SAUDE15.book Page 33 Friday, July 15, 2005 8:38 AM GISELE CASSANO FERREIRA, ET AL. ORIGINAL/ORIGINAL Estudo de Caso de um Jovem Afásico e sua Qualidade de Vida Case Study of an Aphasic Youngster and his Quality of Life RESUMO Este trabalho se propõe a analisar o discurso oral de um jovem afásico sobre sua qualidade de vida após dois acidentes vasculares cerebrais, doravante AVCs, cuja etiologia provável tenha sido a dependência química. A análise de seu discurso é feita a partir do que pode ser extraído do processo de interlocução, em intervenção terapêutica fonoaudiológica. A metodologia utilizada é a de abordagem qualitativa, e a análise dos dados é guiada pela análise microgenética. Com base nos dados analisados, observa-se que a terapeuta, ao assumir o papel de interlocutor, do que interpreta, atribui sentido ao seu discurso, incentiva o paciente a falar, favorecendo sua auto-estima e contribuindo para uma melhor qualidade de vida do sujeito envolvido. Palavras-chave AFÁSICO JOVEM – QUALIDADE DE VIDA – DISCURSO ORAL. GISELE CASSANO FERREIRA* Curso de Fonoaudiologia – Faculdade de Ciências da Saúde (UNIMEP/SP) EVANI ANDREATTA AMARAL CAMARGO Curso de Fonoaudiologia – Faculdade de Ciências da Saúde (UNIMEP/SP) *Correspondências: Rua Josefa Torres Silvestrine, 79, Jardim Torrezan, 13440-000, Saltinho/SP [email protected] ABSTRACT This work aims to evaluate the oral speech of an aphasic young adultís quality of life, after two vascular brain accidents, henceforth AVCs, which etiology, probably, had been chemical dependence. The analysis is carried from what can be extracted from the speaker process in phonological therapeutic intervention. The methodology used is a qualitative approach and the data analysis is guided by the micro-genetic analysis. Based on the evaluated data, it is observed that the therapist, when assuming the speaker role, from what he interprets, gives sense to his speech, motivates the patient to speak, favoring his self-esteem, contributing for the subjectís quality of life. Keywords YOUNG APHASIC – QUALITY OF LIFE – ORAL SPEECH. Saúde em Revista ESTUDO DE CASO DE UM JOVEM AFÁSICO E SUA QUALIDADE DE VIDA 33 SAUDE15.book Page 34 Friday, July 15, 2005 8:38 AM GISELE CASSANO FERREIRA, ET AL. INTRODUÇÃO omo fonoaudióloga, uma das autoras ficou envolvida com a questão da afasia desde o momento inicial de seus estágios clínicos da graduação em fonoaudiologia, realizados na UNIMEP. Quando formada e clinicando em seu consultório, o primeiro paciente foi um afásico adulto jovem, de 18 anos, que acabara de ser acometido por dois AVCs isquêmicos, cuja seqüela foi uma afasia motora e uma hemiplegia à direita. Os AVCs foram causados, provavelmente, por dependência química. Tais fatos motivaram este estudo sobre afasia e sobre afásicos jovens. Assim, o objetivo deste trabalho é analisar o discurso oral e a qualidade de vida deste sujeito adulto jovem após dois AVCs. E, além disso, as questões que ele apresenta sobre suas dificuldades, a partir do material extraído do processo de interlocução de um episódio de uma sessão terapêutica fonoaudiológica, que faz parte do banco de dados da dissertação de mestrado (em construção) de uma das autoras. Pode-se observar que, durante as sessões de terapia fonoaudiológica, o paciente trazia para a terapeuta suas frustrações, emoções, ansiedades e angústias em relação à sua linguagem. Posteriormente, ele passou a se queixar de sua fala curta, ou seja, do fato de não conseguir formar frases, da linguagem telegráfica, esperada para o seu quadro afásico. Muitas vezes, durante as sessões, o paciente dizia “falar mais... preciso”. Levando em consideração as necessidades do paciente, a terapeuta procurou mostrar a ele a importância da atividade dialógica durante as sessões fonoaudiológicas, lugar em que o sentido e a significação são privilegiados em detrimento da repetição e do falar corretamente. Nesse sentido, foi-lhe mostrado que os desvios em sua fala podiam ter outro estatuto, pois são atividades epilingüísticas, de reconstrução ou ressignificação das palavras. Ao discutir a linguagem de afásicos, Couldry1 coloca como problema teórico metodológico fundamental a condição de sujeito da