AGOSTINHO TOFFOLI TAVOLARO 1 OMC : SUBSÍDIOS TRIBUTÁRIOS * AGOSTINHO TOFFOLI TAVOLARO 1 - INTRODUÇÃO O crescimento do comércio internacional a partir do último quarto do século passado propiciou ao direito, em todos os seus aspectos, novas facetas de estudo e dimensões até então somente fruto de cogitação de uns poucos. 2 - DIREITO TRIBUTÁRIO E O DIREITO COMERCIAL INTERNACIONAL Essas novas dimensões do direito se espelham em todos os seus ramos, havendo dado um novo alento ao direito tributário internacional, dada a frequência de transações trans-fronteiras e ao direito comercial internacional, onde, a partir de 1960 BERTHOLD GOLDMANN fala em uma nova lex mercatoria, com maior vigor que a antiga lei dos mercadores que vicejou na idade média e no início da idade moderna 1. Embora tradicionalmente exista um muro separando tributação e comércio, a verdade é que essa muralha, tal qual o muro de Berlim, vem caindo , pois como anota JINYAN LI, citando HOMER MOYER, toda solução tributária causa problemas de comércio e toda solução de comércio tem problemas tributários 2. Como afirma WOLFGANG SCHÖN, se a liberdade de mercado (objetivo da OMC – Organização Mundial do Comércio) há de ser atingida, os preços cobrados nos mercados internacionais de produtos não podem ser distorcidos, dificilmente existindo outras partes dos sistemas jurídicos nacionais cujos efeitos na fixação de preços sejam tão profundos quanto à parte do regime tributário nacional 3, o que começa com os direitos aduaneiros, passando ao imposto de consumo e à tributação especial de produtos supérfluos (tabaco e álcool). * - Advogado Sócio Diretor de TAVOLARO E TAVOLARO - ADVOGADOS – Campinas - São Paulo. - Vice Presidente da IFA – INTERNATIONAL FISCAL ASSOCIATION – 1983/1985. - Membro do Comitê Permanente Científico da IFA - INTERNATIONAL FISCAL ASSOCIATION – Amsterdã – Holanda (1990/2000). - Presidente da ABDF - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE DIREITO FINANCEIRO (1996/1998) – Atual Vice-Presidente – Rio de Janeiro – Brasil. - Acadêmico da Cadeira nº 14 da ABDT - ACADEMIA BRASILEIRA DE DIREITO TRIBUTÁRIO – Vice-Presidente – São Paulo – Brasil. - Professor de Direito Comercial na Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Campinas - São Paulo – Brasil. 1 MAGALHÃES, José Carlos de e TAVOLARO, Agostinho Toffoli. Fontes do Direito do Comércio Internacional: a Lex Mercatoria. “in” Direito do Comércio Internacional – Aspectos Fundamentais, S. Paulo : Lex, 2004, p. 57. 2 LI, Jinyan. Relationship between International Trade Law and National Tax Policy : Case Study of China. “in” Bulletin for International Fiscal Documentation, February/2005, 77. 3 SCHÖN, Wolfgang. World Trade Organization Law and Tax Law. “in” Bulletin for International Fiscal Documentation, July/2004/283 Av. Hermas Braga, nº 379, Nova Campinas - 13092-130 - CAMPINAS – SP Fone: (19) 3251-8237 - Fax: (19) 3251-2432 E-mail: [email protected] AGOSTINHO TOFFOLI TAVOLARO 2 De se notar, ainda, que o direito comercial internacional que a OMC corporifica (não todo ele, desde logo se afirme), não tem o mesmo alcance que tem o dos blocos econômicos regionais, pois estes visam (e a União Européia é o melhor exemplo) a completa integração de seu mercado interno, compreendendo o livre trânsito de pessoas, mercadorias, serviços e capitais, enquanto que a OMC preocupa-se apenas com o livre trânsito de mercadorias e serviços, cabendo notar, ainda com SCHÖN, que historicamente as regras de um e de outro vem caminhando em paralelo, no que se refere a mercadorias e serviços, como se percebe da proibição de discriminação e protecionismo tributário no art. 90 do Tratado da União Européia (modelado conforme o art. III (2) do GATT 1947) e do Acordo sobre Subsídios e Medidas Compensatórias da OMC,que adota as regras dos arts. 87 e 88 do Tratado da União Européia 4. 3 - OS TRATADOS INTERNACIONAIS SOBRE TRIBUTAÇÃO O exame das convenções internacionais sobre tributação evidencia a coexistência de tratados multilaterais e tratados bilaterais, denunciando no entanto a tendência de terem os tratados bilaterais comumente como objeto os impostos diretos (tributação da renda) 5 enquanto que o GATS se ocupa dos impostos indiretos (nestes compreendidos os direitos alfandegários). 4- OS TRATADOS SOBRE TRIBUTAÇÃO E SOBERANIA Não passe ainda sem menção o fato de que os tratados internacionais têm a ver com a soberania, conceito que vem sofrendo evolução ditada pela constante mutação das relações internacionais e da instabilidade do equilíbrio de forças (militares, econômicas, tecnológicas e culturais) que encontrou sua mais forte expressão no último século e cujos efeitos se projetam no inicio deste novo milênio. Ligada umbilicalmente ao conceito de Estado, tem a soberania, como ensina ALBERTO XAVIER, dois elementos essenciais o território e a população 6, dando origem a uma soberania pessoal, consistente no poder do Estado de regular as relações jurídicas de seus nacionais e uma soberania territorial, que se configura no poder do Estado de legislar sobre pessoas, coisas, fatos e eventos que ocorram em seu território. Característica do Estado soberano é sua independência, perante as demais pessoas jurídicas com que se relacione e de total independência diante de qualquer outra pessoa jurídica soberana, na assizada assertiva de BETINA GRUPPENMACHER 7. 4 SCHÖN, Wolgang. Op. cit. p.284. A rede mundial de tratados sobre a dupla tributação da renda abrange hoje mais de 2000 tratados; o Brasil tem em vigor atualmente 25 tratados desse tipo. 6 ª XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional. Rio: Forense, 2004, 6 ed., p. 13. 