1 O AGENTE MARÍTIMO: A NATUREZA JURÍDICA DA ATIVIDADE E SUA RESPONSABILIDADE POR ATOS PRATICADOS POR SEUS REPRESENTADOS Érico Lafranchi Camargo Chaves SUMÁRIO INTRODUÇÃO.........................................................................................................................2 1. DO CONTRATO DE AGÊNCIA NO NOVO CÓDIGO CIVIL.........................................5 1.1 Agência e representação comercial...................................................................................5 1.2 Natureza jurídica do contrato de agência..........................................................................7 1.3 Agência e contratos afins. Distinções................................................................................8 1.4 Sujeitos e objeto do contrato de agência.........................................................................10 2. NATUREZA JURÍDICA DA ATIVIDADE EXERCIDA PELO AGENTE MARÍTIMO. RESPONSABILIDADE E QUESTÕES CONTROVERTIDAS................12 2.1 Agentes marítimos e agentes de carga.............................................................................12 2.2 A responsabilidade do agente marítimo..........................................................................13 CONCLUSÃO.........................................................................................................................16 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................................17 RESUMO O presente trabalho tem por desiderato trazer breves apontamentos sobre a complexa natureza jurídica da atividade exercida pelo agente marítimo, fazendo o devido cotejo entre o contrato de agência, nova modalidade prevista nos artigos 710 e seguintes do Código Civil de 2002, e outras tradicionais modalidades de colaboração comercial, tais como o mandato e a comissão mercantil. Além disso, tecem-se algumas distinções entre a atividade exercida pelo agente marítimo, e a dos demais auxiliares da navegação. 2 Por derradeiro, centra sua análise em julgados da lavra do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo acerca da responsabilidade jurídica de natureza civil, penal e administrativa do agente marítimo por atos praticados pelo seu representado. ABSTRACT This work has the goal of showing brief notes about the complex legal nature of the activity exerted by the shipping agent, making the comparison between the contract made by the agency, the new method provided for in Articles 710 and following of the Civil Code, and other traditional methods of commercial collaboration, such as the mandate and the market committee. Also, make a few distinctions between the activities carried out by the shipping agent, and the other auxiliaries of navigation. By last, focuses its analysis on the recent cases of the Superior Court of Justice and the Court of Justice related with the legal responsibility of the shipping agents. PALAVRAS-CHAVE AGENTE. AGÊNCIA. CONTRATO. DISTINÇÕES. RESPONSABILIDADE. JURISPRUDÊNCIA KEYWORDS AGENT. AGENCY. CONTRACT. DISTINCTIONS. LIABILITY. JURISPRUDENCE INTRODUÇÃO Com o crescimento em escala global do volume da produção de bens e serviços, surge a necessidade do empresário de atuar muito além dos limites físicos de seu estabelecimento, para melhor colocação de suas mercadorias. Nos primórdios, tal captação se fazia através das figuras dos viajantes ou pracistas, empregados que, atuando na busca de clientes em outras praças, portanto afastados do recinto do estabelecimento empresarial, 3 continuavam vinculados ao corpo de pessoal permanente da empresa, mediante a subordinação advinda do contrato de trabalho. Considerando que o comércio internacional lastreia-se precipuamente no transporte marítimo de mercadorias, perfaz-se insuficiente para as empresas que atuam no segmento essa vetusta forma de atuação, do que decorre o aparecimento de novas figuras contratuais, das quais se valem o empresário para a obtenção da colaboração de outros agentes no escoamento de seus produtos e/ou serviços. Aliás, como bem preceitua Waldo Fazzio Junior (2008, p.507), “a cooperação formal entre empresários não é singela opção, mas estratégia necessária para viabilizar o atendimento da demanda, para abrir alternativas na disputa de posições favoráveis nas diversas zonas do mercado, para disponibilizar novos produtos e para possibilitar a ampliação territorial dos núcleos de captação de negócios”. Destarte, com o claro escopo de expandir seus negócios e facilitar a captação de novos clientes, é que surge a figura da agência marítima 1, empresa que tem por função exercer a representatividade do armador em uma determinada localidade. Sinteticamente, sua função, na condição de auxiliar da navegação, é o de colaborar com a empresa armadora nas tarefas da armação e do transporte marítimo2, dentre as quais se destaca a angariação de carga para os espaços disponíveis do navio (slot charters) e o controle das operações portuárias de carga e descarga. A definição legal do agente marítimo encontra-se estampada no art. 1º, III, da Portaria 48/95 da Secretaria de Vigilância Sanitária, vinculada ao Ministério da saúde, a qual define-o como “pessoa qualificada para representar um transportador e por ele ou em seu nome, autorizar todas as formalidades relacionadas com a entrada e despacho de embarcação, tripulação, passageiro, carga e provisão de bordo”. 