O conhecimento do professor de matemática sobre funções reais
Wanderley Moura Rezende
Instituto de Matemática e Estatística da Universidade Federal Fluminense
Brasil
[email protected]
Resumo
O artigo apresenta o relato de uma pesquisa sobre o conhecimento profissional do
professor de matemática da educação básica com relação ao tópico “funções reais”,
principalmente no que concerne, especificamente, ao comportamento variacional das
funções polinomiais. A coleta de dados da pesquisa, realizada em forma de estudo
de caso, foi obtida por meio de atividades realizadas pelo autor e sua orientada em
três eventos de educação matemática do estado do Rio de Janeiro e em uma turma de
especialização de Matemática para Professores do Ensino Fundamental e Médio do
Instituto de Matemática da Universidade Federal Fluminense.
Palavras chave: formação de professores matemática, funções reais, variabilidade,
cálculo, ensino de cálculo.
O que os professores de matemática (não) sabem sobre o conceito de função?
Diversos autores têm apontado a existência de algumas lacunas na formação de professores
de matemática com respeito ao conceito de função (Even,1990, 1998 e Hitt,1998, no exterior, e
Zuffi,1999, Rossini, 2006, Costa 2008 e Thees, 2009). Mas, então, o que sabem (ou, não sabem)
os professores de matemática sobre funções reais?
Ruhama Even realizou uma pesquisa com cento e sessenta e dois estudantes de licenciatura de oito universidades americanas, que deu origem a dois trabalhos, o primeiro publicado em
1990, o segundo, em 1998. Importa ressaltar que os sujeitos de sua pesquisa já tinham cursado a
disciplina de Cálculo e estavam no estágio final do curso de licenciatura. Em (EVEN, 1990), a
pesquisadora propõe como se deve investigar o conhecimento do professor acerca de determinado conteúdo matemático. Além da compreensão matemática, a autora sugere que outros aspectos
relacionados ao conteúdo devem ser observados. A importância do tópico “funções reais” na
Matemática e no seu currículo, pesquisas e trabalhos teóricos sobre o ensino e aprendizagem
deste tópico específico, são alguns dos aspectos que o professor de matemática também deve
conhecer. Em seu trabalho, publicado em 1998, Even observa que os professores investigados
XIII CIAEM-IACME, Recife, Brasil, 2011.
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não relacionam os vários modos de representação do conceito de função (diagrama de setas,
tabelas, expressão algébrica), bem como não conhecem as limitações inerentes a cada um deles.
Essas dificuldades em articular diferentes representações deste conceito também podem ser
observadas nas atitudes dos professores pesquisados por Hitt (1998) e por Costa (2008).
Seguindo a metodologia empregada por Even, Costa (2008) observou que a representação
simbólica do conceito de função dominava o pensamento dos professores, sujeitos de sua
pesquisa. Segundo o autor, a maioria dos entrevistados definiu função como “relação entre
conjuntos”, tendo, de maneira predominante, o “diagrama de setas” e a “representação gráfica”
como as primeiras imagens deste conceito. No entanto, em algumas situações de sua pesquisa,
os professores, diante da representação gráfica de algumas funções elementares (função
quadrática), sentiam necessidade de converter esta para a representação algébrica, para, em
seguida, resolver o problema por meio de tratamentos algébricos.
Os professores pesquisados por Hitt (1998) também definiram o conceito de função no
contexto algébrico, ora como um conjunto de pares ordenados, ora a partir de uma “regra de
correspondência”. Apenas três professores definiram funções como uma relação de
interdependência entre variáveis. Além disso, os professores demonstraram dificuldades em
identificar a variável independente em um determinado contexto físico.
