revista da
Fruticultura
Viticultura
Olivicultura
Horticultura Herbácea
Horticultura Ornamental
ISSN - 1646 - 1290 - Publicação Trimestral Preço de venda: 5€ n.º 102 Julho- Agosto -Setembro 2010
Associação Portuguesa de horticultura
A colonização micorrízica no uso eficiente do azoto
Peras que “falam” português
Gestão da vegetação herbácea em olival biológico
Um intruso indesejável em parques e zonas de lazer
Redução dos riscos dos pesticidas
O GPP em destaque - Entrevista
Editorial
3
5
Artigos Técnicos
9
11ª Visita Vitivinícola da APH: Bucelas, Carcavelos e Colares
Ainda... em Notícia
Notícias
6
Congressos, micorrizas, peras, olivais,
eucaliptos ornamentais, pesticidas, visita vitivinícola, entrevista …
Maria Elvira Ferreira
13
17
28th International Horticultural Congress, Lisboa 2010
Mário Reis & Maria Elvira Ferreira
A colonização micorrízica no uso eficiente
do azoto pelas culturas hortícolas
Cristina Cruz & Corina Carranca
Peras que “falam” português. Perspectivas
de aceitação pelos consumidores
Justina Franco, Filipe Melo & Rosa Guilherme
Gestão da vegetação herbácea em olival
em modo de produção biológico
M. Ângelo Rodrigues, Francisco Pavão,
Joana Oliveira & Margarida Arrobas
21
Um intruso indesejável em parques e zonas de lazer
Conceição Boavida
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A redução dos riscos dos pesticidas é dificultada
a nível oficial e das empresas de pesticidas
Pedro Amaro
29
Entrevista
Gabinete de Planeamento e Políticas –
Director-Adjunto Dr. Bruno Dimas
Maria da Graça Barreiro & Maria Elvira Ferreira
32
As Empresas dos Sócios Patrono
34
Actividade Interna
35
Calendário de Eventos
Plataforma vinha Lusosem – Belchim
Sócios Patrono
Nota:
O conteúdo dos artigos publicados é da inteira responsabilidade dos seus autores
Autor da capa: Cristina Cruz
Revista da APH (Associação Portuguesa de Horticultura)
Propriedade e edição: Associação Portuguesa de Horticultura
Rua da Junqueira, 299 1300-338 Lisboa
Tel. 213623094 e-mail: [email protected] www.aphorticultura.pt
Director: Maria Elvira Ferreira ([email protected])
Editor: Isabel Mourão ([email protected])
Co-Editor: Maria da Graça Barreiro
Redacção: Alberto Vargues, Isabel Mourão, Maria Elvira Ferreira, Mário Reis, Teresa
Mota.
2
Design Editorial: Miguel Frazão ([email protected], www.fanq.eu )
Impressão: Europress
Publicação Trimestral N.º 102 (Julho, Agosto, Setembro)
Tiragem: 2000 exemplares
Preço: 5€ - Isenta do Registo na ERC nos termos da alínea a) do n.º1
do Artigo 12.º do Decreto Regulamentar n.º 8/99, de 9 de Junho
ISSN: 1646-1290
Dep. legal: 1566/92
Editorial
Congressos, micorrizas, peras, olivais,
eucaliptos ornamentais, pesticidas,
visita vitivinícola, entrevista …
O passado mês de Agosto foi muito
importante para a horticultura mundial
e, muito particularmente, para a horticultura portuguesa. Se não vejamos:
- O ‘28th International Horticultural Congress’ (IHC Lisboa 2010),
numa organização conjunta da APH
e da Sociedad Española de Ciencias
Hortícolas (SECH), reuniu em Lisboa,
de 22 a 27 de Agosto um número de
congressistas que, até hoje, foi o maior
neste tipo de evento. Foram mais de
3300 participantes oriundos de 110
países, que contribuíram para excelentes apresentações e animadas discussões em torno do tema ‘Science and
horticulture for people’. As manifestações de felicitações e de agradecimento que temos recebido pela qualidade
científica e nível de organização do
evento deixaram-nos muito orgulhosos e satisfeitos, com o sentimento
do dever cumprido. De salientar o excelente trabalho desenvolvido pelos
co-Presidentes do Congresso Prof.
António Monteiro e Dr. Victor Galán
Saúco, pelo Presidente do Comité
Científico Prof. Luis Rallo e pelo Secretário Geral do Congresso Doutor Pedro Oliveira e respectivas equipas que
tudo fizeram para que este congresso
fosse de facto especial. Parabéns a todos aqueles que o tornaram possível.
- Outro motivo de satisfação e de
orgulho foi a eleição do Prof. António
Monteiro, sócio da APH e seu Pre-
sidente de 1988 a 1992, para a presidência da International Society for
Horticultural Science (ISHS) durante os
próximos quatro anos. A eleição decorreu nas reuniões do Conselho da ISHS
que antecederam o Congresso. Queremos aqui expressar o nosso contentamento e desejar as maiores felicidades à ISHS e ao seu novo Presidente.
É claro que um evento tão importante como o IHC Lisboa 2010 não poderia
deixar de ser devidamente assinalado
na Revista da APH, pelo que estamos a
preparar o próximo número da Revista
inteiramente dedicado ao Congresso.
Esse número especial dará aos leitores
que não puderam participar no Congresso uma ideia do que se passou e
para os que nele participaram a possibilidade de relembrarem essa inolvidável semana de Agosto. Com o intuito
de aguçar o interesse do leitor para o
próximo número apresentam-se aqui
alguns ‘números’ sobre o Congresso,
bem como algumas fotos de momentos
importantes.
Terminado este Congresso já se
pensa no de 2014 que será realizado
na Austrália (Brisbane) numa organização conjunta com a Nova Zelândia. O destino do ‘30th International
Horticultural Congress’, em 2018,
foi eleito aqui em Lisboa e o escolhido, entre 5 concorrentes, foi Istambul
(Turquia).
As mais de 4000 comunicações
apresentadas oralmente e na forma de
painel no IHC Lisboa 2010 versaram
muitos e diversificados temas. No próximo número daremos conta dos aspectos mais relevantes. Entretanto, na
presente revista, apresentam-se cinco
artigos técnicos também eles diversificados e interessantes.
O primeiro artigo aborda a importância da colonização de micorrizas nas
raízes das plantas hortícolas. Como as
plantas micorrizadas podem explorar
um maior volume de solo, tem-se verificado um aumento da produtividade, da
eficiência do uso do azoto e da qualidade alimentar, como por exemplo o aumento do teor do anti-oxidante licopeno
na cultura do tomate.
Sob o lema ‘Preservar o passado é
precaver o futuro’ apresenta-se um artigo sobre a aceitação pelo consumidor
de 13 variedades de peras portuguesas. Embora dispersas pelo país, estas
variedades podem vir a ser recuperadas e assim aumentar a oferta de peras ao consumidor. Estas variedades
foram comparadas com a Pêra Rocha,
destacando-se a Santo António, a Delícia, a Pérola do Lima, a Formiga de
Ansião e a Marmela. Será necessário
completar este estudo com avaliações
de produção e de poder de conservação das variedades.
A adopção do modo de produção
biológico nos olivais portugueses tem
trazido benefícios à comercialização do
Revista da APH N.º 102
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azeite a melhores preços, mas a produtividade tende a diminuir e os custos
de produção a aumentar. Para minimizar esta situação têm-se desenvolvido
vários estudos, apresentando-se neste
número da Revista o do controlo de infestantes através da introdução de cobertos vegetais de leguminosas na entrelinha dos olivais tradicionais. Esta
tecnologia de produção ajuda a evitar a
perda de água e a preservar o sistema
radicular das oliveiras.
Em 2007, Portugal e Espanha foram invadidos pelo insecto Glycaspsis
brimblecombei que ataca os eucaliptos, utilizados como árvores de sombra em parques. As folhas do eucalipto atacadas apresentam manchas com
a forma de pequenas conchas de cor
branca. O insecto excreta uma melada
nas folhas, que provoca a sua colagem ao sítio onde caiem, prejudicando
os utilizadores das zonas de lazer. O
controlo desta praga deverá ser feito
através de inimigos naturais nativos da
Austrália, à semelhança do que já foi
feito, com êxito, noutros países.
O quinto artigo chama a atenção
para a necessidade urgente da divulgação de informação sobre as características toxicológicas e ecotoxicológicas
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Revista da APH N.º 102
dos pesticidas vendidos em Portugal.
Esta informação é indispensável à redução do risco do uso dos pesticidas.
A 11.ª Visita Vitivinícola da APH,
agendada para 2 e 3 de Outubro, decorrerá este ano nas regiões de Bucelas, Carcavelos e Colares. O programa
prevê dois dias preenchidos com visitas a vinhas e adegas, onde não faltarão os momentos culturais, de convívio
e de lazer.
Publica-se ainda neste número da
Revista da APH a entrevista com o
Director-Adjunto do Gabinete de Planeamento e Políticas do Ministério da
Agricultura, do Desenvolvimento Rural
e das Pescas, Dr. Bruno Dias, que gentilmente acedeu a responder às questões que lhe foram colocadas e que
muito agradecemos.
Desfrutem deste número 102 da Revista da APH, tanto ou mais, quanto o
prazer que todos os que nele participaram tiveram ao prepará-lo para vós.
Saudações hortícolas!
Maria Elvira Ferreira
Notícias
11.ª Visita Vitivinícola da APH:
Bucelas, Carcavelos e Colares
A décima primeira visita vitivinícola da APH direcciona-se para
as mais emblemáticas e antigas regiões vitícolas portuguesas, com
muita história e tradição: Bucelas, Carcavelos e Colares, que
se situam num curto perímetro em redor de Lisboa, daí sofrerem
fortes pressões urbanísticas que fazem perigar a subsistência e expansão das áreas vitícolas, mas a singularidade cultural e a diversidade de vinhos nelas produzidos espicaçam a nossa curiosidade!
PROGRAMA
Sábado - dia 2 OUT. 2010
09.45 h - Ponto de encontro no Hotel Praia
Mar, em Carcavelos
10.00 h - Saída em autocarro para a região
de Bucelas
10.45 h - Visita às vinhas da Quinta de Boição
e Enoteca das Caves Velhas, com
Prova de Vinhos
12.30 h - Almoço no Restaurante ‘Barrete
Saloio’, em Bucelas
14.30 h - Partida para Oeiras, com passagem
pelas vindimas da Quinta da
Romeira (Bucelas)
15.00 h - Visita às vinhas da Quinta do
Marquês e à Adega do Vinho de
Carcavelos (Oeiras)
16.30 h - Visita aos Jardins do Palácio do
Marquês de Pombal (Oeiras)
19.00 h - Regresso ao Hotel Praia Mar
20.00 h - Jantar convívio com Prova de
Vinhos no Hotel Praia Mar
Domingo - dia 3 OUT. 2010
08.30 h - Partida do Hotel Praia Mar para
Colares (visita à Adega Regional
de Colares e às vinhas em areia e
chão rijo)
12.30 h - Almoço no Restaurante ‘A Toca do
Júlio’, em Almoçageme
14.00 h - Visita à Exposição do “Vinho de
Colares” na Adega Visconde de
Salreu e Prova de Vinhos
15.00 h - Partida para Cascais com paragem
no Cabo da Roca, o ponto mais
ocidental do continente europeu
16.30 h - Visita à Casa das Histórias de
Paula Rego, em Cascais
18.00 h - Visita ao Museu do Automóvel
Antigo, em Paço de Arcos
19.30 h - Regresso ao Hotel Praia Mar
Apoios:
Adega Cooperativa de Colares;
Câmara Municipal de Loures;
Câmara Municipal de Oeiras;
Câmara Municipal de Sintra;
Confraria do Vinho de Carcavelos; INIA / INRB, I.P.
A Comissão Organizadora
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28th International
Horticultural Congress
Lisboa 2010
Terminou a 27 de Agosto, no Centro de Congressos de Lisboa (CCL), o
28th International Horticultural Congress (IHC), com a maior participação de sempre. O inicio destas reuniões cientificas internacionais remonta a 1864, ano em
que se realizou o primeiro destes encontros em Bruxelas.
A organização do IHC Lisboa 2010 foi fruto dos esforços, durante anos, de
técnicos e cientistas portugueses e espanhóis que, em cooperação, conseguiram
em 2002 em Toronto, assegurar a realização de um Congresso Internacional de
Horticultura na Península Ibérica.
No Congresso de Lisboa, organizado conjuntamente pela Associação Portugue-
sa de Horticultura (APH) e a Sociedad Española de Ciencias Hortícolas (SECH),
sob a égide da International Society for Horticultural Science (ISHS), foram regis-
tados mais de 3300 participantes, oriundos de 110 países, numa representativa
amostra da vitalidade do sector, apesar da época economicamente adversa.
Durante o Congresso, cujo tema foi “Science and horticulture for people”, fo-
ram apresentadas 4495 comunicações, no decurso de 9 Colóquios, 18 Simpósios,
14 Seminários, 18 Sessões Temáticas, 28 Workshops, 13 Business Meetings e 3
Lunch Time Workshops. As comunicações foram apresentadas oralmente (1016)
e em painel (3479), num total de 26 em Colóquios, 3257 em Simpósios, 461 em
Seminários e 78 em Workshops.
Na sessão de abertura do Congresso destacaram-se as comunicações efec-
tuadas pelo Dr. Jorge Sampaio, pelo Presidente cessante da ISHS, Dr. Norman
Looney, e pelos Professores Cary Fowler e Pere Puigdoménech. As comunicações
apresentadas trouxeram à consideração dos participantes problemas relacionados
com o desenvolvimento humano e os desafios colocados à agricultura, numa época de grandes desenvolvimentos tecnológicos mas também do agravar de problemas na utilização dos recursos naturais.