1 Eliane Maria Octaviano Martins faz relevante distinção entre agente marítimo, que são agentes de navios e agentes de carga, tais como os transitários, despachantes aduaneiros e comissárias de despacho. Vide capítulo 3, retro. 2 Observa ANJOS E GOMES (1992, p. 21) que, dentre os serviços prestados pelo agente marítimo, incluem-se a "assistência nos despachos do navio e repartições governamentais; embarque e desembarque dos tripulantes; pagamentos; prestação de serviço junto à previdência social ou à saúde dos portos; condução para navios fundeados ao largo; requisição de práticos; amarradores; atracação, passagens aéreas ou terrestres para tripulantes que desembarcam; providências junto aos fornecedores, lavanderias etc. Como auxiliar de transporte marítimo assume a função, de contratação do transporte de carga, assim como das operações de manipulação da mesma; além do redespacho de mercadorias, ou seja, o despacho de mercadorias em trânsito após a descarga do navio" (OCTAVIANO, 2008, p. 323) 4 Fácil inferir, pois, que a atividade exercida pelo agente marítimo é complexa e envolve prestações disciplinadas por diversas figuras contratuais, já que o contrato firmado entre armador e agência sói incluir as tarefas de administração do navio, sua representação e a do armador perante as autoridades portuárias e governamentais, além do atendimento direto aos clientes. Dessa aparente confusão conceitual nasce a discussão acerca da natureza jurídica do contrato firmado entre a armadora e agência marítima. Não obstante parte substancial da doutrina conceitue o agente marítimo como um mandatário 3, há entendimentos jurisprudenciais que pugnam em sentido contrário, enquadrando a figura do agente na modalidade específica do contrato de agência, tipificado e disciplinado nos artigos 710 e seguintes do Novo Código Civil. Para análise da controvérsia, cite-se trecho do voto proferido pelo Ministro José Delgado quando do exame do Recurso Especial de nº. 410172/RS (DJ de 29/04/2002), no qual, ao apreciar a responsabilidade do agente marítima por falta ou avaria de mercadoria transportada, teceu-se as seguintes considerações, confira: “Conforme os ensinamentos de Pontes de Miranda, in ‘Tratado de Direito Privado Parte Especial, Tomo XLIX, 3ª. Edição, 1972, cabe trazer à baila algumas anotações sobre o agente marítimo, in verbis: ‘O agente, rigorosamente, não medeia, nem intermedeia, nem comissiona, nem representa: promove conclusões de contrato. Não é mediador, posto que seja possível que leve até aí a sua função. Não é corretor, porque não declara a conclusão dos negócios jurídicos. Não é mandatário, nem procurador. Donde a expressão “agente” ter, ao contrato de agência, sentido estrito’ “Assim, agente de navegação é: ‘a pessoa ou firma encarregada pelas empresas de navegação, de gerir os seus negócios em determinado porto, promovendo todas as diligências no sentido de desembaraçar os despachos dos vapores aí aportados, realizando em seu nome os contratos de fretamento para transporte das mercadorias destinadas a outros portos e embarcados nos navios ou embarcações da empresa que representa’ (DE PLÁCIDO E SILVA, in “Vocabulário Jurídico”, Vol. I, Ed. Forense, 1982, pág. 108)”. Assim, vê-se estabelecida a problemática: qual a natureza da atividade exercida pela agência marítima? Trata-se de agente, sob a ótica da novel legislação civil, ou de mero mandatário? E mais: quais as implicações dessa distinção na análise de responsabilidades? 3 Para Eliane Maria Octaviano Martins, que defende o enquadramento da figura do agente marítimo como mandatário, “o agente marítimo representa o proprietário do navio, o armador, o gestor ou o afretador/transportador ou de alguns destes simultaneamente”. Afirma ainda a festejada doutrinadora que “o agente marítimo poderá realizar todos os trabalhos necessários ao atendimento do armador, ou ser apenas agente comercial ou agente operacional” (2008:325). 5 Feitas essas considerações iniciais, e na esteira do posicionamento manifestado pelo Superior Tribunal de Justiça, cumpre traçar breves apontamentos sobre a disciplina do contrato de agência no direito brasileiro, cotejando-a com outras figuras contratuais mercantis, e por fim relacionando-as à atividade do agente marítimo. 1. DO CONTRATO DE AGÊNCIA NO NOVO CÓDIGO CIVIL 1.1 Agência e representação comercial Seguindo a tradição do direito europeu, a agência recebe por boa parte da doutrina tratamento similar à representação comercial, atividade há muito já regulamentada por lei especial (Lei nº. 4.886/65)4. Assim, é importante ressaltar que a análise do contrato de agência não prescinde do cotejo entre as definições do Código Civil (art. 710 e ss.) e as constantes da Lei 4.886/955. Primeiramente, a lei especial define diretamente o representante comercial (ou agente)6, ao passo que o Código Civil dá enfoque ao contrato típico que vincula o agente e seu representado. 