COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO DESTINADA A APURAR A REGULARIDADE DO CONTRATO CELEBRADO ENTRE A CBF E A NIKE Relator: SÍLVIO TORRES Presidente: ALDO REBELO 1º Vice-Presidente: NELO RODOLFO 2º Vice-Presidente: PEDRO CELSO 3º Vice-Presidente: EURICO MIRANDA SUB-RELATORES Eduardo Campos Jurandil Juarez José Rocha Dr. Rosinha Léo Alcântara Olímpio Pires Tráfico de Menores Passaportes Falsos Legislação Federações Sul e Nordeste Federações Sudeste Federações Norte Centro Oeste JUNHO/2001 ÍNDICE COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO DESTINADA A APURAR A REGULARIDADE DO CONTRATO CELEBRADO ENTRE A CBF E A NIKE (CPI CBF/NIKE). Composição............................................................................................................................1 DEMONSTRATIVO ESTATÍSTICO DAS REUNIÕES REALIZADAS...................... 2 AGRADECIMENTOS ......................................................................................................... 4 Introdução ............................................................................................................................. 8 Capítulo I – O futebol brasileiro: diagnóstico de suas dimensões; sugestões ............13 Capítulo II - Legislação Desportiva: Evolução Histórica................................................ 24 Capítulo III – A CBF é uma associação civil sem fins lucrativos ................................... 34 Capítulo IV – O Contrato entre a CBF, a Nike e a Traffic............................................. 56 Capítulo V -- Outros Contratos da CBF. A Parceria com a Traffic............................... 78 Capítulo VI – Administração da CBF acumula prejuízos.................................................91 Capítulo VII – Empréstimos no Exterior a juros extorsivos...........................................130 Capítulo VIII – Doações políticas. Criação de uma rede de influência política no Congresso. ..........................................................................................................................156 Capítulo IX – Declarações de Renda de Ricardo Teixeira.............................................175 Capítulo X - Federações: desagregação da organização conferativa ............................. 191 ACRE .............................................................................................................................. 194 ALAGOAS....................................................................................................................... 197 AMAPÁ ........................................................................................................................... 201 amazonas .......................................................................................................................... 209 BAHIA ............................................................................................................................. 227 BRASÍLIA ....................................................................................................................... 234 CEARÁ ............................................................................................................................ 249 ESPÍRITO SANTO .......................................................................................................... 253 GOIÁS............................................................................................................................. 259 MARANHÃO .................................................................................................................. 266 MATO GROSSO ............................................................................................................. 276 MATO GROSSO DO SUL ............................................................................................... 287 MINAS GERAIS.............................................................................................................. 292 PARÁ............................................................................................................................... 304 paraíba ............................................................................................................................. 309 PARANÁ ......................................................................................................................... 319 PERNAMBUCO .............................................................................................................. 331 piauí ................................................................................................................................. 338 rio de janeiro.................................................................................................................... 348 RIO GRANDE DO NORTE............................................................................................. 352 RIO GRANDE DO SUL................................................................................................... 358 rondônia........................................................................................................................... 372 RORAIMA....................................................................................................................... 380 santa catarina................................................................................................................... 388 SÃO PAULO.................................................................................................................... 392 sergipe .............................................................................................................................. 398 Tocantins ......................................................................................................................... 403 Capítulo XI – Passaportes falsos de jogadores ............................................................... 406 Capítulo XII - Fábrica de “gatos”. Falsificação de identidades e tráfico de menores para o Exterior................................................................................................................... 440 Capítulo XIII - Negócios de Juan Figer...........................................................................461 Capítulo XIV - Hélio Viana e Pelé Sports ....................................................................... 478 CAPÍTULO XV - OUTROS DEPOIMENTOS............................................................. 489 1. Depoimento do Deputado Federal Eurico Miranda ...................................................... 489 2. Depoimento de Kleber – Presidente da Kleffer........................................................... 501 3. Depoimento de Wanderley Luxemburgo ...................................................................... 506 Capítulo XVI -- Segurança nos Estádios........................................................................ 523 Capítulo XVII -- A Questão das Arbitragens.................................................................. 530 CAPÍTULO XVIII - PAINÉIS SOBRE A LEGISLAÇÃO DESPORTIVA ................ 533 XIX – CONCLUSÕES...................................................................................................... 540 ANEXOS ............................................................................................................................619 COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO DESTINADA A APURAR A REGULARIDADE DO CONTRATO CELEBRADO ENTRE A CBF E A NIKE (CPI CBF/NIKE). Criada pelo RCP nº 0003/99 Constituída em: 16/10/2000 Instalada em: 17/10/2000 COMPOSIÇÃO PRESIDENTE: 1º VICE-PRESIDENTE: 2º VICE-PRESIDENTE: 3º VICE-PRESIDENTE: RELATOR: TITULARES DEPUTADO ALDO REBELO (PCdoB-SP) DEPUTADO NELO RODOLFO (PMDB-SP) DEPUTADO PEDRO CELSO (PT-DF) DEPUTADO EURICO MIRANDA (PPB-RJ) DEPUTADO SILVIO TORRES (PSDB-SP) SUPLENTES Bloco PSDB, PTB ALEX CANZIANI (PSDB/PR) - 5842 ALEXANDRE SANTOS (PSDB/RJ) - 5302 IRIS SIMÕES (PTB/PR) - 5948 LÉO ALCÂNTARA (PSDB/CE) - 5726 (PSDB/CE) - 5725 MAX ROSENMANN (PSDB/PR) - 5758 SILVIO TORRES (PSDB/SP) - 5624 BASÍLIO VILLANI (PSDB/PR) - 5634 FERNANDO GONÇALVES (PTB/RJ) - 5256 JUQUINHA (PSDB/GO) - 5335 RAIMUNDO GOMES DE MATOS DARCÍSIO PERONDI (PMDB/RS) - 5518 GEOVAN FREITAS (PMDB/GO) - 5580 JOSÉ LOURENÇO (PMDB/BA) - 5313 JURANDIL JUAREZ (PMDB/AP) - 5383 NELO RODOLFO (PMDB/SP) - 5660 ANTÔNIO DO VALLE (PMDB/MG) - 5503 JOÃO MAGALHÃES (PMDB/MG) - 5211 JORGE PINHEIRO (PMDB/DF) - 5837 JOSÉ BORBA (PMDB/PR) - 5616 PEDRO CHAVES (PMDB/GO) - 5406 SÉRGIO REIS (PSDB/SE) - 5958 YEDA CRUSIUS (PSDB/RS) - 5956 Bloco PMDB, PST, PTN CHICO SARDELLI (PFL/SP) - 5706 CORAUCI SOBRINHO (PFL/SP) - 5460 JAIME MARTINS (PFL/MG) - 5333 JOSÉ MENDONÇA BEZERRA (PFL/PE) - 5314 JOSÉ ROCHA (PFL/BA) - 5908 DR. ROSINHA (PT/PR) - 5474 EDUARDO CAMPOS (PSB/PE) - 5846 PEDRO CELSO (PT/DF) - 5572 EURICO MIRANDA (PPB/RJ) - 5420 JOSÉ JANENE (PPB/PR) - 5608 OLIMPIO PIRES (PDT/MG) - 5384 ALDO REBELO (PCdoB/SP) - 5924 LUCIANO BIVAR (PSL/PE) - 5717 RUBENS FURLAN (PPS/SP) - 5836 PFL PT PPB EXPEDITO JÚNIOR (PFL/RO) - 5240 ILDEFONÇO CORDEIRO (PFL/AC) - 5231 JOSÉ MÚCIO MONTEIRO (PFL/PE) - 5458 LUIS BARBOSA (PFL/RR) - 5340 ROBERTO PESSOA (PFL/CE) - 5607 GERALDO MAGELA (PT/DF) - 5479 JOSÉ GENOÍNO (PT/SP) - 5270 TÂNIA SOARES (PCdoB/SE) - 5625 HERCULANO ANGHINETTI (PPB/MG)-5241 PDT TELMO KIRST (PPB/RS) - 5424 JOÃO SAMPAIO (PDT/RJ) - 5944 Bloco PSB, PCdoB 1 vaga Bloco PL, PSL PPS VALDECI PAIVA (PSL/RJ) - 5508 REGIS CAVALCANTE (PPS/AL) - 5724 COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO DESTINADA A APURAR A REGULARIDADE DO CONTRATO CELEBRADO ENTRE A CBF E A NIKE. DEMONSTRATIVO ESTATÍSTICO DAS REUNIÕES REALIZADAS 1 - AUDIÊNCIAS PÚBLICAS : - nº de reuniões realizadas: 35 - nº de horas: 188 h 26 min. – média aproximada de 5 h37 min., por reunião - nº de depoentes: 100 – média aproximada de 3 por reunião reunião reunião - nº de Parlamentares participantes: 380 – média aproximada de 11 por - nº de indagações formuladas: 1.900 – média aproximada de 55 por 2 - ORDINÁRIAS: - nº de reuniões realizadas: 17 - nº de horas: 23 h 39 min. – média aproximada de 1 h 37 min. por reunião - nº de Parlamentares participantes: 222 – média aproximada de 13 por reunião 3 - REUNIÕES DA SUB-RELATORIA DE LEGISLAÇÃO : - nº de reuniões realizadas: 7 - nº de horas: 25 h 11 min. – média aproximada de 3 h 58 min. por reunião - nº de depoentes: 25 – média aproximada de 4 por reunião - nº de Parlamentares participantes: 52 – média aproximada de 8 por reunião - nº de indagações formuladas: 260 – média aproximada de 37 por reunião 4 - TOTAL DE REUNIÕES (CPI + SUB-RELATORIA) - nº de reuniões realizadas: 59 - nº de horas: 237 h 16 min. – média aproximada de 4 h por reunião - nº de depoentes: 125 – média aproximada de 2 por reunião - nº de Parlamentares participantes: 654 – média aproximada de 11 por reunião - nº de indagações formuladas: 2.160 – média aproximada de 37 por reunião AGRADECIMENTOS Cresci no interior de São Paulo praticando futebol nas calçadas, nas ruas de terra, nos campinhos improvisados no meio de pastos e em espaços de recreio nas escolas. Privilegiado dentre tantos da minha idade, cheguei aos clubes que dispunham de campos de verdade para categorias menores. Não fui longe, mas me tornei um torcedor apaixonado e praticante bissexto mantendo com o futebol uma relação constante em toda a minha vida. Minha cidade, São José do Rio Pardo, diferentemente do que aconteceu comigo, revelou craques que se destacaram, forjados em condições semelhantes que tive na infância e juventude. Richard, que jogou pelo Palmeiras no início da década de 50, abriu caminho para uma fila de ídolos da terra que revelou e projetou Modesto, pelo Santos; Aloísio, pela Portuguesa; Zanata, pelo Vasco; Rondinelli, pelo Flamengo; Edson e Luiz Fernando, pelo Corinthians; Márcio Araújo, pelo São Paulo, e outros jogadores de bom nível técnico. Tive o prazer de conviver e até mesmo de jogar com eles nas 'peladas' e em torneios municipais. Minhas ligações com o futebol começaram bem antes e estão relacionadas à própria história da minha família: meu pai, Lupércio Torres, foi jogador e presidente do Rio Pardo F. C. que, a exemplo de outro time da cidade – a Associação Atlética Rio Pardense - disputou campeonatos amadores do Estado na década de 40. Meus irmãos seguiram destinos parecidos: Lupércio e Elizabeth ocuparam cargos de direção do mesmo clube e, um outro irmão já falecido, Marcus, foi diretor do Corinthians nos anos 80, atuando no futebol amador e no basquete. Permito-me registrar essas reminiscências pessoais para afirmar que elas foram um importante estímulo para a minha tarefa de levar à frente esta CPI, tarefa que julgo ter cumprido sem abdicar do enorme prazer que o tempo da minha vida ligado ao futebol me proporcionou. Creio eu, lembranças parecidas que a maioria dos brasileiros ainda preserva na memória e no coração. No entanto, as profundas crises moral e técnica que vêm destruindo o futebol brasileiro nos últimos anos acabaram afetando até mesmo os sentimentos e o interesse de milhões de simpatizantes e torcedores pelo futebol, que fugiram dos estádios, mudaram de canal de televisão e desligaram o rádio, indignados com denúncias de escândalos e irregularidades que estão presentes nos mais diferentes setores do nosso futebol. A isso se deve a criação desta CPI. Ela nos levou a dedicar oito meses de trabalho, na busca da identificação das causas e dos agentes que permitiram tamanho descalabro. O relatório que apresentamos é o resultado da investigação que a Comissão realizou por todo o País e, em alguns casos, até no exterior, para esclarecer a opinião pública sobre a realidade do futebol brasileiro, que se expressa não apenas nos oscilantes índices técnicos e no ufanismo de conveniência que tentam esconder a sujeira debaixo do tapete. Por isso, como se verá, além de analisar o contrato CBF/NIKE, procuramos trazer à luz todos os fatos que envolvem setores do futebol brasileiro relacionados com a entidade-mãe, a CBF, e, em especial, os contratos com patrocinadores, a administração da entidade e sua relação com as federações, além da ação dos empresários e agentes que representam interesses comerciais, econômicos e políticos. A CPI ouviu 125 pessoas; recebeu e analisou milhares de documentos e, além de repassar com transparência à opinião pública tudo o que encontrou, utilizou-se dessas informações para elaborar, na forma de projeto de lei, uma proposta para modernização e moralização do futebol brasileiro. Essa é a colaboração maior que acreditamos ter dado para ver resgatada a credibilidade desse esporte, que hoje se constitui em uma importante alavanca para a economia do País e, mais do que isso, queremos também preservá-lo como patrimônio cultural inalienável que o transforma em um bem público - o único que consegue unir todo o território nacional em torno de uma só paixão, democraticamente dividida por classes e segmentos sociais. Ao encerrar essa tarefa, que não contém a pretensão de preencher todas as expectativas da sociedade, estou convicto de que a CPI CBF/NIKE vai dar uma importante contribuição para que a ética, a transparência e o interesse público sejam valores essenciais para habilitar as pessoas e entidades que pretendam comandar o futebol brasileiro e levá-lo à condição de líder inquestionável do futebol mundial. O presidente da CPI, deputado Aldo Rebelo, foi o criador desta Comissão, pela qual lutou e à qual deu um brilho especial pela sua dedicação e liderança. Agradeço o privilégio de tê-lo tido como parceiro, assim como aos subrelatores, Dr. Rosinha, Eduardo Campos, José Rocha, Léo Alcântara e Olímpio Pires. Aos demais membros da Comissão, que se revezaram no trabalho de acompanhar audiências e sessões de votação, registro também meus agradecimentos, extensivos aos funcionários incansáveis da Secretaria da CPI, aos consultores e assessores da Câmara e aos colaboradores cedidos por outros órgãos, cujos nomes são listados em outro espaço do relatório. À imprensa, em especial à imprensa esportiva, agradeço o estímulo pelo acompanhamento constante e das informações relevantes que nos trouxeram, como também o fizeram inúmeros amigos e torcedores que se manifestaram pessoalmente e por correspondências enviadas à Comissão. Agradeço, ainda, ao líder e hoje presidente Aécio Neves que me escolheu, em meio a tantos companheiros competentes, para representar o partido nessa Comissão, sem interferir na minha liberdade de ação. Um especial agradecimento faço à minha mulher, Vera Lúcia, e aos meus filhos, Fábio, Henrique e Marina, apoio de todos os momentos, especialmente daqueles nos quais tive que me ausentar para realizar este trabalho. SILVIO TORRES Relator AGRADECIMENTOS: SECRETARIA DA CPI • • • • • ANTONIO CARLOS BARBOSA DEISE SIQUEIRA DEL NEGRO ESTEVAM DOS SANTOS SILVA MARCOS FIGUEIRA DE ALMEIDA MARIA TEREZINHA DONATI ASSESSORIA DA CPI • • • • • • CARLOS ALBERTO DE AZEVEDO CARLOS ANTÔNIO MENDES RIBEIRO LESSA EMILE PAULUS BOUDENS KÁTIA DE CARVALHO JACOPPETTI LUIZ HENRIQUE CASCELLI DE AZEVEDO PAULO DE SENA MARTINS REQUISITADOS DE OUTROS ÓRGÃOS • • • • • • • AGNALDO ANTONIO GISLENI – BACEN ANDRÉ LUIZ DE CARVALHO - TCU EDUARDO PINGARILHO MENDIZABAL – BANCO DO BRASIL FLÁVIO BRITO MAGNO – BACEN JOAQUIM PINHEIRO BEZERRA DE MENEZES – BACEN MIGUEL DE SIQUEIRA VERAS – BACEN NORBERTO DE SOUZA MEDEIROS - TCU • PEDRO ARRAES DE ALENCAR – BACEN INTRODUÇÃO A CPI para apurar a regularidade do contrato CBF-Nike foi requerida em 11 de março de 1999. E foi instalada em 17 de outubro de 2000, dezenove meses depois. Esse intervalo de quase dois anos é revelador das imensas resistências que se antepuseram à sua criação. Também durante sua vigência esta CPI encontrou dificuldades e obstáculos de variados tipos às suas investigações. E atuou ameaçada de ter seus trabalhos encerrados a qualquer momento. Seu fim prematuro foi anunciado inúmeras vezes pela imprensa. Trabalhou, pois, sob uma condição sui generis, porque as outras CPIs da Casa não costumam sofrer essa pressão, e há até uma delas que está em funcionamento já pelo segundo ano (sobre mortalidade materna). Encerra-se após oito meses. Cabe à sociedade avaliar contribuição que deu para o aperfeiçoamento do esporte nacional. POR QUE UMA CPI PARA INVESTIGAR O FUTEBOL? Por volta de 1993 a Confederação Brasileira de Futebol, a CBF, começou a chamar mais a atenção da opinião pública pelas suspeitas de irregularidades na sua administração do que pelas façanhas da Seleção canarinho. O empresário Edson Arantes do Nascimento, o Pelé, veio a público para denunciar que sua empresa de intermediação de patrocínios e de negócios de direitos de imagem televisivos na área esportiva, a Pelé Sports, havia sido vítima de uma tentativa de chantagem. A Pelé Sports tentava comprar junto à CBF os direitos de transmissão de imagem do Campeonato Brasileiro de 1994. Ofereceu 5 milhões de dólares por esses direitos. Pelé acusou o então diretor financeiro da CBF, José Carlos Salim, de exigir uma propina de um milhão de dólares, depositados num Banco da Suíça, para fechar o contrato. Pelé recusou-se a pagar e denunciou o fato à imprensa. Ricardo Teixeira, presidente da CBF, processou Pelé. Denúncias mútuas, agressões verbais, represálias, iriam se suceder durante os últimos sete anos. Essa polêmica revelou que nos bastidores do futebol nacional se desenrolava uma concorrência feroz entre empresas de intermediação de negócios publicitários na área esportiva, envolvendo também emissoras de TV e grandes clubes de futebol agrupados no “Clube dos Treze”. A empresa Traffic Assessoria e Comunicação, do ex-jornalista esportivo José Hawilla, saíra na frente e levava vantagem. Conseguira firmar contratos de exclusividade para intermediação de certos direitos da CBF. Vantagem que havia de se tornar virtual monopólio a partir das denúncias de Pelé, já que, desde então a Pelé Sports seria praticamente banida de negócios no Brasil durante a década dos 90. A luta comercial estendeu-se até à retaliação pessoal contra Pelé. Como no episódio em que João Havelange, então presidente da FIFA, solidário com seu então genro e sócio, Ricardo Teixeira, alijou Pelé, a maior celebridade do universo do futebol, das cerimônias oficiais de abertura da Copa do Mundo de 1994. A conquista do tetra-campeonato pelo Brasil na Copa de 94 foi o momento de maior prestígio da CBF sob direção de Ricardo Teixeira. Poderia ter significado o alívio das críticas que a direção da entidade vinha recebendo. Mas a repercussão da gloriosa conquista acabou parcialmente comprometida dois dias depois, pelo “Vôo da Muamba”. De volta ao Brasil, a delegação tetracampeã provocou escândalo ao tentar trazer 17 toneladas de bagagem, sem passar pela Alfândega. Por um instante a Nação suspendeu os aplausos e assistiu perplexa a um espetáculo de arrogância e truculência, encenado pelo presidente da CBF, que tentava colocar-se acima da lei. Em 1997, estourou o Escândalo da Arbitragem, que envolveu Ivens Mendes, até então responsável pela Comissão Nacional de Arbitragem da CBF, CONAF. Acusado de graves irregularidades, Ivens Mendes foi afastado da função, decisão tomada em Assembléia Geral da CBF. Intensificou-se o debate sobre os chamados “instrumentos de poder da cartolagem”, ou seja, a justiça desportiva, a arbitragem e o passe. O futebol profissional havia se convertido plenamente num produto comercial, movimentava vultosos capitais. Essa tendência encontrava respaldo na mudança de legislação -- “Lei Zico” em 1993; “Lei Pelé” em 1998, -- que abriam espaço para a intervenção empresarial em seu gerenciamento. Generalizava-se o debate sobre questões como patrocínio desportivo, comercialização de marcas, exploração do desporto por empresas públicas e privadas para fins de publicidade e parcerias entre clubes e bancos de investimento. Repercutia intensamente o sucesso de algumas parcerias como, por exemplo, Coca-Cola e Comitê Olímpico Internacional, Energil e Cruzeiro, Parmalat e Palmeiras. Alastrava-se a idéia de que é possível transformar o futebol num grande negócio, desde que os clubes sejam administrados como empresas, supostamente sem concessões às disputas internas pelo poder político, substituindo os “cartolas” por executivos de fundos de investimentos, “sintonizados” com o mercado. A Confederação Brasileira de Futebol também se contaminou desse viés empresarial. A CBF anunciava com desenvoltura seu sucesso em negócios que envolviam grandes números, milhões de dólares. Dessa dança dos milhões o que a torcida mais percebia eram: 1) a partida em massa dos nossos melhores jogadores para irem jogar no Exterior; 2) os grandes lucros das empresas de marketing esportivo, os sinais de rápido enriquecimento de empresários, agentes de jogadores, de dirigentes. Paralelamente, as finanças de clubes e federações iam de mal a pior, em estado de crise econômica e financeira cada vez mais grave. A grande massa de atletas ficou ainda mais abandonada, com salários mais baixos, sem acesso a assistência médica nem a um plano de previdência social. Quanto aos poucos craques afortunados por contratos milionários, espalharam-se pelo planeta, deixando atrás de si um futebol menos vistoso e estádios crescentemente vazios. Quanto ao essencial, quanto à arte do jogo, aos resultados, à qualidade do futebol praticado pela seleção brasileira, e pelos clubes, o futebol milionário e marqueteiro amargava frustrações crescentes, como se viu da atuação fracassada na Olimpíada de 1996 e a sucessão de maus resultados desde então. O episódio mais significativo dessa euforia empresarial deu-se em meados de 1996 com a assinatura de um contrato entre a CBF e a multinacional Nike de material esportivo. Trata-se de um contrato de patrocínio e apoio, entre a empresa Nike Europe B.V., e a Confederação Brasileira de Futebol, intermediado pela Traffic Assessoria e Comunicações. Por este contrato, a Nike tornou-se co-patrocinadora da CBF, junto com a Coca-Cola, para o uso da imagem da seleção brasileira de futebol, além de patrocinadora e fornecedora exclusiva de material esportivo da CBF. A outra face da moeda: o episódio mais frustrante deu-se em 1998, com a derrota da seleção brasileira na final da Copa do Mundo, para a França. A maneira como nossa seleção se comportou na maioria dos jogos, e como foi derrotada, levantou a indignação contra os métodos usados na seleção e sobre os critérios de administração da CBF. A Nação torcedora teve o vislumbre de que os dirigentes da CBF estavam por demais ocupados com grandes negócios. Para eles, o futebol era o que menos importava. O Deputado Aldo Rebelo relembra: “Das cenas de tristeza e revolta pela derrota do Brasil na Copa da França, uma me impressionou em particular. Era a foto de um estudante com um cartaz onde desenhara a Bandeira do Brasil. No lugar da frase “Ordem e Progresso” ele escreveu: “Nike”. Abaixo, o grito de repulsa: “Nossa bandeira agora é esta”. O estudante levou seu protesto para o aeroporto do Rio, na hora em que o presidente da CBF desembarcava com a taça de vice-campeão. Um segurança do sr. Ricardo Teixeira destruiu o cartaz”. O jornalista Juca Kfouri, então na Folha de S. Paulo, ousou fazer as perguntas cabíveis. A onipresença da NIKE em todos os momentos da vida da seleção tornou-se o alvo principal das críticas. Que significava essa interferência que ia desde a convocação, escalação, programação de eventos que obrigava a suspensão de treinamentos, que escolhia de adversários, inclusive data e local? Em que medida a interferência da Nike na seleção brasileira influenciara no insucesso do time brasileiro? A suspeita de que a CBF havia cedido o controle sobre a seleção brasileira à Nike não parava de crescer, embora ainda não fossem conhecidas as cláusulas do contrato. A LUTA PELA CONVOCAÇÃO DA CPI Só em janeiro de 1999 a imprensa teve acesso ao contrato entre a CBF e a Nike. Sua divulgação levantou vozes indignadas. O jornalista Armando Nogueira viu o contrato como “uma rendição melancólica ao poder do dinheiro”. E foi adiante: “posso, agora, entender a onda de maledicência popular que atribuiu a derrota brasileira no final da Copa a um conchavo comercial”. Em 11 de março de 99, o Deputado Aldo Rebelo enviou requerimento ao Deputado Michel Temer, então presidente da Câmara dos Deputados, em favor da criação desta Comissão Parlamentar de Inquérito destinada a investigar a regularidade do contrato CBF-Nike. Alegava como motivos suficientes a existência de “cláusulas contratuais que asseguram à Nike a organização dos jogos e a escolha dos times que competirão com a seleção brasileira e limitam o poder de decisão da CBF sobre os jogos amistosos destinados à preparação técnica e tática do time”. Argumentava que tais cláusulas podiam significar o desrespeito aos princípios fundamentais inscritos no artigo 2º da Lei Geral do Desporto, entre os quais os da soberania, da autonomia e da identidade nacional; e ao art. 4º, § 2º da mesma Lei, que dispõe que “a organização desportiva do País, fundada na liberdade de associação, integra o patrimônio cultural é considerada de elevado interesse social”. A CBF opôs-se à convocação da CPI. Ricardo Teixeira, argumentava que, por tratar-se de uma entidade civil de direito privado, a CBF não poderia ser investigada pelo Congresso Nacional. De início, a CBF arregimentou deputados, dirigentes de futebol, artistas, treinadores, para esvaziar a proposta. Ricardo Teixeira convenceu o ex-treinador da seleção, Mario Zagallo e aquele que na época era o treinador, Wanderley Luxemburgo, a enviarem cartas à Câmara de Deputados negando qualquer interferência da Nike na seleção. Luxemburgo chegou a ser mandado a Brasília para reafirmar pessoalmente sua posição. Vários Deputados que haviam subscrito o requerimento foram pressionados e retiraram suas assinaturas. Apesar disso, restaram 206 assinaturas (são necessárias 171) e a CPI pôde ser criada. Mas ainda não foi dessa vez que se implantou. Desencadeou-se uma operação-abafa: imediatamente foram desarquivadas CPIs remanescentes, criadas na legislatura anterior, e que haviam sido encerradas em 31 de dezembro de 1998. CPIs aprovadas, mas que não haviam sido instaladas, foram abertas às pressas. Como o regimento limita a cinco o número de CPIs simultâneas, a da CBF, que era a segunda, passou a ser a oitava. Iria amargar na fila por 19 meses. Sua criação se efetivou em 16 de outubro de 2000. Só depois que novos incidentes escandalizaram ainda mais a opinião pública. Indicações adicionais da interferência da Nike na seleção se evidenciaram no episódio dos dois jogos na Austrália em que Wanderley Luxemburgo recusou-se a escalar Ronaldo (ele só podia jogar um, devido as obrigações de contrato com o Inter de Milão). O treinador alegou que isso prejudicaria a preparação da seleção para a Olimpíada. A Nike queria que Ronaldo jogasse pelo menos um jogo porque assumira no contrato com a Federação Australiana a escalação obrigatória de Ronaldo. Como isso não ocorreu, os jogos foram realizados com portões abertos. A Nike perdeu a arrecadação. E depois descontou do que tinha de pagar à CBF. Outros fatos negativos foram o fracasso da seleção brasileira na Olimpíada de Sidney, e a medíocre participação nos jogos eliminatórios para a Copa de 2002. E, como se tudo aquilo não bastasse, caíram como uma bomba as denúncias que envolveram Wanderley Luxemburgo. O técnico da seleção foi acusado de intermediar vendas de jogadores brasileiros para o Exterior, de sonegar seus ganhos ao Imposto de Renda. E, mais grave ainda, convocar jogadores para a seleção apenas para provocar sua valorização e poder vendê-los para o Exterior. Luxemburgo foi demitido do cargo de treinador, agravando-se ainda mais a crise da seleção. Ricardo Teixeira e a administração da CBF eram alvos de críticas cada vez mais pesadas. A imprensa repercutia denúncias de má administração, de corrupção, que ganhavam mais eco por se juntarem ao descontentamento de milhões de torcedores com o desempenho da seleção. Não bastasse o clima de caos que se instalara, o Senado Federal também resolveu abrir uma CPI para investigar o futebol. Era demais! Pouco depois, a CPI CBF-Nike foi instalada pela Câmara dos Deputados. Agora a sociedade ia poder afinal conhecer os subterrâneos do futebol. E saber os motivos por que interesses poderosos haviam resistido tão tenazmente à sua instalação. CAPÍTULO I – O FUTEBOL BRASILEIRO: DIAGNÓSTICO DE SUAS DIMENSÕES; SUGESTÕES O futebol é um dos aspectos de maior vitalidade do patrimônio cultural do povo brasileiro. Embora seja um jogo importado -- sua forma regulamentar chegou ao país no final do século dezenove -- rapidamente integrou-se à paisagem. O futebol como é hoje, seus milhões de jogadores, seus clubes, torcidas, é uma criação da sociedade, sua existência não depende do Estado, e é sustentada unicamente pela vontade da cidadania, enraizada na tradição, e sempre renovada pela paixão popular e a magia do esporte. Tal é sua importância que a lei Pelé, que rege o futebol, no artigo 4º, afirma que “a organização desportiva do país integra o patrimônio cultural e é considerada de elevado interesse social”. Um patrimônio que deve ser preservado, conforme prevê a Constituição. A matriz do futebol se alimenta em três fontes: os praticantes, os torcedores, e sua expressão viva, que é a associação voluntária dos aficcionados em seus clubes. Sua presença no imaginário popular é intensa, a seleção de futebol usa as cores da bandeira e chega a se confundir com a Nação, suas vitórias e derrotas são vitórias ou derrotas do país; os grandes atletas são heróis que povoam o universo mítico, os sonhos de glória e de riqueza dos jovens. Ao longo do século vinte o futebol veio crescendo de importância como elemento de identidade nacional. Como atividade de massa que envolve milhões de praticantes e torcedores, sua influência é crucial para o aprimoramento esportivo, físico e técnico, formação moral de crianças, jovens e adultos. Motivo de alegria e forma de participação, o futebol também é a maior fonte de lazer para a população de todas as idades em todos os cantos do país. Daí decorre seu dinamismo econômico -- atividade geradora de empregos, criadora de riquezas em volume considerável para o PIB nacional. A mercantilização do esporte, e em particular, do futebol criou, nos últimos anos, uma situação nova em que grande fluxo de capitais passou a envolver as atividades esportivas. A venda de direitos de uso de imagem de seleções, clubes e jogadores a empresas de produtos esportivos e outros, a venda dos direitos de transmissão de jogos por TV, rádio, Internet etc.; as transferências de jogadores entre clubes e de um país a outro, tudo isso, somado, superou em muito a antiga fonte de recursos que era a renda resultante da venda de ingressos para torcedores assistirem aos jogos em estádios. Numa fase mais recente, grandes grupos de investidores, fundos de investimentos multinacionais inclusive, atraídos pelo potencial econômico do futebol, vêm entrando no setor, patrocinando e tornando-se co-administradores de clubes e jogadores. Esse tipo de interferência, endereçado à busca de lucros e de resultados que valorizem a imagem da marca patrocinadora, tem exercido uma influência que está submetendo o futebol a rápidas mudanças e a distorções. No Brasil, como a atividade ainda é administrada de forma amadorística e os negócios feitos em grande parte na informalidade, o resultado tem sido uma elevação do grau de corrupção. E se cria um quadro de contrastes. Por um lado, emissoras de TV, empresas de investimentos e de marketing, empresários e agentes de jogadores, obtêm lucros elevados; boa parte dos dirigentes se enriquecem pessoalmente; uma minoria de jogadores recebem altos salários. Por outro lado, as entidades e clubes mergulham em crise profunda, chegando em muitos casos à insolvência. A maior parte dos atletas recebe baixos salários e não tem qualquer sistema de aposentadoria. A qualidade do futebol decai, os estádios vão ficando vazios. E também abandonados, sem reformas e manutenção, oferecendo pouco conforto e até mesmo tornando-se ameaça à segurança dos torcedores. Como ilustração veemente desses fatos cabe anexar reportagem do jornal “Folha de S. Paulo” de 29 de fevereiro de 2000: Título da matéria: “Dados da CBF revelam empobrecimento jogador nacional” da Sucursal do Rio “Ao mesmo tempo em que o futebol brasileiro recebe investimentos nunca antes vistos, com os principais clubes firmando parcerias com multinacionais milionárias, os jogadores do país estão cada vez mais pobres. Segundo documentos oficiais do Departamento de Registro e Transferência da CBF (Confederação Brasileira de Futebol) obtidos pela Folha, os ''boleiros ricos'' integram uma parcela cada vez menor no futebol brasileiro. De acordo com o levantamento, apenas 3,7% dos jogadores profissionais relacionados na entidade receberam mais de 20 salários mínimos no ano passado. Ou seja, 765 dos 20.496 jogadores registrados na CBF ganharam mais de R$ 2.720 mensais em 1999. Em 1998, a porcentagem de jogadores que integravam a elite do futebol nacional era de 4,3 %. Analisando as estatísticas dos últimos quatro anos, descobre-se que, enquanto o grupo que ganha até dois salários mínimos mostra uma tendência de crescimento, a parcela daqueles que recebem de duas a mais de 20 vezes esse valor apresenta inclinação contrária (veja quadro abaixo). Em 1996, 81% dos profissionais do país recebiam até dois salários mínimos, número que pulou para 84,8% no ano passado (crescimento de 4,7%). Ocorre que a categoria dos miseráveis do futebol nacional foi engordada em 20% por atletas que, em 1996, estavam no grupo dos que ganhavam mais de dois salários mínimos (naquele ano, eles eram 19%, ao passo que hoje representam 14,7%). O fenômeno contrasta com a injeção de dinheiro observada recentemente no futebol do país, especialmente no ano passado. Em 1999, o Flamengo firmou contrato com a ISL pelo qual receberá cerca de R$ 145 milhões em 15 anos (a maior parte para o futebol), enquanto o Corinthians fechou acordo com o HMTF recebendo aproximadamente R$ 55 milhões por dez anos. Cruzeiro, Grêmio, Santos e Atlético-MG também acertaram recentemente parcerias milionárias com multinacionais. A CBF fechou, em 1996, contrato com a Nike para receber US$ 160 milhões (cerca de R$ 285 milhões) em dez anos. O levantamento da pirâmide salarial do futebol brasileiro é feito anualmente pela CBF, com base na palavra dos clubes. Todos os contratos são registrados, obrigatoriamente, na entidade. Mas a estatística tem distorções provocadas por clubes que não declaram o valor verdadeiro dos vencimentos. Muitos dirigentes obrigam os jogadores a assinar contratos no valor de um salário mínimo, mas pagam por fora até R$ 1.000 _o conhecido "caixa dois" (contabilidade paralela para recolher menos imposto). Mas como isso também ocorria em anos anteriores, os dados da CBF evidenciam o empobrecimento dos jogadores e voltam a exibir o enorme fosso que separa a minoria rica da maioria pobre. Enquanto no Everest, do Rio, todos os atletas recebem um salário mínimo, craques como o meia Rincón, contratado recentemente pelo Santos, ganham R$ 250 mil todo mês. Em dois, anos, período do contrato, o colombiano _que teve o salário indexado ao dólar, pela cotação fixa de R$ 1,80_ receberá R$ 6 milhões, entre salários e aluguel do passe. No Santos, Rincón ganhará US$ 20 mil (ou R$ 35,6 mil) a mais do que recebia no Corinthians. O vascaíno Edmundo é outro exemplo dessa casta. O atacante está recebendo, atualmente, cerca de US$ 8 mil (R$ 14,2 mil) por dia. No total, Edmundo recebe cerca de US$ 240 mil (R$ 427 mil) mensais. Criado em um subúrbio da periferia do Rio, Edmundo mora hoje em uma luxuosa casa na Barra da Tijuca (zona sul da cidade), com campo de futebol e uma grande piscina.” A ECONOMIA DO FUTEBOL Apesar de sua importância na formação da identidade do país, o futebol ainda não atingiu seu pleno potencial no aspecto econômico. Diversas razões contribuem para isso, notadamente a desorganização da atividade no país, administrada de forma precária e pouco profissional. A importância do esporte no Brasil em termos econômicos ainda está muito abaixo do que ocorre na Europa e nos Estados Unidos, onde este setor responde por 3,5% a 4% do PIB, enquanto que no Brasil sua participação não atinge 1% do PIB. O futebol foi adquirindo nas últimas décadas grande relevância econômica no mundo inteiro, e hoje movimenta em torno de US$ 250 bilhões ao ano. Desse total o Brasil participa com R$ 16 bilhões, de acordo com o estudo da Fundação Getúlio Vargas. Os clubes, que são a unidade fundamental do futebol, geram uma receita anual de aproximadamente US$ 182 milhões no Brasil, muito abaixo do que ocorre nos principais centros europeus. Os clubes ingleses obtêm uma receita anual de US$ 1 bilhão, na Itália este número é de US$ 700 milhões e na Espanha US$ 580 milhões. Esta disparidade não se deve apenas a diferenças econômicas entre esses países, mas também a diferentes estágios de organização do futebol entre o Brasil e os centros europeus. Quando se observa a estrutura de receita dos clubes, verifica-se que os clubes brasileiros dependem excessivamente dos direitos de televisão que chegam a 57% do total, de acordo com dados da Pelé Sport e Marketing. E que podem ser de até 70%, conforme estimativa da Globo Esporte. Em alguns casos, chegam a 90%. A transferência de jogadores equivale a 20% da receita gerada pelos clubes, provocando distorções em alguns deles, onde observa-se um excesso de compra e venda de jogadores, funcionando como um balcão de negócios. Na Inglaterra e na Itália, por exemplo, esta receita apresenta-se bem mais equilibrada, como se verifica nos quadros abaixo: Inglaterra Itália Brasil Atividades Comerciais 29% 15% 15% Fonte: Pelé Sport e Marketing Direitos de Televisão 25% 39% 57% Bilheteria 33% 31% 8% Transferência de jogadores 13% 15% 20% País Inglaterra Brasil Patrocínio Direitos de Televisão Bilheteria 11% 20% 28% 60% 39% 17% Licenciamentos (parceria com empresas de investimento) 12% 3% Fonte: Panamerican Sports Teams Essa dependência leva a um poder de ingerência exagerado da televisão, muitas vezes com prejuízo para os atletas e o público que devem adaptar-se aos horários televisivos. O Brasil, apesar de contar com estádios de grande capacidade, possui uma média de público relativamente baixa, em torno de 12 mil pessoas/jogo e a taxa de ocupação dos estádios é de cerca de 20%. Na Itália e Inglaterra o público médio é de 30 mil espectadores por jogo e na Espanha este número é de 27 mil. Na Inglaterra a taxa de ocupação dos estádios está em torno de 90%, levando os principais clubes a fazerem planos para aumentar a capacidade de seus estádios. Está claro que essa diferença de público é decorrente de diversos fatores entre os quais estão a disponibilidade e comodidade dos transportes até o estádio, segurança, credibilidade dos torneios, renda per capita e preço dos ingressos (ver Tabela). País Inglaterra Itália Espanha Brasil Preço Médio dos Ingressos (em US$) 30,00 30,00 20,00 5,00 Fonte: Pelé Sport e Marketing Porém, o Brasil conta com um grande número de praticantes, estimado em 30 milhões. Existe registro de 13 mil times amadores e 800 clubes de futebol. Há igualmente 11 mil jogadores federados no Brasil além de 2 mil atuando no exterior. A estrutura física compreende 308 estádios com capacidade total de 5 milhões de lugares. Os dados acima mostram que o país já possui uma grande base a partir da qual surgem os atletas profissionais. Não é por acaso que o Brasil está sempre revelando jogadores de qualidade. No entanto, grande parte destes atletas termina encaminhando-se para o exterior visto que não encontram no país condições semelhantes às existentes na Europa. O atual quadro de dificuldades por que passa o futebol brasileiro tem por origem uma multiplicidade de fatores. Em primeiro lugar a organização deficiente dos campeonatos, com calendário confuso e sem critérios perenes, colabora para a baixa credibilidade dos torneios, onde se assiste a diversas “viradas de mesas”, atendendo a critérios políticos. O segundo ponto, de acordo com estudo realizado pela Fundação Getúlio Vargas, é a inadequação da infra-estrutura para atender às necessidades do espetáculo, sobretudo no que diz respeito aos estádios que precisam ser modernizados e dotados de serviços que possam atender adequadamente ao público. Outro aspecto levantado pelo estudo trata da necessidade de fontes de financiamento e de apoio à formação das categorias de base. Com o fim da chamada lei do passe, este aspecto passa a adquirir maior importância, visto que, para os clubes, houve uma relativa diminuição ao incentivo para formação de jogadores. A estrutura administrativa do futebol brasileiro é precária e carece de credibilidade em todos os níveis (clubes, federações e CBF). A Confederação Brasileira de Futebol não possui a necessária liderança nem para a organização dos campeonatos, ficando a mercê dos caprichos das emissoras de TV e dos grandes times. Por fim, os sistemas de informação relativos ao registro dos atletas, estatísticas, legislação entre outros, ainda são precários e não trazem subsídios confiáveis para tomada de decisões bem fundamentadas. Apesar dos problemas acima citados, uma série de fatores positivos permitem vislumbrar a possibilidade de alteração da atual conjuntura. O futebol é o esporte nacional por excelência. Em todo o país existe um alto grau de envolvimento dos torcedores com seus times e uma grande fidelidade aos mesmos. Não há dúvida, portanto, de que há uma grande possibilidade de aumento da freqüência aos estádios, uma vez sanados os problemas apontados acima. Apesar do mau momento por que passa, a seleção brasileira sempre foi motivo de orgulho para os brasileiros porque construiu ao longo do tempo uma história vitoriosa e de destaque em nível mundial. O Brasil sempre foi um celeiro de grandes jogadores e possui um grande número de boas equipes, o que possibilita uma grande visibilidade do nosso futebol no exterior, podendo-se imaginar que exista potencial de venda dos torneios brasileiros no exterior. Do ponto de vista social, o futebol possui capacidade de geração de empregos e é uma das poucas formas de ascensão social no país. Existe, atualmente, consenso entre os analistas de que sem uma modificação profunda em sua estrutura o futebol brasileiro estará fadado a conhecer crescentes dificuldades e descrédito. Alguns sinais de modificação estão sendo esboçados. A própria direção da CBF anunciou, em fins de maio de 2001, intenção de mudança no seu Estatuto e de medidas visando maior transparência na administração. Propostas positivas, mas por enquanto insuficientes para convencer de que não se trata de mero exercício de marketing de parte dos dirigentes. É preciso portanto romper as estruturas viciadas existentes hoje no futebol, de forma que se possa adotar as ações necessárias para as transformações desejadas. A própria CBF encomendou um estudo para a Fundação Getúlio Vargas onde fica traçado um plano estratégico de desenvolvimento do setor. Resta a dúvida de se os diversos atores e participantes do futebol brasileiro estariam dispostos a pensar além dos seus interesses individuais e concentrar esforços para benefício do setor como um todo. ESTUDO DA FGV - RECOMENDAÇÕES O conjunto de recomendações resultantes do Estudo supracitado estão agrupadas em três pilares fundamentais, quais sejam: o aprimoramento da gestão do futebol, a modernização do sistema CBF e intensificação da atratividade do futebol brasileiro. 1 - APRIMORAMENTO DA GESTÃO ESTRATÉGICA Quanto ao aprimoramento da gestão do futebol o estudo propõe a reformulação da legislação esportiva brasileira com vistas a dotar o setor de modernos instrumentos de regulação, com reflexos diretos no futebol profissional. A relação entre os clubes “formadores” e seus atletas adquire singular importância para a formatação do contexto em que os clubes evoluirão. A Medida Provisória 2141, de 23/03/2001, que alterou a Lei Pelé, aumentou o valor das multas rescisórias, beneficiando os clubes formadores, dando-lhes garantia de retorno do investimento. A prática desse novo dispositivo legal irá mostrar se tal medida não se tornará um fator de prejuízo para os jovens atletas. É imperativo o aprimoramento da Justiça Desportiva, conferindo-lhe autonomia financeira e adotando um plano de carreira, com exigência de prova de conhecimento e títulos para o ingresso na instituição. Essas providências irão aumentar sua transparência e credibilidade, uma vez que o diagnóstico da FGV aponta para fortes indícios de parcialidade nesse setor. (Ver Capítulo XIX – Projeto de legislação para renovar o futebol). Outro aspecto do aprimoramento da gestão do futebol toca no melhoria do sistema de arbitragem, através da definição de um quadro de árbitros com direito a um plano de carreira e de cargos e salários. Aponta também a necessidade de criação de um conselho nacional de árbitros de futebol e dos conselhos estaduais de árbitros, como órgãos executivos, autônomos e independentes. Propõe também a manutenção da comissão de arbitragem da CBF. (Ver Capítulo ...) A carreira de jogador é de curta duração. Para poder proporcionar ao atleta um mínimo de amparo quando do término de sua carreira, sugere-se a criação de um plano de previdência privada complementar, com um modelo atuarial próprio e capaz de fornecer os recursos necessários para o período de readaptação às novas atividades dos ex-profissionais do futebol. O estudo discute também a necessidade de linhas de crédito para aumentar a competitividade dos clubes e do futebol brasileiro em geral de forma a garantir uma capacidade de alavancagem de recursos a curto, médio e longo prazo. Atualmente, as possibilidades para este tipo de crédito no Brasil são limitadas. Na esfera internacional, vêm surgindo diversas formas de apoio ou proteção financeira que aumentam a capacidade de gestão dos clubes e reduzem os riscos inerentes ao negócio. O setor deveria portanto mobilizar-se no sentido de articular soluções e produtos financeiros junto a instituições de fomento (como o BNDES), instituições bancárias e financeiras e grandes seguradoras. A sistematização das informações através da criação de um anuário estatístico pela CBF viria suprir a atual deficiência de informações e permitiria a realização de estudos e pesquisa para o desenvolvimento de novos produtos, para a reivindicação de auxílios governamentais, bem como para a tomada de decisão. 2 – MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA CBF Como ficou demonstrado ao longo das investigações desta CPI, a CBF e as federações estaduais precisam atuar dentro de um modelo organizacional diverso do hoje existente. Entre os principais pontos a ser considerados está o aumento da transparência destas organizações através de comunicação financeira e institucional compreendendo, entre outros, relatórios anuais, materiais institucionais e balanços sociais. É preciso igualmente dar transparência às transações com jogadores através da introdução de instrumentos de comprovação de compra e venda de jogadores por ambas as partes – comprador e vendedor. Como parte deste processo a CBF, sendo o órgão central do futebol brasileiro, deveria liderar o esforço de modernização da gestão dos clubes e das federações que em muitos casos possuem estruturas arcaicas e práticas administrativas condenáveis. A FGV sugere a elaboração de um conjunto de instrumento de gestão contemplando os seguintes pontos: - Modelo organizacional para os pequenos, médios e grandes clubes; - “kits de modernização” (sistemas: contábil e financeiro, folha de pagamento, orçamentário etc..); - Cartilha de orientação para as questões estratégicas de obtenção de patrocínios, parcerias, vendas otimizadas de ingresso etc.; - Estudo de linha de financiamento para modernização dos clubes (a ser desenvolvida junto ao BNDES) Está claro que a própria CBF necessita de mudanças para poder fazer face às necessidades de seu setor e crie condições de planejamento adequadas ao desempenho de suas funções na gestão de uma estrutura complexa como a do futebol brasileiro. Para tal é preciso que a entidade elabore seu plano estratégico, contemplando uma série de objetivos a serem perseguidos ao longo do tempo. A CBF deverá contar com um corpo funcional capacitado para o enfrentamento dos desafios de um setor em processo de modernização. Assim sendo recomenda-se a implementação de um programa de capacitação interna, coerente com os objetivos estratégicos da CBF e com sua nova estrutura organizacional. A FGV sugere também o desenvolvimento de um projeto de memória do futebol brasileiro, contemplando ações de preservação, recuperação e manutenção desta história, por meio de criação de um banco de dados de: - Fotos, Filmes e outras formas de memória visual; - Livros, jornais, revistas e outras publicações; e - Depoimentos e entrevistas com personalidades, estudiosos, atletas, dirigentes e demais profissionais. Este material poderá ser disponibilizado ao público de diversas formas como livro, CDs, DVDs, vídeos, sites oficiais etc. 3 – INTENSIFICAÇÃO DA ATRATIVIDADE DO FUTEBOL BRASILEIRO O primeiro aspecto relacionado com a atratividade do futebol brasileiro abordado no estudo da FGV trata da manutenção do craque no Brasil. A situação atual revela a incapacidade do país em reter seus craques devido ao descompasso existente entre os salários pagos internamente e aqueles pagos no exterior, sobretudo nos principais centros europeus. O êxodo excessivo de jogadores contribui para a redução na atratividade do futebol brasileiro como espetáculo, uma vez que as maiores estrelas estão no exterior. Além da fuga de talentos já consagrados há casos de “exportação” sem controle de crianças e jovens talentosos. Para fazer face a este estado de coisas é preciso que a FIFA, como entidade máxima do futebol, crie uma norma para que os jogadores sejam obrigados a fazerem o primeiro registro profissional em seu país de origem. Isto evitaria a ida precoce de atletas jovens, que muitas vezes não conseguem sucesso no exterior, ficando em situação precária nos países para os quais são transferidos. (Ver Capítulo XII – Fábricas de “gatos” e tráfico de menores para o Exterior). Ademais, além do aspecto normativo, é preciso incentivar a formação dos jovens talentos. De acordo com a FGV : Estes incentivos poderão ser de caráter fiscal (plano de avaliação das necessidades e dos benefícios a serem gerados), de caráter esportivo (campeonato Brasileiro de Estudantes) ou de caráter social (parceria com o terceiro setor, ONG´s) A necessária profissionalização na gestão dos clubes contribuiria para a manutenção dos atletas no país, através do aumento da rentabilidade das agremiações, permitindo uma maior competitividade com relação aos clubes europeus. Por fim, como citado anteriormente, a criação de mecanismos de proteção ao jogador como previdência privada complementar e apólices de seguros especializadas constituiria uma melhoria da situação dos jogadores no país. Além da manutenção dos jogadores em território nacional, é necessário restaurar a credibilidade dos diversos campeonatos realizados no Brasil. Atualmente os critérios adotados são controversos e pouco transparentes. A FGV sugere a criação de um Ranking Nacional do Futebol Brasileiro como mecanismo de seleção de equipes para participação de equipes nos campeonatos do sistema CBF que facilite a aceitação da escolha, o planejamento das equipes e a rentabilidade das competições. Este Ranking deverá ter critérios e ponderações de classificação que sejam claros e não passíveis de questionamento para viabilizar sua manutenção ao longo do tempo. Uma vez definidos os critérios de escolha das equipes é necessário tratar da racionalização do calendário nacional. Atualmente existe um número excessivo de competições, trazendo prejuízos para todos os envolvidos. Os atletas desgastam-se, o público fica saturado com a quantidade de jogos, os clubes não podem realizar um planejamento adequado visto que em alguns casos as datas dos jogos não são fornecidas com a antecedência necessária. A Fundação Getúlio Vargas traçou alguns critérios sobre os quais poderá ser fundamentada a elaboração do novo calendário do futebol brasileiro: Necessidade de integração do calendário nacional com o calendário FIFA; Subordinação ao Ranking Nacional do Futebol Brasileiro, como instrumento preponderante de acesso e descenso dos participantes nas diversas competições; Interdependência entre as competições estaduais, regionais e internacionais; Fortalecimento dos Campeonatos Estaduais, ampliando o número de datas para os pequenos e médios e racionalizando o número de jogos para os grandes; - Ausência de equipes disputando competições simultaneamente; Valorização da participação dos grandes clubes nas competições, tornando-os mais atrativos; Utilização de apenas duas datas por semana para as disputas, respeitando a saúde do atleta; - Obrigatoriedade de férias remuneradas de 4 semanas; e, Atendimento das necessidades física, técnica e psicológica da prétemporada. Por fim, é feita uma sugestão de tabela, que seria ocioso reproduzir aqui, com os seguintes campeonatos: Campeonatos Estaduais, Copa dos Campeões, Campeonato da Integração Nacional (novo), Copa do Brasil, Campeonato Brasileiro da Primeira e da Segunda Divisão, Copa Libertadores de América e Copa Mercosul. O estudo pode estar, sem dúvida, sujeito a discussão. No entanto poderá servir de base para as mudanças necessárias no futebol brasileiro, de forma a superar o momento crítico e apontar caminhos para o desenvolvimento do esporte. É oportuno trazer a sugestão do Sr. Jonh Richard Law, Presidente da Panamerican Sports Teams - PST e representante da Hicks Muse Tate and Furst, apresentada a esta Comissão, durante painel sobre Patrocínio, Contratos de Marketing e Direitos de Transmissão. Segundo ele, os clubes de futebol poderiam ser parceiros das empresas de investimentos, tal qual a PST, com o objetivo de alavancar a marca do clube e desenvolver o seu potencial econômico. Hoje, o Corinthians paulista e o Cruzeiro possuem esse tipo de contrato – chamado genericamente de licenciamento, que busca atender às necessidades do clube e do seu torcedor. CAPÍTULO II - LEGISLAÇÃO DESPORTIVA : E VOLUÇÃO HISTÓRICA LEGISLAÇÃO DESPORTIVA ANTERIOR À CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 Historicamente, há dois tipos de legislação desportiva brasileira: uma marcada pela presença do Estado nos negócios desportivos, mas que no decorrer de sua prática deu espaço para uma relativamente livre organização dos esportes; a outra, liberal, concebida a partir do princípio da autonomia das entidades desportivas e associações quanto à organização e ao funcionamento, com base na Constituição Federal de 1988. O período mais intervencionista do Estado no esporte ocorreu no Estado Novo, com o Decreto-lei nº 3.199, de 1941, e, de certa forma, coincidiu com o reconhecimento da legitimidade do desporto profissional, praticado com fins econômicos, ao lado do desporto amador, praticado gratuitamente, sem fins utilitários. Esse decreto-lei colocou a organização e a prática do desporto sob a tutela do Conselho Nacional de Desportos, CND -- órgão disciplinador e normativo, além de última instância da Justiça Desportiva. Trinta e quatro anos mais tarde, veio a Lei nº 6.251, de 1975, sancionada pelo Presidente Geisel e adjetivada pelo Decreto nº 80.288, de 1977. Na visão sintética de Eduardo Dias Manhaes, “nada, absolutamente, foi mudada no ordem desportiva, quase nada e formalmente nas estruturas, nada no conceito, quase nada nas prioridades”. Foi mantido o Conselho Nacional de Desportos, que, no seu meio século de existência, encerrada com a entrada em vigor da Lei Zico, expediu aproximadamente 400 atos normativos, regulamentando uma enorme diversidade de assuntos, tais como, publicidade em camisas, composição dos conselhos deliberativos nas sociedades desportivas, critérios e condições do passe, organização de calendários. Os clubes conseguiram introduzir no Decreto nº 80.288 um dispositivo pelo qual, nas associações desportivas com mais de duzentos sócios maiores de dezoito anos, os sócios pudessem manifestar-se coletivamente por meio de conselhos deliberativos, constituídos de membros eleitos (1/3, pelo menos) e membros vitalícios (2/3, no máximo, indicados de acordo com o que estatuía a esse respeito o estatuto). Para a assembléia geral sobrou o poder de “eleger” os membros do Conselho Deliberativo e de decidir quanto à extinção ou fusão da entidade. Está aí a razão principal por que, em muitos clubes, o mesmo grupo, não raro uma família, consegue perpetuar-se no poder. A Constituição de 1988 delegou às sociedades desportivas a capacidade de decidir e legislar em matéria de organização interna, ordem desportiva (organização de competições, regras de jogo) e disciplina desportiva. Determinou a nova Constituição Federal, também, que a Justiça comum só admitisse ações relativas à disciplina e às competições depois que se esgotassem as instâncias da justiça desportiva, que tem que proferir decisão final no prazo de sessenta dias, contados da instauração do processo. A Constituição de 1988 significou o afastamento do Estado e do mundo do desporto. A mudança foi tão radical que não havia como considerar recepcionada a Lei nº 6.251/75, que passou a configurar autêntico entulho autoritário. Mesmo assim, levou quase cinco anos até que o País tivesse uma nova lei do desporto, que traduzisse em ordenamento jurídico-desportivo os princípios estabelecidos no art. 217 da Constituição 1. A LEI DO PASSE Até 26 de março de 2001, quando entrou em vigor o art. 28, § 2º da Lei Pelé, a legislação desportiva então em vigor constava, basicamente, da Lei n.º 6.345, de 1976, mais conhecida como Lei do Passe; da Lei n.º 9.615, de 25 de março de 1998, mais conhecida como Lei Pelé; e da Lei n.º 9.981, que altera substancialmente a redação da Lei Pelé. A Lei do Passe – na verdade, uma lei que dispunha sobre as relações de trabalho do atleta profissional do futebol - definia o passe como “a importância devida por um clube a outro clube, pela cessão do atleta durante a vigência do contrato ou depois de seu término, “observadas as normas desportivas pertinentes”. Importante destacar “ou depois de seu término”, pois, significava que, acabado o vínculo empregatício, permanecia o chamado vínculo desportivo, que mantinha o atleta preso ao clube. O vínculo desportivo costumava ser justificado como justa recompensa do investimento que o clube faz na formação profissional e pessoal do atleta. Além de dispositivos de menor importância, a Lei do Passe ainda estabelecia que a) o valor do passe seria estabelecido de acordo com as normas desportivas, “segundo os limites e as condições estabelecidas pelo Conselho Nacional de Desportos”; b) teria passe livre, ao fim do contrato, o atleta que, ao atingir 32 anos de idade, tivesse prestado 10 anos de serviço ao seu último empregador. O dono do passe não era necessariamente um clube. Qualquer pessoa jurídica ou pessoa física (inclusive o próprio atleta) podia tornar-se o dono de um ou mais passes, desde que se dispusesse a: a) investir dinheiro na educação e formação profissional de um possível talento desportivo, via de regra pobre; b) comprar o passe a outra pessoa (investidor, clube, empresário, o próprio atleta). Investir em passes podia render bons lucros (da mesma forma que investir na engorda de um boi magro), muito 1 Interessante lembrar que nossas entidades desportivas proclamam alto e bom som sua autonomia com relação ao poder público (a não ser que se trate de pedir facilidades tributárias ou o perdão dos débitos fiscais e parafiscais), mas não se importam de ficar submetidas a entidades burocráticas como federações e confederações, aí incluída a FIFA, que não toleram o pensamento divergente, sob pena de exclusão de campeonato, desfiliação, etc. “Burocráticas”, no caso, quer dizer: não praticam o desporto, não formam atletas e não participam diretamente do espetáculo desportivo; apenas registram contratos, recolhem taxas, arrecadam contribuições, fornecem infra-estrutura física e administrativa aos órgãos da Justiça Desportiva. embora, obviamente, seja um negócio de risco. Daí a importância do profissional chamado olheiro, que, graças a seu “olho clínico”, desempenha papel de consultor na compra e venda de passes. LEI ZICO, LEI PELÉ E LEI N .º 9.981, DE 14.6.2000 A Lei Pelé (Lei n.º 9.615, de 25.3.1998) substituiu a Lei Zico (Lei n.º 8.672, de 6.7.1993), mas, na verdade, desconsiderados os artigos dedicados ao bingo (na Lei Zico, era um só), quase a metade de seus dispositivos são simples transcrições. As principais diferenças entre a Lei Zico e a Lei Pelé referem-se ao passe e ao que se convencionou chamar clube-empresa. Quanto ao passe, a Lei Pelé preceitua que, a) “o vínculo desportivo do atleta com as entidades contratantes tem natureza acessória ao respectivo vínculo empregatício, dissolvendo-se, para todos os efeitos legais, com o término da vigência do contrato de trabalho” (art. 28, § 2º); b) mesmo assim, a entidade formadora de atleta tem o direito de assinar com o mesmo o primeiro contrato de profissional, cujo prazo não poderá ser superior a dois anos (art. 29, caput), ficando com a preferência para a primeira renovação deste contrato (cuja duração, não está claro, será também de dois anos, ou, aplicando-se o disposto no art. 30, caput, de até cinco anos ); b) o disposto no § 2º do art. 28 passou a produzir efeitos jurídicos a partir de 26 de março de 2001 (art. 93), quando foram revogados os dispositivos básicos da Lei do Passe. Importante destacar a complementação do art. 93, na redação dada pela Lei n.º 9.981/2000: “... respeitados os direitos adquiridos decorrentes dos contratos de trabalho e vínculos desportivos de atletas pactuados com base na legislação anterior”. A dúvida é se anterior a 26 de março de 2001 ou anterior à data de sanção da própria Lei n.º 9.981/2000. Daí a paradeira atual nos negócios de compra e venda de passes. Quanto ao clube-empresa, cumpre lembrar que a simples possibilidade de sua constituição, prevista na Lei Zico, foi uma novidade, para muitos um avanço, na medida em que, pela legislação desportiva anterior à Constituição de 1988, era proibido organizar e praticar o desporto profissional em sociedades de fins econômicos e que os clubes profissionais desse lucro a quem neles aplicasse capital. Já Pelé queria que as entidades que fossem participar de competições oficiais ou quisessem fazer jus a incentivos fiscais fossem obrigatoriamente organizadas como sociedades de fins econômicos, vedada sua constituição como associações. A mudança mais profunda introduzida na Lei Pelé pela Lei n.º 9.981, de 14.7.2000, consiste, precisamente, no retorno à situação anterior, a da Lei Zico, ou seja, à facultatividade da transformação dos clubes em empresas (ver a nova redação do art. 27). De quebra, além de declarar revogado, a partir de 31 de dezembro de 2000, todo o capítulo dedicado ao bingo (art. 2º), a Lei 9.981 disciplinou restritivamente a celebração de acordos de parceria entre clubes e patrocinadores, investidores, etc. (ver o art. 27A). Finalmente, por força do disposto no art. 94 da Lei n.º 9.981, a Lei Pelé virou uma lei do futebol. A MEDIDA PROVISÓRIA N .º 2.141, DE 23 DE MARÇO DE 2001 Esta Medida Provisória foi editada quase às vésperas da data de extinção do passe, ou seja, 26 de março. Teve por objetivo amenizar os efeitos negativos da extinção do passe. Contudo não criou, como os clubes queriam e até mesmo esperavam, um mecanismo legal que substituísse o passe, protegendo-os de uma eventual (anunciada como apocalíptica) debandada dos talentos desportivos. Criou, em substituição, algumas salvaguardas para os clubes que investem na formação de atletas. De fato, como se pode verificar na leitura da nova redação que foi dada pela MP ao § 2º do art. 28 da Lei n.º 9.615/98, o clube formador de atleta poderá exigir do novo empregador, conforme o caso, uma “indenização de formação” ou uma “indenização de promoção”: a primeira, no caso de cessão de atleta na vigência do primeiro contrato de trabalho (valor: duzentas vezes o montante da remuneração anual); a segunda, quando de nova contratação do atleta após o término do primeiro contrato (valor: cento e cinqüenta vezes o montante da remuneração atual). Neste caso, o clube dispõe de seis meses para negociar a transferência do atleta, desde que continue pagando normalmente o salário. As demais alterações da Medida Provisória n.º 2.141/2001 se referem à criação e à composição do Conselho Nacional de Esportes (do qual a CBF passa a fazer parte), à publicação obrigatória dos balanços anuais pelas entidades desportivas e às responsabilidades dos dirigentes de entidade desportiva. AS QUESTÕES BÁSICAS TRATADAS NA LEGISLAÇÃO ESPORTIVA A QUESTÃO DA ORGANIZAÇÃO O modelo de organização do desporto moderno, tal como o conhecemos hoje, foi idealizado na Inglaterra, em razão da sistematização de certos jogos populares e sua introdução nas escolas públicas, numa época em que fair-play e cavalheirismo eram fatores determinantes da educação total do homem. É, assim, que o desporto foi institucionalizado, com regras bem definidas, sendo talvez a matriz moderna do que poderíamos chamar de Direito Desportivo (Vargas, 1995). Com a progressiva unificação, codificação e universalização das regras de jogo, tornou-se possível a realização de competições nacionais e internacionais nas diversas modalidades desportivas, como, por exemplo, futebol, esgrima, ciclismo, tênis e luta-livre. A institucionalização do desporto e a universalização das regras de jogo e dos regulamentos não aconteceram em decorrência de alguma iniciativa ou intervenção do poder público. Pessoas e grupos de pessoas é que se organizaram em estruturas que assegurassem a observância das regras de jogo e a disciplina desportiva, sob a égide do fair-play, do cavalheirismo, da valorização do convívio social. Tratava-se - como ainda se trata - de estruturas hierárquicas, verticalizadas, em cujo topo figura a entidade internacionalmente reconhecida em cada modalidade desportiva (FIFA, FIA, FIVB, etc.), que é uma associação de confederações continentais e nacionais (Conmebol, CBF, por exemplo). Estas, por sua vez, são associações de federações estaduais (ou regionais), às quais estão associados os clubes onde a respectiva modalidade desportiva é praticada. Na verdade, a interferência do Estado na prática e na administração do desporto organizado e institucionalizado nunca foi motivada por razões éticodesportivas ou humanitárias, mas, sim, porque, por exemplo, as autoridades achavam que essa interferência era necessária para assegurar a prática disciplinada do desporto, a qual, por sua vez, interessava à formação espiritual e física da juventude; ou, então, intentavam tornar os desportos uma alta expressão da cultura e da energia nacionais, privilegiando, conseqüentemente a prática do desporto de alto rendimento, a preparação de equipes olímpicas, etc.; ou, ainda, como na época dos governos militares, tentando tapar o sol com a peneira, usavam o incentivo oficial à prática do desporto como solução para problemas sociais causados por má distribuição de renda, má qualidade de vida nas cidades, etc. A organização do desporto de competição em pessoas jurídicas de direito privado chamadas sociedades civis, ou associações, é tradição tão antiga quanto a sua sistematização, internacionalização e popularização, que se tornaram possíveis graças à unificação das regras de jogo, a partir de meados do século passado. Uma das características das sociedades civis (associações) é que os associados, tomados individualmente, não têm qualquer participação no patrimônio, por maior que possa ser. Quer dizer que se, por qualquer razão a sociedade for dissolvida ou extinta, o patrimônio não pode ser distribuído entre os associados; terá de ser destinado a outra entidade, de fins idênticos ou semelhantes. Outra característica é que, a existência da pessoa jurídica é tão distinta da dos seus membros que a admissão ou o desligamento de associados não acarreta qualquer mudança nos atos constitutivos, diferentemente do que ocorre com a sociedades comerciais, onde a saída (ou admissão) de qualquer um dos sócios implica alteração do contrato existente ou a elaboração de um novo contrato social. Foi em 1941, que União estabeleceu as bases de organização do desporto em todo o país. No que se refere ao tema objeto deste estudo, cumpre lembrar que o capítulo inicial do Decreto-lei n.º 3.119, de 14 de abril de 1941 é todo dedicado ao Conselho Nacional de Desportos, incumbido, entre outras, de “estudar e promover medidas que tivessem por objetivo assegurar uma conveniente e constante disciplina à organização e à administração das associações e demais entidades desportivas do país (...)”. Desde então e até a Constituição de 1988, o desporto de competição era obrigatoriamente organizado em associações. Ficou proibido a organização e o funcionamento de entidade desportiva de que resultasse lucro para os que nela empregassem capital de qualquer forma, a remuneração intermediação, mediante pagamento, de mão-de-obra desportiva. dos diretores e a Inicialmente, as sociedades desportivas só podiam funcionar depois de obter licença por meio de alvará expedido pelo Conselho Nacional de Desportos. .A estrutura associativa, regulada nos mínimos detalhes pelo poder público, foi mantida pela Lei n.º 6.251, de 1976, que confirmou as associações como entidades básicas da organização desportiva nacional, sempre "sob a alta supervisão normativa e disciplinar" do Conselho Nacional de Desportos. Em síntese, entre 1941 (Decreto-lei n.º 3119) e 1993 (Lei n.º 8.672), foram princípios básicos da organização do desporto (profissional e não-profissional): associacionismo, responsabilidade colegiada, finalidade não lucrativa, não-remuneração dos dirigentes, tutela governamental, controle interno e externo dos atos administrativos nas entidades desportivas, transparência contábil. A Constituição Federal de 1988, ao mesmo tempo que reconheceu a competência legislativa concorrente em matéria de desporto (art. 24), proclamou a autonomia das entidades desportivas quanto a sua organização e funcionamento (art. 217, I,). Daí que a necessidade de uma legislação desportiva atualizada não se fez esperar. A nova lei, de n.º 8.672, ficou pronta em 6 de julho de 1993 e, no art. 18, confirmou o princípio da libertação do desporto da tutela do Estado, em artigo que foi reaproveitado na Lei Pelé (art. 26): “Atletas, entidades de prática desportiva e entidades de administração do desporto são livres para organizar a atividade profissional de sua modalidade, respeitados os termos desta Lei". Ao permitir que as entidades desportivas se constituíssem como sociedades de fins econômicos ou assumissem a estrutura de sociedades comerciais (art. 11), a Lei n.º 8.672, de 1993, também conhecida como Lei Zico, rompeu com a tradição do associativismo como filosofia e modelo de organização do desporto, consagrada na legislação. De fato, hoje o desporto de competição vale como espetáculo (sobretudo televisivo), onde o resultado desportivo interessa na medida em que seja fator de reprodução e multiplicação do capital nele investido. É o desporto-negócio, subordinado às leis do mercado, onde os aspectos pragmáticos da renda e do lucro prevalecem sobre os valores desportivos (integração social, de desenvolvimento psicomotor, de exercícios físicos educativos, de fortalecimento da cidadania, etc.) e onde as decisões importantes são tomadas pelo departamento de marketing. Foi presumivelmente nessa linha de raciocínio a Lei n.º 9.532, de 10 de dezembro de 1997 excluiu do rol de entidades beneficiadas com a imunidade fiscal prevista no art. 150, inciso VI, alínea c), as sociedades desportivas dedicadas ao desporto profissional. De fato, em razão dos interesses financeiros (emissoras de TV, patrocinadores e outros parceiros), já não era possível sustentar a caracterização como entidades que colocam seus serviços “à disposição da população em geral, em caráter complementar às atividades do Estado, sem fins lucrativos” (art. 12). Ao mesmo tempo, ao revogar o art.. 30 da Lei n.º 4.506, de 30 de novembro de 1964, a Lei n.º 9.532/97 revogou a isenção concedida às entidades dedicadas à prática desportiva de caráter profissional (clubes) e às de administração do desporto (federações e confederações). Em 10 de dezembro de 1997, foi sancionada a Lei n.º 9.528. No que interessa ao presente estudo, essa lei alterou o art. 22 da Lei n.º 8.212, de 24 de julho de 1991 (a Lei de Custeio da Seguridade Social), reconhecendo como fato gerador da contribuição previdenciária não só a renda de bilheteria, mas também a receita obtida com outras atividades relacionadas a competições de atletas profissionais, consoante se vê no parágrafo a seguir citado: “A contribuição empresarial da associação desportiva que mantém equipe de futebol profissional destinada à Seguridade Social, em substituição à prevista nos incisos I e II deste artigo, corresponde a cinco por cento da receita bruta, decorrente dos espetáculos desportivos de que participem em todo território nacional em qualquer modalidade desportiva, inclusive jogos internacionais, e de qualquer forma de patrocínio, licenciamento de uso de marcas e símbolos, publicidade, propaganda e de transmissão de espetáculos desportivos”. A QUESTÃO DA AUTONOMIA DAS ENTIDADES DESPORTIVAS Nossa primeira “lei orgânica” do desporto data de 1941, ou seja, do regime conhecido como Estado Novo, que se notabilizou pelo paternalismo nas relações entre o Estado e a sociedade e, conseqüentemente, pelo emprego alternado da força e da cooptação, como instrumentos de manutenção da harmonia social e da ordem pública. O Decreto-lei n.º 3.199, já referido, prescrevia que toda matéria relativa à organização desportiva do país fosse regulada por lei federal (art. 46) e que cada confederação não só adotasse o código de regras desportivas da entidade internacional a que estivesse filiada, mas também o fizesse respeitar pelas entidades nacionais que lhe estivessem direta ou indiretamente vinculadas (art. 43). O Decreto-lei n.º 3.199, de 1941, inaugurou também a presença do Estado nos esportes através da legislação desportiva, determinando que as entidades desportivas se organizassem em confederações, federações, ligas e associações, sob a superintendência do Conselho Nacional dos Desportos e instituindo “medidas de proteção dos desportos” (subvenções e isenções de tributos e taxas). Pouco mais de trinta anos depois, em pleno regime militar, foi substituído pela Lei n.º 6.251, de 8 de outubro de 1975. Pela Lei n.º 6.251/75, a organização do desporto (“atividade predominantemente física, com finalidade competitiva, exercitada segundo regras preestabelecidas”) no País passou a obedecer ao disposto na lei e sua regulamentação, bem como, ainda, nas resoluções do Conselho Nacional de Desportos. É por isso que Vargas (1995) pôde escrever que “podemos definir que a história do Direito Desportivo no Brasil é a história da intervenção do Estado, visando transformar o desporto num instrumento de pressão e manipulação ideológica”. Não é por acaso que o primeiro (e único) Plano Nacional de Educação Física e Desportos veio a lume em 1976. Com a Constituição Federal de 1988, passaram a ser reconhecidas as práticas desportivas formais e não formais (art. 217, caput) o desporto educacional (art. 217, II), o desporto de alto rendimento (idem) e o lazer, este “como forma de promoção social” (art. 217, § 3º). Proclamou-se, também, que as entidades desportivas dirigentes e associações eram competentes para definir sua estrutura interna, sua organização e seu funcionamento. Na prática, a Constituição Federal de 1988 tornou obsoleta toda a legislação desportiva então em vigor, ou seja, a Lei n.º 6.251, de 08.10.75, o Decreto n.º 80.228, de 25.08.77, que a regulamenta, a Lei n.º 6.354 (Lei do Passe), de 2.09.76, e grande parte das resoluções do Conselho Nacional de Desportos. Álvaro Mello Filho chama a autonomia das entidades desportivas de pedra de toque, chave de abóbada e espinha dorsal do atual ordenamento jurídicoconstitucional-desportivo brasileiro. Não há dúvida de que sua proclamação rompeu com uma relativamente longa tradição de institucionalização do desporto sob tutela estatal. O exercício da autonomia quanto à organização e ao funcionamento do Comitê Olímpico Brasileiro, do Comitê Paraolímpico Brasileiro e das entidades de administração do desporto é que confere a essas entidades a competência para manter a ordem desportiva, ou seja, para impor o respeito às normas desportivas (estatuto, regulamento de campeonato, dispositivos legais, etc.). Com esse objetivo, são colocadas à disposição das entidades algumas apenações de caráter administrativo: advertência, censura escrita, multa, suspensão, desfiliação. Observe-se, finalmente, que nossos clubes (a não ser que se trate de pedir facilidades tributárias ou o perdão dos débitos fiscais e parafiscais!), proclamam alto e bom som sua autonomia com relação ao poder público; contudo nunca reclamam da mão-de-ferro com que são governados por entidades burocráticas 2 como federações e confederações, aí incluída a FIFA, que têm horror do pensamento divergente os mantém subordinados graças ao poder que têm de excluí-los de campeonatos, puni-los com desfiliação, etc. Aliás, não é muito diferente a maneira de agir dos clubes com relação a seus atletas. RELAÇÕES DE TRABALHO NO FUTEBOL Dispunha o § 2º o art. 28 da Lei n.º 9.615, de 24.3.1998, Lei Pelé: “Burocráticas”, no caso, quer dizer: não praticam o desporto, não formam atletas e não participam diretamente do espetáculo desportivo; apenas registram contratos, recolhem taxas, arrecadam contribuições e oferecem infra-estrutura física e administrativa aos órgãos da Justiça Desportiva. 2 “O vínculo desportivo do atleta com a entidade contratante tem natureza acessória ao respectivo vínculo empregatício, dissolvendo-se, para todos os efeitos legais, com o término da vigência do contrato de trabalho”. Pelo art. 93 da mesma lei, com a redação que lhe foi dada pela Lei n.º 9.981, de 14.7.2000, o disposto no § 2º do art. 28, acima citado, “... somente produzirá efeitos jurídicos a partir de 26 de março de 2001, respeitados os direitos adquiridos, decorrentes dos contratos de trabalho e vínculos desportivos de atletas profissionais pactuados na legislação anterior”. A expressão “legislação anterior” tem dado origem a uma querela jurídica, que deverá ser decidida na Justiça: anterior à própria Lei Pelé (que é de 24 de março de 1998), ou seja, a Lei do Passe, ou anterior à data de extinção do passe, ou seja, 26 de março de 2001? É conhecida como Lei do Passe a Lei n.º 6.354, de 2.9.1976, que dispõe sobre as relações de trabalho do atleta profissional. Consoante o disposto no art. 96 da Lei Pelé, “São revogados, a partir da vigência do disposto no § 2º do art. 28 desta Lei, os incisos II e V e os §§ 1º e 3º do art. 3, os arts. 4º, 6º, 11 e 13, o § 2º do art. 15, o parágrafo único do art. 16 e os arts. 23 e 26 da Lei n.º 6.354, de 2.9.1976”. A partir de 26 de março de 2001, está extinto o passe e, por conseguinte, parcialmente revogada a chamada Lei do Passe (Lei n.º 6.354, de 1976). Extinção e revogação, pois, não causaram maior surpresa. Para bem entender em que consiste a “extinção do passe”, é preciso comparar o texto do art. 11 da Lei do Passe com o texto do § 2º do art. 28 da Lei Pelé. No primeiro, está muito claro que, uma vez contratado como profissional, o atleta se torna propriedade (patrimônio) do clube, pois a ele continua vinculado mesmo depois do término do contrato de trabalho. Isto é, se por qualquer motivo, não houver acordo sobre um novo contrato com o mesmo clube, este só libera o atleta se quiser. Conseqüentemente, o atleta pode ficar impedido de trabalhar, o que, como é óbvio, configura um abuso, para não dizer uma lesão de direito líquido e certo, que é o direito ao trabalho (Constituição Federal, art. 5º, XIII). Portanto, na vigência da Lei do Passe, o contrato de trabalho do atleta criava dois vínculos com o clube: o vínculo empregatício e o vínculo desportivo. O término do primeiro não significava o término do segundo. O atleta só ficava livre do vínculo desportivo aos trinta e dois anos de idade e, ainda assim, se tivesse jogado por pelo menos dez anos em seu clube atual. Na época, a principal reclamação contra o passe era que, vencido o contrato de trabalho (vínculo empregatício), o clube podia não recontratar o atleta, nem permitir que fosse jogar em outro clube. E, assim, como dono do passe (vínculo desportivo), o clube podia manter o atleta num banho-maria, até que concordasse com as condições do novo contrato, do jeito que o clube queria. Enfim, o que diz o § 2º do art. 28 da Lei Pelé é que não mais existe o chamado “vínculo desportivo”, ou seja, aquele que prendia o atleta ao clube mesmo que tivesse terminado o contrato de trabalho. Assim, de 26 de março de 2001 em diante, o vínculo do atleta profissional com o clube se dissolve com o término do contrato de trabalho, não precisando o atleta esperar sua “liberação” por parte do clube. Obviamente, isso não quer dizer que, na vigência do contrato de trabalho, o atleta possa, sem mais nem menos, pedir a conta e ir embora, seja para exercer uma outra profissão, seja para jogar em outro clube. Este caso configura abandono de emprego, sujeito à aplicação da cláusula penal prevista no final do caput do art. 28 da Lei n.º 9.615/98 e ao pagamento de indenização nos termos dos parágrafos 3º, 4º, 5º e 6º do mesmo artigo (Ver o quadro abaixo). A propósito, importa notar (para, depois, comparar com o valor de um outro tipo de indenização, criada pela Medida Provisória n.º 2141, de 23 de março de 2001), que, consoante o disposto no § 3º do art. 28 da Lei Pelé (redação dada pela Lei n.º 9.981, de 14 de julho de 2000), o valor da cláusula penal imposta em razão de abandono de emprego sem justa causa é livremente estabelecido pelos contratantes, até o limite de cem vezes o montante da remuneração anual pactuada. De qualquer forma, retomando o raciocínio, a extinção do passe não invalida o pagamento de indenização, pelo atleta ao clube, em virtude de rescisão unilateral de contrato de trabalho. Extinção do passe significa apenas que, terminado o contrato com um clube, o jogador está livre, inclusive para vincular-se a outro clube, sem que o clube empregador anterior possa cobrar qualquer coisa do clube empregador que o sucede. CAPÍTULO III – A CBF É UMA ASSOCIAÇÃO CIVIL SEM FINS LUCRATIVOS Uma questão crucial para esta CPI é a definição da natureza jurídica da CBF como entidade. Comprovadamente, a CBF é uma associação civil, sem fins lucrativos. É o que consta do Estatuto, que não foi mudado. No entanto, em seu depoimento, por diversas vezes Ricardo Teixeira se referiu à CBF como a uma empresa. Disse ele: “Achava eu, naquela ocasião, na base da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que um contrato privado entre duas empresas privadas, como é o caso da NIKE e da CBF, não deveria ser objeto de uma investigação num foro político. Achava eu que duas empresas que não recebem recursos públicos de nenhuma forma e que já são alvos de investigação permanente por parte da Receita Federal, do Ministério Pùblico, do Banco Central, entre outros, estavam sob o necessário controle das instituições nacionais, sem prejuízo, portanto, para o interesse público”. (...) “A visibilidade da CBF é muito maior do que a dimensão financeira dela como empresa. Como empresa, ela é uma empresa de médio porte, mas caminha para o para o equilíbrio do ponto de vista financeiro”.(...) (...) “E tem um detalhe muito importante que é preciso que se ressalve com relação à contabilidade da CBF – e aqueles aqui da Comissão que têm alguma vinculação com clubes e confederações sabem disso. Até 98 e no início de 98 foi que, por uma medida provisórian, nós tivemos que transformar as entidades em empresas de fins lucrativos”. (...) A partir de 1998, ela (CBF) começou a ter que fazer toda a contabilidade normal de uma entidade, como se fosse uma empresa comercial”. O presidente da CBF foi contestado pelo Deputado Aldo Rebelo: “V.Excia., no pronunciamento de abertura de seu depoimento e recorrentemente insistiu na tese e na formulação de que a CBF é uma empresa privada com fins lucrativos. No estatuto, o que vejo é uma associação civil de direito privado. Empresas privadas têm regra de mercado. Eu sei que uma empresa que fabrica paletó concorre com outras que fabricam paletó; uma empresa de televisão concorre com outra de televisão; de rádio, com outras de rádio. Eu gostaria de saber qual é a empresa no ramo de futebol que concorre com a CBF para organizar Seleção Brasileira, campeonato de futebol, qual é a natureza mesmo, o caráter privado de uma empresa, se na verdade ela recebe e tem, quase em caráter de monopólio, a atribuição de organizar uma atividade esportiva?” Ricardo Teixeira: “ Dentro desse critério, nós teríamos alguns segmentos, por exemplo, as escolas de samba...” Aldo Rebelo: “ Não, mas escola de samba o senhor tem pelo menos uma dúzia no Rio de Janeiro, outra dúzia, em São Paulo; CBF só há uma no Brasil, Presidente. É isso que eu quero lhe dizer. Eu não posso organizar uma Seleção Brasileira no lugar da CBF...” O deputado Jurandil Juarez também questionou o argumento de Ricardo Teixeira: “(...) eu fui à CBF e procurei mudanças, estou convicto de que não houve mudanças. Por isso, eu vou ler o que diz o Estatuto, que foi o que essa Comissão recebeu, lá na CBF: esta entidade continua sendo uma associação civil de direito privado sem fins lucrativos. Agora, deixar bem claro que existe uma diferença entre ser sem fins lucrativos e isenta do pagamento de impostos. A entidade, portanto, continuou, por sua própria deliberação, dado que não existe, na Junta Comercial do Rio de Janeiro, registro de mudança de característica de pessoa jurídica da CBF...” Ricardo Teixeira respondeu: “O que eu disse não foi que houve modificação estatutária. O que eu disse é que, com a alteração da lei em que a CBF deixou de ser entidade isenta de impostos, automaticamente caiu a proibição que existia de ter salário diretor de empresa de fins lucrativos”. (g.n.) Deputado Jurandil Juarez: “A que título o senhor recebe esses proventos? O senhor é funcionário? Isso é pro labore? São os honorários? São rendimentos da atividade? Qual é o título do seu rendimento?” Ricardo Teixeira: “Vou consultar minha auditoria para lhe mandar...” (...) “Nós estamos tentando entrar em contato com o Departamento Jurídico, não conseguimos contatar, para responder à sua primeira pergunta...” Deputado Jurandil Juarez: “Eu vou ler o artigo 13 do estatuto que rege a entidade: ‘Os membros dos poderes e órgãos não serão de qualquer forma remunerados pelas funções que exercerem na CBF. Esse artigo já foi revogado do Estatuto?” (...) “Se não foi o artigo 13 revogado, o senhor recebeu 405 mil, 962 reais no ano de 99. Se não foi revogado especificamente esse artigo, o senhor tem consciência de que está recebendo irregularmente da CBF?” O presidente da CBF referia-se às mudanças produzidas pela lei 9.532 de 10 de dezembro de 1997, que revogou a isenção de imposto de renda e outros impostos que até então beneficiava a CBF. Cobrado pela CPI , Teixeira enviou afinal, em 24 de abril último uma cópia da ata da Assembléia geral da CBF que tratou desse tema e que se realizou-se em 5 de janeiro de 1998. A ata da assembléia estabeleceu no item “e” da ordem do dia “examinar e deliberar sobre concessão de poderes especiais à Diretoria, para adoção de medidas necessárias visando à adaptação da CBF ao novo regime tributário a que ficará sujeita a partir de 1º de janeiro de 1998, em razão da Lei no. 9532, de 10 dezembro de 1997, que revoga a isenção de imposto de renda que beneficiava as entidades de administração do desporto...”. Assembléia: Ricardo Teixeira apresentou a seguinte proposta da Diretoria à “Como conseqüência do término do regime isencional, entende a Diretoria que diversas providências deverão ser tomadas pela CBF, a fim de compatibilizar sua administração, notadamene nas áreas financeira e contábil, com os requisitos inerentes a essa nova realidade que a equipara, sob aspecto tributário, às empresas mercantis. Isto não significa que a Diretoria entenda conveniente ou necessário modificar o caráter das finalidades societárias da CBF, a qual continuará a ter fins não lucrativos...” Sua proposta foi aceita: “A Assembléia Geral decidiu por unanimidade de votos, conceder à Diretoria os mais amplos poderes para adoção de medidas visando a adaptação da CBF ao novo regime tributário...” “Ficou, portanto, autorizada a Diretoria a praticar todos os atos necessários e recomendáveis para atender aos reclamos da recente legislação, podendo, para tanto, também, promover alterações nos Estatutos Sociais...” “(...) A Assembléia Geral, por unanimidade de votos, decidiu que doravante os membros da Diretoria poderão, ou não, receber remuneração pelas funções que exercem na CBF, sendo conferido ao sr. Presidente da Entidade poderes para fixar o valor dessa remuneração”. DECISÕES ILEGAIS Esta CPI não tem dúvida alguma de que as decisões adotadas por aquela Assembléia Geral foram ilegais. Pelos seguintes motivos: 1. O artigo 13 do Estatuto da CBF dispõe que: “ Os membros dos poderes e órgãos não serão de qualquer forma remunerados”. Portanto, os diretores da entidade não poderiam ser remunerados. A não ser que o artigo 13 do Estatuto fosse modificado ou revogado. 2. A Assembléia Geral deu poderes à Diretoria para remunerar seus diretores, mas nada decidiu sobre a mudança do artigo 13 do Estatuto. O Estatuto não foi mudado, caracterizando-se assim como uma ilegalidade a remuneração dos diretores, que passou a ser efetivada a partir de setembro de 1998. 3. E tem mais. Na verdade, essa Assembléia Geral, que foi convocada com base no artigo 17 do Estatuto, que é, portanto, uma Assembléia Geral de natureza administrativa, que se reúne apenas com as federações filiadas, não tem poderes para mudar o Estatuto. Isto é, mesmo que aquela Assembléia Geral houvesse decidido mudar o Estatuto, ela não poderia tomar essa decisão. 4. Somente a Assembléia Geral de natureza eleitoral pode mudar o Estatuto da CBF. Diz o Artigo 19 do Estatuto da CBF que Assembléia Geral de natureza eleitoral é aquela que reúne-se não só com a participação das federações, mas também com as “filiadas especiais, que serão as 24 entidades de prática de futebol (clubes) que, na época da reunião estejam integrando a divisão principal do Campeonato Brasileiro de Futebol...” Pois bem: O artigo 19, em seu parágrafo 3º reza: “Compete, também, especificadamente à Assembléia Geral, de natureza eleitoral, reformar os Estatutos da CBF, no todo ou em parte, por iniciativa própria ou proposta do Presidente, mediante voto de, pelo menos ¾ (três quartos) dos filiados diretos e especiais, permanecendo o texto vigente caso não se obtenha na Assembléia Geral o número de votos necessários para proceder a alteração”. 5. No Cartório Civil do Rio de Janeiro não consta nenhuma alteração do Estatuto da CBF, como notou o deputado Jurandil Juarez durante o depoimento de Ricardo Teixeira em 10 de abril último: “A exigência estatutária é de que seja convocada uma assembléia geral específica para fazer isso. E certamente, para cumprir as determinações também do estatuto, ele precisa ser registado no Cartório de Registro Civil das Pessoas Jurídicas do Rio de Janeiro. Não há (...) não há esse registro no Cartório de Registro Civil de Pessoas Jurídicas. Isso quer dizer o seguinte, Sr. Presidente, vale o que está escrito aqui.” Fica, assim, evidenciada a ilegalidade da decisão da Assembléia Geral de 5 de janeiro de 1998, que aprovou a proposta de remunerar os diretores da CBF. Portanto, vê-se que a Assembléia Geral da CBF, levada pelo desconhecimento que é próprio dos dirigentes de suas filiadas, aprovou medidas que ultrapassaram a sua competência. Desse modo, abre-se a possibilidade de que a remuneração à diretoria possa vir a ser revista. Pela Assembléia Geral, ou por intermédio de alguma ação judicial que pretenda fazer com que a CBF destine seus recursos para os fins estatutários, e não outros que o próprio Estatuto proíbe e que fogem às suas finalidades. Como conseqüência, que os diretores da CBF podem ser levados a devolver à entidade os valores que receberam indevidamente. (Anexo Estatuto da CBF, de 1994, em vigor, sem alterações até esta data). CONSELHO FEDERAL DE CONTABILIDADE CONFIRMA O Relatório de Análise do Conselho Federal de Contabilidade, que fez uma diligência à sede da CBF para examinar seus livros e contas, vem em reforço de nosso entendimento: “Houve alterações significativas na Legislação Fiscal pertinente, que afeta diretamente a CBF, não incorporadas a seu Estatuto, passando a recolher os tributos federais e remunerar a diretoria em decorrência disso. A CBF continua sendo uma Entidade ‘sem fins lucrativos’, conforme decisão unânime da diretoria em Assembléia Geral ‘...apesar do novo regime tributário... continuará a ter fins não lucrativos...’ (Ata da Assembléia Geral de 05.01.98 pg. 184). Tal fato necessita ser definido, uma vez que coloca na ilegalidade alguns atos que vêm sendo administrativamente praticados”. CONTROLE EXTERNO E INTERNO Apesar de utilizar um modelo de contabilidade que traduz um aparente controle, não existem pessoas ou órgãos dentro ou fora da CBF que podem exercer algum tipo de controle ou pressão. Nisso a CBF se afasta mesmo das empresas privadas das quais Ricardo Teixeira tanto se esforça para aproximá-la, sem ter tido sucesso. Quais os instrumentos de controle a que a CBF está estatutariamente submetida? Teoricamente, à Assembléia Geral, ao Conselho Fiscal e a uma auditoria contratada. O CFC E O CONTROLE INTERNO DA CBF A CPI solicitou o apoio do Conselho Federal de Contabilidade (CFC) para auxiliá-la no exame do sistema contábil e de controle da CBF. O Conselho participou com membros e assessores desta Comissão de diligência nas instalações da Confederação. Após a diligência, o CFC, produziu um trabalho, o Relatório de Análise 01/2001, elaborado pelos auditores Daniel Salgueiro da Silva e Alberto Jones Silva. Esse trabalho, muito importante para esta Comissão, foi fundamental para que se chegasse ao juízo real do controle, da contabilidade e das finanças da CBF. Quanto ao controle interno da entidade, a seguir são transcritos alguns trechos do Relatório do CFC, que demonstram a fragilidade contábil, financeira e operacional da CBF (Anexo Relatório de Análise CFC): “2.2.1 Quanto aos aspectos de “Controle Interno” a proteção dos ativos da entidade deixa muito a desejar. Reiteradamente processa-se a transferência de numerários a diversas organizações, sem uma definição de critérios, dentre os quais destacamos: a) Ajudas de custos às Federações Estaduais, Clubes esportivos e Entidades outras, sem critérios definidos. Ora registradas em “Outras Contribuições e Doações”, ora na atividade fim. b) Ajuda de custo a título de contribuição para candidatos nas eleições/98, sem o recebimento do correspondente “bônus eleitoral”, fato que caracteriza irregularidade de procedimento e infração à “Lei Eleitoral”. c) Distribuição de recursos financeiros em valores bastantes elevados a diversos funcionários, dirigentes, em cheques nominais à própria entidade, para posterior prestação de contas, sem a centralização necessária ao funcionamento de um bom “Controle Interno”. (...) 2.2.5 Consta depósito do valor de R$ 458.896,89, baixado em contrapartida na conta “Caixa” em 30/12/99, documento no 002/043. Confirmamos tratar-se de 36 (trinta e seis) comprovantes de depósitos bancários. Entretanto, tais depósitos foram efetuados entre os dias 12/11/99 a 23/12/99. Tal procedimento fere, no mínimo, o mais frágil “Controle Interno” existente, desnudando a fragilidade na administração dos “ativos financeiros” da Entidade. (...) 3.2.4 Testamos um repasse feito a SBTR (Stella Barros Turismo), no valor de R$ 716.469,23 – despesas com eliminatórias da copa de 2002 – feito em 18/12/98 doc.005/0049 Fatura 041/98 de 09/12/98, que menciona “... conforme carta em anexo”. A justificativa é que refere-se a apropriação de despesas de “acerto Copa do Mundo de 98”. Não localizamos a tal “carta em anexo”, nem tampouco a fatura encerra maiores explicações além do lançamento do valor: FF 3.097.181,14 : 5,49 = U$ 564.149,00 x 1,27 = R$ 716.469,23. Tal procedimento fere o bom “controle interno”. (...) Conclusões: (...) b) O Fluxo contábil utilizado pode ser otimizado, em uma estruturação mais moderna, de formar a permitir a direta contabilização dos atos e fatos administrativos da Entidade, eliminando assim lançamentos supérfluos. c) O entendimento acima não exclui a necessidade de se proceder alterações profundas no “Controle Interno” da Entidade, este sim, maior responsável pela má impressão que se obtêm em uma análise da estrutura administrativo-operacional.” (g.n.) ASSEMBLÉIA GERAL A Assembléia Geral reúne-se, ordinariamente, todos os anos, em janeiro, para aprovar as contas do ano anterior. Os representantes são os presidentes da Federações e clubes da primeira divisão. Não é raro, entretanto, que sejam enviados procuradores para responder pela entidade filiada. Esta CPI apurou que essas reuniões anuais não examinam as contas devidamente. Há, na realidade, uma grande reunião de confraternização, na qual alguns representantes são escolhidos para examinar a documentação contábil. O restante do grupo estará de acordo com que os examinadores disserem. E, pelo que se sabe, nunca se levantou algum tipo de irregularidade nas contas da CBF. Os presidentes de federações, em geral, não têm formação apropriada para examinar as contas da CBF. A grande maioria das entidades estaduais de futebol não tem um sistema de contabilidade mínimo, não sendo raro os casos em que elas nada têm. Entre diversos exemplos, o presidente da Federação do Espírito Santo declarou ter preparado todos os livros contábeis após receber a requisição desta CPI. Até fins de 2000 essa entidade não tinha contabilidade. Pelos depoimentos tomados de todos os presidentes de federações, esta CPI pôde averiguar que reina o descontrole em quase todas essas entidades. Quando há um programa de computador adequado, as despesas é que não são controladas. Ou os dois problemas em conjunto. O que se pode esperar desse tipo de administrador, que, em seu Estado conduz a sua federação nos moldes da CBF, tratando-a como coisa particular, sem qualquer comprometimento ou responsabilidade? Esse mesmo presidente terá condições de julgar as contas da entidade mãe, cujos números são muito superiores? Em janeiro de 1999, foram aprovadas as contas da CBF relativas ao exercício de 1998. Esta CPI questionou alguns presidentes se eles estiveram presentes àquela reunião e se souberam da assinatura dos empréstimos da Confederação junto ao Delta Bank. Os que estiveram presentes declararam desconhecer completamente os empréstimos firmados com as taxas mais elevadas do mercado financeiro na época. Um exemplo, quando perguntado sobre esse tema pelo Deputado Dr. Rosinha, o sr. Nilson Gomes da Costa, presidente da Federação Norte-rio-grandense de Futebol afirmou: “O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Eu vou começar por onde terminou o Deputado Pedro Celso. O senhor já esteve em alguma assembléia da CBF, que aprovava contas da CBF? O SR. NILSON GOMES DA COSTA – Várias. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – O senhor esteve nessa especificamente de 1998, que... O SR. NILSON GOMES DA COSTA – De 99, que aprovava as contas de 98. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – ... que se deu em janeiro de 1999? O SR. NILSON GOMES DA COSTA – Acredito que sim. Eu não tenho certeza, porque algumas delas eu mandava representante, mas acredito que em 99 eu deva ter participado. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Foi exposto, nessa aprovação de contas, foi feita a exposição de que havia um empréstimo do Banco Delta National Bank(?). O SR. NILSON GOMES DA COSTA – Bom, já foi mais ou menos explicado, mas a prestação de contas da CBF é examinada pelo Conselho Fiscal e emitido um parecer. E esse parecer, com toda a documentação, é colocado à disposição dos membros da Assembléia. Na verdade, não é dito, não é lido naquela hora, porque foi aprovado pelo Conselho, para aprovação dos Clubes. Não me recordo de que ele tenha falado quanto pagou ou de quanto foi o empréstimo. Salvo engano, acho que não houve esse assunto.” (g.n.) Pode-se observar com clareza que as filiadas nem tiveram as informações sobre os primeiros dois empréstimos da CBF com o Delta e que os dirigentes supõem que o Conselho Fiscal faça a sua parte. Por sua vez, o sr. Fares Cândido Lopes, presidente da Federação Cearense de Futebol afirmou que manda, às vezes, o diretor de futebol para reuniões que aprovam contas da CBF. Será que o diretor de futebol reúne conhecimento específico para analisar essas contas? “O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – (...) Houve essa reunião, deve ter sido no Rio de Janeiro, (...) que aprovou as contas do Sr. Ricardo Teixeira de 1998. O senhor estava nessa reunião? O SR. FARES CÂNDIDO LOPES – Não. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Quem é que estava representando o senhor nessa reunião? O SR. FARES CÂNDIDO LOPES – (...) O Raimundo Chaves. Era... (...) O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO- Ele era o que da Federação? O SR. FARES CÂNDIDO LOPES – Ele era diretor de futebol, e eu não... Em 99... A assembléia de 99, que aprovou as contas de 98, e a de 2000, que aprovou a conta de 99, eu não fui à CBF. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Quer dizer, porque aí, eu acredito que todos os presidentes aqui presentes e os presidentes de federações pelo Brasil afora vão ter que responder pela aprovação das contas do Sr. Ricardo Teixeira de 1998. Porque tem ali um escândalo. O SR. FARES CÂNDIDO LOPES – Possível que ele tenha aprovado essa conta sozinho, sem nenhuma federação presente. Só faltava essa. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Como é? O SR. FARES CÂNDIDO LOPES- Que o Teixeira tenha convocado uma assembléia, não tenha comparecido nenhuma federação, e ele tenha aprovado a conta sozinho. Não é possível que isso tenha acontecido. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO- Porque o Estatuto da CBF manda reunir a assembléia geral, que é composta pelos senhores, para aprovar as contas. E aí, Sr. Fares, vamos aqui. O senhor tem conhecimento do negócio feito entre a CBF e o Delta National Bank? O SR. FARES CÂNDIDO LOPES – Tenho o que, rapaz? (Risos.) O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - O senhor sabe que só de juros, em um período de três anos,... O SR. FARES CÂNDIDO LOPES – Eu tenho assistido às sessões da Câmara. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - ... ele pagou 10 milhões de dólares, só de juros desse negócio com o Delta National Bank? Mentiu na CPI quando disse que os juros eram juros de mercado. E a nossa assessoria, muito competentemente, diga-se, ressalte-se aqui, foi atrás de verificar os juros pagos por outras empresas, companhias similares até, e os juros foram pagos, é... os juros pagos por outras companhias ou similares muitas vezes menor do que o pago pela CBF. E neste mesmo ano que a CBF disse que estava numa situação de insolvência, que estava numa situação de quebradeira completa, por isso precisava fazer o empréstimo, ela doou pra políticos e até pra criadores de cavalo mais de 5 milhões de reais? É só o Ricardo Teixeira que é o responsável por essas contas? Não tem uma assembléia? Então, eu gostaria aqui... O SR. FARES CÂNDIDO LOPES – Tem uma assembléia e tem o Conselho Fiscal, que... O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Quem aprova as contas é a assembléia... O SR. FARES CÂNDIDO LOPES – É, mas... Não, é o Conselho. Sabe por que Deputado. Vou lhe dizer o porquê. Eu, no meu primeiro ano, eu não fui... (...) O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Quem aprova as contas é a Assembléia. O SR. FARES CÂNDIDO LOPES – É, mas o ... É o Conselho. Sabe por quê, Deputado? Vou até dizer por quê. Eu, no meu primeiro ano, eu não fui. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Essa questão, vamos ter que analisar juridicamente, não é isso, Presidente? O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Vamos ter que analisar juridicamente e analisar politicamente — entendeu? —, porque 22 milhões, porque dez milhões de dólares são 22 milhões de reais, pagos de juros em três anos, quantidade que não precisa, porque recebia e podia receber em adiantamento da própria Nike esse dinheiro, empréstimo de três meses, de seis meses, que no fim resulta em dez milhões de dólares de juros, de 40 milhões que pediu emprestado. Isso é um escândalo! Sinceramente. O SR. FARES CÂNDIDO LOPES – Mas, Deputado, eu não tenho nenhum conhecimento, nem desse contrato com a Nike, não fomos consultados, não participamos. O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Mas isso é feito em nome dos senhores, porque a CBF é uma Confederação. Uma Confederação significa que ela é formada por federações. Quando ele chega em Nova York, ou na sede da Nike, ou na sede da AMBEV, para vender os direitos da CBF, está vendendo em nome dos senhores.” (g.n.) Verifica-se, por esse depoimento, que os presidentes de entidades filiadas desconhecem os negócios da CBF. Ao que parece, os empréstimos com o Delta Bank nem foram trazidos à discussão na reunião da Assembléia, de janeiro de 1999. Prova cabal é que Fares, voluntariamente, afirmou que os presidentes de federações não foram consultados sobre o contrato com a Nike. O presidente desta CPI, Deputado Aldo Rebelo, lembrou aos dirigentes que a CBF não é nada em si: ela é nada mais nada menos do que uma associação de federações, e que tudo que a CBF faz é em nome desses mesmos dirigentes. Sintomaticamente, o presidente da Federação Pernambucana de Futebol, Carlos Alberto de Oliveira, foi aplaudido por todos os presidentes das federações do Nordeste presente à audiência de João Pessoa, em 12/05/2001, quando fez contundentes críticas à administração de Ricardo Teixeira. Ele declarou que, após assistir ao depoimento do presidente da CBF à CPI, pela TV, pediu a renúncia de Ricardo Teixeira.. Há uma crescente insatisfação dos dirigentes estaduais com a atual administração da CBF, até porque eles estão descobrindo que desconheciam os descaminhos seguidos pela Confederação. Agora percebem que foram abandonados à margem de todo o processo. Um processo que tem envolvido centenas de milhões de dólares, enquanto que as federações só participam quando se trata da distribuição das doações de mesadas, que comparadas aos negócios dos diretores da CBF nada significam. No mesmo depoimento, em João Pessoa, o presidente da Federação Pernambucana de Futebol, reconheceu que não há controle sobre as atividades da CBF. Acrescentou que se alguma filiada tentar fiscalizar, sofrerá retaliações: “O SR. CARLOS ALBERTO GOMES DE OLIVEIRA -Por que a CBF não negocia os contratos? Eu tenho uma mercadoria boa, o filé, que é a primeira divisão, mas tenho o contrafilé que é a segunda. (...) E por que nós somos tão espoliados? Um time da grandeza do Náutico que tá fazendo cem anos, que tem uma torcida imensa, ir pra terceira divisão, sem dinheiro. E agora chega um Ministro bota o América, o outro bota outro, e o Náutico não entra no campeonato. (...) A coisa pior do mundo é você ser injustiçado. CBF, meu caro Relator, é mais fechada que uma maçonaria, ninguém fala com ninguém ali. Eu tô sabendo do contrato da Nike quando os senhores interrogaram o Ricardo Teixeira porque eu não sabia e perguntei ao Presidente: Me diga quanto a CBF ganha da Nike porque nunca me disseram. Me diga quanto a CBF ganha de cota de televisão porque nunca me disseram. O senhor diz: “O senhor é membro da Assembléia Geral?” Sou. “O senhor é irresponsável porque devia cobrar isso.“ Talvez, mas eu já disse porque eu não fiz, porque o problema não era meu, o problema era dos meus clubes que podiam ser retaliados. Mas agora não tem mais clube pra ser retaliado não, porque têm os Deputados que defendem os clubes deles. Agora eu tenho condições de tomar as posições na CBF.” (g.n.) CONSELHO FISCAL O Conselho Fiscal da CBF não é eleito independentemente da diretoria. O Deputado Jurandil Juarez questionou o presidente da CBF: “O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - (...) Bom, o senhor já me disse que tem um instrumento de controle que é a auditoria externa, não é? Uma empresa de auditores independentes. Internamente, o senhor tem algum controle? Quem exerce o controle das contas? Quem fiscaliza as contas da CBF? O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Nós temos o Diretor Financeiro e nós temos uma estrutura da CBF, do Departamento Financeiro. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Quem fiscaliza isso? O senhor tem um conselho fiscal? O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Nós temos um conselho fiscal e a auditoria manda para o Conselho Fiscal o seu parecer. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - O Conselho Fiscal pode ser eleito autonomamente? O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Quem elege o Conselho Fiscal é a assembléia da CBF e o representante de cada região. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Eu estou lendo aqui o art. 23 do Regimento Interno da Confederação. No seu § 8º, ele diz o seguinte, Sr. Presidente: “Não haverá registro de chapa para o Conselho Fiscal”. O senhor acha que uma disposição como essa não estabelece desde logo uma relação subalterna, uma relação subordinada do Conselho Fiscal, que vai fiscalizar os atos da diretoria, que apenas pode se eleger de forma subsidiária? O Regimento Interno — quero repetir, talvez o senhor não tenha entendido, porque não estava prestando atenção —: “Não haverá registro de chapa para o Conselho Fiscal”. É proibido pelo Regimento Interno da Confederação. O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Excelência, quem indica os membros do Conselho Fiscal, normalmente, na CBF, pelo menos na minha gestão, tem sido a assembléia, que me entrega os nomes. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Mas eles são eleitos, não é isso? O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - São eleitos. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - São eleitos. Como é que faz o registro da chapa? Veja, me chama atenção de que “não haverá registro de chapa para o Conselho Fiscal”. E no estatuto diz que ele é eleito, inclusive em sessão secreta, tudo. Como é que faz o registro da chapa? Como é que alguém pode se candidatar? Suponha que eu queira ser Conselheiro do Conselho Fiscal. Como é que eu posso me candidatar lá na CBF? O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Excelência, até agora tem sido candidato único, de forma que não houve nenhum registro de chapa até hoje, como na minha candidatura à Presidência da CBF.” (g.n.) Ricardo Teixeira não soube responder ao Deputado Jurandil Juarez como o Conselho Fiscal é eleito, se o próprio estatuto da CBF não admite o registro de chapa. Ficou provado que a CBF não tem, e não teve na administração de Teixeira, um Conselho Fiscal independente. O Deputado Jurandil mostrou ao presidente da CBF e aos presentes ao depoimento de 10/4/2001, que o Conselho Fiscal aprovou as contas da entidade, nos últimos cinco anos, com o mesmo parecer, sem que uma vírgula fosse alterada, sem que fosse feito qualquer tipo de reparo ou sugestão, concluindo seu questionamento: “O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – O senhor fez um empréstimo que pode ser considerado, em qualquer operação, altamente temerário, porque o senhor estava em vias de receber recursos. O senhor fez empréstimo no momento em que você tinha juros crescentes. O senhor, conhecendo o mercado, sabia disso. Daí, Sr. Presidente, eu chegar à conclusão, pela inquirição feita, porque tenho aqui cinco pareceres do Conselho Fiscal absolutamente idênticos, até nos erros de português, de colocação de vírgula, assinado pelas mesmas pessoas, nos anos de 96... de 94 a 99, iguaizinhos. Tenha a certeza do seguinte: a CBF está atravessando, atravessou — e o Presidente disse que recebeu a CBF com 1 milhão de dólares de déficit —, atravessa dificuldades com as mesmas características do futebol brasileiro. A entidade que gere o futebol brasileiro tem as mesmas características do futebol, os mesmos defeitos, também as mesmas virtudes. Nós temos um terrível problema de má administração. O dinheiro da CBF, ele entra aos borbulhões e sai aos borbulhões. Não há nenhum controle. O conselho fiscal assina igualzinho. É o mesmo conselho fiscal. A empresa de auditoria é contratada para consubstanciar o que está colocado lá contabilmente. É por isso que a gente tem casos também como dos recursos que estão destinados para as federações, como esse para a Federação Amazonense de Futebol, que recebeu 40 mil reais da CBF e ele foi simplesmente destinado à Braga Distribuidora de Veículos, em Manaus, Amazonas. Foi por isso que um pagamento feito à Federação Amazonense, sobre um compromisso internacional da Seleção Brasileira lá, tem como comprovante de despesas, Sr. Presidente, um papel timbrado de um representante comercial de medicamentos que diz lá simplesmente quanto é que deve ser pago. Esses documentos são comprobatórios de despesa da Confederação Brasileira de Futebol, que administra o futebol brasileiro” (g.n.) É importante ressaltar a composição atual do Conselho Fiscal da CBF. Um dos três membros titulares, é José Guilherme, ex-presidente da Federação Mineira de Futebol e pai de Elmer Guilherme, atual presidente desta entidade, que está envolvida em muitos escândalos de diversas naturezas, de acordo com informações obtidas e já comprovadas por esta CPI (Ver capítulo relativo às federações). José Guilherme Ferreira é funcionário da Federação que seu filho dirige. É um dos muitos parentes contratado por Elmer Guilherme, autor do caso mais escandaloso de prática de nepotismo, dentre todas as federações. Sendo pai de Elmer, e seu funcionário, é conivente com o quadro em que se encontra a Federação mineira. Qual o grau de independência de José Guilherme, se a CBF acaba de assumir uma dívida de R$ 1,5 milhão não paga pela Federação Mineira para a Federação Paulista? Como ele resolve esse conflito de ser ao mesmo tempo membro do Conselho Fiscal e pai do presidente da entidade mineira? Outro membro do Conselho é o presidente do Jornal do Brasil, o senhor José Antônio Nascimento Brito. Isso cria uma ligação entre a CBF e o jornal, devido às relações normais que tem a entidade com os meios de comunicação. A imparcialidade do jornal, ao noticiar fator relativos à CBF fica prejudicada, principalmente quando se tratar de problemas financeiros ou a falta de controle da entidade. O terceiro membro efetivo do Conselho Fiscal é o senhor Antônio Carlos de Oliveira Coelho, executivo do grupo Vega. A CBF manteve aplicações no Banco Vega, chegando a ter R$ 3.616.845,76 aplicados, em 31/12/97, de acordo com dados da contabilidade da CBF (Ver Anexo Contabilidade da CBF). Também no ano de 1997, a CBF pagou à Vega Administradora e Corretora de Seguros Ltda. pelo menos R$ 232.121,18 (Anexo 3 pasta 18). Além disso, em 1995, Ricardo Teixeira possuía aplicações, no Banco Vega, no valor de R$ 16.003,98 no fundo de investimento financeiro do Vega e no fundo de commodities no mesmo banco, no valor de R$ 187.466,24 (Anexo 4 Pasta Fiscal). Teixeira manteve, no final de 1996, R$ 425.574,47 em certificados de depósito bancário (CDBs), no mesmo Banco Vega, na mesma época em que a CBF trabalhava com esse Banco. É digno de nota o fato de Ricardo Teixeira realizar movimentações bancárias particulares, inclusive de suas empresas, nos mesmos bancos, e até agências, da CBF: Real, Vega, Rural, Delta Bank, etc. EMPRESA DE AUDITORIA A CBF contratou a empresa PS Contax Auditoria para realizar serviços de auditoria na entidade. Essa empresa recebe da CBF mensalmente cerca de R$ 11 mil, tendo faturado mais de R$ 314 mil, entre 1998 e 2000. O Deputado Jurandil Juarez, como visto acima, afirmou, no depoimento de Teixeira, que a empresa de auditoria seria contratada apenas para “consubstanciar o que está colocado lá contabilmente”. É o que se conclui pelo exame das contas da CBF e dos documentos que comprovam as despesas realizadas. São tantos as falhas cometidas, conforme atesta o Conselho Federal de Contabilidade, que não se pode conceber que uma empresa de auditoria esteja prestando, de fato, serviços efetivos à Confederação. A CBF C OMO PESSOA JURÍDICA A Confederação Brasileira de Futebol – CBF é uma associação civil de direito privado, sem fins lucrativos, constituída com a finalidade de dirigir nacionalmente o futebol. Tem, como filiadas diretas, 27 federações e, como filiadas indiretas, aproximadamente 13 mil clubes, dos quais cerca 800 dedicados ao futebol profissional. Por meio desses clubes, a CBF, que é uma espécie de entidade de cúpula ou entidade guarda-chuva, controla mais de meio milhão de jogadores inscritos e acima de 5 mil árbitros. O controle da CBF sobre entidades filiadas, jogadores, árbitros, etc. decorre da obrigatoriedade de seu registro na entidade: quem não está registrado na CBF não participa, sob qualquer título, de campeonato oficial, ou seja, não existe para o futebol de competição. A CBF detém, ainda, a exclusividade da representação do futebol brasileiro junto à Fifa, decide sobre a promoção de competições interestaduais e nacionais por federações e clubes, fiscaliza a rigorosa execução das determinações da Fifa, e, ressalvada a competência do COB, representa o futebol brasileiro em qualquer atividade internacional. A FIFA – Fédération Internationale de Foot-ball Association – é a entidade que rege os destinos do futebol em todo o mundo. Cabe-lhe, entre outras tarefas, zelar pela correta observância da “lei do jogo” estabelecida pelo órgão legislador do futebol, a International Board. A FIFA é muito poderosa: ela só aceita a filiação de entidade desportiva que renunciar ao direito de submeter ao Poder Judiciário quaisquer litígios de natureza desportiva ou que envolvam entidades desportivas. O poder máximo da CBF é a Assembléia Geral 3, constituída pelas federações filiadas. É ela que julga a prestação de contas anual das atividades administrativas e financeiras da diretoria da entidade. Além disso, entre outras competências, é a Assembléia Geral elege a diretoria e reforma e interpreta o Estatuto, decide sobre a desfiliação da CBF da FIFA e resolve sobre a extinção da entidade. Pelo art. 82 da Lei n.º 9.615/98, os dirigentes, unidades ou órgãos de entidade de administração do desporto não exercem função delegada do poder público, nem são consideradas autoridades públicas, “para os efeitos desta lei”. Como associação civil, a CBF é autônoma quanto à organização e ao funcionamento. Suas competências estão definidas no Estatuto. Apesar de reconhecer a autonomia das entidades desportivas, a Lei n.º 9.615/98 estabelece algumas regras a serem observadas nos processos eleitorais (art. 22) e determina que os estatutos devem prever a instituição de Tribunal de Justiça Desportiva, a adoção de Códigos de Justiça Desportiva e a inelegibilidade ou nomeação para cargo de direção de quem cumpre pena ou já deu mostras de improbidade administrativa (art. 25). 3 Trata-se, bem entendido, da Assembléia Geral de natureza eleitoral, da qual participam, além das 27 federações, os 24 clubes da divisão principal do Campeonato Brasileiro. A Assembléia Geral de natureza administrativa reúne-se exclusivamente com as 27 federações diretamente filiadas e tem poderes mais limitados. Não pode, por exemplo, mudar o Estatuto. Entidades nacionais de administração do desporto, como a CBF, têm competência para decidir as questões relativas ao cumprimento das normas e regras de prática desportiva (art. 47), podendo aplicar sanções com o objetivo de manter a ordem desportiva e o respeito aos atos emanados de seus poderes internos. Daí o estatuto da CBF estabelecer, em seu art. 8º, que a entidade não intervém em suas filiadas, exceto para por termo a grave comprometimento do futebol brasileiro. Os Tribunais de Justiça Desportiva são tecnicamente autônomos e independentes das confederações e federações. Contudo, delas dependam financeira e administrativamente. (art. 52). O art. 50 da Lei n.º 9.615/98, define que a organização, o funcionamento e as atribuições da Justiça Desportiva, limitadas ao processo e julgamento das infrações disciplinares e às competições desportivas, serão definidas em Códigos Desportivos. No regime da lei anterior, cabia às entidades federais de administração do desporto propô-los; a Lei Pelé é omissa quanto ao este ponto: apenas diz que cabe ao Conselho de Desenvolvimento do Desporto Brasileiro aprová-los4. No que interessa ao objetivo desta CPI, a Constituição Federal, em seu art. 217, além de proclamar a autonomia das entidades desportivas quanto a sua organização e funcionamento, restringe a destinação de recursos públicos à promoção do desporto educacional e, somente em casos específicos, à do desporto de alto rendimento; estabelece que o Poder Judiciário só admitirá ações relativas à disciplina e às competições desportivas após esgotarem-se as instâncias da justiça desportiva, regulada em lei. O art. 24 da Carta Magna estabelece que cabe à União legislar sobre desporto concorrentemente aos Estados e ao Distrito Federal. Assim, nesta matéria, a competência da União é limitada ao estabelecimento de normas gerais (CF, art. 24, IX e § 1º). Atualmente, as normas gerais sobre desporto estão instituídas na Lei n.º 9.615, de 24 de março de 1998, cognominada Lei Pelé, que foi recentemente alterada pela Lei n.º 9.981, de 14 de julho de 2000, e pela Medida Provisória no. .... de 23 de março de 2001. É óbvio que a autonomia das entidades desportivas não é absoluta. Ela deve ser entendida à luz do princípio da plena liberdade de associação para fins lícitos, assegurada no art. 5º, XVII, da Constituição Federal: o Estado não pode impedir a criação de associações, não pode ditar regras para seu funcionamento e só pode ordenar que encerrem suas atividades por decisão judicial. Contudo, por força do princípio da isonomia, não estão as entidades desportivas dispensadas de observar a lei quando se trata de relações de trabalho, obrigações para com terceiros, pagamento de impostos, contribuições à previdência social, direito de arena, proteção à infância e à adolescência, direito do consumidor, respeito à autoridade constituída, etc. 4 A Lei n.º 9.981/00 acrescentou que cabe ao CDDB aprovar os código e suas alterações. Supõe-se que é para impedir que os códigos (assim como o estatuto!) sejam alterados pela própria Diretoria da CBF, mediante RDI’s (Resoluções da Diretoria), que favorecem a legislação em causa própria. Quanto à destinação de recursos públicos para a promoção do desporto de rendimento, em casos específicos, o art. 7º, II, permite concluir tratar-se dos casos de participação de entidades nacionais de administração do desporto (o Comitê Olímpico Brasileiro, por exemplo) em competições internacionais. Portanto, a receita da CBF compreende as taxas de filiação, registro e transferências; as rendas das partidas que realizar; as rendas provenientes de patrocínios, de venda de direitos de transmissão de imagem e de aplicação de multas; da participação na arrecadação das competições internacionais e interestaduais. A Lei n.º 9.615/98, mais conhecida como Lei Pelé, tem por objetivo disciplinar a prática e a administração do desporto formal, que é regulado por normas nacionais e internacionais e pelas regras de prática de cada modalidade. Trata-se do desporto de resultados ou de rendimento, referido no art. 3º (II) da Lei, que pode ser organizado e praticado de modo profissional e de modo não-profissional (art. 3º parágrafo único). No caso da CBF, ou seja, do futebol, as normas e regras são estabelecidas pela FIFA, que é a associação internacional de confederações de futebol. A lei distingue entidades de administração do desporto (confederações e federações) e entidades de prática do desporto (clubes). Essas entidades compõem o Sistema Nacional do Desporto, juntamente com o Comitê Olímpico Brasileiro e o Comitê Paraolímpico Brasileiro, que, na verdade, assim como eventuais ligas, também são entidades de administração do desporto. Sistema Nacional do Desporto é o conjunto das pessoas jurídicas de direito privado, com ou sem fins lucrativos, encarregados da coordenação, administração, normalização, apoio e prática do desporto, bem como as incumbidas da Justiça Desportiva (art. 13, parágrafo único). Confederações são associações de federações. Federações são associações de clubes. Clubes são associações de pessoas físicas. A organização do desporto competitivo em sociedades civis, ou associações, sem fins lucrativos, é tradição tão antiga quanto a sua sistematização, internacionalização e popularização, que se tornaram possíveis graças à unificação das regras de jogo, a partir de meados do século passado. Pelo art. 16 da lei do desporto em vigor 5, confederações, oficialmente chamadas “entidades nacionais de administração do desporto”, são pessoas jurídicas de direito privado, que têm as competências definidas em seus estatutos. Entre essas competências constam, invariavelmente, a direção nacional da respectiva modalidade desportiva, sua representação no exterior, e o intercâmbio com as entidades internacionais, cujas determinações são obrigadas a cumprir e fazer cumprir. A lei brasileira, pois, reconhece que a Confederação Brasileira de Futebol tem, entre outros fins, o de “representar o futebol em qualquer atividade de cunho internacional, com poderes para celebrar convênios e acordos, assim como orientar, coordenar e fiscalizar as atividades das federações e dos clubes filiados no âmbito nacional”. 