COLÉGIO JOHN WESLEY SOLIDÁRIO – Um ato de bondade de cada vez! Rua Mariana, 88, Centro – MG 3822-1330 colegiojohnwesley.com.br Pais que postam muito sobre filhos violam sua privacidade. ANA CLARA OTONI / Jornal O Globo “Qual é a graça de ir à casa da vovó no domingo e não ter nada novo para contar? Todo mundo já sabe que eu fui ao cinema, o que vi na mostra do CCBB e até o que fiz na escola porque você já postou tudo no Facebook, mãe!” Foi a partir desse puxão de orelha do filho Lucas, de 7 anos, que Anamaria Mendes passou a repensar o modo como compartilha informações na internet. De uma gracinha dita em casa às dúvidas da maternidade, ela postava tudo no blog “Universo Materno” e nas redes sociais. Anamaria não está sozinha. Mais da metade das mães e um terço dos pais ouvidos na pesquisa “Parents on social media: Likes and dislikes of sharenting” (“Pais em mídias sociais: prós e contras do compartilhamento paterno”, em tradução livre), da Universidade de Michigan, discutem nas redes sociais sobre a educação dos filhos. Muitos são pais de primeira viagem, frutos da geração Y (que nasceu junto com a internet) e usam esses canais para saberem que não estão sozinhos na empreitada de educar uma criança. Há, contudo, um risco no modo como as pessoas estão compartilhando essas experiências. É o chamado oversharenting, a exposição parental exagerada, alerta a pediatra Sarah J. Clark, pesquisadora associada da Universidade de Michigan. — Se você compartilha uma foto ou vídeo do seu filho pequeno fazendo algo ridículo, por achar engraçadinho, quando a criança tiver seus 11, 12 anos, pode se sentir constrangida. A autoconsciência vem com a idade. O que determina o cyberbullying é o modo de usar o material compartilhado — diz. A pesquisa conduzida por Sarah ainda traz outro aspecto curioso: três quartos dos pais ouvidos reconhecem o compartilhamento exagerado de outros pais nas redes. E se preocupam quanto à exposição da privacidade e localização da criança (68%), bem como de sua imagem (67%). — Às vezes pensamos que nossos filhos são tão especiais que não percebemos que estamos compartilhando demais. É fácil apontar o oversharenting nos outros e não se auto avaliar — justifica a pesquisadora. A superexposição traz preocupações também quanto à segurança. No ano passado, por exemplo, um criminoso em Santa Catarina admitiu à Polícia Civil que planejou o sequestro de um menino de 9 anos a partir de informações que os pais mostravam no Facebook. O psicólogo Lucas Parisi, especializado em atendimento de famílias e crianças, cyberbullying e problemas advindos do uso abusivo da internet, observa que a formação das identidades digitais das crianças começa quando elas têm ainda poucos meses de vida: — A exibição da privacidade dos filhos começa a assumir uma característica de linha do tempo, e eles não participaram da aprovação ou recusa quanto à veiculação desses conteúdos. Assim, quando a criança cresce, sua privacidade pode já estar violada — diz o psicólogo. Foi o que aconteceu com Anamaria. Ela criou seu blog em 2007, quando ficou grávida de seu primeiro filho. No espaço, compartilhou o progresso da barriga com vídeos no YouTube, o nascimento e a rotina com o filho. COLÉGIO JOHN WESLEY SOLIDÁRIO – Um ato de bondade de cada vez! Rua Mariana, 88, Centro – MG 3822-1330 colegiojohnwesley.com.br — Minha ideia era apenas a troca de experiência com outras mães. Uma vez, uma mãe brasileira que morava na Europa reconheceu a mim e o Lucas na igreja. Ela disse que o que eu compartilhava tinha ajudado muito, já que estava sozinha em outro país. Esse reconhecimento, aos poucos, foi incomodando o Lucas. Quando íamos tirar fotos, ele perguntava se eu ia postar, pedia para avaliar ou se esquivava. Por isso, há dois anos, Anamaria mudou de postura e tem respeitado a vontade do filho. — No mês passado, os dentinhos dele caíram e ele pediu para ninguém comentar na internet. Queria chegar na casa da avó no domingo e mostrar a novidade. O DIREITO DOS PAIS SOBRE A IMAGEM E INFORMAÇÕES DAS CRIANÇAS Do ponto de vista legal, segundo Bernardo Garcia, presidente da Comissão de Direito da Família (OAB-RJ), os pais têm o direito total sobre a imagem e informações sobre a criança. — É claro que se espera que os pais administrem essa responsabilidade sempre protegendo o direito, a integridade e o bem-estar da criança. Mas o que define esse critério é algo completamente subjetivo de cada pai. Segundo Garcia, qualquer cidadão que perceber uma publicação que possa oferecer danos à imagem ou à moral da criança pode denunciar os responsáveis ao Conselho Tutelar ou ao Ministério Público. Inclusive, adolescentes a partir dos 16 anos podem fazer denúncias contra os próprios pais no Conselho Tutelar. — Segue-se o mesmo princípio de uma agressão física. Se você vir uma criança apanhando na rua, mesmo que seja dos pais, você pode denunciar à polícia ou chamar o Conselho Tutelar. Talvez na internet isso não ocorra de modo frequente porque as pessoas não sabem o que fazer e nem mesmo como localizar as pessoas responsáveis pelo post o que esvazia a denúncia. De acordo com a lei, os pais podem ser punidos em uma escala que vai de advertência, multa e, dependendo da situação, até mesmo suspensão da convivência familiar. Nestes casos, a criança é entregue a uma família substituta, explica Garcia. Ele acrescenta ainda que, em casos de pais separados, o juiz pode, inclusive, suspender a convivência com o pai em questão.