linguagem. A autora aponta para o fato de que é na condição de exercício da linguagem que emerge o sujeito. Interessa-se por estudar a linguagem do afásico para conhecer o que “a afasia apaga e o que o sujeito sublinha” (p. 5). Enfatiza a questão de que, para conhecer a atividade do sujeito, o que realça e quais recursos são usados a partir de sua doen- C 34 ça, é necessário estar imerso na linguagem em funcionamento. Avança ao falar sobre a singularidade do sujeito e, a partir daí, propõe uma prática intersubjetiva, em que seja possível surgirem possibilidades de formas de ação (tanto do sujeito como do terapeuta). A autora propõe que, logo no início do atendimento do sujeito afásico, a meta deve ser elevar o sujeito e suas formas de se expressar, ou seja, trazer o sujeito para o discurso em funcionamento. Sendo assim, o terapeuta não pode se posicionar distante, mas deve inserir-se no espaço da linguagem, assumir o papel do interlocutor, que participa dos modos de ação que são possíveis pela linguagem e dá condições para que o afásico se constitua como sujeito. Para complementarmos o estudo sobre o funcionamento lingüístico do sujeito aqui apresentado, também buscamos respostas em outros autores, como Bakhtin,2 que discute que “compreender a enunciação de outrem significa orientar-se em relação a ela, encontrar o seu lugar adequado no contexto correspondente” (pp. 131-2). A compreensão ocorre porque existe o outro, apto para “orientar-se em relação à enunciação do interlocutor” (pp. 131-2). Já a perda da fala, decorrente de uma lesão cerebral, e os sintomas da afasia vêm sendo discutidos em muitos trabalhos oriundos da medicina. O cérebro era um mistério, e os anatomistas e fisiologistas empenharam-se em decifrar suas funções. Foucault3 discute que, entre os séculos XVII e XIX, observa-se uma grande mudança no saber médico caracterizada pela passagem entre o “adivinhar o interior unicamente pelas noções externas” e o “descobrir a doença na profundidade secreta do corpo” (p. 156). Isso só se tornou possível às custas do enfrentamento de obstáculos que opunham resistência à abertura de cadáveres. Segundo Novaes-Pinto,4 as primeiras investigações sobre afasia ocorreram quando Broca, em 1861, procedeu a uma autópsia de um paciente, pretendendo atribuir às alterações encontradas no cérebro a causa da sintomatologia apresentada pelo paciente. Como o paciente de Broca tinha dificuldade na linguagem articulada, ele determinou que aquela área seria a sede da faculdade da linguagem articulada, a área de Broca (parte inferior da terceira circunvolução frontal esquerda, área 44 de Broadman). Opondo-se à noção localizacionista, assim como à visão holística do funcionamento cereSAÚDE REV., Piracicaba, 7(15): 33-38, 2005 SAUDE15.book Page 35 Friday, July 15, 2005 8:38 AM GISELE CASSANO FERREIRA, ET AL. bral, segundo a qual todo cérebro estaria envolvido em qualquer que fosse a função psíquica registrada, Luria5 adota a concepção de sistema funcional, atribuindo a algumas áreas a responsabilidade pelo desempenho de qualquer que seja o processo psíquico referido. Para muitos outros autores, o distúrbio da linguagem nas afasias ocorre após a sua aquisição e é causado por uma lesão cerebral. Após uma breve discussão sobre afasia, introduziremos o tema qualidade de vida, cuja correlação estamos discutindo neste artigo. Conforme Penteado:6 Para o Ministério da Saúde, promoção da saúde implica a construção de um processo de investimentos e ações que fortalece as pessoas e aumenta sua auto-estima, capacitando-as ao controle, ação e transformação dos fatores que afetam sua qualidade de vida. Implica também uma mudança na forma de pensar sobre a saúde, que passa a ser compreendida como a capacidade da população em desenvolver potencialidades para realizar aspirações, satisfazer necessidades, responder aos desafios. (Penteado,6 p. 62). Segundo o Grupo Qualidade de Vida da Organização Mundial da Saúde,7 qualidade de vida é definida como “a percepção do indivíduo de sua posição na vida no contexto da cultura e sistema de valores nos quais ele vive e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações” (p. 179). Observa-se que a capacidade do sujeito