7 GRUPPENMACHER, Betina Treiger. Tratados Internacionais em Matéria Tributária e Ordem Interna. S. Paulo : Dialética, 1999, p. 11, nº 2.1. Av. Hermas Braga, nº 379, Nova Campinas - 13092-130 - CAMPINAS – SP Fone: (19) 3251-8237 - Fax: (19) 3251-2432 E-mail: [email protected] 5 AGOSTINHO TOFFOLI TAVOLARO 3 Essa independência, no entanto, tem-se visto cerceada em função dos tratados internacionais, levando, como diz CANOTILHO, a uma distinção entre o constitucionalismo nacional, tradicional e o constitucionalismo global, tendo este como pontos de partida a democracia e o princípio de autodeterminação , havendo de nossoutros as seguintes observações: “O primeiro, democracia e o caminho da democracia, é tópico centralizador da política interna e internacional, apresentando-se, no plano interno, como o governo ‘menos mau” e no plano internacional como promotor da paz. O segundo, princípio da autodeterminação, “deve ser reinterpretado não apenas no sentido de que os ‘os povos’ devem deixar de estar submetidos a quaisquer formas de colonialismo, mas também no sentido de que a legitimação da autoridade e da soberania política pode e deve encontrar suportes sociais e políticos a outros níveis – supranacionais e subnacionais – diferentes do ‘tradicional’ e ‘realístico’ Estado-nação” Aponta, assim, para a irrelevância das fronteiras e para o papel desempenhado pela globalização da informação e das comunicações e para o deslocamento das atividades do ator estatal para as ONGs privadas ou públicas mas não estatais. Dando sequência a seu pensamento, enumera ainda os traços caracterizadores desse constitucionalismo global: “1) alicerçamento do sistema jurídico-político internacional não apenas no clássico paradigma das relações horizontais entre estados (paradigma hobbesiano/westfalliano, na tradição ocidental) mas no novo paradigma centralizado nas relações entre Estado/povo (as populações dos próprios estados); 2) emergência de um jus cogens internacional materialmente informado por valores, princípios e regras universais progressivamente plasmados em declarações e documentos internacionais; 3) tendencial elevação da dignidade humana a pressuposto ineliminável de todos os constitucionalismos.” Finalmente, conclui que o constitucionalismo global não está , ainda, em condições de neutralizar o constitucionalismo nacional, que se assenta nas seguintes premissa: a) soberania de cada Estado – conduzindo, no plano externo a relações horizontais entre os diferentes Estados e no plano interno à supremacia no seu território e exercício das sua competências soberanas (legislação, jurisdição e administração); Av. Hermas Braga, nº 379, Nova Campinas - 13092-130 - CAMPINAS – SP Fone: (19) 3251-8237 - Fax: (19) 3251-2432 E-mail: [email protected] AGOSTINHO TOFFOLI TAVOLARO 4 b) centralidade jurídica e política de sua constituição como carta de soberania e independência perante outros Estados; c) aplicação do direito internacional na forma prevista na sua constituição interna; d) nacionalidade das populações ou povos residentes permanentemente em seu território definida por sua constituição. Apresenta-se assim o constitucionalismo nacional como determinante da primazia da constituição nacional de cada país, que se traduz na necessidade de subordinação dos tratados internacionais às normas constitucionais, em particular no caso do Brasil, conclusão a que também chega IVO DANTAS 8 , que a dá como “decorrência dos elementos que caracterizam a Constituição como norma portadora de uma supra legalidade sobre todo o ordenamento jurídico nacional”. De se indagar ainda, como faz DENNIS LLOYD, citado por IVO DANTAS : “como um Estado soberano nacional pode estar subordinado a um sistema de normas legais internacionais, sem perda de sua soberania independente?"”9, a que se dá resposta fazendo-se a distinção entre DELEGAÇÃO e TRANSFERÊNCIA, para afirmar que no caso ocorre a delegação, pois enquanto na transferência o Estado aliena seus poderes de que era , até então, titular, na delegação a raiz, a titularidade nua (como a nua propriedade no usufruto) mantém-se na esfera do Estado titular ou delegante.10 De nossa parte, no entanto, vemos em alguns tratados internacionais, uma verdadeira renuncia do Estado signatário, quando, ao invés de ceder o direito de tributação a um outro Estado, que tributará o mesmo fato gerador, pura e simplesmente se obriga a não tributar o fato gerador ou, no caso de subsídios e incentivos fiscais, a se abster de criálos ou pô-los em execução. Com efeito, se soberania tributária é, como escreve McLURE , a capacidade de uma nação de implementar qualquer política fiscal que escolha, livre de influências externas11, entendemos que essa soberania tributária resulta arranhada, sem transferência ou delegação quando o Estado, através de um tratado multilateral (OMC) ou bilateral se obriga, sem contrapartida direta dos demais Estados, a não adotar determinada política fiscal de incentivos ou subsídios. 8 DANTAS, Ivo. Direito Constitucional Econômico – Globalização *& Constitucionalismo. Curitiba: Juruá, 2004, p. 146. 9 DANTAS, Ivo. Op. cit. p.142. 10 TAVOLARO, Agostinho Toffoli. Globalização, Soberania e Tributação. Revista de Tributário e de Finanças Públicas, Janeiro/Fevereiro/2005, nº 60/234. 11 McLURE, Charles E. Jr. Globalization, Tax Rules and National Sovereignity. “in” Bulletin for Fiscal Documentation, August/2001/328. Av. Hermas Braga, nº 379, Nova Campinas - 13092-130 - CAMPINAS – SP Fone: (19) 3251-8237 - Fax: (19) 3251-2432 E-mail: [email protected] AGOSTINHO TOFFOLI TAVOLARO 5 De se deter , aqui, para se avaliar se a obrigação assumida pelos Estados signatários da OMC no mesmo sentido se constitui em contrapartida dessa renuncia, o que muitas vezes deixa de ocorrer dadas as diferentes condições e estágios de desenvolvimento dos mesmos. 