5 Lei n.º 9.625, de 25 de março de 1998 (Lei Pelé), alterada pela Lei n.º 9.981, de 14 de julho de 2000. Representar é ser procurador de, substituir, ou, mais pomposamente, simbolizar (o País, o povo brasileiro, o Estado, o governo, a cultura pátria, o que for). Qualquer que seja o significado, não existe representante sem representado. Ao representado cabe definir os poderes do representante, traçar os objetivos, os limites e a área de atuação, cobrar periódicas prestações de conta. Desta forma, sob certo aspecto, por se tratar de uma espécie de delegação de poder, pode-se dizer que, muito embora não seja uma entidade estatal, a CBF, a exemplo das demais confederações desportivas, do Comitê Olímpico e de entidades como a OAB e SBPC, presta um serviço de natureza pública. A Medida Provisória que alterou a Lei Pelé, em 23 de março de 2001, colocou a CBF como membro do CND, Conselho Nacional de Desportos, mais uma demonstração de que se caracteriza como serviço de natureza pública. Ou, pelo menos, no País onde futebol e vida se misturam, um serviço de evidente interesse geral da sociedade. A Confederação Brasileira de Futebol – CBF, é a entidade nacional de administração do futebol. Como tal, existe desde 1979, quando foi desmembrada da Confederação Brasileira de Desportos, fundada em 1904. De acordo com o seu estatuto, a CBF é uma associação civil de direito privado, sem fins lucrativos, de caráter desportivo, com personalidade jurídica e patrimônio próprios, com sede no Rio de Janeiro. Trata-se, pois, de pessoa jurídica regida pelo Código Civil. ORGANIZAÇÃO E FUNCIONAMENTO DAS ENTIDADES DESPORTIVAS A Constituição Federal assegura, portanto, às entidades desportivas dirigentes (confederações e federações) e associações desportivas (clubes) autonomia quanto à sua organização e seu ao funcionamento. Na prática, isso significa 1º) que a criação de entidades como a CBF independe de autorização do poder público e 2º) que o Estado não pode interferir nas matérias chamadas “interna corporis”, tanto as de natureza técnica e desportiva, quanto as de natureza organizacional e administrativa. Em oposição a esta “liberalidade”, a legislação desportiva anterior à Constituição Federal de 1988 foi marcada pelo autoritarismo, pelo paternalismo e pela tutela estatal. Ocorre que a transição do regime de subordinação das entidades desportivas ao Estado para o regime de autoregulação e independência deixou muito a desejar, no sentido de que não contribuiu significativamente para o aperfeiçoamento da organização do desporto no País. Esta constatação é confirmada por diversos autores, conforme se vê nos parágrafos a seguir. “Com a revogação de fato da legislação desportiva, através da promulgação da Constituição de 1988, ficou um vazio 6 na ordem jurídica esportiva nacional, o que, de certa forma, favoreceu o fortalecimento das estruturas arcaicas e os interesses dos senhores feudais do esporte brasileiro”. Estes pseudo-esportistas teriam passado a 6 O art. 217 foi de tal forma inovador que a Constituição Federal de 1988 revogou de fato a Lei n.º 6.251, de 1975, que era a lei do desporto então em vigor. A lei do desporto, Lei Zico, só foi sancionada em julho de 1993, ou seja, quase cinco anos depois da promulgação da CF/88. É a esse período de vacatio legis que se refere o autor. referenciar-se unicamente na estrutura vertical das entidades internacionais. “Desse modo, com o CND7 completamente desaquecido e em fase terminal, estes verdadeiros ‘coronéis’ do esporte nacional, na maioria investidos como dirigentes de federações e confederações, principalmente no futebol, passaram a fazer regras próprias, deixando reduzidas oportunidades de contestação, justamente pelo aval que recebiam das entidades internacionais” (Manoel Gomes Tubino). “Constituindo-se numa autêntica medula espinhal do esporte, a autonomia desportiva, desde o advento da Carta Federal de 1988, tem gerado muitas contendas judiciais e controvérsias extrajudiciais, além de enfoques emocionais e distorcidos, conquanto inúmeras mutações estatutárias e procedimentos eleitorais foram concretizados com amparo nesta concepção constitucional (art. 217, I), deixando ‘a latere’ os arts. 17, 19 e 20 da então vigente Lei n.º 6.251/75, exatamente quando faltava um quadro legal-normativo adequado e ajustado aos princípios desportivos do Texto Maior, pois a nova lei de normas gerais ainda estava em projeto” (Álvaro Mello Filho). Na Exposição de Motivos que acompanhou o Projeto de Lei n.º 3.633, de 1977, o então Ministro Pelé, seu autor, assim ponderava: “Essa situação (de desorganização, de amadorismo, de falta de transparência e de desprezo pela condição do atleta) foi produzida, principalmente, pela má interpretação do art. 217 da Constituição Federal, que garantiu autonomia às entidades de prática e de administração do desporto. O referido dispositivo constitucional tem sido interpretado de forma equivocada por essas entidades, gerando a idéia de uma liberdade irrestrita e causando danos irreparáveis ao prestígio e à credibilidade do esporte brasileiro”. Apesar do reconhecimento oficial do princípio da autonomia e, conseqüentemente, a revogação automática de uma legislação do desporto impositiva, contraditoriamente, até hoje são mantidas as tradicionais estruturas desportivas, tão autoritárias e paternalistas quanto aquelas. Em outras palavras, as confederações se libertaram da tutela do Estado, mas não se tornaram independentes de entidades como FIFA e COI, nem conseguiram ajustar aos novos tempos estruturas administrativas e métodos de gestão herdados do passado. Ao mesmo tempo, o legislador não teve a preocupação de explicitar claramente qual o papel do Estado em matéria de desporto, mesmo observando que, com a interveniência da televisão, o espetáculo desportivo vinha se transformado rapidamente numa atividade econômica e numa indústria de entretenimento, onde não só a prática do desporto de competição é um meio de vida para o atleta e uma fonte de renda para os clubes, mas também há evidente risco de as “normas gerais sobre 7 Conselho Nacional de Desportos. desportos” serem ditadas pelo mercado e terem muito pouco ou nenhum compromisso com os valores desportivos propriamente ditos. A QUESTÃO DA AUTONOMIA É público e notório que, a despeito de sua autonomia e de sua ojeriza a qualquer tipo de controle por parte do poder público, as entidades desportivas têm buscado a proteção do Estado. Procuram por subsídios, isenções, anistias fiscais, parcelamentos de débitos acumulados junto ao INSS. Defenderam uma legislação desportiva que os livrasse de correr os riscos próprios da iniciativa privada e da atividade econômica. Foi o que se viu, por exemplo, na Lei Zico, onde empresários da jogatina e dirigentes de entidade desportiva conseguiram introduzir a permissão para o jogo de azar em pretenso benefício do esporte (o bingo); na Lei Pelé, os clubes conseguiram inserir dispositivo que adiou por dois anos a extinção do passe. Como a Lei Pelé deixou sem proteção os interesses dos clubes, ameaçados de perderem seus jogadores sem qualquer remuneração, procuraram influir na recente medida provisória, de 23/03/2001 para que os protejesse da evasão em massa de atletas para o exterior. O que efetivamente acabou acontecendo. Na verdade, sequer a própria legislação desportiva distingue claramente o público e o privado. Ao que parece, no mundo do esporte, é proibido o público invadir o espaço reservado ao privado, mas o privado pode perfeitamente invadir o terreno do público. Na legislação desportiva, o caso mais flagrante é que, no art. 82, é estabelecido que “os dirigentes, unidades ou órgãos de administração do desporto não exercem função delegada pelo poder público, nem são consideradas autoridades públicas, para os efeitos da lei do desporto”, mas, logo a seguir, no art. 84, caput e § 2º, se preceitua que será considerado como de exercício efetivo, para todos os efeitos legais, o período em que o servidor público que for convocado, a qualquer título, para integrar representação nacional em treinamento ou competição desportiva. À parte a questão da isonomia, como deixar de concluir que a participação em seleção ou delegação desportiva é considerado um serviço público? Para reverter esta situação, impõe-se, antes de mais nada, uma leitura lógica do art. 217, caput e incisos, da Constituição Federal. Pela própria ordenação física desses dispositivos, não há dúvida de que a autonomia das entidades desportivas está, no mínimo, literalmente subordinada ao dever do Estado de promover as práticas desportivas de qualquer natureza. Em outras palavras, o inciso da autonomia, assim como os demais (o da destinação de recursos públicos para a promoção prioritária do desporto educacional, o do tratamento diferenciado para o desporto profissional e o desporto não profissional, e o da proteção e do incentivo às manifestações desportivas de criação nacional) não têm uma valor absoluto: o universo em que se move a autonomia das entidades desportivas é o do dever do Estado de fomentar o desporto. A interpretação correta do art. 217 é que a autonomia não é um fim em si mesmo, nem é ilimitada: não exime o Estado do dever de traçar e implementar políticas de desenvolvimento do desporto, não o desobriga de suas responsabilidades relativas ao fomento das práticas desportivas formais e não formais, como direito de cada um, nem inibe, de qualquer forma, a ação do poder público em matéria de desporto. Ao assegurar autonomia às entidades desportivas, os constituintes apenas reconheceram que existe uma realidade do desporto, que cumpre respeitar. A ESTRUTURA DO FUTEBOL A CBF surgiu em 1979, via Portaria n.º 615 do MEC para, em substituição à CBD, então desmembrada em diversas confederações desportivas, cuidar do nosso futebol internamente e de representá-lo externamente. Se cuidou mal, representou pior. CBF se tornou sinônimo de modo errado de fazer as coisas. Por exemplo, o futebol profissional é praticado em pouco mais de oitocentos clubes, endividados (ou com os jogadores, ou com o INSS, ou com os fornecedores, ou com a federação). De vez que, freqüentemente, sequer têm com que pagar a arbitragem, comprar bolas ou custear o transporte dos jogadores, os clubes recorrem às federações, a maioria das quais também quebradas. Sabidamente, confederações e federações não geram empregos, como fazem os clubes. Ressalvadas algumas exceções, confederações e federações são, sobretudo, organizações burocráticas, freqüentemente cabides de emprego e distribuidoras de mordomias, redutos do nepotismo, pois existem principalmente para servir de suporte a projetos pessoais e políticos de dirigentes que se elegem indefinidamente. Já que, via de regra, cada clube é um voto, raramente as federações se recusam a prestar-lhes socorro. Note-se que não ajudam os clubes a sair da crise com medidas saneadoras, com uma administração esclarecida, com bons contratos de publicidade e transmissão de imagem e com campeonatos rentáveis. Não. Para o custeio das operações tapa-buracos, as federações recorrem à CBF. A CBF, também quase falida, porém interessada em assegurar preciosos votos para eventuais candidatos a reeleição, tem pavor de dizer um não. Em vez de sanear o sistema que preside, que é sua obrigação de acordo com o estatuto, a CBF toma dinheiro emprestado ao sistema financeiro, vende jogos da seleção e outros “direitos”8. É desta forma que consegue manter o esquema de mesadas, que beneficia mais da metade das federações de futebol. Já que todos têm culpa em cartório, ninguém reclama de ninguém, e o círculo vicioso se fecha. Esses problemas só se resolvem mediante uma lei que acabe de vez e de forma radical com a idéia de que o desporto profissional é uma área reservada à competência exclusiva de confederações, federações e clubes e de que cabe ao Estado cuidar apenas das sobras, da periferia. O peso econômico e o impacto social do 8 Para comprovar esta assertiva, basta ter a paciência de ler atentamente o Contrato Nike/Traffic/CBF, especialmente a Introdução, os itens 2.2, 2.3, 2.4 e 2.5, os subitens 8.4 a e 8.4 f (I, II, III, IV, V) desporto profissional são grandes demais para ficarem a cargo apenas das próprias entidades desportivas. O RESGATE DO PAPEL DO ESTADO A conclusão é que o País realmente precisa de uma nova lei do desporto, uma lei que, para começar, além de tratar diferentemente o desporto profissional e o desporto não profissional, conforme manda o art. 217, II, da Constituição Federal, defina claramente o papel do Estado enquanto responsável maior pela promoção do desporto, mediante a implementação de políticas públicas específicas e a elaboração de um Plano Nacional do Desporto, a par do incentivo à valorização do espetáculo desportivo, à modernização dos estádios, ao investimento no esporte de base e à profissionalização de todos os agentes, sem esquecer-se de proteger o trabalhadoratleta. Somente um Estado consciente do papel que lhe cabe na compatibilização do direito ao desporto com os objetivos fundamentais da República terá a autoridade (muito diferente de o autoritarismo) necessária para, em nome da nação politicamente organizada, obrigar a CBF a cumprir o disposto no estatuto, a dar satisfação à sociedade civil e a exigir campeonatos bem organizados, calendários racionais, clubes economicamente viáveis, justiça desportiva tecnicamente independente das federações, processos eleitorais democráticas, respeito ao torcedor, gestão participativa e transparente. Sem explicitar as responsabilidades do Estado, não há como cobrar moralidade às entidades desportivas. CAPÍTULO IV – O CONTRATO ENTRE A CBF, A NIKE E A TRAFFIC O contrato da CBF com a Nike só ficou conhecido depois da Copa do Mundo de 1998. Foi firmado em 1996, com prazo de dez anos. Valor de 160 milhões de dólares em dinheiro, mais 150 milhões de dólares em “marketing esportivo” a ser realizado pela NIKE, mais 10 milhões para pagamento à UMBRO, de multa pela rescisão de contrato, mais 5 milhões em material esportivo a ser fornecido à CBF, e mais 1 milhão de dólares para fornecer veículos de transporte às delegações da CBF em qualquer parte do mundo durante a vigência do contrato. Total: 326 milhões de dólares. E tem mais: uma previsão de pagar 43 milhões de dólares por uma prorrogação do contrato por mais quatro anos, chegando a um total de 369 milhões de dólares por 14 anos de contrato. Pelos primeiros dez anos, efetivamente, entrarão nos cofres da entidade, em dinheiro, somente os 160 milhões de dólares. O contrato coloca à disposição da NIKE não só a seleção de futebol principal, mas também as seleções sub-17 e sub-20 e a seleção feminina de futebol. Destacam-se no contrato cláusulas que têm sido consideradas excessivas em termos de predominância dos interesses da Nike sobre os da CBF, resultando prejudiciais ao futebol brasileiro, como se pode ver detalhamento a seguir. Duas cláusulas surpreenderam a opinião pública por influenciarem diretamente a vida da Seleção Brasileira de Futebol: 1. aquela em que a CBF se obriga a escalar os oito principais jogadores sob um critério não definido, mas que pode ser o da Nike; 2. e a cláusula em que a CBF cede à Nike a primazia de definir os adversários e os locais de 50 jogos amistosos durante dez anos. Além disso, a CBF não pode marcar jogos nos Estados Unidos, Japão, Coréia e em qualquer país da Europa se a Nike já houver marcado jogos nesses locais nesse mesmo ano. Pressionado pelas críticas, o presidente da CBF, Ricardo Teixeira, recuou. Nike e CBF repactuaram alguns pontos do contrato, o número de “ jogos NIKE” foi reduzido. E também reduzido o valor do contrato em 14 milhões de dólares. COPA DO MUNDO DE 1998 Os sinais de interferência da Nike na seleção brasileira tornaram-se mais evidentes durante a Copa do Mundo de 1998. A doença de Ronaldo e sua polêmica escalação para o jogo da final da Copa, converteram-se no ponto crucial da questão: teria a Nike exigido a escalação de Ronaldo sem condições físicas, após uma convulsão horas antes da partida, para atender a seus interesses de propaganda? Essa polêmica ocupou a atenção da CPI. Vários personagens do episódio foram convidados a depor. Zagallo veio depor de espírito armado. Seu depoimento está eivado de negativas, de não-respostas, evitando todo tempo abrir qualquer flanco para que a CPI pudesse aprofundar sua investigação. Deliberadamente desconhecia perguntas, dava respostas evasivas, procurava evitar que a linha de investigação voltada para o contrato NIKE-CBF se desenvolvesse. INCONSISTÊNCIAS DO DEPOIMENTO DE ZAGALLO No seu depoimento, Zagallo utilizou uma “retranca” eficiente. Mas algumas inconsistências se evidenciaram. Contrato CBF-NIKE: Negou terminantemente ter qualquer conhecimento sobre o contrato CBF-Nike durante seu tempo como treinador. O que é duvidoso, já que era o chefe da Comissão Técnica e efetivamente o contrato existia desde 1996, e implicava em uma série de posturas da seleção que contratualmente exigiam o conhecimento e entendimentos com o treinador. É o caso, por exemplo, dos chamados “Jogos NIKE”, aqueles que são decididos pela multinacional. No capítulo 8 do contrato, parágrafo 8.4, letra “a”, está escrito: “Durante o Período do Contrato a CBF colocará à disposição da NIKE o time de futebol masculino de primeira linha (...) para um mínimo de 50 jogos (...) A NIKE compreende que a CBF precisará consultar o Treinador-Chefe/Diretor Técnico do Time AMasculino com relação à programação desses jogos.” Depois de muita insistência dos Deputados, Zagallo recuou parcialmente e admitiu que havia jogos definidos por outra instância que não a Comissão Técnica, e que ele atribuiu vagamente ao “oitavo andar” (andar do prédio da CBF onde fica a diretoria). De qualquer modo, fica difícil aceitar as palavras de Zagallo de que ele desconhecia o contrato e ao mesmo tempo participava e coonestava atividades como o evento comercial da Nike ao qual os jogadores tiveram de comparecer durante a Copa98, para isso tendo que interromper os treinamentos. Também é irrecusável a evidência da interferência da NIKE na convocação dos jogadores. Basta ler o parágrafo 8.4 letra “c” do contrato: “Pelo menos 8 (oito) dos então principais jogadores do Time-A Masculino serão requisitados a participar de cada um desses jogos”. Refere-se aos “ Jogos NIKE”. Quer dizer, a Comissão Técnica estava impedida de promover uma renovação da equipe, caso considerasse necessário. Diante disso, cabe perguntar: antes da existência da CPI CBF/NIKE, que pôs o contrato em questão, o técnico da seleção brasileira poderia ter feito uma mudança radical da escalação no time como a que o atual treinador Emerson Leão fez ao deixar de convocar Rivaldo, Cafu, Roberto Carlos e outras estrelas? O CASO RONALDO : INCONGRUÊNCIAS E CONTRADIÇÕES A CPI também conseguiu descortinar novos cenários para o nebuloso episódio da escalação de Ronaldo na final da Copa 98. A crise "convulsiva" de Ronaldo, o principal jogador do time, maior ídolo mundial do futebol, sete horas antes da final da Copa, certamente foi um acontecimento estarrecedor, uma bomba. Milhões de dólares estavam envolvidos no acontecimento supremo do futebol. Boa parte deles investidos no prestígio e na imagem de Ronaldo, um espetáculo da mídia e, em particular, da Nike. O incidente certamente colocou em grande confusão a concentração do Brasil. Por que motivo esse acontecimento é retratado por Zagallo e pelos membros da Comissão Médica com tanta imprecisão e até com aparente indiferença, tentando minimizá-lo? O MEDO CONFESSADO Foi um problema grave de saúde? César Sampaio teve de destravar a língua do colega (como se faz em casos de epilepsia e outras convulsões), isso não é fábula, vários jogadores foram testemunhas. Do ponto de vista médico, foi um acontecimento de gravidade. As estranhezas começam aqui: o melhor jogador do mundo sofre de um mal súbito, e o treinador, o líder da Comissão Técnica, o centralizador, o mesmo que afirma categoricamente que é ele quem decide tudo na seleção, Zagallo, não é avisado? Ronaldo passou mal entre 14 e 15 horas. Zagallo disse que ouviu uma algazarra, mas supôs que fosse a torcida francesa do lado de fora da concentração. Estava vendo vídeo de um jogo, e depois dormiu até 17 horas, e só foi avisado três horas depois do fato. É o que ele afirma em seu depoimento: “O SR. MÁRIO JORGE LOBO ZAGALLO - Bem, na véspera do jogo, a torcida francesa, ela se localizou na porta da concentração e fez uma... uma algazarra, e foi comunicado, a Polícia veio e retirou a torcida, que estava perturbando. Isso na véspera, à noite. No dia que aconteceu o problema do Ronaldo, nós tínhamos almoçado, cada um foi para os seus quartos, e eu fui para o meu justamente ver um tape de França e Croácia, que foi o jogo que a França jogou, para analisar sozinho, sossegado, tranqüilo, pra ver o plano tático, o que ia ser feito diante do jogo da França. E, de fato, quando eu estava vendo a televisão, eu escutei uma gritaria, sim, mas pensei que fosse perturbação dos próprios franceses, dia do jogo, tiveram na véspera, e eu pensei que fosse também. Não dei bola. Acabei de ver o meu, o tape, dormi. E, cinco horas da tarde, eu saí tranqüilo, foi quando eu soube do fato que ocorreu, que o Ronaldo tinha tido um estresse, um estresse emocional, uma convulsão. Somente às cinco horas da tarde, foi que eu, de fato, fui comunicado”. Primeiro questionamento: nos outros depoimentos ninguém confirmou que tivesse havido algazarra da torcida francesa. E mais: da rua ao interior da concentração há uma distância grande, os ruídos externos não chegam lá. Segundo questionamento: Dr. Lídio Toledo tem versão diferente. Sua versão: Ronaldo passa mal após as 14 horas, depois do almoço. A concentração entra em alvoroço. Os colegas assustados temem pela sua saúde. Os médicos acorrem. A crise já passou. Estranhamente, não fazem nenhum exame, não dão nenhum remédio (Por que? Por que, desde o início, pensavam na possibilidade de Ronaldo jogar, apesar da "convulsão?) Limitam-se a vigiar seu " sono". Dr. Lídio diz que limpou a saliva que escorrera da boca do atleta e ficou apenas dois minutos a seu lado, chamou seu auxiliar Wilson da Mata e saiu, porque tinha de cuidar do lanche dos outros atletas (isso era mais importante que cuidar de Ronaldo?) E foi avisar o Supervisor Américo de Faria. Em seguida, (20 a 30 minutos depois?), avisa Zagallo. Zagallo foi avisado três horas depois, ou 20 a 30 minutos depois? Por que Zagallo insiste nessa linha de "distanciamento" do problema? Ele, o centralizador, quer dizer que aquele não era um problema dele, mas um problema do Departamento Médico? É a postura que manterá até o final do episódio. Ronaldo, três horas depois de passar mal, depois de tomar lanche, é afinal levado a uma clínica neurológica francesa (essa demora não se caracterizaria como omissão dos médicos e da própria Comissão Técnica?) Zagallo decide escalar Ronaldo com base nos resultados dos exames da clínica, e diante do fato de não haver veto dos médicos à sua escalação. E também porque Ronaldo chegou dizendo que estava bem, insistindo para jogar, segundo ele. Em seu depoimento Ronaldo não foi tão enfático. Afirmou que colocou-se à disposição do técnico. Depois de buscar se distanciar das responsabilidades, no final Zagallo afirma que a escalação de Ronaldo foi decisão solitária dele, embora toda Comissão Técnica estivesse reunida, e Ricardo Teixeira presente. Toda essa argumentação parece de encomenda para negar que a escalação de Ronaldo tenha se dado por interferência da Nike, para atender às conveniências dos grandes negócios envolvidos. E também para tentar negar que tenha sido uma temeridade, para não dizer irresponsabilidade, já que a Comissão Técnica pôs a saúde do atleta em risco. E finalmente, para encobrir o pânico de que a Comissão Técnica foi tomada quando se viu diante da decisão de tirar Ronaldo do time no jogo do final da Copa. A CBF e a Comissão Técnica se beneficiaram da sorte, porque felizmente a saúde do atleta não foi prejudicada. O Brasil perdeu, mas ele foi escalado. Então, a irresponsabilidade terá sido premiada. Ronaldo foi escalado por medo, não por coragem, como quer fazer parecer Zagallo. Lídio Toledo resumiu tudo nesta frase do seu depoimento à CPI: "se não escalamos Ronaldo e o Brasil perde, hoje eu estaria morando no Polo Norte". EDMUNDO CONTRADIZ ZAGALLO Em 23 de novembro, dois dias depois de Zagallo, o jogador Edmundo depôs na CPI. Foi o depoimento que mais lançou luz sobre o espisódio. Por isso, trecho dele merece ser transcrito: “O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA - Poderia nos relatar esse ocorrido? O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO - Posso, sim. Eu estava na concentração, depois do almoço. É normal todos os jogadores irem pro quarto e descansarem, dormir, quem gosta de dormir, outros gostam de ler, outros gostam de ouvir música. Enfim, eu estava no quarto, e eram aqueles quartos interligados. E era eu e o Doriva, e o Ronaldo e o Roberto Carlos. E por volta de 3h da tarde, não sei bem o horário, eu estava vendo televisão, e o Roberto entrou no quarto: “Edmundo, Edmundo, Doriva, o Ronaldo está passando mal”. E, ao ver a cena, eu me desesperei, porque era uma cena muito forte e muito chocante. E saí correndo por dentro do hotel inteiro, batendo em todas as portas e gritando pra todo mundo, pra que os médicos viessem o mais rápido possível pra atender o Ronaldo. Como o quarto dos médicos e da comissão técnica era uma pouco mais distante, os jogadores chegaram primeiro. E, nisso, eu gritei pra todo mundo e voltei até o quarto do Ronaldo. E quando eu cheguei lá, o César Sampaio já estava prestando, digamos assim, os primeiros socorros: era desenrolar língua, aquelas coisas. E fui eu e o César Sampaio que tivemos a iniciativa, porque ninguém nunca sabe o que pode fazer, se mexe ou se não mexe, o que fazer até a chegada dos médicos. E... enfim, conseguimos fazer com que a língua desenrolasse, ele adormeceu, e os médicos reuniram todos os jogadores e falaram: “Olha, a gente tem um jogo superimportante, uma final de Copa do Mundo, e o Ronaldo vai acordar e não vai saber o que aconteceu com ele. Então, a gente não vai falar nada até a hora do jogo. Volte todo mundo pros seus quartos, e vamos descansar”. O lanche seria às 6h, 5h30, 6h da tarde. Voltamos pros quartos, deitamos, mas, quer dizer, todo mundo preocupado. Meu quarto era interligado ali, eu via toda hora; de cinco em cinco minutos, vinha um, olhava, e o Ronaldo estava ali, dormindo, estava tranqüilo. Quando chegou as 6h, na hora do lanche, estávamos todos assim, como estamos aqui, lanchando, Ronaldo foi o último a chegar. Sentou, não falou com ninguém, o que não era uma coisa normal, ele sempre brincava, não falou com ninguém. Sentou, com a cabeça baixa, não comeu nada. Levantou e foi em direção ao campo que tinha ao lado do restaurante. E o Leonardo se levantou desesperado e falou: “Doutor, tem que levar esse garoto pra fazer exame, não sei o quê, pra ele tomar alguma atitude, que ele não está bem”. Foi quando os médicos se aproximaram do Ronaldo e falaram, contaram tudo que tinha acontecido, até pra levá-lo a fazer os exames. Ele disse: “Não, eu tenho que jogar, é final de Copa do Mundo, eu quero jogar, eu quero jogar”. E foi aí que os médicos disseram... eu não ouvi, mas foi o que os médicos disseram pra nós depois: “Você vai fazer todos os exames; se você estiver bem, você volta e joga” (..) (...) O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO (..) E nós fomos para o estádio; quando chegamos lá, quando ia começar o aquecimento, chegou o Ronaldo. E aí ele já chegou completamente diferente de quando ele saiu. Ele já chegou mais alegre, mais sorridente e foi direto trocar de roupa. Foi quando aí se reuniram os membros da comissão técnica e o departamento médico e chamaram o Ronaldo lá pra dentro de uma sala, que nenhum dos jogadores participaram. E o Zagallo saiu, foi o primeiro a sair dessa sala e falou: “Edmundo, você vai se segurar um pouco”. Foram essas as palavras. Eu falei: “Tudo bem”. E só. O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA - Quando V.Sa. chegou no quarto do Ronaldo, o quadro horrível que V.S.a. falou, como é que ele se encontrava? Estava batendo, tremendo? O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO - É, ele estava se batendo muito. Eu não... eu não... O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA - Deitado? O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO - Deitado e se batendo com as mãos assim, com os dentes... O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA - Cerrados. O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO - Trancados e com a boca espumante. O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA - Espumando. O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO E era... Pra mim era muito chocante porque ele é muito forte. Ele é muito grande. E fazendo aquela força toda... O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA - O corpo todo se batia? O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO - O corpo todo se batia. O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA - E alguns colegas seus tiveram que contê-lo com os braços ou... O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO - É... O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA - ...ou apenas ficaram “espectando”? O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO - Não, como eu contei. Eu, quando eu vi a cena, eu saí correndo do quarto, tá? Fui eu que acordei todo mundo, dentro da concentração. E quando eu voltei, já estavam ali dez jogadores, quinze jogadores, e ninguém, assim, tinha iniciativa. O César Sampaio é que enrolou um lençol na mão. O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA - Ele chegou a cair da cama? O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO - Não, que eu tenha visto, não. O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA - Durante o tempo todo, só viu ele na cama. O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO - Durante o tempo todo na cama. O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA - O Zagallo chegou quanto tempo após o ocorrido? O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO - Olha, eu não posso precisar o período, porque um prédio era dos jogadores, e o prédio da frente é que era da comissão técnica; mas, dez minutos, quinze minutos... O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA - Dez minutos, quinze minutos. O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO - Mais do que isso impossível.” CONTRADIÇÕES ENTRE ZAGALLO E LUXEMBURGO O depoimento de Zagallo também foi diferente do depoimento de outro ex-técnico da seleção brasileira, Wanderley Luxemburgo. Zagallo admitiu que tinha contrato com a Nike pela época da Copa, depois mandou carta à CPI negando. O representante da NIKE, Ingo Ostrovsky confirmou que Zagallo não tinha contrato com a NIKE à época da Copa de 98, mas apenas um “acerto” para Zagallo receber materiais esportivos. Luxemburgo confirmou que tinha contrato. O primeiro negou qualquer influência da Nike na escalação dos jogadores, Luxemburgo admitiu haver entendimentos, conversas, influência enfim. Zagallo alegou ignorar tudo, até a clausula do contrato que dá à Nike direito de escolher os adversários e o local de cinco jogos da seleção por ano, como vimos. Mas Luxemburgo admitiu saber do contrato e da cláusula. SOBRE A INTERFERÊNCIA DA NIKE NA CONCENTRAÇÃO DA SELEÇÃO Edmundo trouxe à CPI novos elementos que fortaleceram os indícios de interferência da NIKE sobre os assuntos da seleção brasileira de futebol, conforme pode-se ver abaixo: “O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA – Os jogadores... a informação que tenho aqui é que os senhores jogadores ficaram irritados de cumprir um compromisso com a Nike na inauguração do Nike Center de Paris. V.S.a. confirma isso? Houve suspensão do treino para esse compromisso? Ou o treino transcorreu durante todo o tempo devido? O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO – Olha, eu... eu não posso afirmar se... se houve. Mas, treinamentos, eles são cancelados e colocados de acordo com a... com a... com a necessidade. Nós ficamos um mês lá treinando, de manhã e à tarde, e, às vezes, um jogador ou outro estava com dor ou uma coisa dessa e, às vezes, os treinamentos eram cancelados. Eu não posso afirmar se nesse dia, propriamente, o treino foi cancelado em função... O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA – Mas foi cancelado? O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO – Não. Eu não posso afirmar se foi em função disso. Mas que foi cancelado, sim. O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA – Foi. É isso que eu queria... O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO – Olha, eu não sei se foi suspenso. Eu sei que nós treinamos e fomos pra lá à tarde. O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA – E o treinamento transcorreu todo o tempo devido ou não? O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO – Não. A gente treinava, como eu disse, período da manhã e período da tarde. O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA – Nesse dia, nesse dia. O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO – Nesse dia, treinamos só durante um período. O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA – Só durante um período? O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO – É. O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA – O outro período não foi... não houve treinamento? O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO – Não. O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA – Em função desse evento? O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO – Em função desse evento. O SR. DEPUTADO RONALDO VASCONCELLOS (...) Os jogadores da Seleção Brasileira sabiam do contrato da Nike, ele, que ele foi assinado em 1996 e nós estávamos em 1998? Os jogadores da Seleção Brasileira sabiam que a CBF tinham um contrato com a Nike? O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO – Sabia. É normal que a empresa que patrocine tenha um contrato. Eu acho que sim. Todos os jogadores sabiam. O SR. DEPUTADO RONALDO VASCONCELLOS Existia na comitiva — não digo na concentração —, na comitiva, em algumas reuniões, e na própria viagem, um representante da Nike junto à comitiva da Seleção Brasileira nos jogos da França? O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO – Sim. O SR. DEPUTADO RONALDO VASCONCELLOS Tempo integral? O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO – Tempo integral. O SR. DEPUTADO RONALDO VASCONCELLOS - O senhor lembra do nome dele? O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO - Todo não, mas era Luís alguma coisa. O SR. DEPUTADO RONALDO VASCONCELLOS Nacionalidade dele. O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO - Brasileira. É mineiro. (...) O SR. DEPUTADO ALEX CANZIANI – Esse Sr. Luís, que o senhor cita que é o representante da Nike, ele freqüentava a concentração? Ele ficava no local onde vocês estavam concentrados? O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO – Isso, ele ficava na concentração, ia no ônibus, enfim... O SR. DEPUTADO ALEX CANZIANI – Acompanhava toda... O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO – É, acompanhava toda a delegação. O SR. DEPUTADO ALEX CANZIANI – A concentração na França, eu estou dizendo, lá, na França. O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO – Na França.” DEPOIMENTO DOS REPRESENTANTES DA NIKE Embora em nota divulgada à imprensa, de autoria do gerente de comunicação da NIKE, Ingo Ostrovsky, se afirme que o contrato com a CBF é de quatrocentos milhões de dólares, “dos quais U$ 160 milhões em dinheiro e o restante em outros benefícios”, nunca se esclarece a aplicação efetiva, em prol da seleção, da importância de duzentos e quarenta milhões de dólares, seja em propaganda, divulgação de qualquer ordem ou fornecimento de materiais. Em depoimento à CPI Ostrovsky afirmou que o contrato envolve trezentos e sessenta e nove milhões de dólares (e não 400 milhões como havia afirmado na nota): são cento e sessenta milhões por dez anos de contrato, divididos de acordo com um cronograma estipulado, mais dez milhões de dólares para pagar a empresa Umbro pela rescisão do seu contrato com a CBF, mais cerca de cinco milhões em materiais esportivos, além de cento e cinqüenta milhões de investimentos em marketing e, por fim, um milhão de dólares para custear equipamentos de transporte para a Seleção Brasileira. O contrato prevê ainda uma possibilidade de renovação por um mínimo de quatro anos, prevendo, para isso, quarenta e três milhões de dólares. Conforme a mesma testemunha, não se poderia comparar o contrato com a Seleção e com o Manchester, pois este joga muito mais vezes num ano com transmissão pela TV para todo mundo, com grande exposição. Como a CBF pode controlar essas despesas, particularmente aqueles US$ 150 milhões de investimento em marketing? E esse investimento favorece efetivamente a quem? Ao futebol brasileiro ou à multinacional NIKE? Os depoimentos dos representantes da NIKE ajudaram a lançar luz sobre esses fatos. “O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES - Muito bem. Esse dinheiro previsto em contrato, que é previsto para investimentos em marketing, qual é o tipo de investimento, que o contrato não diz, deixa em aberto, mas nós queremos saber qual o tipo de investimento que esses recursos cobrem e quanto desses recursos já foram investidos. E em que já foram investidos até agora? E quem decide pelos investimentos de 150 milhões de dólares, é a Nike com a CBF ou os dois em conjunto? Ou a Traffic também participa? O SR. REYNALDO OSTROVSKY (Ingo Ostrovsky) - Sr. Relator, esses 150 milhões de dólares são gastos ou serão gastos ao longo de dez anos em atividades de marketing, de publicidade, de divulgação, de promoção, de exposição da Seleção Brasileira em todo o mundo. São atividades que incluem filmes, publicidade, materiais de publicidade, pôsteres, campanhas publicitárias, campanhas de rua em várias partes do mundo, enfim, campanhas de marketing — acho que o nome geral é esse. Nós estamos atualmente quase no meio do contrato, já passamos quatro anos do contrato e, até o momento, nós investimos cerca de 50 milhões de dólares. Eu gostaria aqui de fazer uma pequena observação: quando se olha o tamanho do contrato da Nike com a CBF, esse contrato ele inclui, excelência, três Copas do Mundo — a Copa de 98, a Copa de 2002 e a Copa de 2006. Durante... no ano de realização da Copa do Mundo é que são feitos os maiores investimentos em marketing em torno da Seleção, uma vez que, evidentemente, a Copa do Mundo dá uma exposição global à seleção e a nossa marca. Portanto, nós passamos apenas uma dessas três copas, até agora, e já gastamos 50 milhões, por volta de 50 milhões. Respondendo também a sua última questão, excelência, esses gastos são decididos pela Nike e em consulta com a CBF. O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES - Não há uma prestação de contas? É um contrato bilateral. Nesse contrato consta um investimento de 150 milhões de dólares, que é um investimento, apesar de abranger três Copas do Mundo, é um investimento razoável. E imaginase que ao constar uma cláusula contratual de investimento dessa natureza, imagina-se que seria em benefício de ambas as partes. Então, eu queria saber, primeiro, se isso... se quem decide é a Nike, efetivamente, se ela consulta a CBF, como o senhor disse, mas quem presta... a Nike decide, paga e presta contas, tem uma prestação de contas desses valores? O SR. REYNALDO OSTROVSKY (Ingo Ostrovsky) Excelência, a Nike decide fazer o investimento de marketing, ela faz o investimento de marketing, evidentemente que é a companhia que arca com todas as despesas desse investimento, e ela comunica à CBF aonde foi gasto o dinheiro, aonde foi investido, aonde foi feito esse investimento de marketing. O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES - De que forma é feita essa comunicação? É o senhor quem faz a comunicação, como o representante do contrato no Brasil? O SR. REYNALDO OSTROVSKY (Ingo Ostrovsky) - Não, excelência. O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES - Como é feito? O SR. REYNALDO OSTROVSKY (Ingo Ostrovsky) - Não passa, não sou eu a pessoa que faz essa prestação de contas. Eu não tenho informações sobre como exatamente ela é feita, mas ela é feita. O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES - Mas se o senhor que é o representante da empresa no Brasil, responsável pelo desempenho de um contrato de um valor de 150 milhões de dólares, o senhor disse que não sabe como é feito? O senhor não acha que isso é uma informação truncada? O SR. REYNALDO OSTROVSKY (Ingo Ostrovsky) Excelência, o que eu ... O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES - O que o senhor administra, então, além disso? O SR. REYNALDO OSTROVSKY (Ingo Ostrovsky) Excelência, o que eu estou dizendo é que eu não tenho informações se essa é uma prestação de contas anual, se essa é uma prestação de contas que é feita na medida em que os eventos de marketing são criados e realizados, eu não tenho essa informação no momento não. O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES - Gostaria que o senhor perguntasse ao seu assistente pra saber se ele tem condições de dar essa informação que o senhor não tem condições. O SR. AMADEU AGUIAR JÚNIOR - Muito obrigado pela palavra. A Nike, como falado pelo Ingo, ela executa campanhas de marketing periódicas, concentradas ao redor das Copas do Mundo, que são os três eventos mais importantes cobertos por esse contrato. A maioria desses investimentos, como o contrato é feito também pela empresa Nike Europa, são coordenados por essa entidade. Essa entidade decide a forma da campanha, o tema da campanha, comunica isso à CBF, através do seu escritório no Brasil, representado pela Nike do Brasil, que discute com a CBF a forma que essa campanha vai ser executada. A prestação de conta é feita diretamente pela Nike Europe à CBF. Eu tenho comigo um resumo que demonstra as campanhas principais que foram feitas até agora. Possa mencionar, com relação à Copa de 1998, o investimento total de aproximadamente 41 milhões e 600 mil dólares num filme de publicidade veiculado no mundo todo chamado Aeroporto, inclusive foi mostrado em TV aberta no Brasil. E diversos outros eventos. E essas informações estão disponíveis a esta Comissão, caso vocês, V.S.as. queiram consultar maiores detalhes, nós podemos consultar a empresa que fez os investimentos diretos para satisfazê-los. O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – Nós temos, requerimento aprovado aqui nesta Comissão que solicita à CBF o envio de toda a relação das despesas realizadas em termos de marketing, investimentos em marketing. E como, segundo a sua afirmação, quem decide é a Nike Europe, e depois remete, presta as contas à CBF, nós gostaríamos de obter uma cópia, então, dessas informações que o senhor coloca à disposição. O SR. AMADEU AGUIAR JÚNIOR – Perfeitamente.” Em 17 de maio de 2001 a CPI recebeu a documentação prometida pela Nike. Refere-se a campanhas publicitárias realizadas entre junho de 1997 e julho de 1998. Anúncios em TV e jornais, voltados para a Copa do Mundo de 98. Um único anúncio de TV intitulado “Aeroporto”, divulgado mundialmente pela TV, custou US$ 41,624 milhões. Mais US$ 5 milhões foram gastos em outros anúncios em TV, outdoors, revistas e jornais, tendo quase sempre o jogador Ronaldo, contratado da multinacional, como protagonista, e a Copa de 98 como tema. A marca Nike e Ronaldo rodaram o mundo nas asas dos comerciais de TV por conta do contrato com a CBF. Resta saber em que essa publicidade beneficiou a seleção brasileira de futebol e a própria CBF. Resumindo: essas informações e o depoimento de um dos representantes da NIKE, reforçaram o ponto de vista desta CPI de que os cento e cinqüenta milhões de dólares destinados a atividades de marketing (publicidade, divulgação, promoção e exposição da seleção em todo o mundo), são aplicados única e exclusivamente à vontade desta, que apenas “comunica”, segundo se expressou, à CBF “aonde foi gasto o dinheiro, aonde foi investido, aonde foi feito esse investimento de marketing.” Entretanto, Ostrovski não sabia informar como esta comunicação se dava, isto é, “...não sou eu a pessoa que faz essa prestação de contas. Eu não tenho informações sobre como exatamente ela é feita, mas ela é feita.” CONTRATO CBF-NIKE, ANÁLISE DETALHADA O Contrato CBF/NiKe, cuja investigação é um dos objetivos mais importantes desta Comissão Parlamentar de Inquérito, é um contrato de patrocínio e apoio, firmado em meados de 1996, entre a empresa Nike Europe B.V., a Confederação Brasileira de Futebol e a Traffic Assessoria e Comunicações. Por este contrato, a NIKE tornou-se co-patrocinadora da CBF, junto com a Coca-Cola, além de patrocinadora e fornecedora exclusiva da CBF de bolas, caneleiras, calçados e outros produtos fabricados e comercializados pela Nike. O contrato regula detalhadamente o uso do chamado Kit da Nike pela CBF, ou seja, seu pelos jogadores, pelos gandulas, pelos integrantes da equipe técnica, pelos mascotes e por toda a periferia da Seleção. O Contrato simplesmente assegura a onipresença da marca. Todos são obrigados a facilitar e até mesmo priorizar de todas as maneiras a exposição da marca Nike. Além disso, o logotipo e a marca devem estar nos pôsteres, publicações e papel timbrado da CBF, nas placas de campo, nos escritórios da entidade desportiva, nos veículos usados para transporte da Seleção – tudo de forma muito visível, muito clara, muito promocional. O contrato ainda prevê que, no período do contrato, a seleção masculina ficará à disposição da Nike para um mínimo de 50 jogos ou exibições internacionais, a serem organizadas sob a responsabilidade da empresa, com direitos exclusivos de comercialização, patrocínio e licenciamento, inclusive no que se refere à transmissão de imagens. A Nike tornou-se também co-patrocinadora de escolas, clínicas e quaisquer programas juvenis de futebol diretamente operados pela CBF. A Nike é uma empresa transnacional de material esportivo. Consta que a produção desse material esportivo é toda terceirizada. A Nike do Brasil disputa o mercado esportivo com concorrentes de peso, dentre os quais se destacam a gigante nacional Olympikus, a vice-líder Rainha, as multinacionais Reebok, Adidas e New Balance e a japonesa Mizuno. No momento, os objetivos de marketing, no Brasil, são, até 2003, dobrar sua participação no mercado nacional de calçados esportivos e atingir a liderança; triplicar o volume de vendas atual, no mesmo período. São objetivos de comunicação: transmitir aos consumidores os valores da Nike, aproximando-os da empresa; valorizar o esporte, a determinação e o esforço; transmitir a performance da tecnologia Nike. O CONTRATO COLIDE COM OS INTERESSES DO FUTEBOL BRASILEIRO À luz da legislação desportiva, porém, o contrato colide, com os princípios da qualidade, que se refere à valorização dos resultados desportivos educativos e dos relacionados à cidadania e ao desenvolvimento físico e moral, e da eficiência, obtido por meio da competência desportiva e administrativa, conforme consta do art. 2º, IX e XII, da Lei Pelé. Em outras palavras, cabe questionar se e de que forma o contrato CBF/Nike subordina o resultado desportivo (em seu sentido mais amplo) aos interesses do capital e aos princípios do marketing. É verdade que, de acordo com o § 2º do art. 4º da Lei Pelé, a organização desportiva do País e fundada na liberdade de associação. Contudo, ela também integra o patrimônio cultural brasileiro e é considerada de elevado interesse nacional. Quanto ao patrimônio cultural brasileiro, pelo art. 216, § 1º, da Constituição Federal, cabe ao poder público, com a colaboração de todos, promovê-lo e protegê-lo por meio de formas variadas de acautelamento e preservação, em nenhuma hipótese deixá-lo entregue à própria sorte. “Elevado interesse nacional” remete a organização desportiva aos cuidados do Ministério Público, que, aliás tem responsabilidade específica no que se refere à proteção do patrimônio público e social. Além disso, hoje a competição desportiva é principalmente um espetáculo público, de cujos protagonistas, os atletas, os promotores esperam que a conduta pessoal, o desempenho profissional e o modo de relacionar-se com a imprensa e o público antes de mais nada promovam a marca do patrocinador. Nesse espetáculo, (sobretudo televisivo), o resultado desportivo interessa na exata medida em que seja fator de reprodução e multiplicação do capital nele investido. O desporto-negócio é subordinado às leis do mercado, onde os aspectos pragmáticos da renda e do lucro prevalecem sobre os valores desportivos (integração social, de desenvolvimento psicomotor, de exercícios físicos educativos, de fortalecimento da cidadania, etc.) e onde as decisões importantes são tomadas por algum departamento de marketing ou órgão similar. Neste contexto, justifica-se que o contrato CBF/Nike seja analisado à luz da legislação de defesa do consumidor, da regulamentação de diversões e espetáculos públicos, da legislação trabalhista. A TRAFFIC É PARTE NO CONTRATO O contrato entre a CBF, a Traffic e a NiKe, firmado entre entidades de natureza privada em um país estrangeiro, em local não declarado pela partes, traz profundas conseqüências para o nosso país, a começar pelo fato de envolver a nossa seleção, detentora de tantos títulos, capaz de unificar o sentimento de todos os brasileiros, seja pelo orgulho, pela expectativa, seja, enfim, pela esperança. Quando a seleção vence, temos a certeza de que todo o país, isto é, dos mais velhos aos mais jovens e mesmo aqueles que não costumam acompanhar o futebol no dia-a-dia dos campeonatos regionais e nacional, se sentem unidos pelo sentimento de que temos valor, que os nossos atletas – representantes da nossa diversificada população – têm qualidades inerentes a todo o povo brasileiro e de que, enfim, nosso país pode ser vitorioso e feliz aos olhos do mundo. Daí a percepção de que a associação da seleção a uma empresa privada de material esportivo certamente implica na exploração comercial do sentimento de uma população. Em outras palavras, a utilização da imagem da nossa Seleção traz, e não temos a menor dúvida em afirmá-lo, grandes vantagens comerciais para a empresa, no caso específico a NIKE. Mais ainda pelo fato de que a imagem da Seleção ultrapassa em muito as fronteiras do nosso país. Até países longínquos com os quais o Brasil não mantém relações comerciais mais estreitas nem tampouco políticas conhecem o futebol brasileiro e o admiram. Portanto, a entidade que administra o futebol brasileiro, a CBF, deveria ter um cuidado extremo na participação de contratos comerciais para a exploração da imagem da nossa Seleção. Assim, em termos nominais, o valor do contrato pode impressionar a alguns, mas a destinação dos recursos advindos da sua execução não são claros ou privilegiam interesses que não os propriamente ligados à Seleção e ao futebol brasileiro. Tem-se noticiado na imprensa e também no depoimento a esta CPI do jornalista Flávio Prado, a partir de informações divulgadas em diversos sites – Telenet, Zipnet e UOL -, que a mesma NIKE firmou contrato com o clube Manchester no valor de quatrocentos e trinta e nove milhões de dólares. Mais ainda, de acordo com matéria do Correio Braziliense do dia 1o de dezembro do ano passado, a TV Globo estabeleceu contrato com o Clube dos 13 que chega ao montante de quinhentos e sessenta milhões de dólares, incluindo os direitos de transmissão pela TV. Somente isto justificaria a revisão ou mesmo a extinção do pacto com a CBF. Sob o ponto de vista jurídico formal, chama a atenção que não haja a indicação do local onde o contrato foi celebrado, crítica que se mantém mesmo tendo Ricardo Teixeira, em depoimento do dia 10 de abril a esta CPI, afirmado que o pacto foi estabelecido em Nova York e que lá, nos Estado Unidos, é irrelevante a indicação, no instrumento formal, do local em que foi assinado. Assim também não há assinaturas de testemunhas, as firmas não estão reconhecidas, não foi submetido a registro nos órgãos competentes, os anexos não acompanham a cópia da tradução juramentada. Neste ponto vale ressaltar que a tradutora pública fez constar que a tradução se deu a partir de uma cópia reprográfica do original em inglês. O contrato envolve, em verdade, três partes, quais sejam a CBF, a Traffic e a NIKE EUROPE. O contrato foi chancelado pela NIKE, Inc – matriz norteamericana. A NIKE EUROPE, por sua vez, é uma empresa sediada na Holanda, podendo configurar-se como empresa não-residente para fins fiscais (“offshore”), já que a legislação daquele país oferece a possibilidade de isenção tributária. No contrato, a Traffic é mais do que simples intermediária, constituindose em verdadeira parte, o que pode ser depreendido a partir do fato de que, como inscrito, “...é titular de certas marcas registradas e outros Direitos de Propriedade pertencentes à CBF, cujo direito a NIKE deseja obter”. O próprio representante da NIKE, confirmou, instado pelo Deputado Aldo Rebelo, que “...a Traffic é detentora de direitos legais da CBF. Então...(...)...nós não podemos assinar um contrato com a CBF, uma vez que nós estamos interessados em adquirir direitos que são da Traffic. Então, ela tem que fazer parte do contrato.” A NIKE É A PARTE PRIVILEGIADA Em seu depoimento à CPI Ricardo Teixeira foi contestado por três aspectos da formalização do contrato: 1) por não haver no contrato indicação do local onde foi firmado. Ele disse que foi em Nova Iorque, mas que nos Estados Unidos isso é comum, não tem importância. No que foi contestado pelo deputado Sílvio Torres, dizendo que esse é um contrato de interesse do Brasil; 2) Enquanto do lado da NIKE assinaram quatro diretores, do lado da CBF o presidente da CBF assinou sozinho, refletindo a falta de democracia e de transparência nas decisões da entidade; 3) Na elaboração do contrato havia três advogados representando a NIKE. E não havia nenhum advogado representando a CBF, o que, evidentemente, pode ter favorecido os interesses da multinacional. É o que se verá em seguida: Quanto às cláusulas operacionais do contrato, devemos registrar que as de nºs 2.1, 2.2, 2.3 e 4.5 traduzem uma exclusividade desmedida do uso dos direitos adquiridos em razão do contrato, aliás, exclusividade oponível em qualquer parte do mundo, sendo que a 2.2, “a”, V, traduz um objeto contratual de certo modo ilimitado. A expressão “em todas as atividades da CBF” na cláusula 5, “i”, demonstra novamente a larga extensão do objeto do contrato concedido em favor da NIKE. A cláusula 2.7 estabelece que “CBF e a Traffic concordam que os direitos e benefícios concedidos à NIKE, por meio deste Contrato, serão também estendidos a cada e a todos os membros do Grupo NIKE, e que cada uma das obrigações da NIKE, assumidas de acordo com este Contrato, pode, a critério exclusivo da NIKE, ser cumprida por quaisquer dos membro do Grupo NIKE, desde que esse cumprimento não iniba ou restrinja a responsabilidade da NIKE por suas obrigações...” [Grifo nosso.] Por esta cláusula contratual a CBF possibilita que qualquer participante do “grupo NIKE”, seja lá onde for e seja lá com que função, tome a frente de sabe-se lá que sorte de providências e usufrua da imagem da Seleção para fins não determináveis (confecção de fotos, vídeos, filmes, camisetas, material esportivo, álbuns, objetos de toda natureza com a imagem da Seleção), mesmo em padrões não espeficificados no contrato, porquanto a CBF não teria e não tem condições de fiscalizar todo o “grupo NIKE” mundo afora. A CBF se compromete, nesta cláusula, a aceitar a atuação de entidades do grupo NIKE, sem saber exatamente qual e em que parte do mundo, sujeitando-se ao alvitre exclusivo da empresa. Sobre a cláusula 4.1 devemos observar que os preços por atacado da NIKE para o Brasil, ali insertos, e que servem de referência para a aferição dos valores negociais, ficam, exclusivamente, ao alvitre da NIKE, sem qualquer garantia de controle e aferição pela CBF. A CBF também estaria prejudicada pela cláusula 4.6, à medida que a NIKE não poderia ser responsabilizada nem pelo atraso e tampouco pela não entrega dos produtos. Em complemento, a cláusula 4.7 inibe os direitos da CBF ao não estabelecer um prazo certo para uma obrigação da NIKE. Da cláusula 4.9 depreendemos que nem a própria NIKE confia tanto assim na qualidade dos seus produtos, porquanto se escusa em ter responsabilidade em acidentes ou danos sofridos pelos atletas da Seleção pelo uso de tais produtos, de forma a afrontar o nosso ordenamento jurídico, já que clausula contratual não pode excluir a responsabilidade legal a ser aferida caso a caso (art. 12, 18, 23, 24 e principalmente o art. 25 do Código de Defesa do Consumidor – Lei n.º 8.078, de 11.9.90). A este propósito, a simples assinatura de um termo de responsabilidade pelo atleta não elide a responsabilidade da empresa frente ao mesmo estatuto legal. interesses. A cláusula 6.2 suprime a liberdade de a CBF administrar os seus A alínea “a” da clausula 8.2, por sua vez, procura, de maneira inadequada e indevida, superar os limites que envolvem as partes pactuantes (CBF-Traffic-NIKE) para estabelecer obrigações aos jogadores: “cada Membro do Time cooperará com a NIKE e dará a NIKE todas as facilidades, dentro do razoável (inclusive o uso da marca e do logotipo da NIKE nos itens do Kit da NIKE e de outros Produtos NIKE), conforme a NIKE exigir, de tempos em tempos, para a obtenção e publicação de fotografias, vídeos e outros materiais de marketing ou promocionais e para outras atividades patrocinadas pela NIKE e relacionadas com a CBF;” Da mesma forma, tal raciocínio volta a aparecer na cláusula 8.14, pela qual a CBF assume o compromisso de envidar todos os seus esforços “para fazer com que os Membros do Time-A Masculino estejam disponíveis, assim como os outros Membros do Time para aparecerem nos eventos promocionais conduzidos pela NIKE e facilitará esse comparecimento. A NIKE pagará todas as despesas incorridas por esses Membros do Time, dentro do razoável, relacionadas com esses comparecimentos.” Assim, em função destas cláusulas a CBF, de acordo com o art. 929 do Código Civil Brasileiro9, poderia ser chamada a indenizar a NIKE ao prometer algo em nome de outrem que pode se recusar a cumprir o acordo de que não fez parte. O constrangimento indevido provocado por esta cláusula pode ser verificado por ocasião dos preparativos para a Copa de 1998, quando foi noticiado que o jogador Dunga, de maneira bastante justa, havia apontado o inconveniente em interromper-se o treino dos jogadores para a realização de uma festa promocional para a NIKE. Isso demonstra como a CBF poderia ter exigido uma redação mais favorável do contrato e não sujeitar-se, inclusive em nome alheio, às condições estabelecidas pela sua patrocinadora. Em conseqüência, mesmo quando os atletas são chamados a assinar documento assumindo o compromisso de não oposição às exigências comerciais assumidas pela CBF, há a possibilidade de controle judicial pela evidente desvinculação com a prática esportiva. INGERÊNCIA DA NIKE E a ingerência inaceitável da NIKE na administração da CBF continua quando, nesta mesma cláusula 8.4 as alíneas “b” e “c” estabelecem, a primeira, que a NIKE é a responsável pela organização dos jogos e “pelo fornecimento de outros times que irão competir nesses jogos” e, a segunda que estabelece a obrigatória presença de pelo menos oito dos principais jogadores do Time-A para atuarem em cada um desses jogos. Mais ainda, adiante, na alínea “d”, a CBF fica impedida de participar, durante o contrato, de “quaisquer jogos amistosos ou de exibição, que não sejam os 50 (cinqüenta) jogos a serem organizados pela NIKE e mencionados acima.” Sobre este ponto, devemos lembrar que Ricardo Teixeira no depoimento prestado a esta CPI reconheceu que cometeu um erro ao assumir a possibilidade de realizar tantos amistosos, o que levou, inclusive, a uma revisão contratual que, ao diminuir o número dos amistosos, também reduziu em cerca de catorze milhões de dólares o valor do contrato em detrimento da CBF. “Art. 929. Aquele que tiver prometido fato de terceiro responderá por perdas e danos, quando este o não executar.” 9 Pela cláusula 8.16, a CBF se compromete a ceder áreas, dentro das suas dependências administrativas, para que a NIKE possa comercializar seus produtos, através de uma “Loja com Conceito NIKE”. E, mais, a NIKE exige que tal loja seja localizada próxima ao Museu, de forma que “todos os visitantes do museu passem através da Loja com conceito NIKE quando saírem do museu.” E a CBF, como se não fosse suficiente, dá ainda mais demonstrações de má gestão negocial ao assumir, na cláusula 8.18, de maneira abusiva, o compromisso de disponibilizar para uso da NIKE, livre de quaisquer despesas, todas as filmagens que tenha em seu poder dos jogos da seleção, até mesmo daqueles jogos realizados antes da assinatura do contrato. A propósito da remuneração da CBF (cento e sessenta milhões de dólares americanos, na versão original do contrato), devemos ressaltar que ela ainda é menor do que a declarada, uma vez que, na alínea “b”, da cláusula 11.1, é estabelecido que o valor deverá ser partilhado com a Traffic (5 por cento). DESREIPEITO À JUSTIÇA BRASILEIRA Outra cláusula que chama a atenção é 18.2, mais especificamente a alínea “g”, pela qual fica evidente que a NIKE, com anuência da CBF, coloca o contrato acima até mesmo das disposições legais, mesmo de ordem pública, a demonstrar que a regra número um do contrato, ou melhor ainda, a essência do contrato é basicamente voltada para o lucro que a empresa vislumbra ao aproveitar-se da imagem da Seleção. Assim a empresa se julga no direito de “cancelar” unilateralmente o contrato, se por exemplo: “g) qualquer lei, regra, regulamento ou decisão judicial resultar em uma redução material do valor dos direitos e benefícios concedidos à NIKE, de acordo com este Contrato.” O desrespeito ao nosso ordenamento – e assim cremos que constituiria desrespeito a qualquer ordenamento jurídico contemporâneo -, se torna ainda mais evidentemente expresso na alínea “m”, que se põe acima das decisões judiciais de qualquer natureza que “proíbam quaisquer das partes contratantes deste Contrato, de cumprir, totalmente, as suas obrigações...”. A alínea “n”, por seu turno, pretende tornar a NIKE livre de qualquer responsabilidade tributária contrariando a nossa Constituição e a nossa legislação infraconstitucional, podendo haver a configuração, até mesmo do crime previsto no art. 2º, II, da Lei n.º 8.137, de 27 de dezembro de 1990. Assim a NIKE poderia cancelar o contrato caso viesse a “receber uma notificação de qualquer autoridade fiscal, em qualquer parte do mundo, avisando que a NIKE precisa reter ou que deveria ter retido impostos sobre quaisquer dos pagamentos exigidos de acordo com este contrato.” Sobre o teor destas cláusulas e os perigos que elas embutem, o representante da empresa, em depoimento à esta CPI, Ingo Ostrovsky, considerou que se tratava tão-somente de proteger os interesses da empresa, isto é, “...essa é uma cláusula de proteção. É...nós não estamos nessa cláusula dizendo que qualquer decisão judicial ou fiscal deixará de ser cumprida. O que nós estamos dizendo é que, se houver uma decisão judicial que implique em diminuição dos direitos que nós adquirimos da CBF, nós temos o direito de rescindir o contrato.” Nesta mesma toada se pronunciou o senhor Amadeu Aguiar Júnior, quando lhe oferecemos um fato concreto: há uma autuação fiscal da Receita Federal para que a CBF recolha os impostos devidos não só sobre os cento e sessenta milhões de dólares mas também sobre os dez milhões pagos a Umbro. Confrontado sobre a eventual determinação da autoridade administrativa no sentido do obrigatório recolhimento do imposto devido, houve o reconhecimento de que uma decisão desta natureza poderia configurar uma daquelas hipóteses contratuais de rescisão do contrato por deliberação da NIKE. Por fim, a supremacia indubitável da NIKE sobre a CBF se faz também clara na cláusula 22, pela qual a primeira pode escolher o foro ao seu bel-prazer inclusive onde houver “propriedades intangíveis” da CBF ou da Traffic. Mas, para ser demandada, exige como foro a cidade de Zurique, na Suíça. Posteriormente, não se sabe a razão, foi realizado um aditamento, firmado em 28 de março de 2000, pela qual o foro para o deslinde de questões referentes ao contrato passou a ser o do Rio de Janeiro. Entretanto, a alteração contratual firmada no dia 3 de abril de 2000 modificou a cláusula 2.4 da versão original, tornando exclusivo o direito da NIKE de “utilizar e sublicenciar o uso dos Direitos de Propriedade e Imagens dos Atletas”. E acrescentou que depois de deduzidas as despesas administrativas da NIKE (vinte por cento da receita bruta) e comissões, haveria o compartilhamento, em cinqüenta por cento, do que fosse auferido com a utilização dos direitos outorgados. Na alínea “b” da cláusula terceira deste adendo, acrescenta-se um novo item - 2.8 -, na cláusula dois do contrato original, definindo o termo “prêmios” a serem distribuídos pela NIKE que deterá o direito exclusivo de estabelecer os termos e condições. Mais uma vez, a CBF e a Traffic anuem, cedem expressamente a exclusividade de determinação em favor da NIKE. Outro adendo, datado de 6 de abril de 2000, define, através de fórmulas matemáticas, uma nova reformulação financeira no contrato, a partir de metas que foram redefinidas, observando, é claro, como é freqüente neste contrato, uma redução de remuneração em desfavor da CBF. AÇÃO CIVIL EM DEFESA DO PATRIMÔNIO CULTURAL BRASILEIRO Enfim, a NIKE ditou o contrato e a CBF, muito mal representando os interesses da nossa Seleção e assim do povo brasileiro, aceitou de olhos fechados os seus termos, condições, imposições e, principalmente, sua remuneração. Isto posto, temos como certa a utilização da ação civil pública por dois fundamentos legais: o primeiro por ser o esporte patrimônio cultural em relação ao qual há interesses difusos manifestos e protegíveis pelo Estado (art. 1º, IV, da Lei 7.347, de 24.07.85). O segundo fundamento está justamente na aplicação do Código de Defesa do Consumidor, à medida que o contrato CBF (TRAFFIC) – NIKE excede os interesses das partes contratantes para atingir os torcedores-consumidores dos produtos esportivos desta última empresa, levados pela associação da marca com a Seleção Brasileira. Principalmente em consideração ao segundo fundamento, podemos indicar, em conformidade com Cláudia Lima Marques, as três “bases instrumentais para combater as cláusulas abusivas, previstas no Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: 1) prioridade ao controle judicial do conteúdo do contrato, sem excluir um controle administrativo; 2) opção pela nulidade absoluta como sanção da abusividade da cláusula; 3) elaboração de uma lista exemplificativa de cláusulas consideradas nulas, permitindo sua regulamentação.” O controle judicial, hoje, se faz possível pela evolução da teoria contratual pela qual a intervenção do Estado no conteúdo dos contratos se efetiva, em última análise, pelo Poder Judiciário. Segundo a mesma autora (Contratos no Código..., op. cit., p. 395), pode se dar um controle formal e do conteúdo dos contratos a partir basicamente do art. 51 do Código, constituindo-se num verdadeiro “novo controle incidente do conteúdo e da eqüidade de todos os contratos de consumo submetidos à apreciação do Judiciário brasileiro. Um controle direto também é possível, segundo os arts. 80 e 83, através de uma ação de nulidade de cláusula.” [Grifos da autora.] De modo que há um controle formal (arts. 46, 47 e 49), por um lado, e a possibilidade de um controle do conteúdo do contrato (arts. 51 a 53). Antes que o litígio seja formalizado diante do Juiz, o Ministério Público, como adverte a autora citada, tem realizado um notável trabalho, sendo responsável pelos mais significativos êxitos dos consumidores, principalmente em sede de controle abstrato. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR O § 4o do art. 51 do Código de Defesa do Consumidor preceitua que o Ministério Público pode ser chamado a ajuizar a competente ação para que cláusula contratual, que contrarie os preceitos do Código ou não assegure o justo equilíbrio entre os direitos e obrigações das partes, seja declarada nula. O Ministério Público, então, atua não só como órgão legitimado para a propositura da ação de controle abstrato das cláusulas abusivas, mas também na conciliação e no possível ajuizamento da ação civil pública. O Código de Defesa do Consumidor, atribui, como conseqüência, a nulidade absoluta, seja na lista exemplificativa das cláusulas abusivas inseridas no seu art. 51, seja no que se refere ao art. 53. A propósito, o inciso XV do art. 51 prevê, que todas as demais cláusulas, mesmo que não previstas na numeração legal, serão consideradas nulas quando se caracterizar a sua desconformidade com o sistema de proteção do consumidor, expresso no conteúdo do próprio Código. Cláudia Lima Marques adverte que o inciso IV do art. 51, completado com o § , traduz “verdadeira norma geral proibitória de todos os tipos de abusos contratuais, mesmo aqueles já previstos exemplificativamente nos outros incisos do art. 51. A boa técnica legislativa ordenaria que norma tão importante e ampla estivesse contida em artigo próprio e não escondida, talvez por medo do veto, em uma lista de quinze incisos. Mas, seja como for, a cláusula geral da boa-fé, da eqüidade e do equilíbrio nas relações contratuais está presente no sistema do Código de Defesa do Consumidor, representando uma das mais importantes inovações introduzidas por esta lei no direito contratual brasileiro.” [Grifos da autora.] De acordo com o referido inciso, são nulas as cláusulas que estabeleçam obrigações iníquas, de forma a deixar o consumidor em desvantagem exagerada, incompatível com a boa-fé ou a eqüidade. 1o Em conseqüência, várias cláusulas do contrato CBF (TRAFFIC) – NIKE, ofendem o art. 51, bem como o inciso V do art. 6o do Código de Defesa do Consumidor, entre outras. Ainda merece consideração a falta de informação que envolve toda a negociação, fato que, por si, seria o bastante para gerar o controle já com base no art. 46 do Código de Defesa do Consumidor. CAPÍTULO V -- O UTROS C ONTRATOS DA CBF. A PARCERIA COM A TRAFFIC. No momento em que entra em declínio o domínio de Ricardo Teixeira sobre o futebol brasileiro, a FIFA, a entidade máxima do futebol mundial, também é abalada por denúncias. O presidente José Blatter está sendo acusado de corrupção em cumplicidade com a parceira ISL. Os fatos indicam que um modelo de administrar o futebol está em crise. Um modelo que combinou poder com marketing esportivo e grandes negócios menos transparentes. O que está falindo é o modelo João Havelange de administrar o futebol. A CBF inspirou-se no método inaugurado por João Havelange. Durante anos Havelange cedeu os direitos da FIFA para a Adidas e depois para uma sociedade da Adidas com uma agência de publicidade japonesa, que formou a ISL. A FIFA vendia para essa agência os direitos de publicidade para as Copas do Mundo, por um certo valor. E a agência os revendia a inúmeros patrocinadores por valores muito superiores. A ISL enriquecia rapidamente, transformava-se em uma potência do marketing esportivo. Foi exatamente o que a CBF passou a fazer com sua parceira Traffic, a partir da posse de Ricardo Teixeira na entidade, em 1989. O modelo-Havelange de gerir o futebol foi seguido à risca no Brasil por seu então genro, Ricardo Teixeira. Embora em seu depoimento a esta CPI o ex-presidente da FIFA, tenha afirmado que nessa entidade se fazia licitação para escolha da agência intermediadora, na prática isso não acontecia, ficando a ISL como parceira exclusiva durante anos, mesmo quando empresas concorrentes ofereciam contratos melhores.(Ver o livro “Como eles roubaram o jogo”, do jornalista David Yallop, pág. 186/187/222/248/249/250). Na CBF aconteceu algo semelhante, como mostraram tanto a exclusividade da Traffic nos contratos com a CBF como as fracassadas tentativas de participação nesse mercado por parte da principal concorrente da Traffic, a Pelé Sports. Ultimamente, com a falência espetacular da ISL, esse sistema, herança dos 24 anos de poder de João Havelange na FIFA, sofreu um abalo, lançando estilhaços até sobre a preparação da Copa do Mundo de 2002 na Coréia e Japão. A associação FIFA-ISL veio abaixo acompanhada de denúncias e acusações. Por trás dos negócios privilegiados haveria corrupção. A ISL é acusada de manter um fundo secreto no paraíso fiscal de Liechtenstein destinado a subornar dirigentes de confederações. Eis o que relatou o “Jornal do Brasil” de 23/05/2001: “FIFA NEGA SUBORNO esportivos Fundação da empresa suíça seria usada para comprar dirigentes ZURIQUE - Um minúsculo país que tem apenas 25 quilômetros separando o norte do sul pode ser a sede de um escândalo sem precedentes no esporte. Liechtenstein - um paraíso fiscal de 30 mil habitantes na Europa - abrigaria uma fundação mantida pela empresa de marketing esportivo ISMM, controladora da ISL, para subornar dirigentes esportivos. A denúncia poderia atingir o presidente da FIFA, o suíço Joseph Blatter. A ISL, ex-parceira do Flamengo e do Grêmio, era responsável pela comercialização dos direitos de transmissão da Copa do Mundo até 2006. Dirigentes da empresa - que teve a falência decretada esta semana - teriam chantageado Blatter, ameaçando contar ''detalhes escusos'' do presidente da FIFA se ele rompesse o contrato da entidade com a ISL. Blatter negou as acusações dizendo que a Fifa é apenas uma cliente da ISL. Por causa da insolvência da empresa, o Campeonato Mundial de Clubes, em julho, na Espanha, foi adiado para 2003. A fundação da ISL em Liechtenstein, que se chamaria Nunca, teria US$ 40 milhões para usar no suborno a dirigentes. Além da Fifa, a empresa cuidava do marketing das federações internacionais de natação, basquete e atletismo, além da Associação dos Tenistas Profissionais (ATP (...) ...a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento da Europa (OCDE), pôs Liechtenstein numa lista negra de países onde há lavagem de dinheiro. O pequeno principado já tinha aparecido no Brasil, durante a CPI da CBF-Nike, na Câmara dos Deputados. O presidente da CBF, Ricardo Teixeira, disse, em depoimento, que a RLJ, sua empresa, tem sociedade com a Sanud, sediada em Liechtenstein”. A FIFA começou negando tudo. Mas, diante de evidências apresentadas pela imprensa européia, recuou. Em 26/05/2001 a “Folha de S. Paulo” acrescentou novos detalhes às denúncias de corrupção no futebol globalizado, negócios que envolvem a TV Globo e a empresa Traffic, do Brasil: “Acuada, Fifa admite pela 1ª vez corrupção “A Fifa reconheceu que um esquema de corrupção fraudou os cofres do futebol mundial. No centro da grave crise financeira, está sua ex-parceira, a ISL A agência de marketing, que já teve sua falência decretada na Suíça, desviou cerca de US$ 45 milhões em direitos de TV pagos pela Globo. A existência dessa "conta secreta", revelada pela imprensa européia no último fim-de-semana, foi confirmada ontem pelo presidente da Fifa, Joseph Blatter. ""A única coisa que eu sei é que é provável que os US$ 45 milhões ingressaram em uma conta que não corresponde à dos direitos de TV da Copa do Mundo de 2002. Se essa for mesmo uma conta secreta, nós vamos ter um processo jurídico", disse Blatter. A Globo foi a primeira emissora no mundo a adquirir os direitos de transmissão das Copas de 2002 e 2006. Em 1998, a emissora acertou a compra dos direitos por US$ 383 milhões, valor apurado pela Folha. Os US$ 45 milhões a que Joseph Blatter se refere seriam uma parcela do desembolso. ""Infelizmente, nós apuramos que parte desse dinheiro foi usado pela ISL para pagar alguma outra coisa. Isso não é totalmente honesto", disse o presidente da Fifa. (...) O contrato entre a Globo e a ISL feito em 98 seguiu modelo de negociação definido pela Fifa em 96, quando João Havelange presidia a entidade - o brasileiro era amigo do alemão Horst Dassler, ex-dono da Adidas que fundou a ISL. Ontem, Blatter, sucessor e ex-secretário-geral de Havelange, convocou coletiva de imprensa às pressas para explicar denúncias sobre a "conta secreta" da ISL - o dinheiro, segundo a imprensa européia, seria destinado para subornar dirigentes esportivos. Lennart Johansson, presidente da Uefa que concorreu com Blatter à presidência da Fifa, exigiu explicações sobre a crise. "Eu não tenho nada a esconder. Nós não estamos em crise. Nós vivemos uma situação diferente. Uma crise é quando você não sabe o que fazer", disse Blatter. A PARCERIA ENTRE A CBF E A TRAFFIC A análise dos contratos de patrocínio e de cessão de direitos pela CBF feitos com a intermediação da Traffic revelam a semelhança com o sistema FIFA-ISL. O primeiro contrato mais amplo entre CBF e Traffic data de 1987, de exploração de vendas para o Exterior de direitos dos jogos da seleção brasileira nas eliminatórias da Copa do Mundo de 1990. E o contrato básico cujas cláusulas se mantêm até hoje, apenas com mudanças, foi pactuado em 1990. Após onze anos dessa íntima parceria a Traffic, que era uma empresa modesta em 1989 saltou para o lugar de quinta maior empresa de marketing esportivo no mundo, com um faturamento de 262 milhões dólares em 2000. Só com a CBF o faturamento foi de 96 milhões de reais. O crescimento do ativo da Traffic assumiu proporções gigantescas: de R$5.678 milhões em 1995, saltou para R$57.649 milhões em 1999. Enquanto isso, a CBF teve prejuízos, espelhados por um passivo, que vai sendo rolado há três anos, de R$25 milhões de reais, de acordo com o balanço de 2000. O patrimônio pessoal de José Hawilla, oficialmente declarado à Receita Federal, que era de 3,7 milhões de reais em 1995, passou a ser de 76 milhões de reais em 1999. Esses números causaram espanto aos deputados da CPI: “O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - É realmente assustador. Porque, veja bem, senhor... É a pergunta que eu quero fazer: o senhor enriqueceu muito em poucos anos. A que o senhor atribui isso? O SR. JOSÉ HAWILLA - Ao trabalho. Eu posso garantir ao senhor... O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – ... Porque, veja bem, trabalhando com o futebol brasileiro, a Traffic e o senhor tiveram grande sucesso financeiro na última década. A Traffic, por exemplo, acaba de inaugurar uma sede muito boa, em local nobre de São Paulo. Enquanto isso, o futebol brasileiro foi levado a uma crise financeira profunda. A CBF tem elevado as dívidas, as federações regionais não têm nada, os clubes, e principalmente os grandes clubes, estão falidos. Como podem os empresários e intermediários como a Traffic terem tanto sucesso financeiro ao mesmo tempo em que o futebol se encontra, o futebol brasileiro, se encontra em crise tão profunda? Então, há uma contradição aí, há alguma coisa que nós precisamos descobrir — Deputado Benito Gama, e outros Deputados aqui também, Darcísio Perondi, José Lourenço. O Zé Lourenço se assustou, por exemplo, não sei por quê, Zé Lourenço, nobre Deputado José Lourenço, com os 262 milhões. Ele achou um número assim espantoso. A pergunta é esta: nosso futebol numa crise sem fim, federações quebradas, clubes quebrados e empresários e empresas como a Traffic, multimilionárias. Quer dizer, há um enriquecimento de alguns, né, alguns poucos, certo? Inclusive, tem a situação da Hicks Muse, também, com a ISL — a informação que nós temos é que a ISL está quebrada. Mas não quero entrar nisso agora, não quero entrar nisso agora. Eu gostaria que V.S.a. me respondesse a respeito disto: uma crise tão profunda no nosso futebol, quebradeira, e a Traffic tão bem. Gostaria que tecesse comentário. Em resposta, José Hawilla argumentou que seus negócios são no Exterior, que apenas 1,3 por cento deles acontecem no Brasil. O SR. JOSÉ HAWILLA - O único equívoco que V.Ex.a. fez é quando o senhor se refere ao futebol brasileiro. Quando disse aqui no início, Deputado, a Traffic tem muito pouco trabalho no futebol brasileiro. Nós fomos inquiridos nesta CPI por causa do contrato que nós temos com a CBF. O Deputado Enrico Miranda, que é Presidente de clube, sabe muito bem disso. O trabalho da Traffic é internacional. Nós temos empresas que trabalham no futebol fora do Brasil. No Brasil nós não temos nenhum direito em nenhum campeonato de nenhum clube, de nenhuma seleção estadual. O único contrato que nós temos, Deputado, é com a CBF. O contrato da CBF com a Nike, para nós, no nosso faturamento, representa 1,37% do nosso faturamento — 1,37% do faturamento. Este, este é o dinheiro que nós ganhamos com os negócios com a CBF e com a Nike. Noventa e oito por cento e meio, um pouco mais, vem de faturamento de fora do Brasil, de campeonatos, de torneios, de eventos, de ações, de merchandising e de marketing.” José Hawilla foi contestado pelo Deputado Eurico Miranda: “O SR. DEPUTADO EURICO MIRANDA - Eu só quero colocar, sem entrar, sem entrar no mérito, porque eu vou deixar pra minha oportunidade, dizer o seguinte: o contrato com a CBF sem dúvida nenhuma permitiu que a Traffic fizesse todos esses contratos internacionais. O SR. JOSÉ HAWILLA - É verdade. O SR. DEPUTADO EURICO MIRANDA - Isso eu vou chegar. Então, há uma coisa, hoje corresponde a pouco, pode ser pouco o faturamento, mas foi o que alavancou. O SR. JOSÉ HAWILLA - Exato, eu falei isso no começo, eu falei isso, que institucionalmente... O SR. DEPUTADO EURICO MIRANDA - Sim, mas eu só queria colocar que, em termos de valores, quando o Deputado estava perguntando, há uma conexão com a CBF, porque a CBF é que permitiu, o contrato com a CBF é que permitiu esse, essa alavancagem. O SR. JOSÉ HAWILLA - Me permite, Deputado. O Deputado Pedro Celso está dizendo, a pergunta dele se refere que os clubes estão pobres, que a CBF está pobre, que a federação está pobre, que o futebol brasileiro está pobre e nós ficamos ricos. Então, eu estou respondendo diretamente à pergunta formulada por ele nesta direção. Nós não ficamos, não ficamos, não somos ricos, nem nossa empresa é rica. Nossa empresa trabalha como outra qualquer, só que nós tivemos — é desagradável falar —, mas, um relativo sucesso fora do Brasil. Não é no Brasil. No Brasil nós geramos recursos pra CBF. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Eu não contesto isso. V.S.a. teve uma atitude correta, acertou quando fez o contrato com a CBF. E nós é que imaginamos, acho que foi o que o Deputado Enrico Miranda colocou aí, e que eu também imagino, que a partir do contrato da CBF é que as portas de outras confederações pelo mundo afora se abriram.” E acabou confessando que o sucesso da Traffic foi feito em cima do prestígio da seleção brasileira, portanto, enriquecendo, sim, enquanto o nosso futebol mergulhava em crise. “O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – Naquele período, a sua empresa já era uma empresa já com alguma tradição no mercado? O senhor já tinha alguma...? O SR. JOSÉ HAWILLA – Não. Eu confesso que o contrato com a CBF, depois mais amplo, ele foi muito importante pra nossa empresa internacionalmente. Embora financeiramente não tenha sido um bom contrato, um ótimo contrato pra nós, ele institucionalmente foi muito importante, porque a Seleção Brasileira, todos nós sabemos, é famosa no mundo inteiro. É o melhor futebol do mundo, é a que tem mais tradição no mundo inteiro. Então, pra nós, institucionalmente, era muito importante ser a empresa de marketing da CBF. Pra fora do Brasil, isso, pra nós, tinha um valor muito grande e representou muita coisa, embora, repito, não seja... não tenha sido significativa a parte econômica e financeira.” OS PRIMEIROS CONTRATOS CBF-TRAFFIC O contrato-base entre a CBF e a Traffic se deu em 1990, pouco depois de Ricardo Teixeira assumir a presidência da entidade. Depois, foram sendo feitos outros contratos, como de publicidade estática, com a Pepsi. E o contrato com a Topper. A parceria inicial foi sendo ampliada. Em 21/10/1994, a CBF vendeu à Traffic “em caráter de exclusividade”, os seguintes direitos: utilização para fins publicitários e promocionais da marca CBF e da imagem da seleção brasileira de futebol, como um todo, resguardando os direitos individuais de seus integrantes e restrições constantes do contratos firmados entre CBF/UMBRO e CBF-Coca-Cola, os quais declaram conhecer e se obrigam a respeitar. 1. Painéis publicitários, em sua totalidade, nos campos dos jogos, em todas as partidas da Seleção Brasileira, amistosos ou oficiais, realizados no Brasil, obrigando-se a CBF a entregar os estádios inteiramente livres de publicidade... 2. Direitos mundiais de transmissão por televisão, à exceção do Brasil e do país a que pertencer o adversário da Seleção Brasileira, em todos os jogos e treinos, realizados em território brasileiro. 3. Prazo de validade do contrato, quatro anos – 1/1/95 a 31/12/98 -Valor: a Traffic comprometeu-se a pagar à CBF R$1 milhão de reais em oito parcelas de R$125 mil reais, em fevereiro e agosto de cada ano. Portanto, um milhão de reais em quatro anos. Por quais valores a Traffic terá negociado esses direitos? Somente o item 1.3 – direitos mundiais de transmissão de TV dos jogos da seleção brasileira por quatro anos – deverá ter rendido à Traffic muitos milhões. Esse é mais um exemplo da administração ruinosa da CBF. E tem mais: PRORROGAÇÃO DO CONTRATO ATÉ ELIMINATÓRIAS DE 2002. O contrato acima referido foi prorrogado em 1/12/98 para valer até 2002, ampliado e modificado: A Traffic passou a ter os seguintes direitos: Direitos mundiais à exceção do território brasileiro, de transmissão por televisão aberta ou fechada, em quaisquer sistemas existentes, ou que venham a existir no futuro, dos nove jogos da Seleção Brasileira de Futebol a serem realizados no Brasil, válidas pelas eliminatórias sul-americanas à Copa do Mundo de 2002, a ser realizada na Coréia e Japão. Direitos exclusivos de publicidade estáticas nos estádios. Direitos exclusivos de comercialização das transmissões por Pay per view para as cidades onde se realizem os jogos referidos... Por esses direitos a Traffic está pagando à CBF, em reais, a importância de US$ 4,5 milhões, sendo US$ 1 milhão na data da assinatura e o restante em parcelas semestrais até 20/07/2001 (1 milhão em 1999; 1 milhão em 2000 e 1 milhão e 500 mil em 2001.) CONTRATO DE INTERMEDIAÇÃO, AGENCIAMENTO E OUTRAS AVENÇAS Em 09/03/1995 a CBF e a Traffic firmaram mais um contrato, de intermediação, dando à empresa amplos direitos para negociação. Foi esse pacto que abriu caminho para o rompimento do contrato com a UMBRO e para fazer o negócio com a NIKE. Seus termos: “ A CBF... (...) considerando que para viabilizar e otimizar negócios referentes a patrocínio e licenciamento o melhor caminho é se valer de serviços de empresas especializadas na área de marketing, com amplo conhecimento e experiência no segmento esportivo, afeto à CBF. Considerando que a Traffic, empresa responsável pela criação de patrocínio da Seleção Brasileira de Futebol, é uma das mais atuantes do mercado, tanto no Brasil como em nível mundial. 5. Considerando que os excelentes serviços prestados pela Traffic à CBF a recomendam para promoção, agenciamento e intermediação de eventos esportivos e novos negócios, têm as partes justo e contratado o presente ajuste (...) seguintes cláusulas e condições: 1ª. A CBF contrata a Traffic para atuar na intermediação , agenciamento e operação de novo negócio de patrocínio e fornecimento de material esportivo, objetivando maximizar a receita da contratante neste segmento. 2ª A Traffic está autorizada a iniciar gestões junto a empresas do setor, inclusive a atual contratante da CBF, que deverá prioritariamente consultar a respeito. 5ª Pela efetiva concretização do negócio (...) a CBF lhe pagará a remuneração de 5% sobre o montante ...” Conforme depoimento de José Hawilla a esta CPI, após a vitória do Brasil na Copa de 1994, a imagem da seleção brasileira ficou mais valorizada, criando possibilidades de novos negócios. Farejando melhores negócios a Traffic fechou esse novo contrato com a CBF, que lhe deu poderes para negociar e intermediar o contrato com a Nike. Concretizado o negócio com a NIKE, a Traffic passou a receber 5% dos US$ 16 milhões de dólares anuais recebidos pela CBF = US$ 800 mil dólares por ano durante dez anos, total: US$ 8 milhões de dólares. Um aspecto do negócio ficou obscuro porque envolveu prejuízos para a CBF. Para aceitar o rompimento do contrato, a UMBRO, que era a anterior detentora do direito de uso da imagem da seleção brasileira, e que até então havia pago US$ 3 milhões de dólares à CBF, exigiu uma multa de nada menos que US$ 10 milhões de dólares. Pôde fazer essa exigência porque – pasmem! – no contrato CBF-UMBRO, intermediado pela Traffic, não havia cláusula de previsão de rompimento do contrato, nem fixação de multa. Foi uma imprevidência da CBF e da Traffic, a empresa que intermediou os contratos. Resultado: os primeiros US$ 10 milhões do contrato foram destinados a pagar a multa cobrada pela UMBRO, repassados diretamente pela NIKE. Grande negócio para a UMBRO, que investiu US$3 milhões, usou por vários anos a imagem da seleção brasileira, e ainda recebeu US$10 milhões de indenização. E, pior ainda: a Receita identificou que os US$ 10 milhões pagos pela Nike diretamente à UMBRO fariam parte, também, da receita da CBF, além de diversos outros valores. Com isso, a Receita Federal autuou a CBF por sonegação fiscal, devido à omissão de faturamento. O Termo de Verificação e Constatação Fiscal da Receita FM 199901.756-4 (Anexos 3 pastas fiscal 1 e 2, bancárias 1 a 40) estabeleceu que: “Portanto, o valor total da Remuneração prevista na Cláusula 11 do Contrato entre a CBF e a NIKE foi de US$ 170.000.000,00 (e não apenas os US$ 160.000.000,00 previstos na cláusula 11.1), o que significa que os US$ 10.000.000,00 deveriam ter sido contabilizados com Receita Operacional nas datas acima previstas.” Diante disso, mais um prejuízo deverá ser atribuído às costas largas da CBF, com relação aos contratos UMBRO e Nike: o valor referente à autuação pela Receita Federal.. CONTRATOS CBF/TRAFFIC-COCA COLA Em 21/10/1994, Traffic intermediou o contrato CBF-Coca Cola, com prazo de quatro anos, valor de US$8 milhões de dólares, sendo US$2 milhões por ano, de 95 a 98. Mais um prêmio para a Copa de 98 (1 milhão se o Brasil fosse campeão, US$800 mil, se fosse vice, o que acabou acontecendo). Entre as cláusulas, a 4ª , a CBF se obriga a realizar dez jogos da Seleção Brasileira por ano, abertos ao público, amistosos ou oficiais. A remuneração: a Traffic emite as faturas contra a Coca Cola. Dos valores recebidos repassa 80 por cento para a CBF e retém 20% como remuneração por seu trabalho. Por sua vez, a Klefer Produções, de Kleber Leite, que participou das negociações, recebe 20% da parte da Traffic. RENOVAÇÃO DO CONTRATO COM A COCA COLA Em 08/01/1997, o contrato foi prorrogado de 01/01/1997 a 31/12/2002, substituindo o contrato de 1994. Por um novo valor: R$30 milhões de reais. Pagos em parcelas anuais: 1997 – 4.0 milhões de reais 1998 – 5.5 milhões 1999 – 5.5 milhões 2000 – 5.0 milhões 2001 – 5.0 milhões 2002 –5.0 milhões A Traffic continuou recebendo sua comissão de 20%. CONTRATO PARA AS ELIMINATÓRIAS DE 2006 E 2010 Mais um contrato foi firmado entre a CBF e a Traffic em 02/03/2000., pelo qual a CBF concede os direitos mundiais de transmissão por TV direta ou fechada e Internet, dos jogos da Seleção Brasileira de Futebol, na condição de mandante nas eliminatórias de 2006 e de 2010. A vigência do contrato é até 2010. Preço e condições de pagamento: Pelos direitos cedidos, a Traffic paga à CBF US$900 mil dólares na assinatura do contrato. Se o Brasil for mantido nas eliminatórias, a Traffic pagará à CBF o valor total de US$16 milhões e 200 dólares. 02/03/2000 – 1.0 milhão de dólares 30/12/2000 – 1.1 30/07/2001 –1.2 30/07/2002 –1.2 30/07/2003 –1.2 30/07/2004 --1.2 30/07/2005 --3.3 30/07/2006—1.2 30/07/2007—1.2 30/07/2008—1.2 30/07/2009—1.2 30/07/2010—1.2 A INTERMEDIAÇÃO DA TRAFFIC Para justificar a necessidade de sua empresa como intermediária nos negócios da CBF, em seu depoimento à CPI, J. Hawilla alegou que a Traffic “batalha os clientes” para trazê-los para a CBF. Mas uma marca com o renome da CBF, da seleção brasileira de futebol, não precisa de intermediação. O que aconteceria se a CBF anunciasse no mercado que está vendendo os direitos de imagem da seleção e abrisse uma concorrência para quem desse o melhor preço? Será que não apareciam propostas? Isso já foi feito com sucesso por Giulite Coutinho quando foi presidente da CBF (ele antecedeu Ricardo Teixeira). No contrato com a Coca Cola a Traffic ficava com 20% do total a título de comissão. Nos contratos de cessão de direitos exclusivos para a CBF comercializar as imagens dos jogos da seleção brasileira (eliminatórias da Copa de 2002, 2006, 2010) em todo o mundo, exceto no Brasil (aqui os direitos são negociados com a TV Globo), a CBF recebe importâncias muito inferiores àquelas recebidas pela Traffic ao comercializar essas imagens com o Exterior. Prejuízo para a CBF. Grandes lucros para a Traffic. E também para a TV Globo, que faz a mesma coisa, compra os direitos da CBF e os revende para anunciantes em território nacional por valores muito superiores aos que paga à CBF. A Traffic é parceira no contrato da CBF-Nike e recebe uma comissão de 5% sobre o valor de 160 milhões de dólares em dez anos. Na época, sua intermediação foi considerada imprescindível, como afirmou Ricardo Teixeira em seu depoimento à CPI. Mas era mesmo necessária? Em 2001 a CBF decidiu romper o contrato com a Coca Cola. A partir de maio firmou um contrato com a AMBEV, no valor de 170 milhões de dólares. Antes, a CBF havia tentado negociar com a Coca-Cola um reajuste de 100 por cento no contrato. A multinacional não aceitou fazer o reajuste. Então, a CBF rompeu e fez o contrato com a AMBEV. De acordo com o jornal O Estado de S. Paulo de 29 de maio de 2001, “a CBF ainda negocia com a Coca-Cola o pagamento dos R$30 milhões da multa rescisória”. Se pagar multa nesse valor, mais uma vez a CBF estará sofendo prejuízos. O contrato com a Coca-Cola tinha o valor de R$30 milhões por cinco anos, e o prazo era 2002. Até o ano passado a CBF havia recebido R$20 milhões, menos R$4 milhões correspondentes aos 20% da comissão da Traffic, portanto, R$16 milhões. Se a CocaCola receber agora R$30 milhões de indenização, além de haver usado por três anos a marca da CBF em sua propaganda, terá feito um grande negócio. Nesse caso, a CBF irá devolver em dobro o que recebeu. Fazer contratos com a CBF é um negócio muito bom, mas para os outros. Veja-se o exemplo da UMBRO, e agora, da Coca-Cola. E a Traffic, receberá seus 20% sobre o valor da multa? Em seu depoimento à CPI José Hawilla falou sobre a rescisão com a Coca-Cola, assegurou que não haveria multa e que também não iria cobrar sua comissão na multa. Deu também opinião sobre o fato de a Traffic ter ficado de fora: “SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – E a Coca-Cola, apesar de ter sido solicitada essa revisão, ela não aceitou fazer a revisão do contrato? SR. JOSÉ HAWILLA – Ela negociou, negociou com a gente e até um determinado limite, mas o Presidente da CBF preferiu atender a outra empresa, que o procurou diretamente. SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – E o senhor não participou dessa negociação com a AMBEV? SR. JOSÉ HAWILLA – Não, não participamos. SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – A Coca-Cola está disposta a rescindir esse contrato? SR. JOSÉ HAWILLA – Em princípio, a informação que temos é de que ela aceitou a rescisão. SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – E o senhor vai participar dos valores dessa rescisão? SR. JOSÉ HAWILLA – Em que sentido? SR. EPUTADO SILVIO TORRES – O senhor, como tem uma percentagem do contrato, o senhor vai ter também uma percentagem do valor da rescisão. SR. JOSÉ HAWILLA – Não, não. Não acredito que tenha penalidade, que tenha multa pra pagar. Não acredito. O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – Mas o contrato, ele segue o mesmo padrão do contrato da Umbro, que foi rescindida por acordo, porque foi rescindido antes do término do contrato. Da mesma forma, a Coca-Cola. O contrato da Coca-Cola vai vencer em dezembro de 2002. R. JOSÉ HAWILLA – Eu não acredito que tenha alguma penalidade pra pagar. Não acredito. Não acredito que a Coca-Cola vai exigir isso da CBF. Penso que não vai exigir. SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – O senhor acha que ela vai abrir mão do direito dela de exigir? O senhor vai abrir mão do seu direito? SR. JOSÉ HAWILLA – Devo abrir mão. SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – Mesmo não participando do próximo contrato? SR. JOSÉ HAWILLA – Mesmo não participando(...) SR. JOSÉ HAWILLA – ... eu queria dar uma explicação. Nem a Coca-Cola, nem a CBF, nem a AMBEV vão conseguir fazer este trabalho de entrega sem uma empresa que possa operacionalizar esse contrato. A CBF não tem a menor condição de fazer isso. E a AMBEV, ou ela vai contratar uma empresa, que pode ser a Traffic, ou ela vai contratar uma outra empresa, ou ela vai montar, dentro, um departamento seu pra atender esse contrato, porque isso não é uma intermediação comum de venda de um terreno ou de venda de um apartamento, de uma casa, onde você recebe a comissão e terminou a sua participação. Nós não recebemos a comissão só pela venda ou só pela intermediação. Nós temos que operacionalizar esse contrato. Isto é complicado. Exige especialização, exige conhecimento. Então, eu acredito, eu acredito que a AMBEV terá que contratar uma empresa pra fazer a operação desse contrato. (...) DEPUTADO SILVIO TORRES – O senhor acha que, diferentemente do que ocorreu em todo o tempo anterior, agora seria estabelecido uma concorrência pra... A CBF estabeleceria uma concorrência pra esse tipo de contrato, de operacionalização dos seus contratos? SR. JOSÉ HAWILLA – Veja, eu não posso responder pela CBF, mas eu acho injusto isso com a nossa empresa, porque a nossa empresa é que foi a geradora de todos os recursos que a CBF recebeu até hoje. De todo esse montante de dinheiro que a CBF recebe, fomos nós que criamos, nós que inventamos, nós que saímos no mercado pra buscar, nós que corremos riscos, nós que trabalhamos. Esse contrato da Coca-Cola, esse contrato da Nike, sempre tem uma equipe nossa trabalhando nisso. Todos os dias do ano. Todos os jogos do ano. Em todas as partes do mundo, nós temos cinco, seis pessoas trabalhando pra entregar esse contrato. Isso não é uma coisa absolutamente simples de compra e venda, como eu disse pro senhor agora. Entende? Eu não acho... Eu não sei o que é que está na cabeça da CBF e qual é o procedimento que ela vai fazer, mas eu não acho justo isso, neste momento. Todas as empresas que atendem às seleções do mundo inteiro têm uma reciprocidade de fidelidade no atendimento. Não é pra todo o ano se fazer uma licitação, porque vem uma empresa que não conhece o mercado, vem uma empresa que não conhece a estrutura da CBF, a estrutura... SR. JOSÉ HAWILLA – Só que isto depende de um acordo. Então, a AMBEV pode chegar pra CBF agora e dizer o seguinte: “Tá bom , eu te pago 170 milhões de dólares, mas você me entrega o produto pronto”. A CBF vai ter que contratar uma empresa pra fazer esse serviço. Ela não tem competência pra fazer isso. Não é do objetivo dela fazer isso. (...) Depois, eu entendo, depois do acordo feito com a CBF, se ela, AMBEV, disser “eu assumo a responsabilidade da operacionalização do contrato”, ela só tem duas alternativas: ou contrata uma empresa especializada ou monta uma empresa, dentro do departamento dela, da AMBEV. O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – Sr. J. Hawilla, o senhor foi contatado, ou foi sondado pela CBF pra esse fim? O SR. JOSÉ HAWILLA – Não, porque eu imagino — repito pra V.Ex.a. —, eu acredito que a AMBEV é que vai ficar com essa responsabilidade. Eu acredito e espero que nós venhamos a ser procurados pela AMBEV.” Afinal, a intermediação é mesmo necessária? Em 1995, a CBF considerava a intermediação fundamental, como consta da introdução do seu contrato de agenciamento e intermediação com a Traffic: (...) considerando que para viabilizar e otimizar negócios referentes a patrocínio e licenciamento o melhor caminho é se valer de serviços de empresas especializadas na área de marketing, com amplo conhecimento e experiência no segmento esportivo, afeto à CBF... A novidade é que no contrato com a AMBEV, realizado em 2001, as CPIs em plena atividade, e a opinião pública atenta, a CBF não utilizou a intermediação da Traffic. A intermediação deixou de ser necessária. José Hawilla mostra seu ressentimento. Qual é a explicação da CBF? CAPÍTULO VI – ADMINISTRAÇÃO DA CBF ACUMULA PREJUÍZOS Como resultado da quebra de sigilo bancário e fiscal da CBF, a CPI pôde fazer uma análise de suas contas de 1995 a 2000. Dessa investigação resultou a conclusão de que a CBF vem sendo administrada de forma errada. Em que pese a arrecadação anual da entidade ter quadruplicado no período devido ao patrocínio empresarial, suas despesas mais que quadruplicaram e a CBF chegou ao final de 2000 com um passivo circulante de R$ 55 milhões de reais. E um passivo a descoberto, quer dizer, prejuízo acumulado, de quase R$25 milhões. Técnicos de contabilidade avaliam que, se fosse uma empresa, a CBF estaria insolvente no final do exercício de 2000. (Documentação de referência: CBF -- Anexo 03 – Sigilo Fiscal – pastas 1F e 2F; Sigilo Bancário, pastas 1B a 42B) Além disso, a CBF tem sobrevivido, durante os últimos três anos, usando o subterfúgio de buscar adiantamentos de patrocínios. Assim, está comprometendo seriamente sua estrutura operacional para os anos seguintes. A CBF chegou ao ponto de recorrer a empréstimos tomados junto a instituições financeiras externas, como o Delta National Bank, agravando ainda mais seus problemas estruturais. Esses empréstimos, que serão tratados em capítulo à parte devido ao prejuízo que vêm trazendo à CBF, representam a mais significativa parcela do endividamento da entidade. Foram pagos, entre juros, multas e desvalorização cambial, cerca de US$ 11 milhões de dólares (atenção: dólares!), em menos de dois anos e meio. Os juros desses empréstimos extrapolaram, e muito, as taxas de mercado. Enquanto o mercado praticava taxas de juros em torno de 10% ao ano, em dólares, a CBF contratou empréstimos a 52% ao ano, também em dólares. Esses endividamentos colocaram a CBF em uma posição delicada. Apesar de receber volumosos recursos, principalmente externos, a CBF se encontra bastante deficitária. Por que um empréstimo comprometedor uma semana antes de receber US$ 15 milhões da Nike? E pagá-lo, já após a aguardada liberação do dólar, em vez de usar o dinheiro recebido da Nike? O presidente da CBF, questionado pelo Deputado Jurandil Juarez sobre seus negócios pessoais relativos ao mercado de capitais, em seu depoimento à CPI, afirmou que durante todo o ano de 1998 já se aguardava a desvalorização do Real: “O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Eu volto a dizer que não necessariamente alguém ganha e outro perde. Eu vou dar um exemplo de uma operação que o senhor considerou uma operação de um grande número. Desde o ano de 98, Excelência, que se falava no Brasil que iria haver uma desvalorização cambial. Se o senhor acompanhasse, se o senhor acompanhou o mercado de 98 do dólar, desde 98, final do ano, que começou a haver uma mutação do dólar. Qualquer pessoa que estivesse no mercado e acreditasse nas informações da queda do, na época, Presidente do Banco Central Gustavo Franco, tinha certeza absoluta que no momento que o Presidente do Banco Central, Gustavo Franco, saísse do Banco Central, imediatamente haveria um descolamento do dólar de valores bastante depreciados. Essa operação eu fiz exatamente porque eu tinha certeza absoluta que com os boatos que já se faziam da queda do Gustavo Franco, eu posso lhe enviar depois essa documentação de jornais da época, e exatamente essa grande operação foi em dólar. Essa operação foi compra de dólar futuro.” (g.n.) Infelizmente, os interesses da CBF não foram beneficiados pelos conhecimentos de Ricardo Teixeira sobre o mercado financeiro. Vê-se, sem dúvida alguma, que houve desídia na contratação dos US$ 4,5 milhões junto ao Delta Bank, a juros de 32% ao ano, alguns dias antes da desvalorização do real. Esse dinheiro entrou no caixa da CBF no dia 30 de dezembro de 1998, já reduzido em quase US$ 1 milhão, devido ao pagamento dos juros adiantados! Em 5 de janeiro de 1999, a CBF viria a receber US$ 15 milhões da Nike. RECEITAS AUMENTARAM , DESPESAS MUITO M AIS AINDA As principais receitas da CBF quadruplicaram em quatro anos. Saltaram de R$18 milhões 286 mil reais em 1997 para R$79 milhões 352 mil reais em 2000. Fruto principalmente dos contratos de patrocínio e dos direitos de transmissão. TABELA 1 Exercício Receitas Taxas Diver Fut.Profis. 1997 1.982.968,00 3.599.898,00 1998 2.010.118,00 1999 2000 Dir. Trans. 3.358.962,00 Patrocínios Total 9.344.615,00 18.286.443,00 7.306.264,00 2.301.218,00 15.659.845,00 27.277.445,00 2.661.726,00 7.233.958,00 26.306.307,00 32.228.734,00 68.430.725,00 2.594.099,00 4.504.303,00 15.699.950,00 56.553.660,00 79.352.012,00 Fonte: Relatório de Análise 01/2001, do Conselho Federal de Contabilidade Comparativo das Principais Receitas 80.000.000,00 70.000.000,00 60.000.000,00 50.000.000,00 40.000.000,00 30.000.000,00 20.000.000,00 10.000.000,00 Total Taxas Diver Fut.Profis. Dir. Trans. Patrocínios Total No mesmo período, as principais despesas da CBF também quadruplicaram. Passaram de 26 milhões 924 mil reais em 1997 para 86 milhões 700 mil reais em 2000. Nos quatros anos os prejuízos acumulados superaram 55 milhões de reais. TABELA 2 Exercício Despesas Pessoal Enc. Serviços Fut. Amador Fut. Profission Outras/Totais 1997 4.846.690,00 6.166.886,00 2.410.008,00 11.010.427,00 26.924.219,00 1998 5.883.079,00 14.337.097,00 1.881.648,00 17.711.958,00 43.383.327,00 1999 14.784.219,00 34.029.886,00 4.316.601,00 12.394.165,00 69.552.183,00 36.197.848,00 9.518.038,00 20.410.305,00 86.700.009,00 2000 17.883.987,00 Comparativo dos Principais Grupos de Despesa e Total 90.000.000,00 80.000.000,00 70.000.000,00 60.000.000,00 50.000.000,00 40.000.000,00 30.000.000,00 20.000.000,00 10.000.000,00 - Pessoal 1997 1998 Enc. Serviços Fut. Amador 1999 Fut. Profission 2000 Outras/Totais DESPESAS COM PESSOAL AUMENTARAM 400 POR CENTO Chama a atenção que as despesas que mais aumentaram foram as com Pessoal, que cresceram 400 por cento em quatro anos, e as despesas com Encargos e Serviços, que aumentaram seiscentos por cento. Ao mesmo tempo, as despesas com futebol profissional aumentaram cerca de 90 por cento, no mesmo período. Comentário do Relatório do Conselho Federal de Contabilidade: “É como se a CBF tivesse perdido o rumo”. Enquanto se instalava uma farta distribuição de dinheiro em gratificações, doações, salários, juros e encargos de dívidas, e “outras” despesas, a atividade-fim, -- o futebol profissional e o amador – teve sua participação diminuída no conjunto das despesas. A Tabela 3 mostra que o item Despesa com Pessoal/Encargos ampliou sua participação de 45% em 1997 para 64% em 2000, tendo chegado a 74,5% em 1999. A atividade-fim, o futebol, teve sua participação reduzida de 54,9% em 1997 Para 35,6% em 2000. TABELA 3 ANO 1997 1998 1999 2000 TOTAL EVOLUÇÃO DESP. PES. + ENCAR. X FUT.AMAD. PROFIS. EM R$ 1,00 PESSOAL + ENCARGOS FUTEBOL AMAD/PROFIS TOTAL DESPESAS VALOR % VALOR % VALOR % 11.013.576 45,07 13.420.435 54,93 24.434.011 100,00 20.220.176 50,79 19.593.606 49,21 39.813.782 100,00 48.814.105 74,50 16.710.766 25,50 65.524.871 100,00 54.081.835 64,38 29.928.343 35,62 84.010.178 100,00 134.129.692 63,04 78.653.150 36,96 212.782.842 100,00 Fonte: Relatório de Análise 01/2001, do Conselho Federal de Contabilidade REMUNERAÇÃO DA DIRETORIA A remuneração da diretoria, que passou a ser paga a partir de 1998, deu saltos espetaculares. A Tabela 4 mostra a evolução dessas despesas. Os onze diretores receberam 1 milhão de reais em 98 e 3 milhões e cem mil em 2000, mais de 300 por cento de aumento, rendimentos de dar inveja aos mais bem pagos executivos de multinacional. Ricardo Teixeira recebeu 126 mil reais em 98 e 418 mil reais em 2000. Atualmente, sua remuneração mensal é de 35 mil reais. Mais notável é a situação de seu tio, Marco Antônio Teixeira, secretário geral da entidade, que recebeu 387 mil reais em 98 e 507 mil reais em 2000. Com vínculo empregatício estabelecido a partir de julho de 99, o salário mensal de Marco Antônio é de 37 mil reais. E todos ainda recebem 13º e 14º salários. Com que justificativa? Afora Marco Antônio Teixeira, que tem vínculo empregatício, os outros diretores não são assalariados da CBF. Acrescente-se a esse capítulo alguns “enganos” indesculpáveis, como o do adiantamento do 13º e 14º salários de José Carlos Salim em 1999, que não foi descontado de sua remuneração no final daquele ano. Quem se preocupa com tais detalhes, se o dinheiro jorra por todos os lados? TABELA 4 REMUNERAÇÃO DE DIRETORIA EM R$ 1.000,00 DIRETOR Ricardo Terra Teixeira/Presidente Alfredo Alberto L. Nunes/Vice Carlos Eugênio Lopes/Jurídico José Carlos Salim/Marketing Luiz Gustavo V. Castro /Registro Melchiades Mariano/Patrimônio Gilberto M. Coelho/Finanças Antônio O. R.L. Costa/Financeiro Vandenbergue Santos/Institucion. Luiz M. E.Oliveira/Cat. Especial Marco Antônio Teixeira/Secretár. TOTAIS RETIR 1998 126,9 1 96,6 122,6 122,6 122,6 102,4 3 57,6 00,0 00,0 00,0 5 387,6 1.046,5 RETIR 1999 405,7 1 349,1 310,5 2 317,5 300,5 269,2 00,0 00,0 4 91,4 00,0 5 431,9 2.475,8 RETIR 2000 418,3 308,8 311,1 328,7 308,4 299,8 00,0 283,8 279,1 62,8 5 507,4 3.108,2 RETIRADA ATUAL 35,1 23,1 23,2 23,2 23,2 23,2 00,0 23,2 23,2 6,7 37,3 241,5 (*) Remuneração da diretoria iniciou a partir de set/98, inclusive. 1 – incluso valor recebido em dez/98 e jan/99 por exercício da Presidência. 2 – Concedido em jul/99 adiant. 13 e 14o sem o respectivo desconto em dez/99 3 – Permanência de set a out/99 apenas. 4 – Início em set/99 5 – Remuneração desde jan/98. Após jul/99 estabeleceu-se vínculo empregatício. Fonte: Relatório de Análise 01/2001, do Conselho Federal de Contabilidade Quanto aos salários dos funcionários destaca-se a falta de critérios e a disparidade. Enquanto um auxiliar de escritório recebe entre R$ 800 e R$ 1.200 por mês, um assistente administrativo recebe entre R$ 2.400 e R$ 5.800. Enquanto o Supervisor Geral, José Antônio de Almeida, recebe R$ 2.444 por mês, o Assessor de Comunicação, o jornalista Carlos Leite Lemos da Cruz, recebe R$ 19 mil. REMUNERAÇÃO DA DIRETORIA É ILEGAL Conforme demonstramos cabalmente em outra parte deste relatório (Capítulo V – A CBF é uma associação civil sem fins lucrativos), a adoção pela CBF de remuneração de seus diretores é flagrantemente ilegal. Isto porque o artigo 13 do Estatuto da CBF estabelece que: Art. 13 - Os membros dos poderes e órgãos não serão, de qualquer forma, remunerados pelas funções que exercerem na CBF. E o Estatuto não foi mudado pela a Assembléia Geral da CBF realizada em 5 de janeiro de 1998. A ata registra que não houve mudança no Estatuto. E nem poderia haver, já que aquela era uma Assembléia Geral de natureza administrativa, de quorum limitado. E pelo artigo 19, parágrafo 3º. , somente a Assembléia Geral de natureza eleitoral, de quorum mais amplo, tem poderes para alterar o Estatuto. Como conseqüência, esta CPI recomenda medidas, inclusive judiciais que promovam a devolução aos cofres da entidade da remuneração recebida indevidamente pelos diretores e presidente. DESPESAS COM JUROS E ENCARGOS EXPLODIRAM Na Tabela 5 acompanha-se a evolução incontrolável dos juros e encargos financeiros. De R$ 51 mil, em 1996, para R$ 11 milhões, em 2000. Saltou de 0,001% no primeiro ano para 12,48% no último, tendo chegado a 16% da receita total em 1999. Nesse ano, a CBF pagou R$ 11,348 milhões de juros enquanto sua receita total foi de R$ 70,62 milhões. Isso significa que as despesas com encargos financeiros evoluíram assustadoramente em 3.078% no período em comparação com o incremento de 209% nas Receitas, em termos reais. Essa conta coincide com o período em que a CBF mais arrecadou dinheiro, fruto do contrato CBF/NIKE, e também é o período em que a entidade mais se endividou, apelando à série de seis empréstimos junto ao Delta Bank, tomados a juros altíssimos e em condições duramente adversas aos interesses da CBF. (Ver Capítulo VIII – Empréstimos no Exterior a juros extorsivos). TABELA 5 EXERCÍCI0 ANÁLISE DOS VALORES ENCARGOS FINANCEIROS EM R$ 1,00 RECEITA TOTAL EM R$ 1,00 % S/RECEITA DO EXERÇÍCIO 1996 51.473 27.112.312 0,001 1997 346.790 28.552.761 1,21 1998 2.841.877 28.245.589 10,06 1999 11.348.171 70.620.345 16,07% 2000 11.021.495 88.315.644 12,48% Fonte: Relatório de Análise 01/2001, do Conselho Federal de Contabilidade AUXÍLIOS A FEDERAÇÕES FILIADAS E A POLÍTICOS Uma das maiores rubricas de despesas da CBF é a de “auxílios eventuais”. Em 97 foi de R$ 1,637 milhão; em 98, registrou um salto de quase 400 por cento, para R$ 5,138 milhões. Em 99, sob a rubrica de “auxílio a federações filiadas”, foram registrados R$ 4,15 milhões. E, em 2000, sob o mesmo nome, R$ 7,199 milhões. Mas em 2000 também reaparece a rubrica “auxílios eventuais”, com um valor de R$ 596,6 mil. Segundo o depoimento de Ricardo Teixeira a esta CPI, além das doações às federações, a CBF renunciou voluntariamente a várias taxas e contribuições devidas pelas federações. Umas e outras, apresentadas como uma generosidade da CBF, têm um significado real muito diverso. Criaram laços de dependência, subordinação e cumplicidade das federações frente à entidade nacional. O que lhes tirou poder de contestação nas votações na Assembléia Geral da CBF, de cujas decisões passaram a ser meras subscritoras passivas. Em troca, a CBF não pede prestação de contas das federações pelo uso que fazem das doações, generalizando-se os desvios das finalidades e o uso dessas verbas em benefício pessoal dos dirigentes (Ver Capítulo X -Federações: Desagregação da Organização Confederativa). Entre os beneficiários de vultosas doações aparecem também, em período eleitoral, inúmeros candidatos a eleições parlamentares e majoritárias. O que evidencia o plano dos dirigentes da CBF de estabelecer pontos de apoio no Parlamento e em governos para fazer lobby das posições da CBF. (Ver Capítulo VIII – Doações políticas. Criação de uma rede de influência política no Congresso). A CBF COMPRA OURO NO EXTERIOR. POR QUÊ ? A CBF efetuou transferências para o exterior no mercado flutuante, tipo 04, no período de novembro de 1995 a março de 2001, no valor de US$ 9.738.423,02 , sendo US$ 2.123.850,55 a título de Capital Brasileiro de Curto Prazo – Operações com ouro, representando 21,81% das transferências no mercado flutuante – tipo 04. Essas operações trazem informações incompletas, pois não indicam qual o país de destino nem o nome do recebedor no exterior. Chama a atenção também o fato de serem os únicos contratos da CBF, ao longo do período jan/1995 a mar/2001, a serem realizados na moeda dólar-ouro. Cabe portanto solicitar ao Banco que efetuou a operação (HSBC Bank Brasil S.A, na época Banco Bamerindus) e a própria CBF, através de seus representantes, informar qual o país de destino desses recursos, assim como o recebedor no exterior. Em seu depoimento à CPI, Ricardo Teixeira não soube explicar o motivo dessas transferências em dólar-ouro. Posteriormente, em correspondência de 19 de abril último, informou apenas que “os saldos de conta corrente da CBF no Bamerindus eram automaticamente aplicados sem risco, já que extratos anexos demonstram que as taxas anexas eram prefixadas”. Continuou sem explicar os motivos de a CBF ter feito essas transferências para o Exterior e para quem. CBF FAZ TRANSFERÊNCIAS DE DINHEIRO EM FAVOR DA FIFA No mesmo período, a CBF transferiu US$ 3.314.778,64, para a FIFA, sendo que US$ 325.000,00 correspondem ao código natureza Serviços diversos - Passes de Atletas Profissionais e US$ 2.989.778,64 a título de Serviços diversos - Remuneração de participação em competições esportivas. As transferências para FIFA representam 34,04 % do total de transferências no período considerado. Os valores envolvidos nestas transferências não condizem com o próprio conteúdo do sítio da FIFA, na internet: “De acordo com o seu estatuto a FIFA é uma organização sem fins lucrativos, e assim as federações associadas devem pagar apenas uma modesta anuidade, uma taxa de entrada para participar da copa do mundo e um percentual mínimo das receitas com as seleções nacionais”. O relatório financeiro da FIFA prossegue ainda: “A Copa do Mundo é a vitrine da FIFA e atinge milhões – até bilhões de fãs, gerando uma receita substancial para a entidade e para a federação do país organizador através da venda de ingressos, direitos de retransmissão, patrocínio, merchandising e outros. A maior parte dos lucros é destinada aos países finalistas. Enquanto cada federação associada tem assegurada uma doação de US$1 milhão de dólares para o período de quatro anos, a FIFA retém apenas os fundos necessários à manutenção de seus custos administrativos e de suas principais atividades.” Com relação ao período de envio dos recursos destinados à FIFA, observa-se uma forte concentração no ano de 1999 quando foram realizadas 90,19% das remessas, conforme tabela as seguir: Ano 1996 1997 1999 2000 Total US$ 125.000,00 200.000,00 2.989.593,64 185,00 3.314.778,64 % 3,77 6,03 90,19 0,01 100,0 Fonte: Sisbacen – PCAM 130 A resposta de Ricardo Teixeira a esse questionamento foi dizer que se tratava de “um encontro de contas” para compensar créditos e débitos entre as duas entidades. CBF AUTUADA PELA RECEITA FEDERAL: R$ 14,4 MILHÕES O fato de a CBF não acompanhar, de modo adequado, a legislação tributária brasileira, tem feito com que a entidade deixe de recolher tributos de acordo com a lei. A isso adiciona-se o fato de que irregularidades nas áreas contábil e financeira contribuíram para que a Receita Federal autuasse a CBF em mais de R$ 14 milhões. A CBF foi autuada pela Receita Federal, em 2000, por irregularidades diversas, dentre elas sonegação de imposto de renda, de COFINS, de CSLL, além de omissão de receita e de fraude fiscal, com a criação de receitas, indevidamente (ver Anexo 03/01, CBF - Sigilo Fiscal) Pelo processo 15374.000839/00-03, encerrado em 30/3/2000, a CBF está obrigada a pagar R$ 8.378.778,62 por omissão de receitas, glosa de custos de bens e serviços. Pelo processo 15374.000840/00-84, a Confederação necessita recolher ao caixa da Receita R$ 6.029.882,18, devido a falta de recolhimento da COFINS. A soma total da autuação é, assim, de R$ 14.408.660,80. Um caso claro de omissão de receitas envolve o recebimento de R$ 10 milhões referentes ao pagamento feito pela Nike à Umbro, em nome da CBF para pagar a multa rescisória do contrato CBF/Umbro. Essa importância passou a fazer parte do contrato CBF-Nike., como receita da CBF. Mas não foi declarada à Receita Federal. E o Imposto de Renda relativo àquela importância também não foi pago. Chama a atenção o fato de que o contrato CBF/Umbro não incluía cláusula penal alguma, que é uma falha do trabalho de intermediação da Traffic, a qual deveria ter sido responsabilizada pelo prejuízo causado à sua cliente. Essa cláusula foi acordada depois, em conjunto com a Nike, e tudo se resolveu com a Nike adiantando o dinheiro e a CBF arcando com o prejuízo. Outra irregularidade verificada pela CPI, tanto quanto pela Receita, foi a inclusão na contabilidade da CBF de uma despesa que não existiu. Trata-se de uma pretensa despesa de cerca de R$ 629 mil que relativa a um adiantamento obtido junto à Nike. A multinacional remeteu à CBF, em abril de 1997, US$ 5 milhões adiantando o pagamento de janeiro de 1998. Como é de praxe, os dólares foram convertidos em reais pela cotação do dia em que foram enviados à CBF. Em janeiro da 1998, o dólar valia mais. A entidade contabilizou a diferença da cotação do dólar entre abril de 1997 e janeiro de 1998, um valor de 629 mil reais, como despesa. A CBF alegou que havia deixado de receber R$ 629 mil em função de ter recebido os US$ 5 milhões em abril de 1997 com a cotação de abril de 1997 e não com a cotação de janeiro de 1998! É claro que o valor a receber pela CBF era de US$ 5 milhões, em qualquer momento, e esse valor deveria ser contabilizado pela moeda nacional no momento do recebimento. Grande equívoco ou esperteza para encobrir prejuízos? Naturalmente, a Receita não vacilou em glosar essa falsa despesa. A administração da CBF não tem tido o cuidado em garantir que a entidade se mantenha a par de toda a legislação, atualizada e de acordo com a lei, em todos os aspectos. O exemplo das doações a campanhas eleitorais é um outro exemplo, a ser analisado, com detalhes, em capítulo a parte (Capítulo VIII, novamente). CASO VEÍCULO VOLVO A CBF adquiriu, em 10/5/1995, um veículo marca Volvo, importado, completo com todos os acessórios disponíveis, teto solar, 2.300 CC, no valor de R$ 68.199,00, eqüivalente, na época, a US$ 76.542,08, pela cotação do dólar flutuante do dia (US$ 1 = R$ 0,891) comprado da Vocal Comércio de Veículos Ltda., nota fiscal 171.413 (Anexo Contrato CBF/Nike 37, segunda parte). Pouco mais de um ano depois, em 10/7/1996, o próprio Ricardo Teixeira adquiriu esse automóvel da CBF, pagando apenas R$ 49.000,00, ou melhor, US$ 45.526,52 pela cotação do dia 10/7/1996 (US$ 1 = R$ 1,0104). O veículo foi comprado por Teixeira com um desconto de cerca de 40% sobre o valor pago pela CBF, pois a diferença entre o valor pago pela CBF e o pago pelo presidente da entidade foi de US$ 31.015,56. Na CBF, não há licitação, nem para compra, nem para a venda. Uma parte do ativo permanente é vendido sem que qualquer providência administrativa prévia seja tomada. O veículo foi vendido para o presidente da entidade, sem que ninguém tivesse a oportunidade de oferecer mais, nem mesmo alguém externo à CBF. O carro poderia ter sido oferecido no mercado e, nesse caso, a Confederação poderia ter arrecadado bem mais do que obteve de Ricardo Teixeira. Tem sido, sempre, evidenciado que a CBF não mantém em sua contabilidade os recibos adequados, fato constatado pelos auditores do Conselho Federal de Contabilidade. A COMPRA DE PRODUTOS DAS FAZENDAS TEIXEIRA DE PROPRIEDADE DE RICARDO A CBF adquire, sem licitação, leite e derivados das fazendas de Ricardo Teixeira, em Piraí, RJ. Esse procedimento foi denunciado durante os trabalhos desta Comissão, e foi noticiado pela imprensa. Diante da repercussão negativa das denúncias feitas pela CPI, Ricardo Teixeira devolveu cerca de R$ 28.200,00 ao caixa da CBF. Esse valor foi contabilizado como sendo relativo ao fornecimento de leite e derivados durante o período 1995-2000. PAGAMENTOS DA CBF A RESTAURANTES DE RICARDO TEIXEIRA A CBF vem realizando festas, almoços e jantares, eventos, em restaurantes de propriedade de Ricardo Teixeira, dentre eles, o El Turf Bar e Restaurante e o City Port. Normalmente, os eventos patrocinados pela CBF sempre vêm ocorrendo nesses locais. É verdade que os gastos com o El Turf, por exemplo, caíram de cerca de R$ 50.000,00, em 1998, para zero, em 2000. Isso se deve, aos que parece, à má repercussão que vinha tendo esse costume da CBF de realizar os eventos nos restaurantes do presidente da entidade. Num evento, em 7 de fevereiro de 1996, durante o lançamento do Instituto de Assistência ao Futebol Brasileiro - IAFB, no restaurante El Turf, a CBF gastou R$ 32.480 (trinta e dois mil, quatrocentos e oitenta reais). Para se ter uma breve idéia, foram cobrados 1.300 litros de chope, 1.750 porções diversas (frango champanhe, filé ao champinhon, dentre outras), além de 360 refrigerantes, 80 doses de Whisky 8 anos e 3 champanhas Dom Perignon (que custaram R$ 300,00 cada uma). Ao que parece, foi uma festa para um público muito exigente. Durante o seu depoimento na Câmara, em 10/4/2001, Ricardo Teixeira procurou explicar como são esses negócios da CBF com o Restaurante El Turf: “O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – O senhor disse... . O senhor disse que o El Turf tem um movimento bastante grande. No dia 5/5/98 o El Turf emitiu duas notas fiscais para a CBF, as de nºs 768 e 769. Ótimo, pode ter tido dois eventos. Mas no dia 4/9/98 a nota fiscal é a 770. Nesse período, não foi emitida nota fiscal nenhuma? O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA – Excelência, podem ser... Essa nota fiscal é de eventos. As outras notas fiscais... Hoje em dia, no Rio de Janeiro, a maioria das empresas tem um caixa, por exigência do ICM, eu não sei, em que você recebe... Eu não sei explicar. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Então, tá. O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA – O Deputado sabe como é... O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Então, é a nota fiscal de eventos. Então, eu acho que o El Turf está tendo poucos eventos, só está tendo a CBF. A nota fiscal 768, 769, 770, 772, 780, 789, quer dizer, o El Turf tem como única fonte de renda, pelo jeito, nos eventos, a CBF. O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA – Excelência, esse dado não é verdade. Quer dizer, não é... O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – É a Receita que está nos fornecendo esse dado. O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA – A Receita... Eu vou lhe enviar o faturamento do El Turf, que ele é bem superior a isso. É mais de 200 mil reais por mês. Eu faço questão absoluta de lhe enviar, porque eu não tenho esses dados, até porque não faziam parte da documentação que eu trouxe, mas eu vou lhe enviar o faturamento anual do El Turf a partir da sua criação até a data de hoje.” (g.n.) Outro elemento de comparação é o City Port Restaurante Ltda., também de propriedade de Ricardo Teixeira. Apenas como amostra, verificou-se que a CBF pagou faturas desse restaurante em vinte e seis (26) vezes, apenas no ano de 1999. Já em 2000, aconteceu o mesmo que com o El Turf: não houve eventos naquele estabelecimento. ADVOGADOS DE RICARDO TEIXEIRA PAGOS PELA CBF Ricardo Teixeira, a pessoa física do presidente da CBF, pode estar utilizando escritórios de advocacia remunerados pela Confederação para solucionar suas pendências judiciais, conforme apurou esta CPI. 1. LEONARDO ORSINI DE CASTRO AMARANTE Um dos exemplos é o do processo de Ricardo Teixeira contra Juca Kfouri. Tanto para o agravo AG-131466 (Agravo de Instrumento) quanto para o recurso especial RESP-138420, ajuizados no Superior Tribunal de Justiça (STJ), consta o nome do mesmo advogado de Teixeira. Esses processos aconteceram durante o ano de 1997. O advogado de Teixeira era o dr. Leonardo Orsini de Castro Amarante, conforme observado nas consultas realizadas no processo. Ocorre que o dr. Amarante recebeu três pagamentos da CBF, e não de Ricardo Teixeira. Não constam cheques, ou qualquer tipo de pagamento dele, pessoa física, para o advogado. Já a CBF, por meio de três cheques no valor de R$ 16.315,00, datados de 27/8/97, 15/9/97 e 4/12/97, realizou pagamento de cerca de R$ 50.000,00 ao dr. Amarante. Além desse caso, o dr. Amarante foi advogado no processo 9500220261, ajuizado na 6ª Vara da Justiça Federal do Rio de Janeiro, que tratou do problema de Teixeira com o contrabando de equipamentos para uma choperia. Esse processo, somente em 8/5/98 subiu para o Tribunal Regional Federal, da 2ª Região. De 1998 a 2000 a CBF não pagou mais nada ao advogado Leonardo Amarante. O que reforça a tese de uso da estrutura da CBF, por Ricardo Teixeira, para solução de seus litígios perante a Justiça. 