As sessões de trabalho em Lisboa culminaram com a realização de 9 visitas
técnicas no dia 27, em Portugal. As visitas pós-congresso que se prolongaram
até 2 de Setembro, decorreram nos territórios português e espanhol, com elevada
participação, às regiões do Douro, Andaluzia, Vale do Ebro, Tenerife e Valência.
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Durante o Congresso tomou posse a renovada equipa de direcção da ISHS,
coordenada pelo seu novo Presidente eleito, o Professor Doutor António Almeida
Monteiro.
Do programa social destaca-se a Recepção de Boas-Vindas – Arraial Alfacinha
– nos Jardins do Palácio Burnay e o Jantar de Despedida no Casino do Estoril.
No Pavilhão do Rio do CCL uma exposição com cerca de 40 empresas, institui-
ções e associações possibilitou a apresentação do que de mais recente e inovador
existe na horticultura mundial.
Uma exposição de fotos de actividades na vinha e na fileira olivícola dos anos
30 do século passado, assim como a FrutArt foram muito apreciadas e deliciaram
todos quantos por elas passaram.
Mário Reis
Maria Elvira Ferreira
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Micorrizas
A COLONIZAÇÃO MICORRÍZICA
NO USO EFICIENTE DO AZOTO
PELAS CULTURAS HORTÍCOLAS
Cristina Cruz & Corina Carranca
As culturas hortícolas, senso lato, são importantíssimas para
uma dieta humana equilibrada e para a economia do País.
Todavia, a sua produção deve ser melhorada, procurando
maximizar o uso dos factores de produção, designadamente a
água e os nutrientes, muito em especial, o azoto. A eficiência
do uso deste nutriente pelas plantas depende de factores
intrínsecos à própria planta e extrínsecos. Nos intrínsecos,
o desenvolvimento dum sistema radicular apropriado e a
optimização da colonização micorrízica são fundamentais.
Introdução
Numa agricultura que se pretende
sustentável, para que as gerações vindouras possam usufruir dos recursos
naturais tal como nós os herdámos, a
agricultura intensiva (convencional),
praticada nos finais do século XX, deixou de ser uma prática recomendável.
Neste sistema de agricultura, a produção era obtida com a maximização da
aplicação dos factores de produção,
designadamente, os fertilizantes minerais, a água de rega e os produtos
fitofarmacêuticos. Daqui resultou a deterioração do ambiente e a destruição
de alguns ecossistemas, muito em
especial, a degradação do solo, a poluição da água e do ar, e a redução da
biodiversidade.
Actualmente, privilegia-se a agricultura de conservação, também
conhecida por sustentável, onde se
procura optimizar a produção e a qualidade do produto através da optimização do uso, pelas plantas, dos factores
de produção. Neste contexto, iremos
pronunciar-nos sobre o uso eficiente
do azoto (N) pelas culturas hortícolas.
Eficiência de uso do
azoto (n) pelas plantas
Existem vários conceitos para a eficiência do
uso do N pela planta: eficiência de uso aparente
ou da diferença, eficiência de uso fisiológico e eficiência de uso agronómico.
Define-se eficiência de uso aparente (%) por
(TNf – TNc) x 100 / F
onde,
TNf = nutriente total na planta fertilizada (kg ha-1),
TNc = nutriente total na planta de controlo (não
fertilizada) (kg ha-1),
F = quantidade de nutriente adicionado (kg ha-1)
Do ponto de vista fisiológico, a expressão eficiência de uso fisiológico (kg kg-1) indica a eficiência
com que a planta utiliza o nutriente para a síntese
de moléculas azotadas, e define-se por
(Pf – Pc) / (TNf – TNc)
onde,
Pf = produção da planta fertilizada (kg ha-1),
Pc = produção da planta de controlo (kg ha-1),
TNf = nutriente total na planta fertilizada (kg ha-1),
TNc = nutriente total na planta de controlo (não fertilizada) (kg ha-1).
É afectada pelas condições de crescimento da
planta (ex., o défice hídrico ou a carência de outro
nutriente, que diminuem a eficiência de uso fisiológico do nutriente).
A eficiência de uso agronómico (kg kg-1) é um
indicador muito utilizado pelos agricultores, dum
ponto de vista agronómico, e define-se por
Pf – Pc / F
onde,
Pf = produção da planta fertilizada (kg ha-1),
Pc = produção da planta de controlo (kg ha-1),
F = quantidade de nutriente adicionado (kg ha-1).
Depende não só da eficiência de uso fisiológico, mas também da capacidade da planta
para absorver o nutriente, o que indica a verdadeira capacidade de uso do N pela planta.
Varia com a produção esperada, com o tamanho do sistema radicular, a sua profundidade
e a existência de pêlos absorventes, com a
Revista da APH N.º 102
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capacidade de formação de micorrizas,
com a ciclagem interna do nutriente,
com as características do solo (pH,
poder tampão, teor de água, etc.), com
as práticas culturais (tipo de fertilizante
aplicado, época de aplicação, etc.) e
com o clima. Depende assim, de factores intrínsecos à planta e de factores
extrínsecos. Um aumento na recuperação aparente do nutriente, ou na eficiência fisiológica, implica um aumento
na eficiência agronómica.
A produção
hortícola
As culturas hortícolas lato sensu
abrangem as hortícolas stricto sensu,
incluindo as ornamentais, as fruteiras,
a vinha e a oliveira. As primeiras são,
dum modo geral, produzidas sob cultivo intensivo, isto é, com adição de elevados inputs (água, fertilizantes, produtos fitofarmacêuticos) e mobilização
do solo, para que se atinja a máxima
rendibilidade do produto. Apesar disto,
é recorrente a prática de rotação cultural, onde os resíduos da cultura podem
permanecer no solo.
Dum modo geral, no cultivo intensivo, o sistema radicular das plantas herbáceas hortícolas lato sensu
apresenta-se pouco desenvolvido, em
virtude do fornecimento dos nutrientes e água nas quantidades e datas
de maiores exigências da planta. Por
vezes, os nutrientes são veiculados na
água de rega (fertirrega), em pequenas
quantidades diárias, ou quase diárias.
Em resultado deste modo de produção, a planta aproveita muito pouco dos nutrientes fornecidos, o solo
torna-se rico em matéria orgânica e
nutrientes, podendo ser perdidos para
fora do ecossistema solo-planta (em
especial o N), com a consequente
contaminação do lençol freático, das
águas superficiais e/ou da atmosfera. Para minimizar estes efeitos, deve
ser optimizado o uso do nutriente pela
planta. No quadro 1 apresenta-se o
valor, muito baixo, determinado para a
eficiência de uso do N pelo espinafre
(18%), produzido na região da Lourinhã, onde o nutriente foi aplicado fraccionadamente ao longo do ciclo cultural
(120 kg N ha-1), em fundo (30 kg N ha-1)
e numa cobertura (90 kg N ha-1) cerca
de 30 dias após a sementeira, na fase
de 4-4,5 pares de folhas.
Na nutrição azotada das culturas lenhosas é importante considerar a mobilização e translocação do N na planta,
dos órgãos de reserva para os pontos
meristemáticos, para a formação de folhas, flores, pequenos frutos e raízes,
durante o período de relativa inactividade das raízes. A formação de reservas nutritivas na planta dá-se durante o
período de grande actividade radicular
e senescência das folhas. A formação
de reservas e a ciclagem interna do N
torna-se cada vez mais importante na
nutrição das culturas arbóreas à medida que estas se desenvolvem.
O transplante das plantas lenhosas
para o local definitivo faz-se, muitas
Quadro 1 - Alguns exemplos da eficiência de uso do fertilizante azotado (%EUF) e teores
de nitratos lixiviados (mg N-NO3- l-1) determinados em vários ecossistemas agrícolas.
Cultura
Local
Rega
EUF (%)
NO3- lixiviado
(mg N l-1)
Referências
Beterraba
sacarina
(Beta vulgaris L.)
Coruche
Rega por sulcos
(60 mm de água)
23-40
1,8
Oliveira et al. (1989)
Espinafre
(Spinacia oleracea L.)
Lourinhã
Rega por aspersão
18
nd
Carranca (2005)
Laranjeira
(Citrus sinensis L.
‘Lane Late’) (1-3 anos)
Faro
Fertirrega
gota-a-gota
6-30
4,4
Menino (2005);
Menino et al. (2007)
Pereira
(Pyrus communis L.
‘Rocha’) (1-3 anos)
Pêro Moniz
(Cadaval)
Fertirrega
gota-a-gota
6-33
nd = não determinado.
10
Revista da APH N.º 102
3,7
Neto et al. (2008)
vezes, sem a inoculação micorrízica
das raízes nas plantas do viveiro, que
são muito enriquecidas em nutrientes.
Em consequência, as raízes, durante
o primeiro ano no solo em local definitivo, apresentam-se muito pouco
desenvolvidas, concentrando-se no
bolbo de terra do viveiro e aproveitando muito pouco do N, e outros nutrientes, fornecidos à planta. No quadro 1,
apresentam-se os valores da eficiência do uso do N pela laranjeira
(Citrus sinensis L. ‘Lane Late’) e pereira (Pyrus communis L. ‘Rocha’), jovens
(1-3 anos). A recuperação do nutriente
pelas árvores foi muito baixa (6%), no
primeiro ano, pelos motivos explicados
anteriormente, aumentando significativamente ao longo dos anos (30-33%),
à medida que o sistema radicular se
desenvolveu.
As micorrizas
A formação de associações simbióticas, ubíquas, isto é, não específicas,
entre as raízes das plantas e os fungos
arbusculares (micorrizas) é uma condição natural e ocorre em cerca 80%
das plantas herbáceas. Os benefícios
para a planta envolvem normalmente
melhores condições nutritivas e maior
resistência ao stress. No caso das associações com fungos endomicorrízicos (AM), a simbiose altera a fisiologia
da planta (fig. 1), aumenta o nível nutricional e a resistência ao stress (biótico
e/ou abiótico). O efeito final depende
das espécies fúngicas e vegetais envolvidas e pode ainda ser modulado
pelas condições ambientais e edáficas
(Whipps, 2004).
De uma forma geral, pensa-se que
as vantagens nutritivas das plantas micorrizadas estão associadas à exploração de um maior volume de solo e
à possibilidade de explorar fontes que
não são acessíveis às raízes não micorrizadas. Desta forma, as maiores
vantagens descritas estão associadas
à aquisição de nutrientes pouco móveis
no solo, como é o caso do fósforo (P).
Mais recentemente tem sido observado
que as micorrizas podem também aumentar a capacidade de absorção de N
por parte da planta (Cruz et al., 2007).
Tal como para o P, o efeito da micorriza na absorção do N depende
das espécies de fungo e vegetal envolvidas. Numa experiência realizada no campo (Alcochete) com alface
(Lactuca sativa L. cv. Romana) e tomate (Lycopersicon esculentum Miller cv.
Roma) verificou-se que o incremento
da biomassa vegetal, relativamente
b
d
e
Figura 1 - A colonização micorrízica (AM) em plantas de tomate. No solo, a raiz do tomateiro (a) encontrase rodeada de esporos de fungos endomicorrízicos (b) que ao germinarem estabelecem simbioses com
as raízes formando uma teia de hifas, que ligam plantas e fungos e ajudam a agregar o solo (c) as hifas
penetram na raiz através dos espaços intercelulares (d) e penetram a parede celular para se ramificarem
no interior da célula, sem nunca penetrarem no citoplasma, podendo formar os arbúsculos (e) que são
zonas de troca nutrientes entre as hifas e as raízes.
Incremento em biomassa
(% do controlo)
40
30
Alface
Tomate
20
10
0
-10
40
Incremento do teor de N
(% do controlo)
ao controlo (sem inóculo) era dependente do inóculo micorrízico utilizado
(Glomus etunicatum, Glomus clarum
ou Glomus intraradices). O efeito da
espécie vegetal foi particularmente
visível no caso da inoculação com G.
clarum em que foi observado um efeito
positivo da micorrização para a alface,
mas não para o tomateiro (fig. 2).
Muitos são os factores que contribuem para a melhor performance da
planta micorrizada face à planta não
micorrizada. No entanto, é possível
ver que o incremento da biomassa
está associado ao aumento do teor de
N nas plantas (cerca de 30% no caso
das plantas inoculadas com Glomus
intraradices). O maior conteúdo em N,
não necessariamente concentração,
das plantas implica uma maior eficiência no uso do nutriente aplicado e,
portanto, para além de poder significar
uma maior produção e um menor custo
de produção (adubação), diminui também os impactes ambientais da actividade hortícola (principalmente os que
contribuem para a lixiviação, eutrofização e emissões gasosas).
Uma das características mais interessantes da micorrização, mas que
ainda é muito pouco explorada, reside na capacidade das micorrizas para
aumentar a qualidade alimentar dos
produtos hortícolas. No caso do tomateiro, a concentração de licopeno é um
factor importante para a qualidade do
fruto (fig. 3). O licopeno é um composto com propriedades anti-oxidantes, o
que aumenta o valor alimentar do fruto.
A experiência realizada com tomateiro
mostrou que em condições óptimas
para a cultura de tomate não se observou diferença entre a concentração de
licopeno dos frutos de plantas inoculadas e não inoculadas. Mas em condições de stress, quer salino (50 mM
NaCl), quer nutritivo (70% da concentração de N do controlo), a inoculação
do tomateiro com Glomus intraradices
garantiu uma concentração elevada de
licopeno no fruto.
c
30
20
10
0
G. etunicatum
G. clarum
G. intraradices
Figura 2 - Incremento em biomassa ou teor de N relativamente ao controlo de plantas de alface ou tomate
inoculadas com Glomus etunicatum, G. clarum ou G. intraradices (200 esporos por plântula). As plantas
de alface foram analisadas na altura da colheita e as de tomate imediatamente antes da antese floral.
