ISSN 2175-2338 www.eurp.edu.br Volume 3 n. 2 – Abr/Jul 2011 EURP Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives Editor Científico Wellington de Paula Martins Editor Executivo Francisco Mauad Filho Conselho Editorial Adilson Cunha Ferreira João Francisco Jordão Augusto César Garcia Saab Benedeti Jorge Garcia Carlos César Montesino Nogueira Jorge Renê Arévalo Carolina Oliveira Nastri José Eduardo Chúfalo Daniela de Abreu Barra Luis Guilherme Nicolau Fernando Marum Mauad Procópio de Freitas Francisco Maximiliano Pancich Gallarreta Simone Helena Caixe Gerson Cláudio Crott Secretária Executiva Amanda Aparecida Vieira Fernandes Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives EURP 2011 Expediente Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives – EURP ISSN 2175-2338 Publicação oficial da EURP Escola de Ultra-Sonografia e Reciclagem Médica de Ribeirão Preto Diretor Presidente Diretor Administrativo Francisco Mauad Filho Francisco Mauad Neto Diretor de Pesquisa Presidente do Departamento Científico Fernando Marum Mauad Wellington de Paula Martins Secretária Geral Bibliotecária Janete Cristina Parreira de Freitas Amanda Aparecida Vieira Fernandes Responsável pelo Setor Gráfico Responsável pelo Setor de Multimídia Michel da Silva Ricardo Tostes Professores Adilson Cunha Ferreira José Augusto Sisson de Castro Augusto César Garcia Saab Benedeti José Eduardo Chúfalo Carlos César Montesino Nogueira Heitor Ricardo Cosiski Marana Daniela de Abreu Barra Luiz Alberto Manetta Fernando Marum Mauad Luis Guilherme Carvalho Nicolau Francisco Mauad Filho Márcia Regina Ferreira Patton Francisco Maximiliano Pancich Gallarreta Procópio de Freitas Gerson Claudio Crott Simone Helena Caixe Jorge Garcia Wellington de Paula Martins Jorge Renê Garcia Arévalo SUMÁRIO EURP v. 3, n. 2, p 38-66 – Abr/Jul 2011 ISSN 2175-2338 Higienização dos transdutores ultrassonográficos 38 Hygiene of the ultrasound probes Carolina O Nastri, Wellington P Martins O papel da ultrassonografia no câncer de pâncreas 41 The role of sonography in pancreatic cancer Erika Vervloet, Wellington P Martins Ecodopplercardiograma na cardiomiopatia hipertrófica 45 Echocardiography in hypertrophic cardiomyopathy Flávio P Paes, Wellington P Martins Aplicação da ultrassonografia no diagnóstico de endometriose 50 The role of ultrasound in the diagnosis of endometriosis Ana Beatriz S de Abreu, Francisco Mauad Filho, Wellington P Martins Aspectos diagnósticos da esteatose hepática não alcóolica 54 Diagnostic aspects of non alcoholic fatty liver disease Cassiano Pozzati, Wellington P Martins Considerações sobre a realização de PAAF em nódulos de tireóide 58 Criteria for conducting sonographic FNA in thyroid nodules Filipe B G Freire, Wellington P Martins Ultrassonografia pulmonar 64 Lung ultrasound Rolando E M Oliveira, Wellington P Martins Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives EURP 2011 Artigo de Revisão Higienização dos transdutores ultrassonográficos Hygiene of the ultrasound probes Carolina O Nastri 1,2, Wellington P Martins 1, 2 Uma questão que vem sendo cada vez mais abordada na literatura mundial são os procedimentos usados para a limpeza e desinfecção dos transdutores ultrassonográficos. Vários micro-organismos podem ser transmitidos de uma pessoa para outra através do uso de transdutores não higienizados. Tanto as empresas fabricantes dos aparelhos, como os órgãos regulamentadores da prática médica recomendam a limpeza dos transdutores entre cada exame. Os protocolos de limpeza são variados e devem ser implementados considerando-se os tipos de exames realizados e a disponibilidade de cada clínica. A utilização de capa protetora para os exames endocavitários não impede a transmissão de bactérias e vírus patogênicos e deve ser acrescida da correta desinfecção dos transdutores. A responsabilidade médica é sempre pessoal e não pode ser presumida cabendo a nós médicos, garantir uma higienização adequada dos equipamentos sob nossa responsabilidade. Palavras-chave: Higiene; Ultrassonografia; Serviço Hospitalar de Limpeza; Transmissão de Doença Infecciosa. 1- Escola de Ultrassonografia e Reciclagem Médica de Ribeirão Preto (EURP) 2- Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) Recebido em 15/06/2011, aceito para publicação em 22/06/2011. Correspondências para Wellington P Martins. Departamento de Pesquisa da EURP - Rua Casemiro de Abreu, 660, Vila Seixas, Ribeirão Preto-SP. CEP 14020-060. E-mail: [email protected] Fone: (16) 3636-0311 Fax: (16) 3625-1555 Abstract An issue that is increasingly being addressed in the literature is the procedures used for cleaning and disinfection of ultrasound probes. Several microorganisms can be transmitted from one person to another through the use unclean probes. Both the manufacturers of devices and the regulators of medical practice recommends cleaning the transducers between each exam. The cleaning protocols are varied and should be implemented considering the types of examinations performed and the availability in each clinic. The use of protective cover for the endo-cavity exams does not prevent the transmission of pathogenic bacteria and viruses and must be followed by proper disinfection of transducers. The medical responsibility is always personal and cannot be assumed. It is up to us, physicians, to ensure proper cleaning of equipment under our responsibility. Keywords: Housekeeping, Infectious. Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives Hygiene; Ultrasonography; Hospital; Disease Transmission, EURP 2011; 3(2): 38-40 39 Nastri & Martins – Higienização dos transdutores Introdução A ultrassonografia é aplicada em nosso meio como um método diagnóstico de primeira linha em razão do seu fácil acesso e baixo custo. Os aparelhos são utilizados continuamente em um grande número de exames diários objetivando o aperfeiçoamento da aplicação dos recursos médicos. Desta forma, encontramos na prática diária dificuldade na realização da manutenção destes aparelhos. Uma questão que vem sendo cada vez mais abordada na literatura mundial são os procedimentos usados para a limpeza e desinfecção dos transdutores ultrassonográficos. É alarmante a falta de treinamento formal dos médicos ultrassonografistas neste aspecto. Uma pesquisa realizada com residentes de ginecologia e obstetrícia e pós-graduandos em medicina maternofetal e endocrinologia reprodutiva em um hospital na cidade de Nova Iorque, Estados Unidos 1, mostrou que 83% destes nunca haviam recebido algum treinamento formal para a higienização de aparelhos de ultrassonografia. A maioria dos entrevistados não sabia indicar a periodicidade ou as formas de limpeza dos mesmos. Fonte de contaminação Vários micro-organismos podem ser transmitidos de uma pessoa para outra através do uso de transdutores não higienizados. Em um estudo 2onde foram realizadas culturas com material colhido dos transdutores abdominais após exame ultrassonográfico foram isoladas bactérias na grande maioria das vezes (37 de 40). Entre as bactérias encontradas: Staphylococcus aureus, Klebsiella e Proteus. Recomendações do Food and Drug Administration - FDA Transdutores usados em situações não críticas, como em contato com a pele íntegra, devem limpos e receber desinfecção leve entre cada paciente. A desinfecção leve pode ser feita, por exemplo, com água corrente e sabão ou aplicando-se um pano embebido em solução degermante. Já os transdutores usados em situações semi-críticas, como os endocavitários, devem, além de serem limpos, receberem no mínimo uma desinfecção de alto grau (por exemplo, imersão em solução desinfetante). Para esses trandutores endocavitários deve ser também usada uma capa protetora descartável, além do processo de higienização adequado 3. Recomendação dos fabricantes A GE Healthcare, fabricante de aparelhos de ultrassonografia, recomenda que a limpeza e Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives desinfecção de qualquer transdutor que entre em contato com a superfície corpórea seja feita entre cada exame, para prevenir a transmissão de doenças. No entanto, processos de higienização contendo calor (estufa e autoclave), óxido etileno, qualquer tipo de álcool ou cloro podem danificar os transdutores 4. Para uma limpeza eficiente a GE e a Philips recomendam, após a retirada do gel com um papel ou pano seco, desconectar o transdutor do console e então lavar com uma solução de água e sabão não abrasivo. A seguir esfregar meticulosamente o transdutor com uma escova macia para retirada de todo o gel e resíduos orgânicos. Depois disso, é recomendada a limpeza ou imersão (conforme grau de contaminação) em uma solução desinfetante apropriada para esse uso 4, 5. Certamente o processo indicado por esse fabricante demanda tempo e disponibilidade de mão de obra e material para realizá-la, sendo difícil de ser implementada no dia-a-dia da ultrassonografia. Ainda dos 47 produtos recomendados pelos fabricantes, 40 contem substâncias nocivas à saúde (glutaraldeído), ou cuja segurança em longo prazo não foi confirmada (peróxido de hidrogênio, ácido para-acético e ortofitaldeído) 6. Eficácia de alguns métodos para higienização Na literatura podemos encontrar alguns trabalhos avaliando a eficácia de métodos de higienização de transdutores. O método mais simples testado é a limpeza do transduror com papel toalha seco após a realização de cada exame 7, 8. A limpeza deve ser feita de forma meticulosa retirando todo traço visível de gel ou material biológico. Quando realizado desta forma, diminui a contagem de colônias de bactérias patogênicas em 45% 8. Além dessa limpeza entre cada exame recomenda-se uma limpeza mais abrangente com, pelo menos, água e sabão ao final de cada dia, pois a presença de resíduos de gel e material orgânico ao longo de um tempo mais prolongado (durante a noite) contribui para o aumento da flora patogênica nos transdutores 7. Esse tipo de higienização é considerado suficiente, mas, sem dúvida, não é o ideal 6 . O segundo método mais eficiente seria a limpeza com solução salina fisiológica entre cada exame, reduzindo a flora patogênica em 76% 8. No entanto, a melhor forma de limpeza é a lavagem com água e sabão, reduzindo a flora patogênica em 98% 8. A cobertura dos transdutores com capa (por exemplo, preservativos) não é suficiente para impedir a contaminação dos mesmos com agentes patogênicos como, por exemplo, Vírus Epstein-Barr, citomegalovírus e HPV, além de outras bactérias 9. EURP 2011; 3(2): 38-40 40 Nastri & Martins – Higienização dos transdutores Para a limpeza adequada dos transdutores endocavitários recomenda-se processos com uso de degermantes ou radiação. Um método adequado é a limpeza com papel-toalha embebido em solução desinfetante seguida de um ciclo de 5 minutos em uma câmera de radiação ultravioleta C 9. Já conforme recomendações da sociedade britânica de ultrassonografia médica, os transdutores endocavitários devem ser inspecionados após o uso com cobertura. Caso nenhum sinal de material biológico seja encontrado ele deverá ser limpo com um papel toalha seco e, em seguido, ser higienizado duas vezes com papel toalha embebido em solução degermante adequada. No caso de suspeita de contaminação com material biológico, o transdutor deverá ser lavado com água corrente e sabão e então submerso em solução degermante por 5 minutos (ou conforme orientação do fabricante do produto)6. Recomendações da AIUM 10, 11 Luvas descartáveis devem ser utilizadas durante o exame, ao se retirar o preservativo e também para limpeza das sondas. Deve-se efetuar lavagem da mão com água e sabão após o término dos exames. Em exames vaginais deve ser feito sempre limpeza + desinfecção, enquanto em exames abdominais, a limpeza deve ser feita entre todos os exames, enquanto a desinfecção pode ser apenas quando observados contaminantes. Por limpeza, define-se limpeza com água corrente e sabão utilizando esponja ou compressa e considerar o uso de escovas. Por desinfecção, define-se o uso de soluções degermantes. Em exames vaginais deve-se sempre usar capas protetoras, dando-se preferência para preservativos de látex (avaliar alergia). Considerações finais Conforme o Capítulo III, Artigo 1o do Código de Ética Médica “é vedado ao médico causar dano ao paciente, por ação ou omissão, caracterizável como imperícia, imprudência ou negligência” e ainda que “responsabilidade médica é sempre pessoal e não pode ser presumida”. Levando em consideração as evidências científicas existentes sobre a higienização dos transdutores de ultrassonografia, seríamos então imprudentes e negligentes e, consequentemente, anti-éticos em não nos responsabilizar pela adequada limpeza dos mesmos entre os exames realizados. Cabe a nós médicos, garantir uma higienização Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives adequada dos responsabilidade. equipamentos sob nossa Referências 1. Ridley EL. Ultrasound probe cleaning education may be lacking. Available at: http://www.auntminnie.com/index.asp?sec=ser&sub=def& pag=dis&ItemID=85322. Accessed 16/06/2011. 