Esta predominância do contexto estático e algébrico para a interpretação do conceito de
função também pode ser visto no trabalho de Rossini (2006). A pesquisadora, ao analisar os
mapas conceituais construídos pelos professores que participaram de sua pesquisa, observou que
eles utilizavam as seguintes palavras em seus mapas sobre funções: equação, lei, dependência,
independência, grandeza, velocidade, preço, pressão, vazão, temperatura, tempo, relação,
correspondência, par, seqüência, ordem – para descrever as concepções do conceito de função;
diagrama de Venn, Descartes, par ordenado, ponto, localização, origem, quadrantes, plano,
intervalo, bolinha aberta, bolinha fechada, infinito, ordenada, abscissa, gráfico, escala,
simetria, parábolas, retas, círculos, hipérbole, perpendicularismo, concorrência, ângulos, para
cima, para baixo, letras, números, x, y, grau, coeficiente, valor, positivo, negativo – para
designar os tipos de representações de funções; e função inversa, função composta, função
constante, função linear, função afim, função crescente, função decrescente, função par, função
impar, bijetora, injetora, sobrejetora, seno, cosseno, tangente – para indicar os tipos de funções.
Interessante observar que as palavras “função crescente” e “função decrescente” aparecem
na lista dos professores, no entanto, as noções de variação ou taxa de variação, sequer são
mencionadas. Tal fato evidencia o tratamento estático e superficial dado à imagem gráfica do
crescimento/decrescimento das funções estudadas. O professor, ao que parece, não dispõe de
mecanismos com os quais possa qualificar e quantificar o tipo de crescimento. Os depoimentos
de dois professores participantes da pesquisa de Rossini corroboram este pensamento:
Margarida lembrou que, anteriormente, só propunha aos alunos problemas do
tipo “Dada a função f(x) = -2x + 4, esboce o gráfico, mostre o coeficiente
angular e linear” e admitiu que “essa taxa de variação, já vimos, mas não ficou.
Nós não usamos no dia-a dia e não aplicamos na nossa aula”. César confessou
que não tratava de taxa de variação em sala de aula porque tinha medo.
(Rossini, 2006)
O cenário descrito acima sugere que as disciplinas de Cálculo Diferencial e Integral e de
Análise Real, presentes na grade curricular dos cursos de Licenciaturas em Matemática em nosso
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país, não têm cumprido com os seus papéis na formação desses professores de matemática.
Ratificando este ponto de vista, Zuffi (1999, p.205) acrescenta que a forma como o conceito de
função tem sido apresentado nestas disciplinas (ou mesmo em Álgebra, Álgebra Linear e
Topologia) pouco tem contribuído para a ampliação ou enriquecimento das imagens conceituais
destes futuros professores de matemática da educação básica. As imagens conceituais da noção
de função permanecem idênticas àquelas adquiridas em momentos anteriores à carreira
universitária.
Nesse sentido, o trabalho de Thees (2009), realizado sob orientação do autor deste artigo,
apresenta elementos contundentes da inoperância dos cursos de graduação de Cálculo para a
formação dos professores de matemática da educação básica, sobretudo, no que toca ao estudo
das funções polinomiais reais.
Passemos então à análise dos resultados dessa pesquisa.
O saber de conteúdo dos professores de matemática da educação básica sobre o
comportamento variacional das funções reais: um estudo de caso.
Com o desenvolvimento de algumas atividades principalmente aquelas relacionadas à
realização de minicursos ou oficinas, percebeu-se algumas dificuldades dos professores de
Matemática da educação básica na resolução de problemas que envolvem propriedades e habilidades
relacionadas ao comportamento variacional das funções reais. Essas evidências motivaram a questão
norteadora da pesquisa de Thees (2009): Como os professores da educação básica utilizam
propriedades e habilidades relacionadas ao comportamento variacional das funções afim e
quadrática na resolução de problemas?
Assim, tendo como meta principal a tarefa de mapear as dificuldades supracitadas, foram
considerados quatro grupos piloto de professores de Matemática: Grupo A – 25 participantes de
um minicurso apresentado no 31º Encontro do Projeto Fundão (UFRJ/2007); Grupo B – 10
participantes de um minicurso apresentado no V Encontro Sul Fluminense de Educação
Matemática (USS/2007); Grupo C – 14 professores-alunos que ingressaram no Curso de
Especialização em Matemática para Professores do Ensino Fundamental e Médio do IME-UFF
em 2008; Grupo D – 19 participantes de um minicurso apresentado na Primeira Jornada de
Matemática da FFP-UERJ (2008). Para caracterizar e descrever os sujeitos da pesquisa foi
elaborado e aplicado um questionário fechado, o qual também serviu para obter informações
relativas à situação profissional de cada um dos participantes. Para investigar o conhecimento do
professor a respeito do comportamento variacional das funções afim e quadrática, optou-se pela
aplicação de uma lista de questões contendo quatro problemas cujos contextos estavam relacionados
ao tema. Seguem as questões:
Atividade 1 – Fonte: (Botelho, 2005. p.46) – A tabela abaixo mostra a variação de posição de um trem
em movimento uniforme que passava no quilômetro 40 de uma ferrovia quando o movimento começou a
ser observado (t = 0). Depois de quanto tempo após o início da viagem, o trem passou pelo quilômetro
120 da ferrovia?