2. MÁRCIA PARENTE Outro exemplo é o da advogada Márcia Parente, que defende Ricardo Teixeira nos processos 95/00298821 (RESP-189066), no STJ, e no Habeas Corpus HC 001497, do Tribunal Regional Federal da 2a Região, processo esse ligado à ação por sonegação de imposto de renda, pessoa física. Ela não recebeu valores diretamente do senhor Ricardo Teixeira, fato comprovado com base nos documentos enviados pelos bancos, após a quebra do seu sigilo bancário. Já a CBF pagou a essa advogada a quantia de R$ 20.000,00, em 23/10/97, por meio do cheque 36.590, do Banco Real (Anexo 3/18). Esse é mais um indício de que a CBF tenha arcado com os honorários advocatícios em mais um processo envolvendo a pessoa física do senhor Ricardo Teixeira. O argumento de que Teixeira representa a CBF não pode prosperar devido ao fato de que ele, enquanto cidadão, pessoa física, é responsável por seus atos. Não pode haver confusão entre a pessoa do presidente e a entidade. 3. JOSÉ MAURO COUTO DE ASSIS O dr. Mauro Couto de Assis vem representando Teixeira em muitos processos (RESP-189571, HC-11514, RESP-297898 e AG-385279, do STJ). E fica clara a confusão entre a pessoa do presidente e a da entidade, a CBF. A CBF vem fazendo pagamentos a Couto de Assis, já há tempos. De acordo com dados em poder desta Comissão, a CBF pagou, em 8/5/97, R$ 20.000,00 a José Mauro Couto de Assis, cheque número 34.702, do Banco Real, agência 003, da Av. Rio Branco (Anexo 3/11). Já em 5/3/98, o escritório Couto de Assis Associados recebeu da CBF a quantia de R$ 59.100,00 (cheque 37.960, do mesmo banco, Anexo 3/16). E de Ricardo Teixeira ele, ou o escritório, nada receberam. Mais grave é o fato de Teixeira estar respondendo a processo por sonegação fiscal, tendo sido condenado a seis anos de reclusão em primeira instância, e estar sendo atendido por Couto de Assis. Esse processo teve grande movimentação durante o ano de 2000. Coincidentemente a CBF vem realizando pagamentos mensais a Couto de Assis, no valor de R$ 9.850,00 (Anexo Contabilidade da CBF, ano 2000, em meio magnético, CD). Apenas em 2000, foram nove pagamentos. 4. JANETE LACERDA A advogada Janete Lacerda também defendeu Teixeira (AG/RE 10691, STJ). Dra. Janete também trabalha ou trabalhava para o mesmo escritório Couto de Assis. 5. BARBOSA, MÜNNICH E ARAGÃO Esse escritório esteve defendendo Ricardo Teixeira em seu processo junto à Receita Federal (Processo 13706.000045/95-13). Em 25/5/2000, a CBF pagou a esse escritório R$ 50.000,00 (Anexo “Contabilidade da CBF - CD”). Ricardo Teixeira já havia pago a esses advogados uma única vez, em 13/5/96, apenas R$ 3.371,20, cheque de número 10.805, do Banco Real, Agência Avenida Rio Branco, no Rio de Janeiro. Todos esses registros são indicações de que a CBF esteja pagando por honorários advocatícios para a defesa de processos contra a pessoa física de Ricardo Teixeira. 6. ESKENAZY PERNIDJI ADVOGADOS Esses advogados receberam, da CBF, um total de R$ 23.874,99, no ano de 1998, de acordo com a movimentação bancária recebida por esta CPI. O senhor Sérgio Isidoro Eskenazy foi procurador da empresa AMERITECH HOLDING INC., sediada nas Ilhas Virgens Britânicas, para a compra da casa de Búzios que foi vendida para a empresa MINAS INVESTIMENTOS S/A, de propriedade de Ricardo Teixeira (Ver Capítulo IX -- Declarações de Renda de Ricardo Teixeira). 7. CARLOS ROBERTO SIQUEIRA CASTRO Em seu depoimento à CPI do Futebol, no Senado, em 22-5-2001, o funcionário da CBF Ariberto Pereira dos Santos Filho admitiu que a entidade estava pagando o seu advogado. O seu defensor não é ninguém menos que o advogado Carlos Roberto Siqueira de Castro, do Rio de Janeiro, sub-procurador da República aposentado, jurista renomado, de biografia brilhante. E certamente um dos advogado mais caros do país. O funcionário Ariberto deve ter muito do que ser defendido para que a CBF tenha indicado um defensor desse calibre. Entretanto, essa contratação revela outra vez a promiscuidade entre pessoa física e pessoa jurídica no trato com as finanças da entidade. E caracteriza mais uma irregularidade, outro desvio das finalidades no uso dos recursos da CBF. 8. CARLOS EUGÊNIO LOPES Esse advogado, que também é diretor jurídico da CBF, trabalhou para Ricardo Teixeira, no caso da liberação do restaurante El Turf, de propriedade de Teixeira, em 1999. Há, como nos outros casos, uma confusão entre as pessoas (1) física de Ricardo Teixeira, (2) jurídicas das empresas de Teixeira e (3) jurídica da CBF. Esse fato foi noticiado pelo Estado de São Paulo, de 16/9/1999: “O desembargador Paulo Espírito Santo, do Tribunal Regional Federal (TRF), acatou mandado de segurança impetrado pelos advogados da Boate El Turf, da qual o presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), Ricardo Teixeira, é um dos proprietários, e determinou que as 22 chopeiras da casa, localizada na Gávea, zona sul do Rio, fossem deslacradas. Na sexta-feira, o juiz da 6ª Vara Federal do Rio, Guilherme da Gama, cassou liminar que impedia a Receita Federal de apreender o equipamento instalado na boate. A Receita alega que o material das chopeiras chegou ao País de forma ilegal, no vôo que trouxe a seleção brasileira logo após a Copa do Mundo de 1994, nos Estados Unidos. Anteontem, as torneiras foram lacradas por um inspetor da Receita. O advogado Carlos Eugênio Lopes, vice-presidente jurídico da CBF e encarregado por Teixeira de defender a El Turf, disse que o juiz errou ao determinar a execução da sentença antes de sua publicação no Diário Oficial. "Ele também se equivocou, ao não esperar o prazo legal de apelação", afirmou. De acordo com Lopes, o processo estava "concluso" para sentença desde dezembro de 1997. "Me causou espanto que o juiz tenha demorado tanto para se manifestar." A PARCERIA ENTRE PASSAGENS LTDA A CBF E SBTR - STELLA BARROS TURISMO E A empresa SBTR PASSAGENS E TURISMO LTDA vem recebendo valores muito elevados da CBF, há anos. Grande parte das despesas da CBF se referem a gastos com passagens e hospedagem. Esses valores não são devidamente contabilizados pela CBF, que faz com que as faturas da SBTR fiquem diluídas em todas as contas da entidade. Ou melhor, não há uma conta específica para a SBTR; as despesas com a empresa ficam espalhadas por muitas contas diferentes, o que dificulta a contabilização dos valores pagos a essa empresa. O presidente Ricardo Teixeira, em seu depoimento à CPI, em 10/4/2001, não soube explicar os motivos que levam a CBF a manter por anos a fio a exclusividade desse serviço nas mãos da SBTR, como segue: “O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Nós temos uma incidência muito grande de pagamentos feito à Stella Barros Transportes e Turismo Ltda., que é uma empresa de turismo do Rio de Janeiro. Chama a atenção pelo seguinte: em cinco anos, esta empresa recebeu aproximadamente 20 milhões de reais da CBF, o que dá o cálculo — que eu fiz aqui rapidamente — de 75 mil por semana. O que existe assim de negócio que levaria a ter uma transação de 75 mil reais. O senhor conhece alguém da Stella Barros? O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Claro que eu conheço. Conheço o dono da SBTR, da Stella Barros, e essas... provavelmente todas essas despesas estão incluídas algumas que são competições nacionais, outras que são competições dos campeonatos da CBF e outras da Seleção Brasileira. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Eu cogitei de ver como é que era feita a venda lá e verifiquei que ela tem preços de tabela cheia, e são os preços que a CBF pratica junto com ela. Qual seria a razão da CBF ter essa exclusividade com essa empresa. Quero dizer que, pelos preços, eu verifiquei que não. Não há vantagem. O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Desde que eu assumi a CBF, ela é uma empresa que prestava serviço não só à CBF, como também nos campeonatos mundiais, e ela permaneceu. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Foi uma decisão administrativa unilateral, portanto. O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Foi uma decisão da Diretoria da CBF, assim como cada uma das... cada um dos... Por exemplo, o campeonato nacional, quando realizado pelo Clube dos 13, utiliza outras companhias. Enfim, eu acho que é uma decisão efetivamente da empresa, quer dizer, da entidade”. (g.n.) A SBTR, como apurou o Deputado Jurandil Juarez, somente pratica a tabela cheia, referindo-se aos preços nominais de tabela das passagens aéreas, sem desconto algum. E o senhor Ricardo Teixeira afirmou, no depoimento de 10/4/2001, conhecer os proprietários da SBTR. Todo o volume de vendas de serviços à CBF e o conhecimento pessoal fruto de mais de doze anos de relacionamento não fizeram com que a CBF obtivesse condições especiais de negociação. Fora isso, levantamento feito com dados obtidos durante a diligência na demonstram que a CBF repassou à SBTR valores bastante significativos, como se pode observar na tabela abaixo: Confederação10 Ano 1998 1999 2000 Total Valor (R$) 6.624.771,30 8.174.522,59 16.305.000,00 31.104.293,89 Fonte: Contabilidade CBF/Movimentação financeira da CBF O valor referente a 2000 foi obtido por meio da movimentação financeira da CBF, e não via contabilidade. Muitas despesas da entidade, em 2000, não foram identificadas devidamente. Alguns cheques para a SBTR estão contabilizados apenas como adiantamentos, sem que sejam nominados os favorecidos. Nesse ano, há dois cheques de valores redondos, para essa empresa, de R$ 500 mil, datados, ambos, de 29/2/2000. Comparando-se os valores diretamente repassados às Federações a título de auxílio, verifica-se que a CBF vem tendo despesas muito maiores com a SBTR do que com todas as Federações em conjunto. Apenas em 2000, a SBTR recebeu quatro vezes mais do que todas as federações reunidas! Ver tabela a seguir: Ano 27 Federações (R$) SBTR (R$) % Feder./SBTR 1998 3.225.215,00 6.624.771,30 48,68 1999 4.292.772,00 8.174.522,59 52,51 2000 4.181.218,00 16.305.000,00 25,64 Total 11.699.205,00 31.104.293,89 37,61 Fonte: Contabilidade CBF 1998-2000/CPI CBF Nike Entre os dias 5 e 6 de abril de 2001, esta Comissão realizou diligência na CBF, durante a qual foram obtidos dados complementares necessários ao exame contábil e operacional da entidade. 10 O USO DAS PASSAGENS E HOSPEDAGENS DA SBTR A CBF pagou cerca de R$ 400.000,00 em hospedagem para jornalistas durante a Copa de 1998, indicação de que o uso do dinheiro da CBF, despendido com a SBTR, está tendo destinação diversa à que se propõem os Estatutos da Confederação. Outro exemplo: a CBF pagou passagens aéreas, entre Tóquio e Campo Grande, ida e volta, para o sobrinho do senhor Francisco Cezário, presidente da Federação de Futebol do Mato Grosso do Sul, senhor Umberto Pereira, e mais três familiares deste, em dezembro de 1998 (Anexo: SBTR). O Deputado Dr. Rosinha também criticou os gastos excessivos da CBF com a SBTR, quando apresentou requerimento que buscava quebrar os sigilos fiscal e bancário dessa empresa : “O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – (...) Eu entendia que esses requerimentos estariam pautados hoje. Como um que eu fiz ontem, que diz em relação aos gastos que teve a CBF com a SBTR, que é a empresa conhecida como Stella Barros. Se nós estamos investigando a CBF, a Stella Barros tem sido e tem servido, de acordo com a minha compreensão, como um dos mecanismos de dinheiro. da CBF. No ano de 2000, só para ter um exemplo, a CBF gastou com a Stella Barros mais de 9 milhões em reais em passagens. Se nós compararmos com esta Câmara dos Deputados, que tem 513 Deputados, a Câmara gastou 22 milhões de reais em passagens. O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Pode repetir, Dr. Rosinha? O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – A Câmara gastou o ano passado, com 513 Deputados, 22 milhões de reais. E nós viajamos todas as semanas mais do que uma vez, todos nós. Enquanto a CBF gastou com a Stella Barros 9 milhões de reais. E a Seleção Brasileira, quando viaja, não é tudo pago pela CBF, como nós sabemos. Porque, às vezes, ao assinar um contrato, a outra seleção ou o outro país é que paga as despesas. Então, o que acontece? Há uma suspeita minha, pelo menos, que a Stella Barros está servindo como um dos caminhos de desvio de dinheiro da CBF. Se nós não quebrarmos o sigilo da Stella Barros, pra saber o trajeto desse dinheiro... Ele sai da CBF, entra na Stella Barros e vai pra onde? Eu quero crer que ele volta a algumas pessoas da CBF. Há esses indícios, há essa suspeita. Sem a quebra do sigilo da Stella Barros... Eu não vou investigar a Stella Barros, não vou pedir contabilidade dela. Mas eu vou pedir o que está acontecendo com isso. A CBF gasta cerca de 50% do que gasta esta Câmara Federal — é um absurdo — em passagens. Inclusive há passagens compradas na Stella Barros pra quatro pessoas da família Teixeira, em nome da família Teixeira, em viagens que não são a serviço da CBF. Inclusive naquele fato que eu não quis falar, não quis citar, porque envolve uma questão familiar, daquele acidente com o BMW, nos Estados Unidos, um representante da Stella Barros, a informação que eu tenho, estava junto. Então, há essa questão que tem que ser esclarecida. Serve ou não serve a Stella Barros como um dos caminhos de desvio de dinheiro da CBF? É só quebrando esse sigilo, porque eu achei que ele estaria na pauta hoje. Por isso que eu não fiz questão nem de apresentar requerimento extrapauta. Porque, quando eu retirei, retirei da pauta de ontem, sabendo que tinha reunião hoje. Era essa a minha questão de ordem, Sr. Presidente.” (g.n.) CBF LEVA DESEMBARGADORES ÀS COPAS DO MUNDO A CBF tem convidado diversos magistrados para irem às Copas, com todas as despesas pagas, incluindo acompanhante. Pelo menos em 1994 e em 1998 isso ocorreu. O jornal O Estado de São Paulo, de 20/6/98, tomou o depoimento de diversas autoridades, em reportagem intitulada “ Juristas apontam atitude antiética”: “Os desembargadores do Tribunal de Justiça do Rio que aceitaram convite da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) para ir a Paris tiveram um comportamento antiético que compromete a imagem do Poder Judiciário. Essa é a opinião unânime de juristas consultados pelo Estado. Eles acham que o fato pode configurar crime de corrupção passiva - os desembargadores não deveriam fazer uma viagem a passeio paga por terceiros. "Esse comportamento de receber cortesias não pode ser justificado do ponto de vista ético", acentua Dalmo de Abreu Dallari. "É uma atitude claramente antiética", prossegue o professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). Dallari defende a apuração dos fatos pelo Ministério Público. "Há, em tese, a possibilidade de configurar corrupção passiva." A atitude dos desembargadores Marlan de Moraes Marinho, Sylvio Capanema de Souza, Manoel Carpena Amorim, Paulo César Salomão e Luís Zveiter é passível de averiguação do Conselho de Magistratura do próprio Tribunal de Justiça do Rio. "A população espera de um juiz um comportamento ético", lembra Luiz Flávio Borges D'Urso, presidente da Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas. "Juiz não pode aceitar esse tipo de convite e ainda mais de uma entidade tão polêmica como é a CBF", concorda Dyrceu Aguiar Dias Cintra Jr., presidente da Associação Juízes para a Democracia. "Esses desembargadores estão impedidos de cuidar de processos em que a CBF seja parte interessada." Carlos Miguel Aidar, relator da Lei Pelé e presidente em exercício da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) foi incisivo. "É uma vergonha, uma atitude antiética", assinala. "Espero que o presidente do Tribunal de Justiça do Rio os declare impedidos para julgamento de processos em que a CBF tenha interesse." Aidar acha que o Tribunal de Justiça do Rio deveria investigar o assunto. "Pode ficar comprovada a corrupção passiva." "Fiquei chocado", ressalta José Carlos Dias, advogado criminal. "Eles não foram felizes em aceitar esse convite, caíram em tentação." Quanto aos acontecimentos da Copa de 1994, verificou-se que um dos passageiros contemplados foi o desembargador Antônio Carlos Amorim, presidente do Tribunal de Justiça do Rio. Em seu depoimento à CPI, Ricardo Teixeira negou conhecer o desembargador Amorim, como também o fato de a CBF ter doado a ele os R$ 50 mil para a campanha de 1998. Não se recordou que Amorim foi o relator de uma queixa crime que Teixeira moveu contra Márcio Braga, ex-presidente do Flamengo, em 1991, processo número 1991.067.00003, que resultou num pedido de licenciamento feito à Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro, para que fosse instaurado o processo contra Braga. O Desembargador Amorim também desarquivou outro processo de Teixeira contra Braga, o de número 1991.067.00001, outra queixa crime. Perguntado sobre a viagem à Copa, Amorim disse à Folha de São Paulo de 27/7/1994, que viajou pois queria estar próximo às manifestações populares: “Aceitei o convite porque acho que o Judiciário deve se fazer representar nas manifestações populares", afirmou Amorim. Acompanhados das esposas, eles embarcaram na véspera do jogo de abertura (dia 17/06) e voltaram dia 19 de julho. Amorim e Sartori voltaram num vôo normal. "A CBF é ligada aos órgãos oficiais e convidou autoridades. Até o presidente Itamar foi convidado", disse. A CBF é uma entidade de direito privado, não sendo subordinada a órgãos oficiais. Amorim declarou ainda que não acredita que os dirigentes da CBF utilizem o convite "para obter facilidades junto à Justiça". O presidente da CBF tem processos na Justiça. Ele entrou com um processo de difamação contra Pelé, que o acusou de estelionato. Os advogados que defendem os jogadores do time que ganhou o tricampeonato no México, e que movem ação contra a CBF, Sales Nobre e Franco Oliveira, afirmaram à Folha, em 4/8/1994, que a Procuradoria da República deveria investigar a viagem dos membros do Judiciário do Rio, paga pela CBF. Além do presidente do TJRJ, a CBF pagou as despesas de viagem do corregedor de Justiça José Moledo Sartori e do desembargador Paulo Roberto de Azevedo Freitas, que passaram 20 dias assistindo aos jogos do Brasil, acompanhados pelas esposas. De acordo com a Folha, “os advogados enviaram uma petição ao subprocurador-geral da República, Paulo Sollberger, solicitando que fossem tomadas medidas referentes ao caso”. Eles afirmaram, então: “Membros da Justiça não podem viajar com despesas custeadas por uma ré num processo, como é a CBF. Esperamos que a Procuradoria da República tome as medidas cabíveis no caso”. Na época, o procurador da República Paulo Solleberger enviou a Amorim, segundo a Folha de 9/11/94, “ofício pedindo explicação sobre o que considera ‘operação pouco recomendada’ ”. Em 1998, a CBF também levou magistrados à Copa, na França. Participaram os desembargadores Marlan de Moraes Marinho, Sylvio Capanema de Souza, Manoel Carpena Amorim, Paulo César Salomão (ex-corregedor do TRE-RJ, professor de Direito Eleitoral na Faculdade Cândido Mendes) e Luís Zveiter (também presidente do STJD). O Desembargador Salomão ajuizou uma ação contra o jornal Tribuna de Imprensa, por danos morais, que provocou a decretação de falência do jornal (g.n.) Há um processo, de número 95.001.024141-7, por meio do qual Ricardo Teixeira ajuizou ação de indenização por danos morais contra Juca Kfouri. A juíza que relatou esse processo foi Márcia Santos Capanema de Souza, que é filha do Desembargador Sylvio Capanema de Souza. Nesse processo, a juíza condenou Kfouri ao pagamento de 150 salários mínimos. Quinze dias depois, sua sentença foi anulada pelo Tribunal de Justiça, por erro insanável, entre outros motivos porque a juíza não deu ao réu o direito de defesa. A Agência Folha publicou, em 18/7/1998: “No início do mês, a atitude dos desembargadores já foi condenada, por 95% dos votantes, na consulta popular organizada pelo Sindicato dos Advogados do Estado do Rio. Na ocasião, o sindicato espalhou urnas de votação nos prédios do Tribunal de Justiça e no Tribunal Regional do Trabalho do Rio.” De acordo com a Folha, de 18/7/1998, Ricardo Teixeira foi intimado pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro a prestar esclarecimentos sobre o “vôo da muamba”. A procuradora Inês da Matta exigiu que Teixeira divulgasse o nome dos convidados, o critério da CBF para fazer os convites e o valor gasto no vôo. Entrevistados em Paris, o Desembargador Marlan Marinho e o diretor jurídico da CBF, Carlos Eugênio Lopes, defenderam a ida dos magistrados com tudo pago pela CBF, pelo que publicou a Folha de 20/6/1998: “Entre os que aceitaram o convite este ano está Marinho, 60, que foi relator do processo da CBF contra a cervejaria Brahma no Tribunal fluminense. Ele está hospedado com a mulher no hotel Westminster, um quatro estrelas localizado próximo à Ópera de Paris, local nobre da capital francesa. A CBF pagou as passagens aéreas (classe executiva) e a hospedagem do grupo na França, além de fornecer os ingressos para as partidas da seleção brasileira. A diária básica para um casal no Westminster custa US$ 450, sem o café da manhã. Marinho não vê relação entre o convite e o processo que relatou no Tribunal de Justiça do Rio. "É verdade que julguei um processo da CBF contra a Brahma, mas julguei contra. Minha câmara reduziu pela metade a indenização prevista em primeira instância." Ele disse que recebeu o convite por meio de um diretor da CBF e não crê em conflito de interesses. "Antes de vir para cá, estive em dois congressos patrocinados por empresas e não me senti comprado por isso." Segundo Carlos Eugênio Lopes, diretor jurídico da CBF, também hospedado no Westminster, "cabe à CBF a responsabilidade de colaborar para que personalidades de destaque na vida nacional e representantes dos poderes constituídos estejam presentes nos locais de disputa". Ele reafirmou que a prática de convidar personalidades é comum em Copas do Mundo. Por ser uma entidade de direito privado, a "CBF convida quem quiser. Não precisa prestar contas a ninguém, só ao seu conselho fiscal", disse Lopes. Marinho e Lopes lembraram que outras empresas e entidades trouxeram convidados brasileiros à França. O desembargador fez uma comparação com o Carnaval: "Ninguém se importa com quem está no camarote da Brahma, por exemplo". Marinho não se dirá impedido de julgar outras possíveis ações contra a CBF no Tribunal do Rio. "Em 26 anos nunca me declarei impedido. O juiz tem que saber separar as coisas, senão não pode ser juiz.” (g.n.) O desembargador Marlan Marinho, a menos de dois meses da Copa de 1998, decidiu a favor da CBF, no processo desta contra a Brahma. O Jornal da Tarde, de 20/6/1998, publicou entrevista com o presidente do TJRJ, desembargador Thiago Ribas Filho: “No caso do desembargador Thiago Ribas Filho, o convite foi feito no ano passado, por ocasião de sua posse na presidência do Tribunal, mas ele recusou a oferta. O presidente evitou reprovar a atitude dos colegas. “Não tenho o que reprovar sem estudo prévio da matéria ou sem ouvir os desembargadores”, esquivou-se. Mas ao ser perguntado se a presença de algum dos integrantes da lista de mordomias da CBF o surpreendeu, ele deixou transparecer a decepção com o desembargador Marinho. “Ele é um dos antigos, como eu, membro do conselho da magistratura”, lembrou, para em seguida fazer um pedido: “Não me constranja.” (g.n.) Calcula-se que a CBF gastou, na Copa de 1998, pelo menos US$ 75 mil com os cinco desembargadores e acompanhantes, entre passagens em classe executiva, hospedagens e bilhetes para os jogos. E isso ocorreu em um ano em que a CBF iria apresentar déficit de mais de R$ 15 milhões. “NEGÓCIOS DAS ARÁBIAS ” Não é de espantar que o Conselho Federal de Contabilidade tenha criticado a desídia no trato dos recursos da CBF, que definiu como “negócio das arábias”: “A participação na estrutura em análise, com a remuneração percebida, com gratificação de 13º e 14º salários, participação em gratificações diversas (eventos), a título de exemplo: documento 020/0013 de 30/10/98, gratificação paga a Sérgio Pinto da Silva (campeonato mundial de clubes) de R$ 67.258,25 , nos parece absolutamente fora do contexto empresarial do País, resultando no chamado “negócio das arábias”, ou ortodoxamente, uma forma de locupletar-se dos recursos financeiros da entidade”. (g.n.) EMPRÉSTIMOS JUNTO A EMPRESAS DE FACTORING Conselho Federal de Contabilidade -- CFC observou que a CBF realizou empréstimos junto a empresas não pertencentes ao mercado financeiro, conforme afirma no item 3.7 do seu Relatório de Análise 01/2001, sobre a contabilidade da Confederação: “A Entidade, vem recorrendo reiteradamente a empresas privadas, não integrantes do mercado financeiro, para suprir suas necessidades de “Caixa”. Levantamos, a título de exemplo, alguns empréstimos de financiamentos, captados a custos bastante elevados: CREDOR INFORMAÇÕES SOBRE O EMPRÉSTIMO DOC. No DATA VALOR R$ TAXA % M. P. G. Ass. Empr. Part. Ltda 004/0038 M. P. G. Ass. Empr. Part. Ltda 004/0035 CIAR Part. Admin. Ltda 004/0040 04.12.98 04.12.98 11.12.98 600.000,00 1.400.000,00 2.000.000,00 5,00% a.m. 3,93% a.m. 4,5% a.m. Ressalte-se que há inúmeros outros empréstimos contratados com as empresas acima. Pelo que apuramos as empresas credoras não são instituições financeiras autorizadas a funcionar normalmente no mercado financeiro. São empresas trasvestidas de “Empresas de Factoring”, tendo inclusive motivado autuação por parte da Receita Federal. Outro aspecto interessante nas contratações de empréstimos junto a tais empresas é que os encargos são descontados antecipadamente com entrega de cheque pelo valor bruto do empréstimo, fato que eleva ainda mais os encargos financeiros. As taxas médias anuais saltariam de algo em torno de 69,5% a.a., para em torno de 100,00% a.a., tornando-se um excelente negócio para o credor. Tal situação abre inclusive a possibilidade de estar havendo desvio de recursos, solapando o “Caixa” da entidade.” (g.n.) De fato, a Receita Federal identificou que CBF havia criado pagamentos sem causa no valor de R$ 175 mil, em 1998, relativos aos empréstimos firmados com a MPG e com a CIAR. A Receita Federal assim afirmou: “(...) constatei irregularidade com relação ao valor total de R$ 175.000,00 indevidamente deduzido em dezembro de 1998 e representado pela soma dos valores pagos a títulos de despesas financeiras sobre empréstimos efetuados junto às empresas CIAR PARTICIPAÇÕES E EMPREENDIMENTOS LTDA E M.P.G. ASSESSORIA EMPREENDIMENTOS LTDA. Constatei que o principal e mais os valores das supostas despesas foram pagos no mesmo dia ou até antes do ingresso dos recursos na conta bancária da fiscalizada, de acordo com o Anexo (...); portanto, houve retorno dos valores dos citados empréstimos com pagamento sem causa dos valores de R$ 90.000,00, R$ 30.000,00 e R$ 55.000,00 em dezembro de 1998”. (g.n.) INSTITUTO DE ASSISTÊNCIA AO FUTEBOL BRASILEIRO -- IAFB O IAFB – Instituo de Assistência ao Futebol Brasileiro -- vem consumindo muitos recursos da CBF, como se pode verificar pela tabela abaixo: IAFB - REPASSES DA CBF - 1998 A 2000 FEV MAR ABR 72.002,56 JAN 42.762,17 59.397,47 91.771,46 122.019,71 39.199,30 1999 81.023,40 100.798,35 101.267,16 100.416,25 174.792,38 148.563,87 2000 152.664,34 97.477,83 175.492,34 105.215,80 143.707,12 1998 JUL AGO SET OUT 1998 87.596,98 107.175,30 122.646,40 115.774,86 1999 103.539,35 114.772,53 141.467,79 100.036,39 2000 299.464,48 218.652,04 365.970,48 149.538,69 MAI NOV 102.194,89 151.825,29 JUN DEZ TOTAL 82.912,36 1.045.453,46 252.603,01 1.419.280,48 142.967,77 2.002.976,18 TOTAL 98-2000............... 4.467.710,12 FONTE: CONTABILIDADE CBF A CBF criou o IAFB em 1996, em evento realizado no restaurante El Turf, de Ricardo Teixeira. Para o presidente da CBF, o instituto tinha como objetivo “melhorar a vida do jogador e criar opções de emprego aos atletas”, como ele afirmou ao Estado de São Paulo, de 6/2/1996. Teixeira disse, na época, que o órgão pretendia atender 60 mil atletas profissionais do futebol, no Brasil e que teria a função de “associá-los nas áreas social, cultural e jurídica”. Teixeira afirmou que: "Vamos implantar um sonho antigo e tirar a maioria dos jogadores brasileiros do abandono" Pelo que se pode perceber, o projeto do Instituto era bastante ambicioso. Pretendia tirar a maioria dos jogadores brasileiros do abandono. No entanto, o que se vê hoje é que a própria CBF não dá a relevância devida ao projeto, pois nos relatórios recentes da Confederação não se faz menção alguma às realizações do Instituto, e , por certo, muitas medidas projetadas, então, não devam ter sido cumpridas. É o que se vê pelo que o Estado publicou naquela data: “No próximo ano, o IAFB pretende construir cinco hospitais exclusivos para os jogadores e seus dependentes (RJ, SP, PE, GO, PR). O Instituto vai dar a todos os jogadores profissionais um seguro de vida, além de assistência jurídica aos atletas e seus dependentes, gratuitamente. O órgão pretende criar uma série de cursos profissionalizantes. A intenção é desenvolver paralelamente a carreira do jogador a outras atividades. Para isso, os diretores pretendem promover parcerias com o SENAC, SENAI, SEBRAE e SESI.” Não se tem notícia alguma de que esses hospitais tenham sido construídos. Afinal, nem os relatórios anuais da CBF informam a sua construção ou manutenção. Além disso, nunca se ouviu dizer que algum jogador se utilizasse do IAFB para solucionar algum problema judicial, nem tenha participado de algum curso profissionalizante. Em depoimento à CPI do Futebol, do Senado Federal, em 13/11/2000, o ex-jogador Wilson Piazza , comentando as condições do jogador profissional brasileiro, disse que: “A CBF às vezes não dispõe de nenhuma informação. Ou se dispõe, é daqueles clubes que estão disputando campeonato. Detém qualquer meia dúzia de jogadores registrados. E na federação local, desses clubes que estão disputando, uma grande parte dos atletas não tem sequer seus contratos registrados. Já aconteceu de muitos atletas, em vários Estados do Brasil, irem buscar a comprovação do tempo de serviço porque às vezes não ficam nem com a cópia do contrato, que é levado e nem é registrado – e não terem nada. Mas o clube com jogador irregular não pode disputar a competição. Basta a outra equipe denunciar. Mas isso tem se tornado uma coisa comum. Seria bom verificar essa situação, porque isso traz um prejuízo enorme para muitos atletas que às vezes jogam e não podem contar aquele tempo de serviço. Quando, na verdade, vão verificar, os contratos não foram registrados nem na CBF nem tampouco na própria federação local.” Piazza foi um dos dirigentes do IAFB e critica, com veemência, o descaso da entidade com o atleta brasileiro. A CBF criou o Instituto, que não mostrou resultado prático para a classe de jogadores profissionais de futebol, e nem mesmo protege o jogador para que, no futuro, ele possa estar garantido pela Previdência Social. Já os recursos despendidos pelo IAFB vêm aumentando muito. E um dos motivos disso são, sem dúvida, os altos salários pagos pela CBF, direta ou indiretamente, aos funcionários que ficam à disposição do Instituto. Nos relatórios anuais da CBF, nos últimos três anos, não se encontra prestação de contas do Instituto. Nem dos recursos repassados pela CBF ao IAFB. É de se crer que o controle dos gastos do Instituto fique a cargo do Conselho Fiscal da CBF. Os últimos pareceres do Conselho, no entanto, nada comentam a respeito. Quanto aos cursos oferecidos pelo IAFB, em convênio com as prefeituras, verifica-se que o apoio do Instituto se refere à parte organizacional, e não material. Em documento entregue a esta CPI, quanto ao procedimentos das prefeituras, há a informação de que : “Quanto aos cursos de inglês e espanhol, caso a Secretaria de Educação não tenha professores com disponibilidade de horário para aplicá-los, deverá solicitar a colaboração, através de rádio, TV ou jornal, de estudantes universitários, ou de cursos particulares de línguas, que tenham boa noção do idioma a ser ensinado, a fim de que possam dar aulas voluntariamente.” (g.n.) Apesar dos benefícios que o Instituto possa estar trazendo a comunidades carentes, há necessidade de que os recursos da CBF, ou mesmo da FIFA, de quem Ricardo Teixeira afirmou receber repasses exclusivos, sejam auditados por órgãos de controle independentes e imparciais. O IAFB, por outro lado, por meio desses convênios, pode ser visto também como um meio de aumento da base de influência política da CBF. Pelos documentos referentes ao IAFB, entregues pelo senhor João Havelange, quando de seu depoimento, verifica-se que dezenas de parlamentares vêm (ou vinham) se dirigindo ao IAFB ou à CBF com o desejo de ter determinados municípios contemplados com convênios. Em geral, observa-se que o apoio do IAFB restringe-se mais à organização de eventos, notadamente na cidade do Rio de Janeiro, e no fornecimento de materiais esportivos. Esse aspecto fortalece a força política do instituto. Na sítio do instituto na internet (www.iafb.com.br), não se percebe como, de fato, o IAFB auxilia as prefeituras. Na lista de municípios relacionados no sítio, constam os “municípios que recebem atendimento esportivo e cultural e os nomes dos que, por enquanto, só fazem parte do segmento cultural. A porção esportiva vai sendo implantada, de acordo com a disponibilidade do IAFB” (g.n.). Durante o depoimento de Ricardo Teixeira à CPI, em 10/4/2001, o Deputado Jurandil Juarez questionou-o sobre o IAFB e como são feitos os ressarcimentos mensais ao instituto: “O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Sr. Presidente, tenho aqui um recibo de pagamento feito a esse Instituto. E ele trabalha com ressarcimentos. Ele teve uma despesa com pessoal no valor de 45 mil, 908 reais. Cobrou de ressarcimento 21 mil, 694 reais de INSS. Significa 46% do valor da folha de pagamento. Pediu ressarcimento do Imposto de Renda retido da fonte sobre salários, no valor de 11 mil, 048 reais. Isso feito com recibos. São recibos que estão nas minhas mãos aqui, por isso que eu estou lendo os números. Não existe, Sr. Presidente, alíquota de 46% de INSS em nenhum lugar do Brasil. Aqui se cobra demais INSS. É um absurdo o que se cobra. Mas 46% eu lhe asseguro que não existe. Mas, o mais interessante é que não há como se chegar a uma conta de 11 mil reais para Imposto de Renda retido na fonte. Não existe alíquota no Código Tributário Brasileiro que chegue a esses 11 mil reais. E o que é mais interessante é que o Imposto de Renda retido na fonte é pago por quem recebe. Eu, como Deputado, recebo os meus proventos, e a Câmara retém os meus custos referentes a Imposto de Renda. Portanto, não há ressarcimento de Imposto de Renda retido na fonte. Estranhamente, a CBF, que tem dificuldades financeiras, ressarce Imposto de Renda retido na fonte a esse Instituto de Assistência ao Futebol Brasileiro. Eu queria saber se esses procedimentos... eu queria lhe perguntar se o senhor tem conhecimento desses procedimentos e se as coisas funcionam assim: alguém manda um recibo, discrimina contas, e a CBF paga.” (g.n. ) O Deputado Jurandil Juarez reforçou a questão importante da necessidade de controle do IAFB e da CBF. Levando-se em conta o recibo do IAFB, relativo a dezembro de 1998, no valor de R$ 82.912,36 (ver tabela acima), ao qual se refere o Deputado Jurandil, verificam-se os seguintes gastos (Anexo Recibo IAFB dez/98, pasta Contrato CBF/Nike 116)): Item Folha de pagamento Folha pagamento 13.° salário Férias SETEC OPENLINK TELERJ VIDEO CLIPPING PIS IRF-SALÁRIOS INSS CONTRIB. SINDICAL TOTAL Valor (R$) 30.981,02 11.612,21 3.315,57 2.400,00 50,00 1.279,79 200,00 309,81 11.048,00 21.694,30 21,66 82.912,36 % do Total 37,37 14,01 4,00 2,89 0,06 1,54 0,24 0,37 13,32 26,17 0,03 100,00 As despesas com a natureza pessoal chegam a 95,3% do total do mês. Com isso, comprova-se que naquele mês os gastos da CBF com o instituto foram para a folha de pagamentos e encargos. Infere-se, daí, que os gastos com pessoal preponderem sobre os restantes, o que deixa transparecer que o IAFB esteja destinando seus recursos quase totalmente para o pagamento de pessoal, em prejuízo dos fins para os quais foi criado, o que confirma denúncias feitas a esta CPI de que o IAFB é um “cabide de empregos”. Aliás, esta CPI não teve notícia de que o IAFB tenha algum estatuto, se foi registrado em cartório e qual seria a sua natureza jurídica. Além disso, surgem outros problemas relativos à administração do IAFB, cujo presidente também é Ricardo Teixeira: os altos salários pagos a alguns funcionários, a possibilidade de existência de nepotismo e a remuneração de alguns funcionários em duplicidade. Há funcionários, como a gerente Denise Paiva da Cunha, que recebia salários da ordem de R$ 8.850,00, ainda em dezembro de 1998. É provável que o salário da senhora Denise já tenha quase que duplicado, com vem ocorrendo com as pessoas que assumem cargos de topo na administração da CBF ou do IAFB. Há indicação nesse sentido na folha de pagamento de 2000, de posse desta CPI, que indica pagamento líqüido de R$ 15.064,36 para a gerente Denise Cunha. Assim como na CBF, os cargos no IAFB não são ocupados via concurso ou por outro critério de competência. Há parentes de Denise de Paiva Cunha, que lá trabalham, sem que haja empecilho algum. É o caso de Oraide Paiva da Cunha, cargo de professora orientadora, salário base de R$ 2.550,00 em 12/98, recebendo R$ 3.141,09 liqüido em 2000; e de Fátima Paiva da Cunha, assistente administrativa, salário de R$ 1.913,17, também em 12/98, que, por sua vez, recebeu R$ 2.482,87 líqüidos na folha de pagamento de 2000. Dos 17 funcionários do IAFB, três são irmãs, incluindo a gerente geral, Denise. Ainda há denúncias que o IAFB seja usado como cabide de emprego, onde pessoas são empregadas, apenas, por indicação pessoal de Ricardo Teixeira ou por membros da diretoria. Há um funcionário de nome Ricardo Sarney Fernandes Costa, que guarda parentesco com um dos diretores da CBF, o senhor Fernando José Macieira Sarney, diretor de relações governamentais. E isso reforça a hipótese de nepotismo. Dois funcionários, pelo menos, são remunerados pela CBF e pelo IAFB, simultaneamente. Um deles é o tesoureiro da CBF, Ariberto Pereira dos S. Filho, que no instituto assume o cargo de coordenador financeiro, salário de R$ 4.462,97, em dezembro de 1998, e na CBF é tesoureiro com salário base de R$ 3.950,00, em dezembro de 2000. Ressalte-se que o tesoureiro trabalha as 240 horas mensais na CBF e ainda encontra tempo para se dedicar ao IAFB. Somados os dois salários, a sua remuneração mensal, já em 1998, encontrava-se próxima de R$ 10.000,00. Como o cargo de tesoureiro na CBF adquire uma importância maior em função do descontrole administrativo que se observa naquela entidade, torna-se necessário que os órgãos competentes, em especial a Receita Federal, fiscalizem os recursos geridos pelo tesoureiro Ariberto, assim como em relação a toda a diretoria da CBF e a gerência do IAFB. Outro funcionário que trabalha para a CBF e para o IAFB é Nélson Sampaio de A. Júnior. No IAFB, ele é assistente de informática, e ganhava R$ 1.765,50 mensais, em dezembro de 1998; na CBF, ele trabalha como auxiliar de escritório, e recebe R$ 1.177,05, base dezembro de 2000. Outro indício de irregularidade é o fato de a gerente Denise Paiva da Cunha receber cheques diretamente da CBF. Pelo documentos de posse desta Comissão, Denise teria recebido pelo menos R$ 29.024,24, em 1998, e R$ 48.160,86, em 1999. Levando-se em conta que os controles de gastos da CBF ( e por extensão os do IAFB) são muito precários, os depósitos diretos em conta corrente pessoal da gerente são suspeitos de conterem desvios de recursos. A boa conduta contábil não permite esse procedimento. PUBLICIDADE PAGA EM BRASÍLIA A CBF comprou uma página do Jornal de Brasília, para publicar material de publicidade. Realizou pagamento de R$ 300 mil em seis parcelas de R$ 50 mil, a partir de 30/11/2000. A fatura do jornal de número 5384, contrato 65021, com data de captação de 22/11/2000, define as condições do negócio. Foi paga uma página de 757,26 cm, tipo de contrato “compra de página”, valor bruto R$ 300 mil, em seis parcelas. Em 13/12/2000, foi publicada um entrevista exclusiva com Ricardo Teixeira, exatamente no dia em que ele depôs na CPI do Futebol, no Senado Federal. A reportagem daquele dia exibia uma entrevista exclusiva do presidente da CBF. Ao ser questionada sobre essa entrevista, a direção do jornal apresentou a membros da CPI cópia de contrato pelo qual a CBF se encarregava de pagar, adiantadamente, os serviços a serem executados pelo jornal. Afirmou, também, que nenhuma publicidade havia ainda sido feita. Por sinal, o contrato apresentado não trazia assinatura da CBF, apenas dos representantes do jornal, apesar de o primeiro pagamento ter ocorrido em 30/11/2000. Convém destacar que a CBF não realiza pagamentos a jornais ou outros meios de comunicação. Pelos documentos de posse desta CPI, a CBF nunca teria emitido cheques para, por exemplo, O Globo, Jornal do Brasil, Folha de São Paulo, Estado de Minas, Estado de São Paulo, Zero Hora, etc. No período de cinco anos analisados por esta Comissão não houve, portanto, pagamentos a órgãos de imprensa. É provável que a CBF já tenha contratado agências de publicidade, o que é diferente. A CBF faz o primeiro pagamento a um jornal, em 30/11/2000, e menos de quinze dias depois é publicada uma entrevista com Ricardo Teixeira, no dia em que ele iria depor no Senado. Há indícios de que recursos da CBF, mais uma vez, estejam sendo utilizados para outras finalidades que não as estabelecidas em seu estatuto, em vigor desde 1994. Cabe, nesse caso, aprofundar esse exame, como meio de se apurar a regularidade desses pagamentos e do contrato mencionado. CBF PAGA ICMS DO VÔO DA MUAMBA A CBF pagou, por meio do cheque número 32.540, de 21/10/96, a quantia de R$ 46.209,60 pelo ICMS devido pelas pessoas que viajaram por conta da Confederação e desembarcaram no Rio de Janeiro, em julho de 1994, vindas dos Estados Unidos. Foram muitos os autos de infração, da Secretaria de Estado da Fazenda do Rio de Janeiro, incluindo o de número 01.029128-4. A CBF arcou, assim, com o ICMS devido pelos passageiros que estiveram naquele vôo famoso, que ficou conhecido como o vôo da muamba. A CBF arcou com o ICMS de todos os passageiros do vôo. Seguem alguns exemplos, obtidos dos autos de infração da Secretaria da Fazenda do governo do Rio de Janeiro. O jogador Branco, nome real Cláudio Ibraim Vaz Leal, trouxe uma cozinha completa, avaliada segundo os jornais da época em US$ 18 mil, enquanto o limite legal era de US$ 500. Como o avião que trazia a cozinha do Branco veio depois do primeiro vôo, a bagagem dele foi revistada. Dentre outras coisas, Branco trouxe: 1 geladeira GE profile dupla CFX 24W 1 Esteira motorized tread mil, mod DP life strider 1 Televisão cinema wide system marca Pioneer mod SD-P507 1 Aparelho de ginástica Megaflex Home Gym mod IDNOS 157600 1 Forno de parede duplo digital GE 1 Máquina de lavar roupa Maytag 2 Máquinas de lavar pratos GE Apenas o custo desta infração custou à CBF 11.500 UFIRs. Quanto ao funcionário da CBF, Alexandre Silva da Silveira: 2 video cassetes 1 CD player 2 papagaios de brinquedo 2 aparelhos telefônicos E a secretária particular de Teixeira, Gláucia Feijó Fernandes: 2 CDs para carro 1 som portátil 1 máquina fotográfica 1 bateria celular 1 Stik O motorista de Ricardo Teixeira, Odair Araújo Silva: 1 Filmadora Panasonic 1 Walkman 1 Bicicleta Mountain 1 Agenda Casio mod 9600 1 Video Game 1 Game Boy Já Américo Faria teria trazido o seguinte: 1 CD Portable System JVC 1 Som port. AIWA 1 Impressora Canon 1 Notebook Toshiba (Só o notebook custou US$ 3.569) Apesar das despesas arcadas pela CBF, Ricardo Teixeira disse à CPI que os passageiros recolheram seus impostos: “O SR. DEPUTADO SILAS CÂMARA – Nós estamos fazendo essa CPI para esclarecer várias situações, e entre elas uma situação que chama muita a atenção: é sobre o caso de 1994 chamado caso Alfândega, quando foi divulgado em toda a mídia nacional sobre aquela questão da Receita Federal ter levantado questionamento sobre o excesso de compras que os jogadores e a Seleção Brasileira havia feito no exterior. O senhor tem alguma... algum esclarecimento em especial (...)? O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA – Que alguns jogadores trouxeram acima da cota de 500 dólares é verdade, tanto que todos eles recolheram depois os seus impostos, fizeram declaração, recolheram seus impostos. Esse assunto foi exaustivamente analisado pela Receita Federal e já está arquivado, tanto na Receita Federal como numa ação ordinária que ocorria no Rio de Janeiro.” (g.n.) Percebe-se, com isso, que a CBF realiza gastos em desacordo com sua finalidade e que ficam a critério do interesse do presidente ou de algum diretor. Não há controle do que deve ou pode ser despendido. Na comitiva que foi à Copa do Mundo foram motorista e secretária do presidente, desembargadores, empresários amigos de Teixeira, vai quem a diretoria da CBF quer. Quanto custou? Não se sabe. Só se sabe que a CBF pagou a conta. O VÔO DA MUAMBA Ao retornar ao Brasil, após a vitória do tetracampeonato nos Estados Unidos, a comitiva da seleção teve a sua bagagem barrada na alfândega, no aeroporto do Galeão. A fiscalização pretendia revistar todas as malas e caixas regularmente, como se faz com todo cidadão que ingressa no País. O presidente Ricardo Teixeira comandou um esquema de pressão para que a bagagem fosse liberada sem ser vistoriada, argumentando que os jogadores deveriam desfilar, e que poderia até haver risco de vida para todos eles, caso o desfile não ocorresse logo. Depois de muitas ameaças, inclusive dos jogadores, que, orientados por Teixeira, ameaçaram jogar fora as medalhas conseguidas e não desfilar em carro aberto no Rio de Janeiro, chegou uma ordem de Brasília, diretamente do governo federal, permitindo que a bagagem passasse sem ser revistada. Sindicância da Receita Federal confirmou que os jogadores foram incitados por Teixeira para fazer ameaças, fato que teria sido comprovado por mais de dez depoimentos feitos à comissão de sindicância (Jornal do Brasil, 25/8/94 e Folha de São Paulo, 9/8/94). No mesmo dia, o JB publicou que a Procuradoria da República, no Rio de Janeiro, informava que o a bagagem da comitiva saiu do Brasil com 3,4 toneladas e voltou com 14,4. Esses fatos geraram uma série de conseqüências que até hoje são sentidas, por meio de ações judiciais. Para Ricardo Teixeira, principalmente, que foi acusado de contrabandear equipamentos que seriam utilizados em sua choperia, no Jóquei Clube, no Rio de Janeiro. Ainda hoje os processos tramitam na Justiça carioca. O Jornal do Brasil, de 23/7/94, publicou afirmação do ex-Secretário da Receita Federal, Osíris Lopes Filho, considerado por muitos, na época, autor de um ato de decência no episódio: “Os cartolas da CBF usaram os jogadores da Seleção com fins escusos”. Enquanto isso, o mesmo jornal afirma que Ricardo Teixeira estava felicíssimo com a queda do secretário. Osíris se demitiu após saber da decisão superior de que a bagagem poderia ser liberada sem revista. Em seguida, irritado pela cobrança da imprensa em relação à bagagem da seleção, Teixeira disse: “É irrelevante o que os jornais escrevem. O que vale é o povo, que nos recebe com muito carinho” (Folha de São Paulo, 5/8/94) O fato é que algumas informações terminam por ser relevantes. Em editorial de 29/7/94, intitulado de “Investigue-se a CBF”, o Estado de São Paulo repudiou a atitude de Teixeira e da comitiva presente no vôo: “Parece que se supôs que os jogadores seriam mesmo dispensados do pagamento à aduana. É aí que entra o fator CBF. O que não se poderia supor é que o avião viria cheio, carregado da seleção (...). E passou tudo, num festival de liberações que ninguém de bom senso poderia prever, porque o fato é inusitado, mas se enquadra na mentalidade dominante na Confederação Brasileira de Futebol. Cresce o interesse da sociedade no esclarecimento do que ocorreu, sobretudo porque esse bizarro vôo do tetra é uma espécie de coroamento do que vinha acontecendo na notória entidade da Rua da Alfândega (quanta ironia do destino!) e agora há esperança de que os bastidores da Confederação Brasileira de Futebol venham a ser conhecidos, para que, se for o caso, se ponha ordem na casa. O erro de origem de tudo o que está acontecendo vem da circunstância do que foi montado para produzir efeito em 17 de julho de 1991. Naquele dia o sr. Ricardo Teixeira, para driblar o Projeto Zico, pelo qual 110 presidentes de clubes elegeriam no tempo devido o presidente da Confederação (...), reuniu 27 representantes das 27 Federações, o colégio eleitoral que o remeteria a um segundo mandato, e aclamou-se supremo mandatário do futebol brasileiro. O mandato dele terminaria a 16 de janeiro de 1992. O escrutínio foi antecipado e ele ganhou de mão beijada novo mandato. (...) É preciso não esquecer que a CBF está subordinada ao Conselho Nacional de Desportos, órgão do Ministério da Educação e do Desporto. Não é propriamente uma entidade privada, como quis fazer crer o sr. Teixeira, recusando ingenuamente dar a público a lista dos passageiros do vôo do tetra. (...) A conclusão a extrair de tudo é que se as ocorrências da Alfândega não ficarem esclarecidas, promovendo-se a observância da lei, é que esta é a hora de esclarecer a CBF - e bem.” (grifos no original) Já a Folha do dia 5/8/94 informou que Ricardo Teixeira pagou R$ 1.040,00 à Receita Federal, pelo que trouxe dos EUA. O motorista dele, Odair Araújo Silva, pagou mais, R$ 1.633,00. A CBF, na época, encaminhou uma lista à Receita contendo a relação dos bens trazidos pela delegação e seu valor. Pela lista da CBF, os bens pesariam cerca de 1.100 kg. Só que o vôo trouxe quase 15 toneladas. Além disso, a lista incluía 42 dos 95 nomes das pessoas que teriam viajado naquele vôo. Uma das falhas da lista foi a indicação de que Marco Antônio Teixeira, secretário geral da CBF, teria trazido um computador avaliado em US$ 129. “É impossível comprar qualquer computador por esse preço”, finaliza a Folha de São Paulo, de 30/7/94. O jornalista Marcelo Pontes, no Jornal do Brasil de 10/8/97, criticou com veemência as ações de Teixeira no desembarque: “Veja que história exemplar. (...) A Fifa é uma ONU, para Havelange. Tem suas leis próprias, seus estatutos, suas condições. Quem concordar está dentro, quem discordar que se mande (...) Então, se é assim, se a Fifa e por tabela e obrigação a CBF rejeitam ruidosamente a interferência oficial, por que diabos os cartolas correram para os braços do governo quando os tetracampeões mundiais de futebol retornaram dos Estados Unidos em 20 de julho de 1994 com um Jumbo entupido de contrabando? (...) Foi um vexame. Diante da decisão dos fiscais da Receita Federal de conferir a bagagem, os jogadores, Romário à frente, ameaçaram devolver a medalha recebida horas antes do presidente da República, em Brasília. Entre a comenda oficial, a homenagem cívica e a quinquilharia eletrônica ou doméstica, não tinham dúvidas. Eram simplesmente consumidores. O que fez, então, no aeroporto, o presidente da CBF, Ricardo Teixeira, agora um obediente seguidor da doutrina Havelange de não admitir em hipótese alguma interferência do governo no futebol? Incomodou Brasília inteira. Indignado, ligou direto para o Palácio do Planalto. (...) Esta é a historinha: o cartola que hoje, pela obrigação da religiosa fidelidade à ONU do futebol, não admite interferência do governo no seu mundo, arrancou do mesmo governo, na pressão, na ameaça, na chantagem e na marra, uma isenção fiscal para todo o Jumbo dos tetracampeões. Isso que é coerência.” A revista VEJA, de 27/7/1994, publicou um reportagem extensa, capa daquela edição, cujo título era “Muamba Tétrica”. Em editorial, VEJA atacou também a atitude da comitiva: “ (...) O governo federal, traduzindo acertadamente o entusiasmo dos brasileiros, concedeu a medalha do mérito desportivo aos jogadores. O orgulho de ser brasileiro imperava. A festa era uma maravilha até que o avião com os craques aterrissou no Rio. A partir daí, jogadores, cartolas e autoridades protagonizaram um espetáculo lamentável, que maculou a comemoração. (...) Ameaçar devolver as medalhas, ameaçar não desfilar caso a lei fosse cumprida é falta de compostura. É dar um péssimo exemplo. Autoridades e jogadores perderam uma excelente oportunidade de mostrar aos brasileiros que todos são iguais diante da lei, que as regras têm de ser respeitadas” A reportagem destacou a ação dos cartolas da CBF: “Mas houve uma conspiração maluca contra o bom senso. Os cartolas da CBF esbravejaram e os jogadores engrossaram, ameaçando devolver medalhas e não desfilar. A República de Juiz de Fora, atônita, vacilou, submeteu-se à chantagem orquestrada por Ricardo Teixeira. A muamba foi liberada, mas ao custo do desagrado geral (...) Pesquisa de opinião mostra que 70% da população acha que os jogadores devem pagar o que devem à Receita.” Ao longo desse debate, outras discussões e polêmicas foram levantadas. A Receita Federal, que iria vistoriar os equipamentos importados nas residências das pessoas que vieram no vôo, não obteve a lista completa dos passageiros. Apesar disso, iniciou-se a fiscalização nos domicílios dos passageiros que já haviam sido identificados. Segundo informações, um dos mais conhecidos passageiros, o Desembargador Antônio Carlos Amorim11, não apareceu na lista oficial. Até que, por motivos ainda ignorados, essa fiscalização foi interrompida pela Justiça. JUSTIÇA FEDERAL CONFIRMA CONTRABANDO Alguns processos na Justiça Federal revelam uma série de informações importantes. Teixeira teria trazido os tais equipamentos para sua choperia, e que as caixas desse material teriam sido filmadas no aeroporto, pela Infraero, e a fita teria sido, depois, cortada, desaparecendo uma das principais provas do crime. A Receita Federal passou, então, a acompanhar a montagem da choperia de Teixeira e confirmou que uma segunda importação do mesmo tipo de equipamento teria sido feita para tentar justificar a primeira, e, assim, regularizá-la. É que agindo dessa maneira, Teixeira, segundo a versão da Receita Federal, poderia utilizar a mesma guia de importação para o equipamento novo, importado corretamente, e para o que veio ilegalmente na bagagem da seleção, meses antes da segunda remessa, em julho de 1994. A Receita Federal acompanhou, filmou e confirmou que os equipamentos vistos no aeroporto, durante o desembarque, levados para o Jóquei Clube, onde foi instalado o bar El Turf, eram os mesmos utilizados por Teixeira em seu restaurante. Esses equipamentos, mesmo antes da chegada da segunda remessa de equipamentos, já começaram a ser montados, como consta nos processos. O segundo grupo de equipamentos foi importado por uma empresa de nome Uno Industrial Exportadora Ltda., empresa que também já recebeu dinheiro da CBF (R$ 15.000,00 em 14/10/96 e R$ 15.631,74, em 3/12/96). No processo movido pela União contra o El Turf, de Ricardo Teixeira e seu irmão Guilherme, a União venceu em primeira instância na Justiça Federal, sentença proferida pelo juiz Dr. Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Juiz Federal da 6ª Vara. Esse juiz determinou a aplicação da pena de perdimento do equipamento importado ilegalmente, além de seu lacre. Com isso, o El Turf perdeu o equipamento trazido no vôo da muamba. O Estado de São Paulo publicou a seguinte notícia, em 16/9/99: “Na sexta-feira, o juiz da 6ª Vara Federal do Rio, Guilherme da Gama, cassou liminar que impedia a Receita Federal de O Desembargador aposentado Antônio Carlos Amorim recebeu, inclusive, ajuda para a sua campanha eleitoral para Deputado Federal, em 1998, no valor de R$ 50 mil. 11 apreender o equipamento instalado na boate. A Receita alega que o material das chopeiras chegou ao País de forma ilegal, no vôo que trouxe a seleção brasileira logo após a Copa do Mundo de 1994, nos Estados Unidos. Anteontem, as torneiras foram lacradas por um inspetor da Receita.” Advogados do El Turf ajuizaram mandado de segurança (Processo 1999.02.01.036599-3) contra a decisão de lacrar os equipamentos do estabelecimento. A mesma reportagem do Estado, acima, informou que o Desembargador Paulo Espírito Santo mandou que o equipamento fosse liberado: “O desembargador Paulo Espírito Santo, do Tribunal Regional Federal (TRF), acatou mandado de segurança impetrado pelos advogados da Boate El Turf, da qual o presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), Ricardo Teixeira, é um dos proprietários, e determinou que as 22 chopeiras da casa, localizada na Gávea, zona sul do Rio, fossem deslacradas.” O advogado do El Turf na ocasião foi o também vice-presidente da CBF, como informou o Estado: “O advogado Carlos Eugênio Lopes, vice-presidente jurídico da CBF e encarregado por Teixeira de defender a El Turf, disse que o juiz errou ao determinar a execução da sentença antes de sua publicação no Diário Oficial.” (g.n.) O El Turf apelou contra a decisão do juízo de primeira instância. Segundo informações, o mesmo desembargador Paulo Espírito Santo avocou a apelação ajuizada pelos advogados dos irmãos Teixeira, e que isso poderia não ser regular. O fato é que os dois recursos do El Turf foram autuados pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região em 9/2/2000, e têm os números 2000.02.01.012314-0 e 2000.02.01.012315-1. Os dois processos têm como relator o Desembargador Paulo Espírito Santo, que, até a data de hoje, não se pronunciou sobre a questão. Ricardo Teixeira, ao depor perante a esta CPI, não disse a verdade, por duas vezes, sobre o processo que o envolve e a seu restaurante El Turf. O Deputado Dr. Rosinha interrogou Teixeira sobre o assunto: “O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - (...) Foi feita uma pergunta pelo Deputado Silas Câmara sobre as importações de equipamentos. E o senhor não teve nenhum problema? O senhor falou dos jogadores, o senhor não teve nenhum problema com a importação daqueles equipamentos na época do vôo, daquele vôo dos atletas? O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA – Excelência, tive. Eu tive, inclusive, uma ação fiscal sobre isso, foi noticiado na época, inclusive lacraram o equipamento. Mas logo em seguida, o mesmo juiz que determinou o lacre daquele equipamento reconheceu a legalidade da importação e imediatamente autorizou que se acabasse o lacre. De forma que essa ação já terminou não só na parte criminal, como na parte também de Receita Federal. (g.n.) Teixeira afirmou que a ação “terminou”, o que não é verdade. Ao contrário, o juiz federal Dr. Guilherme da Gama decidiu pelo perdimento do material, em desfavor de Teixeira e do El Turf. E o El Turf recorreu, estando o processo nas mãos do desembargador Dr. Paulo Espírito Santo. Este sim, e não o juiz federal como disse Teixeira, é que liberou o equipamento para uso temporário, até que a decisão final seja proferida. Mesmo que o desembargador Espírito Santo venha a decidir a favor do El Turf, a União pode, ainda, recorrer. Com isso, não poderia Teixeira ter afirmado que a ação terminou, mesmo que ele conheça, previamente, a decisão do desembargador. “O SR. DEPUTADO SILAS CÂMARA – Então, não existe um processo que corre até hoje, nem contra o senhor nem contra nenhum membro da Seleção, na Receita Federal, sobre o assunto do excesso de compras feitas no exterior? O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA – Não, isso foi tudo liquidado.” SUSPEITAS DE SONEGAÇÃO DE IMPOSTOS NA SEGUNDA IMPORTAÇÃO De acordo com os autos dos processos que tramitam na Justiça Federal, os sócios do El Turf teriam apoiado a sonegação de impostos que seria feita na segunda importação de equipamentos para a choperia. Isso ficou claro diante de carta inserta nos autos, por meio da qual a importadora Uno questiona a Guilherme Teixeira se os equipamentos deveriam ser importados ou não com características falsas para fugir do pagamento de impostos, o II (imposto de importação) e o IPI (imposto sobre produtos industrializados). A carta diz o seguinte: “Para Guilherme Teixeira Data: 14/10/94 Ref.: Sistema para Chopp Conforme combinado, encaminhamos, em anexo, Planilhas Estimativas para a importação do “Sistema para servir chopp”. Favor notar que consideramos dois preços distintos com referência a Guia de Importação. Para que possamos ficar isentos de II e IPI, precisaríamos classificar o sistema como segue: ‘Filtro prensa automático para mosto de cerveja, com sistema de pré-compressão e compressão para retirada do mosto sem absorção de oxigênio, com controlador programável’ Gostaria de ouvir sua opinião técnica a respeito dessa classificação. Um abraço, Oscar Cruz Uno Importação e Importação Ltda. Av. Ataulfo de Paiva, 135/1212, Rio de Janeiro” (g.n.) Anexadas à carta seguiram duas planilhas, cada uma com valores específicos para as duas situações (Ver Anexo Carta da Uno e seus anexos). Os equipamentos foram, de fato, importados com a denominação que permitia a sonegação de impostos federais, ou seja, em vez de equipamentos para servir chopp, foram importados como sendo filtro prensa automático para mosto de cerveja ... etc. Essa falsificação, entre outras, fez com que a Receita e a Justiça Federal considerassem irregular toda a transação envolvendo a importação ou descaminho dos equipamentos do El Turf. Para conferir, basta consultar o processo, que é público, tramitando no TRF da 2ª Região. TEIXEIRA RECLAMA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS Ricardo Teixeira ajuizou, à época, uma ação visando obter indenização de alegados danos morais sofridos, em decorrência da autuação de agentes públicos que reputava desmotivada e abusiva. Em contestação à ação de Teixeira, processo número 95.0022026-1 da 6ª Vara da Justiça Federal do Rio de Janeiro, o Procurador da Fazenda Nacional, representante judicial da União, Dr. Manoel Rolim Campbell Penna, afirmou que o pedido de Ricardo Teixeira continha “incorreções, inverdades e dolosas omissões” (grifos do original) (Ver Anexo Processo El Turf/Muamba). O Dr. Manoel Penna chegou, dentre outras, às seguintes conclusões: “ - o maquinário apreendido não é oriundo, exclusivamente, da Nova Zelândia, tendo sido encontrados e apreendidos materiais produzidos nos Estados Unidos da América, procedentes de Los Angeles, e na Inglaterra; - o que o autor denomina de intransigência dos fiscais por ocasião do desembarque da comitiva da seleção brasileira representou, na verdade, uma tentativa das referidas autoridades em dar o cumprimento fiel à legislação aduaneira, no que foram obstadas pela atitude do autor, que exaltava os ânimos dos presentes, como ele próprio confessa, visando a liberação da bagagem da comitiva ‘sem a cansativa revista’; afirmação esta que a par de salientar a prepotência que norteia as atitudes do autor, serve ainda como confissão dos crimes de resistência e desobediência à ordem legal emanada de funcionários públicos no legítimo exercício de suas funções (Código Penal, arts. 329 e 330); - o Inspetor da Receita Federal e o Procurador da República acoimados de perseguidores do autor atuaram nos estritos limites de suas obrigações funcionais, promovendo a apuração de denúncias de fraude ao Erário de que tiveram conhecimento; - existiam e persistem severos indícios de intrusão ilegal de maquinário estrangeiro em território pátrio por atos do autor e seus sócios, justificadores das atitudes adotadas pelo Sr. Inspetor da Alfândega e Dr. Procurador da República no exercício de suas atribuições funcionais...” O Dr. Manoel Penna terminou sua contestação com as seguintes palavras: “Em qualquer hipótese, ressalta-se a ostensiva má-fé do autor, que altera a verdade dos fatos e falseia documentos com o intuito de induzir a erro esse MM. Juízo e, com isso, obter ilegal locupletamento sobre a própria torpeza, lide temerária esta que reclama a devida repreensão de V. Exa., para que não se desmoralize a Justiça (CPC art. 17)” (g.n.) Esse processo se encontra no Tribunal Regional Federal da 2ª Região, do Rio de Janeiro, com o número 98.02.28351-7. Já nessa instância, o Procurador Regional da República, Dr. Luiz Mendes Simões, membro do MP junto ao TRF da 2ª Região, condenou Ricardo Teixeira, em seu parecer, julgando improcedente o pedido de indenização do presidente da CBF: “De início, cumpre lembrar que até hoje [4/2/1999] permanecem obscuros diversos fatos que envolveram o desembarque da seleção brasileira de futebol em julho de 1994. Se os jogadores e os integrantes da comissão técnica da seleção nada tinham a esconder, por que então não permitiram a conferência da bagagem que traziam? Se nada tinham a ocultar, por que os auto-proclamados “ídolos” nacionais criaram toda aquela celeuma que envolveu o desembarque da seleção?” (g.n.) E concluiu: “Na verdade, e ao contrário do que se postula na inicial, a inação dos servidores, ao tomarem conhecimento dos fatos que envolvem a demanda, é que poderia configurar, em tese, crime de prevaricação. O comportamento desses servidores merece, muito ao contrário do que afirma o Autor, todos os elogios e aplausos da sociedade.” (g.n.) Esse processo tem como relator o Desembargador Federal Poul Erik Dyrlund, da 6ª Turma do TRF da 2ª Região, de quem se aguarda a decisão. INCÊNDIO NA GRANJA COMARY Em 1999, houve um incêndio nas instalações da Granja Comary, local utilizado para os treinos da seleção, que fica em Teresópolis, RJ. Pela ocorrência registrada pelo 16° Grupamento de Bombeiro Militar, naquela localidade, no dia 27 de junho de 1999, por volta das 6 h 50 min teria ocorrido um princípio de incêndio na rua Hercílio Ferreira dos Santos, sem número, bairro Granja Comary. A ocorrência foi registrada apenas no dia 7 de julho do 1999 (Anexo Certidão Incêndio Granja Comary). Foram perdidos documentos importantíssimos referentes à contabilidade da CBF, de 1985 até 1994. Nessa documentação, incluía-se todo material referente aos problemas ocorridos com a seleção na volta da Copa de 94. Essa questão, o retorno da comitiva em julho de 1994, ainda não está completamente resolvida, com várias ações na Justiça. O incêndio não mereceu investigação alguma da CBF. Afinal, quem examina os atos da entidade? O que conteria aquele conjunto de documentos? Recibos, espelhos de cheques, informações úteis, não só para outras investigações, até para a história da CBF e do futebol brasileiro. Não se sabe, também, se alguém teria algum interesse em destruir aqueles documentos. Há necessidade, portanto, do Ministério Público promover investigações que poderão revelar se o incêndio foi, ou não, proposital. CAPÍTULO VII – EMPRÉSTIMOS NO EXTERIOR A JUROS EXTORSIVOS Entre 1998 e 2000, a CBF tomou seis empréstimos junto ao Delta National Bank and Trust Co. of N.Y. (650 Fifth Avenue, Nova.Yorque). Trata-se de uma série de seis empréstimos feitos pela CBF junto ao Delta Bank, entre outubro de 1998 e setembro de 2000, com juros muito acima dos juros correntes no mercado internacional, na época. Foram empréstimos que somaram de 39 milhões de dólares, sendo que a entidade pagou mais de 6 milhões de dólares só de juros. A seguir, tabela com os seis empréstimos: EMPRÉSTIMOS TOMADOS PELA CBF JUNTO AO DELTA NATIONAL BANK Emprés timo 1 Valor (US$) 7.000.000,00 2 4.500.000,00 3 10.000.000,00 4 3.708.281,83 5 10.000.000,00 6 4.500.000,00 TOTAL 39.708.281,83 Juros nominai s aa Valor dos Juros Início Juros Venciment Liquidação Reais ao o ano 43,576% 652.429,56 27/10/98 12/01/99 06/01/99 52,12% 25,0% 843.750,00 29/12/98 14/09/99 02/09/99 34,30% 25,0% 2.326.388,89 05/02/99 05/01/00 07/01/00 32,48% 21,0% 748.454,88 21/09/99 14/09/00 06/09/00 20,70% 16,0% 1.435.555,56 24/02/00 12/01/01 12/01/01 18,68% 14,5% 07/09/00 10/01/01 04/01/01 15,23% --- 215.702,48 6.222.281,37 --- --- --- --- Fonte: Delta Bank, CBF e CPI CBF/Nike Examinando o primeiro desses empréstimos, um analista do Banco Central, do escritório de Belo Horizonte, comentou, nos autos de um processo, ainda em andamento no BC (Ver Anexo Processos dos Empréstimos - Banco Central, documentos de referência: Sigilo Bancário CBF Anexo 03 Pasta 05, página 41 a 59 e 124 a 194) que: “ fato que merece ser destacado é que enquanto as taxas de juros praticadas no mercado internacional encontravam-se no patamar de 5,22% ªª (LIBOR trimestral) e 8% ªª (PRIME trimestral), a taxa pactuada para o mútuo sob comento foi de 43,576 ªª; (...) assim sendo, podemos afirmar que, caso a captação realizada pela CBF tivesse curso no mercado de câmibo de taxas livres (foi no flutuante), a contratação do mútuo ora sob análise, muito provavelmente não seria autorizada por este Banco Central” . E conclui: (...) “ são fortes os os indícios de evasão de divisas, uma vez que os juros pagos exorbitam daqueles cobrados no mercado internacional (...) o que poderá ser conclusivamente apurado pelo Ministério Público”. (g.n.) O Departamento Jurídico do BC de Belo Horizonte, entretanto, não encontrou indicações de evasão de divisas, mas “tão-somente indícios de um mau negócio, que só poderá ser fiscalizado pelos membros da CBF, associação civil de direito privado”. E opinou pela não comunicação ao Ministério Público. Mas o caso não se encerrou aí. Requisitado pela superintendência do Banco Central, esse processo está sendo reexaminado em Brasília, conforme nos informou, oralmente, a sua Diretora de Fiscalização, dra. Theresa Grossi. Em todos os seis empréstimos o presidente da CBF, Ricardo Teixeira, assina como avalista da entidade. Causa estranheza que o Banco tenho aceitado esse aval, dada a enorme discrepância entre os valores negociados e a renda declarada de Ricardo Teixeira. Entre os documentos sobre o primeiro empréstimo há cópia de uma carta do Delta Bank endereçada à CBF, datada de 18/9/98, na qual o banco relaciona as condições do empréstimo de US$ 7.000,000.00, descrevendo que a garantia seria o “aval pessoal do Sr. Ricardo Teixeira (pede para fornecer a relação de bens do Sr. Teixeira) e alienação de recebíveis do contrato da Nike”. É inusitado que um banco dos EUA, cuja política de concessão de crédito é conhecida como muito rigorosa pelo mercado, tenha concedido um empréstimo num montante vultoso de sete milhões de dólares apenas tendo como garantia o aval do Sr. Ricardo Teixeira, cujos bens estão avaliados em cerca de R$4.8 milhões de reais. A garantia que os bancos exigem costuma estar por volta de 130 por cento do valor tomado. Além disso, sabe-se que a NIKE recusou dar a garantia para o empréstimo, conforme depoimento dos representantes da NIKE a esta CPI: “O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – Saber o seguinte... Há possibilidade de a empresa entrar como garantidora de algum contrato de empréstimo feito pela CBF ou pela Traffic, qualquer uma que conste do contrato, mediante os pagamentos que tem a fazer? O SR. AMADEU AGUIAR JÚNIOR - Não. Isso não é uma previsão do contrato. Nossa única obrigatoriedade é fazer os pagamentos conforme a programação definida.” A estranheza se transforma em espanto quando o aval de Ricardo Teixeira continua a ser suficiente para garantir os cinco empréstimos seguintes, que elevaram os compromissos da CBF a 39 milhões de dólares. Esses empréstimos foram objeto de exame da própria mídia, conforme publicou a Folha de São Paulo, do dia 20/4/2001. Nessa reortagem, consta que analistas especializados foram unânimes em afirmar que os empréstimos foram feitos de maneira irregular (Ver Anexo Folha de São Paulo, dia 20/4/2001): “Juros da CBF foram recorde Documentos em poder da CPI da CBF/Nike mostram que, dos 50 empréstimos feitos pelo Delta Bank no período, seis maiores taxas foram tomadas por Ricardo Teixeira A CBF foi a instituição brasileira que pagou os maiores juros entre todos os empréstimos realizados pelo Delta Bank (EUA) de 1997 a 2000, segundo documentos que estão em poder da CPI da CBF/ Nike, na Câmara dos Deputados. De acordo com a lista, que contém o nome das 50 empresas do Brasil que realizaram operação de empréstimo com o banco nos últimos quatro anos, a entidade foi responsável pelo pagamento dos seis maiores juros ao Delta. O que chama a atenção e reforça as dúvidas de parte da comissão sobre a legalidade das operações da CBF é que muitos dos negócios das outras empresas foram feitos no mesmo período que os da entidade. A CPI quer usar a lista para derrubar o principal argumento de Ricardo Teixeira, presidente da CBF, para justificar as operações. Ele alega que as taxas de juros se elevaram por conta da crise financeira da Rússia, em 1998. A maior taxa anual entre os negócios _avalizados por Teixeira_ feitos pela entidade foi fixada em 43%, para um empréstimo de US$ 7 milhões tomado em outubro de 1998. O prazo do negócio era de 77 dias. Segundo a CPI, como a CBF pagou os juros adiantados e liquidou o empréstimo alguns dias antes da data final, os juros chegaram a 52,1% ao ano. À época, com o auge da crise na Rússia, o Fed Funds _taxa de juros básica determinada pelo Federal Reserve, o Banco Central dos EUA_ era de 5% ao ano. A título de comparação, com base na lista em poder da CPI, uma determinada empresa realizou empréstimo no mesmo banco seis dias antes (20 de outubro), com juros de 10% ao ano. Outras três instituições realizaram a mesma operação no dia 26 com juros que variaram de 8% a 10%. Da lista, a taxa mais alta paga por uma empresa após as da CBF é de 12%. Mesmo se não conseguirem comprovar irregularidades (evasão de divisas), deputados da CPI já estão convencidos de que os empréstimos revelam má administração de Teixeira na entidade. (...) Especialistas em mercado consultados pela Folha afirmaram que os juros são altos demais até para o período de crise.” (g.n.) As taxas praticadas pelo Delta Bank com a CBF foram as únicas que excederam as taxas normais de mercado. Até mesmo o Restaurante El Turf, de propriedade de Ricardo Teixeira, obteve, em abril de 1999, um empréstimo de R$ 843.262,00 junto ao mesmo Delta Bank, a taxas de 12,0% ao ano (Ver Anexo Banco Rural International Conta CC5 - Anexo 33, pastas 1 a 37). A seguir, será realizada análise dos empréstimos, individualmente. 1. PRIMEIRO EMPRÉSTIMO : ANTECIPADAMENTE US$ 7 MILHÕES , JUROS PAGOS a) Juros extorsivos Em 20 de outubro de 1998, a CBF contratou um empréstimo de 7 milhões de dólares com o DELTA NATIONAL BANK, de Nova Iorque, com juros de 43,57% ao ano, sendo esses juros em dólares! Nada explica esses juros tão elevados. A CPI tem em mãos dezenas de empréstimos feitos por empresas e mesmo pessoas físicas brasileiras junto ao Delta Bank, no mesmo período. Todos foram tomados com juros de, apenas, 9% a 10% ao ano. b) Juros pagos antecipadamente Como qualquer tomador, a CBF tinha o prazo de 77 dias para pagar os juros do empréstimo. Mas os juros, – os 652.339,72 dólares – foram pagos adiantadamente. Foram pagos no mesmo dia 29/10/98. Quer dizer, o dinheiro dos juros veio para a conta da CBF e voltou no mesmo dia para o Delta Bank. Na prática, isso significa que a CBF não pagou juros de apenas 43.57%, mas juros reais de 52% ao ano! c) O pagamento do principal foi feito antes do prazo. Parece que a CBF não se importa em desperdiçar dinheiro. A data do vencimento do empréstimo de US$7 milhões era 12/01/99. No entanto, a CBF pagou no dia 06/01/99. Por que pagou seis dias antes do prazo? Considerando que a CBF estava pagando US$8.471,00 por dia de juros, deu de graça cerca de US$50 mil ao Banco credor. No mesmo dia 6 a CBF havia recebido o pagamento de US$15 milhões da Nike. Se ficasse com os US$7 milhões a juros por esses seis dias, como faria qualquer pessoa ou empresa, a CBF teria ganho uma importância considerável. Por que não o fez? Ou, então, porque a CBF não solicitou ao Delta Bank um desconto pelo apagamento adiantado? d) Caminho tortuoso com passagem nas Bahamas. Neste gráfico anexo temos o rastreamento do caminho seguido pelos US$7 milhões desde o Delta Bank, em Nova Iorque, até a conta corrente da CBF na agência do Banco Rural, em Belo Horizonte. Por que um caminho tão complicado? O dinheiro sai do Delta, vai para o BANESTADO, agência de Nova Iorque. Daí, vai para a agência do RURAL INTERNATIONAL BANK, em Nassau, Bahamas, paraíso fiscal. De lá, vai para a conta corrente da CBF no Banco Rural, em Belo Horizonte. (gráfico a seguir) DELTA INTER. BANK 1 6B 4B BANESTADO RURAL INTERN. BANK CC: 1.111-3 NASSAU - BAHAMAS AMERICAN EXPR. BANK 1A CC: 124 081 4A 6A NOVA YORK 5 3 2 CC: 133107 BCO RURAL NIKE 6 BCO RURAL CC: 4344-2 HOLANDA BELO HORIZONTE 4 CBF RIO DE JANEIRO INFORMAÇÕES 1. Transferência de US$ 7.000.000 do Delta para CC do Rural International, no Banestado 1A. Transferência de US$ 6.836.000 do Rural Int. para o Banco Rural, BH, menos US$ 163.000 do previsto (28.10.98) CONTA CORRENTE 2. Depósito dos US$ 6.836.000, deduzido dos tributos pagos pelo banco (líqüido: R$ 7.846.000,00), na CC da CBF (29.10.98). CHEGADA DE VALORES SAÍDA DE VALORES EMPRÉSTIMO DA CBF JUNTO AO DELTA NATIONAL BANK, DE US$ 7.000.000. (em 29.10.98, taxa: 43,6% a.a.) 3. Depósito do equivalente aos juros (R$ 779.000,88) na CC geral do Banco Rural, Rio, pelo Rural International. Não se sabe o motivo. (29.10.98) 4. Pagamento dos juros pela CBF, R$ 779.000,88, na CC do Rural International (29.10.98). 4A. Transferência interna (Rural International) dos juros pagos pela CBF para o Banestado (suposição). 4B.Transferência do Rural International para o Delta dos juros enviados pela CBF, via Banestado (não se sabe se ocorreu). 5. Depósito de US$ 15.000.000 da NIKE na conta do Banco Rural, dentro do American Express Bank, NY (6.1.99). 6. Pagamento do empréstimo (R$ 8.623.713,00) pela CBF, ao Rural International. Valor eqüivale a US$ 7.123.000, maior em cerca de US$ 123.000 do contratado (6.1.99). 6A. Transferência interna do Rural International (suposição) 6B. Transferência de US$ 7.000.000 da CC do Rural International de sua CC no Banestado, NY, para o Delta (6.1.99). Perguntado pelo Deputado Sílvio Torres a respeito do trajeto da remessa do dinheiro desse empréstimo e do seu pagamento, Ricardo Teixeira não soube responder: “O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES - Queria também agregar mais uma informação sobre os empréstimos, mais especialmente sobre o primeiro empréstimo, de valor maior, para dizer que o empréstimo de 7 milhões do Delta Bank, que foi o primeiro, ele percorreu três bancos diferentes antes de chegar ao Banco Rural, que era o banco que queria fazer o depósito. Ele passou pelo Delta, pelo BANESTADO e pelo Rural International Bank. O Dr. Ricardo Teixeira tem alguma informação sobre esse caminho, para nos esclarecer por que esse caminho tão tortuoso? O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Eu tenho que verificar por quê, mas isso daí não é uma decisão que a CBF toma. Quer dizer, quem toma é o próprio banco, a forma de o dinheiro sair daqui. O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES - O senhor conhecia esse percurso? O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Com toda a honestidade, eu estou tomando conhecimento, mas deve... Se aconteceu isso, deve estar na contabilidade.” (g.n.) Por que, afinal, esse dinheiro teria passado por três Bancos diferentes antes de chegar ao Banco Rural? Delta, Banestado e Rural International Bank? e) Recebeu a menos e pagou a mais Na transferência dos US$ 7 milhões do Rural International Bank, de Nassau, para a agência do Banco Rural de Belo Horizonte há uma diferença de valores Saíram, da agência de Nassau, US$ 7 milhões, e deram entrada na agência de Belo Horizonte apenas US$ 6.836.000,00. Tudo com a mesma taxa de câmbio e já descontados IR, IOF e CPMF... Há uma diferença para menos de US$ 163 mil. Já no pagamento do empréstimo, em 06/01/99, deu-se um movimento contrário, mais uma vez em prejuízo da CBF. Nessa data, a CBF creditou ao Rural International Bank, Nassau, R$ 8.606,500,00 (atenção! reais). Convertidos pela taxa cambial do dia, que foi R$ 1,2082 por dólar, no flutuante, equivaleram a US$ 7.123.064,00 (dólares). Mas a dívida da CBF era de US$ 7.000.000,00 apenas! Por que a CBF pagou US$ 123.000,00 a mais? O Banco Rural alega que essas diferenças, na entrada e na saída dos valores se deve à sua comissão, que é obtida em cima da oscilação do câmbio, no dia. Na entrada foi uma comissão de 2,33%. Uma comissão considerada alta no mercado, ainda mais sendo aplicada a uma importância grande. Se somarmos tudo o que a CBF perdeu em razão de uma taxa de juros escandalosa, o pagamento antecipado de juros e do principal, a desvalorização cambial, as elevadas comissões ao Banco intermediário (Banco Rural), chegamos a um número de cerca de US$ 1.080.000. 2. SEGUNDO EMPRÉSTIMO : US$ 4,5 MILHÕES , ARAUCÁRIA, JUROS PAGOS ANTECIPADAMENTE POR MEIO DO BANCO Em 14 de dezembro de 1998, 22 dias antes de receber os US$15 milhões da Nike, a CBF fechou o segundo empréstimo com o Delta Bank, de Nova Iorque. A transferência, no valor de US$ 4,5 milhões, foi efetivada em 30/12/98. Os juros foram de 25% ao ano, duas vezes e meia a mais do que os juros praticados no período pelo mercado. (Boletim do Banco Central do Brasil indicou taxas entre 8% a 13% a.a. na época. O Banco Central do Uruguai admitiu, para a mesma data, taxas médias de 10,4% a.a.) Nesse empréstimo, o valor dos juros pagos ficou em Vencimento em 14/09/99, prazo de 9 meses. 4.500.000,0 X 25% em 9 meses = US$ 843.750,00 (valor dos juros). JUROS PAGOS ANTECIPADAMENTE Os juros foram pagos antecipadamente, como no empréstimo anterior, o que os torna, em juros reais de mais de 30% ao ano, pagos pela CBF. Com um agravante: o valor referente aos juros nem chegou a ser internado no Brasil, caracterizando sonegação de impostos sobre esse valor (US$ 843.750,00). Rastreando os movimentos dessa transferência através das telas do Banco Central, observamos que: a) O DELTA BANK de Nova Iorque transferiu US$ 4.500.000,00 para a agência do TRADE AND COMMERCE BANK nas Ilhas Cayman (paraíso fiscal); b) Em 30/12/98 O TRADE AND COMMERCE BANK transferiu US$ 3.614.442,00 para sua conta corrente no Banco Araucária, em Curitiba, retirando US$ 885.000,00, relativos aos juros. Como os juros eram de US$ 843.750,00, estamos supondo que a direrença a mais – US$ 41.500,00 refiram-se à comissão do Banco. Quanto ao Banco Araucária, ao aceitar esse procedimento, isto é, receber menos do que havia sido emprestado, omitiu-se perante a lei brasileira, tornando-se cúmplice do ilícito de sonegação do Imposto de Renda relativo aos juros e que deveriam ser pagos no Brasil. c) O Banco Araucária converteu US$ 3.614.442,00 em reais que, depois de descontados os outros impostos e taxas -- IOF R$ 87.216,49 e CPMF R$ 8.704,21 - resultaram em R$ 4.264,904,00, que foram depositados na conta corrente da CBF no Banco Real, agência do Rio de Janeiro (taxa cambial do dia: R$ 1,206500). a) Em 2 de setembro de 1999 a CBF depositou R$8.969,850,00 na conta corrente do DELTA BANK no Banco Sudameris, agência de Araraquara. De onde esse dinheiro, convertido em dólares, foi enviado para o DELTA BANK em Nova Iorque, em pagamento do empréstimo, doze dias antes do prazo estipulado, em prejuízo da CBF e em inexplicável vantagem para o DELTA BANK. b) Aspecto ainda mais relevante: naquela data, o valor de R$ 8.969,805,00 era equivalente a US$ 4.660.000,00, valor superior em US$ 160.000,00 (dólares) ao do empréstimo feito pelo DELTA BANK, que era de US$ 4.500.000,00. Para onde foram esses US$ 160 mil dólares? c) O Imposto de Renda sobre os juros foi pago com multa. Pressionada pela Receita Federal, a CBF pagou o imposto de renda sobre os juros 5 de novembro de 1999, quase um ano depois. Valor do IR pago: R$ 168.768,97. Valor da multa: R$ 33.753,79. Valor de encargos: R$ 35.677,76. Total: R$ 238.200,52. Mais um prejuízo de R$71 mil para a CBF. Nota: nesse caso, a CBF pagou o IR sobre os juros, após a desvalorização cambial, sem fazer a atualização dos juros, em reais, pela variação cambial. Esse pagamento deve ser examinado pela Receita Federal, para se aferir a sua regularidade. a) A imprevidência resultou em mais prejuízos. Esse empréstimo foi feito quinze dias antes da desvalorização do Real. Essa falha administrativa é indesculpável. O próprio presidente da CBF, Ricardo Teixeira, estava atento, sabia que a desvalorização ia acontecer. Tanto que, quando perguntado, nesta CPI, sobre os seus elevados ganhos no mercado de capitais, como pessoa física, em 1998, ele respondeu que todo mundo sabia que na hora em que Gustavo Franco caísse do Banco Central, o real iria se desvalorizar. E que ele fez como qualquer investidor , comprou dólar, e teve grandes lucros. Só que a CBF não se beneficiou dos refinados conhecimentos que Ricardo Teixeira tem do mercado financeiro. Mesmo todo mundo prevendo que o real ia desvalorizar-se, em 30/12/98, a CBF tomou empréstimo de US$ 4.500.000,00 pagando 25% de juros ao ano (taxa real de 34,3% ao ano, devido aos juros pagos adiantadamente), em dólares. Nessa ocasião, recebeu o valor líquido em reais de R$ 4.264.904,00. Doze dias antes do vencimento do empréstimo, em 2 de setembro de 1999, pagou R$ 8.969,850,00. Isto é, pagou mais que o dobro em reais. 3. TERCEIRO EMPRÉSTIMO : US$ 10 ANTECIPADAMENTE MILHÕES , JUROS DE 25%, PAGOS Há o mesmo procedimento dos outros empréstimos, com pequena diferenças. Em 5 de fevereiro de 1999, 35 dias após o último empréstimo (o 2.°), a CBF recebeu outro empréstimo do Delta Bank, no valor de US$ 10 milhões de dólares. Com juros de 25% ao ano, e vencimento em onze meses, em 5 de janeiro de 2000 (data de receber o dinheiro da Nike). Enquanto a CBF firmou esse empréstimo com as taxas mencionadas, de 25% ao ano. No entanto, o restaurante de propriedade de Ricardo Teixeira, o El Turf, fechou empréstimo junto ao Delta, dias depois, no valor de R$ 843 mil, a uma taxa bem menor, de 12% ao ano, já dentro da faixa de mercado. Por onze meses, pagou US$ 2.326.388,89 dólares de juros. Os juros foram pagos antecipadamente. Pagou o IOF à vista, mas o Imposto de Renda não pagou logo. Pressionada pela Receita Federal, a CBF só veio a pagar nove meses depois. A seguir, os valores pagos: Valor do principal do pagamento do IR Valor da multa Valor dos juros e encargos Total R$ R$ R$ R$ 722.549,02 144.509,80 119.003,82 986.062,64 Além dos gastos com os juros e do imposto sobre esses juros, mais um outro prejuízo contabilizado para a CBF, representado pela soma da multa com os juros e encargos: R$ 263,5 mil! 4. QUARTO EMPRÉSTIMO : US$ 3,7 MILHÕES, JUROS DE 21%ªª Em 21 de setembro de 1999 a CBF tomou junto ao Delta Bank um empréstimo de US$ 3.708.281,83. Pagou juros de 21% aa., o dobro do que o mercado estava praticando no período. Prazo do vencimento: 14/09/2000. Valor dos juros pagos: US$ 748.454,88. Esse juros não foram pagos antecipadamente. O agravante aqui é que esse foi um empréstimo pelo prazo de um ano. E nem assim a CBF “conseguiu” taxas de juros na média dos 10% como as outras empresas (menores que a CBF) conseguem. Destaque-se que esse empréstimo foi tomado 19 dias depois da data de pagamento do segundo empréstimo, indicação de que estava em curso um processo de rolagem de dívida. 5. QUINTO EMPRÉSTIMO : US$ 10 ADIANTADAMENTE MILHÕES, JUROS DE 16%AA., PAGOS Em 24 de fevereiro de 2000 a CBF tomou um empréstimo de US$ 10 milhões de dólares, com juros de 16% ao ano, para pagamento em 12 de janeiro de 2001. (antecipando em quase um ano o recebimento da Nike, mas á custa de juros ruinosos. A CBF pagou US$ 1,436 milhão de dólares de juros! E, além do valor elevado, os juros foram pagos antecipamente. E o imposto de renda sobre a remessa dos juros foi pago em 25/02/2000. Valor do principal: R$ 378.448,34. Valor da multa: R$ 23.728,71. Total pago à Receita: R$ 402.177,05. 6. SEXTO EMPRÉSTIMO : US$ 4,5 ADIANTADAMENTE MILHÕES, JUROS DE 14,5%ªª, PAGOS Em 7 de setembro de 2000, a CBF contratou um sexto empréstimo com o Delta Bank, no valor de US$ 4.500.000,00, com vencimento em 10/01/2001, à taxa de juros de 14,5% aa., pagos antecipadamente. Mesmo essa taxa de juros, mais baixa que as anteriores, ainda é mais elevada que a de quaisquer outros empréstimos junto ao Delta Bank feitos por outras empresas e até por pessoas físicas. E uma vez mais a inexplicável generosidade com o Banco credor, com o pagamento antecipado dos juros, que foram de US$ 290 mil por quatro meses de empréstimo. SOMA DOS CUSTOS GERADOS PELOS SEIS EMPRÉSTIMOS Conforme mostra o quadro anexo, a CBF fez empréstimos junto ao Delta Bank num total de US$ 39,7 milhões. E pagou de juros nada menos que US$ 6,22 milhões. Além dos juros, a CBF pagou impostos e multas por atraso de pagamento, perdeu muito com a desvalorização cambial, dentre outros encargos financeiros. Esses dados, mostrados na tabela abaixo, ajudam a a entender os motivos do crescente endividamento da CBF: Juros EMPR Nomin NÚM. ao ano Juros Reais JUROS (US$) ao ano IR S/ JUROS COMISSÕES, MAIS ETC MULTAS (US$) (US$) 115.134,57 159.486,69 1.857.552,63 125.368,69 49.266,96 DESVALORIZ IOF (US$) CPMF (US$) . CAMBIAL (US$) TOT. DESP (US$) 1.081.050,82 2.955.291,58 1 2 43,58% 52,12% 25,00% 34,30% 652.429,56 843.750,00 140.000,00 72.139,36 14.000,00 7.213,94 3 25,00% 32,48% 2.326.388,89 147.496,92 14.749,69 538.449,54 298.765,07 3.325.850,11 4 5 21,00% 20,70% 16,00% 18,68% 748.454,88 1.435.555,56 72.182,60 256.423,43 14.732,29 32.044,26 131.875,37 ?? 158.643,08 285.716,42 1.125.888,23 2.009.739,67 6 14,50% 15,23% 215.702,48 ?? 807,23 41.132,79 266.441,63 524.084,13 Total 6.222.281,37 Fonte: Delta Bank, CBF, CPI CBF Nike 688.242,31 83.547,42 1.857.552,63 951.960,97 1.218.319,84 11.021.904,55 Verifica-se que as despesas com os seis empréstimos ultrapassaram US$ 11 milhões. E esse gasto foi realizado em menos de dois anos e meio, no período que vai de outubro de 1998 a janeiro de 2001. Importante ressaltar que não se localizou, em todos os empréstimos, os recibos com os valores pagos a título de imposto de renda ou de IOF. Cabe aos órgãos competentes verificarem o recolhimento desses tributos, tanto pela CBF como por parte dos bancos envolvidos nas transações. COMPARAÇÃO COM EMPRÉSTIMOS TOMADOS POR OUTRAS EMPRESAS BRASILEIRAS JUNTO AO DELTA NO MESMO PERÍODO . COMPARAÇÃO MOSTRADA EM GRÁFICO . SÓ A CBF PAGOU JUROS TÃO ELEVADOS Para justificar os juros elevados, em seu depoimento nesta CPI Ricardo Teixeira disse que o primeiro empréstimo (19/10/98) foi tomado num momento conturbado (crise da Rússia), e que havia falta de capitais para empréstimo no mercado financeiro, tanto no Brasil como no Exterior. O exame dos jornais da época mostra um clima tenso no mercado financeiro, mas os juros praticados em dólar eram bem mais modestos, o que contesta a afirmação de Teixeira. Pela tabela divulgada pelo Banco Central, naquele momento praticavam-se juros de 8 a 13 por cento no mercado internacional. Esta Comissão examinou dezenas de empréstimos feitos pelo Banco Delta a empresas e mesmo pessoas físicas brasileiras naquele período e todos foram contratados com taxas em torno de 10% ao ano. (Ver Documentos Sigilosos/Sigilo Bancário Delta Bank – Anexo 34 – Pastas 1b a 116b, destacadamente pastas 084/085/086/087/088/089/90/91/92/93/102/104/111/115/116). No quadro e no gráfico anexos esses empréstimos estão relacionados. Veja-se a enorme defasagem entre os juros dos empréstimos tomados pela CBF e os dos outros, inclusive o do El Turf. EMPRÉSTIMOS DE BRASILEIROS JUNTO AO DELTA BANK NOME ASSIN. VALOR (US$) 1 2 EMPRESA 1 EMPRESA 2 20-jul-97 12-set-97 200.000 1.500.000 3 EMPRESA 3 18-set-97 4 5 PESSOA FÍSICA 1 EMPRESA 4 28-jan-98 31-jan-98 6 7 EMPRESA 5 EMPRESA 6 8 EMPRESA 7 9 10 JUROS AO ANOJUROS PRÉ% PAGOS? PRAZO 6,0 1,5 NÃO NÃO 360 DIAS 360 DIAS 400.000 10,0 NÃO 3 ANOS 150.000 800.000 5,5 8,5 NÃO NÃO 360 DIAS 360 DIAS 17-fev-98 17-fev-98 300.000 360.000 9,0 10,0 NÃO NÃO 2 ANOS 3 ANOS 25-fev-98 2.000.000 11,0 NÃO 8 ANOS PESSOA FÍSICA 2 PESSOA FÍSICA 3 04-mar-98 04-mar-98 1.200.000 1.085.000 9,0 9,0 NÃO NÃO 360 DIAS 360 DIAS 11 12 EMPRESA 8 EMPRESA 9 10-mar-98 26-mar-98 1.000.000 120.000 5,5 8,0 NÃO NÃO 3 ANOS 2 ANOS 13 14 EMPRESA 10 EMPRESA 11 11-mai-98 10-jun-98 100.000 850.000 10,0 10,0 NÃO NÃO 360 DIAS 5 ANOS 15 PESSOA FÍSICA 4 06-jul-98 127.000 9,0 NÃO 360 DIAS 16 17 EMPRESA 12 EMPRESA 13 10-jul-98 17-jul-98 220.000 1.000.000 8,0 10,0 NÃO NÃO 3 ANOS 360 DIAS 18 19 EMPRESA 14 EMPRESA 15 23-jul-98 04-ago-98 500.000 300.000 11,0 10,0 NÃO NÃO 8 ANOS 360 DIAS 20 EMPRESA 16 06-ago-98 1.300.000 10,0 NÃO 3 ANOS 21 22 EMPRESA 17 EMPRESA 18 06-ago-98 07-ago-98 400.000 220.000 8,0 10,0 NÃO NÃO 5 ANOS 180 DIAS 23 24 EMPRESA 19 EMPRESA 20 09-ago-98 12-ago-98 200.000 88.000 6,0 10,0 NÃO NÃO 360 DIAS 2 ANOS 25 26 EMPRESA 21 EMPRESA 22 12-ago-98 23-set-98 500.000 200.000 10,0 10,0 NÃO NÃO 3 ANOS 5 ANOS 27 EMPRESA 23 23-set-98 100.000 10,0 NÃO 5 ANOS 28 29 EMPRESA 24 EMPRESA 25 25-set-98 08-out-98 100.000 70.000 9,0 1,5 NÃO NÃO 180 DIAS 360 DIAS 30 EMPRESA 36 14-out-98 1.000.000 10,0 NÃO 360 DIAS 31 32 CBF EMPRESA 27 20-out-98 26-out-98 7.000.000 100.000 52,1 8,0 SIM NÃO 77 DIAS 360 DIAS 33 34 EMPRESA 28 EMPRESA 29 26-out-98 26-out-98 100.000 3.000.000 10,0 10,0 NÃO NÃO 360 DIAS 5 ANOS 35 36 EMPRESA 30 EMPRESA 36 (SEGUNDO) 13-nov-98 13-nov-98 400.000 1.000.000 ? 10,0 NÃO NÃO 2 ANOS 360 DIAS 37 EMPRESA 37 23-nov-98 300.000 10,0 NÃO 360 DIAS 38 39 PESSOA FÍSICA 5 PESSOA FÍSICA 5 (SEGUNDO) 25-nov-98 03-dez-98 432.000 256.500 12,0 12,0 NÃO NÃO 360 DIAS 360 DIAS 40 41 EMPRESA 38 CBF 07-dez-98 14-dez-98 330.000 4.500.000 10,0 32,0 NÃO SIM 360 DIAS 270 DIAS 42 EMPRESA 39 18-dez-98 237.780 10,0 NÃO ? 43 44 PESSOA FÍSICA 5 (TERCEIRO) PESSOA FÍSICA 6 22-dez-98 30-dez-98 350.000 417.000 12,0 10,0 NÃO NÃO 360 DIAS 360 DIAS 45 46 EMPRESA 40 CBF 11-jan-99 05-fev-99 500.000 10.000.000 8,5 32,5 NÃO SIM 2 ANOS 330 DIAS 47 EMPRESA 41 04-mar-99 1.000.000 12,0 NÃO 360 DIAS 48 49 PESSOA FÍSICA 7 EL TURF 06-abr-99 20-abr-99 60.000 R$843.262 10,0 12,0 NÃO NÃO 360 DIAS 5 ANOS 50 51 CBF CBF 21-set-99 24-fev-00 3.708.281 10.000.000 21,0 18,7 NÃO SIM 360 DIAS 320 DIAS 52 CBF 07-set-00 4.500.000 15,2 SIM 125 DIAS 60,0 50,0 40,0 30,0 20,0 10,0 0,0 EMPRÉSTIMOS DO DELTA A BRASILEIROS (juros ao ano %) CBF X EL TURF Cabe ressaltar, novamente, que a CBF utilizou essas taxas elevadas, enquanto que o restaurante El Turf, de Teixeira, fechou também um empréstimo com o Delta a 12% a.a., em abril de 1999. Ou seja, nos mesmos dias em que tomava recursos para a CBF junto ao Delta Bank a 32,5%, como no 3.° empréstimo, com juros pagos adiantadamente, Ricardo Teixeira obtinha, da mesma agência e igual banco, empréstimo a apenas 12% a.a., com juros pagos posteriormente, junto com o principal. O empréstimo do El Turf foi, então, realizado dentro dos padrões do mercado. (Sigilo bancário – Rural International Bank – Anexo 33 -- Pastas 1-B a 37-B). Não se pode crer que o El Turf pudesse dar ao Delta Bank maiores garantias do que a CBF, que justificassem a diferença de juros. E, em qualquer dos casos, Ricardo Teixeira foi o avalista dos empréstimos. Sendo assim, percebe-se que a condução dos negócios da CBF é feita de modo completamente diferente dos negócios particulares de Teixeira. Não é à-tôa que enquanto a CBF se vê diante de um grande rombo, de pelo menos R$ 25 milhões, os negócios pessoais do presidente da entidade estejam prosperando, a todo vapor. Outro ponto a destacar é que a CBF nunca reclamou, publicamente, com o Delta Bank, o fato de a Confederação Brasileira de Futebol ter sido a única instituição a ter tomado dinheiro emprestado a juros tão elevados. Nem quando tomou conhecimento por intermédio da imprensa. Ricardo Teixeira procurou, ao contrário, manter argumentos que justificassem aquelas taxas contratadas. Afinal, ele, particularmente, conhece as taxas reais de mercado. O empréstimo para o El Turf confirma isso. EXPLICAÇÃO DA CBF NÃO CONVENCEU. DADOS APRESENTADOS POR RICARDO TEIXEIRA EM SEU DEPOIMENTO À CPI FORAM DESMENTIDOS. AS EMPRESAS APONTADAS POR ELE ENVIARAM OFÍCIOS À CPI AFIRMANDO QUE JAMAIS TOMARAM EMPRÉSTIMOS NAQUELAS CONDIÇÕES. DIVULGAÇÃO DE INFORMAÇÕES FALSAS Em seu depoimento nesta CPI em 10 de abril último, Ricardo Teixeira tentou justificar os altos juros apresentando uma placa com uma lista de empresas que supostamente haviam tomado empréstimos com taxas semelhantes às da CBF no mesmo período. A placa tinha as informações abaixo: ´ Empresa NET Klabin Governo de M. Gerais Singer Ed. Abril RBS NetSat TV Filme Juros 36,00 % 50,56% 47,57% 56,22% 51,46% 45,62% 42,30% 50,36% Fonte: Ricardo Teixeira, depoimento 10/4/2001 A placa, como todos presentes à sessão viram, tinha apenas esses dados, sem quaisquer outras informações, sem data da tomada do empréstimo, sem esclarecerer se eram empréstimos em reais ou em dólar. Aparentemente, o argumento, logo assumido como verdadede por parte da imprensa, derrubava os questionamentos da CPI. Para conferir, algumas das empresas citadas e o governo de Minas Gerais foram consultados pela CPI nos dias subseqüentes. Eis suas respostas: No entanto, ao tomar conhecimento de que Teixeira havia citado o Governo de Minas Gerais como tendo firmado contratos de empréstimos com taxas de juros próximas ou superiores às da CBF, e em torno de 47% ao ano, o Secretário da Fazenda de Minas Gerais, José Augusto Trópia Reis,enviou ofício datado de 18/04/01, no qual afirma: “informamos que o Governo de Minas Gerais não contratou nenhum empréstimo externo nos últimos três anos (...) a última operação de financiamento externa contratada pelo Governo de Minas Gerais foi realizada em março de 1995 (...) à média anual de 5,78%”. Na mesma data, a empresa Indústrias Klabin oficiava: “De 1998 a 2000 a Klabin contratou financiamentos no montante de US$637 milhões, com custo médio de 9,53% ªª. Deste modo, não procede a afirmação de que a Klabin tenha contratado financiamentos em moeda estrangeira pagando taxas de juros superiores a 50%ªª”. Em 19 de abril a empresa Itsa Telecomunicações/TV Filme respondia que havia contrado um empréstimo externo apenas em dezembro de 1996, com a taxa de juros de 12,8%ªª. A Empresa Singer também respondeu afirmando que nunca tomara empréstimo externo com os juros anunciados por Teixeira. O presidente da CBF apresentara informações falsas à CPI. É o que demonstra a tabela retificadora, preenchida com os dados das empresas e do Governo de Minas Gerais, que foram encaminhados oficialmente a esta CPI: Empresa ou Órgão Klabin Governo de M. Gerais Singer ITSA/TV Filme Juros informados por Ricardo Teixeira 50,56% 47,57% 56,22% 50,36% Juros reais informados 1 pelas empresas 9,53% 5,78% 10,0% 12,87% Fonte: CPI CBF/Nike, Klabin, Singer, TV Filme e Gov. de M. Gerais. Anexo 4: Ofícios das empresas Klabin, Singer e TV Filme e do Governo de Minas Gerais. Teixeira prometeu encaminhar a esta CPI documentos esclarecendo os fatos que levaram a CBF a fazer tais empréstimos. Os documentos enviados trazem como fundamentação básica dois pontos: (1) a necessidade de caixa da entidade, em outubro de 1998, e (2) que as taxas de mercado estavam elevadas, devido à chamada, por ele, de crise da Rússia. Insiste, pois, num argumento já comprovadamente sem fundamento. O PARECER DE MAÍLSON DA NÓBREGA Quanto às taxas de mercado, a CBF encaminhou a esta Comissão parecer de economista Maílson da Nóbrega que tenta estabelecer um entendimento de que as condições durante a crise da Rússia obrigavam contratações de empréstimos de curto prazo para problemas de falta de caixa. Entretanto, o parecer não abrangeu os casos concretos em exame. Por manter-se em hipóteses acaba por confundir a questão central. E qual é a questão? Ela se resume-se a: por que o Delta Bank teria emprestado apenas à CBF àquelas taxas tão elevadas? E mais: por que, além do Delta, instituições como o Trade and Commerce Bank teriam firmado empréstimos, no mesmo período, e a brasileiros também, a taxas de apenas 6%? (Ver Trade and Commerce Bank, Anexo 35, pastas 1B a 8B). O documento de Maílson da Nóbrega tergiversa sobre o tema. Faz referência a títulos privados emitidos no exterior por empresas brasileiras e não a empréstimos tomados por empresas brasileira no Exterior, em dólar, pela Instrução 63 e pela então chamada conta CC5, que é o caso em pauta. Compara também com títulos da dívida pública brasileira, dando como exemplo o título Interest Due and Unpaid,IDU, emitido para pagar juros da dívida externa do nosso governo. Compara , portanto, coisas diferentes. Mesmo assim, os dados que apresenta indicam que os juros elevaram-se até 30% ao ano em setembro e cairam para menos de 20% ao ano, em outubro. O gráfico que acompanha a explanação indica precisamente que em 25 de outubro de 1998 a taxa de juros dos IDUs estava por volta de 17%. Bem diferente, portanto, da taxa de 52% que a CBF assumiu no empréstimo feito três dias depois, em 28 de outubro de 1998. A seguir, Maílson da Nóbrega afirma: “ Apesar das dificuldades conhecidas e esperadas, esse impactos foram passageiros. O quadro de instabilidade foi considerado como um problema de curto prazo, que se estenderia até o primeiro trimestre de 1999, dada a concedntração de vencimentos referentes às captações do primeiro trimestre de 1998. Para 1999, as perspedtivas da economia brasileira, com o desaquecimento da atividade e melhoria dos preços dos produtos primários no mercado externo, eram de recuperação”. (g.n.) Quer dizer, os maus tempos na economia continuaram apenas para a CBF, que em 1999 continuou a tomar empréstimos a juros extorsivos, de mais de 30% ao ano, como vimos acima. Com suas palavras o eminente economista evidencia a excepcionalidade do caso da CBF e vem em reforço às denúncias desta CPI. Na suas conclusões o ex-ministro da Fazenda tenta dar um alento aos surrados argumentos de Ricardo Teixeira: “ Em situações de crise como a do México em 1995, da Ásia em 1997, da Rússia em 1998, ou na desvalorização de 1999, a disponibilidade de recursos externos para países como o Brasil diminui súbita e drásticamente. Torna-se muito difícil obter ou renovar empréstimos externos. E quando se consegue, o custo é extremamente elevado quando comparado com taxas vigentes antes ou depois da crise. Taxa da ordem 20%, 30% ou mesmo 40% passam a ser praticadas...” (g.n.) Como se vê, o dr. Maílson está preocupado em justificar aquele primeiro empréstimo feito pela CBF em 29 de outubro de 1998, com juros antecipados de 52% ao ano. O máximo que consegue é fazer afirmações genéricas, externando uma lógica acaciana, sem jamais apresentar um fato concreto. O que ele não consegue explicar são as dezenas de empréstimos cedidos pelo Delta Bank a empresas e mesmo a pessoas jurídicas brasileiras, naquele mesmo período, nos dias próximos e no mesmo dia 29/10/98, conforme mostram a tabela e o gráfico apresentado em outra parte deste capítulo. Os comprovantes, relativos à quebra de sigilo do movimento do Delta Bank, estão de posse desta CPI, como já referimos (Anexo 34 -- Pastas 1b a 116b). Desse episódio resta um último questionamento. De acordo com a imprensa a CBF pagou R$ 30 mil reais a Maílson da Nóbrega pelo seu parecer. A que título? Em que medida essa despesa se justifica em relação à atividade-fim da Confederação, que é o desenvolvimento do futebol? Trata-se de mais um exemplo de malversação de recursos da administração temerária da CBF. TEIXEIRA APARENTA DESPREPARO Questionado sobre os empréstimos com o Delta, em especial sobre o segundo empréstimo, firmado nos últimos dias de 1998, ocorreu o seguinte diálogo durante o depoimento de Ricardo Teixeira, em 10/4/2001: “O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES - No dia 14 de dezembro de 1998, praticamente dois meses depois, menos de dois meses depois que o empréstimo de 7 milhões, a CBF fez um outro empréstimo com o Delta Bank, no valor de 4,5 milhões de dólares. Dessa vez os juros foram de 25% ao ano, segundo informações do Banco Central — duas vezes e meia os juros praticados no período no mercado —, e esse empréstimo era com vencimento com prazo de 9 meses, e novamente os juros foram pagos antecipadamente, o que eleva essa taxa para 30% ao ano. Eu queria saber do senhor por que esse novo empréstimo, a CBF teve que recorrer a um novo empréstimo, e por que essas taxas. O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Excelência, o empréstimo foi feito por necessidade de caixa da CBF; agora, a taxa foi dentro do mercado. Eu só não estou localizando aqui os documentos que comprovam isso. (Pausa.) O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES - Quer dizer, a CBF tinha... O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Excelência, eu tenho certeza de que eu tenho esses documentos, mas eu não estou localizando eles aqui. Especificamente desse, de dezembro. Mas eu tenho convicção absoluta que eu fiz a tomada das taxas nessa época, e elas eram... e eu sempre faço através do banco, e as taxas, elas eram compatíveis.” (g.n.) Percebe-se que o próprio presidente da CBF admite que o primeiro empréstimo foi fechado numa taxa exorbitante. Apesar de que, para isso, considerou a taxa de 25% (de fato, 34,3%) dentro do mercado, enquanto ela é quase o triplo do mercado. Em geral, Teixeira tentou aparentar não estar preparado para responder as questões relativas aos empréstimos: “ Excelência, de cabeça eu não posso... não tenho informações para lhe dar, mas eu lhe prometo que envio isso para o senhor tão logo eu chegue no Rio de Janeiro...”; ou: “Excelência, eu vou mandar verificar através da Auditoria da CBF e lhe responderei em 48 horas esse assunto”... A resposta que mais vezes se ouviu durante o depoimento do presidente da CBF foi essa. Freqüentemente não tinha informações para responder aos deputados. Em trinta e uma ocasiões, tratando-se de 31 temas diferentes Ricardo Teixeira prometeu enviar documentos que esclareceriam os fatos. Sobre os empréstimos da CBF com o Delta Bank mandou um resumo das operações bancárias, com os mesmos dados apresentados anteriormente, mas sem esclarecimento adicional. A RESPONSABILIDADE DO DELTA BANK A polêmica envolveu o Delta Bank. Em contato pessoal com o relator Sílvio Torres, dirigente do Banco disse que o dinheiro dos empréstimos não era do Delta. Posteriormente, em carta à CPI, o advogado do Banco, Roberto Rosas, fez a mesma afirmação: “Quanto `a alusão sobre ‘empréstimos a juros extorsivos’, é preciso que se diga que não faz parte dos serviços do Delta Bank a concessão de empréstimos diretos. O Delta realiza intermediações entre o tomador e instituições e/ou investidores do mercado financeiro. A fixação de juros é negociada com as partes, cabendo ao Delta não a receitas dos juros mas somente um spread pela operação.” (g.n.) Se o dinheiro dos empréstimos não era do banco, se o Delta não faz empréstimos, se só intermedia, de quem era o dinheiro? No seu depoimento à CPI, inquirido pelos deputados, Ricardo Teixeira afirmou que o dinheiro era do Delta Bank. Em 16 de abril, o Delta Bank enviou ofício à CBF, que o repassou à CPI. Nessa correspondência, o vice-presidente executivo do Delta, Newton Bleffe, diz: “ gostaria de confirmar que o Delta National Bank and Trust Co., concedeu empréstimos diretos à CBF em condições de prazos e de juros compatíveis tanto com o risco comercial do tomador bem como às condições prevalecentes no momento de cada operação para captação de recursos no mercado internacional com risco brasileiro”. E relacionava uma lista incompleta dos empréstimos e dos juros. Portanto, o Delta voltava atrás. Permanecia a indefinição. A CPI convocou o representante do Delta Bank no Brasil, George Philip de Brito, para depor. Mas este não compareceu. Dois dias antes do seu depoimento, a CPI recebeu carta do presidente do Delta Bank, John D. Landers, informando que Brito não poderia comparecer ao depoimento por “ encontrar-se em Portugal a caminho dos Estados Unidos” em cumprimento de férias e tratamento de saúde. Brito é cidadão estadunidense. Por haver se omitido de comparecer à CPI deve prestar contas à Justiça brasileira, se pretender voltar ao Brasil. A evasão de Brito, recusando-se a prestar declarações à CPI, referendada oficialmente pelo presidente do Delta Bank, o cidadão estadunidense John Landers, reforçou as dúvidas sobre esses empréstimos e a suspeita de que estejam envolvidos em irregularidades. A confirmar-se que o emprestador não foi o Delta Bank seria de alto interesse público saber quem se privilegiou das taxas de juros extorsivas. Mas essas informação nem o Banco Central do Brasil detém. Seria necessário invocar auxílio de autoridades financeiras dos Estados Unidos para se obter tal informação, providência que esta CPI já adotou. Porém, se o dinheiro usados nos empréstimos pertencia ao Delta Bank, essa instituição pode ter infrigido a legislação bancária dos Estados Unidos. Pela legislação financeira dos EUA um Banco só pode emprestar até o limite de 25 por cento de seu patrimônio líquido a um mesmo segmento da economia, quanto mais a um mesmo cliente. A Section 2050.1 do Commercial Bank Examination Manual, do Federal Reserve Board – FED, determina que o limite máximo permitido para concentração de crédito nas mãos de um único credor ou de grupos de credores do mesmo segmento econômico, não ultrapasse 25% do patriomônio líquido do Banco - nível 1, ou seja, excluídas as provisões para créditos duvidosos. No caso do Banco Delta envolvendo a CBF, em 31/12/1998, os créditos somavam US$ 11,5 milhões! (FLI-40853 e FLI-40962). Naquela data, o patrimônio líquido do referido Banco era de apenas US$ 21,896 milhões. As duas operações de crédito representavam 53% do patrimônio da instituição. Considerando a posição em 31/12/2000, os saldos dos empréstimos somavam US$ 14,5 milhões, enquanto o patrimônio líquido do Delta era de US$ 41,414 milhões. Os empréstimos correspondiam a 35% desse patrimônio. Em ambos os casos o limite aceitável pela legislação americana (25%) foi desobedecido, o que é considerado como administração temerária, e sujeita a instituição a receber tratamento específico bastante severo por parte do FDIC, o Federal Deposit Insurance Corporation. Não se pode esquecer também o risco sem precedentes a que o Delta Bank se expôs ao aceitar, como vimos atrás, Ricardo Teixeira como avalista dos seis empréstimos tendo um patrimônio declarado muito inferior aos valores emprestados. O Banco Central dos EUA precisa ser informado disso. COMPETÊNCIA SELETIVA Após todos esses meses de investigação, a conclusão a que esta CPI chega é de que permanecem e até se fortaleceram os indícios de evasão de divisas nas operações desses empréstimos. O tema merece atenção do Banco Central e do Ministério Público. Além disso, a confusão interna que o próprio Delta Bank causou com respeito a de quem é o dinheiro emprestado à CBF dificulta as conclusões da CPI sobre essa questão fundamental. Desse espisódio fica a evidência de que quando se trata de seus negócios particulares Ricardo Teixeira é uma administrador muito mais competente. É o que demonstram os contratos de empréstimo do restaurante El Turf, de Teixeira, junto ao Delta Bank, de abril de 1999, que está dentro da faixa de mercado (12% a.a.), e outro empréstimo do mesmo El Turf, obtido utilizando-se da Resolução 63, do Banco Central. Neste empréstimo, fechado com o Banco Real, em 1996, as taxas foram muito baixas, 1,25% acima da Libor. Isso remete ao depoimento de Teixeira a esta CPI, quando questionado sobre os seus ganhos na Bolsa de Mercadoria e de Futuro (BM&F): “O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Eu volto a dizer que não necessariamente alguém ganha e outro perde. Eu vou dar um exemplo de uma operação que o senhor considerou uma operação de um grande número. Desde o ano de 98, Excelência, que se falava no Brasil que iria haver uma desvalorização cambial. Se o senhor acompanhasse, se o senhor acompanhou o mercado de 98 do dólar, desde 98, final do ano, que começou a haver uma mutação do dólar. Qualquer pessoa que estivesse no mercado e acreditasse nas informações da queda do, na época, Presidente do Banco Central Gustavo Franco tinha certeza absoluta que no momento que o Presidente do Banco Central, Gustavo Franco, saísse do Banco Central, imediatamente haveria um descolamento do dólar de valores bastante depreciados. Essa operação eu fiz exatamente porque eu tinha certeza absoluta que com os boatos que já se faziam da queda do Gustavo Franco, eu posso lhe enviar depois essa documentação de jornais da época, e exatamente essa grande operação foi em dólar. Essa operação foi compra de dólar futuro. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Eu acho perfeito isso. Eu só não consigo entender por que o senhor, sendo Presidente da CBF, não fez o mesmo também com os recursos da CBF. O senhor fez um empréstimo que pode ser considerado, em qualquer operação, altamente temerário, porque o senhor estava em vias de receber recursos. O senhor fez empréstimo no momento em que você tinha juros crescentes. O senhor, conhecendo o mercado, sabia disso.” (g.n.) O Deputado Jurandil Juarez questionou o fato de Ricardo Teixeira, sendo especialista e experiente na área de mercado de capitais, que é uma área que exige conhecimento muito específico e é complexa, não gerir as contas da CBF como vem fazendo com as suas empresas particulares. Uma segunda conclusão é que as condições em que esses empréstimos foram negociados evidenciam, sem sombra de qualquer dúvida, a administração ruinosa da CBF. O pagamento de juros extorsivos – em benefício de quem? – causou grandes prejuízos à CBF. Para esse aspecto também chamamos a atenção do Ministério Público. A diretoria da entidade deve ser responsabilizada. AINDA O SEGUNDO EMPRÉSTIMO A PARTICIPAÇÃO BANK DO BANCO ARAUCÁRIA E DO TRADE AND COMMERCE O Trade and Commerce Bank realizou a intermediação do segundo empréstimo da CBF. E isso a pedido da própria entidade. O dinheiro, US$ 4,5 milhões, saiu do Delta Bank e foi enviado para o Trade Bank, nas Ilhas Cayman. De lá, passou pelo Banco Araucária, onde foi transformado em reais e veio para a conta corrente da CBF. A CBF é que, inclusive, solicitou que a transação fosse feita via o Trade Bank. A Confederação enviou correspondência em 3/12/1998 para o Delta Bank. Nela, a CBF deu as instruções para que o dinheiro fosse enviado, passando pelas Ilhas Cayman (Ver Anexo Pastas Contratos CBF Delta Bank): “Instruções para crédito de dólares: Creditar CITYBANK - NEW YORK / USA ABA: 021000089 CONTA: 36016231 Para crédito do: TRADE & COMMERCE BANK Por ordem de: Delta Bank Em favor de: Confederação Brasileira de Futebol - CBF Referência: Empréstimo” A CBF, desse modo, ordenou ao Delta Bank que remetesse o dinheiro para a conta do Trade, no Citybank, em Nova York. das Ilhas Cayman, o dinheiro, já deduzido dos juros, foi para a CBF, como já mencionado. Não se pode compreender o porquê dessa providência, e nem mesmo a carta da CBF para o Delta esclarece isso. O Delta Bank tinha todas as condições possíveis para enviar o dinheiro diretamente para o Brasil, como esta CPI pôde comprovar por intermédio de centenas de remessas realizadas pelo Delta para o Banco Real, ambos bancos então pertencentesao mesmo grupo. Essa transação mereceu a atenção da Polícia Federal (PF) e do Ministério Público Federal (MPF), em Foz do Iguaçu, Paraná, pelas suas peculiaridades. Primeiro, porque os dólares, que deveriam vir diretamente do Delta Bank, em Nova York, para o Brasil, passaram pelas Ilhas Cayman. Segundo, porque não constava pagamento de imposto de renda sobre os juros do empréstimo. Terceiro, devido ao fato de os juros terem sido pagos antecipadamente, o que é extremamente raro nesse tipo de negócio. O inquérito na PF de Foz do Iguaçu já está em andamento e cabe a esta Casa e à sociedade exigir resultados dessa investigação, bem como das centenas de processos envolvendo crimes relativos à lavagem de dinheiro, à evasão de divisas e à sonegação fiscal sob a responsabilidade daquele órgão. Afinal, o trabalho dedicado de pessoas da PF e do Ministério Público, que incansavelmente se dedicam a essa batalha, não pode ser esquecido ou engavetado. 12 Esta CPI quebrou o sigilo bancário das contas “CC-5” do Trade no Brasil. Inicialmente, o Banco Araucária, no qual o Trade mantém conta CC-5, demorou para enviar os documentos exigidos. Quando os documentos chegaram, verificou-se que não tinham utilidade alguma, pois o banco havia remetido algumas cópias de depósitos na conta do Trade Bank, sem que se pudesse identificar quem eram os Sugere-se, portanto, ao Ministério da Justiça promover ações no sentido de agilizar os trabalhos da PF de Foz, bem como equipá-la mais dignamente, sob os aspectos pessoal e material. Desse trabalho harmonioso feito em conjunto com a Receita Federal, que tem trabalhado, também, com afinco, sairão, por certo, resultados muito positivos para este País, como os já obtidos, até o ano de 2000. 12 depositantes. E isso trouxe uma série de dificuldades para esta CPI, além de atrasos nas investigações (Ver Anexo 35, Pastas 1 a 8, do Trade and Commerce Bank). OS EMPRÉSTIMOS DO TRADE O Trade emprestava dinheiro a brasileiros, por intermédio do Banco Araucária. Esta CPI obteve as informações fundamentais sobre os empréstimos realizados diretamente pelo Trade. Os contratos de empréstimos mencionam literalmente o Trade como uma das partes envolvidas. Desses contratos, pôde-se obter informações importantes que vêm se somar a muitos outros dados que esta CPI já possui a respeito de empréstimos tomados no exterior, nos últimos anos. Isso auxilia esta Comissão no sentido de estabelecer um juízo cada vez mais definido sobre os empréstimos tomados pela CBF, nos últimos dois anos e meio. Para demonstrar esse fato, basta que sejam relacionados alguns empréstimos e suas condições. As empresas ou pessoas não serão citadas expressamente, devendo caber ao MP averiguar a regularidade dessas transações. A tabela a seguir indica essas condições: JUROS JUROS ADIANTADOS? VALOR (US$) DATA ASSINAT. A. C. S/A LIBOR+1% NÃO 1.500.000 28/10/95 P. A. S/A 6% NÃO 1.500.000 10/12/98 P. A. S/A 6% NÃO 2.020.000 01/03/99 P. A. S/A 6% NÃO 1.000.000 21/05/99 P. A. S/A 6% NÃO 5.000.000 28/10/99 P. A. S/A 6% NÃO 1.500.000 10/12/99 M. C. S. 6% NÃO 5.000.000 24/07/00 P. A. S/A 6% NÃO 755.000 27/07/00 NOME Fonte: Banco Araucária - CPI CBF Nike O que importa a esta CPI é comprovar que todos os empréstimos foram tomados a, no máximo, 6% ao ano. Um dos empréstimos chamou mais a atenção desta Comissão: é o empréstimo que está destacado em negrito, acima. Ele foi assinado a apenas quatro dias do segundo empréstimo da CBF, negócio esse que também teve a participação do Trade Bank. No empréstimo em destaque, o Trade ofereceu dinheiro à P. A. S/A a 6% ao ano e juros pagos depois, junto com o principal, como é de praxe. Para a CBF, o tratamento foi bem diferente. O Trade participou de um negócio entre o Delta Bank e a CBF no qual, em vez de 6% ao ano, se cobrou 32,5% ao ano. Os juros, foram pagos antecipadamente, e ficaram com o Trade na agência das Ilhas Cayman, paraíso fiscal, local onde não se consegue identificar os beneficiados por transações nebulosas ou mesmo ilegais. E cobrou taxa de administrtação – o spread – sobre essa importância. Comparando-se os empréstimos da CBF com os outros realizados pelo Trade Bank, tem-se a tabela e o gráfico, a seguir: TOMADOR JUROS ADIANTADOS? NÃO SIM NÃO SIM SIM NÃO NÃO NÃO NÃO NÃO SIM NÃO NÃO SIM JUROS AA A. C. S/A CBF 1 P. A. S/A CBF 2 CBF 3 P. A. S/A P. A. S/A CBF 4 P. A. S/A P. A. S/A CBF 5 M. C. S. P. A. S/A CBF 6 6,00% 52,12% 6,00% 34,30% 32,48% 6,00% 6,00% 20,70% 6,00% 6,00% 18,68% 6,00% 6,00% 15,23% VALOR (US$) DATA 1.500.000 7.000.000 1.500.000 4.500.000 10.000.000 2.020.000 1.000.000 3.708.282 5.000.000 1.500.000 10.000.000 5.000.000 755.000 4.500.000 28/10/95 29/10/98 10/12/98 14/12/98 05/02/99 01/03/99 21/05/99 21/09/99 28/10/99 10/12/99 24/02/00 24/07/00 27/07/00 07/09/00 Fonte: Trade and Commerce Bank/Banco Araucária/CPI CBF Nike JUROS AO ANO EMPRÉSTIMOS EM DÓLARES 60,00% 50,00% 40,00% 30,00% 20,00% CBF 6 P. A. S/A M. C. S. CBF 5 P. A. S/A P. A. S/A CBF 4 P. A. S/A P. A. S/A CBF 3 CBF 2 P. A. S/A CBF 1 0,00% A. C. S/A 10,00% Fonte: Trade and Commerce Bank/Banco Araucária/CPI CBF Nike Os dados são claros e demonstram que a CBF poderia ter captado recursos a taxas de juros muitas vezes menor do que as obtidas junto ao Delta Bank (por intermédio ou não do Trade Bank). Fica, mais uma vez, provado que os juros altos contratados pela CBF soam como algo inexplicável diante das provas que esta CPI tem em mãos. Diante de fatos concretos como esses, torna-se impossível estabelecer modelos econômicos teóricos, ou se utilizar de outros elementos hipotéticos, provenientes de exames em abstrato e de análises acadêmicas, para justificar as taxas elevadíssimas praticadas pela CBF. A única verdade concreta é que tanto o Delta Bank como o Trade Bank emprestaram dólares a brasileiros, a taxas de mercado, desde antes, durante e depois da crise da Rússia. Parece que a crise só foi sentida pela CBF. Por que não pelos centenas de outros tomadores de empréstimos? Mesmo porque a crise da Rússia, argumento repetido por Ricardo Teixeira para convencer da necessidade de se pegar dinheiro a 52,12% ao ano de juros e em dólares, somente afetou o Brasil durante parte do segundo semestre de 1998. Em 1999, com os efeitos da crise já não mais sentidos por aqui, a CBF continuou tomando dinheiro no exterior, a taxas de juros três vezes maior do que o mercado. Por que? Por que continuar insistindo em argumentos vazios de realidade sob o disfarce de tendências teóricas da conjuntura econômica? CAPÍTULO VIII – DOAÇÕES POLÍTICAS. CRIAÇÃO DE UMA REDE DE INFLUÊNCIA POLÍTICA NO C ONGRESSO. O estudo dos documentos da CBF revela um esforço continuado de apoio financeiro a candidatos ao Parlamento (e também a Prefeituras de algumas cidades), visando a eleição de candidatos de suas relações. Ao mesmo tempo, a CBF investiu na montagem de uma casa em Brasília, um verdadeiro escritório de representação, para dar atendimento a parlamentares. São indicações de que a CBF planejava ampliar sua influência política além do mundo do futebol, criando no Congresso uma “Bancada da CBF”. Além de eticamente discutível, essa prática de fazer doações a políticos configura uma ilegalidade, já que a CBF é uma entidade sem fins lucrativos e recebe recursos do Exterior. Essa condição preenche uma das vedações estabelecidas pela legislação eleitoral de 1997 (Lei 9.504, art. 24, VII). Relação das doações contabilizadas da CBF a candidatos nas campanhas eleitorais de 1998: NOME ANTÔNIO CARLOS AMORIM JR ANTÔNIO DELFIM NETTO PAULO CARDOSO DE ALMEIDA ANTÔNIO AQUINO LOPES ANTÔNIO AQUINO LOPES MAURÍCIO MAGALHÃES MAURÍCIO MAGALHÃES CARLOS AUGUSTO A.SANTANA DARCÍSIO PAULO PERONDI DARCÍSIO PAULO PERONDI JOSÉ AGRIPINO MAIA HUGO NAPOLEÃO DO REGO NETO ARTHUR HENRIQUE G. FERREIRA EURICO ÂNGELO DE O. MIRANDA RAVENA NAPOLEÃO DO REGO TOTAL * Doações fora do prazo legal. (R$) 50.000 5.000 50.000 25.000 32.500 25.000 25.000 50.000 50.000 50.000 50.000 50.000 50.000 50.000 50.000 612.500 DATA DOS CHEQUES 18/9/98 21/8/98 30/9/98 25/9/98 30/10/98 * 11/9/98 30/9/98 09/10/98 * 11/9/98 30/9/98 11/9/98 11/9/98 11/9/98 11/9/98 30/11/98 * --- Os deputados contestaram as justificativas de Ricardo Teixeira para fazer essas doações. Veja trechos das notas taquigráficas do depoimento do presidente da CBF a esta CPI: O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – O senhor tem conhecimento, então, dos cheques que saem, dos valores que são colocados, das doações que são feitas, dos empréstimos que são feitos, dos pagamentos de juros, de toda a administração da CBF, ou empresa, como o senhor está dizendo, que essa CBF é uma empresa hoje? O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA – Especificamente, no caso das doações, eu tenho. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – O senhor tem? O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA –Tenho. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – O senhor não conhece Antonio Carlos Amorim Júnior? O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA – Por nome... O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Ele é o pai... Ou melhor, Sr. Ricardo Teixeira, ele é filho do Sr. Antonio Carlos Amorim, o desembargador ex-Presidente do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, ex-Presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro, que V.Sa. levou para a Copa do Mundo com todas as despesas pagas. Esse Antonio Carlos Amorim Júnior é filho desse desembargador(...) Antonio Carlos Amorim Júnior, então candidato a Deputado, recebeu uma doação da CBF de 50 mil reais. E o Presidente não conhece o Sr. Antonio Carlos Amorim 13 Talvez conheça, Sr. Presidente, o Sr. Antônio Delfim Netto, exMinistro, Deputado, que recebeu também da CBF 5 mil reais num jantar de adesão. (...) Ou ainda o Sr. Paulo Cardoso de Almeida, que também, no dia 30/9/98, recebeu 50 mil reais; ou ainda Antônio Aquino Lopes, que, no dia 25/9, também recebeu 25 mil reais para a sua campanha eleitoral; ou ainda Antônio Aquino Lopes, que, no dia 30/10/98, recebeu 32 mil e 500 reais da CBF para a sua campanha eleitoral; ou ainda o Sr. Maurício Magalhães, que, no dia 30/9/98 — sempre às véspera da eleição ou um pouco depois, Sr. Presidente —, Maurício Magalhães recebeu 25 mil reais também da CBF; ou ainda Carlos Augusto Santana, Deputado Federal do PT do Rio de Janeiro, que recebeu, no dia 9/10/98, 50 mil reais; Na verdade, verificou-se tratar do próprio desembargador, e não do filho dele. O desembargador se aposentou e se candidatou a uma vaga de Deputado Federal. 