IFMG Campus Formiga
Matemática Discreta
Notas de Aula 2: Métodos de Prova
Prof. Diego Mello
2o. Semestre 2012
Sumário
1 Introdução
2
2 Conceitos
2
3 Teoremas
4
4 Métodos de Prova
4.1 Prova Direta . . . . . . . .
4.2 Prova por Contraposição . .
4.3 Prova por Contradição . . .
4.4 Prova por Equivalência . . .
4.5 Prova por Contra-Exemplo
4.6 Prova por Divisão em Casos
4.7 Prova por Exaustão . . . .
4.8 Provas Existenciais . . . . .
4.9 Prova de Unicidade . . . . .
4.10 Outros Métodos de Prova .
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6
9
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17
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21
23
23
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26
5 Resumo: Técnicas de Prova
27
6 Exercícios de Fixação
29
1
1
Introdução
Este documento contém as notas de aula sobre o tema ‘Métodos de Prova’ da disciplina de Matemática Discreta do curso de Ciência da Computação do Insituto Federal de Minas Gerais - Campus
Formiga. Ela é baseada no conteúdo dos livros referenciados neste documento.
Este documento serve apenas como referência para acompanhamento das aulas, e não substitui a
necessidade de leitura e estudo da bibliografia oficial do curso. Muitos dos exemplos, tabelas e
diagramas contidos no documento foram extraídos e/ou adaptados dos livros contidos na seção de
referências bibliográficas.
2
Conceitos
Uma prova é um argumento válido que estabelece a verdade de uma declaração matemática.
Uma prova pode utilizar (i) as hipóteses de um teorema, (ii) axiomas ou (iii) teoremas previamente
provados como ingredientes que, em conjunto com regras de inferência, estabelecem a verdade da
declaração que está sendo demonstrada.
Um teorema é uma sentença que pode ser demonstrada como verdadeira. Um teorema pode ser a
quantificação universal de uma declaração condicional com uma ou mais hipóteses, e uma conclusão. Uma definição alternativa diz que um teorema é uma afirmação específica que pode ser provada.
Alguns teoremas são mais importantes ou menos importantes que os outros; daí existem designações
alternativas que os matemáticos usam no lugar de teorema. Por exemplo, o teorema de Pitágoras
merece ser chamado de teorema em função de sua importância na geometria. A afirmação ‘o quadrado de um inteiro par é também um inteiro par ’ também é um teorema, mas talvez não mereça
uma designação deste nível. Outra afirmação, ‘3 + 9 = 12’ é também um teorema, mas não tem
tanto prestígio para usar essa designação.
Por isso, teoremas podem adotar outras nomenclaturas. Teoremas também podem ser chamados de
fatos, resultados, lemas, proposições, corolários e alegações. Descreveremos brevemente no decorrer
desta seção algumas situações em que as designações alternativas são empregadas.
Um resultado é uma declaração modesta, genérica para um teorema. Um fato é um teorema de
importância bastante limitada, tal como ‘6+3 = 9’. Uma proposição é um teorema de importância
secundária, mais importante que um fato porém com menos prestígio que um teorema.
Um teorema é demonstrado ser verdadeiro por meio de uma prova. Uma prova pode conter como
declarações os axiomas, as premissas do teorema (se houverem), e outros teoremas já demonstrados
anteriormente.
Um axioma ou postulado é uma sentença ou proposição que não é provada ou demonstrada, mas
é considerada óbvia e aceita como verdade na construção de deduções e inferências. Como exemplo,
2
a Tabela 1 apresenta uma série de axiomas úteis sobre os números reais; alguns também se aplicam
ao conjunto dos números inteiros.
Tabela 1: Tabela de Axiomas sobre os Números Reais
Axioma
Fecho Aditivo
Fecho multiplicativo
Associatividade Aditiva
Associatividade Multiplicativa
Comutatividade Aditiva
Comutatividade Multiplicativa
Identidade Aditiva
Identidade Multiplicativa
Elemento Identidade
Lei Inversa para Adição
Lei Inversa para Multiplicação
Lei Distributiva
Lei da Tricotomia
Lei da Transitividade
Lei da Compatibilidade Aditiva
Lei da Compatibilidade Multiplicativa
Declaração
Para todo número real x e y, x + y é um número real
Para todo número real x e y, x · y é um número real
Para todo número real x, y e z, (x + y) + z = x + (y + z)
Para todo número real x, y e z, (x · y) · z = x · (y · z)
Para todo número real x e y, x + y = y + x
Para todo número real x e y, x · y = y · x
Para todo número real x, x + 0 = 0 + x = x
Para todo número real x, x · 1 = 1 · x = x
A identidade aditiva 0 e a identidade multiplicativa 1 são
distintas, i.e., 0 6= 1
Para todo número real x, existe um número real −x (inverso
aditivo de x) tal que x + (−x) = (−x) + x = 0
Para todo número real x, existe um número real x−1 = x1
(inverso multiplicativo de x) tal que x · ( x1 ) = ( x1 ) · x = 1
Para todos os números reais x, y e z, x · (y + z) = x · y + x · z,
e (x + y) · z = x · z + y · z.
Para todos os números reais x e y, exatamente uma das
condições x = y, x < y ou x > y é verdadeira
Para todos os números reais x, y e z, se x > y e y > z, então
x>z
Para todos os números reais x, y e z, se x > y, x + z > y + z
Para todos os números reais x, y e z, se x > y e z > 0,
x·z >y·z
Uma definição é uma sequência de palavras que expressa o significado de uma expressão. Definições
são elementos essenciais na dedução sobre a verdade de um teorema. Para exemplificar, segue a
Definição 1, sobre o significado de um número ser primo no conjunto dos números inteiros.
Definição 1 (Primalidade). Um número primo é um número inteiro n > 1 tal que n não é
divisível por nenhum inteiro além de 1 e n.
Teoremas menos importantes que são úteis na prova de outros resultados são denominados de lemas. Provas mais complicadas tornam-se fáceis de compreender quando são provadas usando uma
série de lemas, onde cada lema é provado separadamente, decompondo o teorema em partes menores. Os lemas são as partes (instrumentos) usados para provar teoremas complexos.
Uma alegação é análoga ao lema. Alegações são afirmações que aparecem dentro da prova de um
teorema. A função de uma alegação é organizar os passos-chave da prova. A formulação de uma
3
alegação pode envolver termos que só fazem sentido no contexto da prova.
Um corolário é um teorema que pode ser estabelecido diretamente a partir de um teorema que foi
provado. O corolário é uma decorrência imediata de um teorema. É um resultado com uma prova
rápida.
Exemplo:
O Teorema de Pitágoras afirma que a2 = b2 + c2 , onde a é a diagonal do triângulo retângulo, e b
e c são os catetos opostos e√adjacentes do triângulo retângulo. A diagonal de um quadrado cujos
lados medem l unidades é l 2; tal declaração é um corolário do Teorema de Pitágoras.
◭
Uma conjectura é uma declaração em que propõem-se ser verdadeira, geralmente com base em
alguma evidência parcial, argumento heurístico ou intuição de um especialista. Quando a prova
de uma conjectura é encontrada, a declaração correspondente torna-se um teorema; obviamente, se
uma conjectura é provada ser falsa, ela não é um teorema. Enfim, uma conjectura é uma proposição
que ainda não foi provada nem refutada.
Exemplo:
Conjectura de Goldbach: ∀n, se n é par, ∃a, b tal que a e b são primos e a + b = n.
A conjectura de Goldbach é uma das mais antigas conjecturas de teoria dos números. Segundo
[Loureiro, A. A. F.], até novembro de 2010 ela foi verificada para números até 2 × 1018 por meio de
programas de computador. O último resultado publicado1 em Setembro de 2012 atingiu números
verificados até 3 × 1017 .
Embora tenha sido verificada para números até 3 × 1017 , não significa que a conjectura é verdadeira
para números entre 3 × 1017 e ∞.
◭
3
Teoremas
Resultados matemáticos são geralmente expressos como teoremas da forma ‘se p, então q’, ou p → q.
onde p e q podem representar sentenças compostas. Em teoremas expressos desta forma, tentamos
deduzir q de p a partir de axiomas, regras de inferência, definições e resultados já provados.
Se for possível usar na dedução apenas axiomas (i.e., sentença assumida verdadeira), então o teorema é verdadeiro. No entanto, muitas vezes desejamos demonstrar teoremas sobre um tema em
particular (ex: algoritmos de grafos, algebra booleana, teoria de compiladores, programação linear
ou outros temas). Neste casos, usamos como premissas fatos sobre o assunto em questão (como
definições e resultados previamente provados) em conjunto com axiomas e regras de inferência para
1
Ver novidades em http://www.ieeta.pt/~tos/goldbach.html
4
deduzir q de p a partir de uma sequência lógica de passos que começam em p e terminam em q.
Exemplo:
Provar o teorema: ‘se um inteiro é divisível por 6, então ele também é divisível por 3’.
Para efetuar a prova, devemos usar uma série de axiomas, fatos e definições para mostrar que a
hipótese ‘x é divisível por 6’ (p) leva à conclusão ‘x é divisível por 3’ (q).