Tempo ( horas)
0
1
2
3
4
Espaço (km)
40
70
100
130
160
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Atividade 2 – Fonte: (Botelho, 2005. p.49) – Um estudante anotou a posição de um móvel em
movimento uniformemente variável ao longo do tempo e obteve a seguinte tabela:
Tempo (s)
Posição (cm)
0
17
10
45
20
81
30
125
40
177
50
237
Calcular a posição do móvel nos instantes 5s e 35s.
Atividade 3 – Fonte: (Lima et al, 2001, p.103) – Uma escala N de temperatura foi feita com base nas
temperaturas máxima e mínima em Nova Iguaçu. A correspondência com a escala Celsius é a seguinte:
°C
18°
43°
°N
0°
100°
Em que temperatura ferve a água na escala N ?
Atividade 4 – Fonte: (Lima et al, 2001, p.150) – Uma pessoa possui um gravador de vídeo dotado
de um contador que registra o número de voltas dadas pelo carretel da direita. A fita, de 6 horas de
duração, está parcialmente gravada. O contador indica 1750 ao final do trecho gravado e 1900 ao
final da fita. Medindo o tempo de gravação correspondente às primeiras 100, 200, 300 e 400 voltas,
foram encontrados os dados abaixo:
Volta
Tempo (s)
100
555
200
1176
300
1863
400
2616
Quanto tempo resta de gravação na fita?
Os problemas foram propostos para serem resolvidos pelos participantes em até uma hora. Foi
permitido o uso da calculadora e, em um dos grupos pesquisados, a calculadora foi substituída por
um computador com planilha eletrônica. O objetivo principal desta pesquisa era investigar quais as
estratégias e ferramentas utilizadas pelos participantes para descobrir a lei de formação da função a
partir dos dados de um problema.
Dos 68 participantes da pesquisa, 25 eram alunos de graduação em Matemática ou pósgraduação em Matemática ou em Ensino de Matemática e ainda não atuavam como professor; 41
participantes atuam como professores de Matemática, sendo que 80% destes atuavam no ensino
médio, graduação ou pós-graduação.
Apresentação das categorias de análise da resolução das atividades da pesquisa
Estudos sobre divergências entre corretores em provas dissertativas de Matemática
levaram-nos a buscar uma situação ideal de correção e de análise das resoluções das
atividades apresentadas pelos participantes desta pesquisa. Em seu artigo, Moretti (2008)
indica as vantagens da prática da multicorreção de provas: “pensamos que a explicação das
divergências entre corretores é um pré-requisito necessário para visar o objetivo da uniformização.”
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A partir do reconhecimento desta situação, realizamos primeiramente um estudo
comparativo das resoluções por questão. Tanto as respostas corretas quanto as respostas
incorretas foram classificadas visando uniformizar as resoluções dos sujeitos da pesquisa. Após
o levantamento das similaridades encontradas nas resoluções de cada questão, utilizamos as
legendas Cn e In para classificar, respectivamente, as diversas modalidades de resoluções
corretas e incorretas. Algumas respostas não estavam nem corretas, nem incorretas, por isso
não puderam ser classificadas de acordo com as categorias descritas acima. São questões que não
foram resolvidas, deixadas literalmente “em branco” (EB); questões não finalizadas (NF) que,
apesar de iniciadas, não foram terminadas, impossibilitando sua classificação em corretas ou
incorretas; e, finalmente, questões com resolução incongruente (RI), que são questões
resolvidas ou não, mas cuja resolução está incompatível com o enunciado.
Passemos então a análise dos resultados obtidos.
