Revista Brasileira de FisiologiaVegetal, 11(3):161-168, 1999. FLUXO DE GÁS CARBÔNICO SOBRE AS CULTURAS DE DOIS HÍBRIDOS DE MILHO1 Orivaldo Brunini2,6, Eduardo Caruso Machado3,6, Eduardo Sawazaki4, Luis Torres de Miranda5 Centro de Ecofisiologia e Biofísica, Instituto Agronômico, C.P. 28, Campinas, SP, 13001970, Brasil RESUMO- Estimou-se o fluxo de gás carbônico para as culturas de dois híbridos de milho (Zea mays L.), Cargill 601 e IAC 8222, através da técnica micrometeorológica embasada na razão de Bowen e balanço de energia. Foram observados fluxos máximos de CO2 para o Cargill 601 de 4,5 e 2,5 mg.m-2.s-1, correspondentes aos períodos vegetativo e reprodutivo, respectivamente, e de 1,2 a 3,1 mg.m-2.s-1 para o IAC 8222. O fluxo de CO2 estava correlacionado com a radiação solar global incidente para o híbrido Cargill 601. Esta relação não foi tão evidente para o IAC 8222, indicando que outros fatores afetaram o padrão de resposta do fluxo de CO2, possivelmente devido à resposta diferencial dos estômatos deste híbrido, em particular ao déficit de pressão de vapor nos horários mais quentes do dia. Termos adicionais para indexação: fluxo de CO2, fotossíntese, razão de Bowen,Zea mays. CO2 FLUX MEASUREMENTS ABOVE TWO HYBRID CORN CANOPIES ABSTRACT - By means of the energy balance the Bowen ratio and CO2 flux uptake towards the crop was determined for corn (Zea mays L.) hybrids IAC 8222 and Cargill 601. Maximum CO2 flux for Cargill 601 was 4.5 and 2.5 mg.m-2.s-1 at vegetative reproductive phase, respectively; for IAC-8222 these fluxes were respectively 1.2 and 3.1 mg.m-2.s-1. For Cargill 601, CO2 flux was correlated with the global solar radiation reaching the top of the canopy, whereas for IAC 8222, plant CO2 uptake in response to solar radiation was less correlated, probably due to stomata response to the high values of air vapor pressure deficit around noon. Additional index terms: Bowen ratio, CO2 flux, photosynthesis, Zea mays. 1 Recebido em 17/11/1998 e aceito em 04/11/1999. Com auxílio da FINEP e Fundação Cargill. 2 Pesquisador Científico (PqC), PhD, Centro de Ecofisiologia e Biofísica (CEB), Instituto Agronômico de Campinas (IAC) – email: [email protected]. 3 PqC, Dr., CEB-IAC. 4 PqC, Dr., Centro de Graníferas – IAC. 5 PqC, Dr., Centro de Graníferas – IAC (in memorian). 6 Com Bolsa de Produtividade em Pesquisa, CNPq. 161 Brunini et al. 162 INTRODUÇÃO A caracterização micrometeorológica de uma comunidade vegetal envolve todos os processos de troca de energia e de massa, sendo fundamental a estimativa do fluxo de gás carbônico (CO2), visto ser este o principal substrato para síntese dos fotoassimilados utilizados no crescimento vegetal. Os fluxos de calor sensível, calor latente e de energia fotoquímica em uma comunidade vegetal podem ser determinados por medidas diretas e contínuas ou por técnicas de análise dos perfis de umidade, de temperatura do ar e de concentração de CO2. A técnica de perfil embasada na razão de Bowen (Bowen, 1926) e balanço de energia determina a equipartição do saldo de radiação solar sobre a cultura e o seu desdobramento nos processos de evapotranspiração (calor latente), aquecimento do ar (calor sensível) e o fluxo de calor no solo. Esta técnica tem sido utilizado para estimativas da evapotranspiração ou calor latente (Tanner, 1960; Villa Nova et al., 1975; McGinn & King, 1990), do consumo hídrico e para o fluxo de CO2 em comunidades vegetais (Baldoccchi et al., 1981; Ohtaki & Matsui, 1982; Anderson & Verma, 1986; Price & Black, 1989), inclusive em culturas de milho (McGinn & King, 1990; Steduto & Hsiao, 1998). Técnicas de medidas diretas do fluxo de CO2 para milho já foram utilizadas (Desjardin et al ., 