5- TREATY OVERRIDE Necessário se faz, para determinar com precisão o alcance das normas convencionais internacionais, indagar ainda da posição dos diferentes Estados quanto à possibilidade de sua lei nacional posterior contrapor-se ao acordado internacionalmente, consubstanciando o que na doutrina internacional comumente se denomina “treaty override”. Em recente estudo, Karl Vogel relata que, enquanto em 1989 somente duas constituições (França e Holanda) davam prevalência aos tratados sobre a legislação interna acrescentando ele também o Japão ,hoje, de 43 países da Europa 17 comandam ,por dispositivo de sua constituição essa prevalência (Albânia, Armênia, Arzebaijão, Bulgária, Chipre, Croácia, Espanha, Estônia, França, Geórgia, Grécia, Holanda, Macedônia, Polônia, Republica Tcheca, Rússia e Eslovênia) , dois tem disposição similar em leis complementares (Látvia e Hungria) , cinco países dão prevalência aos tratados em defluência de princípios constitucionais, embora não exista norma constitucional expressa (Bélgica, Bôsnia-Herzegovinia, Luxemburgo, Portugal e Suíça) , seis países em que se dá predominância aos tratados sobre direitos humanos (Eslováquia, Malta, Moldávia, Noruega, Reino Unido e Romênia) ; treze países não reconhecem a supremacia dos tratados (Alemanha, Andorra, Áustria, Belarus, Dinamarca, Finlândia, Islândia, Itália, Liechtenstein, Lituânia, San Marino, Suécia e Ucrânia) 12. No continente americano verificamos que nos Estados Unidos da América do Norte não existe prevalência do tratado, dada à existência, em plano constitucional, da cláusula de supremacia, que o art. VI.2 consagra, podendo assim a lei federal posterior sobrepor-se ao tratado 13. 12 13 VOGEL, Klaus. New Europe Bides Farewell to Treaty Override. “in” Bulletin for International Fiscal Documentation January/2004/5. Assim dispõe o art. VI.2 da Constituição americana: “Esta constituição e as leis complementares e todos os todos os tratados já celebrados ou por celebrar sob a autoridade dos Estados Unidos constituirão a lei suprema do país; os juízes de todos os Estados serão sujeitos a ela, ficando sem efeito qualquer disposição em contrário na Constituição ou nas leis de qualquer dos Estados” (S. Paulo : Jalovi, 1987 ou no original: “VI.2 – This Constituion, and the Laws of the United States which shall be made in Pursuance thereof; and all Treaties made, or which shall be made, under the Authority of the United States, shall be the supreme Law of the Land; and the Judges in every States hall be bound thereby, any Thing in the Constitution or Laws of any State to the Contrary notwithstanding.” Av. Hermas Braga, nº 379, Nova Campinas - 13092-130 - CAMPINAS – SP Fone: (19) 3251-8237 - Fax: (19) 3251-2432 E-mail: [email protected] AGOSTINHO TOFFOLI TAVOLARO 6 Na Argentina, conforme testemunha JUAN CARLOS VICCHI 14, vinha a Corte Suprema de Justiça de la Nación filiando-se à doutrina da supremacia da lei nacional desde 1963, conforme decidido em “Martin & Co. S.A. c. Gobierno Nacional (Administración General de Puertos), havendo no entanto alterado seu posicionamento em 7 de julho de 1992, julgando a causa “Ekmekdjian , Miguel Angel c. Sofovich, Gerardo” com fundamento no art.27 da Convenção de Viena sobre Direitos dos Tratados, a que aderiu a República Argentina em 1973 15. Com a reforma constitucional de 1994 passaram as normas dos tratados aprovados pelo Congresso Nacional a revestir-se de hierarquia superior à das leis, conforme previsto no art. 75, inc. 22, no que se refere a direitos humanos 16 e no inciso 24 do mesmo art.75 no que se refere a tratados de integração 17. De se apontar, ainda , que o artigo 31 da Constituição Argentina contém também disposição similar à cláusula de supremacia da Constituição americana 18. 14 15 16 17 18 VICCHI, Juan Carlos. La Armonización Fiscal en los Procesos de Integración Económica. Buenos Aires : La Ley, 2004, p.82. Estabelece o art. 27 da Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados de 1969 (em vigor a partir de 27 de janeiro de 1980): “Art. 27 – DIREITO E OBSERVÂNCIA DE TRATADOS Uma parte não pode invocar as disposições de seu direito interno para justificar o descumprimento de um tratado...” Preceitua o art. 75, inc. 22 da Constituição da República Argentina: “22. Aprobar o desechar tratados concluídos com las demás naciones y com lãs organizaciones internacionales y los concordatos com la Santa Sede. Los tratados y concordatos tienen jerarquía superior a las leyes. La Declaración Americana de los Derechos y Deberes del Hombre; la Declaración Universal de los Derechos Humanos; la Convención Americana de los Derechos Humanos; el Pacto Internacional de Derechos Econômicos, Sociales y Culturales; el Pacto Internacional de Derechos Civiles y Políticos y su Protocolo Facultativo; la Convención Internacional sobre la Eliminación de todas las Formas de Discriminación Racial; la Convención sobre la Eliminación de todas las Formas de Discriminación contra la Mujer; la Convención contra la Tortura y otros Tratos o Penas Crueles, Inhumanos o Degradantes; la Convención sobre los Derechos del Nino; em las condiciones de su vigência, tiene jerarquía constitucional, no derogan articulo alguno de la primera parte de esta Constitución y deben entenderse complementarios de los derechos y garantias para ella reconocidos. Solo poderán ser denunciados, em su caso, por el Poder Ejecutivo nacional, previa aprobación de las dos terceras partes de la totalidad de los miembros de cada Câmara. Los demás tratados y convenciones sobre derechos humanos, luego de ser aprobados por el Congreso, requerirán del voto de las dos terceras partes de la totalidad de los miembros de cada Câmara para gozar de la jerarquía constitucional.” Determina o art. 75, inc. 24 – “24. Aprobar tratados de integración que deleguen competências y jursidicción a organizaciones supraestatales em condiciones de reciprocidad e igualdad, y que respeten el orden democrático y los derechos humanos. Las normas dictadas em su consecuencia tienen jerarquía superior a las leyes.” Está assim redigido o art. 31 – “Esta Constitución, las leyes de la Nación que em su consecuencia se dicten por el Congreso y los tratados com las potencias extranjeras son la ley suprema de la Nación; y las autoridades de cada província están obligadas a conformarse a ellas, no obstante cualquiera disposición em contrario que contengan las leyes o constituciones provinciales, salvo para la província de Buenos Aires, los tratados ratificados después del pacto de 11 de noviembre de 1859.” Av. Hermas Braga, nº 379, Nova Campinas - 13092-130 - CAMPINAS – SP Fone: (19) 3251-8237 - Fax: (19) 3251-2432 E-mail: [email protected] AGOSTINHO TOFFOLI TAVOLARO 7 No Brasil , onde a Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados encontra-se ainda pendente de ratificação pelo Congresso Nacional 19 , não obstante a forte pressão dos adeptos da corrente monista internacionalista, mantém-se no Supremo Tribunal Federal a tese da prevalência da lei nacional 20 , excetuada pela norma do Código Tributário Nacional, que com a natureza de lei complementar determina em seu artigo 98 a supremacia dos tratados internacionais sobre tributação 21. Quanto aos tratados sobre direitos humanos, foi-lhes dada, pela Emenda Constitucional nº 45, de 8 de dezembro de 2004 equivalência às emendas constitucionais 22. Assim, necessário é se conservar em mente se pode um Estado, ao adotar uma determinada política fiscal contrária a uma norma obrigacional a que se tenha submetido, dela discrepar, admissível essa discrepância somente por partes de Estados que adotem o “treaty override”. 