ao vivo.
Fangas da Farinha era um dos mais conhecidos, situado na Boa Hora, no mesmo sítio
onde mais tarde se ergue o Hospital de Todos os Santos. Também a casa da ópera,
Academia da Trindade, onde mais tarde se constrói o Teatro da Trindade era palco de
atuações frequentes.
Por outro lado, havia também o costume dos mais afortunados fazerem concertos de
música e teatro ao vivo nos salões das suas residências.
Já no século XVI, a Rua Direita das Portas de Santa Catarina é o palco escolhido para
os cortejos que vinham dos palácios reais fora da cidade. Era também nesta mesma
rua que se realizavam as cerimónias de receção dos mais importantes convidados e
visitantes de Lisboa, e nela decorreram os cortejos nupciais de D. Afonso IV16 e D.
Maria de Sabóia17 no ano de 1666, e de D. José18 e D. Maria Vitória de Bourbon19
cerca de 1729.
Nesta rua desfilaram também importantes procissões e cortejos religiosos,
manifestações, festas, e eventos culturais de rua.
Apesar de estar rodeado de palácios, conventos, igrejas, e edifícios de importância
cultural e ser frequentado pela mais alta nobreza e burguesia, o Chiado, em paralelo a
esta realidade intensa de acontecimentos e situações próprias do seu quotidiano,
apresenta graves deficiências ao nível de higiene e iluminação.
linguagem e pelo profundo misticismo. Torna-se assim um dos maiores escritores clássicos de prosa em
Portugal.
16
D. Afonso IV (1643-1683), cognominado de O Vitorioso, foi o segundo rei de Portugal da Dinastia de
Bragança.
17
Maria Francisca Isabel de Sabóia (1646-1683), foi a esposa do Rei D. Afonso VI de Portugal, que mais
tarde acaba por se casar com o irmão deste, Pedro II de Portugal.
18
D. José (1714-1777), foi o Rei de Portugal pertencente à Dinastia de Bragança, desde 1750 até à data
da sua morte. Recebeu o cognome de O Reformador, devido às reformas e transformações que praticou
durante o seu reinado.
19
Mariana Vitória de Bourbon (1718-1781), foi rainha e esposa de D. José de Bragança. Filha do Rei
Filipe V de Espanha e de sua segunda esposa, Isabel Parma. Foi em 1725 que o seu pai manifesta a
intenção de criar uma aliança entre Portugal e Espanha, da qual o acordo de casamento entre D. José e
Mariana de Bourbon constitui o primeiro passo.
João Miguel Nascimento
35
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
A iluminação era feita através de lampiões, e as ruas, à exceção da Rua de Santa
Catarina, que era calçada com tijoleira, não eram pavimentadas, dando origem, no
inverno, a grandes lamaçais e socalcos de desgaste provocados pelo deslocar das
viaturas e no verão ao levantar de uma poeira constante e desagradável.
No dia 1 de Novembro de 1755, Lisboa é atingida por um dos mais fortes sismos que a
História conhece e ao qual o Chiado não saiu impune. O terramoto constitui um marco
na História da cidade, pelo rasto de destruição que nela deixou e pelo impacto politico
e socioeconómico que teve na sociedade portuguesa do século XVIII, que será
descrito e analisado no capítulo que se segue.
1.2. O CHIADO DO TERRAMOTO AO INCÊNDIO
O dia 1 de Novembro de 1755, dia de Todos-os-Santos20, decorria normalmente com
os espaços religiosos cheios de crentes para as celebrações preparadas para este dia.
Por volta das nove horas e trinta minutos da manhã, após um enorme e prolongado
ruído, a terra começou a tremer. O tremor durou cerca de sete minutos, instalando o
pânico e o medo por toda a parte.
O sismo foi de tal maneira forte e devastador que os geólogos dos tempos modernos
acreditam que possa ser equivalente a um sismo de magnitude nove da escala de
Richter21.
Os momentos que sucederam o terramoto, foram preenchidos por um maremoto com
vagas de ondas que poderão ter chegado aos vinte metros, havendo relatos de ondas
que fizeram submergir o centro da cidade, até Campo de Ourique.
Nos sítios onde o maremoto não chegou, foi o fogo que provocou os estragos. Há
relatos de diversos incêndios por toda a Lisboa, e chamas que duraram quase seis
dias até serem definitivamente extintas. Estima-se que, à data, Lisboa tivesse uma
20
A festa do dia de Todos os Santos é celebrada em honra de todos os santos e mártires, conhecidos ou
não. A Igreja Católica celebra a Festum omnium sanctorum a 1 de novembro seguido do dia dos fiéis
defuntos a 2 de novembro. A Igreja Ortodoxa celebra esta festividade no primeiro domingo depois do
Pentecostes, fechando a época litúrgica da Páscoa. Na Igreja Luterana o dia é celebrado principalmente
para lembrar que todas as pessoas batizadas são santas e também aquelas pessoas que faleceram no
ano que passou.
21
A escala Richter, também conhecida como escala de magnitude local, atribui um número único para
quantificar o nível de energia liberada por um sismo. É uma escala logarítmica, de base 10, obtida através
do cálculo do logaritmo da amplitude sísmica do maior deslocamento a partir do zero. A escala varia entre
os valores de zero e dez. Existem cerca de 8000 sismos de nível 0 por dia, e existe um sismo de nível 9 a
cada vinte anos. Desconhece-se a existência de sismos de nível 10.
João Miguel Nascimento
36
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
população de cerca de 275 mil habitantes, dos quais quase dez mil morreram neste
dia.
Ilustração 5 – Vorstellung von Lisabon vor und in dem erbenden des 1 Novembris 1755. Autor: Desconhecido. Exposto em: Museu da
Cidade, Lisboa
Consta que o terramoto devastou de metade a dois terços da cidade. Grande parte da
estrutura edificada existente na cidade de Lisboa, foi destruída pelo terramoto, ou
consumido pelas chamas e ondas que o seguiram.
O tremor, provocou transformações na cidade, nas pessoas e no panorama português
no geral. A catástrofe não abalou apenas a cidade e as suas construções.
Lisboa era a capital de um país com tradições religiosas muito fortes. O facto de a
catástrofe ter ocorrido em plena manhã do dia de Todos-os-Santos, e ter arrasado por
completo diversos edifícios religiosos, foi, à luz da mentalidade religiosa do século
XVIII, encarado como uma manifestação do poder e da ira dos deuses.
João Miguel Nascimento
37
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Segundo Manuel Múrias22, àquela hora na Igreja da Trindade estariam quatrocentas
pessoas. Ao primeiro tremor, o pânico ficou instalado entre as pessoas, e ao segundo
o templo desabou por completo. Os órgãos da igreja desapareceram com o fogo assim
como as várias obras de arte que se encontravam no interior da igreja.
A igreja do Sacramento desabou logo aos primeiros tremores, diz-se que as chamas e
os saqueadores consumiram todas as riquezas existentes.
A destruição das cadeias do Limoeiro e dos Aljubes permitiram a fuga dos criminosos.
Estes saquearam tudo o que puderam enquanto a cidade recuperava dos males
naturais que a tinham atingido
Os cadáveres amontoavam-se ao acaso. O choro dos vivos, os gritos suplicantes dos
moribundos presos debaixo dos destroços, os lamentos e as imprecações da mole
humana que corria espavorida, misturava-se com o crepitar das chamas, com o
estrondo caótico dos desmoronamentos, com o relinchar dos cavalos em fúria,
espavoridos, com o uivar dos cães e o chiar dos carros (Múrias, 1996 p. 56)
O Convento do Carmo era agora um amontoado de pedras. A abóbada caiu logo aos
primeiros tremores, seguida da capela-mor. As velas acesas, deram início ao incêndio
que se alastrou, e acabou por destruir grande parte do que restava do edifício.
A igreja do Loreto ainda aguentou os três primeiros abalos, apenas perdendo um dos
sinos de uma torre, mas um incêndio descontrolado que deflagrava no palácio
adjacente acabou por se estender ao templo.
Ficaram incinerados no Chiado doze palácios da mais alta nobreza. Dos oito principais
conventos nenhum ficou inteiro. As preciosidades perdidas são incalculáveis. Os
fidalgos, tão desorientados como a arraia miúda, só pensavam em fugir, acicatados
pelos boatos terroríficos que se propalavam e corriam à velocidade do fogo e do vento.
Dizia-se que o paiol do Castelo ameaçava explodir. Contava-se que o rio voltara a
rebelar-se e que um bruxo proclamava no Rossio que o diabo andava à solta. (Múrias,
1996 p. 57)
Durante vários dias, Lisboa sobreviveu à merce das chamas e contínuos saques.
Lisboa e o Chiado eram montões de entulho e horror.
A situação era caótica. Agora era necessário controlar os saques, orientar as pessoas
e dar um rumo à reconstrução da cidade.
22
Manuel Múrias (Agosto de 1928 - Outubro de 2000), que assinava Manuel Maria Múrias, foi um
jornalista, escritor e político, ligado à fação nacionalista e conservadora portuguesa, que manteve uma
presença ativa no jornalismo político, dirigindo, entre outros periódicos, o jornal A Rua
João Miguel Nascimento
38
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
O Marquês de Pombal23 “nasce” com a catástrofe.
Dadas as necessidades, o Marquês acaba por ver nesta catástrofe a oportunidade e
pretexto certos, para assumir o controlo do destino do país, enquanto primeiro ministro
do Rei D. José.
Após três dias a viver numa liteira24 à espera que os perigos abrandassem, o Marquês
aparece com medidas e vontade de dar ordem ao caos.
Começa por ordenar a sentença dos criminosos apanhados em flagrante, sendo agora
executados em pleno local onde eram apanhados. Foi de tal maneira rigoroso com
esta ordem que vários proprietários foram executados por engano, assim, decretou
que ninguém se podia aproximar das ruínas. Só assim conseguiu travar o saque que
sucedeu o terramoto.
Foi também proibida a construção, ou reconstrução definitiva, sob a pena de
demolição. Esta medida foi tomada para que a reconstrução seguisse uma ideia única,
e contínua.
Para dar abrigo às pessoas, e de maneira a controlar esta questão da reconstrução
espontânea, o Marquês permitiu erguer tendas e abrigos temporários, feitos com
estruturas em madeira que foram fornecidos por outros países da Europa, chocados
com o impacto do abalo na cidade.
Marquês de Pombal, marcou a sua oposição a qualquer tipo de arquitetura de
emergência, ou espontânea para remediar de imediato o sucedido. Aos olhos de
Pombal, a intervenção, deveria seguir três premissas:
- Um discurso único ideológico e pragmático
- Uma proposta urbana e arquitetonicamente coerente
- Sistema construtivo racionalizado
23
Sebastião José de Carvalho e Melo, primeiro Conde de Oeiras e Marquês de Pombal (13 de Maio de
1699 – 8 de Maio de 1721 ) foi um nobre, diplomata e estadista português. O Marquês foi secretário de
Estado durante o reinado de D. José I, sendo considerado, uma das entidades mais importantes,
controversas e carismáticas da História de Portugal. Desempenhou um papel muito importante na
recuperação de Lisboa a seguir à catástrofe de 1755
24
Uma liteira é uma cadeira portátil. Podem ser abertas ou fechadas e são suportadas por duas varas
laterais. Normalmente são transportadas aos ombros de liteireiros ou animais, um à frente e outro atrás.
As liteiras, foram um meio de transporte muito utilizado pelas personalidades abastadas da Roma Antiga.
Normalmente eram escravos que a suportavam.
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Era necessário demolir o que restou do terramoto que pudesse por a população em
perigo com novos desmoronamentos. Marquês de Pombal, nomeou o Sargento-Mor
José Monteiro de Carvalho responsável por esta tarefa, tendo até este ficado
conhecido pela alcunha de Bota Abaixo.
Houve quem achasse que o Sargento foi demasiado incisivo na execução desta tarefa,
mas foi graças a este que se conseguiu fazer o recenseamento predial da maioria das
propriedades.
A reconstrução de Lisboa foi um processo lento em toda a zona baixa da cidade, não
só devido às dificuldades de desentulhamento e oscilações de maré do tejo, mas
também por questões de propriedade. Devido à grande desorganização e falta de
processos até à data, não havia maneira de provar quem era o dono de quê.
Manuel da Maia25 começava agora a pensar como se ergueria a nova cidade, ainda
que rodeados de dificuldades relativas aos problemas jurídicos de propriedade.
Para se poder avaliar bem o enorme emaranhado de questões jurídicas que iriam
embaraçar a reconstrução de Lisboa basta dizer que, naquele tempo, não existia no
nosso Direito Positivo o conceito de Propriedade Pública. Tudo era propriedade
privada, fossem as Casas do Senado da Câmara, ou os chãos da Casa dos Vinte-eQuatro, ou os das múltiplas confrarias. Fossem os bens da Coroa que mal se confundia
com o Estado, fossem os bens do clero, fossem os dos morgados. Público era o que
era de uso comum; o uso comum, todavia, não implicava necessariamente posse ou
propriedade comum. Por exemplo, a R. Nova dos Mercadores era dos Mercadores O
Senado da Câmara podia, talvez, obrigar os Mercadores a fazer obras; mas não podia
fazê-las ela. (Múrias, 1996 p. 59)
Com o objetivo de contornar este problema, o Duque de Lafões26, regedor das justiças
do reino à data, anunciou que quem quisesse reivindicar propriedade sobre qualquer
ruína deveria exibir o título de propriedade. Dadas as circunstâncias em que a cidade
se encontrava, poucas foram as pessoas que conseguiram provar a propriedade. Esta
situação levou a que a baixa acabasse por ser tomada pela Coroa, sendo mais tarde
arrematada em hasta pública para ser reconstruída.
25
Manuel da Maia (1677-1768), foi um arquiteto e engenheiro português. Em 1754 foi nomeado
engenheiro-mor do reino. Foi dirigida por ele a elaboração da planta da cidade de Lisboa, e algumas
obras de grande importância, como o aqueduto das águas livres. Foi coordenador de projeto da
reconstrução da baixa de Lisboa após o terramoto.
26
Duque de Lafões, foi um título nobiliárquico criado por decreto de 17 de Fevereiro de 1718, por D. João
V, Rei de Portugal. O Duque de Lafões, reside em Lisboa, no seu palacete situado na calçada com o seu
nome - a Calçada dos Duques de Lafões.
João Miguel Nascimento
40
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Aqueles que de algum modo conseguiram provar a propriedade sobre terrenos da
baixa, pouco interesse tinham em voltar à área sinistrada, acabando assim por vender
barato as suas posses.
Estavam assim reunidas as condições necessárias ao início daquela que foi a maior
obra de construção do século.
O projeto de reconstrução da Baixa de Lisboa revela uma consciência extremamente
coerente nos domínios, urbanístico e arquitetónico. Não apenas nas áreas
reconstruídas, mas sobretudo na costura entre a parte de cidade que resistiu ao abalo
e a que se reconstrói. Esta costura, resultou numa ligação harmoniosa entre novo e
antigo tanto a nível formal e ideológico como a nível funcional.
Como podemos observar na planta de 1780, o traçado da reconstrução procura
preencher os vazios das zonas danificadas, atribuindo-lhes novos valores, simbólicos
e monumentais, de maneira a fortalecer a relação de continuidade entre o novo e o
antigo.
Uma operação na qual a aparente rutura de determinados fragmentos acaba por ser
assimilada pelo restabelecimento de novas continuidades e hierarquias. (Byrne, 1987,
p.20)
João Miguel Nascimento
41
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Ilustração 6 – Planta da Baixa Pombalina por Eugénio dos Santos, Carlos Mardel e E. S. Poppe, 1780. Atlas de Lisboa: A Cidade no
espaço e no tempo / Gabinete de Estudos Olissíponenses, 1993
Manuel da Maia, foi nomeado por Pombal para desenvolver soluções para a parte
nova da cidade.
Assim, Maia acaba por desenvolver três relatórios escritos, as Dissertações de Manuel
da Maia, onde o engenheiro engloba toda a estratégia de reconstrução, assim como
as várias alternativas à ideia geral.
Segundo Manuel da Maia, a reconstrução de Lisboa apenas podia ser feita de cinco
modos diferentes.
O primeiro, passava por replicar a cidade segundo a estrutura anterior, mantendo as
antigas alturas de edifícios e larguras originais das ruas.
O segundo modo, mantinha as alturas das edificações alterando as ruas, que
passavam a ser mais largas.
No terceiro modo a altura dos edifícios estaria limitada a, no máximo, três pisos acima
do solo e as ruas passariam a ser mais largas.
João Miguel Nascimento
42
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
O quarto modo passava por uma rutura completa com a cidade baixa existente. As
antigas ruas deixariam de existir, dando lugar a novos arruamentos. Estes novos
arruamentos tinham largura variável conforme a necessidade. Largura esta que nunca
poderia ser ultrapassada pela altura dos edifícios.
No quinto modo, a Lisboa destruída seria completamente abandonada, com o intuito
de criar uma nova cidade que tomasse o lugar da agora destruída, entre Alcântara e
Pedrouços.
Este quinto modo de ver a reconstrução, não era de todo uma má ideia, mas era um
contra senso a distância de ruínas que ficaria entre a parte antiga da cidade que não
desabou, da que iria agora ser construída. A ideia não foi levada avante por
discordância entre o Marquês de Pombal, o Senado da Câmara e os proprietários que
exigiram que a cidade fosse reconstruida no sitio onde era antes.
Foi então selecionado o quarto modo de reconstrução da cidade. Reerguer a cidade
de Lisboa em Lisboa, mas com uma nova estrutura, traçado e organização.
Ao longo da elaboração dos relatórios, é de notar uma gradual adaptação das ideias
iluministas de Pombal à realidade de Lisboa. Embora entregue a parte de desenho
urbano ao grupo de arquitetos da Casa do risco27, ao longo das três dissertações,
Maia demonstra preocupações muito além de arquitetura e urbanismo.
Estes relatórios são autênticas linhas de pensamento que comportam áreas desde
funcionalidade urbana e ornamentação, até sistemas e processos construtivos.
A partir destes relatórios já era possível determinar as ideias chave para elaboração
da nova estrutura urbana, austeridade da arquitetura e até a definição de hierarquias.