13 membro dessa CPI, o Deputado Darcísio Paulo Perondi, que recebeu 100 mil reais, em duas parcelas de 50 mil reais, uma datada — de 50 mil — de 11/9/98, outra de 30/9/98; ou ainda o Senador José Agripino Maia, que, no dia 11/9/98, recebeu 50 mil reais; ou ainda o Presidente do PFL, o Senador Hugo Napoleão do Rego Neto, que recebeu também, no dia 11/9, 50 mil reais; ou ainda, na mesma data, o Sr. Artur Henrique G. Ferreira, 50 mil reais também; e aqui outro Deputado dessa CPI, Deputado Eurico Miranda, que, na mesma data, recebeu 11 mil reais.14 Então, Sr. Presidente, como pode a CBF (...) Primeiro é saber qual o critério da escolha: porque é filho do desembargador, porque é próximo, enfim, quais os critérios que a CBF utiliza para sortear ou beneficiar ou premiar candidaturas com valores razoáveis para as campanhas. Porque isso, na própria disputa eleitoral, causa já uma desigualdade, causa já dificuldades para outras candidaturas. Queria saber, Sr. Presidente, os critérios que V.Sa., o Sr. Salim e outros mais da CBF utilizam-se para... O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Porque também, Sr. Presidente, a legislação que eu tenho em minhas mãos aqui proíbe que uma entidade como a CBF, proíbe que Deputados recebam, que candidatos recebam doações de instituições como a CBF, certo? E gostaria de saber também de V.Sa. se é comum V.Sa. levar desembargadores graciosamente nas disputas da Copa do Mundo .O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA – Sr. Presidente, eu gostaria de pedir a S.Exa., o Deputado, que me informasse qual é a legislação que diz que a CBF não pode e por que razão ela não pode fazer doações políticas? O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Um minutinho que eu já vou localizar. Olha, eu não tenho, Deputado Jurandil... Está aqui. É exatamente o art. 24 da Lei 9.504, de 30/7/97, publicada no Diário Oficial de 1/10/97. Art. 24: “É vedado partido e candidato receber direta ou indiretamente doação em dinheiro ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie procedente de...”. Aí vem inciso I, II, III, certo? Vou ler somente o IV, que diz que, ou aliás, o inciso VII, que diz: “Pessoas jurídicas sem fins lucrativos que recebam recursos do exterior”. É vedado que candidatos recebam de pessoas jurídicas sem fins lucrativos que recebam recursos do exterior. Isso é ilegal. Mas, além da questão legal... a questão pode não ser legal, para 14 O deputado Eurico Miranda recebeu R$50 mil reais em doação da CBF à sua campanha eleitoral. mim é muito mais moral e ética. O que a CBF exatamente ganha ao financiar determinados candidatos e não financiar os outros? O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA – Excelência, eu gostaria de esclarecer que, desde 98, a CBF é entidade de fins lucrativos, porque houve uma medida provisória do Governo que acabou com a isenção tributária que a CBF tinha. Segundo, é perfeitamente legal e dentro da lei que saiu, que emanou do Congresso Nacional e da Câmara dos Deputados a lei que faculta o auxílio oficial, como a CBF dá, com cheques nominativos, que estão na sua contabilidade, razão por que essa CPI conseguiu obter a documentação. Todos os cheques de auxílio que nós fornecemos foram nominativos e totalmente declarados dentro da entidade, entidade essa, que eu voltou a dizer, em janeiro de 98, perdeu o direito de ser uma entidade de fins não lucrativos. Mas o deputado Jurandil Juarez havia analisado a legislação e o estatuto da CBF e concluiu que o argumento usado pelo depoente não tinha fundamento: O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – (...) Sr. Presidente, eu fui à CBF e procurei mudanças, eu estou convicto de que não houve mudanças. Por isso, eu vou ler o que diz o estatuto, que foi o que esta Comissão recebeu, foi o que este Deputado, em nome da Comissão, recebeu a informação, lá na CBF: esta entidade continua sendo uma associação civil de direito privado sem fins lucrativos. Agora, deixar bem claro que existe uma diferença entre ser sem fins lucrativos e isenta do pagamento de impostos. A entidade, portanto, continuou por sua própria deliberação, dado que não existe, na Junta Comercial do Rio de Janeiro, registro de mudança de característica de pessoa jurídica da CBF. Continua valendo este estatuto, e este estatuto é a lei da CBF. Considerado que isso é verdadeiro, eu começaria por algumas questões que foram ficando pendentes e que vão orientar o meu raciocínio. Com referência às doações feitas às pessoas que disputaram a eleição de 1998, não é fato que elas sejam legais, não. Consultei também a CBF sobre isso, de lá obtive a resposta que seriam legais. Mas quero lhe dizer que essas doações ferem, em primeiro lugar, o estatuto. Os arts. 7º e 57 proíbem que sejam feitas essas doações, porque o art. 7º determina que: todos os recursos da CBF — estou lendo — serão empregados na realização de suas finalidades. Leio as suas finalidades, e nenhuma tem aqui apoiamento de candidatos para cargos eletivos. Ainda que fossem legais, essas contribuições se tornariam ilegais porque excederam o limite previsto pela lei eleitoral, segundo o deputado Jurandil Juarez: “Ferem, Sr. Presidente, a lei, porque a lei que rege essa matéria estabelece que as doações poderão atingir o máximo teto de 2% do faturamento das empresas. A lei estabelece que as doações têm que ser feitas no período eleitoral. A CBF fez doações pelo menos a dois candidatos — acho que se torna ocioso aqui citar os seus nomes — fora de prazo, depois de realizadas as eleições, portanto, depois que os comitês financeiros estavam fechados; e eles não concorreram a cargos majoritários, portanto não tinha o segundo turno. Por todas essas razões, Sr. Presidente, eu posso lhe assegurar que essas doações são ilegais. Claro que isso não atingirá os que receberam, não só porque receberam de boa-fé, mas porque os prazos para contestação, para que a própria Justiça Eleitoral fosse acionada, já se exauriram. Mas eu lhe pergunto: o que o senhor acha de uma situação dessas, em que em pelo menos quatro situações uma entidade tão bem dirigida por V.Sa. comete esse tipo de deslize? O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Excelência, o senhor tem os dados nas suas mãos, eu não os tenho. Chegando à CBF, vou verificar os dados, primeiro, e, segundo, pode haver, o senhor conhece isso melhor do que ninguém, opiniões diferenciadas sobre o mesmo assunto, juridicamente falando. Eu tenho que fazer uma análise e pedir um parecer a uma grande empresa de advogados para que configure realmente que isso tenha existido dessa forma, porque na realidade, em janeiro de 98, existe uma medida provisória em que todas as entidades que eram de fins não lucrativos deixaram de sê-lo, por uma medida provisória aprovada no Congresso Nacional. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Sr. Presidente, me desculpe, eu não estou fazendo julgamento de valor, não estou dando opinião. É possível, e por isso que disse que estou lendo no seu estatuto que o senhor continua sendo... a entidade continua sendo sem fins lucrativos, regida pelo seu estatuto. E no seu estatuto não há abertura para haver esse tipo de doações, o estatuto da entidade, que o senhor pode reformar, dar-lhe outra personalidade jurídica, permitir que isso aconteça. Bom, mas isso poderia configurar eventualmente o julgamento de valor, mas eu estou falando de fato. As doações ultrapassaram o teto estabelecido na lei e duas delas foram feitas. Uma, no dia 30 de outubro de 98. Ora, as eleições foram no dia 3 ou no dia 4, se não me falha a memória. Outra, no dia 9 de outubro de 98. Isso não é objeto de especulação, eu posso lhe dar o nome do cheque, a data estou lhe dando aqui, posso lhe dizer o banco e, como já foram até citadas algumas pessoas, não é do meu interesse citar quais foram as pessoas que receberam fora do período determinado pela lei. Por isso, quero lhe dizer que não se trata de um julgamento de valor, é o julgamento de fato; isto não é estatuto, não é receita federal, essa é a lei que orienta e que baliza esse tipo de procedimento.” O valor total doado - e declarado na contabilidade - pela CBF, em 1998, é de R$ 612.500,00. A Lei 9.504/97 estatui o limite de 2% do faturamento bruto da empresa doadora, no ano anterior ao das eleições. O faturamento bruto da CBF, em 1997, foi de R$ 28.097.358,00, já descontados os R$ 455.402,00 relativos a doações e subvenções que foram destinadas à CBF. Assim, mesmo na hipótese de que a CBF pudesse realizar doações, tese essa que é falsa, o valor doado representa 2,18% do faturamento da Confederação em 1997. Com isso, a CBF pode vir a ser apenada conforme estabelecem os parágrafos 2. e 3. do art. 81 da Lei, o que vale dizer que a CBF poderá pagar multas pelo excesso doado e poderá ficar proibida de firmar qualquer tipo de contrato com o Poder Público, durante cinco anos. A Lei 9.504/97, a Lei Eleitoral, estabelece em seu art. 81 o seguinte: Art. 81. As doações e contribuições de pessoas jurídicas para campanhas eleitorais poderão ser feitas a partir do registro dos comitês financeiros dos partidos ou coligações. § 1º As doações e contribuições de que trata este artigo ficam limitadas a dois por cento do faturamento bruto do ano anterior à eleição. § 2º A doação de quantia acima do limite fixado neste artigo sujeita a pessoa jurídica ao pagamento de multa no valor de cinco a dez vezes a quantia em excesso. § 3º Sem prejuízo do disposto no parágrafo anterior, a pessoa jurídica que ultrapassar o limite fixado no § 1º estará sujeita à proibição de participar de licitações públicas e de celebrar contratos com o Poder Público pelo período de cinco anos, por determinação da Justiça Eleitoral, em processo no qual seja assegurada ampla defesa. (g.n.) Além das doações declaradas a candidatos apoiados pela CBF, também se observa, através do fluxo das doações feitas às federações, que elas tendem a ser maiores nos períodos eleitorais. O que indica também aí o favorecimento de candidatos ligados à CBF. Por meio das tabelas e do gráfico tem-se uma idéia dos valores despendidos pela CBF em doações. Observa-se na tendência das doações, o objetivo de influenciar as eleições, de ampliar sua influência política elegendo sua “ bancada” federal, e mesmo prefeitos e vereadores. O gráfico evidencia que o fluxo de doações a federações estaduais se intensifica nos anos e meses em que há eleição. Veja-se o gráfico mostrando as doações da CBF às federações em 1998, 1999 e 2000. Após, tabelas com essas doações, por ano (1998 a 2000), obtidas da contabilidade da CBF. 0 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/2000 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/99 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/98 R$ CBF: DOAÇÕES PARA AS FEDERAÇÕES 1998 - 2000 1.000.000 800.000 600.000 400.000 200.000 MESES Em 1998 as doações intensificaram-se no período eleitoral, a partir de em setembro, chegaram ao máximo em dezembro desse ano, estendendo-se até janeiro de 1999, num valor total de R$ 1.885.768,00. Em 1999 as doações se mantiveram iguais durante o restante do ano, na faixa de R$300 mil por mês Em 2000, ano das eleições municipais, novamente as doações intensificaram-se depois de agosto, alcançaram o máximo em setembro – R$ 687.839,00 -- e a um total de R$ 2.178.093,00 até dezembro. DOAÇÕES PARA O DIRETÓRIO DO PFL MUNICIPAL DE NATAL, RN A CBF fez uma doação para o Diretório Municipal do PFL de Natal, RN, no valor de R$ 100 mil, em 19/9/2000, por meio do cheque do Banco Real, agência 003, número 53.446. Trata-se de mais um auxílio eleitoral ao Estado do Rio Grande do Norte, que reforça a hipótese de que a CBF esteja realizando doações para campanhas políticas por meio de repasse de recursos para a Federação de Futebol daquele Estado. O gráfico abaixo é claro: DOAÇÕES DA CBF PARA A FEDERAÇÃO DE FUTEBOL DO RIO GRANDE DO NORTE, NO ANO DE 2000 R$ DEZEMB NOVEMB OUTUBR SETEMB AGOSTO JULHO JUNHO MAIO ABRIL MARÇO FEVEREI JAN/2000 120.000 100.000 80.000 60.000 40.000 20.000 0 MESES Pode-se verificar que durante os meses mais próximos à data das eleições municipais de 2000 houve envio de mais recursos pela CBF. Em julho, o patamar é o de R$ 12 mil; em setembro, a Federação recebeu mais R$ 40 mil, em outubro mais R$ 100 mil e, em outubro, mais R$ 20 mil, além da mesada habitual. Outra característica dos repasses da CBF para as Federações é que, enquanto as Federações do Nordeste recebem a mesada de R$ 12 mil, a do Rio Grande do Norte, apenas, aufere R$ 12.780,00. Quanto ao cheque para o Diretório Municipal do PFL, ele não se encontra incluído nos repasses para a Federação. Caberá aos órgãos competentes examinar o uso desse dinheiro enviado pela CBF ao Diretório, bem como todos os repasses da CBF para Federações e clubes de futebol, em períodos eleitorais. DOAÇÕES PARA FEDERAÇÕES OU PARA CAMPANHAS ? Em depoimento feito a esta Comissão, em 9/5/2001, o presidente da Federação de Futebol do Mato Grosso, senhor Carlos Orione, confirmou que é costumeiro a CBF enviar às Federações dinheiro para campanhas eleitorais. O trecho em que Orione confirma isso está a seguir: O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – A Federação recebeu diversas doações em 98. Como foi um ano eleitoral dentro da... Foi um ano eleitoral dos dois lados, com eleição pra Presidente, Governador, Senadores, Deputados e também do Presidente da Federação... Presidente da CBF. O senhor acha que esse dinheiro foi com o intuito eleitoral? O SR. CARLOS ORIONE – Excelência, eu recebo isso acho que como uma ofensa, porque jamais eu iria vender o meu voto. Pela minha posição (ininteligível) no Estado do Mato Grosso. O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – Todas as federações receberam mais. O SR. CARLOS ORIONE – Eu sei, mas não em compra, em troca de voto, absolutamente. O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – Eu não estou dizendo que é compra de voto. O SR. CARLOS ORIONE – Eu tô entendendo V.Exa. como isso, como fins eleitorais. Para quê fins eleitorais? Eu recebi, eu recebi da CBF, do Dr. Ricardo Teixeira, uma importância de 50 mil reais que eu pedi que era pra mim ajudar alguns candidatos a Deputado estadual, federal, a Governador do Estado. O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - Eu ia chegar nessa pergunta. O SR. CARLOS ORIONE - Então, logicamente, esse... O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - Então, foi pra fim eleitorais? O SR. CARLOS ORIONE - Esses 50 mil foi pra eleitorais, não meu nem dele, foi pra fins eleitorais de candidatos ligados ao futebol de Mato Grosso, que me pediu esse... O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - Eu não perguntei, eu não perguntei se era pro senhor ou não. Eu te disse, ainda... Eu ainda disse que era uma eleição pra Deputados, Governador, Governadores... O SR. CARLOS ORIONE - Senadores. O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - ...Senadores e também do Presidente da CBF. O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha) - Aparte? O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - Perfeitamente. O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha) - É o seguinte, Sr. Carlos, não é a sua Federação, todas as Federações, na análise que nós fazemos, no ano de 98, aumentaram a contribuição da CBF para essas Federações. No depoimento do Deputado, do Sr. Ricardo Teixeira nós constatamos inclusive o registro da colaboração da CBF com campanhas eleitorais. O SR. CARLOS ORIONE - Certo. O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha) - Pelo estatuto há duas interpretações e que nós vamos discutir no nosso relatório. Há uma interpretação, de alguns, que a CBF pode fazer isso. E há de outros, advogados e Parlamentares, que não pode. Nós estamos nessa discussão. Ao fazer... O SR. CARLOS ORIONE - Eu só fiz a solicitação porque eu fiquei sabendo realmente que lá na CBF estaria, o Presidente estaria colaborando com algumas candidaturas. O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha) - Pois é. O SR. CARLOS ORIONE - Então, como esse pessoal é ligado ao esporte, muitos foram Presidente de clubes, alguns até já participaram da nossa administração, e eles... Só não vou declinar o nome, porque o senhor tá vendo, eu não vou declinar o nome das pessoas pra quem eu repassei, porque não foi em dinheiro, eu repassei em material esportivo. O material esportivo era recolhido pelos coordenadores das campanhas, mas eles tinham ciência do que estava fazendo. O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha) - Então, como Presidente do órgão, quero dizer pro senhor que, como o senhor foi convidado, o senhor pode deixar de declinar o nome. Se o senhor tivesse sido convocado, que foi até uma discussão que nós tivemos na Comissão de não fazer as convocações dos Srs. Presidentes porque a gente entendia que a colaboração pode vir sem tá convocado. Então, o senhor diz que não gostaria de declinar... O SR. CARLOS ORIONE – Não vou declinar. O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha) - ...e nós da Comissão gostaríamos muito que fosse declinado que houve colaboração da Federação Mato-Grossense de futebol em material para alguns candidatos no ano de 98. O SR. CARLOS ORIONE - Com recursos oriundos que vieram da CBF. O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha) - Com recursos oriundos da CBF. O SR. CARLOS ORIONE - A meu pedido. Com isso, pode-se concluir que a CBF doou muito mais dinheiro às campanhas de 1998 e de 2000, do que realmente consta em sua contabilidade. Para se ter uma idéia, basta apenas calcular o valor líqüido recebido pelas federações, debitando-se a mesada habitual, nos meses próximos às eleições. Tendo-se como base o ano de 1998, e considerando-se os meses de agosto de 1998 a janeiro de 1999, chega-se ao valor de R$ 1.885.768,00. Isso tudo, é claro, sem se contabilizar as doações oficiais. Somente em setembro de 1998, mês mais crítico em termos das eleições daquele ano, o excesso de doações foi de R$ 293.280,00. Há indícios de que grande parte do valor em excesso doado tenha sido dirigido para campanhas eleitorais nos Estados. Tanto em 1998, como em 2000, para campanhas dos próprios presidentes de Federações, como no caso de Sergipe, onde o presidente é prefeito de Macambira; Mato Grosso do Sul, onde o presidente é prefeito de Rio Negro; da Paraíba, onde o marido da presidente (e ex-presidente da Federação paraibana) é prefeito da cidade de Sossego; ou para Regeneração, no Piauí, onde o vicepresidente da CBF, Alfredo Nunes, se elegeu prefeito; ou em muitos casos, nos quais o presidente deva apoiar políticos locais. Há, inclusive, no caso de Alfredo Nunes, uma denúncia ainda não completamente apurada por esta CPI, de que ele teria sido eleito com recursos e materiais esportivos fornecidos pela CBF. Esse excesso, calculado apenas como hipótese, em quase R$ 2 milhões, demonstra que a CBF, além de não poder fazer doações para campanhas, vem doando muito acima do que a Lei permite para quem está habilitado a realizar doações. Sabe-se que a CBF é uma entidade sem fins lucrativos. É o que rege seu Estatuto e o que confirma a sua Assembléia Geral em reunião no dia 5/1/1998, quando estabeleceu que : “a Assembléia Geral decidiu, unanimemente, que, apesar do novo regime tributário, não deverá haver modificação no caráter das finalidades societárias da CBF, a qual continuará a ter fins não lucrativos, o que vale dizer, não distribuirá lucros. De acordo com tal critério aprovado pela Assembléia Geral, eventual resultado financeiro positivo, apurado entre a receita e despesa de um exercício, continuará sendo aplicado, como até agora, na manutenção e desenvolvimento da CBF e na consecução de seus objetivos estatutários”. (g.n.) Ver Anexo “Ata da Assembléia Geral da CBF, de 5/1/1998”. Todo dinheiro arrecadado pela CBF deve ser usado na consecução de seus objetivos estatutários. Além disso, a CBF é uma entidade que recebe recursos do exterior. Um dos exemplos são os recursos que recebe da multinacional Nike, e também da FIFA, que é uma entidade nos moldes da CBF, ou seja, a FIFA não é uma empresa comercial com fins lucrativos. Sabe-se que os valores recebidos do exterior são bastante expressivos. Apenas da Nike, a CBF recebeu nos últimos anos cerca de US$ 60 milhões. Com isso, a CBF, de fato, recebe recursos do exterior, que têm participação efetiva no conjunto de receitas da entidade. Mesmo que a CBF queira afirmar que não procurou montar uma “bancada da bola” na Câmara dos Deputados ou no Senado, as provas disso são irrefutáveis. Uma delas é o esquema montada em Brasília, com se verá neste Capítulo. FAVORECIMENTOS ESPECIAIS AO MUNICÍPIO DE PIRAÍ, RJ A CBF vem realizando doações, conforme tem-se verificado e já se tornou notório. Há casos, no entanto, que extrapolam a doação pura e simples, destinada a manter e promover uma bancada em Brasília. Há momentos em que a CBF realiza destinações de recursos atendendo a critérios pessoais de Ricardo Teixeira. Um desses casos é o da cidade fluminense de Piraí. Nesse município, Teixeira possui três fazendas: Santo Antônio, com 115,6 hectares, Santa Rosa, de 155,6 hectares e Fazenda Linda Linda, de 960,0 hectares. Um dos privilegiados, em 1998, foi o Deputado Estadual Arthur Henrique G. Ferreira. Esse parlamentar auxiliado pela CBF (leia-se Teixeira) foi eleito Deputado Estadual. Ele é de Piraí, cidade que indicou ao TRE/RJ como sendo a de sua residência. Qual seria a ligação entre a CBF e esse Deputado? Qual seria a ligação entre a CBF e o município de Piraí? O que vem, de imediato à mente, é o fato de a ajuda ter sido feita devido ao fato de Ricardo Teixeira ter suas fazendas naquele município. Outra doação para Piraí chamou mais a atenção desta Comissão. Foi uma doação feita pela CBF no dia 18/9/2000, às vésperas das eleições municipais do ano passado, para a Prefeitura de Piraí. Foram dois cheques: o de número 53.386, do Banco Real, agência 003, no valor de R$ 36.000,00 e o de número 53.388, no valor de R$ 14.110,00. O total foi de R$ 50.110,00. Chama a atenção o fato de que as doações da CBF têm um valor padrão de R$ 50.000,00. Essa doação foi repartida pelo motivo que será tratado a seguir. Um dos cheques, o de R$ 14.110,00, foi endossado por alguém supostamente com competência para fazê-lo, da Prefeitura de Piraí, e foi depositado na conta corrente do então vereador (e candidato a reeleição) de Piraí, Nilton Teixeira Crosgnac, do PFL, conta no Banco Itaú, agência 0688, número 09500-9. Essa agência do Banco Itaú, 0688, fica na cidade vizinha de Barra do Piraí, na Av. Gov. Portela, 158, centro. Há uma ligação entre Ricardo Teixeira e Nilton Crosgnac: há indícios fortes de que Teixeira seja sócio ou tenha sido sócio de Edelweis José Crosgnac na empresa Linda Linda Com. Ind. Ltda. Teixeira vendeu para Edelweis a parte que lhe cabia na empresa em 1997, por R$ 319,68, valor declarado à Receita Federal. Edelweis Crosgnac é, possivelmente, parente próximo do vereador Nilton Crosgnac. Ess ligação pode ser um dos motivos da doação para esse vereador de Piraí, RJ. O outro cheque no valor de R$ 36.000,00 foi depositado numa conta da Caixa Econômica Federal de Piraí. Não se sabe o destino desse dinheiro. Caberá ao órgão competente verificar para onde foi o valor que deveria ser destinado à Prefeitura de Piraí. Tudo indica que tenha sido para a campanha de reeleição do prefeito ou viceprefeito de Piraí. A CBF contabilizou essas despesas como sendo “Ajuda concedida à Prefeitura Municipal de Piraí”. Primeiro, o que a CBF tem a ver com a Prefeitura de Piraí? Somente Ricardo Teixeira tem. Que ajuda é essa feita às vésperas das eleições municipais, sendo que uma parte delas foi, escancaradamente, para a conta de um vereador, o senhor Nilton Crosgnac? Sem a menor dúvida, fica claro que essas “ajudas” tiveram como fim o auxílio oculto a campanhas eleitorais municipais de Piraí. Sem se considerar o fato de que a CBF não pode fazer doações, a entidade o fez de maneira indireta, fugindo completamente dos seus objetivos estatutários. Cabe refletir se o presidente atual da CBF pode continuar agindo como se a entidade fosse mais uma de suas muitas empresas. Ficam os órgão competentes de natureza eleitoral, o Ministério Público, compelidos a investigar essas doações até o fim, para que se possa apurar as responsabilidades das pessoas que foram indevidamente favorecidas e quem burlou a lei. E mais uma vez, cabe à sociedade reivindicar seus direitos, por meio de ação judicial pertinente tendo em vista o desvio de finalidades ocorrido, como meio de promover a devolução dos recursos desviados novamente para a CBF. A CASA DE BRASÍLIA E O LOBBY DA CBF A CBF mantém alugada uma casa em Brasília, numa das regiões mais valorizadas da cidade. A casa fica numa chácara no Lago Sul, SHIS, QI-15, chácara 2, lote 15. O aluguel é, atualmente, de R$ 15.747,00. É alugada de uma empresa, que se diz proprietária do imóvel, que se chama CCL Comércio e Serviços Ltda., CGC 00.737.486/0001-45 (ver Anexo “Contrato CBF CCL Aluguel”). Essa empresa tem como sócios Dannyel Carvalho Coelho e Dannyela Carvalho Coelho. O procurador da empresa é o senhor José Maria Gonçalves Coelho. O contrato de locação contém uma série de irregularidades. Verificou-se que o imóvel pertence, na verdade, a José Maria Gonçalves Coelho, ao que tudo indica, pai de Dannyel Coelho. A CCL tem capital social de apenas R$ 10.000,00, enquanto o imóvel deve valer mais de R$ 1 milhão de reais. Daí se infere que possa estar ocorrendo, no mínimo, sonegação fiscal por parte da empresa CCL ou do senhor José Maria Gonçalves Coelho. A casa foi alugada pela CBF, por intermédio do presidente da Federação Metropolitana de Futebol, Weber Magalhães. E é administrada pelo irmão de Weber, Wagner de Azevedo Magalhães. O contato, pelo que consta, foi feito com Dannyel Coelho, que é presidente da Federação Brasiliense de Boliche. Um outro problema é o endereço da empresa. No contrato, consta “QI 13, Bloco H, sala 203, SHIS, Brasília, DF”. Nesse endereço não existe a empresa. No registro na Junta Comercial do Distrito Federal, consta sala 103. Além disso, os cheques da CBF sempre tiveram como destinatários uma empresa de nome diverso: CCL Comércio e Construção Ltda. Essa empresa, a CCL, segundo dados do seu registro junto à Junta Comercial, tem como atividades econômicas: comércio varejista de material de construção, e higiene, limpeza e outros serviços. . Além disso, o contrato de aluguel não tem firmas reconhecidas e não há avalistas. Consta na Cláusula 6a do contrato que: A) O imóvel destina-se exclusivamente ao uso da Confederação Brasileira de Desportos (sic) que fará dele o uso relacionado a suas finalidades estatutárias, sendo proibido ao Locatário sublocá-lo, cedê-lo ou emprestá-lo no todo ou em parte, seja a que título for”. As finalidades estatutárias da CBF estão listadas nos nas letras “a” a “o” do art. 2. do Estatuto da CBF. Não se encontra, dentre elas, alguma que se ajuste à necessidade de a CBF ter uma casa em Brasília. Talvez, merecesse exame mais profundo a necessidade de se transferir a sede da CBF para Brasília, e não manter uma unidade lobista tão cara. Para se ter uma idéia do custo Brasília para a CBF, tem-se os seguintes números: Item Aluguel IPTU Administração Diretor Brasília TOTAL 1998 145.551 7.722 99.747 253.020 1999 155.636 7.746 205.939 116.492 485.813 2000 175.860 9.996 196.430 278.433 660.719 TOTAL 477.047 25.464 502.116 394.925 1.399.552 Pode-se verificar que o custo Brasília vem crescendo muito nos últimos três anos, quase 50% a cada ano. DOAÇÕES : “ARRANJE UM RECIBO ” Entre muitos exemplos de doações feitas, um é peculiar. A CBF fez uma doação para um clube catarinense, o Joinville, no valor de R$ 60 mil, no final de 1998. Esse fato foi denunciado por esta Comissão, durante o depoimento de Teixeira, em 10/4/2001. No dia seguinte, o clube foi aos jornais avisar que nunca havia recebido esse dinheiro. E que ele teria ficado com um vice-presidente da CBF, José Jorge Pio. Em audiência pública realizada em Florianópolis, dia 7/5/2001, o senhor Pio confirmou isso: “O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - (...) Como que o Joinville solta nota na imprensa que não recebeu o dinheiro e o senhor diz que recebeu? E esse recibo em nome do Joinville, como foi feito? O SR. JOÃO JORGE PIO - Foi... Desde a primeira notícia eu declarei à imprensa e vou declarar hoje de novo: em 8 de outubro, eu tava a serviço da CBF, caí no aeroporto em Cumbica e fraturei o braço. Aí vim pra Joinville, o Joinville me colocou dois dias no Hospital Dona Helena, em Joinville, e me pagou a despesa. (...) O único que é remunerado é o Presidente. Aí eu pedi uma ajuda pra ele, porque ia ficar muito tempo parado, e ele me disse: “Não, se tu me conseguir um recibo, um recibo, eu te dou uma ajuda de 60 mil reais.” Aí, solicitei o Presidente do Joinville na época esse recibo”. (...) Tanto é que quando eu pedi pra CBF pra me dar um documento eles me mandaram os dois recibos e disseram: “Oh, aqui, do Joinville não consta nenhum pedido de verba pro Joinville.” E, de fato, lá na CBF, o Dr. Salim, que era o Departamento Financeiro, e o Dr. Marco Antônio, os dois que assinavam os cheques da CBF: “Se tu me arrumares um recibo, eu te arrumo essa quantia.” E arrumei o recibo, e eles me deram em 3 ou 4 pagamentos. Agora, quero deixar bem claro pra esta Comissão: cheque de 50 mil reais eu não recebi. Nu... E não... E esses 60 mil reais eu acho que foi um ou dois cheques, e o resto eles me deram em dinheiro. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - E o dinheiro o senhor pegou na CBF ou pegou no Joinville? O SR. JOÃO JORGE PIO - Não, não. Na CBF. Eu podia chegar e dizer, na hora que a imprensa me procurou: “Peguei o dinheiro e dei pro Presidente do Joinville.” Não. Não aconteceu isso. Ele apenas me deu o recibo pra mim prestar contas na CBF. Eu ainda perguntei: “Mas não pode ser um recibo meu?” “Não, não pode. Tem que ser um recibo de uma firma ou de um clube, de uma doação.” “Tudo bem.” Aí eu consegui.” (g.n.) Pio obteve com o Joinville dois recibos, um de R$ 10 mil e outro de R$ 50 mil, com promessa de que a CBF iria auxiliar na reforma do estádio local. O clube forneceu, antecipadamente, os recibos para Pio, não tendo, depois, recebido valor algum. Pio, sozinho, embolsou os R$ 60 mil. Em resumo, Pio recebeu R$ 60 mil, em dinheiro na CBF, sem que esse valor tivesse sido contabilizado pela entidade. Ricardo Teixeira, Marco Antônio Teixeira e José Carlos Salim recomendaram a Pio que providenciasse um recibo para que eles pudessem dar a ele uma ajuda daquele valor. Tinha de ser um recibo de firma, de clube, de uma doação. (Cheques em referência estão no Anexo 03 – Pasta Sigilo Bancário 17). CAPÍTULO IX – DECLARAÇÕES DE RENDA DE RICARDO TEIXEIRA O valor real do patrimônio pessoal de Ricardo Teixeira é insondável, mas com certeza é superior àquele que aparece nas suas Declarações de Renda. Para comprovar essa afirmação, basta fazer referência a algumas propriedades não declaradas, como a mansão que possui no balneário de Búzios (RJ) e à mansão, igualmente não declarada até 2000, em Miami, Florida, USA. Esse costume de sonegar informações à Receita Federal não vem de agora. Por isso, Ricardo Teixeira foi condenado a seis anos de prisão por sonegação fiscal pela Justiça Federal do Rio de Janeiro, em novembro de 2000. O juiz Flávio Oliveira Lucas sentenciou: “Julgo procedente a pretensão punitiva deduzida na denúncia para condenar o acusado RICARDO TERRA TEIXEIRA, qualificado nos autos, como incurso nas penas do artigo 1, inciso I da Lei 8.137/90, por três vezes, na forma do artigo 69 do Código Penal (...) Destarte, chega-se à pena definitiva de seis anos de reclusão e 300 diasmulta , cada um deles no valor acima declarado (200 UFIR) (...) A pena privativa de liberdade será cumprida em regime semi-aberto (...) Concedo ao sentenciado o direito de recorrer em liberdade, considerando sua primariedade e bons antecedentes (...) Transitada em julgado esta sentença, expeça-se mandado de prisão...” Assim, por ser primário, o condenado Ricardo Teixeira pôde recorrer da sentença em liberdade. O escritório Couto de Assis Advogados, que recebe R$9.850,00 reais por mês da CBF, para defender Teixeira (o que já configura uma irregularidade, e caberia às federações cobrar do presidente da CBF), propôs o encerramento do processo argüindo sua prescrição. O processo continua em curso na Justiça. A análise feita por esta CPI das declarações de renda de 1997 a 2000 do presidente da CBF encontrou falhas e inconsistências que certamente ainda serão questionadas pela Receita Federal. Algumas delas: a) Desde 1997 Ricardo Teixeira declara a propriedade de cinco apartamentos. Mas não declarou a renda desses imóveis em nenhum desses anos. Não estão alugados? Estão fechados? Estão emprestados? Em seu depoimento à CPI em 10/4/01, Ricardo Teixeira disse apenas que esses apartamentos não estão gerando renda. b) Na sua declaração de renda de 97 (ano base 96) consta um pagamento de R$140 mil reais à empresa MB DTVM. Uma empresa que, segundo os registros, está encerrada desde 1991. c) Na Declaração de 98 (ano base 97) declara envio de 200 mil reais para sua empresa Rio Port, mas na sua movimentação bancária do ano há cheques no valor de 500 mil reais para essa empresa. Qual o motivo para essa diferença? d) Na declaração do mesmo ano, declara empréstimo de 299 mil reais à empresa City Port Bar e Restaurante. Mas na sua movimentação bancária não há nenhum lançamento para essa empresa. Qual o motivo dessa ausência? e) Em 1999, apesar de transferir 924 mil reais em bens para sua exesposa Lúcia Havelange, seu patrimônio não diminuiu. Seus rendimentos declarados aumentaram em 251,53% em comparação com 98. Declarou 329 mil reais recebidos da CBF e 974 mil de ganhos no mercado financeiro. INCONSISTÊNCIAS NAS DECLARAÇÕES DE RENDA 1. Declaração do IR 1997 – Calendário 1996 Observação 5 apartamentos declarados Título de sócio do Iate Clube do RJ, adquirido de Alex Silva da Rocha. Cheques nominais ao El Turf Pagamentos à MB DTVM Valor Carnet Leão ? R$ 12.000 Rendimentos do rest. El Turf R$ 8.800 Veículo marca espero, D10, Daewoo, não consta na declaração de 96. Na de 97 aparece nas 2 colunas R$ 19.398 R$ 60.000 R$ 140 mil Comentário Não há renda de aluguel Movimento bancário de R$ 4.000,00 no IRPF nada consta Inst. Cancelada em 1991 emitiu cheques R$ 280000 Não tem registro no Renavam. 2. Declaração de 1998 – Calendário 1997 Observação 5 apartamentos declarados Aquisição de carro usado (volvo 850) à CBF Cheques p\ Rio Port Cheques p\City Port Bar e Rest. Valor Sem carnet leão R$ 46 mil R$ 500 mil Nihil Comentário Não há renda de aluguel Ano seguinte, perda total no IRPF = R$ 200 mil Na IRPF = R$ 299 3. Declaração 1999 – Calendário 1998 Observação 5 apartamentos declarados El Turf Cheques p\ Rio Port Cheques p\ City Port Bar e Rest, Valor Sem carnet leão R$ 13 mil IRPF 200 mil IRPF 349634 Comentário Não há renda de aluguel Chq. R$ 513 mil Chq. 200 Rend. 00 Cheques=00 Rend.R$0 4. Declaração do IR 2000 – Calendário 1999: Observação 5 apartamentos declarados Valor Carnet leão Aquisição imóvel lote 05, quadra 10,rua vereador Crispin da Fonseca, adquirido de Edivaldo Gerônimo da Silva Transferiu bens p\ Lúcia Havelange R$ 190.000 Em relação ano anterior, rendimentos cresceram 251,53 % R$ 329 mil R$ 974 mil Elevada soma em cc e no “cofre” particular R$ 360 mil + R$ 712 mil R$ 924 mil City Port bar Comentário Não há renda de aluguel Não há movim. bancária correspondente Patrimônio não diminuiu CBF pagou a mais. Ganhou no merc. fut. a+ Chq. R$ 88,1 APLICAÇÕES NA BM&F Ricardo Teixeira vem realizando muitas aplicações financeiras nos últimos cinco anos. Em geral, referem-se a apostas em dólar futuro, na Bolsa de Mercadorias e Futuros. Para se ter uma idéia da sua competência nesse ramo, basta examinar alguns de seus ganhos recentes. Apenas em janeiro de 1999, ganhou cerca de R$ 877 mil. Esse ganho é resultado da aposta na desvalorização do real ocorrida em janeiro de 1999. Ganhou exatamente nos dias seguintes àquele fato, como demonstram os relatórios da BM&F recebidos por esta CPI. Ricardo Teixeira confirmou que acreditava na desvalorização do real, durante seu depoimento de 10/4/2001. Ele afirmou que qualquer pessoa que tivesse informações sobre a queda do presidente do Banco Central saberia que o dólar iria descolar. Essa afirmação sugere que Teixeira pode ter tido informações privilegiadas, devendo aquela operação ser examinada devidamente. Foram encontradas, também, inconsistências entre as informações relativas às aplicações no mercado futuro, constantes nas declarações de renda, e os relatórios encaminhados pela BM&F e pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Caberá à Receita Federal, à CVM e ao Ministério Público Federal examinar essas operações e apurar sua regularidade. A CVM, especialmente, deverá verificar o cumprimento das normas contidas na Instrução CVM n° 301, de 16/4/1999. (Documentos de referência: Ricardo Teixeira Anexo 04 – Sigilo Bancário Pasta 08). AS EMPRESAS DE RICARDO TEIXEIRA NO BRASIL Na Declaração de Renda de 2000 (Ano Calendário/99), Ricardo Teixeira declarou ser sócio ou proprietário das seguintes empresas, todas em território nacional. Não declarou nenhuma empresa fora do Brasil: - Fazenda Linda Linda, em Barra do Piraí; - Fazenda Santo Antônio, Barra do Piraí; - Cotas de capital da empresa RLJ Participações (R$ 152.77,29); - Cotas de capital da empresa LR da Barra Veículos, que declara ter vendido em 1999; - 50 mil cotas de capital da empresa Casa do Chopp 2001 Bar e Restaurante (R$ 48.500,00); - Cotas de capital da empresa El Turf Bar e Restaurante (R$ 12.572.00); - 1.600 cotas de capital da empresa El Turf Bar e Restaurante adquiridas de Guilherme Teixeira (R$ 100.000,00); - Ações de Minas Investimentos S/A (R$ 5.060,00); 90.000,00); valores). - Cotas de capital da empresa City Port Bar e Restaurante (R$ - Subscrição de cotas da empresa Rio Port View (sem referência a O Banco Central identificou mais essas outras empresas de Ricardo Teixeira, que não foram declaradas: - UNEMIL União Nacional de Empreendimentos e Participações; (não foi declarada) (Obs. No depoimento à CPI (10/04/01), indagado sobre a UNEMIL, Ricardo Teixeira respondeu apenas que essa empresa estava cancelada. Mas só foi cancelada em abril de 2000. Portanto, deveria ter sido declarada à Receita nos anos anteriores.) - Minas Investimentos Empreendimentos e Administração Ltda; (não foi declarada) - Joio Empreendimentos e Participações Ltda; (não foi declarada) - Minas Investimentos Condomínio de Seguros Sociedade Civil Ltda.; (não foi declarada) declarada) - Minas Investimentos Corretora de Seguros Ltda.; (não foi - Agropecuária Santa Rosa Ind. E Comércio Ltda; (declarada, mas como Fazenda Santa Rosa). Em investigações paralelas identificamos com mais detalhes algumas dessas empresas: EMPRESAS EM QUE RICARDO TEIXEIRA E JOÃO HAVELANGE SÃO SÓCIOS “O SR. JOÃO HAVELANGE - Eu lhe digo: eu fico tão triste de ouvir isso! Eu quando fiz o meu primeiro Imposto de Renda foi em 1940, quando eu vim trabalhar em São Paulo, e eu faço até hoje. O pouco ou tudo que tenho está estipulado no meu Imposto de Renda, e, dentro desse Imposto de Renda, como eu consegui comprar um apartamento ou isso ou aquilo. E posso lhe dizer o que possivelmente vai estarrecer quem está aqui: eu nunca comprei uma coisa para mim; o pouco que tenho está tudo no nome de minha mulher. Se eu me separar, eu tenho que começar do zero, pelo respeito que eu tenho à minha família. Este é um ponto.” Quando de seu depoimento como convidado a esta CPI, João Havelange declarou-se pobre e enfatizou que o pouco que tem está em nome de sua mulher. Talvez não tenha se lembrado. Mas alguma coisa ele tem em seu nome, pois é sócio de seu ex-genro Ricardo Teixeira em algumas empresas do grupo MINAS INVESTIMENTOS. Consultado, o Cartório de Registros de Minas Gerais informa que existe uma empresa chamada Minas Investimentos Empreendimentos e Administração Ltda., com o mesmo CNPJ de uma antiga empresa de Ricardo Teixeira -- a Minas Investimentos S/A, Empreendimentos e Administração – ADMINAS -- na qual ele é sócio de João Havelange e outros. De acordo com os registros da Junta Comercial de Minas Gerais, localizamos três empresas cujos sócios são os mesmos, ainda que em funções diferentes em cada uma delas. São: MINAS INVESTIMENTOS EMPREENDIMENTOS E ADMINISTRAÇÃO LTDA. MINAS INVESTIMENTOS CONDOMÍNIOS DE SEGUROS SOCIEDADE CIVIL LTDA. UNEMIL UNIÃO NACIONAL DE EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES. Os sócios dessas três empresas são: RICARDO TERRA TEIXEIRA MARCO AURÉLIO TEIXEIRA GUILHERME TERRA TEIXEIRA JEAN MARIE FAUSTIN GODEFROID HAVELANGE A seguir, histórico de algumas dessas empresas: 1. MINAS INVESTIMENTOS S/A EMPRENDIMENTOS ADMINISTRAÇÃO LTDA - ADMINAS - CNPJ 17.496.431/0001-93 E Foi aberta em 31/03/1971, em Belo Horizonte, rua do Catete, 272 bairro de Barroca. 2. MINAS INVESTIMENTOS CONDOMÍNIO LTDA. DE SEGUROS SOCIEDADE CIVIL Alteração de contrato social da empresa em 12/01/1989. Transferência de sede para Travessa do Ouvidor, 38 - 3º andar - Rio de Janeiro. (Belo Horizonte, 26/04/1989). 3. UNEMIL UNIÃO NACIONAL DE EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES S/A - CNPJ 17.362.237/0001-15 Aberta em 22/09/1981. End. Rua Pedra Bonita, 1114 - Barroca - Belo Horizonte (mesmo bairro da Minas Investimentos). Sócios: Responsável e Diretor -- RICARDO TERRA TEIXEIRA QSA incluído em 18/09/1990. Diretor -- GUILHERME TERRA TEIXEIRA QSA incluído em 18/09/1990. Diretor -- JEAN MARIE FAUSTIN GODEFROID HAVELANGE QSA incluído em 18/09/1990. Diretor --MARCO AURÉLIO TEIXEIRA QSA incluído em 18/090/1990. Essa empresa foi cancelada em 07/04/2000. 4. MINAS INVESTIMENTOS S/A CRÉDITO E FINANCIAMENTO, que era a empresa mais ativa do grupo de Ricardo Teixeira, foi vendida por ele. As empresas restantes do grupo ficaram a partir daí praticamente inativas, sem pagar impostos. Entretanto, uma delas, a ADMINAS, aparece em 1996 como proprietária da casa de Búzios. 5. ALTERAÇÃO DE CONTRATO SOCIAL: Em 12/01/2000. Minas Investimentos S/A Empreendimentos e Administração ADMINAS teve seu nome alterado para MINAS INVESTIMENTOS EMPREENDIMENTOS E ADMINISTRAÇÃO LTDA. CNPJ é o mesmo: 17.496.431/0001-93 Sócios-gerentes: RICARDO TERRA TEIXEIRA - 5.060 cotas; UNEMIL União Nacional de Empreendimentos e Participações S/ª -17.940.000 cotas. De Serviços gerais financeiros, e da qual João Havelange é sócio. A composição societária da empresa MINAS INVESTIMENTOS EMPREENDIMENTOS E ADMINISTRAÇÃO LTDA.: Responsável e sócio-gerente: RICARDO TERRA TEIXEIRA QSA alterado em 12/01/2000 Diretor: GUILHERME TERRA TEIXEIRA QSA alterado em 28/08/1990. Sócio; UNEMIL : União Nacional de Empreendimentos e Participações S/A QSA incluído em 12/01/2000. (da qual João Havelange é sócio). Alguns meses depois -- 07/04/2000 -- a UNEMIL e suas duas filiais tiveram seu registro cancelado. 6. A empresa MINAS INVESTIMENTOS CONDOMÍNIOS DE SEGUROS também continua existindo. Esses registros contradizem declarações de Ricardo Teixeira, feitas em sucessivas entrevistas à imprensa, na qual afirmava que havia vendido a empresa Minas Investimentos. Vendeu apenas a financeira do grupo, que continuou sendo de sua propriedade. Ele também se equivocou em seu depoimento à CPI quando disse que a empresa remanescente é a MINAS INVESTIMENTOS – ADMINAS. Segundo o registro do Cartório, essa empresa foi substituída pela MINAS INVESTIMENTOS EMPREENDIMENTOS E ADMINISTRAÇÃO LTDA., em 12 de janeiro de 2000. NEGÓCIOS DA EMPRESA MINAS INVESTIMENTOS A MANSÃO EM BÚZIOS O Imóvel de Ricardo Teixeira em Búzios é uma mansão composta por três prédios, localizados sobre um terreno de 1.460 m2, na Praia do Canto, uma das mais valorizadas do balneário mais caro do Brasil. Foi avaliada recentemente por agente imobiliário local em pelo menos 1 milhão de reais. Não está em seu nome, mas no da empresa Minas Investimentos, de sua propriedade. A história do terreno e da mansão: em 1984 Renato Mendonça Pacote obteve aforamento de terreno da Marinha, pertencente à União, para domínio útil do imóvel contra pagamento de foro anual. Ali construiu três casas de boa qualidade, uma com quatro suítes, as outras duas com três quartos cada uma. Na verdade, é uma mansão, com várias dependências autônomas. Em 1994, dez anos depois, Renato Pacote assinou contrato de promessa de venda a Octávio Koeler Plácido Teixeira Júnior dos imóveis por 39.9 milhões de cruzeiros, equivalente em reais a 14.509,09 (cerca de 16 mil dólares, pois na ocasião o real valia mais que o dólar). Chama atenção o preço pelo qual o imóvel foi vendido, aparentemente muito abaixo do preço de mercado. O registro da venda em escritura deu-se em 9 de setembro de 1996. Nota: Octávio Koeler Plácido Teixeira mora no Rio de Janeiro, empresário, é proprietário da SWAP Sociedade Corretora de Câmbio Ltda. Ele tem um sócio na SWAP, Renato Tiraboschi, que também é sócio de Ricardo Teixeira no Restaurante El Turf. Na declaração de renda de 1999 de Ricardo Teixeira Tiraboschi aparece como credor de um empréstimo de R$ 97.313,00. A SWAP SOCIEDADE CORRETORA DE CÂMBIO LTDA. presta serviços de corretagem – empréstimos no Exterior, compra e venda de moeda estrangeira - à CBF. Durante os anos de 1997/98/99 recebeu vinte cheques da CBF no valor aproximado de R$ 1,1 milhão, conforme comprovantes em mãos desta CPI. Em 18 de outubro de 1996, o mesmo Octávio Koeler Plácido Teixeira vendeu o imóvel para a empresa Ameritech Holding Ltd. , pessoa jurídica estrangeira, existente e organizada segundo as leis das Ilhas Virgens Britânicas. O preço ajustado foi o mesmo pelo qual Octávio havia comprado o imóvel, de Renato Pacote, 39.9 milhões de cruzeiros, equivalentes a R$ 14.509,09. O imóvel continuava, portanto, sendo negociado por preço muito abaixo do mercado. A Ameritech Holding foi representada no negócio por um procurador, Sérgio Isidoro Eskenazi Pernidji, advogado do Rio de Janeiro., A procuração havia sido passada em 14 de novembro de 1993, na Cidade do Panamá. Nota: À época Sérgio Eskenazi era advogado da CBF – Confederação Brasileira de Futebol (temos cheques da CBF para ele) e também do sr. Ricardo Teixeira. Apesar dessa aparente familiaridade, em seu depoimento à CPI Ricardo Teixeira negou ter qualquer relação com a empresa Ameritech Holding Em 06 de outubro de 1997 registrou-se promessa de venda do terreno, da Ameritech Holding Ltd. para Minas Investimentos S.A. Empreendimentos e Administração, que, como vimos, é de propriedade de Ricardo Teixeira. O preço foi de R$500.000,00 – quinhentos mil reais – algo como 500 mil dólares à época, integralmente recebidos (pagos à vista). Na venda, a Ameritech foi representada por outro procurador, Luiz Eduardo Landim Balthazar, engenheiro, procuração passada em 17 de junho de 1997, na Cidade do Panamá. Nota: à época, Luiz Eduardo Landim Balthazar era gerente do restaurante Chopp 2001, de propriedade de Ricardo Teixeira, e sócio do presidente da CBF. Pela Minas Investimentos assinou o sr. Marco Aurélio Teixeira, irmão de Ricardo Teixeira, diretor da empresa Minas Investimentos, da qual Ricardo também é sócio. No registro de imóveis de Búzios o número do CNPJ da empresa Minas Investimentos S/A é 17.966.431/0001-93, o que confere com seu registro de CNPJ no Cartório de Registro de Imóveis de Minas Gerais. O endereço apresentado – Rua Pedra Bonita, 1114, em Belo Horizonte –MG, não é o que consta no Registro de Imóveis (Rua do Catete, 272 – BH). Aquele é o endereço de outra empresa de Ricardo Teixeira, João Havelange, Marco Aurélio Teixeira e Guilherme Teixeira, a UNEMIL União Nacional de Empreendimentos e Participações S/A . INDÍCIOS DE ILICITUDE É notável a valorização do imóvel em 33 vezes no período de um ano, enquanto havia se mantido sem valorização durante os anos anteriores, sendo inclusive vendido por Octavio Koeler Plácido Teixeira pelo mesmo preço que havia comprado, o que não parece razoável, ainda mais num local tão valorizado. Esses fatos são indícios que essa tenha sido uma negociação forjada entre parceiros de negócios. Seja a Ameritech Holding ou não de propriedade de Ricardo Teixeira, (na compra,o procurador da Ameritech foi Sergio Eskenazi, seu advogado; na venda Balthazar Landim, seu sócio), o negócio dessa empresa com a Minas Investimentos é suspeito. Aqui há duas hipóteses: a) A Minas Investimentos nada pagou à Ameritech, forjou-se o negócio apenas para transferir a propriedade da mansão à empresa de Ricardo Teixeira, o que caracteriza falsificação de documentos; b) Ou os US$500mil dólares foram pagos à Ameritech, importância foi enviada para as Ilhas Virgens Britânicas, o que caracteriza operação de evasão de divisas. essa uma SONEGAÇÃO DE IMPOSTO DE RENDA Em suas declarações de renda de pessoa física de 1997 a 2000 Ricardo Teixeira nunca declarou ser proprietário da mansão de Búzios.. Ele declarou apenas deter cotas de pequeno valor da Minas Investimentos, R$5.060,00. Não tivemos acesso à declaração de renda da Minas Investimentos. Se não declarou a comprou da mansão, a Minas Investimentos cometeu crime de sonegação fiscal. Como Ricardo Teixeira é sócio gerente dessa empresa ele é o principal responsável. Outros indícios, ver item que trata, a seguir, da lavagem de dinheiro. INDÍCIOS DE ENTRADA IRREGULAR DE DINHEIRO NO PAÍS Em 26/09/1996 El Turf Bar e Restaurante tomou um empréstimo no Banco Real de Nova York a Valor US$ 2.500.000,00, com juros de 1.25% ao ano acima da Libor . O negócio foi feito na agência do Banco Real em São Paulo, para ser pago em largo prazo, em 16 prestações semestrais até 26/09/2004. O Intermediário foi o Banco Real de Investimento S/A. (Atual Banco Alfa de Investimentos S/ª). Ricardo Terra Teixeira assinou como Creditado. E também como Avalista. Atenção para o texto, em inglês, do ofício do Banco Real S/A New York ao Banco Real de Investimento, São Paulo, Brasil: no parágrafo central o texto diz algo assim: “ ...se o devedor não puder honrar o pagamento do empréstimo para você em Reais na data da liquidação, você (Banco Real de Investimentos/ S. Paulo) não será obrigado a depositar o equivalente em reais no Banco Central do Brasil, o qual, por sua vez, não será obrigado a remeter o equivalente em dólar para nós (Banco Real Nova York). QUER DIZER, O DEVEDOR NÃO PRECISA PAGAR. Não foram encontrados na documentação do Banco Central registros dos pagamentos das parcelas do empréstimo. Até 26/03/01 deveriam ter sido pagas nove dessas parcelas. Por sinal, o Banco Central está examinando esse empréstimo não usual desde 1998. Mas tem havido um retardo inexplicável no desenvolvimento do processo, o que pode levar em algum tempo à prescrição do provável ilícito. Pelo atraso imotivado, recomenda-se medida judicial contra o Banco Central. Outros negócios feitos pelo Restaurante El Turf no mercado financeiro internacional : a) empréstimo do Delta Bank para El Turf – de R$ 843.262,50 - Em 20/04/1999, o El Turf Bar e Restaurante fez um empréstimo deste valor junto ao DELTA BANK. b) pagamento de juros ao RURAL INTERNATIONAL BANK LTD. – Em 07/07/2000 o El Turf Bar e Restaurante enviou para o Exterior US$112.270,50 sob a rubrica de juros. Provavelmente para pagamento de juros do empréstimo acima. Em suma, fica caracterizada a intensa movimentação de capitais feitas pelo El Turf no mercado financeiro, importâncias que excedem em muito as necessidades de investimento de uma empresa desse tipo. Tais fatos merecem a atenção do Banco Central, pois podem estar ligados a transferências ilegais de capitais, caracterizando evasão de divisas ou outro crime. Quanto ao El Turf, há ainda algo importante a ser examinado. Ricardo Teixeira afirmou, em seu depoimento a esta CPI, que o El Turf tem um faturamento grande, pelo que se pode observar, via as notas taquigráficas daquele depoimento: “O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – (...) Porque eu estava analisando aqui e observando um certo relacionamento entre o El Turf Bar e Restaurante e a CBF. O El Turf Bar e Restaurante é de V.Sa. Eu nunca estive lá, não conheço, deve ser um bar e restaurante muito grande, não deve ser um espaço pequeno, até porque, pelos valores que pega emprestado, como pegou do Banco Real de Nova Iorque, 2 milhões e meio de dólares, eu imagino que seja um bar e restaurante com uma área bastante grande. E, em 98, o El Turf emitiu notas fiscais para a CBF em diversas ocasiões. E o que chama a atenção é que, pelo tamanho do bar e pelo tamanho que deve ter sido investido lá, deve ter um movimento muito grande. Qual é o movimento do bar e restaurante? O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA – Só para responder parcialmente, é realmente grande. Seguramente, é o maior do Rio de Janeiro. Eu só queria fazer uma correção. Ele não tem empréstimos do Banco Real de Nova Iorque, até porque não existe Banco Real de Nova Iorque. Ele tem empréstimos do Banco Real do Brasil.” (g.n.) Ou seja, o El Turf tem um faturamento invejável. Um restaurante como esse, que toma empréstimos de US$ 2.500.000 deve ser realmente de porte. O próprio Teixeira afirma ser o El Turf o maior do Rio de Janeiro. O que é estranho nesse caso é fato de Ricardo Teixeira não ganhar nada, nos últimos anos, com o maior restaurante carioca. Abaixo, estão relacionados os ganhos obtidos por Teixeira, retirados do El Turf: Ano Calendário 1995 1996 1997 1998 1999 Rendimentos (R$) 9.450,00 8.800,00 0,00 0,00 0,00 I. Renda na Fonte (R$) 2.450,00 0,00 0,00 0,00 0,00 Observa-se que Teixeira não declara retiradas do El Turf desde 1997. No entanto, de acordo com documentos de posse desta Comissão, ele emitiu cheques ou DOCs para o El Turf nos valores abaixo: Ano Calendário 1995 1996 1997 1998 1999 Valor enviado (R$) 60.000,00 280.000,00 100.000,00 13.000,00 500.000,00 Os valores de 2000 não são conhecidos ainda porque o Banco Real (ABN AMRO Real) não entregou a esta Comissão os documentos exigidos, mesmo tendo sido cobrado. Os dados acima podem ser verificados em todos os Anexos 4, que deverão fazer parte deste Relatório. São completamente incoerentes os valores pagos por Teixeira com os que ele declara à Receita Federal. A movimentação financeira entre Teixeira e o El Turf demonstra indícios de sonegação fiscal. O quadro abaixo sintetiza essas divergências, incluindo-se os empréstimos feitos por Teixeira para o El Turf: Ano Calendário Rendimentos de RT no El Turf Valor enviado por RT para El Turf (R$) 1995 9.450,00 1996 8.800,00 1997 0,00 1998 0,00 1999 0,00 Soma 17.450,00 1 Informado por Ricardo Teixeira à Comissão em maio de 2001 60.000,00 280.000,00 100.000,00 13.000,00 500.000,00 953.000,00 Empréstimo de RT para El Turf declarados à SRF 0,00 0,00 40.000,00 13.000,00 0,00 53.000,00 Faturamento do El Turf (R$)1 1.724.762,60 2.558.976,80 2.673.691,85 3.060.322,12 ? 10.017.753,37 Verifica-se que: a) há valores repassados por Teixeira ao El Turf que não foram declarados à Receita, como (a1) os R$ 500.000,00 enviados por Teixeira em 1999, (a2) os R$ 280.000,00 de 1996, (a3) os R$ 60.000,00 de 1995 e (a4) a diferença de R$ 60.000,00, de 1997; b) enquanto Teixeira recebeu R$ 9.450,00 do restaurante em 1995, com um faturamento de R$ 1,7 milhão, ele não retirou da empresa quando o faturamento dela chegou a R$ 2,5 milhões, em 1997, ou a R$ 3 milhões, em 1998, o que sugere estar ocorrendo sonegação fiscal tanto da pessoa física dele quanto da empresa; c) em 1999, Teixeira afirma não ter recebido nada do El Turf. No entanto, prevê-se que a empresa tenha tido faturamento maior do que o de 1998 (pelo crescimento que vinha apresentando) e ele repassou ao restaurante, pelo menos, R$ 500.000,00. Isso também reforça a tese de que o El Turf seja um repositório de indícios fortes de ilicitudes fiscais, tanto na esfera federal, quanto aos tributos estaduais ou municipais que, porventura, devessem ser arrecadados. Somente do empréstimo de US$ 2,5 milhões, o El Turf teria de pagar cerca de US$ 400.000 por ano ao banco. Isso eqüivale, hoje, a R$ 880.000,00 ou em torno de 25 a 30% do faturamento bruto do restaurante. Ou seja, se se considerar um lucro líquido mais realista, em torno de 15%, cerca de R$ 450.000,00, na melhor das hipóteses, o El Turf poderia pagar o empréstimo com esse lucro em mais de quinze anos. Isso sem se considerar o segundo empréstimo, tomado junto ao Delta Bank, o mesmo com que a CBF firmou os seis empréstimos sob investigação por esta CPI. Deve ser ressaltado que Ricardo Teixeira declarou não ter feito retiradas do El Turf, o que levanta dúvidas quanto ao que tem sido declarado à Receita Federal (por ele e pelo restaurante), como também quanto aos empréstimos feitos pelo El Turf, como descrito acima. São fortes os indícios, portanto, de lavagem de dinheiro e de sonegação generalizada de impostos e contribuições. EMPRESAS DE RICARDO TEIXEIRA NO EXTERIOR AMERITECH HOLDING LTD. Em seu depoimento a esta CPI em 10 de abril último, o presidente da CBF, Ricardo Teixeira, negou que fosse proprietário da empresa AMERITECH HOLDING LTD., que tem sede nas Ilhas Virgens Britânicas. Entretanto, recomendase investigação sobre ela porque tal empresa vendeu à empresa Minas Investimentos (empresa de Ricardo Teixeira) uma mansão em Búzios, no que parece um negócio no mínimo suspeito e que envolve sócios e empregados de Teixeira como procuradores. A saber: 1) A mansão de Búzios foi vendida por Octávio Koeler Plácido Teixeira Jr., à Ameritech Holding. Ele é proprietário da empresa SWAP Corretora de Câmbio Ltda., que opera largamente para a CBF em negócios com o Exterior; 2) Nesse negócio a Ameritech foi representada pelo advogado Sérgio Isidoro Eskenazi Pernidji, como procurador. Este foi advogado da CBF e do próprio Ricardo Teixeira naquela época (1996); 3) A Ameritech vendeu a mansão de Búzios para Minas Investimentos S/A, empresa de Ricardo Teixeira, por um preço 33 vezes maior, imediatamente depois. O procurador da Ameritech na venda foi o engenheiro Landim Balthazar, na época sócio e empregado de Ricardo Teixeira no Restaurante Chopp 2001. A procuração dada a ele pela Ameritech foi assinada por Armando Aparício, cidadão sem registro de CPF no Brasil. 4) Em 31 de janeiro de 2000, Ricardo Teixeira pagou de seu bolso, em nome da Ameritech Holding Ltd., uma diferença de laudêmio relativo à mansão da Praia do Canto em Búzios. São dois DARFs , recibos da Receita Federal, nos quais constam o nome da Ameritech Holding como pagadora: o primeiro, de R$16.431,22, refere-se à diferença de laudêmio. O segundo, de R$1.446,21, à multa de transferência. O pagamento foi feito por meio de autorização de débito na conta corrente de Teixeira no Banco Real. Portanto, há fortes indícios de que a AMERITECH seja de Ricardo Teixeira. E há evidências de que envolveu-se em negócio nebuloso com outra empresa do presidente da CBF, a Minas Investimentos. GLOBUL ANSTALT CORPORATION GLOBUL ETABLISSEMENT A LIECHTENSTEIN O nome da empresa GLOBUL aparece na Declaração de Renda de 1997 de Ricardo Teixeira. Refere-se a um pagamento feito a ela, no valor de 12.185,55 reais. É uma empresa localizada no Liechtenstein, o paraíso fiscal mais fechado do mundo. No seu depoimento, o presidente da CBF afirmou que esse valor se referia a pagamento de aluguel de uma casa em Miami. Valor evidentemente baixo para fazer frente ao aluguel de uma mansão daquele porte e naquele balneário estadunidense, conforme observou o deputado Dr. Rosinha na ocasião, não sendo contestado pelo depoente. SANUD Embora insistindo que não é dono de empresa alguma no Exterior, o presidente da CBF admitiu em seu depoimento que a empresa SANUD tem sociedade com uma empresa de sua propriedade, a LRJ PARTICIPAÇÕES. A SANUD, como a GLOBUL, também tem sede no principado de Liechtenstein15, na Europa. A SANUD aparece como proprietária de 40% do capital da empresa LRJ PARTICIPAÇÕES. Informações mais recentes dão conta de que a SANUD já detém 92% do capital da LRJ PARTICIPAÇÕES. A PRIMEIRA CASA DE RICARDO TEIXEIRA EM MIAMI Na declaração de renda de 1997, referente ao ano de 1996, Ricardo Teixeira informa que fez um pagamento de R$12.185,55 reais a uma empresa chamada GLOBUL, sediada no Principado de Liechtenstein. Em depoimento à CPI o presidente da CBF negou ser proprietário da GLOBUL. Afirmou que essa empresa era a proprietária da casa em que ele morava em Miami e que o valor acima se referia ao aluguel pago no ano de 1996. Endereço da casa: 16879 Knigtsbridge Lane, Delray Beach, CEP Florida 33484-6949. Observação: foi contactada a corretora de imóveis Desirée, em Miami, (telefone 561-998-5243 ou 998-5220), que trabalha com imóveis na região de Delray Beach e ela informou que o aluguel de uma casa naquela área não sai por menos de US$ 5 mil por mês, isto é, US$ 60 mil dólares por ano. Em correspondência de 02/05/01, Ricardo Teixeira enviou a esta CPI cópia do contrato de aluguel da casa de Miami, firmado em 15/03/1995, com aluguel fixado em US$ 1.500,00 mensais. Ainda assim, o 15 NOTA: PRINCIPADO DE LIECHTENSTEIN É UM PARAÍSO FISCAL. Fica entre a Suíça e a Áustria. Pequenino, ali vivem apenas 30 mil habitantes,. Fica a 110 km -- a uma hora de carro – distante de Zurique, sede da FIFA. Aliás, o aeroporto internacional que serve Liechtenstein é o de Zurique. Muito conveniente para quem tem negócios na Suíça. Ainda mais porque dos cinco bancos desse principado, os três maiores pertencem à Associação Suíça de Bancos “e são obrigados a reconhecer muitas das convenções desta associação, da mesma maneira que os bancos suíços” (propaganda dos Bancos de Liechtenstein na Internet). Além disso, diz a propaganda, “o principado tem estabilidade política e impostos e leis liberais para pessoas físicas e pessoas jurídicas” investirem ali. Na verdade, Liechtenstein é o paraíso fiscal mais fechado do mundo. Segue as leis suíças, isto é, não dá informação alguma sobre as contas bancárias de pessoas ou empresas que invistam ali. valor é superior àquele declarado à Receita. Detalhe: só declarou em 1997 sobre o anocalendário de 1996. .Ricardo Teixeira afirmou que a casa era alugada. Entretanto, em 1996 a empresa SOLIMARE INTERNATIONAL INC., com sede em Miami, e de propriedade de Waldemar Verdi Jr., (brasileiro, sócio do Banco DIBENS e proprietário de um dos 50 maiores grupos empresariais do Brasil, entre os quais o Consórcio Rodobens), intermediou a venda dessa mesma casa situada no mesmo endereço: 16879 Knigtsbridge Lane, Delray Beach, CEP Florida 33484-6949. A casa foi vendida a um casal de estadunidenses (o comprador é um médico, cujo nome não será citado). A SEGUNDA CASA Em seguida, em abril de 1997, a empresa SOLIMARE INTERNATIONAL INC. (de Waldemar Verdi Jr., amigo de Ricardo Teixeira e de José Háwilla) intermediou a compra de uma outra casa, em favor da empresa GLOBUL, sediada no Principado de Liechtenstein, vizinho da Suíça. Essa casa, que tem cerca de 600 metros quadrados de área construída, fica no mesmo condomínio fechado da casa anterior. Endereço: Delray Beach, Florida; Vintage Oaks, 5896 , CEP 33484 6424. É um dos lugares mais valorizados do balneário. Segundo o registro de imóveis da Flórida foi comprada por US$924.400,00 dólares. Esta é a casa em que Ricardo Teixeira reside desde 1997. Ele nega que seja dono da GLOBUL, e diz que pagava aluguel da casa a essa empresa. Aliás, no depoimento à CPI tentou fazer confusão dizendo que o valor enviado à GLOBUL em 1996 se referia a esta segunda casa. Mas essa casa só foi comprada pela GLOBUL em 1997. E nas suas Declarações de Renda de 1998/1999/2000 não consta pagamento à GLOBUL. No seu depoimento à CPI, disse que, por ser um imóvel alugado a pessoas jurídica sediada no Exterior, considerava desnecessário declarar o aluguel à Receita Federal do Brasil. “EFEITO CPI” Ainda de acordo com o cartório de registro de imóveis de Miami, em março de 2001 Ricardo Teixeira, pessoa física, comprou a casa por US$800 mil dólares junto à GLOBUL. Generosa, a GLOBUL concordou em vender a casa por preço inferior ao que havia comprado (US$ 924 mil), em 1997. Dez meses depois, em 26 de dezembro de 2000 (A CPI CBF/NIKE acabava de ser instalada), no penúltimo dia útil do ano, numa mesma data, Ricardo Teixeira fez duas remessas de dinheiro para o Exterior, transferência internacionais de reais, em seu próprio nome: uma de US$ 602.160,00 e outra de US$ 246.628,44. As duas remessas foram através do RURAL INTERNATIONAL BANK, de Nova Iorque. São desconhecidos os objetivos dessas remessas. Mas se ele quisesse regularizar a “compra” da casa, para poder declará-la na Declaração de Renda de 2001, esse seria o caminho. Aliás, no seu depoimento Teixeira manifestou intenção de declarar a casa na próxima Declaração de Renda. Em conclusão, embora Ricardo Teixeira negue, há indícios fortes de que é proprietário de várias empresas no Exterior. São nebulosas as condições em que o presidente da CBF adquiriu as duas casas em Miami, Florida através de da empresa Solimare International de seu amigo Valdemar Verdi Jr., dono do Banco DIBENS. Esta CPI, que promove investigações a esse respeito nos Estados Unidos, espera ainda poder esclarecer melhor tais assuntos. CAPÍTULO X - FEDERAÇÕES : DESAGREGAÇÃO DA ORGANIZAÇÃO CONFERATIVA A situação encontrada pela CPI nas federações não poderia ser pior. Revela um processo avançado de desagregação da organização confederativa. Entidades dominadas há muitos anos por grupos familiares e de compadrio político, misturando as relações esportivas com relações políticas. Não raro, o dirigente da federação ou de clube é também parlamentar, havendo casos como o do Maranhão, onde o presidente de um clube, o Sampaio Correia, é também o presidente da Assembléia Legislativa. Desse panorama pode-se deduzir como estão essas entidades distanciadas da participação da comunidade desportiva na definição de seus destinos, como não há nelas vestígios de vida democrática. Associado ao continuísmo, viceja o nepotismo, a contratação de parentes e de amigos, chegando-se ao cúmulo de o presidente da Federação Mineira ter pelo menos 27 parentes empregados na entidade. É como se a federação fosse uma empresa, uma fazenda do dirigente, que nela reina e se impõe como senhor feudal, como dono absoluto, sem ter que prestar contas a ninguém. A manipulação dos recursos arrecadados pela federação tem como regra geral o completo descontrole. Não há orçamento, não há prestação de contas, nem balanços, nem registros contábeis. Não se declara ao Imposto de Renda. Os recursos transitam livre e impunemente da conta da entidade para as contas pessoais de dirigentes e amigos. Nem mesmo sobre os recursos enviados pela CBF há qualquer prestação de contas ou indicação do destino dos gastos Em muitos casos, são situações que vêm de longe, herdadas do “coronelismo” que se implantou nos clubes, mesclado com um mecenato de interesses eleitorais e que criou a figura do “cartola”, esse misto de dirigente, torcedor e político, assemelhado, no caráter e nas fidelidades, a um pelego sindical. O agravante é que, após a Constituição de 1988, que delegou amplamente à sociedade a organização dos esportes, esses grupos de interesses particularistas sentiram-se à vontade para ampliar sua atuação, abandonando qualquer atividade de organização e apoio efetivo à atividade-fim, o esporte, o futebol. Desgraçadamente, a nova administração da CBF, que instalou-se em 1989, não só omitiu-se completamente quanto à delegação que o Estado lhe deu, e à sua função estatutária de organizadora do futebol, como foi muito além. Aproveitou aquela estrutura carcomida e, ainda mais, incentivou-a, colocando-a a serviço dos interesses privados do grupo que assumiu a entidade nacional. Ricardo Teixeira e seu grupo, ao deixarem de corrigir as irregularidades que proliferam na base confederativa, e ao oferecerem ajuda paternalística a federações falidas, estabeleceram laços de dominação que lhes permitiram, em troca, contar com os votos cativos das federações nas decisões da CBF. Contando assim com folgada maioria na Assembléia Geral, obtida à base da cooptação dos dirigentes de federação, o grupo de Ricardo Teixeira pôde, por sua vez, exercer um poder sem contestações no futebol brasileiro, durante os últimos doze anos. O resultado todos estão a ver: o colapso do futebol nacional. A REORGANIZAÇÃO NECESSÁRIA A reforma do sistema confederativo se impõe com urgência a partir da sua cabeça, a CBF. Uma nova legislação se impõe, que fortaleça e amplie a democracia nas relações internas da CBF e nas suas relações com as federações e clubes. Todas as entidades terão de abrir espaço para a participação da comunidade no processo eleitoral e nas decisões federativas. A CBF e as federações não são, definitivamente, empresas privadas, que só devem prestar contas a seus sócios. São delegadas da Nação para a organização do esporte. A sociedade tem direito de fazer cobranças e de receber a prestação de contas. À CBF cabe extrema responsabilidade. Após a reorganização dos estatutos, estabelecendo rigorosamente direitos e deveres de todos os membros da confederação, fortalecendo a democracia no sistema confederativo e na vida interna das entidades, eliminando o continuísmo e o nepotismo, a CBF terá de apresentar um planejamento geral a ser cumprido por todas as entidades. O futebol brasileiro é rico, gera muitos recursos. A CBF tem uma arrecadação vultosa. Nos próximos anos poderá contar com a arrecadação garantida de 25 milhões de dólares por ano, devidos aos contratos de patrocínio da NIKE e da AMBEV; e mais outros milhões resultantes da venda de direitos dos jogos da seleção às emissoras de TV, dos contratos com a Traffic etc. A CBF não recebe esses recursos por si mesma. Eles se originam da força do futebol brasileiro, do seu prestígio. Esse dinheiro é tanto da CBF quanto das federações, até que porque a CBF não é nada senão a representação nacional das federações. Esses recursos devem retornar ao futebol como estímulo ao seu desenvolvimento e aprimoramento, beneficiando atletas, clubes e a comunidade, na medida em que incentiva o esporte e o lazer. A obrigação estatutária da CBF é gastar os recursos arrecadados pela confederação unicamente com a promoção do futebol, a atividade-fim a que o sistema confederativo se destina. O planejamento plurianual deve incluir atividades da própria CBF, mas, mais que tudo, deve nortear as atividades das federações e clubes. O primeiro passo é organizar a federação de forma a que passe a ter atividades ordenadas, sistema de orçamentos, balanços, prestação de contas, através de um sistema-padrão informatizado, desenvolvido pela CBF. Moralizadas, reorganizadas e postas a serviço da comunidade, as federações contarão com os recursos repassados pela CBF, não como “generosidade” paternalista e eleitoreira, mas como recursos a que têm direito, instrumentos de incentivo à prática do futebol. Por exemplo: 1. Medidas de apoio à formação de atletas desde a infância até a adolescência, orientação técnica, de saúde, educacional. Apoio material, como fornecimento de material esportivo; 2. Programação de campeonatos em estreita colaboração com as entidades da comunidade, como escolas, empresas, sindicatos, associações e clubes comunitários; 3. Obras físicas, como construção e reformas de praças de esporte e providências simples, como iluminar e cercar quadras de esportes no bairros podem servir de grande estímulo ao esporte e às praticas de sociabilidade da juventude na comunidade; 4. Estímulo à formação de clubes comunitários, de bairros, de associações, de empresas; 5. Apoio aos clubes profissionais nas suas atividades de formação de base, na modernização de suas instalações, no fortalecimento da participação dos sócios na vida do clube. Em resumo, apesar do estado lamentável em que esta CPI encontrou o sistema confederativo de futebol, ele se mantém como uma estrutura viva e, reorganizado, poderá transformar-se em fator de desenvolvimento do nosso futebol em todo o território nacional. Nas próximas páginas, seguem os relatos sobre cada uma das federações estaduais, pautados nos trabalhos dos sub-relatores Deputados Dr. Rosinha, Olímpio Pires e Léo Alcântara. A título de auxílio ao leitor, relacionamos no quadro abaixo a localização dos documentos utilizados pela CPI, integrantes como anexos a este Relatório. DOCUMENTOS ANEXOS E SUAS LOCALIZAÇÕES (*) ANEXO 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 Observações: FEDERAÇÕES (por Estados) ACRE ALAGOAS AMAZONAS AMAPÁ GOIÁS MARANHÃO MINAS GERAIS MATO GROSSO DO SUL BAHIA CEARÁ DISTRITO FEDERAL ESPÍRITO SANTO MATO GROSSO PARÁ PARAÍBA PERNAMBUCO PIAUÍ PARANÁ RIO DE JANEIRO RIO GRANDE DO NORTE RONDÔNIA RORAIMA RIO GRANDE DO SUL SANTA CATARINA SERGIPE SÃO PAULO TOCANTINS PASTAS (**) 1F; 1B 1F; 1B 1F; 1B 1F; 1B 1F; 1B 1F; 1B 1F; 1B a 5B 1F; 1B 1F; 1B a 10B 1F; 1B e 2B 1F; 1B 1F; 1B a 4B 1F; 1B 1F; 1B a 3B 1F; 1B a 3B 1F; 1B a 4B 1F; 1B a 5B 1F; 1B a 3B 1F; 1B a 9B 1F; 1B 1F; 1B 1F; 1B 1F; 1B a 7B 1F; 1B e 2B 1F; 1B 1F; 1B a 12B 1F; 1B e 2B (*) Acrescenta-se a esta relação e aos anexos da CPI os documentos de cada Federação específica, constantes das pastas nominadas por regiões, sob o domínio da CPI: Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul. (**) As letras “F” e “B” referem-se, respectivamente, aos sigilos fiscal e bancário. Ao se colocar, por exemplo, “1F; 1B a 3B”, significa que foram utilizadas, naquela Federação, uma pasta de sigilo fiscal (1B) e três de sigilo bancário (1B a 3B). ACRE 1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DA FEDERAÇÃO A Federação acreana possui personalidade jurídica de sociedade civil de direito privado, regida pelos artigos 20 e 23 do Código Civil Brasileiro. 2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA : Segundo depoimento de Antônio Aquino Lopes, presidente da Federação Acreana de Futebol, a situação administrativa é bastante tranqüila, sem dívidas, com todas as suas obrigações sendo cumpridas a contento. Ainda, conforme depoimento, possui seis funcionários, com salário médio de R$ 300,00. À frente da Federação há dezessete anos, Antônio Aquino frisou que, nem ele, nem os outros diretores, recebem remuneração. Informou que está no cargo desde abril de 1984, portanto há mais de dezessete anos. Questionado sobre a extensão do período em que comanda a Federação, disse que não vê problema algum, e que todo esse tempo indicaria que esteja realizando um bom trabalho. 3. S ITUAÇÃO FISCAL /F INANCEIRA Inicialmente, foi observado que a Federação não entregou as Declarações de Imposto de Renda de Pessoa Jurídicas referentes aos exercícios de 1996 e 1997. Como se não bastasse, as declarações referentes aos três anos seguintes contém em todas as suas contas de todas as demonstrações o valor 0,00, como podemos perceber a seguir, por meio de um extrato resumido de duas demonstrações contábeis constantes das declarações: Com relação a situação fiscal descrita acima, Antônio Aquino Lopes, quando inquirido sobre o assunto depoimento, não teve explicações para a omissão nos anos calendários de 95 e 96, nem para a forma como foi feita a declaração referente aos anos de 97, 98 e 99 ; culpou seu contador pela falha. De todo modo, ficaram sem respostas os porquês relacionados às suas declarações de Imposto de Renda, talvez por que não as tenha, sendo, de pronto, passível de ser indiciado por sonegação fiscal. 4. RELAÇÃO COM A CBF 4.1 ELEIÇÕES NA CBF Em depoimento à CPI da Bola, da Assembléia Legislativa do Maranhão, que realizou audiências públicas entre abril e maio de 1994, o jornalista Herbert Fontenele afirmou o seguinte: “O SENHOR BENEDITO COROBA: Fontenele, também fala-se o seguinte. Que o cargo de presidente de Federação, não obstante todas essas dificuldades materiais, é um cargo assim, muito cobiçado e principalmente em época de eleição de dirigentes da Confederação Brasileira de Futebol. Tens notícias de que no período da eleição, um voto custa assim muito caro, por exemplo, na disputa pela CBF? Há notícias de que na época da escolha dos dirigentes da Confederação realmente corre muito dinheiro e, por isso, determinadas pessoas cobiçam esse cargo? O SENHOR FONETENELE: É muito comentado que o voto na Assembléia Geral da CBF vale muito, dependendo, é claro, de como a campanha vai se desenvolver. E só o apoio ao presidente da CBF, durante o mandato de quatro anos, aquilo pelo que se sabe, já rende alguma coisa, não só na época da eleição, mas durante a administração toda, há casos comprovados de um Presidente da Federação do Acre, nessa eleição do Ricardo Teixeira, que foi muito divulgado na imprensa. O SENHOR BENEDITO COROBA: Tu tens mais ou menos a idéia de quanto realmente vale, em dólares, por exemplo? O SENHOR FONETENELE: Não. Eu até agora não consegui entender por que eles se apegam a esse cargo, já que só recebem críticas, é difícil administrar, não tem recursos, são criticados sempre. Mas todos eles querem se perpetuar. O presidente da Federação Carioca vai fazer agora 24 anos, teve um de Pernambuco que passou trinta, João Havelange vai para 24 anos na FIFA. O vôlei do Brasil deu uma guinada quando houve uma mudança.” (g.n.) Durante o depoimento das Federações do nordeste, em João Pessoa, dia 12/5/2001, o Deputado Pedro Celso recordou esse depoimento: “O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - Esta CPI tem verificado que a CBF vem fazendo doações para as federações sem controle algum e já tem formado juízo sobre esse assunto. O Jornalista Herbert Fontenele(?) disse à CPI da Bola, do Maranhão, de 1994, que Ricardo Teixeira paga caro pelo voto na Confederação e que o cargo na Federação rende também, apesar de que não tanto quanto durante as eleições...não tanto quanto durante as eleições. Fontenele disse, há sete anos, que o Presidente da Federação Acreana teria vendido o seu voto caro pra eleição de Ricardo Teixeira. Esse caso ficou famoso na época. Disseram que o voto da Federação Acreana custou mais caro do que o próprio Acre, esse importante Estado brasileiro, que foi adquirido junto a Bolívia. (...)” (g.n.) O presidente da Federação acreana sempre foi o Antônio Aquino, durante todo os diversos mandatos sucessivos de Ricardo Teixeira. Pelo que se pôde apurar, há denúncias e indícios fortes de que tenha ocorrido algum tipo de compra de voto da Federação, por parte do atual presidente da CBF. 4.2 DOAÇÕES DA CBF Por meio da análise da Contabilidade da CBF, constatou-se um fato, no mínimo paradoxal: em 1999 a Federação Acreana, a despeito do futebol no Estado não ter nenhuma expressão no cenário nacional, foi a que recebeu o maior montante da CBF, a título de auxílio financeiro: R$ 418.000,00. Questionado sobre o fato, Antônio Aquino Lopes, achou natural e afirmou que gastou todo o dinheiro na Federação, e que estaria tudo contabilizado. Prometeu que remeteria toda a documentação à CPI, comprovando os gastos, o mais breve possível. Porém, nada remeteu, depois, a esta CPI. Segue gráfico com as doações da CBF para a Federação, sem se considerar as doações recebidas por Aquino Lopes para a campanha política de 1998, registradas pela contabilidade da CBF: DOAÇÕES DA CBF PARA A FEDERAÇÃO ACREANA DE FUTEBOL 1998 - 2000 R$ 100.000 80.000 60.000 40.000 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/2000 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/99 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO 0 JAN/98 20.000 MESES 4.3 DOAÇÕES DA CBF PARA ANTÔNIO AQUINO LOPES O presidente recebeu duas doações da CBF, em 1998, para sua campanha eleitoral. Para melhor avaliação desse item, é importante esclarecer como se deu essas doações. Em setembro de 1998, a CBF emitiu um cheque nominal à Federação Acreana, no valor de R$ 25 mil; sete dias após, a Federação Acreana emitiu um cheque, no mesmo valor para a CBF; no mesmo dia, a CBF emitiu um cheque nominal a Antônio Aquino Lopes, com o mesmo valor, 25.000 reais; um mês após, Antônio Aquino Lopes recebeu mais um cheque nominal a si, da CBF, no valor de 32.500 reais. Esta Comissão, durante as investigações, ficou com a impressão de que o primeiro cheque no valor de 25.000,00 foi emitido, num primeiro momento, erroneamente à Federação, corrigido o erro sete dias depois. Um mês após, houve o reforço 32.500 reais. Quando questionado sobre essa movimentação, Antônio Aquino Lopes, afirmou não lembrar, apresentou algumas desculpas. Após insistentes questionamentos dos deputados, Antônio Aquino Lopes revelou ter acontecido exatamente o que esta CPI havia imaginado. Completou, dizendo que foi candidato e que teria usado o dinheiro na campanha. É importante observar que o último cheque, o de 32.500,00 reais, foi emitido após a data das eleições, o que estaria em desacordo com a legislação eleitoral. Antônio Aquino Lopes ainda afirmou em seu depoimento que acha perfeitamente legal que a CBF auxilie a políticos em suas campanhas. Essa afirmação, juntamente com o fato de a Federação Acreana ter recebido da CBF o maior montante em 1999, mais o auxílio recebido por Antônio Aquino Lopes, em sua campanha política, faz essa CPI concluir que, no mínimo, o presidente da Federação Acreana está em perfeita sintonia com o pensamento do Ricardo Teixeira, à frente da CBF. 5. CONTRATOS COM TV de TV. A Federação acreana informou que não firmou contratos com emissoras 6. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL 7. RELAÇÃO COM CLUBES 8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DE FUTEBOL 9. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES A Federação acreana tem uma relação muito próxima com a CBF. Percebe-se que as doações recebidas são fruto desse convívio de mais de doze anos, sendo que Antônio Lopes é tido, na opinião de jornalistas especializados, como uma pessoa que tenha negociado seu voto durante as eleições de Ricardo Teixeira. Sugere-se que seja encaminhado ao Ministério Público denúncia de compra de voto durante as últimas eleições de Ricardo Teixeira; ALAGOAS 1. N ATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DAS FEDERAÇÕES: Conforme estatuto da entidade, aprovado por assembléia geral extraordinária reunidas em 14/02/1991 e em 15/10/1991 (art. 97 do estatuto), a Federação Alagoana de Futebol é uma “sociedade civil de caráter desportivo, com personalidade jurídica distinta das suas filiadas” (art. 1º), tendo como finalidades: “dirigir, difundir e incentivar (...) a prática do futebol amador e profissional (...)”; “promover a realização de campeonatos, torneios e competições de futebol”; “cumprir e expedir as filiadas, com caráter de adoção obrigatória, os atos originários” da CBF (...); e penalizar os responsáveis por desrespeitos ao estatuto (art. 2º). Trata-se de típica entidade de direito privado sem fins lucrativos. O estatuto define como “poderes” da entidade as seguintes instâncias: assembléia geral, Tribunal de Justiça Desportiva, Conselho Fiscal e, Presidência e Diretoria (art. 11). Não há previsão expressa, na Seção estatutária dedicada às “Despesas”, de gastos com pagamento de remunerações aos membros dos poderes acima mencionados (art. 82). Em depoimento a esta CPI, o vice-presidente da Federação afirmou que a entidade não remunera seus dirigentes. 2. S ITUAÇÃO ADMINISTRATIVA : A Federação Alagoana de Futebol é presidida por José Raimundo de Albuquerque Tavares, sendo que na Sessão da CPI em João Pessoa foi ouvido o José Raimundo Soares Alexandre, vice-presidente administrativo da entidade. 3. S ITUAÇÃO FISCAL E FINANCEIRA 3.1. AS F INANÇAS DA FEDERAÇÃO A Federação Alagoana encontra-se em difícil situação financeira. Esta é a opinião do vice-presidente da entidade, conforme seu depoimento a esta CPI: “As finanças da Federação da mesma maneira em que estão as finanças das Federações mais deficitárias do futebol nordestino, difíceis.” 3.2. I MPOSTO DE RENDA E PROPRIEDADES A Federação, no período entre 1995 e 2000, apenas declarou Imposto de Renda relativo aos exercícios de 1998 e 1999. Nestes dois anos base foram declarados bens, nos itens “edifícios e construções”, “equipamentos, máquinas e instalações industriais”, “veículos” e “móveis, utensílios e instalações comerciais”. Em seu depoimento à CPI sobre as propriedades da Federação, o José Raimundo Soares Alexandre afirmou que: “ (...) Nós temos o prédio da Federação Alagoana de Futebol, um estádio, um pequeno estádio e uma concentração.” Ao compararmos os números contábeis da CBF em relação à Federação Alagoana com a contabilidade da própria FAF, constatamos suspeitas de irregularidade no Imposto de Renda no ano base de 1999: a Federação, conforme o livro razão da CBF, recebeu auxílio no valor de R$ 289.744,00, e as receitas diretas com futebol totalizam R$ 118.818,32. Ocorre que em seu Imposto de Renda, a entidade alagoana declara apenas R$ 291.200,32. Considerando que receitas diretas com futebol não poderiam ser confundidas com auxílios da CBF, conclui-se que a receita mínima a ser declarada seria de R$ 408.562,32, que é a soma dos dois primeiros valores acima mencionados. Também há diferenças entre o contido no livro razão da CBF e o movimento de caixa contabilizado pela Federação Alagoana, nos seguintes valores: R$ 44.103,50 em 1998; R$ 136.946,50 em 1999; e R$ 31.365,00 em 2000. As questões acima levantam suspeitas graves de sonegação nas declarações de Imposto de Renda da Federação Alagoana de Futebol. 3.3. INSS Junto à previdência social, a Federação tem dívida de R$ 7.660,50. 4. RELAÇÃO COM A CBF A Federação Alagoana recebeu da CBF, entre 1998 a 2000, os seguintes valores: em 1998, R$ 6.000,00 mensais, com exceção dos meses de novembro e dezembro, quando a Federação recebeu R$ 36.000,00 em cada mês. Em 1999, o repasse mensal foi de R$ 6.000,00 em janeiro, R$ 12.000,00 em fevereiro, junho, julho, agosto, outubro e novembro, R$ 72.000,00 em março, R$ 23.372,00 em abril e maio, R$ 48.000,00 em setembro e R$ 45.000,00 em dezembro. Em 2000, de janeiro a fevereiro, abril, maio, julho e dezembro, o valor foi de R$ 12.000,00, em março, junho, setembro e outubro foi R$ 62.000,00 e R$ 40.365,00 em novembro. Curiosamente, os finais dos anos 1998 e 2000, períodos eleitorais, aumentam os repasses da CBF à Federação Alagoana, sugerindo interesses explicitamente eleitorais. A seguir, gráfico com as doações da CBF para a Federação: DOAÇÕES DA CBF PARA A FEDERAÇÃO ALAGOANA DE FUTEBOL 1998 - 2000 R$ 80.000 70.000 60.000 50.000 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/2000 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/99 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO JAN/98 10.000 0 MARÇO 40.000 30.000 20.000 MESES Fonte: Contabilidade da CBF/ CPI CBF Nike Em seu depoimento à CPI, o vice-presidente da Federação negou que a entidade financia campanhas políticas. Acerca de verba enviada em março de 2000, José Raimundo Soares Alexandre alegou tratar-se de auxílio financeiro da CBF para a reforma em estádio de futebol na cidade de Arapiraca, interior do estado. Outra parcela, porém, de igual valor, não foi contabilizada pela FAF. 5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL Da análise dos documentos e do depoimento do vice-presidente da Federação, não foi observada qualquer informação ou denúncia relevante que relacionam a Federação com a política local, em que pese a constatação acima registrada, que levanta suspeitas sobre o financiamento eleitoral. 6. C ONTRATOS COM A TV A Federação Alagoana de Futebol não possui contratos de transmissão de jogos com emissoras de televisão. 7. RELAÇÃO COM OS CLUBES Não foram encontradas informações ou denúncias relevantes sobre a relação entre clubes e Federação. 8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DO FUTEBOL Também não foram encontradas informações ou denúncias relevantes sobre a relação entre Federação e empresários. 9. C ONCLUSÕES, ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES Da análise de todos os documentos e do depoimento do José Raimundo Soares Alexandre, vice-presidente administrativo da Federação Alagoana de Futebol, concluímos que a entidade é gerida de forma temerária, notadamente nos aspectos financeiro e fiscal. Constatou-se sonegação fiscal. Há suspeitas de financiamento eleitoral a candidatos, seja em 1999 ou em 2000. Recomenda-se reforma estatutária para permitir maior autonomia do conselho fiscal. Sugere-se encaminhar o presente Relatório à Receita Federal, ao Ministério Público Federal, ao Ministério Público do Estado de Alagoas e ao Ministério Público Eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral de Alagoas, com base na Lei nº 9.504/97. AMAPÁ 1. N ATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DA FEDERAÇÃO : Conforme preceitua o estatuto, a Federação Amapaense de Futebol é uma sociedade civil de direito privado, regida pelo direito comum, leis desportivas em vigor e pelo estatuto social. Esse estatuto não permite que os dirigentes recebam remuneração. 2. S ITUAÇÃO ADMINISTRATIVA: Iniciando por uma análise na direção da entidade, pode-se verificar uma razoável rotatividade dos Presidentes da Federação do Amapá, em contraposição ao que acontece com a maioria das Federações. O atual Presidente, José Orlando Pereira Santana, era vice do anterior, e assumiu o cargo em abril do ano passado, depois do afastamento do então Presidente, Silvio Barbosa de Assis. É interessante mencionar o motivo do afastamento de Silvio Barbosa, até para que se tenha idéia sobre quem estava à frente do futebol do Amapá: Este cidadão foi acusado, por várias vezes, na CPI do Narcotráfico, ficando um tempo foragido, depois preso por 30 dias. O atual presidente havia ocupado a presidência, pela primeira vez, de 95 a 97 e iria tentar a reeleição, quando foi apresentado a Silvio Barbosa, com quem se aliou para compor uma chapa, recusando a presidência. Assim o fez, porque acreditou nas propostas apresentadas por Silvio Brabosa, já que este tinha amizades em Brasília e melhores condições financeiras. Ainda com relação ao processo eleitoral da Federação, é permitido o voto por procuração, desde que protocoladas com até 24 horas antes da instalação da sessão. José Orlando afirmou que não recebe qualquer remuneração, nem os demais dirigentes, devido à proibição estatutária. Também frisou que não pretende mais se candidatar à Presidência. Com relação ao patrimônio da Federação do Amapá, seu Presidente deu uma resposta que retrata as dificuldades na administração do Futebol no Amapá: O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - (...) a Federação tem uma sede. E ela tendo uma sede ela tem que fechar até por que dispondo de bens ela tem que fazer o balanço e demonstrar no seu ativo imobilizado os imóveis que ela tem. Eu pergunto: a sede da Federação está no nome da Federação? Aquele prédio? O SR. JOSÉ ORLANDO PEREIRA SANTANA Excelência, aquele prédio da Federação foi comprado pelo então Presidente Bernardino Sena Ferreira Filho, e até hoje disse que o prédio é da Federação. Mas até hoje não se tem um documento, nem o próprio Bernardino que comprou sabe onde estão os documentos que comprovam que aquele prédio é da Federação. 3. SITUAÇÃO FISCAL/FINANCEIRA A Federação nunca declarou Imposto de Renda de Pessoa Jurídica. Ao ser questionado quanto à omissão, o presidente informou que não tinha conhecimento da obrigatoriedade de, mesmo isenta, apresentar a declaração. Ainda expressou outros argumentos que mais uma vez demonstram o descontrole administrativo a que está entregue o futebol profissional do Estado do Amapá: “Excelência, não. A Federação de Futebol, durante o período em que eu passei na Presidência, eu confesso que não declarei Imposto de Renda. Não declarei, primeiro, porque não tinha contador, eu não contratei contador para isso, até porque a informação que eu tinha era que as Federações não... não... não poderiam... estavam dispensadas, melhor dizendo, de fazer as declarações de Imposto de Renda, e, quando, na verdade, elas não estavam, vim saber agora, que não estão dispensadas de declarar, elas têm que apresentar declaração mesmo que seja sem movimento, e quando tiver movimento, logicamente, quando recebe recursos, tem que ser declarado. E a Federação de Futebol não declarou. E eu tenho uma intimação da Receita Federal que eu recebi há uns 15 dias atrás me dando o prazo de 60 dias para que eu possa regularizar a situação sob perda da extinção do CNPJ da Federação.” Com relação à sua contabilidade, a Federação do Amapá também elaborou documentos contábeis a serem enviados a esta CPI (vide fala acima do José Orlando), com a observação de que seu Presidente não assinou nenhum deles. O contador que elaborou os documentos, Paulo Marques de Araújo, CRC-AP, nº 001259/O-0, apesar de ter confeccionado os documentos este ano, colocou a data do ano a que se referia o demonstrativo contábil, ou seja, assinou tudo com data retroativa. Paulo Marques é também presidente do Santos Futebol Clube, do Estado do Amapá. Seguem importantes trechos dos questionamentos sobre a situação contábil da entidade, que dão uma visão panorâmica da fragilidade do controle contábil. “O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – A contabilidade da Federação estava em dia ou como estava essa contabilidade? O SR. JOSÉ ORLANDO PEREIRA SANTANA – Não estava em dia, até porque eu deixei de mandar para a CPI, inclusive, prestação de contas de 98 e 99, porque não tinha nenhum documento que comprovasse despesa ou receita. (...) O SR. JOSÉ ORLANDO PEREIRA SANTANA – Paulo Marques de Araújo é o Presidente do Santos Futebol Clube. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Ele presta algum serviço à Federação? O SR. JOSÉ ORLANDO PEREIRA SANTANA – Excelência, foi ele que fez, ele é contador, foi ele que fez esse balanço que a CPI pediu e que teria que ser assinado por uma pessoa que tivesse CRC. Eu passei os documentos a ele, e ele fez e assinou. Mas garanto a V.Exa. que eu não pedi para ele que fizesse nada além dos documentos que foram apresentados a ele, até porque ele é de maior e tem que zelar pelo seu registro de CRC, ele vive disso. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Foi bom o senhor ter lembrado isso, porque talvez ele vá ter complicações com o seu Conselho Regional de Contabilidade lá. Estou satisfeito, Sr. Presidente.” (g.n.) Ao se examinar as finanças da Federação do Amapá, também pôde-se perceber um quadro complexo, com uma série de dívidas aliadas à falta de recursos. Dívidas atrasadas, funcionários sem receber seus salários, pedidos de material desportivos à própria CBF, e até o interrompimento de um jogo por falta de pagamento ao árbitro e auxiliares, são relatos do presidente da Federação a esta CPI, que demonstram as condições financeiras em que se desenvolve o futebol amapaense: “O SR. JOSÉ ORLANDO PEREIRA SANTANA – Excelência, quando eu assumi a Federação, a sede da Federação estava penhorada e ia para leilão por débitos junto ao INSS. E eu estive na CBF e consegui recursos para pagar inclusive oito meses de salários de funcionários atrasados. E hoje já estão atrasados novamente por falta exatamente do repasse desses recursos, que são os únicos que a Federação tem. E negociei esses débitos junto ao INSS. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Negociou através do REFIS? O SR. JOSÉ ORLANDO PEREIRA SANTANA – Eu negociei diretamente com a Procuradoria. Isso já estava a nível de Justiça Federal. Eu acredito que não seja REFIS. Eu não entendo. Sei que veio parcelamento. Estou pagando 214 reais por mês. E também está há dois meses atrasado. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Qual o montante da dívida? O SR. JOSÉ ORLANDO PEREIRA SANTANA – De INSS, na época, eram de dez mil reais. Eu dei dois mil reais adiantados para o INSS. Fiquei pagando. Hoje, esse débito deve estar em cerca de sete mil reais, seis, sete mil reais.” 3.1 RETENÇÃO DE VALORES PAGOS POR CLUBES O presidente Orlando Santana confirmou ao Deputado Jurandil Juarez que não havia repassado, para a CBF, valores pagos pelo Ypiranga: “O SR. JOSÉ ORLANDO PEREIRA SANTANA - O Ipiranga pagou 700 reais. Eu, talvez tenha errado, porque não tenha feito por escrito, mas comuniquei à Tesouraria da CBF de que havia recebido 700 reais. E como a CBF não estava repassando recurso para a Federação, eu utilizei o dinheiro dando vale para o meu pessoal na Federal para que eles não ficassem passando fome, Excelência; para que eles não ficassem passando necessidade, e os recibos eu posso enviar a V.Exa. assim que eu chegar em Macapá, provando o que eu estou dizendo. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Eu posso aceitar como uma explicação, mas esse não é um procedimento regular. A Confederação atestou não ter recebido os recursos. O SR. JOSÉ ORLANDO PEREIRA SANTANA - Mas eu comuniquei, Excelência. Eu estou dizendo que eu usei e comuniquei para eles. O meu erro talvez foi não ter feito por escrito, mas comuniquei por telefone. Assim como V.Exa. telefonou para eles perguntando e eles lhe passaram por escrito, a mesma coisa eu fiz, comunicando para eles. Mas vou passar por escrito e passar inclusive a cópia do ofício. E o procedimento da CBF quando se faz isso, eles escrituram dizendo... quando o clube não paga, eles escrituram na conta da Federação e depois descontado da quota da Federação. Está aqui uma quota que o Ipiranga não pagou de transferência de jogador, que eu trouxe para mostrar a V.Exa., que é escriturado quando o clube não paga, na conta da Federação. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Bom, mas, então, a informação de que o dinheiro foi recebido e não repassado à CBF, esse confere... O SR. JOSÉ ORLANDO PEREIRA SANTANA - Confere.” (g.n.) 4. RELAÇÃO COM A CBF: A Federação do Amapá recebe mensalmente a “mesada” da CBF. Segundo seu presidente, é de fundamental importância para o desenvolvimento das atividades da Federação, dada a escassez de recursos no desporto do Estado. A seguir, gráfico com doações da CBF para a Federação: NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/2000 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/99 NOVEMB SETEMB MAIO MARÇO 80.000 70.000 60.000 50.000 40.000 30.000 20.000 10.000 0 JAN/98 R$ JULHO DOAÇÕES DA CBF PARA A FEDERAÇÃO AMAPAENSE DE FUTEBOL 1998 - 2000 MESES Fonte: Contabilidade CBF/CPI CBF Nike O Deputado Jurandil Juarez criticou a Federação Amapaense e a CBF: “O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Bom, Sr. Presidente, ficou claro que com a contestação de ter sido feito a coleta entre os torcedores, ficou claro que a partida ficou interrompida, porque não houve pagamento dos árbitros. O SR. JOSÉ ORLANDO PEREIRA SANTANA Exatamente. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Isso aconteceu? O SR. JOSÉ ORLANDO PEREIRA SANTANA - Ficou por 20 minutos, ficou o intervalo do primeiro para o segundo tempo. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - O que me leva a raciocinar que nós podemos ter tudo lá, menos o futebol profissional. E uma da propostas, ao final da CPI, será nós apresentarmos idéias que poderão.. idéias transformadas em alguns casos até em leis, para transformar a estrutura do futebol brasileiro em algo mais compatível com aquilo que é o futebol. Tanto lá o Amapá quanto no Rio Grande do Sul, no Acre ou na Paraíba e, no meio disso, o restante dos Estados, como talvez a única unanimidade que exista no País. Porque todo mundo é torcedor de futebol de alguma forma ou de outra, mas o é. O que é injustificável é que essa expressão da cultura nacional seja tão maltratada, tão mal dirigida, tão mal concebida. E nós entendemos, e pessoalmente eu entendo como Deputado, que essa estrutura não pode permanecer desse jeito. Explico: não adianta tentar mexer politicamente no sentido de, usando a própria estrutura, inclusive a estrutura mental existente, alterar o que faz a CBF. Porque o Presidente nos disse que ele dá mesada — ele usou esse termo — ele dá mesada para dezessete Federações. Ora, votam 27 Federações. Então, ele já tem no bolso dezessete votos. Os clubes vivem em situação senão pior, mas semelhante a das Federações. Então, essa estrutura que está desde de 89 no comando da Federação se perpetuará dando bola para disputar o campeonato lá no Amapá, porque certamente a situação média daqui das outras Federações. E isso não vai nos levar a lugar nenhum. Isso me leva a fazer a última pergunta: a Federação Amapaense tem sido uma eleitora incondicional — vi pelas eleições —, incondicional do Sr. Ricardo Teixeira. O senhor pessoalmente, mesmo com a disposição de deixar a Federação, o senhor acha que é possível uma estrutura como essa, tendo a Confederação Brasileira de Futebol, que paga ao seu Presidente aproximadamente 500 mil reais por mês, sem poder, porque isso é proibido, que doa ao Presidente da Federação do Acre 57 mil reais para disputar uma eleição para Deputado Federal, se não me falha a memória; que faz, que paga, remunera seus dirigentes em quantias extraordinárias e que tem uma filiada chamada Federação Amapaense de Futebol, que tem que interromper um jogo do seu campeonato no intervalo do primeiro para o segundo tempo, porque não tem dinheiro para pagar árbitro. O senhor acha que uma estrutura dessa pode continuar funcionando assim? Se o senhor continuasse na Federação, o senhor votaria, por exemplo, na manutenção desse status quo? O SR. JOSÉ ORLANDO PEREIRA SANTANA - Excelência, eu acho que a estrutura tem que mudar. Tem que mudar. E se tem que mudar, tem que mudar para melhor. Não pode ficar do jeito que está. Na reunião de assembléia geral passada na Confederação, nós conversávamos com vários Presidente de Federações, dos quais três estão aqui presente, e nós conversávamos exatamente a respeito disso, dizendo que enquanto um diretor na CBF está ganhando cerca de 19 mil reais, as Federações recebem 12 mil por mês. E que no mínimo, no mínimo, no mínimo a CBF deveria ajudar as Federações, auxiliar as Federações mais pobres de outra forma. Ou repassando esse recurso para que ela se mantivesse, mantivesse o seu pessoal, mantivesse despesa de manutenção de prédio, pagamento de pessoal, encargos, e até mandando material para os clubes, clube profissional, para as ligas, e também facilitando quando confeccionasse as suas tabelas de competições nacionais. facilitando quando confeccionasse as suas tabelas de competições nacionais. Inclusive isso. Eu poderia até votar. Não digo que não votaria, não. Poderia até votar no Presidente Ricardo Teixeira. Agora, ele teria que apresentar uma proposta que fosse melhor que essa que está sendo, que está havendo agora, dessa que está acontecendo agora no futebol brasileiro. Se continuasse, sinceramente, se eu fosse candidato, não votaria. 5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL : Não foi identificada, explicitamente, nenhuma doação da CBF ou da própria Federação a políticos do Estado, tendo inclusive a negativa do José Orlando, durante seu depoimento a esta Comissão. 6. RELAÇÃO COM CLUBES A futebol do Amapá é composto, basicamente, de doze clubes amadores, doze clubes profissionais, dos quais, dez estão disputando o campeonato, e quinze ligas, um total de 39 entidades, desde que estejam regularizadas. O relacionamento da Federação do Amapá com os clubes é marcado pela suspeita de evasão de rendas em jogos mais importantes; como exemplo, temos os jogos contra São Paulo, Flamengo e Cruzeiro no Estádio local, oportunidades em que, seguramente, a renda seria de mais de cem mil reais, porém, não passou de trinta mil. Tal suspeita fez com que o Presidente do Flamengo entrasse com um ação na justiça, na tentativa de reaver a diferença. Houve, ainda, uma consulta do clube Ypiranga ao deputado Jurandil Juarez, sobre parcelas, no valor de R$ 700,00, de uma multa, aplicada ao clube pelo Superior Tribunal de Justiça Desportiva. Para se informar, o Deputado entrou em contato com Ricardo Teixeira que negou a existência de tal multa, e fez chegar às mãos do Deputado o prontuário do Clube na Justiça Desportiva. Questionado, José Orlando respondeu: “Excelência, eu vou começar mostrando ao senhor, passando às suas mãos cópia de telefax enviado pela Comissão Disciplinar da Confederação Brasileira de Futebol, primeira e segunda Comissão Disciplinar, o que mostra que o Ypiranga foi multado e que deve à Confederação. Eu fiz uma consulta ao saber que o Ypiranga passou um...tinha um documento dizendo que não viu o documento mas dizendo que havia sido anistiado ou não devia nada. Eu fiz uma consulta perguntando à CBF. Tá aqui a cópia do meu ofício também que eu vou passar às suas mãos, perguntando se havia alguma anistia, se tinha acontecido alguma anistia pro Ypiranga. Cópia de todos os ofícios enviados pelo tesoureiro da CBF e pelo Sr. Herma Seixas, Procurador do Tribunal de Justiça da CBF, que diz que o Ypiranga deve não os 2 mil e 800, mas sim 4 mil 110 reais. Eles fizeram as conversões desde o tempo de cruzado ainda, o débito do Ypiranga. Isso aqui está datado do dia 8 de maio. Eu passo às suas mãos, para que o senhor tome conhecimento. Quanto à parcela que o Ipiranga pagou na Federação, o Presidente em exercício do Ipiranga, Sr. Paulo Rodrigues, foi na Federação, apresentou o documento e disse: “Olha, eu não posso pagar o débito”. Porque, conforme o art. 200, do CBDF, depois da multa ele tem o prazo de cinco dias para pagar, sob pena de suspensão dos seus direitos. Então, eu encaminhei todos...Todos esses ofícios aí foram encaminhados para o Ipiranga, exceto esses últimos com a data do dia 8, que vieram da CBF. O Ipiranga deu entrada num documento, num ofício, pedindo para pagar de três vezes. Três vezes de 800 reais. O Ipiranga pagou 700 reais. Eu, talvez tenha errado, porque não tenha feito por escrito, mas comuniquei à Tesouraria da CBF de que havia recebido 700 reais. E como a CBF não estava repassando recurso para a Federação, eu utilizei o dinheiro dando vale para o meu pessoal na Federal para que eles não ficassem passando fome, Excelência; para que eles não ficassem passando necessidade, e os recibos eu posso enviar a V.Exa. assim que eu chegar em Macapá, provando o que eu estou dizendo.” 7. CONCLUSÃO De tudo quanto foi exposto, pode-se enunciar a inequívoca e simplista, porém, escorreita, afirmação de que a administração do futebol no Amapá precisa ser recriada. Seguem, neste sentido, as palavras do deputado Jurandil Juarez, que defende a obrigatoriedade da ajuda da CBF: “O que me leva a raciocinar que nós podemos ter tudo lá, menos o futebol profissional. E uma da propostas, ao final da CPI, será nós apresentarmos idéias que poderão.. idéias transformadas em alguns casos até em leis, para transformar a estrutura do futebol brasileiro em algo mais compatível com aquilo que é o futebol. Tanto lá o Amapá quanto no Rio Grande do Sul, no Acre ou na Paraíba e, no meio disso, o restante dos Estados, como talvez a única unanimidade que exista no País. Porque todo mundo é torcedor de futebol de alguma forma ou de outra, mas o é. O que é injustificável é que essa expressão da cultura nacional seja tão maltratada, tão mal dirigida, tão mal concebida. (...) Confederação Brasileira de Futebol, que paga ao seu Presidente aproximadamente 500 mil reais por mês, sem poder, porque isso é proibido, que doa ao Presidente da Federação do Acre 57 mil reais para disputar uma eleição para Deputado Federal, se não me falha a memória; que faz, que paga, remunera seus dirigentes em quantias extraordinárias e que tem uma filiada chamada Federação Amapaense de Futebol, que tem que interromper um jogo do seu campeonato no intervalo do primeiro para o segundo tempo, porque não tem dinheiro para pagar árbitro.” No tocante à responsabilização, não se deve esquecer que atos praticados em 1998 e 1999, são de responsabilidade do já citado Silvio Barbosa de Assis, indiciado na CPI do Narcotráfico. Porém, a juízo desta CPI, José Orlando é co-responsável, guardadas as devidas vênias jurídicas, pela administração do ex-presidente, uma vez que estava na vice-presidência, durante o período mencionado. AMAZONAS 1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DAS FEDERAÇÕES : Conforme seu estatuto, a Federação Amazonense de Futebol é uma “sociedade civil de caráter desportivo” (art. 1º do estatuto de 1983). Não consta, entre as despesas da entidade, o pagamento de remuneração a seus dirigentes (art. 65, idem). Trata-se de típica entidade de direito privado sem fins lucrativos. As informações sobre os estatutos estão parcialmente prejudicadas, tendo em vista que a Federação não enviou à CPI seus estatutos. Esta CPI teve à sua disposição uma versão ultrapassada que, por outros meios, chegou até ela. Ao que parece, os estatutos passaram por alterações, em 1993. Em seu depoimento, o presidente da entidade, Francisco Dissica, comprometeu-se a enviar a última e atual versão, o que não fez. Constata-se, assim, um primeiro desrespeito à ordem da CPI, no tocante ao envio da documentação pleiteada e fruto de requerimento aprovado por esta Comissão Parlamentar de Inquérito. 2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA: Francisco da Chagas Dissica Valério Tomaz ocupa o cargo de presidente da Federação desde 1992. Francisco da Chagas Dissica, enquanto presidia a Federação, ocupou cargo de Prefeito em sua cidade natal, Eruneté, de 1997 a 2000, além de ter exercido a atividade empresarial, seja no setor de comércio importador (atividade que durou 26 anos e que deixou em finais de abril de 2001), seja como proprietário de uma editora, de uma emissora de TV (UHF, há dois anos, que retransmite o sinal da CNT) e outra de rádio (“FM de Povo”). Em que pese afirmar que não recebia qualquer remuneração da Federação, Francisco da Chagas Dissica percebeu repasses diretos da Federação, como é o caso dos R$ 10.000,00, em 21/6/95 (doc. 632.226, Banco 034, Agência 1, Conta 107.712). 3. SITUAÇÃO FISCAL E FINANCEIRA A Federação Amazonense de Futebol não enviou à CPI a sua documentação contábil, nem os estatutos, conforme requerimentos aprovados, em plenário, nesse sentido. 3.1 MOVIMENTAÇÃO BANCÁRIA DA FEDERAÇÃO Segundo alega o presidente da Federação, a entidade não tinha cheques, apesar de ter conta bancária. Declara Francisco da Chagas Dissica: “É... Vamos... Vamos pela ordem, aqui. O problema é o seguinte. A Federação não tem..., cheque. A Federação não pode pegar cheque. Ponto um. Esses valores que estão sendo colocados..., esses valores altíssimos..., não é da Federação. A Federação simplesmente..., simplesmente pegava esse dinheiro e repassa, de imediato, para os clubes que jogaram o campeonato. Isso aí realmente... Em 99, se o senhor verificar, tem o valor..., deve ter um valor bastante..., bastante significativo.” Todos os saques em conta durante os anos 1999/2000 foram efetuados através de cheques avulsos, sem qualquer identificação do objeto do pagamento. Tratase de movimentação que envolvia valores altos (entre R$ 20.000,00 a R$ 200.000,00). A movimentação bancária, a partir de cheques avulsos, tornaria possível o desvio de verbas paga pela CBF à Federação. Segundo o Deputado Jurandil Juarez, poderia estar havendo um mecanismo ilícito, assim sintetizado: “a CBF simula um pagamento e envio de recursos a uma afiliada e alguém se apropria desse dinheiro”. Das muitas dúvidas geradas por esse procedimento, há um fato que chama especial atenção: o saque, pelo presidente da Federação, de cheque emitido pela CBF, no valor de R$ 150.000,00, em 10/12/1999. Francisco da Chagas Dissica nega, embora haja documento probatório do saque, na boca do caixa, junto ao Banco Real (agência 3, Av. Rio Branco, prédio da CBF, Rio de Janeiro). Seguem, abaixo, trechos do depoimento do Francisco da Chagas Dissica: “O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Sr. Dissica, eu tenho preocupado em repetir essa questão da pergunta porque num período curto de três anos foi retirado, sacado na boca do caixa, 1 milhão 667 mil 301 reais e 94 centavos. O que leva a preocupar ainda mais é que há uma procuração, uma assinatura só no cheque. O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ - Qual o período , Deputado? Qual o período? (...) O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – De 11/6/93 a 22/6/99. É muito dinheiro sacado na boca do caixa. Alguns desses cheques que já foram levantados pelo nosso Relator, por exemplo, cem mil em 7/2/96. Cento e cinqüenta mil em 10/2/99 e 25 mil também em 11/09/96 foram descontados na boca do caixa, na agência do Banco Real do Rio de Janeiro, onde a conta é da CBF, não é nem aqui em Manaus. O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ - Não, não, vou fazer uma declaração aqui agora que eu não sei o que vai dar, pode ter certeza de que a Federação Amazonense de Futebol nunca recebeu, reafirmo, em 99, nós recebemos da Confederação Brasileira, entre repasse e ajuda 187 mil reais. Eu nunca saquei um centavo no Rio de Janeiro. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - É um dado importante que o senhor está colocando. O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ - Reafirmo que nunca recebi, Deputado. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Nosso Presidente está chamando a atenção que os 150 mil foi no ano de 96. (...) Junto com o cheque de 100 mil. O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ - Repudio veementemente esses valores, eu tenho aqui. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Aí é que a gente levanta umas questões. Eu ia até perguntar se foi o senhor ou foi o tesoureiro que sacou na boca do caixa, porque com uma procuração, com uma assinatura única não há o controle entre as partes, quando a responsabilidade é dos dois do procurador de quem deu a procuração e de quem tem a autorização para fazer isso. Então, leva-se a esses questionamentos que estou fazendo em função disso. (Não identificado) - Em 96 com esses cem mil reais deu 248.923 reais. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Outro fato que chama a atenção é que nós quebramos o sigilo da CBF e constatamos o dinheiro saído da CBF. No caso desses cheques é que sai de lá em nome da Federação, por isso que foi sacado no caixa. Ele não chegou a entrar na conta da Federação, por isso que nós identificamos. A CBF também fez repasse... O SR. PRESIDENTE (Deputado Jurandil Juarez) - Me conceda um aparte? Porque veja: a pergunta foi feita com base nos documentos da CBF, uma vez que a Federação não encaminhou, toda a documentação não foi encaminhada, a própria Receita Federal nos envia a informação que o senhor jamais declarou imposto de renda. O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ - Da Federação, é verdade. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Da Federação, do senhor, inclusive, da Federação O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ - É verdade, que era inclusive ignorância minha. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Essa já é uma situação bastante grave, porque nunca foi declarada, não é uma federação que mexe com pouco dinheiro. Acabei de citar uma cifra que não é uma cifra baixa. O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ - Mas nesta época, Deputado, não era... não se pagava nada. Só a partir de 98. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Mas assim mesmo não foi declarado. O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ - Não foi declarado. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Mesmo que isso fosse considerado legal, como o senhor está dizendo que nós temos compreensão diferente disso. O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ - Perfeito. Eu entendo e realmente eu aceito essa crítica, como disse, mas não ... Esse dinheiro é para mim uma coisa absurda, não aconteceu mesmo.” Francisco da Chagas Dissica admite ter recebido R$ 100.000,00, mas contesta o pagamento de R$ 150.000,00: “Não, Sr. Presidente. O 100 mil aconteceu, retirado aqui, que veio, inclusive, antes do segundo jogo da seleção brasileira, pra gente fazer alguns pagamentos, pra depois serem ressarcidos, mas 150 nunca recebi não. Tá aqui, eu tenho aqui a relação dos depósitos, confere o de 100 mil, mas 150, esse eu nunca vi. Confesso, esse aqui pra mim é novidade. (...) Bom, existe alguns pagamentos daqui pra lá que foi quando nós fomos pagar o terceiro jogo da seleção brasileira. Não tenho de 150 mil. Confesso isso aqui pra mim é novidade. Não tenho, tá aqui, tenho todas os, as entradas aqui. Não tenho, sinceramente, não tenho. Esse pra mim... Nunca recebi 150 mil da CBF.” 3.2 DECLARAÇÕES DO IMPOSTO DE RENDA A Federação, no período entre 1995 e 2000, não declarou Imposto de Renda. O presidente da Federação, em seu depoimento, afirma que a entidade possui bens registrados em cartórios, como é o caso da sua sede, adiante mencionada: “E nós temos... Nós recebemos a Federação, para o senhor ter uma idéia, eu recebi a Federação numa sacola das lojas Belmiro, os documentos numa sacola. Só tinha uma sala. Ela tem 2 andares, tem auditório, tem tudo. Inclusive, só funcionava uma salinha pequenininha. E nós, hoje, temos uma Federação.” Federação. Igualmente não foram declarados os rendimentos bancários da 3.3 INSS A Federação tem dívida junto à previdência social. 3.4 O VEÍCULO ADQUIRIDO PELO CHEQUE DA CBF FRANCISCO DA CHAGAS DISSICA COM Francisco da Chagas Dissica, presidente da Federação, adquiriu um veículo Blazer, junto à concessionária de propriedade de João dos Santos Braga Neto, oferecendo um cheque da CBF para a Federação Amazonense de Futebol. O cheque da CBF foi recebido por João Braga com o endosso do Francisco da Chagas Dissica, e ao encaminhar ao banco para ter acesso ao dinheiro, João Braga endossou o documento pela segunda vez. O fato ocorreu em dezembro de 1998. O banco efetuou a operação, mesmo contrariando o dispositivo previsto na Lei nº 9.311/96, que veda o segundo endosso. Já aí identifica-se uma irregularidade na movimentação bancária. Segundo o Deputado Jurandil Juarez, presente à Sessão da CPI em Manaus, a operação configuraria uma “venda simulada”, envolvendo “um cheque de uma pessoa jurídica”, “duas pessoas jurídicas que são de notoriedade nacional, que ainda têm (...) o rótulo de sociedades civis de Direito Privado”. A operação sugere que Francisco da Chagas Dissica se apossou de verba que a CBF enviou para a Federação para a compra do veículo. Esse fato é confirmado pela absoluta ausência de documentação que nos leve a outra conclusão. Braga Neto: Seguem, abaixo, trechos do depoimento do empresário João dos Santos O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO – “ (...) O Sr. Francisco esteve conosco, o Sr. Dissica, no caso até comigo, na época, e propôs a compra de um carro, no final de 98 – eu não me lembro propriamente a data. Esse carro, na época, já era final do ano, e nós fizemos o negócio. E naquela época era permitido ainda por lei fazer o segundo endosso em cheques de terceiros. O cheque era nominal à Federação Amazonense de Futebol e ele, como era o Presidente, ele endossou e nós recebemos aquele cheque, sim. Porém, há uma complementação que, com certeza, acho que o senhor vai me perguntar, eu deixaria pra sua pergunta.” (...) “É uma Blazer..., executivo.” (...) “Saiu em nome dele, porém vale ressaltar o seguinte. Na realidade, o que foi colocado... Porque, pra mim, como empresário, eu queria vender o carro. Eu queria receber o dinheiro. Foi explicado, no momento, que aquele dinheiro era um dinheiro da Federação, que seria um modo de eu ajudar..., a empresa ajudar ele receber aquele dinheiro, porque a Federação estava com problema de não poder depositar o cheque. Ele deu o cheque pra nossa empresa, nós devolvemos em dinheiro, pra ele – isso está contabilizado – e ele pagou com cheque dele próprio, em 6 vezes.” (...) “A nota fiscal foi emitida em nome do Sr. Dissica. Nós recebemos o cheque de terceiros, no caso, da CBF; depositamos o cheque, devolvemos em dinheiro para o Sr. Dissica e ele pagou o carro com cheques dele próprio, que nós inclusive temos depósito desses cheques na nossa conta, do próprio Banco Safra, que foi aonde nós depositamos o cheque também da CBF.” (...) “Ele deu um cheque de 40 mil reais, nós devolvemos pra ele 32 mil e uma fração; ficou 6 mil e pouco como entrada e ele deu 6 cheques dele pra complementar os 40 mil reais.” (...) “Uma transação, porém, legal, contábil.” (...) O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – O cheque entrou na conta da Braga Veículos? O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO – Da Braga Veículos, positivo. (...) O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Qual é a quantidade de cheques que daí a Braga Veículos recebe? O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO – Seis cheques. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – No valor de quanto cada um? O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO – Cinco mil 300 e uma fração que, somados aos 6 mil, dá exatamente os 40 mil reais. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Quer dizer que 6 mil, nessa história, ficou por conta do cheque da Federação? Aquele da entrada não foi feito outro? O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO – Veja bem, eu respondo como empresário. Eu recebi 40 mil reais referente a um carro que eu vendi, no valor de 40 mil reais, e devolvi pro senhor Francisco Tomaz Dissica 32 mil e poucos reais, dos quais ele me deu 6 cheques dele, que foram devidamente pagos. (...) O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Então significa que o restante, pra completar os 40 mil, não foi cheque do Sr. Francisco? O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO – Não. (...) O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – ... da CBF... O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO – Correto. (...) O SR. DEPUTADO LÉO ALCÂNTARA – Sr. João Braga, V.Sa. disse que recebeu 6 mil e poucos reais de entrada, foi isso? O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO – Não. Eu recebi... A operação foi o seguinte. Foi dado um dado um cheque de 40 mil, certo, no qual foi devolvido 32..., 33 mil e uma fração... O SR. DEPUTADO LÉO ALCÂNTARA – Ah, 33 mil? O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO – É. Ficou um saldo de 6 mil e poucos reais como entrada e eu recebi, a empresa recebeu 6 cheques de R$ 5.337,00 que, somados a essa entrada, deu os 40 mil. (...) O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Diretor da Braga... Braga Veículos, não é? O senhor disse, com clareza — e tive o cuidado de anotar —, que o senhor, como empresário, queria vender e receber o dinheiro. O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO - Correto.” O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Eu acho que, empresarialmente, talvez, em tese, isso seja irrefutável. No entanto, nessa transação houve um cheque de uma pessoa jurídica, uma pessoa jurídica que trabalha um bem que é de toda a sociedade amazonense, a sociedade brasileira, que é o futebol. Então, mesmo o senhor sendo empresário, e eu queria lhe dizer que não vejo em mim nenhum preconceito, um preconceituoso contra a atividade empresarial. É minha origem, eu sou filho e neto de pequenos empresários. E exerço a atividade nessa área. Fui, durante sete anos, Presidente da Federação do Comércio da minha terra. Mas eu não posso concordar com o senhor. Eu acho que, até individualmente, isso possa ser justificável, mas, na verdade, a sua empresa participou da simulação de uma venda, o que não é correto, do ponto de vista empresarial. Eu posso aceitar, pela sua ótica, que foi simples: eu recebi um cheque de 40 mil reais, devolvi 33 e poucos, fiquei com 6 mil e recebi cheques, seis cheques, no valor de 5 mil, 337. Mas eu posso lhe dizer, em contrapartida, como Deputado, que o senhor pode ter feito isso, e, na verdade, ter trocado seis cheques de 5 mil para a pessoa que lhe fez a compra do veículo. O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO - Ter trocado como? O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Os seis cheques de 5 mil, 337. Porque, na verdade, foi esse o dinheiro da transação. O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO - Correto. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Seis mil e seiscentos reais não compunha o patrimônio da pessoa física que foi fazer a troca. Seis mil e seiscentos reais era um recurso da federação. O senhor poderia ter devolvido os 40 mil e, aí, não haveria questionamento, a não ser o Presidente, isso deverá acontecer, e qualquer uma outra forma de pagamento, até recebendo sete cheques — isso eu não entro no mérito —. Mas, na verdade, o que aconteceu foi uma operação simulada, em que o senhor trocou um cheque e vendeu um veículo, recebendo como entrada, como parte do pagamento — estou chamando de entrada aqui, por entender assim — , o recurso da federação amazonense de futebol, que o senhor sabia que era da federação, porque o cheque era da federação. Eu queria lhe perguntar sobre o endosso desse cheque. O cheque foi... o cheque era da federação, foi endossado pela federação, recebeu endosso. Quando passou pra Braga Veículos recebeu outro endosso? O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO - Para... na época, o senhor deve saber bem, como Deputado... primeiro, eu quero deixar claro pro senhor que isso é no seu entendimento, porque, no meu entendimento, como empresário, eu gostaria, também, com respeito a V.Exa., que eu discordo do seu posicionamento. E no meu fórum eu, nós, diretores de Braga Veículos, aqui representando a empresa, tenho certeza que eu não fiz nada de errado. Então, eu quero dizer o seguinte: que, naquele momento, todos os bancos aceitavam cheque de terceiros. E o que foi feito foi feito legalmente, depositado na conta um cheque de terceiro endossado. Eu queria lhe perguntar, lhe devolver até uma pergunta: se isso tem alguma ilegalidade. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – O senhor fez um segundo endosso no cheque, pra poder depositá-lo? O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO - Sim. Para depositar, naquela época, não era, não era... hoje, não é permitido ter o segundo endosso, mas na época, sim. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Qual foi a época? O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO - Noventa e oito, dezembro de 98. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Deixa eu só... O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO - Tanto é que o próprio Banco Safra recebeu o cheque. Se, por acaso, não fosse permitido, fatalmente o próprio Banco Safra não o receberia. Como não recebe hoje. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Então, eu vou ler para o senhor o que diz a Lei 9.311, de 1996. A operação foi em 98. Portanto, esta lei estava em vigor: O art. 17 da Lei diz o seguinte: “...que não pode haver um segundo endosso durante o período de tempo previsto no art. 20, inciso I. Somente é permitido um único endosso nos cheques pagáveis no País.” O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO - Só que eu acho que essa pergunta o senhor deveria fazer para o banco, porque o banco aceitou. Tanto é que nós temos o comprovante do depósito bancário na conta da empresa Braga Veículos.” (g.n.) A compra do veículo Blazer pelo presidente da Federação com o dinheiro da entidade foi assim comentada por Francisco da Chagas Dissica: “O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Mas o Sr. Braga diz que esse recibo aí foi do cheque da CBF... O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ – Sim. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – ... na qual era a Federação, o senhor endossou, e ele lhe devolveu 40 mil, ele devolveu segurando esses 6 mil, que ele segurou 6.778 lá, ele devolveu pro senhor a diferença. O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ – Perfeito. E é verdade isso, não é mentira. Agora, isso aí foi um artifício usado... O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Agora, quando é que foi paga essa diferença de 6.788? O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ – A ele? O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – A ele. O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ – Não, ele já ficou com o dinheiro. Quando ele descontou ... O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Mas o dinheiro não era do senhor era da Federação. O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ – Sim, mas, perfeito, e na Federação entrou os 40 mil, porque tinha 10 mil mandado pra fazer essa compra. E foi um artifício usado pra que exatamente se trocasse o cheque, tá certo? O cheque pra depositar aqui demoraria oito dias pra ficar disponível, tá, então, nós teríamos que sacar esse cheque também da mesma maneira que recebemos o dinheiro, com cheque avulso. Então, esse foi o artifício. Podem até pensar, mas o senhor usou 6 mil reais então do dinheiro da Federação ... O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – pensando. É o que eu estou O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ – ...é, mas eu poderia dizer, é, é, que tinha recebido 40, eu podia ter combinado com ele, né, que é meu amigo, combinado com ele e dizer: “Não, é, eu entreguei os 40 e depois ele me pagou a entrada em 6 mil reais”. Então foi isso que aconteceu. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – E o senhor tem o comprovante que fez esse depósito na conta da Federação? O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ – Tenho, tenho na prestação de contas, tenho. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Então é necessário nos entregar... O comprovante a que se refere Francisco da Chagas Dissica não foi encaminhado a esta CPI. 3.5 A F EDERAÇÃO E A EXPLORAÇÃO DE BINGOS De acordo com Francisco da Chagas Dissica, a Federação participou da exploração de bingos. Essa informação foi dada pelo presidente da Federação quando questionado acerca de pagamento de R$ 14.000,00 (em 16/06/1995), da Federação a José Edson Bezerra. Ao tentar explicar essa movimentação, Francisco da Chagas Dissica noticia à CPI duas ocorrências que valem registro: a primeira, de que teria acontecido sonegação de pagamento devido ao INSS; e a segunda diz respeito à forma como o presidente da Federação gere a entidade, colocando-a muito próxima de uma empresa de prestação de serviços. Segue o depoimento: “(...) Deixa eu pegar, que se for a pessoa que eu tô imaginando foi um representante do bingo, que nós iniciamos aqui, que era o Bingo do Palmeiras. Deixa eu só confirmar aqui o nome dele. (Pausa.) Edson, Edson Bezerra, o.k. Edson Bezerra foi um representante do, daquele bingo que era feito pelo Palmeiras. Era feito pelo Palmeiras, por um grupo de empresários de São Paulo, que nos procuraram e nós vimos naquele momento, 93, 94, por aí, mais ou menos, esses anos não me vem à memória o ano exato, para fazer uma parceria, a exemplo do que faziam com alguns clubes, em São Paulo, e nós logicamente, né, acordamos, e iniciamos esse, essa experiência nefasta, que realmente foi nefasta. (...) E aí, é que vem mais uma vez também certa solidariedade por parte, né, do Dr. Ricardo Teixeira. E eu levei a ele o problema, simplesmente nós realizamos quatro bingos, dois diretamente eles assumiram responsabilidade, e os dois últimos já veio, como deu certo, a Federação àquela época ganhou, salvo engano, treze, doze mil reais, oito mil uma, doze a outra, treze, não sei o número exato, passou a ser da Federação. Aí, eu envolvi dois dos companheiros que estão aqui, fui às suas cidades para a gente fazer junto e tal, era o Bingão da Amazônia. Nas duas primeiras vezes, aliás, na primeira vez, eu fui ao Diretor da Rede Amazônica, fui ao jornal A Crítica, fui a diversos empresários, porque graças a Deus, nós sempre tivemos um bom relacionamento com toda essa gente, e assinei os pedidos de própria publicidade e tal, e tal e a empresa exigiu, porque ela também manipularia dinheiro, que eu nomeasse então essa pessoa pra assinar conosco, né, os pagamentos, os compromissos. Primeiro, eu assinei; no segundo, veio, eu não assinei mais, eu não assinei. Eles assinaram, pagaram. Terceiro, eles assinaram; e quarto, assinaram, solicitações, inclusive, de uma empresa de São Paulo e tal. E não pagaram nenhuma delas. E foi minha sorte não ter assinado. Aqui, aquelas empresas onde eu fui, onde eu estive presente pedindo apoio, pedindo desconto para as propagandas, impressões em editores e tal, eu tive que honrar com esses compromisso. Eu tenho, tive, como disse. Aqui mesmo tem um aqui, olha: execução. Aqui tá: Justiça Federal. Essa aqui é do INSS, de um clube que o Promotor fugiu com o dinheiro. Nós távamos no estádio, não recolheu o 5%, e veio a confusão, que nós vamos chegar lá depois. Então, nós tivemos que honrar esses compromissos. Com o de São Paulo e alguns de fora, nós denunciamos o fato à Polícia, que tinha sido utilizado. E esse cidadão deixou uma carta pra mim, quando ele fugiu daqui, ele fugiu, inclusive, levou até o televisor da televisão, onde ele diz que tinha comprado com o dinheiro dele e tal. Mas nos deixou esse tremendo problema. Foi aí que nós procuramos a Confederação Brasileira, pedimos ajuda, pedi o jogo pra cá, do Brasil. Naquele ano estavam iniciando aqui a, a reconstrução do Estádio Vivaldo Lima não é nem reforma, era uma reconstrução. E nós então vimos naquilo ali a possibilidade de nós começarmos a sanar esses problemas. E foi o que aconteceu. Com um primeiro jogo, citado pelo Dr. René (...). Eu, naquele momento, eu podia ter cobrado até 20%, porque 10% é normal. Agenciamento de qualquer evento, agência de publicidade tudo ganha 20%. Com aquele 20% talvez tivesse sanado todos os problemas de imediato da Federação. Porque eu tive que continuar recorrendo pra fazer um outro jogo, um segundo jogo. E aí nós conseguimos equilibrar as coisas. Aí fizemos um terceiro jogo um ano depois. E ele não citou nada, sabe por quê? Porque deu prejuízo de 56 mil reais. E quem arcou com esse ônus fomos, fomos nós.” (g.n.) 3.6 CONSELHO FISCAL A contabilidade da Federação não tem qualquer controle. Os cheques avulsos mencionados anteriormente foram todos assinados duas vezes pelo diretor financeiro da entidade, José Castro de Lima, portador de procuração do presidente (mesmo após a vigência do instrumento procuratório). O órgão que estatutariamente, competeria fiscalizar e aprovar as contas da entidade, não possui autonomia para levantar questionamentos à movimentação da Federação, centralizada pelo seu presidente. Em seu depoimento, Francisco da Chagas Dissica confirma que o conselho fiscal não fiscaliza e assume que a gestão da entidade é baseada na “informalidade” e na afinidade entre a pessoa do presidente e seus membros: “O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Quem são os membros do Conselho Fiscal hoje nominalmente? O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ - É Vandico Pereira Cardoso, comerciante, meu ex-sócio. É Roberto de Lima Caminha, João Paulo Pereira, é... Tamer Freire de Versoza, cidadão que é... foi presidente também de entidades esportivas, CBDU, e até hoje pertence ainda à CBDU e mais outros dois membros que não me vêm o nome. Três titulares e três suplentes. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - O Sr. Vandico Pereira Cardoso era sócio do senhor? O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ - Era. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - O Sr. João Paulo Ferreira de Oliveira é sobrinho do senhor? O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ - Não. Não. Cunhado. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Cunhado do senhor? O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ - Cunhado. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - O senhor acha que há isenção num conselho fiscal com graus de parentescos e de sociedade? O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ - Dr. Rosinha, vamos abrir o coração e falar a verdade. Essa informalidade no futebol, se os senhores verdadeiramente e a CPI viesse pra dar uma punição generalizada por esses problemas, né, que aconteceram... Porque o futebol sempre funcionou nessa informalidade.” (g.n.) 4. RELAÇÃO COM A CBF A Federação Amazonense recebeu da CBF, nos anos de 1998 a 2000, os seguintes valores: em 1998, R$ 6.000,00 por mês, com exceção do mês de dezembro, quando a Federação recebeu R$ 46.000,00; em 1999, o repasse mensal foi de R$ 12.000,00, com as exceções de janeiro (R$ 6.000,00), fevereiro (R$ 31.000,00) e julho (R$ 42.000,00); em 2000, a Federação recebeu R$ 37.000,00 em janeiro, e nos outros meses, o repasse foi de R$ 12.000,00. Além desses valores, registre-se o acima mencionado, no valor de R$ 150.000,00. Verificar gráfico a seguir: DOAÇÕES DA CBF À FEDERAÇÃO AMAZONENSE DE FUTEBOL 1998 - 2000 R$ 50.000 40.000 30.000 20.000 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/2000 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/99 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO 0 JAN/98 10.000 MESES Francisco da Chagas Dissica afirma, sobre a relação entre Federação e CBF, que se negou a seguir a sugestão de advogado supostamente vinculado à CBF, e ajuizar ação contra a CPI: “Em absoluto. Aqui tão, (...) tão quatro presidentes. Todos nós fomos contrários a isso, porque nós entendemos que não cometemos deslize nenhum que pudesse vir a nos causar problema. E nós fomos contrários a isso. Só um minutinho Deputado. Veio pra cá advogado do Rio de Janeiro, constitucionalistas, vieram pessoas importantes do futebol brasileiro, pa exatamente talvez tentar conseguir o apoio de mais federações para consubstanciar essa, essa, essa solicitação, né, de não, de não fazê-lo. Nós nunca entramos em nenhum momento, nem pensamos em entrar, contra qualquer tipo de ação pa impedir que verificasse qualquer coisa. Tanto é que não entramos, não tem nada disso.” 5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL O presidente da Federação Amazonense foi Prefeito em uma cidade do interior do estado. Enquanto candidato, reconhece que há ajuda, mesmo que indireta, da CBF, em termos de material esportivo. A utilização desse material e sua distribuição, auxiliariam em uma campanha. Como dirigente da Federação e tendo em vista que sua gestão foi marcada por uma forte centralização na pessoa do presidente, é plausível considerar a hipótese de que Francisco da Chagas Dissica tenha instrumentalizado o material esportivo da entidade em sua campanha eleitoral. Além disso, dado o descontrole das contas da Federação, é impossível afirmar que não houve utilização das suas verbas em financiamento de campanhas políticas. Segue trecho do depoimento do Francisco da Chagas Dissica: O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – Recebeu, já que o senhor disse que foi candidato a Prefeito, recebeu ajuda da CBF, do Ricardo Teixeira, na sua campanha? O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ - Não recebi ajuda. Isso aí seria um engodo, quem não recebeu o dinheiro assim declarado, explicitamente pra política. Eu não recebi esse dinheiro explicitamente pra política. Mas lógico, nós não somos nenhuma, nenhuma criança. Todos sabem, o material esportivo, não é, que você dá prum clube duma comunidade, o material esportivo logicamente você compra com esse dinheiro que vem, né, de alguns repasses da CBF, logicamente que isso ajuda, ajudam na política, não resta a menor dúvida. 6. CONTRATOS COM A TV A Federação Amazonense de Futebol não possui contratos de transmissão de jogos com emissoras de televisão de canal aberto, sendo que a Federação, com a concordância dos clubes, acerou com a Sky para que esta emissora de canal fechado transmita jogos da primeira divisão do campeonato estadual. Francisco da Chagas Dissica não informou se a empresa remunerará a Federação ou os clubes. Houve um fato que foi objeto de denúncia contra a Federação. Trata-se de jogo envolvendo o clube Sul América, que foi transmitido pela emissora do canal 13, sem autorização ou acerto com os clubes e sem o pagamento referente ao direito de imagem. Conforme estatuto da CBF, a Federação não poderia permitir a transmissão nestes termos. A Federação se omitiu. O fato foi exposto da seguinte maneira no depoimento do Francisco da Chagas Dissica: “Bom, veja bem, o Presidente do Sul América queria que a Federação tomasse uma ação, formalizasse uma ação jurídica contra a televisão, quando nós — nós e todos os outros clubes —, e ficou claro aqui que só o Sul América foi contrário, todos os outros queriam e querem ter os seus jogos transmitidos, porque eram categorias básicas, não era nem profissional, ter transmitido os jogos. Isso, aí, se for possível até se pagar pra fazer isso com a televisão... quer dizer, é importante pra essa criançada, pra essa molecada poder se sentir prestigiada e ser vista, tá certo? Então, nós entramos em contato com a televisão, exatamente dizendo que o clube tal não havia protestado contra isso. E mais, conforme confirmado aqui, nem um jogo mais foi transmitido. Agora... (...) O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Mas esse direito de imagem anterior não foi pago. O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ - Não. Veja bem, mas não houve cobrança, porque também o Sul América não exigiu cobrança, ele não permitiu mais, também, que fosse feito. E agora, por exemplo, estamos com a Sky transmitindo... iniciamos esse... essa parceria dia 6, agora, depois de negociação e tal. Nós estivemos tentando, durante algumas semanas, puxar o que fosse possível da Sky para ver se... ver se conseguíamos pagar pelo menos a arbitragem, quadro móvel e alguns clubes, devido às vendas serem mínimas, estarem passando dificuldades e até atrasando pagamentos de quadro móveis. Como a exemplo de Estádio Vivaldo Lima, existem alguns atrasos. Eu tô esperando chegar esse valor, depois de negociações, a primeira parcela, para mim, exatamente, pagar àqueles clubes esses valores. E, graças a Deus, todos os clubes, os nove clubes que estão disputando campeonato profissional, aquiesceram e assinaram. E até mesmo sem valor nenhum, seria de interesse pra nós que a Sky mostrasse pra seiscentos e poucos mil assinantes o futebol do Amazonas, nesse primeiro momento. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – É, eu sei que todo garoto gosta de se ver, ou na televisão, ou gosta de ser assistido pela televisão, porém, há um dispositivo legal... se ver no sentido de vídeo, a posteriori... Porém, há um dispositivo legal que não foi cumprido. E eu quero, talvez aqui pode até entender como censura, mas entender que qualquer protocolo tem que ser dado resposta. E parece que o senhor é bastante omisso, não responde absolutamente nada, pelo menos, esses documentos que eu fui citando aqui... o caso do Júnior, do São Raimundo, não houve a resposta por escrito; o caso do campeonato encerrado, não houve resposta por escrito; pelo menos, não está anexado; o chamado golpe no peladão; e outras questões mais, como esse do Canal 13. Realmente há dois pedidos aqui: “Assim sendo, para o cumprimento das normas legais já citadas, que... se possível, uma demanda judicial, a requerente solicita dessa federação, como litisconsorte, nas seguintes medidas administrativas: que a Rádio e Televisão Rio Negro, Canal 13, seja notificada a pagar os direitos de transmissão ao vivo da partida realizada no último sábado, dia 16/02/97; e que a emissora de televisão seja notificada para o cumprimento das normas sobre o assunto, caso seja seu interesse continuar”. Pelo menos, a resposta, dizendo que não aceita ser litisconsorte deveria ser dada. No mínimo, isso. O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ – Perfeito, Deputado... O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Mas aqui não tá que foi feito essa resposta... O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ – Perfeito, mas foi feito isso verbalmente em reunião com os clubes. Foi feito isso, e nós tomaríamos as providências, foi cobrado isso por eles, algumas vezes, e foi... O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Isso consta em ata? O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ – Hã? O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Isso consta em ata, que foi feito oralmente? O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ – Não, mas foi feito, tanto é que ele mesmo disse que não foi mais transmitidos os jogos dele. Não foi mais, acabou, não foi mais. E não foi por discriminação, não, foi simplesmente porque não foi mais permitido. E a televisão até parou de transmitir exatamente por causa desse impasse.” 7. RELAÇÃO COM OS CLUBES Conforme denúncias apresentadas à CPI por Renê Gomes da Silva, dirigente do clube Sul América, a relação entre a Federação e os clubes e ligas do estado é de desconfiança, que se estende até mesmo ao Tribunal de Justiça Desportiva. Francisco da Chagas Renê informou que vários desportistas locais encaminharam ao Conselho Estadual de Esporte, com um rol de queixas sobre a Federação e seu presidente. Desde beneficiamento a determinados clubes e boicotes a outros, a desvio de verbas e extinção do futebol feminino, a direção da Federação se caracterizaria, segundo Renê Gomes, pela constante prática de irregularidades e pelo controle político sobre os clubes. Outrossim, o campeonato amazonense da juniores de 1999, de acordo com denúncias, não chegou a termo, demonstrando falta de capacidade da Federação em administrar as competições que envolvem os clubes. 8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DO FUTEBOL Francisco da Chagas Dissica trabalha como empresário no setor das comunicações, tendo experiência em comércio de importados. Do seu histórico na Federação, conforme apurado pelos documentos e depoimentos, constata-se que sua atitude sempre foi a de gerir a Federação como uma empresa de sua propriedade, associando-a a empreendimentos econômicos. Assim foi o caso do vínculo com o bingo. Especificamente quanto à relação entre Federação e empresários do futebol, pode-se supor uma ligação na exploração de atletas que são utilizados por clubes com idades alteradas. A denúncia do Renê Gomes, dirigente do clube Sul América, sobre a utilização pelo clube São Raimundo (do qual Francisco da Chagas Dissica teria vínculos) de um “gato” em partida de futebol, é admitida pelo próprio Francisco da Chagas Dissica, que assume a omissão da Federação, comportamento também verificado pelo Tribunal de Justiça Desportiva local: “O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - O Sr. René trouxe uma denúncia do caso do júnior do São Raimundo. Eu fiquei aqui analisando o documento e, considerando que esses documentos são verdadeiros, houve o protocolo desse documento na federação... a data tá um pouco apagada, e o carimbo, mas acho que é 7/10/99. E a denúncia é grave, demonstrando que é mais um gato do futebol brasileiro. O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ - Mais um gato? O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Mais um gato. Não tô dizendo o senhor, mais um gato no futebol brasileiro. O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ - Perfeito, não, eu entendo. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - É... qual foi a ... a ação que tomou a Federação Amazonense a respeito disso? O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ - Olha, salvo engano, nós encaminhamos isso, Deputado, para registro policial. Salvo engano, porque O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Salvo engano? O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO TOMAZ - É eu não posso afirmar, não vou afirmar, mas, vejam bem, aconteceram aqui alguns casos que nós mandamos inclusive pra polícia pra instalar inquérito. Agora, infelizmente, numa cidade, hoje já não tão pequena, existe sempre aquele... aquela coisa, né, de amizade. Aí um diz pro outro: “Deixa pra lá, vai prejudicar o rapaz”. Aí começa essas coisas. Mas, na verdade, a responsabilidade disso, e precisa ser tomada alguma providência mesmo, é contra quem faz essa... essas falsificações e levam pra federação essas coisas. E depois a responsabilidade sempre cai na costa da federação, sempre.” 9. CONCLUSÕES , ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES Da análise de todos os documentos e do depoimento do Francisco da Chagas Dissica, concluímos que a Federação Amazonensede Futebol tem uma administração absolutamente temerária, além de total descontrole contábil e fiscal. Constatou-se sonegação fiscal, admitida pela presidente. Foi comprovada a falta de fiscalização e controle das contas, além de irregularidades estatutárias e diversas ilegalidades. Desde nepotismo a ofensas básicas aos estatutos da Federação, até o descumprimento de ordem da CPI. Há necessidade de que a Receita Federal promova (1) fiscalização na entidade no sentido de apurar o recebimento por parte da Federação dos valores enviados pela CBF, bem como (2) investigar, na CBF, se houve desvio de recursos da Confederação, de acordo com as informações desta CPI divergentes das prestadas pelo presidente da Federação amazonense. No aspecto administrativo, recomenda-se uma imediata reforma estatutária para limitar o mandato da diretoria da entidade em no máximo quatro anos, impedindo a recondução aos cargos; para permitir uma maior autonomia do conselho fiscal; para obrigar a realização de licitação para a aquisição de bens e de material esportivo; e para estabelecer maior transparência nas contas da Federação e nos repasses de verbas que envolvam a entidade e os clubes. Diante do descalabro administrativo em que se encontra a Federação, sugere-se a intervenção naquela filiada, de acordo com o art. 8., do Estatuto da CBF. Quanto à empresa Braga Distribuidora de Veículos Ltda., que a Receita Federal apure a negociação feita com o presidente da Federação do Amazonas, com a contabilização do cheque da CBF que tinha como favorecido a Federação, e que contém mais de um endosso, bem como a existência de outras transações que, porventura, existam entre as duas entidades. Sugere-se, ainda, encaminhar o presente Relatório à Receita Federal, ao Ministério Público Federal, ao Ministério Público do Estado da Amazonas – no tocante aos casos de “gatos” e aos atos que ofendem o direito do consumidor, assegurados na Lei nº 8.078/90 e na Lei nº 9.615/98 (art. 42, § 3º) –, e ao Ministério Público Eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba, com base na Lei nº 9.504/97. BAHIA 1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DAS FEDERAÇÕES : O estatuto da entidade, alterado por assembléia geral extraordinária realizada em 22/07/1997, dispõe que a Federação Paraibana de Futebol é uma “associação civil de direito privado, sem fins lucrativos, de finalidades desportivas, com personalidade jurídica e patrimônio próprios” (art. 1º), tendo como objetivos: “dirigir o futebol (...) incentivando a sua difusão e aperfeiçoamento”; “promover (...) campeonatos, torneios e outros eventos de futebol”; “incrementar a cultura física, intelectual, moral e cívica dos desportistas (...)”; e “colaborar para o progresso material e técnico das associações filiadas (...)” (art. 2º). O estatuto define como “poderes” da entidade: a assembléia geral (composta das associações filiadas e ligas amadoras), o Tribunal de Justiça Desportiva, o Conselho Fiscal e a Diretoria (art. 3º). Os diretores da entidade devem ter dedicação “prioritária” à Federação (art. 20, § 1º), e poderão ser remunerados por suas atividades em valores aprovados pelo Conselho Fiscal, a partir de proposta da Presidência (art. 20, § 2º), sendo esses valores limitados em até 120 salários mínimos (omite-se a periodiciodade desse limite: não se sabe se se trata de remuneração mensal ou anual). 2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA: A Federação é presidida, desde janeiro de 2001, por Ednaldo Rodrigues Gomes. Antes dele, presidiu a entidade por oito anos o Virgílio Elísio da Costa Neto. Ednaldo Rodrigues fazia parte das gestões anteriores, como diretor. 2.1. “PROFISSIONALIZAÇÃO ” DA FEDERAÇÃO E REMUNERAÇÃO AOS SEUS DIRIGENTES A Federação Bahiana de Futebol, a partir da alteração estatutária de 1997 acima indicada, passou a remunerar seus dirigentes. A nova redação dada ao estatuto, ao permitir a remuneração, contém uma grave injuridicidade: enquanto seu art. 20, § 2º prevê que o Conselho Fiscal aprovará a remuneração, o dispositivo que dispõe sobre as competências do Conselho Fiscal não dispõe sobre aprovação, conforme se verifica da seguinte redação: “oferecer parecer sobre os valores de remuneração da Diretoria, após análise da proposta encaminhada pela Presidência da FBF” (art. 24, § 3º). Oferecer parecer não significa aprovar. A Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, que “dispõe sobre as Sociedades por Ações”, que ora tomamos como legislação análoga, estabelece competências apenas consultivas para o Conselho Fiscal, e não executivas, como seria o caso de aprovar valores para remuneração. Conforme depoimento do Ednaldo Rodrigues, a Federação remunera seu presidente e alguns dos seus diretores a título de “pró-labore”. O presidente recebe, atualmente, R$ 8.000,00 mensais. Questionado a esse respeito, considerando que o estatuto da CBF não prevê remuneração de dirigentes e que os estatutos das Federações não podem ser conflitantes com o da CBF (arts. 52, I, e 53 dos estatutos da CBF), assim respondeu Ednaldo Rodrigues: “O curioso é que o Estatuto de qualquer entidade, de qualquer Federação quando existe uma reforma até ele está totalmente validado passa para a diretoria jurídica da CBF, o qual aprecia. E o Estatuto da Federação, em 22 de julho de 1997, quando teve as suas reformas aprovadas pela Assembléia Geral, foi submetido á CBF. Se a CBF não colocou nenhum impedimento e também através da Constituição Federal no seu 217, que dá autonomia administrativa às entidades, a Federação entendeu que estava fazendo correto.” A Federação remunera seus dirigentes desde 1997, após reforma dos estatutos, quando a entidade foi, nas palavras do seu presidente, “profissionalizada”. Seguem, abaixo, trechos do depoimento do Ednaldo Rodrigues: “O SR. EDNALDO RODRIGUES GOMES - A Federação tem três diretores. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - Três diretores. Remunerados? (...) O SR. EDNALDO RODRIGUES GOMES - São 4.500 reais ao diretor administrativo financeiro, 4.500 reais ao diretor técnico, e 2.000 reais ao diretor departamento do interior.” (...) “O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – (...) O senhor é dirigente há quantos anos da Federação? O SR. EDNALDO RODRIGUES GOMES – A partir de janeiro de 98. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Janeiro de... já era remunerado anteriormente. O SR. EDNALDO RODRIGUES GOMES – Já, no cargo de Diretor do Interior. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – E o Sr. Virgílio Elísio é o ex-presidente? O SR. EDNALDO RODRIGUES GOMES – É o ex-presidente. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Também era remunerado. O SR. EDNALDO RODRIGUES GOMES – Exatamente.” A remuneração paga aos dirigentes da Federação se dá a título de prólabore, conforme documentação analisada pela CPI e confirmada pelo depoimento do Ednaldo Rodrigues. Pró-labore é a retirada que os sócios de uma empresa privada se permitem fazer, na repartição de seus lucros. Por essa conclusão, o pagamento aos dirigentes da Federação Bahiana não se dá como remuneração pelas atividades prestadas, mas como divisão de lucros. Ocorre que a entidade não tem fins lucrativos, o que aproxima o ato dos dirigentes a uma grave irregularidade administrativa, envolvendo a verba, o patrimônio da Federação. Segue, abaixo, trecho do depoimento em que Ednaldo Rodrigues admite receber pró-labore: “O SR. EDNALDO RODRIGUES GOMES - A Federação, em 22 de julho de 1997, quando fez a reforma estatutária, ela se tornou profissional, sendo que seus diretores dando exclusividade de trabalho à federação e em conseqüência também em remuneração. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - O senhor recebe a que título? O SR. EDNALDO RODRIGUES GOMES - A título de prólabore. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - Deixa só eu terminar a pergunta, Dr. Ednaldo, por favor. O senhor pode me informar o valor, é a título de pró-labore? O SR. EDNALDO RODRIGUES GOMES – Pró-labore. 8 mil reais.” 3. SITUAÇÃO FISCAL E FINANCEIRA 3.1. IMPOSTO DE RENDA A Federação Bahiana de Futebol não encaminhou à Receita Federal as declarações de Imposto de Renda nos exercícios de 1996 e 1997. A Federação declarou à Receita Federal em 1999, ano calendário 1998, e em 2000, ano calendário 1999, que sua forma de tributação teria como base àquela de quem recebe lucro real. Seu estatuto, ao contrário, dispõe que a entidade não tem fins lucrativos. Trata-se de questão não esclarecida por Ednaldo Rodrigues, conforme se vê abaixo: O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – (...) A declaração do Imposto de Renda: vem a definição, forma de tributação do lucro, definese como lucro real. A Federação é uma entidade sem fins lucrativos? O SR. EDNALDO RODRIGUES GOMES – Olha, pelo estatuto, é uma entidade sem fins lucrativos. Curiosamente, ao declarar-se, em 1999 e em 2000, com lucro real, ao mesmo tempo a Federação encaminhou à Receita Federal, no item natureza jurídica, como sendo “outras formas de organização sem fins lucrativos”. A Federação utilizou de ardil para manter-se em uma confusa e impossível situação híbrida: entre lucrativo e sem fins lucrativos. 3.2. P ATRIMÔNIO E REMUNERAÇÃO DE DIRIGENTES O valor da remuneração do presidente da Federação Bahiana (R$ 8.000,00 por mês) é desproporcional à realidade do futebol bahiano. São poucas as equipes que disputam a primeira divisão do campeonato, e apenas dois clubes têm projeção nacional: o Bahia e o Vitória. Ambas as entidades de prática desportiva transformaram-se em empresas, sob o modelo de sociedade anônima. O atual presidente ocupa o cargo desde janeiro de 2001, tendo sido diretor (do interior) na gestão anterior. Trata-se de questão comentada no item 2.1., acima. 3.3. I NSS Junto à previdência social, a Federação tem uma dívida de R$ 796.328,33, sendo mais de 20% referente a contribuições recolhidas e não encaminhadas ao INSS. A Federação comprometeu-se a pagar sua dívida por meio do programa REFIS. 3.4. SONEGAÇÃO NO PROGRAMA “SUA NOTA É UM SHOW” A Federação Bahiana contratou com a Secretaria da Fazenda do Governo do Estado da Bahia, para os campeonatos estaduais de 1999 e de 2000, em suas principais divisões de profissionais, a permuta de ingressos por notas fiscais. Trata-se do programa “sua nota é um show”. Ocorre que a própria Secretaria da Fazenda alegou que a Federação não estaria cumprindo suas obrigações públicas, a saber, recolhendo tributos à menor. O mecanismo da Federação era divulgar, no borderô, uma receita irreal, onde o ingresso era comercializado por R$ 0,88, quando 80% da carga do estádio já havia sido vendida pelo programa “sua nota é um show”, de forma prévia, por R$ 2,34. Assim, quanto menos público, maior a diferença que era deixada de recolher pela Federação. Caso concreto foi relatado pela imprensa, conforme transcrição abaixo: “No jogo Galícia x Camaçari, no dia 18 de abril do ano passado, também na Fonte Nova, o governo do estado pagou o equivalente a 67.980 mil ingressos, enquanto o borderô anunciava a renda de apenas R$ 15 mil, correspondente a 6.410 ingressos, menos de 10% do que foi pago, antecipadamente, pelo próprio governo. Ainda nesse documento, a entidade declara o recolhimento de apenas R$ 750,00, de Iapas, correspondente a renda bruta de R$ 15 mil, quando, na realidade, deveriam ser recolhidos R$ 7.956,00 (INSS), R$ 3.978,00 (ISS) e R$ 2.386,80 (IR).” (“A Tarde”, edição de 11/03/2000) 3.5. MOVIMENTAÇÃO ENTRE AS CONTAS BANCÁRIAS DA FEDERAÇÃO E DO SENHOR VIRGÍLIO ELÍSIO DA COSTA NETO O ex-presidente da Federação Bahiana de Futebol, Virgílio Elísio da Costa Neto, tinha uma movimentação bancária intensa com a Federação. O dinheiro saia da Federação para a conta do Virgílio Elísio, e da conta deste para a Federação com grande regularidade. Tal movimentação, observada nos anos de 1996 e 1997, ocorreu até dois meses após a última reforma estatutária. O quadro é de uma tal promiscuidade, que não restou esclarecida a que título, baseando-se nos estatutos da entidade, foram feitos os pagamentos de um para o outro. Aparentemente, o Conselho Fiscal silenciou sobre essa circulação entre contas. Trata-se de um fato que não encontra respaldo legal nem estatutário, e sugere procedimentos contábeis irregulares. 4. RELAÇÃO COM A CBF A Federação Bahiana de Futebol não recebeu, entre os anos de 1998 e 2000, qualquer auxílio financeiro da CBF. Conforme o critério adotado e publicamente assumido por Ricardo Teixeira, apenas as entidades com dificuldades financeiras seriam beneficiadas por repasses da CBF. Por esse critério, a Federação Bahiana estaria, aos olhos da CBF, em uma relação estável. Ao contrário do que foi observado em outras Federações, a entidade bahiana pagou à CBF um valor significativo, fato não esclarecido por Ednaldo Rodrigues, em seu depoimento em João Pessoa, conforme o quadro abaixo. Movimentações financeiras entre Federação e CBF (1998/2000). Ano Pagamento da CBF para a FBF (R$) Pagamento da FBF para a CBF (R$) 1998 0,00 0,00 1999 0,00 246.377,97* 2000 0,00 0,00 *consta aqui o valor de R$ 130 mil, referente a pagamento em espécie à CBF, como cota do jogo entre as seleções brasileira e holandesa, em 03/06/99. 5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL Não foram levantadas informações e denúncias relevantes no tocante à relação entre a Federação Bahiana de Futebol e a política local. 6. CONTRATOS COM A TV Conforme documentação encaminhada à CPI, os contratos entre as empresas de captação e transmissão de imagens e a Federação se dão anualmente. A análise do contrato celebrado entre a Federação e a Televisão Bahia Ltda., que teve como objeto a “captação, fixação e transmissão dos sons e imagens de jogos do Campeonato Bahiano de Futebol”, na temporada 2000 do Campeonato Bahiano de Futebol, sugere a transferência de responsabilidade sobre os participantes do campeonato da Federação para a empresa. Nesse sentido, cláusula contratual específica prevê o compromisso da Federação em limitar em dez a quantidade de clubes participantes da primeira divisão. Depreende-se da análise do contrato e de denúncias divulgadas pelos clubes Galícia Esporte Clube e Ypiranga Esporte Clube, que o determinante para se chegar ao mencionado limite não seria a decisão dos clubes de futebol, conforme alegou Ednaldo Rodrigues durante a Sessão da CPI em João Pessoa, mas os interesses da empresa de televisão. Trata-se de suspeita de ingerência da empresa Televisão Bahia Ltda., que ao firmar o comando, passaria a controlar o calendário do principal evento futebolístico estadual, no tocante ao desporto de rendimento. 7. RELAÇÃO COM OS CLUBES A relação entre a Federação e os clubes não é tranqüila. Pode-se observar, por meio de denúncias de clubes filiados, a insatisfação envolvendo o Campeonato Bahiano de 1999, que não conheceu seu campeão. Nessa competição, a Federação resolveu, por um lado, postergar a solução do problema, mantendo a expectativa sobre quem seria o campeão, se o Esporte Clube Bahia ou se o Esporte Clube Vitória (os maiores clubes do estado), e por outro, decidiu que os dois últimos colocados na competição – o Galícia Esporte Clube e o Ypiranga Esporte Clube – cairiam para a segunda divisão. Estes dois clubes passaram a questionar publicamente a decisão, provocando um mal estar geral entre o grupo de clubes menores e a Federação, supostamente melhor relacionada com os dois clubes maiores (Bahia e Vitória). Outra situação conflituosa nessa relação se deve aos questionamentos, também por parte dos clubes menores, acerca de divisão do dinheiro oriundo do contrato de transmissão de jogos do Campeonato Bahiano. O Campeonato Bahiano de 2000 não cumprirá, segundo determinação da Federação, o que dispõe a Lei Pelé em relação à necessidade de descenso dos clubes da primeira para a segunda divisão. O critério técnico, exigido pela Lei, não será observado, embora a decisão da Federação preveja a “subida” dos melhores colocados na segunda para a primeira divisão a ocorrer na temporada imediatamente posterior. Em seu depoimento à CPI, Ednaldo Rodrigues confirmou essa determinação. A mais recente questão que se coloca entre a Federação e os clubes se refere à decisão do Esporte Clube Bahia e do Esporte Clube Vitória de não participar do Campeonato Bahiano da próxima temporada, em 2002. Os clubes desejam participar apenas da Copa Nordeste, cujo gerenciamento foge da alçada da Federação Bahiana de Futebol. A decisão gera um problema legal, vez que os clubes participantes da Copa do Nordeste não se submeteriam ao critério técnico para acesso e descenso (exigência da Lei nº 9.615/98). 8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DO FUTEBOL Dos documentos encaminhados à CPI e da análise do depoimento do Ednaldo Rodrigues, não foram levantadas informações ou denúncias de relevante interesse na relação entre a Federação Bahiana de Futebol e os empresários do futebol. 9. CONCLUSÕES , ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES Da análise de todos os documentos e do depoimento do Ednaldo Rodrigues Gomes, conclui-se que a Federação Bahiana de Futebol apresenta-se com problemas administrativo, financeiro e fiscal. Constatou-se sonegação fiscal nos anos de 1995 a 1997 e informações irreais encaminhadas à Receita Federal. Suspeita-se de ingerência e controle político da emissora de TV sobre a Federação, ao menos no ano de 2000. Ao remunerar seus dirigentes em valores altos, incompatíveis com seu patrimônio (não tem bens imóveis ou veículos), a Federação ofende seu próprio estatuto, à medida que há nítida distribuição das verbas recebidas pela entidade, facilmente identificadas como lucros. Recomenda-se reformar os estatutos para suprimir a possibilidade de remunerar os dirigentes da entidade e para limitar o mandato da diretoria da Federação em um máximo de quatro anos, além de se buscar impedir a recondução aos cargos, permitir uma maior autonomia do conselho fiscal, obrigar a realização de licitação para a aquisição de bens e de material esportivo e estabelecer maior transparência nas contas da Federação e nos repasses de verbas que envolvam a entidade e os clubes. Sugere-se encaminhar o presente Relatório à Receita Federal, ao Ministério Público Federal, ao Ministério Público do Estado da Bahia – no tocante às verbas recebidas pelos ex-diretores e diretores da Federação Bahiana de Futebol, aos atos anti-estatutários dos próprios dirigentes, considerando-se a possibilidade de devolução das verbas irregularmente percebidas, e aos atos que ofendem o direito do consumidor, assegurados na Lei nº 8.078/90 e na Lei nº 9.615/98 (art. 42, § 3º e art. 89), em especial no que se refere à quebra do princípio de acesso e descenso. BRASÍLIA 1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DAS FEDERAÇÕES A Federação Metropolitana de Futebol constitui-se como uma associação civil com finalidades desportivas, sem fins lucrativos. De acordo com seu presidente, a Federação não remunera seus dirigentes. 2. S ITUAÇÃO ADMINISTRATIVA A Federação Metropolitana de Futebol, anteriormente denominada Federação Brasiliense de Futebol, é presidida por Weber Azevedo Magalhães desde 1996, que está em seu segundo mandato. Weber Magalhães se iniciou em entidades de administração do futebol de Brasília em 1989, quando foi designado representante da CBF em Brasília, função que desempenhou por três anos, de acordo com reportagem do Correio Braziliense, de 2/3/2000. Funcionário do Senado, vice-presidente financeiro da Federação por três anos (1992 a 1996) na gestão do presidente Tadeu Roriz, Weber Magalhães elegeu-se presidente em 1996 com o apoio de Ricardo Teixeira. Conforme a reportagem, Weber Magalhães exerceu a função de lobista da CBF, durante a tramitação e posterior aprovação da Lei Pelé, sendo o anfitrião da chácara que a entidade mantém no Lago Sul. 2.1 N EPOTISMO A Federação mantém como funcionário o irmão do presidente, Wagner Magalhães, que é também funcionário registrado da CBF (administra a casa da CBF, em Brasília, no cargo de auxiliar de escritório). Já na Federação, Wagner tem o cargo de “Assessor de Informática da Presidência”. Além do irmão do Weber Magalhães, a Federação emprega o sobrinho do presidente, Mário Vítor Magalhães, como assistente técnico do Departamento de Futebol Amador/Profissional. 2.2 ELEIÇÕES NA FEDERAÇÃO Em 2 de março de 2000, Weber Magalhães foi reeleito presidente da Federação Metropolitana de Futebol. Para essa eleição a entidade publicou o edital das eleições no Diário Oficial da União e na seção de pequenos anúncios do Jornal do Brasil, do Rio de Janeiro. Isso foi o que informou o Correio Braziliense daquela data. Disse o jornal, na reportagem intitulada “ Na Surdina”: “A rigor, não há nada de errado nisso. Até porque a Lei Pelé determina apenas que o edital seja publicado ‘em jornal de grande circulação’. Mas é no mínimo estranho que uma publicação, de interesse apenas no âmbito do Distrito Federal, não seja divulgada nos jornais da cidade. Tinha dirigente de clube que nem sabia a data da eleição”. (...) O cartola argumenta que não tinha motivos para esconder nada até porque não há concorrentes à presidência. ‘Ninguém apresentou chapa. Não há outro candidato.’”. (...) O xeque-mate dado por Weber Magalhães para conseguir o apoio dos eleitores foi a verba de R$ 600 mil obtida do Governo do Distrito Federal. Desse valor, quase R$ 500 mil serão divididos entre os clubes para que paguem as despesas nestes cinco meses de Campeonato Brasiliense. Os outros R$ 100 mil serão divididos entre a FMF e as categorias amadoras. O anúncio do incentivo governamental foi feito numa festa, no início do mês, mas até agora o dinheiro não saiu. Segundo Weber Magalhães, a Secretaria da Fazenda deve repassar o valor até amanhã.” 16 2.3. D ESPESAS INADEQUADAS Weber Magalhães, em seu depoimento em Goiânia, dia 09/05/2001, contou para onde vai o dinheiro da Federação: “O SR. WEBER MAGALHÃES – (...) A Federação, como muitos dizem, é sem fim lucrativo, e eu tenho certeza que a nossa é, porque tudo que entra para a Federação é diretamente enviado ao futebol.” (g.n.) No entanto, a Federação Metropolitana vem realizando gastos não condizentes para uma entidade que se diz em dificuldades financeiras, nem com as palavras do seu presidente. No ano de 1998, enquanto a mesada mensal da CBF ainda era de R$ 6 mil, a Federação realizou despesas que não correspondem ao grau de dificuldades pelas quais passam todas as entidades estaduais de futebol. Destacam-se gastos excessivos em bares, restaurantes, telefones celulares, hotéis, supermercados, e até em lojas de festas infantis ou escolas. A seguir tabela com alguns dos gastos: D ESPESAS DA FEDERAÇÃO METROPOLITANA DE FUTEBOL EM 1998 Despesas 17 Bares e restaurantes Telefone celular Valor (R$) 10.331,82 4.148,75 70.942,27 Hotéis Condomínio Pgto. A Wagner Magalhães Pgto. A Juarez Alberto Moreira Doação Assoc. Empregados da CEB Total 13.712,18 9.600,00 9.600,00 21.920,00 140.255,02 Secretaria da Fazenda do Governo do Distrito Federal. O Governador é Joaquim Roriz, parente de Tadeu Roriz, ex-presidente da Federação Metropolitana de Futebol. 17 Alguns dos estabelecimentos utilizados pela Federação: Bar dos Cunhados, Bar do Professor, Sppadda Bar, Libanus, Antártida Choperia, Pizzaria Castelinho, dentre outros. 16 Há despesas como o pagamento do “IPVA do Dr. Ricardo Teixeira”, em maio de 1995 e de muitas notas de combustível, sem que a Federação tenha veículos. Também em 1995, a Federação efetuou muitos empréstimos, sem que a contabilidade da entidade se preocupasse em identificar os favorecidos, em sua grande maioria. Essa conduta contraria princípios contábeis básicos, e pode colocar sob suspeita a área financeira e contábil da Federação. Segue uma tabela com os empréstimos feitos, em 1995, ano em que foi vendido o estádio de futebol Pelezão: Empréstimos da Federação Metropolitana de Futebol em 1995 DATA 30/04/95 30/04/95 30/04/95 30/04/95 30/04/95 30/04/95 31/05/95 31/05/95 31/05/95 31/05/95 31/05/95 31/05/95 31/05/95 31/05/95 31/05/95 31/05/95 31/05/95 31/05/95 31/05/95 31/05/95 31/05/95 31/05/95 31/05/95 31/05/95 31/05/95 31/05/95 31/05/95 30/06/95 30/06/95 31/08/95 31/08/95 31/10/95 31/10/95 TOTAL 31/12/95 VALOR (R$) 2.000,00 1.000,00 1.000,00 2.000,00 2.000,00 1.500,00 6.000,00 4.000,00 5.000,00 5.000,00 3.000,00 5.000,00 3.500,00 5.000,00 3.000,00 5.000,00 1.500,00 4.000,00 2.500,00 3.000,00 2.000,00 5.000,00 2.000,00 1.660,00 1.000,00 2.500,00 6.000,00 2.000,00 2.000,00 1.300,00 500,00 250,00 500,00 EMPRÉSTIMOS Emprestimo EMPRESTIMO A JOSE ELIO DE OLIVEIRA CH 140118. EMPRESTIMO AO GUARA CH 140123. EMPRESTIMO AO SOBRADINHO E.C CH 140116. EMPRESTIMO AO SOBRADINHO E.C CH 140116. Emprestimo. PG. REF .EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 112734. PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 112735. PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 112736. PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 112737. PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 112738. PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 112739. PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 00011 PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 122297. PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 122298. PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 122308. PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 122311. PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 123872. PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 123873. PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 123874. PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 123876. PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 123877. PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 123884. PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 123885. PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 123886. PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 140120. PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIRO ACERTO CH 112733. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO, RB 822. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO, RB 822. Emprestimo ao ADC Bandeirante, ch 192725. Emprestimo ao Planaltina E.C., ch 000077. Emprestimo para posterior acerto conf. recibo Pgto ref. emprestimo a Ceilandia para posterioracerto 91.710,00 4.000,00 Liquidacao de emprestimos efetuados no ano. Observe-se que os empréstimos foram feitos, porém os recursos não retornaram à Federação. Apenas em maio de 1995, foram emprestados R$ 76.660,00. Nesse mês, foi contabilizada a venda do estádio Pelezão. Foram emprestados R$ 91.710,00 e apenas R$ 4.000,00 foram devolvidos ao caixa da Federação. Há uma despesa realizada em março de 1999, paga pelo cheque número 933.534, de R$ 5.000,00 que foi contabilizado assim: “R$ 5.000,00 - Cheque 933.534 Despesa não identificada”. Isso poderia ser visto como um desvio de dinheiro do caixa da Federação, fato que deve ser investigado, mais profundamente. Do mesmo modo, a imprensa divulgou que, em 1996, desapareceu soma expressiva de dinheiro do caixa, no dia da posse do atual presidente, dinheiro ainda não recuperado. Registrou-se uma ocorrência policial, sem que se tenha sido dado o prosseguimento às investigações. 3. SITUAÇÃO FISCAL E FINANCEIRA A Federação se comprometeu a encaminhar a contabilidade para a CPI e não o fez. Weber Magalhães renovou o compromisso durante seu depoimento e novamente não enviou a documentação necessária para a completa análise da movimentação fiscal e financeira da entidade18. Com efeito, Weber Magalhães prometeu também disponibilizar seu sigilo fiscal e bancário, além do comprovante de que teria enviado à CPI os documentos contábeis; a CPI, no entanto, não recebeu por parte desse dirigente nenhuma iniciativa nesse sentido. Segue abaixo o exame da quebra de sigilo fiscal e bancário, à luz do depoimento do presidente da Federação. O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – A Federação, ela tem uma contabilidade? O SR. WEBER MAGALHÃES – Tem. O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – Por que não enviou os documentos pedido por esta Comissão? O SR. WEBER MAGALHÃES – Enviamos todos os documentos. Nós fomos um dos primeiros a enviar o documento. O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – A informação que nós temos é que não foi enviado, não chegou. O SR. WEBER MAGALHÃES – De qual ano? todos os documentos. Nós fomos um dos primeiros a enviar os documentos. O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – A informação que nós temos é que não enviado, que não chegou. A Federação encaminhou parte dos documentos contábeis às vésperas de se encerrar este Relatório. Isso não saneia o fato de a Federação não ter enviado todos os dados tempestivamente, conforme requisitado pela CPI, visto que prejudicou o exame contábil e operacional da entidade. 18 O SR. WEBER MAGALHÃES – De qual ano? O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – Não foi envi... A informação que ... O SR. WEBER MAGALHÃES – Nós encaminhamos todos documentos para a CPI, inclusive nós fomos o primeiro. Falamos até com o Deputado Aldo Rebelo que nós estávamos encaminhando toda a documentação, nós sendo de Brasília. O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – É justamente que teria a maior facilidade, não é? O SR. WEBER MAGALHÃES – Justamente. O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – Por acaso, o senhor tem o comprovante de entrega? O SR. WEBER MAGALHÃES – Não, aqui, não. Não temos aqui. Mas levantarei sob rapidamente para informar aos senhores. Mas o que me consta a nossa contabilidade encaminhou toda documentação que foi solicitada. O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES poderia encaminhar ... – Então, o senhor O SR. WEBER MAGALHÃES – Claro, não tem problema nenhum. (g.n.) Weber Magalhães não disse a verdade à CPI ao declarar que havia encaminhado os documentos. Mesmo durante seu depoimento em Goiânia, a CPI teve a confirmação de que nada havia sido entregue pela Federação Metropolitana. Dias após o depoimento, Weber Magalhães encaminhou algumas informações, sem, contudo, enviar os dados contábeis. Mesmo que o fizesse ao final dos trabalhos da Comissão, o comportamento do Weber Magalhães configuraria obstrução das investigações da CPI relativas à Federação, prejudicando portanto a elaboração deste Relatório. 3.1 A NÃO-DECLARAÇÃO DE IMÓVEIS A Federação, entre 1995 e 2000, não declarou suas rendas nos exercícios de 1996 e de 1997. Na declaração de 1998 (ano calendário 1997), não constam veículos e bens imóveis dentre as propriedades da Federação. Já na declaração de 1999 (ano calendário 1998), consta o valor de R$ 9.590,91 na rubrica “imóveis” (valor incompatível às dez salas e à loja, propriedades da entidade como admitido por Weber Magalhães em seu depoimento). Já na declaração de 2000 (ano calendário 1999), o registro dos bens volta à situação declarada em 1998 (ano calendário 1997), que aponta a inexistência de bens. 3.2 A S SALAS E LOJA DA FEDERAÇÃO Em seu depoimento, Weber Magalhães afirmou que a Federação é proprietária de dez salas e uma loja, todos alugados e gerando rendimentos à entidade. Seguem trechos do depoimento: “O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – O senhor disse que a sua Federação, a Federação que V.Sa. preside, tem entre outras receitas, receitas de aluguel. Aluguel de que? O SR. WEBER AZEVEDO MAGALHÃES – Aluguel de salas, onde foi vendido em 95 um estádio e ficaram dez salas para a Federação e hoje elas são alugadas. São em torno de 3 mil reais. São dez salas e uma loja.” A Federação sonegou informações e imposto junto a Receita Federal, não só no tocante às salas e à loja. Segundo o depoimento do Weber Magalhães, estão em nome da Federação outros imóveis, pertencentes aos clubes. Todos esses imóveis foram frutos da venda de um estádio, que era da Federação. Parte do pagamento se deu sob a forma de imóveis, ficando dez salas e uma loja para a Federação, e outros imóveis para os clubes (esses imóveis mantêm-se em nome da Federação). 3.3 A VENDA DO ESTÁDIO A Federação Metropolitana vendeu o estádio Pelezão, em maio de 1995, estádio que a entidade havia recebido do Governo do Distrito Federal, anteriormente. Tratou-se de uma permuta com o grupo empresarial Paulo Octavio: o estádio por algumas lojas e salas. Esse negócio ainda levanta algumas dúvidas. Durante essa transação, diversas despesas foram realizadas, dentre elas o pagamento de R$ 80.000,00 em 10/04/1995, a Wilson Antônio de Andrade. Segundo depoimento do Weber Magalhães, tal quantia refere-se a honorários advocatícios pagos ao advogado Wilson Andrade, ex-presidente da Federação. A atuação do advogado junto à Federação envolve a venda do estádio Pelezão: “O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Conhece Wilson Antônio? (...) O SR. WEBER AZEVEDO MAGALHÃES - Wilson Antônio de Andrade, Dr. Wilson de Andrade? Conheço. Foi ex-Presidente da Federação. (...) O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - A Federação teria alguma razão para pagar-lhe 80 mil reais? O SR. WEBER AZEVEDO MAGALHÃES - Pagamos 80 mil reais numa ação nessa venda do Estádio Edson Arantes do Nascimento, o qual era... ele receberia honorários advocatícios. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Eu não entendi bem. Por favor, ele recebeu como honorários? O SR. WEBER AZEVEDO MAGALHÃES - Ele é advogado numa ação, se não me engano, na... na... ação popular, alguma coisa assim.” (g.n.) A Federação pagou honorários significativos para o ex-presidente Wilson e não os contabilizou devidamente. Há um lançamento no valor de R$ 80 mil, datado de abril de 1995, que informa apenas: “Ref. 03/95 CH 056283”. Pode ser que se trate do cheque para Wilson Andrade. Observe-se que, em julho do mesmo ano, a entidade pagou R$ 750,00 (setecentos e cinqüenta reais) a título de honorários advocatícios referentes a “medida cautelar” (cheque 122.296). Segundo informações, Weber Magalhães era vice-presidente financeiro da entidade à época da venda do estádio, o que o torna um dos responsáveis pelos atos daquele negócio. A forma de gestão patrimonial da Federação revela, segundo o Deputado Jurandil Juarez, membro desta CPI, a existência de um caixa dois patrimonial, que tornaria a Federação uma “latifundiária urbana”. Segue abaixo a conclusão do Deputado, como parte do presente Relatório: “O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – São imóveis que não se coadunam com o objetivo da Federação. São imóveis que não constam da declaração do Imposto de Renda, portanto, não constam dos registros fiscais. Não constam dos registros contábeis, porque na documentação fiscal tem balanços, inclusive com o registro do patrimônio, isso não consta. Então, na verdade, isso, a Federação tem um lado que eu imagino, e espero até que seja só esse (...) que caracteriza a existência de um caixa 2 imobiliário, para usar o nome, mas, de uma informalidade injustificável. Primeiro, para uma Federação tão nova. Segundo, para uma Federação da capital da República. E, terceiro, porque são coisas que não podem ser guardadas. Não são valores que podem ser transformados em títulos, em ativos financeiros. São imóveis.” Em que pese Weber Magalhães queixar-se de que a Federação Metropolitana vive em situação financeira crítica, registre-se que há um auxílio constante do governo do Distrito Federal em favor da entidade. Trata-se de verba pública que entra diretamente na contabilidade da entidade. Assim, o interesse e o patrimônio públicos estão presentes na estrutura da Federação Metropolitana. Diz o presidente em seu depoimento: “Fontes de receita da Federação são as ajudas que a CBF nos dá, são três mil reais de aluguel de alguns imóveis que pertencem à Federação e receitas de clubes quando estão na primeira divisão, segunda e terceira divisão, 5% dessas rendas. E, a partir do ano passado, nós tivemos, como o Governo nos ajudou, nós tínhamos 3% do valor das rendas, sendo que nosso ingresso era um real. Ao todos, fizemos 170 mil torcedores. Então, tivemos 3% de 170 mil. Este ano, abrimos mão dos 3%. Teremos agora, no final do campeonato, porque o ingresso subiu, a Federação terá novamente os 5% novamente este ano, mas nós não estávamos recebendo ... Até o ano passado, até 99, 5%, e 2000 3%. Esse ano, nada. (...) Através de convênio, no passado, o Governo nos ajudou não só na parte amadora como também na parte profissional. Ajudou em torno do amador em torno de 300 mil reais, aonde adquirimos material todo de esportivo para as ligas, as 21 ligas, que são filiadas à Federação, mas não têm direito a voto, que é até uma reivindicação das ligas, porque nós estamos esperando chegar o momento certo para poder até eles terem direito. É uma reivindicação deles. E tivemos uma ajuda para a Copa João Havelange para o primeiro e o segundo, para primeira divisão, segunda e terceira, que foram em torno de 450 mil reais e tivemos uma ajuda de 600 mil reais para o futebol profissional, desses 600 mil reais, 500 mil reais foram divididos para os dez clubes, cabendo a cada um 50 mil reais e 100 mil reais para a Federação, sendo que desses 600 tivemos o desconto de 5% para o INSS. E esse ano também estamos prestes a receber 800 mil reais sendo que 600 para os clubes e 200 para a Federação.” O Correio Braziliense, de 09/11/2000, publicou reportagem de Cida Barbosa com denúncias relativas às negociações da Federação com o governo do Distrito Federal, e referências à transação da Federação com empresa do grupo Paulo Octavio: “O estádio foi vendido por R$ 3 milhões a um pool de empresas liderado pelo hoje deputado federal Paulo Octavio (PFL-DF). A FMF recebeu R$ 1 milhão em dinheiro e R$ 2 milhões em salas e lojas da empresa Paulo Octavio Empreendimentos Imobiliários. A negociação, porém, foi parar na Justiça. A deputada distrital Maria José Conceição, a Maninha (PT), entrou com ação no Tribunal de Justiça do Distrito Federal contra a FMF, sob a alegação de que o patrimônio público fora lesado. Na ação, Maninha argumenta que a FMF adquirira o estádio do Governo do DF por preço simbólico, sem passar por processo de licitação. A revenda, conforme argumento da deputada, gerou um ganho milionário para a FMF. Na época, o presidente da entidade era Tadeu Roriz. Weber Magalhães ocupava a vice-presidência financeira. O processo continua em andamento na Justiça.” (g.n.) A doação do estádio para a Federação e a sua venda (ou permuta) para terceiros precisa ser investigada mais detalhadamente. A seguir, os lançamentos contábeis referentes à transação do estádio para o grupo Paulo Octavio (ver Anexo CD Rom Contabilidade Federação Metropolitana de Futebol): Lançamentos contábeis da Federação Metropolitana de Futebol (1995) DATA LANÇAMENTO 31/05/95 1.13.304.00003 31/05/95 4.42.102.00002 VALOR (R$) EVENTO 2.996.076,63 reavaliacao do estadio pelezao 2.996.076,63 REAVALIACAO DO ESTADIO PELEZAO 31/05/95 1.13.310.00001 190.000,00 REF. PERMUTA DE IMOVEIS CONF.ESCRITURA 92.061, FL 1357. 31/05/95 1.13.310.00002 190.000,00 REF. PERMUTA DE IMOVEIS CONF.ESCRITURA 92.061, FL 1357. 31/05/95 1.13.310.00003 190.000,00 REF. PERMUTA DE IMOVEIS CONF.ESCRITURA 92.061, FL 1357. 31/05/95 1.13.310.00004 190.000,00 REF. PERMUTA DE IMOVEIS CONF.ESCRITURA 92.061, FL 1357. 31/05/95 1.13.310.00005 190.000,00 REF. PERMUTA DE IMOVEIS CONF.ESCRITURA 92.061, FL 1357. 31/05/95 1.13.310.00006 50.000,00 REF. PERMUTA DE IMOVEIS CONF.ESCRITURA 92.061, FL 1357. 31/05/95 1.13.310.00007 500.000,00 REF. PERMUTA DE IMOVEIS CONF.ESCRITURA 92.061, FL 1357. 31/05/95 1.13.310.00008 500.000,00 REF. PERMUTA DE IMOVEIS CONF.ESCRITURA 92.061, FL 1357. 31/05/95 1.13.304.00003 1.000.000,00 REF. PERMUTA DE IMOVEIS CONF.ESCRITURA 92.061, FL 1357. 31/05/95 1.13.304.00003 1.000.000,00 REF. PERMUTA DE IMOVEIS CONF.ESCRITURA 92.061, FL 1357. 31/05/95 3.31.106.00002 1.11.102.00002 51.173,78 30/04/95 1.13.304.00003 1.000.000,00 Pagamento de ITBI, ch 088050. Venda de 1/3 do Pelezao conf. Escrit. 92060 30/04/95 3.31.106.00001 580.839,37 30/04/95 1.11.104.00001 51.173,78 30/04/95 1.11.104.00001 9.500,00 30/04/95 1.11.104.00001 40.000,00 Valores a receber conf. Escritura 92060. 30/04/95 1.11.104.00001 99.326,22 Valores a receber conf. Escritura 92060. Pago IPTU conf. diversos D.A.R. Valores a receber conf. Escritura 92060. Valores a receber conf. Escrit. 92060 30/06/95 3.32.101.00002 1.13.310.00001 38.000,00 Consult. 03 Bl. A da 915 sul, doado p/ C.R. 30/06/95 3.32.101.00002 1.13.310.00003 27.000,00 Consult. 203 Bl A da 915 sul, doado p/ Taguatinga E.C. 30/06/95 3.32.101.00002 1.13.310.00001 38.000,00 Consult 11 Bl A da 915 sul doado p/ A.D.C. Bandeirante. 30/06/95 3.32.101.00002 1.13.310.00008 50.000,00 Loja 04 do Bl. A QI 33, p/ Sobradinho E.C. 30/06/95 3.32.101.00002 1.13.310.00003 32.000,00 Consult. 204 Bl A da 915 sul, doado 30/06/95 3.32.101.00002 1.13.310.00006 50.000,00 Consult. 310 Bl. D da 915 sul, doado p/ G.E. Tiradentes. 30/06/95 1.13.310.00001 1.13.310.00001 38.000,00 Consult. 10 Bl. A da 915 sul, Samambaia F.C. 30/06/95 3.32.101.00002 1.13.310.00002 27.000,00 Consult. 103 Bl A da 915 sul, S.E. Ceilandense 30/06/95 3.32.101.00002 1.13.310.00005 63.000,00 Consult. 203 Bl C. da 915 sul, doado p/ S.E. Gama 30/06/95 1.13.310.00005 1.13.310.00005 63.000,00 Consult. 07 Bl C da 915 sul, doado p/ Planaltina E.c. 30/06/95 3.32.101.00002 1.13.310.00004 76.000,00 Consult. 308 e 309 Bl A da 915 sul, S.E. 30/06/95 3.32.101.00002 1.13.310.00007 125.000,00 Salas 201 e 202 da QI 27, p/C.R. Guar 30/06/95 3.32.101.00002 1.13.310.00008 125.000,00 Sala 207 da 915 sul, p/ C.R. Guara e 30/06/95 3.32.101.00002 1.13.310.00008 125.000,00 Sala 208 da 915 sul p/ Taguatinga E. C. e S.C. Ceilandense. 30/06/95 3.32.101.00002 1.13.310.00005 63.000,00 Sala 210 da 915 sul, p/S.E. do Gama e Samambaia E.C. 30/06/95 3.32.101.00002 1.13.310.00003 32.000,00 Sala 211 da 915 sul, p/ Brasilia E.C. e 31/05/95 3.31.106.00002 1.11.104.00001 40.000,00 Pagto ITBI PelezÆo. 31/05/95 3.31.105.00010 1.11.102.00002 4.000,00 Guara p/ Brasilia E.C. Ceilandense. A.D.C. Bandeirante. G.E. Tiradentes. PG. REF. ESCRITURACAO E REGUL. DO IMOVEL CH 112732. A Federação se encarregou de pagar o ITBI (imposto de transferência do imóvel) relativo ao estádio, no valor de R$ 40 mil. Registre-se que, em geral, é o comprador o responsável por esse tipo de pagamento. A distribuição dos imóveis entre a Federação e os clubes afiliados não está muito clara na contabilidade da entidade, com se vê acima. O próprio presidente não soube explicar, em seu depoimento, com quem e em nome de quem estão esses imóveis: “O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Esses imóveis... Pelo total, foram repassados à Federação ou eles foram repassados já direta... o que coube aos clubes, diretamente aos clubes? O SR. WEBER AZEVEDO MAGALHÃES - Não. Foram repassados para a Federação e... foram repassados aos clubes, mas ficou em nome da Federação, ainda, alguns imóveis. Ficou vários imóveis em nome da Federação, porque tinha uma ação pendente de cadeiras cativas e não poderia ser repassado. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - E eles continuam em nome da Federação? O SR. WEBER AZEVEDO MAGALHÃES - Alguns continuam em nome da Federação. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Quer dizer que tem mais imóveis no nome da Federação? O SR. WEBER AZEVEDO MAGALHÃES - Tem mais imóveis na Federação que... O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Quantos? Quantos imóveis? O SR. WEBER AZEVEDO MAGALHÃES - Agora, não posso precisar. Tenho que levantar para o senhor e encaminhar tudo isso aí. Porque tem alguns imóveis que estão de responsabilidade de clube, mas com nome na Federação. (...) O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Se o senhor quiser vender, qual é... o que é que existe de disposição em contrário? O SR. WEBER AZEVEDO MAGALHÃES – Hoje, nós estamos quase já com as certidões negativas, tudo pronto, ganhando uma ação das cadeiras cativas. E para que se venda esses imóveis precisaria, primeiro, o clube, que é responsável dele, dar autorização. E, já que está em nome da Federação... O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Não, não está no nome do clube. Isso é o que eu quero dizer. O SR. WEBER AZEVEDO MAGALHÃES - Não. Mas... O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Não estando no clube, o clube não tem nada a ver com isso. O SR. WEBER AZEVEDO MAGALHÃES - Mas está em nome da Federação. Para mim vender e disponibilizar qualquer imóvel da Federação, teria que convocar uma assembléia geral dos clubes filiados para que seja dada autorização. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Quando foi vendido o estádio foi esse o procedimento? O SR. WEBER AZEVEDO MAGALHÃES - Foi esse o procedimento. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Sr. Presidente, eu quero manifestar a minha preocupação com este fato. Porque existe um caixa dois patrimonial. Eu tô acostumado até ver caixa dois financeiro” 3.4 C ONTROLE DA FEDERAÇÃO SOBRE O CONSELHO FISCAL A movimentação financeira e fiscal da Federação não possui uma fiscalização que se preza pela imparcialidade. Isto porque a composição do conselho fiscal, órgão responsável pela fiscalização, foi articulada pelo próprio presidente da Federação. Ao depor em Goiânia, Weber Magalhães assume que a composição do conselho fiscal é de plena confiança da direção da entidade: “Mas nós é que indicamos. Foi montado nossa chapa com Presidente, Vice-Presidente, 2º Vice-Presidente e um Conselho Fiscal. Agora, eu procurei, dentro do Conselho Fiscal, por pessoas que são trabalhadores, que têm emprego e que a maioria são contadores.” 4. RELAÇÃO COM A CBF A Federação Metropolitana de Futebol recebeu da CBF, entre 1998 a 2000, os seguintes valores: em 1998, R$ 6.000,00 por mês, com as exceções dos meses de outubro (R$ 18.450,00) e novembro (R$ 46.000,00); em 1999, o repasse mensal foi de R$ 12.000,00, com as exceções de janeiro (R$ 66.000,00) e maio (R$ 32.000,00); já em 2000, manteve-se o valor de R$ 12.000,00 nos meses de janeiro a abril, junho a agosto, e outubro a dezembro, sendo que em maio o valor foi de R$ 62.000,00 e em setembro, de R$ 37.000,00. Ver gráfico abaixo: DOAÇÕES DA CBF PARA A FEDERAÇÃO METROPOLITANA DE FUTEBOL 1998 - 2000 R$ 70.000 60.000 50.000 40.000 30.000 20.000 NOVEMB MESES SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/2000 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/99 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO 0 JAN/98 10.000 A Federação recebeu mais recursos exatamente em períodos eleitorais, de 1998 e de 2000, o que sugere a possibilidade de que as doações recebidas possam ter sido utilizadas para campanhas políticas. “O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA - Se a CBF deixar de ajudar a Federação do Distrito Federal o que aconteceria com a Federação? O SR. WEBER AZEVEDO MAGALHÃES - Ficaria difícil até porque não poderíamos ajudar o produto final que são os jogadores. São até jogadores que tem dificuldades como sempre se tem aqui, o dinheiro que entra para o futebol, repassamos para o futebol, pagamos a arbitragem de futebol feminino, ajudamos o futebol juvenil, o futebol infantil que não tem recursos, não tem renda. Então, tudo que entra na Federação, quando temos condições de ajudar nós ajudamos tanto que eu deixei bem claro se nós terminarmos o ano, por exemplo, entrando cem mil e gastando cem mil eu estou satisfeitos porque sem dúvida nenhuma nós encaminhamos para o futebol.” (g.n.) Todas as Federações admitem precisar das doações da CBF. Todas precisam de um mesmo valor mensal, como se os déficits fossem idênticos. Como se presume que muitas doações feitas pela Confederação tenham fins políticos, é de supor que diversas doações para a Federação Metropolitana não tenham objetivos estatutários. A Federação Metropolitana mantém um vínculo especial com a CBF, no que diz respeito à casa mantida pela CBF em Brasília. Do depoimento do Weber Magalhães, pode ser destacado o seguinte trecho: “O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – (...) O senhor freqüenta aquela casa da CBF em Brasília? O SR. WEBER MAGALHÃES – Eu, morando em Brasília, a CBF tem representação em Brasília, eu sempre estive lá. O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – Tem acesso constante lá e tudo? Quanto é que a CBF tem pagado de aluguel naquela casa? O SR. WEBER MAGALHÃES – Agora, eu não sei, porque foi feito contato direto com a CBF. Foi (ininteligível) Diretor de Assuntos Legislativos na casa CBF. E eles renovaram o contrato. Eu não sei quanto ela tá pagando hoje.” Segundo informações, a casa foi adquirida graças ao Weber Magalhães, intermediador do negócio. Um irmão de Weber, Wagner de Azevedo Magalhães, trabalha como administrador da casa da CBF, conforme comentado no item 2.1 acima. Sobre a casa da CBF em Brasília, há, no Relatório da CPI, um item específico no capítulo VIII. 5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL Os elementos relevantes encontrados referem-se às doações da CBF para a Federação em períodos eleitorais. A Federação não encaminhou os documentos contábeis exigidos pela CPI. Com isso, pode-se levantar a hipótese de que os recursos recebidos tenham tido destinação diversa às previstas no estatuto da entidade, que, por sua vez, também não foi encaminhado. Weber Magalhães, em seu depoimento, afirmou que: “A Federação, como muitos dizem, é sem fim lucrativo, e eu tenho certeza que a nossa é, porque tudo que entra para a Federação é diretamente enviado ao futebol”. Há também uma ligação entre a Federação e o acompanhamento dos interesses legislativos da CBF no Congresso Nacional. O depoimento do Weber Magalhães, que é servidor público do Senado Federal, deixa evidenciado que suas atribuições não se limitam à Federação, estendendo-se à CBF. 6. C ONTRATOS COM A TV Pelos documentos enviados à CPI, a Federação Metropolitana de Futebol não possui contratos de transmissão de jogos com emissoras de televisão. 7. RELAÇÃO COM OS CLUBES Da análise dos documentos e do depoimento do Weber Magalhães, não há informações ou denúncias relevantes na relação entre clubes e Federação. Destaque- se apenas que a Federação cuida de repassar verbas para os clubes, como um modo de intermediação. Chamou a atenção, durante a discussão sobre a permanência do clube brasiliense Gama na primeira divisão do futebol brasileiro, que o Weber Magalhães tenha assumido lado oposto ao dos interesses do Gama. Assim retratou a situação o Correio Braziliense, de 02/03/2000: “O cartola Weber Magalhães é um cartola escorregadio, do tipo que, ao menor sinal de pressão, corre para cima do muro. Isso pode ser comprovado no episódio envolvendo a disputa judicial entre o Gama e a Confederação Brasileira de Futebol (CBF). Em vez de bater de frente com a entidade para defender os interesses do seu filiado - que luta na Justiça comum para se manter na primeira divisão do Campeonato Brasileiro -, o dirigente prefere se omitir. Uma atitude impopular num momento em que toda a cidade está solidária ao clube. A explicação para a omissão é simples. Weber Magalhães não quer queimar o filme com o amigo Ricardo Teixeira, presidente da CBF. Ao mesmo tempo, esforça-se para não desagradar o clube, o que não conseguiu totalmente.” (g.n.) 8. C ONCLUSÕES, ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES Da análise dos documentos enviados e que esta CPI teve acesso e do depoimento do Weber Azevedo Magalhães, pode-se concluir que a Federação Metropolitana de Futebol é gerida de forma temerária, seja em termos administrativo, financeiro e fiscal. Weber Magalhães não disse a verdade a esta Comissão, em seu depoimento, em Goiânia. A Federação Metropolitana não encaminhou a tempo a esta CPI os documentos requeridos, impedindo assim o exame da documentação. Só depois de muitos pleitos e no final de maio, parte dos documentos foram enviados, configurando a tentativa de encobrir irregularidades em suas contas. Constatou-se sonegação fiscal, admitida pelo presidente em seu depoimento. Recomenda-se uma reforma estatutária para limitar o mandato da diretoria da entidade em no máximo quatro anos, impedindo a recondução aos cargos; para evitar a contratação de parentes de dirigentes da entidade; para permitir autonomia do conselho fiscal; para obrigar a realização de licitação para a aquisição de bens e de material esportivo; e para estabelecer maior transparência nas contas da Federação e nos repasses de verbas que envolvam a entidade e os clubes. Sugere-se que o Ministério Público do Distrito Federal, através de inquérito público civil, proceda um levantamento detalhado da compra e venda do estádio que pertencia ao Distrito Federal e, com a transação, passou à Federação Metropolitana de Futebol, estendendo-se às pessoas envolvidas, dentre elas os atuais e os ex-diretores, em razão de indícios de irregularidades na negociação e o envolvimento de patrimônio público. Recomenda-se que o Ministério Público Federal e a Receita Federal investiguem o pagamento feito pela Federação a Wilson Antônio de Andrade. Sugere-se, ainda, encaminhar o presente Relatório, e cópias dos documentos recebidos da Federação Metropolitana de Futebol, à Receita Federal, ao Ministério Público Federal (considerando-se inclusive o não atendimento aos requerimentos da CPI), ao Ministério Público do Distrito Federal, ao Tribunal de Contas do Distrito Federal, para inspeção, tendo em vista que a Federação recebe verbas do Governo do Distrito Federal e à Procuradoria Eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral do Distrito Federal, com base na Lei 9.504/97. CEARÁ 1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DAS FEDERAÇÕES : Conforme estatuto da entidade, aprovado por assembléia geral extraordinária realizada em 05/01/1996 (art. 91 do estatuto), homologado pela CBF, a Federação Cearense de Futebol é uma “sociedade civil e pessoa jurídica de direito privado, de caráter desportivo (...) “cujo fim é dirigir e incrementar a prática do Futebol em todo o estado, em caráter não profissional e profissional” (art. 1º). Trata-se de típica entidade de direito privado sem fins lucrativos. O estatuto veda que “os membros eleitos dos Poderes da FCF” sejam remunerados pela entidade (art. 82). São poderes da Federação: a Assembléia Geral (composta, conforme o art. 26, dos integrantes das divisões profissional e não profissional, além das ligas agrupadas na divisão não profissional especial), a Justiça Desportiva, o Conselho Fiscal, a Presidência, a Diretoria e o Conselho Arbitral (art. 3º). O estatuto pauta-se no art. 217 da Constituição Federal, sendo a norma geral que regula a Federação, subsidiado pela Lei nº 8.672/93, arts. 20 a 23 do Código Civil Brasileiro, e das disposições normativas aplicáveis da CBF e da FIFA. 2. S ITUAÇÃO ADMINISTRATIVA : A Federação Cearense de Futebol é presidida por Fares Cândido Lopes, que se encontra em seu segundo mandato. 3. S ITUAÇÃO FISCAL E FINANCEIRA Segundo informações da receita federal, a Federação Cearense de Futebol, entre o período entre 1995 e 2000, apenas declarou Imposto de Renda relativo ao ano base de 1997, quando declarou-se isenta. Neste ano base, a Federação registrou não haver bens ou imóveis. O presidente da Federação alega que ajuizou Mandado de Segurança junto ao Supremo Tribunal Federal contra a ordem da CPI de quebra do sigilo bancário e fiscal da entidade por um exercício de cidadania, e por achar que não há qualquer problema com a Federação. 3.1. INSS A Federação Cearense é devedora do INSS. O valor da dívida é de R$ 20.342,03. 3.2. CONSELHO FISCAL Quanto ao controle fiscal e financeiro da entidade, Fares Cândido confessa um certo descontrole. Conforme apontado acima, não foram declaradas as rendas de forma satisfatória nos últimos anos, e a declaração encaminhada à receita federal conta com erros relativos a valores de bens. O conselho fiscal não trabalha de forma eficaz e nem tem autonomia para isso, tanto que tem sido escolhido junto com a direção da entidade, como afirma Fares Cândido em seu depoimento: “O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – (...) Como é que é o conselho fiscal da Federação? (...) O SR. FARES CÂNDIDO LOPES – Não tem nenhum parente, nenhum funcionário, nenhum diretor. (...) O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Mas como é a eleição dele? O SR. FARES CÂNDIDO LOPES – A eleição é como a ... a minha. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Na mesma chapa. O SR. FARES CÂNDIDO LOPES – Na mesma chapa. É do estatuto. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Do estatuto. É uma outra questão que a gente tem... Nós temos estudado isso aí. Há muitas entidades que a chapa do conselho fiscal é diferente da chapa... porque dá mais legalidade, mais moralidade... O SR. FARES CÂNDIDO LOPES – O senhor sabe qual foi o problema, Deputado? A Lei Pelé, a 9.615, diz no art. 16, que as entidades e associações são entidades jurídicas de direito privado e que se, se organizam... são autônomas e se organizam de acordo com os seus estatutos. Então, não é? A própria lei, não é? Tem a Constituição no 217 que diz que o Governo tem que deixar livremente, né? O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Sim. O SR. FARES CÂNDIDO LOPES – Então, tudo isso é amarrado nas leis.” 4. RELAÇÃO COM A CBF A Federação Cearense recebeu da CBF, entre 1998 a 2000, os seguintes valores: em 1998, R$ 6.000,00 por mês, com exceção dos meses de abril e junho, cujos valores foram de R$ 56.000,00; em 1999, o repasse mensal foi de R$ 12.000,00, com as exceções em janeiro, que foi de R$ 6.000,00, e em abril, de R$ 24.000,00, sendo que não houve repasse em março; já em 2000, o valor do repasse mensal foi de exatos R$ 12.000,00. Em seu depoimento à CPI, o presidente da Federação Cearense disse que não compareceu à assembléia da CBF que aprovou as contas da entidade nacional dos anos de 1998 e de 1999; em seu lugar, mandou um diretor da Federação. 5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL Não foram registrados vínculos explícitos entre a Federação e a política local. Registe-se, porém, a denúncia do jornalista cearense Marconi Alves, segundo o qual jornalistas cearenses receberiam pagamentos para tecer comentários elogiosos à seleção brasileira, nas apresentações desta em estádios do Ceará (“Observatório da Imprensa”, edição de 05/12/1998). A denúncia de Marconi Alves estaria sendo apurada pela Comissão de Ética do Sindicato dos Jornalistas do Estado do Ceará. 6. CONTRATOS COM A TV A Federação Cearense de Futebol não possui contratos de transmissão de jogos com emissoras de televisão. Segundo depoimento do seu presidente, a Federação tentou vender seus jogos oferencendo-os gratuitamente a uma emissora de TV durante uma temporada, na busca de um contrato futuro. A tentativa não teve resultados interessantes para a entidade, como relata Fares Cândido: “Eu quis fazer isso em 99. Eu dei alguns jogos para a Televisão Verdes Mares, que é a repassadora da Globo, de graça. Todo sábado eu dava um jogo, para ver se em 2000 motivava as empresas a ... Quando foi em 2000, eles me apresentaram um contrato de cinco anos pagando 200 mil reais por ano, em seis parcelas, para fazer três jogos por semana. Eu digo, não, eu vou... Quando eu deixar... Mas eu não vou cometer esse crime com o futebol cearense. E é por isso até que eles não gostam muito de mim.” 7. RELAÇÃO COM OS CLUBES A imprensa relata que há problemas entre clubes e Federação Cearense, como os eventuais conflitos de locais para a realização de jogos (“Diário do Nordeste”, edição de 12/07/2000), ou a confusa relação que se instalou com as duas entidades de árbitros administradas pela entidade cearense (“Chute a Gol”, 01/04/2001). Há notícias que o Ceará Sporting teria encaminhado ao Ministério Público Estadual pedido para apurar a omissão da Federação em face de um caso de doping. O Ceará Sporting também protagoniza outro fato que envolve a Federação: trata-se da cobrança desta entidade de dívida do clube (“Tribuna do Norte”). Registre-se que Fares Cândido, antes de assumir a Federação, ocupou a presidência do Fortaleza duas vezes, tendo sido ainda diretor de futebol daquele clube. 8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DO FUTEBOL Não foram levantadas informações relevantes quanto à relação entre a Federação e empresários que exploram o futebol. 9. C ONCLUSÕES, ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES Da análise dos documentos e do depoimento do Fares Cândido Lopes, constata-se a forma temerária como a Federação Cearense de Futebol tem sido gerida em termos fiscais, além de certo descontrole financeiro. Constatou-se sonegação fiscal conforme a inexistência de declaração de Imposto de Renda dos anos base de 1995, 1996, 1998, 1999 e 2000. Tendo em vista aspectos administrativos e a atuação do conselho fiscal, recomenda-se uma reforma estatutária para limitar o mandato da diretoria da entidade em no máximo quatro anos, impedindo a recondução aos cargos; para permitir uma maior autonomia do conselho fiscal; para obrigar a realização de licitação para a aquisição de bens e de material esportivo; e para estabelecer maior transparência nas contas da Federação e nos repasses de verbas que envolvam a entidade e os clubes. Sugere-se encaminhar o presente Relatório à Receita Federal e ao Ministério Público Federal. ESPÍRITO SANTO 1. N ATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DA FEDERAÇÃO A Federação de Futebol do Espírito Santo possui personalidade jurídica de sociedade civil para fins esportivos, no ramo do futebol, conforme prevê o artigo 1º de seu Estatuto. 2. S ITUAÇÃO ADMINISTRATIVA A Federação Espírito-santense possui como presidente o senhor Marcus Antônio Vicente, que, até depor nesta CPI, era Deputado Federal; hoje, ocupa o cargo de Secretário no Governo do Espírito Santo. Assumiu a Federação em 94 e, segundo suas palavras no depoimento à Comissão (Notas Taquigráficas nº 000329/01), nunca recebeu nada a título de remuneração pelos serviços prestados à entidade. Afirmou que assumiu a Federação em meio a uma crise do futebol no estado. Sem recursos e com o Vitória Futebol Clube, principal time da capital, fora da primeira divisão, o que levou à interiorização do futebol, teve que recorrer a diversos empréstimos para viabilizar os campeonatos programados. 2.1 PROBLEMA COM A CONTABILIDADE Inicialmente, verificou-se que jamais existiu contabilidade na Federação de Futebol do Espírito Santo. Isso declarado pelo próprio presidente em seu depoimento. Afirmou que, quando do pedido desta CPI de todos os documentos contábeis da entidade, contratou os serviços de uma profissional para elaborá-los, e pediu adiamento do prazo por mais trinta dias. Foram, então, remetido Livros Diários originais, produzidos, no ano de 2001, pela profissional contratada. Esse fato veio explicar porque os livros diários apresentavam, todos (de 1995 a 2000), o mesmo estado de conservação. Um outro fato decorre dessa afirmação: todos os livros foram assinados com data retroativa pelo presidente Marcus Antônio Vicente e pela contadora Tânia Maria Thomazini, ou seja, o livro de 1995 possui todos os seus termos e demonstrativos assinados com a data de 2/1/1995, porém confeccionado e efetivamente assinado em 2001; o de 1996, idem; e assim sucessivamente, até 2000. Os livros foram autenticados pelo Registro Civil das Pessoas Jurídicas, Oficial Rodrigo Sarlo Antônio, Praça Costa Pereira, 132 – 1º Andar, Vitória – ES. 2.2 EMPRÉSTIMOS COM PESSOAS FÍSICAS Durante praticamente todo seu depoimento, senhor Marcus Antônio procurou destacar a precariedade financeira da Federação do Espírito Santo. Como conseqüência, constatou-se que a Federação recorre, freqüentemente, a agiotas, já que bancos pedem garantias reais, e a Federação possui apenas seis salas, que valem aproximadamente R$ 7.000,00, cada. O pagamento feito a um desses agiotas, o senhor Gobbi, foi contabilizado como prestação de serviços; porém, senhor Marcus afirmou categoricamente que esse cidadão nunca prestou serviços para a Federação, uma vez que é exportador de café; tal pagamento foi a devolução de um empréstimo feito ao senhor Gobbi. Ocorreu, então, um erro na contabilidade contratada de última hora. 2.3 C ONTRATAÇÃO DE PARENTES E O CONSELHO FISCAL Afirmou, também, que tem irmã como Diretora Financeira, recebendo R$ 1.600,00 mensais, sendo a média de remuneração dos funcionários de R$ 270,00. O senhor Marcus justificou, dizendo que, além de ser função de confiança por mexer com dinheiro dos clubes, do INSS, muitas vezes, sua irmã trabalha mais de doze horas diárias. Outra incongruência administrativa é a norma estatutária, capitulada no art. 29, que segue transcrito: “Art. 29 O Conselho Fiscal será composto de (3) membros efetivos e (3) três suplentes, indicados pelo presidente da FES, com mandato de (4) quatro anos, podendo ser substituídos” Pergunta-se: como se ter um controle interno eficaz, se é o próprio presidente quem nomeia as pessoas que vão fiscalizá-lo? Naturalmente, as chances de não existir controle algum é enorme. Essa total dependência do Conselho Fiscal ao presidente da FES, pode ter gerado a inexistência de contabilidade e o déficit crônico que tem levado à Federação a vários empréstimos. Inúmeras impropriedades administrativas podem surgir, fruto da inexistência de um organismo de controle independente que verifique os procedimentos adotados pelo dirigente. É importante destacar que, apesar da administração sofrível que pôde-se verificar, seu presidente colocou à disposição desta CPI seus sigilos bancário e fiscal de dez anos atrás; informou, também, que não pretende se reeleger presidente da Federação. 3. S ITUAÇÃO FISCAL /F INANCEIRA Inicialmente, foi observado que a Federação Espírito-santense não entregou as Declarações de Imposto de Renda de Pessoa Jurídica, referentes aos exercícios de 1995, 1996 e 1997 e quando seu presidente foi questionado quanto à omissão, respondeu que a Federação não declarava Imposto de Rendas, por ser isenta; após alguns esclarecimentos e pelos argumentos apresentados pelo presidente, ficou a impressão de que ele nem sabia que havia sido entregue as declarações relativas aos anos de 1998 e 1999. Confirmando as impropriedades no binômio contabilidade/declaração de renda, foi constatado que a Federação declarou em 1998, como ativo, o montante de R$ 18.000,00, enquanto que o valor constante do Livro Diário é de R$ 35.000,00; já em 1999, o valor declarado foi nulo, zero. Com relação ao faturamento, foi declarado um faturamento de R$500.000,00; recorrendo-se ao livro contábil, chegou-se a R$ 750.000,00. Também não houve explicação para o não recolhimento do COFINS. O senhor. Marcus fez questão de afirmar que está em dia com as parcelas do REFIS, porém, deixou bem claro, que a dívida com o INSS, é bastante antiga, de mais de vinte anos. A Federação recebe um montante do Governo do Estado, que se refere à prestação de serviços dentro do programa estadual “Dinheiro Vivo”. Há um contrato, que deveria ser fiscalizado pelo Tribunal de Contas do Estado, que estabelece as obrigações da Federação dentro desse programa. Segundo o presidente da Federação, foi graças a esses recursos que puderam realizar o campeonato do corrente ano. Como houve demora do estado no pagamento à Federação, tiveram que fazer empréstimos a empresas de Factoring, segundo o presidente, apreciados e aprovados pela diretoria. Essa análise panorâmica da situação fiscal e financeira da Federação do Espírito Santo, mais uma vez deixa claro a necessidade de uma reestruturação administrativa, criando uma contabilidade eficiente, controle internos capazes de detectar incorreções, a fim de que erros crassos, como os relatados acima, não venham a se repetir. 4. RELAÇÃO COM A CBF A Federação Espírito-santense recebe normalmente o auxílio mensal da CBF; alguns repasses maiores, em 98 e 99, teriam sido para ajudar os times do ES a disputarem o campeonato brasileiro, séries B e C; também para ajudar no campeonato do estado, em suas rodadas decisivas. Seu presidente prometeu entregar, na semana seguinte ao depoimento, todos os documentos comprobatórios dos gastos. Porém, quatorze dias após seu depoimento, nada relacionado às questões sem resposta havia dado entrada na Secretaria desta CPI. Apenas para explicitar o bom relacionamento com a CBF, o presidente da Federação Espírito-santense foi vice-presidente daquela Confederação, entre os anos de 1995 a 2000; em maio de 1995, viajou com a Seleção Brasileira principal para Israel, como chefe de delegação, oportunidade em que recebeu a quantia de U$ 100,00 por dia, durante uma semana. Chefiou também a delegação da Seleção Sub-17, em viagem, no ano passado, para Inglaterra; recebeu U$ 150,00 por dia. O gráfico abaixo demonstra as doações realizadas pela CBF, entre 1998 e 2000: NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/2000 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/99 NOVEMB SETEMB JULHO MARÇO 70.000 60.000 50.000 40.000 30.000 20.000 10.000 0 JAN/98 R$ MAIO DOAÇÕES DA CBF PARA A FEDERAÇÃO DE FUTEBOL DO ESPÍRITO SANTO 1998 - 2000 MESES Pode-se perceber, com facilidade, que houve um aumento sensível de doações entre agosto e dezembro de 1998, período eleitoral. Esta Comissão tem confirmado a existência de um esquema de doações eleitorais realizado pela CBF (ver Capítulo VIII). Algumas federações admitiram receber recursos para essa finalidade, com o apoio de Ricardo Teixeira, mesmo com os repasses realizados por meio das federações, e não diretamente aos candidatos. Com isso, No caso da Federação capixaba, há indícios de que esse procedimento tenha sido utilizado, como será visto a seguir. 5. C ONTRATOS COM TV 6. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL É necessário destacar que o senhor Marcus foi vereador, em seguida, prefeito por duas vezes, em sua cidade natal Ibiraçu-ES. Em janeiro de 1997, chegou à Câmara Federal, reelegendo-se em 1998. Em maio do corrente ano, após prestar depoimento a esta CPI, deixou o mandato de Deputado Federal, para assumir uma Secretaria no Governo do Estado do Espírito Santo. Durante seu depoimento, afirmou, por diversas vezes, que nunca recebeu nenhum auxílio da CBF para sua vida política; poderia ter recebido, porque acha que é legal; se fosse o caso, teria prestado conta ao Tribunal Regional Eleitoral. Também foi categórico em afirmar que não recebeu nada da Federação Espírito-santense, nem doou nada a ninguém; segundo ele, “a Federação, sim, estaria precisando de doações”. Sobre dois cheques, emitidos pela Federação, nominais ao presidente Marcus Vicente, no valor de R$ 10.000,00 e R$ 12.756,22, explicou que tinha sido o avalista de dois empréstimos: o primeiro a Luciano Gobbi, e o segundo a Antônio Cavaliere. Os cheques teriam saído nominais ao presidente, por ele ser o avalista, e porque os credores teriam preferido receber os valores em dinheiro.... Soa estranho alguém querer receber uma quantia relativamente alta, em espécie...Porque, então, a Federação não pôde, ela própria, sacar o total e pagar os credores? Apesar das explicações, esta Comissão não se convenceu da necessidade desses cheques terem sido emitidos nominais ao seu presidente. O senhor Marcus também se comprometeu a enviar à Comissão os comprovantes dessa operação, o que não ocorreu. A Federação recebeu um auxílio da CBF, no valor de R$ 50 mil, no dia 11/9/1998. No mesmo dia, a Federação emitiu o cheque 011.736, do Banco Real, também de R$ 50 mil para um favorecido desconhecido, de acordo coma contabilidade entregue pela Federação. Pelo Livro Diário da entidade, consta “Pgto. Verba (CBF) CF. Ch. 011.736”. O Banco Real informou a esta CPI que o favorecido do cheque 011.736, da conta corrente da Federação do Espírito Santo é o senhor Adauto Gonçalves Pinheiro. Perguntado sobre esse cheque, o senhor Marcus Vicente respondeu: “O SR. DEPUTADO LÉO ALCÂNTARA – O senhor conhece, V.Exa. conhece o senhor Adalto Gonçalves Pinheiro? O SR. DEPUTADO MARCUS VICENTE – Adalto Gonçalves Pinheiro é o empresário, salvo engano... Não. Adailton é Diretor da Federação. O SR. DEPUTADO LÉO ALCÂNTARA – Adailton Gonçalves Pinheiro? O SR. DEPUTADO MARCUS VICENTE – Adalto não! O SR. DEPUTADO LÉO ALCÂNTARA – Isso! O SR. DEPUTADO MARCUS VICENTE – Ele é diretor da federação. O SR. DEPUTADO LÉO ALCÂNTARA – Eu faço essa pergunta por que um dos cheques V.Exa. recebeu, aliás, perdão, a Federação Capixaba recebeu 50 mil da CBF no dia 11 de setembro. E nesse mesmo dia, a Federação emitiu um cheque para o Sr. Adailton Gonçalves Pinheiro. A título de que teria sido esse cheque? O SR. DEPUTADO MARCUS VICENTE – Com certeza foi para cobrir despesas de uma das equipes, que eu não me lembro qual, que eu vou mandar os comprovantes para V.Exa, semana que vem, disputantes do Campeonato Brasileiro da Série C ou também para pagamento de outras despesas relativas ao Campeonato Estadual daquele ano. O SR. DEPUTADO LÉO ALCÂNTARA – Eu gostaria que V.Exa., se pudesse, mandasse ainda esta semana, porque o nosso prazo é exíguo para apresentar o relatório. O SR. DEPUTADO MARCUS VICENTE – Não, vamos fazer todo o possível.” Não foi recebido, por esta CPI, documento que justificasse a despesa de R$ 50 mil com qualquer clube. Apenas, foi mantida a informação do que já teria sido contabilizado pela Federação. Com isso, surgem indícios de que os R$ 50 mil doados pela CBF não tenham sido, de fato, utilizados com finalidades estatutárias. 6. C ONTRATO COM TELEVISÃO Consta, na documentação enviada à CPI pela Federação do Espírito Santo, um contrato com a Gazeta do Espírito Santo Rádio e TV Ltda. Conforme o ofício de encaminhamento, teria sido o único contrato com emissoras de rádio e televisão, assinado pela Federação. Este contrato tem como objeto apenas o jogo da final do campeonato do ano passado, entre o Serra Futebol Clube e o Desportiva Capixaba. Chamou-nos atenção o valor irrisório do contrato: R$ 300,00 a ser rateado entre os finalista e a Federação. A cláusula décima desse contrato traz o compromisso da Federação em negociar, prioritariamente, com a TV Gazeta as transmissões dos jogos dos campeonatos dos anos de 2001 a 2004. Conforme deixou claro o presidente da Federação em seu depoimento, esse possível contrato com a TV Gazeta é que dará uma sobrevida ao Futebol no Espírito Santo. Mais uma vez, restou comprovada a dependência financeira do futebol aos interesses comerciais, dentre esses, e com maior força, o interesse televisivo. 7. RELAÇÃO COM OS CLUBES 8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DE FUTEBOL Não se obteve informações relativas a empresários de futebol. 9. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES GOIÁS 1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DA FEDERAÇÃO A Federação Goiana de Futebol é uma sociedade civil de direito privado para fins desportivos, com jurisdição em todo o estado de Goiás, constituída pela união das Ligas e Associações que lhe são filiadas. Tem como seu presidente Wilson da Silveira Pereira, que, interrogado por deputados membros desta CPI, em 09/05/2001, afirmou que a diretoria não é remunerada e que ele é juiz aposentado, empresário na área do álcool e do turismo. 2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA A Federação Goiana não enviou a esta CPI os documentos contábeis solicitados. Quando lhe foi perguntada a razão desse procedimento, o presidente informou que, ao participar de uma reunião em Manaus, onde se encontravam vários presidentes de federações, em Manaus, lá encontrou um advogado, levado por Eduardo Viana, da Federação do Rio de Janeiro, que o convenceu da “inconstitucionalidade da criação de uma CPI com relação ao futebol” e que, posteriormente, por telefone, acabou convencido por Eduardo Viana de que nada mais seria necessário encaminhar à CPI. A documentação bancária, que é recebida através do Banco Central, também veio incompleta no que se refere ao BEG – Banco do Estado de Goiás, tendo chegado apenas os extratos de contas, sem as cópias dos documentos bancários correspondentes. Esse fato foi, inclusive, motivo de questionamento feito ao presidente, no sentido de se teria ele atuado junto ao Banco para que esse não enviasse a documentação, o que foi negado. 2.1 CONTINUISMO O atual presidente, Wilson da Silveira Pereira, foi vice-presidente da Federação de 75 a 78 quando saiu para assumir a presidência de clube de futebol, sendo novamente vice em 88. Assumiu a presidência no final desse mandato por seis meses e, em 91, foi eleito presidente, permanecendo até os dias atuais. Tem previsão de encerramento do mandato atual em 2002 quando completará 12 anos à frente da federação. 2.2 N EPOTISMO Durante o depoimento prestado a esta CPI em Goiânia, o próprio presidente afirmou que tem dois parentes trabalhando na Federação. 2.3 C ONSELHO F ISCAL - ELEIÇÃO O Conselho Fiscal da federação é eleito conjuntamente na chapa do presidente. Não há a devida isenção necessária para o trabalho desse Conselho. Essa situação é encontrada em todas as entidades estaduais examinadas e, principalmente, na CBF. O presidente da Federação Goiana descreveu bem esse procedimento eleitoral, ratificando tratar-se de uma prática normal no futebol de todo o Brasil: “Sim, eu disse para o senhor. Se não é a forma eficiente, é a forma normal que se faz no futebol de todo o Brasil, eu tenho a impressão de que ... Eu já disse que nós temos um estatuto arcaico, mas é o futebol brasileiro, infelizmente ou não, é assim. Então, sempre foi feito assim, todas as eleições já vai a chapa, de um lado ou de outro, com os seus fiscais.”. 2.4 CBF REPASSA R$ 63.920,00 A JAIME FERREIRA DE OLIVEIRA N ETO E R$ 195.500,00 A W ILSON DA SILVEIRA PEREIRA Jaime Ferreira de Oliveira Neto é o vice-presidente da federação para quem o presidente endossou um cheque que acabara de receber da CBF destinado à Federação, no valor citado, “para ressarcir dos débitos que ele já havia feito,...”. O saque foi efetuado no Rio de Janeiro enquanto o presidente se encontrava naquela cidade, conforme cópia do cheque (Anexo 03, Pasta 17). O presidente, em pessoa, sacou no caixa do banco pelo menos mais dois cheques oriundos da CBF para a federação: um de R$ 100.000,00, em dezembro/98 e outro de R$ 95.500,00 em janeiro/99, conforme seu depoimento em 09/05/2001 e cópias dos cheques (Anexo 03, Pastas 17 e 24). 3. S ITUAÇÃO FISCAL , FINANCEIRA E CONTÁBIL A análise fiscal da federação não pôde ser completa em virtude das manobras que a entidade goiana realizou para não enviar a documentação contábil, dentre outras, conforme solicitado por esta CPI. Vale salientar que, durante depoimento em audiência pública realizada em 09/05/2001, em Goiânia, quando não conseguia responder satisfatoriamente às perguntas e atender aos pedidos de explicações formuladas pelos deputados, o presidente fazia seguidas promessas de envio de documentos que comprovariam as suas afirmações. Assumido tal compromisso, eis que, no dia 22/05/2001, foi recebido um expediente da Federação, com data do dia anterior, onde consta: “Conforme prometido por mim... , encaminho a Vossa Excelência os documentos comprobatórios dos questionamentos realizados naquela oportunidade, como segue:”. Em seguida relaciona uma série de documentos que nada acrescentaram ou esclareceram com relação aos fatos inquiridos anteriormente, configurando-se no envio de uma papelada inútil. Um exemplo típico foram os livros contábeis. Estava constando da relação dos documentos enviados a cópia do livro DIÁRIO, ano base 1998. Essa cópia, no entanto, se resumia a quatro folhas, duas das quais eram tão somente: o “Termo de Abertura” e o “Termo de Encerramento” (Pasta Federações Centro-oeste, Vol 04). Assim, o expediente termina com o fechamento: “Certo de ter cumprido com o prometido, subscrevo-me mui atenciosamente.” A seguir, alguns aspectos que merecem comentários quanto à situação fiscal, financeira e contábil. Foi verificado, em documentos de posse desta CPI, uma denúncia do Ministério Público Federal, Procuradoria da República em Goiás, de 06/05/97, à Justiça Federal, contra Wilson Silveira Pereira, presidente da Federação. Lá estão tipificados crimes contra a Previdência Social, consubstanciados no desconto, quando do pagamento de salários, férias e outros direitos de empregados da federação, sem efetuar os repasses, havendo a apropriação dos mesmos. Essa conduta se deu de 1990 até 1994, sendo que, em 1994, ainda houve uma apropriação de parcelas retidas de clubes referentes a partidas de futebol realizadas (Pasta Federações Centro-oeste, Vol 04). A Federação Goiana tem uma dívida com o INSS de R$ 715 mil de saldo de parcelamento do REFIS, efetuado em 25/04/2000 (Anexo 09, Pasta 01 - Fiscal). Declarou ao Imposto de Renda, ano base 1998, uma receita de R$ 266.575,64 proveniente de venda de bens e ou da prestação de serviços. O presidente, no entanto, não soube explicar a origem desses recursos. Em 1999, recebeu de doações e subvenções R$ 3.166.000,00, fato que também não foi explicado pelo presidente, admitindo ter sido o montante de recursos patrocinado pelo governo do estado com referência a um “campeonato de prêmios”, repassados aos clubes, do qual a federação ficaria com 10%. Ao ser inquirido por esta CPI a respeito de cheques sacados em espécie, o presidente forneceu uma explicação onde, pelas suas palavras, ficam caracterizadas a intenção e os artifícios utilizados para burlar o INSS: “O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – Em 25/11/99 foram depositados, na conta da Federação, o valor de 240 mil reais. No dia 30/11/99, todo esse dinheiro foi sacado em espécie. Por que esse procedimento? O SR. WILSON DA SILVEIRA PEREIRA – Esse é aquele que eu disse ao senhor, eu recebi na verdade 100 mil, no dia 1º/12, e depois mais 95 mais 15, no dia 8/1. Esse é o valor que foi repassado para complementar, conforme o meu relatório, que está sendo apresentado a vocês imediatamente sobre o campeonato brasileiro de futebol, que foi a sua totalidade que vocês vão observar a legalidade, a honestidade e a seriedade desse descompromisso com toda a documentação e que tudo é um valor realmente justificável. O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – O senhor já disse, quem a gente... O SR. WILSON DA SILVEIRA PEREIRA – E esse valor, complementando ao senhor, nós temos que buscar realmente em espécie, eu não podia pôr na nossa conta, era ameaça do INSS de nos bloquear, aí eu estava perdido. Então, foi feita essa razão.” Segundo o presidente da entidade goiana, a federação é proprietária de onze salas na Galeria Tocantins, alugadas por R$ 220,00 cada uma. Essa renda de alugueis não consta expressamente em nenhuma das declarações de renda às quais tivemos acesso: anos base 1997, 1998 e 1999. A sonegação foi admitida pelo presidente que, como sempre misturando assuntos ou falando sobre o que não lhe foi perguntado e não esclarecendo o que lhe é pedido, assim se expressou: “Eu até liguei pra federação e consultei lá, ele não recolhia parece alguma coisa de Imposto de Renda. E eu tinha a impressão também que realmente nunca foi recolhido isso. Então, há essa deficiência. Há uma série de erros dentro da própria federação, de administração, que ela vem há anos assim. Então, eu acho que... eu tava vendo os estatutos arcaicos, os estatutos que não dão condições de nada. A isenção da federação, alguém nos disse da contabilidade que era isento dessa declaração...” 4. RELAÇÃO COM A CBF Com relação à CBF, pode-se afirmar que existe um entrelaçamento muito forte entre a federação Goiana e a CBF e entre os seus dirigentes. A partir de cheques emitidos pela CBF, verificou-se que a federação Goiana recebeu daquela os seguintes valores: R$ 100.080,00 em 1996, R$ 178.920,00 em 1998, R$ 175.500,00 em 1999, 103.924,00 em 2000. Em 1997, conforme contabilidade da CBF, ela fez repasses de R$ 230.000,00 para a Federação Goiana. Na rubrica referente a doações e subvenções, porém, há registro de apenas R$ 15.000,00, dado verificado na declaração de renda daquele ano obtida através da Receita Federal. DOAÇÕES DA CBF PARA A FEDERAÇÃO GOIANA DE FUTEBOL 1998 - 2000 R$ 250.000 200.000 150.000 100.000 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/2000 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/99 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO 0 JAN/98 50.000 MESES Fonte: Contabilidade CBF Quando inquirido por esta CPI, o presidente discordou dos números, afirmado terem sido os repasses em 1997, na realidade de R$ 125.000,00, o que lhe foi mostrado que, mesmo assim, o valor seria muito maior do que os R$ 15.000,00 registrados e acrescentou, na hora, o deputado: “O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ –Foi quanto o senhor declarou. E nós voltamos àquela questão de que existem duas vidas: uma verdadeira, na administração da federação, e uma fictícia. A fictícia é a que vai pro papel, a fictícia é que é fiscalizada pelo Conselho Fiscal, a fictícia é a que a sociedade toma conhecimento. Em contrapartida, existe uma realidade concreta que ninguém toma conhecimento. Esse é o caminho mais rápida pra catástrofe que tem hoje administrativa no futebol. Você criar uma peça de ficção, você colocar uma coisa, como o presidente que o antecedeu aí disse que ele pensava até que ele podia colocar qualquer informação que não tinha problema, porque não pagava Imposto de Renda. Na verdade, é exatamente por não pagar é que deveria se ter a exigência, até a exigência moral, de que as informações fossem verdadeiras. E as suas informações não são verdadeiras.” O presidente, durante o seu depoimento, por várias vezes reconheceu ter recebido ajuda de CBF, seja para pagamento de 13º salário, ou até na forma de veículo, a exemplo de um Tempra 1997 que teria custado à CBF R$ 25.000,00 e que, em dezembro/98, teria sido vendido, conforme recibo existente, por R$ 15.000,00, à Federação Goiana. Wilson da Silveira Pereira, porém, definiu a operação com esse veículo como tendo sido uma doação da CBF. Esse carro, em 2001, ainda se encontrava em nome da CBF. O presidente ainda informou estar reclamando da CBF um carro novo, tendo se dirigido à essa Confederação, nesse sentido: “Eu, este ano, procurei ao Marco Antônio, pedi a ele: olha, eu preciso renovar o carro, preciso que vocês me troquem o carro, eu dou o carro de volta e vocês me dão um carro novo. ... Então, eles falaram assim: Olha, o senhor vende esse carro aí e vê o que você pode fazer. ... Eu não sei se esse carro já foi vendido, eu mandei realmente colocá-lo à venda, mas eu tenho aqui toda a documentação que esse carro pertenceu, até este ano, até há quinze dias ele estava em nome da própria CBF, e não da Federação Goiana de Futebol. Isso aqui foi uma doação realmente da CBF à Federação, e o carro não tem mais condições, depois de quatro anos de tráfego, de rodagem, ele não... Então, ele estava pedindo que eu mandaria a eles e eles me mandariam um novo. Aí, não teve condições de fazer, depois da dificuldade de CPI também, tudo agora é CPI, então, ficou por elas. Não vale 15 mil mais o carro, pela consulta que fiz no mercado.”. Quando do depoimento perante esta CPI na cidade de Goiânia, o presidente se alongou falando sobre outros cheques recebidos da CBF em 1998 em benefício da Federação. Reconheceu que um de R$ 63.920,00 foi endossado por ele e depositado na conta particular do vice-presidente, Jaime Ferreira de Oliveira Neto, “para ressarcir dos débitos que ele já havia feito,...”. Os demais valores recebidos, pelo menos em 98/99, também nunca entraram nas contas da federação e, pelo menos, dois cheques foram sacados em espécie pelo próprio presidente nos valores de R$ 100.000,00 e de R$ 95.500,00, entre dezebro/98 e janeiro/99. As razões, conforme explicações do presidente, Wilson da Silveira Pereira, seriam, na melhor das hipóteses, fugir das obrigações fiscais, conforme as palavras do presidente: “Então, esse valor, vocês, sei que vão perguntar porque que ele veio. Fomos buscar em dinheiro e não trouxemos para cá ou não jogamos na conta de ninguém. Esse dinheiro não foi gasto, a não ser nos investimentos do Campeonato Brasileiro de Futebol Feminino. Não foi jogado na conta porque a Federação na época tinha ameaças e agressões por parte de um candidato de oposição a nós, que o INSS iria nos criar problema. E eu tinha realmente uma ação do INSS. Nós cometemos um erro, porque o INSS a Federação deve há muitos anos, vem sendo rolada a dívida. E às vezes, pelas dificuldades, às vezes nós deixamos de pagar um... fazer um pagamento ou outro, e vêm as pendências. A gente vai sempre renovando, renovando, e sempre aumentando esses valores.” Essa explicação não procede, pois, pouco depois, sem ter havido qualquer acerto com o INSS, foram depositados em conta corrente da Federação no BEG valores muito mais altos do que aqueles que estavam sendo questionados, totalizando R$ 3.000.000,00, entre maio e setembro de 1999 (Anexo 09, Pasta 01 – Sigilo Bancário). Eram recursos provenientes de contrato com o Governo do estado de Goiás para a promoção de uma campanha pela exigência da nota fiscal por parte do consumidor. 5. C ONCLUSÕES O exame das contas da Federação Goiana de Futebol leva à conclusão de que a entidade é mal administrada. O presidente desconhece, ou faz demostrar isso, dados importantes relativos à entidade, tais como receitas, despesas, etc. E trata-se de uma federação comandada pela mesma pessoa há mais de dez anos. Não se vislumbra aqui os princípios básicos constitucionais da moralidade, legalidade e impessoalidade. 6. RECOMENDAÇÕES Alguns fatos devem ser imediatamente submetidos a uma investigação minuciosa por parte das instituições competentes, tendo em vista a existência de indícios mais do que suficientes para se crer em prática de atos ilícitos. São apresentados, a seguir, algumas recomendações: 1. que seja feita uma auditoria na Federação Goiana, procurando-se, entre outros, identificar os motivos da não contabilização dos recursos oriundos da CBF e a real razão pela qual os recursos eram recebidos no caixa pelo presidente ou pelo vice; 2.. encaminhar ao Ministério Público cópia deste Relatório e dos anexos referentes à Federação Goiana de Futebol, Anexo 09, duas pastas, incluindo-se, ainda, os documentos relativos a entidade recebidos por esta CPI. Na área administrativa, podem ser salientados os seguintes aspectos e as correspondentes recomendações: a) promover a revisão dos estatutos da Federação, especialmente no que diz respeito às atribuições e à escolha/eleição dos membros do Conselho Fiscal; b) denunciar ao Conselho Federal de Contabilidade, dando-lhe conhecimento dos procedimentos contábeis adotados pela Federação; c) comunicar à Receita Federal as irregularidades verificadas nas declarações do Imposto de Renda dos anos recentes e recomendar uma fiscalização severa nas contas da entidade, e de seus dirigentes. Sugere-se, por fim, que seja decretada a intervenção na Federação Goiana de Futebol, com base no art. 8, do Estatuto da CBF. Sugere-se ainda que o MPF investigue a regularidade da atuação do Banco do Estado de Goiás. MARANHÃO 1. NATUREZA JURÍDICA/ESTATUTÁRIA DA FEDERAÇÃO A Federação maranhense não encaminhou para a CPI os estatutos da entidade. Pelas declarações de renda apresentadas, percebe-se que natureza jurídica da entidade é de uma associação civil de direito privado, sem fins lucrativos. De acordo com seu presidente, os dirigentes não são remunerados. Como será verificado a seguir, o presidente sacou cheques destinados à Federação para uso próprio. Uma verdade ficou clara para esta Comissão: o uso, ilimitado, dos dirigentes da entidade como propriedade suas, por meio da qual se enriquecem, se candidatam a cargos eletivos utilizando-se da estrutura e das oportunidades de aparecer na imprensa em geral que dá o cargo. No caso em questão, há indícios muito fortes de que o presidente maranhense tenha se enriquecido às custas do cargo ocupado. Não se pode crer em crescimento patrimonial de alguém que desde os dezoito anos milite na Federação e que não seja remunerado. O jornalista do Maranhão, Herbert Fontenele Filho, em depoimento à CPI da Bola, ocorrida em 1994, na Assembléia Legislativa daquele Estado (que será tratada a seguir), ao ser questionado a respeito do cargo de presidente de federação estadual de futebol, afirmou que: “Eu até agora não consegui entender porque eles se apegam a esse cargo., já que recebem críticas, é difícil de administrar, criticados sempre. Mas todos eles querem se perpetuar. O Presidente da Federação Carioca vai fazer agora 24 anos, teve um em Pernambuco que passou 30, João Havelange vai para 24 anos na FIFA, agora. O voley do Brasil deu uma guinada quando houve uma mudança de direção da Confederação do Voley. Não é só no Maranhão, os presidentes das Federações no Brasil todo se reelegem. Esse presidente agora da Federação do Maranhão, ele modificou o Estatuto e ampliou o mandato dele, prorrogou por mais um ano, para coincidir com a eleição do Ricardo”. É o que ocorre no Maranhão. O presidente atual é acusado de ter adquirido patrimônio significativo, até empresa em São Paulo, sendo, por tantos anos, dirigente da entidade, não remunerado. Não há dúvidas, portanto, de que a natureza jurídica da Federação maranhense seja de uma associação civil, sem fins lucrativos, com direito a alguns benefícios da lei, desde que preenchendo todos os requisitos legais. Essa entidade, nesse ponto, vem infringindo a lei em muitos aspectos, o que fará com que ela tenha de arcar com o ônus de se utilizar dos benefícios de uma entidade sem fins lucrativos e realizar atividades, omitir informações ou efetuar despesas não permitidas para esse tipo de entidade. 2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA A Federação Maranhense de Futebol é dirigida pelo senhor Carlos Alberto Ferreira (CPF 075.295.543-87) desde março de 1991, completando dez anos, em 2001. Está, no entanto, a serviço da entidade desde os seus dezoito anos de idade. Antes de ser presidente, foi vice-presidente diversas vezes. Tudo isso faz com que esteja há mais de trinta nos na Federação maranhense. A Federação não encaminhou os dados referentes às eleições na entidade, conforme exigido por esta Comissão, por meio do Requerimento n. XXX/0X, de YY/YY/YYYY. Pelos depoimentos obtidos em 25/1/2001 e em 11/5/2001, pôde-se observar a extensão da desorganização administrativa da Federação. Não há contabilidade e as declarações de renda não têm valor algum. O presidente até confirmou ter sacado um cheque na boca do caixa e não ter contabilizado esse valor. Na CPI maranhense da Bola, o jornalista Herbert Fontenele Filho afirmou que a Federação tem a “estrutura mínima possível” e se se procurar documentos arquivados não se encontra, pois não existe o mínimo de organização. Segundo Fontenele, “somem documentos importantes com muita facilidade. O cara mete a mão no balcão, já sumiu súmula de jogo aqui, decisivo, é só meter a mão no balcão, botou debaixo do braço, levou, ficou por isso mesmo”. E continua Fontenele: “Ainda por cima da mesa os papéis, rolando, é assim. Não tem ar condicionado, não tem gabinete, não tem porta, não tem chave, não tem gaveta trancada, não tem sala no Tribunal, não tem mesa, não tem carteira.” Por volta de 1990 e 1991, a Federação Maranhense de Futebol organizou um bingo para arrecadar recursos para os clubes maranhenses 19. Ela contratou dois empresários de Santa Catarina para realizar os eventos. Foram impressas 80.000 cartelas, naquela ocasião. 19 Depoimento do jornalista José Raimundo Rodrigues à CPI da Bola, em 5 de maio de 1994. De acordo com o jornalista José Raimundo Rodrigues, hoje Deputado Estadual maranhense, em depoimento na CPI da Bola, no dia 5 de maio de 1994, os sorteios dos bingos foram gravados com 72 horas de antecedência e passados na rede de TV Mirante, em diversas cidades, simultaneamente, por meio de fitas gravadas e combinadas, como se tudo estivesse ocorrendo ao vivo. Foi feita a gravação na quintafeira à noite e passada a fita na TV no domingo, de manhã. Não houve dúvidas da fraude, pois naquela época nem havia canalização (via Embratel) para a transmissão ao vivo que possibilitasse isso ocorrer. Para ele, que denunciou em seu programa de TV, foi um dos crimes mais graves praticados pelos dirigentes da Federação. O bingo foi, para José Raimundo, “um jogo de cartas marcadas, compactuado pela TV Mirante”. Esse assunto, na TV Mirante, segundo o jornalista era tratado pelo senhor Guy Sobral, diretor geral. As gravações teriam sido feitas na “calada da noite” e que “todos já sabiam, entre Federação e organizadores, quais as cartelas vencedoras”. “As cartelas (“vencedoras”) foram retiradas de circulação e foram colocadas à venda (as restantes) até no sábado”, véspera do “sorteio”, “em todo o interior do Maranhão, nas agências dos Correios”. Segundo ele, a armação feita pela Federação foi objeto de um inquérito policial, aberto pelo delegado Sebastião Justino, no qual o próprio jornalista depôs, sendo que, porém, não resultou em nada. Para o jornalista José Raimundo Rodrigues, os bingos foram “crimes contra a economia popular dos mais graves” pois nem os prêmios foram entregues e não se sabe do destino do dinheiro apurado. “Foi a coisa mais acintosa que já vi uma entidade fazer e não acontecer absolutamente nada!”. Nos depoimentos dados à CPI da Bola, verificou-se que o principal responsável pelo golpe foi do então vice-presidente da FMF, Carlos Alberto Ferreira, que assumira o presidência, com o afastamento de Mário Carneiro. Quanto a Carlos Alberto Ferreira, este foi completamente desmascarado por esta CPI. Além de não convencer a Comissão sobre seus relacionamentos com os crimes de falsificação de documentos e de registros, do tráfico de menores para o exterior, não soube explicar, dentre muitas outras coisas, como descontou um cheque da CBF em nome da Federação na boca do caixa de uma agência no Rio de Janeiro, em 1996. Sobre isso respondeu que fora para efetuar alguns gastos e que a Federação não podia ter talões de cheques, quando foi contestado pela CPI com a comprovação de que a FMF teria movimentado conta na Caixa Econômica Federal, agência Conceição dos Mulatos, em São Luís. Os números apresentados pela Comissão quanto ao repasse de recursos da CBF para a Federação chocaram-se com as informações dadas por Carlos Alberto Ferreira. Para o dirigente, os valores enviados pela CBF eram em forma de auxílios, de doações. A contabilidade da CBF, ao contrário, vem registrando esses repasses, em sua maioria, como empréstimos e não como auxílio. 3. SITUAÇÃO FISCAL Após a quebra dos sigilos bancário e fiscal da Federação maranhense, algumas das federações, incluindo a do Maranhão, impetrou mandado de segurança, procurando impedir que esta Comissão recebesse as informações das instituições bancárias e da Receita Federal. De acordo como presidente Carlos Alberto Ferreira, isso foi feito para atender a um pedido de um presidente de Federação e que não buscava obstruir os trabalhos da CPI. Com relação a essas doações, questionado sobre o recebimento de um cheque da CBF, que teve como favorecido a Federação e que o próprio presidente havia sacado, na boca do caixa, Carlos Alberto Ferreira não soube explicar o porquê do saque: “O SENHOR DEPUTADO EDUARDO CAMPOS- (...) Onde foi parar um cheque de dezoito mil reais que foi passado do Banco Bamerindus, o cheque de nº 136036 nominal a Federação Maranhense de Futebol, sacado na agência Conde de Bonfim no Rio de Janeiro no caixa, em espécie pelo o senhor, no dia dezessete de janeiro de 1996? O SENHOR CARLOS ALBERTO FERREIRA- Ele veio para a Federação da despesa que eu paguei determinadas despesas, eu recebi lá e como para botar o cheque para ele não voltar para cá, eu ia ter que esperar quatro ou cinco dias úteis, e eu saquei. O SENHOR DEPUTADO EDURDO CAMPOS- E nunca registrou esse dinheiro na contabilidade da Federação? O SENHOR CARLOS ALBERTO FERREIRA - Não.” Há a necessidade, portanto, de se fazer com que o presidente da Federação devolva ao caixa da entidade o valor retirado sem comprovação, que, aparentemente, foi utilizado em proveito próprio. E esse é apenas um caso apurado; por falta de exame da contabilidade da entidade, pode-se levantar a suspeita de que outros casos possam ter ocorrido. O Ministério Público, a quem caberá a continuidade das investigações, poderá promover exame detalhado das contas da Federação e, com a quebra dos sigilos bancário e fiscal dos dirigentes, em especial, do senhor Carlos Alberto Ferreira, verificar a existência ou não de desvio de recursos da Federação para o bolso do presidentes e diretores. Cabe ressaltar que o presidente depôs afirmando que houve, em algum tempo atrás, perda de documentos contábeis e fiscais da Federação, devido a um arrombamento seguido de furto que lá ocorreu. Caberá ao Ministério Público apurar a veracidade dessas informações, para se confirmar se não se trata de um atentado contra a Federação, com o objetivo de ocultar informações que poderiam levar a outros crimes. Não se teve acesso à contabilidade da Federação, que se recusou a atender requerimento aprovado pelo Colegiado desta Comissão. O não-atendimento desse requerimento prejudicou o exame do quadro da contabilidade da entidade. Aparentemente, a Federação não possui um sistema contábil eficiente, da mesma maneira que tem controles muito deficiente de registro de atletas. Corrobora para isso o fato de a Federação do Maranhão não ter apresentado as declarações de renda conforme estabelece a Lei 9.532/97. A Receita Federal encaminhou a esta Comissão dados que comprovam que a Federação não entregou a declaração de renda relativa ao ano-calendário de 1998, que deveria ser entregue em 1999. Além disso, as declarações entregues (ano-calendário 1997 e 1999) contêm muitas irregularidades. As declarações entregues em 1998 e 2000 não contêm, na verdade, informações contábeis, ou outros dados que pudessem realizar algum exame. Elas foram entregues totalmente em branco. Ou seja, apenas encaminharam o formulário da Receita com dados cadastrais da Federação. Somente essas omissões e declarações falsas certamente deverão fazer com que a entidade maranhense tenha suspenso o benefício da isenção do imposto sobre a renda (IR), como também da contribuição social sobre o lucro líquido (CSLL). É o que estabelece a Lei 9532/97. Além disso, caberá à Receita calcular os tributos devidos no período em que ficarem apuradas as irregularidades. Pelo se pode inferir do depoimento do presidente da Federação e da condições administrativas dessa entidade, pode-se facilmente supor que não há o recolhimento de tributos que caberiam até a entidades isentas de IR, tais como o COFINS e o PIS. Essas declarações fraudulentas não poderiam ser feitas sem contar com o apoio do senhor José Ribamar Santos Barroso (CPF 237.892.393-72), contador de CRC número 7557/03, responsável pelo preenchimento da declaração do ano de 2000 (ano base 1999), que assina uma declaração em branco de uma entidade que, pela declaração apresentada, não possui patrimônio, ativo, passivo, não obteve receitas nem gerou despesas, etc. Há, portanto, a necessidade de se considerar o contador como coresponsável, pela sonegação de informações prestadas e, possivelmente, sonegação de tributos desde muitos anos atrás. Certamente, nesse caso, torna-se necessário exame da contabilidade da Federação por parte do INSS, que, por certo, também identificarão uma série de irregularidades, dentre elas, o não recolhimento das contribuições sociais. Outro problema grave encontrado na administração da Federação maranhense refere-se ao registro de atletas. Como ficou provado durante a audiência ocorrida em São Luís, entre os dias 25 e 26 de janeiro de 2001 (a audiência iniciou-se às 9 horas e somente terminou à 6 horas da manhã do dia seguinte), há inúmeras irregularidades naquela Federação, incluindo-se falsificação de documentos, adulteração de identidades e de registros, que serão tratados em capítulos especiais. 3.1 CONSELHO FISCAL A Federação não possui um Conselho Fiscal adequado. Pelo o que pôde ser apurado, diante dos obstáculos colocados pelo presidente Carlos Alberto Ferreira, o Conselho Fiscal praticamente nem existe. Durante a CPI da Bola, o jornalista Fontenele, perguntado sobre a existência de livro caixa, extrato de bancos, etc. advertiu que: “Isto é controlado por ele, mais um, que muda com facilidade, hoje é um, amanhã é outro, sai um, entra outro, quer dizer, não tem Conselho. A CBF tem o que eles chamam de Conselho Fiscal, que aprova as contas anualmente, e a Assembléia Geral, que são esses Presidentes da Federação. Eles aprovam da mesma forma que aprova aqui, faz a Ata, e pronto, e não querem saber”. 4. RELAÇÃO COM A CBF Essa Federação é uma das unidades da CBF que menos recursos recebeu, em formas de doações, nos últimos três anos. É o que se pode verificar no gráfico abaixo. A entidade recebe um valor mensal fixo da CBF, em forma de um mesada, a qual, segundo o dirigente, é gasta em despesas tanto administrativas quanto de assistência a clubes amadores, a mais de cem ligas esportivas. Além disso, Carlos Alberto Ferreira demonstrou forte grau de subserviência perante Ricardo Teixeira, diante a CBF. De uma Federação que recebe tão poucos recursos da CBF, e é tão mal atendida em termos de presença de clubes maranhenses em torneios nacionais, aparentemente não se esperaria atitudes como essas. A não ser que outras formas de compensação estejam envolvidas, não em interesse público e do futebol do Maranhão. Caberá ao Ministério Público, à Receita Federal, ao INSS, dentre outros órgãos competentes, apurar, com mais detalhes, todos os indícios de irregularidades. NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/2000 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/99 NOVEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/98 45.000 40.000 35.000 30.000 25.000 20.000 15.000 10.000 5.000 0 SETEMB DOAÇÕES DA CBF PARA A FEDERAÇÃO MARANHENSE DE FUTEBOL 1998 - 2000 R$ MESES 5. CONTRATOS COM TV A Federação maranhense possui um contrato com a TV Globo para quem transfere os direitos de transmissão dos jogos do Campeonato Estadual. Os valores do contrato chegam a R$ XXX.XXX,XX. 6. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL Os contextos esportivo e político estão intimamente interligados no Maranhão. Não que isso não ocorra em outros Estados; no Maranhão, pelo que foi percebido por esta Comissão, há um envolvimentos mútuo exacerbado. Começando pela Assembléia Legislativa maranhense, que possui, como seu presidente, o Deputado Estadual Manoel Ribeiro. Esse parlamentar acumula o cargo ce presidente do Sampaio Correa, um dos três mais importantes clubes de futebol do Maranhão com a presidência da Assembléia, cargo, este, que ocupa há mais de nove anos. Outros parlamentares têm participação no mundo futebolístico maranhense, tal como o ex-Deputado, Sebastião Murad, ex-presidente do Moto Clube, outro importante clube de São Luís. Capítulo importante do futebol maranhense foi a CPI da Bola, que será tratada, a seguir. 