2. Bello TO, Taiwo SS, Oparinde DP, Hassan WO, Amure JO. Risk of nosocomial bacteria transmission: evaluation of cleaning methods of probes used for routine ultrasonography. West Afr J Med 2005;24:(2):167-170. 3. FDA. U.S. Department of Health and Human Services: Information for Manufacturers Seeking Marketing Clearance of Diagnostic Ultrasound Systems and Transducers. Guidance for Industry and FDA Staff 2008;5759. 4. GE.Healthcare. Ultrasound Transducers - Care, Safety and Cleaning Available at: http://www.gehealthcare.com/usen/ultrasound/products/ probe_care.html. Accessed 16/06/2011. 5. N.V. KPE. Transducer Cleaning, Disinfecting, and Sterilizing. Available at: http://www.healthcare.philips.com/main/products/ultraso und/transducers/transducer_care/ev_iu22_ie33_hd11_hd3 /cleandisandsteril.wpd. 6. Backhouse S. Establishing a Protocol for the Cleaning and Sterilisation/Disinfection of Ultrasound Transducers. The British Medical Ultrasound Society Bulletin 2003;11:(1):37-39. 7. Muradali D, Gold WL, Phillips A, Wilson S. Can ultrasound probes and coupling gel be a source of nosocomial infection in patients undergoing sonography? An in vivo and in vitro study. AJR Am J Roentgenol 1995;164:(6):1521-1524. 8. Mirza WA, Imam SH, Kharal MS, Aslam M, Ali SA, Masroor I, et al. Cleaning methods for ultrasound probes. J Coll Physicians Surg Pak 2008;18:(5):286-289. 9. Kac G, Podglajen I, Si-Mohamed A, Rodi A, Grataloup C, Meyer G. Evaluation of ultraviolet C for disinfection of endocavitary ultrasound transducers persistently contaminated despite probe covers. Infect Control Hosp Epidemiol 2010;31:(2):165-170. 10. AIUM. Guidelines for Cleaning and Preparing Endocavitary Ultrasound Transducers Between Patients. Available at: http://www.aium.org/publications/statements.aspx. Accessed 16/06/2011. 11. AIUM. Recommendations for Cleaning Transabdominal Transducers. Available at: http://www.aium.org/publications/statements.aspx. Accessed 16/06/2011. EURP 2011; 3(2): 38-40 Artigo de Revisão O papel da ultrassonografia no câncer de pâncreas The role of sonography in pancreatic cancer Erika Vervloet 1, Wellington P Martins 1, 2 Este trabalho visa enumerar e brevemente discutir o papel e a importância de alguns métodos de ultrassonografia no diagnóstico e seguimento de pacientes com câncer de pâncreas. Após breve introdução sobre a patologia discutida e uma explanação resumida sobre cada método, poderemos concluir que com os avanços tecnológicos no campo da ultrassonografia, esta desempenha um papel cada vez mais importante não somente no diagnóstico como também em procedimentos intervencionistas para auxiliar nos procedimentos curativos e paliativos relacionados ao câncer de pâncreas. Palavras-chave: Neoplasias Pancreáticas; Ultrassonografia; Endossonografia. 1- Escola de Ultrassonografia e Reciclagem Médica de Ribeirão Preto (EURP) 2- Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) Recebido em 31/05/2011, aceito para publicação em 10/06/2011. Correspondências para Wellington P Martins. Departamento de Pesquisa da EURP - Rua Casemiro de Abreu, 660, Vila Seixas, Ribeirão Preto-SP. CEP 14020-060. E-mail: [email protected] Fone: (16) 3636-0311 Fax: (16) 3625-1555 Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives Abstract This work aims to list and briefly discuss the role and importance of some methods of ultrasonography in the diagnosis and monitoring of patients with pancreatic cancer. After a brief introduction about the pathology and a short explanation about each method, we may conclude that with the technological advances in the field of ultrasound, it plays an increasingly important role not only in diagnosis but also in interventional procedures to assist in curative and palliative procedures related to pancreatic cancer. Keywords: Pancreatic Ultrasonography; Endosonography. Neoplasms; EURP 2011; 3(2): 41-44 42 Vervloet & Martins – Câncer de pâncreas Introdução Enquanto radiografias simples ou estudos baritados do abdome superior pouco contribuem para o diagnóstico das neoplasias pancreáticas, a ultrassonografia (USG) trans-abdominal e via endoscópica, a tomografia (TC) e a ressonância magnética (RM) possibilitam uma avaliação global e mais profunda do parênquima pancreático e das estruturas vizinhas 1. A ultrassonografia é um método muito utilizado pelo seu baixo custo e fácil acesso. O exame é operador dependente e paciente dependente, podendo ser prejudicado pela interposição gasosa e obesidade 1. TC de cortes finos contrastada é considerado o exame padrão ouro para o estudo de tumores pancreáticos sólidos e seu estadiamento, enquanto que a colangiopancreatografia retrograda juntamente com a RM, são melhores para massas císticas e para visualização do sistema ductal. Para o diagnóstico definitivo, a punção por agulha fina ou biopsia guiada são necessárias 2. Neoplasias pancreáticas A neoplasia de pâncreas compreende cerca de 2% do número de casos de câncer e cerca de 5% das mortes por câncer 3. A neoplasia mais comum do pâncreas é o adenocarcinoma e, em cerca de 75% dos casos encontra-se localizado na cabeça do pâncreas e 25% no corpo e cauda. Os tumores neuroendócrinos são responsáveis por 1-2% das neoplasias pancreáticas e podem ser funcionais ou não funcionais 3. As neoplasias císticas são responsáveis por somente 1% dos pacientes com câncer de pâncreas, mas são importantes por serem confundidas com pseudocistos com certa freqüência. Devem ser suspeitadas quando uma lesão cística for encontrada no pâncreas na ausência de historia de pancreatite. Cerca de 15% dos cistos pancreáticos são neoplasias 3. São considerados fatores de risco idade avançada, obesidade, tabagismo, etilismo, pancreatite crônica, radiação abdominal e historia familiar posiiva. Cerca de 7 a 8% dos pacientes diagnosticados com câncer de pâncreas possuem historia de familiar de 1º grau com o mesmo diagnóstico3. O câncer de pâncreas também pode acorrer como parte de algumas síndromes familiares, como na síndrome do câncer de mama familiar (portadoras do gene BRCA-2 tem risco de 7% de desenvolver câncer de pâncreas) 3. Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives Classificação A classificação recentemente proposta pela OMS visa estabelecer prognóstico, além de graduar e estadiar. São classificadas de acordo com o comportamento benigno (adenomas) e maligno (adenocarcinoma). Existe também uma nova categoria chamada de “tumores de potencial maligno incerto”. Estão incluídas neste grupo algumas neoplasias císticas mucinosas, neoplasias mucinosas intraductais e a maioria das neoplasias sólido-cisticas. Estas definidas pelo grau de displasia e o potencial de se tornarem malignas 4. Modalidades de ultrassonografia Doppler A sensibilidade do ultrassom Doppler tem aumentado significativamente, contribuindo para o diagnóstico e estadiamento das doenças pancreáticas. O estudo com Doppler é uma parte integrada do exame ultrassonográfico do pâncreas, avaliando a vascularização peripancreática, como veia porta, artéria e veia esplâncnica, artéria e veia mesentérica superior, aorta e veia cava inferior. Também faz parte do exame a visualização dos vasos menores peri e intrapancreáticos 5. O carcinoma pancreático tem sido descrito como uma massa hipovascularizada, quando comparada com o restante do parênquima, e as massas inflamatórias são hipervascularizadas 6. A ausência de sinais dentro de uma massa suspeita no exame Doppler tem uma sensibilidade de 93% e especificidade de 77%, com uma acuracia de 88% no diagnóstico do câncer de pâncreas. Se houver circulação colateral estes números sobem para 97% e 92% respectivamente com acuracia de 95% 6. Ultrassonografia contrastada A ultrassonografia convencional representa o primeiro método diagnóstico para o estudo dos tumores de pâncreas. A ultrassonografia contrastada melhorou significantemente a acuracia na primeira linha de investigação e influência na escolha da segunda linha de investigação 2. A USG contrastada proporciona uma melhor avaliação da perfusão sanguínea do tecido pancreático dentro do tumor, facilitando a diferenciação entre pancreatite crônica e carcinoma pancreático. Os critérios diagnósticos usados para câncer de pâncreas são: nenhuma vascularização detectada usando o us Doppler convencional, aparecimento irregular das artérias usando técnica contrastada e ausência de sistema venoso dentro da lesão 6. Há um aumento na sensibilidade de 73,2% para 91,1% da EUS convencional para a contrastada e um aumento EURP 2011; 3(2): 41-44 Vervloet & Martins – Câncer de pâncreas da especificidade respectivamente. de 83,3% para 93,3% Ultrassom endoscópico (EUS) O EUS foi introduzido em meados dos anos 80, numa tentativa de melhorar a imagem ultrassonográfica do pâncreas. Também tem sido usado para exames do trato gastrointestinal, sistemas portal e hepatobiliar; diagnóstico e estadiamento de tumores pancreatobiliares, gástricos e esofágicos e avaliação de linfonodos mediastinais. Apesar de suas limitações e de ser operador dependente, possui muitas aplicações intervencionistas e terapêuticas 7, sendo ainda considerado o melhor método de imagem no estudo de imagens suspeitas clinicamente 6 . 43 A grande vantagem do EUS é o alto valor preditivo negativo, que se aproxima de 100%, ou seja, a ausência de massa no EUS praticamente exclui a presença de câncer pancreático. Entretanto, um estudo recente apontou um pequeno número de casos de neoplasias com EUS negativo, portanto, na presença de um quadro clínico sugestivo, é conveniente repetir a investigação em 2 a 3 meses 6. A EUS contrastada é uma nova técnica ainda pouco testada. É usada para caracterizar a microcirculação em doenças pancreáticas – massas hipervascularizadas como os tumores neuroendócrinos ou hipovascularizadas como os adenocarcinomas – e para melhor visualizar áreas necróticas na pancreatite aguda e a vascularização de nódulos e septos em cistos 7. Tabela 1. Classificação dos tumores pancreáticos adaptada da OMS. Tumores epiteliais Tumores exócrinos Tumores endócrinos Tumores não- epiteliais Outros Classificação Adenocarcinoma ductal Anaplasico Adenoescamoso Mucinoso não cístico Células claras Ciliado Ductal misto Outras neoplasias de origem ductal Cística mucinosa Cística serosa Carcinomas de células acinares Cistoadenocarcinoma de células acinares Misto acinar-endócrino Tumores de origem incerta Neoplasias sólido-císticas Células gigantes Pancreatoblastoma Funcionantes de cels. de ilhota (insulinoma, gastrinoma, vipoma, glucagoma) Não funcionantes de células de ilhotas Linfoma primário De partes moles benignos e malignos (hemangioma, sarcoma, etc) Metástases Linfomas secundários Pseudotumor Pancreatite crônica Pâncreas divisum, anular Ultrassom abdominal versus ultrassom endoscópico A USG abdominal é geralmente usada na avaliação inicial do paciente, mas o seu papel no diagnóstico do câncer de pâncreas é pequeno. Sua sensibilidade para o diagnóstico de neoplasia pancreática é baixa, em torno de 67%, e a especificidade é em torno de 40%, baixa em comparação com a tomografia computadorizada (77% e 53%, respectivamente) e com o EUS (99% e 100%) 6. Como todo exame de ultrassonografia é operador dependente e alguns estudo mostram diferenças importantes mesmo entre operadores experientes. Ainda assim, por ser um Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives exame muito disponível e baratoem nosso meio, é freqüentemente a primeira linha de diagnóstico de imagem abdominal. A USG com Doppler contrastado tem sido usada no diagnóstico de massas abdominais. Estudos prospectivos usando as novas técnicas de contraste não foram realizados para comparar a eficácia deste com a TC ou EUS. Achados ultrassonográficos mais comuns Sinais diretos O sinal direto mais comum é a presença de massa hipoecogênica, homogênea ou heterogênea, de EURP 2011; 3(2): 41-44 44 Vervloet & Martins – Câncer de pâncreas contornos irregulares, localizada no pâncreas ou na loja pancreática. A massa pode ser restrita a glândula ou comprimir estruturas veizinhas. Algumas vezes a massa pode ser isoecoica, o que torna a avaliação dos contornos e dimensões do pâncreas importante. Sinais de necrose, como a área cística central é um achado infreqüente. Pode ser diferenciada de outras lesões císticas pelo seus contornos irregulares, paredes espessas e seu conteúdo complexo. Pseudocistos podem ser encontrados a montante do tumor 1. A neoplasia difusamente infiltrativa pode ser confundida com a pancreatite aguda. A história clinica, o aspecto lobulado e a ausência de inflamação em estruturas vizinhas ajudam na diferenciação 1. Sinais indiretos Dilatação do ducto pancreático Na presença de obstruções neoplásicas o ducto dilata mais de 2 a 3 cm e assume forma biconvexa, com trajeto tortuoso e afilamento abrupto. A diferenciação entre pancreatite e doença neoplásica é difícil. No caso de o diâmetro do ducto principal ultrapassar a metade da espessura do parênquima pancreático, a etiologia mais provável é a neoplásica 1. Na pancreatite há uma dilatação em toda a extensão do ducto, enquanto nas neoplasias o ducto dilata somente a montante da lesão, o chamado “sinal do ducto interrompido” 1. Dilatação das vias biliares O montante de dilatação varia de acordo com o local da obstrução, porém a dilatação do ducto biliar comum é geralmente maior que 7 mm 6. A redução abrupta do calibre do ducto biliar é fortemente sugestiva de malignidade, nas lesões benignas o afilamento é gradual. A combinação de dilatação do ducto biliar e do pancreático muitas vezes pode ser o único achado ultrassonográfico 1. Desproporção das dimensões A atrofia corpo-caudal decorrente de lesão tumoral obstrutiva na região cefálica determina alteração da ecogenicidade do parênquima pancreático, podendo ser hipo ou hipercogenica 1. Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives Intervenção Atualmente, o ultrassom endoscópico pode ser utilizado em uma série de procedimentos intervencionistas, visando diagnóstico, tratamento e no tratamento paliativo do câncer de pâncreas. Como exemplo podemos citar: neurólise do plexo celíaco, colocação de guia para radioterapia, guiar braquioterapia, guiar drenagem do ducto biliar, guiar aplicação local de quimioterápicos e ajuda no desenvolvimento de técnicas de ablação. Considerações finais Apesar de a tomografia ser o exame padrão ouro no diagnóstico e estadiamento de pacientes com câncer de pâncreas, os novos avanços na ultrassonografia tem aumentado cada vez mais seu papel no diagnóstico, auxilio ao tratamento e acompanhamento destes pacientes, principalmente através da ultrassonografia endoscópica. Referências 1. Cerri GG. Ultra-sonografia Abdominal. 2 ed. Rio de Janeiro: Revinter; 2009. 2. D'Onofrio M, Gallotti A, Pozzi Mucelli R. Imaging techniques in pancreatic tumors. Expert Rev Med Devices 2010;7:(2):257-273. 3. Mcphee SJ, Papadakis MA. Current - Medical Diagnosis and Treatment. 49 ed: Lange; 2010. 4. Liszka L, Pajak J, Mrowiec S, Zielinska-Pajak E, Golka D, Lampe P. Discrepancies between two alternative staging systems (European Neuroendocrine Tumor Society 2006 and American Joint Committee on Cancer/Union for International Cancer Control 2010) of neuroendocrine neoplasms of the pancreas. A study of 50 cases. 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A ecocardiografia desempenha papel fundamental nesta moléstia, seja no diagnóstico ou no acompanhamento e orientação da terapêutica dada a sua facilidade de acesso e custo relativamente baixo. Novas modalidades em desenvolvimento proporcionam um diagnóstico cada vez mais precoce e até mesmo em fase subclínica da doença. Palavras-chave: Cardiomiopatia hipertrófica; Ecocardiografía; Morte súbita. 1- Escola de Ultrassonografia e Reciclagem Médica de Ribeirão Preto (EURP) 2- Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) Recebido em 07/06/2011, aceito para publicação em 10/06/2011. Correspondências para Wellington P Martins. Departamento de Pesquisa da EURP - Rua Casemiro de Abreu, 660, Vila Seixas, Ribeirão Preto-SP. CEP 14020-060. E-mail: [email protected] Fone: (16) 3636-0311 Fax: (16) 3625-1555 Abstract Hypertrophic cardiomyopathy is the most prevalent genetically inherited cardiac disorder; accounting for the majority of sudden death’s cases. Its main feature is the left ventricular hypertrophy, often asymmetrical and unrelated to other diseases. Echocardiography plays a key role in this disease, either in diagnosis as in monitoring and guidance of therapy because of its accessibility and relatively low cost. Developing new tools provide an increasingly early diagnosis that may be done even in subclinical stage. Keywords: Cardiomyopathy, Echocardiography; Death, Sudden. Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives Hypertrophic; EURP 2011; 3(2): 45-49 46 Paes & Martins – Cardiomiopatia hipertrófica Introdução A cardiomiopatia hipertrófica (CH) é uma doença genética autossômica dominante em cerca de 50% dos casos. Possui baixa prevalência, acometendo cerca de 0,2% da população geral e 0,5% de pacientes não selecionados encaminhados para estudo ecocardiográfico. Provavelmente é o mais comum distúrbio genético cardíaco herdado 1. Foi descrita em meados do século XIX por patologistas franceses, porém sua descrição moderna foi feita por Teare e Brock em 1958 na Inglaterra 2. Caracteriza-se por presença de hipertrofia ventricular esquerda sem causa aparente, como hipertensão arterial (HAS) ou estenose valvar aórtica 3. Ocorrem mutações das proteínas sarcoméricas, determinando fibrose intersticial, desarranjo das fibras musculares e da arquitetura miocárdica e comprometimento do desempenho do ventrículo esquerdo 4. A ecocardiografia é sem dúvida a mais importante ferramenta para a investigação, acompanhamento e direcionamento da terapia da CH. É um exame não invasivo, confiável, de custo não tão elevado e fácil realização. Suas diversas modalidades são capazes de determinar a localização e o grau da hipertrofia, a presença de movimento sistólico anterior do folheto mitral (MSA) e da obstrução subaórtica, a gravidade da regurgitação aórtica, dentre outros achados 2, 5, 6. Novas técnicas tentam realizar o diagnóstico precoce e demonstrar o prognóstico da doença em relação ao risco de morte súbita 7. Ecocardiografia e cardiomiopatia hipertrófica Usada desde seus primórdios no auxílio diagnóstico da cardiomiopatia hipertrófica, o ecocardiograma oferece a possibilidade de uma completa e abrangente avaliação estrutural e funcional do coração 8. Apesar de caracteristicamente a hipertrofia do septo ser assimétrica, pode haver envolvimento de virtualmente todos os segmentos do miocárdio 6. Em razão dessas peculiaridades, foram criados critérios ao ecocardiograma bidimensional para auxiliar o diagnóstico da doença 3: • Espessura máxima de 15 mm em qualquer segmento, sem causa justificável, ou; • Relação espessura septal/parede posterior >1,3 mm em pacientes normotensos, ou; • Relação espessura septal/parede posterior >1,5 mm em pacientes hipertensos. Além da hipertrofia, durante a avaliação ecocardiográfica da CH deve-se observar tamanho e volume dos átrios e ventrículos; o padrão da hipertrofia do ventrículo esquerdo; a fração de ejeção ventricular; o relaxamento do VE e suas pressões de enchimento; a pressão sistólica da artéria pulmonar; a Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives presença e localização de obstrução dinâmica da VSVE e de ventrículo direito; presença de MSA; magnitude do gradiente da VSVE em repouso e em manobra de Valsalva; presença e gravidade de regurgitação mitral e se há doenças coexistentes a CH 8. A hipertrofia do VE, com consequente redução do volume da cavidade ventricular pode levar a obstrução dinâmica, gerando gradiente de pressão intracavitário durante a sístole, com pico máximo ao final da sístole. Valores de gradiente > 30 mmHg estão relacionados com risco aumentado de morte súbita cardíaca e progressão para insuficiência cardíaca 3, 4. Essa alteração hemodinâmica pode ocasionar o movimento sistólico anterior da válvula mitral (MSA), que apesar de não ser patognomônico da CH, possui especificidade de 98% quando encontrado 4. O folheto anterior da válvula mitral vai de encontro ao septo interventricular durante a sístole, promovendo redução da VSVE. Este movimento anômalo pode levar a falha na coaptação dos folhetos da válvula mitral, com conseqüente regurgitação mitral. Tal fenômeno pode ser conseqüente ao efeito de ”arrasto”, ocasionado pela alta velocidade do fluxo sistólico, ou pelo chamado efeito Venturi, onde segundo o princípio da conservação da energia, o aumento na energia cinética acompanha-se por uma diminuição no potencial energético e da pressão local levando ao movimento anterior da válvula 5, 8. O ecocardiograma transesofágico desempenha um papel auxiliar na definição do MSA e no tipo de obstrução do ventrículo esquerdo 2. A função sistólica do VE na cardiomiopatia hipertrófica encontra-se preservada ou até mesmo aumentada nas fases iniciais da doença, ocorrendo comprometimento apenas na fase terminal, onde ocorre um adelgaçamento das paredes do VE, dilatação da cavidade e fibrose. Essas alterações elevam a mortalidade anual em até 11%, assim como o risco de morte súbita. De um modo geral, usa-se a fração de encurtamento ou a fração de ejeção do ventrículo esquerdo (FEVE) para avaliar a função sistólica, porém pode ocorrer FEVE normal e disfunção sistólica 3. O uso de técnicas relativamente recentes como a velocidade sistólica miocárdica e a taxa de deformação miocárdica podem detectar esse padrão 8. Em relação à disfunção diastólica, observamos que a diminuição da complacência pelo aumento da massa do VE e a sua rigidez pela fibrose miocárdica, são os principais responsáveis por este achado na CH 4. Entretanto, os parâmetros ecocardiográficos convencionais não são fidedignos para essa mensuração. O Doppler transmitral pode não detectar anormalidades na função diastólica, pois seus valores EURP 2011; 3(2): 45-49 47 Paes & Martins – Cardiomiopatia hipertrófica podem estar subestimados em virtude das pressões de enchimento elevadas. Nesse contexto, o Doppler tecidual do anel mitral, com relação E/E’ demonstra com mais acurácia esta alteração 9. A disfunção diastólica, bem como outros fatores como o grau de regurgitação mitral e hipertrofia do VE e a presença de obstrução na VSVE, pode levar a aumento do átrio esquerdo, que é considerado importante fator de risco no prognóstico desses pacientes, por aumento da morbidade e mortalidade. Está relacionado a uma maior incidência de fibrilação atrial e fenômenos tromboembólicos, sobrevivência pós-miectomia e falência cardíaca 4, 9. A avaliação é feita pela medida bidimensional da área-comprimento do átrio direito, obtida em corte apical de duas e quatro câmaras, ao fim da sístole ventricular e indexada pela área de superfície corporal 9. A estimativa da função miocárdica pelo ecocardiograma é ferramenta importante para determinar o arsenal medicamentoso a ser utilizado nas diversas fases da CH 2. A forma apical, que representa cerca de 9% dos casos de CH, pode ser de difícil diagnóstico quando o exame não é realizado por profissionais experientes, e mesmo por eles, quando há ocorrência de artefatos prejudicando a obtenção de uma janela ecocardiográfica adequada para a análise dessa região. Nesses casos, quando há alta suspeição clínica, a angiografia ventricular ou a ressonância nuclear magnética eram os exames de escolha para a elucidação 2, 10. Em 2001, Soman et al. descreveram pela primeira vez uma nova técnica, que se baseava no uso de contraste para ecocardiografia (microesferas de albumina humana com perflutreno), com o intuito de aumentar a definição da visualização do endocárdio. Os achados destes pesquisadores foram semelhantes aos encontrados com os estudos angiográficos, com a grande vantagem de ser um exame não invasivo e que pode ser realizado rapidamente à beira do leito. O contraste também pode ser usado para avaliar a perfusão miocárdica no tratamento da CH com ablação alcoólica septal, onde após a cateterização do ramo septal desejado, é infundido contraste com o intuito de avaliar se a artéria selecionada irriga outras áreas indesejadas 11. Novas técnicas ecocardiográficas Ecocardiografia tridimensional (3D) A introdução da ecocardiografia 3D proporcionou a aquisição de imagens com melhor definição anatômica das estruturas cardíacas e melhor definição das relações espaciais em anomalias complexas 12. Com ele, pode-se definir a mecânica do MSA e a geometria de deformação da via de saída do VE, bem Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives como definir a sua área antes e após a miectomia ou ablação, de modo não invasivo 4, 12, 13. Um novo índice, chamado índice derivado de massa de dispersão, que equivale à média dos desvios-padrão dos volumes de massa segmentar foi criado para tentar diferenciar a CH das outras formas de hipertrofia do VE, baseado no fato de a maioria dos casos de CH promover hipertrofia assimétrica 14. Atualmente desenvolvem-se novos softwares que possibilitam imagens em tempo real, que melhoram ainda mais o imageamento e a reprodutibilidade, mas ainda há escassez de dados que corroborem sua real aplicação na CH 11. Doppler tecidual O Doppler tecidual (DT), técnica relativamente recente, também possui aplicação na CH. Ela é capaz de detectar sinais de grande amplitude e baixa velocidade do tecido miocárdico, quantificando sua função longitudinal ou axial em tempo real 4. Nagueh et al., em um estudo que envolvia pacientes com genótipo positivo com ou sem hipertrofia e indivíduos normais, conseguiu demonstrar que a velocidade sistólica tecidual e a velocidade diastólica inicial são significantemente reduzidas no anel mitral. O mesmo estudo mostrou que há alta sensibilidade e especificidade no método, podendo predizer