Quantos somos os comunistas no país?
Afinal, quantos somos os comunistas no país? Um dos indicadores que denotam o grau de
maturidade de nossa corrente política no país tem a ver, sem dúvida, com sua estruturação
especificamente organizativa, ou seja, número de militantes inscritos, número de bases, número de
comitês. Insistente e corretamente, temos reafirmado em nossos planos de estruturação a
importância disso. Isso é uma (boa) tradição do movimento comunista, que desde Lênin e sua teoria
do partido revolucionário, inovou fortemente a prática dos partidos políticos modernos e fez escola
no século XX.
Entretanto, a questão é simples de enunciar, mas contingenciada por toda uma trajetória que nos
dificultou respondê-la com clareza, sobretudo a partir da legalidade alcançada em 1985. Vivemos
mais de três quartos de nossos 81 anos de existência em dura clandestinidade ou semiclandestinidade. Notoriamente, isso foi fator dificultador para a estruturação orgânica. O país, por
seu lado, não tem as tradições decantadas de experiência de partidos operários como os da Europa.
Tampouco o PCdoB pode utilizar os mesmos critérios dos demais partidos políticos tradicionais que
predominaram na cena brasileira – para os quais criar partidos, fundi-los, renomeá-los é tarefa quase
cotidiana, sendo o processo de filiação mero aspecto cartorial. É de referir ainda os aspectos da
legislação partidária restritiva no país, que até pouco tempo atrás impunha um controle burocrático
descabido sobre os partidos por parte dos Tribunais Eleitorais. Isso tudo complica muito as
respostas à questão.
Temos uma relação oficial de filiados ao partido, comunicado duas vezes ao ano aos TRE’s. Por
outro lado, temos em nossos cadastros um outro número de filiados que, por razões as mais
variadas, deixam de ser comunicados, mas que recebem alguma correspondência do Partido.
Ademais, em momentos mais elevados da vida partidária – eleições, conferências, etc – agregamos
um enorme número de aderentes que, sendo ou não filiados regularmente, militam
conjunturalmente. Isso confere um caráter de intensa flutuação nos efetivos partidários a cada
situação. Resulta, também, num trabalho de baixa qualidade no que se refere aos controles dos
cadastros de filiados, dificultando o estudo de nosso perfil militante. Na prática, dados nossos
critérios políticos e ideológicos, trabalhamos publicamente com o número de militantes
regularmente cadastrados a cada processo de Conferência e Congresso. Com a norma do ano
passado, que praticamente instituiu conferências anuais, atualizamos o número de nossos
contingentes quase anualmente. Fomos cerca de 30-35 mil nos dois últimos processos de 2001 e
2002. Mas atenção: muitos mais camaradas podiam se considerar comunistas.
De forma conseqüente com uma visão crítica e auto-crítica, lançamos enorme esforço pela maior
estruturação partidária, dando-lhe conteúdo político, ideológico e organizativo. Nos últimos cinco
anos, construímos quatro planos de estruturação. É a batalha da hora, presente ainda no esforço da
9a. Conferência Nacional. No essencial, trata-se de aumentar os efetivos partidários, e incorporá-los
à esfera da ação política partidária, em diversas variantes de atuação, tendo por pressuposto o
esforço de alargar e concretizar a noção de pertencimento ao Partido.
Avançamos, mas a situação nesse particular ainda é pouco satisfatória. Revela que ainda devemos
percorrer uma trajetória mais ou menos extensa, para superar essa imaturidade organizativa de
nossa corrente política, o que aponta também para a maturação na esfera ideológica. Nessa luta,
alguns pontos de partida estão dados. Temos reafirmado, como parte da contenda ideológica aguda
no seio da esquerda, nossa vocação de Partido de corte marxista-leninista, assentado no critério de
militância, cujos direitos e deveres estão nos Estatutos. Compreendemos a militância política como
manifestação mais elevada da consciência social e disso não queremos abrir mão. Persistimos,
portanto, nos critérios militantes. Afirmamos, no debate da 9a Conferência, que precisamos transitar
no sentido de um Partido Comunista de caráter revolucionário, classista, concebido
organizativamente com bases extensas, ou seja, um PC de massas, forte, de numerosa militância.
Temos consciência de que esse é também um fator de correlação de forças, na luta pela hegemonia.
Isso tem motivado indicações importantes, de definição do caráter e perfil da condição de militante,
do caráter e perfil das Organizações de Base que devem acolher esse contingente, aí incluído o
debate de eventual diferenciação de direitos e deveres entre militantes e filiados, sem perder a
marca leninista. É um debate que pode se construir para o 11o Congresso.
Conferimos, portanto, à luta na esfera organizativa, inteiro conteúdo político e ideológico. Mas a
par disso, não se pode descuidar dos aspectos estritamente organizativos. Foram expressos
centralmente no sentido de garantir a estruturação partidária pelas bases. Nisso está implicado, e é
de destacar, melhorar o controle das inscrições ao Partido, como ponto de partida para um trabalho
mais racional e planejado de alcançar o conjunto da militância em cada uma de nossas ações. Para
um Partido maior, isso será cada vez mais essencial e indispensável – conferir um caráter estrutural
e não apenas conjuntural ao funcionamento do Partido pelas bases.
Essa luta se estende também à esfera dos controles. É preciso compreender a importância do
controle dos que são inscritos no Partido, valorizar a atitude dos homens e mulheres que nos
procuram para assinar uma ficha de filiação. Não é ato de pouca significação, muito menos tem
caráter cartorial. Por isso mesmo, nossa atitude com isso precisa ser mais elevada e responsável.
Estamos dando curso a um novo sistema informático, interativo, ancorado na rede do Portal do
PCdoB, como instrumento que poderá ser muito útil para uma resposta mais clara da pergunta
original - quantos somos? - e para um efetivo estudo do perfil de nosso contingente militante.
Nossa trajetória, já se disse antes, foi marcada pela modelagem da experiência socialista e por
difícil clandestinidade. Foi própria de um partido de quadros, com pequena base militante. Há nessa
trajetória importantes originalidades, entre elas a ruptura de caráter revolucionário em 1962, e é de
referir, no aspecto político-organizativo, a experiência exitosa da UJS. Tal como nas lições que se
extraiu da derrota estratégica sofrida pelo socialismo, não vamos importar um modelo nem
tampouco soluções prontas. Vamos fazer nossa própria experiência, nos termos da tradição política
do país, de nosso povo, de nossa cultura, e das exigências próprias do movimento transformador no
Brasil. Por isso mesmo, os desafios são maiores. A luta na esfera organizativa é, portanto, uma das
dimensões irrecusáveis neste momento em que o PCdoB pode alcançar novo patamar em sua
estruturação
Walter Sorrentino
Publicado em 7 de maio de 2003
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