Podemos partir da definição de divisibilidade: um inteiro a é divisível por um inteiro b se a for
igual ao produto de um inteiro k por b, ou seja, a = k · b. Apresentaremos os passos envolvidos na
demonstração do teorema.
Hipótese: x é divisível por 6
x = k · 6 para algum inteiro k (Definição de divisibilidade)
6 =2·3
(Fato numérico)
x = k(2 · 3)
(Substituição)
x = (k · 2)3
(Axioma da associabilidade multiplicativa)
(Fato: × é fechada sobre os inteiros)
x = (k · 2) 3
| {z }
inteiro
Conclusão: x é divisível por 3
Demonstramos através de uma sequência de axiomas, definições e fatos matemáticos que a hipótese
‘x é divisível por 6’ leva à conclusão ‘x é divisível por 3’, logo o teorema apresentado foi provado
ser verdadeiro. Este tipo de prova é denominada de prova direta, e será abordada mais adiante. ◭
A maioria das afirmações em matemática são universais; assim, um teorema pode conter um resultado sobre todos os objetos do domínio de interpretação. Neste caso, a expressão formal do teorema
começará com pelo menos um quantificador universal, na forma ∀x ∈ D(P (x) → Q(x) que pode ser
escrito informalmente como P (x) → Q(x).
Quando D é um conjunto finito, ou existe um número finito de valores x que satisfazem a propriedade P (x), uma possível forma de provar a afirmação consiste no uso do método de exaustão,
onde a afirmação é provada verdadeira desde que mostre ser verdadeira para cada um dos elementos
da coleção finita. Veja o exemplo a seguir:
Exemplo:
[Adaptado de [Loureiro, A. A. F.]] ∀n ∈ Z, se n é par e 4 ≤ n ≤ 30, então n pode ser escrito como
a soma de dois números primos.
Podemos mostrar a verdade desta declaração enumerando todos os números pares entre 4 e 30,
decompondo-os em uma soma de dois números primos. Listando-os, teremos
5
4 =2+2
12 = 5 + 7
20 = 7 + 13
28 = 11 + 17
6 = 3+3
8=3+5
10 = 5 + 5
14 = 3 + 11 16 = 5 + 11 18 = 7 + 11
22 = 5 + 17 24 = 5 + 19 26 = 7 + 19
30 = 11 + 19
Através da enumeração de todos os elementos do domínio x ∈ Z|4 ≤ x ≤ 30 mostramos que a
afirmação é verdadeira.
◭
Entretanto, o método da exaustão é pouco prático quando o domínio D é muito grande ou não
finito. Podemos nestes casos utilizar o método da generalização para mostrar a verdade de uma
afirmação.
A única forma para a sentença P (x) → Q(x) ser falsa é P (x) ser verdadeira e Q(x) ser falsa. Para
mostrar que (P x) → Q(x) é verdadeira suponha que P (x) é verdadeira e mostre que Q(x) também
deve ser verdadeira. Para mostrar que ∀x ∈ D(P (x) → Q(x)) é verdadeiro, suponha que c é um
elemento específico mas escolhido arbitrariamente do domínio D, e mostre que c satisfaz a propriedade P (c) → Q(c). Se provarmos P (c) → Q(c) para um elemento arbritrário c, então teremos
provado ∀x ∈ D(P (x) → Q(x)).
Esta generalização funciona devido ao uso da regra de generalização da lógica de predicados, apresentada nas notas de aula sobre lógica.
4
Métodos de Prova
A construção de provas é uma tarefa complexa e difícil. No entanto, existem alguns métodos de se
mostrar que a declaração condicional P (x) → Q(x) é verdadeira a partir da lógica. Dentre eles estão
a prova direta, a prova por contraposição, a prova por contradição, a prova por contra-exemplo e
a prova por divisão de casos. Entender a mecânica destes métodos é a chave para aprender a ler e
construir provas matemáticas.
Uma vez escolhido o método de prova, empregamos axiomas, definições de termos, resultados previamente provados e regras de inferência para completar a prova. As próximas seções irão apresentar
a idéia central de cada método, exemplificando sua aplicação.
4.1
Prova Direta
A prova direta de uma declaração condicional p → q consiste em provar que a declaração p → q
é verdadeira mostrando que, se p é verdadeiro, então q também deve ser verdadeiro tal que a combinação de p verdadeiro e q falso nunca ocorrerá.
A prova direta de uma declaração condicional p → q é construída quando:
• o primeiro passo consiste na consideração de que p é verdadeiro;
6
• os passos subsequentes são construídos através de axiomas, definições, resultados provados e
regras de inferência;
• o último passo mostra que q também deve ser verdadeiro.
Em uma prova direta, assumimos que p é verdadeiro e usamos axiomas, definições e resultados provados, juntamente com regras de inferência para provar que q também é verdadeiro. Provas diretas
levam das premissas do teorema até a conclusão. Elas começam com as premissas, continuam com
a sequência de deduções e finalizam com a conclusão.
Em [Loureiro, A. A. F.] é apresentado um método para construir provas diretas, cuja adaptação é
apresentada a seguir, no Algoritmo 1.
Algoritmo 1 Construção de uma prova direta
1: Expresse a declaração a ser provada na forma ∀x ∈ D, se P (x), então Q(x)
2: Comece a prova supondo que x é um elemento específico de D escolhido abritrariamente para
o qual P (x) é V.
3: Mostre que Q(x) é V usando axiomas, definições, resultados anteriores e regras de inferência
Alguns exemplos de prova direta serão apresentados a seguir. Definições serão apresentadas onde
houver necessidade.
Definição 2 (Paridade). Um inteiro n é par se existir algum inteiro k tal que n = 2k, e n é ímpar
se existir algum inteiro k tal que n = 2k + 1. Dois inteiros tem a mesma paridade quando ambos
são pares ou quando ambos são ímpares; eles tem a paridade oposta quando um é par e o outro é
ímpar.
Teorema 1. Se n é um inteiro ímpar, então n2 é ímpar.
Prova Direta. O teorema declara que ∀n(P (n) → Q(n)), onde P (n) é ‘n é um inteiro ímpar’ e Q(n)
é ‘n2 é ímpar’. Para mostrar a prova direta deste teorema, vamos assumir que a hipótese desta
declaração condicional é verdadeira, ou seja, assumimos que n é ímpar. Pela Definição 2, temos que
n = 2k + 1, para um inteiro k. Queremos mostrar que n2 também é ímpar. Elevando ambos os
termos da equação n = 2k + 1 ao quadrado, obtém-se a equação
n2 = (2k + 1)2
que expressa o valor de n2 . Desenvolvendo o termo à direita, temos
n2 = 4k2 + 4k + 1
n2 = 2 (2k2 + 2k) +1
| {z }
t
Pela Definição 2 temos que quando n é ímpar,
n2
7
também é ímpar
Teorema 2 ([Loureiro, A. A. F.]). Se a e b são inteiros, então 6a2 b é par.
Prova Direta. Pela Definição 2, um inteiro n é par quando n = 2k. Considere n = 6a2 b e k = 3a2 b.
Como as operações de +, − e × entre inteiros resultam em inteiros, temos que 3a2 b é um inteiro, e
2
2
6a2 b é o dobro de 3a2 b. Assim, |{z}
6a2 b = 2(3a
|{z}b). Concluímos que 6a b é par.
n
k
Definição 3 (Quadrado Perfeito). Um inteiro a é um quadrado perfeito se houver um inteiro b
tal que a = b2 .
Teorema 3. Se m e n são quadrados perfeitos, então n · m é também um quadrado perfeito.
Prova Direta. Para produzir a prova direta deste teorema, vamos assumir que a hipótese é verdadeira (no caso, que ambos números n e m são ambos quadrados perfeitos). Pela Definição 3 temos
que existem dois números, r e s tais que n = r 2 e m = s2 . O objetivo da prova é mostrar que
n · m é também um quadrado perfeito; faremos isso substituindo os valores r 2 e s2 no produto n · m.
Assim,
n · m = r 2 · s2
n · m = rr · ss
n · m = (rr)(ss)
n · m = (rs)(rs)
n · m = (rs)2
Logo, n · m é o quadrado de rs, um número inteiro. Pela Definição 3, temos que o produto n · m é
também um quadrado perfeito.
Teorema 4 ([Loureiro, A. A. F.]). Se a soma de dois números inteiros é par, então a sua diferença
também é par (linguagem natural). ∀ inteiros n e m, se n + m é par, então n − m é par (linguagem
formal).
Prova Direta. Suponha m e n inteiros tal que m + n seja par. Pela Definição 2, m + n = 2k, para
algum inteiro k. Subtraindo-se uma quantidade n de ambos os lados da igualdade m + 2 = 2k,
teremos
m + n − n = 2k − n
m = 2k − n
Usando este resultado, podemos expressar a diferença entre m e n como
m − n = (2k − n) −n
| {z }
m
m − n = 2k − 2n
m − n = 2 (k − n)
| {z }
t
onde t = (k − n) é um inteiro que, multiplicado por 2, resulta em um inteiro par. Logo, a diferença
entre dois inteiros m e n cuja soma é par é um inteiro par.
8
4.2
Prova por Contraposição
Provas de teoremas da forma ∀x(P (x) → Q(x)) que não começam com as premissas e terminam
com a conclusão são também possíveis; dá-se a este tipo de prova a denominação de prova indireta.