1984; Baldocchi, 1994). Estimativas do fluxo de CO2 em culturas anuais demonstram que ele varia com o tipo de metabolismo fotossintético (C3 ou C4), com as condições atmosféricas e com a disponibilidade de água no solo. Wall & Kanemasu (1990) observaram que a taxa de assimilação de CO2 para a cultura de trigo variou entre 0,5 e 1,0 mg.m-2.s-1, sendo influenciada pelo índice de área foliar, geometria da vegetação e orientação das linhas de semeadura. Dunin et al. (1989) observaram que em trigo irrigado o decréscimo na taxa de absorção de CO2 estaria associado à diminuição da água disponível no solo e à senescência das folhas. Resultados semelhantes foram obtidos também por Whitfield (1990), onde, sob condições hídricas adequadas no solo a taxa de absorção de CO2 para a cultura de trigo foi 2,1 mg m -2 s-1 enquanto sob estresse hídrico esta taxa foi reduzida para 0,7mg.m-2.s-1. A via de entrada do CO2 nos vegetais é através dos estômatos, sendo a absorção proporcional, dentro de limites, à abertura estomática (Machado & Lagôa, 1995). É importante, portanto, caracterizar-se o efeito interativo dos fatores ambientais e da planta sobre a sensibilidade dos estômatos. Miranda et al. (1987) relataram que o fator latência confere ao milho resistência ambiental, que é a capacidade dos indivíduos de sobreviver a ambientes desfavoráveis em umidade e calor. Brunini et al., (1981), verificaram que os estômatos de cultivares de milho com o fator latência em seu genoma apresentaram maior sensibilidade em resposta às variações do ambiente. Por outro lado não há informações consistentes sobre a fotossíntese em milho com o fator latência. O objetivo deste trabalho foi estimar o fluxo de CO2 através da técnica do balanço de energia com o uso da razão de Bowen para dois híbridos de milho: um de ciclo precoce e porte baixo, o Cargill-601 e outro, de ciclo tardio e porte elevado IAC – 8222, que apresenta o fator latência incorporado ao seu genoma. MATERIAL E MÉTODOS Cultura e local Foram utilizados dois híbridos duplos de milho: o Cargill 601, precoce, de porte baixo e florescimento masculino ao redor dos 40 dias após a emergência (DAE), e o híbrido IAC 8222, tardio, de porte alto e florescimento ao redor dos 60 DAE. O estudo foi conduzido no Núcleo Experimental de Campinas, do Instituto Agronômico, situado a 22o53’S, 47o04’W a uma altitude de 660 m, em um latossolo roxo eutrófico. Os híbridos foram semeados no espaçamento de 0,90 metros entre linhas com 5 plantas por metro linear. A adubação de plantio foi 110 kg/ha da fórmula 10-20-20 e a adubação de cobertura 110 kg/ha com sulfato de amonia, 40 dias após a emergência. As semeaduras mecânicas foram feitas em 8 de fevereiro de 1985 e em 18 de dezembro de 1985 compreendendo as duas épocas de estudo, respectivamente. A área total do experimento foi de aproximadamente 1,5 ha para cada híbrido. A área vizinha ao experimento também foi cultivada com milho de modo que havia bordadura adequada para as medições micrometeorológicas. Medidas micrometeorológicas No centro de cada parcela (aproximadamente 100 x 150 metros) foram instalados os equipamentos para as medidas micrometeorológicas. O saldo de radiação solar (Rn ) foi monitorado com um radiômetro líquido (Middleton & Co., Austrália), instalado um metro acima da cultura, cujo sinal era registrado em um registrador potenciométrico (Modelo ECB - Brasil). Os gradientes de temperaturas do ar seco (T) e úmido (Tu), acima da cultura foram medidos com um conjunto psicométrico de termopares de cobre-constantan, instalados em microabrigos de PVC com diâmetro interno 10 cm, revestidos internamente com isopor pintado de preto e externamente com uma camada de isopor envolta com