Manuel da Maia reconheceu que criar uma cidade raiz, sem fazer caso de que não
seja ela própria a uni-la a outra antiga, será mais divertimento que trabalho, dado que
a correspondência entre o antigo e o moderno é o ponto onde se encontram as
maiores dificuldades. (Byrne, 1987, p.10)
27
Casa do Risco das Reais Obras Públicas de Lisboa, também conhecida apenas por Casa do Risco, foi
um gabinete de trabalho formado por alguns arquitetos e engenheiros, de formação militar, fundada pelo
Marquês de Pombal para a reconstrução das zonas sinistradas pelo sismo de 1755. Este gabinete
começou por ser chefiado por Eugénio dos Santos e mais tarde por Carlos Mardel.
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
A Casa do Risco, foi fundada com o propósito da elaboração do plano para a zona
sinistrada. A formação militar destes arquitetos adicionou uma enorme racionalidade
aos processos construtivo e tecnológico. O uso de elementos modulares e pré
fabricados trouxe vantagens a nível económico e de rapidez de execução.
Os arquitetos da Casa do Risco introduziram neste plano de recuperação, o sistema
de construção em gaiola. Este sistema estrutural é composto por elementos de
madeira modulares, colocados no interior do edifício, e que oferecem maior resistência
sísmica à construção.
É então que da Casa do Risco vão aparecendo as várias propostas para a
reconstrução de Lisboa.
Ilustração 7 – Planta nº1. Planta da Baixa Pombalina por Gualter Fonseca e Pinheiro da Cunha. 2000, Álvaro Siza e a reconstrução do
Chiado
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Ilustração 8 – Planta nº2. Planta da Baixa Pombalina por Sebastião e Domingos Poppe. 2000, Álvaro Siza e a reconstrução do Chiado
Ilustração 9 – Planta nº3. Planta da Baixa Pombalina por Eugénio dos Santos e Carlos Andrea. 2000, Álvaro Siza e a reconstrução do
Chiado)
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Ilustração 10 – Planta nº4. Planta da Baixa Pombalina por Gualter Fonseca. 2000, Álvaro Siza e a reconstrução do Chiado
Ilustração 11 – Planta nº5. Planta da Baixa Pombalina por Eugénio dos Santos e Carlos Mardel. 2000, Álvaro Siza e a reconstrução do
Chiado
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
A proposta de reconstrução escolhida é a da planta nº5, desenhada por Eugénio dos
Santos28 e Carlos Mardel29, que representa uma densa malha de ruas perpendiculares
e paralelas ao rio, que organizam quarteirões mais longos e estreitos.
Esta estrutura, é articulada por duas praças situadas nas extremidades. A primeira,
Praça do Comércio, é uma verdadeira porta da cidade Lisboeta orientada ao Tejo. A
segunda, Rossio, torna-se um lugar de encontro e ponto social. Entre estas duas
praças, a malha ortogonal organiza um contínuo urbano, ao qual todas as construções
têm de obedecer independentemente do seu estatuto ou função.
Em 12 de junho de 1758, foi dirigido ao Duque de Lafões, um plano de reconstrução
da antiga zona da Pedreira.
[…] de se regular o alinhamento das ruas e a reedificação das casas a erigir nos
terrenos entre a R. Nova do Almada e a da Padaria, e entre a extremidade
Septentrional do Rossio até ao Terreiro do Paço, exclusivamente. (França, 1983,
p.331)
Então, segundo este plano, as ruas do Chiado, que fazem a ligação entre a Baixa e o
Bairro Alto, são alvos de uma profunda transformação.
Existia a vontade de respeitar minimamente o traçado existente anteriormente nas
ruas do Chiado, mas era necessário adapta-lo à estrutura agora prevista para a nova
Baixa (contínuo urbano).
(…) No meio desta obra ficaram duas cousas dignas de atender-se: - primeiro, o largo
irregular e torpe, acima referido: - segundo, a chamada Calçada de Payo de Novais
indigna de ser rua de uma Corte ainda no estado antecedente. E para que fique tudo
reduzido a termos decorosos, resolveu S. Majestade, que se continua no referido largo
a mesma Rua de cinquenta e quatro palmos, largando-se o mais aos vizinhos e
rompendo-se ate ao fim da Rua dos Espingardeiros, e ângulo, que fica na extremidade
Meridional do Rossio; ou onde mais conveniente for, para ficar mais esta comunicação
ampla, e decorosa entre o Bairro Alto, e a Cidade Baixa. (França, 1983, p.331)
É então assim que nasce a Rua do Carmo.
28
Eugénio do Santos, (1711 – 1760). Foi um dos engenheiros militares, e arquiteto responsável pela
reconstrução da cidade pombalina após o terramoto de 1755. Durante algum tempo dirigiu a Casa do
Risco.
29
Carlos Mardel (1696 – 1763). Foi um engenheiro e arquiteto húngaro de carreira militar. Foi, juntamente
com Eugénio dos Santos, um dos engenheiros militares responsáveis pela reconstrução da cidade
pombalina após o terramoto de 1755.
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
O Chiado, ainda todo em ruínas, sofria assim grandes mudanças.
No campo da religião, as ordens estavam a passar, talvez, a maior crise de todos os
tempos ao nível moral e teológico. Estavam completamente desfasadas dos tempos
que corriam, e com grandes dificuldades de integração.
A nobreza, sem rendas e fortemente afetada pela desvalorização da moeda, é
ultrapassada por uma burguesia ambiciosa e competitiva, que sabia avaliar com rigor
o valor do dinheiro.
O valor dos terrenos aumentou excessivamente, e já não era permitida a construção
de habitações unifamiliares. Assim os Fidalgos vêm-se obrigados a abandonar o
Chiado, por não poderem erguer os seus palácios.
Passados vinte anos da data do terramoto os sítios mais nobres de Lisboa continuam
a ser um monte de ruínas.
Em 1765, data da colocação da estátua de D. José no Terreiro do Paço, a praça do
comércio apenas estava metade construída.
A reconstrução da cidade foi um processo muito lento nos finais do século XVIII e que
durou ainda todo o século XIX.
Só no reinado de D. Luís 30é que se fecha o arco da Rua Augusta.
Depressa fazia-se tudo o que fosse à glória do Rei e do Marquês. Devagar
construíam-se as habitações dos pobres e dos burgueses da classe média – e, mais
além no Chiado, os mosteiros dos frades que Sebastião José31 detestava, e os
palácios da mais alta nobreza a que D. José temia e o valido invejava. (Múrias, 1996
p. 63)
Mas não foi apenas por falta de método e inoperância que Lisboa levou tanto tempo a
ser reconstruida.
30
D. Luís I de Portugal (1838 –1889), foi o segundo filho da Rainha D. Maria II e do Rei D. Fernando II.
Herdou o trono após a morte do seu irmão mais velho, D. Pedro V (1861). Fica conhecido como O
Popular, devido à adoração que o povo tinha por ele. Eça de Queiroz chamou-lhe O Bom.
31
Sebastião José de Carvalho e Melo, é o verdadeiro nome do Conde de Oeiras, ou Marquês de Pombal.
Pombal (13 de Maio de 1699 – 8 de Maio de 1721 ) foi um nobre, diplomata e estadista português. O
Marquês foi secretário de Estado durante o reinado de D. José I, sendo considerado, uma das entidades
mais importantes, controversas e carismáticas da História de Portugal. Desempenhou um papel muito
importante na recuperação de Lisboa a seguir à catástrofe de 1755
João Miguel Nascimento
48
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
O medo e receio de novas catástrofes estavam instalados.
As pessoas viviam assombradas pelas réplicas do terramoto que ainda durante alguns
meses se fizeram sentir, através de pequenos tremores sem força destrutiva.
A despesa que a reconstrução impunha face à probabilidade e receio de novos
tremores, levou a que tanto nobres como plebeus se resignassem a viver em
barracões. Mesmo D. José, rei de Portugal, viveu durante bastante tempo num
barracão na Ajuda.
À data do terramoto, viviam nos palácios do Chiado imensas personalidades
importantes. A violência do terramoto foi tal, que nenhuma destas personalidades
voltou ao Chiado aquando da sua reconstrução.
O Chiado ficou entregue aos frades, que o não largavam porque não podiam – e à
burguesia pequena, média e grande que, durante mais de dois séculos, lhe faria a
fortuna e glória. (Múrias, 1996 p. 64)
Entre a destruição e a reconstrução do Chiado, há um tempo morto, sem história.
Quotidiano social quase não existia, eram algumas tendas que davam abrigo a uns
quantos, mas nada organizado e tudo temporário. Não havia edifícios, nem comercio,
logo, não havia pessoas.
O Chiado atravessou uma longa temporada sem o quotidiano que o caracterizava.
É no fim do século XIX, já após o fim das obras de reconstrução, que Chiado
consegue voltar a ser o centro social que em tempos foi.
A saída definitiva das ordens religiosas do Chiado, permitiu enormes mudanças no
quotidiano deste sítio.
Agora, instalavam-se no Chiado os artistas, escritores, políticos, a alta sociedade e
burguesia que fizeram emergir bibliotecas e academias laicas, clubes, cafés e teatros.
O Chiado era agora o lugar da intelectualidade e modernidade de Lisboa.
João Miguel Nascimento
49
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Algumas fotografias capturadas pelo Estúdio Horácio Novais 32 mostram o ambiente
vivido nas ruas do Chiado do século XX.
Ilustração 12 – Rua Garrett, Lisboa, Portugal, Estúdio Horácio Novais, 193?-198? (Estúdio Horácio Novais)
32
Os Novais eram uma família de fotógrafos. Horácio (1910-1988) era filho de Júlio (1867-1925) e
sobrinho de outros dois, António (1855-1940) e Eduardo (1957-1951). Horácio começou por trabalhar no
jornal O Século, como fotojornalista e ainda responsável pelo trabalho de laboratório.
O Estúdio Horácio Novais abre portas em 1931. Ao longo de 50 anos, cristaliza a vida de Lisboa, da
arquitetura às peixeiras, do comércio aos bairros populares. O fotógrafo colabora com alguns dos
melhores arquitetos da época, faz fotografia institucional, industrial, publicidade, sem nunca afastar o lado
documental. O espólio de Horácio Novais compreende quase 50 mil documentos.
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Ilustração 13 – Rua Garrett, Lisboa, Portugal, Estúdio Horácio Novais, 193?-198? (Estúdio Horácio Novais)
Ilustração 14 – Largo do Chiado, Lisboa, Portugal, Estúdio Mário Novais, 193?-198? (Estúdio Mário Novais)
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Ilustração 15 – Rua Garrett, Lisboa, Portugal, Estúdio Mário Novais, 193?-198? (Estúdio Mário Novais)
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Durante a década de 1980, com o aparecimento das grandes superfícies comerciais e
também devido à mudança de hábitos das pessoas, o Chiado, que era centro de
comércio e lazer, acaba por ficar quase ao abandono.
Numa madrugada de Agosto de 1988, deflagrou o grande incêndio no Chiado. Este
incêndio constitui um novo marco na história deste fragmento da cidade.
1.3. O CHIADO APÓS O INCÊNDIO
No dia 25 de Agosto de 1988, deflagrou no Chiado, um incêndio que horas mais tarde
viria a alastrar-se acabando por arrasar grande parte da zona histórica da cidade.
Estima-se que estas chamas tenham arrasado com cerca de oito mil metros
quadrados de área.
As chamas que deflagraram no edifício Grandella, alastrando para os edifícios que o
rodeavam deixaram as fachadas descarnadas. Os edifícios da Rua do Carmo, Nova
do Almada, Garrett e da Calçada do Sacramento, escondiam uma amálgama de
ferros, paredes rachadas, e janelas abertas para o céu. (Vieira, 2009ª, p.63)
Ilustração 16 – O Incêndio do Chiado, Revista de Lisboa, 1988, Revista municipal de Lisboa
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
[…] Comtemplar a desoladora imagem do popular Chiado a arder, compreendemos,
[…] que, no meio daquele gigantesco braseiro de chamas, desaparecia algo de
incalculável valor, que vertiginosamente se ia consumindo a partir das suas próprias
entranhas […] Ardia Lisboa o coração citadino, a sua víscera nostálgica, já cansada de
um bater quotidiano decadente e resignado. A Lisboa ardia-lhe uma história última feita
de matérias diversas unidas pelo tempo […]. Tudo, agora, se abrasava […] numa
incansável fogueira ignorante de quanta obsessão e mistério devorava; porque o
incêndio é uma infernal liturgia passageira em cujo altar a memória se imola e, mais
tarde, entre fagulhas as lembranças se escapam. (Santiago, 1993, p.114)
A cidade não é só um somatório dos seus espaços. Constrói-se também com
sentimentos e memórias resultantes das vivências, dos acontecimentos, da
arquitetura, e da história. (Salgado, 1994, p.32) O incêndio do Chiado foi um violento
acidente que feriu a memória coletiva da cidade, ao destruir dezoito edifícios deixando
para trás um enorme monte de ruínas. De qualquer modo, não é de estranhar a
violência do incêndio perante a elevada quantidade de materiais altamente inflamáveis
existentes nos armazéns e nas lojas. (Salgado, 1994, p.34) O desleixo em que se
encontravam os mecanismos primários de prevenção, assim como, as dificuldades de
acesso enfrentadas pelos bombeiros e a demora na deteção e alarme sinistro foram
dificuldades no combate rápido ao fogo. Para isso contribuiu, decisivamente, o
baixíssimo nível de ocupação habitacional da área. (Salgado, 1994, p.34) Se houvesse
mais moradores certamente o incêndio teria sido detetado e combatido numa fase
mais precoce. (Salgado, 1994, p.34)
Ilustração 17 – Incêndio Chiado, Bombeiros de Lisboa, 1988 (Bombeiros Lisboa)
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
É importante fazer uma pequena descrição dos edifícios onde deflagraram as chamas,
para se entender o porquê destas se terem espalhado de uma forma tão rápida e fácil.
Os Armazéns Grandella, é um edifício de construção antiga, com paredes de alvenaria
e pavimentos em madeira assentes numa estrutura metálica, e os tetos são
estucados. As escadas, são em madeira e a cobertura num misto de estrutura
metálica e madeira.
As fachadas do edifício Grandella, são caracterizadas pelo enorme número e tamanho
de vãos. Em planta, o edifício ocupa quase cerca de mil metros quadrados ao longo da
Rua do Carmo, e organiza-se em três pisos abaixo da cota da rua e cinco acima desta.
Estima-se uma área total de cerca de seis mil metros quadrados, sem qualquer tipo de
preocupação ao nível da segurança contra fogo.
Não há no edifício Grandella, qualquer medida corta-fogo ao longo dos vários pisos,
nem entre eles. O facto de nem os lances de escada nem os elevadores serem
isolados, permitem a permeabilidade entre os pisos, ou seja, o edifício Grandella,
funciona como um compartimento único no que toca à resistência ao fogo.
Ilustração 18 – Armazéns Grandela, Fachada Rua do Carmo, 2000, Álvaro Siza e a reconstrução do Chiado
Ilustração 19 – Armazéns Grandela, Após o Incêndio, 2000, Álvaro Siza e a reconstrução do Chiado
Os Armazéns do Chiado, têm um sistema de construção muito semelhante ao edifício
Grandella, também composto por, paredes de alvenaria, pavimentos em madeira
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
assentes em estrutura metálica, lances de escada em madeira e a cobertura, por sua
vez, também em estrutura mista de madeira e metal.
Este edifício, desenvolve-se no Chiado, ao longo das ruas do Carmo e Nova do
Almada, com cerca de três mil metros quadrados de implantação e estima-se que
tenha uma área total de treze mil metros quadrados ao longo dos seus cinco pisos.
Assim como o edifício Grandella, os Armazéns do Chiado também não possuem
qualquer tipo de compartimentação ou sistema corta-fogo, e os acessos verticais
também não são isolados, tornando o edifício um corpo único na resistência ao fogo.
Para além da construção sem preocupações de segurança contra incêndio, quer o
edifício Grandella quer os Armazéns do Chiado estavam recheados de mercadoria
armazenada, grande parte dela inflamável.
Ilustração 20 – Armazéns do Chiado, Ruínas, 2000, Álvaro Siza e a reconstrução do Chiado
Ilustração 21 – Armazéns do Chiado, Ruínas, 2000, Álvaro Siza e a reconstrução do Chiado
Nenhum destes edifícios possuía sistema de deteção nem extinção automática de
incêndio.
Em poucas horas, um património histórico-cultural secular, de valor único para a cidade
e para o país foi consumido pelas chamas. Desaparecia parte da zona nobre e
elegante do Chiado, centro de comércio tradicional lisboeta que ali se desenvolveu
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
depois do terramoto de 1755 e ao qual, Eça de Queirós e Camilo, entre diversos
escritores e figuras da vida cultural, deixaram para sempre o seu nome ligado. (Moita,
p.62)
No combate ao incêndio do Chiado estiveram todas as corporações de bombeiros da
área de Lisboa, que de alguma forma conseguiram evitar uma maior tragédia.
1.4. O CONVITE INSTITUCIONAL
Após o incêndio foi necessário tomar rápidas medidas para a resolução deste
problema. O Chiado, é o espaço que faz a transição entre a Baixa e o Bairro Alto. Sítio
de passagem para muitos, de paragem para outros.
Havia que começar de novo. Talvez fosse preciso voltar a erguer novamente e com
toda a rapidez outros volumes, a preencher de edifícios que dissimulem as ausências
no patético vazio criado na confluência entre a Baixa pombalina e o bairro alto […]
Impunha-se uma solução de continuidade urbana que transformasse a área afetada e
lhe refizesse o tráfego e o barulho pedidos, porque a cidade não podia ficar sem centro
nevrálgico tão vital e evocador. […] O Chiado e Lisboa, Lisboa e o Chiado formam já
um binómio indissociável que os torna complementares e interdependentes. (Santiago,
1993, p.116)
O presidente da câmara municipal de Lisboa à data do incêndio, Nuno Kruz
Abecassis33, nomeia Álvaro Siza Vieira como arquiteto responsável pelas obras de
recuperação da área sinistrada. Esta decisão foi bastante contestada entre os
lisboetas por vários fatores.
Lisboa tem uma escola de arquitetura, logo, eleger o “Arquiteto do Porto” levantou
alguma rivalidade, e também por Abecassis ter tomado esta decisão sozinho, sem
antes ter existido um debate quanto à escolha sobre Siza Vieira.