Se você falha em provar uma conjectura através de prova direta, mas tem o sentimento de que ela é
verdadeira, poderá empregar algum dos métodos de prova indireta para realizar tal demonstração.
Um tipo de prova indireta é aquela conhecida como prova por contraposição, que faz uso de
fatos onde a declaração condicional (p → q) é verdadeira quando a sua contrapositiva (¬q → ¬p)
também é verdadeira. Este resultado advém da tautologia [(¬q → ¬p) → (p → q)]. Para deixar
isto claro, verifique a tabela verdade apresentada na Tabela 2, que mostra os valores verdades da
declaração condicional, sua contrapositiva e da tautologia correspondente.
Tabela 2: Tabela
p
0
0
1
1
verdade para as proposições (p → q), (¬q → ¬p) e [(¬q → ¬p) → (p → q)]
q ¬p ¬q (p → q) (¬q → ¬p) (¬q → ¬p) → (p → q)
0
1
1
1
1
1
1
1
0
1
1
1
0
0
1
0
0
1
1
0
0
1
1
1
Na prova contrapositiva, provamos uma declaração condicional do tipo (p → q) aplicando a prova
direta sobre sua contrapositiva (¬q → ¬p), mostrando que ela é verdadeira quando (¬q) e (¬p)
forem verdadeiras. A prova por contraposição de uma declaração condicional p → q é construída
quando:
• o primeiro passo consiste em considerar a premissa (¬q) da contrapositiva verdadeira;
• os passos subsequentes são construídos através de axiomas, definições, resultados provados e
regras de inferência;
• o último passo consiste em mostrar que a conclusão (¬p) da contrapositiva segue dos passos
anteriores.
O Algoritmo 2 (adaptado de [Loureiro, A. A. F.]) apresenta alguns passos que podem ser seguidos
na construção de uma prova por contraposição.
Algoritmo 2 Construção de uma prova por contraposição
1: Escreva a declaração a ser provada na forma ∀x ∈ D, se P (x), então Q(x)
2: Reescreva a declaração na forma contrapositiva: ∀x ∈ D, se ¬Q(x), então ¬P (x)
3: Prove o contrapositivo (¬q → ¬p) por prova direta
4: (a) Suponha x um elemento específico, escolhido de forma arbitrária de D tal que ¬Q(x) é V
5: (b) Mostre que ¬P (x) é V
A seguir serão apresentados alguns exemplos de prova de teoremas por meio do método de prova
pela contrapositiva.
9
Teorema 5. Se n é um inteiro e 3n + 2 é ímpar, então n é ímpar.
Prova Direta. Assuma que 3n + 2 é um inteiro ímpar. Da Definição 2, 3n + 2 = 2k + 1 para algum
valor de k inteiro. Da expressão resultante 3n + 1 = 2k parece não haver uma forma direta de se
concluir que n é ímpar. Aqui, a tentativa de prova direta falha.
Prova por Contraposição. A primeira coisa que necessitamos fazer é identificar a hipótese e conclusão da declaração condicional nas formas direta e contrapositiva. Isto posto, temos:
p:
q:
¬p :
¬q :
‘3n + 2 é ímpar’
‘n é ímpar’
‘3n + 2 é par’
‘n é par’
O próximo passo deste método consiste em assumir que a conclusão q é falsa, ou seja, ¬q é verdadeira. Neste caso, assumimos que ¬q : ‘n é par’ é verdade. Este é o ponto de partida da prova.
Por meio de prova direta, devemos partir de ¬q e usar axiomas, definições e resultados previamente
provados para mostrar que se ¬q é verdadeiro, então ¬p também deve ser verdadeiro.
Pela definição de paridade (Definição 2), n = 2k para algum inteiro k. Substituindo 2k por n, temos
3n + 2 = 3(2k) + 2
3n + 2 = 6k + 2
3n + 2 = 2 (3k + 1)
| {z }
t
onde t = 3k + 1 é um inteiro que, multiplicado por 2, resulta em um inteiro par. Pela Definição 2
temos que 3n + 2 é par. Observe que ‘3n + 2 é par’ consiste justamente na negação da hipótese do
teorema original, ou seja, a partir de ¬q chegamos à ¬p.
Se ¬q leva à ¬p, então a sentença (¬q → ¬p) é verdadeira. Por equivalência, a sentença (p → q)
também é verdadeira. Logo, demonstramos que ‘se 3n + 2 é ímpar, então n é ímpar’.
Teorema 6. Para todo número real positivo x e y, se o produto xy excede 25, então x > 5 ou y > 5.
Prova por Contraposição. Identificando a premissa e conclusão da sentença original e sua contrapositiva. Temos
p:
q:
¬p :
¬q :
‘xy excede 25’
‘x > 5 ou y > 5’
(r ∨ s)
‘xy não excede 25’
‘0 < x ≤ 5 e 0 < y ≤ 5’ DeMorgan: ¬(r ∨ s) ≡ (¬r ∧ ¬s)
Consideramos a negação da conclusão do teorema, ou seja, consideramos verdade que 0 < x ≤ 5 e
0 < y ≤ 5. Sob tais circunstâncias, encontramos que o produto xy é limitado por 0 < xy < 5 · 5,
ou seja, 0 < xy ≤ 25. Em outras palavras, o produto xy não excede 25, que corresponde à sentença
¬p. Assim, ¬q leva à ¬p, (¬q → ¬p) é verdadeira e, consequentemente, a o teorema (p → q) é
verdadeiro.
10
Teorema 7. Se n = ab, com a e b inteiros positivos, então a ≤
√
n ou b ≤
√
n.
Prova por Contraposição. Identificando as premissas e conclusões da forma direta e contrapositiva
do teorema:
p:
q:
¬p :
¬q :
‘n = ab’
√
√
‘(a ≤ n) ou (b ≤ n)’ (r ∨ s)
‘n 6= ab’
√
√
DeMorgan: ¬(r ∨ s) ≡ (¬r ∧ ¬s)
‘(a > n) e (b > n)’
Para provar o teorema original pela sua forma contrapositiva, devemos assumir que ¬q é verdadeiro.
√
√
Seja r : (a ≤ n) e s : (b ≤ n). Logo, q pode ser substituído por (r ∨ s), e (¬q) pode ser
substituído por ¬(r ∨ s). Uma das equivalências lógicas mais importantes consiste em uma das Leis
de DeMorgan, que declara que ¬(r ∨ s) ≡ (¬r ∧ ¬s). Logo, a sentença (¬q) pode ser substituída
pela equivalência lógica (¬r ∧ ¬s).
Nesta demonstração, a declaração (¬r ∧ ¬s) pode ser traduzida como (a >
√
n) e (b >
√
n).
Estamos interessados em mostrar que n 6= ab. Podemos fazer isso multiplicando ambas as quanti√ √
dades a e b, obtendo a · b > n · n, ou seja, ab > n. Logo, ab 6= n, ou seja, chegamos em ¬p.
Demonstramos que ¬q leva à ¬p, então (¬q → ¬p) é verdadeira, de forma que o teorema (p → q)
também é verdadeiro.
Teorema 8. Se um inteiro x é divisível por 6, então x também é divisível por 3
Prova por Contraposição. Seja p : ‘um inteiro x é divisível por 6’ e q : ‘um inteiro x é divisível por 3’.
Na prova contrapositiva, o teorema (p → q) é demonstrado pela prova direta da sua contrapositiva,
isto é, (¬q → ¬p). O enunciado deste teorema na forma contrapositiva passa a ser ‘se um inteiro x
não é divisível por 3, então x não é divisível por 6’. A demonstração da prova é dada a seguir.
Hipótese: x não é divisível por 3
x 6= k · 3 para algum inteiro k
x 6= (2k1 ) · 3
x 6= k1 (2 · 3)
x 6= k1 · 6 para algum inteiro k1
(Negação da divisibilidade por 3)
k é igual a um inteiro 2k1
(Axioma da associabilidade multiplicativa)
(Fato)
Conclusão: x não é divisível por 6
Teorema 9 ([Loureiro, A. A. F.]). Dado qualquer inteiro n, se n2 é par, então n é par.
11
Prova por Contraposição. Vamos identificar as premissas e conclusões do teorema e da sua forma
contrapositiva:
p:
q:
¬p :
¬q :
‘n2 é par’
‘n é par’
‘n2 não é par’
‘n não é par’
Partimos da declaração ¬q, ou seja, assumimos que n não é par. Oras, se n não é par, então n é
ímpar (ver Definição 2). Se n é ímpar, então n = 2k + 1 para algum inteiro k.
O produto de n por n é, dessa forma, expresso por (2k + 1)(2k + 1) = (2k + 1)2 . Desenvolvendo a
expressão, temos
n2 = (2k + 1)(2k + 1)
n2 = (2k + 1)2
n2 = 4k2 + 4k + 1
n2 = 2 (2k2 + 2k) +1
| {z }
t
Pela definição de paridade (Definição 2) temos que, assumindo n ímpar, n2 é ímpar, ou seja, partindo
de ¬q chegamos a ¬p. Logo, a declaração condicional (¬q → ¬p) é verdadeira, e o teorema (p → q)
também é verdadeiro.