quanto à interação e comunicação, à expressão e ação no mundo relaciona-se com a saúde, daí a importância do desenvolvimento da linguagem para a qualidade de vida. Então, qualidade de vida implica também promover o desenvolvimento do sujeito, da linguagem e da comunicação. METODOLOGIA O dado analisado é de uma das sessões fonoaudiológicas de um sujeito afásico jovem, cuja linguagem está sendo estudada. Tais sessões foram gravadas por gravador portátil em fitas cassetes de 60 minutos e transcritas ortograficamente. As terapias foram iniciadas três meses após os AVCs (03/2001), com acompanhamento semanal, com duração de 45 minutos. As gravações foram feitas durante um ano de terapia, mas analisamos, para este trabalho, apenas uma delas, da qual foram recortados todos os trechos em que o sujeito falou sobre sua vida, expectativas, relatos pessoais etc. Saúde em Revista ESTUDO DE CASO DE UM JOVEM AFÁSICO E SUA QUALIDADE DE VIDA Em seu discurso, observa-se um agramatismo, de característica telegráfica, o que não prejudica totalmente o sentido e o significado do seu discurso, pois o paciente tem realizado, ao longo do processo terapêutico fonoaudiológico, cada vez mais intervenções relacionadas àquilo que é dito, mostrando interpretar o que lhe é falado e que está preocupado em se posicionar com relação aos temas, independente do seu desejo inicial de alcançar uma fala perfeita. Segue-se, abaixo, um resumo do histórico do agravo que acometeu o jovem sujeito deste estudo, aqui chamado de João (nome fictício para preservar a identidade do sujeito). João, 20 anos, apresenta uma afasia motora e hemiplegia à direita. No ano de 2001, teve dois AVCs no prazo de quatro dias. Antes dos AVCs, João era dependente químico (cocaína, bebida, cigarro). Ele iniciou as terapias fonoaudiológica e fisioterápica alguns dias após a alta hospitalar. A metodologia utilizada para a análise dos dados é a de abordagem qualitativa, pois tal metodologia revela aspectos dos processos envolvidos, ao contrário do que ocorre em análises centradas em estudos estatísticos dos fenômenos lingüísticos, cujos parâmetros só podem ser tomados para a avaliação de parte do sistema lingüístico, e não da linguagem em funcionamento. A análise dos dados é guiada pela análise microgenética que, segundo Góes,8 pode ser o caminho de uma investigação ou articular-se a outros procedimentos para compor um estudo de caso ou uma pesquisa participante. Esse tipo de pesquisa está orientado para os detalhes das ações, para as interações e os cenários socioculturais, para o estabelecimento de relações entre microeventos e condições macrossociais. RESULTADOS, DISCUSSÕES E CONCLUSÕES Com o objetivo de analisar o discurso oral e a qualidade de vida deste sujeito adulto jovem e, além disso, as questões que ele apresenta sobre suas dificuldades a partir do que pode ser extraído do processo de interlocução, foi analisado aqui um episódio de uma das sessões fonoaudiológicas, realizada no mês de agosto 2002, cerca de um ano após o início da terapia. Este episódio está sendo tomado como exemplo do processo de interlocução entre o sujeito e a terapeuta. 35 SAUDE15.book Page 36 Friday, July 15, 2005 8:38 AM GISELE CASSANO FERREIRA, ET AL. Episódio Os participantes da sessão eram a terapeuta (T) e o paciente (P). No dia 21 de agosto de 2002, a terapeuta chegou na sala de espera do consultório e encontrou o paciente com um sorriso no rosto, um ar de alegria. Ambos entraram na sala, sendo que, em cima da mesa, havia o jornal do dia, pois o paciente gostava de lê-lo e conversar sobre os assuntos das manchetes. Como a terapeuta percebeu a alegria do paciente, começou a sessão terapêutica perguntando: Turno 1 – T: Você está contente hoje, tá até mais bonito, o que é que aconteceu neste fim de semana? Turno 2 – P: (sorridente).... eu... festa peão.... Barretos.... Turno 3 – T: Que delícia, por isso que está com essa cara tão boa!!!! Turno 4 – P:.