150
Não inoculadas
120
Licopeno (µgg -1 PS)
a
Inoculadas
90
60
30
0
Controlo
Stress salino
Stress nutritivo
Tratamentos
Figura 3 - Concentração de licopeno em tomate não inoculado e inoculado com Glomus intraradices.
Revista da APH N.º 102
11
Conclusão
Embora na natureza a maioria das
plantas se encontre micorrizada, a
micorrização não tem sido um factor
muito considerado na horticultura. Os
trabalhos realizados até ao momento
têm mostrado que a micorrização adequada das culturas pode aumentar a
produtividade, a eficiência do uso do
N, a qualidade alimentar dos produtos
hortícolas, e ainda diminuir os impactes ambientes resultantes desta actividade. No entanto, a performance da
planta depende das espécies (vegetal
e fúngica) envolvidas na simbiose e por
isso muito trabalho há ainda a fazer no
sentido de explorar todas as potencialidades da utilização de plantas micorrizadas em horticultura.
Autoras
Cristina Cruz
[email protected]
Professora Auxiliar da FC/UL;
Investigadora do CBA
FFC/FC/UL, Dep. Biologia Vegetal,
Fac. Ciências de Lisboa.
Especialidade: Interacções solo-planta
Corina Carranca
[email protected]
Investigadora Auxiliar
INRB, I.P./INIA, Instituto Nacional
de Recursos Biológicos, Oeiras
Especialidade: Dinâmica do azoto no solo
e nutrição das plantas
12
Revista da APH N.º 102
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Fruticultura
Peras que “falam” português.
Perspectivas de aceitação
pelos consumidores
Justina Franco, Filipe Melo & Rosa Guilherme
A diversidade de oferta de peras é reduzida e o consumo tem-se
mantido constante e baixo comparativamente às maçãs, no entanto, o património frutícola nacional é rico. No sentido de diversificar a oferta e sob o lema “preservar o passado é precaver o futuro”
desenvolvemos este trabalho que teve como objectivo caracterizar
variedades de peras tidas como portuguesas e com perspectivas
de aceitação pelos consumidores, numa tentativa de introdução/
recuperação de algumas.
INTRODUÇÃO
O consumo de peras em Portugal
e na União Europeia, ao contrário de
outros frutos, tem-se mantido mais ou
menos constante ao longo dos anos,
cerca de 10 kg por pessoa e por ano.
Ao percorrermos os corredores dos
supermercados e as prateleiras das
frutarias verificamos que a diversidade
da oferta é reduzida levando a alguma
monotonia; o número de variedades
presentes raramente ultrapassa as
duas, a Pêra Rocha que se comercializa durante 10 meses do ano e uma
outra estrangeira que alterna entre a P.
Triumph, a William’s e a P. Crassane.
Durante o mês de Julho e a 1.ª quinzena do mês de Agosto encontramos a
P. Morettini e algumas variedades tidas
como portuguesas (em pequena quan-
tidade) como a Carapinheira Parda e a
Pérola.
Borges (1999) ao efectuar uma pesquisa bibliográfica sobre pomóideas regionais e ao nível das peras encontrou
referência a:
• 33 variedades temporãs;
• 83 variedades de estação;
• 42 variedades de Inverno;
• 73 variedades com poucos elementos de identificação para além do nome.
Muitas destas variedades ainda
existem dispersas por quintais de Norte
a Sul do país, outras já só se encontram em colecções de organismos oficiais nomeadamente do Ministério da
Agricultura do Desenvolvimento Rural
e das Pescas, pelo que, as que se consideram que têm qualidade poderão vir
a ser recuperadas e aumentar assim
a diversidade de peras nos locais de
compra e nos cestos de fruta das nossas casas.
Os consumidores procuram cada
vez mais produtos distintos, com autenticidade e com uma íntima ligação ao
território, inserindo-se aqui novas variedades ou as tradicionais recuperadas.
Consideramos que devido à riqueza
do nosso património frutícola este possui capacidade para dar resposta aos
consumidores a partir do momento que
os frutos tenham qualidade.
Parâmetros
de qualidade
Definir qualidade é tarefa complexa e,
segundo Almeida (2004), os consumidores tomam, frequentemente, a decisão
de compra com base na aparência visual
e na textura; sendo que a repetição da
compra e em última análise, a expansão
do mercado depende de uma experiência de consumo satisfatória, avaliada pelo
aroma e pelo sabor. Tradicionalmente a
qualidade dos frutos é avaliada através
dos seguintes parâmetros (Gil, 2003;
Lespinasse et al., 2002):
• aparência visual;
• textura;
• sabor e aroma;
• valor nutricional;
• segurança.
Entre o produto e o seu consumidor
estabelece-se uma relação complexa
que, normalmente, não explica a razão
do seu grau de satisfação, gosta ou
não gosta (Pinon, 1998).
Revista da APH N.º 102
13
Caracterização de
algumas variedades
de peras tidas como
portuguesas
Figura 1 - Avaliação global das 13 variedades de peras - Santo António (SA), Delícia (De), Rabiça (Ra),
Pérola (Pe), Pérola de Leiria (PL), Formiga de Ansião (FA), Marquesinha (Mar), Marmela (Mam), Rocha
(Ro), Formiga de Coimbra (FC), Pão (Pa), Amêndoa de Silgueiros (AS) e Baguim dos Covões (BaCv);
(- - - avaliação da Rocha).
Figura 2 - Perfis sensoriais de oito variedades de peras. (A: aspecto, B: textura, C: sabor e D: aroma).
Quadro 1 - Resultados médios das análises laboratoriais em 13 variedades de pêra
(ØE: diâmetro equatorial, ØL: diâmetro longitudinal).
DATA
Jul - 04
VARIEDADE
Peso
(g)
ØE
( mm)
ØL
(mm)
Dureza
(kg/0,5cm2)
IR
(°Brix)
Acidez
(g/l ácido málico)
Santo António (SA)
147,0
59,5
90,4
7,1
16,0
5,6
Delícia (De)
110,2
55,8
59,5
4,4
15,2
2,7
Rabiça (Ra)
99,0
54,8
62,2
3,0
12,5
3,2
Pérola Leiria (PL)
94,3
50,5
70,9
3,3
13,8
2,1
Jul - 05
Pérola (Pe)
87,4
50,5
67,4
1,5
14,0
1,8
Formiga de Ansião (FA)
185,7
74,3
80,9
4,4
15,5
3,2
Marquesinha (Mar)
250,7
78,8
67,9
3,8
14,3
5,0
Marmela (Mam)
246,4
82,7
74,8
3,5
13,1
1,2
Rocha (Ro)
144,1
63,6
78,7
4,3
14,8
1,8
Pão (Pa)
171,5
76,7
82,9
3,3
14,8
2,7
Formiga de Coimbra (FC)
174,1
64,3
73,0
6,1
13,7
2,7
91,3
56,6
55,5
4,5
14,5
2,2
67,8
50,5
49,7
5,,4
12,7
3,3
Set - 06
Amêndoa de Silgueiros
(AS)
Baguim de Covões
(BaCv)
14
Revista da APH N.º 102
Sendo necessário apostar na diferenciação e na fidelização dos clientes/consumidores pela qualidade e
genuinidade dos produtos procurámos
avaliar alguns parâmetros de qualidade no sentido de contribuir para a diversificação da oferta de peras com a
introdução/recuperação de variedades
regionais. Para tal e no âmbito do projecto AGRO 740 o Departamento de
Ciências Agronómicas da Escola Superior Agrária de Coimbra avaliou 54 variedades de peras portuguesas ou tidas
como tal, das colecções da Direcção
Regional de Agricultura e Pescas do
Centro (Soure e Coimbra). Efectuou-se
a caracterização dos frutos através dos
parâmetros: peso, forma, cor, dispersão da carepa, tamanho e consistência
do pedúnculo, dureza da polpa, índice
refractométrico e teor em ácido málico.
Para a avaliação da qualidade por
potenciais consumidores realizaram-se
várias provas de frutos. Os elementos
do painel deveriam posicionar-se como
potenciais consumidores preenchendo
uma ficha na qual classificavam os frutos das diferentes variedades em relação ao aspecto, à textura, ao sabor e
ao aroma numa escala crescente de 1
a 5; no final, faziam uma avaliação global numa escala de 1 a 20.
Das análises dos resultados ao longo dos três anos verificámos grandes
diferenças entre as variedades. Quanto à época de colheita, a Precoce de
Silgueiros foi a mais precoce, colhida
na 1.ª quinzena de Junho e a Curé, a
mais tardia, colhida na última semana
de Outubro; relativamente ao peso dos
frutos, a S. António de Leiria produziu
frutos muito pequenos (20-25 g) e a S.
Bento de Chaves, a Bela Feia, a Chata, a Inverneira e a Curé produziram
frutos muito grandes (cerca de 300 g).
Quanto às características internas a diversidade também foi muito grande: os
frutos da variedade Tapeus eram muito
duros e com um teor de sólidos solúveis baixo (7 kg/0,5 cm2 e 10 ºBrix), os
da variedade Brava eram muito duros
e com teor de sólidos solúveis muito
elevado (9 kg/0,5 cm2 e 16 ºBrix) e os
frutos da Coxa de Freira eram moles e
com teor de sólidos solúveis elevado (3
kg/0,5 cm2 e 16 ºBrix).
Partindo do princípio que não vale a
pena produzir o que não se consome,
para uma análise mais exaustiva con-
siderámos apenas as variedades que
os potenciais consumidores avaliaram
como boas (avaliação global superior a 13,5) reduzindo assim o universo para 13 variedades: Santo António
(SA), Delícia (De), Rabiça (Ra), Pérola
(Pe), Pérola de Leiria (PL), Formiga de
Ansião (FA), Marquesinha (Mar), Marmela (Mam), Rocha (Ro), Formiga de
Coimbra (FC), Pão (Pa), Amêndoa de
Silgueiros (AS) e Baguim dos Covões
(BaCv) (fig.1).
Pela análise dos resultados das provas de frutos verificou-se que sete variedades obtiveram valores de avaliação
global superiores à Rocha (14,1): Santo António, Delícia, Pérola e Pérola de
Leiria (de maturação mais precoce que
a Rocha), Formiga de Ansião e Marmela (mesma época que a Rocha) e Pão
(mais tardia que a Rocha) (fig. 1).
Da observação aos parâmetros das
provas de frutos verificou-se que a variedade Marmela obteve a melhor cotação para a textura, sabor e aroma (fig.
2). A variedade S. António foi a que os
provadores consideraram ter melhor
aspecto (fig. 2).
As 13 variedades foram também
avaliadas em laboratório, nos mesmos
dias das provas, constando os resultados no quadro 1.
Dos resultados obtidos confirmámos
que, descodificar o gosto dos consumidores nem sempre é tarefa fácil; de
uma maneira geral os potenciais consumidores optaram por peras de tamanho médio a grande (com mais de 90 g
e menos de 260 g) e oblongas. Quanto
às características internas gostaram
das variedades com dureza superior a
3,5 kg/0,5 cm2 (com excepção da Pérola) e IR maior do que 13 ºBrix. Relativamente à acidez não foi possível
estabelecer o padrão de escolha.
Conclusões
Pelo trabalho realizado constatámos
que existem variedades portuguesas,
ou tidas como tal, que se apresentam
como potenciais agentes de diversificação do mercado sendo disso exemplo
a Santo António, a Delícia, a Pérola de
Leiria, a Formiga de Ansião e a Marmela (fig. 3).
Pensamos ser do maior interesse o
desenvolvimento de estudos que conduzam ao aumento do conhecimento
destas variedades, nomeadamente no
que diz respeito às suas características agronómicas, produtivas e poder
de conservação. Só assim, poderão
seguir o exemplo da pêra Rocha, referência para todos nós como variedade
excelente.
Agradecimentos
Ao Projecto AGRO 740 pelo financiamento. À DRAPC pela cedência
dos frutos. Aos Eng.os Fátima Curado e
Nuno Neves, da DRAPC, porque juntos
formámos uma verdadeira equipa.
AUTORES
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Justina Franco
[email protected]
Professora Adjunta da Escola Superior
Agrária de Coimbra
Especialidade: Fruticultura e Pós-Colheita
Filipe Melo
[email protected]
Mestre em Biologia Vegetal
Técnico Superior no Departamento de
Ciências Agronómicas da Escola Superior
Agrária de Coimbra
Rosa Guilherme
[email protected]
Mestre em Ecologia
Técnica Superior no Departamento de
Ciências Agronómicas da Escola Superior
Agrária de Coimbra
Revista da APH N.º 102
15
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Revista da APH N.º 102
Olivicultura
GESTÃO DA VEGETAÇÃO HERBÁCEA
EM OLIVAL EM MODO DE PRODUÇÃO BIOLÓGICO
M. Ângelo Rodrigues, Francisco Pavão, Joana Oliveira & Margarida Arrobas
A introdução de cobertos vegetais de leguminosas em olival
biológico está a ser estudada no âmbito do projecto PTDC/AGRAAM/098326/2008 em dois olivais em Trás-os-Montes. Duas
hipóteses estão a ser equacionadas: o uso de leguminosas anuais
de porte erecto (tremoço branco) ou sub-erecto (ervilhaca) e de
leguminosas anuais de ressementeira natural e ciclo curto.
