Resenha Crítica em homenagem ao centenário da morte de
Machado de Assis
Colégio: E.E. Prof. Christino Cabral – Bauru – SP
Profa. Eunicéa de Oliveira Souto Cândido
Aluno: Jéssica Bezerra Paiva
Neste ano de 2008, comemora-se o centenário da morte de
Machado de Assis, célebre escritor da língua portuguesa falecido em 1908.
Nascido no Rio de Janeiro em 21 de junho de 1839, Joaquim Maria
Machado de Assis viria se tornar jornalista, contista, cronista, poeta,
teatrólogo e romancista, sendo considerado o maior escritor brasileiro. De
saúde frágil, gago e epilético, e mesmo sem ter acesso a cursos regulares,
o autodidata Machado de Assis empenhou-se em aprender. Aprendeu
francês, inglês, alemão e latim, possuía amplo conhecimento da cultura e
história geral e foi influenciado posteriormente pela formação européia de
sua esposa Carolina Xavier de Novais, que o colocou a par das literaturas
inglesa, francesa e portuguesa.
Dono da característica ironia machadiana e de um humor mordaz,
seu estilo sarcástico e amargo, desiludido e reticente é inconfundível.
Revelou-se um mestre da observação psicológica e da duplicidade de
sentido. Possuía o domínio da linguagem e abusava do uso de metáforas
em suas obras, sobretudo em Memórias Póstumas de Brás Cubas. O livro
publicado em 1881, apresenta as mais radicais experimentações na prosa
brasileira até então, inaugurando o Realismo e apresentando o romance
psicológico na literatura brasileira. Com foco na caracterização interior dos
personagens, enfatiza os problemas existenciais em vez de a vida social e
os espaços externos, Machado de Assis surpreende com sua Inteligência e
ironia finas.
Organizados em partes curtas, os 160 capítulos da narrativa seguem
a ordem do pensamento do narrador, o “defunto autor” Brás Cubas, que
inicia o romance com uma dedicatória em forma de epitáfio. Brás Cubas
reconta a própria vida, do final para o começo, num relato franco e
reflexivo. Típico burguês da segunda metade do século XIX, está sempre
procurando a melhor maneira de tirar vantagem ou ser reconhecido. É um
sujeito contraditório e sem objetivos, que passou a vida sem alcançar
nenhuma realização real, nem mesmo seu emplastro, o medicamento
sublime para todos os males, que viria a perpetuar o seu nome na
sociedade: “Este último capítulo é todo de negativas. Não alcancei a
celebridade do emplastro, não fui ministro, não fui califa, não conheci o
casamento. Verdade é que, ao lado dessas faltas, coube-me a boa fortuna
de não comprar o pão com o suor do meu rosto. Mais; não padeci a morte
de Dona Plácida, nem a semidemência de Quincas Borba. Somadas umas
coisas e outras, qualquer pessoa imaginará que não houve míngua nem
sobra, e conseguintemente que sai quite com a vida. E imaginará mal;
porque ao chegar a este outro lado do mistério, achei-me um pequeno
saldo, que é a derradeira negativa deste capítulo de negativas. Não tive
filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado de nossa miséria”.
Memórias Póstumas de Brás Cubas foi adaptado três veze4s para o
cinema, contudo, em 2001 teve a sua versão mais fiel ao livro: “Memórias
Póstumas”. O filme foi dirigido por André Klotzel, diretor, roteirista,
produtor e editor, estudou cinema na Universidade de São Paulo e é dono
da produtora Brás Filmes. O filme traz no elenco Reginaldo Faria e
Petrônio Gontijo no papel de Brás Cubas, Sônia Braga como Marcela,
Stepan Nercessian como Bento Cubas e Marcos Caruso como Quincas
Borba.
Bem humorado, o filme conta com belas locações e excelentes
atuações e fotografia e é bastante semelhante ao livro quanto ao uso de
metáforas e de passagens com duplicidade de sentido. Analisando o
trecho do filme correspondente aos capítulos de XIV e XVIII, nota-se o
cuidado do diretor em quase transcrever literalmente algumas frases do
livro, como: “éramos dois rapazes, o povo e eu. Vínhamos, da infância com
todos os arrebatamentos da juventude” e “Marcela não possuía a
inocência rústica, e mal chegava a compreender a moral”, entretanto os
fatos não ocorrem na mesma ordem do livro, para que haja uma otimação
do tempo. Há ainda modificações com a troca dos termos para atualizar o
romance. No livro, Brás Cubas compara as fases de seu romance com
Marcela: “na primeira (fase consular, segundo ele) regemos o Xavier e eu,
sem que ele jamais acreditasse dividir comigo o governo de Roma”.
Enquanto no filme diz: “a primeira foi uma espécie de parlamentarismo,
em que o Xavier era o presidente e eu o primeiro ministro”. O acréscimo de
algumas metáforas também é notado, como quanto compara a um anjo
os banqueiros e joalheiros. “Então, apelei ao meu anjo da guarda. Na
verdade, ele se parecia mais com um gerente de banco. Os anjos e os
demônios se disfarçam de muitas maneiras alguns, tomam a forma de
banqueiros, outros de joalheiros”, o que demonstra a preocupação do
diretor em conservar o estilo de Machado de Assis...
Entretanto, faz supressões de partes importantes não entrando
muito em detalhes e peca com o pouco uso da ironia, que é bastante
característica no livro. Há um salto dos capítulos XVI e XVII, em que há a
discussão de Cubas e seu pai, sobre os gastos do filho e a tentativa de
levar Marcela com ele para a Europa, para o capítulo XVIII – Visão do
corredor, em que diz: “Marcela amou-me por quinze meses e onze contos
de réis”, para então ser surpreendido por seu pai a saída da casa de
Marcela. É claro que tais supressões são feitas para reduzir o tempo do
filme, que com certeza ficaria muito extenso se todas as digressões de
Brás Cubas fossem incluídas. Os traços psicológicos do romance ficam a
cargo das interpretações dos atores. Apesar das adaptações que foram
feitas no filme, como o uso da troca do termo leitor do espectador, por
exemplo, Brás Cubas interage com o leitor e o convida a refletir sobre suas
digressões e o ritmo da história não fica perdido.
O filme traz em sua essência as características machadianas, graças
às adaptações inteligentes feitas por Klotzel. Bom filme, boa adaptação,
recomendado a todos que apreciam cinema, sobretudo aos fãs de
Machado de Assis e àqueles que desejam conhecer melhor o estilo deste
imortal da Literatura Brasileira.
Jéssica Bezerra Paiva, aluna da terceira série do Ensino Médio da
E.E.Prof. Christino Cabral – Bauru – SP.
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