6 - O TRATADO DA OMC : LIVRE COMÉRCIO LOWENFELD 23 escreve que a meio-caminho da Segunda Grande Guerra os EUA e a Grã-Bretanha começaram a discutir o futuro do sistema monetário e do lado comercial do intercâmbio econômico, quanto a este havendo planejado um acordo multilateral de comércio, que buscaria a redução das barreiras alfandegárias e a disciplina das negociações multilaterais para atingir essa finalidade e uma organização internacional de comércio (ITO – International Trade Organization) , que seria uma organização permanente, tendo por objeto não só as tarifas aduaneiras mas também o investimento internacional, os cartéis e outras práticas restritivas de negócios, os acordos sobre “commmodities” e o desenvolvimento econômico. 19 Encaminhada ao Congresso Nacional em 20 de abril de 1992 e aprovada em 1995 pela Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional encontra-se ainda em tramitação parlamentar, sendo um dos óbices à sua aprovação a regra de seu art. 24.2, segundo a qual “um tratado entra em vigor tão logo o consentimento em obrigar-se por um tratado seja manifestado por todos os Estados negociadores” o que se contrapõe ao art. 49, I , da Constituição Brasileira, que determina: “É da competência exclusiva do Congresso Nacional : I – resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional . ...” TAVOLARO, Agostinho Toffoli. A supremacia dos tratados internacionais em face da legislação interna. “in” RTFP maio/junho/2002, 44/41- também “in” Diritto e Pratica Tributária Internazionale, Vol. LXXIII (2002), nº 4/548. 21 Reza o art. 98 do Código Tributário Nacional: “Art. 98 – Os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna, e serão observados pela que lhes sobrevenha.” 22 A Emenda Constitucional nº 45, de 08/12/2004 acrescentou ao art. 5º da Constituição Federal de 1988, que versa sobre os direitos e garantias fundamentais o seguinte parágrafo 3º: “§ “3º - Os tratados e as convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional , em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais” 23 LOWENFELD, Andreas F. International Economic Law – Public Control on International Trade, N. ª York : Matthew Bender, 1983, 2 ed. p. 15, § 2.2. Av. Hermas Braga, nº 379, Nova Campinas - 13092-130 - CAMPINAS – SP Fone: (19) 3251-8237 - Fax: (19) 3251-2432 E-mail: [email protected] 20 AGOSTINHO TOFFOLI TAVOLARO 8 Desses planos somente prosperou o acordo multilateral de comércio – o GATT – instituído em 1947, pois o estatuto da ITO , aprovado em Havana em 1947, apesar de subscrito por 53 países, inclusive os EUA e a Grã-Bretanha não foi levado adiante, pois não chegou a ser aprovado pelo Congresso americano, o mesmo acontecendo em relação à Grã-Bretanha. Objeto de sucessivas rodadas de negociações, que LIGIA MAURA COSTA alinha 24, onde ser firmaram normas a serem observadas no comércio internacional, atingiu o GATT de 1947 seu pináculo com a Rodada Uruguai, que se encerrou com a Ata Final firmada em Marrakesh , em abril de 1994, onde teve berço a OMC – Organização Mundial do Comércio, também conhecida por sua sigla em inglês WTO – World Trade Organization 25. Tendo por fundamentos, como aponta GUSTAVO ZUNINO 26: a) um comércio sem discriminação que se apóia na cláusula de nação mais favorecida; b) a promoção de uma concorrência leal mediante a eliminação de restrições quantitativas; c) o fomento do desenvolvimento e da reforma econômica ; d) a redução geral e progressiva dos direitos alfandegários e) a segurança jurídica, possui hoje a OMC 148 países membros regulação do comércio internacional. 24 27 , constituindo-se em instrumento eficaz de COSTA, Ligia Maura. OMC – Manual Prático da Rodada Uruguai. S. Paulo : Saraiva, 1996, assim relaciona as rodadas de negociações multilaterais do GATT: “As primeiras Rodadas de Negociações Comerciais Multilaterais tratavam apenas de problemas tarifários. São elas: Rodada Genebra (abril a outubro de 1947, 23 países participaram dessa Rodada); Rodada Annecy, França (1949, 33 países participantes); Rodada Torquay, Inglaterra (1950 a 1951, 34 países participaram dessa Rodada); Rodada da Genebra (1955 a 1956, os países participantes eram 22) e Rodada Dillon (1960 a 1961, 45 países participantes). A partir da Rodada Kennedy (novembro de 1963 a maio de 1967, com 48 países participantes), as negociações passaram a abranger não somente o plano tarifário, mas também o não tarifário. A Rodada Tóquio (setembro de 1973 a novembro de 1979, com 99 países participantes) tratava tanto dos problemas tarifários e não tarifários como da reforma do sistema jurídico do GATT-1974. A Rodada Uruguai teve sua Ata Final assinada em 15.04.1994. 25 NORONHA, Durval de Goyos Jr. A OMC e os Tratados da Rodada Uruguai. S. Paulo: Observador Legal, 1994, p. 11. 26 ZUNINO, Gustavo. Limitaciones al poder tributario sobre el comercio internacional y restricciones sobre las políticas de defensa comercial, derivadas del acuerdo Marrakesh por el que se estableció la Organización Mundial de Comercio “in” Justiça Tributária, Coord. HELENO TAVEIRA TORRES, S. Paulo : Max Limonad,1998, p. 213. 