Introdução
A olivicultura tradicional atravessa
uma fase difícil, parecendo caminhar progressivamente para uma situação de insustentabilidade económica. O preço dos
factores de produção (combustíveis, agroquímicos,…) tem registado uma subida
continuada, enquanto o preço do azeite
se tem mantido em valores muito baixos
www.olive.net/poolred. Por outro lado, a
produtividade das oliveiras não deverá
apresentar melhorias significativas nos
próximos anos, mesmo que algumas técnicas culturais, como a poda (Lopes et
al., 2009), a fertilização (Arrobas & Moutinho-Pereira, 2009) e a manutenção do
solo (Rodrigues & Cabanas, 2009) possam ainda ser significativamente melhoradas. A adopção do modo de produção
biológico pode modificar favoravelmente
algumas variáveis, designadamente a
comercialização do azeite a melhores
preços e a obtenção de apoios comunitários mais estimulantes. Contudo, o
cultivo em modo biológico é tecnicamente mais exigente, já que não podem
ser usadas algumas técnicas culturais
generalizadas em olival, como o uso de
fertilizantes e pesticidas de síntese industrial. Muitos dos olivicultores que adoptaram o modo de produção biológico não
têm conseguido manter a produtividade
e/ou viram aumentados substancialmente os custos de produção.
Métodos de
controlo de
infestantes em
olival biológico
A mobilização do solo não deve
ser usada como método de controlo das infestantes em olival biológico,
pelo impacte negativo na fertilidade do
solo. Os solos mobilizados tornam-se
mais vulneráveis à erosão hídrica e o
teor de matéria orgânica decresce devido ao arejamento excessivo do solo
(Tisdall, 1989; Fleskens & De Graaff,
2001; Arrobas & Rodrigues, 2002; Pastor et al., 2001). A jusante, o impacte
ambiental decorrente da erosão do
solo pode ser significativo, com eutrofização e deposição de sedimentos em
cursos de água e albufeiras. Em olivais mobilizados, a produção também
é afectada negativamente, sobretudo
pelos danos causados nas raízes das
árvores. A danificação do sistema radicular dificulta a absorção da água e
nutrientes próximo da floração, a fase
mais sensível das árvores a qualquer
stresse ambiental. A regeneração das
raízes implica consumo suplementar
de fotoassimilados que não poderão
ser canalizados para os frutos e os
novos ramos em crescimento. Acresce
que os apoios concedidos actualmente
no âmbito do PRODER sofrem também
uma redução significativa se o solo for
mantido através de técnicas de mobilização na totalidade das entrelinhas,
ainda que de mobilização mínima (Portaria N.º 427-A/2009).
Em olival biológico os herbicidas
de síntese industrial não podem ser
utilizados. Apesar de terem vindo a
ser comercializadas algumas substâncias naturais como herbicidas de
Revista da APH N.º 102
17
contacto (óleo de cravo, vinagre, ácido
cítrico,…), em particular nos Estados
Unidos, os estudos onde foram utilizados têm demonstrado que apresentam
reduzida eficácia e custos incomportavelmente altos para serem usados
em olival comercial (Lanini & Vossen,
2007).
Métodos térmicos, em que se usa
chama, vapor de água a temperatura
muito elevada ou radiação infravermelha, podem também ser usados
no controlo da vegetação herbácea
(Ascard, 1998). Contudo, certas espécies com os ápices vegetativos mais
protegidos, como as gramíneas, são
particularmente difíceis de destruir. Alguma eficácia só se consegue quando
se actua sobre a vegetação nas fases
iniciais do seu desenvolvimento, o que
obriga a passagens repetidas durante o ano (Lanini & Vossen, 2007). Os
equipamentos que utilizam chama, que
são os mais generalizados e eficazes,
têm sido usados no controlo das infestantes em espaços públicos e jardins
privados. Contudo, em ambiente mediterrânico levantam um problema suplementar que é o risco de propagarem
incêndios. Os equipamentos utilizados
queimam propano, originando a libertação de CO2 para a atmosfera, aspecto
menos positivo quando se procura uma
solução para o modo de produção biológico. Na prática, estes métodos não
apresentam, de momento, potencial
para que o seu uso se possa generalizar em olival.
A gestão da vegetação herbácea
através do corte é o método mais acei-
tável na perspectiva ambiental, na
medida em que favorece a infiltração
da água da chuva, minimiza a erosão,
aumenta o teor de matéria orgânica
do solo e preserva a biodiversidade
(Lipecki & Berbeć, 1997; Pastor et al.,
2001). Contudo, os cobertos vegetais
vivos consomem água, o que normalmente se traduz em perda de produção, em particular em olival de sequeiro
(Silvestri et al., 1999; Montemurro et al.,
2002; Rodrigues & Cabanas, 2007). A
gestão da vegetação herbácea através
do corte obriga também a uma adequada monitorização do risco de incêndio.
Os restolhos e o mulching de material
seco podem constituir carga combustível suficiente para, no caso de incêndio,
originar danos elevados nas árvores.
Assim, pode ser necessário estabelecer
barreiras de solo mobilizado nos limites
das parcelas para evitar a propagação
das chamas. Os custos associados ao
corte da vegetação podem também ser
elevados, sobretudo em primaveras húmidas em que seja necessário efectuar
mais que uma passagem.
Nutrição mineral
das plantas em
olival biológico
Uma outra grande dificuldade em
manter o olival em modo de produção
biológico está relacionada com a nutrição das árvores, pelo facto de, genericamente, os adubos de síntese industrial não poderem ser usados. Em olival
em modo de produção biológico os adu-
Figura 1 - Aspecto de um coberto de ervilhaca no momento em que está a ser destroçado.
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Revista da APH N.º 102
bos sólidos convencionais de aplicação
ao solo são substituídos por fertilizantes orgânicos e fertilizantes minerais de
baixa solubilidade. Aspecto importante
a considerar é o facto dos fertilizantes
autorizados em modo de produção biológico serem comercializados a preços
frequentemente especulativos e os produtos utilizados apresentarem, de uma
maneira geral, menor valor fertilizante
quando comparados com os adubos
convencionais (Rodrigues et al., 2006).
A necessidade de reforçar a adubação
foliar tem constituído praticamente regra entre olivicultores em modo de produção biológico. Na prática, os custos
com a fertilização aumentam sem que
se consiga resolver de forma satisfatória o fornecimento de alguns nutrientes,
com destaque para o azoto. Em olival,
tal como na generalidade dos agrossistemas, o azoto é o elemento mais
utilizado como fertilizante (FernándezEscobar, 2001; Freeman et al., 2005;
Connell & Vossen, 2007).
Gestão de cobertos
de leguminosas
em olival
Os cobertos vegetais devem ser
geridos tendo em conta a sua relação
com a fertilidade do solo. As leguminosas devem ser preferidas para os
cobertos vegetais dos olivais conduzidos em modo de produção biológico.
O facto de terem de ser semeados é
uma desvantagem relativamente aos
cobertos de vegetação natural, mas
espera-se que os custos associados
sejam amplamente compensados pelos benefícios da fixação biológica de
azoto.
A sementeira de leguminosas para
formação de um coberto vegetal pode
resultar na introdução no sistema
de quantidades apreciáveis de azoto, devido à possibilidade que estas
plantas têm de estabelecer simbiose com microrganismos da família
Rizhobiaceae,
com
capacidade
para fixar azoto atmosférico (Paul &
Clark, 1996). Através dos rizóbios, as
leguminosas têm acesso a uma fonte
inesgotável de azoto (N2 atmosférico),
o que permite a estas plantas grande
desenvolvimento vegetativo, mesmo
em solos de reduzida fertilidade natural, o que, na prática, significa também
que mais carbono entra no sistema,
promovendo a actividade biológica do
solo e contribuindo para o seu enrique-
cimento em matéria orgânica. Algumas
leguminosas, como os tremoceiros,
parecem ter capacidade especial para
absorver fósforo, através da segregação de ácidos orgânicos para a rizosfera (Le Bayon et al., 2006). Uma vez
na forma orgânica, o fósforo ficará mais
disponível para as árvores, após mineralização dos resíduos deixados no
solo pela leguminosa.
Os cobertos vegetais devem manter
o solo protegido com vegetação viva
durante o período outono/inverno e um
mulching de vegetação morta durante
o Verão (Rodrigues & Cabanas, 2009).
O grau de permissividade que se deve
ter com os cobertos vegetais vivos está
relacionado com as condições hídricas
do solo, na medida em que a vegetação herbácea compete com as árvores
pela água. Assim, em olival de sequeiro
é necessário ser-se, comparativamente, menos permissivo com a vegetação herbácea que em olival regado.
Quanto maior for a tolerância para com
a vegetação herbácea maiores serão
os benefícios na protecção do solo e
no incremento da sua fertilidade, mas
maiores serão os riscos de redução
da produção. Assim, em sequeiro a
perda de água pelo coberto deve ser
o aspecto principal a ter em conta, já
que a falta de água no longo período
estival é o principal factor limitante da
produção. Em condições de sequeiro
os cobertos devem ser destruídos mais
cedo, enquanto em regadio podem ser
destruídos mais tarde, favorecendo-se
a acumulação de biomassa.
Leguminosas
anuais de porte
erecto e sub-erecto
Existe em Portugal uma longa tradição na sementeira de tremoceiros em
olival para sideração. Os tremoceiros
são semeados no Outono e enterrados
no fim da Primavera com uma mobilização. A técnica tradicional tem duas
componentes perniciosas que podem
pôr em causa o sucesso da operação:
os tremoceiros são habitualmente destruídos muito tarde na Primavera, em
estado fenológico muito avançado, o
que permite excessiva competição pela
água; por outro lado, como se produz
muita biomassa, esta é habitualmente
enterrada com equipamentos de aivecas, que reviram a leiva e atingem maior
profundidade, aumentando o risco de
ocorrência de danos no sistema radicu-
Figura 2 - Aspecto de um coberto de tremoço branco no momento em que está a ser destroçado.
lar das oliveiras. Assim, os benefícios da
introdução de azoto, carbono e eventual
melhoria na disponibilidade de fósforo podem ser obscurecidos quer pela
perda de água pelo coberto quer pelos
danos causados no sistema radicular
das árvores. No projecto PTDC/AGRAAM/098326/2008 está em estudo o
efeito da introdução de cobertos vegetais de tremoço doce e ervilhaca em olival. No projecto ensaia-se uma gestão
dos cobertos distinta da utilizada tradicionalmente pelos olivicultores: quer o
tremoço quer a ervilhaca têm elevado
potencial de produção de biomassa e,
necessariamente, de transpirar água. É
necessário estudar a capacidade destas
espécies para introduzir azoto no sistema mas também definir o momento óptimo para a destruição do coberto, sendo
o segundo aspecto determinante em olival de sequeiro. A biomassa, destruída
na Primavera, é deixada sobre o solo
como mulching, evitando-se, assim, a
ocorrência de danos no sistema radicular das oliveiras. O mulching de material
vegetal morto mantém a protecção do
solo contra a erosão, promove a infiltração da água das precipitações estivais,
reduz a temperatura do solo e, consequentemente, a evaporação de água
durante o verão. Dada a elevada capacidade de produção de biomassa de tremoceiros e ervilhaca, não se prevê a necessidade de semear todos os anos, na
medida em que se espera que os efeitos
benéficos desta biomassa na fertilidade
do solo assegurem um estado nutritivo
adequado das árvores por um período
de dois a três anos (fig. 1 e 2).
Figura 3 - Aspecto de um coberto de trevo subterrâneo no início de Maio.
Leguminosas anuais
de ressementeira
natural
Outra hipótese muito atractiva do
ponto de vista teórico é o uso de leguminosas anuais de ciclo curto e
ressementeira natural (fig. 3). A ideia
é substituir a vegetação espontânea
por leguminosas anuais de ciclo curto, capazes de fixar azoto e incrementar o ciclo de outros nutrientes devido
ao maior potencial de produção de
biomassa. Como para garantir a ressementeira natural é necessário assegurar a maturação fisiológica das
sementes, devem usar-se leguminosas
de ciclo curto para minimizar a perda
de água pelo coberto.
Uma vez mais, o coberto deverá ser
gerido constituindo um mulching de
biomassa que proteja o solo durante o
Verão. A grande dificuldade nesta tecnologia deverá passar por garantir a per-
Revista da APH N.º 102
19
sistência das espécies semeadas. Apesar de haver longa tradição na gestão
destas espécies em pastagens, o facto
dos olivicultores habitualmente não possuírem rebanhos poderá torná-la bastante mais difícil. O corte da biomassa
deverá substituir o pastoreio na gestão
dos cobertos. Conseguida uma boa afinação desta metodologia, as potencialidades de uso serão imensas. Todo o
sector olivícola anseia por uma solução
deste género, quer para olival biológico,
quer para olival em produção integrada.
Nota final
Os cobertos vegetais de leguminosas poderão resolver alguns dos principais problemas da gestão da fertilidade
do solo em olival biológico. O uso de
destroçadores e a constituição de um
mulching de vegetação morta poderão
ser a chave que permita tirar as vantagens do cultivo das leguminosas na
fertilidade do solo, mantendo a perda
de água em níveis aceitáveis, preservando o sistema radicular e contendo
os custos, aspectos determinantes na
gestão sustentável do olival biológico.