laminado de alumínio para refletir a radiação incidente. O zero de referência para os termopares era obtido através de gelo fundente, sendo ajustado a cada hora para 0 0C. Em decorrência deste ajuste, o desvio máximo nos valores de temperatura foi 0,1 oC. Contudo como se trabalhou com valores diferenciais de temperatura este erro foi desprezível. Os termopares com os respectivos microabrigos e o radiômetro líquido foram montados em um mastro telescópico, sendo a altura ajustada durante o crescimento da cultura. Os termopares para medidas das temperaturas de bulbo seco e úmido foram instalados em duas alturas acima do topo da cultura, respectivamente, 0,30 m e 0,60 m. Os sinais gerados pelos termopares eram R. Bras. Fisiol. Veg., 11(3):161-168, 1999. Fluxo de gás carbônico sobre as culturas de dois híbridos de milho. transferidos através de cabo telefônico até um multiplexador eletrônico e deste para um registrador potenciométrico (Modelo ECB - Brasil). Os termopares foram calibrados na faixa 0 a 45 oC quando já conectados aos cabos telefônicos. O fluxo de calor no solo foi medido com duas placas medidoras do fluxo de calor no (Middleton & Co. – Australia) montadas em série e instaladas a 0,03 m de profundidade. Os sinais gerados por estas placas eram registrados em um registrador potenciométrico (Modelo ECB - Brasil). A radiação global incidente sobre a cultura foi registrada continuadamente com um radiômetro de cúpula de vidro (modelo Kipp & Zonen – Holanda), acoplado a um registrador potenciométrico apropriado ao próprio equipamento (Kipp & Zonen). As medidas da concentração de CO2 no ar foram feitas por um analisador de gás por radiação infravermelha não dispersivo (Beckman 865 – Estados Unidos), em amostras colhidas nos mesmos níveis adotados para as medidas do gradiente de temperatura. As amostras de ar foram colhidas por sucção por meio de bombas peristálticas e conduzidas por mangueiras de nylon (0,005 m de diâmetro) até o analisador de CO2, distante 50 m. As amostras foram coletadas a intervalos de 10 minutos nos dois níveis em sequência alternadamente, através de válvulas solenóides acopladas com temporizadores. A amostra de ar antes de ser medida pelo analisador de CO2 era desidratada pela passagem através de uma coluna de PVC cheio com CaCl2. O sinal do analisador infravermelho era registrado num potenciômetro linear (Instruments Corp-USA) previamente ajustado, de modo que cada mV correspondia a 5 vpm de CO2. As variáveis analisadas representam uma média de 30 minutos de medidas, sendo feitas no mínimo 5 leituras de cada variável por intervalo de amostragem. Em intervalos de 15 dias foram colhidas folhas das plantas contidas em um metro linear, e a área foliar de cada folha foi estimado pela relação: AF = C.L.0,75 LE = ρKv.cp.γ-1 ∆e.∆z -1 (4) H = ρcp KH. ∆T.∆z (5) –1 FCO2 = ρ KCO2. .∆C.∆z -1, (6) sendo ρ a densidade do ar (kg.m ), e a tensão de vapor (kPa), cp o calor específico a pressão constante (J kg o -1 C ), γ a constante psicrométrica (kPa.oC-1) Kv, KH, KCO2, os coeficientes de difusividade para vapor, calor sensível e gás carbônico, os quais sob condições de neutralidade ou convecção forçada tornam-se similares, ∆e, ∆T e ∆C são os gradientes de pressão de vapor, temperatura do ar (oC) e gás carbônico (vpm), respectivamente. Valores de déficit de pressão de vapor medido às 7:00 e as 14:00 horas nos dias de medida do fluxo de CO2 estão na Tabela 1. Nos termos da equação 3, somente Rn e G são medidos diretamente enquanto LE e H são estimados pelas respectivas equações de fluxo (eqs. 4 e 5). Para contornar esta solução, Bowen (1926) propôs uma maneira analítica para solução da equação 4, introduzindo a razão dos fluxos de