A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA
AÇÃO
DE 9 A 12 DE OUTUBRO
TERRITÓRIO DO MARACATU NAÇÃO PATROCÍNIO DO BREJÃO
SERGIPE
Prof. Edivaldo Alves de Oliveira1
Profª. Drª. Maria Augusta M. Vargas2
Resumo
O estudo tem por objetivo apreender as relações simbólicas e econômicas
existentes no Maracatu-Nação Patrocínio do Brejão - MNPB que se manifesta no
povoado Brejão dos Negros situado no baixo São Francisco, próximo a sua foz.
Buscamos analisar o território do Maracatu como um cortejo integrante da festa
em homenagem a Nossa Senhora do Rosário e nas festividades do ciclo de Reis
realizada durante o mês de Janeiro, evidenciando os aspectos simbólicos
manifestos na religiosidade, na performance, na estrutura e na forma do cortejo.
Palavra chave: Tradição popular; Maracatu; Festa.
Abstract
The study aims to grasp the symbolic and economic relations existing in Maracatu
Nation- Sponsorship of Brejão - MNPB manifested in the village Brejão of Negros
located in the lower São Francisco, near its mouth. We analyze the territory of
Maracatu as an integral procession of the feast in honor of Our Lady of the Rosary
and the Kings cycle festivities held during the month of January, showing the
obvious symbolic aspects through religion, performance, structure and form of the
procession.
Key-words: Popular tradition; maracatu; Party.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho visa analisar, no contexto da Geografia Cultural, o
território do Maracatu Nação Patrocínio do Brejão – MNPB, considerando as
relações simbólicas e econômicas que operaram para a sua existência e sua
manutenção até os dias atuais.
1
- Professor do Instituto Federal de Sergipe; Mestrando em Geografia pelo Programa de Pós-Graduação em
Geografia (PPGEO) da Universidade Federal de Sergipe (UFS) – [email protected]
2
- Docente Colaboradora do Programa de Pós-Graduação em Geografia (PPGEO) da Universidade Federal
de Sergipe (UFS) – [email protected]
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O Maracatu, objeto deste trabalho, se manifesta no povoado Brejão dos
Negros, reconhecido como comunidade Quilombola conforme Parecer Técnico do
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária3, em atenção à reivindicação
de seus habitantes, localizado no município de Brejo Grande/SE, (Figura 1).
Figura 1. Localização espacial do objeto de estudo.
Na atualidade observa-se que o papel da Geografia Cultural vem
conseguindo um destaque entre as Ciências Sociais e, nesse sentido, nossa
proposta se coaduna com uma maior valorização dos elementos da cultura
tradicional, voltada para o resgate de manifestações populares que tendem a
desaparecer.
A materialização dos Maracatus no Brasil se manifesta pela disseminação da
cultura africana desde o período colonial. A compreensão da formação de um
Maracatu-nação só é possível pelo conhecimento da diáspora africana, pelo
entendimento do sincretismo religioso e pelo enraizamento dos africanos na
“Terra Brasilis”.
Os deslocamentos humanos constituem um fenômeno geográfico presente
desde seu aparecimento na superfície da Terra possibilitando construções sociais
e feições espaciais.
Nesse sentido, é conveniente questionar se a tradição de manifestar-se
através do Maracatu-nação contribui significativamente para a construção da
identidade territorial do MNPB.
3
- INCRA/SR-23/F-4/Nº 01/2013.
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Do aparecimento do Maracatu aos dias atuais existem mudanças na sua
manifestação?
Em outras palavras, procura-se apreender as relações dos
aspectos materiais e imateriais diante dos lugares que se criam, recriam e se
renovam a cada movimento da sociedade. Portanto, o espaço é um sistema de
valores que se transforma permanentemente.
No Estado de Sergipe, atualmente existem dois grupos de Maracatus: o
Maracatu Nação Patrocínio do Brejão e o Maracatu de Dona no município de
Japaratuba. Ambos têm projeção em nível local e se apresentam durante o ciclo
natalino nas festas de comemoração de Reis4. O MNPB é o que mais se
sobressai, pois já se apresentou na sede do município Brejo Grande e em vários
povoados deste como o Saramém e Paraúna e nos municípios de Neopólis,
Propriá, Japoatã, Laranjeiras, São Cristóvão, Aracaju e até em Brasília no ano de
2002, a convite da Secretaria Estadual da Cultura do Estado de Sergipe.