AUTORES
M. Ângelo Rodrigues
[email protected]
Professor Adjunto da Escola Superior
Agrária de Braçança; Investigador do
Centro de Investigação de Montanha
Especialidade: Gestão do azoto em
agrossistemas
Francisco Pavão
[email protected]
Director da Associação de Olivicultores de
Trás-os-Montes e Alto Douro
Especialidade: Olivicultura
Joana Oliveira
[email protected]
Sócia Gerente da Viaz Produção e
Comercialização de Vinhos e Azeites, Lda.;
Economista
Especialidade: Gestão de olival biológico
Margarida Arrobas
[email protected]
Professora Adjunta a Escola Superior
Agrária de Braçança; Investigadora do
Centro de Investigação de Montanha
Especialidade: Fertilidade do solo e
nutrição de plantas
20
Revista da APH N.º 102
BIBLIOGRAFIA
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Protecção das plantas
Um intruso indesejável
em parques e zonas de lazer
Conceição Boavida
Glycaspis brimblecombei (Homoptera: Psyllidae) é um insecto
exótico de origem australiana que foi introduzido acidentalmente
em Portugal em 2007, originando explosões populacionais
espectaculares em diversas espécies de eucaliptos, designadamente
Eucalyptus camaldulensis e E. tereticornis, muito usadas nos parques
portugueses como árvores de sombra. A luta biológica clássica é a
opção mais adequada para controlar as populações desta psila.
O Parque Florestal de Monsanto,
em Lisboa, é um tesouro de frescura
e paz nos dias quentes de Verão. O
canto repetitivo das cigarras pelas horas do calor acompanha o caminhante
ao longo de trilhos ladeados por árvores altas de sombra generosa. Mas eis
que a sua atenção é subitamente desviada para o manto de folhas a seus
pés, que parece aderir obstinadamente
à sola dos seus sapatos. Levantando
os olhos, o caminhante descobre os
ramos pendentes de um eucalipto com
as folhas verdes salpicadas por pequenas conchas brancas de forma cónica.
O agente causador desta novidade indesejável é um insecto, uma
psila de origem australiana chamada
Glycaspis
brimblecombei
Moore
(Homoptera: Psyllidae). Na última
década, este insecto foi introduzido
acidentalmente em diferentes zonas
do mundo, dando origem a explosões populacionais espectaculares
em diferentes espécies de eucaliptos.
G. brimblecombei permaneceu confinado na Austrália até cerca de 1998,
altura em que foi detectada a sua presença nos Estados Unidos da América, na Califórnia (Dahlsten & Rowney,
2000). Posteriormente, outras regiões
foram invadidas pelo insecto, ao sabor
da intensificação do comércio de plantas de eucalipto: México, em 2000, Florida, Hawai e Ilhas Maurícias, em 2001
(EPPO, 2002; Sookar et al., 2003),
Chile, em 2002 (EPPO, 2004), Brasil,
em 2003 (Wilcken et al., 2003), Portugal e Espanha, em 2007 (Valente &
Hodkinson, 2008) e, mais recentemen-
te, Marrocos, em 2010 (Assali Fouad,
com. pessoal). Em Portugal, a zona de
distribuição conhecida abrange os distritos da Guarda, Castelo Branco, Santarém, Portalegre, Évora, Beja e Faro
(Valente & Hodkinson, 2008), para
além de Lisboa.
Entre as espécies de eucalipto
(família Myrtaceae) mais atacadas
pelo insecto, encontram-se Eucalyptus
camaldulensis e E. tereticornis, que
são vulgares em parques e noutras
zonas públicas de lazer em Portugal, representadas frequentemente
por exemplares que atingem dimensões consideráveis e são apreciados pela sombra, aroma e beleza. E.
camaldulensis é, para além do mais,
uma fonte de néctar para mel de muito boa qualidade (Doran & Wongkaew,
2008). Quanto à espécie E. globulus,
cultivada em Portugal pela fileira florestal para a indústria da celulose, é pouco atacada por esta psila (Valente &
Hodkinson, 2008).
Os estragos e incómodos causados
por esta praga são múltiplos. Por um
lado, ao sugarem o floema das folhas
dos eucaliptos para se alimentarem,
as psilas enfraquecem os rebentos e
podem até causar desfoliação (fig. 1).
Por outro lado, as psilas excretam melada que se cobre de fumagina e que
atrai insectos indesejáveis em parques
e zonas de lazer, nomeadamente moscas, vespas e formigas. A melada que
escorre das folhas e as conchas vazias
caídas sujam os passeios, bancos de
jardins e automóveis. Por fim, o solo
enche-se de folhas pegajosas e de
conchas vazias. Por estas razões, as
infestações de G. brimblecombei afectam o usufruto de parques e zonas de
lazer.
Revista da APH N.º 102
21
Figura 1 - Desfoliação causada por ataque de G. brimblecombei.
Figura 2 - Desenvolvimento de G. brimblecombei: A) ovos; B) ninfas; C) adultos.
BIOLOGIA,
MORFOLOGIA
E DINÂMICA
POPULACIONAL
A espécie G. brimblecombei reproduz-se por ovos e passa por cinco
fases de desenvolvimento juvenil (estados ninfais) antes de atingir o estado adulto (fig. 2). Os ovos, amarelos
e oblongos, são postos pelas fêmeas
nas folhas da rebentação mais nova, a
que ficam presos por um curto pedicelo enterrado na folha. Após a eclosão
dos ovos, as pequenas psilas neona22
Revista da APH N.º 102
tas, começam a alimentar-se através
de um fino estilete ventral, sugando o
floema da folha, ao mesmo tempo que
constroem laboriosamente um escudo protector com um fluido segregado
na zona anal, que endurece ao secar
(fig. 3). Este escudo, branco e de forma
cónica, está na origem do nome vulgar
por que é conhecida esta psila no Brasil: “psilídeo-de-concha”. A ninfa, relativamente sedentária, desenvolve-se
sob esta carapaça, que vai ampliando
à medida que cresce, podendo, contudo, construir uma nova concha noutro
local da folha. A concha pode atingir
cerca de 3 mm de diâmetro e 2 mm de
altura. As quatro primeiras mudas ( 1 )
do insecto, ou ecdysis, decorrem sob a
concha. De cada vez que a ninfa sofre
uma muda, empurra a exúvia contra o
topo da concha, onde acaba por ficar
recoberta pela secreção cerosa e integrada na concha. As ninfas possuem
um corpo oval, segmentado, achatado
dorso-ventralmente, com patas e antenas curtas. São desprovidas de asas,
cujo desenvolvimento progressivo se
processa no interior de duas estruturas
acastanhadas, ornadas com fileiras de
pontos brancos, situadas nos lados do
tórax, designadas por tecas. O comprimento das ninfas aumenta desde
cerca de 0,7 mm, na ninfa neonata, até
cerca de 1,2 mm, no 5.º estado ninfal.
Inicialmente, as ninfas apresentam
uma coloração amarelo-alaranjada uniforme, adquirindo ao longo do desenvolvimento marcas dorsais castanhas
e uma tonalidade verde no abdómen.
No final da fase ninfal, abandonam
a concha, sofrem a última muda e
transformam-se em insectos adultos,
capazes de voar, de saltar e de se reproduzir (fig. 4). Os adultos passam a
maior parte do tempo sobre as folhas,
alimentando-se da seiva, podendo caminhar ou permanecer parados, frequentemente percutindo a folha com
os tarsos das patas anteriores.
No laboratório, o ciclo de vida completa-se em 3 semanas a 26 ºC, sendo mais demorado com temperaturas
mais baixas (Firmino-Winckler et al.,
2009). O insecto adulto é alongado e
tem cerca de 3-4 mm de comprimento. As quatro asas são membranosas e dispostas sobre o abdómen à
maneira de um telhado. A coloração
dos adultos varia de verde pálida a
amarela-clara acastanhada, podendo
exibir marcas castanhas e laranja. A
cabeça é mais larga do que comprida,
com olhos grandes e globosos dispostos nos lados. As antenas são filiformes
e projectadas para a frente. Na frente
da cabeça, entre as antenas, existem
duas estruturas colunares características, chamadas genas. Os machos são
geralmente menores do que as fêmeas
e distinguem-se destas pela forma da
extremidade do abdómen, que é mais
estreita e termina por uma estrutura em
forma de pinças, revirada para cima.
Na Austrália, podem ocorrer de 2 a 4
gerações anuais (EPPO, 2002). A multiplicação das populações do insecto
é favorecida pela existência de folhagem juvenil e pela ocorrência de tempo
quente e seco. A actividade de diversos
predadores ( 2 ) indígenas generalistas existentes em Portugal, nomeadamente de crisopídeos, antocorídeos e
aranhas, que frequentam as colónias
do psilídeo e se alimentam de ninfas e
ovos (fig. 5), não é suficiente para conter a explosão populacional no verão e
evitar os estragos daí decorrentes.
CONTROLO
Figura 3 – Construção da concha de G. brimblecombei: A) e B) início; C) aspecto final.
Figura 4 – Adulto de G. brimblecombei.
Figura 5 - Ninfa de predador antocorídeo atacando uma ninfa de G. brimblecombei.
Na Austrália, só raramente se verificam surtos populacionais deste psilídeo e a sua presença passa usualmente despercebida (Philips, 1992; Halbert
et al., 2003). Isto deve-se à existência
de um conjunto de inimigos naturais
locais que, por terem evoluído em conjunto com G. brimblecombei ao longo
de milhares de anos, desenvolveram
uma adaptação estreita ao psilídeo,
regulando a densidade das suas populações e mantendo-a abaixo de níveis
prejudiciais. Uma dessas espécies,
o pequeno himenóptero encirtídeo,
Psyllaephagus bliteus, que é um parasitóide ( 3 ) que se desenvolve exclusivamente à custa das ninfas desta psila, foi importado para a Califórnia, em
2000, para ser estudado, multiplicado
e largado numa extensa zona afectada pela psila nos EUA, no âmbito de
um programa de luta biológica clássica
( 4 ). O estabelecimento e dispersão
natural do parasitóide no novo habitat
foram tão bem sucedidos, tal como o
controlo exercido sobre as populações
do hospedeiro fitófago, que encorajaram a adopção de programas idênticos
de luta biológica clássica no México, no
Chile e no Brasil.
Não existindo em Portugal este parasitóide, que fazer, então, para limitar os
estragos causados pela praga? A luta
química é desaconselhável devido à localização das plantas hospedeiras em
zonas de recreio e lazer. Para além disso, as conchas que protegem as ninfas
limitam a eficácia da luta química que,
por outro lado, é tecnicamente difícil
de realizar devido ao grande porte das
Revista da APH N.º 102
23
plantas hospedeiras e à sua dispersão.
Este meio de luta poderá ser reservado
para eucaliptos de monumentalidade
reconhecida, de preferência por meio
da injecção de insecticidas sistémicos.
Preventivamente, poderão evitar-se
durante o verão as práticas que favoreçam o vigor, como o corte de ramos e a
rega. No entanto, a única solução sustentável para controlar esta praga, tanto a nível económico como ecológico,
é, sem dúvida, a introdução de inimigos
naturais nativos da Austrália, específicos de G. brimblecombei, através de
um programa de luta biológica clássica
de âmbito nacional, à semelhança do
que foi feito noutros países invadidos.
De facto, uma vez conseguida a instalação permanente do parasitóide no
ecossistema, a sua especificidade em
relação ao psilídeo hospedeiro garante
o estabelecimento de uma relação de
interdependência entre as populações
de um e de outro, que conduz à regulação natural das populações da praga.
24
Revista da APH N.º 102
COMO DISSE?
( 1 ) Muda ou ecdysis: processo através do qual o insecto se desembaraça
da cutícula que reveste o seu corpo,
dura e sem elasticidade (exoesqueleto), e produz uma nova, maior, para
possibilitar o seu crescimento. As cutículas vazias são chamadas exúvias.
( 2 ) Predador: inimigo natural de um organismo que se desenvolve e cresce à custa
do consumo de numerosos especímenes
desse organismo (as presas) que o predador caça activamente.
( 3 ) Parasitóide: inimigo natural de um organismo que se desenvolve e cresce à custa do consumo de um único indivíduo dessa
espécie de organismo (o hospedeiro), previamente seleccionado pela progenitora do
parasitóide.
( 4 ) Luta biológica clássica: método de
luta contra pragas de origem exótica, baseado na importação, multiplicação e largada
de inimigos naturais da praga nativos da
zona geográfica de origem da mesma, visando o seu estabelecimento permanente
no novo habitat e a regulação natural da
população da praga.
AUTOR
Conceição Boavida
[email protected]
Investigadora Auxiliar do Instituto Nacional de
Recursos Biológicos (INRB, I.P.) – L-INIA
Especialidade: Protecção das Plantas.
Entomologia aplicada. Luta biológica
clássica.
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Protecção das plantas
A REDUÇÃO DOS RISCOS DOS PESTICIDAS
É DIFICULTADA A NÍVEL OFICIAL E DAS
EMPRESAS DE PESTICIDAS
Pedro Amaro
Desde 1994, intensificou-se, em Portugal, a prática de dificultar
a divulgação de informação sobre as características toxicológicas
e ecotoxicológicas dos pesticidas indispensável à redução do uso e
dos riscos dos pesticidas. É urgente a tomada de medidas visando,
nomeadamente, a eliminação de ilegalidades relativas à CATPF, a
pesticidas de elevado risco e à prática, a nível oficial e das empresas
de pesticidas, de esconder informação indispensável ao uso com
risco aceitável dos pesticidas.
INTRODUÇÃO
O Programa de Reavaliação de
1004 substâncias activas (s.a.) realizado pela UE, entre 15/7/93 e 13/3/09, no
âmbito da Directiva 91/414/CEE, proporcionou: a aprovação só de 26%; a
Não aprovação de 7% por se considerar INACEITÁVEL o risco do seu uso;
e a retirada do mercado de 67% por a
Indústria dos Pesticidas ter desistido
da realização da investigação indispensável ao esclarecimento dos riscos
para a Saúde humana e animal e para
o Ambiente (7,8).