4.3
Prova por Contradição
Outra forma de provar uma declaração condicional do tipo (p → q) consiste na prova por contradição. Na prova por contradição, o teorema (p → q) é demonstrado de maneira indireta.
Neste tipo de prova, assumimos que a declaração ∀x ∈ D(P (x) → Q(x)) é falsa, isto é, p → q é falsa
para pelo menos uma substituição de x do domínio D. Existe algum elemento x do domínio D para
o qual P (x) é verdadeiro e Q(x) é falso. Em linguagem lógica, partimos de (p ∧ ¬q) e deduzimos
que (p ∧ ¬q) leva à uma contradição.
Usamos a verdade de (p∧¬q) para derivar uma contradição, isto é, uma sentença que sempre resulta
em falso. Uma vez que uma contradição seja obtida, provamos a verdade do teorema (p → q), pois
[(p ∧ ¬q) → 0] → (p → q) é uma tautologia, onde (p → q) equivale à [(p ∧ ¬q) → 0] (ver Tabela 3).
Tabela 3: Tabela verdade para as proposições (p → q), [(p ∧ ¬q) → 0] e [(p ∧ ¬q) → 0] → (p → q)
p q ¬q (p ∧ ¬q) (p ∧ ¬q) → 0 (p → q) [(p ∧ ¬q) → 0] → (p → q)
0 0
1
0
1
1
1
0 1
0
0
1
1
1
1 0
1
1
0
0
1
1 1
0
0
1
1
1
12
Como vimos, a forma (p ∧ ¬q) é útil para provar declarações condicionais na forma (p → q). Existe
ainda uma outra forma de provar uma declaração na forma p por contradição, usando a sentença
¬p → (r ∧ ¬r).
Nesta forma, a demonstração começa considerando que p é falso, ou seja, ¬p é verdadeiro, e usamos
axiomas, definições e resultados já provados para deduzir que ¬p leva à alguma contradição do tipo
(r ∧ ¬r) para alguma proposição r. Oras, se afirmar que a declaração p é falsa leva à uma contradição, então a declaração p é verdadeira pois [(¬p → (r∧¬r)] → p é uma tautologia (ver Tabela 4).
Tabela 4: Tabela verdade para as proposições [¬p → (r ∧ ¬r)] e [¬p → (r ∧ ¬r)] → p
p r ¬p ¬r (r ∧ ¬r) [¬p → (r ∧ ¬r)] [¬p → (r ∧ ¬r)] → p
0 0
1
1
0
0
1
0 1
1
0
0
0
1
1 0
0
1
0
1
1
1 1
0
0
0
1
1
O Algoritmo 3 apresentado a seguir foi adaptado de [Loureiro, A. A. F.], e apresenta alguns princípios para construir provas por contradição.
Algoritmo 3 Construção de uma prova por contradição
1: Suponha que a declaração a ser provada é falsa
2: Mostre que esta declaração leva logicamente à uma contradição
3: Conclua que a afirmação a ser provada é verdadeira
Para finalizar, vimos nesta sub-seção que um teorema ou sentença pode ser demonstrado através da
prova por contradição. Duas formas foram apresentadas, uma para declarações na forma p e outra
para declarações na forma (p → q). Nos exemplos de demonstração por contradição apresentados
neste documento procuraremos destacar a forma escolhida para se mostrar a contradição e, desta
forma, demonstrar a verdade sobre a sentença ou teorema enunciado.
Definição 4 (Números Racionais e Irracionais). Um número real r é racional se existem inteiros
p e q com q 6= 0 tal que r = p/q. Um número real que não é racional é denominado irracional.
Teorema 10. O número
√
2 é um número irracional.
√
Prova por Contradição. Seja p a proposição ‘ 2 é um número irracional’. Para demonstrar a verdade desta sentença, usaremos
a prova por contradição na √
forma ¬p → (r ∧ ¬r). Suponha
que ¬p
√
√
é verdadeiro, ou seja, ‘ 2 não é um número irracional’. Se 2 não é irracional, logo 2 é racional.
13
√
√
Se 2 é racional, segundo a Definição 4 existem inteiros a e b tal que 2 = a/b, onde b 6= 0 e a e
b não possuem fatores em comum,
i.e., a/b é o menor termo desta relação. Aplicando o quadrado à
√
ambos os lados da expressão 2 = a/b, obtemos:
√ 2 a 2
2 =
b
a2
b2
2
2b = a2
2=
Esta última expressão mostra que, pela definição de paridade (Definição 2), o número a2 é um
número par. Segundo o Teorema 9, se a2 é par, então a também é par. Logo a pode ser escrito da
forma a = 2k, para algum inteiro k. Substituindo o termo a na expressão já desenvolvida, temos:
2b2 = a2
2b2 = (2k)2
2b2 = 4k2
Dividindo ambos os termos da igualdade por 2, temos:
b2 = 2k2
Acabamos de concluir que b2 é par (Definição 2). Oras, se b2 é par, b também é par (Teorema 9).
√
√
A hipótese usada nesta demonstração assumiu que 2 é um número racional, ou seja, 2 = a/b,
onde a e b não possuem fatores em comum. Porém, deduzimos da Definição 2 e Teorema 9 que os
números a e b são pares, logo o número 2 divide a e b.
Seja r : ‘2 divide os inteiros a e b’, e ¬r : ‘os inteiros a e b não possuem fatores em comum’. A
dedução partindo da hipótese ¬p levou à contradição (r ∧ ¬r).
√
Isto é suficiente para concluir que a sentença p : ‘ 2 é um número irracional’ é verdadeira.
Teorema 11 ([Loureiro, A. A. F.]). Não existe um inteiro que seja o maior de todos.
Prova por Contradição. Para demonstrar a verdade desta sentença, usaremos a prova por contradição na forma ¬p → (r ∧ ¬r). Suponha que ¬p seja verdadeira, ou seja, ‘existe um inteiro N que
é o maior de todos os inteiros’.
Partindo de ¬p temos que N ≥ n, para cada inteiro n. Seja M = N + 1 a soma de dois inteiros. A
operação + é fechada sobre o conjunto dos números inteiros: a soma de dois inteiros resulta em um
novo inteiro – logo existe um inteiro M que equivale à N + 1. Concluímos que M > N .
Seja r : ‘existe um inteiro N que é maior do que todos os inteiros’ e ¬r : ‘existe um inteiro M > N ’.
A dedução da sentença ¬p levou à contradição (r ∧ ¬r), que é suficiente para demonstrar por
contradição que a sentença original, p, é verdadeira.
14
Até o presente momento utilizamos a forma ¬p → (r ∧ ¬r) para provar os Teoremas 10 e 11. Entretanto, podemos usar outras formas na prova por contradição com objetivo de provar declarações
condicionais na forma (p → q). Trata-se da forma (p ∧ ¬q) → 0.
Neste tipo de prova, nós assumimos que a hipótese do teorema é verdadeira e a sua conclusão é
falsa, e usamos axiomas, definições e resultados já provados para deduzir uma contradição. Em
notação formal, (p ∧ ¬q) → 0.
Mostrar uma contradição partindo de p ∧ ¬q é suficiente para demonstrar a verdade do teorema, já
que existe uma equivalência lógica entre as proposições (p → q) e (p ∧ ¬q → 0), já apresentada na
Tabela 3.
Teorema 12. Se 3n + 2 é ímpar, então n é ímpar
Prova por Contradição. Seja p : ‘3n + 2 é ímpar’ e q : ‘n é ímpar’. O teorema tem a forma (p → q),
logo podemos demonstrar a verdade de (p → q) por uma prova por contradição.
Para construir a prova por contradição, assuma a verdade de (p ∧ ¬q), isto é, ‘3n + 2 é ímpar’ e ‘n
não é ímpar’. Pela definição de paridade (ver Definição 2), se n não é ímpar, então n é par e existe
um inteiro k tal que n = 2k.
Substituindo n por 2k na expressão 3n + 2, obtemos
3n + 2 = 3(2k) + 2
3n + 2 = 6k + 2
3n + 2 = 2 (3k + 1)
| {z }
t
O número t = 3k + 1 é um inteiro que, multiplicado por 2, resulta em um número par – logo 3n + 2
é um número par. Segundo a dedução, ¬p é verdadeiro.
Na prova, assumimos a verdade de p : ‘3n + 2 é ímpar’, e por meio de dedução sobre a definição de
paridade encontramos ¬p : ‘3n + 2 é par’. Logo, (p ∧ ¬q) → (p ∧ ¬p), ou seja, (p ∧ ¬q) → 0.
Como [(p ∧ ¬q) → 0] ≡ (p → q), então o teorema (p → q) é verdadeiro.
Teorema 13. Se a e b são números inteiros, então a2 − 4b 6= 2.
Prova por Contradição. Seja p : ‘a e b ∈ Z’ e q : ‘a2 − 4b 6= 2’. Para provar por contradição que o
teorema (p → q) é verdadeiro, podemos usar a forma (p ∧ ¬q) → 0.