É... Turno 5 – T: E aí? Estava gostoso lá!! Turno 6 – P: Nossa... muito bom... cheio gente... Turno 7 – T: É, tinha muita gente? Turno 8 – P: Brasil inteiro!! Turno 9 – T: É mesmo, vai gente de todo o Brasil. Turno 10 – P: Eu... uma menina... Minas Gerais... Turno 11 – T: Que legal, você conheceu, como ela chama? Turno 12 – P: Jaqueline... nossa, não... longe, né... Turno 13 – T: É. Minas Gerais é longe, mas tem telefone, né, é só ligar para ela. Turno 14 – P: É... peguei número... Turno 15 – T: Então dá para vocês conversarem Turno 16 – P: Muita menina lá... tudo nova... assim... (aponta com o dedo para a terapeuta, se referindo a sua idade) veião... caminhonete... Turno 17 – T: Verdade, João, tudo nova com homem velho, só interesse, João. Turno 18 – P: É... só dinheiro... Turno 19 – P: Nossa, muita... muita gente... gostoso... Big Brother... o peão... ganho... Turno 20 – T: Verdade, João, o Rodrigo estava lá, ele é bonito!!! Turno 21 – P: Ô loco... bonito... homê (rindo) Turno 22 – T: Ué, eu acho mulher bonita, por que você não acha homem bonito? Turno 23 – P: Tô fora… 36 A análise do episódio apresentado suscita algumas questões para discussão: a terapeuta fica atenta para a expressão facial e postural do paciente, chamando sua atenção para isso, respondendo e reinterpretando os tópicos por ele introduzidos. O episódio faz refletir sobre a importância entre os locutores, na atribuição de sentidos em um discurso. A terapeuta assume o lugar de interlocutora ativa, participando, fazendo perguntas, atribuindo sentidos para a fala e as expressões do sujeito, considerando-o como o outro do discurso, buscando a significação da interlocução. Isso pode ser identificado no momento em que a terapeuta usa a experiência vivida do paciente para fazer dela o tema da discussão. Além disso, verificamos que ela não está preocupada com a forma da língua, com a fala telegráfica do rapaz, mas sim com o conteúdo que ele traz, como podemos observar em todo o episódio. Dessa forma, o paciente não se queixa de como está usando a língua, não se importando em não conseguir formar frases complexas. Segundo Bakhtin,2 é durante o diálogo, em que há a réplica, que a compreensão torna-se possível. Assim, é necessário que os processos de significação sejam considerados em todas as suas possibilidades. Dessa forma, quando a terapeuta leva em conta a fala do jovem, mesmo que incompleta, os processos de significação configuram-se como efetivos. Observa-se neste episódio, pelo relato do jovem, que sua vida social continua preservada (mesmo que parcialmente), ao contar para a terapeuta sobre seu passeio na festa do peão de Barretos. Nota-se que ainda mantém suas amizades e paqueras (turnos 10 a 15). Assim, ao dirigirmos nosso olhar para a qualidade de vida deste jovem, cujo tema do episódio aqui apresentado é o passeio do final de semana, podemos inferir que ele procura se inserir como os jovens sem afasia de sua idade. Nos turnos 10, 12 e 14, verifica-se que o sujeito aparenta resolver seus problemas, pois sabe que Minas Gerais é longe e, por isso, pega o telefone da menina por quem se interessou para manter contato, pois é a única maneira, devido à distância. Podemos observar o senso crítico de João sobre costumes sociais nos turnos 16 e 18, ao identificar o interesse das meninas novas por homens mais velhos e ricos, posicionando-se frente ao faSAÚDE REV., Piracicaba, 7(15): 33-38, 2005 SAUDE15.book Page 37 Friday, July 15, 2005 8:38 AM GISELE CASSANO FERREIRA, ET AL. to. Nos turnos 20 a 23, a terapeuta questiona e provoca o sujeito sobre suas posições e opiniões, mas, apesar disso, ele as mantém. Já no turno 19, verifica-se que o paciente está atualizado com os acontecimentos da televisão, ao falar sobre o ganhador do programa de televisão Big Brother Brasil. Identifica-se, ainda, que a fala do paciente tem característica telegráfica, já que apresenta uma grande dificuldade em formar frases complexas. Mas, mesmo assim, ele se faz entender e não desiste de falar. Observa-se, também, que a terapeuta privilegia o conteúdo da fala do paciente, em detrimento dos aspectos formais da língua, questiona e, ao mesmo tempo, o interpela, para que a dinâmica discursiva não fique prejudicada. Ao levarmos em conta todos os recursos lingüísticos e extralingüísticos dos quais um sujeito afásico lança mão para se fazer compreender, podemos observar em sua fala elementos que, de certa forma e com maior independência, fazem parte dos