A importância da ação de desenvolver traduzia-se em tensões e debates dialéticos que
uma hábil gestão municipal resolveu de forma extremamente satisfatória: encarregar ao
arquiteto português de fama internacional, Álvaro Siza Vieira, os projetos necessários à
recuperação da zona devastada e à recuperação dos espaços demolidos e,
inclusivamente desaparecidos. (Santiago, 1993, p.116)
33
Nuno Kruz Abecassis (24.10.1929 – 14.04.1999) Politico português de ascendência judaica, que se
estabeleceu em Lisboa aos nove meses de idade. Licenciado em engenharia civil no Instituto Superior
Técnico. Integrou o governo da coligação PS com o CDS em 1978, como Secretário de Estado das
Industrias Extrativas e Transformadoras. Em 1979, é eleito Presidente da Camara Municipal de Lisboa,
conseguindo reeleição em 1985. O trágico incendio no Chiado ocorre dentro do seu segundo mandato.
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
No livro, Lisboa Downtown, após ter recebido o convite para o trabalho de recuperação
do Chiado, Siza Vieira diz numa entrevista em tom de conversa: “Alto lá que vou ter de
falar com a Ordem dos Arquitetos, não lhe vou dar uma resposta de imediato”. Após
ter chegado a Lisboa, Siza entra em contacto com a Ordem dos Arquitetos tendo
agora conhecimento que havia um plano para se levar a obra a concurso. Três dias
depois, novamente em conversa de telefone com Nuno Abecassis, diz: “Eu, em
princípio, vou aceitar porque me parece que isto não é tema para um concurso.
Porque não é propriamente ter uma ideia para o Chiado, mas sim a gestão de muitos
interesses envolvidos e a montagem de uma operação.”
Danificado um eixo tão vertebral da estrutura urbanística e histórica de Lisboa,
reclamava-se uma intervenção modelar, um passar por cima da destruição, mudandoo, ordenando-o, ressuscitando-o, mas com apurada sensibilidade e fazê-lo no prudente
respeito ao prévio, àquilo que, necessariamente, não poderia mudar, pelo menos de
modo ostensivo ou insensato. (Santiago, 1996, p.116)
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
2. A OBRA DE ÁLVARO SIZA VIEIRA
Para falar sobre um arquiteto é necessário falar sobre a sua obra e falar sobre a sua
obra é obrigatoriamente falar de arquitetura.
Entre todas as artes, a Arquitetura é a que mais diretamente participa na vida das
pessoas. Acaba por influenciar a vida das pessoas na sua maneira de pensar e de
agir, mesmo quando não se toma consciência desse facto.
Por essa mesma razão, falar de arquitetura é falar das pessoas, das vivências, das
memórias, das épocas, das influências, do urbanismo.
A primeira referência, aquilo que primeiro transporta Álvaro Siza para o universo da
arquitetura, contemplada como uma intervenção na sociedade que se pretende
valorizar através de uma nova maneira de pensar e de viver, está intimamente ligada
às ideias e aos ideais do Movimento Moderno34. (Belém, 2012, p.10) A compreensão e
a apreensão destes ideais, no caso deste arquiteto, levam-no a pensar nos princípios
em relação aos quais se deve subordinar a arquitetura. (Belém, 2012, p.10)
Construir é colaborar com a terra; é pôr numa paisagem uma marca humana que a
modificará para sempre; é contribuir também para essa lenta transformação que é a
vida das cidades. Quantos cuidados para encontrar a situação exata de uma ponte ou
de uma fonte, para dar a uma estrada na montanha a curva ao mesmo tempo mais
35
económica e mais pura […] Marguerite Yourcenar
Este modus operandi36 de Siza, transporta a sua arquitetura para um determinado
universo em que a sua arquitetura existe e faz todo o sentido universalmente, ou seja,
existe em harmonia com o envolvente e pré existente. Seja qual for o projeto tem
34
Movimento Moderno – a Arquitetura Moderna, é a designação utilizada para caracterizar a arquitetura
produzida a partir do século XX. As características deste tipo de arquitetura têm as suas bases na
Bauhaus, Le Corbusier e Frank Lloyd Wright sendo sucinto. O Modernismo, manifestou alguns princípios
que foram seguidos por muitos arquitetos das mais variadas escolas e tendências. Uma das
características que acompanharam o Modernismo é a rejeição do ornamento, outra era a vontade de
mudar que aparece com a Revolução industrial. A industrialização e a economia foram conceitos
abordados por arquitetos da época. Os edifícios deviam ser limpos, económicos e uteis. As máximas que
caracterizam o Movimento são: Menos é Mais (Mies Van der Rohe), e A Forma segue a Função (Louis
Sullivan).
35
Marguerite Yourcenar, (08.06.1903 – 17.12.1987) foi uma escritora belga de língua francesa. Primeira
mulher eleita à Academia Francesa de Letras em 1980. Educada de forma privada, aos oito anos de
idade lia Jean Racine e aprende Latim. Aos doze aprende grego. Em 1939 muda-se para os E.U.A. onde
passa o resto da sua vida, e onde acaba por ensina literatura francesa. Escreveu dezenas de obras de
sucesso que a tornaram internacionalmente conhecida.
36
Modus Operandi é uma expressão do Latim que significa “modo de operação”. É muito utilizada para
designar uma maneira de agir numa qualquer atividade seguindo sempre os mesmos procedimentos.
João Miguel Nascimento
59
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
sempre uma especificidade própria, por ter sido pensada única e exclusivamente para
o sítio em que vai ser construído.
Esta é, sem dúvida, uma das razões que assumem as características que dão sentido
a cada projeto. O facto de só poder existir ali e nunca noutro qualquer lugar.
Esta capacidade de distinguir entre o que é essência e o essencial em arquitetura é a
grande lição inteiramente compreendida e assimilada por Álvaro Siza relativamente ao
Movimento Moderno. (Belém, 2012, p.10)
Devem-se ter necessariamente em consideração as circunstancias reais para poder
pensar não só segundo as regras de uma gramatica universal e abstrata, mas também
sermos capazes de nos envolver no contexto e fazer com que o projeto nasça a partir
daquelas circunstâncias precisas. (Moura, 2008,p.58)
A lição a retirar é a de que os valores e as ideias universais são a base sobre a qual
se desenvolve uma linguagem pessoal, que se acrescenta ao que já foi feito, de
acordo com as características únicas do espaço e do tempo em cada projeto. (Belém,
2012, p.11)
A década de 30, década de nascimento de Siza Vieira, foi marcada por profundas
transformações, contrastes e violência social e politica. É por esta altura que, na
arquitetura, se impõe o Movimento Moderno. Este é mais que um estilo revolucionário,
aborda um novo conceito de ver, pensar e fazer arquitetura.
Uma autêntica revolução estética iniciada por Le Corbusier37 com o projeto da Casa
Sabóia e a construção do Empire State Building por William Lamb38. Pela mesma
altura, Mies Van der Rohe39, assume em Dessau a liderança da Bauhaus40.
37
Charles-Edouard Jeanneret-Gris, mais conhecido por Le Corbusier (06.10.1887 – 27.08.1965). Foi um
arquiteto, urbanista e pintor francês, de origem suíça. Foi um dos mais importantes arquitetos do século
XX. Uma das suas grandes obras é a Unité d’Habitacion, que evidencia o seu enorme poder de síntese
na arquitetura. Nas viagens que fez a várias partes do mundo, Corbusier contactou com várias culturas e
estilos diversificados, e desses estilos captou aquilo que achava ser essencial e intemporal. A sua
atividade profissional começa aos 18 anos, com a produção de uma casa na sua terra natal, La Chauxde-Fonds. Lançou o livro Vers une architecture, as bases do movimento moderno de características
funcionalistas. E foi um dos criadores dos CIAM (Congresso Internacional de Arquitetura Moderna). Os
cinco mandamentos da sua arquitetura são: a construção sobre pilotis, o terraço-jardim, planta livre da
estrutura, fachada livre da estruturae janela em fita; presentes no projeto da Villa Savoye.
38
William Lamb, (1883-1952) Arquiteto Americano que desenhou o Empire State Building. Estudou na
Universidade de Arquitetura de Columbia e na Escola de Belas-Artes de Paris. Para muitos Americanos, o
Empire State Building é ainda hoje a peça de arquitetura favorita.
João Miguel Nascimento
60
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
A escola acaba por encerrar três anos depois com a subida de Hitler41 ao poder, mas
manteve-se como uma referência incontornável nas áreas de arquitetura e design. Em
1933, ano de nascimento de Álvaro Siza Vieira, nos Estados Unidos da América nasce
a Casa da Cascata de Frank Lloyd Wright42, outra obra inovadora da história da
arquitetura.
A década de 30, foi também noutras áreas das artes bastante intensa. Em 1931,
Salvador Dali43 pinta A Persistência da Memoria, Jorge Luís Borges44 escreve a
39
Ludwig Mies van der Rohe 27.03.1886 – 17.08.1969), foi um arquiteto alemão naturalizado americano.
É sem dúvida um dos maiores nomes da arquitetura de todos os tempos. Professor na escola Bauhaus e
um dos criadores daquele que ficou conhecido como “International Style”. A sua marca na arquitetura
prima pelo racionalismo, utilização de geometria pura, noção de escala e sofisticação. A utilização de
materiais modernos como o aço industrial e vidro permitiram a Mies desafiar o conceito de
permeabilidade. A sua conceção de espaço arquitetónico, envolvia sempre uma profunda depuração da
forma, voltada sempre às necessidades impostas pelo lugar, segundo a máxima minimal. É o autor de
algumas da máximas que acompanham desde sempre a arquitetura moderna, como: Menos é Mais, e
Deus está nos Detalhes.
40
Bauhaus foi uma escola de Design, artes plásticas, e arquitetura de vanguarda que funcionou em
Dessau entre 1919 e 1933. A Bauhaus, apesar do pouco tempo de funcionamento, foi uma das maiores
expressões do modernismo na arquitetura. Fundada por Walter Gropius e mais tarde dirigida por Mies van
der Rohe, a Bauhaus teve um papel assumido no exercício do puro racionalismo funcional. O estilo
associado à Bauhaus, tanto na arquitetura como na criação de bens de consumo, primava pela
funcionalidade, custo reduzido e orientação para produção em massa. Atualmente, a Bauhaus de Weimar
mantém-se na liderança, como uma das melhores universidades da Alemanha, lecionando sobretudo
arquitetura mas também com outros pólos de ensino ligados às várias artes.
41
Adolf Hitler (20.04.1889 – 30.04.1945) Foi líder do Partido Nacionalista Socialista dos Trabalhadores
Alemães, conhecido por Partido Nazi. Hitler tornou-se Chanceler e mais tarde, ditador alemão. Os seus
ideais racistas e anti-semitas ficaram patentes no livro “Mein Kampf” que escreve em 1924. Grupos como
Testemunhas de Jeová, eslavos, poloneses, ciganos, homossexuais, deficientes físicos e mentais e
Judeus foram perseguidos naquele que se tornou conhecido por Holocausto. Durante o período de 1939 a
1945, Adolf Hitler liderou a Alemanha naquele que foi o maior conflito do século XX. Na segunda grande
guerra estima-se a morte de 50 a 70 milhões de pessoas. Após várias tentativas de assassinato, Hitler
comete o suicídio no seu quartel-general a 30 de abril de1945.
42
Frank Lloyd Wright (08.06.1867 – 09.03.1959) foi um arquiteto e escritor de ascendência do País de
Gales. Uma das premissas da sua arquitetura, é esta ser individual, de acordo com a sua localização e
finalidade. Trabalhou em inicio de carreira com Louis Sullivan, um dos pioneiros da Escola de Chicago. É
considerado um dos arquitetos mais importantes do século XX. Wright influenciou diretamente o rumo da
arquitetura moderna com as suas ideias e obras. É o maior representante do movimento Arquitetura
Orgânica, sendo o ex-libris da sua carreira a Casa da Cascata.
43
Salvador Dali (11.05.1904 – 23.01.1989) foi um conhecido pintor catalão conhecido pelo seu trabalho
surrealista. A obra de Dali é caracterizada pela combinação de imagens bizarras, oníricas e com uma
extrema qualidade plástica. O seu trabalho mais conhecido é a “Persistência da Memoria”. Trabalhou
também em outras áreas das artes como: cinema, escultura e fotografia. Salvador Dali tinha uma
tendência a atitudes e realizações extravagantes destinadas a chamar a atenção. Por vezes, esta atitude,
deixava aborrecidos os apreciadores da sua arte.
44
Jorge Luis Borges (24.08.1899 – 14.06.1986) foi escritor, poeta e critico literário argentino. Em 1921,
Borges começou a publicar poemas e ensaios em revistas literárias. Trabalhou como bibliotecário e
professor numa universidade de ensino publico. Em 1955 é nomeado diretor da Biblioteca Nacional da
Republica da Argentina e professor de literatura na Universidade de Buenos Aires. Em 1961 recebeu o
prémio Formentor. Ainda hoje, os seus trabalhos são um grande contributo para a literatura fantástica.
A sua cegueira progressiva ajudou a criar novos símbolos literários através da imaginação, já que “os
poetas, como os cegos, podem ver no escuro”.
João Miguel Nascimento
61
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
História Universal da Infâmia em 1933, e em 1937, Picasso45 pinta a Guernica. Em
1939, inicia-se a segunda grande guerra apos a invasão da Polonia.
Em Portugal, por volta de 1932, Salazar 46 sobe ao poder, dando início ao período
chamado de Estado Novo47. Em simultâneo, uma nova geração de arquitetos, recémformados, que, acompanhando as transformações do mundo ocidental e conscientes
do papel da arquitetura na sociedade, dotaram o país de obras notáveis que se
tornaram emblemáticas do seculo XX português.
Esta nova geração de arquitetos “geração de 97” conta com nomes como, Pardal
Monteiro48, Cristino da Silva49, Jorge Segurado50, Cottinelli Telmo51, Cassiano
Branco52, Carlos Ramos53 e outros.
45
Pablo Picasso (25.10.1881 – 08.03.1973) foi um pintor e escultor espanhol que também desenvolveu
alguma poesia. Para muitos, é considerado um dos grandes mestres das artes do século XX.
Considerado um dos artistas mais versáteis do mundo e de todos os tempos, Picasso, desenvolveu
milhares de trabalhos nas áreas do desenho, pintura, escultura e cerâmica, usando todo o tipo de
materiais. Picasso é considerado o pai do estilo Cubista, juntamente com
Braque.
46
António de Oliveira Salazar (28.03.1889 – 27.07.1970) foi um politico nacionalista português e
professor catedrático na Universidade de Coimbra. O seu percurso politico inicia-se quando foi Ministro
das Finanças, durante apenas duas semanas, na sequencia da revolução nacional de 28 de Maio de
1926. Volta a ser Ministro das Finanças entre 1928 e 1932. Foi instituidor do “Estado Novo” e da sua
organização de suporte, a “União Nacional”. Foi presidente do Conselho de Ministros entre 1933 e 1968.
47
Estado Novo foi o nome atribuído ao Regime Politico Autoritário e Corporativista de Estado que regeu
Portugal durante 41 anos sem interrupção. O Estado Novo, foi derrubado pela Revolução do 25 de Abril.
A designação de Estado Novo é criada sobre tudo por razões ideológicas e propagandísticas que quis
marcar a entrada de um novo período politico iniciado com a Revolução de 28 de Maio de 1926. O Estado
Novo foi também chamado de Regime Salazarista.
48
Porfírio Pardal Monteiro (1897 – 1957) Foi professor e arquiteto português, dos mais importantes da
primeira metade do século XX. Foi um dos pioneiros na viragem modernista da arquitetura portuguesa.
Destaca-se como “o que mais construiu e que se celebrizou como primeiro moderno. Sem concessões, foi
capaz de pegar no fio da tradição para inovar”. A obra de Pardal Monteiro deixou uma marca forte na
cidade de Lisboa, tendo sido responsável por muitas das obras importantes realizadas na cidade entre as
décadas de 20 e 50.
49
Luis Ribeiro Cristino da Silva (1896 – 1976) foi um arquiteto português diplomado pela Escola de BelasArtes de Lisboa em 1919. Juntamente com outros arquitetos, foi pioneiro da inserção do movimento
moderno na arquitetura portuguesa. “Ele foi o autor versátil de uma obra vasta e controversa”. Foi o autor
do emblemático conjunto urbano da Praça do Areeiro e a partir de 1948 foi o arquiteto-chefe do projeto
Cidade Universitária de Coimbra. Foi também professor na ESBAL.
50
Jorge de Almeida Segurado (15.10.1898 – 09.11.1990) foi um arquiteto português. Segurado foi um
dos pioneiros da implementação da linguagem modernista na arquitetura português do seculo XX. A partir
do final da década de 30, acompanhou a mudança de rumo associada ao “gosto oficial, neo-tradicional,
do Estado Novo, que praticou por vários anos, para mais tarde regressar aos inícios do tema modernista,
que estava presente no resto da Europa. Formado pela ESBAL, Segurado é responsável por várias obras
de excelência na cidade de lisboa. Exemplos disso são: a Casa da Moeda, o Liceu D. Filipa de Lencastre,
e o Complexo Habitacional da Av. Do Brasil.
51
José Ângelo Cottinelli Telmo (13.11.1897 – 18.07.1948) foi um arquiteto e cineasta português.
Multifacetado, Cotonelli Telmo não se ficou pela arquitetura, tendo a sua obra chegado a outras artes
como o cinema, a escrita, a poesia, a musica, o desenho, e a banda desenhada. Foi também um dos
pioneiros da linguagem modernista em Portugal. Foi responsável por grandes obras do Estado Novo,
como a conceção global e por edificações de grande visibilidade da Exposição do Mundo Português em
1940, e o plano de expansão da Universidade de Coimbra.
João Miguel Nascimento
62
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Este último, Carlos Ramos entra para a Escola de Belas-Artes do Porto como docente
em 1940, e em 1952 assume a sua direção.
O ensino ministrado por Carlos Ramos, que nessa época vê condicionado o seu
trabalho assim como o dos seus pares, e que ele define como «arquitetos transigentes
que têm de contemporizar ou mesmo abdicar dos seus ideais para garantir a sua
sobrevivência profissional», é uma formação que pretende marcar a diferença
relativamente à Escola de Lisboa, cujas diretivas estão ainda anquilosadas nos
programas dos antigos mestres. (Belém, 2012, p.15)
Para Ramos, a formação de um arquiteto devia ser muito além que apenas saber
desenhar e fazer um projeto, considerava fundamental o debate de ideias sobre
arquitetura e todo o seu envolvimento na sociedade.