Devemos considerar a verdade das proposições (p ∧ ¬q), ou seja, ‘a e b ∈ Z’, e ‘a2 − 4b = 2’. Vamos
trabalhar sobre a sentença a2 − 4b = 2:
a2 − 4b = 2
15
a2 = 4b + 2
a2 = 2(2b + 1)
De acordo com a Definição 2, a2 é par. Se a2 é par, pelo Teorema 9 temos que a também é par e
pode ser escrita na forma a = 2k, para algum inteiro k.
Substituindo a por 2k na expressão a2 − 4b = 2, temos
a2 − 4b = 2
(2k)2 − 4b = 2
4k2 − 4b = 2
Dividindo ambos os lados da expressão acima por 2 resultará em
2k2 − 2b = 1
2 (k2 − b) = 1
| {z }
t
Da expressão acima, temos que t = k2 − b é um inteiro. Se 1 = 2t, pela definição de paridade temos
que 1 é par.
Seja a proposição r : ‘1 é par’, e seja a proposição ¬r : ‘1 é ímpar’. Pela dedução, encontramos
que r é verdadeiro, porém, pela definição de paridade sabemos que 1 é ímpar porque não existe
nenhum inteiro que multiplicado por 2 resulte em 1. Se tanto r quanto ¬r são verdadeiros, temos
a contradição (r ∧ ¬r).
Partimos de (p ∧ ¬q) e deduzimos a contradição (r ∧ ¬r), ou seja, [(p ∧ ¬q) → 0]. Por equivalência,
se [(p ∧ ¬q) → 0] é verdadeiro, então o teorema (p → q) também é verdadeiro.
Teorema 14. Para todo número real x ∈ [0, π/2], temos sin x + cos x ≥ 1.
Prova por Contradição. Seja p : ‘x ∈ [0, π/2]’, e p : ‘sin x+cos x ≥ 1’. Para provar o teorema (p → q)
por contradição, devemos assumir a verdade de (p ∧ ¬q), ou seja, ‘x ∈ [0, π/2]’ e ‘sin x + cos x < 1’.
De p temos que o ângulo varia entre 0 ≤ x ≤ π/2, ou seja, nem sin x nem cos x são negativos, logo
0 ≤ sin x + cos x < 1.
Elevando a expressão 0 ≤ sin x + cos x < 1 ao quadrado, temos
02 ≤ (sin x + cos x)2 < 12
0 ≤ sin2 x + 2 sin x cos x + cos2 x < 1
2
2
0 ≤ sin
{z cos x} +2 sin x cos x < 1
| x+
1
16
Substituindo sin2 x + cos2 x por 1, temos
0 ≤ 1 + 2 sin x cos x < 1
Se de p temos que nem sin x, nem cos x são negativos, então 1 + 2 sin x cos x será sempre maior do
que zero. Assim,
1 + 2 sin x cos x < 1
2 sin x cos x < 0
Seja r : ‘2 sin x cos x < 0’. Partindo de (p ∧ ¬q), deduzimos que r é verdadeiro; no entando p afirma
que se 0 ≤ x ≤ π/2, nem o sin x nem o cos x são negativos, logo 2 sin x cos x também não é negativo.
Em outras palavras, ¬r também é verdadeiro.
Chegamos à contradição (r ∧ ¬r), ou seja, (p ∧ ¬q) → 0. Por equivalência, se (p ∧ ¬q) → 0 é
verdadeiro, o teorema (p → q) também é verdadeiro.
4.4
Prova por Equivalência
A prova por equivalência é útil para provar teoremas bicondicionais, na forma (p ↔ q). Para
demonstrar um teorema nesta forma, necessitamos mostrar que (p → q) e (q → p) são ambos verdadeiros.
Este tipo de demonstração é suficiente para provar (p ↔ q) graças à relação entre as proposições
(p ↔ q) e [(p → q) ∧ (q → p)], que resultam na tautologia (p ↔ q) ↔ [(p → q) ∧ (q → p)] cujos
valores verdade são apresentados na Tabela 5.
p
0
0
1
1
Tabela 5: Tabela verdade para a tautologia (p ↔ q) ↔ [(p → q) ∧ (q → p)]
q p → q q → p (p → q) ∧ (q → p) p ↔ q (p ↔ q) ↔ [(p → q) ∧ (q → p)]
0
1
1
1
1
1
1
1
0
0
0
1
0
0
1
0
0
1
1
1
1
1
1
1
Teorema 15. Se n é um inteiro, então n é impar se e somente se n2 é ímpar.
Prova por Equivalência. Seja p : ‘n é ímpar’ e q : ‘n2 é ímpar’. O teorema tem a forma (p ↔ q),
logo para provar o teorema necessitamos mostrar que as proposições (p → q) e (q → p) são ambas
verdadeiras.
O Teorema 1 consiste justamente na proposição (p → q), que já demonstramos ser verdadeira por
meio de prova direta (ver demonstração do Teorema 1). Agora resta provar que a proposição (q → p)
é igualmente verdadeira.
17
Para provar que a proposição (q → p) é verdadeira, vamos usar a prova por contraposição. Em
um teorema na forma (q → p), a proposição q é a hipótese ou premissa do teorema, e a proposição
p é a conclusão. Para demonstrar que o teorema é verdadeiro por contraposição, devemos partir
da verdade sobre a negação da conclusão (neste caso, ¬p) para deduzir que a negação da hipótese
(neste caso, ¬q) é também verdadeira. Em linguagem formal, (¬p → ¬q).
Seja ¬p : ‘n é par’ verdadeira. Da definição de paridade (Definição 2), temos que o número n pode
ser determinado por n = 2k, para algum inteiro k. Elevando a expressão n = 2k ao quadrado,
temos:
(n)2 = (2k)2
n2 = 4k2
n2 = 2 2k2
| {z }
t
Ou seja,
é par uma vez que pode ser expresso por n2 = 2t, para um inteiro t = 2k2 . Acabamos
de deduzir ¬q.
n2
Nesta demonstração, partimos de ¬p e deduzimos ¬q usando definições e fatos matemáticos. Como
existe equivalência entre (¬p → ¬q) e (q → p), mostrar a verdade sobre (¬p → ¬q) é suficiente para
provar que (q → p) é verdadeira.
Como nesta demonstração mostramos que as proposições (p → q) e (q → p) são ambas verdadeiras,
pela equivalência entre as proposições (p ↔ q) e [(p → q) ∧ (q → p)] temos que o teorema (p ↔ q)
é verdadeiro.
Em alguns casos, um teorema declara que diversas proposições, ditas p1 , p2 , . . . , pn são equivalentes.
Tal fato é formalizado da seguinte maneira: p1 ↔ p2 ↔ p3 ↔ · · · ↔ pn , que declara que todas as n
proposições possuem a mesma tabela verdade.
Consequentemente, para todo i e j com 1 ≤ i ≤ n e 1 ≤ j ≤ n, pi e pj são equivalentes. Uma forma
de provar essa equivalência mútua é usar o resultado da tautologia (p1 ↔ p2 · · · ↔ pn ) ↔ [(p1 →
p2 ) ∧ (p2 → p3 ) ∧ · · · ∧ (pn → p1 )].
Se as n proposições condicionais (p1 → p2 ), (p2 → p3 ), . . . , (pn → p1 ) forem demonstradas serem
verdadeiras, então as proposições p1 , p2 , . . . , pn são todas equivalentes.
Essa forma de demonstrar equivalência entre as n proposições é bastante eficiente, pois envolve n
demonstrações. A alternativa consiste em provar a verdade de (pi → pj ), para todo i 6= j, com
1 ≤ i ≤ n e 1 ≤ j ≤ n, que envolve demonstrar n2 − n proposições condicionais deste tipo.
Teorema 16. Para um inteiro n, as declarações n é par, n − 1 é ímpar e n2 é par são equivalentes.
18
Prova por Equivalência. Sejam p1 : ‘n é par’, p2 : ‘n − 1 é ímpar’ e p3 : ‘n2 é par’. Para provar a
equivalência entre p1 , p2 e p3 iremos usar a demonstração por equivalência.
Na demonstração por equivalência, devemos provar a verdade de (p1 → p2 ), (p2 → p3 ) e (p3 → p1 )
usando os métodos de prova direta e indireta. Vamos demonstrar a verdade de cada uma das proposições condicionais a seguir, em separado.
Demonstrando (p1 → p2 ) por prova direta: Assumindo que n é par, então temos que n = 2k para
algum inteiro k. Por consequência,
n − 1 = (2k) − 1
n − 1 = 2k − 1
n − 1 = 2 (k − 1) +1
| {z }
t
Logo, n − 1 é igual ao produto de um inteiro t = k − 1 por 2, somado à 1. Pela definição de paridade
(Definição 2) temos que n − 1 é ímpar. Partimos da verdade sobre p1 e chegamos à verdade sobre
p2 usando demonstração direta, logo a proposição condicional (p1 → p2 ) é verdadeira.
Demonstrando (p2 → p3 ) por prova direta: Assumimos que n − 1 é ímpar, ou seja, n − 1 pode ser
escrito na forma n − 1 = 2k + 1, para algum inteiro k. Disso, temos
n − 1 = 2k + 1
n = 2k + 2
(n)2 = (2k + 2)2
n2 = 4k2 + 8k + 4
n2 = 2 (2k2 + 4k + 2)
|
{z
}
t
Ou seja, n2 pode ser escrito pelo produto de um inteiro t = 2k2 + 4k + 2 por 2. Pela definição de
paridade, n2 é par. Partindo de p2 , por demonstração direta mostramos a verdade de p3 ; logo a
proposição condicional (p2 → p3 ) é verdadeira.