Com frequência os pesticidas só são
autorizados pela UE com a exigência
da obrigatória adopção de medidas de
mitigação do risco. É assim indispensável a inclusão destas medidas nos
rótulos e nas fichas de dados de segurança e a sua ampla divulgação pelas
entidades oficiais e pelas empresas de
pesticidas visando a transmissão destes conhecimentos a agricultores, aos
técnicos e à população em geral.
A análise desta problemática tem
evidenciado graves deficiências e até
ilegalidades, da Autoridade Fitossanitária Nacional (AFN) (DGPC/DGADR)
e das empresas de pesticidas, evidenciadas na frequente prática de uma política de esconder a indispensável informação dos riscos dos pesticidas e das
medidas de segurança (1 a 9).
AS ENTIDADES
OFICIAIS IGNORAM
A LEI E ESCONDEM
A INFORMAÇÃO
A Comissão de Avaliação
Toxicológica dos
Pesticidas (CATPF)
A mais grave ilegalidade mantém-se
há quase 5 anos, pois desde 19/7/05
não funciona a CATPF, criada pelo
Decreto-Lei 284/94. A CATPF, além da
participação do Ministério da Agricultura (4 representantes), assegura também as dos Ministérios da Saúde (2
repr.) e do Ambiente (2 repr.) (4 a 9). As
suas funções têm a maior importância
por, nomeadamente:
- definir a classificação toxicológica,
as frases de risco e as frases de segurança (“tendo em vista a protecção do
homem, dos animais e do ambiente”);
- e “emitir pareceres do ponto de vista toxicológico e ecotoxicológico para
fins de homologação dos produtos fitofarmacêuticos, a pedido da DGADR.
Actualmente ignora-se quem toma
estas tão importantes e “delicadas” decisões, sem interferência de representantes da Saúde e do Ambiente !
Os pesticidas de
elevado risco e
os aplicadores
especializados
e as zonas tampão
Outra preocupante e grave ilegalidade, principalmente pelas nefastas consequências na saúde dos aplicadores
de pesticidas, consiste em ignorar as
exigências da UE em relação a pesticidas de elevado risco para o aplicador,
limitando rigorosamente o seu uso a
aplicadores especializados. A indiferença oficial por esta questão, obrigatória nos EUA desde 1972, é agravada
ao ignorar-se que o Dec. Lei 173/2005
determina, no Art. 17, que, desde
21/10/07, o uso dos pesticidas de elevado risco é limitado aos aplicadores
especializados. Além desta exigência,
outras como as zonas tampão em relação às águas de superfície (SPe3)
também foram impostas pela UE para
alguns pesticidas, como 5 fungicidas
(carbendazime, dinocape, fenarimol,
flusilazol e procimidona) autorizados
em 12/12/06, mas tudo é ignorado em
Portugal (2,4,5,6,8).
Esconder a informação
a nível da AFN e dos
Serviços de Avisos
Quanto a esconder a informação,
a nível oficial, além de se continuar a
aguardar, desde 2007, que a AFN divulgue a lista dos pesticidas de elevado
risco, para acautelar o risco do uso desses pesticidas e permitir o cumprimento
da Lei, referem-se mais dois exemplos,
entre outros citados na bibliografia: o
descoordenado e deficiente comportamento do Serviço de Avisos; e, desde
1995, o caso relativo a alguns pesticidas de maior perigosidade.
A deficiente informação do Serviço
de Avisos, quanto às características
toxicológicas e ecotoxicológicas dos
Revista da APH N.º 102
25
Quadro 1 - Informação dos Boletins de Avisos de 17 Estações de Avisos, em 2009 (9).
Estação de Avisos
Fr/p.t.
LFr
Douro, Terra Quente
•
•
Bairrada
•
•
Leiria
•
CT
•
O
IS
•
•
•
Nordeste
•
Castelo Branco, Guarda, Entre
Douro e Minho
•
•
•
•
Baixo Alentejo, Alto Alentejo
•
Algarve, Oeste, V. Sado,
Ribatejo, Dão, Cothn
•
•
Orivárzea
•
Fr/p.f.: Frases de risco do p.f.; LFr: Lista de frases de risco; CT: Classificação Toxicológica; IS: Intervalo
de Segurança; O: Ausência de informação.
Quadro 2 - Número de substâncias activas homologadas em Portugal e com efeitos
específicos na saúde humana, referido em Portugal e França, entre 1993 e 2005 (2,3,4,9).
.
Substância activa (n.º)
ANO
Portugal
França
1993
.
19
1995
2
1996
4
35
2001
7
48
2005
48
produtos fitofarmacêuticos (p.f.), é evidenciada nos Boletins de Avisos, divulgados em 2009 por 17 Estações de
Avisos (quadro1).
O conjunto da informação referida
nos Boletins, abrangendo: as Frases
de risco dos produtos fitofarmacêuticos
(Fr/p.f.); as Listas das frases de risco (LFr); a Classificação Toxicológica
(CT) e o Intervalo de Segurança (IS)
só ocorreu no Douro e na Terra Quente
(Mirandela), isto é em 12% das 17 Estações de Avisos. As Fr/p.f. foram também incluídas em Bairrada e Leiria (9).
Além do Douro e da Terra Quente,
as LFr foram publicadas em Bairrada,
Nordeste, Castelo Branco, Guarda e
Entre Douro e Minho e a Classificação
Toxicológica (CT) só no Nordeste, no
Baixo Alentejo e no Alto Alentejo. Os Intervalos de Segurança (IS) foram referidos em todas as Estações de Avisos,
excepto na Orivárzea (9).
É bem evidente a incapacidade da
Coordenação, da responsabilidade da
AFN, traduzida na diversidade e predominante insuficiência da informação (a
maioria isto é 53% das Estações de Avisos ignorou as frases de risco, em 2009)
indispensável à selecção dos pesticidas
menos perigosos para a Saúde humana
e animal e para o Ambiente (9).
Os pesticidas com efeitos específicos na saúde humana (ex: cancerígenos, mutagénicos, tóxicos para a
26
Revista da APH N.º 102
reprodução) foram quase totalmente
ignorados pela AFN, desde 1995 até
2004, em contraste com a informação de outros países como a França
(2,3,4,9). Só após a Directiva 1999/45/CE
e o Dec. Lei 82/2003, “os especialistas
da DGPC e da CATPF descobriram haver em Portugal em 2005, 48 s.a. com
efeitos específicos na saúde humana,
quando, em França, em 2001 se referia
o mesmo número 48 e em Portugal só
7 s.a.” (4) (quadro 2).
Este estranho comportamento da
Entidade coordenadora, a AFN, justificou duas questões que aguardam resposta desde 2007 (4):
- Qual a justificação para não considerar, em contraste com a França,
os “outros dados toxicológicos que
possam ser tomados em consideração quando tal se justifique”, que
a CEE, já em 1978, previa na sua
Directiva 78/631/CEE e que se tornaram mais numerosos e importantes entre 1995 e 2001?
- A quem (à CATPF, à DGPC ou às
empresas de pesticidas) pertencerá a
responsabilidade das possíveis consequências desta carência de informação
vital para assegurar que o risco seja
aceitável, com o uso de pesticidas com
efeitos específicos na saúde humana,
“esquecidos” durante 10 anos (1994 a
2005)?
É FREQUENTE AS EMPRESAS DE PESTICIDAS IGNORAREM A LEI E ESCONDEREM
A INFORMAÇÃO
As empresas de pesticidas esclarecem as características dos seus
produtos fitofarmacêuticos através de
rótulos, fichas de dados de segurança,
informação técnica e publicidade. Esta
informação deve respeitar as exigências legais e a sua fiscalização (infelizmente nula ou muito deficiente) deve
ser assegurada principalmente pela
ASAE e também por alguns organismos regionais ou centrais dos Ministérios da Agricultura, Saúde e Ambiente
(4,9). Não há conhecimento de qualquer
caso em tribunal ou de penalidade por
infracção desta natureza no “País Maravilha para os Pesticidas”(9).
A análise da informação, disponível
na Internet, sobre produtos fitofarmacêuticos, em Abril de 2010, evidencia
que, relativamente a empresas associadas na Anipla, só 4 (Basf, Du Pont,
Monsanto II e Nufarm P) proporcionam
o acesso aos tão importantes e esclarecedores rótulos. Quanto às Fichas
de Dados de Segurança (FDS), além
das 4 empresas referidas, foi possível
analisar as FDS de pesticidas da Agroquisa, Bayer e Sapec. O acesso às
FDS da Epagro e Selectis é condicionado por Username e Password, não
concedido após solicitação. A Dow e
a Syngenta só disponibilizam a Ficha
Técnica e quanto a Cheminova, Ind.
Vallés e Makhteshim não há qualquer
informação (quadro 3) (9).
Quanto a empresas não associadas
na Anipla, a análise na Internet relativamente a seis empresas com 9 a 26 p.f
não revelou qualquer informação sobre
características toxicológicas ou ecotoxicológicas dos seus pesticidas (9).
A observação de FDS de algumas
empresas de pesticidas evidenciou
frequentes faltas de rigor e de informação, nomeadamente sobre recentes
exigências de medidas de mitigação
do risco da European Food Safety
Authority (EFSA). A toxidade dos pesticidas para as abelhas é frequentemente ignorada nas FDS, chegando-se ao
cúmulo, num insecticida Extremamente Perigoso para abelhas, o imidaclopride, de nada referir na 12-Informação
Ecológica, na 15-Regulamentação e
em 16-Outras Informações e realçando na 3-Identificação de Perigos: “Nenhum risco especial conhecido” (9).
Nas Fichas Técnicas é muito frequente “esquecer” as características
Quadro 3 - Informação disponível, em Abril de 2009, na Internet, sobre produtos fitofarmacêuticos de 14
empresas de pesticidas associadas na ANIPLA (9).
Empresa de pesticidas
Rótulo
FDS
FICHA
técnica
FDS*
Basf
•
•
•
Du Pont
•.
•
•
Monsanto II
•.
•
•
Nufarm P
•
•
•
Agroquisa
•
•
Bayer
•
•
Sapec
•
•
Epagro
•
•
Selectis
•
•
Dow
•
Syngenta
•
Cheminova
Ind. Vallés
Makhteshim
*Acesso às FDS condicionado por username e password
Quadro 4 - Frases de risco do Pergado F, do folpete e da mandipropamida (12,13).
FRASE DE RISCO
N - Perigoso para o ambiente
R20 - Nocivo por inalação
PERGADO
FOLPETE
Rótulo
FDS
(12)
mandpropamida
AF N(13)
•
•
•
•
•
•
(1).
R36 - Irritante para os olhos
R40 - Possibilidade de efeitos cancerigenos
(2)
•
•
R41 - Risco de lesões oculares graves
•
R43 - Pode causar sensibilização
em contacto com a pele
R50 - Muito tóxico para organismos aquaticos
•
•
(2)
•
•
•
R51 - Tóxico para organismos aquaticos
•
R53 - Pode causar efeitos nefastos a longo
prazo no ambiente aquatico
•
•
Pode desencadear uma reacção alérgica
•
•
R63 - Possiveis riscos durante a gravidez
com efeitos adversos na descendência
•
• (3)
Pode formar uma mistura inflamavel pó-ar
•
Elevado risco a longo prazo para aves
insectivoras, pequenos mamiferos herbivoros
e minhocas
•
Zonas tampão de 5 m em trigo de
Inverno e 10 m em vinha
•
AFN: Autoridade Fitossanitária Nacional; FDS: Ficha de Dados de Segurança; (1): Só refere Nocivo;
(2): Só em 16 Outras informações; (3): Proposta em discussão.
toxicológicas e ecotoxicológicas e ignorar os símbolos toxicológicos (4,9).
Na Publicidade dos pesticidas, através de folhetos, e na imprensa são quase
sempre ignorados a classificação toxicológica e ecotoxicológica e os símbolos
toxicológicos, o que é ilegal…, mas que
tem permanecido impune, o que obviamente agrava a tentação da sua generalizada utilização (4,9).
Desde o primeiro semestre de 2005,
que se tem analisado a Política de redução dos riscos dos pesticidas em
Portugal, nomeadamente em 3 livros
divulgados entre 2006 e 2008 (1,4,6),
a partir duma intervenção do Eng. Rui
Delgado, técnico da Syngenta, num
Simpósio em Fevereiro de 2005 em
Ponte de Lima (4,9). Justifica-se, assim, a particular atenção dada à documentação desta muito importante e
prestigiada empresa de pesticidas, em
particular do Catálogo de 2006 e “de
seis fichas técnicas e um CD com os
rótulos, as fichas de dados de segurança, as fichas de transporte e as fichas
técnicas de 54 pesticidas, distribuídos
na Pasta do 7.º Simpósio de Vitivinicultura do Alentejo, em Évora em Maio de
2007.A análise apresentada em (4) evidencia a nula ou “muito escassa informação toxicológica e ecotoxicológica”.
Outro exemplo, confirmando ou
agravando esta orientação da Syngen-
ta, ocorre no Guia da Vinha, com excelente qualidade gráfica e rico manancial de útil informação para a selecção
e o uso adequado de cada pesticida,
mas com evidente proibição de referência às características toxicológicas
ou ecotoxicológicas (9,10).
Em Abril de 2010, a situação
é ainda mais grave! No portal da
Syngenta na Internet, as Fichas técnicas
(quadro 3), para cada pesticida, são
uniformes, mas, tal como no Guia da
Vinha, sem qualquer informação toxicológica ou ecotoxicológica (9).