4 Silvio de Salvo Venosa, sem embargo de reconhecer a similitude de tratamento dada às duas figuras contratuais, aponta a existência de algumas relevantes distinções entre ambas: “em vista da natureza dos dois contratos, ao menos em nosso sistema, não há razão para identificar a representação autônoma com a agência. Ambos os negócios jurídicos devem ser tratados como contratos distintos. O representante comercial é mais do que um agente, porque seus poderes são mais extensos. O agente prepara o negócio em favor do agenciado; não o conclui necessariamente. O representante deve concluí-lo. Essa é a sua atribuição precípua. Não é necessário que o agente seja qualificado como comerciante. A agência pode ter natureza civil. O representante, por via da própria orientação legal, será sempre comerciante” (2008:513) 5 Venosa pugna pela aplicação da Lei 4.886/65 sempre quando a atividade for exercida por representante comercial regulamentado, aplicando-se apenas subsidiariamente as disposições constantes do Novo Código. Leciona o festejado civilista: “Pouco importa que pratique ele (o representante comercial), negócios de agência ou de representação segundo o presente Código. Tratando-se de profissão regulamentada, estando o sujeito inscrito nos Conselhos Regionais dos Representantes Comerciais, subordinados estes ao Conselho Federal, aplica-se essa lei, que lhe é protetiva e cria, na verdade, um microssistema jurídico. Subsidiariamente, poderá ser aplicado o corrente Código. Há que se levar em conta, contudo, que essa lei atribui os direitos básicos do representante, que doravante devem ser harmonizados com os dispositivos do mais recente Código Civil. Assim, naquilo que o contrato e a lei protetiva forem omissos, preponderarão as disposições do atual Código” (2008:296). 6 Art. 1º. da Lei 4.886/95: “Exerce a representação comercial autônoma a pessoa jurídica ou a pessoa física, sem relação de emprego, que desempenha, em caráter não eventual por conta de uma ou mais pessoas, a mediação para a realização de negócios mercantis, agenciando propostas ou pedidos, para, transmití-los aos representados, praticando ou não atos relacionados com a execução dos negócios.” 6 Assim, de acordo com a novel codificação, o contrato de agência é aquele pelo qual uma pessoa – o agente – assume, em caráter não eventual, e sem vínculos de dependência, a obrigação de promover à conta de outra – o preponente 7 ou fornecedor – mediante retribuição, a realização de certos negócios, em localidade determinada8. São dedutíveis, portanto, as seguintes características do contrato de agência: a) existência de uma relação entre empresários, inexistindo entre eles dependência hierárquica, já que o representante age com autonomia na organização de seu negócio e na condução da intermediação dos negócios do último (conquanto tenha de cumprir programas e instruções do preponente); b) o contrato objetiva uma prática habitual, não eventual, estabelecendo-se entre as partes um vínculo duradouro, que não se adstringe a um negócio isolado; c) a representação importa atos promovidos por uma das partes à conta de outra, configurando, pois, uma intermediação na prática mercantil de interesse do representado; d) à realização da intermediação corresponde o direito do representante de perceber uma remuneração, de sorte a caracterizar o contrato de agência como bilateral, oneroso e comutativo; e) a representação deve ser exercitada nos lindes de uma zona determinada, cabendo ao agente praticar a intermediação dentro de um território estipulado pelo contrato, ou algo que a isso corresponda. De inferir-se, portanto, que a atividade do agente, realizada em nome e por conta de seu representado, é a intermediação, de forma autônoma, em caráter profissional e não habitual, sem dependência hierárquica, porém em consonância com as instruções do preponente (representado). Inconfundível, pois, com as figuras do mandatário, do comissário, do empregado ou do prestador de serviço em sentido estrito. Presta o agente um serviço especial, que é justamente o de promover a coleta de propostas ou pedidos a serem retransmitidos ao representado. 7 Salienta Humberto Theodoro Junior que “no Brasil, o novo Código Civil escolheu a nomenclatura recomendada pela antiga doutrina portuguesa, ou seja, preponente e agente, muito embora nos contratos de prestação de serviços com subordinação jurídica a tradição, entre nós, seja a de identificar o representado como preponente e não como proponente” (2003:27) 8 No proficiente escólio de Fran Martins, “o contrato de representação comercial é também chamado contrato de agência, donde representante e agente comercial terem o mesmo significado”. A partir desse enfoque, define o contrato de agência, ou de representação comercial como “aquele em que uma parte se obriga, mediante remuneração, a realizar negócios mercantis, em caráter não eventual, em favor de outra. A parte que se obriga a agenciar propostas ou pedidos em favor da outra tem o nome representante comercial; aquela em favor de quem os negócios são agenciados é o representado” (MARTINS, Fran. Contratos e obrigações comerciais. 6.ed., Rio de Janeiro: Forense, 1981, n. 206, p. 337. 7 Ressalva o parágrafo único do art. 1º. da Lei 4.886/65 que, no caso de “a representação comercial incluir poderes atinentes ao mandato mercantil” – isto é, quando ao representante comercial forem conferidos poderes relacionados com a execução dos negócios intermediados – “serão aplicáveis, quanto ao exercício deste, os preceitos próprios da legislação comercial”. Dito de outra forma, o agente pode, excepcionalmente, receber poderes que extrapolam a mera intermediação de pedidos, mormente na hipótese em que o preponente lhe incumbe da prática de atos de consecução ou execução dos negócios agenciados, o que implicará a incidência das regras do mandato mercantil9. 