inclusive sobre a presença de CH antes mesmo do surgimento de alterações fenotípicas 15. A velocidade de pico sistólico no anel mitral mostra-se preservada em hipertrofias não-correlacionadas a CH, enquanto que na CH a velocidade de pico é heterogênea, tornando o Doppler tecidual útil também para ajudar a distinguir a hipertrofia da CH da hipertrofia com origem em outros estados patológicos ou fisiológicos, com precisão de até 92% 16. Velocidades de pico sistólico <4 cm/s na parede lateral do anel mitral tem valor prognóstico e preditor independente de hospitalização e morte por falência cardíaca 17. Suas limitações envolvem a necessidade de boa angulação do feixe de ultrassom. Por esse motivo, sua utilização se restringe a janela apical 4. Strain e Strain rate Embora o DT tenha enriquecido o estudo do miocárdio, essa técnica estuda apenas a função regional através da velocidade, mas não é capaz de discernir entre a contração miocárdica e a movimentação passiva. Em virtude dessas características, desenvolveram-se novas formas de avaliação baseadas no DT, como o strain e o strain rate. Strain seria a medida instantânea local da compressão ou expansão miocárdica, independente do movimento de translação cardíaca. É capaz de quantificar a velocidade de movimentação de um EURP 2011; 3(2): 45-49 48 Paes & Martins – Cardiomiopatia hipertrófica ponto do miocárdio em relação a outro ponto adjacente, localizado a dada distância do primeiro. Strain rate por sua vez é a integral do strain, ou seja, enquanto o strain mede a velocidade de deformação, o strain rate expressa essa deformação em porcentagem. Entretanto, uma vez que essas medidas são derivadas do DT, ainda sofrem influência da angulação do Doppler 4. Speckle tracking O speckle tracking surgiu para eliminar definitivamente o viés da angulação. Essa modalidade ecocardiográfica explora as mesmas informações (velocidade de movimentação do músculo, deformação, deslocamento e tempo de ativação ventricular), baseado num software que identifica cada ponto do miocárdio e é capaz de segui-lo para sua nova posição têmporo-espacial, usando dados do eco bidimensional e não do Doppler. Seu uso independe do ângulo de insonação, podendo avaliar áreas não-paralelas ao feixe de Doppler e foi validada comparando-a com as técnicas de ressonância nuclear magnética e sonomicrometria, mostrando melhor aplicabilidade 4. Papel da ecocardiografia no diagnóstico diferencial O diagnóstico diferencial para a CH se faz principalmente com quatro entidades principais: coração de atleta, doença de Fabry, doença de Danon e amiloidose. Um dos maiores desafios diagnósticos é o de CH associado ao chamado coração do atleta. Pacientes que praticam esportes competitivos geralmente apresentam espessura de parede superior a 12 mm, o que não impede de terem CH concomitante. Nesses casos, uma pista que auxilia a diferenciação é a presença de um VE não dilatado, pois geralmente a CH não cursa com dilatação do VE (atletas geralmente tem cavidade ventricular >55 mm), a não ser em casos de progressão da doença e disfunção sistólica 11. Outro dado importante é a análise da função sistólica e diastólica ao Doppler tecidual, que se encontra prejudicada na CH, enquanto que no coração de atleta ela se encontra normal ou supranormal 3. A importância do diagnóstico em pacientes com esse perfil é a grande propensão a morte súbita quando se realizam esportes competitivos ou outras atividades físicas intensas na presença de CH 11. A doença de Anderson-Fabry é uma causa relativamente freqüente de hipertrofia idiopática do VE (4-6% dos casos de HVE). É uma doença de armazenamento causada por uma mutação na αgalactosidase e caracteriza-se por uma grande Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives variedade de sinais e sintomas. Entre os achados cardíacos observamos hipertrofia do VE (simétrico na maioria dos casos), disfunção diastólica leve e função sistólica preservada. Não se observa obstrução ao fluxo na via de saída de VE. Os sintomas também são mais presentes em homens, enquanto que em mulheres portadoras apresentam pouco ou nenhum sintoma. Na prática é muito difícil distinguir a doença de Fabry da CH baseado na ecocardiografia, e portanto deve ser suspeitada quando ocorre em pacientes do sexo masculino sem história familiar de HCM, além do aparecimento de outros sinais sistêmicos 3, 11. Na doença de Danon, por sua vez, ocorre por uma mutação de proteínas não-sarcoméricas ou no gene que codifica a subunidade g2 regulatória da proteína cinase AMP-ativada ou o gene codificador da proteína de membrana 2 associada ao lisossomo. Os pacientes acometidos por essa doença desenvolvem hipertrofia ventricular importante e pré-excitação ventricular. É uma doença ligada ao cromossomo X, e portanto é de importância clínica em homens jovens 11. A amiloidose cardíaca é mais comum em homens e raramente ocorre antes dos 40 anos de idade. O ecocardiograma caracteriza-se na maioria dos casos por HVE simétrica, dilatação atrial com espessamento de suas paredes, bem como dos folhetos valvares, além de derrame pericárdico 11. Em alguns casos, o grau e a distribuição da hipertrofia pode se assemelhar a CH, mas quando há HVE e baixa voltagem ao eletrocardiograma, diagnóstico diferencial com derrame pericárdico e CH deve ser feito 11. Considerações finais Apesar do grande avanço das novas tecnologias diagnósticas, a ecocardiografia ainda é considerado o exame complementar de escolha para o diagnóstico da cardiomiopatia hipertrófica. As informações que o método nos traz, o fato de não ser invasivo, a facilidade de realização, reprodutibilidade e seu custo contribuem para tal afirmação. O desenvolvimento de novas modalidades ecocardiográficas como o strain, strain rate e speckle tracking tem se mostrado promissores no diagnóstico sub-clínico, oferecendo oportunidade de tomar-se decisões terapêuticas e estratificar riscos de forma precoce, proporcionando melhoria na qualidade de vida dos pacientes. Referências 1. Braunwald. Tratado de Doenças Cardiovasculares. In: Zipes D, Libby P, Bonow R, eds. Cardiomiopatias. Rio de Janeiro: Elsevier; 2006. EURP 2011; 3(2): 45-49 49 Paes & Martins – Cardiomiopatia hipertrófica 2. Wigle ED. Cardiomyopathy: The diagnosis of hypertrophic cardiomyopathy. Heart 2001;86:(6):709-714. 3. Williams LK, Frenneaux MP, Steeds RP. Echocardiography in hypertrophic cardiomyopathy diagnosis, prognosis, and role in management. Eur J Echocardiogr 2009;10:(8):iii9-14. 4. Afonso LC, Bernal J, Bax JJ, Abraham TP. Echocardiography in hypertrophic cardiomyopathy: the role of conventional and emerging technologies. 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Este trabalho faz uma revisão bibliográfica sobre a utilização da ultrassonografia nesse diagnóstico, relevante visto ser este um exame mais simples, que oferece menos riscos. Palavras-chave: Endometriose; Ultrassonografia; Diagnóstico. 1- Escola de Ultrassonografia e Reciclagem Médica de Ribeirão Preto (EURP) 2- Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) Recebido em 17/04/2011, aceito para publicação em 01/06/2011. Correspondências para Wellington P Martins. Departamento de Pesquisa da EURP - Rua Casemiro de Abreu, 660, Vila Seixas, Ribeirão Preto-SP. CEP 14020-060. E-mail: [email protected] Fone: (16) 3636-0311 Fax: (16) 3625-1555 Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives Abstract Endometriosis is a disease that has many manifestations, affecting a large number of women; it is also responsible for many clinical consequences. The diagnostic methods currently used for endometriosis’ diagnosis are invasive and pose risks to the patient. This paper reviews the literature on the use of ultrasound in diagnosis, which relevance lies on being is a simple procedure that offers less risks. Keywords: Diagnosis. Endometriosis; Ultrasonography; EURP 2011; 3(2): 50-53 51 De Abreu et al – Endometriose Introdução Endometriose é definida como crescimento e proliferação de um tecido endometrial fora da cavidade uterina, frequentemente localizada nos órgãos pélvicos como ovários, útero, trompas e reto, pode estar presente na parede abdominal, intestino, pulmão e trato urinário. É uma das causas mais comuns de esterilidade feminina. Trata-se de um relevante problema para a saúde, uma vez que é grande o número de mulheres atingidas por essa doença, assim como as taxas de morbidade associadas a essa patologia 1. O diagnóstico de endometriose tem sido realizado tradicionalmente através de laparoscopia ou laparotomia. A laparoscopia apresenta riscos variados à paciente, podendo haver complicações simples como náuseas, vômitos e dores ou até mesmo riscos sérios como de perfuração do intestino 2. Assim sendo, o estudo de métodos menos invasivos de investigação diagnóstica torna-se relevante na medida em que diminui os riscos aos pacientes. O principal destes métodos é a ultrassonografia. Epidemiologia A endometriose afeta de 5 a 15% das mulheres no período reprodutivo 3, alguns estudos sugerem que a prevalência de endometriose varia de 0,5 a 5% em mulheres férteis e de 25 a 40% das mulheres inférteis 4 . Segundo Murphy 1, na investigação clínica de mulheres que apresentam dor pélvica, encontra-se uma taxa que varia de 40 a 60% de pacientes com endometriose, proporção que varia de acordo com a população estudada. Ainda estão sendo pesquisados os fatores de risco e proteção para o aparecimento de endometriose, assim como a melhor caracterização da população acometida por essa enfermidade. Como se trata de uma doença dependente do estrogênio tem-se a hipótese de que condições que aumentam a exposição da mulher a este hormônio aumentem o risco de aparecimento da patologia. Portanto, a endometriose poderia ser mais frequente em mulheres com menarca precoce, gravidez tardia e grande diferença de tempo entre menarca e primeira gestação. Porém em mulheres que apresentam obesidade, as quais também tendem a apresentar uma maior quantidade de estrogênio cieculante, a endometriose é menos frequente, talvez por estas mulheres apresentarem com maior frequência anovulação crônica e irregularidade menstrua 5. Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives Fisiopatologia A endometriose é definida pelo implante de estroma e/ou epitélio glandular endometrial de localização fora do útero, causando fibrose por toda a pelve, podendo comprometer diversos órgãos, como os ovários, peritônio, ligamentos úterossacros, região retro-cervical, septo reto-vaginal, reto/sigmoide, íleo terminal, apêndice, bexiga e uretere.5. Reconhe-se a existência de três tipos de endometriose: a superficial, a lesão tipo endometrioma ovariano e a endometriose profunda 4 .As lesões superficiais acometem pricipalmente o peritônio pélvico, os endometriomas são mais comum nos ovários. A endometriose profunda é tida como aquelas lesões que infiltram o peritônio mais que 5mm e geralmente acometem ligamento uterossacro, vagina, bexiga, ureter e intestino 6. A fibrose causada pela endometriose por vezes envolve os ovários, impossibilitando, portanto, a liberação de óvulos. Também constantemente obstrui as trompas de Falópio, tanto nas terminações fimbriadas quanto em outras parte de sua estrutura 5. Sintomatologia Algumas pacientes portadoras de endometriose são assintomáticas, porém a maioria apresenta sintomas, de diferentes intensidades. São comuns os seguintes sintomas: dismenorreia, dor pélvica crônica (fora do período menstrual), infertilidade, dispareunia de profundidade, sintomas intestinais e urinários cíclicos, como dor ou sangramento ao evacuar/urinar durante o período menstrual. Como esses síntomas não são muito específicos, muitas vezes os diagnóstico de endometriose é feito tardiamente. As dificuldades encontradas na utilização dos métodos diagnósticos que são utilizados para essa enfermidade também pode ser um fator que contribua para essa demora 2, 5. Diagnóstico O diagnóstico clínico de endometriose é feito primeiramente através da sintomatologia e do exame físico da paciente. Alguns métodos de imagem tem sido t utilizados no auxílio ao diagnóstico da endometriose profunda, entre eles a ultrassonografia transvaginal e transretal, a endoscopia sonográfica retal, a sonovaginografia e a ressonância magnética 6. Ultrassonografia Transvaginal (TVUS) no diagnóstico de endometriose A ultrassonografia é um método de baixa sensibilidade para detecção de implantes focais, porém, mostra-se um excelente exame para EURP 2011; 3(2): 50-53 52 De Abreu et al – Endometriose diagnóstico de cistos endometriais, com índice de sensibilidade de 83% e de especificidade de 98%. A TVUS é um método recomendado para diagnostico de endometriose ovariana e pélvica, assim como de bexiga. É também tão eficiente quanto à ressonância magnética nuclear para o diagnóstico de endometriose pélvica anterior e ovariana 6. A TVUS apresenta-se eficaz na diferenciação de endometrioma de outras massas anexiais. Este exame apresenta uma taxa