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CTG - UFPE - 2011
TRÊS DÉCADAS DE DITADURA MILITAR: O CASO DOS
MARACATUS LEÃO COROADO, PORTO RICO E INDIANO
Rosana Maria dos Santos¹ ; Beatriz de Miranda Brusantin2
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Estudante do Curso de História- CFCH – UFPE; E-mail: [email protected],
²Docente/pesquisadora do Depto do Curso de História- UNICAP; E-mail: [email protected]
Sumário: O trabalho se propõe analisar como atuaram as nações de maracatu: Leão
Coroado, Nação Porto Rico e o Indiano nas décadas de 60, 70 e 80 (período da ditadura
militar no Brasil). Esse período foi marcado pela resistência popular ao regime. À medida
que se desenvolviam movimentos sociais populares de oposição, se tornou necessário
contê-los e mostrar para o resto do mundo a imagem de um país alegre, cheio de cores o
país do carnaval. Controlar a cultura popular sempre foi um dos mecanismos dos períodos
ditatoriais no Brasil. Nos anos trinta e quarenta (durante o Estado Novo), essa idéia de
“integração nacional” também foi utilizada. Desse modo, o objetivo central da pesquisa, é
procurar entender como os sujeitos, ou melhor, como os maracatuzeiros viveram esse
período, e de que forma o regime impõe a sua “doutrina” sobre os maracatus nação no
carnaval do Recife.
Palavras-chave: carnaval do recife; ditadura militar; maracatu nação
INTRODUÇÃO
O Período da ditadura militar no Brasil inicia-se em mil novecentos e sessenta e quatro e
tem fim em mil novecentos e oitenta e oito, com a nova constituição que permitiu a
reestruturação dos partidos políticos, dos sindicatos e o direito eleitoral da sociedade civil,
para assim escolher seus representantes. Apesar da forte repressão a sociedade organizava
seus protestos movida pelo sentimento de medo e indignação, e a revolta tomava conta do
país. Nesse período se intensifica na sociedade brasileira a luta de classes, identificada por
um confronto direto entre as camadas. A vigilância e a repressão, realizada pelas
instituições dominantes foram fatos comuns do regime. Os negros eram considerados,
infantis, ignorantes, raça de inferiores e perigosos. Um exemplo disso está definido numa
inscrição gravada na Escola de Polícia de São Paulo que dizia: “Um negro parado é
suspeito; correndo, é culpado”. (CHAUÍ, 1993). Desse modo, as classes consideradas
“inferiores” (pobres e negros) carregam os estigmas da suspeita, da culpa, essa “classe” é
vigiada constantemente para assim, conter o “povo”. Durante o regime, houve uma
“modernização conservadora”, essa expressão encontra grande receptividade entre
cientistas e políticos brasileiros e norte americanos e que levou a designar o Estado e o
governo como um novo autoritário, para diferenciá-lo do antigo sentido que o
autoritarismo tinha na sociedade. Surgi assim, interesse ao carnaval e principalmente pelo
turismo. À medida que se desenvolviam movimentos sociais populares de oposição,
tornando necessário contê-los e mostrar para o resto do mundo a imagem de um país
alegre, cheio de cores o país do carnaval. Controlar a cultura popular sempre foi um dos
mecanismos dos períodos ditatoriais no Brasil. Nos anos trinta e quarenta (durante o
Estado Novo), essa idéia de “integração nacional” também foi utilizada. O Brasil precisava
mostrar-se “limpo”, por isso todas as mazelas sociais são colocadas a margem. No Recife,
por exemplo, há uma “limpeza” da cidade, onde os flagelados e pobres começam a ser
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colocados nas periferias para que o centro da cidade possa apresentar uma imagem de
desenvolvimento aos turistas que chegam. Muitos terreiros nessa época também são
perseguidos, e muitos de seus líderes religiosos são presos como Maria Júlia Nascimento
(Dona Santa) que foi acusada por praticar o catimbó na ditadura dos anos trinta. Assim o
objetivo central do trabalho, é procurar entender como os sujeitos, ou melhor, como os
maracatuzeiros viveram esse período, e de que forma o regime impõe as sua “doutrina”.
Uma vez que, o maracatu nação tem a sua origem nas “senzalas”, que para facilitar a
administração dos negros, é incentivada pelo colonizador português, a instituição dos reis e
rainhas negros sob a proteção das irmandades de nossa senhora do Rosário e de São
Benedito cujos cortejos de coroação deram origem ao maracatu. Os maracatus nação que
também são conhecidos como maracatu de baque virado tem a sua origem nas coroações
de reis e rainhas negros denominados reis de Congo, com o objetivo de subordinação,
administração e controle dos escravos.