Deu assim início a um tipo de ensino inovador, que deu origem a uma nova geração
de arquitetos, os arquitetos da Escola do Porto, que vão ter um papel importante na
arquitetura de excelência.
Da Escola do Porto surgem nomes como: Fernando Távora54, Álvaro Siza Vieira e
Eduardo Souto Moura55, alguns dos mais importantes nomes da arquitetura
portuguesa nos dias de hoje.
A obra de Siza Vieira tem o seu primeiro destaque ainda na década de 60, quando o
arquiteto desenha, em Leça da Palmeira, um restaurante e as piscinas. Neste projeto
52
Cassiano Viriato Branco (13.08.1897 – 24.03.1970) foi um arquiteto português dos mais importantes do
seculo XX em Portugal. Pertence ao grupo de arquitetos pioneiros na implementação da linguagem
modernista na arquitetura portuguesa. Viveu acima de tudo de projetos de iniciativa privada. Edifícios da
sua autoria marcaram Lisboa. Edifícios como o Éden, o Hotel Vitória e o coliseu do Porto.
53
Carlos João Chambers Ramos (1897 – 1969) foi um arquiteto e urbanista português muito conceituado.
Pioneiro da implementação da linguagem modernista na arquitetura portuguesa. A obra inicial revela um
desejo pelas tendências avançadas da arquitetura internacional do início do seculo XX. A dimensão
restrita da sua obra construída, não faz justiça à real influencia que teve nas seguintes gerações de
arquitetos. Foi docente e diretor da Escola de Belas-Artes do Porto. Nas palavras de Siza, “Carlos Ramos
foi um professor admirável e infatigável defensor dos princípios modernos”.
54
Fernando Távora (25.08.1925 – 03.09.2005) foi um arquiteto português estabelecido na cidade do
Porto e formado pela Escola de Belas-Artes do Porto em 1952. Ativo e dinamizador,o seu papel foi de
extrema importância na afirmação do curso de Arquitetura da ESBAP. Foi membro da Organização dos
Arquitetos Modernos e, em associação com outros arquitetos, introduziu no final da década de 40 uma
reflexão que não tinha precedente em Portugal sobre o peso social da arquitetura. Criador de uma nova
logica de construção, Távora deu transversal enfase às paisagens originais, adotando-as como dados
culturais que deverão ser integrados na relação com a arquitetura. Foi tutor de Álvaro Siza Vieira no seu
atelier. Hoje existe um prémio de arquitetura com o seu nome – Prémio Fernando Távora.
55
Eduardo Souto Moura, nascido a 25 de julho de 1952 é um arquiteto português de referência a nível
mundial. Trabalhou com Álvaro Siza Vieira, mas cedo criou o seu espaço de trabalho. Influenciado pela
horizontalidade de Mies van der Rohe, tem nas suas obras implícito o seu próprio estilo arquitetónico.
Galardoado em 2011 com o prémio Pritzker da arquitetura, Souto Moura, é um dos expoentes máximos
da Escola do Porto. Foi distinguido pela Faculdade de Arquitetura e Artes da Universidade Lusíada do
Porto com o doutoramento Honoris Causa.
João Miguel Nascimento
63
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
inovador, Siza revela a capacidade de integração de um objeto na paisagem,
integrando-o e tornando-o quase natural.
As piscinas descem até ao mar como se um muro de areia feito por uma criança as
separasse do Atlântico, muro esse amparado pelas rochas, não isolando as piscinas
do mar, mas, antes, continuando-as pela paisagem com vários espaços, onde também
se toma banho ao abrigo das ondas… (Belém, 2012, p.18)
Ilustração 22 – Fotografia aérea sobre a frente marítima de Leça da Palmeira, 2013, ilustração nossa
Siza envolve-se em todos os seus projetos com os princípios e o rigor que espelham
toda a sua obram, a simplicidade formal, avaliada pelo seu olhar particular sobre o
sítio onde vai nascer o novo objeto arquitetónico.
Costuma dizer-se que Siza Vieira encara as mãos como extensão do próprio corpo,
fumam, desenham e falam ao mesmo tempo. Ouve, porque cada pergunta é diferente
da anterior, mesmo que já tenha respondido à mesma questão várias vezes.
Esta postura é o que o faz encarar cada projeto como sendo a primeira vez, retirando
sempre novas abordagens, novas perspetivas e novas ideias do mesmo tema.
A primeira abordagem deste arquiteto ao sítio onde vai nascer o seu projeto, prendese na compreensão da topografia e geografia locais, uma forte leitura sobre a
morfologia do terreno onde vai nascer a sua criação e a sua ligação ao espaço
envolvente, isto é: como vai coexistir a pré existência com aquilo que vai passar a
existir.
João Miguel Nascimento
64
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Na sua experiência na iniciativa SAAL56, com o desenho da Quinta da Malagueira em
Évora, e o Bairro da Bouça em pleno coração portuense, Álvaro Siza demonstra esta
capacidade de inserção e harmonia entre a sua arquitetura e a natureza da topografia
e geografia onde esta se insere.
Na Quinta da Malagueira, Siza encontra o local perfeito para a inserção da sua
arquitetura em harmonia com o envolvente.
A ligação do espaço ao movimento que nos permite não só percorrê-lo mas também
vivenciá-lo através das formas dos edifícios que o habitam, faz com que este projeto
seja praticamente impossível de descrever sem lá termos estado. Podem-se definir as
linhas gerais dos edifícios, das ruas, da paisagem, mas será impossível falar da
surpresa ao virar da esquina, da particularidade de uma determinada forma, daquela
sensação de bem-estar. A agregação de pátios, ruas e terraços, tudo assumidamente
disciplinado e moderno, que simultaneamente nos revelam a memória da arquitetura
tradicional portuguesa, não é óbvia, mas antes pelo contrário, é a capacidade de
57
conciliar a arquitetura racionalista com os espaços onde ela vai habitar. (Belém, 2012,
p.22)
Neste projeto fundem-se as diretrizes do Movimento Moderno com a cultura
tradicional, a exigência social de habitação com qualidade, dado ser iniciativa SAAL, e
a ideia de concilio entre a arquitetura, o local onde se insere e quem a vai vivenciar.
A arquitetura faz-se, não só para quem a habita mas também para quem por ela
passa. Este pensamento, levou Siza a relacionar-se com as memórias e a respeitá-las
nos seus projetos.
As nossas referências, partem sempre daquilo que nos rodeia.
56
Criado com o intuito de dar apoio às populações que se encontravam alojadas em situações precárias,
o SAAL, Serviço de Apoio Ambulatório Local, surgiu como um serviço descentralizado que, através do
suporte projectual e técnico dado pelas brigadas que actuavam nos bairros degradados, foi construindo
novas casas e novas infraestruturas, foi oferecendo melhores condições habitacionais. Se, por um lado,
se pode considerar a produção que se seguiu como a expressão mais coerente de uma “Arquitectura do
25 de Abril”, por outro lado, a pronta resposta dada pelos arquitectos e pelas equipas de projecto em geral
correspondeu, pelos conteúdos metodológicos inusitados e pela própria qualidade de muitos dos
exemplos construídos, a um dos períodos da nossa cultura arquitectónica recente mais debatidos e
referenciados em todo o mundo
57
Corrente arquitetônica que surge na Europa após a Primeira Grande Guerra, tem ligação direta com o
cubismo das artes plásticas. A partir da experiência da arquitetura Bauhaus de 1919, a influência do
movimento racionalista invade também a arquitetura, trazendo para ela a clareza, a limpeza das formas e
valorização do que é mais necessário e importante. A ideia era utilizar no solo e na construção o máximo
possível de economia, a partir de grandes pesquisas e tendências construtivistas, dando atenção às
características de cada material diferente que seria utilizado como o vidro, a madeira, o ferro e outros
metais. Outras características importantes são: estruturas aparentes, inovação nos materiais,
ornamentação despojada, estrutura plana, preocupação com os espaços internos e grandes áreas
envidraçadas. O que se valoriza é o raciona, o prático, aquilo que realmente é necessário e funcional para
aquela construção, deixando de lado os excessos e sobreposições.
João Miguel Nascimento
65
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Este é o grande compromisso de Siza com a arquitetura: através da ação, do fazer, do
reconhecer o erro, da seriedade, da perseverança que se reconhece em todo o seu
percurso, sobressai a importância desta identidade que é feita de gentes e de lugares.
(Belém, 2012, p.29)
Na elaboração dos seus projetos, Siza utiliza muito o desenho. Utiliza o desenho como
o escultor que nunca chegou a ser. Sente que antes da tridimensionalidade está a
imaginação, e no desenho pode explorar tudo, o corpo do projeto, como ele se move,
a sua pele e a sua alma.
A essência dos seus projetos é definida sempre na base do desenho.
Traços trémulos, como de formas ainda incipientes, das quais não se está ainda
perfeitamente consciente, mas que já contêm a ideia à volta da qual se condensarão
as formas e os espaços definitivos. (Vieira, 2009, p.17)
Alguns dos desenhos chegam a ser quase enigmáticos e indecifráveis para outros que
não o próprio. São resultado das várias leituras que tem do assunto que está a
desenhar.
Esboços rápidos, sem preocupação, como faz um viajante que tira notas para depois
calmamente escrever sobre o que viu e o que sentiu. Siza é um viajante, faz esboços
não para escrever mas para construir. (Belém, 2012, p.30)
No trabalho de um arquiteto, desenho é uma ferramenta que ensina mais que
simplesmente olhar. Ensina a ver. Faz com que a ideia fique registada na memória, e
volte quando for necessária, no momento exato.
58
Siza não precisa de heterónimos como Pessoa , ele possui esta mão que é outro elemesmo, ela faz-lhe companhia e diz-lhe o que pensa do seu projeto. Conhece-o tao
bem que está habituada aos seus tiques e às suas pequenas manias, parece divertir-se
a surpreendê-lo por meio de desvios permanentes. Possui uma autonomia tal, que
pode permitir-se não desenhar “à Siza”, assim como para encurralá-lo, guia-o para
hipóteses improváveis, nas quais ele não teria certamente pensado sozinho. Como ela
não o larga e ele a leva consigo para todo o lado, ela não se importa de rabiscar em
58
Fernando Pessoa (13.06.1888 – 30.11.1935) foi um poeta, filósofo e escritor português. Considerado
um dos maiores poetas portugueses de todos os tempos. O critico literário Harold Bloom considerou a sua
obra como: “legado da língua portuguesa para o mundo”. Foi também empresário, editor, crítico literário,
jornalista, comentador político, tradutor, inventor, astrólogo e publicitário, ao mesmo tempo que produzia a
sua obra literária em verso e em prosa. Como poeta, desdobrou-se em múltiplas personalidades
conhecidas como heterónimos, objeto da maior parte dos estudos sobre sua vida e sua obra. Centro
irradiador da heteronímia, auto-denominou-se um "drama em gente".
João Miguel Nascimento
66
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
permanência; a paixão dela é o desenho, quanto a ele, talvez prefira fumar um cigarro
olhando pensativamente o que ela acaba de fazer. (Siza, 2009, p.17)
Os seus desenhos revelam por vezes alguma ambiguidade, na medida em que se
conseguem interpretar as ideias de várias maneiras. Talvez daqui se entenda a sua
forte atração pelo cubismo59, por toda a tensão que existe entre a figura e o fundo.
Nos seus desenhos, esta mesma tensão acaba por realçar o objeto e o espaço.
Sendo a leitura destes desenhos, por vezes, ambígua, o conceito de espaço e o
próprio objeto arquitetónico representados, assumem várias identidades.
Os desenhos estão ligados a ideias, e as ideias são transmitidas pelos desenhos. Nos
seus apontamentos Siza revela a propósito dos projetos em que está a trabalhar
pequenos tópicos que registam a memória do olhar. (Belém, 2012,p.32)
Todos estes pequenos registos desenhados começam a dar corpo aos projetos, e
mais tarde aparecem as referências históricas, as interpretações que faz do lugar, e as
opções.
Os primeiros desenhos têm como força motriz o jogo de contornos. A sobreposição de
níveis num projeto, as diversas abordagens dos vários ângulos que são dadas pelos
contornos de todas as superfícies, de uma aresta ou de uma parede, definindo um
limite, dá a dinâmica e o movimento que se adivinha mesmo quando muito subtil. Este
movimento começa por ser muito gráfico… explorando e sobrepondo as várias fases
de um edifício, ou as várias camadas que se formam enquanto ideias e cuja mão, que
nem sempre obedece à cabeça, vai transpondo para o papel. (Belém, 2012, p.33)
Com esta mestria no desenho, Siza Vieira consegue unir a arte e o ofício, o desenho e
a técnica; no fundo, a ideia e o projeto.
Cada projeto é único, e tendo em conta as complicações de cada um, sejam a
morfologia do terreno, o programa e a sua funcionalidade, o peso da memória e da
história, etc., Álvaro Siza diz a propósito no livro “Obras e Proxectos”: «quando me
chamam para projectar um edifício num lugar que não conheço, e sobre o qual tenho
uma ideia muito vaga, quase mítica, às vezes uns primeiros desenhos ajudam a
desencadear uma série de reflexões que se concretizam posteriormente. Creio que é
necessário, em cada momento do processo de projectar, ter uma ideia clara das
59
O Cubismo é um movimento artístico que surge no século XX, nas artes plásticas que tem como
principais fundadores, Pablo Picasso e Georges Braque. O Cubismo trata as formas da natureza, por
meio de figuras geométricas quase que planificando todas as partes do mesmo objeto no mesmo plano. A
representação do mundo passava por não ter nenhum compromisso com a realidade.
João Miguel Nascimento
67
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
formas, dos volumes e do espaço prévios ao programa funcional do edifício. Quando
eu estudava, ensinava-se que as análises prévias eram fundamentais, e surgia logo
esse momento de angústia de confrontar o papel em branco. Agora no meu trabalho
eu já não passo por essas angústias, porque evito esse desequilíbrio entre o que se vê
e o que se concebe.»
Siza Vieira afirma usar o desenho com fins práticos, como elemento de exploração de
uma ideia, ou mesmo como ajuda em situações pontuais de cada projeto. Serve
igualmente como elemento explicativo das suas ideias. O desenho é um elemento
presente no decorrer de todo o seu trabalho, quer na procura de intenção, quer na
resolução de um problema, quer num simples e pequeno registo para gravação de
uma memória.
O projeto está para o arquiteto como a personagem de uma novela está para o autor:
ultrapassa-o constantemente. É preciso não o perder. O desenho persegue-o. O
projeto é uma personagem com muitos autores, e torna-se inteligente só quando é
assumido como tal, caso contrário é obsessivo e impertinente.
O desenho é o desejo da inteligência. (Vieira, 1995, p.61)
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
3. A RECONSTRUÇÃO DO CHIADO
Este capítulo, “A Reconstrução do Chiado”, vai desenvolver-se em três subcapítulos
nos quais, se pretende dar a conhecer quais foram as condições em que Siza
encontra o Chiado antes da sua intervenção, quais os seus objetivos, e rever as suas
intervenções naquele fragmento urbano, fazendo a ponte para o “Chiado dos nossos
tempos”.
3.1. SITUAÇÃO DE PARTIDA
Após o grande incêndio, Siza descreve o Chiado, numa entrevista a José Salgado60
como:
Ruínas. Fachadas descarnadas e buracos que libertam muros de suporte
antiquíssimos, bocas de misteriosas galerias. Um esqueleto belíssimo e incompleto,
um objeto frio e abstrato, a revelar Lisboa. Uma espécie de espelho que não reflete. E
gente apressada, ou gente a ver pedras, gruas e operários. (Vieira, 1989,p.68)
O incêndio que deflagrou no Chiado a 25 de Agosto de 1988 devastou dezoito
edifícios, contando com cerca de dez mil metros quadrados de área total queimada.
Dos dezoito edifícios queimados fazem parte, os Grandes Armazéns do Chiado e o
Edifício Grandella. Edifícios emblemáticos que acompanham o Chiado. No caso do
edifício Grandella desde 1906 e os Armazéns do Chiado desde os tempos mais
remotos, tendo este já desempenhado várias funções diferentes ao longo da sua
existência.
60
José Salgado é um arquiteto português. Professor na Faculdade de Arquitetura da Universidade do
Porto.
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Ilustração 23 – Edifícios do Chiado em chamas,1988, Revista municipal de Lisboa
Naquele dia, no Chiado, ardeu não só o centro da cidade, mas também a história que
este representava e, mais que isso, ardeu parte da memória deste sítio e daqueles
que o habitavam.
Ilustração 24 – Fachada dos Armazens do Chiado destruídas pelas chamas, 2013, Chiado em Detalhe (esquerda)
Ilustração 25 – Fachada do edifício Grandella destruída pelas chamas, 2013, Chiado em Detalhe (direita)
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Na opinião do Arquiteto Gonçalo Byrne61, Foi quase uma sorte ter acontecido o
incêndio, porque veio levantar problemas que há muito já deviam ter sido resolvidos.
Nos anos que antecederam o fogo, o Chiado, encontrava-se descontextualizado.
A intensa vida social, cultural e económica que se fazia naquela estrutura deixou de
acontecer, entrando em declínio e abandono. Sobretudo à noite, tornando-se não mais
que um ponto de passagem.
Para esta situação de descontextualização do Chiado contribuíram vários fatores.
Entre eles, a galopante expansão da cidade para as periferias, que fez com que este
centro deixasse de ser único.
As cidades de hoje, não têm apenas um centro, mas vários polos onde se encontra o
tipo de vivência assemelhada à do Chiado: Comércio, laser, etc.
[…] As cidades têm almas, muitas. E as almas não ardem. As estruturas é que podem
arder. Aliás não me lembro de ouvir falar em alma, mas sim em coração. Embora as
cidades também não tenham coração, mas muitos corações, o que é verdade é que
ardeu uma parte da cidade, que para muitos habitantes era extremamente importante.
(Vieira, 2000, p.72)
A facilidade de movimentação nas cidades de hoje é muito maior, o que conduz a
uma maior dispersão das pessoas pela cidade, em vez de fortalecer os centros únicos.