27 www.wto.org/english acesso em 08/03/2005. Av. Hermas Braga, nº 379, Nova Campinas - 13092-130 - CAMPINAS – SP Fone: (19) 3251-8237 - Fax: (19) 3251-2432 E-mail: [email protected] AGOSTINHO TOFFOLI TAVOLARO 9 Não se ignore que tem ela opositores ferrenhos, que a consideram como “inerentemente antidemocrática” , vendo nela um instrumento a serviço dos poderosos países industrializados e das corporações multinacionais, afirmando que as decisões das disputas comerciais entre nações membros levadas a ela tem favorecido as nações industrializadas 28. Embora realmente a maioria das decisões favoreçam as nações desenvolvidas, parece-nos que isto se deve muito mais à falta de preparo das nações em desenvolvimento na defesa de seus pontos de vista, falha essa que vem aos poucos sendo gradativamente eliminada por aquelas nações que compreendem a importância dessas decisões. Ainda recentemente obteve o Brasil vitória expressiva contra os EUA na disputa contra ele levada a efeito perante painel da OMC, tendo por objeto os subsídios concedidos pelos EUA aos produtores e exportadores americanos de algodão 29. Embora se possa chamar, como vulgarmente se diz “briga de gente grande”, não se pode deixar aqui de referir, como relata SCHÖN a disputa entre a então Comunidade Européia e os EUA, quanto às DISC (domestic international sales corporations) , programa instituído pelo Revenue Act de 1971 que qualificava como DISC as empresas que tivessem como receita bruta no mínimo 95% oriunda de exportação, dando-lhes isenção completa do imposto sobre os lucros auferidos, resolvida pela OMC no sentido de reconhecer a existência de subsídio à exportação vedado pelo art. XVI(1) do GATT 30. Substituído em 1984 o programa DISC pelas FSC (foreign sales corporations), companhias com base no exterior que exportavam produtos americanos para terceiros países, seus lucros derivados de exportações eram isentos do imposto de renda americano, assim como seus acionistas não eram tributados pelos dividendos recebidos dessas companhias. Levada a matéria ao painel da OMC e depois ao seu órgão de apelação, a decisão foi contrária aos EUA, de vez, adotando estes o world wide income system seja para a tributação das empresas seja para a tributação das pessoas físicas, as vantagens asseguradas pela legislação americana foram consideradas uma renuncia (waiver) da cobrança dos impostos que seriam exigidos em circunstâncias normais. Face a essas decisões da OMC substituíram os EUA o programa FSC pelo ETI – Extraterritorial Income Exclusion Act a fim de declarar não tributável a renda obtida fora do território americano nas exportações, substituição essa também profligada tanto pelo painel quanto pelo órgão de apelação da OMC. Analisando essas decisões SCHÖN as vê baseadas muito menos na adoção do princípio da taxação da renda universal que no princípio da capacidade contributiva (ability to pay) , afirmando que o fato de que os lucros sejam oriundos de exportação é completamente irrelevante para se aquilatar a situação financeira do contribuinte, princípio da capacidade contributiva este que ALEJANDRO C. ALTAMIRANO dá como “plenamente aplicable a los tributos del comercio exterior” 31 28 Veja-se o site www.citizen.org/trade/portugues/omc/ - acesso em 08/03/2005. O Estado de São Paulo, de 04/03/2005, p. B5 30 SCHÖN, Wolfgang. Op. cit. p. 293, nº 7.3.1. 31 ALTAMIRANO, Alejandro C. Las retenciones a las exportaciones de productos agropecuários – Finalidades fiscales y extrafiscales. “in” Impuestos sobre el Comercio Internacional, Coord. VICTOR UCKMAR, ALEJANDRO C. ALTAMIRANO e HELENO TAVEIRA TORRES, Buenos Aires: Ábaco, 2003, p. 309. Av. Hermas Braga, nº 379, Nova Campinas - 13092-130 - CAMPINAS – SP Fone: (19) 3251-8237 - Fax: (19) 3251-2432 E-mail: [email protected] 29 AGOSTINHO TOFFOLI TAVOLARO 10 7- SUBSÍDIOS NA OMC Ilustrado acima o posicionamento da OMC, vemos que os exemplos dados concernem subsídios, precisamente o ponto focal do presente trabalho. 7.1 – DIREITOS E ENCARGOS DE QUALQUER NATUREZA Inicialmente, cumpre lembrar que o art. 2 do GATT expressamente se refere à tributação na importação como abrangente de “direitos ou encargos de qualquer natureza , exigidos por ocasião da importação ou que com a mesma se relacionem” na dicção que lhe deu em português a Lei nº 313, de 30/07/1948, correspondente ao texto em inglês “all other duties or charges of any kind imposed on or in connection with importation ...” oportuna a observação de SARA ARMELLA no sentido de que como meios fiscais idôneos a obstaculizar o trafico comercial internacional o GATT tomou em consideração os impostos de efeito equivalente ao impostos aduaneiros, definidos como “other duties or charges of any kind”, dando a seguir como a melhor definição desses direitos e encargos de efeito equivalente àquela soma arrecadada no momento e sobre o ingresso no país de importação 32 , lembrando ANTONIO UCKMAR 33 que as regras relativas aos impostos aduaneiros aplicam-se a todas as exações decorrentes da importação dos bens, na forma da nota 58 ao ACORDO SOBRE SUBSÍDIOS E MEDIDAS COMPENSATÓRIAS (Agreement on Subsidies and Countervailing Measures) que se integra no Anexo 1 A da Ata Final das Negociações Comerciais da Rodada Uruguai (promulgada no Brasil pelo decreto 1355, de 30/12/1995, por força do Decreto Legislativo nº 30, de 15/12/1994), onde se define como impostos indiretos os tributos sobre vendas, consumo, volume de negócio, valor acrescido, franquias, selo, transmissões, estoques e equipamentos, ajustes fiscais na fronteira e todos os impostos além dos que se denominam impostos diretos e direitos de importação. 32 33 ARMELLA, Sara. I Dazzi Doganali. “in” Corso di Diritto Tributario Internazionale. Coord. VICTOR UCKMAR. Padova: CEDAM, 1999, p.137. UCKMAR, Antonio. Aspetti Fiscali nelle Regole Della Organizzazione Mondiale del Commercio (OMC/WTO). “in” Corso di Diritto Tributario Internazionale. Coord. VICTOR UCKMAR. Padova: CEDAM, 1999, p. 864. Av. Hermas Braga, nº 379, Nova Campinas - 13092-130 - CAMPINAS – SP Fone: (19) 3251-8237 - Fax: (19) 3251-2432 E-mail: [email protected] AGOSTINHO TOFFOLI TAVOLARO 11 7.2 – O CONCEITO DE SUBSÍDIOS COMO CONSEQUÊNCIA POSICIONAMENTO FILOSÓFICO DO PAPEL DO ESTADO NA ECONOMIA DO Tendo em conta que o conceito de subsídios dentro da doutrina é um conceito cuja abordagem muito depende de seu questionamento político-filosófico, quanto ao papel e os limites do estado na economia, como afirma WELBER BARRAL 34, concordando com este autor que subsídios e dumping se distinguem em que os subsídios são ocasionados por um ato estatal e que o dumping constitui uma prática privada de conquista de mercado, dele discordamos quando define subsídio como vantagem indevida proporcionada pelo Estado a determinadas empresas ou setores, vez que devida ou indevida é juízo que depende fundamentalmente do papel que se atribui ao Estado na economia. 