A AÇÃO PEDAGÓGICA DO PROFESSOR E A APRENDIZAGEM DO
ALUNO: UM TRABALHO COOPERATIVO
Joana D´arc de Sousa Dantas
Professora do Departamento de Educação
Doutora em Educação
Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN
Djanira Brasilino de Souza
Doutora em Ciências da Educação
O presente estudo teve como foco de interesse desenvolver uma pedagogia de ação –
Pedagogia Freinet, na qual tomou-se como centro de interesse a “Cooperação”, princípio este que
propicia ao aluno, meios tais como: a discussão conjunta das atividades realizadas, a troca de
experiências, a ajuda mútua, a solidariedade entre outros, para que ele numa ação democrática
conjunta com os demais colegas, seja o construtor de sua própria formação.
Assim sendo, o próprio título deste trabalho tenta explicar a importância dessa dinâmica de
ação que pode contribuir mais efetivamente no processo de ensino-aprendizagem, por ter como
centro de suas preocupações o aluno como “agente” do seu próprio saber.
O motivo de se perseguir essa linha de trabalho foi poder trazer subsídios à formação e
aperfeiçoamento do professor, através da orientação da sua ação em sala de aula.
Acreditamos que, numa pesquisa, onde se contempla a intervenção na sala de aula, momento
de maior interação professor-aluno, aluno- aluno, interagindo-se nas suas trocas de experiências, o
que ocorre com a pedagogia Freinet, obtêm-se maiores subsídios para o repensar da prática
pedagógica.
É inegável, hoje se vive numa época em que o mundo está envolto numa grande
complexidade, devido as grandes e rápidas mudanças, tanto no campo científico quanto
tecnológico. E pode-se perguntar: Qual tem sido a posição da escola face a essas mudanças?
Percebemos que no bojo desses acontecimentos, a escola pela sua estrutura e funcionamento
continua à margem das conquistas e já se sente a forte pressão que é exercida sobre ela, não só pela
sociedade como um todo, mas pelos próprios alunos, em particular que não aceitam mais a atitude
de alguns professores que persistem em transmitir-lhes um conteúdo alienante às exigências de sua
formação para o mercado de trabalho.
Portanto, a escola brasileira como está estruturada – padronizada e impositora, no que
concerne aos conhecimentos, dificilmente formará indivíduos capazes de participar do processo de
desenvolvimento da sociedade.
Torna-se necessário que a escola dê outra direção à educação, substituindo a sua forma
tradicional, centrada no professor, por outra, que favoreça a igualdade de oportunidades e a
equidade, e as diferenças individuais, abra espaço a todos, dando-lhe condições de participar do
processo social, um direito que assiste aos cidadãos, independente de raça, língua, credo e
nacionalidade.
Para tanto, precisa-se colocar o aluno como centro do processo de ensino-aprendizagem,
para que ele possa tomar parte ativa no processo de sua formação.
Este é o desafio com o qual se defronta a escola, a fim de poder cumprir a sua função de
mediadora da transformação social.
Para o enfrentamento do desafio, a escola deve ser repensada, desde a sua estrutura física,
seu projeto pedagógico à formação dos professores, tendo em conta a sua formação sócio-política.
Deve escolher uma linha pedagógica que possa oferecer as crianças os meios de ascensão à cultura
e ao saber. E isto se faz através de uma reflexão crítica que os conduz à adaptação das situações
novas que aparecem na vida cotidiana. Isto impõe uma educação que não venha pronta, mas que se
centre na vida ambiente, bem vigorosa capaz de educar as crianças para o exercício pleno da
cidadania.
Está evidente que a escola precisa de mudanças e essas mudanças devem se processar no seu
interior, ou seja, na sala de aula, espaço reservado a ação docente propriamente dita, onde há uma
interação direta professor-aluno, que numa ação conjunta possam buscar a construção do “saber”.
Por isso, acreditamos que, se o professor utiliza uma dinâmica de trabalho que envolva o
aluno como co-responsável do processo de ensino-aprendizagem, ele está investindo a “cota” que
lhe cabe na mudança desse quadro.
Essas e outras reflexões ajudaram no norteamento deste estudo; razão pela qual optamos por
desenvolver um trabalho ligado diretamente a ação do professor na sala de aula.