[…] Fernando Pessoa62, hoje, em vez de ir ao Martinho da Arcada ou parar na
Brasileira, iria, sei lá, às Amoreiras, por exemplo. A cidade expandiu-se, há dinâmicas
novas. A ideia de que tudo o que é importante se tem que passar no núcleo, está
ultrapassada. E já estava antes do incêndio. (Vieira, 2000, p.72)
Também os grandes armazéns instalados no Chiado atravessavam uma enorme crise,
porque para este sector de comércio já não é o centro histórico de Lisboa que
61
Gonçalo de Sousa Byrne, nascido em 1941, é um arquiteto português formado na Escola Superior de
Belas Artes de Lisboa. Professor catedrático recebe o titulo Honoris Causa pela Faculdade de
Arquitectura de Lisboa. Também Gonçalo Byrne interveio no Chiado, em 1994, na reconversão do
Quarteirão Império Seguros.
62
Fernando António Nogueira Pessoa, 1888 - 1935, foi poeta, filósofo e escritor português. É o poeta
português mais universal e está entre os vinte e seis melhores escritores da civilização ocidental. Das
quatro obras que publicou em vida, três são escritas na língua inglesa. É conhecido pelas várias
entidades que criou e sobre as quais escreveu, os heterónimos. Fernando Pessoa, era cliente assíduo da
pastelaria Brasileira, no Chiado, que ainda hoje se encontra em atividade e com uma estatua do poeta na
zona exterior.
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interessa, mas sim as grandes superfícies comerciais, que se situam noutros novos
polos da cidade.
O que me parece adequar-se melhor à fisionomia do bairro, são as pequenas lojas, os
comércios especializados de pequena dimensão. (Vieira, 2009, p.43)
De um modo geral, existia da parte dos comerciantes do Chiado uma enorme
dificuldade e desinteresse em acompanhar estas transformações das dinâmicas
sociais, o que de alguma maneira, gerou um envelhecimento do tecido comercial
daquela zona. O sector terciário ali instalado, deixa de cumprir com as funções da
época, gerando a sua falência.
Outro dos fatores que participava ativamente nesta desertificação do Chiado, era a
quase ausência do tecido habitacional, que se perdeu ao longo dos anos, mas para a
qual o bairro foi dimensionado.
O desaparecimento da habitação associado ao declínio do tecido comercial, resulta no
abandono, decadência e descontextualização do Chiado.
Um lugar vale pelo que é, e pelo que quer ser. (Vieira, 2009, p.42)
O Chiado funciona como charneira entre a Baixa de Lisboa e o Bairro Alto. O traçado
existente, resulta da mudança topográfica que a malha pombalina encontra, quando
chega à encosta.
Não pertencente à Baixa, nem ao Bairro Alto, o Chiado é a continuidade da malha
pombalina que vence a topografia.
Está também em contacto direto com a Praça do Rossio, outro ponto forte do centro
histórico de Lisboa.
Sendo um ponto de contacto com várias partes da cidade, que incorpora diversas
atividades, o Chiado, acaba por ser um ponto inevitável de passagem e permanência
para aqueles que o frequentam.
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Ilustração 26 – Vista aérea sobre o Chiado, 2013, Ilustração nossa
Ilustração 27 – Corte entre a Rua do Ouro e a Rua Ivens, 2013, Chiado em Detalhe
Este espirito tão caracterizador “de passagem” no Chiado era preciso não perder. A
zona queimada não poderia representar um vazio na cidade, porque os utentes estão
habituados à sua utilização e também porque a ausência total de vida no Chiado
poderia, de facto, arrasar de vez com este núcleo.
De maneira a vencer este problema, mesmo antes do começo das obras de
reconstrução, foi instalada uma passagem a uma cota superior, que permitia a
circulação pedonal no Chiado e por baixo o decorrer das obras.
Era necessário encontrar uma estratégia para a reconstrução do Chiado.
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Após o fogo existiram movimentações que afirmavam ser uma boa oportunidade de ali
introduzir um novo tipo de arquitetura assim como novas atividades.
Era um grito por modernismo que não ia de encontro à revitalização da memória
daquele sítio.
«Trabalhem sem inibições», diziam eles, a hora da Arquitetura Moderna com M grande
estava a chegar, para o centro de Lisboa. Nunca tive essa ideia. Achei que era
necessário refazer os edifícios. (Vieira, 2009, p.42)
Siza encara a Baixa Lisboeta como um edifício único pré-fabricado, da qual o Chiado é
parte integrante. Era necessário manter a atmosfera do bairro, assim como, a
continuidade existente entre este e a Baixa.
Aos olhos do arquiteto, o incêndio não era um motivo que legitimasse a inserção de
novas arquiteturas nem novas atmosferas, o que arrasaria com o papel de transição
entre as partes alta e baixa da cidade.
Acho que não era caso para isso, acho que os arquitetos têm tanta oportunidade de
fazer o “moderno” na periferia das cidades que não faz sentido essa ânsia em sítios
que não interessa. (Vieira, 2013, Público)
Decidiu-se optar pela continuidade entre Baixa e Chiado, restaurar e reconstruir a sua
memória.
A recuperação da memória passava pela reconstrução da ambiência do Chiado. Não
havendo razões para a mudar, no âmbito da arquitetura, havia de facto a necessidade
de a transformar e adaptar às necessidades dos vários quotidianos que ali acontecem.
O incêndio, veio tornar evidentes os problemas urbanos existentes na cidade, que se
vinham acumulando desde algumas décadas anteriores, deixando-a na posição
vulnerável face a este tipo de incidentes.
Esta
condição
de
vulnerabilidade
é
indissociável
das
estruturas
urbanas
aparentemente sólidas e duradouras e, se observada numa ótica distinta da que
resulta de uma situação limite, é em grande parte a razão e o motor da inadequação e
adaptabilidade da cidade, ou seja, da sua transformação. (Byrne, 2013, p.15)
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As novas exigências temporais, obrigam a transformações, obrigam a uma reutilização
que prova que a cidade não para no tempo e é um organismo vivo em constante
mutação. (Vieira, 2000, p.74)
Era preciso organizar a estrutura do Chiado, atuar no sentido de atualizar as
infraestruturas e introduzir os exigidos e importantes sistemas de segurança, mas
mantando o traçado original da arquitetura pombalina.
Não existe no Chiado uma razão profunda de mudança. Trata-se de uma recuperação
sujeita a correções e transformações menores. A vontade de alguns projetistas não
tem nem a possibilidade nem a legitimidade de superar significativamente o ritmo de
evolução duma cidade e dos seus agentes de transformação, sob pena do insucesso.
(Vieira, 2013, p.15)
O Chiado mantém a mesma arquitetura da Baixa, à exceção dos edifícios Grandella e
Armazéns do Chiado. Era necessário uma intervenção ao pormenor para a
recuperação da zona sinistrada.
Embora não contivesse desenhos de pormenor das fachadas, o cartulário pombalino
foi de extrema importância na reconstrução para o estudo dos ritmos e proporções dos
vãos. Surge então a necessidade de uma pesquisa mais aprofundada sobre o sistema
construtivo das fachadas, pois existem diversas variantes dentro deste sistema préfabricado causadas pela morfologia do terreno.
Ilustração 28 – Alçado da Rua do Carmo pertencente ao Cartulário Pombalino, 2013, Chiado em Detalhe
No que toca ao desenho, como quase sempre num projeto de âmbito limitado, o
essencial da sua definição depende das relações com a zona considerada, com as
margens, com as zonas de transição, lá onde se encontra uma notável vocação de
transformação, nos interstícios esquecidos no corpo da cidade. (Vieira, 2013, p.15)
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3.2. OS OBJETIVOS
Repetir nunca é repetir. (Vieira, 2000,p.15)
Ilustração 29 – Esquisso ilustrativo do Chiado, 2013, Chiado em Detalhe
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A intervenção no Chiado podia ser encarada, para uma classe de arquitetos mais
conservadores e protetores dos núcleos históricos, como uma obrigação de
continuidade da herança pombalina. No entanto, aos olhos de um arquiteto com outra
maneira de pensar, poderia ser a oportunidade para uma intervenção de rutura, num
núcleo histórico da cidade com bastante mediatismo e projeção internacional.
Siza Vieira não se deixou intimidar pela obrigação que o Chiado impunha no seu
próprio projeto de reconstrução, conseguindo, com sucesso, atribuir continuidade à
herança pombalina e conferir-lhe inovação.
Siza opta pela intervenção que entende a preservação da memória do Chiado,
afirmando:
Não me importo de passar por conservador, se isso significar que não tenho nenhuma
ansia por ser moderno. Acredito que cada projeto tem uma vocação, nasce de uma
necessidade interna que vai para além da vontade do arquiteto e do desenho. (Vieira,
2009, p.58)
Ao apresentar a estratégia de recuperação do Chiado, Siza, foi alvo de inúmeras
críticas, entre elas, a de que existia no presente plano “ausência” de arquitetura pelo
facto de não existirem alterações ao nível do alçado dos edifícios e de que não havia
mão criadora por parte do “melhor” arquiteto português.
Como já referido anteriormente, o arquiteto compreende a Baixa-Chiado como um
edifício único e contínuo, entendendo que a estratégia correta, passa por uma
“cicatrização” desta estrutura que foi “ferida” pelas chamas.
Surge então a necessidade de um estudo maior sobre a evolução do Chiado, e as
suas mutações ao longo do tempo, tornando-se interessante perceber no plano de
recuperação de Siza, que este não atuou apenas sobre os estragos causados pelo
incêndio, mas também sobre perdas, alterações e apropriações que ocorreram desde
a reconstrução pombalina a seguir ao terramoto de 1755.
Neste plano, a preservação da herança pombalina faz-se acompanhar de uma
intervenção de cariz mais interior, pontual e discreta, que fortalece o sistema de
acessos mediante o uso de rampas, lances de escadas e abertura de pátios interiores,
reforçando assim a solidez do desenho urbano, unificando-o.
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O plano não pretende parar na história ou repetir o antigo, mas sim servir-se da
memória para proporcionar inovação, com a construção do novo. (Rodrigues, 1992,
p.37)
No entanto, sei que o Chiado vai sofrer profundas mudanças – não tanto no estilo e no
desenho, como na sua abrangência. Será uma resposta às transformações em curso,
aos novos modos de viver, às alterações de utilização da área, que irão arrancá-la da
decadência para o dinamismo. (Vieira, 2009, p.58)
Ilustração 30 – Blocos de intervenção na recuperação do Chiado, 2013, Chiado em Detalhe
No plano de reconstrução e consequente ativação da área do Chiado consta que à
exceção dos Grandes Armazéns do Chiado e do Edifício Grandella, todas as outras
construções abrangidas pelo plano são do tipo pombalino, sendo assim recuperados
segundo a fachada-tipo adequada.
Atendendo a que dois dos grandes objetivos deste plano são, devolver ao Chiado o
tecido habitacional e o desenvolvimento comercial à escala do bairro, os restantes
edifícios a recuperar foram destinados a habitação nos pisos superiores e a comércio
e equipamentos culturais e de laser no piso térreo.
Nestes edifícios de habitação, foi reduzida a profundidade de construção de maneira a
ser possível transformar os antigos logradouros privados em pátios de uso público que
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idealizam dentro do Chiado novas ambiências e lhe conferem novas utilizações e
importantes ligações no sistema de circulação.
Nestes pátios, existe uma evocação à cultura bairrista, tão característica da cidade de
Lisboa, proporcionando uma vida mais comunitária. A vida aqui ganha a tranquilidade
que a cidade não tem, uma ambiência diferente com ritmos temporais diferentes. De
um momento para o outro a agitação da cidade acalma-se nestes poços de luz.
(Colembrander, 1994, p.18)
Para a reconstrução do edifício Grandes Armazéns do Chiado, o plano propunha um
programa de hotel e para o Edifício Grandella um programa misto de comércio e
escritórios. Também segundo o plano, estes edifícios devem manter a sua função
urbanizadora, na medida em que, deveriam servir de plataforma de ligação entre a
Baixa e o Chiado, ligando as Ruas do Ouro e Crucifixo à Rua do Carmo.
Ilustração 31 – Cortes demonstrativos da função urbanizadora dos Armazéns Chiado e Grandella, 2000, A Recuperação do Chiado
Siza afirma que o Chiado podia funcionar como Plataforma de Distribuição.
De facto, beneficiando da excelente localização entre a Baixa, Rossio e Bairro Alto,
com o impulso da nova estação de metro Baixa-Chiado, que liga o Chiado à restante
rede de metropolitano e, também, da exploração das antigas ligações urbanas
existentes, agora revisitadas, o Chiado volta claramente a ser um ponto por onde
todos passam e onde todos param.
Plataforma de distribuição. Um patamar onde é imprescindível passar e parar, uma
aparição onde se vê a paisagem. Chiado essencial, enorme, sobre a Rua do Crucifixo.
(Vieira, 2000, p.66)
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No âmbito do desenho urbano, este plano vem unicamente ordenar o sistema de
circulação no Chiado, adaptando-o às dinâmicas e exigências sociais dos nossos
tempos.
A Rua do Crucifixo, que era uma rua menos importante da baixa, por ter recebido uma
das portas de acesso ao metropolitano, deixa agora de ser a ultima rua da Baixa, para
passar a ser a primeira do Chiado. Local onde todos chegam e onde todos partem,
passa a ser uma rua com um movimento muito intenso.
Neste sentido, Siza redescobre algumas ligações como as Escadinhas do Espirito
Santo da Pedreira, que foram indevidamente apropriadas pelo edifício dos Grandes
Armazéns do Chiado durante a reconstrução pombalina.
Há uma escada nova que desce para a Rua do Crucifixo que se calhar existiu, porque
o que se descobriu com o incêndio é que a largura daquela escada estava ocupada
pelos Armazéns do Chiado, mas era um acrescento. Tanto que, demolido, apareceu a
verdadeira fachada. Essa ligação tem muitas consequências porque prolonga as
escadinhas de São Francisco, com uma ligeira torção. (Vieira, Público, 2013)
Esta escadaria confere continuidade à Calçada Nova de São Francisco, paralela à
Rua Garrett e acaba por concluir uma ligação direta entre a Rua do Crucifixo e a Rua
Ivens. Entretanto, no Bloco A, a abertura de um pátio interior permite novas ligações
cruzadas, entre as ruas Garrett, Ivens, Nova do Almada e as escadas de Santo André.
Ilustração 32 – Vista aérea sobre o Chiado demonstrando a nova ligação, 2013, Ilustração nossa
Outra ligação que o arquiteto vai desenvolver é entre a porta sul do Convento do
Carmo e a Rua Garrett, através da abertura de um pátio interior no Bloco B,
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articulando lances de escada e zonas rampeadas, sendo assim possível vencer a
diferença de cotas. Esta ligação foi em tempos existente mas havia desaparecido com
o tempo, porventura até com o terramoto, mas é possível ver a sua existência numa
gravura de Lisboa desenhada por Giorgie Braunio. Mesmo sem conhecimento da
existência desta ligação, o arquiteto, ao circular na zona sinistrada achou que esta era
a única forma de dar sentido à porta sul do Convento.
Criar um circuito: Elevador de Santa Justa, rampas e escadas e um ascensor, e sair à
cota da rua Garrett e ter ainda uma escada que ligasse à Rua do Carmo, completando
os percursos. […] Uma historiadora que trabalhava também para nós como consultora,
mostrou-me uma gravura antiga. E a gravura mostrava que da Igreja do Carmo havia
uma escada que vinha cá abaixo. (Vieira, LISBOA GROUND, p.38)
O projeto do pátio interior do Bloco B, ainda em fase de construção, estabelece
ligações entre a Rua Garrett, a Rua do Carmo e o Convento do Carmo e os mais
recentes Terraços do Carmo.
Os Terraços do Carmo, estão localizados sobre a Rua do Carmo imediatamente à
frente das ruinas do convento e no fim do percurso que arranca do Pátio B. Trata-se
de uma plataforma que disfruta de uma belíssima vista sobre a encosta do castelo e a
Praça do Rossio que servirá o Plano de Recuperação enquanto área de lazer.
Ilustração 33 – Alçado dos Terraços do Carmo, 2013, Chiado em Detalhe
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Siza entende que a dimensão urbana do plano inovará e adaptará o Chiado às
dinâmicas dos nossos tempos, mas a outra dimensão, a do pormenor, é que fará
renascer a memória.
O arquiteto atribui grande importância ao restauro das fachadas principais, porque
estas são a “cara” do Chiado e a essência da herança pombalina. Siza, auxiliado do
Cartulário Pombalino, acaba por perceber que a arquitetura “banal e corriqueira” do
Chiado é bastante complexa. O restauro de pormenores de cada fachada, como
portas, cantarias, cornijas, embasamentos foram alvo de um estudo extremamente
aprofundado.
O Plano de Recuperação do Chiado envolve diversas escalas diferentes. O domínio
sobre as diferentes escalas de ação é a definição da vida dos vários utilizadores do
Chiado, desde o utilizador permanente ao esporádico.
Este domínio sobre a escala, nas palavras do arquiteto Gonçalo Byrne, traduz a
riqueza do processo em Álvaro Siza, onde: pensar, esquiçar e desenhar, quer se trate
do espaço publico (pavimentação, escadas, corrimãos, lambris, cornijas, galerias,
atravessamentos) quer de elementos de transição para o espaço privado (fachadas,
esquadrias, envidraçados, ferragens, etc.) é um ato vital e unitário onde se regista, da
atmosfera desejada ao particular mecanismo de uma ferragem de janela. (Byrne, 2013,
p.17)
Álvaro Siza desenha o essencial, do grande espaço público ao mundo relacional da
proximidade, onde a vida das pessoas se cola, ou se relaciona através da experiencia
sensorial, total: visual, táctil, térmica, sonora, olfativa, etc. (Byrne, 2013, p.17)
A riqueza deste plano de recuperação elaborado por Siza Vieira, resulta não só pelas
diversas alterações urbanas inovadoras, a que se submeteu a área do Chiado, mas
também, na harmoniosa coexistência de elementos novos com antigos devidamente
conservados, mas também no rigor de execução dos inúmeros pormenores das
fachadas, assim como, no primor do desenho de aproximação que marca diariamente
os quotidianos do Chiado.