7.3 – O ACORDO SOBRE SUBSÍDIOS E MEDIDAS COMPENSATÓRIAS Preocupação do comercio mundial já velha de quase três séculos 35, aos subsídios dedicou a Rodada Uruguai do GATT sua atenção, aprovando o já mencionado Acordo sobre Subsídios e Medidas Compensatórias, referido muitas vezes pelos autôres de lingua inglêsa como SCM Agreement (Subsidies and Countermeasures Agreement) que veio assim substituir o Código de Subsídios de 1979, firmado com a conclusão da Rodada de Tóquio. 7.3.1 – SUBSÍDIO - CONCEITO Neste Acordo é dado o conceito de subsídio que ADILSON RODRIGUES PIRES resume como “todo auxílio oficial, de ordem financeira, cambial , comercial ou fiscal, concedido direta ou indiretamente ao industrial, assim como ao exportador ou grupo de exportadores , estabelecido em uma área geográfica, com o fim de estimular na exportação de determinado produto” 36, em uma feliz síntese do art. 1 do Acordo. Neste acordo, aponta ANA CARLA BLIACHERIENE avanços no combate às práticas desleais do comércio: 34 35 36 37 37 , tem-se, como principais BARRAL, Welber. Subsídios e Medidas Compensatórias na OMC. “in” Guerra Comercial ou Integração Mundial pelo Comércio? A OMC e o BRASIL. S. Paulo : LTr, 1998, p. 371 GUEDES, Josefina Maria M.M. e PINHEIRO, Silvia M. Antidumping e Subsídios e Medidas Compensatórias. S. Paulo: Aduaneiras, 1993, p.27. indicam que já no Tariff Act de 1789 (primeira Lei de Comércio dos EUA) se identificava a prática de subsídios. PIRES, Adilson Rodrigues. Práticas Abusivas no Comércio Internacional . Rio Forense, 2001, p. 203. BLIACHERIENE, Ana Carla. Subsídios: Efeitos, Contramedidas e Regulamentação – Uma análise das normas nacionais e das normas da OMC. “in” Direito Tributário Internacional Aplicado. Coord. HELENO TAVEIRA TORRES. S. Paulo : Quatier Latin, 2003, p. 289 Av. Hermas Braga, nº 379, Nova Campinas - 13092-130 - CAMPINAS – SP Fone: (19) 3251-8237 - Fax: (19) 3251-2432 E-mail: [email protected] AGOSTINHO TOFFOLI TAVOLARO 12 a) a definição, por primeira vez, do termo subsídio; b) anexa-se o conceito de subsídio específico; c) estende-se a disciplina do GATT para a investigação de subsídios domésticos injustos; d) cria-se um comitê especial para tratar da matéria. A esses característicos adiciona ainda WELBER BARRAL como inovação importante o fato de todos os estados membros da OMC adotarem obrigatoriamente as disposições do acordo,bem como a definição qiue nele se dá de dano grave, a aplicação das normas a todos os subsídios, inclusive quando concedidos por subdivisões adminsitrativas do Estado ea definição dos requisitos procedimentais para a aplicação das medidas compensatórias ( op. cit. p.373) 7.3.2 – ESPECIFICIDADE Excepcionados pelo art. 5 do Acordo os subsídios mantidos para os produtos agrícolas, conforme o disposto no art. 13 do Acordo sobre Agricultura, integrante também ele do Anexo A1, temos que nem todos os subsídios que se incluam na definição geral são dados como óbices ao livre comércio, deles se requerendo também que apresentem especificidade, vale dizer, são considerados como lesivos os subsídios (art. 2 do Acordo): que destinem-se a uma empresa, produto, grupo de empresas ou produtos aferindo-se essa especificidade, quando houver limitação do acesso a esse subsídio a apenas determinadas empresas (art. 2.1, “a”), não ocorrendo essa especificidade se a autoridade outorgante ou a legislação pertinente estabeleceer condições ou critérios objetivos que disponham sobre o direito de acesso e o montante do benefício a ser concedido, desde que esse direito seja automático (art. 2.1, “b”), cabendo na dúvida sobre a especificidade considerar ainda fatores como uso predominante de um programa de subsídios por um número limitado de empresas; concessão de parcela desproporcionalmente grande do subsídio a determinadas empresas apenas e o modo de exercício do poder discricionário da autoridade na sua concessão, levando-se em conta adiversidade das atividades economicas dentro da jurisdição da autoridade outorgante e o período de tempo de vigência do subsídio (art. 2.1. “c”), a delimitação geográfica de localização de empresas para gozo dos subsídios (art. 2), cabendo ainda acrescentar que os subsídios proibidos, referidos no art. 3, que a seguir se verá são presumidos específicos. 7.3.3 – TIPOS DE SUBSÍDIOS Classifica o Acordo os subsídios em três tipos distintos, a saber: subsídios proibidos, subsídios recorríveis (acionáveis) e permitidos (não recorríveis ou não acionáveis. Av. Hermas Braga, nº 379, Nova Campinas - 13092-130 - CAMPINAS – SP Fone: (19) 3251-8237 - Fax: (19) 3251-2432 E-mail: [email protected] AGOSTINHO TOFFOLI TAVOLARO 13 a) SUBSÍDIOS PROIBIDOS Enquadram-se nesta primeira categoria, conforme estabelece o art. 3.1 do Acordo, os subsídios vinculados , de fato ou de direito, ao desempenho exportador , quer individualmente, quer como parte de um conjunto de condições, inclusive aqueles indicados em lista exemplificativa de subsídios à exportação no Anexo I do Acordo.. b) SUBSÍDIOS RECORRÍVEIS O art. 5.1 do Acordo indica serem recorríveis ou acionáveis os subsídios que criados por um Estado sejam danosos aos interesses de outros estados membros , causando dano à industria nacional do outro estado, anulação ou prejuízo de vantagens resultantes para os outros Estados membros resultantes direta oiu indiretamente do GATT 1994, ou que causem grave dano aos interesses de outro membro . A louvada inovação de definição de grave dano se encontra no art. 6 do Acordo, onde extensamente se tipifica essa ocorrência, dando-a por existente quando : a) o subsídio total, calculado äd valorem” exceda a 5%, b) os subsídios destinarem-se a cobrir prejuízos operacionais incorridos por uma indústria; c) os subsídios destinarem-se a cobrir prejuízos operacionais