calor sensível (H) e calor latente (LE), (Villa Nova et al., 1975, Alfonsi et al., 1986), de modo que: -3 β = H /(LE) (7) Em termos dos gradientes de temperatura do ar (seco e úmido) β pode ser expresso como: onde, S é a tangente à curva de saturação de vapor so- TABELA 1- Déficit de pressão de vapor da água nos dias em que foram estimados os fluxos de CO2 nos híbridos de milho IAC-8222 e Cargill 601. Dia de medida (2) onde S é a área de terreno ocupada pelas plantas colhidas. Método Sob condições naturais, de uma superfície vegetada, desprezando-se os fluxos horizontais de calor sensível para o sistema (advecção) assim como armazenamento, o balanço de energia é descrito como (Thom, 1975, Villa Nova et al., 1975): Rn + G + LE + H = 0 (W.m-2), G, o fluxo de calor no solo (W.m-2); H, o fluxo convectivo de calor sensível (W.m-2) e LE , o fluxo convectivo de calor latente (W.m-2). Os fluxos médios de energia sensível (H) vapor d’água (LE), e de gás carbônico (FCO2) foram calculados pelas equações abaixo (Denmead & Mcllroy, 1971; Rosenberg, 1974; Thom, 1975): (1) onde: C indica comprimento da folha, L a largura máxima da folha (mm) e 0,75 um fator de correção. A área foliar total (AFt) foi estimada pela soma da área de cada folha individual (AF) e o índice de área foliar (IAF) em m2 .m-2 estimado pela seguinte relação: IAF = AFt . (S)-1 163 (3) onde Rn é a radiação líquida disponível à superfície 20/04/85 24/04/85 25/04/85 02/05/85 03/05/85 06/05/85 07/05/85 08/05/85 03/02/86 04/02/86 Déficit de pressão de vapor (es - e) kPa 7:00 h 14:00 h 3,39 14,96 3,04 16,99 2,67 12,98 2,33 7,43 1,96 13,24 2,04 20,26 0,89 15,89 1,52 19,01 0,69 3,28 4,28 15,49 R. Bras. Fisiol. Veg., 11(3):161-168, 1999. Híbrido Cargill 601 Cargill 601 Cargill 601 IAC 8222 IAC 8222 IAC 8222 IAC 8222 IAC 8222 Cargill 601 IAC 8222 164 Brunini et al. bre a água na temperatura umida média entre os níveis de medida; ∆Tu e ∆T a diferença em temperatura de bulbo úmido e bulbo seco respectivamente entre os níveis de medida. Desta maneira, com as variáveis medidas, estimouse β (eq. 6) e os termos do balanço energético (eq. 3) ficam expressos como: LE = -(Rn + G) (1 + β)-1 (9) Através da técnica do balanço de energia e da razão de Bowen (β) estimou-se o fluxo de calor sensível (H). Pela divisão da equação 6 pela 5, o fluxo de CO2 para a cultura pode ser estimado (Denmead & McIlroy, 1971), de modo que: FCO2 = 1,5.10-9 H.∆C (∆T)-1 (10) onde o fluxo de CO2 é expresso em g.cm-2.s-1 e H em mW cm-2, e os fluxos apresentados por unidade de área do terreno, e os demais fatores já definidos. No caso dos resultados a serem descritos posteriormente o FCO2 é apresentado em mg.m-2.s-1, de modo que a equação 10 torna-se: FCO2 = 1,5.10-2 H.∆C (∆T)-1 (10a) com os parâmetros já definidos. A resistência estomática foi medida na folha mais expandida no topo da cultura, através de um porômetro de equilíbrio dinâmico (LI-1600, LICOR-Ltda., Lincoln, NE). Em cada amostragem eram avaliadas 10 plantas de cada híbrido, em intervalos de 1 hora, entre as 7:00 e 18:00 horas. As medidas conjuntas de resistência estomática e estimativa do fluxo de CO2 foram feitas aos 32 DAE para o Cargill 601 e 80 DAE para o IAC8222. O déficit de pressão de vapor foi estimado através da medida de termômetros mercúrio de bulbo úmido e seco em abrigo meteorológico distante 200 metros do local do experimento. As medições do fluxo de CO2 foram realizadas durante 4 dias para o IAC-8222 e 3 dias para o Cargill-601. RESULTADOS E DISCUSSÃO Os balanços de energia para os dois híbridos são apresentados na Figura 1. Os termos do balanço de energia na fase vegetativa (Figura 1A e 1B), foram obtidos aos 44 (florescimento) e 43 DAE (fase