Como a nossa intenção nesse primeiro momento era investigar a ação das professoras e sua
interação com os alunos, tornou-se necessária à definição de instrumentos que se mostrassem
eficazes na coleta de informações sobre as situações de ensino-aprendizagem, no cotidiano da
professora e alunos no seu próprio contexto – a sala de aula.
Assim para desenvolver uma interação com os sujeitos da pesquisa (professoras e alunos),
procuramos inicialmente desenvolver o nosso estudo em torno da abordagem da pesquisa
qualitativa do tipo etnográfica por ser um referencial metodológico mais indicado ao uso das
técnicas de observação participante, entrevistas e análise de documentação, pois segundo ANDRÉ
(1995 p. 28), essas técnicas são tradicionalmente associadas à etnografia.
Porém, a evolução do desenvolvimento do trabalho, culminou num segundo momento um
processo interativo de intervenção (ação sistemática e controlada desenvolvida pela pesquisadora),
segmento característico da pesquisa ação.
Segundo THIOLLENT, a finalidade da pesquisa ação é favorecer aos pesquisadores e
grupos envolvidos, a aquisição de um conhecimento e de uma consciência crítica do processo de
transformação para que, através da troca de experiências, eles possam buscar a melhoria da
qualidade do ensino. Ela é, sem dúvida, um tipo de pesquisa social que mantém uma articulação do
conhecer e do agir, estabelecendo uma ação coletiva e participativa numa dinâmica de produção e
conhecimento coletivo. E ele afirma, 1985, p.14.
Com a pesquisa ação pretende-se alcançar realizações
efetivas transformações ou mudanças no campo social.
A pesquisa-ação é também vista como um instrumento de trabalho com grupos numa
situação real, onde os grupos participantes da situação buscam através da construção coletiva a
solução dos problemas.
A natureza da pesquisa-ação e os seus objetivos oportunizaram uma maior interação entre
pesquisadores e sujeitos envolvidos, que através de discussões e troca de experiências, foram
identificando os problemas a serem pesquisados e as soluções a serem encaminhadas, buscando
esclarecer ou mesmo resolver os problemas observados.
Assim para manter uma interação constante entre pesquisadores e grupo observado, foram
utilizados, como instrumentos mediadores dessa interação, as técnicas de observação participante,
entrevista e questionários.
Na observação ora realizada foram consideradas as anotações de campo feitas através de
registros escritos e gravados a fim de captar o maior número possível de informações capazes de
subsidiar este trabalho.
Os dados das observações eram discutidos entre pesquisadores e subsidiados por um suporte
teórico que fornecia contribuições significativas para um trabalho pedagógico ajustado às
necessidades e exigências dos alunos.
A pesquisa foi desenvolvida numa escola pública de Natal-RN - Brasil e contou com a
participação de três professoras em exercício no Ensino Fundamental e cento e dois alunos do
Ciclo de Sistematização – sujeitos da pesquisa.
Para desenvolver este trabalho, delimitamos como “objeto” de estudo” a Pedagogia Freinet,
destacando-se o princípio da cooperação como eixo condutor do processo de ensino-aprendizagem.
E para orientar as nossas ações estabelecemos como objetivo mais geral – “Implementar
novas formas de dinamização das atividades de ensino, através de uma experiência pedagógica
alternativa baseada no princípio da cooperação e fundamentada na Pedagogia Freinet”.
A pedagogia Freinet tem como finalidade modernizar a escola, ou seja, torná-la acessível a
todos que a ela tem direito e oferecer-lhe um ensino de boa qualidade.
No que diz respeito à construção do seu projeto pedagógico em educação, Freinet apoiou-se
em teóricos da educação que embora tivesse dito muito sobre a ação pedagógica do professor,
pouco transferiram para uma prática autêntica junto às crianças das classes populares.
Quando leu Rabelais e Montaigne, já encontrou no seu realismo que é uma doutrina, que
preconiza o processo de copiar a natureza tal qual ela é e no seu naturalismo uma ligação com a sua
proposta pedagógica, que é tomar a criança no seu estado natural e construir com ela a sua
formação, ou seja, ela deve participar ativamente do seu processo de educação e não buscar uma
criança ideal como querem muitos educadores-para poder educá-la.
FREINET (1978, p.10) lembra:
A vida é o que é devemos construir com ela e para ela.
Isto significa dizer, que o educador, deve tomar a criança tal qual ela é em sua natureza, com
suas virtudes e seus defeitos, com a sua ingenuidade e a sua experiência, e com ela construir o
processo de sua formação. Este é um dos pontos culminantes da Pedagogia Freinet, que se traduz
pelo respeito incondicional à criança.