Demonstraremos (p3 → p1 ) por contraposição, ou seja, assumindo que ¬p1 é verdadeiro, chegaremos
a ¬p3 verdadeiro. Assumiremos que n − 1 é par, ou seja, n − 1 = 2k para algum inteiro k. Assim,
n − 1 = 2k
n = 2k + 1
(n)2 = (2k + 1)2
n2 = 4k2 + 4k + 1
n2 = 2 (2k2 + 2k) +1
| {z }
t
19
Ou seja, n2 é dado pelo produto de um inteiro t = 2k2 + 2k por 2, somado à 1, ou seja, n2 = 2t + 1.
Pela definição de paridade, n2 é ímpar, ou seja, ¬p3 é verdadeiro. Provamos que se (¬p1 → ¬p3 ) é
verdadeiro, então a proposição condicional (p3 → p1 ) é também verdadeira.
Demonstramos que as 3 proposições condicionais (p1 → p2 ), (p2 → p3 ) e (p3 → p1 ) são verdadeiras,
que nos leva à concluir que p1 , p2 e p3 são equivalentes.
4.5
Prova por Contra-Exemplo
Para mostrar que uma declaração na forma ∀x ∈ D(P (x)) ou na forma ∀x ∈ D(P (x) → Q(x)) é
falsa, basta encontrar um contra-exemplo.
Um contra-exemplo consiste em um valor x do domínio D para o qual P (x) é falso em declarações
do tipo ∀x ∈ D(P (x)), ou para o qual P (x) é verdadeiro e Q(x) é falso em declarações da forma
∀x ∈ D(P (x) → Q(x)).
Este tipo de prova é usada quando uma declaração da forma ∀x ∈ D(P (x)) ou ∀x ∈ D(P (x) →
Q(x)) nos parece ser falsa, mas que não conseguimos demonstrar pelas técnicas já discutidas. Neste
casos, buscamos um contra-exemplo que mostre a falsidade da declaração.
Teorema 17 (Adaptado de [Loureiro, A. A. F.]). Para todo a,b ∈ R, [(a2 = b2 ) → (a = b)].
Prova por Contra-Exemplo. Seja P (a, b) : (a2 = b2 ), e seja Q(a, b) : (a = b). Para mostrar que a
afirmação ∀a∀b(P (a, b) → Q(a, b)) é falsa, basta encontrar um contra-exemplo para o qual a igualdade dos quadrados de a e b não implique que a e b sejam iguais.
Observamos que a atribuição de valores a = 4 e b = −4 torna a sentença P (a, b) verdadeiro e Q(a, b)
falso, logo a declaração condicional P (a, b) → Q(a, b) é falsa.
Logo, os valores a = 4 e b = −4 são um contra-exemplo para a afirmação [(a2 = b2 ) → (a = b)].
Teorema 18. Cada inteiro positivo é a soma dos quadrados de dois inteiros.
Prova por Contra-Exemplo. Seja P (x) : n = a2 + b2 . Para mostrar que P (x) é falso, basta apresentar um contra-exemplo, ou seja, um inteiro que não é formado pela soma dos quadrados de outros
dois inteiros.
Buscaremos por um contra-exemplo, enumerando alguns casos. Assim,
0 = 02 + 02 (Verdadeiro)
1 = 12 + 02 (Verdadeiro)
2 = 12 + 12 (Verdadeiro)
3=? + ?
(Falso)
O número 3 é um inteiro que não pode ser escrito pela soma do quadrado de dois outros inteiros.
Logo, o número 3 é um contra-exemplo para P (x), pois torna P (x) falso.
20
4.6
Prova por Divisão em Casos
Existe ainda um outro tipo de prova, conhecida como prova por divisão de casos, que é útil
quando temos que examinar múltiplos casos antes de demonstrar que uma declaração é verdadeira
em todos os cenários.
Uma prova por divisão em casos deve cobrir todos os casos que surgem no teorema em questão.
Geralmente uma prova por casos é aplicada quando não existe uma forma óbvia de começar a demonstração, porém existem informações extras sobre cada caso que ajudam a desenvolver a prova.
Teorema 19 (Adaptado de [Loureiro, A. A. F.]). Dois números inteiros consecutivos quaisquer tem
paridade oposta.
Prova por Divisão em Casos. Suponha m e m + 1 dois inteiros consecutivos. Para provar o teorema
acima, devemos mostrar que um dos números, m ou m + 1, é par, e o outro é ímpar.
Pela definição de paridade (Definição 2) sabemos que ou m é par, ou m é ímpar. Vamos verificar
ambos os casos em separado.
Caso 1 (m é par): Se considerarmos que m é par, então m = 2k para algum inteiro k. Substituindo
m por 2k na expressão m + 1, obtemos:
m + 1 = (2k) + 1
m + 1 = 2k + 1
Logo, m + 1 é ímpar. Temos que um dos números é par, enquanto que o outro é ímpar – logo os
inteiros m e m + 1 tem paridade oposta.
Caso 2 (m é ímpar): Se considerarmos que m é ímpar, então m = 2k + 1 para algum inteiro k.
Substituindo o valor de m na expressão m + 1, temos:
m + 1 = (2k + 1) + 1
m + 1 = 2k + 2
m + 1 = 2 (k + 1)
| {z }
t
Ou seja, m + 1 pode ser escrito na forma m + 1 = 2t, onde t = k + 1 é um inteiro. Logo, m + 1 é
par. Se considerar m ímpar nos levou à encontrar que m + 1 é par, temos que os inteiros m e m + 1
tem paridade oposta.
Conclui-se que, independente de qual dos dois casos ocorre, os números m e m + 1 sempre tem
paridade oposta. Isto posto, o teorema é verdadeiro.
21
Teorema 20. Se n ∈ N, então 1 + (−1)2 · (2n − 1) é um múltiplo de 4.
Prova por Divisão em Casos. Suponha n ∈ N verdadeiro. Logo, n é par ou n é ímpar. Como o
fator (−1)n na expressão pode assumir um valor diferente dependente da paridade de n, devemos
então considerar os dois casos em separado.
Caso 1 (n é par): Se n é par, então n = 2k para algum inteiro k, e (−1)n = 1. A expressão
1 + (−1)2 · (2n − 1) torna-se 1 + (2n − 1). Substituindo n por 2k, temos 1 + [2(2k) − 1] = 4k. O
resultado 4k é múltiplo de 4.
Caso 2 (n é ímpar): Se n é ímpar, então n = 2k + 1 para algum inteiro k, e (−1)n = −1.
Assim, a expressão 1 + (−1)2 · (2n − 1) resulta em 1 − (2n − 1). Substituindo n por 2k + 1, temos
1 − (2n − 1) = 1 − [2(2k + 1) − 1] = 1 − [4k + 2 − 1] = 1 − [4k + 1] = −4k. O resultado −4k também
é múltiplo de 4.
Ambos os casos mostram que 1 + (−1)2 · (2n − 1) é sempre múltiplo de 4.
Teorema 21. Mostre que |xy| = |x| · |y| para x e y números reais.
Prova por Divisão em Casos. A notação |c| é usada para indicar o valor absoluto de um número
real c. Por definição, |c| = c quando c ≤ 0, ou |c| = −c quando c < 0.
Para provar o teorema, temos que mostrar todos os casos possíveis envolvendo o valor absoluto de x
e y. Tomando a definição usada acima, verificamos que existem quatro casos a serem demonstrados:
x positivo, y positivo; x positivo, y negativo; x negativo, y positivo e x negativo, y negativo.
Caso 1 (x ≥ 0, y ≥ 0): se x ≥ 0 e y ≥ 0, então o produto xy ≥ 0. Pela definição de valor absoluto,
se c ≥ 0 então |c| = c. Neste caso, tanto x quanto y são positivos, ou seja, |x| = x e |y| = y. Logo,
|xy| = xy = |x| · |y|.
Caso 2 (x ≥ 0, y < 0): se x ≥ 0 e y < 0, então o produto xy < 0. Logo, |xy| = −xy. Pela
definição de valor absoluto, |c| = c se c ≥ 0, ou |c| = −c se c < 0. Neste caso, consideramos que
x é positivo e y é negativo, logo |x| = x e |y| = −y. Em função dos sinais de x e y, a expressão
resultante |xy| = −xy pode ser reescrita como |xy| = x(−y). Usando a definição de valor absoluto
temos então que |xy| = |x| · |y|.
Caso 3 (x < 0, y ≥ 0). Se x < 0 e y ≥ 0, então o produto xy < 0. Logo, |xy| = −xy. Pela
definição de valor absoluto, |c| = c se c ≥ 0, ou |c| = −c se c < 0. Neste caso, consideramos que
x é negativo e y é positivo, logo |x| = −x e |y| = y. Em função dos sinais de x e y, a expressão
resultante |xy| = −xy pode ser reescrita como |xy| = (−x)y. Usando a definição de valor absoluto
temos então que |xy| = |x| · |y|.