vegetativa) para o FIGURA 1 - Balanço de energia em dois híbridos de milho, IAC-8222 e Cargill-601, em diferentes estádios fenológicos. A e C mostram a equipartição dos termos do balanço de energia para o híbrido IAC-8222 e B e D para o híbrido Cargill-601 (DAE – dias após a emergência, Rn – saldo de radiação sobre a cultura, LE – fluxo de calor latente, H – fluxo de calor sensível, G – fluxo de calor no solo). R. Bras. Fisiol. Veg., 11(3):161-168, 1999. Fluxo de gás carbônico sobre as culturas de dois híbridos de milho. Cargil 601 e IAC 8222, respectivamente; e nas fases reprodutiva e final da formação de espiga aos 70 e 81 DAE para o Cargill 601 e IAC 8222, respectivamente (Figuras 1C e 1D). Embora haja diferença de porte e de ciclo, entre os híbridos estudados não foram evidenciadas relações destes fatores com o padrão da distribuição diária dos componentes do balanço de energia. Os fluxos horários de gás carbônico para o interior da vegetação e a radiação global incidente são apresentados nas figuras 2 (A, B e C) e 3 (A, B, C e D) para os híbridos Cargill 601 e IAC 8222, respectivamente. O fluxo de CO2 para o Cargill 601 foi estreitamente relacionado com o fluxo de radiação global (Figura 2). Esta 165 dependência ficou mais evidente quando representouse diretamente o fluxo de CO2 em função do aumento da radiação global (Figura 2 D, E e F). Respostas deste tipo entre fluxo de CO2 e radiação são descritas na literatura, especialmente para plantas do tipo C4, como é o caso do milho, em que a fotossíntese não é saturada, mesmo em valores máximos de radiação solar, quando as outras condições de ambiente são adequadas (Baldocchi, 1994). Porém, a fotossíntese, medida em folhas individuais, em geral, é descrita por uma curva do tipo hipérbole retangular (Machado & Lagôa, 1995), tendendo a uma assíntota. No entanto, para o IAC 8222, a variação horária de FCO2 foi menos relacionada ao fluxo FIGURA 2 - Fluxo de gás carbônico (FCO2) e radiação solar global incidente (Rg) sobre a cultura de híbrido de milho Cargill 601 em função da hora local (A, B e C) e FCO2 em função da radiação global (D, E e F), em diferentes estádios fenológicos. R. Bras. Fisiol. Veg., 11(3):161-168, 1999. 166 Brunini et al. de radiação global (Figura 3 C, D), quando comparado ao Cargill-601. Baldocchi (1994) observou em milho e em trigo que entre 88 e 90% da variação de FCO2.era devido à variação na radiação solar. No caso presente, quando uniu-se todos dados de cada cultivar observouse que a correlação entre fluxo de CO2 e radiação para o milho Cargill 601 apresentou r2=0,80 (FCO2= 0,1386.exp (0,00378*R)) enquanto que para o IAC 8222 r2=0,59 (FCO2=0,1986 exp(0,0027*R)), onde R é a radiação glo- bal incidente. A baixa correlação observada para o IAC 8222 indica que a variação de outros fatores ambientais ou fatores relacionados com a planta, afetaram mais a fotossíntese do IAC 8222 que a do Cargill-601. O fato do fluxo máximo de CO2 nem sempre ocorrer no mesmo horário de intensidade máxima de radiação solar pode estar relacionado com o efeito do aumento do déficit de pressão de vapor sobre o aumento da resistência estomática, ou ainda ao acúmulo de amido nas folhas FIGURA 3 – Fluxo de gás carbônico (FCO2) e radiação solar global incidente (Rg) sobre a cultura de híbrido de milho IAC-8222 em função da hora local (A, B, C e D) e FCO2 em função da radiação global (E, F, G e H), em diferentes estádios fenológicos. R. Bras. Fisiol. Veg., 11(3):161-168, 1999. Fluxo de gás carbônico sobre as culturas de dois híbridos de milho. 