Este trabalho está estruturado em três partes: na primeira se discute a origem
do Maracatu com uma rápida abordagem histórica, sua significação e sua
espacialização no Brasil; na segunda apresenta as primeiras informações sobre o
MNPB; e, a terceira parte expõe a metodologia para a apreensão da pesquisa,
qual seja a identidade territorial do MNPB.
1 – OS MARACATUS – ORIGEM E SIGNIFICAÇÃO
A busca pela compreensão da origem, estrutura e significações dos
Maracatus no Brasil vêm sendo conduzida por grandes pesquisadores das
Ciências Sociais, tais como: COSTA (1974), GUERRA-PEIXE (1980), REAL
(2002), BENJAMIM (2011) e LIMA (2005), que abordam desde os tradicionais aos
ressignificados. Apesar da existência de grupos de maracatus em diversos
espaços brasileiros é no Estado de Pernambuco onde se encontra a maior
concentração.
De forma sintética, Haesbaert (2012, p. 40),
4
- A folia de Reis é uma festa católica que celebra os Três Reis Magos. Fixado o nascimento de Jesus Cristo a
25 de dezembro, adotou-se a data da visitação dos Reis Magos como sendo o dia 6 de janeiro, que, em
alguns países de origem latina, especialmente aqueles cuja cultura tem origem espanhola, passou a ser a
mais importante data comemorativa católica, mais importante, inclusive, que o próprio Natal. (FERREIRA,
1986).
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“apresenta três noções de território, a política (referida às relações
espaço-poder em geral); a econômica (muitas vezes economicista) e a
cultural ou simbólico-cultural (muitas vezes culturalista) esta prioriza a
dimensão simbólica e mais subjetiva, em que o território é visto,
sobretudo, como o produto da apropriação/valorização simbólica de um
grupo em relação ao seu espaço vivido”.
Diante disto, partindo do individual ou do coletivo podemos apreender o
sentido da vida dos afro-descendentes nessa dimensão simbólica cuja
subjetividade torna-se comum as três noções de território.
Os escravizados trazidos à força da África chegaram aos novos territórios
desprovidos de bens materiais, mas possuidores de um patrimônio imaterial
incalculável, entre os quais, as suas religiões, culinária, indumentária, danças em
forma de cortejos, a exemplo do Maracatu.
Em palavras sinalizadas por Souza (2006, p. 44) “O mundo sobrenatural é o
das religiões, da magia, aos quais os homens só têm acesso parcial, por meio de
determinados ritos e cerimônias. Ele é mais ou menos importante, dependendo da
sociedade”.
Segundo Souza (2006, p. 116),
“O Catolicismo, que deveria ser ensinado a todo africano escravizado,
era uma das principais obrigações dos senhores, e também serviu de
caminho para a organização de novas comunidades negras, quando
agrupadas em irmandades leigas de devoção a um determinado santo.
Essas associações religiosas de “homens Pretos” eram não só aceitas,
”
mais estimuladas pela Igreja Católica e pela administração colonial .
As irmandades dos “homens Pretos” surgem em Portugal, e antes mesmo
do descobrimento do Brasil, a Igreja Católica havia atribuído a devoção a Nossa
Senhora do Rosário, como padroeira dos africanos escravizados levados para
Portugal. Mantendo para aqueles vindos para o Brasil. Os principais santos da
Irmandade são Nossa Senhora do Rosário, Santa Efigênia e São Benedito.
Assim, o trabalho escravo no Brasil se materializa diante da existência de
bens materiais disponíveis e de bens imateriais trazidos pelos negros
escravizados.
Considerando Haesbaert (2007, p, 37) “O território, portanto, é
construído no jogo entre material e imaterial, funcional e simbólico”. A noção de
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pertencimento ao território configura-se como a base do trabalho, da residência,
das trocas materiais e espirituais e da vida sobre os quais ele influi.