Alguns indicadores quantitativos das resoluções
Para que os resultados obtidos na pesquisa pudessem ser observados de forma organizada,
optamos por apresentar tabelas e gráficos, lado a lado, de modo a fornecer ao leitor uma
interpretação mais rápida e objetiva.
Iniciaremos a apresentação dos resultados com uma análise geral, constituída de todos os
grupos (A, B, C e D) e todas as questões (1, 2, 3 e 4) reunidas. Neste tipo de análise as categorias
de resposta não podem estar classificadas em Cn e In pelo fato de cada questão (1, 2, 3 e 4)
apresentar uma variedade de tipos de respostas corretas ou incorretas que não estão
relacionadas entre si. Por exemplo, uma resposta do tipo C1 relativa à questão 1 nada tem a ver
com uma resposta do tipo C1 relativa à questão 2. Sendo assim, o que consideramos ser uma
categoria de respostas resumida engloba as respostas classificadas como corretas, incorretas, em
branco (EB), não finalizadas (NF) e resoluções incongruentes (RI).
Todos os Grupos x Todas as Questões x Categoria de Resposta Resumida
Tabela 1
Todos os grupos x todas as questões
Respostas
Qtde.
Corretas
83
Incorretas
113
Em branco (EB)
51
Não finalizadas (NF)
8
Resoluções incongruentes (RI)
9
Total geral
264
A partir da observação dos dados da tabela e do gráfico, percebe-se que as repostas
incorretas (43%) em conjunto com as respostas em branco (19%), com as não finalizadas (3%) e
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com as resoluções incongruentes (3%), perfazem uma quantidade significativa de 181
respostas, que representam mais de dois terços do total de respostas analisadas. Este resultado
inicial, por si só, já não é nada animador.
Contudo, percebemos que este comportamento não representa o perfil dos resultados
obtidos para cada uma das questões. Sendo assim, apresentaremos os dados estatísticos das
quatro questões separadamente, mantendo os participantes ainda agrupados e classificando as
respostas quanto ao tipo de resolução. Por limitação de espaço do template fornecido para esta
modalidade de artigo, não entraremos na especificação de todas as categorias In e Cn de cada
questão. Comentaremos sobre as categorias apenas quando a análise destas se fizerem necessária
para uma análise mais qualitativa da questão.
Todos os Grupos x Questão 1 x Categoria de Respostas Classificadas
Nesta organização de dados, pode-se verificar as respostas corretas, incorretas, em branco,
não finalizadas e as resoluções incongruentes apresentadas pelos participantes da pesquisa para
solucionar a questão 1. 77% dos participantes resolveram corretamente a questão.
Tabela 2
Todos os grupos x questão 1
Respostas
Corretas do tipo 1 (C1)
Corretas do tipo 2 (C2)
Corretas do tipo 3 (C3)
Corretas do tipo 4 (C4)
Subtotal Corretas
Incorretas do tipo 1 (I1)
Incorretas do tipo 2 (I2)
Subtotal Incorretas
Em branco (EB)
Não finalizadas (NF)
Resoluções incongruentes (RI)
Qtde.
6
22
5
18
51
3
8
11
2
1
1
Nas 11 resoluções classificadas como incorretas, os professores utilizaram modelos lineares
( s = k ⋅ t ) para resolver o problema.
Figura 1. Resolução incorreta do tipo 2 (I2) da questão 1: espaço (s) proporcional ao tempo (t), s = Δs t .
Δt
Todos os Grupos x Questão 2 x Categoria de Respostas Classificadas
Apenas um participante resolveu esta questão corretamente. Nas respostas incorretas
(74%), predominam modelos em que a variável s é proporcional à variável t ( s = k ⋅ t ) ou em que
a variação de s é proporcional à variação de t ( Δs = k ⋅ Δt ).
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Tabela 3
Todos os grupos x questão 2
Respostas
Corretas do tipo 1 (C1)
Subtotal Corretas
Incorretas do tipo 1 (I1)
Incorretas do tipo 2 (I2)
Incorretas do tipo 3 (I3)
Incorretas do tipo 4 (I4)
Subtotal Incorretas
Em branco (EB)
Não finalizadas (NF)
Resoluções incongruentes (RI)
Qtde.