No 8.º Simpósio de Vitivinicultura do
Alentejo, em Évora em 5 e 6 de Maio
de 2010, a Syngenta decidiu investir
com uma espectacular publicidade de
cartazes, Folheto e Boletim técnico,
coroada com a apresentação, de excepcional qualidade gráfica, da comunicação: PERGADO F – À prova de
míldio. Este fungicida é uma mistura de
mandipropamida (5%) e folpete (40%).
No Folheto de Publicidade do Pergado F, de 6 páginas, nada é referido
quanto às suas características toxicológicas e ecotoxicológicas, além das
esclarecedoras qualidades ditadas por
um Marketing “rigoroso” e intencionalmente convincente: “EXCELENTE
PERFIL TOXICOLÓGICO” e “BAIXO
IMPACTO AMBIENTAL. Assim se comete a ilegalidade (Decreto-Lei 92/95)
de ausências de verdade e da referência às categorias de perigo deste fungicida (quadro 4).
Este Folheto de Publicidade foi divulgado na Vida Rural de Maio de 2010
(p.24-25) (11) também sem informação
toxicológica e ecotoxicológica, além do
“EXCELENTE PERFIL TOXICOLÓGICO” e “BAIXO IMPACTO AMBIENTAL.
No Boletim técnico Pergado F, com
28 páginas e 8 capítulos, no Cap. 3 –
Perfil toxicológico, ecotoxicológico e
ambiental (pág.13-14) refere-se que a
mandipropamida tem “BAIXO RISCO
PARA ORGANISMOS AQUÁTICOS”.
Surpreendente qualidade não confirmada pela AFN (13) ao ser classificada
como (quadro 4):
• N – Perigosa para o ambiente;
• TÓXICA para organismos aquáticos (R51);
• Pode causar efeitos nefastos a longo prazo no ambiente aquático (R53).
Curiosamente o fungicida Pergado
F parece não ter o Perfil correspondente ao Cap.3. Para conhecer a classificação toxicológica e ecotoxicológica do
Pergado F foi preciso enfrentar a arte
de esconder e procurar muito e com
bastante cuidado até chegar à última liRevista da APH N.º 102
27
nha da penúltima página (pág. 27) para
descobrir, em 8.3 Precauções:
• Classificação: Nocivo – Xn; Perigoso para o ambiente – N.
E em linhas anteriores desta pág.27,
ainda em 8.3 – Precauções, com grande surpresa (e não conseguindo adivinhar a justificação para a ausência
desta informação no Cap. 3 – Perfil
toxicológico, ecotoxicológico e ambiental) surgem preciosos mas perigosos
esclarecimentos sobre o Pergado F :
• Possibilidade de efeitos CANCERÍGENOS (R40);
• Pode desencadear uma reacção
ALÉRGICA;
• MUITO TÓXICO para os organismos
aquáticos (R50);
• Pode causar efeitos nefastos a longo
prazo no ambiente aquático (R53).
Estas características, aliás referidas
no FDS e no Rótulo do fungicida, deveriam ser completadas por (quadro 4):
• Nocivo por inalação (R20);
• Risco de lesões oculares graves (R41);
• Pode causar sensibilização em contacto com a pele (R43);
• Possíveis riscos durante a gravidez com
efeitos adversos na descendência (R63);
• Elevado risco a longo prazo para as
aves insectívoras, os pequenos mamíferos herbívoros e as minhocas (na vinha);
• Para protecção dos organismos
aquáticos respeitar zonas tampão em
relação às águas de superfície de 5m
em trigo de Inverno e de 10m em vinha
(SPe3);
• Pode formar uma mistura inflamável pó-ar.
Que EXCELENTE PERFIL TOXICOLÓGICO e BAIXO IMPACTO AMBIENTAL do Pergado F. O que o Marketing
obriga e a AFN e a ASAE ignoram!!!
E é assim que a Syngenta “está activamente empenhada na promoção de
uma “Agricultura Responsável”, uma
abordagem que conjuga sustentabilidade económica, cuidados com a SAÚDE, segurança ambiental e responsabilidade social” (9)!
E o mais grave e preocupante é o
exemplo, como foi realçado na Reunião sobre os Serviços de Avisos,
em Viseu em Dezembro de 2008. No
sector dos pesticidas de intensa competitividade, envolvendo os interesses
de 90 empresas, como deve ser difícil
tomar decisões de proporcionar toda a
informação, de forma rigorosa e com
facilidade de acesso, como ocorre por
exemplo com a Nufarm P e a Basf,
tendo a coragem de revelar “aspectos
desagradáveis dos seus produtos”, pe28
Revista da APH N.º 102
rante as empresas que os escondem,
não cumprindo a Lei, por conhecerem
a inoperância da Fiscalização (9).
Também é bem revelador, da amplitude desta política de desinformação
e ainda das graves consequências na
muito deficiente formação de técnicos e de agricultores, o facto de não
haver qualquer referência a fichas de
dados de segurança, a frases de risco e de segurança e até a precauções
toxicológicas em dois importantes e
reveladores documentos da iniciativa
CULTIVAR A SEGURANÇA da Anipla:
Manual Técnico. Segurança na Utilização de Produtos Fitofarmacêuticos,
de 2007 e na Acção de Formação”
Segurança na Aplicação de Produtos
Fitofarmacêuticos,”s/d (9).
CONCLUSÕES
Em Portugal, na Primavera de 2010
e antes, foram frequentes as ilegalidades que dificultaram a prática de medidas de redução do risco do uso de
pesticidas, que condicionam o risco
do seu uso ser aceitável.
A nível oficial: durante mais de 10
anos (1994 – 2005) ignorou-se a perigosa toxidade de numerosos pesticidas com efeitos específicos na saúde
humana (ex: cancerígenos, mutagénicos e tóxicos para a reprodução) (quadro 2); esqueceu-se, desde Outubro
de 2007, de cumprir a Lei que limita
exclusivamente a aplicadores especializados o uso de pesticidas de elevado
risco; e esconde-se a informação sobre
a lista destes pesticidas e a relativa a
outras questões da maior importância
para a defesa da saúde humana e animal e do ambiente, como as frases de
risco e de segurança, nomeadamente
nos vário Guias da AFN e nos Boletins
dos Serviços de Avisos (ex: 53% das
17 Estações de Avisos sempre as ignoraram) (quadro 1).
A nível das empresas de pesticidas
predominam largamente as ilegalidades resultantes do não cumprimento
da Lei relativa à informação rigorosa
e verdadeira nas fichas técnicas e em
publicidade, ignorando ou escondendo
sistematicamente a tão importante informação sobre as características toxicológicas e ecotoxicológicas dos pesticidas (quadros 3 e 4).
É angustiante admitir que o futuro Plano Nacional de Acção, previsto na Directiva do Uso Sustentável dos Pesticidas, a
concluir até 14/12/12, poderá ser elaborado essencialmente por entidades oficiais
e privadas que têm, nos últimos 15 anos,
evidenciado, com persistência, o desrespeito da Lei e o profundo desinteresse e
até a oposição à redução do uso e dos
riscos dos pesticidas.
BIBLIOGRAFIA
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dos pesticidas, em Portugal em 2005. ISA
Press, Lisboa, 108 p.
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pesticidas. Revta APH, 89: 34-37.
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e os tabus dos pesticidas em Portugal. 1ª
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Castelo Rodrigo, Agosto 07. Revta Ciênc.
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8. Amaro P. 2010. Portugal país maravilha para os
pesticidas. O Segredo da Terra, 30: 37-40.
9. Amaro P. 2010. A deficiente informação aumenta os riscos dos pesticidas em Portugal. Revta
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10. Anónimo. 2007. Guia da vinha. Lisboa. Syngenta..
11. Anónimo. 2010. Pergado F. Míldio da vinha.
Uma ameaça constante. Vida Rural, 1757:
24-25. Syngenta.,
12. EFSA. 2009. Conclusion on the Peer review
of the pesticide risk assess.ment of the active
substance folpet EFSA Scientific Report, 297,
1- 80.
13. Henriques M, Carvalho B, Robalo JC & Barros
P. 2009. Mandipropamida. Produtos fitofarmacêuticos. Informação referente ao 4º trimestre
de 2009 p.61. DGADR-DSPFSV DHPF- 6/09.
AUTOR
Pedro Amaro
[email protected]
Foi responsável pelo início em Portugal
do ensino da Fitofarmacologia (1955), da
Herbologia (1971), da Protecção Integrada
(1977) e da Produção Integrada (1995) e
pela organização inicial do Laboratório de
Fitofarmacologia (1959-1967) e do Instituto
Nacional de Investigação Agrária (19741977).
Entrevista
Gabinete de planeamento e políticas
O Gabinete de Planeamento e Políticas (GPP) do Ministério da
Agricultura Desenvolvimento Rural e Pescas (MADRP) elaborou e
coordenou, em 2008, seis diagnósticos sectoriais relativos às Arvenses, Azeite, Carnes, Leite, Frutas, Hortícolas e Flores, e Vinho.
Nesta entrevista concedida pelo Director-Adjunto do GPP,
Dr. Bruno Dimas, à Revista da APH, procurámos saber que políticas estão a ser implementadas nas áreas de abrangência da
APH (horticultura herbácea, fruticultura, olivicultura, viticultura
e horticultura ornamental), e que medidas estão a ser implementadas para o Sector, visando a preparação da PAC pós- 2013.
A entrevista foi conduzida por Maria da Graça Barreiro e Maria Elvira Ferreira
APH – No âmbito das atribuições que estão cometidas ao GPP,
como proponente de políticas para
o sector agro-rural, de que modo
são auscultados e se envolvem os
diferentes agentes do sistema, designadamente os agricultores/empresários agrícolas, técnicos, investigadores e estruturas associativas
e cooperativas?
Bruno Dimas – As funções atribuídas ao GPP em matéria de definição
de políticas sectoriais fazem com que
o contacto com os agentes e representantes do sector seja uma constante da
sua actividade.
Esse contacto tem vários níveis,
desde as formais Comissões Consultivas, definidas na Lei Orgânica do GPP,
até ao contacto telefónico corrente,
passando por grupos de trabalho específicos, participação em congressos
e seminários e auscultação específica.
Por outro lado, a divulgação de informação é cada vez mais uma preocupação deste Gabinete, para fazer face
às necessidades e expectativas dos
nossos interlocutores externos, sendo
cada vez mais utilizados meios como a
página da internet do GPP, sendo disso
exemplo a área dedicada ao processo
de negociação da PAC Pós-2013, ou
mesmo fazendo uso de novas funcionalidades como redes sociais com a
criação de área do GPP no facebook
e twitter, ou a criação de página específica para a área da condicionalidade
na comunidade Google, que permitem
uma interacção directa com as entidades envolvidas nestas áreas.
Especificamente no sector hortofrutícola é de destacar que está em preparação no âmbito do Grupo de Trabalho para o Regime de Fruta Escolar
a respectiva página de internet, que
comportará uma área de fórum para
MADRP
relacionar produtores nacionais com os
municípios e escolas, destinatários do
regime.
APH – No documento de 2008
“Estratégia Nacional para o Sector
das Frutas e Produtos Hortícolas”
faz-se uma análise da situação do
Sector, visando a produção, comercialização e de um modo geral a
organização da fileira, incluindo as
Organizações de Produtores. No tocante à área da qualidade dos produtos, numa base das boas práticas
agrícolas e ambientais, qual o actual ponto da situação e que medidas
têm sido empreendidas?
Bruno Dimas – A qualidade dos
produtos agrícolas e agro-alimentares
tem vindo a ser um ponto de debate
importante como garante de competitividade da agricultura da União Europeia face à concorrência no mercado
global. A título de exemplo refira-se o
debate sobre o Livro Verde da Qualidade dos produtos alimentares desenvolvido pela Comissão Europeia em 2008
e que irá dar origem a iniciativas legislativas enquadradoras de um sistema
europeu para a qualidade.
Convém assinalar que o sector hortofrutícola tem uma larga experiência
em regimes de certificação de produto
business to business , em que as exigências da distribuição sobre práticas
culturais e de conformidade de produto
são uma condição para estar presente
no mercado. A este nível os Programas
Operacionais estão também orientados
para permitirem o apoio à participação
nestes regimes.
Revista da APH N.º 102
29
Portugal tem vantagens competitivas pelas condições de produção que
apresenta e que permitem a valorização da produção através de regimes
de qualidade certificada visíveis pelo
consumidor. De destacar o caso das
pomóideas que são as culturas mais
representativas, quer no modo produção biológico (40%), quer nos regimes
de indicação geográfica (60%), em que
existem dezoito produtos com nomes
protegidos.
Por fim, a Produção Integrada, que
actualmente é uma preocupação quase generalizada na produção de fruteiras, leva a que sejam incorporadas as
boas práticas agrícolas e ambientais
na actividade com as respectivas melhorias das condições de produção.
Esta evolução do sector permitiu assumir preocupações com a produção de
qualidade mesmo em regimes específicos
do sector, como o Regime de Fruta Escolar,
em que pelo menos 50% da fruta distribuída
gratuitamente nas escolas tem de ser proveniente de modos de produção de qualidade reconhecida.
APH – Outro sector igualmente
importante para a APH, particularmente para os seus associados,
é o do azeite. O INE aponta para
este ano uma produção recorde
do olival com cerca de 420 mil toneladas de azeitona para azeite.
Confirmando-se esta situação poderemos atingir o valor mais elevado
dos últimos 15 anos. Nestas condições, apesar da taxa de consumo
de azeite estar também a aumentar
progressivamente, poderemos admitir que entrámos no bom caminho
da redução das importações deste
produto? E quais as perspectivas no
tocante a mercados externos?