O momento de maior importância na vida da irmandade surge com a
realização da festa religiosa, devendo acontecer todo ano, no seu orago5 ou seja,
na invocação a Nossa Senhora. Era freqüente a coroação de Rainhas e Reis do
Congo nessas festas que se configuravam como motivo maior da existência do
cortejo do Maracatu que emulavam as procissões católicas. Durante o cortejo,
danças e cantos percorrem as ruas, ritmados ao som de instrumentos de origem
africana despertando em alguns o sentimento de reprovação. Os cortejos se
mantêm até os dias atuais.
Importante ressaltar que não há um consenso entre os pesquisadores sobre o
sentido de celebrações e manifestações. Segundo Benjamim (2011, p. 25)
“Celebrações são festividades comemorativas, enquanto que „manifestações‟ são
ocorrências de fatos culturais componentes, ou não, das festividades, por
exemplo, a capoeira, o frevo, o coco, o maracatu são manifestações e não
festividades”. Portanto, o cortejo do Maracatu representa uma manifestação afrodescendente.
Todavia, há um consenso entre os diversos pesquisadores quanto à ideia de
que o Maracatu-nação é uma reminiscência das festas dos Reis e Rainhas do
Congo, ou seja, uma sobrevivência folclórica de costumes e práticas africanas.
Uma manifestação em forma de cortejo que se integra às festividades de
coroação dos Reis e Rainhas do Congo, além da execução de um ritual durante o
mês de outubro em homenagem a Nossa Senhora do Rosário e aos ancestrais
dos afro-brasileiros.
Para (apud, Vargas e Neves 2009, p, 54) o Maracatu é “um folguedo que se
liga as festa de Reis, e tem influência africana, no qual revive o cerimonial das
cortes africanas. Bailam ao som de instrumentos de percussão, acompanhando
uma mulher que na extremidade de um bastão conduz uma bonequinha
ricamente enfeitada, a calunga, que representa Oxum e Xangô”.
5
- O santo da invocação que dá o nome a capela ou templo.
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No pensamento de Guerra Peixe (1980), que estudou os Maracatus
pernambucanos, não há como precisar um momento exato para o surgimento dos
Maracatus no Brasil e no Recife. Supõe-se que seja datado de 1662, com a morte
de Henrique Dias, governador dos crioulos e pardos.
Para Benjamim (2011, p. 38), “Henrique Dias participou das lutas em
guerrilhas e das grandes batalhas que resultaram na expulsão dos holandeses
tendo recrutado um grande efetivo de africanos e afros descendentes oriundos
dos engenhos conquistados pelos holandeses”. Assim na condição de autoridade
perante os negros e brancos, no momento de sua morte as Irmandades
Religiosas rendem homenagens como previsto nas atribuições das associações
religiosas tais como: realização de cultos religiosos, práticas de sacramento,
encomendação de alma, enterro e missas de defunto, catequese e iniciação
religiosa, festas religiosas e a difusão da oração do rosário.
Apesar da existência da concordância entre a maioria dos pesquisadores
quanto à origem do folguedo Maracatu, surgem algumas divergências, embora
pontuais nos estudos de alguns autores como Onyeda Alvarenga (1950) que ao
escrever sobre as Cambindas6 faz correlações com o Maracatu-nação.
Nos estudos de Lima (2005) “fazer a busca de tal prática significa tentar
entender uma série de significados e símbolos diferentes entre si e que são
construídos por muitos fazedores de cultura em variados contextos sociais”.
Esta contestação remete ao entendimento de um Maracatu muitas vezes
visto apenas como um “folguedo” ou “brincadeira” e que a compreensão da sua
origem é entendida como um processo linear e homogêneo. Há de se
compreender que esta manifestação possui vários elementos que nos levam a
visualizar diversas formas de expressão cultural.
Em outras palavras, a origem do Maracatu-nação é algo complexo concebido
dentro do contexto da transculturação processo pelo qual sempre é dado algo em
troca do que se recebe. Para o etnólogo Bronislaw Malinowski esse fenômeno é:
Um processo no qual emerge uma nova realidade, diversa e complexa;
uma realidade que, não é uma aglomeração mecânica de caracteres,
6
- Dança na qual os dançadores, de cócoras, se movem ao som da música.
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nem um mosaico sequer, e sim uma realidade nova,original e
independente. Para descrever tal processo, o vocábulo de raízes latinas
transculturação, proporciona um termo que não contém a implicação de
que uma determinada cultura tenha de inclinar-se para outra, e sim de
uma transição entre duas culturas, ambas ativas, ambas contribuindo
com aportes significativos e cooperando para o advento de uma nova
7
realidade de civilização .