de especificidade de 90% e de sensibilidade de 75%. Porém o resultado positivo para o diagnóstico de endometrioma não exclui a necessidade de pesquisas mais específicas para sua utilização em outras formas de endometriose 2. Este é ainda um excelente método para o diagnóstico de lesões vesicais, sendo no entanto ruim para a visualização de endometriose pélvica posterior, pois não avalia com precisão a infiltração das camadas da parede retal 2. Ultrassonografia anorretal tridimensional (US 3D) no diagnóstico de endometriose profunda A laparoscopia é o exame mais usado para o diagnóstico e avaliação da endometriose peritoneal. (SAGAE et al, 2009). Porém, existe ainda uma dificuldade de avaliação das lesões. Em poucos casos há o acometimento da mucosa, portanto, os métodos via anorretais de diagnóstico que são mais usados nem sempre tem uma boa resolutividade. (SAGAE et al, 2009) Já a ultrassonografia anorretal tridimensional é eficaz para detectar, nos casos de endometriose pélvica profunda e posterior, infiltração da parede retal e áreas comprometidas, como o septo retovaginal. Assim, é um método importante para a escolha de qual técnica será utilizada na cirurgia, uma vez que permitem medir a distância do foco endometriótico ao aparelho esfincteriano, bem como seu tamanho, grau de infiltração na parede retal e sua distância aos esfíncteres anais (MURAD-REGADAS & REGADAS, 2006) Como já colocado anteriormente, é um método não-invasivo e que tem tido bons resultados em diversas pesquisas, com porcentagem de 87,5% de sensibilidade e 97% de especificidade para o diagnóstico de infiltração da parede retal por focos endometrióticos. (SAGAE et al, 2009). Comparação entre a ultrassonografia e a ressonância magnética (RM) nos casos de endometriose. Com relação à endometriose profunda, a ultrassonografia pode ser utilizada como um método para o diagnóstico assim como a ressonância Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives magnética. Como já colocado anteriormente, o estudo de Cardoso et al (2006) aponta que a TVUS detecta melhor a endometriose na junção retossigmóide e no reto, porém no caso das lesões na pelve sua eficiência é menor do que a da RM. Em outra pesquisa publicada também se encontra um resultado positivo para o uso de ultrassonografia no caso de endometriose profunda; este, entretanto analisa a precisão da ultrassonografia endoretal em comparação com a RM para detecção do envolvimento do reto nesses casos, em casos que a endometriose já havia sido histologicamente comprovada. A ultrassonografia mostrou-se mais eficaz. No caso de exames pré-operatórios, este exame pode ser essencial para a técnica utilizada, para o caso de haver um envolvimento intestinal. Além dessa importância, o uso da ultrassonografia pode também apontar para a profundidade das lesões da endometriose na parede retal. As limitações desse método são na detecção da parte distal do intestino (reto e parede reto-sigmóide). A importância da RM na endometriose se dá, pois esse método ainda é mais eficaz para um acompanhamento da bacia em geral, incluindo a parte anterior (quem pode ser investigada através da TVUS), mas também da parte posterior. (CHAPRON et al, 2004). Considerações finais Pode-se concluir que ainda precisam ser realizados mais estudos com relação ao uso da ultrassonografia para o diagnóstico de endometriose, assim como avaliação de sua extensão e profundidade. Das publicações encontradas, todas concordam com o fato de que este método deve sim ser utilizado por ser menos invasivo, mais barato e de mais fácil acesso. Em alguns casos, como os de endometriose profunda, nem sempre apenas a ultrassonografia é o suficiente, e outros exames são indicados. Porém esse método é importante para a indicação de tratamento e de técnica utilizada em caso da necessidade de uma intervenção cirúrgica. Referências 1. Murphy AA. Clinical aspects of endometriosis. Ann N Y Acad Sci 2002;955:1-10; discussion 34-16, 396-406. 2. Moore J, Copley S, Morris J, Lindsell D, Golding S, Kennedy S. A systematic review of the accuracy of ultrasound in the diagnosis of endometriosis. Ultrasound Obstet Gynecol 2002;20:(6):630-634. 3. Vigano P, Parazzini F, Somigliana E, Vercellini P. Endometriosis: epidemiology and aetiological factors. Best Pract Res Clin Obstet Gynaecol 2004;18:(2):177-200. 4. Child TJ, Tan SL. Endometriosis: aetiology, pathogenesis and treatment. Drugs 2001;61:(12):1735-1750. EURP 2011; 3(2): 50-53 53 De Abreu et al – Endometriose 5. Bellelis P, Dias JA, Jr., Podgaec S, Gonzales M, Baracat EC, Abrao MS. Epidemiological and clinical aspects of pelvic endometriosis-a case series. Rev Assoc Med Bras 2010;56:(4):467-471. 6. Cardoso MM, Werner Junior H, Berardo PT, Coutinho Junior AC, Domingues MNA, Gasparetto EL, et al. Evaluation of agreement Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives between transvaginal ultrasonography and magnetic resonance imaging of the pelvis in deep endometriosis with emphasis on intestinal involvement Radiologia brasileira 2009;42:(2):89-95. EURP 2011; 3(2): 50-53 Artigo de Revisão Aspectos diagnósticos da esteatose hepática não alcóolica Diagnostic aspects of non alcoholic fatty liver disease Cassiano Pozzati 1, Wellington P Martins 1, 2 A esteatose hepática não alcoólica é o resultado do acumulo de gordura no fígado. Existem várias teorias que tentam explicar sua ocorrência, porém o mecanismo ainda não está bem esclarecido. O diagnóstico é feito com a exclusão de outras causas de esteatose e baseia-se na história clínica, exames laboratoriais e exames de imagem como a ultrassonografia, tomografia computadorizada e ressonância magnética. Este trabalho tem como objetivo discutir alguns aspectos desta patologia e do seu diagnóstico. Palavras-chave: Fígado gorduroso; Ultrassonografia. 1- Escola de Ultrassonografia e Reciclagem Médica de Ribeirão Preto (EURP) 2- Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) Recebido em 26/05/2011, aceito para publicação em 01/06/2011. Correspondências para Wellington P Martins. Departamento de Pesquisa da EURP - Rua Casemiro de Abreu, 660, Vila Seixas, Ribeirão Preto-SP. CEP 14020-060. E-mail: [email protected] Fone: (16) 3636-0311 Fax: (16) 3625-1555 Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives Abstract The non alcoholic fatty liver disease is the result of the accumulation of fat in the liver. There are several theories that attempt to explain its occurrence, but the mechanism remains poorly understood. The diagnosis is made by excluding other causes of steatosis and is based on clinical history, laboratory tests and imaging tests such as ultrasound, computed tomography and magnetic resonance imaging. This paper aims to discuss some aspects of this disease and its diagnosis. Keywords: Fatty Liver; Ultrasonography. EURP 2011; 3(2): 54-57 55 Pozzati & Martins – Esteatose hepática não alcóolica Introdução O fígado gorduroso é uma doença que afeta populações do mundo todo. De acordo com os relatórios da verificação anual de saúde japonesa, 9 a 30% dos japoneses adultos demonstram evidências de fígado gorduroso a ultrassonografia 1, 2. Uma vez que se sabe que aproximadamente 10 a 20% dos indivíduos com doença hepática gordurosa não alcoólica tem esteatohepatite não alcoólica, a prevalência de esteatohepatite não alcoólica na população adulta Japonesa esta estimada em 1 a 3%. Considera-se que estas estimativas sejam semelhantes na população de países asiáticos e ocidentais 3. De acordo com os exames anuais de saúde japoneses, a incidência e taxas de remissão da doença hepática gordurosa não alcoólica eram de 10 a 16% por tempo médio de 1,1 anos 4. Comparando indivíduos da população geral da mesma idade e sexo, aqueles com doença hepática gordurosa não alcoólica tiveram uma menor sobrevida do que a esperada, em razão da mortalidade padronizada de 1,34 – 1,69 de acordo com estudos americanos e suecos 4-6. Estes estudos também revelaram que a simples esteatose tem um curso clínico benigno, sem excesso de mortalidade e que só a sobrevivência de pacientes com esteatohepatite não alcoólica foi reduzida. As causas mais comuns de morte relacionadas à doença hepática gordurosa não alcoólica e esteatohepatite não alcoólica foram doença arterial coronariana seguida de mortes relacionadas com o fígado 7. Fisiopatologia do fígado gorduroso A fisiopatologia envolve o acúmulo de gordura (esteatose), inflamação e variavelmente a fibrose. A esteatose surge como resultado da acumulação de triglicerídeos hepáticos. Os possíveis mecanismos incluem redução da síntese de lipoproteínas de muito baixa densidade (VLDL) e aumento da síntese hepática de triglicérides (possivelmente devido à diminuição da oxidação de ácidos graxos ou aumento de ácidos graxos livres que estão sendo entregues para o fígado). A inflamação pode resultar de danos às membranas celulares causados pela peroxidação lipídica. Estas alterações podem estimular células estreladas hepáticas, resultando em fibrose. Se avançada a fígado gorduroso não alcoólica pode causar cirrose e hipertensão portal 8. Acredita-se que a resitência à insulina, estresse oxidativo e a cascata inflamatória desempenhem um papel essencial na patogênese e na progressão da fígado gorduroso não alcoólico. A hipotese “multi-hit” tem sido usada para descrever a patogenia do fígado gorduroso 8, 9. A resistência à insulina resulta no Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives aumento da produção de ácidos graxos livres (AGL) que são absorvidos pelo fígado promovendo a esteatose - “primeiro hit”. Sobrepostas em cima deste fundo gorduroso há uma série de interações complexas (vários hits - “segundo hit”) entre os hepatócitos, as células estreladas, células adiposas, células de Kupffer, mediadores inflamatórios e espécies reativas ao oxigênio resultando em inflamação (EHNA) ou cirrose 10. Em estados de resistência a insulina as células adiposas e musculares tem preferência por oxidar lipídios, resultando na liberação de AGL que pode então ser tomado pelo fígado resultando em esteatose. Ainda não esta claro por que alguns pacientes evoluem da fase de esteatose e desenvolvem inflamação e fibrose 10. Ultrassonografia do fígado gorduroso A aparência ultrassonográfica da degeneração gordurosa pode variar dependendo da quantidade de gordura presente e se a distribuição dos depósitos é difusa ou focal 5: •Leve: Aumento mínimo e difuso da ecogenicidade hepática; visualização normal do diafragma e das bordas dos vasos intra-hepáticos. •Moderada: Aumento moderado e difuso da ecogenicidade hepática; visualização dos vasos intrahepáticos e do diafragma discretamente dificultada. •Grave: Aumento acentuado da ecogenicidade; pouca penetração no segmento posterior do lobo direito e dificuldade em visualizar ou ausência de visualização dos vasos hepáticos e do diafragma. A esteatose focal ou ausência focal de esteatose pode mimetizar neoplasia. Na infiltração gordurosa focal existem regiões com ecogenicidade aumentada de permeio ao parênquima hepático normal. Por outro lado, ilhas de parênquima normal podem aparecer como massas hipoecóicas em um fígado, com infiltração gordurosa densa 5. As características da degeneração gordurosa focal incluem: Ausência focal de acometimento e degeneração gordurosa focal : •Ambas afetam mais frequentemente a região periportal e o segmento medial do lobo esquerdo (segmento IV). •A ausência focal de acometimento também ocorre frequentemente na fossa da vesícula biliar e ao longo das margens do fígado. •Os pacientes diabéticos que recebem insulina na diálise peritoneal podem apresentar depósito subcapsular de gorduras. EURP 2011; 3(2): 54-57 56 Pozzati & Martins – Esteatose hepática não alcóolica Ausência de efeito de massa. •De maneira geral, os vasos hepáticos não estão deslocados. Entretanto, um relato recente demonstrou a presença de vasos sanguíneos atravessando metástases. Margens geométricas • Presentes, apesar de a infiltração focal poder ser redonda, nodular ou intercalada com tecido normal. Mudanças rápidas •Pode haver resolução da esteatose até mesmo em seis dias. •A TC do fígado mostrará regiões correspondentes de baixa atenuação Diagnóstico da esteatose hepática não alcóolica O objetivo dos procedimentos diagnósticos é a identificação de pacientes com esteatose antes da ocorrência de fibrose significativa. A biópsia hepática mostra diretamente o grau de infiltração gordurosa e fibrose, no entanto, é pouco representativa de todo o parênquima hepático (representa apenas 1/50.000 do fígado) sendo desta forma sujeita a grandes erros de interpretação 11. Além disto, constitui um procedimento invasivos com riscos inerentes, tornando a investigação não invasiva uma intensa área de pesquisa. O diagnóstico é essencialmente feito pela exclusão de outras patologias que também poderiam levar à infiltração gordurosa do fígado. A principal delas é o consumo de álcool. A quantidade de ingestão de álcool para a exclusão de