6.1 A CPI DA BOLA MARANHENSE , DE 1994 - UMA LIÇÃO HISTÓRICA AINDA PRESENTE Em 1994, foi instalada uma CPI, na Assembléia Legislativa maranhense, destinada a apurar problemas do futebol maranhense. O principal foco das atenções foi a própria Federação maranhense. O presidente da CI foi o então Deputado Estadual Benedito Coroba, hoje promotor de justiça no sul do Maranhão. Dentre outros membros se encontram os Deputados Gastão Vieira, Francisco Martins, José Genésio e Kleber Branco. As reuniões ocorreram entre abril e maio daquele ano. Esta Comissão, em sua audiência em São Luís, entre os dias 25 a 26 de janeiro de 2001, procurou junto à Assembléia Legislativa do Maranhão as notas taquigráficas ou fitas de áudio daqueles depoimentos. Houve grande dificuldade de se conseguir qualquer informação sobre a CPI da Bola. Os funcionários da Assembléia negavam com veemência a existência de alguma nota taquigráfica ou gravação daquelas audiências. Tornou-se necessário contactar o ex-Deputado Coroba, por duas vezes, para que se pudesse confirmar que as reuniões ocorrerm de fato. Em um desses contatos, Deputado Coroba sugeriu que a CPI entrasse em contato com o jornalista Herbert Fontenele Filho, que acompanhou bastante aquele trabalho e poderia dar informações sobre o assunto. Questionado pela Comissão, o senhor Fontenele negou a existência de audiências e disse que a CPI da Bola havia sido abortada desde o início e que não teriam ocorrido audiências. A resistência evidente dos funcionários da Assembléia só foi rompida a partir de pedidos feito por Deputados em plena audiência e diante do fato de que diversos Deputados confirmaram os depoimentos. Pressionados, os funcionários apresentaram parte das notas taquigráficas e das fitas de áudio daquela CPI. Qual não foi a surpresa da Comissão ao perceber que o primeiro depoimento, dentre os mais de dez encontrados, foi feito prestado exatamente pelo jornalista Herbert Fontenele Filho. O mesmo que havia negado a existência daqueles depoimentos... Convidado a depor em nova ocasião, já em 12 de maio de 2001, durante audiência desta CPI, em João Pessoa, o senhor Fontenele não compareceu. A única falta percebida dentre todos os convidados. Soube-se, inclusive, por intermédio do depoimento presidente da Federação maranhense, que a esposa desse jornalista, a senhora Diva Maria Fontenele era ou ainda é remunerada pela Assembléia maranhense, além de outra parente dele, Cynthia Fontenele. O que leva a esta Comissão a crer que o jornalista Fontenele tenha mentido para defender interesses de terceiros. Assim, as notas taquigráficas descobertas auxiliaram a esta CPI a elaborar questões importantes para os depoentes, como também vêm enriquecendo os trabalhos desta Comissão. A CPI da Bola maranhense, de 994, precursora, atacou muitos problemas do futebol que hoje são tratados pela CPI da CBF/Nike. Os Deputados que a compunham são dignos, portanto, de louvores pela iniciativa honrada. O mesmo não se pode dizer do grupo político que, por meio do presidente da Federação maranhense, senhor Carlos Alberto Ferreira, entrou com ação judicial contra a CPI da Bola, impedindo que esta chegasse às suas conclusões. Afinal, o Poder Judiciário local admitiu a ação e permitiu que as forças contrárias às mudanças sepultassem aquela CPI. Carlos Alberto Ferreira afirma que CPI foi usada por Fontenele contra ele. Só que Ferreira se esqueceu de que outros depoentes também denunciaram, com veemência, ações praticadas pelo presidente atual da Federação maranhense, dentre eles o Deputado Estadual José Raimundo Rodrigues. A CPI da Bola, enfim, ressurge para ficar. As notas taquigráficas constam, em forma de anexo, deste Relatório, para exame de todos os cidadãos. 6.2 JORNALISTAS E CRONISTAS ESPORTIVOS - RELAÇÕES COM PODERES LOCAIS As denúncias recebidas por esta Comissão foram comprovadas por meio do depoimento do presidente da Federação maranhense, em seu segundo depoimento, a 12 de maio de 2001. Carlos Alberto Ferreira foi claro ao afirmar que todos os jornalistas e cronistas são remunerados pela assessoria de imprensa da Assembléia Legislativa do Maranhão. Esse fato pode ser corriqueiro para o maranhense, porém adquire uma importância maior, e em nível nacional, quando se avalia a relação política e futebol. No caso, há Deputados maranhenses que estão à frente de clubes daquele Estado. O presidente da Assembléia, Deputado Manoel Ribeiro, é também presidente do Sampaio Correa, um dos mais importantes clubes daquele Estado. O fato de toda a imprensa esportiva ser remunerada pelos cofres da Assembléia demonstra a parcialidade com que, possivelmente, ajam os jornalistas e cronistas locais. Ao ponto de negarem fatos comprovados, como fez o jornalista Herbert Fontenele Filho. Além disso, há outro agravante. De acordo com o presidente Carlos Alberto Ferreira, pelo menos três dirigentes do Sampaio Correa são remunerados pela Assembléia. Certamente, esse fato, se comprovado, além de ilegal, não condiz coma boa política, e, contrariará todos os cidadãos maranhenses que não são torcedores do Sampaio, ou mesmo por simplesmente serem cidadãos e por perceberem ter seus direitos violados. Direito como, por exemplo, de ter disponíveis informações imparciais e isentas. 7. RELAÇÃO COM OS CLUBES Há suspeitas fortes de que a relação da FMF com os principais clubes do Estado seja promíscua. Os principais clubes da capital sempre estiveram presentes na diretoria da Federação. Um dos exemplos é o senhor Antônio Cassas de Lima, que foi conselheiro e vice-presidente do Moto Clube, e, ao mesmo tempo vice-presidente da Federação Maranhense de Futebol. Foram feitas muitas denúncias relativas à existência de muitas ligas amadoras ou de pequenos clubes que foram criados com o apoio do presidente da Federação com o intuito de que ele fosse favorecido durante as eleições. A entidade maranhense não enviou os estatutos nem a forma pela qual se realizaram as últimas eleições, o que fortalece a possibilidade de que sejam verídicas as denúncias. Há diretores da Federação que são presidentes de clubes, tal como o senhor Emanoel dos Santos, que é o contador da entidade e presidente do clube denominado de Boa Vontade, de São Luís. O senhor Emanoel, além disso, é funcionário da Secretaria Estadual de Fazenda do Estado maranhense, o que pode ser discutível do ponto de vista ético ou legal. No caso do Americano, da cidade de Bacabal, que pertence ao empresário Clóvis Dias, esta Comissão verificou a existência de uma relação obscura, por meio da qual o clube maranhense se utiliza da Federação para registrar seus muitos atletas. A irregularidade começa a partir do fato de que os jogadores quase nem vão à Bacabal, ficando, inclusive, o presidente do clube em Fortaleza, no Ceará. A Federação se presta, assim, apenas como local de regularizacão de documentos inidôneos, ou para a adulteração de documentos, etc., como será tratado no Capítulo XIII específico relativo à fábrica de gatos. 8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DE FUTEBOL Há uma estreita ligação da Federação maranhense com empresários ligados ao futebol. Um deles é o médico Antônio Cassas de Lima, que está sendo indiciado por esta Comissão por crimes que vão da falsificação de documentos ao tráfico de menores. Sobre Cassas de Lima ver capítulo XX. Outro contato mantido com a Federação, com relativa freqüência é do empresário Juan Figer Svirsk. Figer, ou alguém de sua empresa, a MJF, fez diversas ligações para a Federação, para contatos telefônicos ou transmissão de faxes, durante o mês de novembro de 1996 (ver Anexo Ligações Telefônicas de Juan Figer). Isso abre a possibilidade de que transações de jogadores maranhenses para o exterior, ou mesmo no País, possam estar tendo a participação de Figer em conjunto com Ferreira. 9. CONCLUSÕES , ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES A Federação maranhense vem sendo muito mal administrada. Urge que seja encaminhado à Secretaria da Receita Federal pedido de fiscalização nas contas da entidade Sugere-se encaminhar o presente Relatório à Receita Federal, ao Ministério Público Federal e ao Ministério Público Estadual. Inciso XIII do art. 10 da Lei n. 8.429, de 18/7/1992. Sugere-se, ainda, comunicar ao Ministério Público e à Receita Federal sobre a possibilidade de desvio de recursos destinados à Federação e para clubes maranhense, recursos provenientes da CBF (Ver Anexo Lista de Repasses CBF Federações Clubes). MATO GROSSO 1. NATUREZA JURÍDICA /ESTATUTÁRIA DA FEDERAÇÃO Segundo Carlos Orione, presidente, que prestou depoimento a esta CPI, em 9/05/2001, ficando registrado em notas, até 1978, chamava-se Federação Matogrossense de Desportos, quando foram desmembradas as demais modalidades desportivas e criadas as suas respectivas federações. A Federação de Mato Grosso não encaminhou documentos referentes ao seu estatuto. Diz seu presidente que participou do Fórum Norte/Nordeste em dezembro/2000, realizado em Manaus, juntamente com uns vinte presidentes de federações, para convencionar que se ia entrar com um mandato de segurança, no Supremo, contra a quebra de sigilo bancário das federações. Recebeu ofício do deputado Aldo Rebelo solicitando documentação fiscal da entidade e que respondeu não poder atender no momento porque a Federação estava em recesso e providenciaria tão logo fosse reaberta; entretanto sofreu intervenção cirúrgica no início de janeiro, tendo ordenado ao seu vice-presidente o envio dos documentos. Este, por sua vez, informou a Carlos Orione que não enviou a documentação porque o Dr. Eduardo Viana, presidente da Federação do Estado do Rio de Janeiro, disse que o mandato de segurança também atingia esse aspecto. O deputado Dr. Olimpio Pires questionou se há remuneração para o presidente da federação ao que Carlos Orione assim se expressou: “Não senhor. Eu sou Procurador da Justiça aposentado e os meu proventos me dão minha sustentação, como a da minha família.. E posso dizer a V.Exa. que, até 31 de dezembro, eu pagava 3.500 reais de imposto de renda. Passei a ser isento porque sendo portador de cardiopatia grave eu fico isento de imposto de renda.” Quanto ao recebimento de R$ 70 mil da Federação, alegou ser um possível ressarcimento de despesas e que encaminharia os comprovantes o mais rápido possível e ainda que houve período em que a Receita Federal bloqueou valores depositados em qualquer banco, em nome da Federação, para quitação de débitos com aquele órgão, tendo que dispor dinheiro seu para pagar despesas e admitindo retirar dinheiro da Federação para repor o que havia colocado. Inquirido sobre remuneração de dirigentes, pelo deputado Jurandil Juarez, admitiu remunerar os dirigentes da Federação através de ajuda de custo, ao que o deputado disse tratar-se de irregularidade uma vez que a entidade é sem fins lucrativos. O depoente diz não receber remuneração mas o deputado questiona o recebimento de dois cheques (valores de 12 e 10 mil reais) emitidos pela Federação ao que responde: ...” Pode ter saído no meu nome, mas foi repartido, foi (ininteligível) para a federação. A distância é muito grande. É como o senhor falar, por exemplo, o senhor conhece o estatuto, não pode remunerar o diretor. Mas, ninguém hoje ali se trabalhar sem remuneração. O senhor está entendendo. A coisa mais difícil hoje é o senhor encontrar quem queira a pessoa gabaritada que queira trabalhar de graça para a federação. Indagado sobre um cheque de 23 mil reais, emitido em 08.02.99, da Federação em seu favor disse não saber a que se refere; admitiu que a Federação possui um estádio, que tem 6 a 7 funcionários, mais prestadores de serviços e que dá ajuda de custo para os diretores que colaboram. 2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA 2.1 CONTINUISMO A Federação Matogrossense vem sendo administrada, há 15 anos, por Carlos Orione que disse ser membro do Ministério Público, aposentado como Procurador de Justiça de Mato Grosso. Em 1976 recebeu convite para ser interventor da Federação Matogrossense de Desportos permanecendo até 1980 com eleição de novo presidente (nome não informado). Segundo Orione, foi convidado a se candidatar, e eleito, em maio de 1986, herdando dívidas executadas que atingem a cifra de 200 mil reais. Foi penhorado o estádio pertencente à Federação juntamente com sua área de 25 mil metros quadrados, no centro de Cuiabá. O INSS executou o presidente da Federação em 1997 com prazo de pagamento em 24 horas; Carlos Orione penhorou, então, uma propriedade rural e embargou a execução, o que vem rolando até os dias de hoje. Quanto a perpetuação do cargo, foi sugerida sua renúncia e convocação de eleição, ao que retruca: ... “Eu vou dizer uma coisa para V. Exa. Lá em Mato Grosso, na situação que está a federação, ninguém queria pegar a federação, a verdade é essa. Eu estou lá segurando para manter o futebol ativo em Mato Grosso com todos os sacrifícios possíveis, inclusive financeiro”. 2.2. P ROCESSO ELEITORAL Indagado, Carlos Orione disse que são convocadas, para eleição, todas as ligas (mais ou menos 70) de clubes profissionais e que as condições de registro de chapa e de voto são informadas por edital; cada clube tem direito a dois votos: um para sua filiação como profissional e outro como amadora; cada liga tem um voto e cada clube amador também. 3. SITUAÇÃO FISCAL/FINANCEIRA A Federação declarou à Receita Federal que não recolheu PIS nem COFINS até hoje. Os valores apontados nas rubricas de 1998 (ano-base 1997) e 1998 (ano-base 1997) estão zerados. Os valores patrimoniais apontam: em 1997 - R$ 80,70 como total do Ativo, contra R$ 0,00 (zero) no total do Passivo e em 1998 – R$ 1.712,36 como totais de Ativo e Passivo. Entretanto informações quanto a Origem de Recursos , no ano de 1998, aponta o valor de R$ 49.999,29, quando, somente a CBF remeteu, naquele ano, a importância de R$ 142 mil. Não há informações naqueles demonstrativos (97 e 98) sobre o estádio pertencente a Federação, pois disse Carlos Orione que o estádio existe desde 1950 e que é de conhecimento público que é da Federação. Questionado pelo valor recebido da CBF - R$ 50 mil, Carlos Orione alegou toda a dificuldade em lutar na justiça pelo seu patrimônio, em lutar para manter em dia seus pagamentos e promover competições esportivas é que somente no ano passado contratou um contador pois não havia contabilidade montada na Federação; era um caixa único. O responsável técnico pelas declarações de renda da entidade é o contador Tadafumi Takakura, CRC número 4384/MT. Sobre o REFIS, disse ter negociado um valor próximo de R$ 400 mil entre INSS e Receita. Indagado sobre a não inclusão do estádio como bem da Federação em suas declarações de renda, bem como nenhum valor de bens (zerado) e que o patrimônio também é zero, disse não ver nenhuma infração, o estádio disse ser público e notório que pertence à Federação e quanto aos bens: “muitos eu comprei em meu nome, a nota saiu em meu nome; inclusive o computador, recentemente, porque tem outras ações menores e volta e meia poderiam ser penhorados”. 4. RELAÇÃO COM A CBF A Federação Matogrossense recebeu mensalmente, durante o ano de 1998, a importância de 6 mil reais tendo sido elevados para 12 mil/mês em 1999 e 2000. Nos meses de: set/98 houve uma remessa a mais de 50 mil reais; dez/98 - 20,4 mil; jan/99 – 14 mil, fev/99 – 56 mil e julho/99 de 20 mil. Negou que essas remessas tivessem sido com intenções de apoio a sua candidatura ou de Ricardo Teixeira, mas admitiu ter pedido 50 mil a Ricardo Teixeira para ajudar alguns candidatos a Deputado Estadual, Federal, Senador e Governador. O gráfico abaixo mostra como foram feitas as doações para a Federação, em dinheiro: NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/2000 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/99 NOVEMB SETEMB MAIO JAN/98 80.000 70.000 60.000 50.000 40.000 30.000 20.000 10.000 0 MARÇO R$ JULHO DOAÇÕES DA CBF PARA A FEDERAÇÃO MATOGROSSENSE DE FUTEBOL 1998 - 2000 MESES As respostas do presidente Carlos Orione foram as seguintes: O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – A Federação recebeu diversas doações em 98. Como foi um ano eleitoral dentro da... Foi um ano eleitoral dos dois lados, com eleição pra Presidente, Governador, Senadores, Deputados e também do Presidente da Federação... Presidente da CBF. O senhor acha que esse dinheiro foi com o intuito eleitoral? O SR. CARLOS ORIONE – Excelência, eu recebo isso acho que como uma ofensa, porque jamais eu iria vender o meu voto. Pela minha posição (ininteligível) no Estado do Mato Grosso. O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – Todas as federações receberam mais. O SR. CARLOS ORIONE – Eu sei, mas não em compra, em troca de voto, absolutamente. O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – Eu não estou dizendo que é compra de voto. O SR. CARLOS ORIONE – Eu tô entendendo V.Exa. como isso, como fins eleitorais. Para quê fins eleitorais? Eu recebi, eu recebi da CBF, do Dr. Ricardo Teixeira, uma importância de 50 mil reais que eu pedi que era pra mim ajudar alguns candidatos a Deputado estadual, federal, a Governador do Estado. O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - Eu ia chegar nessa pergunta. O SR. CARLOS ORIONE - Então, logicamente, esse... O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - Então, foi pra fim eleitorais? O SR. CARLOS ORIONE - Esses 50 mil foi pra eleitorais, não meu nem dele, foi pra fins eleitorais de candidatos ligados ao futebol de Mato Grosso, que me pediu esse... O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - Eu não perguntei, eu não perguntei se era pro senhor ou não. Eu te disse, ainda... Eu ainda disse que era uma eleição pra Deputados, Governador, Governadores... O SR. CARLOS ORIONE - Senadores. O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - ...Senadores e também do Presidente da CBF. O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha) - Aparte? O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - Perfeitamente. O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha) - É o seguinte, Sr.Carlos, não é a sua Federação, todas as Federações, na análise que nós fazemos, no ano de 98, aumentou a contribuição da CBF para essas Federações. No depoimento do Deputado, do Sr. Ricardo Teixeira nós constatamos inclusive o registro da colaboração da CBF com campanhas eleitorais. O SR. CARLOS ORIONE - Certo. O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha) - Pelo estatuto há duas interpretações e que nós vamos discutir no nos-so relatório. Há uma interpretação, de alguns, que a CBF pode fazer isso. E há de outros, advogados e Parlamentares, que não pode. Nós estamos nessa discussão. Ao fazer... O SR. CARLOS ORIONE - Eu só fiz a solicitação porque eu fiquei sabendo realmente que lá na CBF estaria, o Presidente estaria colaborando com algumas candidaturas. O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha) - Pois é. O SR. CARLOS ORIONE - Então, como esse pessoal é ligado ao esporte, muitos foram Presidente de clubes, alguns até já participaram da nossa administração, e eles... Só não vou declinar o nome, porque o senhor tá vendo, eu não vou declinar o nome das pessoas pra quem eu repassei, porque não foi em dinheiro, eu repassei em material esportivo. O material esportivo era recolhido pelos coordenadores das campanhas, mas eles tinham ciência do que estava fazendo. O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha) - Então, como Presidente do órgão, quero dizer pro senhor que, como o senhor foi convidado, o senhor pode deixar de declinar o nome. Se o senhor tivesse sido convocado, que foi até uma discussão que nós tivemos na Comissão de não fazer as convocações dos Srs. Presidentes porque a gente entendia que a colaboração pode vir sem tá convocado. Então, o senhor diz que não gostaria de declinar... O SR. CARLOS ORIONE – Não vou declinar. O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha) - ...e nós da Comissão gostaríamos muito que fosse declinado que houve colaboração da Federação Mato-Grossense de futebol em material para alguns candidatos no ano de 98. O SR. CARLOS ORIONE - Com recursos oriundos que vieram da CBF. O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha) - Com recursos oriundos da CBF. O SR. CARLOS ORIONE - A meu pedido. O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha) – Obrigado pelo aparte. O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - Então, volto a repetir que a minha pergunta tem sentido. Quando eu disse que se esse dinheiro foi repassado com a finalidade eleitoral. O SR. CARLOS ORIONE - Eu vou explicar ao senhor. Eu acho que o Dr. Ricardo Teixeira não precisava fazer, repassar dinheiro pra outro, porque ele era candidato único. Pra que que ele ia ter gastar dinheiro em eleição, em compra de votos? Invés de prestar uma colaboração maior às Federações, se deu (??) várias Federações, qual é o pecado nisso aí? O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - Eu não sei, mas, às vezes, às vezes ele poderia ter um receio que tivesse alguém, algum outro a ser candidato. São suposições. São suposições. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – V.Exa. me concede um aparte? O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - Com muito prazer, Deputado Jurandil Juarez. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Sob o intuito de colaborar, eu queria esclarecer o nobre Depoente que não é uma anormalidade fazer as doações para campanhas eleitorais. Existe uma lei que disciplina isso. O SR. CARLOS ORIONE - Certo. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Isso não impede. Eu recebi, como Deputado Federal, eu recebi doações para a minha campanha. O SR. CARLOS ORIONE - Certo. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Essas doações foram devidamente contabilizadas e apresentadas na prestação de contas, apresentadas ao Tribunal Regional Eleitoral. O SR. CARLOS ORIONE - Certo. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Então, esse é um procedimento normal, isso existe e tem, inclusive, contornos muito bem definidos. Agora, chamou a atenção o fato da CBF e de algumas Federações fazerem essas doações, porque elas estão impedidas por lei e pelo seu estatuto. A pessoa que recebe, se recebeu de boa-fé, não tem problema nenhum. Agora, a entidade precisa saber que, mesmo sendo pessoas que trabalharão, eventualmente eleitos, em favor do esporte, as Federações não podem fazer essas doações. A CPI está apurando isso... O SR. CARLOS ORIONE - Certo. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - ...e vai estabelecer, certamente, um relacionamento, com as suas conclusões, através das suas conclusões, que defina isso com muita clareza. O SR. CARLOS ORIONE - Certo, certo. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Porque as Federações não são empresas, elas não se incluem no rol daquelas entidades que podem fazer doações. E, ainda que a pessoa receba de boafé, e pode fazê-lo, a entidade não pode. Agora, também queria lhe dizer que os prazos para eventuais punições já se exauriram. Mesmo que o senhor decline o nome da pessoa, a não ser que aconteça como se ele for do PT... Porque o PT não desculpou o Presidente do Diretório Regional do Rio de Janeiro que recebeu da Federação, da Confederação Brasileira. Quer dizer, não, não é que não tenha perdoado, é que tomou-lhe satisfações. Mas é um caso interno do partido. Quer dizer, se a Federação Mato-Grossense de Futebol tiver feito doações ela o fez de forma irregular. O SR. CARLOS ORIONE - Certo. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Mas não há como puni-la mais agora. O SR. CARLOS ORIONE - E sem má-fe, né, Doutor? O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – E tampouco... O SR. CARLOS ORIONE - E sem má-fe, né? O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – E tampouco a quem recebeu. Tampouco a quem recebeu. O SR. CARLOS ORIONE - Certo. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Eleito ou não. O SR. CARLOS ORIONE - Certo. O problema é o seguinte, é que esse de fazer doações, esse é um fato que não é só a de Mato Grosso faz, outras Federações também fazem. Isso que eu sei, tenho ciência, não estou acusando nenhuma Federação nem vou declinar o nome de Federação. Eu, antes mesmo de 98, eu já fiz, não nesse valor, nessa quantidade, mas sempre fazia doações de bola pra um candidato, isso e aquilo outro, e amigo nosso, que é da Federação, mexe com esporte. Agora, posso adiantar aos senhores que essa doação ela foi feita sem ver a cor partidária. Eu dei pra candidatos de um partido, de outro partido, sem colarização partidária, são pessoas diretamente ligada ao futebol, no passado ou no presente. O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - Eu acho que, não condeno por dar, mas eu, quando o senhor diz que deu e declina o nome, eu acho que a coisa não tem, não tá tendo transparência. Eu acho que era importante que pudesse... O SR. CARLOS ORIONE - Eu pra declinar o nome deles aqui eu teria que consultá-los. O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - Não, eu acho que quando o senhor deu, não é agora. O SR. CARLOS ORIONE - Certo. O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - O senhor não tem obrigação de falar aqui. Mas eu acho que era uma questão de transparência. Ó, eu estou fazendo isso, isso e isso e isso. O senhor tá dando é um direito... O SR. CARLOS ORIONE - Não vou declinar. O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - Mas, agora, eu acho que deve ser, que não deve ser declinado na, para, para as pessoas saberem no Mato Grosso que a Federação doou, fez isso. Como a CBF doou, ela doou pra diversos candidatos e veio a público. Ela veio a público dizendo que doou. Temos Deputados, colegas nossos que estão lá que receberam. O SR. CARLOS ORIONE - Eu quer deixar bem claro o seguinte, que a importância veio porque eu fiz um pedido pro Dr. Ricardo Teixeira, que eu gostaria de colaborar com determinados candidatos que estavam envolvidos no futebol, alguns deles, inclusive, já exerceu funções dentro da entidade, e se ele podia mandar. Ele me mandou 50 mil reais que eu fui na casa de material esportivo e fiz a distribuição, que os coordenadores iam lá buscar de acordo com o que foi distribuído.” (g.n.) Carlos Orione confessou que a CBF usa da prática de enviar recursos, no caso em exame a pedido, para campanhas eleitorais nos Estados. Ele inclusive menciona, especificamente, Ricardo Teixeira, dando o devido destaque entre CBF e seu presidente. Daí se infere que a decisão do repasse de dinheiro é uma decisão pessoal do presidente, e não de um colegiado ou da diretoria. Esse esclarecimento do Orione contradiz o que Ricardo Teixeira afirmou à CPI, em seu depoimento, em 10/4/2001: “O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES - Sr. Presidente, eu vou voltar aqui a uma... a uma questão que foi levantada pelo Deputado Pedro Celso, que é a questão das doações da CBF para campanhas eleitorais. Foram relacionados um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete, oito, nove, dez, onze, doze, treze... treze candidatos que receberam doações que perfizeram 562 mil e 500 reais. Além de isso ter sido considerado pelo Deputado Jurandil Juarez como ilegal, e além de também não ser uma iniciativa recomendada, dado aos enormes prejuízos que a CBF vinha tendo naquele período, ficou sem resposta a questão de quais critérios a CBF utilizou para fazer essas doações. O senhor poderia responder, por favor? O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Essa grande... Excelência, a grande maioria deles foi por um critério de ter, de alguma forma, vinculação com o futebol. O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES - Dessa lista de treze, eu consultei alguns... algumas pessoas que conhecem mais do que eu o futebol, e nós encontramos, ligados ao futebol, o Deputado Eurico Miranda, o Deputado Darcísio Perondi — não sei se é ele que é ligado ao futebol ou a ligação se dá através do irmão — e o Deputado Paulo de Almeida, que não sabemos... não posso dizer se ele é ou não. Ele é, também. Os demais são todos eles... nenhum deles tem ligação com o futebol direta, não tem vinculação com futebol. Então, esse critério que o senhor diz ter seguido não... não bate com a realidade. Foi o senhor que tomou essa decisão de... foi o senhor que escolheu as pessoas? O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Não, eu diria que foi uma decisão da Diretoria da CBF, porque alguns outros Diretores pediram para alguns partidos políticos, e nós fornecemos isso, e, no nosso modo de entender, fui surpreendido pela configuração de que era ilegal, até porque o senhor há de convir comigo que eu não conheço a lei eleitoral; quer dizer, eu nunca soube que isso era ilegal — pagar depois, pagar antes. Quer dizer, eu tenho que mandar fazer um estudo. Realmente, se isso, dentro do contexto geral... Eu não sabia dessa eventual ilegalidade. O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES - Sim, mas o senhor que autorizou? Essa é que é a minha pergunta. O senhor autorizou? O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Autorizei, sim, senhor. O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES - Os 562 mil reais foi o senhor que autorizou? O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - A ajuda eu autorizei, sim, senhor.” (g.n.) Ricardo Teixeira asseverou que as doações são fruto de decisão da diretoria da CBF. Ao que parece, pelas palavras do presidente Carlos Orione pode-se depreender que quem decide por isso é o presidente da CBF. 5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL Admitiu auxílios a políticos “muitos foram presidentes de clubes, alguns até já participaram da nossa administração”, sem contudo declinar nomes pois alegou que não houve ajuda financeira e sim distribuição de material esportivo. Ocorre que a Lei Eleitoral de n. 9.504/97 impede, em seu art. 24, o fornecimento de doação estimável em dinheiro. A doação realizada pela Federação do Mato Grosso pode ter contrariado a legislação em vigor na época. 6. EMISSÃO DE CHEQUES BANCO DO BRASIL S.A. (AGÊNCIA 3325-1) – CONTA Nº 46.095-8 DATA VALOR(R$) DOCUM. BENEFICIÁRIO 08.02.1999 23.000,00 000141 Carlos Orione (ct. 7342-3 do Carlos Orione) 05.03.1999 22.000,00 000159 Carlos Orione (ct. 7342-3) 14.09.1999 10.000,00 000337 Federação Matogrossense 22.12.1999 15.000,00 000367 Federação Matogrossense 14.03.2000 12.000,00 000445 Carlos Orione 21.03.2000 10.000,00 000454 Carlos Orione (ct. 7342-3) OBS. NÃO FORAM INFORMADOS OS DOCUMENTOS DOS SEGUINTES VALORES LANÇADOS A DÉBITO: 14.09.98 24.000,00 000101 18.02.99 11.600,00 212801 08.06.00 10.000,00 000555 (reap.) 14.09.00 10.930,00 000629 7. CONCLUSÕES Se confirmada em seu estatuto, que não deve ser diferente das demais federações, a característica de “entidade sem fins lucrativos” fica caracterizada a irregularidade de remuneração de dirigentes. Foi admitida a remessa de numerário da CBF com intuito de ajuda a candidatos a eleições federais e municipais. Houve promessa de envio de documentação para provar a origem dos valores pagos pela Federação Matogrossense ao seu dirigente, o que não aconteceu até o fechamento deste relatório. 8. RECOMENDAÇÕES a) comunicar à Receita Federal as irregularidades encontradas em suas declarações de renda; b) comunicar ao Ministério Público Eleitoral do Tribunal Regional do Mato Grosso sobre as possíveis irregularidades envolvendo as doações para campanhas eleitorais; c) comunicar ao Ministério Público Eleitoral sobre os indícios de ilicitudes envolvendo a CBF e as Federações; d) comunicar ao Conselho Federal de Contabilidade sobre as irregularidades contábeis e fiscais, sob s responsabilidade do contador da Federação; e) encaminhar cópia do Relatório e seus anexos para o Ministério Público apurar irregularidades ou ilegalidades cometidas. MATO GROSSO DO SUL 1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DAS FEDERAÇÕES : Conforme estatuto da entidade, a Federação Sul-Matogrossense de Futebol é uma “Sociedade Civil, com finalidade esportiva, com personalidade jurídica e patrimônio próprio” (art. 1º), tendo como objetivos: “dirigir o Futebol (sic) todas as suas manifestações (...), promovendo a sua difusão e o seu aperfeiçoamento”; “promover campeonatos, torneios, palestras e simpósios de futebol”; e “facilitar o progresso técnico e material de seus afiliados” (art. 2º). Trata-se de típica entidade de direito privado sem fins lucrativos. O estatuto define como “poderes” da entidade: a Assembléia Geral, o Tribunal de Justiça Desportiva, o Conselho Fiscal, a Presidência e a Diretoria (art. 11). 2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA: Francisco Cezário de Oliveira preside a Federação Sul-matogrossense de Futebol desde 1998, já tendo ocupado o cargo entre 1983 e 1989. A Federação não remunera seus dirigentes e não tem funcionários. Segundo afirmou seu presidente em depoimento a esta CPI, a entidade depende do trabalho voluntário dos seus membros. 3. S ITUAÇÃO FISCAL E FINANCEIRA 3.1 I MPOSTO DE RENDA E CONTABILIDADE DA FEDERAÇÃO A Federação Sul-matogrossense não entregou à receita federal as declarações de Imposto de Renda dos exercícios de 1996 e de 1997. A Federação é titular de quatro contas no banco HSBC (duas delas encerradas). A entidade não tem sede própria e funciona em prédio alugado. Segundo depôs Francisco Cezário, a Federação era proprietária de uma sala, que foi a leilão para pagar dívidas junto à receita federal e ao INSS. Há sérios indícios de que a Federação teria encaminhado informações equivocadas à receita federal. Conforme a declaração de Imposto de Renda de 1998, a Federação recebeu, de doações e subvenções, R$ 99.766,28; por outro lado, pela quebra de sigilo bancário da CBF, verificou-se que esta repassou à Federação, no período correspondente, 122 mil reais. Na declaração apresentada em 2000, vê-se que a entidade declara ter recebido da CBF 230 mil reais, quando a CBF teria repassado 242 mil reais. GASTOS COM ATIVIDADES AMADORAS Os eventos relacionados a amadores movimentam valores que, conforme a prestação de contas, aumentam significativamente ano após ano. E curiosamente, a maioria das verbas que se destinam aos amadores ocupam a rubrica “outras despesas”, de natureza indefinida. Em seu depoimento, Francisco Cezário não conseguiu justificar essa movimentação em prol do amadorismo, tal como não apresentou quaisquer justificativas em relação à concentração na misteriosa rubrica “outras despesas”. Segue, abaixo, quadro com valores destinados ao esporte amador, considerando-se, em cada ano, o quadrimestre que a Federação beneficiou o setor. Curiosa a movimentação registrada no ano 2000, onde os valores destinados ao amadorismo superam o próprio valor que a Federação declarou ter recebido da CBF. Ano 1998 1999 2000 Valores que a Federação teria recebido da CBF (em reais) 56,5 mil 68,75 mil 134 mil Valores destinados ao esporte amador (em reais) 19 mil 51 mil 155 mil Peso do amadorismo em relação ao repasse (%) 33,6 74,0 115,7 3.2. I NSS 250.000,00. A dívida da Federação junto ao INSS seria de aproximadamente R$ Segundo análise do Deputado Jurandil Juarez, a qual incorporamos ao nosso Relatório, para que uma entidade como a Federação Sul-matogrossense atingisse uma dívida de R$ 250.000,00, seria necessário que movimentasse uma receita em torno de R$ 1.250.000,00, o que é uma incongruência face à situação falimentar da entidade, relatada por seu presidente. Francisco Cezário alega tratar-se de dívida que foge à sua responsabilidade, uma vez que teria sido constituída em gestões anteriores a sua. REFIS. A Federação negociou a dívida junto ao INSS por meio do programa 3.3. F INANCIAMENTO A CANDIDATOS E OUTROS REPASSES Foram transferidos R$ 15.000,00, por meio do cheque nº 306.550, emitido em 03/08/2000, para a conta corrente nº 56782 (agência 3936), no Banco do Brasil, em Campo Grande (MS), pertencente à “Coligação Renov. C. Exp. Francisco C. Oliveira”. “Francisco C. Oliveira” seria Francisco Cezário de Oliveira, o presidente da Federação e candidato vencedor ao pleito municipal de 2000, em Rio Negro, cidade do interior de Mato Grosso do Sul, a 150 quilômetros de Campo Grande. A Federação Sul-matogrossense financiou R$ 15.000,00 à campanha do hoje prefeito municipal de Rio Negro (Francisco Cezário já ocupou o cargo de prefeito do município entre 1976 e 1983). O quadro abaixo, colhido na página eletrônica do Tribunal Superior Eleitoral, fornece os dados sobre as eleições em Rio Negro: Candidato Número de Votos % (em relação ao total de votos válidos) Francisco Cezário de Oliveira (PSDB) Joaci Nonato Rezende (PMDB) Marcelo Renato Coelho de Miranda (PT) Total de votos validos Nulos Brancos Total de votos apurados 1656 1474 310 3440 159 29 3628 48.14 % 42.85 % 9.01 % Entre 30/08/2000 e 20/09/2000, foram emitidos quatro cheques nominais em favor de Umberto A. Pereira, totalizando R$ 46.000,00. Segundo depoimento do Francisco Cezário, Umberto Pereira é seu sobrinho e funcionou como tesoureiro do município de Rio Negro de 1977 a 1983, sendo atualmente Vicepresidente de Finanças e Patrimônio da Federação Sul-matogrossense de Futebol. Umberto Alves Pereira (cuja esposa é descendente de japoneses, conforme informação do Francisco Cezário) viajou ao Japão, junto com Clarisse Pereira, Daniele Pereira e Marcelo Pereira, com despesas pagas pela CBF à empresa SBTR (Stella Barros), num custo de R$ 11.790,81. Trata-se de informação proveniente da contabilidade da CBF (ver Anexo Cópias de Notas da SBTR), quando da visita da CPI à sede daquela entidade. Francisco Cezário alega desconhecer se foi a CBF que pagou a viagem. Tal como Umberto Pereira, Eurico Ferreira Rezende, “companheiro político” do Francisco Cezário e “ tesoureiro da campanha da nossa coligação”, segundo depoimento do presidente da Federação, foi beneficiado pelas verbas da Federação. Um dos cheques que envolvem Umberto Pereira teria sido depositado na conta do Eurico Rezende. O Francisco Cezário não soube explicar, em seu depoimento, as razões dessa movimentação. 3.4. CONSELHO FISCAL A contabilidade da Federação é fiscalizada e controlada por um conselho fiscal que não tem autonomia política em relação à direção da entidade. A eleição dos membros do conselho fiscal é realizada de forma conjunta com a da diretoria, em uma chapa única. Trata-se de dispositivo estatutário (art. 37). 4. RELAÇÃO COM A CBF A Federação Sul-matogrossense recebeu da CBF, entre 1998 e 2000, os seguintes valores: em 1998, R$ 6.000,00 por mês, com as exceções de setembro (R$ 34.500,00), outubro (R$ 16.000,00), novembro e dezembro (R$ 12.000,00 cada mês); em 1999, o repasse mensal foi de R$ 12.000,00, com as exceções de janeiro (R$ 10.000,00), março (R$ 25.660,00), agosto (R$ 17.750,00), setembro e novembro (R$ 24.000,00 cada mês) e outubro (R$ 27.000,00); não houve repasse em dezembro. Em 2000, manteve-se o valor de R$ 12.000,00, sendo que em agosto o valor foi de R$ 64.000,00, em setembro de R$ 38.000,00 e em outubro de R$ 32.000,00. Segue, abaixo, gráfico com as doações da CBF: DOAÇÕES DA CBF PARA A FEDERAÇÃO SUL-MATOGROSSENSE DE FUTEBOL 1998 - 2000 R$ 70.000 60.000 50.000 40.000 30.000 20.000 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/2000 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/99 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO JAN/98 0 MARÇO 10.000 MESES Segundo depoimento do Francisco Cezário, as verbas provenientes da CBF são destinadas a atividades amadoras. “Eu tenho o orgulho de dizer que eu fui um dos responsáveis de lançar o dr. Ricardo Teixeira como candidato a Presidente da CBF (...) Confesso a V.Exa. que eu nunca recebi nenhum tipo de dinheiro pra que desse ao Dr. Ricardo Teixeira o meu apoio político. Sempre o fiz por entender que ele como candidato, até mesmo por ser candidato único, nunca nos permitiu que tivesse qualquer tipo de questionamento quanto a sua candidatura. Eu quero dizer a V.Exa. que, em 98, eu... eu fui eleito, tomei posse em 98. Eu votei na eleição do dr. Ricardo Teixeira e não recebi nada (...)” (g.n.) Questionado sobre a razão dos repasses terem um valor maior em períodos eleitorais, Francisco Cezário alegou que as despesas com o futebol amador são mais elevadas no segundo semestre do ano. 5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL Conforme registrado acima, a CBF aumentou sua ajuda financeira à Federação exatamente em época eleitoral, sugerindo um financiamento à campanhas eleitorais. Também ficou comprovado, conforme quebra de sigilo bancário da entidade, que a Federação Sul-matogrossense de Futebol pagou R$ 15.000,00 à coligação político-partidária em que era candidato Francisco Cezário. O presidente da Federação, em seu depoimento, nega a ocorrência da mencionada movimentação (ver item 3.3. acima). 6. C ONTRATOS COM A TV A Federação Sul-matogrossense de Futebol tem contrato de transmissão de jogos com a emissora Rede Mato-grossense de Televisão. A TV tem o direito de transmitir os jogos e em troca custeia a despesa dos clubes e dos jogos. Assim informou à CPI Francisco Cezário. 7. RELAÇÃO COM OS CLUBES Não foram constatadas denúncias acerca da relação entre a Federação Sul-matogrossense de Futebol e os clubes. 8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DO FUTEBOL Do depoimento do Francisco Cezário e dos documentos analisados, não foram observadas informações ou denúncias relevantes sobre empresários de futebol. 9. C ONCLUSÕES, ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES Da análise de todos os documentos e do depoimento do Francisco Cezário, conclui-se que a Federação Sul-matogrossense de Futebol é administrada de forma temerária, além do descontrole financeiro e fiscal. Há evidências de sonegação fiscal. Há indícios de irregularidades nas transações envolvendo os senhores Francisco Cezário de Oliveira, Umberto Teixeira e Eurico Ferreira Rezende, tanto no aspecto da legislação tributária, quanto ao não cumprimento do Estatuto da Federação. Recomenda-se alteração estatutária para permitir uma maior autonomia do conselho fiscal e obrigar que os cheques da entidade sejam subscritos por pelo menos dois dos seus dirigentes, sendo um deles o presidente, além de que seja estabelecida maior transparência nas contas da Federação e nos repasses de verbas que envolvam a entidade e os clubes. Sugere-se encaminhar o presente Relatório à Receita Federal, ao Ministério Público Federal, ao Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul e ao Ministério Público Eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso do Sul, com base na Lei nº 9.504/97. MINAS GERAIS 1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DA FEDERAÇÃO A Federação Mineira de Futebol é uma sociedade civil de direito privado, sem fins lucrativos, constituída pela livre união de Ligas Municipais e Associações Desportivas. Dirige o futebol não profissional, masculino e feminino, e o futebol profissional no estado de Minas Gerais. A Federação Mineira era isenta de impostos pelo menos até o ano calendário de 1999, pois na DIPJ 2000 consta: “Forma de tributação do lucro: Imune do IRPJ”. De acordo com a Lei 9.532/97, que condiciona o reconhecimento como atividade recreativa, isenta, com a não remuneração dos dirigentes, a Federação não poderia remunerar os dirigentes. Com relação à remuneração dos dirigentes da federação, O Sr. Elmer Guilherme Ferreira, presidente, quando interrogado por deputados membros desta CPI, em 08/05/2001, assim se expressou, conforme notas taquigráficas: “– Eu sou funcionário público, lotado na Secretaria de Esportes, Lazer e Turismo de Minas Gerais, à disposição da Federação Mineira de Futebol, e recebo da Federação uma verba de representação que o estatuto permite que seja até quarenta salários mínimos, mas a minha verba de representação hoje é em torno de 4 mil reais.” Naquela oportunidades ele ainda acrescentou que recebe essa remuneração desde que assumiu o cargo. O presidente faltou com a verdade com relação ao que determina o estatuto ou, no mínimo, desconhece aspectos importantes constantes nesse instrumento da entidade que dirige, pelo menos quando lhe convém desconhecê-los, pois o referido estatuto, em seu artigo 9º, determina que “É gratuito o exercício de funções, por parte dos membros integrantes de qualquer dos poderes da Federação.” Quando interrogado pela CPI, o presidente declarou-se desconhecedor do impedimento. Portanto, a remuneração por ele e por outros dirigentes recebida da federação estaria impedida por lei, além da proibição estatutária. 2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA 2.1 CONTINUISMO O atual presidente, Sr. Elmer Guilherme Ferreira, já se encontra há 14 anos como presidente da Federação. O seu pai, Sr. José Guilherme Ferreira, foi presidente da Federação Mineira por 16 anos, período iniciado em 1966. Mesmo durante alguns poucos anos em que o pai, tendo deixado a presidência, o filho ainda não assumira o cargo, este já ocupava o cargo de diretor técnico e depois, de vice-presidente. Quando o Sr. Elmer vier a concluir o mandato atual em 2004, estará sendo completado um período total de praticamente 38 anos de uma mesma família à frente da Federação Mineira de Futebol. Existem vários questionamentos a respeito dos critérios que o presidente Elmer Guilherme adota para permanecer no cargo, sendo reeleito seguidamente. O assunto será tratado abaixo no item correspondente ao processo eleitoral na federação. 2.2 NEPOTISMO São severas as críticas quanto a esse aspecto observadas na imprensa há bastante tempo. O jornal Estado de Minas de 09/05/2001, caderno Esportes, trouxe que: “Elmer emprega 27 familiares, entre irmãos, primos, cunhados, e até o marido de uma sobrinha, como funcionários diretos da FMF ou integrantes do quadro móvel”. No dia 08/05/2001, quando inquirido por esta CPI sobre o assunto, o presidente apenas ressaltou não haver empecilho legal que lhe impedisse de ter parentes trabalhando na entidade que dirige, acrescentando: “Procurei me cercar de elementos de minha confiança. São funcionários legalmente contratados...”. Admitiu explicitamente a existência de dois filhos lá regularmente empregados, os quais seriam donos de uma empresa gráfica que confecciona ingressos para a própria federação. Durante o depoimento à CPI, o Sr. Elmer esteve sendo auxiliado por um irmão, Geraldo Márcio, na manipulação de documentos pertencentes à Federação. No dia 15/05/2001, o Estado de Minas/Esportes, trouxe uma lista de doze nomes de pessoas da família Guilherme que teriam ou estariam sendo demitidos da Federação, incluindo o pai, ex-presidente, vários irmãos, sobrinhos e tios do atual presidente. 2.3 PROCESSO ELEITORAL Comentários da imprensa e de concorrentes ao cargo de presidente da federação se referem a que o estatuto atribui excessivos poderes ao cargo, concedendolhe larga margem de manobras e operações junto às entidades votantes e seus representantes, de forma que essas ações redundam em favorecimentos ao presidente quando das eleições, permitindo-lhe a “eternização” no cargo. Dentro desse espírito, a seção II do estatuto, “DAS ATRIBUIÇÕES DO PRESIDENTE...” , contém 39 incisos, dentre os quais se destacam alguns que dizem competir ao presidente: Inciso III: “nomear, admitir, designar, comissionar, contratar e rescindir contratos, exonerar, dispensar, demitir, punir, destituir, licenciar, conceder férias, elogiar, premiar, abrir inquéritos, e instaurar processos;”; Inciso IV: “nomear e dispensar os membros da diretoria que independem de eleição, designar assessores e os componentes de comissões que instituir...” ; Inciso XI: “nomear e dispensar os membros da Comissão de Arbitragem, designar seu presidente e vice-presidente...”; Inciso XII: “nomear e dar posse aos membros do Poder Judiciário”; Inciso XXXVI: “conceder moratória ou anistia” (aos seus filiados – votantes nas eleições para a diretoria); Um outro fator que tem levantado suspeitas é o relacionamento do presidente da federação com a própria imprensa desportiva do estado de Minas. Há quem atribua existirem favorecimentos a alguns setores da imprensa que, em contrapartida, auxiliam o presidente quanto à formação de uma boa imagem nas eleições. Perguntado se a Federação tem algum contrato ou proporciona alguma ajuda de custo a radialistas, à imprensa escrita, enfim, à mídia no geral, o Sr. Elmer responde que não, mas acrescenta: “O que pode ocorrer lá é o seguinte: nós temos, por exemplo, algumas salas na Federação que são alugadas a alguns elementos da imprensa. Então, nós fazemos com eles uma permuta. Eles não pagam o aluguel dessa sala e, em contraproposta, eles prestam serviço na área de relações pública à Federação. Mas pagamento de... de... salário, não”. Em uma pergunta sobre a Rádio Itatiaia, se a Federação já fez alguma espécie de pagamento a ela, a resposta: “Fizemo. Fizemo um pagamento da mídia que foi feita pra Copa Centenário. Na época da Copa Centenário, a Rádio Itatiaia fez praticamente toda a mídia da Copa Centenário, nós inclusive ficamos devendo por um grande período, e depois fizemos o pagamento daquilo que era devido pela mídia que ela fez da Copa Centenário”. 20 A Copa Centenário foi realizada em Belo Horizonte, em comemoração aos cem anos de fundação da capital mineira, datada de 12/12/1897. 20 O presidente acrescentou quanto a pagamento efetuado à empresa Osvaldo Faria Publicidade e Promoções Ltda: que “foi também quem fez a promoção... outra empresa que fez a promoção da Copa Centenário.” e admite que a federação efetua repasse para a Associação Mineira de Cronistas Desportivos. Posteriormente, a federação enviou a esta CPI nova documentação (Pasta FEDERAÇÕES SUDESTE, Vol. 05) onde se verificaram diversos pagamentos efetuados a pessoas ligadas a “comunicação”, “marketing” ou “imprensa”, conforme relação a seguir: A título COMUNICAÇÃO: de prestação de serviços de SUPERVISOR NOME VALOR(R$) DATA Flávio Geraldo Anselmo Junior 1.167,65 06/10/2000 DE A título de prestação de serviços de ASSESSOR DE MARKETING: NOME VALOR(R$) DATA Flávio Geraldo Anselmo Junior 1.415,70 06/10/2000 A título de prestação de serviços de IMPRENSA E RELAÇÕES PÚBLICAS: NOME VALOR(R$) DATA Nina Abreu Carvalho 580,80 06/09/2000 Cláudio Luiz Maia Nunes 275,00 06/09/2000 Afonso Alberto Teixeira dos Santos 574,75 06/09/2000 Marco Antônio Salomão Bruck 193,60 06/09/2000 2.4 L ICITAÇÃO E RELAÇÃO COM EMPRESAS: 2.4.1 GRÁFICA O caso mais visível e comentado pela imprensa é o da gráfica de propriedade dos filhos do presidente em sociedade com o contador da Federação, Sr. Wagner Soares. Essa empresa é quem confecciona os ingressos para jogos promovidos pela Federação. Quando inquirido por esta CPI, o presidente declarou que não fazia licitação para a confecção dos ingressos porque: “...a gráfica deles (dos filhos com o contador) ofereceu um contrato melhor do que o anterior.”. 2.4.2 JB DUARTE E MINERAÇÃO LISBOA A Federação Mineira emitiu muitos cheques para duas empresas. Uma delas é a Mineração Lisboa, empresa muitíssimo modesta, que trabalha com rejeito de minério, e para uma grande empresa industrial de óleo e comestíveis do gênero, chamada JB Duarte S/A. Essa recebeu um cheque da Federação no valor de R$ 375.000,00 em abril/1997. Já a empresa mineradora recebeu da federação, em cheques nominais, o total de R$ 1,606 milhão, entre abril e julho de 1997, mais R$ 50.671,00 em 1998 e R$ 20.969,00 em 1999. Quase todos esses cheques à Mineração Lisboa foram endossados e depositados em uma conta corrente no banco BCN, em São Paulo, pertencente à empresa JB DUARTE. No depoimento de 08/05/2001, o presidente não conseguiu explicar os motivos dos cheques emitidos em favor das duas empresas, atribuindo ter sido para pagamento de um adiantamento feito pelas mesmas com a finalidade de pagamento de cotas do clube Milan, da Itália, iniciando por dizer: “Deve ser para pagamento ao Milan, devem ser todos para pagamento ao Milan, que foi feito pela JB Duarte.” Perguntado sobre quem seria e o que faz a Mineração Lisboa, o presidente revelou não conhecer, nem saber o que faz essa empresa que recebera 1,6 milhão de reais da Federação que dirige, empregando as seguintes palavras: “Emprestou dinheiro. Eu não sei o que que é a Mineração Lisboa. O coordenador da Copa Minas Gerais, que é o Sr. Marcos Perrela, é que fez esses contatos e eles fizeram o adiantamento do dinheiro.” Em virtude da existência de vários cheques nominativos à empresa Mineração Lisboa Ltda, os seus proprietários, Srs. Jair Afonso Lisboa e Marcelo Eustáquio Lisboa, foram entrevistados pelos deputados Jurandil Juarez e Leo Alcântara, em Belo Horizonte, homens bastante humildes, no dia 17/05/2001, na presença do seu advogado. Eles negaram conhecimento de qualquer transação envolvendo a sua empresa com a Federação Mineira de Futebol ou com qualquer pessoa ligada à federação, afirmando conhecer o nome do Presidente Elmer Guilherme apenas por ouvir no rádio nos eventos futebolísticos. Conforme documentação obtida por esta CPI, o Patrimônio Líquido da Mineração Lisboa era de R$ 137.856,00 no balanço patrimonial levantado em 31/12/1999; a receita operacional líquida em 1999 foi de R$ 119.868,00 e o lucro no período, de R$ 2.190,00. Todas as cópias de cheques emitidos para essas duas empresas encontram-se no Anexo 11, Sigilo Bancário, Pastas de 01 a 05, sendo que mais especificamente na Pasta 05. 2.4.3 T RAFFIC ASS. COMUNICAÇÃO LTDA. A Traffic efetuou os seguintes pagamentos à Federação Mineira: 1996 – R$ 373.000,00, 1997 – R$ 300.000,00, 1998 – R$ 600.000,00, 1999 – R$ 800.000,00, totalizando R$ 2,073 milhões (Anexo 02, Pastas 12, 21, 29 e 35). Quando foi questionado ao presidente qual a relação da Federação Mineira de Futebol com a Traffic, a resposta foi: “Nenhuma.”. Mais especificamente, foi perguntado quanto ao recebimento de R$ 800.000,00 em março de 1999, o presidente afirmou: “De 1999? Não, a Federação não recebeu nada da Traffic, eu posso garantir para o senhor.”. Esta CPI, no entanto, possui cópia de dois cheques de R$ 400.000,00, nominais à Federação Mineira, que entraram em conta corrente dessa federação na Caixa Econômica Federal em datas de 12 e 31/03/1999 (Anexo 02, Pastas 12, 21, 29 e 35). Esta CPI não recebeu tempestivamente os documentos solicitados referentes à contabilidade da Federação. Por isso, não pôde verificar qual o tratamento dado às importâncias recebidas da Traffic. De qualquer maneira, por essa via seria possível tão somente a constatação de uma dentre duas hipóteses. A primeira, que o dinheiro recebido da Traffic, mesmo que destinado a pagamento à Federação Mineira, não teria chegado lá. Isso porque, conforme declarações do presidente, citadas acima, a federação não teria qualquer relação com a Traffic e nunca recebera pagamentos dessa empresa. Por outro lado, se existem relações e a federação recebeu pagamentos da Traffic, configurar-se-ia um total desconhecimento e ignorância, por parte do seu principal dirigente, da atuação, das ocorrências e dos pagamentos importantes, efetuados ou recebidos pela federação. Esta hipótese, apesar dos desmandos verificados, é menos provável já que o desconhecimento de fatos por parte do presidente foi percebido ser mais freqüente quando lhes são solicitadas explicações sobre saídas de recursos de maneira injustificada ou inexplicável. 2.4.4 O UTRAS OCORRÊNCIAS : 2.4.4.1 P AGAMENTO DE R$ 455.000,00 À 28ª VARA CÍVEL DA JUSTIÇA DE MG Essa importância foi paga mediante três cheques nominais durante o ano de 1999 (Anexo 11, pasta 05). O presidente, quando inquirido por esta CPI, não forneceu qualquer explicação para os pagamentos efetuados à 28ª Vara Cível, mesmo tendo-lhe sido chamada a atenção para o fato de ser um valor altamente significativo frente a toda arrecadação da federação no mesmo ano, que fora de R$ 712.000,00. Prometeu fornecer as explicações posteriormente, mas nada apresentou até o momento da elaboração deste relatório. 2.4.4.2 PAGAMENTO PRAXEDES NETO DE QUASE R$ 160.000,00 AO FUNCIONÁRIO GUSTAVO Funcionário do Setor de Arrecadação, é sobrinho do presidente, segundo informações do Jornal O Estado de Minas, caderno Esportes, de 15/05/2001. Recebeu dois cheques de elevados valores, datados de 18 e 19/09/2000, de R$ 45.000,00 e R$ 114.562,00, respectivamente (Anexo 11, Pasta 05). Esses cheques foram nominativos, mas não trazem no verso qualquer explicação quanto ao motivo do pagamento. Quando o presidente foi inquirido por esta CPI em 08/05/2001, chegou a ser-lhe formulado um pedido de esclarecimento a respeito desses pagamentos ao Sr. Gustavo. Ao fazer o questionamento, no entanto, o Deputado se confundiu, trocando o nome Gustavo por Guilherme, formulando dessa forma o pedido de explicação. O inquirido declarou taxativamente não conhecer tal pessoa e nenhuma explicação, portanto, foi obtida. 2.4.4.3 PAGAMENTO BRAGA DE R$ 60.000,00 A CELSO EUSTÁQUIO FERNANDES Efetuado em seis cheques de R$ 10.000,00 de julho a outubro de 2000 (Anexo 11, Pastas 04 e 05), o pagamento a Celso Eustáquio Braga teve como explicação ser o elemento intermediário na compra pela Federação de uma fazenda em Mato Grosso. Essa aquisição teria sido feita com a finalidade de se dá-la como parte de pagamento de dívidas com impostos. Segundo palavras do presidente em seu depoimento à CPI quanto à fazenda: “Vamos vender. Era para entregar para o INSS, como nós fizemos o REFIS, nós compramos a fazenda para entregar para o INSS, como foi feito o REFIS...” . Não soube informar o valor pelo qual foi adquirida, o tamanho, nem a razão porque resolvera comprar a fazenda; assegurou, no entanto, que a propriedade estaria em nome da Federação. Isso, porém, não justificaria, pois a compra de uma fazenda foge aos objetivos da entidade, contrariando o seu estatuto. Posteriormente, foi enviada a esta CPI cópia da escritura pública e do registro em cartório de registro de imóveis datado de novembro/1998. O valor registrado em escritura foi de R$ 400.000,00, cujos pagamentos teriam sido da seguinte forma: R$ 20.000,00 no ato (não diz quando), R$ 40.000,00 em setembro/1996, R$ 40.000,00 em setembro/1997 e R$ 300.000,00 em setembro/1998 (Pasta FEDERAÇÕES SUDESTE, Vol. 05). Pela contabilidade, vê-se um esquema de pagamento diferente do descrito aqui (mesma pasta anteriormente citada), tendo sido feito em sua totalidade em novembro/1998, conforme registro contábil do dia 30/11/1998: uma parte de R$ 150.000,00, documento não identificado no histórico, mais um cheque de R$ 250.000,00, de número 000569, da Caixa Econômica Federal. Estranhamente, porém, esse cheque, conforme cópia em poder da CPI, foi emitido nominalmente a Patrício da Rocha Rezende Junior, que seria, conforme informado pelo presidente, o auditor que presta serviços para a federação, o qual será citado em seguida. 2.4.4.4 PAGAMENTO JÚNIOR DE R$ 265.000,00 A PATRÍCIO DA ROCHA REZENDE Pagamentos efetuados apenas entre novembro e dezembro de 1998 (Anexo 11, Pasta 05). Trata-se, segundo informações do presidente, de um profissional, pertencente aos quadros da empresa CONFISCO, o qual presta serviços de auditoria para a federação. Também foram efetuados pagamentos à Associação Jurídica Patrício da Rocha Rezende S/C, no valor de R$ 38.770,00, no mesmo período. É altamente questionável que a federação pague altos valores a um auditor e/ou uma assessoria jurídica enquanto se verifiquem uma série de irregularidades na administração, na contabilidade e nos procedimentos fiscais da entidade. Seria um caso merecedor das atenções dos respectivos Conselhos de classe, se é que se trata de profissionais habilitados junto a esses. 2.4.4.5 PAGAMENTO DE R$ 294.000,00 A HUMBERTO BOTINO Efetuado em novembro de 1998, esse foi mais um dos pagamentos de elevada monta efetuados pela Federação Mineira (Anexo 11, Pasta 05). A razão dessa operação teria sido o pagamento de um empréstimo por essa pessoa concedido à Federação Mineira, conforme explicações do Sr. presidente da Federação. O cheque, no valor de R$ 293.682,50, da Caixa Econômica Federal, foi emitido nominalmente ao Sr. Humberto Botino; no livro Razão está historiado como “pg. NF 308 de Casa Engenharia LTDA” e, no verso, consta carimbo de Mendonça e Cia LTDA. Conforme o “Razão”, no mesmo mês, foi efetuado um outro pagamento a essa Casa Engenharia LTDA, no valor de R$ 36.117,50, tendo como histórico a mesma NF 308, relacionando-a, porém, a despesas com reforma do prédio sede da federação. O Razão encontra-se nas Pastas FEDERAÇÕES SUDESTE, Vols. 5, 6 e 7). Ainda segundo o presidente, o pagamento ao Sr. Botino teria sido efetuado quando do recebimento de um outro empréstimo, dessa feita de R$ 1.500.000,00 concedido pela Federação Paulista de Futebol, cuja dívida foi, posteriormente, absorvida pela CBF, segundo a mesma fonte, sem maiores explicações. O empréstimo com a Federação Paulista será examinado no item “Relação com a CBF e com a Federação Paulista”. 3. SITUAÇÃO FISCAL , F INANCEIRA E CONTÁBIL : A Federação mineira não atendeu tempestivamente ao pedido desta CPI de envio da documentação referente a sua contabilidade. Ao final dos trabalhos, 15/05/2001, foi recebida correspondência da federação com os seguintes termos: “Estamos enviando cópias das demonsatrações financeiras completas (Balanço Patrimonial, Demonstração do Resultado, Demonstração de Origens e Aplicações dos Recursos e das Mutações Patrimoniais) e do Livro Razão Analítico, todos relativos ao exercícios de 1995 a 2000, bem como os demais documentos solicitados.”. Na verdade, contrariamente ao texto da carta, foram recebidos apenas o “Razão”, que oferece poucas condições para identificação e esclarecimento dos lançamentos, e mais alguns outros documentos de pouco ou nenhum valor para a elucidação dos fatos sobre os quais o presidente fora inquirido (Pastas FEDERAÇÕES SUDESTE, Vols. de 4 a 7). Se administrativamente a situação da federação é confusa e desorganizada, com seu presidente dizendo desconhecer fatos relevantes, bem como as operações de vulto realizadas pela entidade, no campo fiscal, financeiro e no contábil não é diferente. As ocorrências verificadas, a exemplo da falta de dados e de explicações sobre relevantes operações, as suspeitas de existência de um “caixa dois”, a desorganização e, especialmente, a participação do contador como sócio, juntamente com outros sócios ainda mais suspeitos, em uma empresa gráfica prestadora de serviços exclusiva, sinalizam para uma situação de total falta de confiabilidade na contabilidade da Federação. Os reflexos são sentidos na área fiscal conforme descrito a seguir. A Receita Federal informou a esta Comissão não constar registro de entrega de declaração nos exercícios de 96 e 97. No ano de 1997, conforme declaração apresentada em 1998, a federação apresentou uma receita de R$ 3,904 milhões e uma despesa de R$ 6,057 milhões, o que dá um déficit de R$ 2,153 milhões que, segundo o presidente, teria sido, na realidade de R$ 4 milhões. Nessa declaração consta como entidade isenta; não declara rendimentos do presidente, Sr. Elmer, citando-o nominalmente com rendimentos zero. Lembrando que esse, em depoimento, declarou receber da federação desde quando lá entrou, o que, pelo menos como presidente, faz 14 anos, tal fato configura-se sonegação do contribuinte Elmer Guilherme Ferreira, CPF 098.788.746-72, e uma omissão da Federação frente ao fisco, não declarando o valor pago àquele contribuinte. Na declaração apresentada em 1999, vem como “Forma de tributação do lucro: Lucro Real” e a Federação indicou receita zero. No entanto, a movimentação bancária foi superior a 4 milhões de reais nesse mesmo ano, conforme apurou a Comissão Já em 2000, declara: “Forma de tributação do lucro: Imune do IRPJ”. Declara, dessa vez, rendimento do Sr. Elmer Guilherme Ferreira no total de R$ 45.056,90, com desconto na fonte. Apresenta um déficit em 99, e um déficit muito grande, porque há um recebimento de 712 mil e uma despesa de 1 milhão e 911, ou seja, o déficit foi maior do que o total da receita. Mesmo aparentando não ter dinheiro, a Federação auferiu, nesse mesmo período, rendimentos de aplicações financeiras. Pode-se verificar o quadro em que se encontra a FMF levando-se em conta o fato de ela ter declarado à Receita Federal ser imune, qualidade que constitucionalmente é garantida, apenas, a algumas entidades, de modo taxativo. Isso prova que a Federação mineira não possui o mínimo de controle do ponto de vista fiscal e tributário. Todos os documentos fiscais referentes aos tópicos levantados acima encontram-se no Anexo 11, Pasta 01 – Sigilo Fiscal. 4. RELAÇÃO COM A CBF E COM A FEDERAÇÃO PAULISTA Com relação à Federação Paulista, o Sr. Elmer disse ter um bom relacionamento, inclusive com o presidente, Eduardo Farah. Contou que, terminada a Copa Centenário, tendo havido prejuízos, procurou o presidente Farah, que concedeu um empréstimo de R$ 1.500.000,00 à Federação Mineira. Afirma que, posteriormente, a CBF assumiu o restante dessa dívida e que agora a dívida é com a CBF. As respostas do presidente Elmer foram as seguintes: O SR. DEPUTADO LÉO ALCÂNTARA - Existiu algum... algum negócio, alguma transação financeira entre a Federação Paulista e ... O SR. ELMER GUILHERME FERREIRA - Existiu. Terminada a Copa Centenário, e... e... dado ao prejuízo, e como a Federação não tinha nenhuma perspectiva e sufocado pelos credores que todos cobravam, nós procuramos o Presidente Eduardo Farah, levamos a ele esse... essa nossa aflição, e ele nos fez um empréstimo em torno de 1 milhão e 500. Esse empréstimo foi feito justamente... inclusive esse agora me recordo, até o cheque desse Humberto Botino foi retirado desse dinheiro, foi quando nós pagamos principalmente aquelas dívidas que tava nos sufocando mais da Copa Centenário. O SR. DEPUTADO LÉO ALCÂNTARA - É exatamente, casa as datas. O senhor recebeu esse empréstimo da Federação Paulista em 20 de novembro e pagou ao Sr. Humberto Botino, em 27 de... O SR. ELMER GUILHERME FERREIRA - É isso aí, eu tenho certeza que foi um dos primeiros que foram pago com o dinheiro que veio da Federação... O SR. DEPUTADO LÉO ALCÂNTARA - E o senhor ainda deve à Federação Paulista? Consta na sua contabilidade esse empréstimo, essa entrada do dinheiro, e algum pagamento... O SR. ELMER GUILHERME FERREIRA – Tenho, tem. A Federação fez um pagamento em torno de 150 mil, e depois, como nós não tivéssemos condições de saldar o resto, foi feito um acordo entre a Federação, a CBF e o Eduardo Farah, e o Ricardo é... comprometeu a liqüidar o restante dessa dívida junto à Federação Paulista. O SR. DEPUTADO LÉO ALCÂNTARA - Ricardo que o senhor chama... O SR. ELMER GUILHERME FERREIRA Teixeira. Ricardo O SR. DEPUTADO LÉO ALCÂNTARA - É o Presidente Ricardo Teixeira? O SR. ELMER GUILHERME FERREIRA - É o Presidente da CBF, é. O presidente da Federação Paulista, Eduardo Farah, em seu depoimento à CPI do Futebol, no Senado, em 22/5/2001, afirmou que cedeu o empréstimo, de fato, à Federação de Minas Gerais. Disse que cobrou da Federação pelo atraso do pagamento, chegando a ameaçar a execução de um imóvel que havia sido dado como garantia. E que, como a Federação Mineira não tinha como pagar, foi feito um acordo com Ricardo Teixeira, presidente da CBF, assumindo esta a dívida. Entre os documentos de posse desta Comissão, consta apenas um pagamento relativo a esse empréstimo pela CBF à Federação Paulista, no valor de R$ 136.273,65, datada de 28/11/2000. Se a Federação Mineira diz ter pago apenas R$ 150 mil, restam, ainda, R$ 1.213.726,35 para a Federação Paulista receber, ao que parece, da CBF. Já a CBF, ainda perdoou a dívida acumulada, durante o ano de 2000, com a Federação Mineira, no valor de R$ 763.508,40, sendo que desse total, apenas R$ 136.273.65 se relacionam com o empréstimo. Outros R$ 627.234,75 foram, assim, também perdoados. Foram observadas cópias de cheques da CBF para a Federação Mineira assim distribuídos: R$ 88.000,00, em 1995, R$ 200.000,00, em 1996, R$ 100.000,00, em 1997 e R$ 200.000,00, em 1998 (Anexo 03, Pastas 09, 19, 22, 25 e 26). O ex-presidente da Federação Mineira, José Guilherme Ferreira, pai do atual presidente, é um dos três membros titulares do Conselho Fiscal da CBF. Durante muitos anos, exerceu o papel de dirigente maior da Federação, afiliada da CBF, o que reforça, e muito, a ligação entre ele e Ricardo Teixeira. A relação de fatos observados, possivelmente, retira do senhor José Guilherme a isenção necessária para que um membro de Conselho Fiscal possa exercer suas atribuições. 5. CONCLUSÕES Durante os interrogatórios realizados por esta Comissão, muitos foram os compromissos assumidos pelos inquiridos, com promessas e garantias do envio de explicações e documentação comprobatória da regularidade de fatos sobre os quais foram levantadas suspeitas. Muitos questionamentos, como já era previsto, permanecem sem respostas, comprovando a inexistência de motivos ou de procedimentos lícitos nas operações realizadas. Ficou comprovado que a Federação Mineira está carente de dirigentes que levem a sério os princípios universais da moralidade, impessoalidade e da legalidade. A entidade é dominada por uma família já há quase quatro décadas e apresenta sintomas de todas as conseqüências que advêm dessa longevidade no poder: nepotismo, favorecimentos diversos, desvio de dinheiro, gestão temerária, apropriação indébita, dentre outros vícios. 6. RECOMENDAÇÕES Alguns fatos devem ser imediatamente submetidos a uma investigação minuciosa por parte das instituições competentes, tendo em vista já existirem indícios mais do que suficientes para se crer em prática de atos ilícitos. São apresentados, a seguir, algumas recomendações: 1. utilização da Mineração Lisboa Ltda. como ponte para a saída irregular de recursos da federação – prosseguir com as investigações junto à empresa para se concluir pela sua participação ou não na operação e, em seguida, serem indiciados os dirigentes da federação; 2. concluir pesquisas no sentido de se conhecer qual foi realmente a participação da Indústria JB Duarte S/A no caso da saída de recursos, utilizando-se da Mineração Lisboa; Traffic; 3. procurar onde foram parar os pagamentos efetuados à Federação pela 4. esclarecer o total de pagamentos efetuados a 28ª Vara Cível (R$ 455.000,00) e outros pagamentos de elevados valores; 5. investigar os pagamentos realizados a terceiros com o pretexto de pagamento de empréstimos, tal como no caso do senhor Humberto Botino, cabendo à Receita Federal apurar os recebimentos feitos pelos favorecidos (ver Anexo 11 e suas pastas, bem como Relatório de Cheques de Federação Mineira); 6. encaminhar ao Ministério Público cópia deste Relatório e dos anexos referentes à Federação Mineira de Futebol, Anexo 11, todas as pastas, incluindo-se, ainda, os documentos relativos a entidade recebidos por esta CPI, dentre eles, o estatuto da FMF. Na área administrativa, podem ser salientados os seguintes aspectos e as correspondentes recomendações: a) promover a revisão dos estatutos da Federação, reduzindo-se as atribuições e os poderes do presidente, incluindo regras que impedissem a prática do nepotismo e de manipulações eleitoreiras; inclusão de condições e de requisitos especiais para os integrantes do Conselho Fiscal; b) denunciar ao Conselho Federal de Contabilidade, dando-lhe conhecimento dos procedimentos do contador e do auditor contratado pela Federação; c) comunicar à Receita Federal as irregularidades verificadas nas declarações do Imposto de Renda dos anos recentes e recomendar uma fiscalização severa nas contas da entidade, de seu presidente e do ex-presidente, pai do atual, o senhor José Guilherme Ferreira; e d) recomendar à Receita Federal e ao Ministério Público que investiguem se a CBF arcou com o ônus do empréstimo de R$ 1.500.000,00 ou como se deu essa transação nebulosa. Sugere-se, por fim, que seja decretada a intervenção na Federação Mineira de Futebol, com base no art. 8, do Estatuto da CBF. PARÁ 1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DAS FEDERAÇÕES : A Federação Paraense de Futebol é uma sociedade civil para fins desportivos, com personalidade jurídica e patrimônios próprios. O art. 52 do estatuto da entidade prevê que a presidência, os diretores, colaboradores e assessores “não poderão ser remunerados, nem auferir gratificação”, o que foi confirmado pelo presidente Antônio Carlos Nunes de Lima, que dirige a entidade há seis anos, somando-se os dois períodos. Abre, no entanto, espaço para o caso de despesas comprovadas com hospedagem, transporte, alimentação, cópias de documentos, etc., no parágrafo único do mesmo artigo. 2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA A Federação paraense encaminhou a esta CPI parte dos documentos exigidos, dentre os quais, os balanços contábeis dos exercícios de 1998 a 2000. A entidade informou que não foram localizadas os documentos relativos aos exercícios de 1995 a 1997, que pertenceriam à administração anterior. A entidade apresenta gastos excessivos com a justiça, principalmente trabalhista. Segundo informações do jornal eletrônico Lancenet, de 3/8/2000, o clube do Remo vem passando por sérias dificuldades financeiras. Incluem-se duas ações trabalhistas, que, apenas elas, podem fazer com que o clube perca sua sede social, já penhorada. Nos últimos cinco anos, a entidade despendeu cerca de R$ 300 mil apenas com causas na justiça. Em federação alguma se observou gastos como os dessa Federação com ações trabalhistas. E, de acordo com Nunes Viana, apenas uma ação foi de R$ 46 mil. Como o presidente desconhece, ou demonstra desconhecer, as atividades da gestão anterior à sua, caberá aos órgãos competentes (Receita Federal e Ministério Público) examinar a contabilidade da Federação para conferir a regularidade desses pagamentos, e se se referem a funcionários da entidade ou jogadores de clubes paraenses, ou nada disso. A contabilidade apresentada a esta CPI demonstra que, em 1999, teriam sido gastos apenas R$ 925,24 em indenizações trabalhistas. Somente de pagamentos feitos à 4ª Junta de Conciliação e Julgamento de Belém foram pagos R$ 21.931,13 no dia 13/7/1999. 3. SITUAÇÃO FISCAL E FINANCEIRA 3.1 MOVIMENTAÇÃO BANCÁRIA DA FEDERAÇÃO Há pagamentos também expressivos para uma empresa, a F.A. Meireles Agência de Turismo. Para Viana, os gastos são para pagar passagens aéreas: “O SR. DEPUTADO OLÍMPIO PIRES – E essa F.A. Meireles, Agência de Turismo? O SR. ANTONIO CARLOS NUNES DE LIMA – Noventa e nove. No campeonato do Pará, ele interiorizou. Então, para você jogar nas cidades de Marabá, como profissional, que lá tem uma (ininteligível) de Marabá — nós temos em Santarém, 99, São Francisco e São Raimundo — a dimensão continental que eu digo até do Estado do Pará, sem pensar até no Amazonas, as passagens são via aérea, e elas foram compradas na Empresa S. A Meireles. O SR. DEPUTADO OLÍMPIO PIRES – A federação é que paga as passagens. O SR. ANTONIO CARLOS NUNES DE LIMA – Nós vamos à cata de recursos. A CBF, Governo do Estado. Vamos atrás. Vamos atrás. E conseguimos e pagamos.” Em três anos, 1998 a 2000, a Federação gastou mais de R$ 180 mil apenas com um agência de turismo. 3.2 DECLARAÇÕES DO IMPOSTO DE RENDA A Federação Paraense não vem recolhendo a COFINS, tributo obrigatório mesmo para as entidades sem fins lucrativos, do mesmo modo que é o recolhimento do PIS. Esses valores deverão ser calculados pela Receita, ou pela Federação, para pagamento. 3.3 INSS A Federação paraense tem dívida pendente com o INSS no valor de R$ 21.532,54, em 21/11/2000, sem ter optado pelo parcelamento dos débitos federais (REFIS). 3.4 CONSELHO FISCAL O Conselho Fiscal é composto pelos seguintes membros efetivos: Francisco Moreira Pacheco, Carlos Souza de Figueiredo e Rui Guilherme Soares Noronha, sendo, os três, contadores 4. RELAÇÃO COM A CBF Nunes de Lima afirmou que há necessidade de mudanças urgentes na relação CBF - Federações. Advertiu que o futebol está sofrendo muito devido ao desencontro entre a CBF e as entidades estaduais. Nunes de Lima disse ainda: “Acompanhei atentamente as manifestações de V.Exas. aqui, todas elas mostrando que não estão aqui para, vamos dizer assim, um termo nosso do interior, “cascaviar” a vida de nós, Presidentes de Federações. Muito pelo contrário, lutar por nós, porque aquilo que o Ricardo Teixeira chamou de “mesada”, ele deveria sim olhar a fazer um planejamento da sua administração, porque, quando nós votamos, na última eleição, no Ricardo Teixeira, era o seu planejamento a modernização do futebol brasileiro, a ligação on line com as Federações, para que tudo fosse transparente e nós não tivéssemos os problemas dessas grandes distâncias que nós aqui do Norte sofremos e ficamos padecendo na administração do futebol brasileiro. Por isso, Srs. Deputados, o momento é este, é um momento de mudança.” (g.n.) A Federação vem recebendo doações da CBF, como se pode ver pelo gráfico a seguir: DOAÇÕES DA CBF PARA A FEDERAÇÃO PARAENSE DE FUTEBOL 1998 - 2000 R$ 60.000 50.000 40.000 30.000 20.000 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/2000 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/99 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO 0 JAN/98 10.000 MESES Fonte: Contabilidade CBF/CPI CBF Nike O presidente Nunes de Lima criticou Ricardo Teixeira. Para ele, Teixeira deveria dar mais atenção aos clubes e federações do Norte, além de escolher um novo diretor de futebol que atenda aquela região. Lima afirmou: “Hoje nós estamos sem pai nem mãe, nós Presidentes de federações do Norte, porque o Ricardo Teixeira, quer dizer, é nosso amigo, é companheiro do mesmo ofício do futebol, ele não se dignou a nomear ninguém para o Departamento Técnico de Futebol. Acredito que isso aí não pode acontecer. Ele tem que imediatamente modificar isso aí e colocar alguém lá. Foi indicado alguns companheiros. Não foi aceito. A CBF tá anunciando de hoje pra manhã campeonato brasileiro. Quem é que vai anunciar? O Secretário-Geral da CBF, que não é papel dele, Excelência. Eu acredito que são essas coisas, esses desmandos que nós temos que corrigir também no futebol brasileiro. Nós aqui que somos Federações do Norte, aqui pobre, não temos pra quem falar.” (g.n.) 5. CONTRATOS COM A TV A Federação Paraense, os clubes filiados e a TV Filme Belém Serviços de Telecomunicações Ltda. firmaram um contrato referente a direitos de transmissão de jogos do Campeonato Paraense da 1ª divisão, para as temporadas de 2000 a 2005. O valor do total do contrato é de R$ 108 mil reais. 6. RELAÇÃO COM OS CLUBES A Federação mantém relacionamento com os clubes do Estado. Somente em 1999, a entidade repassou mais de R$ 200 mil tanto para o Clube do Remo, como para o Paysandu Sport Clube. O Tuna Luso recebeu cerca de R$ 70 mil. 7. CONCLUSÕES , ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES Há necessidade que a Federação atualize seus registros contábeis, tomando as providências necessárias para regularizar os anos que estão incompletos. É preciso que a entidade tome medidas para informatizar todos os sistemas contábeis, tornando disponível, em tempo real, para os clubes filiados. Comunicar a Receita Federal que a Federação não vem recolhendo tributos, como a COFINS, ou vem declarando irregularmente à Receita, bem como examinar a contabilidade da entidade com o objetivo de apurar os gastos com passagens aéreas de clubes e o seu ressarcimento. Sugere-se à Receita Federal que examine as contas relativas ao antigo presidente, Euclides de Freitas Filho, quanto à regularidade e recolhimento de tributos federais. Comunicar ao INSS sobre indícios de não recolhimento devido, em função do excessivo pagamento de ações trabalhistas. Comunicar ao Conselho Federal de Contabilidade para que tome ciência deste Relatório e tome as providências cabíveis quanto à entidade e seus contadores, examinando as contas da entidade do atual presidente e de seu antecessor. No aspecto administrativo, recomenda-se uma imediata reforma estatutária para limitar o mandato da diretoria da entidade em no máximo quatro anos, impedindo a recondução aos cargos; para permitir uma maior autonomia do conselho fiscal; para obrigar a realização de licitação para a aquisição de bens e de material esportivo; e para estabelecer maior transparência nas contas da Federação e nos repasses de verbas que envolvam a entidade e os clubes. Sugere-se, ainda, encaminhar o presente Relatório à Receita Federal, ao Ministério Público Federal e ao Ministério Público do Estado do Pará. PARAÍBA 1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DAS FEDERAÇÕES : Conforme estatuto da entidade, alterado por assembléia geral extraordinária realizada em 29/07/1998 (art. 87 do estatuto), a Federação Paraibana de Futebol é uma “sociedade civil, para fins desportivos, com personalidade jurídica (...) e patrimônio próprio” (art. 1º), tendo como objetivos: “dirigir (...) o futebol amador e profissional, promovendo a sua difusão e aperfeiçoamento”; “promover campeonatos, torneios e competições de futebol”; e “incentivar, por meio de processos educativos, compatíveis com o fundamento da atividade institucional, cultura moral, cívica e intelectual, sobretudo no meio das gerações ais novas” (art. 2º). Trata-se de típica entidade de direito privado sem fins lucrativos. O estatuto define como “poderes” da entidade as seguintes instâncias: assembléia geral (composta, conforme o art. 17, das associações das 1ª e 2ª divisões de profissionais, associações de amadores da capital e ligas do interior), Tribunal de Justiça Desportiva, Conselho Fiscal e, Presidência e Diretoria (art. 16). Os membros desses “poderes” devem possuir reconhecida competência técnica e gozar de “conceito público por suas atividades cívicas, sociais e desportivas” (art. 10, § 1º), estando proibidos de receber “qualquer forma” de remuneração “pelas funções que exercem na Federação” (art. 10, § 3º). O estatuto é a norma geral que regula a Federação, sendo subsidiado pelo estatuto da CBF e demais atos confederativos, além do disposto na Lei nº 9.615/98 (Lei Pelé). 2. S ITUAÇÃO ADMINISTRATIVA A análise da situação administrativa da Federação Paraibana de Futebol indica a existência de problemas de várias ordens, dentre as quais destacamos a prática de nepotismo e grave ingerência dos interesses da família da presidente sobre a Federação, e o domínio da presidente sobre o conselho fiscal da entidade. Em Sessão desta CPI realizada em João Pessoa, em 12/05/2001, foi ouvida a Rosilene de Araujo Gomes, atual presidente da Federação, que confirmou informações e denúncias veiculadas em órgãos de comunicação e que já eram de conhecimento dos membros desta CPI. Segundo Rosilene de Araujo Gomes, a Federação possui um quadro de dezoito funcionários, movimentando cerca de 4 mil reais por mês para o pagamento de pessoal. 2.1. CONTINUISMO Rosilene Gomes ocupa o cargo de presidente da Federação há quatro mandatos, isto é, desde 1989. Seu marido, Juracy Pedro Gomes, foi presidente da Federação de 1980 a 1986. 2.2. A F EDERAÇÃO TRATADA COMO UM NEGÓCIO DE FAMÍLIA O domínio político da família da Rosilene de Araujo Gomes sobre a Federação se estende à relação entre seus filhos e a entidade. A empresa que fornece material esportivo pertence a dois dos filhos do casal Rosilene e Juracy Gomes. Conforme denuncia de Laerson Almeida e de Lamir Motta, em depoimentos na Sessão do dia 12/05/2001, a Federação exerce coerção sobre os clubes a ela filiados para que estes contratem a mencionada empresa (denominada “Rei dos Esportes”). Rosilene de Araujo Gomes contesta a denúncia, para quem não existiria ingerência da Federação na relação entre os clubes e a dita empresa. No entanto, em seu depoimento, chega a admitir a propriedade da mencionada empresa, conforme se revela abaixo: “A Federação, eu estou, eu sou empresária há 40 anos, há 40 anos, eu estou como Presidente a Federação há quase 12 anos, eu sou empresária, há 40 anos que eu tenho casas comerciais, diversas e diversas casas, tanto minha pessoa como também todos os meus familiares, eu digo esposo, filhos e tudo mais, certo? E não só vendo material esportivo como também eu vendo outros produtos, certo, como máquinas industriais e tudo mais. Quer dizer, não vejo nenhum erro na hora que um clube, um clube solicita uma ajuda e a Federação, a Federação autoriza aquela equipe comprar, ela compra onde ela achar que seja conveniente porque já comprou em outras lojas também.” (g.n.) 2.3. NEPOTISMO E DESVIO DE VERBAS POR PARENTE A influência da família da presidente Rosilene Gomes sobre a Federação é confirmada ainda pelos fatos que envolvem o Judas Tadeu, sobrinho da Rosilene Gomes. Judas Tadeu trabalhou na Federação de março de 1994 a 1999, recebendo o equivalente a dois salários mínimos mensais. Ocorre que, durante um certo período, sua remuneração era ampliada por gratificações oriundas do programa “vale-legal”, do Estado de Alagoas, que correspondiam a uma média próxima de três salários mínimos mensais. Esse fato demonstra um benefício direto e explícito ao parente da Rosilene de Araujo Gomes. Mais grave, no entanto, foi o procedimento administrativo verificado no ano de 1998 e em parte de 1999, pelo mesmo funcionário Judas Tadeu, no tocante ao desvio de cheques oriundos de clubes e destinados ao Departamento de Registro de atletas da Federação. Ao invés de encaminhar o regular pagamento das taxas, o funcionário embolsava os valores. O prejuízo desse procedimento estendeu-se aos clubes, que utilizaram, sem saber, atletas irregulares; aos atletas, que também desconheciam a falta de registro; e ao próprio futebol paraibano, no que diz respeito à credibilidade em relação a outras Federações e clubes de outros Estados. Segundo Rosilene de Araujo Gomes, a situação apenas foi corrigida quando o Santos Futebol Clube encaminhou denúncia à Federação, que resultou em posterior auditoria e regularização da situação dos atletas. Mesmo diante de tal irregularidade, a Federação não denunciou o caso à polícia e sequer se interessou em recuperar a verba desviada. A presidente da Federação apenas dispensou seu funcionário. A estes fatos, que confirmam a prática de nepotismo na gestão administrativa da Federação Paraibana de Futebol, some-se a constatação de uma direção centralizadora da Rosilene de Araujo Gomes sobre a entidade e um domínio político explícito da presidente sobre o conselho fiscal. Ao longo do depoimento da Rosilene Gomes, esta chegou a confirmar que a contadora da entidade, subordinada diretamente a ela, também é membro do conselho fiscal, como se percebe a seguir: “A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Ela foi eleita membro do conselho fiscal. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – E é a contadora também. A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – É a contadora.” Essa gestão quase “familiar” da Federação Paraibana é caracterizada por uma desorganização administrativa generalizada, com explícita vantagem para os membros da família de Rosilene Gomes. Sintomático, neste sentido, o fato de que a Câmara Municipal de João Pessoa e a Assembléia Legislativa do Estado da Paraíba tenham instituído Comissões Parlamentares de Inquérito, respeitando suas competências e atribuições, para examinar a situação do futebol local e o papel da Federação Paraibana de Futebol. 3. SITUAÇÃO FISCAL E FINANCEIRA Se administrativamente a gestão da Federação Paraibana é confusa e desorganizada, no campo fiscal e financeiro a situação não é diferente. Quebrados os sigilos fiscal e bancário, chegaram à CPI informações que comprometem a probidade na administração dos recursos e no pagamento dos tributos e recolhimentos legais. Parte significativa do que apontam os documentos oriundos da receita federal e dos bancos foi confirmado pelas denúncias dos depoentes Jaerson Almeida e Lamir Motta, e pelo próprio depoimento da Rosilene de Araujo Gomes. A seguir, exporemos as irregularidades percebidas na declaração do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica da Federação; situação previdenciária; movimentação irregular de verbas; gestão das verbas relativas ao vale-legal; ocorrências de evasão de renda; desvio de cheques; comprometimento do conselho fiscal; e beneficiamento de empresa dos filhos. 3.1. D ECLARAÇÕES DO IMPOSTO DE RENDA A Federação, no período entre 1995 e 2000, apenas declarou imposto de renda relativo ao ano base de 1998 e ao ano base de 1999. Nestes dois anos base não foram declarados bens imóveis ou veículos no imposto de renda, em que pese Rosilene Gomes ter confessado perante esta CPI ser a Federação proprietária de vários bens, a saber: um prédio, um campo de futebol e veículos (foram citados um Pajero, adquirido em 2000 e antes, um Corsa e depois um Siena). A presidente afirmou ainda não saber avaliar quanto vale esse patrimônio. Sobre a sonegação daí decorrente, alega ter havido lapso por parte da sua contadora. Rosilene Gomes assume a sonegação em seu depoimento: “O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Um Pajero, e a partir do ano passado, por isso não está no imposto de renda que ainda está lá. E anterior a isso, tinha carros? A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Tinha. Quando eu assumi a Federação, a Federação não tinha carro. Foi comprado, se eu não me engano, foi um Corsa, foi o primeiro foi um Corsa. Depois foi um Marea e posteriormente foi justamente uma Pajero. Mas isso sem ser do dinheiro da Confederação, porque a Confederação nunca mandou dinheiro nem para a Federação fazer doação aos clubes como também a Confederação nunca mandou dinheiro para a compra de carros. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Então, no ano de 98 e no ano de 99 tinha carro? A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Tinha sim senhor. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Então, só para registrar que também não foram colocados no imposto de renda declarados como carro da Federação. A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Certo. Isso daí também é um caso para ser analisado com a contadora o porquê de não ter sido declarado.” E sobre a propriedade dos veículos, afirma Rosilene Gomes: “Com o dinheiro da Federação e passado e toda documentação é em nome da Federação Paraibana de Futebol.” 3.2. INSS Junto à previdência social, a Federação comprometeu-se a pagar sua dívida por meio do programa REFIS. 3.3. CONTRIBUIÇÕES IRREGULARES A Federação recebeu contribuições irregulares. Consta que o Tribunal de Contas do Estado destinou duas parcelas de R$ 125.000,00 em favor da Federação. Perguntada à respeito, Rosilene de Araujo Gomes não soube explicar e alegou desconhecer o fato, deixando a suspeita de que poderia ser um valor relativo ao repasse do governo estadual, no programa “vale-legal” (o que não tem qualquer respaldo legal). Destaca-se, em seu depoimento, a seguinte passagem: “O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – (...) A Federação Paraibana de Futebol tem algum convênio ou recebeu algum dinheiro do Tribunal de Contas do Estado da Paraíba? A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Tribunal de Contas? Não. Tribunal de Contas, não. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Do Tribunal de Contas? A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Não. Tribunal de Contas, não. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Nunca prestou serviço? A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Também não. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Em 1999, de acordo com documentação enviada pra nós, a Federação recebeu 125 mil reais do Tribunal de Contas do Estado da Paraíba. A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Tribunal de Contas? O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – E, em 2000, outra parcela de 125 mil reais. A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Tribunal de Contas? O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – É. A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Deve ter vindo justamente através da Secretaria das Finanças, mas não sei se foi do Tribunal de Contas. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Olha, eu vou até especificar de acordo com a movimentação financeira da conta da Federação. Dia 27/12/99, 125 mil. A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – 27/12... Me dá o extrato bancário. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - E dia 1/2/2000, mais 125 mil. Eu chamo a atenção... A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Não... Foi ajuda do Governo no valor de 250 mil reais. Mas eu não sei se foi do Tribunal de Contas não.” Outra movimentação que ficou sem esclarecimentos refere-se aos repasses de R$ 128.883,37 a Luciano Wanderley Filho e de R$ 32.376,50 a Hebert Levy de Oliveira: ambos são dirigentes do Botafogo (da Paraíba), sendo que o primeiro negou o recebimento. Segundo Rosilene de Araujo Gomes, os pagamentos teriam sido destinados ao Botafogo, e não às pessoas físicas. 3.4. P ROGRAMA “VALE-LEGAL ” Já no que se refere ao programa do Estado da Paraíba denominado “valelegal”, restam vários questionamentos. Segundo a presidente da Federação, o governo estadual pagaria as verbas do programa à Federação, que por sua vez as repassaria aos clubes. Aparentemente, porém, esse procedimento não ocorria de forma regular. É o que aponta o depoimento do Lamir Motta, para quem a Federação deve ao clube Campinense a transferência de valores relativa ao “vale-legal”. O depoente Nelson Lira, ex-dirigente do Botafogo da Paraíba, afirma que a Federação pagou a parte do clube através de um cheque sem fundos. Ainda sobre o “vale-legal”, registre-se a ocorrência que envolve o sobrinho da presidente, que recebia gratificações extras do programa. Em seu depoimento, a Rosilene Gomes acaba confirmando que não declarou a parte retida na Federação, oriunda do programa “vale-legal”: “O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Dado que eles estão certos, eu fiz uma conta. Cheguei que a Federação Paraibana recebeu 150 mil, 396 e 25, número que eu venho repetindo de forma recorrente. Isto não está declarado! Como é que a senhora explica isso? A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Ela pode não estar declarado no Imposto de Renda, mas ela está aqui declarado no balancete. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Não, não vale. A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Outra co... é... O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Não. Não vale. Me desculpe. A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Dr. Jurandil, olhe, não é rendimento da Federação. A Federação abriu uma conta exclu-si-va! Exclusiva! Está aqui. Eu passo às suas mãos — certo? — o extrato bancário do Vale Legal. Está aqui. Passo às suas mãos, Dr. Aldo. Certo? Não é o senhor não? Pensei. (riso.) Desculpa. (riso.) (...) O SR. PRESIDENTE (O Deputado Aldo Rebelo) – O que ele está dizendo é que a senhora não declarou essa receita da Federação a senhora não declarou no imposto de renda. A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES - Pronto! É isso que eu estou dizendo, Dr. Aldo. O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – A senhora declarou? A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES - Eu não sei se foi declarado, mas se não foi será declarado. Por quê? Porque isso daqui eu acredito que até mesmo o nosso Contador ele achou conveniente não fazer esse repasse, aliás, essa declaração. Por quê? Porque era totalmente para ser repassado para os clubes, porque a Secretaria das Finanças... Ia fazer esse repasse para a Secretaria das Finanças... (...) A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES - Não, ele está falando do imposto de renda. É isso que eu estou dizendo para ele. Não houve a declaração do Imposto de Renda, eu acredito que a nossa contadora, certo?, ela achou conveniente de não fazer por quê? Porque esse repasse era para os clubes e não para a Federação. Mas mesmo aqui... está aqui, Dr. Rosinha, todos os vales, todos os recibos, né?, de todos os clubes, as doze equipes que receberam, não é?, o vale legal. (...) O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – E chegando a eles, se eles tinham declarado para o Imposto de Renda, porque, na verdade, eu quero lhe dizer, se não foi declarado, a senhora sonegou a contribuição correspondente, o Imposto de Renda correspondente. Significa dizer que a Federação Paraibana sonega Imposto de Renda, sonega contribuições. A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Ela sonegou justamente neste caso, certo? Agora que foi repassado, está aqui: todos os recebidos que foram repassados para todos os clubes, certo?, sem haver nenhuma contestação, porque foram repassados através de cheques.” 3.5. EVASÃO DE RENDAS Na Sessão da CPI em João Pessoa, levantaram-se suspeitas de evasão de rendas sob a responsabilidade da Federação. Segundo depoimento do Laerson Almeida, há venda de ingressos por empresas controladas pela Presidente. Os outros depoentes confirmaram essa possibilidade. Enquanto Lamir Motta apontou o exemplo do que ocorreu no maior “clássico” do estado, Nelson Lira afirmou que ocorreu evasão no jogo entre o Botafogo (PB) e o Bahia. 3.6. O SOBRINHO JUDAS TADEU O caso do desvio de cheques envolvendo o sobrinho da presidente, Judas Tadeu, analisado acima, é outro exemplo de administração financeira descuidada. Neste mesmo sentido, o conselho fiscal, que tem como um dos membros a contadora da Federação; o empréstimo de dinheiro da CBF a funcionários da Federação, sem juros, (casos de Antônio Alves Gonçalves e de Sônia Maria); e o beneficiamento da empresa de material esportivo de propriedade dos filhos, são fatores que sugerem estar a entidade se distanciando do futebol, ao tempo em que mantém uma movimentação financeira com o objetivo de enriquecimento da Rosilene Gomes e de sua família. 3.7. CHEQUES AO PORTADOR Outra ocorrência observada no exame da quebra de sigilo bancário é a emissão de cheques com valores altos, ao portador. 4. RELAÇÃO COM A CBF 4.1. VERBAS DA CBF A Federação Paraibana recebeu da CBF, nos anos de 1998 a 2000, os seguintes valores: em 1998, seis mil reais por mês, com exceção do mês de fevereiro, quando a Federação recebeu vinte e um mil reais; em 1999, o repasse mensal foi de doze mil reais, com as exceções de janeiro, que foi de seis mil reais, e de setembro, de quarenta e dois mil reais; já em 2000, de janeiro a agosto, e em outubro e novembro, o repasse mensal manteve-se em doze mil reais, sendo que em setembro foi de trinta e dois mil e em dezembro de vinte e sete mil cento e onze reais. 4.2. ASSEMBLÉIA DA CBF Perguntada se compareceu à assembléia geral da CBF em janeiro de 1999, que aprovou as contas da CBF de 1998, a presidente da Federação Paraibana, em seu depoimento, afirmou que não estava presente àquela reunião; abaixo, o trecho do depoimento: “O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Não, 99. A senhora esteve presente na reunião realizada em janeiro de 99, onde foram aprovadas as contas referentes ao exercício de 98, essa é a pergunta. A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Olha, eu acredito que este ano eu estava na ... na ... no Paraguai, na sulamericana, eu tenho quase certeza. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – A senhora não estava presente então? A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Não estava presente. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Está muito bem. A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Dois anos, eu passei dois anos sem comparecer a assembléia.” No entanto, de acordo com a lista de presenças da assembléia geral do dia 11/01/1999, documento enviado pela CBF à CPI, Rosilene Gomes não apenas esteve no evento, como registrou sua presença na mencionada lista. Conclui-se que Rosilene Gomes mentiu em seu depoimento. 5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL A Federação Paraibana de Futebol, segundo sua presidente nunca se envolveu com política, em que pese a própria Rosilene de Araujo Gomes já ter sido candidata a Deputada Estadual durante a sua gestão, e seu marido e antigo presidente da Federação, Juracy Gomes, ter sido eleito Prefeito do Município de Sossego, interior da Paraíba. Curiosamente, a Federação recebeu doação de vinte mil reais no último dia útil antes das eleições de outubro de 2000, quando foi eleito o Juracy. Em que pese a afirmação de Rosilene Gomes, em nossa passagem por João Pessoa, observamos que Rosilene de Araujo Gomes é conhecida nos meios políticos, estando envolvida, como já citado, nas CPI’s locais. Sobre sua própria candidatura, comenta a Rosilene de Araujo Gomes: “Fui candidata, se não me engano, em 1994, certo, mas, é, não foi, é, por querer mesmo. O querer é uma coisa. Foi assim vários amigos que me lançaram candidata, mas eu, em nenhum momento, eu tenho nenhuma tendência a ser candidata.” Acerca da legalidade ou não da doação eleitoral, seja pela CBF ou pela Federação, a Rosilene de Araujo Gomes, aparentemente, não percebe irregularidades, é o que se supõe do seu depoimento, abaixo transcrito: “O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – A CBF, segundo constatado pelo trabalho que nós fizemos, a CBF teve por hábito apoiar candidaturas, através de doações, em vários Estados, e a senhora, por acaso, não recebeu auxílio financeiro? A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES - Não, não foi necessário, a CBF nos passar essa doação, porque também nunca solicitei à CBF ajuda financeira nesse sentido. Talvez se tivesse solicitado, não sei, até...” 6. CONTRATOS COM A TV A Federação Paraibana de Futebol não possui contratos de transmissão de jogos com emissoras de televisão. 7. RELAÇÃO COM OS CLUBES Constatou-se que a relação entre a Federação Paraibana e os clubes a ela filiados é de subordinação. No controle da Federação há quase doze anos, tendo seu marido ocupado a presidência no período de 1980 a 1986, Rosilene Gomes é denunciada por Lamir Motta por seu caráter autoritário, com ocorrência de intervenção em clubes. A relação com os clubes não se resume ao vínculo político e invade o campo econômico, seja no favorecimento da empresa “Rei dos Esportes” (dos filhos da presidente), cujos produtos os clubes seriam obrigados a comprar, seja na manipulação de repasses de verbas aos clubes (conforme descrito em vários casos acima). 8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DO FUTEBOL Do depoimento da Rosilene Gomes, apenas foi apurado que o empresário de nome José Luiz Galante, envolvido em negociações de atletas em Pernambuco, e apresentado à presidente pelo vice-presidente da Federação pernambucana, limitou-se a intermediar o contrato entre a Federação e a Telemar, que vigeu em 2000, e teve como objeto a publicidade dos clubes em cartões telefônicos. Dois empresários foram denunciados na CPI da Câmara Municipal –Flávio Almeida e Carlos Gonzaga. Segundo a presidente, a Federação não tinha contato com essas pessoas. 9. CONCLUSÕES , ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES Da análise de todos os documentos e dos depoimentos de Rosilene de Araujo Gomes, Laerson Almeida, Lamir Motta, Nelson Lira e Luciano Wanderley Filho, conclui-se que a Federação Paraibana de Futebol tem uma gestão temerária, seja em termos administrativo, financeiro e fiscal. Constatou-se sonegação fiscal, admitida pela presidente. Há ingerência e controle político e econômico da Federação sobre os clubes. Há, por parte de Rosilene Gomes, desvio de verbas, nepotismo e permanente ofensa aos dispositivos do próprio estatuto da entidade. Vê-se ainda, dentre outras irregularidades, a suspeita de beneficiamento eleitoral ao seu marido, Juracy Pedro Gomes, no ano de 2000. Por esses motivos, recomenda-se uma reforma estatutária para limitar o mandato da diretoria da entidade em no máximo quatro anos, impedindo a recondução aos cargos; para permitir uma maior autonomia do conselho fiscal; para obrigar a realização de licitação para a aquisição de bens e de material esportivo; e para estabelecer maior transparência nas contas da Federação e nos repasses de verbas que envolvam a entidade e os clubes. Sugere-se encaminhar o presente Relatório à Receita Federal, ao Ministério Público Federal, ao Ministério Público do Estado da Paraíba – no tocante às verbas que envolvem o Tribunal de Contas do Estado e aos atos que ofendem o direito do consumidor, assegurados na Lei nº 8.078/90 e na Lei nº 9.615/98 (art. 42, § 3º) –, e ao Ministério Público Eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba, com base na Lei nº 9.504/97. PARANÁ 1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DA FEDERAÇÃO : O Estatuto da Federação paranaense dispõe, em seu art. 1º, sobre sua natureza: trata-se de sociedade civil com fins desportivos com personalidade jurídica própria. A norma fundadora e reguladora das atividades da Federação não prevê maiores detalhamentos de sua qualificação jurídica, o que nos remete à legislação geral, qual seja, o Código Civil Brasileiro. 2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA : O presidente da Federação, Onaireves Nilo Rolim de Moura, ocupa esse cargo há dezesseis anos; não há previsão estatutária para que receba remuneração. Não foi constatado nenhum pagamento que indicasse remuneração regular e mensal a Onaireves Nilo. O que mais chama atenção com ralação à situação administrativa da Federação Paranaense é a enorme quantidade de dívidas que essa Federação possui, as quais serão abordadas com mais detalhes no item a seguir. 2.1 INTERVENÇÃO Em março de 1998, a Federação sofreu intervenção do governo municipal de Curitiba, tendo como fundamento sua dívida fiscal com o município. Essa intervenção durou seis meses, e Onaireves Nilo reassumiu por determinação judicial. Nessa mesma época, foi acusado de estelionato, por seu envolvimento com a exploração de bingos. Antes de assumir a Federação Paranaense, o Interventor, Vicente Rodachi, contratou a empresa Assessoria Contábil Ferraz S/C Ltda., para a realização de auditoria contábil. A seguir alguns trechos, que dão uma idéia de como estava a Federação em 1998: “(...) A metodologia adotada está fora dos padrões geralmente aceitos. A contabilidade foi executada de forma resumida, não atendendo ao regime de competência, não identificando o número do documento, o nome do beneficiário, e também não lançando em conta devida, ocasionando distorções em seu conteúdo. A sistemática administrativa adotada no período apresentou muitas irregularidades, não havendo controles, tais como orçamento, contas à pagar e à receber, conta corrente bancária, dentre outros. A forma de contabilização do movimento de caixa, não apresenta nenhuma garantia da veracidade dos fatos, pois apresenta vícios, afrontando os princípios básicos de contabilidade, deixando muito à desejar, principalmente quanto à clareza dos fatos. A contabilidade não tem condições de ser considerada correta. (...) Enfim, para se chegar a uma conclusão, haveria necessidade de se fazer nova contabilização, desprezando tudo ao que foi feito, às vistas dos documentos existentes e alguns à serem solicitados. (...) O controle das receitas estão insuficiente. Não há forma de comprovação através dos blocos de recibos. (...) Os relatórios apresentados foram executados mediante a documentação fornecida pela Federação Paranaense de Futebol, comprovando-se a necessidade de uma restruturação administrativa financeira, com a implantação de controles que possibilitem uma transparência em suas informações, permitindo a contabilização dentro dos padrões geralmente aceitos, obedecendo os princípios estabelecidos pelo Estatuto desta Entidade e de acordo com a legislação em vigor. (...) Relatório movimento de caixa: (...) f) os demais princípios básicos da contabilidade, foram integralmente afrontados, pela forma dos controles apresentados, deixando muito a desejar, principalmente, quanto a clareza dos fatos; g) Todas as despesas efetuadas, estão de acordo com a autonomia do presidente, prevista no estatuto, portanto, de sua inteira responsabilidade. (...) q) Mediante o relatado, não nos é possível apurar a real situação financeira da entidade, visto a precariedade da forma que as informações se encontram.” O presidente da Federação prestou depoimento a esta CPI em duas oportunidades; na primeira delas, em 21/03/2001, ao pronunciar suas palavras iniciais, quis deixar claro que o interventor comprometeu ainda mais as finanças da Federação, inclusive tendo denunciando-o por roubo. Nessa ocasião, procurou justificar a dívida com o Município e com o INSS, afirmando que assumiu a presidência com um enorme déficit. Seguem, abaixo, trechos do segundo depoimento do Onaireves Nilo, realizado em Florianópolis, em que o presidente da Federação comenta a gestão do interventor: O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Consta aqui, Dr. Onaireves, que esses 40 mil reais da CBF, feito como doação, feito em março de 98, não foi contabilizado pela Federação, de acordo com os documentos enviados pela Federação para a CPI. Como é que o senhor explica isso, Dr. Onaireves? O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Há todos os documentos, todos os valores repassados à Federação sempre foram contabilizados. Na verdade, eu gostaria de ter o valor e a data para que eu possa encaminhar à Comissão onde isso foi contabilizado. Mas a Federação sempre fez... Agora recordo dos 40 mil, esses 40 mil especificamente. Esse dinheiro foi dado à Federação, emprestado, eu não sei, ao interventor. E se esse dinheiro não estiver contabilizado... O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Março de 98. O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Exatamente, é período da intervenção municipal. Se esse dinheiro não foi contabilizado foi mais 40 mil reais que ele roubou. Essa pessoa foi afastada da Federação, por determinação judicial, por ter roubado da Federação, inclusive consta dos balanços da Federação que ele se apropriou indevidamente de cerca de 29 mil reais da Federação. Então, se esse dinheiro não entrou na Federação, são mais 40 mil reais que ele roubou. Eu faço questão, inclusive, de procurar verificar essa questão porque seriam mais 40 mil reais que essa pessoa teria roubado da Federação. 2.2 CONSTRUÇÃO DO ESTÁDIO DO PARANÁ – COCEP Ainda com relação à situação administrativa, a Federação do Paraná criou, em 1970 – antes, portanto, de o Onaireves Nilo assumir a presidência –, uma Comissão de Construção do Estádio do Paraná – COCEP –, que tem personalidade jurídica própria e arrecada e manipula recursos, com o fito de administrar a obra de construção do Estádio do “Pinheirão”. Essa comissão ainda existe e, na análise do primeiro depoimento do Onaireves Nilo a esta CPI, percebe-se uma mistura entre as atividades da COCEP com as da Federação, uma vez que o presidente daquela comissão é o próprio Onaireves Nilo, e o contador da comissão é o mesmo da Federação. São duas pessoas jurídicas distintas, acionadas conforme conveniências da situação fiscal, bancária, de cada uma delas. Segue parte do depoimento do Onaireves Nilo, ocorrido em Florianópolis: O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Essa conta da Comissão de Construção do Estádio, quem que assina os cheques dela? O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Quem assina sou eu e mais o Diretor Financeiro, que é o Dr. Cirus Itiberê da Cunha. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Se um só assinar, um tem procuração com o outro para poder assinar? O senhor deu procuração pra ele que possa assinar sozinho ou vice-versa? O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Não, às vezes o que ocorre, às vezes, quando se precisa sacar um dinheiro porque nós temos, nós temos uma afinidade muito grande, principalmente com o banco do Estado, que é ao lado da Federação, muitas vezes são pagos cheques com uma assinatura só, depois vai lá, a gente vai lá no outro dia e assina. Algumas vezes pode ter ocorrido de ter sido pago cheque com uma assinatura só. Mas em função de que eu, tanto eu quanto o Dr. Cirus, inclusive que mora em Quatro Barras, nem sempre estão na Federação o dia inteiro e, portanto, às vezes, é preciso sacar o dinheiro pra uma determinada coisa e pode ocorrer de normalmente não ter as duas assinaturas. Então, muitas vezes ocorre isso de se sacar com uma assinatura só e no outro dia ir até o banco e sacar com a outra assinatura e completar as assinaturas. Constatou-se que vários pagamentos destinados à Federação (da TRAFFIC, TV Paranaense, etc.), não foram registrados em sua movimentação bancária, por terem sido destinados às contas bancárias da COCEP. Em linguagem vulgar, poder-se-ia entender que a COCEP constitui-se como o “caixa dois” da Federação Paranaense. A comissão para a construção do estádio foi constituída há 31 anos e a obra não chegou nem na metade, conforme afirmou o presidente da Federação: O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – E o estádio, ainda falta muito para terminar? O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Bastante, bastante. Nós estamos com um contrato com o Paraná Clube, que tem a administração do estádio. E o estádio, eu diria que falta cerca de 60% ainda para poder ficar concluído. 3. SITUAÇÃO FISCAL/FINANCEIRA 3.1. IMPOSTO DE RENDA Inicialmente, foi observado que a Federação não entregou as declarações de Imposto de Renda de Pessoa Jurídicas referentes aos exercícios de 1996 e 1997. Como se não bastasse, as declarações referentes aos três anos seguintes contém, em todas as suas contas de todas as demonstrações, o valor 0,00. Com relação a situação fiscal descrita acima, Onaireves Nilo, quando inquirido em seu primeiro depoimento, não teve explicações para a forma como foi declarado o Imposto de Renda; comprometeu-se a enviar os balanços, o que o fez de forma bastante precária, dada a informalidade dos documentos e a falta de alguns deles. De todo modo, não ficaram esclarecidas as razões dos equívocos e omissões relacionados às declarações de Imposto de Renda da Federação, talvez por que não as tenha, sendo, de pronto, passível de ser indiciado por sonegação fiscal. 3.2. I NSS Com relação ao INSS, Onaireves Nilo deu uma série de explicações sobre a dívida da Federação com o Instituto, informando que teria optado pelo REFIS e que estaria em dia com o pagamento das prestações. Apesar disso, a informação dada pela Previdência Social impressiona pelo montante: em 22/11/2000 a Federação Paranaense possuía uma dívida, de R$ 4.889.753,69. Onaireves Nilo ainda foi preso em 08/07/2000, acusado de ter desviado, aproximadamente, R$ 525 milhões que os clubes encaminharam à Federação, a qual deveria efetuar o pagamento junto ao INSS. Por essa acusação, Onaireves Nilo responde a processo judicial em uma das Varas Federais do Paraná. 3.3. O GOVERNO MUNICIPAL COMO CREDOR Ainda existe a já citada dívida com o fisco municipal, no montante de 1,4 milhões de reais, a qual deu causa à intervenção. Segundo Onaireves Nilo, essa dívida foi negociada e a Federação vem pagando regularmente as parcelas. O principal questionamento desta CPI com relação a essas dívidas ficou sem respostas convincentes: como, de que maneira, em dezesseis anos à frente da Federação, Onaireves Nilo conseguiu endividar tanto o futebol paranaense? Que tipo de administração o levou a tamanho défcit? 3.4. OPERAÇÕES COM OURO Para finalizar a análise sobre a situação fiscal/financeira, cabe um breve comentário sobre sete operações no mercado flutuante com ouro, no montante de US$ 328.727,81, de 1995 a 2000. Segundo Onaireves Nilo, essas operações eram feitas automaticamente pelo Banco Bamerindus, a todo depósito cujo valor ultrapassasse 600 reais; como o dinheiro permanecia no banco, a espera da distribuição aos clubes, era automaticamente aplicado em ouro. 3.5. AS CONTAS BANCÁRIAS DA FEDERAÇÃO E DA COCEP Conforme comentado no item 2.2. acima, a Federação possui conta bancária que serve como uma espécie de “caixa 2”. Inicialmente criada para financiar a construção do estádio “Pinheirão”, a conta é, de fato, uma segunda conta da entidade. Segue, abaixo, trecho do primeiro depoimento do Onaireves Nilo: O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Uma pergunta: a conta n.º 7171-2, Agência 323, essa conta é da Federação? O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – A Federação, na verdade, ela tem... não a Federação. Nós temos duas contas no Banco do Estado do Paraná. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Isso. Essa é do Banco do Estado do Paraná. O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Exatamente. Uma é 70 e a outra é 71. A 71 é da Comissão de Construção do Estádio do Paraná. Ali nós depositamos valores arrecadados do patrimônio da Federação. Essa comissão é que movimenta, que administra, enfim, a obra do Pinheirão, a manutenção do patrimônio. Essa comissão foi criada em 1970. Não foi criada por nós. Nós simplesmente demos seqüência a essa comissão. Porque a Federação — deixa eu explicar bem isso — a Federação tem a finalidade de gerir futebol. A Federação não tem a finalidade de construir estádio ou de fazer obra. Então foi criada essa comissão para poder administrar a obra, enfim, o patrimônio. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Essa comissão, ela existe ainda? O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Existe. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – E essa conta existe? O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Existe, sim, senhor. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Pois é. Esse cheque da Traffic foi parar nessa conta. O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Bem, ocorre que, por alguns meses ou anos — anos eu não diria, meses — a conta da Federação, em função de dificuldades que nós tivemos, esteve sem condições de obter movimentação através de talão de cheque. Então, certamente, foi depositado nessa conta para poder fazer a movimentação. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Então, essa conta não serve só para construção do estádio. Serve também... O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Nesse momento de dificuldades que a Federação teve, ela serviu para movimentar outras coisas também. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Essa conta não está no nome da Federação? O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Está numa Comissão de Construção do Estádio Pinheirão, cujo presidente sou eu também. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Porém essa conta não é da Federação Paranaense de Futebol? O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Não. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Não é. O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Não é. Essa comissão tem um CGC próprio, certo, um outro CGC. Essa comissão existe desde 1970, como eu disse. 4. RELAÇÃO COM A CBF 4.1. MOVIMENTAÇÃO DE VALORES DA CBF À FEDERAÇÃO Ao contrário do que acontece com as demais Federações, a Federação Paranaense não recebe a “mesada” da CBF, e se orgulha por isso. Porém, em 2000, houve uma remessa financeira de R$ 100.000,00 em agosto, R$ 40.000,00 em setembro e R$ 60.000,00 em outubro, totalizando R$ 200.000,00 em um período eleitoral. Em seu segundo depoimento, Onaireves Nilo foi categórico em afirmar que não foi candidato e não apoiou ninguém; esse montante teria sido para sanar dificuldades financeiras. Há uma controvérsia entre a palavra da CBF e o que diz Onaireves Nilo: para a contabilidade da CBF, esse valor foi contabilizado como auxílio; já para Onaireves Nilo, trata-se de empréstimo, sendo que o presidente da entidade paranaense afirma que faz questão de devolvê-lo à CBF. 4.2. O QUE PENSA ONAIREVES NILO MOURA SOBRE A CBF Segue, abaixo, depoimento do Onaireves Nilo acerca da gestão da CBF: O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – O que o senhor acha da administração do Sr. Ricardo Teixeira à frente da CBF, Dr. Onaireves? O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – O futebol brasileiro, a cerca de, a partir de 1980 passou a ter algumas dificuldades. Porque o futebol brasileiro, a partir de 1970, com a criação da loteria esportiva, até a década de 80, teve, a CBF tinha um teste da loteria esportiva, os Clubes, as Federações tinham uma situação normal. A partir daí a CBF teve que buscar patrocínios. E a CBF obteve, com esse contrato que é feito com a Nike, a condição de poder liberar os clubes do pagamento de taxas de borderô, poder ajudar algumas Federações, patrocinar alguns campeonatos de categorias de base. Eu entendo que o fato da CBF ter conseguido esse contrato foi importante para o futebol brasileiro. Se não fosse esse contrato, em função das enormes dificuldades que tem o futebol brasileiro como um todo, também a Confederação estaria numa situação muito mais difícil do que está. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – O senhor me desculpe, Dr. Onaireves, então, o senhor acha que o Sr. Ricardo Teixeira faz uma boa administração na frente da CBF? O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Eu falei da assinatura do contrato com a, com esse empresa, acho que foi interessantíssimo porque, segundo me consta, é o maior contrato assinado por uma Confederação. 5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL : Não foi identificada, explicitamente, nenhuma doação da CBF ou da própria Federação a políticos do Estado, prática que foi negada pelo presidente da Federação Paranaense, em seu segundo depoimento a esta Comissão. Cabe registrar que Onaireves Nilo foi eleito Deputado Federal em 1990, quando já era presidente; porém, também negou qualquer utilização da Federação de Futebol para fins políticos. Foi cassado, sob acusação de ter pago US$ 50 mil para alguns parlamentares mudarem de partido. 5.1 RELAÇÃO COM CASAS DE BINGO Sabe-se que Onaireves Nilo é proprietário, juntamente com seus filhos, de várias casas de bingo no Paraná. Uma dessas casas seria a “Mônaco Bingo Show”, em Foz do Iguaçu. Essa casa é operada pela empresa Sport House Franquias, cujos sócios-proprietários são pessoas próximas da diretoria da Federação Paranaense de Futebol, além dos filhos do Onaireves Nilo Moura. O advogado Telmar Schossler (defende 17 das 28 ações trabalhistas contra a Sport House) enviou a esta Comissão cópias de depósitos bancários, no valor de R$ 8.000,00, da Federação Paranaense de Futebol para Maria Aparecida da Costa, administradora do bingo. Onaireves Nilo Moura disse que havia dado R$ 8 mil para um office-boy depositar para Maria Aparecida, mas a caixa do banco teria se enganado e colocado como remetente a FPF. As provas contra Onaireves Nilo Moura foram encaminhadas à CPI no início do ano 2001, após seus funcionários, revoltados com a falta de compromisso dos donos da casa, terem recolhido documentos comprobatórios da ligação direta do presidente com o bingo Mônaco. 6. CONTRATO COM TELEVISÃO Em uma análise global do contrato, esta CPI concluiu que a TV Paranaense adquiriu significativo poder de ingerência sobre o futebol do Estado, tornando-o refém da empresa, uma vez que até a tabela de jogos faz parte do contrato. Como ocorre em outras federações, o futebol paranaense também é vitima dos interesses comerciais, dentre eles e com maior força, o televisivo. 7. RELAÇÃO COM OS CLUBES A Federação paranaense permitiu a exploração de bingos de forma articulada com os maiores clubes do estado. Seguem trechos do primeiro depoimento do Onaireves Nilo: O SR. DEPUTADO EURICO MIRANDA – (...) O bingo era uma atividade, era considerado uma atividade legal ou não? O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA - Nós realizávamos os bingos no Paraná através de liminares conseguidas na Justiça, portanto eram legais. O SR. DEPUTADO EURICO MIRANDA - Eram legais porque se conseguia liminares na Justiça. Muito bem. E por que... A Federação realizava muitos bingos, né, realizou muitos bingos? O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA - A Federação e os clubes. Nós fazíamos... a Federação e todos os clubes do Paraná participavam dos bingos. Admitindo que... Londrina. Todas as cartelas vendidas em Londrina, o Londrina participava. Isso era, realmente, na época uma grande receita para os clubes. (...) O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA - Veja, quem geria o bingo não era exclusivamente a Federação. Era a Federação e os três clubes da Capital. Na época, ainda não existia o Paraná Clube, era o Colorado. Era Atlético, Coritiba, Colorado, a Federação e todos os clubes do Paraná. Então, nós fazíamos essas doações. Isso era anunciado de forma bastante transparente. Todos tomavam conhecimento de que havia essas doações e foram feitas. Em cada um dos festivais — nós chamávamos de festivais esses bingos — havia uma doação. O SR. DEPUTADO EURICO MIRANDA - E a fiscalização da aplicação disso? O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA - Bom, aí não compete à Federação fiscalizar essa aplicação. 8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DO FUTEBOL Há, entre a Federação paranaense e Juan Figer, uma relação de razoável aproximação. O empresário foi contratado pelo Atlético Paranaense, e provocou uma grande movimentação em termos de transação de atletas. Como há um Capítulo específico sobre a atuação e os negócios de Juan Figer neste Relatório, o presente item limita-se a registrar a relação e expor parte do depoimento do Onaireves Nilo sobre a questão: O SR. DEPUTADO EDUARDO CAMPOS – O senhor não tem participação na negociação, mas a Federação, ela registra atletas e atletas e atletas que são cedidos de um mesmo clube dos mesmos dois clubes no Uruguai? O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Não. A Federação, ela recebe o contrato, quando o clube contrata o jogador, ela recebe pra ser registrado e encaminhado à CBF. Todo jogador profissional, ele é registrado na Federação e na Confederação. Muito bem. Quando o atleta é vendido também vem o contrato de, digamos, de transferência e autorização pra que ele seja transferido para um clube nacional ou para um clube do exterior. E a Federação faz isso, o clube determina que se faça a transferência, a Federação faz. A quem, a quem está sendo transferido o atleta não compete à Federação discutir isso aí. Isso não compete à Federação. O SR. DEPUTADO EDUARDO CAMPOS - V.Sa. está tendo uma preocupação muito grande em dizer que não participa. Eu não estou querendo dizer que V.Sa participa das transações... O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA - O senhor quer saber se eu tenho conhecimento? O SR. DEPUTADO EDUARDO CAMPOS - Se o senhor tem conhecimento das transações. O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA - Ah! sim. Vamos, então. O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Ele acabou de dizer que trinta e tantos jogadores do Atlético Paranaense foram vendidos só no ano passo. Do Coritiba, quantos foram vendidos? O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Três. O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Do Paraná Clube? O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA - Dois. O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Do Irati? O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA - Que eu saiba nenhum. O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Do Londrina? O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA - Um O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Do Pato Branco? O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Nenhum. O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Então eu quero saber o seguinte? Por que o Atlético vende tanto jogador? O SR. DEPUTADO EDUARDO CAMPOS - Como é que é isso? O senhor sabe. Então, o senhor está aqui, o senhor sabe exatamente. O senhor não participa, é verdade. A Lei Zico, não tem percentual, mas o senhor sabe qual é a lógica, e nós estamos aqui pra lhe perguntar esperando que o senhor não falte com a verdade. O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA - Veja... Claro, nem estou aqui pra faltar com a verdade. Eu conheço o empresário Juan Figer há bastante tempo, não conheço tão bem pessoalmente como eu conheço as transações que ele fez já no futebol brasileiro, internacional, não é? Ele foi um dos primeiros empresários FIFA no Brasil. E ele fez diversas negociações para o São Paulo, para Palmeiras, enfim, para clubes do Rio de Janeiro, e o clube Atlético Paranaense também se utiliza desse empresário pra fazer negociações, principalmente com o interior, apesar dele também ter participado de negociações com clubes nacionais, no caso do Oséias, quando foi vendido ao Palmeiras, também o empresário nessa transação foi o Sr. Juan Figer. O SR. DEPUTADO EDUARDO CAMPOS - Como é que é o processo exatamente que envolve o Atlético, que é um clube federado à usa Federação, o empresário Juan Figer e o Rentistas e o Central Español? O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA - Veja, o... O SR. DEPUTADO EDUARDO CAMPOS – Por que isso só lá? Como é que se dá? Por que se dá? O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA - Bom, na verdade, o Clube Atlético Paranaense, há questão de, eu diria, três anos atrás, ele não fazia nenhuma transação com o exterior. Não fazia. As transações começaram a ocorre depois da participação desse Sr. Juan Figer como empresário do Clube Atlético Paranaense. Então, na verdade, os contatos que esse empresário tem com o exterior, com clubes do mundo inteiro, é que facilitaram essas negociações. Esse é o entendimento que eu tenho. O SR. DEPUTADO EDUARDO CAMPOS – Esses jogadores são... Os contratos que têm registro na Federação são contratos de cessão de jogadores do Rentistas ou do Central ao Atlético, ou a metade do passe pertence ao Atlético, do jogador? O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Vamos falar do caso mais recente. O Lucas, por exemplo, foi um atleta que foi comercializado pelo Atlético com o Botafogo de Ribeirão Preto. Foi comprado o Lucas mais dois jogadores — eram três jogadores — por 1 milhão e meio de reais. E daí foi vendido a esse Rentistas, do Paraguai, ou melhor do Uruguai, 50% do valor desse passe. Isso seis meses depois, eu diria, da aquisição. O Atlético comprou do Botafogo e daí vendeu metade do passe para esse Rentistas. E, depois, quando vendeu, ele vendeu os seus 50% ao Rentistas, que daí vendeu ao exterior. Isso é o que eu sei pela documentação que entrou na Federação e saiu da Federação. O SR. DEPUTADO EDUARDO CAMPOS – O senhor conhece a situação econômico-financeira do Atlético Paranaense. Como é que é? Ele é um clube que… O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Eu diria que o Atlético Paranaense conseguiu, com essa vinculação com o Sr. Juan Figer, vamos chamar assim, com esse contrato, não sei que tipo de relacionamento comercial ele tem, mas, depois desse relacionamento, o Atlético conseguiu construir o seu centro de treinamento, conseguiu construir o seu estádio, conseguiu saldar até impostos que tinha atrasados na área da Previdência, enfim, com essas transações. Eu diria que o Atlético conseguiu neste período arrecadar um dinheiro invejável para... Tanto é que hoje a sua situação patrimonial é muito diferente daquela que tinha há três anos atrás. 