Dito isto, tanto a cultura que se impõe bem como a que é receptora passam
por modificações. “Em Sergipe, o aparecimento do Maracatu, também não é
conhecido assim relata em entrevista Maria Dias Ferreira, conhecida como Dona
Lila, fundadora do Maracatu Nação Patrocínio do Brejão”. A entrevistada
aprendeu a manifestação com seu tio e em meados dos anos 1960, ela fundou o
MNPB.
“não se sabe quando a manifestação começou no Brejão, quando
criança ouvia o tio Plácido, morador da Rua Getulio Vargas no Brejão
dos Negros falando da manifestação sem dizer como tinha chegado até
o povoado, isto aconteceu há muitos anos atrás quando eu tinha apenas
seis anos de idade. No principio no Maracatu brincavam mais homens,
pois os maridos não permitiam que suas mulheres brincassem daí os
homens se vestiam de mulher”.
2 - Os Maracatus: dos tradicionais aos ressignificados
Como exposto, a espacialidade dos Maracatus no Brasil nos remete
inicialmente a diáspora dos afro-descendentes, que ocupam o litoral brasileiro
durante a etapa colonial e sua existência está associada aos espaços habitados
pelos negros. Em Pernambuco, encontra-se o Maracatu-Nação ou Maracatu de
Baque Virado, segundo Guerra Peixe (1980, p.79), “a palavra baque vem a ser a
execução individual, pois coletiva é a festa do Maracatu e a denominação de
Baque Virado é na música de percussão dos conjuntos em que participam mais
de um zabumba“. Existe também o Maracatu Rural ou de Baque Solto conhecido
ainda como Maracatu de Orquestra.
7
- MALINOWSKI, Bronislaw, no prefácio da 1ª edição de ORTÍZ, Fernando. Contrapunteo Cubano Del tabaco
y El azúcar. Caracas, Venezuela: Biblioteca Ayacucho, 1987. P. 5.
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São diversos os elementos que marcam o folguedo Maracatu Rural, caso
dos caboclos de lança8, saxofone, trompete e trombone (instrumentos de sopro);
dama do passo que conduz nas mãos uma boneca, a calunga (mulher que
carrega uma boneca de pano de cor e feições brancas); as toadas sempre
referenciando temas do cotidiano, tais como: usina, açúcar, amor, cana, sátira
social etc., às fantasias ou vestimentas (as golas bordadas com produtos
brilhantes como: lantejoulas, areia brilhante) etc.; e o embelezamento dos
chapéus em forma de funil.
Para Silva (2008, p,11), existe uma ligação forte do Maracatu enquanto
manifestação cultural e a realidade geográfica, com a formação humana da
mestiçagem.
Para esse historiador, é a dança da liberdade dos guerreiros,
primeiros donos das matas substituídas pela atividade e produção monótona da
cana e do açúcar que se transformam em arte com a inovação e a afirmação de
cores, a diversidade de passos e cantos dos brincantes. É a liberdade que se
expressa com os bailados e cantos dos povos da zona da mata.
A pertença dos elementos descritos compõe os Maracatus Rurais que se
configuram como diferencial para o Maracatu-Nação.
No Maracatu-Nação também conhecido como Baque Virado, existe
elementos que se diferenciam do Maracatu Rural, entre os mais importantes
destacamos: toadas ou loas, com temas voltados para Luanda, Reis, Imperial,
beira-mar, dança, calunga, gonguê, etc. Os instrumentos são todos de percussão;
a dama do passo conduz a calunga9 (uma boneca de cor e feições negras
representando a influencia banto na manifestação); quanto às vestimentas ou
fantasias apesar da vistosidade não possuem o mesmo brilho daquelas do
Maracatu Rural.
Embora os dois tipos de Maracatus, quanto a sua origem, tenham forte
ligação com os afro-descendentes, existem algumas características na formação
do cortejo com seus personagens próprios que fazem a diferença entre ambos,
8
- Caboclos vestidos de índios, carregando nas mãos um pedaço de madeira enfeitado com
muitas fitas coloridas, com chocalhos amarrados nas costas e a cabeça coberta por um chapéu
bastante enfeitado em forma de funil. (SILVA, 2008).