esteatose secundária a seu uso é controversa na literatura. Em geral, considera-se para a exclusão, a ingestão semanal de menos de 100 g 12, 13; ou 10g/dia de álcool para mulheres e 20g/dia para homens 11. Deve ser feita também a exclusão adequada de outras doenças hepáticas como hepatite viral, hepatite auto imune, doença hepática induzida por drogas, doença biliar primária, colangite esclerosante primária, obstrução biliar e doenças metabólicas tais como doença de Wilson e hemocromatose12. Estudos de imagem Ultrassonografia (US) A técnica de imagem mais comum e menos invasiva usada para esse diagnóstico é a US, sendo considerada uma técnica de primeira linha, nesta situação. A US permite avaliar a presença de esteatose, mostrando um parênquima hepático hiperecogênico, conhecido como “fígado brilhante”. Esse aumento da ecogenicidade é difuso e fácil de ser avaliado, bastando a comparação com outros órgãos Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives como os rins ou baço 12. Contudo, essa avaliação é subjetiva; alguns índices estão sendo estudados, mas a aplicação ainda é limitada 14. A sensibilidade em da US em detectar a esteatose varia entre 60 e 94% 13, dependendo também da severidade da infiltração gordurosa, sendo muito baixa quando menos de 30% do fígado está infiltrado 15 . Outra limitação da US é que a diferenciação entre esteatose e esteatohepatite é impossível, pois as alterações inflamatórias não podem ser vistas à US 12. Outra dificuldade da US é a diferenciação entre esteastose e fibrose hepática, pois a aparência sonográfica é semelhante 12. Papel da CT e RM para a detecção de fígado gorduroso A tecnologia da tomografia computadorizada (TC), tem sido utilizada na avaliação da arquitetura hepática. Em um estudo realizado por Park et al. 16 utilizaram a TC para detectar esteatose em 154 indivíduos que passaram por biópsia hepática e usaram a relação da atenuação entre baço e fígado, baseando-se na diferença de atenuação para detectar a esteatose maior a 30%. Eles relataram especificidade de 100%, mas sensibilidade variou de 73 a 82%. Em outro estudo com 703 candidatos doadores vivos de fígado, Lee et al. 17 estudaram a atenuação do fígado, baço para classificação visual na TC e comparar estes valores com achados na biópsia hepática. Ambas as medidas foram precisas para o diagnóstico de esteatose maior a 30%. Parece que a TC sem contraste pode ser mais útil na detecção de esteatose do que varreduras realçadas por contraste 18 . A ressonância magnética (RM) se mostrou confiável para detectar fígado gorduroso. Mudanças de gorduras são avaliadas pelo diferencial de deslocamentos químicos entre gordura e água. Fishbein et al. 19 relataram uma boa correlação entre RM, US e histologia em pacientes com doença hepática gordurosa não alcoólica. A RM, no entanto demonstrou detectar com maior precisão níveis inferiores de esteatose do que os detectados pela ultrassonografia e tomografia computadorizada, como ilustrado por um estudo de Fishbein et al. 19 que mostrou que a RM foi capaz de detectar esteatose de 3%. Considerações finais A esteatose hepática não alcoólica é uma doença considerada de difícil diagnóstico em fases iniciais, pois tanto a US quanto a tomografia computadorizada apresentam baixa sensibilidade para a detecção de esteatose grau leve (<30% de infiltração). Já a RM EURP 2011; 3(2): 54-57 57 Pozzati & Martins – Esteatose hepática não alcóolica mostrou-se superior ao detectar com maior precisão graus mais leves de esteatose do que os detectados pela US e CT. Porém, devido elevado custo da RM, esta torna-se um método menos accessível e indicados para casos selecionados. Já a ultrassonografia por ser um método de baixo custo, não invasivo, com resultados superiores aos da CT (exceto em pacientes obesos) torna-se o método de primeira escolha no rastreamento da esteatose hepática. Referências 1. Amarapurkar DN, Hashimoto E, Lesmana LA, Sollano JD, Chen PJ, Goh KL. How common is non-alcoholic fatty liver disease in the Asia-Pacific region and are there local differences? Journal of gastroenterology and hepatology 2007;22:(6):788-793. 2. Hamaguchi M, Kojima T, Takeda N, Nakagawa T, Taniguchi H, Fujii K, et al. The metabolic syndrome as a predictor of nonalcoholic fatty liver disease. Annals of internal medicine 2005;143:(10):722-728. 3. Tominaga K, Kurata JH, Chen YK, Fujimoto E, Miyagawa S, Abe I, et al. Prevalence of fatty liver in Japanese children and relationship to obesity. An epidemiological ultrasonographic survey. Digestive diseases and sciences 1995;40:(9):2002-2009. 4. Ekstedt M, Franzen LE, Mathiesen UL, Thorelius L, Holmqvist M, Bodemar G, et al. Long-term follow-up of patients with NAFLD and elevated liver enzymes. Hepatology 2006;44:(4):865-873. 5. Adams LA, Lymp JF, St Sauver J, Sanderson SO, Lindor KD, Feldstein A, et al. The natural history of nonalcoholic fatty liver disease: a population-based cohort study. Gastroenterology 2005;129:(1):113-121. 6. Soderberg C, Stal P, Askling J, Glaumann H, Lindberg G, Marmur J, et al. Decreased survival of subjects with elevated liver function tests during a 28-year follow-up. Hepatology 2010;51:(2):595-602. 7. Hashimoto E, Tokushige K. Prevalence, gender, ethnic variations, and prognosis of NASH. Journal of gastroenterology 2011;46 Suppl 1:63-69. Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives 8. Jou J, Choi SS, Diehl AM. Mechanisms of disease progression in nonalcoholic fatty liver disease. Seminars in liver disease 2008;28:(4):370-379. 9. Day CP, James OF. Steatohepatitis: a tale of two "hits"? Gastroenterology 1998;114:(4):842-845. 10. Lewis JR, Mohanty SR. Nonalcoholic fatty liver disease: a review and update. Digestive diseases and sciences 2010;55:(3):560-578. 11. Fierbinteanu-Braticevici C, Dina I, Petrisor A, Tribus L, Negreanu L, Carstoiu C. Noninvasive investigations for non alcoholic fatty liver disease and liver fibrosis. World J Gastroenterol 2010;16:(38):4784-4791. 12. Neuschwander-Tetri BA, Caldwell SH. Nonalcoholic steatohepatitis: summary of an AASLD Single Topic Conference. Hepatology 2003;37:(5):1202-1219. 13. Sanyal AJ. AGA technical review on nonalcoholic fatty liver disease. Gastroenterology 2002;123:(5):1705-1725. 14. Tarantino G. Should nonalcoholic fatty liver disease be regarded as a hepatic illness only? World J Gastroenterol 2007;13:(35):4669-4672. 15. Ryan CK, Johnson LA, Germin BI, Marcos A. One hundred consecutive hepatic biopsies in the workup of living donors for right lobe liver transplantation. Liver Transpl 2002;8:(12):11141122. 16. Park SH, Kim PN, Kim KW, Lee SW, Yoon SE, Park SW, et al. Macrovesicular hepatic steatosis in living liver donors: use of CT for quantitative and qualitative assessment. Radiology 2006;239:(1):105-112. 17. Lee SW, Park SH, Kim KW, Choi EK, Shin YM, Kim PN, et al. Unenhanced CT for assessment of macrovesicular hepatic steatosis in living liver donors: comparison of visual grading with liver attenuation index. Radiology 2007;244:(2):479-485. 18. Jacobs JE, Birnbaum BA, Shapiro MA, Langlotz CP, Slosman F, Rubesin SE, et al. Diagnostic criteria for fatty infiltration of the liver on contrast-enhanced helical CT. AJR. American journal of roentgenology 1998;171:(3):659-664. 19. Fishbein M, Castro F, Cheruku S, Jain S, Webb B, Gleason T, et al. Hepatic MRI for fat quantitation: its relationship to fat morphology, diagnosis, and ultrasound. Journal of clinical gastroenterology 2005;39:(7):619-625. EURP 2011; 3(2): 54-57 Artigo de Revisão Considerações sobre a realização de PAAF em nódulos de tireóide Criteria for conducting sonographic FNA in thyroid nodules Filipe B G Freire 1, Wellington P Martins 1, 2 O achado de nódulos na tireóide é relativamente freqüente na população. Com a popularização da ultrassonografia nota-se um aumento no diagnóstico de nódulos tireoidianos, surgindo então a necessidade de meios para a exclusão de malignidade. A PAAF (punção aspirativa de agulha fina) constitui um dos principais métodos empregados com este objetivo. É considerado um método minimamente invasivo e com elevada acurácia, devendo ser indicado apenas em casos suspeitos. Assim, além das características encontradas ao exame físico devem ser identificados padrões estruturais no exame ultrassonográfico que auxiliem na suspeita de malignidade, contribuindo para a precisa indicação de PAAF na complementação diagnóstica. Palavras-chave: Neoplasias da Glândula Tireóide; Ultrassonografia, Biópsia por Agulha. 1- Escola de Ultrassonografia e Reciclagem Médica de Ribeirão Preto (EURP) 2- Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) Recebido em 20/05/2011, aceito para publicação em 01/06/2011. Correspondências para Wellington P Martins. Departamento de Pesquisa da EURP - Rua Casemiro de Abreu, 660, Vila Seixas, Ribeirão Preto-SP. CEP 14020-060. E-mail: [email protected] Fone: (16) 3636-0311 Fax: (16) 3625-1555 Abstract The finding of thyroid nodules is relatively frequent in the population. With the popularization of ultrasound there was an increase in the diagnosis of thyroid nodules, creating the need for tools to exclude malignancy. FNA (fine needle aspiration) is one of the main methods used for this purpose. It is considered minimally invasive and very accurate, and should be indicated only in suspicious cases. Thus, in addition to features found on physical examination should be identified structural patterns in ultrasound to aid in the suspicion of malignancy, contributing to the accurate indication of FNA in the diagnostic workup. Keywords: Thyroid Neoplasms; Ultrasonography; Biopsy, Needle. Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives EURP 2011; 3(2): 58-63 59 Freire & Martins – PAAF em nódulos de tireóide Introdução A maioria dos nódulos tireoidianos é encontrada de forma acidental, principalmente através de estudos de imagem não direcionados para a investigação de doenças tireoidianas, em pacientes na sua maioria assintomáticos. Esses nódulos são denominados incidentalomas. Na sua maioria são benignos e menores que 2 cm 1. Dentre os exames de imagem que identificam nódulos acidentais destacamos a tomografia computadorizada, a ressonância magnética e a ultrassonografia, sendo o último, o método de imagem mais sensível para identificação de nódulo de tireóide. Além disso, podem também ser identificados através do exame físico da região cervical durante a investigação de outras queixas clinicas. Nódulos de tireóide são achados freqüentes na população com prevalência de 5-8% de nódulos palpáveis ao exame físico, porém, o número de nódulos que não são evidenciados à palpação durante exame clínico é muito maior. Durante a realização de autópsias foi identificada uma prevalência de 50% de nódulos incidentais de tireóide. Com o crescimento da utilização da ultrassonografia e do avanço tecnológico que a acompanha foi identificada uma prevalência de 60-70% de nódulos tireoidianos maiores que 3 mm na população 2. Diante da alta prevalência dos nódulos tireoidianos na população é importante notar que apenas 5-9% deles são malignos. Eles representam cerca de 1% de todos os tipos de câncer 3-5. Todavia, está entre os cânceres que mais crescem em incidência nos Estados Unidos ficando atrás apenas do melanoma 1. Assim, o estudo ultrassonográfico tem sido considerado o melhor método para identificação e caracterização dos nódulos tireoidianos e também auxilia na indicação de realização de PAAF (punção aspirativa de agulha fina) que é considerado o método diagnóstico pré-operatório mais preciso para a identificação de um nódulo maligno na tireóide 5. A PAAF embora seja um método considerado minimamente invasivo, representa causa de ansiedade e desconforto para os pacientes e eleva os custos na investigação diagnóstica. Deste modo, torna-se extremamente importante melhorar a seleção dos pacientes para realização deste procedimento. Importância do método ultrassonográfico na avaliação de nódulos tireoidianos O achado de um nódulo tireoidiano ou incidentaloma faz com que se torne imprescindível a investigação no sentido de caracterizar o seu grau de malignidade. Muito embora ao exame físico possam ser identificadas características que apontem para Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives malignidade a ferramenta mais utilizada para apontar e discriminar com maior precisão critérios de malignidade em nódulos tireoidianos é a ultrassonografia. Nota-se, entretanto, que apesar de apresentar alta prevalência os nódulos tireoidianos são malignos em apenas 5% dos casos 3-5. Assim, mesmo com a utilização deste método a chance de falsos positivos e a indicação de métodos diagnósticos invasivos têm aumentado. Dentre os nódulos tireoidianos malignos o principal câncer de tireóide é o carcinoma papilífero de tireóide (75%-80%). Outros tipos histológicos de câncer de tireóide incluem folicular (10%-20%), medular (3%-5%), anaplásico (1%2%) 5. A ultrassonografia é o exame de imagem com maior