Foi em Pestalozzi que Freinet encontrou maiores semelhanças, pois ele foi o criador da
escola popular que tem como finalidade à humanização do homem e também se dedicou as crianças
do meio proletário. Esses aspectos impulsionaram Freinet ao tempo que abriram novas perspectivas
na busca de caminhos para a concretização dos seus intentos.
Com Claparède tem em comum: a criança como centro do processo de ensinoaprendizagem, o respeito às aptidões individuais e um ensino baseado nas necessidades da criança,
bem como a exaltação de um trabalho prazeroso para a criança, em lugar de uma tarefa imposta,
passível de rejeição e insucesso.
Na mesma linha de pensamento de Claparède, FREINET (1978, p.96, 99 e 101), na busca de
uma filosofia para dar sustentação a sua proposta pedagógica diz.
...É no próprio indivíduo que iremos procurar os fundamentos
da nossa ação... A criança ainda menos que o adulto, não
poderia ser considerada um ser pensante e filosofante. A sua
função, a sua razão de ser, antes de mais nada é viver... A vida
é o que é; devemos construir com ela e para ela.
Vê-se, portanto, que a concepção filosófica de Freinet, está centrada no respeito ao indivíduo
e assim sendo, ele toma a criança como centro de todo o processo educativo, tal qual ela é: com a
sua simplicidade, ingenuidade e experiência e procura conjuntamente com ela, construir o seu
saber.
Entre essas contribuições, o respeito e a admiração de Freinet recai sobre Ferrière que
defende uma escola ativa, cujo centro de todo o processo é o aluno, considerado em sua totalidade,
ou seja, nos seus aspectos físicos, biológicos e psicológicos, para com ela fazer crescer as energias
úteis e construtivas do indivíduo, a fim de desenvolver uma personalidade autônoma e responsável.
Tomada pela busca da ênfase de Freinet, pode-se dizer que o livro “l´école active” de
Ferrière foi o norteador, o guia que não só despertou, mas impulsionou Freinet para a organização e
utilização de novas práticas pedagógicas, assim como para a leitura de outras obras e para a
participação em eventos que pudessem lhe dar uma contribuição valiosa, sobretudo que o ajudasse
na construção de um ensino voltado para a classe proletária.
Assim Freinet na sua simplicidade de professor primário de uma escola pública jamais
colocou a sua pedagogia como original, mas como resultante da contribuição de muitos educadores
renomados de sua época, os quais ele leu, ouviu e procurou de forma criativa por em prática os seus
ensinamentos.
Como idealizada, a pedagogia Freinet necessita de um apoio firme para que possa conduzir a
educação a que ela se propõe: “a formação do homem”, livre, autônomo, consciente e responsável,
para agir e interagir no seio da sociedade na qual está inserido. Para isso Freinet pensou numa base
de apoio que pudesse fortalecer o trabalho pedagógico e, conseqüentemente a educação.
FREINET, (1978, p. 116) diz:
A educação deve ser móvel e flexível na sua forma, deve
forçosamente adaptar-se as suas técnicas às necessidades
variáveis da atividade e da vida humana.
Para atender à sua preocupação que é a ”formação do homem”, a sua proposta pedagógica
se apóia em princípios que dão um direcionamento diferente às formas de condução das atividades
escolares: abre espaço a troca de experiências entre o professor e os alunos, através da socialização
dos trabalhos, que são realizados, seja individualmente, seja em grupo, estimula os alunos na busca
incessante de novos conhecimentos tornando as tarefas escolares mais atraentes e prazerosas.
A vivência desses princípios não se dá ao acaso, eles se apóiam numa dinâmica de ação
educativa que se vai construindo no cotidiano de sala de aula, através de técnicas e instrumentos de
trabalho.
Freinet utiliza as condições essenciais de funcionamento e procura introduzir inúmeras
inovações em sala de aula, utilizando para isso a cooperação, um dos princípios da sua pedagogia,
princípio esse, que serviu de apoio para as ações pedagógicas durante todo o processo de
intervenção no percurso da nossa pesquisa.
A experiência viabilizou-se em dois momentos distintos, porém interligados pela sua própria
dinâmica.
O primeiro momento constou de: observações, preparação, treinamentos e reuniões.
No segundo momento desenvolvemos atividades com professores e alunos.