1
1
36
8
4
1
49
11
4
1
Cabe observar que as questões 1 e 2, embora inseridas no mesmo contexto
(cinemática), são modeladas por funções polinomiais de graus diferentes (função afim e
quadrática) e apresentaram resultados bem diferentes.
Figura 2. Resolução incorreta do tipo 1 (I1) da questão 2: o participante utilizou regra de três simples
entre Δs e Δt em dois intervalos de tempo distintos.
Todos os Grupos x Questão 3 x Categoria de Respostas Classificadas
Nesta questão, a quantidade de resoluções corretas (47%) está próxima da quantidade de
resoluções incorretas, em branco, não finalizadas e incongruentes (53%). Um comparação entre
as resoluções apresentadas pelos participantes para as questões 1 e 3, ambas modeladas por
uma função afim, mas com respostas tão discrepantes, sugere-nos que a mudança do contexto
(cinemática para termodinâmica) pode ter sido o fator decisivo para esses resultados
diferenciados.
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Tabela 4
Todos os grupos x questão 3
Respostas
Corretas do tipo 1 (C1)
Corretas do tipo 2 (C2)
Subtotal Corretas
Incorretas do tipo 1 (I1)
Incorretas do tipo 2 (I2)
Incorretas do tipo 3 (I3)
Incorretas do tipo 4 (I4)
Incorretas do tipo 5 (I5)
Incorretas do tipo 6 (I6)
Incorretas do tipo 7 (I7)
Subtotal Incorretas
Em branco (EB)
Não finalizadas (NF)
Resoluções incongruentes (RI)
Qtde.
5
26
31
1
4
12
2
1
2
2
24
9
1
1
Outro ponto que deve ser destacado é a variedade de tipos de resoluções incorretas (de I1
até I7), com destaque para as incorretas do tipo 3, na qual 12 participantes utilizaram a regra de
três direta entre os valores das temperaturas em ºC e em ºN.
Figura 3. Resolução incorreta do tipo 3 (I3): o participante utilizou a regra de três entre as temperaturas
em ºC e em ºN
Todos os Grupos x Questão 4 x Categoria de Respostas Classificadas
Para esta questão, nenhum participante apresentou uma solução correta.
Tabela 5
Todos os grupos x questão 4
Respostas
Qtde.
Incorretas do tipo 1 (I1)
5
Incorretas do tipo 2 (I2)
21
Incorretas do tipo 3 (I3)
3
Subtotal Incorretas
29
Em branco (EB)
29
Não finalizadas (NF)
2
Resoluções incongruentes (RI)
6
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Das respostas incorretas, 73% eram de resoluções do tipo 2, na qual o participante utilizou
uma regra de três simples entre Δn (variação do número de voltas) e Δt (variação do tempo).
Cabe destacar ainda que os outros dois tipos de resoluções incorretas utilizam propriedades da
função afim ou linear.
Figura 4. Resolução incorreta do tipo 2 (I2) : o participante utilizou a regra de três entre Δn e Δt
Considerações finais
Diante deste cenário, surge uma questão natural e de interesse fundamental para este
artigo: por que prevalece o modelo linear ou afim nas respostas dadas pelos professores que
participaram da pesquisa? Por que os professores de matemática não usam outros modelos em
suas resoluções?
As respostas dadas pelos professores sugerem que eles situam o problema no universo
algébrico, onde o mecanismo conhecido como “regra de três” é a chave para solução do
problema. Quer dizer, ou a variável dependente y é proporcional à variável independente x, ou a
variação da variável dependente y, Δy , é proporcional à variação da variável independente x,
Δx . O comportamento variacional da função quadrática, ou mesmo de outras funções
elementares usualmente ensinadas na educação básica, não são consideradas por esses
professores. Aliás, a função que modela o problema, em geral, não é mencionada. Ela permanece
camuflada nos mecanismos algébricos (onde a regra de três é um deles) que utilizam para
resolver a questão.