Caso 4 (x < 0, y < 0). Se x < 0 e y < 0, então o produto xy ≥ 0. Logo, |xy| = xy. Pela definição
de valor absoluto, |c| = c se c ≥ 0, ou |c| = −c se c < 0. Neste caso, consideramos que x e y são
negativos, logo |x| = −x e |y| = −y. Em função dos sinais de x e y, a expressão resultante |xy| = xy
22
pode ser reescrita como |xy| = (−x)(−y). Usando a definição de valor absoluto temos então que
|xy| = |x| · |y|.
A igualdade |xy| = |x| · |y| se manteve em todos os casos demostrados, esgotando as possibilidades.
Logo, concluímos que a afirmação |xy| = |x| · |y| é verdadeira.
4.7
Prova por Exaustão
Alguns teoremas podem ser provados pelo exame de um número relativamente pequeno de exemplos.
Provas deste tipo são denominadas de provas exaustivas ou prova por exaustão, pois a prova
ocorre esgotando-se todas as possibilidades.
Provas exaustivas são um tipo especial de prova por casos onde cada caso consiste em verificar um
único exemplo.
Teorema 22. Prove que (n + 1)3 ≥ 3n se n é um inteiro positivo com n ≤ 4.
Prova por Exaustão. Podemos provar a declaração acima por meio de exaustão, visto que temos
uma quantidade pequena de casos (mais especificamente, n = 1, n = 2, n = 3 e n = 4. A prova
consiste na inspeção de que a desigualdade (n + 1)3 ≥ 3n é verdadeira para todos os casos:
n=1
n=2
n=3
n=4
(1 + 1)3
(2 + 1)3
(3 + 1)3
(4 + 1)3
≥ 31
8
≥ 32 27
≥ 33 64
≥ 34 125
≥ 3 (Verdadeiro)
≥ 9 (Verdadeiro)
≥ 27 (Verdadeiro)
≥ 81 (Verdadeiro)
Logo, em todos os casos do domínio a desigualdade se manteve verdadeira. Provamos por exaustão
que (n + 1)3 ≥ 3n é verdadeiro para n inteiro positivo com n ≤ 4.
4.8
Provas Existenciais
Alguns teoremas são afirmações de que objetos de um determinado tipo existem. Teoremas deste
tipo tem a forma ∃xP (x), para um dado predicado P . Provas para proposições na forma ∃xP (x)
são denominadas provas existenciais. Existem diversas formas de provas teoremas deste tipo.
Uma das formas consiste em encontrar um elemento a, chamado de testemunha, tal que P (a) seja
verdadeiro. Este tipo de prova de existência é denominada de prova construtiva.
Teorema 23. Existe um inteiro positivo que pode ser escrito como a soma dos cubos de inteiros
positivos em duas maneiras diferentes.
Prova Existencial Construtiva. O menor número que pode ser escrito desta forma é o número 1729.
De fato,
3
3
1729 = 10
+ 93} = 12
+ 13}
| {z
| {z
Forma 1
23
Forma 2
Se P (x): ‘x é positivo e pode ser escrito como a soma dos cubos de inteiros positivos de duas
maneiras diferentes’, temos que P (1729) é verdadeiro; logo 1729 é uma testemunha para esta prova
construtiva de ∃xP (x).
Teorema 24. Existe um inteiro que é par e primo.
Prova Existencial Construtiva. Seja P (x): ‘x é par e x é primo’. A afirmação acima pode ser formalizada como ∃xP (x).
Considere o número inteiro 2. O número 2 ∈ Z e o número 2 é um número primo, pois os únicos
inteiros que dividem o número 2 é o número 1 e ele próprio.
O número 2 é uma testemunha de que P (x) é verdadeiro, logo ∃xP (x) é verdadeiro.
Também é possível dar uma prova de existência não construtiva para declarações do tipo ∃xP (x),
isto é, não encontramos um elemento a tal que P (a) seja verdadeiro mas provamos que ∃xP (x) é
verdadeiro de outra maneira.
Teorema 25. Mostre que existem números irracionais x e y tal que xy é racional.
Prova Existencial√Não-Construtiva. Seja
√ 2
então xy =
.
2
√
2 um número irracional. Se tomarmos x =
√
2ey=
√
2,
√
√
√ √2
é um número racional, então temos dois irracionais x = 2 e y = 2 tal que xy resulta
2
Se
em um racional.
√ √2
√ √2
√
for um irracional, então podemos assumir x =
e y = 2
2
2
√ √ 2
√ 2
√ 2
√ √2·√2
y
irracionais tal que x =
=
2
2
2 = 2, que é racional. Neste caso, xy
=
Por outro lado, se
resulta em um número racional.
Na prova não-construtiva apresentada acima, nós não encontramos irracionais√ x e y tal que xy é
√
√
√ 2
√
irracional, mas mostramos que ou o par x = 2, y = 2, ou o par x =
, y = 2 possui a
2
propriedade desejada, mesmo sem indicar qual dos dois pares é a prova existencial do Teorema 25.
Outra maneira ainda de apresentar provas existenciais não-construtivas para um teorema consiste
em mostrar ∃xP (x) indiretamente. Por exemplo, podemos mostrar que ¬∃xP (x) leva à uma contradição, de forma que a declaração ∃xP (x) é verdadeira.
24
4.9
Prova de Unicidade
Quando um teorema afirma a existência de um único objeto que satisfaz uma determinada propriedade, devemos fazer a demonstração de tal teorema utilizando a prova por unicidade. Uma prova
por unicidade envolve demonstrar que existe um elemento com tal propriedade (como uma prova
existencial), e que nenhum outro elemento além deste possui tal propriedade.
Uma prova de unicidade envolve duas partes:
• existência: mostrar que existe um elemento x com a propriedade enunciada.
• unicidade: mostrar que se x 6= y, então y não tem tal propriedade2 ; ou podemos mostrar que
se x e y têm a propriedade desejada, então x = y.
A seguir apresentamos dois exemplos de prova por unicidade.
Teorema 26. Se a e b são números reais e a 6= 0, então há um único número real r tal que ar+b = 0
Prova de Unicidade. Dividiremos a demonstração em duas partes, para mostrar a existência de tal
número r, seguida da demonstração de unicidade de r no sentido de que apenas r satisfaz a equação
ar + b = 0.
Para demonstrar que tal número r existe, podemos isolar o r na equação acima, de onde obteremos
o seu valor como r = − b/a. O número r é, portanto, a raíz da equação ar + b = 0, tornando a
igualdade verdadeira.
Uma vez identificado que existe r tal que ar + b = 0, devemos provar que ele é o único número real
que também satisfaz essa equação. Seja s um número real tal que as + b = 0. Isolando o valor de
s, obtemos que s = − b/a. O número s também satisfaz a equação as + b = 0; no entanto s = − b/a
e r = − b/a; logo s = r.
Teorema 27. Todo inteiro tem um único inverso aditivo.
Prova de Unicidade. Seja p um inteiro. Iremos mostrar que existe um inteiro q tal que p + q = 0.
Se isolarmos o valor de q na equação acima, teremos que q = −p. Logo, existe um inteiro q = −p
tal que p + q = 0.
Agora provaremos que q é único. Seja um inteiro r 6= q tal que p + r = 0. Como p + q = 0 e
p + r = 0, então p + q = p + r. Subtraindo-se p de ambos os lados, a igualdade resulta em q = r.
Oras, a declaração q 6= r levou a deduzir que q = r, ou seja, chegamos a uma contradição. Isto
posto, p = r e, portanto, existe apenas um número q = −p que é inverso aditivo de p.
2
i.e., ∃x(P (x) ∧ ∀y(y 6= x → ¬P (y)))
25
4.10
Outros Métodos de Prova
As técnicas clássicas de prova foram apresentadas nas seções 4.1 à 4.9; entretanto existem ainda
outros tipos de prova, que serão brevemente comentadas na presente seção.
A primeira delas consiste na prova por vacuidade. Na prova por vacuidade, um teorema na forma
p → q é provado ser verdadeiro quando sabemos que p é falso. Isso ocorre porque sempre que p é
falso, p → q é verdadeiro em uma declaração condicional, independente do valor de q (ver Tabela 6).
Tabela 6: Tabela verdade para (p → q), com
p
0
0
1
1
destaque para os elementos da prova por vacuidade
q p→q
0
1
1
1
0
0
1
1
Como consequência, se p é falso então temos uma prova por vacuidade do teorema na forma p → q.
Este tipo de prova é útil para estabelecer casos onde o teorema declara que uma declaração condicional é para todos os inteiros positivos, isto é, ∀xP (x).
Teorema 28. Mostre que P (0) é verdadeiro, onde P (n) expressa a declaração ‘se n > 1, então
n2 > n’ no domínio dos números inteiros.
Prova por Vacuidade. P (0) significa que ‘se 0 > 1, então 02 > 0’. A hipótese 0 > 1 é falsa, o que
implica que P (0) é, automaticamente, verdadeira.
De forma equivalente, podemos provar que um teorema na forma p → q é verdadeiro se a conclusão
q for verdadeira. A Tabela 7 mostra os valores verdade para uma proposição condicional, com
destaque para o resultado de p → q quando q é verdadeiro. Este tipo de técnica é denominada de
prova trivial.