9
- Divindade secundária do culto banto.
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tais como: vestimentas, instrumentos musicais, religiosidade, e principalmente a
presença do caboclo de lança, personagem marcante para o Maracatu Rural.
Na contemporaneidade, para entender as ressignificações que vem atingindo
os Maracatus é necessário referenciá-los aos territórios urbanos e rurais
existentes no Brasil e sua ligação com as atividades religiosas e econômicas.
Tomando com exemplo a abordagem de Guerra Peixe (1980, p. 22) “os
maracatus estão reduzidos a poucas pessoas. Além dos dias de carnaval, quando
têm oportunidade de dançar a porta da igreja do Rosário, os grupos menos
desorganizados ainda festejam a data de sua fundação”. A variedade de formas e
tipos de religiões existentes no Brasil e suas ressignificações, advindas da
herança afro, indígena e europeu conduzem a um entendimento das
possibilidades no aparecimento destas transformações nos Maracatus.
No entanto, os espaços construídos pelas comunidades afro-descendentes,
a exemplo dos religiosos, continuam servindo como ambientes de práticas das
atividades sagradas.
Nota-se que enquanto alguns grupos de Maracatus preservam em seus
cantos,
vestimentas,
ritmos,
cores,
instrumentos,
características
estas
tradicionais, grupos recentemente instituídos promovem a adoção de elementos
de fontes contemporâneas, fruto das novas relações sociais.
É nesse contexto, que se pretende compreender a estrutura do espaço
geográfico quando associada ao conceito de cultura, etnia e território que nos
remetem aos geossimbolos e estes se apresentam em três dimensões como
sinaliza Bonnemaison (2002): a) o espaço objetivo com suas funções, finalidades
e nível de desenvolvimento tecnológico; b) o espaço vivido voltado para a
subjetividade, como a soma de lugares e trajetos usuais quanto à vida cotidiana; e
c) o espaço cultural lugar que incorpora o vivido e o transcendente onde se
concretiza as escrituras geosimbolicas.
Surgem assim, critérios para se diferenciar - batuque de diversão de batuque
de caráter religioso - sendo o primeiro tolerado como mecanismo de liberação e
diversão, e o segundo socialmente reprimido e proibido.
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Dessa forma, a identidade que deveria prevalecer no Brasil, a do branco e
tudo que lembrava a matriz negra ou africana deveriam ser não só rejeitada, mas
também ocultada. Este fato é reforçado pelas teorias do “branqueamento”, pela
forte repressão as religiões afro-brasileiras assim, como uma nova redefinição das
festas públicas, a exemplo do carnaval, enquanto que as festas de negro passam
a fazer parte do folclore brasileiro.
Em Sergipe, todavia, o cortejo está presente em eventos tradicionais durante
o mês de janeiro, quando se festeja na Igreja católica o ciclo de Reis e, no
sincretismo, Nossa Senhora do Rosário e São Benedito.
O grupo em forma de cortejo possui no centro, protegidos pelos cordões,
uma bandeira que representa o símbolo da nação, o seu nome, sua fundação, de
onde vem e esta, respeitosamente é conduzida por um maracatuzeiro ou
maracatuzeira.
O MNPB que surgiu na década de 1960, da vitalidade de uma população que
produz seu próprio território simbólico, passa a existir então o Maracatu liderado
por Maria Dias Ferreira, conhecido como Dona Lila.
Desde o surgimento da referida manifestação, aos dias atuais a
“brincadeira” segundo Dona Lila está associada às festividades de Nossa
Senhora do Rosário e às festividades de padroeiras de municípios e povoados
vizinhos, não existindo, portanto, um calendário para a apresentação do folguedo.
Nas apresentações do MNPB a Rainha (Figura 2) é uma das principais
personagens. Antes de o cortejo adentrar as ruas faz-se a reverência ao tambor
mirim posicionado entre os cordões onde todos os componentes do cortejo dois a
dois, sempre dançando se dirigem ao tambor para fazer uma espécie de
reverência, que do ponto de vista simbólico representa um momento de elevação
espiritual. Na opinião de Dona Lila, o Maracatu não deve iniciar sua apresentação
sem antes ter realizado este ritual, obrigatório para sua realização em bom termo,
do contrário “desanda tudo‟.