Bruno Dimas – A capacidade exportadora deste sector cresceu de 30%
da produção, no final dos anos 80, para
valores superiores aos 75% nos últimos
anos, tendo como principais mercados
alvo de exportação o Brasil, Espanha,
Angola, Venezuela, EUA e Canadá.
A tendência em Portugal é para
aumentos progressivos da produção,
impulsionados pelas novas áreas que
entraram em produção, para o que tem
contribuído a política de incentivo ao
investimento em novos olivais, mais
produtivos e tecnologicamente mais
evoluídos. Para a actual campanha de
2010/2011 a produção prevista é de
cerca de 67.000 toneladas de azeite, o
que representa um acréscimo de 15%
face à campanha anterior.
O aumento da capacidade produtiva expectável no curto prazo, com a
30
Revista da APH N.º 102
entrada em plena produção dos novos
olivais, levará a incrementar as exportações, não apenas para mercados
tradicionais como a UE e a América
do Sul, mas também sendo necessário
procurar alternativas de novos mercados, de que são exemplo a Índia e a
China. Para esta evolução terá grande
importância os sólidos grupos empresariais a actuar no sector, quer através de integrações verticais, do olival
à comercialização de azeite, quer por
compra directa preferencial do produto
nacional, contribuindo para um desenvolvimento sustentado da fileira.
Tendo
em
conta
o
crescimento da produção nacional, no
curto/médio-prazo, para níveis superiores ao nosso grau de auto-abastecimento será fundamental a aposta nos
mercados externos de modo a garantir
valor acrescentado para todo o sector.
A concorrência com outros países exportadores, particularmente da UE e
países africanos da bacia mediterrânica, vai ser determinante para a afirmação do azeite nacional no mercado mundial. É essencial a afirmação
de marcas globais apostando-se em
simultâneo numa diferenciação pela
qualidade e especificidade do azeite
português.
APH – E no tocante à rentabilidade para o produtor, a situação será
promissora para a instalação de novos olivais? - E o aumento dos custos ao consumidor?
Bruno Dimas – O futuro do sector
passará pela capacidade de penetração em mercados externos, sendo que
a rentabilidade dependerá das condições específicas de cada produtor.
O olival nacional regista um importante contraste entre um sector em
crescente dinamismo, voltado para o
mercado interno e de exportação, a par
de uma vasta área de olival tradicional
com níveis de competitividade mais reduzidos. Contudo, este olival, particularmente em zonas de impossibilidade
de rega ou com condições orográficas
difíceis, possui valências complementares ao valor do produto comercializado (valores ambientais – biodiversidade, combate à erosão, paisagístico,
varietal).
Tendo em conta estas diferenças
na competitividade e rendimento das
explorações, com prejuízo para o olival
tradicional, mas reconhecendo o seu
valor como sistema de produção multifuncional, foram orientados os regimes
de apoio ao olival previstos nos pagamentos complementares para este tipo
de produção de qualidade.
Os preços no consumidor dependerão de muitos factores, ligados às condições de oferta e procura e respectivos equilíbrios e, em menor escala, das
políticas. Do lado da oferta, há que ter
em conta a influência dos vários segmentos, da produção à comercialização, sendo importante, no azeite como
nos restantes sectores alimentares, o
aumento da transparência na formação
dos preços, para proteger os pontos
mais vulneráveis da cadeia, os produtores primários e os consumidores
finais, normalmente mais atomizados.
APH – Com o eventual agravamento dos preços a pagar pelo consumidor, associado à existência de
baixas quotas de mercado para os
produtos de produção biológica,
que futuro se perspectiva para o
azeite biológico?
Bruno Dimas – Não é previsível um
aumento significativo de preços no consumidor do produto convencional face
ao passado recente. Com efeito, a cri-
MADRP
se mundial originou uma redução dos
preços ao nível do comércio que teve
repercussões no preço à produção. Os
produtores e suas organizações estão
mais descapitalizados, com acesso
mais difícil ao crédito, tendo os preços
baixado de forma significativa, constituindo-se grandes stocks de azeite em
armazém As grandes marcas (marcas
brancas) concorrem entre si, deixando
uma maior capacidade para os compradores influenciarem os preços.
A quebra da procura no produto
convencional, numa gama vasta de
produtos alimentares, é contrariada por
outros factores como as preocupações
com a qualidade da alimentação, com
os benefícios ambientais ou com a
genuinidade/tipicidade, preocupações
que actuam a favor do consumo de
azeite, e que importa potenciar junto do
consumidor.
Com o aumento mundial da produção de azeite, com novos sistemas
intensivos de plantação e com um número reduzido de variedades mais produtivas para se obterem remunerações
mais elevadas há um espaço crescente para produções rústicas associadas
a regimes de qualidade diferenciada,
não apenas Produção Biológica mas
também DOP/IGP. Em Portugal, estes
modos de produção associados a variedades tradicionais podem beneficiar
desse aumento de interesse.
Acrescente-se ainda que, no âmbito das ajudas públicas ao Desenvolvimento Rural, nomeadamente os
apoios concedidos para a alteração de
modos de produção, são compensados
os custos de produção acrescidos de
modo a permitir o crescimento e consolidação de segmentos de mercado
como o do azeite biológico.
APH – Para além deste segmento olivícola, como está a ser equacionado o
balanço, económico e ambiental, entre
os olivais tradicionais (reconversão
vs. “abandono”) e os novos olivais intensivos e super intensivos?
Bruno Dimas – Para minimizar o
risco de abandono dos olivais tradicionais face a novos olivais intensivos
ou super intensivos, tendo em conta o
papel dos primeiros nas áreas menos
competitivas do território, sem regadio, com riscos elevados de erosão e
com impactos ambientais positivos de
um sistema de olival tradicional, assim
como a manutenção da variabilidade
genética associada à exploração de
variedades tradicionais, menos produtivas, foram criados apoios no âmbito
dos pagamentos complementares para
o sector do azeite, com a preocupação
de produzir para sistemas de qualidade
reconhecida.
Estes pagamentos têm, por um lado,
uma componente de mercado, apoio
específico no âmbito aplicável à produção de qualidade DOP/IGP de azeite
e azeitona de mesa e, por outro lado,
uma vertente agro-ambiental, apoio específico aplicável como protecção ao
património oleícola.
APH – A nível nacional, o GPP
propôs a reflexão e o debate em torno do futuro da PAC pós-2013. Para
o efeito criou uma página na WEB
disponibilizando toda a informação
que vai surgindo e abrindo o tema à
Consulta Pública Comunitária. Pode
falar-nos um pouco desta e outras
iniciativas?
Bruno Dimas – No âmbito da organização e dinamização do debate público e da preparação técnica e política
da negociação a nível nacional sobre
o Futuro da PAC, foram definidos dispositivos específicos de consulta no
MADRP. A constituição de um Grupo
de Peritos, tendo por principal missão
participar na identificação dos principais desafios e opções nacionais em
relação ao futuro da PAC pós-2013,
apoiando o MADRP na dinamização e
orientação do debate público e na melhor fundamentação das suas decisões
políticas, é um exemplo. Também foi
constituída uma Comissão de Aconselhamento da Agricultura e do Desenvolvimento Rural, que funciona junto do
Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas. Duas estruturas de coordenação que permitem
formar uma visão política.
A actuação do GPP nesta matéria foi
reforçada. Para além da colaboração
com o Grupo de Peritos, este Gabinete
tem vindo a concretizar a sua actuação
através do estabelecimento de uma
organização interna específica para a
sistematização e a análise no âmbito
de áreas temáticas relevantes para a
negociação, a participação em forma
de debates nacionais e internacionais
de reflexão sobre o Futuro da PAC e
através da produção e disponibilização
de informação pública na página web www.gpp.pt/pac2013.
O acompanhamento do debate e
negociação a nível comunitário e nacional tem sido objecto de uma sistematização periódica, cuja divulgação
institucional tem sido efectuada de
forma abrangente, inclusive a nível
inter-ministerial.
A actuação do GPP abrange ainda
outras dimensões, nomeadamente a
dinamização e apoio a iniciativas de
esclarecimento e debate público sobre
este tema, a identificação e fundamentação técnica das opções e cenários
mais favoráveis à defesa dos interesses nacionais e informação e auscultação regular dos outros organismos do
MADRP e das Regiões Autónomas.
Com esta entrevista, esperamos ter
levado ao conhecimento dos nossos
sócios e leitores, alguns aspectos do
enquadramento político actual de vários sectores da Horticultura Nacional
e dos percursos que estão a ser trilhados, visando o futuro da PAC pós 2013.
Neste contexto, em nome da APH,
desejamos manifestar os nossos maiores agradecimentos ao Dr. Bruno Dimas por ter acolhido, com toda a simpatia, a nossa pretensão de entrevistar
um dos actuais responsáveis pelos
destinos do GPP. Muito Obrigada!
MADRP
Revista da APH N.º 102
31
As Empresas dos Sócios Patrono
32 Revista da APH N.º 102
Revista da APH N.º 102
33
Actividade Interna
Sócios
Patrono
Secretariado
34
Revista da APH N.º 102
- A. Pereira Jordão, Lda.
- ADP Fertilizantes, SA
- Alípio Dias & Irmão, Lda.
- António Silvestre Ferreira
- Associação da Maçã de Alcobaça
- Brasplanta, Viveiro de Plantas, Lda.
- Dow AgroSciences, SA
- Grupo Hubel
- Koppert, Comércio de Produtos Biológicos Lda.
- Lusosem, Produtos para Agricultura, S.A
- Mercado Abastecedor da Região de Coimbra, SA
- Raul Patrocínio Duarte, Lda
- Sativa, Desenvolvimento Rural, Lda.
- SAPEC S.A
- Selectis, Produtos para a Agricultura, SA
- Sementíbrida, Lda.
- Soares & Rebelo
- Sugalidal, Indústrias de Alimentação, SA
- Tecniferti, Fertilizantes Líquidos
- Viveiros Mirajardim
Horário de funcionamento: De 2.ª a 6.ª Feira, das 8.30 às 14.30h
Tel.: 213 623 094 / 213 633 719 Fax: 213 633 719
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Editor da Revista: [email protected]
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Calendário de Eventos
Evento
Local
Site
2-3/10
11.ª Visita Vitivinícola da APH
Bucelas, Carcavelos e
Colares, Portugal
www.aphorticultura.pt
11-14/10
International Conference on Organic
Greenhouse Horticulture
Bleiswijk, Holanda
www.organicgreenhousehorticulture.
com
17-22/10
VII International Congress on
Cactus Pear and Cochineal
Agadir, Marrocos
www.ishs.org/calendar/
cactusVII_1stannouncement.pdf
25-28/10
International Workshop on Biological Control of
Postharvest Diseases: Challenges and Opportunities
Leesburg, Virginia,USA
www.ishs.org/calendar/BCPD_
Workshop2010.pdf
25-29/10 International Conference on Food Innovation 2010
Valencia, Espanha
www.foodinnova.com
Data
2010
11-12/11
International Symposium on Pyrethrum
Launceston, Austrália
[email protected]
15-18/11
9th Conference of the European Foundation for
Plant Pathology (EFPP) e 6th Congress of the
Sociedade Portuguesa de Fitopatologia (SPF)
Évora, Portugal
www.efpp10.uevora.pt
21-25/11
I International Symposium on Genetic Research of
Bamboos and Palms and III International
Symposium on Ornamental Palms
Campinas, Brasil
www.infobibos.com/symbampalm/
22-26/11 I International Symposium on Tropical Horticulture
Kingston, Jamaica
ocs.mona.uwi.edu/ocs/index.php/th/
th1
XI International Pear Symposium. General Roca, Argentina
www.inta.gov.ar/altovalle/Pears2010/
index.html
23-26/11
International Symposium on Urban and
Peri-Urban Horticulture in the Century of Cities:
Lessons, Challenges, Opportunities.
Dakar, Senegal
www.fao.org/agriculture/crops/corethemes/theme/hort-indust-crops/isd/en/
14-17/03
V International Symposium on Vegetable Nutrition
and Fertilization: Vegetable Farms Management
Strategies for Eco-Sustainable Development
Giza, Egipto
[email protected]
14-17/03
I International Symposium on Sustainable
Vegetable Production in South-East Asia
Salatiga, Indonésia
www.vegsea2011.ugent.be
19-23/03
I International Symposium on Wild Relatives of
Subtropical and Temperate Fruit and Nut Crops
Davis, USA
wildcrops2011.ucdavis.edu
4-7/04
International Symposium on Organic Matter
Management and Compost Use in Horticulture
Adelaide, Austrália
compost-for-horticulture.com
8-12/05
VIII International Workshop on Sap Flow
Volterra, Itália
www.sapflow8th.sssup.it
15-19/05
II International Symposium
on Soilless Culture and Hydroponics
Puebla, México
www.soillessculture.org
15-19/05
I International Symposium
on Microbial Horticulture
Alnarp, Suécia
www.ishs-microhort.com/
16-19/05
VI International Symposium on Edible Alliaceae
Fukuoka, Japão
www2.convention.co.jp/isea2011
Postharvest Unlimited 2011
Wenatchee, WA, USA
[email protected]
5-10/06
International Symposium on Advanced
Technologies and Management towards
Sustainable Greenhouse Ecosystems
Chalkidiki, Grécia
www.greensys2011.com
13-17/06
International Symposium on Responsible Peatland Management and Growing Media Production
Quebec, Canadá
www.peatlands2011.ulaval.ca/
5-9/12
2011
Secretariado
23-26/05
Revista da APH N.º 102
35
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revista da Associação Portuguesa de horticultura