Tabela 7: Tabela verdade para (p → q),
p
0
0
1
1
com destaque para os elementos da prova trivial
q p→q
0
1
1
1
0
0
1
1
Teorema 29. Seja P (n) a afirmação ‘se a e b são inteiros positivos com a ≥ b, então an ≥ bn ’ no
domínio do conjunto Z+ . Mostre que P (0) é verdadeira.
26
Prova Trivial. A proposição P (0) significa ‘se a ≥ b, então a0 ≥ b0 ’. Como a0 = b0 = 1, então a
conclusão a0 ≥ b0 é verdadeira; logo a declaração condicional P (0) é verdadeira, independente dos
valores de a e b.
Por fim, existe ainda a prova por indução finita, que envolve um passo base que corresponde
à uma demonstração dedutiva da proposição para um número natural; e um passo indutivo que
consiste na demonstração dedutiva da proposição geral: a validade da proposição para n implica
na validade da proposição para n + 1. Por tratar-se de uma técnica de demonstração importante
e poderosa para Ciência da Computação, a prova por indução será abordada em detalhes mais
adiante, no estudo de recorrência.
5
Resumo: Técnicas de Prova
A Tabela 8 resume as técnicas de prova discutidas neste documento.
Tabela 8: Resumo das Técnicas de Prova
Prova
Dedução
Direta
p→q
Contraposição
(¬q → ¬p) ≡ (p → q)
Contradição
[(p ∧ ¬q) → 0] ≡ (p → q)
Contradição
[¬p → 0] ≡ p
Equivalência
[(p → q) ∧ (q → p)] ≡ (p ↔ q)
Contra-Exemplo
∃a ∈ D(¬P (a))
Contra-Exemplo
∃a ∈ D(P (a) ∧ ¬Q(a))
27
Como provar
Assuma a premissa p verdadeira, e deduza
a conclusão q
Assuma a negação da conclusão ¬q verdadeira, e deduza a negação da hipótese ¬p
Assuma a hipótese p verdadeira, e a conclusão q falsa. Deduza uma contradição a
partir de (p ∧ ¬q). Se [(p ∧ ¬q) → 0], então o teorema (p → q) é verdadeiro, pois
[(p∧¬q) → 0] → (p → q) é uma tautologia
Assuma a negação da declaração p verdadeira, e deduza uma contradição (r ∧ ¬r) a
partir de ¬p. Se uma contradição é encontrada, então a declaração p é verdadeira
pois [(¬p → 0) → p] é uma tautologia.
Mostrar que as declarações (p → q) e
(q → p) são ambas verdadeiras, empregando qualquer um dos métodos de prova
conhecidos
Encontrar um elemento a ∈ D para o qual
P (a) é falso. Se isso ocorrer, então a declaração ∀x ∈ D(P (x)) é falsa.
Encontrar um elemento a ∈ D para o qual
P (a) é verdadeiro e Q(a) é falso. Se existir
tal elemento, então a sentença [P (a) →
Q(a)] será falsa, assim como a declaração
quantificada ∀x ∈ D([(P (x) → Q(x)]).
Divisão de Casos
Listar os casos e inspecionar a
validade do teorema para cada
caso
Exaustão
Inspecionar a validade do teorema para cada x ∈ D
Existenciais
Construtivas
Apresentar uma testemunha a
tal que P (a) seja verdadeiro
Existenciais NãoConstrutivas
Unicidade
Mostrar que ∃x(P (x)) sem
apresentar uma testemunha a
para o qual a sentença P (a)
seja verdadeira.
(i) mostrar que existe algum
elemento a tal que P (a) é verdadeiro;
(ii) mostrar que se existe um
elemento b tal que P (b) é verdadeiro, então a = b.
Vacuidade
Inspeção sobre o valor de p
Trivial
Inspeção sobre o valor de q
28
Se o teorema em questão é válido para todos os casos em separado, então ele é verdadeiro.
O teorema é provado verificando-se a sua
validade para cada elemento x do domínio.
Basta um contra-exemplo para provar que
o teorema é falso.
Se existe algum elemento a do domínio tal
que a sentença P (a) é verdadeira, então a
sentença quantificada ∃xP (x) será igualmente verdadeira.
Mostrar ∃x(P (x)) indiretamente.
Se existe um elemento a tal que P (a) é
verdadeiro, e nenhum outro elemento do
mesmo domínio possui essa propriedade,
então mostramos que ∃!xP (x).
Se p é falso, (p → q) é verdadeiro independente do valor de q
Se q é verdadeiro, então (p → q) também
é verdadeiro, independente do valor de p
6
Exercícios de Fixação
Resolva a seguinte lista de exercícios. Você poderá usar os axiomas, definições e teoremas provados
apresentados neste documento como parte do raciocínio dedutivo. Caso precise de mais axiomas,
definições, teoremas e fatos para completar a prova, você deverá pesquisar por contra própria e
destacar os resultados.
Use prova direta para demonstrar as afirmações dos Exercícios 1 à 3.
Exercício 1. Para todos os inteiros a e b, se a e b são pares, então a soma a + b é par.
Exercício 2. Para todos os inteiros a e b, se a e b são pares, então o produto a · b é par.
Exercício 3. Todo inteiro ímpar é a diferença de dois quadrados.
Demonstre que as seguintes afirmações são verdadeiras usando as provas direta, por contraposição
e por contradição.
Exercício 4. Se n é um inteiro par, então n + 7 é ímpar.
Exercício 5. Se n é um inteiro ímpar, então n + 11 é par.
Forneça uma prova por contraposição para as seguintes afirmações:
Exercício 6. Para todos os inteiros a e b, se a · b é ímpar, então a e b são ambos ímpares.
Exercício 7. Para todos os inteiros a e b, se a + b é par, então a e b são ambos pares ou ambos
ímpares.
Exercício 8. Para todo número real x e y, se x + y ≥ 100, então x ≥ 50 ou y ≥ 50.
Prove as afirmações dos Exercícios 9 à 12 por contradição:
Exercício 9. Para cada inteiro n, se n é ímpar, então n2 é ímpar.
Exercício 10. Não existem inteiros a e b para o qual 18a + 6b = 1.
Exercício 11. Para cada x ∈ [π/2, π], sin x − cos x ≥ 1.
√
Exercício 12. 6 é um número irracional.
Prove as afirmações dos Exercícios 13 à 18 usando qualquer uma das técnicas apresentadas neste
documento.
Exercício 13. Se n é um inteiro positivo, então n é par se e somente se 7n + 4 é par.
Exercício 14. Se n é um inteiro positivo, então n é ímpar se e somente se 5n + 6 é ímpar.
Exercício 15. Se x2 + 2x − 3 = 0, então x 6= 2.
29
Exercício 16. Se um número somado à ele mesmo resulta no próprio número, então este número
é zero.
Exercício 17. Se x é um inteiro par e primo, então x = 2.
Exercício 18. Se n é um inteiro ímpar, então 8 divide (n2 − 1).
Apresente um contra-exemplo para as seguintes afirmações:
Exercício 19. Toda figura geométrica com quatro ângulos retos é um quadrado.
Exercício 20. Todo quadrilátero com quatro lados iguais têm ângulos retos.
Prove, usando o método da exaustão, a declaração
Exercício 21. Seja o conjunto D formado pelos inteiros pares de 2 à 26, ou seja, D = {2, 4, 6, 8,
10, 12, 14, 16, 18, 20, 22, 24, 26}. Para todo número x ∈ D, x pode ser escrito como a soma de
no máximo 3 quadrados perfeitos.
Prove, usando prova por divisão em casos, as declarações:
Exercício 22. Se dois inteiros tem a mesma paridade, então sua soma é par.
Exercício 23. Se n ∈ N, então n2 + 3n + 4 é par.
Exercício 24. Prove que dado um número real x existem números únicos n e ǫ tais que x = n − ǫ,
com n inteiro e 0 ≤ ǫ < 1.
Exercício 25. Mostre que se a, b e c são números reais e a 6= 0, então existe uma única solução
para a equação ax + b = c.
Referências
[Rosen, K. H.] Matemática Discreta e suas Aplicações, Tradução da 6a. Edição em Inglês. Editora
Mc-Graw Hill Brasil, ISBN 978-85-7726-036-2, 2009.
[Gersting, J. L.] Fundamentos Matemáticos para Ciência da Computação, 3a. edição. Editora LTC,
ISBN 978-85-2161-422-7, 1995.
[Grimaldi, R. P.] Discrete and Combinatorial Mathematics: An Applied Introduction, 3rd. edition.
Adison Wesley, ISBN: 0-201-54983-2, 1994.
[Loureiro, A. A. F.]
Slides
sobre
matemática
discreta.
Disponível
em
http://homepages.dcc.ufmg.br/~loureiro/md/md_3MetodosDeProva.pdf.
Acessado
em Set/2012.
[Hammack, R.]
Book of Proof. Mathematics Textbook Series. Disponível em
http://www.people.vcu.edu/~rhammack/BookOfProof/BookOfProof.pdf.
Acessado em
Out/2012.
30
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Notas de Aula 2 - Ciência da Computação