9. CONCLUSÕES , ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES Da análise de todos os documentos e dos depoimentos de Onaireves Nilo Moura, conclui-se que a Federação Paranaense de Futebol é gerida de forma temerária nos campos administrativo, fiscal e financeiro. Constatou-se sonegação fiscal, ingerência de ordem econômica da Federação sobre os clubes e da empresa transmissora de jogos sobre a Federação. Além disso, a Receita Federal deve ser comunicada para que examine as contas bancárias utilizadas pela Federação, em especial aquela constituída para a construção de estádio de futebol. Recomenda-se uma reforma estatutária para limitar o mandato da diretoria da entidade em no máximo quatro anos, impedindo a recondução aos cargos; para permitir uma maior autonomia do conselho fiscal; para obrigar a realização de licitação para a aquisição de bens e de material esportivo; e para estabelecer maior transparência nas contas da Federação e nos repasses de verbas que envolvam a entidade e os clubes. Sugere-se encaminhar o presente Relatório à Receita Federal, ao Ministério Público Federal, ao Ministério Público do Estado do Paraná e ao Ministério Público Eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná, com base na Lei n.º 9.504/97. PERNAMBUCO 1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DAS FEDERAÇÕES : O estatuto da entidade, alterado pela última vez em 04/07/2000, por assembléia geral extraordinária, dispõe que a Federação Pernambucana de Futebol é uma “sociedade civil para fins desportivos, com personalidade jurídica e patrimônio próprios” (art. 1º). Trata-se de uma entidade sem fins lucrativos. O estatuto define como “poderes” da entidade: a assembléia geral, o Conselho Fiscal, a Diretoria e a Presidência (art. 6º). 2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA: A Federação é presidida por Carlos Alberto Gomes de Oliveira. 3. SITUAÇÃO FISCAL E FINANCEIRA 3.1. DOAÇÕES DA FEDERAÇÃO A TERCEIROS A Federação Pernambucana pagou à empresa Brasifactor Fomento Comercial Ltda, em diversas parcelas, o montante de R$ 397.569,15, em 1998, e de R$ 44.000,00, em 1999. Conforme depoimento do presidente da Federação, esse dinheiro refere-se a contratos que os clubes Náutico e Santa Cruz fizeram com a mencionada empresa, como adiantamento dos recebimentos que estes teriam, fruto do contrato entre a Federação e a Secretaria da Fazenda do Estado (referente à troca da nota fiscal por ingressos). Assim sendo, a Secretaria repassaria à Federação uma determinada verba, e parte desta seria encaminhada a cada um dos clubes envolvidos. A empresa Brasifactor anteciparia a receita dos clubes. A Brasifactor que tem como um dos seus dirigentes o presidente do Sport Recife o Deputado Federal Luciano Bivar. Outra movimentação observada pela CPI refere-se a que envolve a empresa Meta Iniciativas Culturais e Marketing, beneficiada, em 1998, por um montante equivalente a R$ 600.000,00. Em seu depoimento, o presidente da Federação esclareceu o fato: “ Marketing, foi o seguinte: o Governo para promover a campanha Todos com a Nota, fez uma concorrência e essa empresa ganhou a concorrência do Governo. Então, ela fez toda a publicidade da campanha Todos com a Nota, e a federação pagava para ela, porque as verbas do Governo, ele já repassava para a federação com o compromisso de pagar as notas.” Quanto à movimentação financeira gerada pelo programa “todos com a nota”, verifica-se um aumento significativo no ano de 1998. Carlos Alberto tentou esclarecer a movimentação em seu depoimento, deixando, no entanto, dúvidas quanto às diferenças verificadas nos diferentes períodos. Seguem, abaixo, trechos do seu depoimento: O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Dr. Carlos Alberto, por quais motivos o ano de 98 se destaca como o que mais teve doações da federação a terceiros? Se o senhor quiser ver a tabela: 95, R$275.000,00; 96, R$541.000,00; 97, R$781.000,00; 98, R$2.604.190,00... O SR. CARLOS ALBERTO GOMES DE OLIVEIRA – Por causa desse projeto. O dinheiro entrou e o dinheiro saiu. Relação das doações da Federação a terceiros, incluindo os valores referentes ao programa “Todos com a nota” Ano Valores (em reais) 1995 275.000,00 1996 541.902,18 1997 781.938,86 1998 2.604.109,68 1999 1.804.075,14 2000 1.031.947,54 3.2. INSS Junto à previdência social, a Federação tem uma dívida de R$ 28.604,70, não tendo optado pelo programa REFIS. 4. RELAÇÃO COM A CBF Entre os anos de 1998 e 2000, a CBF não repassou verbas mensais regulares à Federação Pernambucana, limitando-se a ter encaminhado R$ 100.000,00, de uma só vez, em novembro de 1999. O presidente explicou que se tratava de uma remessa para o Náutico, de Recife: “Eu tô falando isso porque a Federação Pernambucana nunca recebeu um centavo da CBF. Eu nunca recebi um centavo da CBF. Os senhores podem encontrar aí uma transferência de cem mil reais, mas foi para o Náutico a pedido do Deputado Wilson Santos(?), do Deputado Inocêncio Oliveira que foram ao Ricardo Teixeira e pediram e ele mandou para o Náutico. E eu tenho o recibo aqui do Náutico recebendo os cem mil reais e vou mostrar aos senhores. A Federação como instituição nunca recebeu um centavo de CBF.” Curioso é o fato de que o Náutico não vem recebendo recursos da CBF, nem da Federação Pernambucana, pelos dados obtidos por esta Comissão. Já o Sport recebeu próximo de R$ 3 milhões, da CBF, e cerca de R$ 2 milhões da Federação, nos últimos cinco anos. O Santa Cruz, R$ 140 mil, da CBF, e R$ 1,13 milhão da Federação. Conforme critério adotado e publicamente assumido por Ricardo Teixeira, apenas as entidades com dificuldades financeiras seriam beneficiadas por repasses mensais da CBF. Por esse critério, a Federação Pernambucana estaria, aos olhos da CBF, em uma situação considerável estável. Em seu depoimento à CPI, o presidente da Federação afirmou que a aprovação das contas da CBF não se dá de forma adequada. À assembléia são disponibilizadas informações contábeis de maneira tal que seus membros ficam impossibilitados de realizar qualquer tipo de conferência. A aprovação se dá, pois, sem o conhecimento real das contas e de forma sumária, contrariando qualquer regra de probidade e transparência. O presidente da Federação pernambucana questiona, em seu depoimento, a postura da CBF em face à própria gestão do futebol brasileiro, em especial no tocante à ausência de uma direção específica para o futebol. É o que nos aponta o depoimento: “Então, era um dilema terrível que eu não tenho hoje mais, porque os clubes já têm quem os defenda, não precisam mais de mim, eu esto livre, stand-by, para dizer aos senhores aqui o que estou dizendo ao Brasil: o futebol brasileiro está desorganizado, o futebol brasileiro está sem comando, a CBF está desde janeiro sem um diretor técnico e de futebol, em cima de uma competição, fervendo uma competição, que é a Copa do Brasil. E, na iminência de começar o campeonato brasileiro, não tem um diretor de futebol. Isso é um descaso administrativo que nós não podemos concordar”. 5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL Não foram levantadas informações e denúncias relevantes no tocante à relação entre a Federação Pernambucana de Futebol e a política local. 6. CONTRATOS COM A TV Conforme documentação encaminhada à CPI, a Federação Pernambucana firmou os seguintes contratos envolvendo a transmissão de jogos de futebol por TV: Contrato de cessão de direitos com a Traffic Assessoria e Comunicações S/C Ltda., prevendo-se a exclusividade “absoluta” dos direitos de exploração, por parte da Traffic, dos jogos dos campeonatos pernambucanos da 1ª divisão dos profissionais, dos anos de 1995 a 1998, com a possibilidade de multa, em caso de rescisão e contra o culpado pela rescisão, no valor de R$ 1.538.916,00 (o dobro das parcelas que a Traffic obriga-se a pagar); Contrato de intermediação com a Traffic Assessoria e Comunicações S/C Ltda., o qual prevê o recebimento, pela Federação, de R$ 47.520,00 pelo papel de intermediação desta junto aos clubes, tendo como referência o contrato acima, vigente entre os anos de 1995 a 1998; Contrato de cessão de direitos com a Luva – Propaganda e Promoções Ltda., prevendo-se a exclusividade “absoluta” dos direitos de exploração, por parte da Luva, dos jogos dos campeonatos pernambucanos da 1ª divisão dos profissionais, dos anos de 1999 a 2002, num valor total de R$ 2.146.000,00, com possibilidade de multa, em caso de rescisão, e a permissão para a empresa comercializar os direitos adquiridos com terceiros, sem a necessidade de permissão da Federação; Contrato de cessão de direitos de transmissão do campeonato profissional de futebol da temporada do ano 2000, tendo como cedente a Costa Dourada Mídia e Eventos Ltda., como cessionária a TV Globo de Recife Ltda, e como anuente a Federação Pernambucana de Futebol. A cessionária passa a gozar do direito de transmissão da temporada, mediante pagamento à cedente de valor correspondente a R$ 870.000,00, além do já compromissado conforme contrato acima, de R$ 550.000,00 em favor da Federação. Da análise dos contratos celebrados pela Federação envolvendo a transmissão dos jogos dos campeonatos pernambucanos de futebol, desde 1995, conclui-se que a Federação “vendeu” seu produto de qualidade por preço insatisfatório, considerando-se ainda como custo a possibilidade real de intromissão das empresas contratadas na definição de calendários, detalhes, critérios e participantes dos campeonatos. Do depoimento do Carlos Alberto, confirma-se a qualidade do produto vendido pela Federação: “Nós fizemos um contrato com a Traffic, na esperança de transmitir nosso campeonato. A Traffic comprou nosso campeonato e botou na gaveta. Aí, não passou nenhum jogo. Foi aí que eu rompi com a Traffic e fiz um contrato com a luva co-assegurado pelo Luciano do Valle, que começou a transmitir os jogos do Campeonato Pernambucano. Os jogos eram transmitidos na segunda-feira à noite, tinham uma audiência muito grande, e aí a Globo interessou. Então a Globo mandou me chamar no Rio de Janeiro. Disse: Eu quero o Campeonato Pernambucano. Eu digo: Olha, eu sou um homem de palavra. Meu campeonato eu vendi a Luciano do Valle, e já ofereci à Rede Globo a mais de 5 anos e os senhores nunca me deram a menor atenção. Eu vendi a Luciano do Valle e chegou. Eu vendi a Luciano. Luciano é que começou a desenvolver através da TV de Pernambuco que era do Governo naquela ocasião. E o Campeonato ganhava em mídia da Globo. Foi um sucesso a segunda-feira as 8, porque era o melhor dia para televisão, segunda-feira às 8. Aí, a Globo em cima. Eu digo: olhe, eu não abro mão de Luciano do Valle. Os senhores conversem com Luciano do Valle. Eles conversaram com Luciano do Valle e Luciano fechou com eles e fechou o contrato com a Globo.” 7. RELAÇÃO COM OS CLUBES Dos documentos enviados à CPI e da ouvida do Carlos Alberto Oliveira, não apuramos problemas relevantes na relação entre a Federação e os clubes. Registrese, no entanto, o protesto do presidente da Federação, publicado pela imprensa em novembro de 2000, contra a idéia dos clubes bahianos Bahia e Vitória, e do pernambucano Sport de Recife, quanto à possibilidade destes não disputarem mais os respectivos campeonatos estaduais, mas apenas o Campeonato do Nordeste. 8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DO FUTEBOL O Deputado Federal José Mendonça denunciou, em Sessão dessa CPI, que o empresário José Luiz Galante, atuante no estado de Pernambuco, explorava atletas adolescentes, impondo-lhes contratos com cláusulas explicitamente abusivas. Conforme investigado por essa CPI, e tendo acesso a um dos contratos do José Galante, encaminhado pelo mencionado Deputado, o “empresário” José Luiz Galante atua em duas atividades: na intermediação de contratos entre Federações e a Telemar, com o objetivo de imprimir cartões telefônicos com as marcas dos clubes; e no agenciamento de atletas junto aos clubes. O Deputado José Mendonça apresentou à CPI o contrato entre o mencionado empresário e o atleta Laércio José dos Santos. 8.1. CONTRATO ENTRE EMPRESÁRIO JOSÉ LUIZ GALANTE E ATLETA O contrato denomina o empresário de representante, e o atleta de representado. Conforme o contrato, o tempo do atleta seria dedicado exclusivamente a atividades desportivas. Na hipótese de se tratar de adolescente (maior de doze e menor de dezoito anos), a cláusula contraria o que dispõe o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que determina ser a educação direito da criança e do adolescente e dever do Estado. A prioridade nesta fase não é o trabalho, mas a educação, e ao tratar de atividade laboral, esta deve se pautar na formação técnica do indivíduo. O objeto do contrato é a regulação da relação profissional entre as partes, o que põe em dúvida um elemento essencial no contrato de trabalho entre o atleta e o clube, que é a vontade. A ingerência do empresário como representante do atleta na relação de emprego deste com o clube, é estranho ao Direito do Trabalho. Prevê-se, pelo contrato, que a atuação do empresário não se limitaria ao território nacional, se estendendo ao exterior. O deslocamento do atleta menor de dezoito anos é regulado pelo ECA. O contrato, mesmo que assinado pelos pais ou responsáveis do adolescente, não pode conter uma liberalidade geral ao empresário, a ponto deste promover deslocamentos ou viagens do menor. Cada viagem ao exterior deve ser acompanhado de uma autorização prévia, o que não é previsto no contrato. O contrato dispõe sobre o direito exclusivo do empresário à exploração da imagem do atleta. Em outra cláusula, o empresário passa a ser credor de 10% de todos os ganhos do atleta, inclusive seus salários, o que também contraria os dispositivos do Direito do Trabalho (já que os salários são irrenunciáveis). O prazo de vigência do contrato é de dez anos, o que demonstra o quanto é arbitrário o instrumento. A parte que der causa à rescisão do contrato ou que contrariar seus dispositivos, deverá pagar multa de dois milhões de dólares à outra. O valor estabelecido como multa desrespeita os princípios gerais dos contratos, seja ao dispor sobre valor que exorbita, em muito, o próprio objeto do contrato, ou ao promover um imenso desequilíbrio entre as partes. Na hipótese do atleta desejar rescindir o contrato, certamente não poderá fazê-lo, Sendo assim, configura-se uma situação de “compromisso” do atleta análoga ao trabalho escravo (neste sentido, a legislação brasileira conta com importantes inovações que prevêem tais situações, a saber: as Leis nº 8.683/93 e nº 9.777/98). É prevista ainda a possibilidade de solução de conflitos por meio da figura do “árbitro”, sem que haja um detalhamento das suas atribuições no contrato. Ao dispor sobre arbitragem sem um regramento específico, que permitam a liberdade e o equilíbrio das partes, o contrato provoca uma situação de temeridade para o atleta, tendo em vista o evidente desequilíbrio entre as partes contratantes. Tendo em vista o que dispõe o contrato, trata-se de mais uma cláusula que proporciona ao empresário um pleno domínio sobre a vontade do atleta. Perguntado sobre o pagamento de R$ 89.658,00, em 01/02/2000, a José Luiz Galante, o presidente da Federação respondeu que esse valor referia-se à parte do empresário quando da intermediação no contrato firmado entre a Federação e a Telemar. Carlos Alberto Gomes de Oliveira afirmou ainda que o referido empresário é, hoje, “persona non grata” nos meios futebolísticos de Pernambuco. Seguem, abaixo, trechos do depoimento do Carlos Alberto acerca do mencionado empresário: O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – O senhor José Luiz Galante atua como empresário de jogador em Pernambuco? O SR. CARLOS ALBERTO GOMES DE OLIVEIRA – Até essa data, pra mim, ele atuava como empresário assim de arranjar contratos. Depois que o Santa Cruz me denunciou que ele tinha, digamos, procuração de jogadores, que eu achei um absurdo, e eu vi um contrato, eu mandei um recado para que ele não me procurasse mais na federação, porque eu não o receberia mais. Eu não gosto de explorador de menino. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Então, o senhor, como Presidente da Federação, não tinha conhecimento desses contratos. O SR. CARLOS ALBERTO GOMES DE OLIVEIRA – Nenhum. Eu fiquei horrorizado, o sujeito pegar um menino e botar uma multa de 2 milhões de dólares. Isso não existe, não cabe na cabeça de ninguém. É a escravidão branca. 9. CONCLUSÕES , ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES Da análise de todos os documentos e do depoimento do presidente da Federação Pernambucana de Futebol, verificam-se problemas de ordem administrativa, financeira e fiscal. Constatou-se ausência de entrega de declaração de Imposto de Renda nos exercícios de 1996 e 1997. Suspeita-se de ingerência e controle político da emissora de TV sobre a Federação, ao menos no ano de 2000. Recomenda-se reformar os estatutos para suprimir a possibilidade de remunerar os dirigentes da entidade e para limitar o mandato da diretoria da Federação em um máximo de quatro anos, além de se buscar impedir a recondução aos cargos, permitir uma maior autonomia do conselho fiscal, obrigar a realização de licitação para a aquisição de bens e de material esportivo e estabelecer maior transparência nas contas da Federação e nos repasses de verbas que envolvam a entidade e os clubes. Sugere-se encaminhar o presente Relatório à Receita Federal, ao Ministério Público Federal, ao Ministério Público do Estado da Pernambuco – no tocante ao tratamento que o empresário José Luiz Galante dispensa a atletas adolescentes, e no que se refere à provável ingerência de empresas transmissoras de jogos pela TV sobre os critérios e calendários dos campeonatos pernambucanos, assim como a escolha dos clubes participantes –, e ao Ministério Público do Trabalho – em face da imposição contratual que o empresário José Luiz Galante ao atleta, em que o mesmo pode vir a ser tratado em situação análoga ao trabalho escravo. PIAUÍ 1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DA FEDERAÇÃO Conforme seu Estatuto, a Federação de Futebol do Piauí é sociedade civil de direito privado, com personalidade jurídica própria, regida pelos artigos 20 e 23 do Código Civil Brasileiro. Trata-se de típica entidade de direito privado sem fins lucrativos. 2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA Luís Joaquim Lula Ferreira preside a Federação há oito anos. Anteriormente, Luís Joaquim foi tesoureiro e diretor financeiro da entidade. O que mais chamou atenção a esta Comissão, no tocante à situação administrativa da Federação Piauiense, foi o fato de seus dirigentes estarem totalmente voltados, até 1999, para a operacionalização do bingo Poupa Ganha, o que consumia todo o esforço administrativo daquela entidade. Analisando o estatuto, percebeu-se desvio dos objetivos capitulados nas alíneas do art. 3º. Questionado sobre o assunto, seu presidente, Luís Joaquim Lula Ferreira, afirmou que assembléia geral da entidade havia deliberado favoravelmente à vinculação da Federação com os bingos: “O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Permite, foi os próprios clubes que decidiram, porque era um repasse que era feito diretamente aos clubes de futebol. Foi quem conseguiu em 97 e 98 segurar o futebol do Piauí. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Consegue dizer qual é o artigo do estatuto que permite? O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Não, isso foi decidido em assembléia geral. Pra gente assinar, nós convocamos uma assembléia geral.” No item seguinte, o bingo será examinado de forma mais detalhada. Não foi constatada remuneração oficial da Federação aos seus dirigentes. 3. SITUAÇÃO FISCAL E FINANCEIRA 3.1. IMPOSTO DE RENDA E OUTROS TRIBUTOS A Federação não entregou as declarações de Imposto de Renda de Pessoa Jurídicas referentes aos exercícios de 1996 e 1997. A entidade também não recolheu o COFINS, conforme as declarações de Imposto de Renda. Perguntado à respeito, Luís Joaquim não esclareceu o assunto: “O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - O que nós estamos observando aqui esse Imposto de Renda é a questão como outras Federações, não é exclusividade do senhor, também não têm recolhido o COFINS. O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Tem que ver com minha contabilidade.” A Federação declarou à Receita Federal ser proprietária de bem imóvel de valor inexpressivo, incompatível com a qualificação do imóvel mencionado por Luís Joaquim: “O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - A Federação do Piauí tem algum bem imóvel? O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Tem o prédio dela. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Tem um prédio? O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Tem sim, senhor, um prédio próprio.” 3.2. F EDERAÇÃO E BINGO Fazendo um cruzamento de sua movimentação financeira e o que foi declarado à Receita Federal, esta CPI deparou-se com um paradoxo: o de como uma entidade que tem a receita bruta (desconsiderando todas as despesas) de R$ 1.304.090,71, entre 1997 e 1999, poderia ter gasto, no mesmo período, a quantia aproximada de R$ 6.867.660,00, sendo R$ 2.588.397,00 com compras de veículos e R$ 4.279.263,00 em premiações. Uma análise mais pontual dos cheques revelou que a Federação foi uma das operadoras do bingo Poupa Ganha, com cerca de 97% de sua movimentação financeira relacionada com as atividades necessárias para o funcionamento do bingo. Apesar de constarem em sua relação de cheques emitidos retenções e recolhimentos do Imposto de Renda, relativos aos prêmios pagos em dinheiro, não foi constatada, em suas declarações e em seus balanços, qualquer indicação da atividade de bingo por parte da Federação, apesar do expressivo dinheiro mencionado anteriormente. O Poupa Ganha “passa ao largo” nos documentos fiscais da Federação de Futebol do Estado do Piauí. Com efeito, o art. 75 do Estatuto da Federação traz a seguinte vedação: “Art. 75 Além das proibições resultantes dos deveres impostos neste Estatuto e na legislação vigente, é expressamente vedado às Ligas Municipais e Associações: ............................................................... 3- Interessar-se em apostas de qualquer espécie de jogo proibido ou permitir que se façam em suas dependências;” Ainda relacionado ao bingo, a movimentação bancária da Federação revelou que vários prêmios foram adquiridos, ou pagos, através de valores em espécie oriundos de cheques nominais emitidos pela própria Federação. O procedimento mais comum seria emitir o cheque nominal à concessionária do veículo ou ao ganhador do prêmio, como, aliás, por vezes aconteceu. Acerca dos bingos, seguem abaixo trechos do depoimento do Luís Joaquim que esclarece a potencialidade do negócio e o controle da exploração dos bingo sobre a entidade que tem por função a valorização do futebol: “O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - A Federação recebia quanto? O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Sete por cento. Na... no bingo de dezessete a dezoito mil O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO –Dezessete a dezoito mil? O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - É. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - O que o senhor disse ao Ministério Público Federal é que a Federação recebia entre trinta e quarenta mil mensais. O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Não, eu tô falando em termos de bingo, dependendo da (Ininteligível.). O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - Do bingo, pois é. O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Pois é, isso é por semana. Isso é em... em... todo é... esse bingo era semanal. Era semanal. Dependia do mês, ele podia chegar a trinta, a quarenta mil reais. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - Pois é, a movimentação bancária do senhor mostrou... da Federação mostrou uma movimentação pelo menos dez vezes superior a isso. O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA – Ah, tudo bem, mas é o que nós recebíamos. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Mas o senhor fala de trinta e quarenta mil reais e tem uma constatação de dez vezes acima desse valor. O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Olha, veja (Ininteligível.). O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - O senhor confirma isso? O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA – Não, veja o seguinte: eu disse agora pra... a Receita, a gente conversando, eles mostraram agora uma conta... tinha uma conta do Poupa-Ganha que era em nome da Federação que era pra compra da venda das cartelas. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - Eu não entendi. Pode repetir por favor. O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Tinha uma conta do... do Poupa-Ganha em nome da Federação, com procuração pública pra eles, que eles colocavam da venda das cartelas na conta da Federação, que eles movimentavam. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - Sonegação fiscal, movimentação (ininteligível.) não declarada. O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Não, eles me garantem que tá tudo legal. O que eles passam pra gente é isso: a coisa que (ininteligível.) pra V.Exa. Nós acreditamos (Ininteligível.) O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - A Federação não tem assessoria jurídica, não tem advogado? O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Tem sim, senhor. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Tem? O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA –Tem, e a gente... (?) O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - E esses contratos que o senhor firmou com o Poupa-Ganha não passou pela consultoria jurídica. O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Nós conversamos com todos, até com os próprios filiados. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - E os advogados disseram que tá tudo bem, que tá tudo OK, ninguém (ininteligível) nada. O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Não, no início tava tudo OK, não tem por que reclamar. Nós tamos agora recebendo a coisa que eu tô dizendo a V.Exa. da fiscalização da Receita. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - Quarenta por cento de sonegação fiscal? O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Eu não sei. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - É o que tá aqui (Ininteligível.) O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Eu não... O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - O senhor sabe quem sabe? O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Hum. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - O Ministério Público e a Polícia Federal. O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Tudo bem. Nós falhamos na defesa. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - Eles sabem disso. O senhor não sabe. O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Não, eu tô sabendo a coisa que eu tô dizendo pra V.Exa: a Receita Federal foi até nós e nós tamos junto ao Poupa-Ganha pra provar isso a eles. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - Tem um número aqui, Sr. Luís, que me impressiona, Presidente: de 97 a 2000, houve uma movimentação dessa história do Poupa-Ganha, certo, de ... de compra de carros de 6,5 milhões de reais de compra de veículos. É muita coisa, é não, Sr. Luís? O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Eles compravam toda semana seis carros, eram premiados seis carros. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - Seis carros toda semana? O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Toda semana. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - Um negócio gigantesco esse, hein? O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Era seis... seis carro toda semana, com certeza. Não era só no Piauí.” (g.n.) Outros aspectos importantes sobre bingos foram tratados no depoimento do Luís Joaquim. Quanto ao histórico da relação entre bingos e Federação piauiense, o presidente esclarece a questão em seu depoimento: O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Do início do pedido até, do iniciozinho, que decidiu que ia ter esse bingo, até a autorização do INDESP, quanto tempo demorou? O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA – Não, veja bem o Senhor, esse bingo começou no Piauí em 95, não com a Federação. Em 95, esse bingo começou com o Piauí, lá no Piauí, e foi até com um filiado nosso, o River Atlético Clube, porque em 97, o próprio Paulo Guimarães resolveu fazer com a Federação, porque tava ajudando só o River, e começou uma pressão, tanto da parte da..., porque lá os dois clubes de maiores torcidas é River e Flamengo. A torcida do Flamengo começou a não comprar, a fazer uma pressão pra ajudar o esporte num todo. Aí, foi decidido fazer com o nome da Federação, que essa repassaria para os clube. Então, em 95 a 97 foi feito com o River Altético Clube, em 97 a 99 feito com a Federação de Futebol. Em novembro de 99, desculpe, não é 97, em 99, passou a ser feito com o Comitê Olímpico Brasileiro. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Depois que fechou o Poupa-Ganha nessa relação de bingo com a Federação do Piauí, a Federação continuou fazendo bingos? O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA – Nós temo um bingo permanente, que é o Bingo Royale, é aquele de salão de jogos só. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Que é de propriedade da Federação? O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA – Não, não, não, não, nós só cedemo o nome da entidade pra realização do bingo, nós não fizemo nenhum bingo. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – E qual é a arrecadação com esses bingos? O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA – É 7%, o do Pupa-Ganha dava... O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – A Federação cedeu o nome... O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA – Cede o nome pra empresa.” Já no que se refere à fiscalização da prestação de contas dos bingos pela Federação, observa-se uma absoluta precariedade, mesmo considerando-se que o responsável pelo bingo, o Paulo Guimarães, está sendo processado por sonegação de impostos: “O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – A Federação faz fiscalização sobre esse, esses bingo pra ver se esses 7% tá correto ou tá sonegado? O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA – Faz, eles mostram a vendagem, o Poupa-ganha mostrava a vendagem de cartela toda, que vinha pra... O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Isso aí é tranqüilo, mostrar a vendagem, ... O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA – É verdade. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - ... a gente mostra. O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA – É, não adianta eu também dizer aqui pro Senhor ou a Federação. Ele mostrava e a gente concordava. A gente tinha confiança, como temo confiança. A coisa que eu digo pra V.Exa.: o Paulo Guimarães pra gente é um empresário da cidade, conhecido, que tem residência fixa lá. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – E sonega imposto em Minas Gerais. Então, ... O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA – V.Exa. tá dizendo, eu não...” 3.3. OUTRAS MOVIMENTAÇÕES A movimentação bancária também revelou que houve vários depósitos de cheques emitidos pela Federação, nominais a ela própria, em bancos nos quais a entidade sequer possuía conta corrente. 4. RELAÇÃO COM A CBF Como acontece com as demais Federações, também ocorreram doações questionáveis da CBF. Em setembro de 1998, a Confederação repassou R$ 36.000,00 à Federação Piauiense, seis vezes a mais que nos meses anteriores e posteriores. Setembro foi exatamente o mês anterior às eleições. Ficou sem explicação em que foi gasto esse dinheiro “extra”. A seguir, gráfico com doações da CBF para a Federação: NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/2000 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/99 NOVEMB JULHO MAIO MARÇO 70.000 60.000 50.000 40.000 30.000 20.000 10.000 0 JAN/98 R$ SETEMB DOAÇÕES DA CBF PARA A FEDERAÇÃO DE FUTEBOL DO PIAUÍ 1998 - 2000 MESES Fonte: Contabilidade CBF / CPI CBF Nike Ainda cabe destacar que o Presidente da Federação Piauiense admitiu que esteve presente na reunião que aprovou as contas da CBF, em 1998 e 1999. Nessa reunião, foram aprovadas as contas da Confederação relativas a 1998, ano em que a CBF contratou os dois primeiros empréstimos junto ao Delta Bank, transações que estão sendo investigadas por esta CPI. 5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL Não foi identificada, explicitamente, nenhuma doação da CBF ou da própria Federação a políticos do estado, tendo inclusive a negativa do presidente da Federação, durante seu depoimento; restou apenas a “coincidência” de datas apontada no item anterior. O proprietário do bingo Poupa Ganha, Paulo Guimarães, foi citado no Relatório da CPI do Narcotráfico, que sugeriu ampliar investigações sobre o bingo. Segundo concluiu a CPI do Narcotráfico, o crime no estado do Piauí tem uma forte base no desmonte de veículos e na fraude de seguros. Como a Federação premiou seus ganhadores com inúmeros veículos, pode-se dizer que houve um incremento de aproximadamente R$ 2.600.000,00 no comércio de veículos do Piauí, o que, teoricamente, aumentaria a possibilidade de desmonte de veículos e fraudes a seguros. 6. CONTRATO COM TELEVISÃO A Federação do Piauí, e dez clubes locais, assinaram contrato com o Sistema Timon de Radiodifusão Ltda., para a transmissão dos jogos do campeonato pela TV da temporada 2000. O contrato está plausível, não havendo ingerência do meio de comunicação na condução das atividades futebolísticas no estado. 7. RELAÇÃO COM OS CLUBES Não houve denúncias ou informações relevantes sobre a relação entre clubes e Federação. No entanto, cabe o registro sobre o grau de desinformação do presidente da Federação do Piauí no tocante ao futebol amador do seu estado. Esse tema merece relevo tendo em vista que a Federação movimentou um valor expressivo de dinheiro na exploração de bingos e, por outro lado, não conhece a realidade do futebol local. Seguem trechos do seu depoimento: O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Também quero registrar que não tenho nenhuma oposição a que o futebol receba dinheiro público. Se o Estado pode dar, o Governo, a União pode dar bilhões de dólares de subsídios para empresas multinacionais que se instalam no Brasil, que não recolhem impostos — como deu recentemente para a Ford lá no Estado da Bahia, mais de 1 bilhão e 600 milhões —, dá na Zona Franca de Manaus, dá no Brasil inteiro, por que que não pode dar pro futebol também? Por que não pode dar subsídio, e isenção fiscal para os clubes e as federações? O problema é dar, e quem recebe prestar contas, porque é uma forma de dinheiro público. O clube então presta contas: “ Deixei de recolher tais impostos, contribuições e taxas, e apliquei esse dinheiro no centro de treinamento, no amparo de crianças, na assistência médica, odontológica, escolar”, eu acho que essa é que é a questão. A minha opinião é que o Estado deve também subsidiar o esporte, se subsidia bancos, empresas multinacionais que fazem um PROER pra enterrar 20 bilhões de dólares, então, que subsidie crianças também, que podem jogar, se proteger da droga e da marginalidade jogando futebol. Agora, a contrapartida é que os clubes e as federações devem prestar contas disso, porque é dinheiro do povo; não é nem prestar contas porque é dinheiro público, é dinheiro do trabalhador. Seu Luís quanto praticantes de futebol há no Piauí, entre profissionais, amadores, quantos praticantes? O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA – Excelência, na federação, a federação, quando nós assumimos, nós acabamos com as ligas, ficamos só com os times profissionais, coisa que tô dizendo pra V.Exa, hoje nós temos 7 times profissionais, e os outros 3, a Sociedade Esportiva Tiradentes, que só tá com um time sub-15, sub-17; o Piauí Esporte Clube, e o (Ininteligível) Esporte, que também estão com sub15, sub-17, sub-20. O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Você não sabe, então? O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA – Não, não sei mesmo. O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Certamente o senhor foi em Floriano, em Parnaíba, em Picos, em Piripiri, ... O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA – Não. O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Em Santa Cruz, em qualquer cidade do Piauí o senhor vai encontrar 4, 5, 8, 10 times. O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA – Não...é isso que eu tô dizendo... O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Quantas pessoas, quantos atletas, entre amadores e profissionais, praticam o futebol do Piauí? Eu pergunto isso porque no Brasil, a Fundação Getúlio Vargas calcula que 22 milhões de brasileiros são praticantes desse esporte no País, o que mostra o peso e o significado que ele tem para o Brasil. Quantos têm no Piauí? Porque eu quero levar essas informações também pra pôr no relatório, pra mostrar pra CBF que isso também é futebol. Quer dizer, o futebol não é só o salário de 400 mil reais que o Flamengo paga pro Gamarra, ou que o Santos paga pro Rincón, ou que o Palmeiras e o Vasco podem pagar pro Edmundo ou sei lá pra quem, pro jogador lá que ganha... O futebol também é essa prática amadora, muitas vezes só do time que se reúne fim de semana, que eu acho que integra esse patrimônio comum que é o futebol, que a CBF tem que levar em conta, que as federações também tem que levar em conta. É por isso que estou pedindo essa informação, se o senhor tem. O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Não, senhor, tenho não, os dados corretos eu não tenho.” 8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DO FUTEBOL Também não houve denúncias ou informações relevantes sobre a relação entre Federação e empresários do futebol. É relevante registrar que a relação entre bingos e Federação conta com a presença do empresário Paulo Guimarães, que não explorava apenas bingo mas outras atividades, conforme esclareceu Luís Joaquim em seu depoimento: “O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - ... ele como V.Exa. tá falando, ele é um empresário, que tem um canal de televisão no Estado do Piauí, tem um jornal, tem..., a revendedora da, da Chevrolet é dele, tem uma distribuidora de remédio, tanto no Piauí, Maranhão e Ceará, e, eu lhe digo com toda franqueza, não sabia.” 9. CONCLUSÕES , ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES Da análise de todos os documentos e do depoimento do Luís Joaquim, conclui-se que a Federação Piauiense de Futebol tem uma gestão temerária, seja em termos administrativo, financeiro e fiscal. Constatou-se sonegação fiscal e ingerência de atividade estranha ao futebol (bingos) na Federação. Por esses motivos, recomenda-se reforma estatutária para limitar o mandato da diretoria da entidade em no máximo quatro anos, impedindo a recondução aos cargos e para permitir uma maior autonomia do conselho fiscal, além de se estabelecer maior transparência nas contas da Federação e nos repasses de verbas que envolvam a entidade e os clubes. Sugere-se encaminhar o presente Relatório à Receita Federal, ao Ministério Público Federal, ao Ministério Público do Estado do Piauí – no tocante à ingerência da atividade relacionada a bingos –, e ao Ministério Público Eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba, com base na Lei nº 9.504/97. RIO DE JANEIRO 1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DA FEDERAÇÃO : O Estatuto da Federação do Rio de Janeiro prevê, em seu art. 1º, que sua personalidade jurídica seja de uma sociedade civil, constituídas pelas Associações e Ligas Municipais, para fins desportivos. Cala, portanto, sua norma fundadora e reguladora de suas atividades, sobre maiores detalhamentos de sua qualificação jurídica, o que nos remete à legislação geral, qual seja, o Código Civil Brasileiro. 2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA : O Presidente da Federação, Sr. Eduardo Augusto Viana da Silva, está a frente há dezesseis anos. Não há previsão estatutária para que receba remuneração. Também não foi constatado nenhum pagamento que indicasse remuneração ao Sr. Eduardo Viana. Cabe explicitar que a mídia, sistematicamente, afirma que o Sr. Eduardo Viana vem se perpetuando à frente da Federação Carioca, em troca de favores às ligas municipais interioranas e aos pequenos clubes. Os jornais apontam ainda o crônico déficit da Federação carioca como conseqüência das despesas geradas para viabilizarem tais favores. Questionado sobre essas colocações da mídia, o Presidente da Federação explicou o que consta nas alíneas de “a” a “e”, do art. 16 do Estatuto: quantidade de votos diretamente proporcional à qualificação técnica do Clube, ou seja, time de primeira divisão teria direito a mais votos do que time teoricamente mais desqualificado tecnicamente. Porém, esta CPI entende que tal fórmula de eleição não garante que haja paridade eleitoral, senão vejamos: é trivial que clubes grandes e pequenos não comungam de interesses comuns; como a quantidade de clubes e associações menores é muito grande em relação aos clubes com direito a mais votos (86 contra 12), a equação eleitoral fica desequilibrada, o que torna perfeitamente factível que os pequenos possam decidir o resultado das eleições. E como quem pode decidir são aqueles com menor capacidade técnicofinanceira, e por isso, naturalmente mais vulneráveis a qualquer tipo de acordo ou favores, o Senhor Eduardo Viana, alia-se aos interesses dos pequenos, fornecendo suporte financeiro, material, prestando favores, havendo, com isso, uma cooptação inconsciente dos pequenos. Assim, o Presidente vem se mantendo há dezesseis anos no comando do futebol carioca, a despeito de uma administração constantemente deficitária, a despeito do descrédito que o futebol carioca enfrenta, da oposição dos torcedores, enfim, a despeito de atitudes, muita das vezes ditatoriais, que maculam a tradição do futebol do Rio de Janeiro. Ressalte-se que o Sr. Eduardo Viana é cientista político, professor universitário da matéria, portanto, tecnicamente habilitado para “trabalhar” qualquer processo eleitoral. Tal habilidade restou comprovada, quando trouxe a baila, durante seu depoimento, autores e personagens renomados da Ciência Política. Ressalte-se ainda que ele participou da elaboração do Estatuto da Federação, onde constam as regra da eleição. CRÍTICAS À LEGISLAÇÃO ESPORTIVA Há 16 anos no comando da FERJ, Eduardo Viana, 62 anos, fez críticas duras a legislação desportiva. Considera que o País é infeliz em matéria de legislação, comparada com a era Vargas, que teve a melhor legislação desportiva, considerando em relação ao momento histórico. Analisou como modismo a Lei Zico e cheia de inconstitucionalidades. Quanto a Lei Pelé, fez críticas severas, considerando que ela é a grande culpada pela crise que se alastra no futebol. “Essa lei só prejudica o esporte” disse o dirigente. Ela apenas modificou 11% da Lei Zico e serviu apenas para dar sanha a uma vaidade pessoal e que a Nação paga pelo preço da irresponsabilidade dessa nova lei. Perguntado sobre o processo eleitoral informou que este se processa por intermédio do voto plural paritário por nível de vinculação técnica. A prática do voto plural foi motivação de ações judiciais e ocorreu após a mudança estatutária da Federação. Não existe processo de voto por procuração. Sobre os campeonatos regionais argumenta que estes representam a vivência das células comunitárias em todos os segmentos, são mais de 600 clubes profissionais no Brasil , que tendem a extinção se não ocorrem mudanças. O Futebol pode ficar reduzido com 15 a 30 clubes, o que considera uma grande ameaça. Para a grande mídia não interessa Ter pequenos clubes competindo, para ela interessa poder contar e realizar jogos de grandes símbolos nacionais. O futebol não é o futebol das grandes agremiações. O futebol é um fenômeno no Brasil, é uma atividade social, melhor definindo, que alcança as áreas mais restritas e menos aquinhoadas da sociedade brasileira, acrescenta o dirigente. Em seguida, afirmou o Sub-Relator Léo Alcântara: “O SR. DEPUTADO LÉO ALCÂNTARA - Sr. Presidente, companheiros Deputados, Sr. Eduardo Viana. Sr. Eduardo Viana, o senhor é presidente de uma federação importante, federação carioca que, juntamente com a paulista, detêm, eu acho que provavelmente, 70% do futebol nacional em termos de importância e de volume de recursos que movimenta. Em primeiro lugar, eu queria deixar V.Sa. bastante tranqüilo com relação à imparcialidade com que essa CPI vem hoje aqui a Belo Horizonte. Eu sempre, quando tenho sido procurado, seja pela imprensa, seja por colegas, eu sempre tenho procurado agir com a imparcialidade em que o meu mandato e a minha qualidade de SubRelator das federações exigem. Quando sou indagado sobre irregularidades nas federações, eu sempre tenho dito que houveram denúncias, mas eu só irei me pronunciar sobre elas após ouvir as explicações de V.Sas., porque a partir daí é que eu poderei fazer um julgamento. Denúncias são feitas muitas, e a maioria irresponsáveis. Então eu não posso fazer com que a minha boca seja a boca de pessoas que não têm responsabilidade. Então daí a minha total imparcialidade em estar aqui hoje presente para que nós possamos tirar quaisquer dúvidas que existam e, mais ainda, o que nós da CPI queremos levar, e faremos em nosso relatório final, é sugestões para que o futebol brasileiro volte a ser o que era. Sugestões até mesmo para V.Sas., porque quando passamos muito tempo vivenciando uma realidade, talvez fique até difícil a gente olhar outras sugestões que iriam aumentar e proporcionar melhorias nas entidades de V.Sas. e no futebol, porque o futebol é de interesse público e de interesse nacional. Isso é o que eu tenho procurado fazer e acredito que tenho feito com responsabilidade.” 3. SITUAÇÃO FISCAL/FINANCEIRA A Federação não entregou as Declarações de Imposto de Renda de Pessoa Jurídicas referentes aos exercícios de 1996 e 1997. Questionado sobre tal fato, informou que não declarava, achando não ser obrigatório, uma vez que era isenta. Perguntado sobre o déficit, o Sr. Eduardo Viana relatou acontecimentos pontuais, tais como “WO” em jogos, fracasso do contrato com a TV Bandeirantes, problemas com a loteria esportiva e outros, que não explicaram o porquê da constância dos déficit, mesmo a despeito de um incremento na receita, como o observado em 1999 (181,6% a maior que 1998). Nesse mesmo ano, a despesa com manutenção foi 113,7% maior que em 98, fato que suscitou a seguinte dúvida: Como pode tais despesas dobrarem, se o Ativo Permanente praticamente se manteve o mesmo?? (R$ 1.205.551,92 em 1998, e R$ 1.562.463,16 em 1999). Depreende-se, sem dificuldades, que despesa com manutenção, basicamente, cuida do Ativo Permanente. As respostas, mais uma vez não foram convincentes, gerando uma série de outras dúvidas e inconsistência entre respostas e levando à conclusão de que a entidade gasta mais do que poderia, e que tais gastos são precariamente lançados na contabilidade da Federação. Ainda como exemplo do descontrole contábil aparecem os pagamentos das quantias de R$ 220.000,00 ao Sr. Aremithas José de Lima, funcionário do Clube Regatas Vasco da Gama, e R$ 100.000,00 ao Sr. Juan Figer Svirski, empresário que faz a intermediação de jogadores. Sobre esses pagamentos, o Sr. Eduardo Viana não soube dar explicações (uma alta quantia paga a pessoas físicas, por uma entidade deficitária) e prometeu enviá-las a esta CPI, o que, dez dias após seu depoimento, ainda não havia ocorrido. 4. RELAÇÃO COM A CBF: Inquirido sobre a relação da Federação Carioca com a CBF, o Sr. Eduardo Viana esclareceu que era membro nato da Assembléia Geral e que, eventualmente, recebia ajuda da Confederação, citando o montante recebido em dezembro de 1988 (R$ 155.000,00), a título de auxílio, quando a Federação passava por dificuldades financeiras. Outros montantes menores foram repassados durante o ano de 1998, totalizando R$ 249.205,00, que não figuraram na declaração de Imposto de Renda. Também sobre essa omissão, o Presidente da Federação entrou em contradição por diversas vezes, sem conseguir ser convincente. A seguir, gráfico com as doações da CBF para a Federação: NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/2000 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/99 NOVEMB SETEMB MAIO JAN/98 180.000 160.000 140.000 120.000 100.000 80.000 60.000 40.000 20.000 0 MARÇO R$ JULHO DOAÇÕES DA CBF PARA A FEDERAÇÃO DE FUTEBOL DO RIO DE JANEIRO 1998 - 2000 MESES 5. CONTRATO COM TELEVISÃO Uma análise do contrato da federação com a TV Globo, revela que a TV Globo adquiriu uma enorme capacidade de ingerência sobre o futebol do Estado do Rio de Janeiro, tornando-o seu refém, uma vez que até a tabela com jogos a serem realizados compõe o contrato, como anexo. A predominância da emissora foi corroborada com a multa que a Globo anunciou que aplicaria à Federação Carioca, em abril de 2001, no valor de nove milhões de reais! Segundo o Sr. Eduardo Viana, nada foi pago nem o será; pelo visto, a Justiça decidirá. A impressão que fica para esta Comissão é que, verdadeiramente, como nas outras federações, o futebol carioca também é vitima dos interesses comerciais, dentre eles e com maior força, o televisivo. RIO GRANDE DO NORTE 1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DAS FEDERAÇÕES Conforme estatuto da entidade, cuja reforma foi registrada em 21/07/1997, a Federação Norte-Riograndense de Futebol é uma “sociedade civil, para fins desportivos, com personalidade jurídica (...) e patrimônio próprio” (art. 1º), tendo como objetivos: “dirigir (...) o futebol amador e profissional, promovendo a sua difusão e aperfeiçoamento”; “promover campeonatos, torneios e competições de futebol”; “incentivar, por meios de processos educativos compatíveis com o fundamento da atividade institucional, a cultura moral, cívica e intelectual, sobretudo no meio das gerações ais novas”; “estimular (...) a criação de bibliotecas”; e “facilitar o progresso material e técnico de suas filiadas” (art. 2º). Trata-se de típica entidade de direito privado sem fins lucrativos. O estatuto define como “poderes” da entidade: a assembléia geral (composta, conforme o art. 16, das associações das divisões de profissionais da capital, das associações de amadores da capital e do interior e das ligas), o Tribunal de Justiça Desportiva, o Conselho Fiscal, a Presidência e a Diretoria (art. 15). Os membros desses “poderes” são proibidos de receber “qualquer forma” de remuneração “pelas funções que exercem na Federação” (art. 10, § 3º). 2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA Nilson Gomes da Costa ocupa o cargo de presidente da Federação há três mandatos, ou oito anos. 3. SITUAÇÃO FISCAL E FINANCEIRA 3.1. IMPOSTO DE RENDA E BENS NÃO DECLARADOS A Federação, no período entre 1995 e 2000, apenas declarou Imposto de Renda relativo aos exercícios de 1998 a 2000. Nestas declarações, não constam bens imóveis ou veículos de propriedade da Federação. Ocorre que ao depor a esta CPI, Nilson Gomes disse que a Federação tem como bem um estádio de futebol. Diante da contradição entre seu depoimento e o que declarou à receita federal, o presidente afirmou que aceitaria abrir seu próprio sigilo bancário, fiscal e telefônico. Acerca do estádio e da exploração de lojas, não registradas em qualquer declaração de Imposto de Renda, transcrevemos o seguinte depoimento do Nilson Gomes: “O SR. NILSON GOMES DA COSTA – Mas... o ano passado a Federação construiu algumas lojas pra... tanto pra servir seus filiados como pra Federação alugar, para ter também alguma fontezinha de renda. E contou exatamente com o apoio do Presidente Ricardo Teixeira. Como também as Ligas, clubes amadores, que são em torno de quase... (...) Tem um estádio antigo que..., onde funciona a sede da Federação. Era, foi o primeiro estádio construído em Natal, um terreno doado pelo exGovernador Juvenal La Martini, que foi construído esse estádio. O terreno é do Governo do Estado. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Então sim, então, tem um estádio. Além do estádio, qual outro patrimônio? O SR. NILSON GOMES DA COSTA – Não tem nenhum outro patrimônio. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – E essa questão da construção de lojas que o senhor disse? O senhor disse que tava construindo lojas para auferir aluguel. O SR. NILSON GOMES DA COSTA – É, tem o estádio, e na frente do estádio nós fizemos as lojas, as salas servem para alugar e a Federação aluga a trezentos reais para cada. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – E quando que foi feita, e quando foram feitas essas salas? O SR. NILSON GOMES DA COSTA – Foram feita o ano passado. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Ah, o ano passado. O SR. NILSON GOMES DA COSTA – Foi. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Então, só dizer pro senhor... O SR. NILSON GOMES DA COSTA – Todas as lojas prontas. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - ...,então, pro senhor não esquecer de declarar que foi, que tem essas salas no Imposto de Renda este ano, ano/base, ano passado, bem como declarar que a Federação tem um estádio, porque pela Receita Federal, ela não tem patrimônio nenhum na Declaração do Imposto de Renda. O SR. NILSON GOMES DA COSTA – É, o terreno, o terreno é do Governo do Estado. Agora, o estádio é que é da Federação. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – O terreno é... O SR. NILSON GOMES DA COSTA – É do Governo do Estado. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Aí, tem concessão de uso legal? O SR. NILSON GOMES DA COSTA – Isto foi feito na época, hoje, inclusive há a possibilidade até do Governo receber de volta esse terreno. Eles tão querendo não só do estádio da Federação, mas como outros, outras, como... Tem outro clube lá também que tem o clube dessa maneira, e que eles conseguiram tomar agora recentemente. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Então, o que nós podemos dizer é que esse patrimônio é administrado pela Federação, porém, não é da Federação. O SR. NILSON GOMES DA COSTA – Não é da Federação. O terreno, não. Quando construíram, foi construído, naturalmente com a ajuda também do Governo, que faz muitos anos, não sei, sessenta, setenta anos, e que ele hoje é utilizado apenas para os jogos amadores de segunda ao sábado.” 3.2. RECEITAS DA FEDERAÇÃO E DESCOMPASSO COM A CONTABILIDADE DA CBF As receitas contabilizadas pela Federação Norte-Riograndense de Futebol são de pequena expressão. De acordo com a demonstração de resultados enviados à CPI, nos últimos anos sua receita foi a seguinte: RECEITAS ANUAIS DA FEDERAÇÃO (1997 A 2000) Ano Receita (R$) 1997 231.483,12 1998 105.078,99 1999 741.233,19 2000 Não disponível Com relação à receita declarada na demonstração de resultados, observamos que no ano de 1998 há uma discrepância em face dos valores enviados pela CBF. Tendo como base o livro razão da entidade, a CBF enviou, em 1998, R$ 155.920,00 para a Federação Norte-Riograndense, o que sugere que um montante de no mínimo R$ 50.841,01 deixou de ser contabilizado, visto que a Federação possui outras fontes de receita. As declarações de Imposto de Renda a partir do ano de 1998 não fornecem dado algum sobre as receitas da Federação e suas despesas. Conforme a análise dos balanços da Federação, não foram contabilizadas as verbas recebidas pela CBF; em seu depoimento, porém, o presidente da entidade alega que a contabilização foi feita. A Federação Norte-Riograndense emitiu cheques de valores altos ao portador, o que demonstra irregularidade no procedimento bancário. Os valores, nesses casos, são de R$ 12.252,65 (em 26/10/1998, Banco Itaú) e de R$ 14.054,95 (em 28/02/1996, Banco Itaú). Outros cheques foram emitidos, aparentemente, ao portador, sendo o nome do beneficiário colocado posteriormente. O presidente da entidade queixou-se, em sessão desta CPI em João Pessoa, ter dificuldades financeiras para gerir a Federação. Por outro lado, ele não explicou como a movimentação da entidade acabou por beneficiar algumas pessoas, a saber: Judas Tadeu Gurgel (recebeu R$ 46.770,61, através de cheque nominal em 18/08/1999), Antônio Ricardo Araújo Carvalho (recebeu R$ 46.770,61, através de cheque nominal em 18/08/1999), Carmem Lúcia de O. Alves (recebeu R$ 45.000,00 através de cheque nominal em 28/04/2000), Jaerson José de Amorim (recebeu R$ 10.358,10 em 15/07/1997; R$ 12.907,63 em 25/08/1998, R$ 10.604,44 em 06/10/1998 e R$ 12.206,28 em 08/10/1998, todos em cheques nominais), Aluizio Pedro dos Santos (recebeu R$ 14.097,27, por meio de cheque nominal em 23/10/1998), além do Diretório Municipal do PFL de Natal (beneficiado com R$ 1000.000,00). Não restou esclarecida, nas pesquisas dessa CPI, a relação entre esses beneficiários e os objetivos estatutários e legais da Federação Norte-Riograndense. 4. RELAÇÃO COM A CBF 4.1. VERBAS DA CBF À FEDERAÇÃO A Federação Norte-Riograndense recebeu da CBF, nos anos de 1998 a 2000, os seguintes valores: em 1998, R$ 6.780,00 por mês, com as exceções dos meses de abril, setembro, outubro e dezembro, cujas parcelas foram de, respectivamente, R$ 27.120,00, R$ 21.780,00, R$ 21.780,00 e R$ 31.000,00; em 1999, o repasse mensal foi de R$ 12.780,00, com as exceções dos meses de janeiro (R$ 6.780,00), julho (não houve), setembro (R$ 20.780,00) e novembro (R$ 30.780,00); em 2000, o valor de R$ 12.780,00 foi percebido nos meses de janeiro a março, maio a julho, novembro e dezembro, sendo que em abril o valor foi de R$ 62.780,00, em agosto de R$ 52.780,00, em setembro de R$ 112.780,00 e em outubro de R$ 32.000,00. Percebe-se que os anos eleitorais de 1998 e 2000 foram marcados pelo aumento de repasses, exatamente em períodos próximos às datas em que os pleitos foram realizados. DOAÇÕES DA CBF PARA A FEDERAÇÃO NORTERIOGRANDENSE DE FUTEBOL 1998 - 2000 R$ 120.000 100.000 80.000 60.000 40.000 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/2000 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/99 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO 0 JAN/98 20.000 MESES Fonte: Contabilidade CBF / CPI CBF Nike Nilson Gomes negou que a Federação tenha recebido verbas extras da CBF, referindo-se em especial àquele valor de R$ 100.000,00, em 19 de setembro de 2000 (cheque da CBF ao Diretório Municipal de Natal do Partido da Frente Liberal). Alega que se houve repasses extras, foram destinados aos clubes, via Federação; o estranho é que esse mecanismo não é comum e sequer há registros desse procedimento nas contas da Federação. Conforme afirmou em depoimento na cidade de João Pessoa à esta CPI, as únicas receitas da Federação Norte-Riograndense são principalmente os repasses da CBF, e secundariamente as rendas dos jogos, os quais têm uma média de mil e quinhentos torcedores. 4.2. ASSEMBLÉIA DA CBF E A FEDERAÇÃO Perguntado se compareceu à assembléia geral da CBF que aprovou as contas da gestão de 1998, em janeiro de 1999, o presidente da Federação NorteRiograndense respondeu que as contas são feitas pelo conselho fiscal e aprovada pela assembléia. Expôs, em seu depoimento, o mecanismo de aprovação que, de fato, não esclarece as contas para os membros da assembléia, a exemplo do que ocorreu quando da aprovação do empréstimo envolvendo o Banco Delta: “Bom, já foi mais ou menos explicado, mas a prestação de contas da CBF é examinada pelo Conselho Fiscal e emitido um parecer. E esse parecer, com toda a documentação, é colocado à disposição dos membros da Assembléia. Na verdade, não é dito, não é lido naquela hora, porque foi aprovado pelo Conselho, para aprovação dos Clubes. Não me recordo de que ele tenha falado quanto pagou ou de quanto foi o empréstimo. Salvo engano, acho que não houve esse assunto.” (g.n.) 5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL Três fatos são relevantes na relação entre a Federação NorteRiograndense de Futebol com a política local: o primeiro, já apontado acima, diz respeito a um substancial aumento de repasses da CBF para a Federação em períodos próximos às datas dos pleitos eleitorais nos anos de 1998 e de 2000. O segundo, também levantado acima, refere-se à doação de R$ 100.000,00 ao Diretório Municipal do PFL de Natal (RN), efetuada nos dias que antecederam o pleito eleitoral de 2000. O terceiro fato, que combina-se ao primeiro, é que nas eleições de 2000, Nilson Gomes da Costa foi candidato eleito a vereador no município de Parnamirim (RN). Considerando esses fatos, suspeita-se que há uma forte relação de financiamento entre a entidade de administração do desporto do Rio Grande do Norte, e a política local, a ser confirmada futuramente pelo Ministério Público. 6. CONTRATOS COM A TV A Federação Norte-Riograndense de Futebol não possui contratos de transmissão de jogos com emissoras de televisão. 7. RELAÇÃO COM OS CLUBES Segundo informações oriundas da quebra de sigilo bancário da Federação, verificou-se o repasse de verbas da Federação, por meio da emissão de cheques, aos clubes ABC Futebol Clube e ao América Futebol Clube (cada um recebeu, em 28/03/2000, R$ 15.000,00). Foi identificado também um pagamento ao presidente do ABC Futebol Clube, Judas Tadeu Gurgel, em 18/08/1999, no valor de R$ 46.770,61 (outros cheque, de valor idêntico, foi emitido em favor de Antônio Ricardo Araújo Carvalho). Em seu depoimento, o presidente não justificou esses pagamentos, sendo que não é costumeiro que a CBF repasse verbas para clubes via Federação, como Nilson Gomes afirma ter ocorrido no caso da Federação NorteRiograndense. Segundo depoimento do Nilson Gomes, a Federação NorteRiograndense de Futebol não cobra nada dos seus filiados. 8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DO FUTEBOL Do depoimento do Nilson Gomes, apenas foi apurado que o empresário de nome José Luiz Galante, envolvido em negociações de atletas em Pernambuco, limitou-se a intermediar o contrato entre a Federação Norte-Riograndense e a Telemar, que vigeu em 2000, e teve como objeto a publicidade dos clubes em cartões telefônicos. 9. CONCLUSÕES , ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES Da análise de todos os documentos e do depoimento do Nilson Gomes da Costa, conclui-se que a Federação Norte-Riograndense de Futebol vem sendo gerida de forma temerária, em especial nos aspectos administrativo, financeiro e fiscal. Constatou-se sonegação fiscal. Verificou-se, ainda, forte suspeita de beneficiamento eleitoral em favor do presidente da Federação Norte-Riograndense e do PFL de Natal (RN). Recomenda-se uma reforma estatutária para limitar o mandato da diretoria da entidade em no máximo quatro anos, impedindo a recondução aos cargos; para permitir uma maior autonomia do conselho fiscal; para obrigar a realização de licitação para a aquisição de bens e de material esportivo; e para estabelecer maior transparência nas contas da Federação e nos repasses de verbas que envolvam a entidade e os clubes. Sugere-se encaminhar o presente Relatório à Receita Federal, ao Ministério Público Federal, ao Ministério Público Estadual e ao Ministério Público Eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Norte, com base na Lei nº 9.504/97. RIO GRANDE DO SUL 1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DAS FEDERAÇÕES : A Federação Gaúcha de Futebol (FGF), conforme seus estatutos, é uma “associação civil de direito privado, de caráter e fins desportivos, sem fins lucrativos” (art. 1º). O art. 5º, § 5º, do estatuto, impede a remuneração dos dirigentes, no entanto e de forma contraditória, o mesmo dispositivo prevê a possibilidade de recebimento de honorários, a serem arbitrados pela Diretoria, em decisão unânime. Em seu depoimento a essa CPI, o presidente da entidade confirmou que a Federação não visa lucros e que não remunera seus dirigentes. 2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA A Federação Gaúcha de Futebol é presidida por Emídio Odósio Perondi há mais de nove anos. A entidade não encaminhou documento contábil algum requisitado por esta CPI. Mais ainda, impetrou mandado de segurança junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), para evitar a quebra de seus sigilos bancário e fiscal. Diante disso, vê-se que a FGF procurou, de muitas maneiras, trazer obstáculos aos trabalhos de investigação desta Comissão Parlamentar de Inquérito. 2.1 CHEQUES NOMINAIS À FGF DEPOSITADOS EM OUTRAS CONTAS CORRENTES A Federação vem emitindo muitos cheques nominais à própria entidade, uma grande parte deles descontada em espécie. Conforme apurado pela CPI, muitos desses cheques nominais, emitidos pela FGF, foram depositados em contas correntes diversas. Tal procedimento não é apropriado se se pretende dar transparência aos atos da entidade. Dois desses exemplos são as empresas Núcleo Promoções e Eventos Ltda. e a Duplo Distr. de Bilhetes Promocionais Ltda. Nos dois casos, a Federação emitiu os cheques em seu nome e eles foram depositados nas contas das empresas, após o endosso. Quando questionado sobre isso, o senhor Perondi respondeu: “O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Como eu disse pro senhor, nós analisamos o sigilo bancário da federação e há muitos cheques da Federação Gaúcha que são nominais, ou à própria federação, ou a bancos, como no caso da conta do... como é o caso do Banco do Brasil. A que título os cheques não são emitidos corretamente, com o favorecido identificado? O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Olha, especialmente, (ininteligível.) federação e retira o dinheiro, porque a gente, quando sai pro interior do Estado — isso é contumaz; não agora, porque nós tamos com pouco dinheiro —, quando tem dinheiro, nós distribuímos para os clubes 2 mil, 5 mil, 3 mil. Nós fizemos muito disso, fizemos muito disso, pra escolhinhas de futebol. E a documentação é farta e está lá. É só pegar... me dar os dados, que o senhor terá. Não tem mistério nenhum. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – E a Núcleo Promoções e Eventos, eu vou dar uma idéia pro senhor, que eu volto a ela. No ano de 2000, portanto, bastante recente, dia 07/08/2000, foi depositado um cheque de 30 mil pra essa empresa. O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Núcleo... O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Núcleo Promoções e Eventos Ltda. A que se deve esse pagamento? O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Mas eu tenho certeza de ter lá e lhe mando... até quarta-feira tá nas suas mãos, em Brasília.” (g.n.) 3. SITUAÇÃO FISCAL E FINANCEIRA A Federação, no período entre 1995 e 2000, apenas declarou Imposto de Renda em 1998, 1999 e 2000. Nessas ocasiões, a Federação declarou-se “entidade isenta”, em que pese, conforme se verá abaixo, tenha se envolvido com empresa de bingo e contratado transmissão de jogos, atividades que geraram altos rendimentos. 3.1 INSS 252.687,82. Junto à previdência social, a Federação Gaúcha tem uma dívida de R$ 3.2 FEDERAÇÃO GAÚCHA E BINGOS A Federação Gaúcha, conforme seus estatutos, não tem como finalidade envolver-se com bingos. Ao tratar das receitas da entidade (art. 70), os estatutos também não prevêem a utilização de bingos ou mecanismos similares. O presidente da entidade, em seu depoimento, confessa que a Federação contratou bingos por meio da empresa “Assessoria e Marketing e Promoções Real Ltda.” e fez, desse procedimento, uma fonte de receitas. Aparentemente, ao mesmo tempo em que executou uma atividade sem relação com o futebol, a Federação beneficiou uma empresa sonegadora de impostos. Segue, abaixo, parte do depoimento: “O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – É bingo, é bingo. E a federação, em função desses bingos... isso aí só me trouxe incômodo e ações. Só com Imposto de Renda fui autuado... um ano e meio... (...) Com essa empresa aí, pelo espaço de agosto de 94, se não me falha a memória, a março de 98. Quando a empresa foi autuada, ela foi autuada, eu rescindi o contrato no outro dia. E obviamente não existia a lei que... hoje a lei aplica só na firma prestadora de serviço, e as federações e os clubes caem fora. E eu ainda estava enquadrado. Porque antes era a federação ou os clubes responsáveis por esses... por esses valores. E o Imposto de Renda nos atuou a nós e à empresa: a empresa, uns 14 milhões e nós 8 milhões e pouco. Inclusive, com o .... sei lá, aquilo, 1 milhão e 600, que é até fora da lei. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Então, era um contrato que a Federação tinha... O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - Que tem o clube comigo, lá. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Que tinha? O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - E podem mandar todos eles. Querendo, né. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Então, para nós é interessante, porque essa empresa... o senhor tá dizendo que ela foi condenada. Realmente, ela foi. O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - É. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - E, a posteriori, ela foi também condenada a indenizar pessoas que foram agredidas por seguranças dela, pela 1ª Câmara Especial e Cível de Porto Alegre. Ela teve, depois, também, condenação por agressão física. O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - Não ela é horrível, é horrível, só isso que eu digo. Entrei e não posso dizer que não teve boa-fé ou má-fé. Mas isso, aí, foi penalizado, e penalizado e penalizado forte. Mas, tudo bem. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - E por que a Federação pagava esses valores a ela? Porque, na nossa análise, não consta entrada de dinheiro dessa empresa para a Federação, mas saída de dinheiro. O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - Tenho. Tomara que tenha. Eu tenho direitinho, doutor, todos os pagamentos de todos os meses. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Que consta um pagamento de 118 mil, em 96; depois, consta mais 110 mil em junho de 96... essa foi 21 de junho. Que foi feito outro em junho. (...) O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - Pode ver aqui, ó: isso aqui foi um financiamento feito no Banco do Brasil. Fizemos na empresa. Está lá, dentro da contabilidade tudo marcado. Que eu adiantei para essa empresa. (...) O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - E a empresa pagou de volta esse dinheiro? O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - Não pagou ainda, está me devendo. Estou pagando. Ah! tá me devendo. Fica claro que tá me devendo. Isso é verdade? Eu não sei se isso aqui atinge, aqui. Isso aqui é um comércio normal, que eu perca ou que eu ganhe. E, aqui, ninguém... eu não perdi nada, aqui, ainda. Eu só disse que a empresa que me prejudicou foi em função do seu... dos seus problemas pra fiscalização que me arrastou junto antes da nova lei, que os senhores mesmos fizeram. (...) O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Sr. Emídio, eu vou voltar só um pouquinho: essa parceria com o bingo durou quanto tempo? O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - Foi de quatro... foi de agosto de 94, agosto de 94 a março de 98. Eu, agora, fiquei... março de 98, sim. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Março de 98? O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - É. Desde os contratos que ele tinha. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - E essa... essas empresas de bingo chegou a dar prejuízo em algum momento? O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - Para a Federação? O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Para a Federação. O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - Se não me pagarem, estão pagando lentamente 3 mil, 4 mil, 2 mil, agora, terá prejuízo. Mas o que se recebeu da... do Real Bingo foram 220 mil, um ano, mais ou menos isso. E da Marte, mais ou menos, uns 130 mil, 140 mil. Está tudo contabilizado. Vocês podem também mandar, achando que devo mandar, lhe mando direitinho.” 3.3 EMPRÉSTIMOS A TERCEIROS MESMO ESTANDO A FEDERAÇÃO EM CRISE O Presidente da Federação, em seu depoimento, afirma que a entidade está em situação deficitária, e para evitar a falência, recorreu a contratos de transmissão de jogos pela TV. Ocorre que, diante de tal crise, a entidade foge do que estabelece seus estatutos (art. 72) e empresta dinheiro, é o que afirma Emídio Perondi, abaixo: “O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - Não, não, não. Eu tenho certeza que não, doutor, isso é outra coisa. (Ininteligível) César Cabral, que é meu funcionário do TJD. Paulo Quintana Cabral? Não me vem o nome agora. Eu empresto dinheiro, também, lá. Lá, não digo... tenho dinheiro emprestado lá. Pra Presidente de Clube também empresto dinheiro.” (g.n.) Cabe ressaltar que o senhor Perondi se refere ao funcionário do TJD (Tribunal de Justiça Desportiva) como sendo dele. O TJD, pelo estatuto da Federação, art. 9°, § 2°, é, na realidade, uma “unidade autônoma e independente da FGF”. O § 3° do referido artigo ratifica esse entendimento: “Os órgãos de Justiça Desportiva terão a composição, organização, administração, funcionamento e competência previstos na legislação desportiva”. 3.4 OUTRAS MOVIMENTAÇÕES DUVIDOSAS O presidente da Federação, em seu depoimento, não esclareceu as movimentações da entidade envolvendo instituições como a Núcleo Promoções e Eventos Ltda. (citada no item 2.1., acima) e o Sindicato dos Estabelecimentos da Cultura Física, e pessoas como Luiz Tadeu Ceccato e outros. 4. RELAÇÃO COM A CBF A Federação Gaúcha recebeu da CBF, entre 1998 e 2000, os seguintes valores: R$ 6.000,00 em março de 1998 e R$ 30.000,00 em dezembro de 1998; R$ 80.000,00 em janeiro de 1999 e R$ 60.000,00 em agosto de 1999; e R$ 50.000,00 em setembro de 2000. Perguntado a esse respeito, responde o presidente da entidade: “O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Por exemplo: 50 mil, em setembro de 2000. Isso foi bem recentemente. O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Tá. Torneio que foi repassado, tenho absoluta certeza, pra atividade que patrocina um torneio deste ano que agora tamos entrando, com mais de 120 Municípios. Ano passado foram 117 Municípios. Este ano são 120 Municípios. Chamase Futebol Sub-20, que é patrocinado... a CBF deu auxílio de 50 mil.” Curiosamente, o auxílio da CBF a um torneio municipal se dá exatamente no mês anterior à eleição aos cargos municipais. Ao enviar verbas para a Federação para que esta distribua a clubes de âmbitos municipais, revela uma aproximação razoável de objetivos de financiamentos eleitorais. A seguir, gráfico com os repasses da CBF: NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/2000 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/99 NOVEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/98 90.000 80.000 70.000 60.000 50.000 40.000 30.000 20.000 10.000 0 SETEMB DOAÇÕES DA CBF PARA A FEDERAÇÃO GAÚCHA DE FUTEBOL 1998 - 2000 R$ MESES 4.1 P ERONDI: EMPRÉSTIMO PARTICULAR PARA A CBF Há uma movimentação não explicada no valor de R$ 50.000,00 entre Emídio Perondi e a CBF, em setembro de 1998: ele teria feito um empréstimo à CBF e esta devolvido o dinheiro quinze dias depois. Segundo a entidade nacional, teria ocorrido um engano do Emídio Perondi nessa movimentação 21, que se equivocou ao Essa informação foi passada pela diretoria da CBF aos membros e técnicos da CPI, durante a diligência à Confederação, em 5/4/2001. 21 enviar o dinheiro. A versão do Emídio Perondi é diferente; ele afirmou que teria feito um empréstimo à CBF: “O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Então, é 50 mil. Daí a quinze dias, a CBF devolveu os 50 mil pra mim, que era meu dinheiro. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Por que ela fez essa devolução? O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – A CBF tava sem caixa naquela época de 98, logo depois da Copa do Mundo. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – O senhor, como pessoa física, fez empréstimo à CBF? O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – E ela me devolveu daí a quinze dias. E esse documento também deve estar com V.Exa., não sei... Eu tenho eles. Eu tenho os documentos, não aqui.” (g.n.) A versão da CBF de que Emídio Perondi teria se enganado se choca com a prática do dia-a-dia. Em geral, as transferências de valores maiores do que o normal são feitas com um alto grau de atenção, pelo risco elevado que faz correr. No caso concreto, R$ 50 mil, em 30/9/1998, eqüivaliam a quase US$ 50 mil, o que representa uma verba significativa. 4.1 Relação Federação / CBF Segundo depoimento do presidente da Federação Gaúcha, a relação da entidade com a CBF é excelente. Avalia como positivo o recente acordo entre Pelé e Ricardo Teixeira, em que pesem as críticas do presidente da Federação a Pelé e a Zico, ex-jogadores que não deveriam, segundo ele, ter ocupado os cargos de ministro no governo federal. 5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL O presidente da Federação é ex-Deputado Federal e irmão do Deputado Federal Darcísio Perondi, beneficiado por doações, em 1998, da CBF (duas parcelas de R$ 50.000,00 cada) e da Federação Gaúcha (R$ 5.444,20). Segundo o presidente da FGF, a entidade pode financiar campanhas eleitorais como qualquer empresa privada. Pela justificativa que apresenta, reafirmada em seu depoimento, o presidente da Federação contraria dispositivo estatutário, que aponta a entidade como associação sem fins lucrativos. Dentre as finalidades da entidade não se encontra a promoção de campanhas políticas, nem favorecimentos a parentes em campanhas (ver Anexo Estatuto da FGF). Mais do que a doação confessa ao seu irmão candidato, o presidente da Federação sugere ser normal o financiamento, por parte da Federação, a qualquer candidatura que o presidente deseje. Seguem, abaixo, passagens do depoimento do Emídio Perondi: “O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Pra dizer que não ajudei, acho que ajudei um ou dois Deputados. E fora a federação, digo a V.Exa., ajudo todos eles, porque só ajuda político quem foi político, quem é político. Quem não é político, não ajuda político. Parece que tem medo de ajudar político. E eu ajudo, e continuo ajudando, e de todos os partidos. E pela federação, se não me falha a memória, foram dois candidatos que eu ajudei. E, se eu pudesse ajudar e tivesse dinheiro, ajudaria muito mais. Porque não existe candidato, meu caro Deputado, que não pegue dinheiro de alguém. Não adianta essa história, dizer que você não pega dinheiro. Todos nós políticos — e eu faço política desde 1962 — pegam dinheiro. Quem me ajudava eram os fazendeiros, agricultores, que me ajudavam na época. E hoje, se estivesse concorrendo, pegaria de empresários, pegaria de futebol, pegaria de quem pudesse me ajudar. Porque a política tá muito cara. Então, alguém tem que ajudar os outros. Era eu. E quem não pega que me atire a primeira pedra. Quem não pegou dinheiro pra campanha.” (...) “O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Mas, aí, a federação faz doação? O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Como lhe disse: acho que fiz uma ou duas pequenininhas, mas fiz, viu, doutor. Não tenho certeza... O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Não, ela fez. O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Fez, fez, tenho certeza. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Fez. Nós temos aqui, na prestação... na análise das contas da Federação Gaúcha tem contribuição... O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Cinco mil pro Darcísio e mais... O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Isso, cinco mil... O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – ... mais três mil, dois mil, uma coisa assim. Não me recordo bem, doutor, agora. Teria que fazer... O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Cinco mil, quatrocentos e quarenta e quatro e vinte centavos... O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – É, pode ser, pode ser.” (...) “O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Então, muito bem. O senhor acusou, acha normal a CBF fazer doações pra campanhas políticas, doutor? O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Como qualquer empresa faz doações pra campanhas políticas. Qualquer empresa, em (ininteligível) de uma empresa estado civil... (Ininteligível) se o Ricardo tivesse organizado o nome dos Deputados, a história hoje de uma maneira seria diferente. O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – A CBF não é empresa, não, Dr. Emídio. O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Não, ela é uma empresa. O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Nem a Federação que o senhor preside é empresa, não. O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Não é uma empresa? O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Não, não senhor. Empresa é se alguém pudesse chegar em Porto Alegre, abrir uma federação e concorrer com a sua, organizar o campeonato gaúcho. Aí, seria uma empresa. Se alguém pudesse chegar no Rio de Janeiro, abrir uma CBF, convocar a Seleção Brasileira, nomear o técnico da Seleção Brasileira, organizar a Copa do Brasil, escolher os times pra Copa do Brasil, escolher os árbitros pros jogos. Aí, seria um sistema empresarial. (...) O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - Olha, inclusive consta uma doação da Federação gaúcha de futebol, presidida pelo senhor, para a campanha do seu irmão, Darcísio Perondi. O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Cinco mil reais. Cinco pila.” (g.n.) 6. CONTRATOS COM A TV A Federação Gaúcha de Futebol possui contratos de transmissão de jogos com a RBS, retransmissora da Rede Globo, no estado do Rio Grande do Sul. A Traffic tem como uma de suas principais finalidades a intermediação de contratos entre as Federações e as redes de televisão. Ao emprestar dinheiro à Federação, como alega Emídio Perondi, a Traffic estaria garantindo um clima favorável para o fechamento de contrato de transmissão dos jogos gaúchos, que traria ganhos futuros para a intermediadora, isto é, a própria Traffic. A CPI apurou repasses de verbas da Traffic à FGF, que podem ser tanto relacionados a empréstimos solicitados por Emídio Perondi, quanto a contratos envolvendo a empresa e a entidade: Pagamentos da Traffic à Federação Gaúcha de Futebol (1996/1997): Data dos pagamentos 12/02/1996 16/02/1996 10/06/1996 16/01/1997 23/01/1997 06/02/1997 21/03/1997 14/07/1997 Valores (em reais) 101.266,24 24.560,00 30.000,00 100.000,00 50.000,00 50.000,00 100.000,00 127.500,00 Emídio Perondi recebeu os valores diretamente da Traffic. Pagamentos da Traffic a Emídio Odósio Perondi (1996/1998): DATA DOS PAGAMENTOS 19/03/1996 12/06/1996 02/09/1998 Valores (em reais) 98.640,00 34.965,00 20.000,00 A relação entre a Federação e a Traffic é assim comentada por Emídio Perondi: “É uma empresa que me ajudou desde que eu assumi a federação, que é a empresa do J. Hawilla, que é a Traffic. Essa, eu tenho... é essa a empresa... a única empresa que me ajudou mesmo no futebol, é a Traffic, de São Paulo. E inclusive eles me falaram... mandei esses dias... vocês vão receber agora, acho que deve estar chegando hoje em Brasília. Mandei um ofício de todos os movimentos meus com a Traffic. Mandei pra Câmara; mandei pro senhor. Já mandei, isso já mandei.” 7. RELAÇÃO COM OS CLUBES A Federação Gaúcha tem a prática de cobrar dos clubes. Em várias ocasiões funciona mesmo como um pedágio. Quando há repasse da CBF ou de outras entidades ou instituições aos clubes, e esse repasse é encaminhado via Federação, esta fica com uma parte independente de consulta ou permissão do clube. Esse mecanismo foi assumido por Emídio Perondi, sob a justificativa de que a Federação é credora dos clubes. Há, pois, uma relação de subordinação, controlada diretamente pelo presidente da Federação. Além disso, há a cobrança de taxas, que fortalece esse canal de verbas a partir dos clubes como fonte de recita da Federação. Abaixo, seguem trechos do depoimento sobre a questão: “O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Essas taxas são cobradas de quê? De clubes? O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - De clubes, de clubes. E com a renda da... sem considerar se é bom pra CPI, posso te mandar os anos que o senhor pedir. Todos eu tenho lá: o analítico de receita e despesa, os valores da Federação. Eu não tenho segredo nenhum, doutor. Porque não tenho. Eu devo fazer alguma errada? Posso ter feito, mas não buscando em cima, aplicado em alguma coisa, pode ficar tranqüilo.” (...) “O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Não, porque nos últimos quatro anos, fazendo a somatória de todo o período, nos últimos quatro anos dos cheques, o Grêmio recebeu 250 mil e o Inter 1 milhão. O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - É bem possível, é bem possível. Mas isso foi dinheiro emprestado para próprio benefício. Foi dinheiro ida e volta... O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Todo emprestado? O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - Não. Todo, não. Alguma coisa... Não, do lado, eu não dei nada, eu tenho certeza. Que eu dei dinheiro para ele? Muito difícil. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Tô perguntando. O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - Não, não dei.” 7.1 CONIVÊNCIA DA CBF NOS DESCONTO DA FEDERAÇÃO AOS CLUBES : A CPI apurou que a FGF faz a intermediação de repasses entre a CBF, com a conivência desta, e os clubes gaúchos. Seguem outros trechos do depoimento do presidente da Federação: “O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Há um cheque, Sr. Presidente, e Dr. Perondi, de 260 mil reais da CBF para a Federação Gaúcha em 09/96. Consta na contabilidade da CBF que se trata de dinheiro para o Internacional de Porto Alegre por adiantamento de cotas de televisionamento do campeonato brasileiro série A. O senhor se recorda disso? O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – É verdade. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – De um cheque no valor de 260 mil reais. O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – É. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Mas nós localizamos que o senhor só repassou para o Internacional 250 mil reais, e os outros 10 mil reais? O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Os outros 40? Os outros 10? Deve ter ficado conosco na CBF. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Há um cheque de 260 mil reais... O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Não. Mas aí ficou 10 mil pra Federação. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Fica 10 mil pra Federação. O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Tá me...tá me devendo, tão me devendo, pomba! Eu tiro um pouquinho de cada um. Ou vai ficar só no...no...no vento. Eu agora, em seguida da televisão, tirava cinco dum, dois do outro, dez do outro, porque senão não tenho caixa, né? O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Deve ser o que explica também outro repasse que a Federação, que a CBF fez no valor de 113 mil reais para o Internacional e o senhor só repassou 25 mil reais pro Internacional. Oitenta e oito mil reais... O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Porque já estavam me devendo. Já estavam me devendo. Tenho certeza disso. Pode, Deputado, a hora que o senhor pegar a documentação, tá lá. Mas o Internacional eu repasse, Deputado, repassava todos os mês, 10, 20, 30. Eu acabei dizer que tinha do papagaio, eu queria fazer de cinco dias, de quinze dias, pra repassar pro Internacional.” (g.n.) Conforme seu próprio depoimento, o presidente da Federação se apossou (ou ainda se apossa) de recursos que não pertencem à entidade. Um exame mais aprofundado dessas transações pode revelar algum tipo de irregularidade ou, mesmo, ilegalidade. Há, também, o outro lado do negócio: a CBF, por vezes, envia recursos para a Federação Gaúcha, os quais sequer são contabilizados na entidade, pois vão diretamente aos clubes, via endosso no cheque. O presidente Emídio Perondi assim depôs sobre esse item: “O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Em 98, um cheque de 72 mil, da CBF, datado de 03/09/98. O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Três do nove? O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – É, 03/09/98. Cheque de 72 mil, 975, da CBF, para a Federação Gaúcha. Ele foi endossado e depositado na conta do Grêmio. Por que esse depósito? O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Ah! Eu não tenho nada tomado nota aqui, mas vou tentar de cabeça explicar. São os repasses, ou da Copa Sul-Brasileira, ou Sul-Minas, melhor, Minas... ou o repasse da Copa Brasil, que vem para a federação o cheque nominal, e nós daí endossamos para o Grêmio. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Por que a CBF não faz direto ao Grêmio? O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Eu tenho impressão que isso aí faz parte do currículo de uma empresa que quer valorizar especialmente sua afilhada, já que a valorização é muito forte. Quer dizer, a sua afilhada tem que ser valorizada. Quer dizer, se o senhor tem uma empresa, o senhor não quer dizer: “Vou passar direto, passar por cima”. Então, passa pelo critério da própria federação. Eu quero ver o que tá acontecendo.” (g.n.) 7.2 BENEFÍCIO DESIGUAL AOS CLUBES A Federação gaúcha beneficiou desigualmente os dois grandes clubes do Estado. No esforço da Federação em ajudar os clubes, o Internacional recebeu uma parcela maior que o Grêmio. Em seu depoimento, Emídio Perondi não apresenta justificativas para essa distinção de tratamento. 8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DO FUTEBOL Conforme analisado no item “Contratos com a TV” acima, há um vínculo forte entre a Federação e a Traffic, notado especialmente, em termos financeiros, em 1996 e em 1997. Transcreve-se, a seguir, parte do depoimento em que o presidente da Federação declara sua aproximação com a Traffic, demonstrando haver, ou ter havido, uma forte relação de dependência com aquela empresa: “O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Tem a televisão também, de 94 a 97 ou 98, quando fizemos rádio com a RBS, 99/2000. E a Traffic também me repassava dinheiro, botei e mandei esse ofício, como lhe disse no início. O senhor recorda que já mandei ofício pra...pra CPI. E deve tá lá. (...) Total. Amizade total. Inclusive me ajudaram muito. Essa foi a única empresa privada que me ajudou muito nesses últimos nove anos pela Federação foi a Traffic. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – A título de que o senhor presta serviço à Traffic? O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Repassei e o senhor vai receber todos os documentos dos convênios que foram feitos, especialmente para as categorias de base. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Não. Mas com o senhor, pessoa física. Emílio Odósio Perondi. O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Exatamente. Erraram até o nome. Botaram até José. Pode ver que tem até o nome de José. Não tem? Pode ver que tem. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Só encontrei esse nome. O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Vou te mandar tudo isso essa semana pra Brasília. Pode ficar tranqüilo. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Então, o senhor presta serviço pra Traffic como pessoa física. O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Não. Não é prestar serviço pra pessoa física, não. Isso seria até indecoroso se dissesse isso aqui, ô, Dr. Rosinha. Eu tô dizendo, que a Traffic foi a firma que me ajudou. Eu precisava de 20 mil, 30 mil, telefonava por Hawilla, ele me mandava, tá. E eu aplicava, esse dinheiro eu tenho todo ele direitinho aplicado e já entreguei pra Traffic, e os senhores estão recebendo em Brasília. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Em 96, foi 133 mil, 605. O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Exatamente. Um valor de noventa e poucos mil, um valor de 20mil ou 15 mil, em 94. Em 98, foi 20 mil. Em dezembro eu fiz uma festa em Porto Alegre de 20 mil e me mandaram também. Eu tenho os recibos direitos, doutor. Pode ficar tranqüilo.” 9. CONCLUSÕES , ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES Da análise de todos os documentos e do depoimento de Emídio Odósio Perondi, conclui-se que a Federação Gaúcha de Futebol é gerida de forma temerária nos campos administrativo, fiscal e financeiro. Constatou-se sonegação fiscal, além de ingerência de ordem econômica da Federação sobre os clubes. Além disso, a Receita Federal deve ser comunicada para que examine o sistema contábil da entidade, bem como apure possíveis créditos tributários. Sugere-se o Ministério Público apure os indícios de irregularidades que envolvem as emissões de cheques nominais à entidade. Sugere-se que a Receita Federal e o Ministério Público examinem as transações que envolveram o presidente da entidade e a CBF. Recomenda-se uma reforma estatutária para limitar o mandato da diretoria da entidade em no máximo quatro anos, impedindo a recondução aos cargos; para permitir uma maior autonomia do conselho fiscal; para obrigar a realização de licitação para a aquisição de bens e de material esportivo; e para estabelecer maior transparência nas contas da Federação e nos repasses de verbas que envolvam a entidade e os clubes. Sugere-se o indiciamento do presidente da FGF por desobediência (Código Penal). Sugere-se encaminhar o presente Relatório à Receita Federal, ao Ministério Público Federal, ao Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul e ao Ministério Público Eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul, com base na Lei n.º 9.504/97. RONDÔNIA 1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DAS FEDERAÇÕES : estatutos. A Federação de Futebol do Estado de Rondônia não enviou à CPI seus Do depoimento do seu presidente à esta Comissão Parlamentar de Inquérito, colheu-se a informação de que a Federação não remunera os seus dirigentes. Trata-se de típica entidade de direito privado sem fins lucrativos. 2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA: Heitor Luiz da Costa Júnior preside a Federação de Futebol desde 1990. Heitor Luiz foi vereador em Uberaba, Minas Gerais, e Deputado Estadual em Rondônia por quatro mandatos consecutivos. A Federação não remunera seus dirigentes e não tem funcionários. Segundo afirmou seu presidente em depoimento a esta CPI, a entidade depende do trabalho voluntário dos seus membros. 3. SITUAÇÃO FISCAL E FINANCEIRA 3.1. IMPOSTO DE RENDA Não consta registro de entrega, por parte da Federação de Futebol do Estado de Rondônia, de declaração de Imposto de Renda nos exercícios de 1996 a 1998. A Federação é titular de três contas (bancos Real, do Brasil e Sudameris). 3.2. D ESCONTROLE CONTÁBIL Tendo em vista que a Federação não encaminhou à CPI seu balanço contábil ou qualquer tipo de informação sobre seu balanço, e tomando como fontes as informações provenientes da quebra dos sigilos bancário e fiscal da entidade e da CBF e o depoimento do Heitor Luiz, constatamos haver na Federação um grave descontrole contábil e fiscal. A Federação declara ser proprietária de bem imóvel que, segundo seu presidente, não existe. Esse imóvel seria a sede da Federação, que não seria próprio da entidade, mas público, de propriedade do Estado de Rondônia, assim como móveis lá instalados, todos sediados pela SEPLAN (Secretaria de Planejamento). O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – O senhor falou, também, que a... a sede da Federação é uma sede própria, mas não é uma sede própria de direito, como é que o senhor me explica isso? O que significa uma sede própria que não é de direito? O SR. HEITOR LUIZ DA COSTA JÚNIOR – Não, é porque ela foi construída pelo Governo do Estado para a Federação de futebol, então ela... ela pertence ao Governo do Estado até que se faça a tramitação legal de termo de doação. Foi... foi... essa... esse sentido que eu quis tentar é... interpretar pra V.Exa. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Sim, mas qual é a relação que existe hoje? O... a Federação... o imóvel está em nome de quem? O SR. HEITOR LUIZ DA COSTA JÚNIOR – Ela está em nome do Governo do Estado. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Ah, então na verdade, não existe a... não existe a propriedade... o senhor... O SR. HEITOR LUIZ DA COSTA JÚNIOR – Não, não. (...) O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Existe uma relação, o que é que o... qual é o documento que o senhor tem assinado com o Governo que diz que o senhor pode ocupar lá? Qual é o contrato que o senhor tem? Eu falo assim: se ele pode, amanhã, chegar pro senhor e dizer: olha, vai embora daqui que eu não quero mais. (...) O SR. HEITOR LUIZ DA COSTA JÚNIOR – O que nós temos é a... que o... os móveis, como consta na nossa... no nosso relatório, é... pertencem à SEPLAN, que é a Secretaria do Planejamento, né, que é responsável e o... a reivindicação é a... ao Governador do Estado pra fazer a doação definitiva pra Federação de futebol. Teria um patrimônio próprio. (...) O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Eu tô lendo a sua declaração... da declaração do Imposto de Renda da sua Federação. Ela tem aqui, no seu ativo permanente, imóveis no valor de 5 mil, 231. Como é hábito e a lei permite que se faça declarações pelo valor histórico, isso significa dizer que o senhor tem alguma coisa que declara aqui pra Receita Federal. Se não tiver, é porque o senhor falsificou a sua declaração. (...) O... quando chega na demonstração de patrimônio diz que tem bem imóveis 5.231 reais e 76 centavos, isso no ano calendário 1997. Quer dizer que em 1997 a sua Federação tinha imóvel nesse valor. O senhor disse que não tem imóveis, isso me chamou a atenção. (...) O SR. HEITOR LENIZ DA COSTA JÚNIOR – Não, senhor. Eu pediria até desculpa a V.Exa. porque de contabilidade infelizmente eu não entendo nada. Isso aqui, pelas informações, que ela é anual, tem como aqui o bem da SEPLAN, que é essa Secretaria do Planejamento, que são os móveis existentes na Federação.” O presidente da Federação sequer conhece os gastos declarados junto à Receita Federal. A desorganização contábil tem reflexos no campo fiscal, demonstrando absoluta fragilidade da gestão do Heitor Luiz. Seguem, abaixo, trechos do depoimento do presidente que apontam essa tendência: “O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – O senhor, em 1997, estou pegando dados que são mais fáceis, o senhor pagou de impostos, taxas e contribuições 9 mil 355 reais, para uma receita total de 130 mil reais. Que tipo de impostos o senhor paga lá assim que são tão pesados? O SR. HEITOR LENIZ DA COSTA JÚNIOR – Eu não estou entendendo o que V.Exa...V.Exa. está perguntando o que significa esse imposto? O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Sim. Que tipo de imposto o senhor paga? O SR. HEITOR LENIZ DA COSTA JÚNIOR – Ah, eu pago Imposto de Renda, eu pago INSS, eu pago os encargos. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Não, Imposto de Renda, eu queria saber então do que seria o Imposto de Renda, referente a quê? Seria Imposto de Renda retido na fonte? O SR. HEITOR LENIZ DA COSTA JÚNIOR – Eu não vou saber informar a V.Exa. porque eu não entendo infelizmente contabilidade. O meu contador fez um trabalho para mim, eu pago ele para fazer e infelizmente eu não sei manusear a parte contábil.” 3.3. CONSELHO FISCAL As contas da Federação não são fiscalizadas e controladas adequadamente, uma vez que o conselho fiscal que não tem autonomia política em relação à direção da entidade. A eleição dos membros do conselho fiscal é realizada de forma conjunta com a da diretoria, conforme informou à CPI o presidente da Federação. Segue, abaixo, parte do seu depoimento a respeito do assunto: “O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – (...) A sua permite que seja eleito junto com o Presidente, não é isso? O SR. HEITOR LENIZ DA COSTA JÚNIOR – Sim, junto com o Presidente. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – O senhor alguma vez já teve um conselho fiscal que tenha feito restrições, já tenha feito recomendações sobre a sua prestação de contas? O SR. HEITOR LENIZ DA COSTA JÚNIOR – Não, senhor.” 4. RELAÇÃO COM A CBF A Federação de Futebol rondoniense recebeu da CBF, entre 1998 e 2000, os seguintes valores: em 1998, R$ 6.000,00 por mês, com as exceções de agosto (quando foram enviados R$ 41.000,00), setembro e outubro (R$ 21.000,00) e dezmebro (R$ 56.000,00); em 1999, o repasse mensal foi de R$ 12.000,00, sendo que em janeiro o valor foi de R$ 6.000,0, em fevereiro de R$ 22.000,00, julho, R$ 32.000,00 e agosto, R$ 20.000,00; em maio não houve repasse da CBF. Em 2000, o valor de R$ 12.000,00 foi recebido pela Federação nos meses de janeiro, março a agosto e de outubro a dezembro; em fevereiro foi R$ 37.000,00 e em setembro, R$ 21.216,00. Conforme já percebido em outras tantas Federações, há um aumento do repasse da CBF à Federação rondoniense em períodos eleitorais. No caso concreto, foi registrada essa movimentação extra nos meses próximos ao pleito eleitoral de 1998. A seguir, gráfico com as doações da CBF: DOAÇÕES DA CBF PARA A FEDERAÇÃO DE FUTEBOL DE RONDÔNIA 1998 - 2000 R$ 60.000 50.000 40.000 30.000 20.000 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/2000 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/99 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO 0 JAN/98 10.000 MESES Fonte: Contabilidade CBF/CPI CBF Nike Em seu depoimento, Heitor Luiz defende a necessidade desses repasses, ao tempo em que recusa a suspeita de seu uso em financiamento de campanhas políticas. Diz o presidente da Federação: “Vou me permitir, nobre Deputado, as verbas que nós recebemos da Confederação Brasileira de Futebol, caso contrário, Deputado, com toda a sinceridade seria muito difícil, nós administrarmos a nossa Federação de Futebol. Nós temos a folha pessoal, nós temos pagamento de energia elétrica, pagamento de telefone, pagamento de água, material de expediente, os encargos sociais, material esportivo, material de consumo, propaganda e publicidade, correios e malotes, assinaturas de revistas, ajudas a ligas de clubes, como já informei a V. Exa., manutenção e conservação. Então, dentro de um contexto que vem, eu afirmo e confirmo para V. Exa., com toda a sinceridade da alma, que ele é empregado, muito bem empregado dentro do que manda a legislação, dentro do que manda a nossa responsabilidade, inclusive a essa ajuda ou auxílio ou mesada, como foi dito, ela realmente tem nos ajudado a manter a nossa Federação de Futebol do Estado.” Ocorre que a afirmação do presidente não encontra sustentação e coerência em sua conduta na gestão da entidade. As contas da Federação, geridas de forma desorganizada como registrado acima (item 3.2), não oferecem as mínimas condições técnicas e de rigor contábil para pautar a opinião do Heitor Luiz. Enfim, não é factível nem verossímil a organizada destinação, supostamente criteriosa, das verbas da CBF, apresentada pelo presidente em seu depoimento. 5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL 5.1. ENVOLVIMENTO COM CAMPANHAS POLÍTICAS Sobre auxílios das entidades do futebol a campanhas eleitorais, o presidente da Federação afirma não ter recebido recursos financeiros, mas quanto a materiais esportivos, alega que os recebeu e que serviram para fins políticos e eleitorais: “O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – O senhor também foi contemplado na sua campanha com alguma ajuda da CBF? O SR. HEITOR LUIZ DA COSTA JÚNIOR – Não. Financeiramente não. Eu tive ajuda de material esportivo, como nós temos constantemente, nós recebemos o material esportivo. Então, para a minha campanha, especificamente, eu não tive ajuda. Especificamente, para minha campanha, eu não tive ajuda.” A ajuda em material desportivo, desde que quantificável em dinheiro é, de acordo com a Lei nº 9.504/97, comparável a doação em dinheiro. Neste sentido, evidencia-se, pelo depoimento acima transcrito, o auxílio da CBF a campanhas eleitorais. Segue, abaixo, quadro informativo sobre as eleições de 1994, quando o Heitor Luiz foi reeleito Deputado Estadual. Resultado das eleições do Estado de R ONDÔNIA, EM 1994, PARA O CARGO DE DEPUTADO ESTADUAL Candidato 15110 MARCOS ANTONIO DONADON 15160 RENATO EUCLIDES CARVALHO DE VELLOSO VIANNA 33140 LUIZ CARLOS COELHO DE MENEZES 36101 JOAO BATISTA DOS SANTOS 12121 JOSE MARIO DE MELO 22199 MILENI CRISTINA BENETTI MOTA 12200 JOAO BATISTA DE LIMA 20110 LUCIA TEREZA RODRIGUES DOS SANTOS 12132 CESAR CASSOL 20111 FRANCISCO DE SALES DUARTE AZEVEDO 14110 JOAO FERREIRA MARTINS 14140 JOSE CARLOS OLIVEIRA 33111 HEITOR LUIZ DA COSTA JUNIOR 22220 ELIZEU FERREIRA DA SILVA 45111 MAURO NAZIF RASUL 15109 AUGUSTO TUNES PLACA 33101 JOSE CUNHA E SILVA JUNIOR 33144 IVONE ABRAO DE FREITAS PEREIRA 13200 DANIEL PEREIRA Partido PMDB PMDB PMN PRN PDT PL PDT PSC PDT PSC PTB PTB PMN PL PSDB PMDB PMN PMN PT Votação 9.549 7.010 5.972 5.556 5.494 5.272 5.234 5.076 4.585 4.479 4.260 4.080 4.067 4.055 3.954 3.718 3.553 3.362 3.241 Candidato 15200 SUELI ALVES ARAGAO 45112 ALTAIR SCHONS 13133 ROSARIA HELENA DE OLIVEIRA LIMA 25101 CARLOS MAGNO RAMOS 25250 DONIZETTI JOSE Partido PMDB PSDB PT PFL PFL Votação 3.157 3.006 2.694 2.484 2.463 Fonte: Tribunal Superior Eleitoral. 5.2. A AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM QUE O HEITOR LUIZ CONSTA COMO RÉU O presidente da Federação é réu, junto com Jaime de Melo Bastos de Lima e Oscarino Mário da Costa, em ação civil pública, movida pelo Ministério Público do Estado de Rondônia. O objeto da ação pauta-se na ocorrência de improbidade administrativa. Jaime de Melo Bastos de Lima – candidato a vereador em Porto Velho derrotado nas eleições de 2000 –, tal como Heitor Luiz, tem vínculos com o desporto, uma vez que ocupa o cargo de Secretário Municipal de Cultura e Esportes de Porto Velho, capital de Rondônia. Oscarino Mário da Costa também ocupa cargo público, no governo do Estado de Rondônia, como Presidente da Comissão Permanente de Licitações de Materiais e Serviços, da Superintendência Estadual de Licitações. Considerando-se o que até aqui foi colhido pela CPI quanto à Federação rondoniense, tendo em vista a não colaboração da entidade à essa Comissão quanto ao não envio de seus balanços e movimentos contábeis, e com base no descontrole administrativo e contábil da Federação, é possível concluir que a atitude do Ministério Público na mencionada ação judicial tem algum fundamento. Não é papel deste Relatório fazer ilações acerca daquela ação judicial, mas é inevitável apontar que a má gestão em uma entidade como a Federação sugere um descuido na responsabilidade do administrador, no caso concreto, do Heitor Luiz. Ainda sobre esta questão, é importante registrar a opinião do Heitor Luiz sobre a ação em que é réu, após questionamento feito pelo Deputado Olímpio Pires: “Eu era Líder do Governo na Assembléia e tinha uma instituição de economista mista, que é a Empresa de Navegação de Rondônia, essa empresa fez várias contratações. Eu como Líder do Governo, o pessoal me procurava, eu encaminhava, entendendo por questão, como V. Exas. são políticos sabem, nós encaminhávamos a essa empresa e algumas pessoas foram contratadas e virou-se esse processo de onde que se diz que foi, que está sendo por improbidade administrativa. Mas eu não concordo que seja improbidade administrativa, porque eu nunca contratei, eu nunca fiz contrato, porque eu era Deputado na época, por questão de Liderança de Governo, eu fiz algumas indicações. E uma pessoa foi lá e denunciou que eu havia enviado, autorizado essa contratação. Aí o Ministério Público achou por bem, em novembro de, se não me engano, de 98, abria-se esse processo novamente, que inclusive está envolvido o atual Prefeito de Porto Velho. Então, eu e ele.” 6. CONTRATOS COM A TV A Federação de Futebol do Estado de Rondônia enviou ofício à CPI, em 30/10/2000, informando que a entidade “nunca celebrou contratos com redes e emissoras de televisão sediados no Brasil ou no exterior”. 7. RELAÇÃO COM OS CLUBES Em seu depoimento, o presidente da Federação afirmou que sua relação com os clubes é de auxílio material. Não chegaram à CPI denúncias ou informações relevantes acerca da relação entre Federação e clubes. Reproduzimos, a esse respeito, trechos do depoimento do Heitor Luiz: O SR. HEITOR LUIZ DA COSTA JÚNIOR – Ajudo determinadas ligas. Algumas ligas que necessitam de troféus, de material esportivo, até pra deslocamento quando vão à Capital, ajudo na organização de competições. A nível municipal, nós temos dado ajuda. O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – E aos clubes, o senhor ajuda? O SR. HEITOR LUIZ DA COSTA JÚNIOR – Ajudamos os clubes. Nós temos clube que participou recentemente da Copa Norte. Então, ele tem a dificuldade de deslocamento ou mesmo o próprio repasse das TVs que compram a competição, por exemplo a Copa Norte. Nós sempre, dentro das nossas possibilidades, nós ajudamos esses filiados. 8. CONCLUSÕES , ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES Da análise de todos os documentos e do depoimento do Heitor Luiz da Costa Neto, conclui-se que a Federação rondoniense de futebol é administrada de forma temerária, além do descontrole financeiro e fiscal. Há evidências de que as informações declaradas à Receita Federal não refletem a realidade. Recomenda-se alteração estatutária para permitir maior autonomia do conselho fiscal em relação com a direção da entidade. Sugere-se encaminhar o presente Relatório à Receita Federal, ao Ministério Público Federal, ao Ministério Público do Estado de Rondônia, ao Tribunal de Contas do Estado de Rondônia, a fim de que seja esclarecida a questão da sede da Federação de Futebol, e o contrato entre a Federação e o Estado para o uso de mencionado imóvel, e ao Ministério Público Eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral de Rondônia, com base na Lei nº 9.504/97. RORAIMA 1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DA FEDERAÇÃO Segundo José Gama Xaud, presidente, que prestou depoimento a esta CPI, em 10/05/2001, a Federação nunca cobrou taxa de clube e que sobrevive dos valores repassados pela CBF. A Federação de Roraima não encaminhou documentos referentes ao seu estatuto. Disse seu presidente : “...agora apareceram o meu contador, que não ganha nada, e me disse: “Presidente, nós precisamos ver o problema da receita, porque a Federação tem que pagar o imposto de renda”. Eu disse: “Mas rapaz, você não sabia disso?” Disse: “Não, mas com aquelas... Antes era tido como filantrópica, e agora, depois de 98, com a lei de empresa pública, foi obrigado a recolher aos cofres públicos.” Com a indicação do Deputado Rosinha, que nos fez vários pedidos, e 90% deles foram cumpridos, em função de nós mandarmos as nossas prestações de contas desde 95, deixamos um prazo e, pela indicação dos senhores, é preciso, e foi convocado uma pessoa de gabarito para que se fizesse essa juntada não de documentos, que eles existem, sim uma organização contábil mais apreensível(?), mais reconhecida e, como dizer, mais, vamos dizer, lealmente computada. E nós estamos já há 2 anos para ser cumpridas todas de 95 a 2000. E, com isso também solicitei a esses técnicos que fizessem o levantamento dos nossos débitos com a receita, para que nós possamos comercializar e aí, daqui para a frente, dizer que a Federação Roraimense de Futebol, de fato, cumpre todos aqueles mandatos, cumpre tudo aquilo que é necessário, pelo menos para uma pequena organização do nosso futebol do Norte. Por isso, Excelências, espero que também vocês possam nos ajudar nessa parada com a Receita. Possam reivindicar que nós possamos parcelar isso aí e sim concretizar tudo aquilo que nós pensamos e que V.Exas. também têm em mente sobre a organização do futebol brasileiro. Obrigado.” (g.n.) O deputado Dr. Olímpio Pires questionou se há remuneração para o presidente da federação o que foi negado por Xuad. Disse, ainda ser Contador aposentado. Inquirido sobre remuneração de dirigentes e funcionários, disse o José Gama Xaud: “O SR. DEPUTADO OLÍMPIO PIRES – Quantos funcionários tem a Federação? O SR. JOSÉ GAMA XAUD – A Federação não tem nenhum. A gente paga uma gratificação porque geralmente vem... Antes o Governo nos dava funcionários da Educação para ajudar as Federações. Então, nós gratificávamos ele com uma ajuda de custo mensal para que ele pudesse se locomover.” (g.n.) A Federação, assim, não tem funcionários remunerados, de acordo com seu presidente. Diz não haver remuneração a dirigentes e que dava gratificação aos funcionários que antigamente o Governo liberava da área de Educação. 2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA 2.1 CONTINUISMO A Federação Roiramense vem sendo administrada, há 27 anos, intercalados, por José Gama Xaud. Foi convidado em 1976 pelo trabalho que realizou na Federação de Basquete, tendo saído por causa da Lei do Conselho Nacional que somente permitia a permanência por três mandatos. Foi feito novo convite para sua volta e, conforme estatuto, os filiados votaram por sua eleição (sete). O deputado Luis Barbosa perguntou se o estatuto da Federação permite continuidade da reeleição, e foi assim respondido: “Claro, claro. Permite, porque a Constituição de 88 assim o fez. Os Direitos Individuais e Coletivos às pessoas jurídicas foi aprovado.” E que esse estatuto data de 1994. 2.2 PROCESSO ELEITORAL Indagado, José Gama Xaud disse que são convocadas, para eleição, todas os clubes (sete) e que não há ligas, oficialmente. 2.3 CONTAS BANCÁRIAS A Federação Roraimense de Futebol é o titular da conta 09820.3000-8, da agência 090 do banco Sudameris. O banco enviou a esta CPI somente os extratos da conta, sem os devidos comprovantes de débito/crédito. Há suspeita de que também seja responsável pela conta 0090706315, provavelmente do Bancrevea, pelo fato de o cheque 225877, datado de 12.01.99, emitido pela CBF, no valor de R$ 20.000,00 trazer exarado em seu anverso aquele número de conta. 2.4 DESPESAS DIVERSAS Verificando-se documentos que a Federação enviou a esta CPI, após a audiência em Manaus, já às vésperas de se concluir este Relatório, observa-se que a entidade roraimense realiza gastos bastante freqüentes com restaurantes, combustíveis, além de gratificar a diretoria. A entidade não possui veículos, porém tem gasto expressivo com combustíveis. O diretor financeiro Haroldo de Assis Medeiros recebeu gratificação em 4/1/1999, no valor de R$ 250,00 o que se supõe proibido pelo estatuto da entidade. O presidente Xaud afirmou até que: “O SR. JOSÉ GAMA XAUD - Isso é verdade. Eu fiz ver ao nosso... O que acontece também Excelência é que, por exemplo, as nossas diretorias, o pessoal que nos ajuda não recebe nada. Então, fica até difícil por exemplo às vezes você exigir, porque é tão difícil nessa região arranjar pessoas que nos ajudem nesse futebol, que a gente fica naquela da exigência e a gente tem que cumprir lei.” (g.n.) Verifica-se que o presidente não disse a verdade em seu depoimento, pois há provas de que a diretoria receba valores em forma de gratificações. 2.5 OUTROS ASPECTOS O presidente da Federação Roraimense teceu comentários sobre a decadência do futebol, atribuindo-a aos seguintes fatos: “O Estado de Roraima não tem como tirar dinheiro pro futebol; O Governo brasileiro, que é o principal, tirou incentivos fiscais, tirou até do material esportivo; Nós não temos uma indústria. Se você for pedir naqueles comerciantes que têm recursos, eles choram tanto que você acaba dando presente pro comerciante; Os clubes não têm recursos; Nós não vendemos nada. Enquanto a mídia compra as suas propagandas nos estádios, Roraima nem transmite coisa nenhuma; Não existe verba para o futebol profissional, existe para o amador.” 3. SITUAÇÃO FISCAL/FINANCEIRA Não foi entregue à Receita Federal declaração de renda alguma por parte da Federação. Questionado, o presidente da entidade afirmou que a entidade não possui patrimônio algum, nem veículo nem nada. Quanto a afirmação do Deputado Olímpio Pires, de que em 1998 a Federação Roraimense apresentou balanço à Comissão informando o valor de R$ 78.529,00 como despesas operacionais e R$ 40.142,00 como despesas de veículos e de conservação de bens e instalação, José Gama Xaud diz haver alguma coisa errada e ainda: “...Não. É preciso averiguar isso aí direito, porque o que nós fazemos, Excelência, por exemplo, recentemente o nosso vice ele se descolocou (entendido por deslocou) e nós damos às vezes o vale de óleo diesel em paga. Óleo diesel ou gasolina. Certo? Óleo diesel ou gasolina. Agora, esse montante aí não. ... Não, não. Isso daí está errado. Isso não existe. Eu acho que confundiram as federações. Isso não existe.” E quanto a não apresentação de Imposto de Renda: “...É, veja bem, o que acontece é que são tantas normas, tantas leis, tantas exigências, que tem hora que você se perde. Eu sei que a pessoa física, certo, e praticamente a jurídica tinha que declarar. Agora, as Federações nossas, amadoras como eram, eram tidas como filantrópicas. Nós não temos recursos.” O deputado Léo Alcântara questionou-o sobre o conhecimento de que mesmo as entidades filantrópicas são obrigadas a declarar renda, ao que José Gama Xaud respondeu: “...Elas tinham que declarar ...Isso é verdade. Eu fiz ver ao nosso... O que acontece também Excelência é que, por exemplo, as nossas diretorias, o pessoal que nos ajuda não recebe nada. Então, fica até difícil por exemplo às vezes você exigir, porque é tão difícil nessa região arranjar pessoas que nos ajudem nesse futebol, que a gente fica naquela da exigência e a gente tem que cumprir lei. Hoje, a Federação Roraimense de Futebol está estabilizada financeiramente. Está estabilizada. E com essa nova organização nós vamos ter que pagar alguns técnicos para que de fato nós possamos, nos relatórios administrativos financeiros, cumprir essas cláusulas todas. Eu estou lhe dizendo que nós não declaramos, mas já estamos embuídos... não fizemos agora se não iria parecer uma enganação, porque nós fomos convocados. Se fizéssemos isso até os senhores iriam desconfiar: “Estão vendo como eles estão correndo?” Mas não é isso não. Nós daqui saindo, semana que vem nós já vamos conversar com a receita. Por isso, que estou pedindo o apoio dos senhores, porque não sei nem se tem multa. E se for de fato cobrado multo, aí vai pesar muito para nós. Nós pedimos esse apoio para que vocês possam nos ajudar a esse respeito.” E em relação a dívidas existentes: “Olha, nós fizemos uma dívida foi com o bingo. Fizeram o bingo lá em Roraima e ele enganaram todas as federações. Todas foram enganadas. Depois de quase cinco anos, achou por bem a Receita comunicar que existia, ninguém sabia, que exista esse débito, porque eles não recolheram o imposto devido dos veículos que foram bingados. Nós não tínhamos nem conhecimento. Quando apareceu, o que era 13 mil reais foi para 26 mil reais. Tivemos que comercializar também na Receita e estamos pagando acho que praticamente já está quitado esse débito. Foi o único débito. Nós não devemos à ninguém.” Quanto aos recursos recebidos da CBF: “Olha, Excelência, ali, a parte financeira de recurso, por exemplo, ajuda o clube, dou ajuda de custa a pessoas que trabalham, hoje, que nós já temos recurso — antes não podíamos fazer, hoje nós já temos —, coquetéis, festas, isso nós fazemos com bom grado para aqueles que trabalham no futebol.” (g.n.) Indagou o Deputado Olímpio Pires: “Você por acaso tinha algum livro caixa para controlar isso? Por que, como não tem contabilidade, como que você controlava isso aí?” Ao que respondeu José Gama Xaud: “Não. Veja bem. A nossa contabilidade, a base principal que é primeiro ter receita para poder fazer a despesa, certo?, Com isso, quando nós recebemos a verba, ela entra em banco via cheque e sai via cheque, certo? Comprovando com recibos e com notas fiscais. Ela não sai avulsa e nem dinheiro em mãos. Nós não temos caixa dois. Não temos. Agora, com essa organização, que estou falando aos senhores, vai ser preciso, porque se não tiver livro caixa e um razão, às vezes é difícil você identificar a despesa, porque passa o tempo e às vezes você esquece.” O Deputado Olímpio Pires disse acreditar que há uma desorganização generalizada quanto a não apresentação de documentos e que se os mesmos não forem apresentados até a apresentação do relatório, vai passar por fraude. Respondeu José Gama Xaud: “Veja bem, o nosso recurso, o único recurso que nós recebemos diretamente é da CBF ou quando, por exemplo, agora, o Governador do Estado, ele gosta de futebol nos comprou, fizemos uma proposta e ele nos comprou o primeiro turno para dar 5 mil reais para cada clube, e os 15 restante, para pagar as despesas do campeonato. Tem mais uma coisa doutor, quero lhe avisar, a federação paga arbitragem, paga gandula. Os times não pagam um tostão, nada. Isso a não ser quando tem os jogos que são programados pela Confederação Brasileira de Futebol. Aí, sai do borderô. Mas o nosso futebol lá, 98% tem renda negativa, e os clubes não tem dinheiro e a federação paga. Aí o senhor me pergunta: "Xaud, a federação tem dinheiro, tem saldo positivo. A pessoa só consegue ter saldo positivo nas federações, que nós sabemos, com o uso da lealdade com o desenrolar do dinheiro público, como o senhor falou. Isso eu lhe garanto que a gente faz. É por isso que nós temos um saldo . Graças a Deus não devemos à ninguém, a não ser agora à Receita, que nós vamos comercializar, para que fique a federação totalmente regularizada. Que só dessa maneira se faz. (...) Já houve abuso de poder para me tirarem da federação, e não conseguiram. Já houve abuso de poder. Já recebi pressões. Muitas pressões, até de Brasília, e nós conseguimos, sem um tostão no bolso, vencer essa política da federação. (...) Digo que a CPI tendo declarado em pleno jornais vai ter valor par ao futebol brasileiro. Pelo menos, se inicia uma nova época de responsabilidade e respeito daquilo que está fazendo. Já se vê uma mudança. Eu não quero dizer com isso que culpado é o senhor Ricardo Teixeira ou o clube. (...).” Observa-se que a Federação de Roraima tem poucos gastos registrados em relação aos recursos que obtém. Da documentação recebida já na fase final do relatório, percebe-se, por exemplo, que em outubro de 1999 a entidade recebeu, somente da CBF, R$ 12 mil. No entanto, contabilizou apenas R$ 480,00 de despesas. O mesmo é válido para a maior parte dos meses examinados. Em janeiro de 1999, a CBF repassou um valor adicional de R$ 20 mil. As despesa, nesse mês, chegaram a R$ 5.288,00. Com isso, não se pode afirmar para onde estão os recursos da Federação Roraimense de Futebol. A federação não possui contabilidade, apesar de o seu presidente, há mais de 27 anos usufruindo daquela entidade, ser contador aposentado. O Deputado Luís Barbosa perguntou sobre fontes de recursos da Federação e o Xaud disse que além das remessas da CBF, o governo do Estado, recentemente, comprou o primeiro turno do campeonato. Quanto a prestação de contas, pergunta o deputado: “O SR. DEPUTADO LUIS BARBOSA – V.Sa. pode dizer se a prestação de contas da Federação Roraimense de Futebol está em dia? O SR. JOSÉ GAMA XAUD – Tá, sim. Nós tamos agora conscientes... O SR. DEPUTADO LUIS BARBOSA – Com o Imposto de Renda, com o INSS...? O SR. JOSÉ GAMA XAUD – Não, não. Veja bem: o..., o Imposto de Renda, que nós estamos (ininteligível), com eu já disse, nós estamos fazendo o levantamento... Tá..., tá sendo feito um diagnóstico, uma prestação de conta pra que nós possamos chegar na Receita e conversar como nós vamos pagar. Porque nós não tamos nos omitindo de pagar; nós queremos pagar; agora, é preciso que se faça parcelado e, como eu já pedi o apoio de vocês, possamos fazer isso sem... derivar(?) nenhuma multa contra clubes e Federação.” Quanto a patrimônio, José Gama Xaud afirma que a Federação não possui nenhum, nem equipamentos, nem veículos, nada. Vai solicitar à Prefeitura uma doação para que possa iniciar a sede da Federação, “porque já temos o recurso para isso e nós vamos tocar isso pra frente...”, afirmou 4. RELAÇÃO COM A CBF A Federação Roraimense recebeu mensalmente, durante o ano de 1998, a importância de 6 mil reais tendo sido elevados para 12 mil/mês em 1999 e 2000. No mes de: jan/999 houve uma remessa a mais de 14 mil reais; no mês de setembro/99 não consta remessa; totalizando por ano: 1998 – R$ 72.000,00 1999 – R$ 146.000,00 2000 – R$ 144.000,00. A seguir, gráfico com as doações da CBF: DOAÇÕES DA CBF PARA A FEDERAÇÃO RORAIMENSE DE FUTEBOL 1998 - 2000 R$ 30.000 25.000 20.000 15.000 10.000 Fonte: Contabilidade CBF/CPI CBF Nike NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/2000 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/99 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO 0 JAN/98 5.000 MESES 5. CONTRATOS COM TV A Federação não tem contratos para transmissão de jogos pela TV. 6. RELAÇÃO COM OS CLUBES Admitiu ajuda financeira aos clubes, quando o procuram e que possui comprovantes dessas ajudas. Há empréstimos que, devido ao fato de a Federação não ter encaminhado seus documentos contábeis, não pôde se apurar se eles foram pagos. 