1.2. Natureza jurídica do contrato de agência O contrato de agência é classificável, em sentido amplo, como um contrato de distribuição, gênero no qual se inserem diversas figuras negociais voltadas para a chamada colaboração empresarial, tais como a comissão mercantil, a franquia, a corretagem, dentre outros, nos quais os agentes desenvolvem relevante papel na colocação no mercado de bens e serviços diversos oferecidos pelas empresas preponentes, de molde a beneficiá-las do contínuo trabalho promocional engendrado pelo agente junto à clientela. Efetivamente, a tipicidade do contrato de agência reside na especial modalidade de colaboração empresarial que representa, por intermédio de prestação do agente que tem por escopo o desempenho, em uma localidade determinada, de uma atividade profissional voltada à promoção e conclusão de contratos entre o preponente e os terceiros captados pelo preposto. Eventualmente os contratos agenciados podem ser concluídos e executados pelo próprio agente, não em nome próprio, mas sim sempre em nome e por conta do preponente. Destarte, independentemente da extensão dos poderes do agente, os negócios por ele intermediados ou concluídos se aperfeiçoam diretamente na esfera jurídica do preponente e do terceiro adquirente, do que se infere que, na conclusão do negócio intermediado, o agente não é parte, de sorte que nele não se acha em jogo um interesse jurídico de sua parte, mas tão- 9 No tocante aos poderes para a conclusão do negócio, Silvio de Salvo Venosa também faz interessante diferenciação entre o mero agente e o representante comercial, in fine: “na pureza de sua conceituação, agenciar não é fazer negócio, não é concluir contratos ou outros negócios jurídicos, mas simplesmente promovê-los a bom termo, em favor do dono do negócio (Pontes de Miranda, v.44, 1984:33). Daí porque, originalmente, à margem da posição legal, não há como confundi-lo com o contrato de representação, cuja finalidade é sempre a conclusão de negócios e nisso se aproxima ou se confunde com o contrato de distribuição” (2008:299) 8 somente um interesse econômico, porquanto o agente adquire direito à remuneração pelo serviço prestado na medida em que os negócios são consumados pelo preponente. No particular, esta flexibilidade no que tange ao alcance das atribuições do agente é também verificável no exercício da atividade da agência marítima, eis que o agente marítimo poderá assumir para si o maior número possível de atribuições, realizando todos os trabalhos necessários ao atendimento do armador, ou se limitar a atuar como agente comercial ou operacional, concentrando-se nas tarefas básicas de angariação de carga para os espaços do navio, e o controle das operações portuárias10. Não se pode ignorar, ademais, que a prática da agência nos moldes atuais implica o distanciamento de conceituações antigas, mormente a ligação histórica com a figura do mandato e consagrando acentuada liberdade de iniciativa. Reconhecendo-se o agente como um profissional independente, e em face do estabelecimento de um regime de direito social em defesa de seus direitos, tais como a duração por tempo indeterminado do contrato, remuneração mínima, inadmissível que se considere o contrato de agência como modalidade de mandato11. 1.3 Agência e contratos afins. Distinções. Recorrente é a confusão existente entre a novel modalidade contratual da agência e outras modalidades contratuais representativas de formas de colaboração empresarial, tais como o mandato, a comissão mercantil, a locação de serviços, o viajante ou pracista, a concessão mercantil e a franquia empresarial. 10 Destaca Eliane Maria Octaviano Martins (2008:325) que o agente marítimo pode também se ater à função de agente protetor, mormente quando não há interesse do afretador para a realização dos trabalhos de agente comercial e operacional, situação na qual o armador “será representado por um agente determinado pelo próprio afretador, ficando ele com a responsabilidade de proteger os interesses legais do armador (KEEDI e MENDONÇA, 2000:73) 11 Assevera Humberto Theodoro Junior, nessa esteira:“A natureza jurídica do contrato de agência é hoje a de um contrato típico, que se formou a partir da idéia de profissionalização do mandato e, mesmo, por meio de ‘uma evolução das regras do mandato clássico’. Assim, ‘o agente se beneficia de um estatuto originado de modificação de regras civis do mandato, seja sobre influência dos usos e regulamentos, seja do fato de uma abordagem econômica da agência que se desenvolveu recentemente’. De tal sorte, ‘o agente comercial continua um mandatário, mas deve ser apreciado enquanto profissional do comércio’. (...) O que efetivamente se tem, entretanto, é um mandatário remunerado e profissional, que melhor se qualifica com um profissional do comércio, cuja atividade específica ‘consiste na realização de atos materiais que visam à criação de uma corrente de negócios para a difusão dos produtos e serviços de outra empresa. Se pretender comparar a agência atual com outros contratos típicos, sua afinidade será maior com o contrato de prestação de serviços do que com o mandato, pois apenas excepcionalmente o agente se encarrega de tarefas que são próprias do mandatário”. (2003:26) 9 A priori, é importante classificar os contratos de que se vale o empresário para obter colaboração de outros agentes no escoamento de seus produtos ou serviços de que se vale o empresário para obter a colaboração de outros