incorridos por uma empresa; d) ocorra perdão direto de dívida. c) SUBSÍDIOS PERMITIDOS Subsídios permitidos ou não acionáveis são aqueles definidos no art. 8.1 e 8.2 do Acordo, que ADILSON PIRES RODRIGUES 38 assim resume: a) os subsídios concedidos em caráter não específico ou, quando tal, desde que sejam obedecidas as regas constantes no artigo segundo, quais sejam a divulgação de critérios claros para concessão, bem como os objetivos pretendidos; b) os subsídios concedidos a empresas para fins de pesquisa e desenvolvimento de projetos de empresas ou de instituto superior de pesquisa, desde que não superem o limite de 75% do valor total dos investimentos em pesquisa ou 50% dos custos das atividades de desenvolvimento precompetitivas, destinadas a pessoal, instrumentos, equipamentos, terrenos, edifícios, bem como outros gastos relativos às atividades vinculadas diretamente à pesquisa; c) os subsídios concedidos a título de incentivo ao desenvolvimento de regiões menos favorecidas economicamente; d) os subsídios para o fim de adaptar instalações existentes em uma empresa a novas exigências ambientais impostas por leis ou regulamentos. 38 PIRES, Adilson Rodrigues. Op. cit. p. 206. Av. Hermas Braga, nº 379, Nova Campinas - 13092-130 - CAMPINAS – SP Fone: (19) 3251-8237 - Fax: (19) 3251-2432 E-mail: [email protected] AGOSTINHO TOFFOLI TAVOLARO 14 8 - SUBSÍDIOS TRIBUTÁRIOS NA OMC Já conhecido o alcance da expressão direitos e encargos de quaklquer natureza que dizem diretamente respeito à importação, e ao mencioná-los queremos assertar que o imposto sobre produtos industrializados (IPI) que o Brasil impõe ao estabelecimento importador equiparado a fabricante está compreendido na locuçao em tela, incidindo assim na censura das normas de comercio internacional da OMC, cabe-nos agora perlustrar a LISTA ILUSTRATIVA DE SUBSÍDIOS À EXPORTAÇÃO que se constitui no Anexo I ao Acordo, nela colocando em relêvo suas alíneas expressamente relativas a tributação, “brevitatis causam” resumidas, a saber : Alínea “e” - Isenção, remissão ou diferimento, total ou parcial, concedido especificamente em função de exportações, de impostos diretos ou impostos sociais pagos oupagáveis por empresas industriais ou comerciais . Alínea “f” - Reduções na base de cálculo dos impost5os diretos, relacionadas às exportações ou ao desempenho exportador, superiores aos concedidos à produção para consumo interno. Alínea “g” - Isenção ou redução de impostos indiretos sobre a produção ou distribuição de produtos exportados, além dos aplicados à produção ou distribuição no mercado interno. Alínea “h” - Isenção, remissão ou diferimento de impostos indiretos sobre etapas anteriores de bens ou serviços utilizados no fabrico de produtos exportados. Alínea “i” - Remissão ou devolução de direitos de inmportaçãode insumos que sejam importados para consumo no fabrico de produto exportado. 9 – SUBSÍDIOS CREDITÍCIOS Além dos subsídios tributários, incumbe-nos ainda relatar, por necessário à resposta ao quesito 3 do presente Colóquio, que são ainda exemplos alinhados pela relação em exposição, os das alíneas: - Criação pelo governo ou por instituições por ele controladas de programas Alínea “j” de garantia de crédito ou seguros à exportação. Alínea “k” - Concessão pelo governo ou por instituições governamentais de creditos à exportação a taxas privilegiadas. Alínea “j” - Qualquer outra despesa para o orçamento público que consitua subsídio no sentido do art. XVI do GATT 1994. Av. Hermas Braga, nº 379, Nova Campinas - 13092-130 - CAMPINAS – SP Fone: (19) 3251-8237 - Fax: (19) 3251-2432 E-mail: [email protected] AGOSTINHO TOFFOLI TAVOLARO 15 10 - RESPOSTAS AOS QUESITOS Exposto o quadro normativo a que se submete o comercio internacional, cabe-nos agora dar resposta aos quesitos formulados para o sucesso do presente coloquio, não sem antes , contudo, consignar que o Conselho Geral da OMC, ao apresentar o DOHA WORK PROGRAMME, incluiu na sua DRAFT GENERAL COUNCIL DECISION OF 31 JULY 2004 o Anexo A – Framework for Establishing Modalities in Agriculture cujo item 17 – Export Competition expressamente proclama como finalidade da OMC “the reduction of, with a view to phasing out , all forms of export subsidies” , concedendo aos países em desenvolvimento prazos maiores para gradativamente extinguirem os subsídios, no item 22, sob o título – Special and Differential Treatment 39. Assim é que respondendo aos quesitos podemos dizer: QUESITO 1 - Que são subsídios tributários permitidos pela OMC? RESPOSTA - Uma primeira resposta à indagação é dada, desde logo, pelo art. 8.1 e 8.2. do Acordo, objeto já de relacionamento no item 7.3.3.a acima, ou seja , subsídios que não tenham caráter específico , ou que , quando o tenham, sejam regidos por regras claras e para objetivos definidos, subsídios concedidos para empresas para fins de pesquisa e desenvolvimento, subsidios visando o incentivo ao desenvolvimento de regiões menos favorecidas ecoinomicamente e subsídios para o fim de adequação às exigências ambientais. Necessário é também adicionar as ressalvas aos subsídios tributários relacionados na Lista Ilustrativa de Subsídios à Exportação, onde a nota 59 ao item “h”, esclarece que o diferimento de impostos indiretos poderá não constituir subsídio tributário quando forem percebidos juros adequados, bem como que o preço de transferência a ser considerado não se considerará subsídio quando de acordo com o princípio do “arm’s length “ Serão também subsídios tributários permitidos aqueles ditados nas circunstâncias do art. 6.7 do Acordo, quando o dano grave não se torna reconhecível, quais, em síntese, a proibição ou restrição das exportações do produto similar por parte do membro reclamante, ou importações por terceiro país a partir do membro reclamante ( art. 6.7. a), decisão de governo importador que opere monopolio comercial mudando a fonte de suas importações do membro reclamante para outros países (art. 6.7.b), desastres naturais , greves, e outros eventos de força maior que afetem substancialmente aprodução dos produtos de exportação no país membro reclamante (art. 6.7.c), existência de acordo limitativo das exportações (art.6.7.d), redução voluntária no Membro reclamante da disponibilidade do produto para exportação (art. 6.7.e) e incapacidade de satisfazer padrões e requisitos técnicos do país importador (art. 6.7.f). 