Vale destacar que, mesmo nos casos em que os problemas deveriam ser modelados por
uma função afim, ainda encontramos um número expressivo de professores com dificuldades em
reconhecer tal função como modelo para resolver as questões apresentadas (23% do grupo
pesquisado apresentou essas dificuldades na resolução da questão 1 e 53 %, na resolução da
questão 3). Com relação à questão 1, por exemplo, 17% usaram o fato de o espaço (s) ser
proporcional ao tempo (t), uma propriedade da função linear que não se aplica à resolução do
problema, visto que neste caso o espaço s é uma função afim não- linear de t. A incidência deste
tipo de erro, conforme já observamos, agrava-se ainda mais na resolução da questão 3.
XIII CIAEM-IACME, Recife, Brasil, 2011.
O conhecimento do professor de matemática sobre funções reais
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Com base nessa análise, surge então uma questão imediata: por que então esses
professores, ao resolverem as questões apresentadas, não fazem relação destas com o estudo do
comportamento variacional das funções reais elementares?
Ora, esses conteúdos são usualmente ensinados em uma disciplina de Cálculo, que faz
parte do currículo mínimo de qualquer curso de Licenciatura em Matemática de nosso país. A
partir dos resultados desta pesquisa e das observações dos nossos parceiros teóricos pode-se
concluir que as disciplinas de Cálculo não estão, de fato, cumprindo seu papel na formação dos
professores de matemática da educação básica. Fato lamentável, se considerarmos o papel
construtor dos conceitos e problemas do Cálculo para o desenvolvimento da própria matemática.
Do ponto de vista epistemológico, os conhecimentos do Cálculo representam, metaforicamente
falando, a espinha dorsal do conhecimento matemático. Áreas e volumes de corpos redondos, o
conceito de número real e o estudo das funções reais, sem as idéias fundamentais do Cálculo,
perdem o sentido e os seus significados. Sem este conhecimento, a formação matemática do
professor de matemática fica sem dúvida comprometida. Assim, para tornar o curso de Cálculo
mais eficaz para a formação do professor de matemática da educação básica talvez devêssemos
começar nossa investigação com a seguinte pergunta: pra que serve mesmo um curso de Cálculo
na formação deste professor? Mas isso é assunto para um outro artigo.
Bibliografia e referências
Botelho, L. M. L. (2005) Funções Polinomiais na Educação Básica: Uma Proposta. Monografia
(especialização) em Ensino de Matemática. Instituto de Matemática. UFF. Niterói.
Costa, C. B. J. (2008) O Conhecimento do Professor de Matemática sobre o Conceito de Função.
Dissertação (mestrado) em Ensino de Matemática. Instituto de Matemática. UFRJ. Rio de Janeiro.
Even, R. (1990) Subject matter knowledge for teaching: the case of functions. Studies in Mathematics.
v.21, p. 521-544.
_______ (1998) Factors Involved in linking representations of functions. The Journal of Mathematical
Behavior. v.17, n. 1, p.105-121.
Hitt, F. (1998) Difficulties in the articulation of different representations linked to the concept of function.
Journal of Mathematical Behavior. v.17, n.1, p.123-134.
Lima, E.L., Carvalho, P. C. P., Wagner, E. & Morgado, A. C. (2001) A Matemática do Ensino Médio.
Coleção do Professor de Matemática. Volume 1. Sociedade Brasileira de Matemática. Rio de
Janeiro.
Moretti, M. T (2008) Estudo sobre divergências entre corretores em provas dissertativas de Matemática.
Educação Matemática em Revista. SBEM, Nº 24. UFPE. Recife.
Rossini, R. (2006) Saberes Docentes sobre o tema Função: uma Investigação das Praxeologias. Tese
(doutorado) em Educação Matemática. Faculdade de Ciências Exatas e Tecnologia. PUC-SP. São
Paulo.
Thees, A. V. (2009) Um estudo de caso do conhecimento do professor de matemática da educação básica
sobre o comportamento variacional das funções afim e quadrática. Monografia (especialização)
em Ensino de Matemática. Instituto de Matemática. UFF. Niterói.
Zuffi, E. M. (1999) O tema “funções” e a linguagem matemática de professores do Ensino Médio – por
uma aprendizagem de significados. Tese (doutorado) em Didática - Ensino de Ciências e
Matemática. Faculdade de Educação. USP. São Paulo.
XIII CIAEM-IACME, Recife, Brasil, 2011.
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