Repetir nunca é repetir. (Vieira, 2000,p.15)
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3.3. O PROJETO
Os trabalhos de recuperação da zona sinistrada do Chiado tiveram início pouco depois
do fogo e ainda hoje, vinte e cinco anos depois, não está terminado. Falta concluir a
ligação da Rua Garrett ao Largo do Carmo através do Bloco B e a mais recente área
dos Terraços do Carmo. Para uma melhor organização dos trabalhos, o Chiado do
plano de recuperação está dividido em três blocos (A, B e C).
O Bloco A é composto por edifícios do tipo pombalino e pretende introduzir um novo
concito de espaço urbano no Chiado, o Pátio, que visa inovar e reforçar a estrutura já
existente.
O Bloco B é também composto por edifícios do tipo pombalino a “gritar” por uma
recuperação. Tal como no anterior, no Bloco B vai existir um eixo de comunicação,
também por meio de um pátio, que vai fazer a ligação entre dois pontos essenciais no
Chiado, e conferir de facto continuidade ao desenho da cidade.
O Bloco C tem um conceito diferente no exercício da recuperação visto tratar-se de
dois edifícios de composição particular. Estes edifícios são de extrema importância no
desenho do Chiado, tanto pela sua localização, como na função que desempenham e
pela história que já escreveram.
Ilustração 34 – Vista aérea sobre o Chiado com ilustração da divisão da área de intervenção em blocos, 2013, Chiado em Detalhe
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
3.3.1. BLOCO A
Situado entre as Ruas Ivens, Garrett, Nova do Almada e Calçada Nova de São
Francisco, o Bloco A é um quarteirão com uma recuperação idêntica ao original que
ardeu. Como a maioria dos quarteirões no Chiado, à data do incêndio, era uma
estrutura insegura, desatualizada e abandonada.
É composto por uma linha periférica de edifícios de habitação, escritórios e comércio
que no seu interior desenham um pátio público, designado por Pátio A, que aparece
em substituição dos antigos logradouros, sujos e desordenados que serviam de
estendal e armazém.
Um dos edifícios que pertence ao Bloco A é o edifício Castro & Melo que foi vencedor
do Prémio Secil63 do ano 2000, tratando-se de um edifício exemplar pela forma como
incorpora o programa definido de três funções diferentes, na maneira como se molda
ao terreno onde se insere e na comunicação harmoniosa com o envolvente.
O Pátio A tem cerca de duzentos metros quadrados de área. Tem uma escala e uma
proporção em relação ao exterior do quarteirão, que pressupõe a sua integração na
estrutura urbana.
O Plano de Siza tornou este pátio num espaço público e de utilização livre pelos
utentes da cidade. De certa maneira, esta atitude é uma rutura com o estilo pombalino,
que não previa o interior dos quarteirões enquanto espaço público, mas a abertura
deste espaço permitiu criar uma nova atmosfera dentro do Chiado, uma rede de
comunicações diversificada entre as várias ruas que envolvem o quarteirão e os
acessos aos edifícios que o desenham.
O interior deste quarteirão, com um desenho amplo e livre, aparece em contraste com
a malha apertada do Chiado. De certa maneira, o interior de um quarteirão pressupõe
sempre uma atmosfera diferente, mais calma e intimista, devido a ser rodeado de
edificado.
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O Prémio Secil é atribuído pela empresa portuguesa Secil a projetos de arquitetura (anos pares) e de
engenharia (anos ímpares). Para além dos prémios nacionais, a empresa atribui ainda o Prémio Secil
Universidades que tem por objetivo incentivar a qualidade dos jovens das escolas de arquitetura e de
engenharia civil portuguesas. Este prémio é atribuído todos os anos às duas vertentes.
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Dadas estas características, o Pátio A, torna-se um espaço semipúblico pelo facto de
poder ser vivenciado por qualquer um, mas num subambiente que contrasta com a
dinâmica das ruas que marcam o Chiado.
O edificado envolvente ao Pátio incorpora a função de comércio, que leva a
exploração deste espaço interior, como espaço interior de lazer e permanência. Tem
ainda outra função, muito importante, que é a transição de escala. Este pátio é onde
se reúnem as entradas dos edifícios de habitação, formando assim um espaço
semiprivado, de transição na relação interior (habitação) com o exterior (rua).
A recuperação do Bloco A, não propõe área de estacionamento subterrâneo, pelo
facto de um dos acessos ao interface de metro Baixa-Chiado passar cerca de oito
metros abaixo do quarteirão.
Ilustração 35 – Corte que longitudinal à Rua Garrett a passar pelo interior do quarteirão mostrando a distancia entre o pátio e o acesso
ao metro, 2013, Chiado em Detalhe
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Ilustração 36 – Planta do Bloco A, 2013, Chiado em Detalhe, ilustração nossa
Como se pode observar nos desenhos, o Pátio é um elemento que confere
continuidade urbana ao Chiado. Serve de plataforma entre as cotas da Rua Nova do
Almada e a Rua Ivens, que estão separadas por cerca de sete metros e introduz
naquele sistema de circulação, uma quantidade de novos percursos.
O acesso ao Pátio é possível por três arruamentos diferentes, através de três tuneis
que furam os edifícios do Bloco A.
A partir da Calçada Nova de São Francisco (arruamento em escada situado do lado
esquerdo do Bloco A), o acesso é feito através de uma antecâmara no embasamento
de um edifício. Esta antecâmara liga a Calçada à cota mais baixa do Pátio A e
incorpora alguns estabelecimentos comerciais. Após passar esta antecâmara, já a céu
aberto, estão umas escadas que dão acesso ao Pátio.
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Ilustração 37 – Acesso ao Bloco A através da Calçada de São Francisco, 2013, Ilustração nossa
Ilustração 38 – Escadas de acesso à parte superior do pátio, 2013, Chiado em Detalhe
A partir a Rua Ivens (rua a norte do Bloco A) é também desenhada uma ligação ao
pátio que vence uma diferença de cotas de sensivelmente quatro metros. Esta ligação,
enquanto acesso ao pátio, situado na cota inferior, articula também um acesso ao
edifício de habitação que inicia à cota da Rua Ivens.
A diferença de cotas é vencida com dois lances de escada, onde após o primeiro
surge um pequeno braço superior, transversal ao alinhamento das escadas que faz a
ligação ao segundo piso do edifício, respeitante ao primeiro da Rua Ivens.
A cobertura deste acesso não acompanha o lance de escadas, resultando no alçado
do pátio num rasgo muito vertical, muito subtil mas com muita presença no conjunto.
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Ilustração 39 – Corte longitudinal ao acesso entre o Pátio A e a Rua Ivens, 2013, Chiado em Detalhe
Ilustração 40 – Fotografia do Pátio A, 2013, Ilustração nossa
Ilustração 41 – Fotografia do acesso entre a Rua Ivens e o Pátio A, 2013, Ilustração Nossa
A terceira ligação é entre o Pátio e a Rua Garrett (Rua à direita do Bloco A). Está
concebida para a compatibilização das cotas de acesso entre a Rua Garrett e o Pátio,
o que a transforma numa ligação de grande relevância e quase natural daquele sítio.
Este acesso estabelece também uma relação de continuidade com a entrada do Pátio
B, interior do Bloco B e também com o percurso interior do Quarteirão Imperio,
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desenhado pelo arquiteto Gonçalo Byrne. Estas relações entre pátios e percursos
desenvolvem novos circuitos de circulação no Chiado.
A ligação é desenhada, mais uma vez, através do embasamento de um edifício e por
este facto torna-se uma passagem com pouca luz a qualquer hora do dia. É nesta
entrada que mais se faz sentir a troca de atmosferas durante a transição do espaço
público da Rua Garrett para o espaço semipúblico do Pátio.
A solução adotada para o túnel de ligação entre a Rua Garrett e o Pátio, resulta em
pleno na medida em que, garante a transição adequada entre dois ambientes, que se
pretendem diferentes, um, mais ruidoso e dinâmico, proveniente da Rua Garrett, outro
mais calmo e direcionado para atividades de lazer e permanência.
Ilustração 42 – Esquisso ilustrativo do Pátio A, 2013, Chiado em Detalhe
Dominique Machabert acerca da sua experiencia no Pátio A, ainda durante a fase de
construção, diz:
No outro dia, enquanto eu subia os degraus da Escada de São Francisco, aventurei-me
por uma porta entreaberta que dava para um local, vazio ainda, uma futura loja
provavelmente, que comunica com o espaço liberto do Bloco A, já acabado, uma
praceta. (Vieira, 2000, p.165) […] Abrigada dos ruídos da rua e do vento, a esplanada
do café tinha dificuldades em encontrar os seus marcos. Tal se resolveria sem dúvida
com o tempo. (Vieira, 2000, p.165).
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3.3.2. BLOCO B
O Bloco B está confinado entre a Rua Garrett, a Rua do Carmo, a Calçada do
Sacramento e a cota mais alta do Convento do Carmo. A sua localização torna-o, sem
dúvida, o elemento com maior potencial dinamizador do Plano do Chiado.
Assim como no Bloco A, a intervenção de Siza no Bloco B pressupõe a recuperação
ou reconstrução dos edifícios do tipo pombalino que o compõem e a libertação de um
espaço exterior, designado de Pátio B, que pretende reforçar a rede de comunicações
com a introdução de novos percursos em pleno coração do Chiado.
Ilustração 43 – Planta do Bloco B, 2013, Chiado em Detalhe, Ilustração nossa
Na continuação desta estratégia em que espaço edificado dá lugar a espaço urbano,
Siza reduz a profundidade de construção dos edifícios adjacentes à Rua do Carmo, de
maneira a, no interior, libertar a área necessária à abertura do Pátio B. este espaço
era anteriormente ocupado pelos edifícios da reconstrução pombalina.
Os restantes edifícios pertencentes ao Bloco B, nomeadamente os edifícios a tardoz
voltados para a Calçada do Sacramento não sofrem alterações ao nível de projeto,
sendo recuperados de acordo com a sua configuração original.
João Miguel Nascimento
90
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
A abertura do pátio no interior deste quarteirão e a redução de profundidade de
construção acabam por desenhar edifícios que agora têm duas frentes, uma para a
Rua do Carmo e outra para o Pátio B. Esta transformação, veio melhorar
substancialmente as condições de salubridade e segurança dos edifícios agora
recuperados, no âmbito da renovação do ar, aproveitamento de luz natural e
organização espacial e estrutural.
Em projeto, pelo facto de ainda não estar totalmente concluído, o Pátio B é o espaço
que desenvolve a ligação entre a Rua do Carmo, a Rua Garrett, o Largo do Carmo e
os mais recentes Terraços do Carmo. É então, um elemento altamente dinamizador do
sistema de circulação do Chiado, por articular o Largo do Carmo com os eixos de cota
inferior do mesmo bairro.
Ilustração 44 – Vista aérea sobre o Chiado. A amarelo está delimitado o Largo do Carmo, a azul a Rua Garret e a Vermelho a Rua do
Carmo, 2013, Ilustração nossa
Na óptica da continuidade urbana, o interior do Bloco B, está diretamente ligado às
principais artérias do Chiado, a Rua Garrett e a Rua do Carmo e pressupõe também a
ligação à porta sul do Convento do Carmo, que se encontra ainda em construção.
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Ilustração 45 – Bloco B – a verde está o edifício José Alexandre, a rosa está o edifício Lionel, a vermelho está a ligação entre o pátio e a
Rua do Carmo, a azul está o primeiro momento do Pátio e a Laranja está o segundo momento do Pátio , 2013, Ilustração nossa
Da Rua Garrett, no embasamento do edifício José Alexandre, uma porta de madeira
que está sempre aberta, mostra o atravessamento, sob forma de túnel, para o interior
do Bloco B. Esta entrada, que, com uma pequena torção, surge em continuidade da
saída do Pátio A, leva o utente ao primeiro contato com o Pátio B.
Depois do atravessamento deste túnel, com uma pequena variação de luz, a chegada
a um primeiro espaço, invoca a atmosfera calma e recatada a céu aberto presente no
Bloco A.
Este primeiro contacto com o Pátio B é delimitado pelo ritmo do alçado interior do
edifício José Alexandre e uma fachada reminiscente do antigo edifício ali implantado.
É por esta antiga fachada que se desenvolve a continuação do Pátio B.
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Ilustração 46 – Primeiro momento do Pátio B marcado pelo ritmo do edifício José Alexandre, 2013, Ilustração nossa
Ilustração 47 – Fachada em ruinas que demarca a transição entre momentos do Pátio B, 2013, Ilustração nossa
A partir da Rua do Carmo também é possível aceder ao interior deste quarteirão
através de um lance de escadas que vence quase sete metros de diferença de cota.
Este atravessamento, à semelhança da ligação entre o Pátio A e a Rua Ivens, também
não tem a cobertura a acompanhar os lances de escadas, resultando num rasgo
vertical com a altura de dois pisos no alçado da Rua do Carmo o desenho desta boca
está perfeitamente integrado na métrica do alçado pombalino.
Ilustração 48 – Alçado da Rua do Carmo com a entrada para o Pátio B, 2000, Álvaro Siza e a recuperação do Chiado
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Neste atravessamento, é possível ver o primor do desenho de Álvaro Siza Vieira, onde
a escada cobre o atravessamento desde o degrau até à altura do corrimão, quase
como se de um corpo único se tratasse. O corrimão, também em pedra lioz, surge com
o desenho muito subtil de uma curva e contra curva que encontra o plano da parede.
Ilustração 49 – Pormenor do corrimão do acesso entre a Rua do Carmo e o Pátio B, 2013, Chiado em Detalhe
O acesso ao Pátio B a partir da Rua do Carmo leva o utilizador ao segundo espaço
deste pátio.
Este espaço, dada a topografia acidentada é ladeado por um robusto muro de
contenção de terras em betão por uma lado e por outro com a leveza do edificado
pombalino agora recuperado.
A contraposição destas duas massas dá origem a uma atmosfera de tensão própria de
um espaço de circulação, tornando o segundo espaço do Pátio B uma autêntica
plataforma de ligação de cotas.
Estes dois últimos acessos introduzem novas alternativas na circulação entre a Rua
Garrett e a Rua do Carmo.
Tendo em conta que a intersecção destes dois eixos acontece poucos metros depois
da colocação destes dois novos acessos ao interior do quarteirão, torna-se evidente
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
que o grande fundamento destes atravessamentos é a ligação com o Convento do
Carmo, que está dependente da terceira ligação do Pátio B.
A última ligação do Pátio B é com a porta sul do Convento do Carmo. Trata-se de um
renascer das Escadinhas da Piedade que se perderam à data da reconstrução
pombalina. Estas escadas, como podemos observar no pormenor de uma gravura da
autoria de Braunio, faziam a articulação entre as cotas altas e baixas da cidade.
Ilustração 50 – Adaptação da imagem de Giorgie Braunio sobre Lisboa. Imagem adaptada para focar as existentes Escadinhas da
Piedade, 2013, Ilustração nossa
O renascer das Escadinhas da Piedade, no plano elaborado por Siza para o Chiado,
remete para a atitude do arquiteto no Bairro da Quinta da Malagueira onde o traçado
por ele proposto advém dos “caminhos de pé posto”. Estes circuitos revelam a escolha
do utente e o seu comportamento perante a necessidade de movimentação em função
da topografia.
Este acesso é desenhado por uma sucessão de lances de escada e uma rampa final,
que acompanha a parede da Escola Veiga Beirão, levando à porta lateral do
Convento. Ao longo deste percurso é possível comtemplar a parte baixa da cidade
assim como a colina do castelo. Desenvolve também uma pequena ligação a um
recanto das traseiras da Escola Veiga Beirão. O edifício Leonel que está adjacente a
este atravessamento incorpora um elevador público que também vence a diferença de
cotas entre o Pátio B e o Convento do Carmo.
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Esta ligação é de facto um elemento crucial na otimização do sistema de circulação
vigente, que permite incluir novos circuitos que vão aproximar o Largo do Carmo, as
ruas Garrett e do Carmo, o elevador de Santa Justa e os Terraços do Carmo.
Ilustração 51 – Corte explicativo da ligação entre o Pátio B e a Porta Sul do Convento do Carmo, 2000, Álvaro Siza e a reconstrução do
Chiado
As mais-valias desta ligação não são apenas para as pequenas movimentações
dentro do Chiado, se pensarmos numa escala mais ampla, a escala em que o Chiado
é um ponto de transição entre a Baixa e o Bairro Alto, este acesso pedonal terá
certamente grande adesão nas movimentações entre estes dois bairros.
Conclui-se assim que o pleno funcionamento urbano do plano para o Bloco B está
dependente da concretização desta terceira ligação. Esta ligação trará ao Pátio B,
maior visibilidade e dinâmica, ao contrário da situação em que se encontra quase ao
abandono apenas com a presença de dois espaços comerciais em funcionamento e
sem circulação pedonal.
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Ilustração 52 – Esquisso sobre o Pátio B, 2013, Chiado em Detalhe (esquerda)
Ilustração 53 – Planta da ligação entre o Pátio B e a porta sul do Convento do Carmo, 2000, Álvaro Siza e a reconstrução do Chiado
3.3.3. BLOCO C
O Bloco C, situado entre as ruas do Carmo, Nova do Almada, Áurea e Crucifixo, é
essencialmente composto por dois edifícios marcantes da história do Chiado. Os
Armazéns do Chiado e o edifício Grandella.
Além de estarem ligados à história da colina e ao carácter comercial que durante
épocas caracterizou o Chiado, estes edifícios têm uma componente urbanizadora de
grande importância no território em que se inserem.
Parte integrante do Bloco C são também os novos atravessamentos e pontos de
chegada, que foram descobertos ou inseridos por Siza, ao longo da execução do
plano, que vêm consolidar a organização do conjunto e o tornam extremamente
funcional.
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Ilustração 54 – Planta do Bloco C, 2013, Chiado em Detalhe, Ilustração Nossa
O edifício dos Grandes Armazéns do Chiado é portador de uma enorme herança
histórica. É o edifício mais mediático do Chiado; ponto de encontro de muitos e
imagem de referência para outros. Com uma presença imponente que se enquadra no
centro da perspetiva da Rua Garrett, este edifício é uma imagem de marca do Chiado,
que tem lugar na intersecção das três artérias que constroem o bairro.
No Chiado, este edifício desempenhou diversas funções, tendo funcionado como
convento antes do terramoto, como casa senhorial depois, e como grande centro do
comércio da cidade lisboeta uns anos mais tarde.