agentes. Esse escoamento pode se consumar por meio de auxiliares internos, que nada mais são do que empregados atuantes na captação de compradores, mantendo com a empresa vínculo empregatício permanente; e por intermédio de colaboradores externos, que podem ocupar um dos elos da cadeia de produção, comprando o produto do fornecedor para revendê-lo (intermediação), ou simplesmente contatando outros clientes potencialmente interessados em negociar com o fornecedor. Aliás, em breve parêntese, idêntico raciocínio se aplica no que tange à representatividade da empresa armadora, a qual poderá, como bem preleciona Eliane Maria Octaviano Martins, “estabelecer uma agência marítima sucursal própria, um departamento próprio, e indicar funcionários próprios como ‘prepostos’, com os poderes que se façam necessário (sic)”, caso em que se vale de auxiliares internos; ou ainda “contratar uma pessoa física ou jurídica para representá-la” (2008:324), hipótese típica da utilização de colaboração externa. Pois bem, feita breve digressão, cumpre realizar o cotejo entre o contrato de agência e demais figuras contratuais análogas, senão vejamos. A primeira distinção a ser feita – e quiçá a mais importante, por ser o epicentro da controvérsia lançada pelo julgado em análise – é a entre agência e mandato. A outorga de mandato, regra geral, destina-se à realização de negócios determinados, ao passo que a agência tem por escopo um relacionamento negocial permanente, abrangendo operações reiteradas e indeterminadas. O mandatário é detentor de poderes, outorgados pelo mandante, que lhe permitem deliberar sobre o negócio e o realizar em nome deste. O agente, por outro lado, limita-se a aproximar adquirente e fornecedor, não deliberando acerca do negócio. Pode eventualmente concluí-lo por conta do preponente, mas esta possibilidade desnatura o contrato, tornando-o complexo, e fazendo com que incida regras atinentes ao mandato12 12 Nesse sentido, dispõe o art. 710, parágrafo único, que “o preponente pode conferir poderes ao agente para que este o represente na conclusão dos contratos”, razão pela qual o art. 721, passim, manda aplicar ao contrato de agência e distribuição, no que couber, as regras concernentes ao mandato. 10 Ademais, o essencial ao contrato de agência é a pura e simples mediação de negócios em favor do preponente, o que não depende de poderes inerentes ao mandato. Nesse sentido, ressalta Humberto Theodoro Júnior que “quando estes poderes, eventualmente, se incluem nas cláusulas da agência, representam apenas elemento acessório, secundário ou acidental, não interferindo, por isso mesmo, na conceituação ou configuração, propriamente dita, do contrato, nem tampouco, na definição de sua natureza jurídica”. Nítida também é a diferença entre agência e comissão, posto que o comissário aliena bens ou serviços à conta do comitente, mas contrata em nome próprio, e não em nome da empresa a que presta colaboração, a qual, muitas vezes, é desconhecida do adquirente. O agente, por sua vez, não figura diretamente no negócio agenciado, o qual, no mais das vezes, será concretizado diretamente pelo preponente13. Quanto ao viajante ou pracista, não é difícil traçar distinções. Este, conquanto do ponto de vista prático realize atividade econômica idêntica à do agente, mantém vínculo empregatício com o preponente, ao passo que o agente atua por conta própria, organizando sua atividade autonomamente e de forma livre14. Distingue-se a agência, finalmente, da concessão mercantil, pois o agente não pratica o negócio de colocação do produto ou serviço em nome próprio, sempre atuando em nome e por conta de seu representado, ao passo que o concessionário ou revendedor adquire e revende a mercadoria que lhe é fornecida, negociando-a com o consumidor em nome próprio e por sua exclusiva conta. Ademais, nada recebe do fornecedor primário pela colaboração exercida, lucrando exclusivamente com o produto proporcionado pela revenda. 1.4. Sujeitos e objeto do contrato de agência Como já dito, são sujeitos do contrato de agência o chamado preponente, o qual dispõe dos bens e serviços a serem colocados no mercado; e o agente, que é o profissional encarregado de colaborar na promoção dos negócios do preponente, em que pese inexistir 13 Assevera Rubens Requião que “o representante comercial, agindo em nome e no interesse do representado, não é atingido pelos atos que pratica, dentro dos poderes que recebeu. Na comissão mercantil o comissário age em seu próprio nome, muito embora o tenha realizado por conta e no interesse do comitente”.(2003:16) 14 Humberto Theodoro Júnior assinala as principais diferenças entre viajante e pracista: “a) o viajante ou pracista não pode contratar pessoal para desempenhar a representação que lhe cabe (...); b) o viajante ou pracista não tem iniciativa pessoal, é hierarquicamente subordinado ao comando do empregador (...); c) o viajante ou pracista não pode aceitar representação de outras empresas (...); d) o viajante ou pracista não pode contratar subrepresentantes, a não ser mediante autorização do empregador” (2003:18). 