A intervenção na sala de aula constou do desenvolvimento de técnicas interativas da
pedagogia Freinet, com uma maior ênfase no princípio da cooperação como eixo norteador de
todas as atividades, Daí a reunião cooperativa ter tido maior destaque entre as técnicas utilizadas.
Essa técnica tem como finalidade possibilitar uma convivência grupal mais harmoniosa e favorecer
o crescimento de cada um, tornando um grupo coeso, capaz de agir e interagir, quando necessário,
com respeito, responsabilidade e autonomia. Concomitante à formação de hábitos e atitudes, ia-se
introduzindo os conteúdos essenciais às aprendizagens, dinamizando-os através de técnicas de
trabalho que pudessem envolver o aluno no processo de sua formação, a fim de que, os princípios
básicos que norteiam a Pedagogia Freinet, fossem trabalhados integralmente garantindo assim, a
formação do homem para o exercício pleno e consciente de sua cidadania.
O trabalho assim desenvolvido permitiu uma maior interação entre as crianças e entre estas e
a professora, reduzindo as situações de egoísmo, competição e conflito.
Esta experiência constituiu um desafio para os pesquisadores. Este desafio situa-se em
primeiro lugar ao nível das condições de funcionamento da escola como um todo, que como as
demais instituições de ensino público, não foge à regra – salas pequenas, desprovidas de recursos
didáticos necessários ao desenvolvimento de uma dinâmica mais interativa.
O que nos animava a prosseguir na experiência era o fato de que, mesmo face aos
contratempos existentes, vislumbrávamos pontos positivos, tanto em relação às atitudes das
professoras quanto às dos alunos.
Em relação às professoras, já demonstravam preocupação em se informar melhor sobre a
pedagogia alternativa a ser utilizada, bem como uma certa crença nos seus princípios e propósitos,
aliando-se a uma vontade de fazer e de acertar.
Quanto aos alunos, algumas mudanças foram se concretizando em relação ao interesse, a
participação, organização, realização e socialização dos trabalhos.
No que concerne aos conteúdos passaram a ter mais consistência e profundidade.
Os resultados obtidos mostraram o valor e a eficácia de um trabalho pedagógico
desenvolvido e orientado no seio de uma pedagogia interativa, no caso – a Pedagogia Freinet
Considerando, portanto válido o resultado da pesquisa por ter mostrado que a aplicação de
uma pedagogia interativa, na qual os alunos participam ativamente do processo de ensinoaprendizagem exerceria influência na aprendizagem, como mostra quantitativamente os resultados
obtidos e qualitativamente na sua formação, cujos comportamentos em relação ao interesse,
participação, cooperação..., foram vislumbrados no decorrer da pesquisa, através da adesão dos
alunos ao processo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANDRÉ, Marli Eliza, D. A de. Etnografia da prática escolar. São Paulo: Papiros, 1995
BARBIER, René. A pesquisa ação na Instituição Escolar, Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1985
BOGDAN, Robert C; BIKLEN, K. Investigação qualitativa em educação: uma introdução à teoria
dos métodos. Porto: Editora Porto. Tradução Maria João Álvares et al, 1994.
BRANDÃO, C. R. Pesquisa participante, 2ª ed. São Paulo: Editora Brasiliense, 1982.
DANTAS, Joana D´arc de Sousa. A ação pedagógica do professor e a aprendizagem do aluno: um
trabalho cooperativo. Natal, 2.001, Tese ( Doutorado em Educação) – Departamento de
Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 2001.
FREINET, C. L´éducation du travail. Paris: Delachaux et Niestlé, 1978.
________. Pedagogía do Bom Senso. São Paulo: Martins Fontes, 1996. Tradução de João Batista.
________. As técnicas Freinet da escola moderna. Tradução de Silia Letra, 4ª ed., Lisboa: Editorial
Estampa, 1975
SOUZA, D.B. L´individualisation de l´enseignement (rapport à la pédagogie Freinet). Paris 1982.
Tese (Doutorado em Ciências da Educação) Université de Paris VIII, 1982
THIOLLENT, Michel. Metodologia da pesquisa-ação. São Paulo: Cortez, 1985.
VASQUEZ Aída; Oury, F. De la classe cooperative à la pédagogie institutionnelle, Paris: François
Maspero, 1974, V. I - II
Download

A AÇÃO PEDAGÓGICA DO PROFESSOR E A