167 FIGURA 4 – Relação entre o fluxo de CO2 e a resistência estomática em dois híbridos de milho, IAC-8222 e Cargill 601. diminuindo a relação fonte/dreno perto das 12 horas (Anderson et al, 1984, Herkethi & Baker, 1967; Machado et al., 1994; Medina et al., 1998). Como a absorção de CO 2 está diretamente relacionada à abertura dos estômatos, as oscilações deste podem explicar as alterações no fluxo deste gás. Brunini et al . (1981) observaram que o IAC 8222 possuía maior sensibilidade estomática devida, possivelmente, ao fator latente, presente neste híbrido (Miranda et al., 1987). Nos cultivares de milho que possuem o fator de latência, foi observado que o padrão de abertura e fechamento dos estômatos também era mais sensível à variação da demanda evaporativa da atmosfera (Brunini, 1984; Brunini et al., 1981; 1985). No entanto, no caso presente para o híbrido IAC-8222, não houve uma condição que evidenciasse se a demanda atmosférica ou outra condição climática ou outro fator específico tenha afetado o padrão de resposta da fotossíntese em relação à radiação solar. Por outro lado, uma certa flutuação durante o dia de FCO2 em milho é esperado devido aos vortices intermitentes (“eddies fluxes”) originados na superfície do solo, que é uma característica da rugosidade de dossel aberto (McGinn & King, 1990), mas isto não deve afetar de forma diferente para os dois híbridos. A idade da cultura e o ciclo do milho afetaram o fluxo de CO2 para o interior da cultura. Quando o Cargill-601 apresentava taxa máxima de crescimento (DAE = 32) com índice de área foliar (IAF) 2,7 e massa seca de 140 g.m-2, o fluxo máximo de CO2 atingiu valores ao redor de 4,5 mg.m-2s-1, (Figura 2A) enquanto que, aos 67 e 68 DAE, com IAF ao redor de 3,0 o fluxo máximo de CO2 foi 2,5 mg.m -2.s -1 (Figuras 2B e 2C). No Cargill 601 o florescimento e início da formação de espiga ocorreu entre 40 e 45 DAE e a senescência iniciou-se ao redor dos 70 DAE. No híbrido IAC-8222 o florescimento e início de formação das espigas ocorreram aos 60 e 70 DAE. Aos 76 e 81 DAE os valores de fluxo máximo de CO2 variaram entre 2,8 e 3,1 mg.m-2.s-1, com IAF variando entre 4,0 e 4,8 e massa seca entre 1160 e 1220 g.m-2 (Figuras 3 A, B, C e D). Em ambos híbridos, a relação entre resistência estomática e fluxo de CO2 apresentou um padrão de resposta semelhante (Figura 4). Deve-se ressaltar que o movimento vertical dos gases em uma comunidade vegetal, e em particular do CO 2, está diretamente influenciado pelas características micrometeorológicas do sistema planta-atmosfera e da própria resistência da cobertura vegetal ao transporte de CO2, sendo que a resistência estomática é um dos fatores que a afetam. Na Figura 4 a curvilinearidade observada na relação entre a resistência estomática e o fluxo de CO2, indica que a difusão de CO2 em direção ao cloroplasto é sensível ao estresse hídrico (Whitfield, 1990). Visto que o Cargill 601 apresentou maior fluxo de CO2 por unidade de terreno e também de área foliar que o IAC-8222 e que a relação entre resistência estomática e FCO2 são semelhantes para ambos híbridos, é possível que tais diferenças estejam relacionadas às respostas dos estômatos aos fatores ambientais. R. Bras. Fisiol. Veg., 11(3):161-168, 1999. Brunini et al. 168 REFERÊNCIAS ALFONSI, R.R.; SANTOS FILHO, B.G.; PEDRO JR., M.J.; BRUNINI, O. & CAMARGO, M.B.P. Balanço de energia em milho. Pesquisa Agropecuária Brasileira, 21(2):1233-1235, 1986. ANDERSON, D.E. & VERMA, S.B. Carbon dioxide, water vapor and sensible heat exchanges of a grain sorghum canopy, Boundary Layer Meteorology, 34:317-331, 1986. ANDERSON, D.E.; VERMA, S.B. & ROSENBERG, N.J. Eddy correlation measurements of CO2 . Latent heat and sensible heat fluxes over a crop surface. Boundary Layer Meteorology, 29:263272, 1986. BALDOCCHI, D. 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