11 vínculo de subordinação, sendo tão-somente devida a remuneração, de acordo com o volume de operações promovidas. Vê-se, pois, que ambos são empresários, dedicando-se cada um a negócios específicos: o preponente comercializando suas mercadorias e/ou serviços e o outro angariando clientela para a aquisição daqueles. Nessa esteira, o objeto do contrato, que é típico e de execução continuada, é uma atividade voltada à promoção de negócios individuais, consistente da captação de clientela, coletando-se propostas a serem transmitidas à empresa representada. Integra o contrato, por parte do preponente, a obrigação de remunerar o agente pelo serviço, remuneração que pode corresponder a um preço fixo, mas normalmente é calculada sobre um percentual sobre as operações úteis captadas pelo agente em benefício do representado. Imperioso destacar que o artigo 716 prescreve que “a remuneração será devida ao agente também quando o negócio deixar de ser realizado por fato imputável ao preponente”. O Código assim valoriza a chamada aproximação útil, e, assim sendo se o agente promove eficazmente o negócio que não se conclui por culpa do preponente, será devida a remuneração. E na mesma toada, dispõe o art. 717 que, sem prejuízo da remuneração devida pela aproximação, responderá o preponente pelas perdas e danos. A característica essencial do contrato de agência é a promoção, mediante a remuneração acima aludida, de contratos por conta do preponente, i.e, de negócios que venham a ser concluídos entre os terceiros e o preponente, ou que sejam concluídos pelo agente, embora em nome do representado. Excluem-se do âmbito da agência, quaisquer vendas ou revendas promovidas pelo agente, em nome próprio, eis que a operação é toda ela desenvolvida e consumada em nome e por conta do preponente. Trata-se de um contrato de duração, no qual o agente se obriga a exercer com habitualidade a intermediação de negócios em favor do preponente, enquanto vigente o pacto, o qual poderá ser resilido unilateralmente por qualquer das partes, mediante a concessão de um pré-aviso com antecedência mínima de 30 (trinta) dias, ou pelo depósito de importância igual a um terço da remuneração auferida pelo agente nos três meses anteriores15. 15 O art. 34 da Lei 4.886/65, todavia, não se refere, no tocante à resilição, à possibilidade de indenização, nem ao prazo mínimo de vigência contratual de 6 (seis) meses. 12 Em resumo, conclui Humberto Theodoro Junior que o contrato de agência tem como objetivo “a atividade do agente, com caráter de estabilidade, voltada para a promoção, dentro de uma zona determinada, de contratos que serão concluídos pelo preponente, para cuja consecução empenhará múltiplas atividades, de impulso e de agilização, tudo em busca de conquistar, manter e incrementar a demanda dos produtos do preponente” (2003:29). 2. NATUREZA JURÍDICA DA ATIVIDADE EXERCIDA PELO AGENTE MARÍTIMO. RESPONSABILIDADE E QUESTÕES CONTROVERTIDAS. 2.1. Agentes marítimos e agentes de carga. Dentre os diversos auxiliares da navegação, importante diferençar duas categorias de agentes: o agente marítimo e o agente de carga. O agente marítimo – objeto do presente estudo – é considerado um agente de navio, já que sua tarefa é representar a empresa armadora, auxiliando-o na armação propriamente dita e no transporte marítimo. Os agentes de carga, tais como os transitários, despachantes aduaneiros e comissárias de despacho, são agentes de carga, os quais representam o importador ou exportador, sendo responsável pela contratação do transporte da mercadoria, ou ainda, pela consolidação e/ou desconsolidação de cargas, e serviços afetos. Inconfundível, portanto, a função do agente marítimo com a do mero consignatário, que é nomeado pelo armador para representá-lo temporariamente, mormente por empresas que atuam no mercado tramp, sem linhas regulares. Também diversa é função do chamado cargo broker ou corretor de carga, o qual presta um serviço voltado à efetuação de booking16 e afretamento de navios para transporte de carga, respondendo, outrossim, pelas operações de logística de transporte necessárias à transferência da mercadoria da origem até em seu destino. Por sua vez, os ship’s brokers ou corretores de navio têm por tarefa intermediar operações relativas ao engajamento de cargas, ao fretamento, ao arrendamento, bem como a compra e venda de navios. Podem também prestar serviços diversificados, tais como a 16 Ato de reservar espaço em determinado navio para transporte de uma carga de um porto a outro. 13 tradução de documentos relativos à navegação; acompanhamento da entrada, desembaraço e saída das embarcações, perante as repartições responsáveis; vistoria de embarcações; acompanhamento de operações de carga e descarga; expedição de documentos; agenciamento de seguros marítimos17. O transitário de carga (freight forwarder ou forwarding agent) presta serviços relativos a operações anteriores ou posteriores ao transporte marítimo propriamente dito, atuando geralmente em nome e por conta do embarcador, sendo comum que acumule a função de despachante aduaneiro. Pode ainda excepcionalmente, atuar como transportador principal, desde que haja previsão contratual expressa nesse sentido. O despachante aduaneiro é o profissional responsável pela realização de todas as diligências relacionadas à importação, exportação, e demais operações aduaneiras, sendo suas atribuições devidamente minudenciadas no Decreto 646/92. Por derradeiro, a comissária de despachos é uma empresa prestadora de serviços que atua em portos, aeroportos e zonas fronteiriças, auxiliando importadores e exportadores nos trâmites necessários ao desembaraço aduaneiro de mercadorias importadas ou a serem exportadas. 