processos normais de interlocução: lapsos, reiterações, retomadas e apoio na fala do interlocutor. Conforme Goffman,9 faz-se necessário tentar integrar os sujeitos estigmatizados na sociedade, já que podem ser considerados engajados numa espécie de negação coletiva da ordem social. Tais sujeitos são percebidos pelo grupo cultural como incapazes de usar as oportunidades sociais disponíveis, como as de trabalho ou de relações sociais, fazendo com que sejam discriminados. Os afásicos fazem parte desse grupo de indivíduos e, assim, o processo terapêutico deve levar em conta tais questões. Com o referencial teórico que permeia a terapia fonoaudiológica, tanto a terapeuta quanto o próprio paciente procuram amenizar esses estigmas. Dessa forma, a partir do episódio aqui analisado, podemos supor que o jovem continua parcialmente incluso na sociedade, mantendo sua vida social com restrições, não se intimidando com os preconceitos da sociedade. Acreditamos que uma das razões para isso decorre da perspectiva terapêutica adotada, como nos aponta a citação: “Tudo isso tem a ver com a proposta de relacionar fonoaudiologia e qualidade de vida, onde a fonoaudiologia possibilita acolher e tratar do sofrimento de modo a melhorar a qualidade de vida de uma pessoa” (Friedman,10 p. 8). Complementando as discussões, observa-se no episódio como o paciente não tem dificuldade para expandir ou mesmo sair do tópico discursivo da interlocução em curso, sem perder-se enquanto locutor, demonstrando que responde às questões da terapeuta, não se sobrepondo a sua fala. Discursivamente, a terapeuta está presente para o paciente e ele demonstra ser interlocutor e mantenedor dos tópicos que vão sendo elaborados. Portanto, o episódio apresentado demonstra como o processo dialógico caracteriza a linguagem e, nesse diálogo, existe a troca fundamental para que haja o processo de significação; a terapeuta, ao assumir o papel de interlocutor, interpreta, atribui sentido, resgata a fala do sujeito, priorizando o conteúdo relatado em seu discurso e, dessa forma, incentivando o sujeito a falar e tomar consciência do que é capaz, favorecendo sua auto-estima. O processo terapêutico em que o acompanhamento da linguagem do sujeito afásico é organizado a partir de situações discursivas dialógicas propicia outros modos de ação verbal.1 Podemos verificar na oralidade do paciente a capacidade de interação e de expressão e ação no mundo. Daí a importância da linguagem para a qualidade de vida e das oportunidades de interações sociais oferecidas a sujeitos com limitações como as desse jovem afásico, que se transformam em alicerce para a reintegração social do sujeito, como discutido por Penteado,6 já que a linguagem é considerada uma prática vinculada às suas condições de produção, como um produto social, cultural e histórico. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. 2. 3. 4. Coudry MI. Diário de Narciso, discurso e afasia. São Paulo: Hucitec; 1995. Bakhtin M. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Martins Fontes Ltda; 1995. Foucault MO. O nascimento da clínica. São Paulo: Forense Universitária; 1980. Novaes-Pinto RC. A contribuição do estudo discursivo para uma análise crítica das categorias clínicas [Tese de doutorado]. Campinas (SP): Instituto de Estudos da Linguagem, Unicamp; 1999. 5. Luria. Distúrbios do pensamento e linguagem: as últimas conferências de Luria. Porto Alegre: Editora Artes Médicas; 1998. 6. Penteado RZ. subjetividade e promoção da saúde na clínica fonoaudiológica. Pró-Fono Rev Atualiz Científ Jan-abr 2002;14(1):61-142. Saúde em Revista ESTUDO DE CASO DE UM JOVEM AFÁSICO E SUA QUALIDADE DE VIDA 37 SAUDE15.book Page 38 Friday, July 15, 2005 8:38 AM GISELE CASSANO FERREIRA, ET AL. 7. Fleck MPA, Louzada S. Aplicação da versão em português do instrumento abreviado de avaliação da qualidade de vida WHOQOL-bref. Rev Saúde Públ 2000;34(2):178-83. 8. Góes MCR. A abordagem microgenética na matriz histórico-cultural: uma perspectiva para o estudo da constituição da subjetividade. Caderno Cedes Abr 2002; ano XX:50. 9. Goffman E. Estigma: notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. 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