relevância no manuseio de pacientes com doença nodular tireoidiana, sendo um método de alta sensibilidade para o diagnóstico de nódulo tireoidiano, avaliando suas características, seu grau de comprometimento com estruturas adjacentes, e também monitoriza a evolução dos nódulos tireoidianos, auxiliando na identificação de características que apontem malignidade contribuindo para indicação de realização de PAAF. A ultrassonografia pode identificar com boa acurácia nódulos de até 2 mm 2. Permite avaliar com precisão o volume dos mesmos, a caracterização dos nódulos como sólidos, mistos ou císticos, a identificação de micro calcificações associadas e a detecção de nódulos não-palpáveis, de pequenas dimensões ou posteriores. Auxilia na observação clínica de longo prazo e no diagnóstico de linfonodomegalia cervical, bem como no segmento da avaliação volumétrica dos nódulos 6. Embora não possa determinar com precisão o diagnóstico de câncer de tireóide, a ultrassonografia pode avaliar o potencial de malignidade dos nódulos tireoidianos 2. A literatura procura correlacionar características ultrassonográficas nos nódulos tireoidianos que possam estratificar o risco de malignidade utilizando-se aspectos morfológicos e de vascularização para se aumentar o diagnóstico de nódulos malignos e evitar biópsia desnecessária 4, 7, 8. Características ultrassonográficas de malignidade de nódulos tireoidianos Dentre os principais critérios de avaliação ultrassonográfica dos nódulos tireoidianos destacamse as dimensões do nódulo, sua ecogenicidade, textura, regularidade de seu contorno, presença de halo, presença de micro calcificações e seu padrão vascular, que serão mais bem definidos de forma individualizada. Na avaliação ultrassonográfica dos EURP 2011; 3(2): 58-63 60 Freire & Martins – PAAF em nódulos de tireóide nódulos da tiróide, os principais parâmetros utilizados são: Número de nódulos Quando avaliamos glândulas tireoidianas identificamos de forma geral aquelas que apresentam nódulos em seu interior como tendo um padrão multinodular ou com nódulos solitários. Revisões de estudos recentes têm sinalizado que não há diferença para o risco de malignidade quando se compara glândulas multinodulares com glândula com nódulos únicos 2. Todavia, um nódulo solitário tem maior probabilidade de ser maligno, sendo que a melhor conduta numa glândula multinodular seria estudar cada nódulo, merecendo melhor investigação aqueles com características suspeitas. Dimensões Ao ser considerado a dimensão de um nódulo tireoidiano destaca-se que quanto maior o nódulo, maior o risco de ser maligno. Entretanto, alguns estudos descrevem que o tamanho do nódulo não altera o risco de malignidade. Assim sendo, estudos recentes concluem que mais importante que o valor absoluto das dimensões é a presença do de lesões nodulares que são maiores no plano ântero-posterior em comparação com o plano transverso, pois, este achado evidencia maior potencial de malignidade para este nódulo demonstrando alta especificidade e baixa sensibilidade para câncer de tireóide 2. Alguns autores preconizam que mesmo nódulos menores que 1,0 cm, com características suspeitas, sejam investigados e aqueles sem características suspeitas podem ser apenas acompanhados 6. Ecogenicidade Geralmente quando um nódulo tireoidiano é identificado ao estudo ultrassonográfico a descrição de sua ecogenicidade constitui um dos relevantes critérios que apontam malignidade, visto que, quando o nódulo é isoecogenico ou hipoecogenico possui um menor risco de malignidade quando comparado com o achado de nódulos hipoecogenicos. Estudos apontam que cerca de 75% dos nódulos malignos são hipoecogenicos, 20%são isoecogenicos e 1 a 5% são hiperecogenicos 9. Textura Estudos demonstram que lesões tireoidianas com textura puramente císticas encerram baixo risco de malignidade 10. No entanto, lesões de padrões mistos, quando são predominantemente císticas e com vegetações nas suas paredes apresentam risco aumentado de malignidade na medida em que aumentam seu componente sólido. Demonstra-se também que lesões císticas com aspecto de favo-demel ou com aspecto de esponja com múltiplos cistos separados com septações estão associados a baixo Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives risco de malignidade 2. A maioria dos nódulos malignos identificados à ultrassonografia apresenta padrão sólido 10. Halo Na avaliação do nódulo tireoidiano nota-se a presença de halo em aproximadamente 60 a 80% dos nódulos benignos e em 15% dos malignos. Os estudos mostram relação significativa entre benignidade e presença de halo, sendo esse geralmente fino (até 2 mm) e completo. Todavia, a identificação de nódulo tireoidiano com halo incompleto e espesso (maior que 2 mm) evidencia maior risco de malignidade 10 Contornos Nódulos benignos tendem a ser regulares e bem definidos, diferentemente dos malignos que tendem a ser irregulares e mal definidos 10. Assim, nódulos tireoidianos com bordas mal definidas ou lobuladas são fatores de risco independentes para malignidade com moderada especificidade e baixa sensibilidade 2. Calcificações A presença de microcalcificações apresenta alta especificidade e baixa especificidade para malignidade de nódulos tireoidianos. As microcalcificações podem ser confundidas com cristais de colóide o que quando evidentes falam a favor de nódulo colóide que apresenta um baixo risco de malignidade 2. Geralmente, as microcalcificações (pequenos pontos hiperecogênicos, alguns com sombra acústica posterior) centrais são consideradas um sinal altamente sugestivo de malignidade, sendo descritas em até 60% dos nódulos malignos 10. As calcificações grosseiras estão geralmente relacionadas a nódulos benignos. Doppler Freqüentemente encontramos na literatura a evidencia de um risco aumentado de malignidade nos nódulos com predomínio de vascularização central, ao passo que a ausência de fluxo central está relacionada à presença de nódulos benignos. Neste caso a sensibilidade e a especificidade são apenas moderadas, e o valor preditivo negativo é alto. Todavia, há relatos na literatura de nódulos malignos pouco vascularizados, assim como de nódulos benignos hipervascularizados, sendo que uma proporção significativa de carcinomas papilares apresentou ausência de fluxo central 9, 11. É importante destacar que como a ultrassonografia é um método essencialmente examinador dependente a subjetividade da classificação dos nódulos bem como as diferentes sensibilidades dos aparelhos de Doppler podem ser um obstáculo para a padronização e comparação dos resultados dos estudos na literatura. Atualmente a classificação dos aspectos ultrassonográficos dos nódulos tireoidianos EURP 2011; 3(2): 58-63 61 Freire & Martins – PAAF em nódulos de tireóide proposta por Chammas et al 5 apresenta maior acurácia para detecção de nódulos malignos. Esta classificação separa os nódulos em cinco padrões: Padrão I – ausência de vascularização Padrão II - apenas vascularização periférica Padrão III – vascularização periférica maior ou igual à central Padrão IV – vascularização central maior que a periférica Padrão V – apenas vascularização central Verifica-se que quando o nódulo tireoidiano encontra-se na classificação de Chammas IV e V a chance de malignidade é maior que 60% 12. Evidenciase que o Doppler colorido não deve substituir a PAAF e o estudo citopatológico no diagnóstico dos nódulos malignos da tireóide, mas pode auxiliar na escolha dos nódulos que devem ser biopsiados 12). Quadro 1. Recomendações gerais para a realização de punção aspirativa com agulha fina em nódulos de tireóide detectados pela ultrassonografia. Adaptado de Frates, 2005 7. Nódulo solitário Considerar fortemente a realização de PAAF: (a) um nódulo de 1,0 cm ou mais no seu maior diâmetro se microcalcificações estão presentes (b) um nódulo de 1,5 cm ou mais em seu maior diâmetro se qualquer das seguintes alterações o acompanharem (i) nódulo sólido ou quase inteiramente sólido, ou (ii) existência de calcificações grosseiras dentro do nódulo. (c) um nódulo 2,0 cm ou mais em seu maior diâmetro se qualquer das seguintes alterações o acompanharem: (i) nódulo misto sólido e cístico, ou (ii) o nódulo é quase inteiramente cístico com um componente sólido mural; (d) o nódulo tem mostrado crescimento substancial durante o seguimento Múltiplos nódulos • Considerar PAAF para um ou mais nódulos, com seleção priorizada com base nas condições prévias e critérios listados acima. • PAAF é comumente desnecessária nas glândulas difusamente aumentadas com múltiplos nódulos de aparência ultrassonográfica similar sem intervir no parênquima normal. • Note que essas recomendações não são absolutas ou inflexíveis e que cada caso deve ser avaliado de forma individual. • A presença de linfonodos anormais prevalece sobre os critérios característicos ultrassonográficos e devem indicar biopsia de linfonodos e/ou de um nódulo tireoidiano ipsilateal. Ultrassonografia e PAAF como métodos no rastreamento de câncer de tireóide Diante da evidencia de critérios ultrassonográficos que apontem para risco aumentado de malignização Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives de um nódulo tireoidiano um dos principais recursos para confirmação do diagnóstico de malignidade é a realização de PAAF (punção aspirativa de agulha fina). A PAAF é um procedimento considerado EURP 2011; 3(2): 58-63 62 Freire & Martins – PAAF em nódulos de tireóide minimamente invasivo que possui uma alta sensibilidade e especificidade para o diagnóstico de câncer. Por ser um método que aumenta o custo da investigação diagnóstica e, acima de tudo, por gerar ansiedade para os pacientes e médicos deve ser corretamente indicada. A realização de PAAF guiada por ultrassom diminui a razão de aspirados não diagnósticos de 20 para 1-10% 2. Existem algumas recomendações para pacientes adultos que tem um nódulo de tireóide detectado pela ultrassonografia. Essas recomendações podem não ser aplicadas para todos os pacientes, incluindo aqueles que têm história, exame físico, ou qualquer outro fator que sugere que eles tenham aumento de risco para câncer. Recomendações gerais para nódulos com 1,0 cm ou mais no maior diâmetro 7 são descritas no Quadro 1. Podemos observar que essas recomendações não são absolutas ou inflexíveis e que cada caso deve ser avaliado de forma individual. Dilemas na avaliação de nódulos assintomáticos Com o crescimento das diversas opções de métodos de imagem como a tomografia computadorizada, a ressonância magnética, a ultrassonografia, a cintilografia dentre outros, e seu acentuado grau de sofisticação, tanto no que corresponde a avanços de software como de hardware que tem contribuído para melhoria da qualidade de processamento e nitidez do estudo de imagens, bem como, da maior realização destes exames para auxilio na investigação diagnóstica na medicina moderna, observa-se um aumento considerável da identificação de nódulos de tireóide de forma acidental. Acrescido a este fator tem-se o fato de que os pacientes estão cada vez mais bem informados tornando a conduta diante deste achado um desafio. Diante desta situação muitos médicos têm recorrido ao exame ultrassonográfico como ferramenta que auxilia na avaliação de malignidade para nódulos tireoidianos, visto que, este método possui um custo relativamente baixo e também constitui um procedimento não invasivo, sendo ao mesmo tempo capaz de evidenciar características dos nódulos que indicam maior ou menor grau de malignidade. Entretanto, os achados ultrassonográficos para malignidade possuem baixa especificidade e baixo valor preditivo positivo 1. Os achados com maior sensibilidade para a detecção de câncer apresentam valor preditivo positivo de 15 a 27%. Por essa razão, uma grande proporção das lesões encontradas pode acabar gerando biopsias em Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives excesso, e até mesmo tireoidectomias desnecessárias 1 . Temos, também, a questão da relevância clínica diante do diagnóstico de micro-carcinoma papilar de tireóide. Muito embora existam variantes altamente agressivas que necessitam de tratamento cirúrgico, a grande maioria se apresenta como carcinoma de tireóide clássico e de evolução indolente, e assim, é difícil determinar se intervenções precoces alteram a sobrevida ou os resultados específicos da doença. Estudos demonstraram que apenas em 1,2% deste tipo de tumores foram identificadas metástase para linfonodos que puderam ser detectadas clinicamente. Deste modo, concluíram que a maioria dos carcinomas papilares menores pode ser monitorizada, e a intervenção em estágios avançados não apresentou impacto negativo nos eventuais resultados 1. Todavia, um grande problema com a conduta conservadora nesta situação é que poucos médicos e pacientes aceitam uma conduta expectante diante de um câncer de tireóide confirmado, o que é agravado diante das implicações médico-legais existentes em tais situações, e que são mais evidentes em países desenvolvidos 1. Assim, somando-se a dificuldade e limitação para realização de estudos nesta área, com a ausência de consensos que direcionem a melhor conduta com base científica para esses casos. a decisão do manejo e conduta tem sido tomada de forma individualizada pelos diversos serviços de saúde considerando o conhecimento até então disponível 1. Considerações finais A ultrassonografia tem se demonstrado como um método eficaz na identificação de nódulos de tireóide, bem como, na sua classificação de risco de malignidade. Associada ao exame físico constitui ferramenta muito importante para indicação de realização de PAAF em nódulos suspeitos de malignidade através da determinação de critérios ultrassonográficos objetivos. Tais critérios visam melhorar a correta indicação de PAAF, minimizar as chances de falsos negativos, diminuição de custos e amenizar ansiedade de pacientes e médicos. Diante da prevalência de nódulos tireoidianos na população mundial e do desenvolvimento de novas tecnologias aplicadas aos aparelhos ultrassonográficos é inevitável que novos estudos venham acrescentar critérios cada vez mais específicos na determinação de nódulos malignos melhorando ainda mais a acurácia deste exame considerado de baixo custo. EURP 2011; 3(2): 58-63 63 Freire & Martins – PAAF em nódulos de tireóide Referências 1. Iyer NG, Shaha AR, Silver CE, Devaney KO, Rinaldo A, Pellitteri PK, et al. Thyroid incidentalomas: to treat or not to treat. Eur Arch Otorhinolaryngol 2010;267:(7):1019-1026. 