2.2. A responsabilidade do agente marítimo. Por questões de evidente ordem prática, muitas ações de reparação por avarias e/ou outros danos, que a princípio haveriam de ser propostas em face da empresa armadora, cuja sede e bens, no mais das vezes, localizam-se no estrangeiro, acabam sendo propostas em face da agência marítima. Entretanto, a jurisprudência, majoritariamente, tem ilidido sua responsabilidade, seja de natureza civil, administrativa, ou tributária, por se tratar de fato praticado por terceiro (a empresa armadora/transportadora), sob o qual não exerce nenhuma ingerência. Os argumentos ora concentram-se no fato do agente ser mandatário do armador, ora por se tratar de agente na forma dos artigos 710 e seguintes do Código Civil. 17 Vide Decretos 5.595/28, 19.009/29,54.926/64 e 59.832/66. 14 A doutrina acolhe a tese de que, na condição de mandatário, o agente não responde por atos praticados pelo armador, como preleciona Cristina Wadner D’Antonio, confira: “O agente marítimo não é o afretador do navio, não manuseia a carga, não executa o transporte e muitos menos tem poder de ingerência sobre a navegação – atividade afeta exclusivamente ao armador –, razão pela qual não pode ser responsabilizado por atos praticados no exercício de seu ofício nem pelos atos do armador. Antes, exerce atividade estritamente mandatária e como tal [mandatário] fala e age em nome e por conta do armador [mandante]. Logo, é o armador quem irá contrair obrigações e adquirir direitos como se pessoalmente tivesse tomado parte no negócio jurídico” (2007:2). Na jurisprudência, porém, é que se verificam as divergências no tocante ao fundamento da exclusão da responsabilidade do agente. No julgamento do REsp 225.820, o saudoso Ministro Franciulli Netto, do Superior Tribunal de Justiça, sem adentrar diretamente à polêmica da relação entre agente marítimo e armador/transportador, aduziu as seguintes ponderações em seu voto, afastando a responsabilidade do agente na hipótese de infração sanitária cometida a bordo do navio 18, in verbis: “O agente marítimo não possui responsabilidade pelos negócios do armador. Ele é contratado pelo armador de um navio mercante para atuar como intermediário entre este e a praça onde vai atracar. A sua atividade consiste na facilitação dos negócios que são realizados entre o transportador e o importador. Já o armador é aquele que explora comercialmente uma embarcação mercante, sendo ou não seu proprietário. Assim, não há como confundir a figura do armador com a do agente marítimo. A aplicação de qualquer penalidade, seja tributária, seja administrativa, obedece ao princípio da legalidade, entendido este como sendo a necessidade de que haja lei, em sentido estrito, prevendo a infração, a pena e o sujeito passivo desta. Muito embora as ponderações da agravante sejam razoáveis, não há norma legal expressa atribuindo responsabilidade ao agente marítimo pelas infrações administrativas cometidas pelo armador. Assim, não se admite a extensão de responsabilidade que a agravante quer ver reconhecida”. No tocante à responsabilidade de ordem administrativa, portanto, a questão permanece estreme de dúvidas: regendo-se a atividade administrativa pelo princípio da reserva legal, inexistindo regramento específico a respeito, não há como se estender ao agente marítimo, na condição de mero representante que não interfere diretamente na execução das atividades de transporte, responsabilidade por atos praticados exclusivamente pelo armador. 18 Nesse sentido: STJ – RESP 826637-RS; AGRG NO RESP 584365-PE, RESP 784357-PR, RESP 170997-SP. 15 Fazendo alusão à Súmula 192 do extinto Tribunal Federal de Recursos (TFR)19, a Ministra Eliana Calmon também pugnou pelo afastamento da responsabilidade do agente quanto ao recolhimento do imposto de importação20, fazendo os seguintes apontamentos: “A jurisprudência cristalizou o entendimento a partir da avaliação de que o agente marítimo, embora interfira e facilite o desembaraço aduaneiro e a descarga, não pode, sequer por equiparação, igualar-se ao importador, o real responsável pelo imposto, nos termos do DL n. 37/1966. Poder-se-ia dizer que o agente marítimo seria o preposto do transportador que, pelo art. 41 do DL n. 37/1966, responde pelo conteúdo dos valores. Se assim fosse, ter-se-ia a conjugação do art. 41 do DL n. 37/1966, com o disposto no art. 135, II do CTN. Mas, na hipótese, era necessária a prova de que, no exercício do seu mister, agiu o agente marítimo com excesso de poder ou infração a lei ou ao contrato. A este argumento, junta-se mais um, decorrente da própria natureza do agente que, em verdade, não media, não intermedia (sic), nem comissiona. Não é tampouco mandatário, procurador, ou representante. É ele agente independente que segue as instruções da empresa, mas não a representa, como bem leciona Pontes de Miranda ao tratar do contrato de agenciamento”. Em seu conciso, porém não menos brilhante voto, a r. Ministra segue idêntica linha de raciocínio, afastando a responsabilidade tributária do agente por absoluta falta de amparo legal – até por não se enquadrar na categoria de contribuinte ou responsável, nos termos do art. 121, parágrafo único e incisos do Código Civil – todavia enfrenta, ainda que perfunctoriamente, a questão da natureza da atividade exercida pelo agente marítimo. E faz interessante consideração: conquanto se filie ao pensamento de que o agente não é mandatário do armador, considera a hipótese de responsabilização daquele, caso admitida tal forma de representação, quando age com excesso de poder ou infração a lei ou contrato. Ocorre que, como já visto, ao contrato de agência, nos termos do art. 721, aplicamse, no que couber, as regras concernentes ao mandato e à comissão, do que se conclui que o agente apenas responde por atos praticados por excesso de poder, i.e., a atuação fora dos limites estabelecidos no objeto da avença, ou infração a dispositivo de lei ou de contrato. 