Figura 2. Rainha do Maracatu Nação Patrocínio do Brejão
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Foto: Edivaldo Oliveira - 2015
Diante de suas colocações, pretende-se averiguar se o MNPB tem papel
basilar na comunidade Brejão dos Negros e ainda se ele contribui para a
formação de sua identidade territorial. Entendendo o MNPB como um patrimônio
simbólico, interessa-nos apreender se há distinção de seu sentido entre os
maracatuzeiros e a comunidade, por exemplo, no geral, se é uma brincadeira ou
uma manifestação associada a uma festa religiosa.
3 – CONSIDERAÇÕES SOBRE OS CAMINHOS DA PESQUISA
Para analisar o território do MNPB, foi definida como instrumento balizador da
pesquisa a abordagem qualitativa tendo como embasamento as categorias
geográficas espaço e território.
Para
tal,
um
levantamento
bibliográfico
como
procedimento
básico
possibilitará a elaboração de um roteiro de entrevistas ou questionário. Para
Marafon et al. (2013), nas pesquisas qualitativas do patrimônio cultural a
realização de entrevistas, quase sempre longas e semiestruturadas, é
fundamental para obtenção de depoimentos e informações de pessoas
diretamente ligadas aos processos de gestão ou apropriação desses bens
culturais; será acrescentada também uma observação de campo do fenômeno e o
registro fotográfico das etapas da formação, desde o principio ao fim, do cortejo.
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Outro aspecto a ser abordado será a espacialização e diferenciação dos
Maracatus existentes no Brasil, pois para um melhor entendimento do território do
MNPB é importante identificar as diferenciações existentes entre os Maracatus
Nação e o Rural. Sua formação e ressignificação; suas relações sociais e
espaciais.
No entendimento de Pessoa e Ramires (2013, p. 25),
“a pesquisa qualitativa tem como identidade o reconhecimento da
existência de uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, de
uma interdependência viva entre sujeito e objeto e de uma postura
interpretativa, constituindo-se como um campo de atividade que possui
conflitos e tensões internas”.
Nesse sentido, considerando a velocidade das transformações no mundo
atual acerca das relações sociais, como fato apropriado, transformado e
produzido pela sociedade observa-se uma interdependência entre o sujeito e o
objeto.
Para analisar o território do Maracatu utilizaremos o instrumento da
observação direta com registros e anotações de dados a serem sistematizados,
suscetíveis a uma futura interpretação, considerando a subjetividade como um
dos importantes elementos do diário de campo. O registro fotográfico do
fenômeno será outra ferramenta utilizada, principalmente do cortejo como um
todo, pois a captação das imagens será de grande utilidade para que se possa
apreender diversos valores e significados do folguedo. E por último, pretende-se
utilizar o diálogo entre o pesquisador e os atores e com os sujeitos envolvidos,
através de entrevistas, cujas informações prestadas possibilitarão a construção do
trabalho.
Entendemos
assim
que
este
trabalho
vem
possibilitar
um
melhor
entendimento da origem e significado da manifestação do Maracatu. Partindo da
diáspora africana e do sincretismo religioso é possível dar uma contribuição para
compreender a condição de ser negro nos continentes africano e Americano.
O aprofundamento das relações que unem o homem aos espaços em suas
variações segundo as civilizações e as épocas, é um caminho para que se possa
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entender a singularidade e a pluralidade da concepção e da trajetória da
manifestação do Maracatu.
Vale ressaltar a diferenciação entre o Maracatu Nação e o Rural bem como o
sentido de celebração e manifestação abordado por vários pesquisadores que às
vezes discordam em seu sentido, principalmente quando abordam o folguedo
Maracatu se é uma celebração ou manifestação.
Apesar da existência de pequenas discordâncias entre os pesquisadores
abordados, quanto à origem do folguedo, é na festa de coroação dos Reis e
Rainhas do Congo onde encontramos o tronco comum a origem da manifestação.
Neste contexto, vislumbra-se a abertura de uma janela diante da nossa
pretensão em elaborar um trabalho para compreender melhor a construção e
existência do território do Maracatu-nação Patrocínio do Brejão e sua contribuição
na construção de identidade territorial da comunidade quilombola do Brejão dos
Negros, Sergipe.
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