MATERIAIS E MÉTODOS
Para alcançar os objetivos dessa pesquisa foi necessário dar voz aos maracatuzeiros,
maracatuzeiras e mães de santo. E para isso, foram utilizadas fontes orais, que nos últimos
anos adquiriram uma relevância social e cultural na pesquisa histórica. Esse tipo de fonte
possibilita o resgate de temáticas da história do povo, ou seja, permite aos“marginalizados”
ter voz, buscando valorizar os sujeitos esquecidos, que a história tradicional não se utiliza.
A metodologia utilizada foi a de fontes primárias e secundárias. Por se tratar de uma
pesquisa que apresenta poucas fontes secundárias (livros), que tratam do tema de forma
explicita, no trabalho foram utilizados questionários e entrevistas com os principais atores
sociais que saibam falar da resistência ao regime militar. Essas entrevistas foram
importantes para o trabalho, pois busca informações sobre a tortura, perseguição e a
interdição. Esse artifício tem validade quando se destrói notas de alguns processos
históricos, como a queima de documentos sobre a “subversão” promovida por autoridades
no poder com o intuito de apagar a presença da oposição. O mesmo acontece quando em
situações de repressão, quando superada, há uma tentativa de negar o papel tirânico do
ditador (MEIHY; HOLANDA, 2010).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Para facilitar a administração dos negros em terras brasileiras, Portugal no século XVI,
revolve incentivar instituições dos reis e rainhas negros sobre a proteção das irmandades de
nossa Senhora do Rosário e de São Benedito, cuja coroação dará origem ao maracatu.
Ficando o rei do congo obrigado a vigiar e manter a ordem e a subordinação entre os
negros que lhe forem submetidos. Com a abolição da escravidão negra no Brasil, no ano de
1888, a coroação dos reis do Congo perde a sua razão de existir, já não se fazia mais
necessário ter um rei negro para disciplinar os negros escravizados. O cortejo dos reis do
congo, desse modo, transforma-se no maracatu que se conhece hoje. (SILVA, 1988). No
Recife, os cortejos dos reis negros se transformaram em maracatu a partir do final da
primeira metade do século XIX, para caracterizar um agrupamento de negros andando
pelas ruas da cidade. A presente pesquisa se propõe a analisar a história dos maracatus
Porto Rico, Leão Coroado e Indiano durante o regime militar de sessenta e quatro. O
primeiro foi criado durante o regime, o segundo consegue passar pelo regime sem ser
interrompido, apesar das dificuldades financeiras, e o último passa por transformações
antes do regime militar e durante o período militar consegue uma grande visibilidade. A
história da nação Porto Rico do Oriente inicia em 1967, quando Eudes resolve criar um
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maracatu. Eudes procura João Santiago, do Serviço de Recreação e Turismo da Prefeitura
Municipal do Recife (REAL 2001). O maracatu que foi criado durante o período da
ditadura militar, consegue passar pelo período sem ser interrompido, pois, diante dos dados
levantados e entrevistas realizadas não foram encontrados nenhum registro de repressão
explicita aos maracatuzeiros desse grupo pelo regime. As dificuldades foram muitas, o
maracatu segundo as pessoas entrevistadas, era muito pobre com poucas pessoas, havendo
assim, pouca inovação. O maracatu Leão Coroado foi fundado em 1863 é considerado um
mais antigos, sem ser interrompido, conseguindo assim chegar até os dias atuais.Uma das
maiores referências quando se fala no maracatu Leão Coroado é o lendário Luiz de França
(respeitado oluô, sacerdote máximo na religião africana). Não havendo uma perseguição, o
maracatu conseguiu chegar até os dias atuais sem ser interrompido, pois Luiz de França foi
um homem que viveu para o seu maracatu e que não mediu esforços para ter visibilidade
dentro da sociedade pernambucana. O maracatu Indiano trás em sua trajetória pelo
carnaval do Recife uma característica que é de fundamental importância para compreender
até que ponto as agremiação deveriam se adequar as exigências da Federação Carnavalesca
de Pernambuco. Ele foi um maracatu de orquestra, ou como é mais conhecido nos dias de
hoje, era um maracatu rural, que se transforma maracatu nação por ordem da Federação
Carnavalesca de Pernambuco em 1957. Essa perseguição aos maracatus de orquestra só
tem fim nos anos 70. O indiano apresenta uma característica singular, pois não sendo uma
autêntica “nação africana”, consegue se adequar as exigências que os organizadores do
carnaval lhe impunham. E ganha destaque. Zé Gomes não viu a intervenção da Federação
de forma repressora, porque ele possuía uma experiência política que lhe dava condições
de resistir. Talvez ele desejasse o sucesso do seu maracatu, por isso, obedeceu as regras e
por muitos anos brilhou nos carnavais do Recife e entre os que admiravam a sua
generosidade.