19 “O agente marítimo, quando no exercício exclusivo das atribuições próprias, não é considerado responsável tributário, nem se equipara ao transportador para efeitos do Decreto-lei n. 37 de 1966”. 20 Nesse sentido: RESP 148683-SP; RESP 176932-SP 16 Defendendo a tese de que o agente atua como mandatário 21, o Ministro Luiz Fux, no julgamento do REsp 640.895-PR, preleciona o quanto segue: “Deveras, o agente marítimo não pode ser autuado pela vigilância sanitária, posto que não é armador nem proprietário do navio. Ele exerce atividade de representação do armador em um determinado porto, tendo com ele um contrato de mandato regido pelo Direito Civil. A atividade de agenciamento compreende a requisição de serviços portuários de que careçam os navios durante a sua estada no porto, inclusive, providenciando, em nome dos armadores, a mão-de-obra avulsa, (práticos, estivadores, conferentes, vigias, etc), bem como os reboques e os materiais de consumo, combustível e reparos técnicos para os navios, alimentação e serviços médicos para a tripulação, além de se encarregarem das providências burocráticas junto às entidades, e, desde que necessário, estabelecem contato com os importadores e embarcadores em relação às cargas a bordo do navio ou que nele serão embarcadas, coletando os fretes e as garantias de avaria grossa, processando reclamações por falta e avarias simples, acompanhando e dando ciência aos armadores de processos fiscais,multas e ações judiciais eventualmente propostas contra os seus principais. Assim, o agenciamento marítimo está resumido na intermediação feita pelo armador no sentido de prover todas as necessidades do navio, no porto de destino”. Destarte, independentemente de quaisquer considerações acerca da natureza jurídica da atividade do agente marítimo, em regra, não responde por atos praticados pelo armador/transportador. Contrariando a regra geral, vale destacar as considerações do Juiz Oséas Davi Viana, no julgamento do Agravo de Instrumento nº. 1.292.675-7, do extinto 1º. Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo, senão vejamos: “Contrariamente ao sustentado pela agravante, o agente marítimo é parte ilegítima para figurar no pólo passivo de ação em causa, por não se tratar apenas de ‘despachante’ sem qualquer responsabilidade pelas mercadorias transportadas, mas, por fazer no território nacional o papel do armador do navio na contratação do transporte e recebimento ou entrega das mercadorias transportadas, não sendo simples mandatária, mas constituída por exigência legal para o referido fim, com responsabilidade específica na hipótese. Portanto, cabe ao mesmo responder integralmente pelo cumprimento do contrato celebrado pelo armador”. À guisa de conclusão deste tópico, atuando o agente em excesso de poder, poderá lhe recair o dever de indenizar, razão pela qual, a priori, o agente não pode ser considerado parte ilegítima, eis que o exame de sua responsabilidade não prescindirá da análise do mérito da causa. 21 Nesse sentido: AgRg no REsp 1055650-RJ 17 CONCLUSÃO A relação contratual existente entre agente marítimo e seu representado encaixa-se na figura típica do contrato de agência, a teor da novel disciplina trazida pelo Código Civil de 2002, não se confundindo, pois, com outras formas tradicionais de colaboração comercial, especialmente o mandato. No entanto, e especialmente quanto à possibilidade do agente de dar execução e conclusão ao negócio agenciado, o contrato tornar-se-á complexo, submetendo-se, no que couber, às disposições atinentes ao mandato e à comissão mercantil. No tocante à responsabilidade, seja de natureza civil, tributária, ou administrativa, em regra por não interferir diretamente na atividade explorada pelo representado, o agente marítimo não responde pelos atos praticados por seu representado, salvo se agir com excesso de poder, ou em infração à lei ou contrato. Não se pode reconhecer, a princípio, que o agente marítimo, pelas razões acima expendidas, seja considerado parte ilegítima para figurar no pólo passivo da demanda, pois a apuração de sua responsabilidade não prescinde do prévio exame do mérito da causa. 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS JUNIOR, Humberto Theodoro. Do contrato de agência e distribuição no Novo Código Civil. Mundo Jurídico, mai. 2003. Disponível em http://www.mundojuridico.adv.br/sis_artigos/artigos.asp?codigo=645. Acesso em 15 jul 2009. JUNIOR, Waldo Fazzio. Manual de Direito Comercial. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2009. MARTINS, Eliane Maria Octaviano. Curso de Direito Marítimo. 3. ed. Barueri: Manole, 2008, v.1. VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2008, v.6. 18 WADNER D'ANTONIO, Cristina. A responsabilidade jurídica do agente marítimo. PortoGente, out. 2007. Disponível em http://www.portogente.com.br/texto.php?cod=12012. Acesso em 15 jul 2009.