39 www.wto.org Av. Hermas Braga, nº 379, Nova Campinas - 13092-130 - CAMPINAS – SP Fone: (19) 3251-8237 - Fax: (19) 3251-2432 E-mail: [email protected] AGOSTINHO TOFFOLI TAVOLARO 16 QUESITO 2 – O direito de retaliação a práticas contrárias ao livre comercio, no que concerne a incentivos tributários, deve implicar a alteração destes incentivos , se concedidos de acordo com a legislação do país para produtos nacionais e estrangeiros? RESPOSTA – Entendendo a questão como se deverá o país concedente alterar sua legislaçào incentivadora interna para conformar-se aos ditâmes da norma de comercio internacional, temos que a resposta, desde um poonto de vista internacionalista há de ser positiva, a fim de que os objetivos do livre comercio, que norteam a OMC, seja atendidos. De um ponto de vista pragmático, no entanto, parece-nos que ao país concedente do subsídio profligado resta sempre a alternativa de apurar a relação custo/benefício de sua conformidade, optando entre alterar a sua legislação domestica ou sujeitar-se às sanções (medidas compensatórias) que lhe forem aplicadas. Naturalmente, a decisão do país concedente do subsídio atenderá, sempre, não somente a considerações de política econômica, mas também a injunções de política externa e de forte contéudo ideologico. QUESITO 3 – Sistemas financeiros de países desenvolvidos que permitam financiamento de exportações a custo inferior ao dos juros e despesas exigidos nos países em desenvolvimento poderiam implicar forma velada de incentivos, admitindo-se a compensação, nos países emergentes, com subsídios tributários vinculados à geração de competividade internacional? RESPOSTA – Vimos que os subsídios creditícios são também verberados como vulneradores da liberdade de comércio (itens “j” e “k” da Lista Ilustrativa de Subsídios à Exportação), constituindo-se em forma velada de incentivos. A resposta específica, prevista pelas normas da OMC, para tais subsídios, é a imposição de direitos compensatórios, a que FRATALOCCHI e ZUNINO 40 atribuem a finalidade de neutralizar a sua existência, devendo ser equivalentes ao montante do subsídio recebido pelos exportadores. 40 FRATALOCCHI, Aldo e ZUNINO, Gustavo. El Comercio Internacional de Mercaderias. Su regulación em la Organización Mundial de Comercio. Buenos Aires : Osmar de Buyatti, 1997, p. 192. Av. Hermas Braga, nº 379, Nova Campinas - 13092-130 - CAMPINAS – SP Fone: (19) 3251-8237 - Fax: (19) 3251-2432 E-mail: [email protected] AGOSTINHO TOFFOLI TAVOLARO 17 Prevista a imposição dos direitos compensatórios pelo art. 19 do Acordo, vê-se que o art. 19.4 os limita ao valor dos subsídios comprovados , calculado em termos de subsídio por unidade do produto subsidiado ou importado, tarefa de díficil quantificação e colocação em prática. A questão posta, no entanto, nos leva a outra indagação: são os direitos compensatórios a única via de defesa aberta ao país prejudicado ou pode êle adotar outros meios ( no caso específico a tributação), para defender seus interesses, precavendo-se do dano grave que lhe é inflingido pelo subsídio concedido pelo país exportador. Temos de entender a OMC como organismo que busca promover a liberdade do comercio internacional através de instrumentos pacíficos e civilizados, colocando as partes à mesa e entregando a solução das controversias a organismo isento e capacitado a proferir decisões justas na medida do quanto lhe é facultado apreender do problema trazido a seu conhecimento e das evidências que forem apresentadas pelos interessados. Se no tratado da OMC houve a transfência ou delegacão de soberania, cabe às partes prestar homenagem ao “pacta sunt servanda”. Não se olvide, porém, que há que se distinguir entre as partes aqueles Estados que admitem a supremacia dos tratados internacionais e aqueles para quem essa supremacia não existe, adotando o sistema de “treaty override ” e dispostos a arrostar as consequências de seu posionamento no concerto das nações. Destarte, para os países que se alinham no reduto de sua independência face aos tratados internacionais, no sentido de possibilitar à sua legislação interna revogar, suspender ou alterar as normas convencionais internacionais, parece-nos sempre aberta a via de subsidiar tributariamente suas exportações, mantendo-se assim dentro dos níveis de competitividade internacional. O raciocínio acima, bem se vê, não se aplica somente aos chamados países emergentes ( ou em desenvolvimento) mas também a todos os que professem a sipremacia da sua lei nacional sobre os tratados. De se recordar, apenas para registro, que o Acordo em fóco dedica seu art. 27 ao Tratamento Especial e Diferenciado aos Países em Desenvolvimento Membros. 11 – CONCLUSÕES A validade da OMC na regulação do comercio internacional e no combate à concorrência danosa não mais pode ser colocada em questão, a não pelos poucos renitentes que por razões de ideologia e política colocam-se em posição diametralmente oposta à sua existência, como aliás o fazem em relação aos organismos internacionais em geral. Av. Hermas Braga, nº 379, Nova Campinas - 13092-130 - CAMPINAS – SP Fone: (19) 3251-8237 - Fax: (19) 3251-2432 E-mail: [email protected] AGOSTINHO TOFFOLI TAVOLARO 18 Sem duvida nenhuma, organização humana que é, ressente-se de todas as falhas inerentes ao seres humanos, pois são estes que a compòem, através dos Estados membros que os representam. Seu papel de orientadora das relações de comercio internacional, dando corpo e forma a uma parte da “lex mercatoria“ que existente embora se mostra difusa e esparramada por varias organizações em todo oo mundo é fundamental para que se possa alcançar o ideal de segurança jurídica que permite a cada indivíduo saber de seus atos e de suas consequências. Campinas, 15 de março de 2005. AGOSTINHO TOFFOLI TAVOLARO cs576 Av. Hermas Braga, nº 379, Nova Campinas - 13092-130 - CAMPINAS – SP Fone: (19) 3251-8237 - Fax: (19) 3251-2432 E-mail: [email protected]