2. Bastin S, Bolland MJ, Croxson MS. Role of ultrasound in the assessment of nodular thyroid disease. J Med Imaging Radiat Oncol 2009;53:(2):177-187. 3. Mortensen JD, Woolner LB, Bennett WA. Gross and microscopic findings in clinically normal thyroid glands. J Clin Endocrinol Metab 1955;15:(10):1270-1280. 4. Reading CC, Charboneau JW, Hay ID, Sebo TJ. Sonography of thyroid nodules: a "classic pattern" diagnostic approach. Ultrasound Q 2005;21:(3):157-165. 5. Chammas MC, Gerhard R, de Oliveira IR, Widman A, de Barros N, Durazzo M, et al. Thyroid nodules: evaluation with power Doppler and duplex Doppler ultrasound. Otolaryngol Head Neck Surg 2005;132:(6):874-882. 6. Dominguez JM, Baudrand R, Cerda J, Campusano C, Fardella C, Arteaga E, et al. An ultrasound model to discriminate the risk of thyroid carcinoma. Acad Radiol 2011;18:(2):242-245. 7. Frates MC, Benson CB, Charboneau JW, Cibas ES, Clark OH, Coleman BG, et al. Management of thyroid nodules detected at Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives US: Society of Radiologists in Ultrasound consensus conference statement. Radiology 2005;237:(3):794-800. 8. Iannuccilli JD, Cronan JJ, Monchik JM. Risk for malignancy of thyroid nodules as assessed by sonographic criteria: the need for biopsy. J Ultrasound Med 2004;23:(11):1455-1464. 9. Bartolotta TV, Midiri M, Runza G, Galia M, Taibbi A, Damiani L, et al. Incidentally discovered thyroid nodules: incidence, and greyscale and colour Doppler pattern in an adult population screened by real-time compound spatial sonography. Radiol Med 2006;111:(7):989-998. 10. Emerson CH. Can thyroid ultrasound and related procedures provide diagnostic information about thyroid nodules: a look at the guidelines. Thyroid 2011;21:(3):211-213. 11. Stacul F, Bertolotto M, De Gobbis F, Calderan L, Cioffi V, Romano A, et al. US, colour-Doppler US and fine-needle aspiration biopsy in the diagnosis of thyroid nodules. Radiol Med 2007;112:(5):751-762. 12. Faria MA, Casulari LA. [Comparison of color Dopplerevaluated thyroid nodule classifications as described by Lagalla and Chammas]. Arq Bras Endocrinol Metabol 2009;53:(7):811-817. EURP 2011; 3(2): 58-63 Artigo de Revisão Ultrassonografia pulmonar Lung ultrasound Rolando E M Oliveira 1, Wellington P Martins 1, 2 O estudo ultrassonográfico dos pulmões vem ganhando reconhecimento como um método de imagem diagnóstico e de monitoramento. O seu uso já é bem reconhecido no trauma, para a identificação de pneumotórax, e está sendo ampliado para as unidades de tratamento intensivo, onde permite a rápida diferenciação entre várias causas de dispnéia. Esse método é capaz de diagnosticar e acompanhar a evolução de diversas patologias pleurais e pulmonares como: efusão pleural, consolidações alveolares, síndromes insterticiais, pneumotórax. Além disso, é capar de auxiliar na realização de procedimentos guiados, como toracocentese e biopsias. Palavras-chave: Pulmão; Ultrassonografia; Cuidados Críticos. 1- Escola de Ultrassonografia e Reciclagem Médica de Ribeirão Preto (EURP) 2- Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) Recebido em 26/05/2011, aceito para publicação em 06/06/2011. Correspondências para Wellington P Martins. Departamento de Pesquisa da EURP - Rua Casemiro de Abreu, 660, Vila Seixas, Ribeirão Preto-SP. CEP 14020-060. E-mail: [email protected] Fone: (16) 3636-0311 Fax: (16) 3625-1555 Abstract Ultrasound study of the lungs is gaining recognition as a diagnostic and monitoring imaging method. Its use is already well recognized in trauma, to identify pneumothorax, and is being expanded to the intensive care unit, where it allows the rapid differentiation between various causes of dyspnea. This method is able to diagnose and monitor the progress of various pleural and lung pathologies such as: pleural effusion, alveolar consolidation, insterticiais syndromes, pneumothorax. Furthermore, it is used to assist in performing guided procedures such as thoracentesis and biopsies. Keywords: Lung; Ultrasonography; Critical Care. Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives EURP 2011; 3(2): 64-66 65 Oliveira & Martins – Ultrassonografia pulmonar Introdução A ultrassonografia pulmonar foi pouco valorizada por muito tempo, em razão dos aparentes obstáculos que ela apresentava: pequena área de acesso e a intensa produção de artefatos pela reflexão do som no ar contido nos pulmões dificutando a adequada pneração do feixe produção de uma imagem satisfatória. A evolução da ultrassonografia pulmonar iniciou-se com o estudo destes artefatos, e não na avaliação das estruturas pulmonares, permitindo a diferenciação entre várias condições fisiológicas e patológicas 1. Nos pacientes prostrados com dispnéia, a auscultação e a radiografia de tórax no leito do paciente, tem mostrado pouca acurácia para identificação a etiologia. Um terço das radiografias de tórax não é considerado inadequado para a avaliação pulmonar 2. Radiografias de tórax apresentam grande divergência quando comparado com a tomografia de tórax que é considerado o padrão ouro 3. No entanto a realização da tomografia nem sempre é disponível ou possível, em razão das condições clínicas do paciente. Nesse cenário, a ultrassonografia pulmonar vem ganhando espaço no diagnóstico e seguimento da evolução de certas condições 3 sendo capaz de rapidamente distinguir entre várias causas de dispnéia aguda em pacientes com doenças graves 1. Vantagens A ecografia pulmonar possui características próprias. A diferença da tomografia computadorizada, a ultrassonografia pulmonar pode ser realizada no leito, diminuindo o desconforto do paciente. Outra vantagem da ecografia pulmonar sobre a radiografia de tórax, é que esta, pode chegar a um diagnóstico mais rápido, proporcionando um oportuno tratamento. Outras características são: baixo custo, boa reprodutividade e não usar radiação ionizante 1. Equipamento e transdutores Os transdutores mais usados são os convexos (2,53,5 MHz), microconvexos (3,5-7,0 MHz) e os lineares (5,0-10,0 MHz). E os equipamentos recomendados são todos aqueles que possuam modo B, dando preferência aos portáteis já que eles podem ser levados até o leito do paciente 2. Na ultrassonografia pulmonar não é aplicado o estudo Doppler ou o uso de harmônica. Posição do paciente A avaliação do tórax poderá ser feito em posição supina, sentado ou semi-sentado dependendo da condição clínica do paciente. O tórax poderá ser Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives dividido em 4 zonas: zona anterior direita, zona lateral direita, zona anterior esquerda e zona lateral esquerda 4. Ou poderão ser dividido em 8 zonas, quatro à direita e quatro à esquerda, sendo: zona para esternal, zona médio clavicular, zona axilar anterior e zona axilar média 5 Tabela 1. Sensibilidade e especificidade da ultrassonografia pulmonar para o diagnóstico de patologias pulmonares em unidade de tratamento intensivo 4. Achado Sensibilidade Especificidade Efusão pleural 92% 93% Consolidação alveolar 90% 98% Síndrome intersticial 93% 93% 100% 96% 79% 100% Pneumotórax completo Pneumotórax rádiooculto Tabela 2. Sensibilidade da ultrassonografia pulmonar para identificar sinais de pneumonia comparado com radiografia 6. Consolidação pulmonar Casos identificados Radiografia 100% Ultrassonografia 92% Sensibilidade e especificidade Ultrassonografia transpulmonar apresenta boa sensibilidade e especificidade para detectar efusão pleural, consolidação alveolar, síndrome instersticial, pneumotórax completo e pneumotórax oculto em pacientes em unidade de cuidados intensivos (Tabela 1) 4. Comparando a ultrassonografia pulmonar com a radiografia de tórax, a ultrassonografia pulmonar evidenciou boa acurácia para diagnosticar pneumonia comunitária (Tabela 2) 6. Sinais ecográficos A avaliação pulmonar compreende o estudo dos espaços intercostais desde o segundo até o décimo quarto espaço intercostal do hemitórax direito e desde o segundo até o décimo quinto espaço intercostal hemitórax esquerdo 5. Através do estudo longitudinal do espaço intercostal, poderemos observar o sinal “do morcego”, o qual é produzido pela sombra de ambas costelas (asas do morcego) e a pleura (corpo do morcego) 4. EURP 2011; 3(2): 64-66 66 Oliveira & Martins – Ultrassonografia pulmonar Em condições normais, a única estrutura pulmonar demonstrada é a pleura. Visualizada como uma linha hiperecóica horizontal, a qual se movimenta simultaneamente com a respiração. As linhas hiperecoicas paralelas a linha hiperecogênica horizontal são chamadas de linhas A. O deslizamento pulmonar habitual no modo M é conhecido como imagem “do litoral”, no qual as estruturas superficiais criam linhas horizontais (ondas do mar) e a movimentação da pleura e pulmão criam uma imagem granulada (areia) 4. As efusões pleurais são evidenciadas através de imagens anecoicas delimitadas pela pleura, bordas costais e borde pulmonar; podendo ser confirmadas através do modo M, o qual demonstrará um padrão sinusoidal de ondas criadas pela inspiração e espiração 4. Ultrassonografia pulmonar, junta ou não com peptídeo natriurético do sangue (BNP), pode diferenciar entre falha cardíaca (edema agudo de pulmão) e doença pulmonar obstrutiva crônica/asma 7 . O diagnóstico de síndrome instersticial é realizado através da avaliação das linhas B, que são imagens hiperecóicas que parecem rabos de cometa, que vão desde a pleura até o final da tela. Quando aparecem várias linhas B, numa única aquisição, que apagam as linhas A, é um claro sinal para síndrome insterticial 1. Nos síndromes intersticiais (como no edema pulmonar agudo) existe líquido extravascular, que cria espessamento do septo interlobular. Nessas condições, o feixe de som bate nos septos espessados e cria um artefato chamado linhas B. O diagnóstico deste síndrome é realizada através da avaliação das linhas B, que são imagens hiperecóicas que parecem rabos de cometa, que vão desde a pleura até o final da tela 4. Quando aparecem várias linhas B, numa única aquisição, que conseguem apagar as linhas A, é evidenciado um claro sinal da síndrome insterticial 1. A presença deslizamento pulmonar, nega a presença de pneumotórax 8, isto pode ser visualizado através do modo M, que muda de uma imagem Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives parecida ao litoral (linhas verticais e granulado) evidenciando movimentação pleural normal a outra parecida ao de uma estratosfera (exclusivamente linhas verticais) 4. Os broncogramas aéreos são visualizados como pontos de linhas hiperecoicas localizados em um segmento pulmonar; conhecido como sinal do farrapo 2. Considerações finais Devido aos bons resultados encontrados nos estudos aliado à simplicidade da técnica, a ultrassonografia pulmonar está se tornando uma ferramenta diagnóstica importante, ganhando espaço na cardiologa, na medicina de urgência e nas unidades de terapia intensivas. Referências 1. Cardinale L, Volpicelli G, Binello F, Garofalo G, Priola SM, Veltri A, et al. Clinical application of lung ultrasound in patients with acute dyspnea: differential diagnosis between cardiogenic and pulmonary causes. Radiol Med 2009;114:(7):1053-1064. 2. Barillari A, Fioretti M. Lung ultrasound: a new tool for the emergency physician. Intern Emerg Med 2010;5:(4):335-340. 3. Soldati G, Sher S. Bedside lung ultrasound in critical care practice. Minerva Anestesiol 2009;75:(9):509-517. 4. Lichtenstein DA. 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