A agitada e complexa história do que foi o Convento do Espirito Santo da Pedreira,
desde a fundação medieval ate à instalação dos Armazéns do Chiado, passando pela
destruição durante o Terramoto e pela construção parcial do projeto de Ludovici,
traduz a especificidade e persistência da sua condição de majestoso monumento.
(Vieira, 2000, p.40)
Ilustração 55 – Alçado frontal dos Armazéns do Chiado, 2013, Chiado em Detalhe (em cima)
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Ilustração 56 – Alçado tardoz dos Armazéns do Chiado, 2013, Chiado em Detalhe (em baixo)
No plano de recuperação da área sinistrada, Siza define o edifício Chiado como uma
plataforma de comunicação e contentor universal, insensível a usos alterações e
incêndios. (Vieira, 2013, p.47)
Este edifício é um elemento chave de ligação entre a malha pombalina da Baixa e a
estrutura do Chiado. Agarrado à topografia acidentada da colina, os Armazéns do
Chiado são de facto um elemento urbanizador e estruturante na ligação dos dois
bairros.
Enquanto elemento urbanizador, do ponto de vista da sua posição, o edifício que
separa a Rua Garrett e a Rua do Crucifixo por quase dez metros de diferença de cota,
torna-se permeável ao articular um atravessamento pedonal pelo seu interior.
A intervenção de Siza, ao permitir esta permeabilidade interna do edifício, volta a
reforçar o sistema de circulação, com a introdução de uma nova ligação que confere
continuidade aquele fragmento urbano de topografia acentuada.
Ilustração 57 – Corte que demonstra a permeabilidade do edificio entre a Rua do Crucifixo e a Rua nova do Almada, 2013, Chiado em
Detalhe
No plano de recuperação, Siza prevê a reutilização dos Armazéns do Chiado com o
programa de hotel, que considerava indicado para uma adaptação da estrutura
existente, mas os proprietários do edifício Chiado não demonstraram grande interesse
neste, debruçando-se sobre um programa de centro comercial.
Em acordo, estabelece-se o programa de centro comercial para a maior parte do
edifício deixando os últimos pisos para uma unidade hoteleira de grande qualidade
que beneficia de uma excelente localização.
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
A estrutura horizontal deste edifício é furada no seu interior pelos pátios de acessos
verticais junto à torre central. Um percurso de escadas rolantes cruza estes pátios e os
espaços que lhe estão circunscritos de maneira a assegurar a funcionalidade dos
percursos interiores.
Os espaços comerciais estão dispostos no edifício com as lojas de maior dimensão
colocadas nos topos, enquanto as lojas menores se desenvolvem ao longo dos pátios
de acessos verticais. Nos últimos níveis do edifício desenvolvem-se o sector da
restauração e o Hotel do Chiado que beneficiam do terraço com vista sobre a cidade.
Este terraço contém um espaço ajardinado que faz a separação entre o espaço
público e a do restaurante/bar do hotel e dos varandins de cada quarto. O corpo
saliente, proveniente da fachada principal, é o volume que incorpora o restaurante.
Este espaço que se abre para a colina do Castelo de S. Jorge, proporciona um
enquadramento espetacular sobre a colina do castelo.
Durante o arranque deste centro comercial levantou-se a suspeita de que este
programa fosse um falhanço, não conseguindo vingar, face à localização descentrada
para este tipo de atividade e também dado à falta de movimento que se fazia sentir
naquelas ruas pouco antes de anoitecer.
A abertura da loja Fnac nos Armazéns do Chiado vem contornar esta situação,
utilizando o horário noturno e comportando um cartaz contínuo de atividades culturais.
Este cartaz de atividades, trouxe grandes benefícios ao desenvolvimento da atmosfera
comercial do Chiado, na medida em que voltou despoletar no utilizador o interesse e a
vontade de frequentar o Chiado.
De qualquer maneira acho que é inquestionável que o funcionamento do Chiado nas
suas diversas valências reanimou toda a zona e tem ajudado a consolidar novos
movimentos e possibilidades comunicando a sua presença para o resto da operação.
(Vieira, 2012, p.20)
Outra intervenção de Siza que resultou em grandes transformações ao nível urbano no
bairro do Chiado, foi a inclusão de um dos acessos à estação de metro Baixa-Chiado
no edifício dos Grandes Armazéns, em plena Rua do Crucifixo.
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Esta inovação, associada à descoberta das Escadinhas do Espirito Santo da Pedreira
transforma a Rua do Crucifixo, que era praticamente secundária, numa das ruas mais
dinâmicas ruas do bairro.
Ilustração 58 – Fotografia Do acesso ao metro pela Rua do Crucifixo, 2013, Ilustração nossa (esquerda)
Ilustração 59 – Corte pelas Escadinhas do Espirito Santo, 2013, Chiado em Detalhe
A Rua do Crucifixo torna-se parte integrante dos circuitos do Chiado e desenvolve
mais uma relação de continuidade entre a Baixa e o Bairro. Desta “nova” rua é
possível fazer o acesso às cotas mais altas a partir das redescobertas Escadinhas do
Espirito Santo.
A Rua do Crucifixo era um eixo secundário e de pouca importância. Ocupando a
posição de ultima rua da malha pombalina, esta funcionava como rua de serviço da
Baixa, cumprindo com funções de cargas e descargas, entre outras funções deste
âmbito.
A inclusão desta boca de acesso à estação de metropolitano na Rua do Crucifixo é um
dos elementos mais importantes de toda a intervenção desenvolvida por Siza. Esta
medida em particular vem recriar a Rua do Crucifixo enquanto primeira rua do Chiado.
A rua que simbolizava o fim da Baixa, secundária e pouco frequentada, desenvolve
uma nova atmosfera, bastante mais dinâmica, por se tratar de um ponto de chegada e
partida de pessoas. Esta nova atmosfera também tem peso na aproximação entre os
dois bairros, acabando por coordenar as novas movimentações e desenvolvendo
rotinas e hábitos nos seus utilizadores.
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Ilustração 60 – Esquisso ilustrativo da plataforma de metropolitano Baixa-Chiado, 2013, Chiado em Detalhe
A plataforma Baixa-Chiado transporta o bairro para o resto da cidade, acabando com o
problema da descentralização que o acompanhava nos anos anteriores ao fogo.
Inteiramente desenhada pelo arquiteto, este é um terminal rico na qualidade e
organização do espaço, assim como, essencial na construção da cidade e nas
deslocações de quem circula entre a Baixa e o Bairro Alto.
Há muito que o largo do Chiado se apoderou do Largo de Camões, dada a
proximidade e pela importância que tem nas relações entre Bairro Alto, Chiado, Baixa
e Cais do Sodré.
Para o presente trabalho, o ponto de maior importância no projeto desta infraestrutura
é em particular a ligação que esta estabelece entre duas partes da cidade.
Entre o acesso ao interface de metro do Largo do Chiado e o da Rua do Crucifixo
existe uma diferença de dezoito metros de cota. A inovação implantada por Siza
Vieira, consiste em ser possível utilizar a infraestrutura como ligação entre a parte alta
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
e a baixa da cidade, através de um corredor dinâmico, mecanicamente assistido, que
transporta os utilizadores entre cotas.
Ilustração 61 – Vista aérea sobre o Chiado com assinalação dos acessos ao metropolitano, 2013, Ilustração nossa
Este atravessamento que articula, por meio de escadas rolantes, uma enorme
diferença de cotas, Siza reforça as ligações da cidade estabelecendo uma nova
relação entre a Baixa, o Chiado e o Bairro Alto.
Da perspetiva do utilizador, esta ligação comporta algumas vantagens, dentre as quais
se destacam, a proteção contra intempéries, o facto de proteger este núcleo histórico
de uma possível intervenção de meios mecânicos assistidos que pudessem ser
introduzidos em pleno espaço público, de maneira a favorecer os utilizadores de
mobilidade reduzida e, por último, porque permite uma ligação direta, rápida e fácil
entre a Baixa e o Bairro Alto.
Ilustração 62 – Esquisso ilustrativo da ligação interna da estação Baixa-Chiado, 2013, Ilustração nossa
As plataformas de chegada do metro organizam-se por baixo de um plano que serve
de corredor de circulação, perpendicular ao acesso mecânico entre Alta-Baixa. Este
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103
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
plano desenvolve-se pontualmente apoiado, libertando assim o espaço lateral,
permitindo o contacto visual entre as referidas plataformas e o corredor de circulação,
unificando o espaço e tornando-o mais leve e menos claustrofóbico.
Os túneis são forrados por um ladrilho cerâmico branco brilhante, que permite um jogo
de brilhos e reflexos que espalham a luz tornando o espaço mais dinâmico. Apesar de
ser uma construção subterrânea e sob forma de túnel, este material reforça a leveza
do desenho de Siza.
Ilustração 63 – Fotografias da estação de metro, mostrando o corredor de circulação (esquerda) por cima da plataforma (direita), 2013,
Ilustração nossa
Ainda pertencente ao Bloco C há mais um edifício que se revela, ao longo dos tempos,
muito importante na relação de continuidade entre a Baixa e o Chiado. O edifício
Grandella, data de 1906 e foi um projeto elaborado por Georges Dumay, o arquiteto
responsável pelos Armazéns Printemps de Paris.
Francisco Grandella, dono do negócio e com um grande impulso empreendedor, quis
importar de Paris o conceito de grandes armazéns e implanta-lo na Baixa de Lisboa.
Com a estratégia de grande armazém e o sentido comercial de Francisco Grandella,
estes armazéns foram, na sua época de ouro, um dos mais prestigiados pontos de
comércio português.
A sua arquitetura é particular e desligada da Pombalina que constitui toda a
envolvente.
É um exemplo, raro no país, de introdução simultânea de uma nova tipologia e de uma
técnica: estrutura em ferro de gosto “art nouveau”, fachadas em pedra com decoração
figurativa e enormes vãos, de desenho certamente contaminado pela austeridade da
Baixa e pelas condições locais de construção. (Vieira, 2013, p.47)
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Ilustração 64 – Alçado frontal do edificio Grandella, 2000, Álvaro Siza e a reconstrução do Chiado
No âmbito do tema do presente trabalho, interessa no edifício Grandella focar a
componente urbana que constitui, e que o difere dos edifícios que o envolvem.
Este edifício, situado entre a Rua do Carmo e a Rua do Ouro, incorpora uma escada
rolante, que constitui um percurso que vence os quinze metros de desnível das ruas
em questão.
À data da construção do edifício, esta escada torna-se um autêntico “grito” de
modernidade que fascinava por completo os seus utilizadores, não só pelo percurso
mecanicamente assistido, mas também pela facilidade em vencer a topografia.
Ainda assim a inovação dos percursos mecanicamente assistidos não era a grande
novidade, dado que, poucos anos antes, o Elevador de Santa Justa tinha sido
inaugurado com a ligação entre o Largo do Carmo e a Rua de Santa Justa. A
verdadeira inovação constava do facto desta transição de cotas, ser feita pelo meio de
uma estrutura edificada, tornando o edifício Grandella numa “rua comercial interior”
que liga duas áreas distintas do centro da cidade.
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Ilustração 65 – Planta do edifício Grandella à cota da Rua do Ouro, 2000, Álvaro Siza e a reconstrução do Chiado (esquerda)
Ilustração 66 – Planta do piso tipo do edifício Grandella, 2000, Álvaro Siza e a reconstrução do Chiado (direita)
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Ilustração 67 – Corte perpendicular à Rua do Ouro, sobre o edifício Grandella, 2000, Álvaro Siza e a reconstrução do Chiado (direita)
Esta permeabilidade constitui mais um percurso importante no Plano do Chiado,
porque, à semelhança do atravessamento do interface de metro, aos olhos do
utilizador constitui uma ligação interior que o protege da intempérie e a transição é
feita sem grande esforço.
O percurso interior do edifício Grandella é composto por uma coluna de escadas, que
constituem um vazio na massa do edifício e termina com uma grande claraboia que
enche o espaço de luz, tornando-o de certa maneira mais convidativo e
assumidamente urbano.
Após a sua reconstrução, o edifício Grandella passou a incluir quatro pisos de
estacionamento subterrâneo, libertando este espaço para vir ao encontro das novas
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
formas de deslocação dos utilizadores e conferir capacidade de estacionamento à
área do Chiado.
Após o estudo dos edifícios Grandella e Armazéns do Chiado é notório perceber a
importância que um edifício pode ter na articulação de espaços e diferenças de cota
de uma malha consolidada. Estes dois edifícios são, em parte, responsáveis pela
aproximação entre os bairros Baixa e Chiado, e pelo contínuo urbano que agora
representam.
Ilustração 68 – Esquisso ilustrativo do Chiado, 2013, Chiado em Detalhe
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
4. PROJETO ACADÉMICO – PARQUE URBANO
O trabalho realizado no âmbito da disciplina de Projecto III, correspondente ao 5ºano
do Mestrado integrado em Arquitectura da Universidade Lusíada de Lisboa, teve como
tema a recuperação da frente marítima do Dafundo.
Nesta recuperação, não se tratava apenas de consolidar a frente marítima enquanto
parte isolada de cidade, mas sim, de a conciliar com a morfologia do restante tecido
urbano, diluindo as descontinuidades agora existentes.
Trata-se de desenvolver uma estratégia de projeto unitária, à escala da cidade, que
restabeleça a ligação entre a malha consolidada do Dafundo e a sua frente marítima,
atualmente interrompida à custa dos conflitos entre os vários sistemas estruturantes.
Ilustração 69 – Vista aérea sobre Algés, 2013, Ilustração nossa
O território de Algés tem sofrido, ao longo dos tempos, grandes intervenções
urbanísticas no que diz respeito ao sistema viário, que têm vindo a transformar a
relação, outrora existente, entre Algés e o Tejo.
A proximidade e a fácil acessibilidade entre Lisboa e Algés, fez com que este ultimo,
tenha sido uma das primeiras zonas do concelho de Oeiras a ser transformada numa
área habitacional de grande intensidade. Esta intensidade de crescimento sem
estratégia nem ordenamento, levou a um sistema pouco organizado e funcional dos
sistemas viário e edificado.
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
A praia de Algés, outrora bastante procurada, foi-se tornando cada vez mais reduzida
e perdendo consecutivamente mais visitantes que acabam por procurar as praias mais
distantes para o lado de Cascais.
A frente marítima do Dafundo/Algés encontra-se hoje bastante reduzida, pouco
atrativa e descontextualizada da restante cidade. O contacto com a cidade está
completamente condicionado pela presença da linha ferroviária, a que se juntam as
quatro vias automóveis da estrada marginal, afastando assim qualquer hipótese de
relação entre estas duas parcelas de cidade.
É objetivo do presente projeto que restabelecer a relação agora perdida e devolver aos
habitantes, o contacto com o rio, reconfigurando a zona ribeirinha na procura de uma
estrutura urbanística qualificada e convidativa.
Ilustração 70 – Limite da área de intervenção, 2013, Ilustração nossa
A proximidade à capital, da área de intervenção, confere-lhe uma grande diversidade
de acessos, entre eles, a autoestrada A5, a estrada marginal, a linha ferroviária e a
autoestrada CRIL.
a confluência destas vias de comunicação, embora reforçando o sistema de acessos,
desorganizou, e criou problemas em toda a estrutura adjacente, tornando a frente
marítima do Dafundo num vetor urbano.
Apesar da área de intervenção ser uma zona de possível extensão da cidade de
Lisboa e de conter, em si, potencialidades inerentes a ser exploradas, é atualmente,
uma zona de passagem e de ligação com as áreas envolventes, congregando em si
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
um conjunto de vias de comunicação que, por um lado oferecem maiores condições
de acessibilidade, mas que por outro descaracterizam o local e condicionam as
vivências e relações ali estabelecidas.
Torna-se assim necessário repensar a barreira imposta entre a cidade e o rio, de
maneira a tentar reajustar a sua aproximação, na procura de uma requalificação
urbanística, ambiental e vivencial do conjunto urbano.
Propõe-se então a definição de um circuito contínuo entre a Cruz Quebrada e Santa
Maria de Belém, junto à fundação Champalimaud, que comporte a organização de
novos equipamentos e espaços públicos, constituindo uma frente marítima urbana,
que “remate a cidade” e redesenhe os seus limites.
Tal como no plano de Siza Vieira no Chiado, esta intervenção, além da componente
reintegradora da área de intervenção na estrutura urbana consolidada, pressupõe
também a sua ativação, sendo que esta se encontra partida e abandonada. A frente
marítima do Dafundo encontra-se numa situação semelhante à do Chiado à data do
grande incendio de 1988.
Dada a morfologia do terreno e a sua forma longitudinal à estrada marginal, propõe-se
a implantação de um programa que constitua uma fusão entre o desporto, a cultura, e
as artes, que no seu todo configurem um Parque Urbano.
Este Parque Urbano absorve este programa, como sendo uma mistura dos contextos
anexos às áreas que o ladeiam.
Do lado do Jamor advém a tendência desportiva, que no presente plano tende a
complementar os desportos em falta, nomeadamente os desportos radicais. Do lado
de Belém vem toda a componente artística e historicista, marcada pelos diversos
edifícios e monumentos que comportam esta atmosfera.
A proposta de Parque urbano elaborada para a área de intervenção prevê uma nova
estrutura que articula novos espaços de equipamentos públicos, de habitação e uma
transformação e adaptação do sistema viário.
Este programa de Cultura + Desporto implantado no Parque Urbano pressupõe novos
usos e novas práticas para esta área da cidade, de maneira a torna-la mais avenida e
menos vetor urbano.
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Assim o programa desenvolvido integra diferentes espaços, alguns recuperados e
adaptados às novas utilizações, outros desenvolvidos de raiz em função das diretrizes
estabelecidas pelo plano.
O Parque Urbano é uma estrutura de grande porte, ligada aos desportos radicais, que
pretende receber os circuitos mundiais de Skate e Bmx, sendo um espaço atrativo
para atletas da alta competição. No entanto a ideia base da ideia é ser um espaço
atrativo para todo o tipo de utilizadores, dada a sua versatilidade e multiplicidade de
ambientes e espaços.
De maneira a complementar esta estrutura, o plano deve integrar uma unidade de
habitação temporária ou efémera, um hotel ou hostel, que possa alojar atletas e outros
utilizadores dos espaços desportivos da zona.