CONCLUSÕES
O objetivo principal dos militares não era a repressão declarada à cultura popular, ao
carnaval, expressão máxima do povo. Muito pelo contrário, a ideologia da época era de
um país onde a democracia racial e a alegria do carnaval fosse inerente aos brasileiros. A
ditadura deste período se caracteriza pelos seus mecanismos de construção ideológica de
um “povo que ama o seu país”. A idéia de que na “nação” brasileira todos vivem alegres,
cheios de liberdade e com seus direitos humanos respeitados. Mas, essa idéia de
“democracia” cultural expressa pela ditadura esconde o seu principal objetivo que é o de
conter o povo, de discipliná-los, torná-los civilizados para mostrar a opinião pública
internacional uma realidade deturpada pelos aparelhos de repressão. Desse modo, ao
estudar a atuação dos maracatus Nação Porto Rico, Leão Coroado, Indiano entre 1964 e
1988, percebe-se que a repressão aos maracatus não foi declarada, mas gerou para essas
“Nações africanas” momentos difíceis, principalmente após o período da morte de Dona
Santa em 1962. Nessa época, no Recife, existiam poucas nações de maracatu, chegando até
mesmo alguns folcloristas como Katarina Real e Guerra Peixe afirmarem o fim dos
maracatus. As autoridades faziam ouvidos “moucos” para as questões voltadas para arte
popular. Porém, mesmo diante destes processos históricos de repressão e “falso apoio”, se
os grupos de maracatus conseguiram chegar até os dias de hoje deve-se primeiramente aos
seus líderes e as suas habilidades para angariar recursos para os seus grupos. E não
podemos esquecer os integrantes dos maracatus que, mesmo em tempos difíceis e sem
prestígio público, defendiam a sua “nação” com muita propriedade. Vale as ações de
Natérsio, mestre do Indiano e seu Veludinho que dedicaram suas vidas em nome da
“tradição”. No mais, vale ainda ressaltar a iniciativa de alguns membros dos órgãos
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públicos interessados em manter a tradição. A Cultura feita pelos negros ainda hoje tem
pouca repercussão no país. O negro ainda é motivo de suspeita por parte da sociedade. E na
época (ditadura militar) não era diferente, nas imagens que a EMBRATUR fazia e vendia
como atrativo do Brasil, a cultura negra, tais como, a religião e costumes só era divulgada
em último caso, sendo a cultura “branca” divulgada e difundida como a imagem do país.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Biblioteca Pública do Estado de Pernambuco, a Fundação Joaquim Nabuco, a
Casa do Carnaval do Recife, a Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de
Pernambuco. Agradeço também Ivaldo Lima pela disponibilidade em responder algumas
dúvidas e conselhos fundamentais para a pesquisa, Elda Viana, Afonso Aguiar, Enésia,
Maria de Quixaba que contribuíram para pesquisa, pois sem eles ela não seria possível. E a
Beatriz de Miranda Brusantin pela orientação nesse trabalho.
REFERÊNCIAS
CHAUI, Marilena. Conformismo e Resistência: aspectos da cultura popular no Brasil.
5 ed. São Paulo: Brásiliense, 1993.
LIMA, Ivaldo Marciano de França. Maracatus-Nação: ressignificando velhas histórias.
Recife: Bagaço, 2005.
_____, Ivaldo Marciano de França. Entre Pernambuco e a África. História dos
maracatus-nação do Recife e a espetacularização da cultura popular (1960-2000). Rio
de Janeiro, Tese de doutorado em História, UFF, 2010.
REAL, Katarina. O folclore no carnaval do Recife. Recife: Massangana,1990.
_____, Katarina. Eudes: o rei do maracatu, Recife: Editora Massangana, 2001.
SANTOS FILHO, João dos. “Ditadura militar utilizou a EMBRATUR para tentar ocultar a
repressão, a tortura e o assassinato.” Revista Espaço Acadêmico. Maio de 2008.
Disponível em http://www.espacoacademico.com.br/084/84jsf.pdf (acesso em 27 de julho
de 2011)
SILVA, Leonardo Dantas. Maracatu: presença africana no carnaval do Recife. Recife:
FUNDAJ, 1988.
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