Para desencadear novas rotinas e hábitos de frequência aos moradores e utilizadores
do novo Parque Urbano, serão incorporados novos espaços que dinamizem o
comércio local, dimensionado à escala da envolvente.
As zonas de estacionamento vão ser introduzidas ao longo da nova estrutura viária,
sob forma de bandas de estacionamento, que conferem uma maior facilidade de
acesso e movimentação ao longo de todo o Parque.
O plano prevê também, a atribuição de funções a edifícios que se encontrem
devolutos, mas incluídos na estrutura edificada consolidada. Entre elas está a
adaptação e conversão de dois edifícios num centro de artes plásticas, com direito a
quatro pequenos equipamentos públicos do Parque para exposição dos trabalhos
realizados.
Está igualmente prevista a adaptação e conversão de um edifício de habitação, para a
função de residência de estudantes. Adjacente a esta residência, está a recuperação
de dois outros edifícios, um para conversão em ateliers e oficinas de apoio a
estudantes, outro para desempenhar a função de pequeno espaço de supermercado e
de refeições. O plano pressupõe também a recuperação de um conjunto de quatro
edifícios, mantendo a sua função de habitação.
Edificados de raiz, são os espaços que se organizam ao longo do Parque, as folies,
que albergam diferentes funções, entre as quais, as galerias de exposição associadas
ao centro de artes, espaços de leitura, restaurantes, bares, espaços para crianças
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
(ATL), enfermaria, um armazém/oficina para apoio aos pescadores e uma escola de
desportos náuticos.
À semelhança do que acontece no Chiado, com Siza Vieira, esta intervenção organiza
o sistema de circulação, reforçando-o com novos circuitos, desenvolvendo novas
atmosferas e novas rotinas que pretendem atrair os utilizadores.
A origem do desenho do plano urbano vem da descoberta de um pequeno miradouro,
situado do lado da Cruz Quebrada, que desenvolve um pequeno trilho no sentido do
Dafundo.
Ilustração 71 – Linha preexistente que originou o novo limite, 2013, Ilustração nossa
Deste pequeno percurso preexistente e na procura da geometrização da sua
continuidade, surge uma grande linha reta, que termina na torre de controlo marítimo
de Algés, desenhando o novo limite físico da frente marítima do Dafundo. Este
“caminho de pé posto” preexistente é a base que desenvolve a relação de
continuidade longitudinal entre a Cruz Quebrada e Algés.
A relação de continuidade transversal ao projeto, entre a malha edificada e a frente
marítima está completamente cortada pelo excesso de vias automóveis e a linha
ferroviária.
De maneira a permitir a permeabilidade entre estas duas parcelas e desenvolver uma
relação de interdependência e continuidade, tornou-se necessário redesenhar o
sistema de circulação e adequa-lo às necessidades de uma avenida.
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Ilustração 72 – Novo sistema viário, 2013, Ilustração nossa
Neste novo desenho do sistema viário, a linha ferroviária é elevada cerca de quatro
metros, passando o comboio a circular elevado, libertando o espaço por baixo para a
circulação pedonal.
Paralela a esta elevação das linhas de comboio, duas das quatro vias de circulação
automóvel da estrada marginal, passam a circular do lado do mar, permitindo a
integração de uma área pedonal entre estradas e por baixo da linha.
Nesta área, entre elementos de suporte da estrutura de elevação da linha,
desenvolvem-se novos espaços comerciais que marcam o início do novo Parque
Urbano.
Ilustração 73 – Corte explicativo perpendicular à linha ferroviária, 2013, Ilustração nossa
As duas vias automóveis do lado do mar desenvolvem-se cerca de 70cm abaixo do
nível pedonal, desenvolvendo uma permeabilidade visual entre a malha edificada e o
rio.
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Ilustração 74 – Relação de continuidade entre as ruas existentes e o novo Parque Urbano, 2013, Ilustração nossa
De maneira a organizar um contínuo urbano, os acessos pedonais ao parque, são
colocados estrategicamente na continuidade das ruas transversais preexistentes da já
consolidada malha edificada. Assim, com a continuidade longitudinal agora
conseguida entre o miradouro e a doca pesca, fica garantida integralmente a
continuidade de circulações entre a malha edificada e a frente marítima.
Ilustração 75 – Diagrama ilustrativo dos edifícios a recuperar e reintegrar, 2013, Ilustração nossa
O plano urbano prevê também a recuperação de edifícios devolutos na estrutura
urbana do Dafundo, e a consequente reintegração, neste sistema, com novos usos de
maneira a desenvolver uma leitura homogénea do espaço.
A recuperação da grande estrutura da antiga fábrica da Lusalite, devido à sua área e
excelente localização entre a estação da Cruz Quebrada e os dois campos
desportivos, pressupõe um novo uso com o programa de hotel, fornecendo habitação
temporária a utilizadores destas grandes estruturas.
Também na frente rio da estrutura edificada do Dafundo, o plano prevê a recuperação
de quatro edifícios devolutos para o programa de habitação, de um edifício para
João Miguel Nascimento
115
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
albergar uma residência de estudantes que estará associada à recuperação de outro
edifício, relativamente próximo, onde estes alunos podem desenvolver os seus
trabalhos em espaços próprios de atelier e oficinas. Também está prevista a
recuperação de um edifício para funcionamento de um pequeno supermercado e
espaço de refeições. Por ultimo prevê-se a conversão de um edifício num centro de
artes plásticas.
Ilustração 76 – Proposta de Plano urbano para a frente marítima do Dafundo, 2013, Ilustração nossa
O Parque urbano desenvolve-se por meio da continuação do antigo trilho, proveniente
do miradouro, onde grandes áreas verdes arborizadas se organizam em torno de um
percurso principal e os equipamentos públicos. O limite do Parque do lado do rio é
delimitado por uma ciclovia, que atravessa todo o novo espaço e pretende conferir-lhe
continuidade com o Jamor e Belém.
Ilustração 77 – Diagrama com novos espaços, novos usos e novos espaços, 2013, Ilustração nossa
João Miguel Nascimento
116
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Ilustração 78 – Fotomontagem do limite desenhado pela ciclovia, 2013, Ilustração nossa
Estes equipamentos, de forma cúbica servem como elemento organizador da estrutura
do parque e desenvolvem diversas funções. O exercício de projeto previa o
desenvolvimento de três equipamentos tipo, em que as funções escolhidas foram as
de café/bar, espaço para crianças (ATL) e a galeria de exposições associada ao
centro de artes.
- O Café/Bar é um equipamento que se desenvolve sob forma de um cubo com 10m
de aresta, ao qual foi dado o nome de Cubical Cofee. (ver anexo 1)
Este equipamento inclui no seu programa interno, o espaço de copa/cozinha, espaço
de armazém, núcleo de instalações sanitárias para trabalhadores, núcleo de
instalações sanitárias para clientes, plataforma de elevação para alimentos, área de
lazer interior e esplanada exterior.
Organiza no primeiro nível as áreas de produção e confeção de alimentos, instalações
sanitárias para clientes e trabalhadores, balcão de atendimento e espaços de estar
interiores e exteriores. O segundo nível alberga espaço de lazer e permanência, e
também um núcleo de instalações sanitárias para clientes.
Os segundo e terceiro pisos desenvolvem-se como espaço único, sendo que, o
terceiro nível é uma mezanine sobre o segundo. Este espaço é bastante convidativo e
rico pela absorção de luz natural.
- O espaço para crianças, também se insere num equipamento de forma cúbica
exterior, embora se desenvolva num nível abaixo do solo, que obviamente não é
percetível do exterior.
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Este equipamento agrega um programa, mais extenso que os restantes casos,
constituído por um playground de grandes dimensões, instalações sanitárias para
trabalhadores e para crianças, arrumos, balcão de atendimento, sala de estudo, área
de trabalhos manuais e pequenos balneários.
O nível de entrada do espaço de crianças desenvolve-se sobre o playground e
comporta apenas um corredor de acesso, um balcão de atendimento e um núcleo de
escadas. O nível inferior desenvolve-se à cota -3m em sistema de duplo pé direito e
com o balcão de atendimento a um nível superior, garantindo um maior espaço e
controlo das crianças. Contém instalações sanitárias para crianças, uma grande área
de arrumos e o playground.
O primeiro e segundo níveis também em duplo pé direito, confere ao edifício unidade
espacial.
No primeiro nível, desenvolve-se o programa de sala de estudo, instalações sanitárias
e arrumos, sendo que no segundo, a sala de trabalhos manuais acompanhada de um
pequeno balneário de apoio e instalações sanitárias.
Além deste jogo entre cheio e vazio, onde se contrapõem planos de salas, com
sistemas de duplo pé direito, os rasgos na cobertura em conjunto com os vãos de
grandes dimensões, enriquecem a luz natural do interior do edifício. (ver anexo 2)
- As galerias de exposição associadas ao centro de artes são programa de quatro
equipamentos cúbicos do Parque Urbano. Estas galerias desenvolvem-se, à
semelhança do Cubical cofee, num cubo de 10m de aresta. O programa que
incorporam é bastante simples e pequeno, de maneira a libertar o maximo espaço
possível, para as exposições.
O nível de entrada no edifício é o que comporta maior parte do programa, sendo
constituído por espaço de entrada, balcão de atendimento com área de arrumos,
plataforma elevatória e instalações sanitárias. Este nível torna-se o mais ocupado
pretendendo libertar o espaço dos restantes níveis para as salas de exposição.
Os restantes dois níveis organizam-se em sistema de duplo pé direito, sendo que o
terceiro nível se debruça sobre o segundo, unificando o espaço. Para não
descontextualizar o piso de chegada e atribuir alguma continuidade ao percurso
João Miguel Nascimento
118
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
interior do edifício, este ultimo é furado, junto aos lances de escadas, de onde emerge
uma árvore como elemento continuo a todo o edifício. (ver anexo 3)
O Parque Urbano organiza-se assim por este percurso paralelo ao rio, convivendo em
alternancia as áreas arborizadas com estes pequenos equipamentos, desembocando
na grande estrutura de skate park. Esta área desportiva é uma estrutura de grandes
dimensões, para poder representar o país e receber os eventos desportivos mais
conceituados ao nível mundial.
Este Skate Park é composto por vários tipos de rampas na grande área que ocupa,
ladeado pelo rio, por grandes áreas arborizadas e também com a presença da ciclovia,
resultando numa atmosfera de harmonia entre desporto e natureza. Por cima deste
skate park organizam-se travessias pedonais para acesso aos restantes equipamentos
que se situam junto da torre de controlo marítimo.
Junto ao acesso ao rio desenvolvem-se três equipamentos, sendo um deles já
existente, o restaurante mexicano, que se faz agora acompanhar de uma escola de
desportos náuticos, que complementa a estrutura desportiva com mais um desporto, e
um armazém/oficina de apoio a pescadores.
A proposta de Parque Urbano para a frente marítima do Dafundo desenvolve assim
um novo limite na cidade, valorizando a permeabilidade e a continuidade entre os
vários sistemas ali existentes. A integração do projeto faz-se valer pelo
desenvolvimento de um contínuo urbano, que visa reforçar os sistemas de circulação,
recuperando e recriando novos circuitos, permeabilizando toda a área de intervenção
no sentido do uso pedonal, e principalmente em convívio pleno com o Tejo que, sendo
uma enorme mais-valia que as cidades possuem, não devem nunca ser ignoradas no
desenvolvimento dos seus projetos.
O Parque Urbano pode ser encarado como um espaço de passagem por compreender
novas possibilidades de circulação entre as três zonas que lhe são adjacentes, assim
como, também, como um espaço de lazer e permanência de onde se pode tirar partido
dos equipamentos e estruturas desportivas que comporta, ou simplesmente passear e
contemplar a vista voltada ao Tejo ladeado pelas amplas áreas ajardinas.
Este espaço acaba por “cozer” a parte descontextualizada da cidade, requalificando-a
com a pretensão de servir toda a comunidade de utilizadores diretos e atrair outros
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
novos, o que naturalmente dinamizará a atividade nos sectores comercial e
habitacional da área de intervenção.
Subjacente ao redesenho da frente marítima do Dafundo, existe a necessidade de
conceber um nexo urbano, que pretende potenciar a atratividade dos utilizadores à
zona ribeirinha, onde se localiza o novo Parque Urbano.
Tal como nas intervenções pontuais de Siza Vieira na reconstrução do Chiado, este
elemento é também uma plataforma de distribuição, que consiste numa sequência de
espaços miradouro que permitem aos utilizadores fruir das paisagens sobre o Tejo,
vencendo a topografia de maneira suave e confortável.
No seguimento da ideia dos volumes cúbicos de 10m de aresta que organizam o
percurso do Parque Urbano, os miradouros assumem aqui também, neste nexo, essa
função.
No interior de cada volume desenvolvem-se as escadas de acesso às coberturas
miradouro, assim como uma plataforma elevatória mecanicamente assistida que
possibilita a utilização do percurso na transição de cotas por utilizadores de mobilidade
reduzida.
O nexo urbano funciona assim como elemento de ligação entre o Parque Urbano, a
estrutura edificada do Dafundo e as zonas de cota mais elevada, que se encontravam
impossibilitadas de comunicar diretamente dado o desnível topográfico. É também um
elemento que fortifica o sistema de circulação, introduzindo novos circuitos nas rotinas
dos utentes. (Ver anexo 4)
O Nexo urbano tem assim a ambivalência de servir para diferentes ritmos de uso,
desde o utilizador diário até ao turista frequente, associando-se, assim, a
funcionalidade ao lazer.
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Ilustração 79 – Sobreposição de cortes ilustrativa da transição através do nexo urbano, 2013, Ilustração nossa
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O aproveitamento da oportunidade criada pelo incêndio.
Com efeito, a cidade de Lisboa, teve dois momentos na sua história associados a
catástrofes que devastaram zonas inteiras e partes da cidade.
São elas o terramoto de 1755 e o grande incêndio de 1988.
Em ambos os casos e especialmente no segundo, objeto deste trabalho, o autor
aproveitou da melhor forma a transformação do Chiado, resolvendo problemas e
dificuldades de diversa ordem, provenientes do passado, que dificilmente teriam sido
tao bem resolvidas não tivesse havido uma ocorrência desta natureza.
O incêndio veio alertar para a realidade em que se encontravam as construções do
centro histórico da cidade, e o perigo que esta situação representa.
Pode dizer-se que é nestes momentos de fronteira em que o papel da arquitetura,
sempre tao relevante, pode condicionar definitivamente, para bem e para mal, as
soluções implementadas. Neste caso concreto, sem dúvida alguma, trata-se de uma
excelente intervenção que ficará para a posteridade.
O impacto da intervenção
Tratando-se o Chiado de uma plataforma de charneira entre a Baixa pombalina e o
Bairro alto, Siza Vieira toma uma atitude não de rutura, mas de continuidade da
arquitetura ali praticada na estratégia de recuperação. Esta atitude, é o que mantém
viva a memória daquela zona e o que demonstra a sensibilidade e bom senso de Siza
Vieira. Trata-se portanto de uma opção do autor, que no entanto foi muito contestada
por outras correntes, favoráveis à introdução de um novo registo de arquitetura,
criticando-o por entenderem não existir mão criativa, por apenas se intervir no interior
dos quarteirões, deixando o aspeto visual globalmente inalterado.
Apesar de a totalidade do projeto não estar ainda concluída, é hoje do senso comum,
estar-se em presença de uma excelente transformação desta área da cidade.
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
Preocupações fundamentais
É patente a intenção do arquiteto, de preservar a conceção histórica da área em
estudo. Desta forma e sem uma intervenção arrojada, de exuberância arquitetónica, a
operação do Chiado centra-se na recuperação e conservação das fachadas
pombalinas, surgindo a verdadeira mão criativa na recriação dos sistemas que
estruturam a zona.
A adaptação destes sistemas, principalmente o de circulação, às novas dinâmicas e
movimentações sociais torna-se a base desta intervenção, quase reconstruindo o
Chiado em função delas sem no entanto o descaracterizar.
Por isso, o aspeto visual da estrutura edificada é, no geral preservado,
permeabilizando, no entanto, o seu interior para adequa-la aos novos hábitos e
costumes da população utente. Esta situação é particularmente extensível aos
edifícios ícone, Armazéns do Chiado e Grandella, edifícios urbanizadores, cuja marca
urbana é incontornável.
Por esta razão, e por decisão de Siza Vieira, quando nos deslocamos no “novo”
Chiado tem-se a sensação que nada se perdeu relativamente ao antes do incêndio, ou
seja, apesar de se ter adaptado, corrigido, modernizado e alterado aquele fragmento
urbano, este mantém a memória do que era e adequa-se perfeitamente às vivências
dos nossos tempos, sem que o seu utente se aperceba dessas modificações.
Este facto prova também a grandiosidade deste projeto e das escolhas efetuadas.
Melhoria das infraestruturas
Este foi certamente o momento para renovar as diversas infraestruturas de
abastecimento, de acordo com as novas
legislações técnicas, tais como,
abastecimentos de água, energia, redes de saneamento pluvial e residual, iluminação
exterior, segurança e infraestruturas de transporte, tal como, o metropolitano. As
acessibilidades são também um exemplo nas circulações internas do bairro que
outrora eram impossíveis de efetuar, comportando também as facilidades conseguidas
para os utentes de mobilidade reduzida.
Foram estas melhorias que também privilegiaram a fácil acessibilidade daquela e para
aquela parte da cidade de Lisboa.
João Miguel Nascimento
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Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
O Peso do Chiado
Durante muitos anos, o Chiado foi o palco do comércio e da vida urbana de Lisboa. Os
últimos anos antes do fogo deixaram-no abandonado face ao aparecimento de novos
espaços comerciais e focos de atratividade até aí exclusivos do Chiado.
Após a intervenção de Siza Vieira, o Chiado tem vindo gradualmente a reconquistar a
sua posição cimeira, na procura por parte dos cidadãos, turistas e grandes eventos
sociais.
Lisboa é atualmente considerada uma das cidades mais bonitas do mundo, e sem
dúvida que contribui para esse facto, os seus 800 anos de história, tendo o Chiado um
papel muito importante nessa história.
Álvaro Siza Vieira não quis cortar com a história, antes quis conta-la às futuras
gerações recriando-a para que possa continuar a ser por elas vivida.
Repetir nunca é repetir. (Vieira, 2000,p.15)
João Miguel Nascimento
124
Álvaro Siza Vieira e o plano do Chiado
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