7. CONCLUSÕES Quase todos os problemas que afetam as federações estão presentes aqui. O continuismo aparece de forma destacada. O uso indiscriminado dos recursos da federação também se evidencia. Faltam documentos, há indícios de muitas irregularidades, ausência de Declarações de Renda, não existência de balanços e livros contábeis e os comprovantes da destinação das contribuições recebidas, principalmente por parte da CBF. 8. RECOMENDAÇÕES Comunicar à Receita Federal quanto a não apresentação das declarações de renda da Federação dos últimos anos. Informar ao Ministério Público a ausência de documentação fiscal e contábil da entidade. Solicitar à Federação o envio dos comprovantes de pagamentos referentes aos recursos enviados pela CBF, compromisso assumido pelo seu presidente no depoimento prestado junto a esta Comissão. Recomenda-se encaminhar cópia deste Relatório ao Conselho Federal de Contabilidade, para providências. Recomenda-se uma reforma estatutária para limitar o mandato da diretoria da entidade em no máximo quatro anos, impedindo a recondução aos cargos; para permitir uma maior autonomia do conselho fiscal; para obrigar a realização de licitação para a aquisição de bens e de material esportivo; e para estabelecer maior transparência nas contas da Federação e nos repasses de verbas que envolvam a entidade e os clubes. Sugere-se encaminhar o presente Relatório à Receita Federal, ao Ministério Público Federal, ao Ministério Público do Estado de Roraima – no tocante às verbas que envolvem o Governo estadual. SANTA CATARINA 1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DA FEDERAÇÃO A Federação de Santa Catarina possui personalidade jurídica de sociedade civil de direito privado, regida pelos artigos 20 a 23 do Código Civil Brasileiro, conforme prevê o artigo 1º de seu Estatuto. 2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA A Federação Catarinense vem sendo administrada, há 16 anos, por Delfim de Pádua Peixoto Filho, que prestou depoimento a esta CPI, em 07/05/2001, ficando registrado em notas taquigráficas nesta Casa. Antes do depoimento do presidente catarinense, falou a esta Comissão o senhor Dalmo Bozzano, ex-árbitro da FIFA. Seu depoimento foi marcado por acusações contra a administração do senhor Delfim, as quais se resumem como segue: a) o recebimento de terreno e material para construção da sede da Federação, sem ter sido nada realizado, o que resultou na retomada do terreno pela Prefeitura, a doadora, e no desaparecimento dos materiais doados; b) o presidente do Tribunal de Justiça Desportiva é nomeado pelo Presidente da Federação de Futebol, com funcionamento do Tribunal na sala do prédio da Federação, isso confirmado pelo senhor Delfim em seu depoimento. Essa ingerência da Federação sobre o Tribunal Desportivo, segundo o senhor Dalmo, comprometeria a independência do Tribunal no julgamento das causas, especialmente quando forem relacionadas ao futebol; c) aumento do percentual destinado à Federação, do arrecadado de algumas partidas; os clubes aceitam, devido ao receio de sofrerem retaliações; o regulamento da competição estabelecia 7% e foram arrecadados 14% em alguns jogos; esta denúncia e outras já haviam sido enviada anteriormente a esta CPI pelo senhor Osni Aguiar, aposentado que trabalhou na arrecadação dos jogos; d) permissão estatutária para convocar eleições para presidência seis meses antes do término do mandato; ao par disso, exigência, também estatutária, de 40% de adesões dos filiado para aprovação do candidato e sua chapa, o que, naturalmente, permite que somente dois candidatos disputem a presidência, já em que caso de duplicidade vale a primeira adesão. Por essa regra, um candidato que consiga 61% de adesão dos filiados, seria candidato único. Cabe registrar que o estatuto foi elaborado pelo senhor Delfim; e) remuneração de seu dirigentes; f) apoio à políticos, notadamente a Maurício Magalhães, candidato apoiado pela Federação Catarinense, sob a promessa de melhoria do futebol no Estado; isso, mesmo ante a proibição constante do art. 110 do Estatuto: “Na Federação, não será permitida atividade de natureza política, racial ou religiosa”; e g) acúmulo, por parte do senhor Delfim, dos cargos de presidente da Federação com o de presidente da Comissão de Arbitragem, também contrariando o prescrito no artigo 53 do Estatuto: “Além das incompatibilidades referidas em outros capítulos ou na legislação superior, ninguém poderá, na Federação, acumular, salvo em casos especiais e em caráter transitório , o exercício de cargos na Diretoria” De acordo com o entendimento do senhor Delfim, o Estatuto proíbe a acumulação entre os cargos de direção, não sendo o que acontece com ele, uma vez que a Comissão de Arbitragem não pertence aos Órgãos Diretivos da Federação; é apenas uma simples comissão. Após as palavras do senhor Dalmo, passou a depor o senhor Delfim que, em suas palavras iniciais, relatou os fatos que levaram à inimizade com o senhor Delmo; defendeu-se das denúncias, afirmando o seguinte: a) que nunca recebeu tijolos nem recursos de ninguém para construção da Sede da Federação. Recorte de jornal da época, entregue a esta Comissão pelo senhor Delmo, mostra que o senhor Delfim afirmou ter recebido todo o material e o terreno, tendo, inclusive, marcado data para início das obras; e b) que somente nos jogos finais do campeonato, a parcela destinada à Federação foi aumentada para 14% , de comum acordo com os quatro finalistas da competição. Sobre o Tribunal, disse que Santa Catarina foi o primeiro estado a se adaptar as exigências da Lei Zico e Lei Pelé, uma vez que seus membros são indicados pela OAB, pelos clubes, pelos árbitros e pela Federação, sendo seu presidente escolhido pelos membros. Confirmou que a Federação e o Tribunal Desportivo funcionam no mesmo prédio; Passando às perguntas dos Deputados, o Deputado Dr. Rosinha voltou à questão da arrecadação e de falsificação de ingressos, explicando que já sabia dos fatos, por meio dos documentos enviados pelo senhor Osni Aguiar. Respondendo a esses questionamentos, o senhor Delfim destacou que existe um corpo fiscal da Federação, composto por ex-militares, que nunca detectou problema de arrecadação. Teria havido, sim, problemas de falsificação de ingressos, que foi sanado pela prisão de falsificadores paranaenses e aberturas de diversos inquéritos. Sobre a remuneração dos dirigentes, afirmou que, com o advento da Lei 9532 a Federação deixou de ser sem fins lucrativos, passando a pagar tributos, a remunerar seus dirigentes, enfim, a proceder como entidade de fins lucrativos. Sua remuneração é de R$ 5 mil reais, enquanto que a dos diretores é de R$ 2,5 mil reais. Ainda com relação a situação administrativa, verificou-se que, como acontece nas demais federações, o Conselho Fiscal é eleito em chapa única com a Diretoria. O senhor Delfim admitiu, também, que há voto por procuração nas eleições; acha que não há problema algum; porém não soube precisar a quantidade exata, disse apenas que “não foram muitos, não”. Uma observação: Conselho Fiscal em chapa única com Diretoria, 40% de adesão dos filiados para inscrição da chapa (regra do estatuto elaborado pelo atual presidente), voto por procuração e Diretoria remunerada. Um quadro que naturalmente dificulta qualquer pretensão de renovar os dirigentes do futebol catarinense. 3. Situação Fiscal/Financeira Inicialmente, foi observado que a Federação não entregou as Declarações de Imposto de Renda de Pessoa Jurídicas referentes aos exercícios de 1995, 1996 e 1997 e quando seu presidente foi questionado quanto à omissão, disse que o assunto era do Diretor Financeiro, que estava no local e informou que não havia nenhuma notificação da Receita Federal quanto a isso. Também não houve explicação para o não recolhimento do COFINS referente ao ano de 1998. Da análise da movimentação financeira da Federação Catarinense, verificou-se vários pagamentos, em cheques nominais a Túlio Portinoi Filho, durante 1999 e 2000. O montante pago chegou a R$ 257.285,60, ou seja, mais de 20% da receita total da Federação pagos para uma pessoa física. Isso, de uma entidade que, conforme o declarado no Imposto de Renda, vem apresentando seguidos prejuízos . Questionado sobre essa incoerência, o senhor Delfim respondeu simplesmente que desconhecia tais pagamentos; resposta idêntica foi dada pelo Diretor Financeiro, senhor Arlindo Pedro Reis. Ressalte-se, por mais estranho que possa parecer, que quem assina os cheques da Federação são, justamente, o senhor Delfim, na qualidade de presidente, e o senhor Arlindo, como Diretor Financeiro. Foi verificado ainda que tais despesas com o senhor Túlio não constaram nas Declarações de Imposto de Renda. 4. RELAÇÃO COM A CBF A Federação Catarinense recebe mensalmente a “mesada” da CBF; segundo seu presidente é de fundamental importância para o desenvolvimento das atividades da Federação, dada a escassez de recursos no desporto do Estado. Segundo o senhor Delfim, o Conselho Fiscal coloca, anualmente em suas atas, o fato de a entidade depender financeiramente da CBF. Porém, negou, veementemente, que tivesse utilizado algum recurso financeiro oriundo da CBF para auxiliar políticos, como está examinado a seguir. O gráfico abaixo demonstram as doações feitas, em dinheiro, pela CBF, à Federação catarinense: DOAÇÕES DA CBF PARA A FEDERAÇÃO DE FUTEBOL DE SANTA CATARINA 1998 - 2000 R$ 120.000 100.000 80.000 60.000 40.000 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/2000 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO MARÇO JAN/99 NOVEMB SETEMB JULHO MAIO JAN/98 0 MARÇO 20.000 MESES Pode-se observar que as doações da CBF se concentram nos meses próximos às eleições de 1998 e de 2000. 5. CONTRATOS COM TV Em uma análise global do contrato, esta Comissão ficou com o sentimento de que a TV Catarinense adquiriu uma enorme capacidade de ingerência sobre o futebol do estado, tornando esse último refém da primeira, uma vez que até a tabela com jogos a serem realizados compõe o contrato, como anexo. Verdadeiramente, como nas outras federações, o futebol catarinense também é vitima dos interesses comerciais, dentre eles e com maior força, o televisivo. 6. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL : Durante seu depoimento, o senhor Delfim foi questionado sobre possíveis auxílios financeiros a políticos. Sobre esse assunto, respondeu invocando a Lei 9532/97 e afirmando que poderia ter dado apoio financeiro a políticos; porém, nunca o fez. Apoiou pessoalmente e de outras formas, que não a financeira, governador, senador e candidato a deputado que não se elegeu. Esse último seria Maurício Magalhães (Dr. Fritz), genro do senhor Delfim, à época das eleições de 1998. Maurício Magalhães recebeu da CBF duas doações para sua campanha política. Ambas de R$ 25 mil, a primeira em 11/9 e a segunda em 30/9/1998. Isso reforça a hipótese de que o dinheiro da CBF, repassado para as federações, estarem sendo para promover campanhas eleitorais (Ver Capítulo VIII).. 7 RELAÇÃO COM CLUBES A federação não presta nenhum tipo de auxílio aos clubes de Santa Catarina, porém, o senhor Delfim afirmou que ajudava as ligas existentes no estado, com materiais de informática e quantias em cheques. Só que esta Comissão, de posse do sigilo bancário da entidade, não constatou nenhum cheque emitido para as ligas. Quando foi dito ao senhor Delfim que não havia nenhum cheque, inicialmente, ele tentou mudar suas resposta, disse que a quantia não era muita...depois admitiu não saber por que os cheque não constavam na movimentação financeira da Federação. O curioso é que, no caso dos pagamentos ao senhor Túlio Portinoi Filho, havia cheques que o presidente catarinense desconheceu; agora, o presidente afirma ter efetuado pagamentos em cheques que não constam nas informações repassadas pelo Banco Central. No mínimo, existe algum descontrole na movimentação bancária da Federação Catarinense de Futebol 8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DE FUTEBOL 9. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES SÃO PAULO 1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA O Estatuto da Federação Paulista de Futebol prevê, em seu art. 1º, que sua personalidade jurídica é de uma associação civil de direito privado, sem fins lucrativos, para fins desportivos. Cala, portanto, sua norma fundadora e reguladora de suas atividades, sobre maiores detalhamentos quanto à sua qualificação jurídica, o que nos remete ao Código Civil. O estatuto não prevê qualquer tipo de remuneração para a Diretoria. No depoimento a esta CPI, o presidente da FPF, Eduardo José Farah, afirmou que nada recebia da Federação, apesar de haver sido aprovada, em Assembléia Geral, uma verba de representação de R$ 17 mil reais mensais, em seu favor, desde 1996. Farah está à frente da Federação Paulista há 14 anos. Comentário do Presidente desta Comissão, Deputado Aldo Rebelo sobre a concessão de poderes excessivos a Farah no Estatuto da FPF: “O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) - ... eu tive dando uma olhada no Estatuto aqui, Presidente Farah, e há aqui, no Capítulo V, no art. 29, na... no item “v” que permite à Presidência da Federação “praticar qualquer ato necessário ao bom andamento das atividades da Federação ad referendum do poder próprio, quando for o caso”. E curiosamente esse item do art. 29, combinado com o item “f” do art. 8º, que “é da competência da Assembléia Geral autorizar ou determinar a aquisição, alienação ou gravação de bens imóveis, depois de ouvido o Conselho Fiscal”, me chega à conclusão que dá ao Presidente da Federação o poder inclusive de vender a sede da Federação ad referendum da Assembléia Geral. Eu faço essa curiosidade não em referência ao senhor, naturalmente. É porque estatutos — o da CBF permite amplos poderes ainda mais amplos ao Presidente... estatutos dessas entidades concentram de tal forma poderes na Presidência que, naturalmente, dificultam aquilo que eu acho que é a fiscalização, o controle das instituições que deveriam ter esse papel dentro da entidade.” O Presidente Farah concordou com as palavras do Deputado e prometeu corrigir o Estatuto. 2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA A Federação se mostra saudável quanto à sua administração. O presidente declarou que há alguns anos a Federação vem sendo superavitária; tem uma contabilidade bem organizada; possui um sistema de compras e recebimento de recursos somente por transferência bancária; qualquer gasto da Federação é realizado após um orçamento triplo, apesar de não tornar público esse procedimento. O Conselho Fiscal tem relativa independência. A organização dos campeonatos da FPF têm recebido elogios da imprensa, e também a delegação do controle da arrecadação à responsabilidade dos clubes. Esses e outros procedimentos, comprovados por documentos enviados a esta Comissão, pelo menos dão a aparência de uma administração eficiente e eficaz, no que diz respeito à suas metas, àquilo que seu estatuto prescreve. A Federação Paulista tem 60 funcionários contratados pela CLT, mais 10 contratados temporariamente. Existe um grupo de garotas que atua nos intervalos dos jogos, com intuito de promover o evento e preencher o tempo vago do torcedor. As garotas não são contratadas da Federação; pertencem a uma empresa, e a Federação paga essa empresa, com recursos de patrocinadora, uma loja de construção. A Federação mantém dois programas de televisão, um na Rede Vida e outro na Rede TV; há também um página na Internet, mantida por empresa especializada. 3. SITUAÇÃO FISCAL/FINANCEIRA Apesar de uma administração satisfatória, conforme visto no item anterior, a situação fiscal/financeira da FPF apresenta alguns aspectos pontuais, que merecem ser relatados. Observa-se, inicialmente, que a Federação não entregou as Declarações de Imposto de Renda referentes aos anos calendários de 1995 e 1996. Ainda com relação ao fisco federal, o Presidente de Federação afirmou, em seu depoimento a esta Comissão, que a Federação possui, em aplicações financeiras, o montante de R$ 23 milhões, mas nas declarações de renda da entidade não foi encontrado nada que faça referência a este valor. Com relação à Previdência, a despeito do confortável quadro financeiro, evidenciado a todo instante no depoimento de Farah, há uma dívida no valor de R$ 5.233.943,20, apontado no Relatório do INSS, de 22.11.2000. 3. 1 DAS FONTES DE RENDIMENTO Farah informou que todo aporte financeiro da Federação é originário dos contratos com a televisão aberta e fechada; de 10% sobre o valor dos contratos com a publicidade estática (os 90% restantes vão para os clubes participantes da partida), e, por último, do contrato com a Penalty. 3.2 O CASO DO JOGADOR PIERKASKI O jogador Pierkaski foi adquirido pela Federação Paulista de Futebol, de um clube uruguaio , chamado Rentistas, pelo valor de R$1.200.000,00; depois foi “cedido” ao Mogi-Mirim, e seis meses após, vendido ao Bastia, da França, pelo valor de US$1.800.000,00, em três parcelas de 600 mil dólares, das quais a Federação recebeu duas, que em reais totalizam R$2.348.973,44. Comentários: de acordo com a Lei Pelé, o passe de jogador não pode pertencer à Federação de Futebol; o Rentistas é um clube bastante utilizado pelo empresário Juan Figer em suas transações; antes de ir para o Rentistas do Uruguai, o jogador passou, num curto período, pelo Clube Regatas Flamengo e pelo Atlético Paranaense (também utilizado por Juan Figer), havendo, inclusive, superposição de datas. Questionado sobre esta transação, Farah afirmou que não havia comprado o passe do jogador, mas sim os direitos financeiros dele; disse que quem era dono do passe do jogador, e, portanto, autorizava ou não sua liberação, era o MogiMirim. Porém, documentos entregues a esta CPI comprovam que toda a negociação com o Bastia da França foi realizada com a Federação, por meio de seu vice-presidente, e uma justificativa dada pelo clube francês para não honrar o pagamento da terceira e última parcela, foi a constatação de que o clube Mogi-Mirim estaria envolvido no negócio. A transação aconteceu em 30/07/99 e houve uma empresa encarregada da cobrança (Lavingstone Holding), que, segundo o Sr. Farah, teria recebido nos vencimentos das operações e aplicado os recursos no exterior, gerando um lucro de aplicações num valor acima de 120 mil dólares, que ainda não foi enviado ao Brasil. O que foi efetivamente remetido em 20.11.2000 (US$1.200.000,00, referente ao principal) proporcionou um ganho pela paridade dólar/real de quase 100%, entre julho/99 e novembro/2000. A Lavingstone Holding ainda está encarregada da cobrança da última parcela e é responsável pelo envio dos 120 mil dólares referentes ao lucro da aplicação no exterior. Houve pagamentos ao Central Español, clube uruguaio também utilizado pelo empresário Juan Figer, que o Presidente da Federação Paulista não soube explicar, mesmo tendo assinado cheques de R$ 100 mil reais: “O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – sim, mas tem? não entendi. não, quero saber se houve o pagamento ao central español ou não houve um pagamento. O Sr. Eduardo José Farah – tá dizendo que houve. O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – e a razão desse pagamento? O SR. EDUARDO JOSÉ FARAH – não sei, excelência. não sabia nem que houve pagamento. isso aí eu vou informar. ela tá aí, é o financeiro. a federação é... O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – mas ela ou qualquer outro diretor poderia efetuar um pagamento ou autorizar pagamentos no valor de 400 mil reais sem o seu conhecimento, sem que o senhor se lembrasse? O SR. EDUARDO JOSÉ FARAH – É lógico. eu saio de licença, tem outro presidente na federação. pode até ter acontecido. não tô dizendo que aconteceu. se tiver pagamento, nós vamos apresentar pro senhor o documento. eu só não estou sabendo de memória aqui. se o senhor tiver uma informação... O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – eu tenho cópias de cheques assinados pelo senhor que... O SR. EDUARDO JOSÉ FARAH – hein? ah! eu vou mandar pro senhor os documentos. o senhor fique tranqüilo. O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – no valor de cem... O SR. EDUARDO JOSÉ FARAH – deve ter uma razão absolutamente (ininteligível).” Comentários do Deputado Léo Alcântara sobre o tema: “(...) afigura-se estranho e anormal que a Federação tenha mantido aplicação financeira em dólares no exterior, deixando de declarar esses valores à Receita. Os indícios aqui colhidos apontam para a prática do crime de sonegação fiscal, já que qualquer bem ou valor mantido fora do País deve constar obrigatoriamente da declaração de renda do contribuinte, pessoa física ou jurídica. Além do mais, embora o Presidente da Federação Paulista de Futebol alegue que a venda do jogador foi feita pelo clube Mogi Mirim, a nosso ver, isto não restou demonstrado. Ao contrário, o contrato envolve a Federação e o Clube Bastia da França, o valor foi pago à Federação e aplicado no exterior através do Leving Stone Holding S.A.” 3.3 C ASO MARCELINHO O jogador foi adquirido do Valência (Espanha), tendo a FPF pago o valor de 7 milhões de dólares nos mesmos termos do jogador Pierkaski, ou seja, a Federação estaria comprando os direitos financeiros do jogador Marcelinho. Como forma de angariar recursos para a compra do passe, criou-se um 0900 (disque Marcelinho), em contrato com a Rede Bandeirantes. Esse “disque” indicaria o clube que receberia o Marcelinho por dois anos, a depender da torcida que mais ligasse em favor de seu clube (São Paulo, Palmeiras, Santos e Corinthians) . O resultado apontou o Corinthians como vencedor, com 62,5% dos telefonemas. Do total arrecadado, coube à Federação o valor de 580 mil reais que estão sendo questionados pelo Ministério Público, em ação contra 0900, de uma forma geral. Antes de decorrido o prazo, o Corinthians resolveu adquirir os direitos financeiros do jogador, e a Federação cobrou apenas 40% do valor pago ao Valência da Espanha, ou seja, R$ 2 milhões e 800 mil, o que representou um prejuízo de R$ 4 milhões e 200 mil. Questionado, Farah disse que não considera um prejuízo, uma vez que ajudou o Corinthians e, conseqüentemente, o futebol paulista... “O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - ou seja, para a federação paulista de futebol o senhor perdeu 4 milhões e 200 mil dólares? O SR. EDUARDO JOSÉ FARAH - depende da ótica. para a federação paulista de futebol, nós fizemos um benefício ao Corinthians e ao esporte de São Paulo. não há prejuízo nenhum. O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – entendo. na questão financeira, o senhor perdeu, a federação paulista perdeu 4 milhões e 200 mil dólares.” O Sr. Farah ainda afirmou que a Federação também ajudou na compra de Evair para a Portuguesa de Desportos, de Viola para o Santos, e de outros jogadores para os clubes do interior. Como última informação sobre a situação fiscal/financeira da Federação Paulista, observou-se, por meio da análise da movimentação bancária, que foi despendido o montante de R$ 5.716.750,60 com a empresa Vale Refeição Ltda., apenas nos meses de abril e maio de 1998. O gasto poderia ser melhor esclarecido, caso tivéssemos tido acesso à contabilidade do ano de 1998, conforme solicitado por esta Comissão, por intermédio do Ofício nº 264//00-P. Em resposta a esse Ofício, a Federação enviou um CD-Room, contendo documentos contábeis, supostamente relativos aos anos de 1995 a 2000; porém, não foi possível o acesso ao triênio 1998/2000, por falta de um programa instalador que não constava do CD enviado. Essa constatação foi confirmada pelo departamento de contabilidade da Federação, via contato telefônico, mais especificamente, pela Sra. Conceição, responsável pela confecção do CD. Instada a remeter, por e-mail, o programa, disse não ser possível, dada a informalidade. É importante destacar que, justamente nesse triênio, encontram-se as operações financeiras mais questionáveis da Federação, e que não foram analisadas contabilmente. 4. RELAÇÃO COM A CBF: Evidentemente, tendo em vista que suas contas estão saneadas, a Federação não recebe nenhum tipo de auxílio da CBF. Para se ter uma idéia do relacionamento da CBF com a Federação Paulista, transcrevemos um trecho do depoimento de seu presidente: “O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – (...) O senhor creditaria à CBF a responsabilidade pela crise do futebol brasileiro atual, à administração da CBF? O SR. EDUARDO JOSÉ FARAH – Dizem os meus companheiros de trabalho que eu sou um homem coerente, e vou manter a minha coerência. Em termos internacionais, em muitas oportunidades dei nota dez para o Ricardo Teixeira; reduzi agora para sete, em razão dos últimos tempos. E, em termos nacionais, a administração da CBF tem merecido de minha parte nota três.” Farah acredita que não tem sido consultado acerca de decisões importantes do futebol brasileiro, por manifestar essas opiniões publicamente. Afirmou, ainda, não ser candidato à presidência da CBF e que não se candidatará à presidência da Federação Paulista, passando ao seu sucessor em 2002. 5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL : Não foi identificada, explicitamente, nenhuma doação da CBF, ou da própria Federação, a políticos do estado. 6. Contrato com Televisão Com relação aos contratos com televisão, a Federação tem um contrato com a TV Globo de Televisão, no valor de R$ 44 milhões. Segundo seu presidente, a Federação é apenas uma “mandatária” do contrato, aconselhando os clubes quanto às melhores opções e, por esse trabalho, ficando com 10% do valor do contrato; os 90% restantes são rateados entre os clubes signatários. Existe um outro contrato, também com a Globo, de publicidade estática; existem outros contratos de repasse de imagens para as emissoras de canais fechados (ESPN, Sport TV, Globosat). Em uma análise global dos contratos, esta Comissão avalia, contrariamente ao que vem acontecendo com as outras Federações, que os contratos são plausíveis, até porque, no caso do futebol paulista, há um razoável concorrência entre as emissoras, o que possibilita melhores condições para negociação. Segundo Farah, os contratos com empresas de televisão são as principais fontes de receita para a entidade. Segue um trecho do depoimento que retrata essa situação: “O SR. DEPUTADO RUBENS FURLAN: (...) Por outro lado, nós temos conhecimento de que a Rede Globo às vezes consegue modificar o horário das competições pela conveniência da sua... da sua audiência. E ontem nós estávamos, anteontem, discutindo essa questão e observamos que ela é, praticamente ela detém o monopólio de transmissão e de publicidade. Eu quero perguntar pro senhor se esses patrocinadores, até, principalmente, vamos colocar aqui com muita franqueza, a Rede Globo, ela atrapalha o desenvolvimento dos nossos campeonatos? O SR. EDUARDO JOSÉ FARAH – Nós já jogamos nesse campeonato, na série A-1, oitenta partidas de futebol: 10 rodadas com 8 jogos. Nenhum jogo foi mudado dia e horário, neste ano, felizmente. Anteriormente tivemos algumas mudanças.. A Globo compra e paga. E, se ela conseguir colocar um jogo às duas horas da manhã, ela vai procurar conseguir colocar o jogo às duas horas da manhã; agora, o dirigente tem que passar uma certa autoridade. (...) Vai jogar no Morumbi. Não tem transporte. Então, o senhor nota que no campeonato paulista, 80 jogos, não houve uma única mudança. E em outras competições já aconteceram muitas mudanças. Então, é a fragilidade do comando. Infelizmente, o futebol brasileiro está carente de um comando mais rígido, mais duro.” SERGIPE 1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DAS FEDERAÇÕES : A Federação Sergipana de Futebol é uma associação civil, para fins desportivos, que não remunera seus dirigentes. Trata-se de típica entidade de direito privado sem fins lucrativos. 2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA: A Federação Sergipana de Futebol é presidida por José Carivaldo de Souza há dez anos. 3. SITUAÇÃO FISCAL E FINANCEIRA 3.1. IMPOSTO DE RENDA E BENS DA FEDERAÇÃO A Federação, conforme dados da receita federal, não declarou Imposto de Renda nos exercícios de 1996 e de 1997. José Carivaldo afirmou, em seu depoimento, que a Federação não tem bens. Contudo, pelas informações declaradas junto à receita federal em 2000 (referindo-se ao exercício de 1999), a Federação tem bens imóveis no valor de R$ 1.636,00. Estranhamente, no ano anterior, há registro apenas no item “outros bens e direitos do ativo permanente”, declarado em R$ 1.470,20. Já em 1998, com referência ao ano-calendário 1997, verifica-se o registro de bens apenas neste último item, num valor de R$ 2.623,90 (conforme Anexo 29/01, sigilo fiscal). O conflito entre o dito e o declarado no Imposto de Renda demonstra certo descontrole das contas e do patrimônio. Segue, abaixo, depoimento do José Carivaldo acerca da propriedade ou não de bens pela Federação: “Não tem não. Que eu saiba, não. Eu cheguei junto à Federação, quando eu assumi, nós tínhamos mais de trinta ganhos de causa na Justiça do Trabalho de árbitros. Esse trabalho todo foi feito em fazer todos esses pagamentos. Agora, nós não temos nenhum bem de jeito e hipótese nenhuma. Nunca tivemos. Vou procurar saber lá da contadora, onde o que ela achou.” 3.2. OUTRAS MOVIMENTAÇÕES BANCÁRIAS DA FEDERAÇÃO Da movimentação financeira anual da Federação Sergipana, verifica-se a destinação de verbas a clubes do estado. No entanto, constatou-se o pagamento, em cheque único datado de 12/04/2000, no valor de R$ 101.937,50, em favor de Antônio Costa de Saraiva. Trata-se de pagamento que foge à realidade da Federação, de pouca movimentação financeira, e que ficou sem esclarecimentos. 4. RELAÇÃO COM A CBF 4.1. AUXÍLIOS DA CBF À FEDERAÇÃO A Federação Sergipana de Futebol recebeu da CBF, nos anos de 1998 a 2000, os seguintes valores: em 1998, R$ 6.000,00 por mês, com exceção do mês de dezembro, quando a Federação recebeu R$ 16.000,00; em 1999, o repasse mensal foi de R$ 12.000,00, com as exceções de janeiro, que foi de R$ 6.000,00, maio, de R$ 22.000,00, agosto, de R$ 14.030,00 e novembro, de R$ 42.000,00; já em 2000, os repasses, mês a mês, foram os seguintes: janeiro, R$ 42.000,00; fevereiro, maio a julho, setembro a dezembro, R$ 12.000,00; março e abril, R$ 62.000,00, e agosto, R$ 52.000,00. Estranha-se o aumento dos valores oriundos da CBF no ano 2000, exatamente quando houve o pleito eleitoral para cargos municipais, o que levanta suspeitas sobre o presidente da Federação, eleito Prefeito do município de Macambira, estado de Sergipe, em outubro de 2000. José Carivaldo, em seu depoimento, nega a hipótese de beneficiamento à sua candidatura ou a outras: “O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Nós sabemos que o senhor é Prefeito de Macambira. O SR. JOSÉ CARIVALDO DE SOUZA – Isso. O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Parabéns pela vitória eleitoral. Em seguida, faço a pergunta que eu já fiz a outro. A federação do senhor ajudou na campanha de alguém? O SR. JOSÉ CARIVALDO DE SOUZA – Não senhor. Inclusive quando, três, quatro meses. Teve um ano inclusive que eu sou reeleito. Fui eleito em, fui reeleito, agora, com sete vezes mais a diferença com 70% quase do eleitorado de minha terra. Inclusive digo aqui aos senhores que procuram até saber pelo trabalho que nós estamos fazendo realmente na administração pública lá do nosso Município. Mas, eu nunca usei a federação para fins políticos.” 4.2. A PARTICIPAÇÃO DA FEDERAÇÃO NA ASSEMBLÉIA DA CBF José Carivaldo afirma que as contas da CBF são aprovadas apenas formalmente, sem qualquer discussão dos membros da Assembléia. A atitude da CBF, criticada pelo presidente da Federação sergipana, demonstra certo desprezo da entidade nacional pela instância que é a assembléia geral. Segue abaixo trechos do depoimento do José Carivaldo: “O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Presidente José Carivaldo, o senhor esteve presente na reunião na assembléia que aprovou as contas do senhor Ricardo Teixeira? O SR. JOSÉ CARIVALDO DE SOUZA – Em todos os anos da minha administração, no final do ano, eu estive presente e aprovei as contas. E digo aos senhores lá, assim que nós chegamos, no horário, nos passam um caderno dessa altura com todo o movimento da CBF durante todo o ano e com o parecer do conselho fiscal. Quando todas foram por unanimidade, salvo engano. E não era uma federação sergipana já tão sacrificada e tão pequena que iria, naquela hora, discordar e também não teria condições. Porque, nós não temos condições de verificar as contas naquele momento. Porque, pegam as contas, vai um presidente da federação presidir os trabalhos e diz ‘quem aprova fique sentado, quem não aprova me levante’. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Me deixa entender, a reunião, a assembléia é um dia, dois dias? O SR. JOSÉ CARIVALDO DE SOUZA – É um dia não. É só um horariozinho. Começa um horário e termina. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – E vocês tomam conhecimento desse calhamaço de números então na hora lá. O SR. JOSÉ CARIVALDO DE SOUZA – Na hora , entrego lá o relatório. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Daí a meia hora tem que tá votando. O SR. JOSÉ CARIVALDO DE SOUZA – Daí a meia hora já tá aprovado.” 5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL O presidente da Federação Sergipana de Futebol é prefeito reeleito do município de Macambira, estado de Sergipe. Conforme observado acima, o período eleitoral municipal de 2000 coincidiu com um aumento substancial das verbas enviadas pela CBF à Federação. A suspeita de utilização da doação em campanha eleitoral tem um forte fundamento nesses dados, embora em seu depoimento à CPI, o José Carivaldo tenha negado vínculos entre a entidade e as eleições. 6. CONTRATOS COM A TV A Federação Sergipana de Futebol não possui contratos de transmissão de jogos com emissoras de televisão. 7. RELAÇÃO COM OS CLUBES 7.1. SOBRE A FINAL DO CAMPEONATO SERGIPANO EM 2000 Constatou-se que em 2000, a relação entre a Federação Sergipana e a Associação Desportiva Confiança foi conflituosa. É que a data marcada para a realização da final do campeonato sergipano da 1ª divisão foi adiada, de modo que o Confiança, que compareceu ao local e horário determinados para disputar a partido com o Clube Sportivo Sergipe, viu-se prejudicado com a decisão da Federação. O Confiança protocolou seu protesto na Federação em 27/11/2000, assim como o pedido para que fossem tomadas as medidas necessárias, tendo em vista a ausência do Clube Sergipe. Posteriormente, em outra data, o Clube Sergipe compareceu e o Confiança não, tendo este último sofrido WO. A CPI recebeu denúncias dando conta que a Federação beneficia o Clube Sergipe. Perguntado a respeito, o José Carivaldo negou as suspeitas e justificou o adiamento daquela final de campeonato em função de problemas no estádio “Batistão”. A questão foi assim tratada na sessão desta CPI que ouviu o presidente da Federação: “O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Nós tomamos conhecimento que o campeonato estadual do ano passado conheceu o seu campeão, mas, porém, não foi de uma forma pacífica. O senhor pode explicar os fatos? O SR. JOSÉ CARIVALDO DE SOUZA – Explico. Nós tivemos problema com o Batistão, que infelizmente desabou as suas marquises e, desde o campeonato de 89 e 90, nós estávamos sem estádio em Aracaju. E depois nós vamos chegar lá, inclusive com alguma ajuda financeira que nós solicitamos para esse respeito. E numa partida, a decisão de um turno, a Polícia Militar do nosso Estado disse que não se responsabilizaria pelo jogo no estádio do Confiança. Aí nós tomamos a providência de cancelar a partida e o meu desejo era fazer no próprio estádio, fazendo algumas modificações, inclusive me responsabilizando, dividindo, fazendo aquilo que a Polícia Militar quisesse. Infelizmente, a diretoria do clube não aceitou, não nos deixou entrar e eu comunico: a única coisa que eu tinha condições de fazer era transferir para o estádio de uma cidade, Itabaiana, que dista 40 quilômetros da capital, o jogo, e o Confiança não compareceu e nós demos o jogo como W-O.” 7.2. MATERIAL ESPORTIVO Denúncias que chegaram à CPI sugeriam que o presidente da Federação adquiria material esportivo destinado aos clubes e que não efetuava esse repasse devidamente. Perguntado a esse respeito, José Carivaldo negou a denúncia, conforme se verifica abaixo: “O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Senhor José Carivaldo, em 1993, a federação recebeu material esportivo da CBF para ser repassado aos clubes. Esse material chegou aos clubes? O SR. JOSÉ CARIVALDO DE SOUZA – Chegou. Chegou. O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Porque, tem muita conversa que não chegou, doutor José Carivaldo. O SR. JOSÉ CARIVALDO DE SOUZA – Não. Aí, ao contrário. Eu dou material esportivo todo ano aos clubes. E se é uma coisa, mesmo aqui, eu tenho em minha vida e vou levar é minha honestidade com tudo que eu faço. Eu posso até errar administrativamente. Agora, honestamente, é eu jamais fiz uma coisa que viesse denegrir a minha imagem.” 8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DO FUTEBOL Da análise do depoimento do José Carivaldo e dos documentos enviados à CPI, não foram encontradas informações ou denúncias relevantes na relação entre a Federação e empresários do futebol. 9. CONCLUSÕES , ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES Da análise dos documentos e do depoimento do José Carivaldo de Souza, conclui-se que a Federação Sergipana de Futebol é gerida de forma temerária em termos administrativo, financeiro e fiscal. Recomenda-se uma reforma estatutária para limitar o mandato da diretoria da entidade em no máximo quatro anos, impedindo a recondução aos cargos; para permitir uma maior autonomia do conselho fiscal; para obrigar a realização de licitação para a aquisição de bens e de material esportivo; e para estabelecer maior transparência nas contas da Federação e nos repasses de verbas que envolvam a entidade e os clubes. Sugere-se encaminhar o presente Relatório à Receita Federal, ao Ministério Público Federal, ao Ministério Público do Estado de Sergipe – no tocante a eventuais ofensas à Lei nº 8.078/90 e à Lei nº 9.615/98 (art. 42, § 3º) –, e ao Ministério Público Eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral de Sergipe, com base na Lei nº 9.504/97. TOCANTINS 1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DA FEDERAÇÃO : A Federação de Tocantins possui personalidade jurídica de sociedade civil de direito privado, regida pelos artigos 20 a 23 do Código Civil Brasileiro. 2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA : Pôde-se perceber que a Federação de Tocantins é de porte bastante modesto, quer técnico, financeira e administrativamente (possui apenas três funcionários). Fundada há onze ano por seu atual Presidente, Senador Leomar de Melo Quintanilha, esteve durante todo esse tempo sob o comando do Senador. O Sr. Leomar, em seu depoimento (Notas Taquigráficas 000345/01), fez questão de deixar claro que não recebe qualquer tipo de remuneração e que, por duas vezes, foi reeleito contra sua vontade, já que, apesar de gostar da atividade, absorve muito seu tempo devido as dificuldades próprias de um futebol de pequena expressão no contexto nacional. 2.1 CONTABILIDADE E PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS DE GESTÃO DA DESPESA: Com relação à contabilidade da Federação, pôde-se perceber, com base no confrontamento da movimentação financeira e os lançamentos constantes dos documentos contábeis, enviados a esta Comissão, várias inconsistências nos últimos cinco anos, de modo a tornarem a contabilidade da Federação Tocantinense não confiável, no que diz respeito a espelhar fielmente a vida financeira da Entidade. Por vezes, o procedimento de compras e pagamento de despesas, inclusive salários de contratado, da FTF é, no mínimo, questionável: são emitidos cheques nominais a funcionários da Federação, normalmente de valores elevados (acima de R$ 60.000,00), os quais são descontados na “boca do caixa” (conforme extratos bancários), e os pagamentos são feitos em espécie. 3. SITUAÇÃO FISCAL/FINANCEIRA Inicialmente, foi observado que a Federação não entregou as Declarações de Imposto de Renda de Pessoa Jurídicas referentes aos exercícios de 1996 e 1997, e quando seu Presidente foi questionado quanto à omissão, sinalizou que não tinha conhecimento da obrigatoriedade de, mesmo isenta, apresentar a declaração; em seguida, reconheceu a falha. Com relação às demonstrações constantes da Declaração de Renda, foi questionada a falta, na Demonstração de Origens e Aplicação de Recursos do ano calendário de 1998, do registro das doações da CBF; após algumas ponderações e dúvidas, o Sr. Leomar concordou que houve um deslize por parte do contador. 3.1 CONSTRUÇÃO DO ESTÁDIO Por meio da análise da movimentação financeira da Federação, observouse emissões de cheques que totalizaram, em 1999 e 2000, mais de três milhões e setecentos mil reais, tudo sem passar pela contabilidade da Federação. Se aumentarmos o período da análise para 1995-2000, verifica-se que houve o ingresso nas diversas contas da Federação do montante de R$ 7.666.864,38. Questionado, o Sr. Leomar explicou que trata-se de um convênio com o Governo do Estado, para a construção de um estádio de futebol. Todo o recurso destinado para a obra é apenas repassado para construtora, sem ser apropriado ao patrimônio da Federação, uma vez que por determinação legal, o convênio possui conta bancária específica. Considerando as dimensões do futebol no estado e as condições financeiras daquela Unidade da Federação, cabe um questionamento do binômio custobenefício desses gastos, observando-se os retornos da empreitada. Um outro aspecto que ficou claro é a ausência de fiscalização desses recursos, por parte do Estado. 3.2 EMPRÉSTIMOS Foram observados vários empréstimos da Federação ao seu presidente, que totalizaram R$ 41.506,65. Um outro fato relevante, é que alguns empréstimos foram simplesmente anistiado pelo dirigente da entidade, sem nenhum motivo aparente. O Conselho Fiscal também não questionou tal atitude. 3.3 GASTOS QUESTIONÁVEIS Da análise da documentação enviada a esta Comissão, verificou-se vários gastos que refogem aos ditames estatutários. Como exemplo, podemos citar publicação em jornal, paga pela Federação, de matérias não relacionadas ao Futebol, pagamento de indumentárias carnavalescas, organização de eventos direcionados a outros fins, que não o desportivo, etc. 4. RELAÇÃO COM A CBF: A Federação Tocantinense recebe mensalmente a “mesada” da CBF; segundo seu Presidente é de fundamental importância para o desenvolvimento das atividades da Federação, dada a escassez de recursos no desporto do Estado. 5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL : Não foi identificada, explicitamente, nenhuma doação da CBF ou da própria Federação a políticos do estado, tendo inclusive a negativa do Sr. Leomar, durante seu depoimento a esta Comissão. Cabe registrar que o Sr. Leomar foi eleito Senador em 1995, quando já era Presidente; porém, também negou qualquer utilização da Federação de Futebol para fins políticos. 6. CONCLUSÃO Conclui-se, assim, que é necessário uma análise mais acurada, por parte dos órgãos de controle, das esferas federais e estaduais, com o objetivo de esclarecer aspectos duvidosos que surgiram da análise da administração da Federação Tocantinense de Futebol. CAPÍTULO XI – P ASSAPORTES FALSOS DE JOGADORES Sub-Relatorio sobre Passaportes Deputado JURANDIL JUAREZ Sub-Relator da CPI da NIKE, para assuntos de passaportes falsos INTRODUÇÃO Tendo em vista artigos publicados nos jornais Folha de São Paulo e O Estado de São Paulo sobre violação dos princípios que regem o desporto nacional – Lei nº 9.615/98 –, perpetrada em cláusulas do contrato de patrocínio o firmado entre a Confederação Brasileira de Futebol e a NIKE, foi criado esta Comissão Parlamentar de Inquérito, por Ato da Presidência da Câmara dos Deputados, a requerimento do Sr. Deputado Aldo Rebelo e outros. Em virtude das graves denúncias divulgadas pela imprensa acerca de irregularidades no futebol brasileiro, envolvendo, inclusive, a utilização de documentos falsos de jogadores, como passaportes de outras nacionalidades, diminuição da idade, uso de documentos de terceiros, com o fim de transferir jogadores brasileiros para outros países, foi criado, no âmbito da Comissão, uma Sub-Relatoria para investigação de passaportes falsos. Assim a realização de algumas investigações e da oitiva de testemunhas, tornou-se possível entender o desenvolvimento desse esquema de falsificação de documentos, com o objetivo de transacionar jogadores com times estrangeiros. Neste relatório , procedemos a um relato dos principais fatos aqui denunciados e investigados. O Esquema de Passaportes Falsos com Portugal - Lisboa Do encontro com o Embaixador Synésio Sampaio Goes Em reunião protocolar, foi relatado ao Embaixador Synésio Sampaio Goes o objeto da diligência a ser efetuada em Portugal, tendo sido designado um funcionário daquela representação brasileira para acompanhar os trabalhos a serem desenvolvidos em território português. DAS CONVERSAS COM JORNALISTAS PORTUGUESES O jornalista João Esteves e o Diretor Victor Serpa do jornal A Bola relataram ser a questão da emissão de passaportes falsos portugueses um problema antigo. Já em 1977, noticiava-se o caso de oito jogadores brasileiros do Celta da Espanha. Naquela oportunidade, os passaportes falsos dos jogadores brasileiros também foram utilizados para apresentá-los com idade menor do que a verdadeira. Jogadores da Seleção de Camarões, que nunca haviam estado em Portugal, foram identificados portando passaportes portugueses. Jogadores africanos foram também apontados como portadores de passaportes falsos franceses, belgas e portugueses. Informaram que, segundo a imprensa local, o Sr. Hermínio Menendez estaria disposto a prestar esclarecimentos sobre o Caso Edu e sugeriram que fossem contatadas autoridades do Ministério da Administração Interior e da Policia Judiciária. Sobre o assunto, reportagem do Jornal A Bola, de 23 de novembro, e o dossiê “O caso dos passaportes falsos”. O jornalista Hélio Nascimento (Jornal Record) e o correspondente do Jornal do Brasil em Lisboa, jornalista Tedesco, relataram o interesse da imprensa portuguesa em pesquisar e noticiar o assunto, e as dificuldades enfrentadas para obter informações junto à Polícia Judiciária. Não detinham dados sobre o nível de aprofundamento das investigações efetuadas pelas autoridades policiais sobre o caso . Foi efetuada coletiva com profissionais da imprensa local (jornal, rádio e televisão), convocados pela Embaixada brasileira em Portugal. Na oportunidade, foram repassadas as informações até então obtidas junto aos órgãos oficiais portugueses. DOS FATOS RELATADOS PELO CÔNSUL -GERAL DO BRASIL EM LISBOA O Ministro Pedro Motta, Cônsul-Geral do Brasil em Lisboa, apresentou relato informando sobre o aumento significativo do fluxo migratório de brasileiros para Portugal, especialmente nos últimos 10 meses. Muitos brasileiros encontram-se em situação irregular naquele país, vivendo em condições precárias, alguns inclusive morando em containers de lixo. Em média, 350 brasileiros procuram diariamente o Consulado para obter registro. Apontou para a necessidade do estabelecimento de uma política brasileira de imigração, mostrando-se especialmente preocupado com a situação dos jogadores brasileiros menores de idade. Relatou que atualmente agem no território português diversas quadrilhas organizadas – as máfias portuguesa, africana, russa e a albanesa –, sendo o país utilizado como ponto de entrada de imigrantes ilegais na Europa e como trampolim para os que têm como destino os USA . DO ENCONTRO COM AUTORIDADES POLICIAIS PORTUGUESES Alegando segredo de justiça, o Diretor da Interpol, Dr. Chaves de Almeida, declarou-se impedido, não podendo fornecer informações aprofundadas sobre processo recentemente instaurado com o objetivo de averiguar o caso de passaportes falsos portugueses. Com a interveniência do Diretor da Interpol no Brasil, Dr. Washington, foram obtidos os nomes dos jogadores brasileiros que estariam arrolados no processo, a seguir identificados: André Augusto Leoni Jedias Capucho Neves Nelson de Jesus Neves Edmilson Rocha Andrade Mendes Jorge Henrique Amaral de Castro Marcos Assunção José Vitor Roque Junior Varley Silva Santos Alberto Valentin do Carmo Neto O Dr. Luís Filipe Ramos bonina, Diretor-Geral da Polícia Judiciária, afirmando ser a questão dos passaportes falsos um assunto que tem merecido especial atenção das autoridades policiais portuguesas, informou sobre a alteração a ser introduzida brevemente na formatação dos passaportes portugueses com a finalidade de inibir a atuação dos falsários. Perguntado sobre os processos instaurados contra brasileiros, declarou que estão sendo tratados com prioridade, mas, a exemplo da autoridade policial ligada à Interpol em Portugal, alegou ser uma matéria que tramita em segredo de justiça. Para viabilizar a entrega de cópia do processo, solicitou envio de requerimento do presidente da CPI da CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA DE FUTEBOL/Nike àquele órgão. O Dr. Antônio de Lencastre Bernardo, Diretor-Geral do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, informou ser da competência do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras emitir passaporte tão-somente para cidadãos estrangeiros residentes em território português, cujos países de origem não tenham representação diplomática em Portugal. Sugeriu que a solicitação de cópia dos processos sobre envolvimento de jogadores brasileiros com passaporte falso (lista do item “e”) fosse efetuada por intermédio da Embaixada brasileira. Ressaltou que as medidas a serem adotadas, a partir de 2 de janeiro de 2001, no tocante à formatação dos passaportes portugueses, resultarão em substancial diminuição da possibilidade de fraude. Até o momento, não detém dados que possibilitem estabelecer uma conexão entre brasileiros e as quadrilhas que agem em Portugal, alegando, inclusive, que as autoridades italianas não estariam repassando informações adicionais sobre a ocorrência de furto de passaportes em branco nos consulados portugueses em Genebra/Suíça e Vizeu/Portugal. Informou, ainda, sobre a existência de uma quadrilha de fraudadores (grupo de Governador Valadares) que estaria enviando brasileiros para os USA, via Portugal. Abordou, também, a preocupante questão do forte fluxo migratório de brasileiros que, em Portugal, passam a viver em condições precárias, assumindo postos de trabalho na construção civil, casando-se com prostitutas para obter visto de permanência, principalmente nas regiões de Mafra e de Costa de Taparica. Seriam responsáveis pela migração desses brasileiros intermediários de mão-de-obra e agências de viagem. DO ENCONTRO COM O DEPUTADO OCTÁVIO TEIXEIRA O Deputado Octávio Teixeira, do Grupo parlamentar do PCP – Assembléia da República, declarou que, no âmbito do Parlamento Português, registrouse tão-somente a iniciativa de apresentação de um Requerimento de Informações sobre as denúncias veiculadas na imprensa acerca do surgimento de passaportes falsos, do Deputado Hermínio Loureiro, do PSD (Partido da bancada governista), em anexo. Informou sobre a existência de problemas no futebol português, que age com total independência, financiado por off shores e máfias. Paralelamente, alertou para a situação degradante e precária em que vivem brasileiros (principalmente nas ilhas de Açores), entregando matéria publicada no jornal O Público, sobre o assunto. Sobre a eficácia das entidades policiais, ressaltou que existe confiança na qualidade dos trabalhos desenvolvidos. DO ENCONTRO COM PESSOAS ENVOLVIDAS NO PROCESSO DE AQUISIÇÃO DE PASSAPORTES O Sr. Antônio Carlos de Almeida Castro apresentou-se como advogado do Sr. Juan Figer, que teria sido enviado a Portugal pelo seu cliente para esclarecer fatos relativos ao Caso Edu, propondo-se, inclusive, a comparecer a uma reunião acompanhado de pessoas que deteriam informações sobre o assunto (advogado João Gonçalves, empresário espanhol Hermínio Menendez e o empresário ioguslavo Miroslav Nestorovic). Os Srs. Hermínio Menendez e Miroslav Nestorovic, acompanhados do seu advogado de nacionalidade portuguesa, Dr. João Gonçalves, apresentaram-se como sócios em um empreendimento – Centro Desportivo em Marbella, Espanha, denominado Marpafut – local que seria utilizado por grandes times do mundo inteiro para pré-temporadas. O Sr. Menendez informou ter sido Diretor-Geral do Clube Sevilha, Sub-Diretor-Geral do Sporting da Espanha e detentor de 3 medalhas olímpicas. Perguntado sobre seu relacionamento com o Sr. Juan Figer, Sr. Menendez negou manter sociedade com o mesmo, informando ser apenas um colaborador, tendo intermediado a realização de jogos, torneios e cuidado dos interesses de alguns jogadores na Espanha, cujos passes foram negociados pelo Sr. Juan Figer. Mantém escritório em Madri (Padre Darnian 42-10, Madrid, fone: 913458981). Passaram a relatar o seguinte: O avô do Edu seria português. O Sr. Juan Figer teria comentado com o Sr. Menendez que estaria negociando o passe do jogador brasileiro Edu com o Clube Arsenal da Inglaterra e enfrentando dificuldades com o passaporte do jogador. Na qualidade de amigo, teria tentado ajudá-lo e comentou o caso com seu sócio iugoslavo, o Sr. Nestorovic, que, em Marpafut, conversando sobre o assunto com um português de nome Caldeira (branco, cabelos negros, boa apresentação, de 35 a 40 anos, fone: 00351 918325370), soube que o mesmo tinha uma empresa por meio da qual poderia resolver o problema do passaporte do jogador em Portugal, em duas semanas. Em troca, queria tão-somente vaga nos meses de janeiro e fevereiro de 2001 no Centro Desportivo Marpafut para uma equipe alemã de futebol. O Sr. Caldeira comprometeuse a entregar o passaporte português do jogador em 2 semanas. Para viabilizar a confecção do passaporte, o Sr. Nestorovic entregou documentos do jogador Edu para o Sr. Caldeira em Marbella, que, após 30 a 45 dias, entregou-lhe o passaporte português do jogador Ed. O Sr. Nestorovic repassou o passaporte para o Sr. Menendez que, em Londres/Inglaterra, entregou ao Sr. David Tean, funcionário do Clube Arsenal, que, após fazer uma cópia do documento devolveu o original. Edu encontrava-se em Londres para fazer exames médicos, oportunidade em que, na presença do Sr. Marcel Figer, recebeu seu passaporte português, retornando ao Brasil. O Sr. Menendez e o Sr. Nestorovic afirmam que não houve participação do Sr. Juan Figer neste caso de emissão do passaporte português do jogador Edu. Em espécie, o Sr. Nestorovic entregou ao Sr. Caldeira mais ou menos 400 dólares para pagamento de taxas e serviços relativos à emissão do passaporte em Lisboa, afirmando não recordar o valor exato que teria repassado (68 ou 86 mil pesetas). Os encontros entre os dois ocorreram em Marbella (duas vezes) e os demais contatos foram telefônicos (três vezes). O Sr. Nestorovic afirmou, ainda, ter ido a Lisboa apenas quando o caso veio à tona, em julho deste ano, alertado que foi pelo Sr. Hermínio. Os advogados e empresários presentes ao encontro afirmaram desconhecer se o Sr. Juan Figer seria empresário dos jogadores Dida, Marcos Assunção, Jorginho e Alberto. Na oportunidade, o Dr. Antônio Carlos ligou para o Sr. Marcel Figer que afirmou serem (ele e seu pai, Sr. Juan Figer) empresários apenas do jogador Warley. O passe do jogador foi vendido ao clube italiano Udinese, que se responsabilizara pela sua documentação. O Sr. Nestorovic informou, também, que o Sr. Caldeira teria afirmado que, no caso do passaporte português do jogador Edu, fora auxiliado por dois portugueses: o Sr. Joaquim Silva residente à Av. Dom Carlos I, nº 2770, Amadora/Portugal, fone 9653.66866) e o Sr. Domingos Djalo (residente à, Av. 25 de Abril nº 7, loja 2750, Cintra/Portugal, fone 9670.35405). Essa informação do Sr. Nestorovic obteve quando o caso do passaporte Edu foi noticiado. Apesar de ter tentado manter contato telefônico com as pessoas nominadas, o Sr. Nestorovic afirmou não ter conseguido contatá-las. Informou, ainda, o Dr. Gonçalves que o Sr. Caldeira foi recebido em seu escritório por seus auxiliares, acompanhado do Sr. Nestorovic, oportunidade em que devolveu os documentos do avô do Edu, tais como, certidões de nascimento e de casamento. Concluíram, afirmando que iriam registrar queixa na polícia portuguesa contra o Sr. Caldeira . Das Investigações Realizadas em Vicenza, Itália DOS CONTATOS COM JORNALISTAS EM VICENZA Em Vicenza, foi mantido contato com os jornalistas Pier Paolo Marino, da imprensa italiana, e Paola Roleta, da imprensa portuguesa, com os quais foram trocadas impressões sobre o curso da diligência. Os jornalistas foram incisivos em afirmar o envolvimento do empresário Juan /Figer com grande número de jogadores portadores de passaporte sob investigação, entre eles Marcos Assunção e Alberto, fato peremptoriamente negado pelo representante do empresário Juan Figer em Portugal. DOS RELATOS FEITOS PELO DR. STEFANO SARTORI Dr. Stefano Sartori, Responsável do Setor Sindical da “Associazione Calciatori Professionisti Italiani” relatou que, sobre a emissão de passaportes falsos, só dispõe das informações veiculadas pela imprensa. A Associação possui uma relação com os nomes dos jogadores brasileiros e argentinos no futebol italiano, que demonstra ter o número de jogadores dessas nacionalidades crescido nestes últimos cinco anos. Dr. Sartori acredita que esse crescimento decorre da sentença Bosman (jogador do Liege da Bélgica), que, a partir de dezembro de 1995, permitiu ampla liberdade de circulação de jogadores de futebol na União Européia. Isso estimulou o surgimento de passaportes falsos, não apenas de nacionalidade portuguesa, mas também espanhóis e italianos. A Associação, por intermédio de uma greve, conseguiu limitar o número de jogadores estrangeiros (extracomunitários) nas equipes italianas (máximo de cinco jogadores por equipe). Afirmou que os grandes responsáveis pela situações irregulares dos passaportes são os clubes e os procuradores dos jogadores, ressaltando sua preocupação com a presença de menores no futebol italiano. Segundo registro do Setor Juvenil e Escolar da Federação Italiana de Futebol, existem 4.809 menores, na faixa de 6 a 16 anos, extracomunitários, de várias nacionalidades, atuando no futebol italiano. Informou, ainda, não saber se algum procurador de jogador de futebol estaria respondendo processo na Justiça. DAS CONVERSAS MANTIDAS COM AUTORIDADES POLICIAIS Os Drs. Marcello Moracca, Delegado de Vicenza (Questore di Vicenza), e Edoardo Cuozzo, Dirigente do Departamento de Estrangeiros (Ufficio Stranieri), informaram que os jogadores brasileiros entram na Itália com passaporte brasileiro. Posteriormente é que apresentam o passaporte comunitário. Há processos correndo naquela instituição para apurar os crimes de falsidade ideológica e de favorecimento de imigração clandestina contra Careca, Jeda, Dedé e Mário Pavan, em fase de instrução. O juiz encarregado do processo, Dr. Mazza, irá decidir quanto à abertura ou não do processo criminal. Informou também a autoridade policial que no contrato de venda do passe do jogador Jeda encontram-se estipulados dois valores: US$ 300 mil, na hipótese de passaporte extracomunitário, e US$ 1 milhão, se obtivesse passaporte comunitário. Acusa dificuldade para prestar informações sobre casos ocorridos em outras regiões, haja vista que a Questura di Vicenza tem jurisdição apenas sobre aquela região. Sobre o contrato do jogador Dedé, informou que o mesmo é de US$ 600 mil e refere-se tão somente à hipótese de porte de passaporte comunitário. Sobre o processo contra o ex-jogador e empresário Careca, informou a autoridade policial que o mesmo já havia prestado depoimento em 25 de novembro, tendo a inquirição durado 7 horas. Por sugestão do Dr. Marcello Moracca, foi solicitado ao Consulado Brasileiro em Milão que encaminhasse oficialmente documento requerendo cópia do inteiro teor do referido processo, conforme cópia anexa (Anexo). A solicitação foi atendida pelo juiz e os documentos, dado o grande volume, serão encaminhados, por correio, de Vicenza para Milão e, posteriormente, para esta CPI. DAS INFORMAÇÕES PRESTADAS PELO JOGADOR JEDAÍAS CAPUCHO NEVES O jogador Jeda, Jedaías Capucho Neves, informou que chegou à Itália levado pelo ex-jogador Careca. Jogava, à época, no Clube União São João de Araras que o emprestou ao Clube campinas de propriedade dos ex-jogadores Careca e Edmar. Na Itália, participou de um torneio conhecido como Copa Carnevale na toscana, do qual foi vice-artilheiro. Retornando ao Brasil, voltou a jogar normalmente no União. Em razão de sua atuação destacada na Itália, despertou interesse do Clube de Vicenza, que enviou ao Brasil um de seus diretores de nome Manfredone. As negociações foram intermediadas pelo Careca que, nesta ocasião, lhe perguntou se tinha alguma ascendência portuguesa. Jeda informou ao Careca ser possível, mas que não teria documentos comprobatórios, nem meios para obtê-los. Em junho de 2000, o atleta realizou teste no Clube Vicenza, acompanhado do Sr. José Mário Pavan, presidente do União, e do ex-jogador Careca. Nessa oportunidade, o jogador Jeda utilizou passaporte brasileiro, tanto para entrar, quanto para sair da Itália. Numa reunião preliminar destinada a estabelecer as condições para assinatura do contrato, houve discordância quanto às bases financeiras oferecidas. Acertadas as condições, foi assinado o contrato do atleta com o clube, sem cláusula sobre porte de passaporte comunitário. Posteriormente, afirmou o jogador Jeda, ficou sabendo que o contrato de transferência do Clube União São João para o Vicenza teria dois valores: US$ 300 mil, se o passaporte fosse extracomunitário, e US$ 1 milhão, na hipótese de obter passaporte comunitário. Lembrou que, em março de 2000, havia entregue documentação para a emissão de novo passaporte, sem indicar, entretanto, que tivesse ascendência portuguesa. Essa documentação foi entregue ao Careca, por intermédio de um funcionário em Campinas. Soube, posteriormente, por intermédio do Sr. Mário Pavan, que Edmar havia conseguido o passaporte comunitário. O Sr. Paiva foi a Portugal para buscar o documento e fez contato com o Jeda para que este fosse a Milão a fim de assinar o passaporte. Isto feito, foi o passaporte português do jogador entregue ao Sr. Massimo Breash, italiano e procurador do Jeda na Itália, que o entregou ao Clube Vicenza. Nesta oportunidade, Jeda havia retornada a Bari, onde se encontrava em companhia de um amigo, o jogador João Paulo. O jogador Jeda afirmou que teria questionado o Sr. Edmar, por telefone, quanto à legalidade de seu passaporte português, tendo sempre sido informado de que o documento era legal. Informou o jogador que seu passaporte e o do Dedé foram confeccionados na mesma época. Em setembro deste ano, Jeda foi informado pelo Clube Vicenza que a Federação Italiana havia comunicado que os passaportes (do Jeda e do Dedé) não tinham registro no Consulado português. Descoberta a fraude do passaporte. Jeda foi orientado pela diretoria do Vicenza para que o entregasse à questura de Vicenza. O funcionário responsável pelo caso naquela questura, Sr. Cozzo, recomendou ao jogador que retornasse ao Brasil para obter visto, legalizando sua situação na Itália. Assim procedeu, obtendo junto ao Consulado italiano em São Paulo o visto necessário, tendo contado com o apoio do Sr. Eliseu de Oliveira (Tiroga), seu empresário responsável pela venda de seu passe ao União São João. Retornando à Itália, foi intimado a comparecer à questura de Vicenza, ocasião em que foi indiciado em inquérito. O atleta declarou, ainda, não saber o real valor da venda de seu passe, afirmando que, ao questionar o Careca sobre os 15% sobre o valor do referido passe a que faria jus, foi informado que para ter direito a recebê-los, deveria ter estado, no mínimo, por um ano no clube União São João. Disse, ainda, não ter recebido qualquer valor a título de luvas. Recebe, tão-somente, seu salário e está inscrito na Federação Italiana como atleta extracomunitário. Afirmou, também, ter ouvido um diretor do Vicenza, bastante nervoso, afirmar que iria recuperar o dinheiro que havia pago a mais pelo seu passe, de qualquer forma. DAS INVESTIGAÇÕES EM MILÃO, I TÁLIA Das informações prestadas pelo Secretário-Geral da Liga Calcio A Posição da Liga Calcio frente à Questão da Reserva de Mercado o Dr. Giorgio Marchetti, Secretário Geral da Liga Calcio, declarou que as únicas informações que dispunha sobre a questão dos passaportes falsos eram aquelas veiculadas pela imprensa, afirmando ter conhecimento sobre os processos que estavam aguardando uma posição da magistratura. Quando perguntado sobre os contratos baseados em passaportes falsos, como o do Jeda e o do Dedé, disse que a Liga não mantinha controle sobre os contratos, afirmando saber que, em várias cidades, tais como Vicenza, Milão, Udine e Perugia, estavam sendo efetuadas investigações sobre brasileiros e argentinos, nesta situação. A exemplo da Associação de jogadores, declarou-se favorável à manutenção da reserva de mercado, considerando, entretanto, estar cada vez mais difícil a sua manutenção, em decorrência dos tratados da Comunidade Européia. Sobre a circulação de trabalhadores, declarou considerar discriminatória a qualificação dos jogadores em comunitários e extracomunitários, e que tal prática induz a práticas ilegais. Sobre o caso do jogador nigeriano Ikonga, de um time da 3ª divisão do futebol italiano, que obteve na Justiça o direito de jogar sem obedecer à regra da reserva de mercado, afirmou ser esta decisão da justiça um marco que poderia alterar o mercado italiano, liberando-o completamente. Afirmou, ainda, que a União Européia estaria contestando a FIFA sobre as normas para contratação de jogadores e que, qualquer mudança nas regras implicaria repercussão nos demais países do mundo. Quando perguntado sobre a questão dos menores estrangeiros que atuam no futebol italiano, informou que a justiça italiana trata de várias irregularidades, não apenas as ocorridas no âmbito do futebol, como também as relativas a pedofilia e a prostituição. Informou, também, que a Liga cuida tão-somente das questões da série A., sendo da responsabilidade da Federação Italiana de Futebol os casos dos menores. DO CONTATO FEITO COM O DELEGADO DE MILÃO Acerca da situação irregular de brasileiros na Itália, o Dr. Giovanni Finazzo, Delegado de Milão (Questore di Milano), relatou que o caso Dida, do clube Milan, decorre do caso Warley, amplamente divulgado pela imprensa. O presidente do clube, ao constatar a semelhança entre as assinaturas constantes dos passaportes dos dois atletas, procurou a questura de Milão e denunciou a irregularidade notada no passaporte do Dida. A caderneta e os dados eram absolutamente falsos. Por causa da irregularidade constatada, o jogador Dida responde à acusação de falsidade ideológica. O processo encontra-se em fase de instrução e foi enviado, em 4 de outubro do corrente ano, para o juiz encarregado do assunto, Dr. Raimundini. Questionado sobre outros casos de brasileiros em situação irregular naquele país, apontou, como mais premente a situação de diversos travestis que chegam ao país com contrato de trabalho de operário ou de empregado doméstico ou como turista. Em ambos os casos, não necessitam visto. DAS INVESTIGAÇÕES REALIZADAS NO BRASIL Em sequência aos trabalhos de investigação da sub-comissão, no brasil, no âmbito da cpi, foram realizadas audiências públicas oitiva de pessoas cujas atividades evidenciaram envolvimento direto ou indireto, com a emissão de passaportes falsos para jogador de futebol. fruto desse trabalho foram os depoimentos a seguir, que passamos a analisar afim de investigar mais detalhadamente esse esquemas de passaportes e identificar os responsavéis que essas atividades ilegais. Depoimento do Sr. Luiz Landir Amim Castro – PRESIDENTE CLUBE . DO MARANHÃO . DO MOTO O depoente informou sobre a venda dos jogadores Kléber e Delson, este vendido para o Monastir da Tunísia. O dinheiro relativo a essa venda foi recebido pelo Sr. Antônio José Cassas Lima, ex-Presidente do Conselho Deliberativo do Moto. De acordo com o depoente, existem, na Bélgica, cerca de quarenta e oito pessoas que tentaram ser jogadores de futebol. Um dos meninos enviados ao exterior foi o Oliveira, filho do atleta Zé Zico do Moto Clube do Maranhão. As notícias divulgadas sobre essa transação apontavam como responsáveis os Srs. Cassas de Lima e Braid Ribeiro. Braid Ribeiro é um empresário, que se encontra hoje na Tunísia. Outro empresário citado pelo depoente foi Oceonir Barreto, que também atua na transferência de jogadores do Maranhão para outros pontos, no eixo Rio/São Paulo/Paraná. Confirmou também que, para vir do País, todo atleta tem de passar pela Federação local. Indagado sobre as carteiras de atletas dos jogadores, o depoente confirmou que para sua confecção é necessária a apresentação da certidão de casamento. Concernente à diferença entre a idade constante da certidão de nascimento e aquela lançado na carteira, explicou que quem participa do registro é a Federação Maranhense. O clube prepara as carteiras e as leva à Federação para sua respectiva homologação. Há um departamento específico de registro de jogadores. Foi apontado o nome do Sr. Raimundo Nonato como o diretor desse departamento. DEPOIMENTO DO SR. ANTÔNIO CASSAS DE LIMA. Disse o depoente conhecer o empresário Rubolotta. Segundo o depoente, Rubolotta estava à procura de jogadores no Brasil e ele o fez com que no Estado do Maranhão há vários jogadores bons. Desse modo, Rubolotta foi ao Maranhão e comprou diversos jogadores vendidos por Presidentes dos clubes. Confirmou a venda dos jogadores Delson Pereira da Silva e Domingos Marinho Rosa Júnior para a Tunísia. Segundo o depoente, o responsável pela venda foi o Sr. Henrique de Moraes Rego, Presidente do Moto em 98. Negou, todavia, que existem jogadores menores entre os que são enviados ao exterior. Citou o depoente vários outros nomes de jogadores enviados ao exterior. Entre eles: Vamberto, Rubenilson, Clayton, Geraldo, Oliveira, Domingos Júnior. Vários jogadores levados ao exterior foram indicados pelo depoente. Disse ter ouvido falar no caso do jogadores Jackson, que tem uma certidão de nascimento sem a data de 1977 e uma ficha na Confederação Brasileira de Futebol com a data de 1973. Afirmou que há casos em que até mesmo o nome foi mudado. As falsificações são providenciadas pelos empresários que o depoente denominou de “empresários barca-furada” ou “bolso-furado”. O depoente confirmou que chegou a assinar um documento relativo ao jogador Gil, com dados que não eram dele. DEPOIMENTOS DOS SRS. ANTÔNIO DE OLIVEIRA , EDMAR BERNARDES, ANDRÉ AUGUSTO LEONE, ELISEU OLIVEIRA E JOSÉ MÁRIO PAVAN. seguintes: Os pontos mais importantes destacados nestes depoimentos são os O Sr. Antônio Oliveira reportou-se à transação de transferência dos jogadores Jeda e Dedé para a Vicenza da Itália. Todavia, a existência de um passaporte emitido por um país da Europa era importante, já que eles entrariam não como extra comunitários, mas como comunitários. Daí a indagação sobre a existência de parentes portugueses. Esses jogadores pertenciam ao Campinas Futebol Clube, conforme afirmação do Sr. Edmar Bernardes. O Campinas realiza um trabalho com atletas jovens e tem uma escola de futebol para quinhentos alunos, na faixa de cinco a dezesseis anos. O Sr. Eliseu Oliveira se denominou um olheiro do futebol, e não empresário. Disse que o primeiro jogador seu a ir para a Europa através do Careca e do Edmar, foi o Jeda. do Careca. Disse, ainda, que foi ele quem encaminhou a documentação ao escritório Quando ocorreu a negociação o depoente foi convidado a viajar, pelo Vicenza, para acertar o contrato do atleta. Foi-lhe perguntado, quando da negociação, se o jogador era ou não comunitário. O depoente então informou que essa documentação estava sendo providenciada. Essa negociação foi que resultou na produção do passaporte do jogador Jeda. Restou claro, dos depoimentos, que havia dois valores, dependendo de ser o jogador comunitário ou não. Daí o interesse dos agenciadores em providenciar passaporte de um país europeu. De acordo com o depoente Edmar Bernardes quem providenciou o passaporte português para o jogador Jeda foi o Sr. Jimmy Martins, contratado para realizar os trabalhos de despachante. Este mesmo Jimmy Martins providenciou o passaporte português do jogador Dedé. Recebido o passaporte do Dedé das mãos de Jimmy Martins, o Sr. Edmar Bernardes foi até a Itália entregá-lo ao Vicenza. O passaporte do jogador Jeda foi entregue ao Vicenza pelo Sr. José Mário Pavan, após tê-lo recebido em Portugal das mãos de Jimmy Martins. Coube ao Sr. Antônio de Oliveira Filho a contratação dos serviços de Jimmy Martins para conseguir os passaportes portugueses dos jogadores Jeda e Dedé. O depoente Antônio de Oliveira Filho afirmou que Edgar Moura também era parceiro nessas transações com jogadores e agora está movendo um processo contra ele. Todavia, o depoente afirma possuir documentos que comprovam o envolvimento de Edgar Moura nesses negócios. O preço do passaporte, de acordo com o Sr. Antônio de Oliveira Filho ficava em torno de quarenta mil reais, valor cobrado por Jimmy Martins. O passe do jogador Dedé teria custado algo em torno de 350 mil dólares. De acordo com o depoente Edmar Bernardes o passe de um jogador comunitário está em torno de um milhão. Não sendo comunitário, o valor fica em 300 mil. Disse, ainda, o Sr. Edmar Bernardes que Edgar Moura foi um parceiro que ajudou a bancar a viagem, pois eles não tinham o dinheiro para fazê-lo. Desse modo Edgar teria um percentual em cima do sucesso obtido com a negociação dos jogadores. Foi mencionado, pelo depoente Antônio de Oliveira, o nome do Sr. Máximo Briaschi como um procurador que participou das negociações. O Sr. André Augusto Leone, o Dedé, afirmou que não tinha certeza da sua descendência portuguesa. O caso teria sido entregue ao Edmar, para que a busca fosse feita. Esse passaporte segundo o depoente encontra-se preso na questura. O jogador Dedé confirmou que foi à questura para apresentação do seu passaporte, quando a diretoria do Vicenza lhe informou que seu passaporte era falso. O passaporte foi retido e o jogador está sendo processado na Itália por falsidade ideológica. Foi informado, pelo Sr. Antônio Oliveira, a existência do Careca Sport Center, que tem uma escola de futebol, trabalhando com jovens de cinco, seis, até dezesseis ou dezessete anos. Os jovens que se destacam no Careca Sport Center são levados para o juvenil do Campinas. Atualmente, de acordo com os depoentes, está sendo providenciada a requisição da cidadania por parte do jogador Dedé. Os mesmos empresários que providenciaram o passaporte português auxiliam o jogador no sentido de conseguir um passaporte italiano, mesmo depois de descoberta a fraude em relação aos passaporte português. O objetivo disto é recolocá-lo num time europeu. O Sr. José Mário Pavan é Presidente do Clube União São João. Esse clube tem, segundo o depoente, cerca de 150 garotos acima de dezesseis anos praticando futebol em Araras. É exatamente do União São João a origem do jogador Jeda negociado para a Itália, com a intermediação de Edmar e Antônio Oliveira, o Careca. De acordo com o depoente, foram os Srs. Edmar e Careca que o colocaram em contato com Jimmy Martins. No entender do Sr. Mário Pavan, os maiores beneficiários com a venda do passe do jogador são os empresários e procuradores, que estão ricos. O depoente confirmou também a existência de dois valores, um para o jogador com passaporte comunitário e outro quando o jogador é extracomunitário. Nas negociações com o jogador Jeda, teria ficado claro que o valor de um milhão só seria pago, se o passaporte estivesse em ordem. Afirmou, todavia, que jamais tirou passaporte para qualquer jogador. O passaporte do Jeda teria ficado em suas mãos por apenas uma hora e meia ou duas, que é o tempo de vôo de Lisboa a Milão. Quanto ao seu contato com Jimmy Martins, disse ter ficado máximo seis minutos, no hotel, e três, no aeroporto, em sua companhia. Ainda no seu entender, o culpado por todo esse problema dos passaportes falsos é o Sr. Jimmy Martins, que, de acordo com investigações do depoente, chama-se César. Indagado sobre negociações com jogadores para o exterior, afirmou que o União São João vendeu cerca de dez jogadores. Quanto ao Sr. Eliseu Oliveira, o Tiroga, trata-se, segundo o depoente, de uma pessoa de confiança do União São João, que opina sobre a qualidade técnica do jogador. Disse ainda que só vendeu o jogador porque os Srs. Careca e Edmar lhe garantiram que a mãe de Jeda era Portuguesa e que o jogador era português, após terem colhido a documentação respectiva. Relatou que, na primeira reunião como Vicenza, na qual estavam presentes os Srs. Careca, Edmar e Máximo Briaschi, foi informado de que a quantia pretendida pelo clube só seria paga se o jogador tivesse um passaporte comunitário. Todavia, entra em contradição o depoente, ao dizer que tinha exigido quinhentos mil dólares pelo jogador, mas acabou aceitando trezentos mil, mesmo sabendo da existência do passaporte comunitário, que segundo Edmar e Careca era “quente”. Este fato também se contrapõe ao depoimento do Sr. Edmar, segundo o qual o próprio Sr. José Martins Pavan é quem teria proposto valores diferenciados em face do passaporte comunitário. Negou o depoente José Mário Pavan que esteja sendo processado pela justiça italiana por facilitação de imigração clandestina. Informou, ainda, o depoente que para uma transferência internacional, não é a Federação local que a autoriza, mas a CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA DE FUTEBOL. DO DEPOIMENTO DE GEORLAM GOMES BASTOS Relatou o depoente que foi procurado na sua cidade, Matinha, no Maranhão, por um senhor de nome Araújo, que lhe fez uma proposta para jogar fora do Brasil no time espanhol Lorca. Essa transferência se deu através de documentação forjada a partir de documentos de outra pessoa. Um amigo seu, de nome Ronaldo, o apresentou a esse senhor Araújo, que se identificou como sendo Vice-Presidente do Americano de Bacabal. Assim, se pronunciou o depoente sobre a proposta feita: “Ele disse que ele tinha um documento, não é ? Em sua posse, me mostrou o documento, mas eu não cheguei a olhar na hora. Aí ele disse: “Só que tu vai ter que tirar tuas fotos urgentes, umas foto, e vem aqui.” Aí eu fui, tirei as fotos, ele me deu 10 reais, eu tirei as fotos, voltei á casa dele, aí foi que ele foi me explicar que era um documento que, tipo um documento de uma pessoa que já não existia mais, que tinha, não tinha tido o atestado de óbito, e que não era para mim me preocupar com isso, que era lá do interiorzão, que ninguém ia, ninguém ia perceber nada, que apenas que tudo ia dar certo, que para não me preocupar com tudo. (...) Na hora, eu não cheguei a olhar. Depois, que eu voltei com as fotos, que ele foi me explicar tudinho direitinho o que é que eu tinha que fazer. Aí ele mandou que eu, que eu tinha que tirar os documentos, não é? Para poder tirar o passaporte. Eu falei que eu não sabia onde é que tirava os documentos. Ele disse que não era para eu me preocupar, no outro dia alguém ia me procurar. Aí eu fui para casa do meu tio, e, no outro dia, uma pessoa me ligou, era para mim encontrar ele num local, pegar um ônibus, me explicou tudinho direitinho. Eu fui, me encontrei com ele. Aí chegou no Shopping do Cidadão, eu já com a documentação, com a certidão que o Araújo tinha me entregue, aí eu tirei os documentos, tive que colocar o dedo lá.” O depoente conta que tirou todos os documentos na ocasião. Com essa documentação ele foi até o Araújo novamente, que providenciou toda a documentação e a levou para a Federação Maranhense de Futebol. Feito o registro, Araújo teria dito ao depoente: “Ô, Gil, eu já conversei com o Clóvis que eu tenho um jogador muito bom na minha mão e tal.” Foi então que o depoente conheceu o Sr. Clóvis Dias, tendo-se encontrado com ele no Aeroporto de Fortaleza. Alguns dias depois o depoente viajou para a Espanha, com a documentação nova. Desse modo, ele passou a ter dois passaportes: um verdadeiro e outro falso. Chegando à Espanha, Gil fez teste num time chamado Hércules. O técnico não o aprovou, porém uma pessoa do Lorca que observava o treinamento o convocou para jogar nesse time. Nada tinha acertado até então sobre pagamento ou contrato com o jogador. No Lorca o jogador assinou contrato com salário em torno de quase quatro mil reais. Posteriormente, o próprio Araújo veio a denunciar a ilegalidade que havia cometido, num momento em que se encontrava bêbado. O passaporte utilizado pelo jogador era em nome de Jurcilan Rodrigues. No Lorca, o jogador recebeu outro passaporte dado pelo clube. Tratava-se de um passaporte português. Assim, Gil passou a ter três passaportes. Segundo me disseram, esse documento só serviria para jogar, porque havia muitos estrangeiros no clube. Nessa ocasião, o Clóvis Dias ligou para o depoente e lhe avisou que o Araújo havia denunciado os fatos relativos ao passaporte falso. Então o depoente voltou ao Brasil, tendo ficado parado durante todo o ano de 2000. Na época da falsificação dos documentos, o depoente tinha vinte anos, mas nos novos documentos, constava a idade de dezoito anos. Quando retornou ao Brasil, o depoente descobriu que Jurcilan era uma pessoa viva. A diminuição da idade nos documentos valoriza o passe do jogador lá fora, conforme explicou o depoente. Para não ser identificado, o Sr. Araújo sugeriu ao depoente que, em vez de Gil, utilizasse o nome de Rodrigues. DO DEPOIMENTO BACABAL. DE CLÓVIS DIAS – DIRIGENTE DO AMERICANO EM Afirmou que conheceu o jogador Gil por meio de Francisco Alves Araújo. Disse que não tinha como concluir pela falsidade dos documentos do jogador, uma vez que órgãos públicos responsáveis haviam emitido tais documentos como se fossem verdadeiros. Relatou que quando soube das denúncias de Araújo ligou imediatamente para o jogador que confirmou a falsidade dos documentos e, neste momento, lhe disse para voltar imediatamente. Disse também que tomaria todas as providências legais cabíveis para punir o Sr. Araújo. Como era de se esperar, o depoente não assumiu qualquer culpa pelo episódio ocorrido com o jogador Gil. outros países. Não negou, entretanto, que seu clube realiza venda de jogadores para DEPOIMENTO DE ALEX DIAS DE ALMEIDA – JOGADOR SAINT- ETIENNE . DE FUTEBOL DO O depoente foi para fora do País com um passaporte brasileiro, regular. Somente após disputar o campeonato francês e ser vice artilheiro pelo Saint-Etienne, fizeram-lhe a proposta de adquirir uma nacionalidade extracomunitária, o que poderia ajudar o clube. Assim foi-lhe proposto tirar um passaporte europeu. O depoente então entregou os documentos ao clube, a mando do Presidente para o R. Edinho, empresário do Aloísio, amigo e companheiro do jogador Alex. O depoente desconhece qualquer relacionamento de parentesco com portugueses. Todavia, assinou o passaporte, porque o clube tinha providenciado uma consulta junto à polícia francesa. ele utilizado. Esse passaporte, segundo o jogador, ficou com o clube e nunca foi por Posteriormente, houve uma denúncia quanto à falsidade do passaporte, o que acabou sendo confirmado pela polícia. O depoente desconfia de que a denúncia partiu de seu ex-treinador, que foi treinar o Toulouse. A denúncia foi feita um dia antes do jogo contra o Toulouse, do qual o jogador Alex não pôde participar. DO DEPOIMENTO DE JUAN FIGER SVIRSK – EMPRESÁRIO E AGENTE FIFA. Com relação ao caso do jogador Edu, relatou o seguinte: “Edu estava sendo vendido ao Arsenal da Inglaterra e tinha direito ao passaporte comunitário. Seu avô é natural de Portugal, e que, pelas leis daquele país, dava-lhe o direito à nacionalidade portuguesa. Um empresário espanhol de minha relação, o Sr. Hermínio Menendez, atleta reconhecido na Espanha, único espanhol a ganhar três medalhas olímpicas, ligou-me e afirmou poder tirar o passaporte de Edu em um tempo não muito longo, porque o seu sócio em um centro de treinamento em Marbella afirmava conhecer pessoas que trabalhavam em Portugal. Os documentos foram encaminhados ao Sr. Hermínio, que, segundo ele próprio afirmou aos dois nobres Deputados que foram a Portugal, os entregou a um sócio que contratou o serviço de um despachante em Lisboa, com o intuito de agilizar a documentação. É como se se pagasse o serviço de uma agência de turismo para conseguir um visto com rapidez. Ocorre que, comprovou-se depois, que o tal despachante era uma pessoa desonesta e entregou um passaporte falso. Vejam bem, Srs. Deputados, eu próprio não acompanhei a contratação, não me envolvi com a retirada do passaporte e não poderia sequer sonhar ser este cidadão, que não conheci e que não conheço, um membro de uma quadrilha de falsificadores de passaportes. Quadrilha, sim, pois, ao que tudo indica, segundo os dignos Deputados desta Comissão levantaram em Portugal, a falsificação de passaportes de jogadores na Europa é apenas a ponta de um iceberg, pelo que se viu do excelente trabalho desta CPI na Europa. Há uma evidência de falsificação muito mais ampla, que mostram os desdobramentos da missão cumprida pelos nobres Deputados Pedro Celso e Jurandil Juarez, que alertaram a comunidade européia para estes fatos. Tão logo soube dos fatos, comuniquei-me com o Sr. Hermínio, que, de pronto, se manifestou, isentando-me de qualquer responsabilidade. Fiz mais: pedi a meu advogado que fosse a Portugal a fim de contribuir para o êxito das investigações, fornecendo o nome de Hermínio e solicitando a este que estivesse à disposição dos Srs. Deputados brasileiros e da Polícia portuguesa. Mais ainda, Srs. Deputados, procurei, junto ao jogador, um dos escritórios mais conceituados de Portugal, a fim de solucionar este problema, que estava se tornando enorme, a ponto de prejudicar seriamente a carreira de um jovem jogador. Felizmente, hoje, Edu já está com seu passaporte português, ao qual já tinha direito, estando em plena atividade no Arsenal. Mas o que é grave, Srs. Deputados, é que eu fui vítima, tanto como o jogador, neste episódio grave e sério.” Afirmou o depoente que atua como agente de jogadores, representando os mesmos no Brasil e em qualquer país em onde um jogador poderia ser contratado. Na Europa, na América do Sul, em qualquer continente tem licença outorgada pela FIFA para atuar. Disse representar a parte dos jogadores brasileiros, um jogador colombiano, que está prestando serviços ao Clube San Lorenzo de Almagro, de nome Pedro Portocarrero, que joga em San Lorenzo de Almagro. Afirmou não ser proprietário de nenhum clube de futebol, nem mesmo dirigente. Disse à Comissão que nenhum jogador por ele agenciado tem problema de adulteração de partidas de nascimento, de idade, de certidões de nascimento. Indagado sobre a transformação do mercado de jogadores numa bolsa de mercadorias, respondeu que não existe bolsa de jogadores. O que existe é a necessidade dos clubes de tentar vender jogadores. Afirmou que o jogador Zé Roberto foi transferido para o Central Español, de Uruguai e que ele intermediou a operação entre Real Madrid, Central Español e Associação Portuguesa de Desportos. Indagado sobre notícias da imprensa de que teria conseguido os passaportes portugueses falsos para os atletas Warley, Jorginho Paulista e Alberto, respondeu que, desses três jogadores, é agente do atleta Warley. Dos outros atletas não é agente. Nem de Jorginho Paulista, nem de Alberto. No caso específico de Warley, este foi transferido também para o Udinese e se integrou a jogar como jogador brasileiro. Disse ter uma informação de que a senhora de Warley teria a possibilidade de obter algum passaporte italiano, até que foi informado pelo Sr. Warley de que ele havia obtido um passaporte português. Afirmou que nunca transacionou um jogador com cláusula onde os preços variavam segundo a nacionalidade do jogador e que não é de seu conhecimento contratos que se realizam dessa maneira. Explicou o seguinte sobre a supervalorização dos passes de alguns jogadores: “Existem realmente certas diferenças entre o que é preço bruto e preço líquido. Quando um jogador é vendido por determinada quantia, e essa é uma quantia total, podem incluir diversos custos, como participação do próprio jogador, comissões e valor de passes. Também pode influir a parte de financiamentos, os times europeus, faz muito tempo, não estão comprando jogadores para pagamento a vista, compram jogadores com prazos que variam de acordo com o contrato do próprio jogador com o clube comprador. Como os clubes que vendem necessitam dos recursos financeiros, terminam obtendo dinheiro mediante despesas que pagam por financiamentos, e o preço que entra ao final que o clube recebe deve ser um preço inferior ao expressado no contrato, por quê? Porque estão estabelecidos todos esses custos, financiamentos, comissões, participação do próprio jogador na venda do passe. Completando sua pergunta referente à subvalorização de jogador, não conheço nenhum caso, não é do meu conhecimento.” Sobre a prisão do jogador no aeroporto, na Inglaterra, porque portava um passaporte português falso, o depoente respondeu o seguinte: “Não foi preso; não se lhe permitiu a entrada na Inglaterra e o jogador teve que voltar para o Brasil. Posteriormente a todas essas coisas que ocorreram, ao que sucedeu com o Edu, eu tomei a intervenção para estabelecer, porque isso, para mim, foi uma grande surpresa, devido a que Edu, para obter seu passaporte, apresentou um sua primeira oportunidade toda sua documentação e acreditando que o avô dele, português e vivo, o pai, porém, tem todos os direitos de português e o filho também. Se entregou ao jogador Edu um passaporte falso. Aí quando Edu retornou ao Brasil, eu fiquei muito preocupado, comecei a fazer todas as averiguações necessárias e contratamos os serviços de um escritório de advocacia de Portugal e Inglaterra. Se ele entregou exatamente a mesma documentação, se seguiu toda a tramitação com o apoio do cônsul de Portugal em São Paulo, e o jogador Edu optou por seu passaporte português e com esse passaporte português foi jogar e prestar seus serviços profissionais ao Arsenal. Não poderia entrar na Inglaterra um jogador sem ser comunitário ou poderia entrar como estrangeiro, por uma regulamentação específica da Inglaterra, que não haja participado de no mínimo de 75% dos jogos de suas respectivas seleções. Edu não poderia ir como estrangeiro, porque não tinha esses 75% de jogos e foi jogar ao Arsenal com seu novo passaporte português que eu pedi aqui a fotocópia dos documentos e entregar à Presidência. (...) Nós estamos encaminhando toda a documentação de Warley, do Sr. Warley e da Senhora Warley, que está totalmente feita para poder obter a cidadania italiana, a mulher do Warley, não o Warley. Posteriormente quando sua senhora conseguir sua efetiva cidadania, o jogador pode optar pela cidadania da esposa.” Sobre o valor do passaporte falso de Edu, disse ter a informação de que custou o equivalente a 500 dólares. Confirmou que conhece o Sr. Hermínio Menendez, que é colaborador seu e de outros agentes e que se trata de uma espécie de consultor que utiliza, quando necessita de alguma informação referente à Espanha. Negou que tenha feito qualquer tipo de negociação com o Clube Betis, referentemente ao jogador Denilson. DEPOIMENTO DE AFONSO MARTINS COSTA FILHO (JIMMY MARTINS ) o seguinte: Acerca da venda de brasileiros menores para o exterior, o depoente disse “Bem, sobre os jogadores menores, em absoluto, em nenhum momento na minha vida, sozinho ou em companhia de outros empresários, eu levei garotos para o exterior. Essa é a número um. Sobre os passaportes falsos: por meios que pensava na época serem normais e legais, eu realmente ajudei alguns empresários brasileiros na obtenção de três ou quatro passaportes de jogadores, entre eles Jeda, que estava em processo de venda para o exterior. Não havia na época, pelo menos na nossa visão, na visão empresarial, nenhuma ilegalidade nessa obtenção. Eu tratava com os despachantes que eu vou passar pra vocês, o Sr. Domingos Djalo e Jota Caldeira, que vinham ao nosso encontro, meu e de outros vários empresários de futebol no Hotel Altesi, de Lisboa, de propriedade de um ex-Presidente do Benfica, se não me engano é Dom Fernando o proprietário do hotel. A gente tinha que preencher requerimentos, como eu vou passar pra V.Sas., os senhores, os anexos com custas de documentos que provam que esses documentos saíam de dentro da polícia portuguesa. Isso é interessante para vocês. Eu sou culpado de ter sido enganado num procedimento que parecia legal. Os passaportes eram falsos? Pelo que se sabe hoje os passaportes..., na época... Desculpe, pelo que se sabe hoje, os passaportes não eram falsos. Eram feitos por gente interna da polícia de Portugal etc., etc. Houve jogadores que entraram, inclusive com esses documentos, e saíram de vários países com esses passaportes sem nunca terem sido barrados. E outra coisa: quando o jogador, ele recebia esse passaporte, inclusive na Itália, no caso o jogador Jeda, na Itália existe o que se chama de permesso de soggiorno. Isto é, o jogador tem que pegar o passaporte, levar para a questura, que é a Polícia Federal deles, e fica lá um dia, não sei quanto tempo que ficam, e eles devolvem ao clube. E isso não aconteceu em nenhum caso. Quer dizer, quando as coisas aconteceram, depois que houve aquele segundo check-in, que realmente descobriram todas essas ilegalidades. Essa investigação, por incrível que pareça, começou em abril do ano passado, sobre o jogador Veron, Juan Sebastião Veron, da Lazio. Que eu tenho aqui os recortes dos jornais, foi de abril de 2000. Eu acho o seguinte: se a Magistratura italiana tivesse agido com a firmeza que vocês estão agindo agora, o Senado italiano, nada disso teria acontecido depois. Porque teria tempo. A gente teria descoberto em tempo. Essas pessoas estão no futebol e teríamos..., seria um alerta pra gente, a gente não teria se metido nessa confusão toda. Então, vocês estão de parabéns, porque às vezes, muitas vezes, eu falo isso do coração, falam que nossa Justiça é lenta, que o nosso é isso, é aquilo. Mas, pelo que..., meus trinta anos que eu morei no exterior, eu sinto do coração que vocês estão adiantados em relação a eles. E vocês estão de parabéns por ter feito isso. Porque se tivesse acontecido isso... Por exemplo, o caso do jogador Veron em abril. Óbvio, se saiu em abril no jornal, é de dois a três meses antes, a Magistratura italiana sabia, e ninguém foi comunicado. Então, o que acontece? Inclusive o jogador Veron, já sabe que faz 14 meses que está com esse processo na Justiça italiana. Ontem foi reenviado por mais dois meses, porque não havia um “translador” em italiano para espanhol dentro da Magistratura italiana. Eu acho que é estranho, e eu gostaria de dizer isso, porque eu acho que vocês, V.Sas., desculpe, estão fazendo um trabalho e estão de parabéns pelo que estão fazendo. Inclusive há centenas de jogadores envolvidos, não só de países sul-americanos, como do leste europeu. Eu tenho aqui todas as reportagens que falam todo esse histórico que eu falei pra vocês, agora. Eu acho que talvez isso aconteça, porque eu acho que há gente dentro do Governo envolvida nessa história, principalmente de Portugal. Inclusive, eu sinto isso também nos próprios contatos que eu tive lá.” Disse conhecer o Presidente do time União São João de Araras e que teve a oportunidade de conhecê-lo uma vez em Lisboa, em Portugal, uma vez, quando houve o episódio do Antônio Oliveira da documentação que foi feita em Portugal. Disse conhecer o Sr. Edmar. Edmar. Confirmou que teve contato com o Careca e algumas conversas com o Confirmou que o Careca o procurou, a fim de resolver problemas de documentos de jogadores, conseguindo passaportes portugueses para eles, e que recebeu a quantia de 40 mil reais pelos serviços prestados. Disse que o levantamento dos dados dos brasileiros foram feitos por outros despachantes em Portugal. Mencionou o nome do Sr. Caldeira, como um despachante relacionado à polícia de Portugal, atuando na área de imigração portuguesa. DEPOIMENTO DE ALOÍSIO JOSÉ DA SILVA Afirmou que foi para o Saint-Etienne com passaporte brasileiro. Posteriormente o clube lhe ofereceu um passaporte europeu. Esse passaporte foi providenciado pelo clube que lhe trouxe o documento pronto para ser assinado. Esse passaporte foi apreendido posteriormente pela polícia francesa. O procedimento é sempre o mesmo. O clube iria averiguar qualquer parentesco do jogador com portugueses. O jogador sequer precisou ir a Portugal. Tudo foi providenciado pelo clube. Disse o depoente que alguém denunciou a existência do passaporte falso, mas não soube dizer quem foi. DEPOIMENTO DE EDINO NAZARETH FILHO Relatou sua experiência como jogador e técnico de futebol. Em seguida passou a comentar sua atuação como agente de jogadores. Ao deixar o Grêmio, viajou para a Itália, com a finalidade de observar jogos e treinos, e estreitar contatos com técnicos, jogadores e dirigentes de clubes na Europa, em especial o Milan. Contou o depoente que nessa época, já tinha proposta do Milan para que, no Brasil, funcionasse como observador para indicar jogadores ao clube, mas a proposta foi efetivamente concretizada somente quando deixou a Itália. Depois, de ter montado escritório no Rio de Janeiro, uma de suas primeiras atuações como agente, foi tentar intermediar a venda do jogador Aloísio para a Europa. Contudo ao chegar a Goiás, descobrir que o jogador já estava contratado, pelo Saint-Etienne, embarcando para a França sem dar muitas explicações. Disse o depoente que nada ganhou que não teve qualquer participação nessa transação. Após o retorno de Aloísio ao Brasil, o depoente continuou como seu representante, inclusive para a renegociação do contrato com o Saint-Etienne. Essa transação foi relatada pelo depoente nos seguintes termos: “Assim, em 5 de abril de 2000, viajei para Paris e SaintEtienne, com a finalidade de renegociar o contrato de Aloísio para a temporada 2000 e 2001, que já estava defasado. No dia 8 de abril de 2000, assistimos jogo do Saint-Etienne contra o Paris Saint-Germain. Três dias depois, no dia 11 de abril de 2000, reuni com o Presidente do Clube Saint-Etienne para tratar do salário de Aloísio, a quem representava, e Alex, a quem jamais representei, atendendo pedido do próprio jogador. Contudo, não houve negociação. Lembro-me, no decorrer dessa reunião, o presidente do clube mencionou que seriam providenciados passaportes espanhóis para os jogadores, para que integrassem a lista de profissionais da Comunidade Européia, o que pra mim não foi notícia nova, pois Aloísio e Alex já haviam mencionado a intenção do clube em providenciar os referidos passaportes. Contudo, achei aquilo muito estranho e disse-lhe que não entendia como ele poderia fazê-lo, já que nenhum dos dois tinha, nem mesmo remotamente, ascendência espanhola. Diante da minha colocação, a diretoria me indagou quanto à possibilidade de que os jogadores obtivessem nacionalidade portuguesa. Disse a eles que, de modo geral, todo brasileiro descende de portugueses, mas que não conhecia essa ascendência por parte dos jogadores. Prossegui nos meus contatos com o Saint-Etienne para renegociação dos contratos dos jogadores, retornando ao clube em 17 de abril de 2000, para nova rodada de negociações, mas nada consegui em termos de melhora dos contratos. Participei ainda de outra reunião em 18 de abril, que, da mesma forma, não resultou em acordo. Pouco depois, quando retomei ao Brasil, 0 clube me pediu que providenciasse documentos de Alex e Aloizio, para que procedesse à tal pesquisa genealógica. Obtive tal documentação dos parentes dos jogadores e repassei aos cuidados do clube. Nunca mais vi esses documentos. Logo após remeter os documentos, Alex me telefonou e pediu para que não adotasse qualquer iniciativa em seu favor, revogando o mandato que, anteriormente, havia me outorgado verbalmente para ser seu agente junto ao Saint-Etienne, quando lá estive para negociar o salário do Aloísio. Naquela ocasião, remeti ao clube apenas a certidão de nascimento de Alex e certidão de óbito do seu pai, uma vez que, após a revogação do mandato informal, não mantive mais contato com o jogador, e o clube me cobrou a imediata remessa dos documentos que estavam disponíveis, razão pela qual remeti apenas o que havia recebido de seus parentes. Quase um mês depois, soube que Aloísio recebeu um telefonema do jogador Anderson, do Olimpique de Lyon, que Ihe falou o interesse do clube em contratá-lo. No dia seguinte, o Anderson me telefonou também reportando interesse do Olimpique de Lyon em contratar Aloísio. Em meados do mês de maio do ano passado, Aloísio retornou ao Brasil em férias. Nesse período, recebi telefonema do Olimpique de Lyon, do Sr. Marino, no qual manifestou interesse em iniciar tratativas para contratação de Aloísio, indagando-me da possibilidade de ir até a França para debater sobre a contratação do jogador. Dias depois, recebi novo fax do Sr. Marino, do Olimpique, insistindo para que fosse à França, para debater sobre a contratação do jogador. No dia seguinte a esse telefonema, recebi um fax do clube com o convite. Assim, em 21 de maio de 2000, embarquei para Lyon, para conversar com diretores do clube. Lá chegando, fui direto para a reunião. Depois de exaustivas tratativas com o Olimpique de Lyon, consegui um acordo na negociação da proposta para a futura contratação do Aloísio. Em 24 de maio de 2000, fui a Paris conversar com o diretor do clube, Soler, diretor do Saint-Etienne, onde jogava Aloísio, sobre a proposta feita pelo Olimpique para contratação do jogador. Todavia, Soler sequer quis falar no assunto . Entretanto , solicitou uma proposta de renegociação do contrato de Aloísio, que deveria ser transmitida por fax do Brasil. O encontro foi no Hotel Meridien Mayor, em Paris. Logo após, fui assistir à final da Copa dos Campeões, retomando ao Brasil em seguida. Já no Brasil, transmiti ao SaintEtienne, por fax, a proposta de renegociação do contrato de Aloísio para a temporada 2000/2001. Falando com Soler ao telefone, não consegui chegar a um acordo satisfatório, ocasião em que me convidou para nova reunião no clube, para tratar do assunto pessoalmente, com o presidente do clube. No inicio de julho, viajei para Saint-Etienne, para estar com o presidente do clube. Participei de reunião com o presidente Bompart, na qual Soler esteve ausente por problemas de saúde. A renegociação do contrato de Aloísio foi feita com o próprio presidente do clube. Em seguida, fomos almoçar, ocasião em que falamos a respeito de vários jogadores, em especial Lúcio, do Internacional, pelo que me outorgou procuração para providenciar a contratação do referido jogador. Logo após retomar ao Brasil, recebi telefonema de Aloísio, informando que o mesmo já havia sido chamado ao clube, para assinar seu passaporte português, o que não foi para mi surpresa, pois sabia das diligências do clube e imaginei que a pesquisa havia-se mostrado frutífera.” Outro jogador encaminhado ao Saint-Etienne por Edino foi Thiago Gama. A negociação foi feita no estádio de Toulouse. Entretanto, o jogador já não quis mais ficar no clube e retornou ao Brasil. Nessa ocasião, depoente indicou Luís Alberto, jogador do Flamengo, que segundo ele afirma foi a única venda de jogador que, efetivamente, ele intermediou na qualidade de agente FIFA. Com relação aos fatos noticiados pela imprensa, envolvendo jogadores com passaporte falso, desse que tomou conhecimento do assunto quando divulgados pelos jornais. Nessa ocasião, ele teria procurado o Saint-Etienne, preocupado com o jogador Aloísio, já que o clube havia-lhe providenciado seu passaporte. Posteriormente, o Toulouse ofereceu representação contra o SaintEtienne alegando a escalação de um goleiro ucraniano e do jogador Alex, ambos portadores de passaportes falsos. O primeiro, teria um passaporte grego, e o segundo, o jogador Alex, um passaporte português. Em face disso, o Saint-Etienne apresentou um pedido ao juiz da cidade concernente a esses jogadores, incluindo também o jogador Aloísio, como portadores de passaportes falsos. Nesse documento, o clube mencionava o nome do depoente como responsável pelos documentos para a obtenção desses passaportes falsos. de defesa. O depoente atribuiu essa acusação pelo Clube contra ele como estratégia O depoente afirmou que é procurador de muitos jogadores, entre eles o próprio Aloísio. Negou qualquer envolvimento com o Sant-Etienne na questão dos passaportes falsos. Confessou, ainda, o depoente que o jogador Luís Alberto foi vendido por 2 milhões de dólares e revendido para um clube da Espanha por 4,5 milhões de dólares. O clube teve ganho de 2,5 milhões de dólares em apenas três meses, e, nesta transação, o depoente teve a participação de dez por cento, como agente. Comissão. Estas são, em síntese, as principais declarações do Sr. Edino a esta DEPOIMENTO DO JOGADOR LEONARDO SANTIAGO , DO CLUBE FEYENOORD, EM 17/3/2001, NO CONSULADO BRASILEIRO DA CIDADE DE ROTERDà Inicialmente o jogador mostrou-se receoso por não entender o que significava uma CPI. Pediu para falar a sós com os Deputados sem a presença dos funcionários do Consulado. Depois de receber as explicações de que a presença dos funcionários do Consulado poderia representar maior apoio para si, o jogador concordou em falar na presença de todos. Estiveram presentes, também, o advogado do jogador e o advogado do clube. Em suas declarações, Leonardo disse que chegou a Holanda em fevereiro de 1995, quando tina apenas 11 anos de idade (completaria 12 em 09 de março).Veio do Rio de Janeiro, onde morava com sua família. Jogava na escolinha do Aterro do Flamengo. Seu futebol ficou conhecido na Holanda através de um filme, no qual ele e outros garotos mostravam suas habilidades. Veio com mais dois jogadores, dos quais não citou os nomes, que não aprovaram. Após os testes que realizou no Feyenoord, voltou ao Brasil, tendo retornado a Holanda, em novembro do mesmo ano (1995). Dessa época até o ano de 1998, morou em diversos casas, com as despesas pagas pelo Clube. Nesse período sempre estudou por ser obrigatório no país. Em 1999, machucou-se e recebeu toda a assistência do Clube, até ficar recuperado. Em 1998, quando tinha apenas 15 anos, assinou um contrato de gaveta como se fosse adulto. Sua mãe assinou junto com ele. O acertado era para o contrato ter a duração de dois anos, a partir de 2001, quando completaria 18 anos. Mais tarde ele descobriu que o Clube tinha colocado o prazo de 06 (seis) anos. Para assinar esse novo contrato disse ter sido pressionado pelo seu empresário, que se chama HANS CORET, é holandês e trabalha para o Clube Feyenoord. Falou que existe uma outra pessoa, de nome Indalécio, que também se diz seu empresário, mas que, na verdade não é. O advogado do clube, falando sobre o contrato, disse que é um contrato muito favorável para o jogador, que não é normal na Holanda, um atleta com a idade de Leonardo, ganhar tanto em termos financeiros. Respondendo, Leonardo disse não concorda, pois recebe mensalmente o equivalente a US$ 7.500 (não revelou o valor em (Florins, moeda holandesa), e que havia no Clube, jogadores que se quer ficavam no banco de reservas e recebiam até 20 (vinte) vezes mais que ele. Sobre o passaporte falso, declarou que foi o seu empresário que providenciou tudo e o entregou diretamente ao Clube. Ele nunca chegou a tê-lo em seu poder permanentemente. Quando lhe solicitaram a documentação, informou que não tinha ascendência portuguesa. Não chegou nem ir a Portugal, nem pagou nada pelo passaporte, tudo foi providenciado pelo empresário. A finalidade do passaporte comunitário seria a de facilitar a sua transferência para um clube de outro país europeu, que não soube precisar qual. Por já estar no futebol holandês há mais de 05 (cinco) anos, não precisaria de passaporte comunitário, caso o seu fosse vendido para outro clube da Holanda. A descoberta da irregularidade do passaporte, ocorreu em 07 de dezembro de 2000, em decorrência da investigação de Inspetores do Ministério do Trabalho da Holanda. Leonardo atribuiu à denúncia de alguém, já que o assunto passaporte falso estava repercutindo muito na Europa e no Clube todos sabiam que ele era brasileiro e não tinha ascendência portuguesa. Segundo Leonardo, as investigações começaram com o caso do jogador brasileiro Vamberto, que era “gato”, tinha idade adulterada. Leonardo disse que respondeu processo regularmente e foi condenado a pagar multa e prestar serviço social. Foi ele mesmo que contratou o advogado para defendê-lo, mas, os honorários foram pagos pelo clube. Finalizando disse estar se sentindo prejudicado na situação em que se encontra. Nada teve a ver com a falsificação do passaporte, cuja responsabilidade foi do empresário e do clube, de quem o empresário é funcionário, mas o punido foi ele. Leonardo declarou estar disposto até parar de jogar futebol, caso o clube insista em manter as condições do Contrato atual, que tanto ele quanto a diretoria sabem ter sido adulterada. Disse ainda que gostaria de retornar ao futebol brasileiro, caso algum clube se interessasse pelo seu trabalho e pagasse quanto ele vale. CONCLUSÃO DAS INVESTIGAÇÕES É relevante considerar o resultado da missão em Portugal e na Itália, que se revestiu de êxito total. A agenda, ainda que muito extensa para o tempo disponível, foi cumprida na íntegra. Foram efetuados contatos com todas as principais autoridades de Lisboa, Milão e Vicenza, que estão tratando da questão dos passaportes falsos dos jogadores brasileiros, além de representantes da imprensa italiana e portuguesa e do setor do futebol italiano. Conclusivamente, pode-se afirmar que o epicentro da emissão desses documentos é Portugal, mas, das investigações policiais e judiciais, tanto de Portugal quanto da Itália, pode-se inferir que esta é uma praga que se alastra por toda Europa, em razão das vantagens que tem um jogador de futebol com passaporte comunitário, em relação ao portador de passaporte extracomunitário, com repercussão direta no Brasil. É uma extensa rede que envolve empresários, clubes e jogadores. Levantada a ponta do tapete dos passaportes falsos, aparece também uma realidade maior e muito preocupante, relativa ao imigração ilegal de brasileiros. A rigor, pode-se afirmar que os jogadores são uma vertente de um problema muito mais complexo que envolve trabalhadores de todas as matizes, travestis, prostituição, tráfico de menores, entre outros. O pano de fundo são as oportunidades de trabalho que existiriam tanto na Europa quanto nos Estados Unidos. Assim, os brasileiros estão sendo iludidos por verdadeiras quadrilhas e aliciadores, com articulações no Brasil e na Europa, que vendem a ilusão de bons empregos e bons salários. Na Europa, essas pessoas ficam entregues à sua própria sorte, vivendo em condições subumanas. Em Portugal, existem verdadeiros guetos de brasileiros vivendo em situações deploráveis, dormindo em contamines de lixo. A imprensa portuguesa denuncia fartamente a ocorrência de trabalho escravo nos Açores. De todas as investigações realizadas dentro e fora do Brasil, resultantes de audiências públicas, entrevistas ou compulsão de documentos, não ficou dúvidas do envolvimento de clubes e seus dirigentes, empresários ou agenciadores e dos próprios jogadores na produção de passaportes falsos. Com esses documentos todos lucrariam. Os clubes, porque poderiam fugir da reserva de mercado imposta para jogadores extracomunitários, no futebol europeu. Os intermediários (empresários, procuradores e agenciadores) pela valorização das transações. Em alguns casos o valor do passe do jogador mais que triplicava se ele tivesse um passaporte comunitário. E o jogador, pelas vantagens financeiros decorrentes e pela facilidade que teria para se transferir a um outro clube. As investigações realizadas no Estado do Maranhão não deixam dúvidas quanto ao envolvimento de dirigentes da Federação Maranhense de Futebol e de dois clubes maranhenses, o Americano de Bacabal e o Moto Clube de São Luís, na adulteração da documentação pessoal de atletas para facilitar a falsificação de passaportes. E isso não é de agora. O atleta Raimundinho ( José Raimundo Rodrigues Lopes ), hoje aposentado, um dos melhores jogadores da história do futebol maranhense, inclusive com passagem pelo futebol do exterior, apesar de sua grande notoriedade no Estado, pôde fazer um novo registro na Federação, com o nome e idade adulterados. Com a nova documentação, adquiriu um passaporte português falso e foi jogar na Bélgica. Mais recentemente, em 1999, aconteceu um caso escabroso, com um atleta assumido a identidade de uma outra pessoa. Foi o caso do jogador Gil (Georlan Gomes de Bastos) que passou a usar a documentação de Jucirlan Araújo, dois anos mais novo que ele. Com a nova identidade, adquiriu um passaporte português falso e foi atuar no futebol espanhol, no clube Lorca. A documentação falsificada foi conseguida com o concurso dos dirigentes do Clube Americano, de Bacabal, e o passaporte fornecido pelo próprio clube espanhol. Este caso está sendo investigado pela Polícia Civil do Maranhão. Outro caso é do jogador Canhoto, também conhecido como Esquerdinha. Seu nome verdadeiro é Rozenilton Torres Araújo. Com um novo registro de nascimento, reduziu em 7 anos sua idade e estaria jogando na Bélgica. O jogador Kleber , quando atuava no Moto Clube, também teve sua identidade adulterada quando esteve para ser transferido para o futebol francês . Descoberto, respondeu inquérito instaurado pela Polícia Federal. Hoje joga no Clube Atlético Paranaense. Os casos dos jogadores Varley, Jorginho, Dida, Cafu, Alberto, Roque Júnior, Jeda e Dedé , que foram negociados com o futebol italiano, mostra também o envolvimento de agenciadores e dirigentes de clubes na falsificação de passaportes. O jogador Varley ganhou notoriedade porque foi quem desencadeou a descoberta de passaportes falsos de jogadores brasileiros e de outras nacionalidades, na Itália. Quando o seu clube, a UDINESE foi jogar na Polônia constatou-se a falsidade do documento, que o atleta alega ter sido fornecido pela Diretoria do Clube. Varley foi negociado para a UDINESE, através de seu empresário Juan Figer. Tanto o clube quanto o empresário sabiam que ele não tinha ascendência portuguesa. Os jogadores Jeda e Dedé, foram negociados com o Clube Vicenza com a intermediação dos ex-jogadores e empresários Careca e Edmar Bernardes, tendo também participado das negociações o presidente do Clube S. João de Araras JOSÉ MÁRIO PAVAN. Todos sabiam que os atletas não tinha ascendência européia. Os passaportes falsos foram conseguidos através do empresário JIMMY MARTINS, que se dizia agente FIFA. O caso do jogador EDU, negociado pelo Corinthians Paulista com o Clube Arsenal, da Inglaterra, guarda semelhança com os outros casos no que se refere ao envolvimento de dirigentes e empresários na falsificação de passaportes. Tem, no entanto, uma diferença básica: o atleta possui ascendência portuguesa, poderia, portanto, pleitear legalmente um passaporte português. Aí parece que funcionou o costume do cachimbo. Talvez levado pelo hábito das facilidades, seu empresário JUAN FIGER, o mesmo de Varley, contratou os serviços de intermediários para conseguir o passaporte em Portugal. Uma história pouco verossímil, que passa por dois empresários, um espanhol e outro iugoslavo, e despachantes portugueses, resultou num passaporte falso que levou à detenção do jogador no aeroporto de Londres. Hoje a situação de EDU está regularizada, ostentando a dupla nacionalidade brasileira e portuguesa, mas o exemplo é ilustrativo do método utilizado para produzir documentação falsa. Para o futebol espanhol, além de Gil, que veio do futebol maranhense com toda sua identidade falsificada, foi negociado também o goleiro Francisco José de Oliveira. Oriundo do Clube União São João de Araras, de São Paulo, que foi negociado com o clube Mallorca com passaporte falso. Descoberto retornou ao Brasil e fez chegar à CPI o original do documento falsificado. Mais recentemente, surgiram os casos dos jogadores Alex e Aloísio, que foram negociados do Clube Goiás, do Estado do mesmo nome, para o Clube Saint Etienne, da França. Em suas declarações, os dois afirmaram saber que não tinham ascendência portuguesa e que foram induzidos a assinar os passaportes falsos pela própria diretoria do Saint Etienne, na pessoa de seu presidente, Gérard Soler. Segundo eles os passaportes teriam sidos providenciados pelo empresário de ambos, o exjogador Edinho, que jogou no Clube Fluminense e na Seleção Brasileira. Na Holanda, o caso mais importante é do jogador Leonardo, que atua no Feyenoord. Esse atleta foi levado para aquele País em 1995 com apenas 11 anos de idade, ao que tudo indica sem o preenchimento das formalidades legais exigidas para menores de sua idade. Induzido por seu empresário e certamente com o conhecimento e o consentimento da Diretoria da Clube, adquiriu um passaporte português falso. Descoberto, foi punido com multa e obrigado a prestar serviço à comunidade. O passaporte português não era exigência para atuar no futebol holandês, mas serviria para facilitar a transferência do jogador para outro clube fora da Holanda. O fato do empresário de Leonardo ser funcionário do Feyenoord sugere que o clube patrocinou a emissão do passaporte. Como seria usado para valorizar o passe do jogador, o clube seria o principal beneficiário da falcatrua. Dentre os empresários que fazem parte do esquema dos passaportes, podem ser citados os seguintes: - Antônio de Oliveira, o Careca, e Edmar Bernardes, sócios do Careca Sport Center, que negociaram os jogadores Jeda e Dedé com o Vicenza da Itália, como atletas portadores de passaportes Portugueses. - Afonso Martins Costa Filho (Jimmy Martins), o despachante que recebeu os documentos de Jeda para providenciar a cidadania portuguesa ao jogador. Também foi acusado de ter conseguido passaporte falsos para Dedé, do Vicenza da Itália. Pela confecção de cada passaporte Jimmy Martins teria recebido vinte e quatro mil dólares. - Roberto Gambaster, acusado de ter conseguido passaporte falso para o jogador Kléber- ex-atleta do Moto Clube, para jogar na França, com o nome alterado para Klebernilson. - Juan Figer, uruguaio que atua como agente de futebol no Brasil. Intermediou a venda de Warley para o Udinese da Itália e encomendou o passaporte de Edu a um despachante de Portugal. - José Mário Pavan, Presidente do União São João, que responde a processo em Vicenza por falsidade ideológica e favorecimento de imigração clandestina. Foi o responsável pela entrega do passaporte de Jeda ao Vicenza, após têlo recebido das mãos de Jimmy Martins. - Antônio Cassas de Lima, ex-Presidente do Conselho Deliberativo do Moto Clube, responsável pela transferência de vários jogadores para o exterior, chegou a assinar documento falso referente ao jogador Gil, com dados de outra pessoa. Foi apontado como a pessoa que recebeu o dinheiro relativo à venda dos jogadores Kléber e Delson para o Monastir da Tunísia. - Clóvis Dias, dirigente do Americano em Bacabal, intermediou a transferência do jogador Gil para a Espanha, com passaporte falso. - Edino Nazareth Filho, (Edinho) intermediário da venda de jogadores para o exterior, entre eles Aloísio e Luís Alberto. Os jogadores Aloísio e Alex, do SAINT ETIENNE confirmaram na CPI que Edinho participou do esquema de falsificação dos passaportes de ambos. Além desses empresários, dirigentes de clubes, como o Vicenza, Milan, Udinese, Saint Etienne e o Feyenoord, e dirigentes de Federações locais de Futebol participaram desses esquemas. DAS PROVIDÊNCIAS TOMADAS POR POLICIAIS, JUDICIAIS E ENTIDADES ESPORTIVAS. ORGANISMOS 1) NO BRASIL A Polícia Federal, através de sua Superintendência Regional de São Paulo instaurou inquérito policial para apurar a ocorrência de crime no caso da emissão de documentação inidônea para falsificação dos passaportes dos jogadores Warley, Alberto, Edu, Jeda e Dedé. A Polícia Civil do Maranhão e o Ministério Público, instauraram inquéritos para apurar irregularidade na emissão de documentos que permitiram a falsificação das identidades de jogadores pertencentes a clubes filiados a Federação Maranhense de Futebol. 2) NO EXTERIOR Em Portugal, a INTERPOL e a Polícia Judiciária instauraram procedimentos para investigar a falsificação de passaportes para jogadores brasileiros, argentinos, uruguaios e de outras nacionalidades. Os jogadores brasileiros que estão oficialmente sendo investigados pela INTERPOL, são: André Augusto Leoni, Jedaías Capucho Neves, Nelson de Jesus Neves, Edmilson Rocha Andrade Mendes, Jorge Henrique Amaral de Castro, Marcos Assunção, José Vitor Roque Júnior, Warley Silva Santos e Alberto Valentin do Carmo Neto. Na Itália, em praticamente todas as cidades onde existem grandes clubes foram instaurados inquéritos pela polícia ou pelo Ministério Público . Por exemplo, na Questura de Vicenza, respondem processo que apuram crimes de falsidade ideológica e favorecimento de imigração clandestina os jogadores Jeda e Dedé, além de ex-jogador Careca e o dirigente José Mário Pavan. Na Questura de Milão está sendo investigado o goleiro Dida. Em Roma há inquérito apurando a situação de Cafu. Em Udine, o Ministério Público investiga as situações de Warley e Alberto. Na França, o Ministério dos Esportes determinou que todos os jogadores estrangeiros tivessem confirmada a regularidade dos passaportes. A Federação de Futebol resolveu, além de suspender os atletas estrangeiros com passaportes falsos, punir com a perda dos pontos os clubes pelos quais tenham atuado. Esse foi o caso do SAINT- ETIENNE, que perdeu os pontos dos jogos em que atuaram os jogadores Alex e Aloísio. A Federação Espanhola, por recomendação da FIFA, passou a usar mais rigor na investigação da autenticidade da documentação de jogadores estrangeiros (não europeus) portadores de passaportes comunitários. Entre outros jogadores brasileiros que atuam no futebol espanhol, foram investigados Jameli, do Zaragoza, Doriva, do Celta, Magno, do Alavés e Baiano, do Las Palmas. No mês de Março, reuniram-se em Paris, Promotores Públicos e autoridades policiais de seis países europeus, Itália, França, Portugal, Espanha, Alemanha e Inglaterra, para discutir ações conjuntas e coordenadas para combater passaportes falsos de jogadores de futebol. O objetivo do encontro foi a criação de uma estratégica comum, no âmbito europeu, para repressão a essa prática ilegal. DA FIFA A Entidade mentora do futebol mundial, convidou no mês de março, os membros da CPI para discutir a questão dos passaportes falsos e, assim se inteirar do andamento das investigações. O encontro ocorreu em Zurique, no dia 15 de março, tendo a Entidade recepcionado todas as recomendações emitidas pela CPI sobre o assunto. Algumas das providências tomadas pela FIFA para reprimir o uso de passaportes falsos: a) Solicitou a FEDERAÇÕES NACIONAIS e à UEFA que tivessem rigor nas investigações sobre o passaportes de jogadores estrangeiros que se apresentassem como comunitários. Recomendou punição exemplar tanto para jogadores clubes, envolvidos com passaportes falsos. como para os c) Recomendou que essas punições fossem aplicadas o mais rápido possível, independentemente da atuação da Justiça Comum. d) Punir o jogador HECTOR DIEGO GARAY, argentino que joga no RAGING CLUB DE ESTRASBURGO, da França, portador de um passaporte falsificado. Hector Garay já havia recebido da Federação Francesa de Futebol uma suspensão pelo período de 03 meses, restrita ao futebol francês. A FIFA decidiu usar de mais rigor e ampliou a punição do argentino, suspendendo-o de toda e qualquer atividade relacionada ao futebol, em qualquer lugar do mundo. SUGESTÕES APRESENTADAS À FIFA À CBF FIFA 1. Instituição obrigatória de um cadastro de jogadores extracomunitários, por clube. Esse cadastro seria encaminhado à UEFA e à FIFA, anualmente, que assim acompanhariam as mutações ocorridas. O objetivo seria evitar que um jogador inicialmente contratado como extra-comunitário fosse posteriormente inscrito como comunitário através da falsificação do seu passaporte. 2. Divulgação periódica e atualizada da lista dos Agentes FIFA, que estivessem regulamente autorizados pela Entidade para atividade de intermediação de negócios no futebol. 1. Descredenciamento do Agente FIFA envolvido em questão de falsificação de passaportes. 2. Comunicação obrigatória, pelos clubes, aos órgãos nacionais de controle de migração, da contratação de jogadores estrangeiros. Essa comunicação seria acompanhada de documentação do atleta, inclusive cópia do passaporte. 3. Uniformização dos procedimentos quanto às cotas estabelecida para os clubes na contratação de jogadores extra-comunitários. CBF 1. Instituição de um cadastro de jogadores brasileiros negociados com o clubes estrangeiros. Esse cadastro, atualizado anualmente, seria encaminhado à CBF e à FIFA para efeito de acompanhamento das mutações ocorridas. 2. Divulgação periódica e atualizada da lista das pessoas credenciadas junto à ENTIDADE para intermediação de negócios no futebol. 3. Intervenção em clubes e federação nos quais comprovadamente existirem procedimentos de falsificação de documentos de atletas. 4. Descredenciar ou desautorizar agentes intermediadores que, comprovadamente, se envolvam na prática de facilitação de documentação falsa para atletas. SUGESTÕES APRESENTADAS ÀS AUTORIDADES BRASILEIRAS 1. Ministério das Relações Exteriores – recomendar às autoridades diplomáticas e consulares que prestem apoio aos jogadores brasileiros envolvidos com passaportes falsos, estimulando-os à regularização de suas situações e assistindo-os nos casos em que respondam processos criminais em países estrangeiros. 2. Ministério Público – investigar a ocorrência de crime contra a ordem legal brasileira nas transações de jogadores brasileiros para o exterior, com passaportes falsificados. 3. Receita Federal e Banco Central – investigar a possível ocorrência de crime contra o Sistema Financeiro do Brasil de evasão de divisas, nas transações dos jogadores brasileiros para clube estrangeiros, envolvidos ou não com passaportes falsos. Dos indícios da prática de crimes, apurados no âmbito desta Comissão. Em face dos documentos examinados e dos depoimentos prestados, concluí-se pela existência de indícios da prática dos seguintes delitos: 1. Crime contra a ordem tributária, previsto na Lei nº 8.137, de 1990, cujo art. 2º, inciso I, dispõe: “Art. 2º.- Constitui crime da mesma natureza” – contra a ordem tributária: “I – fazer declaração falsa ou omitir declaração sobre rendas, bens ou fatos, ou empregar outra fraude, para eximir-se, total ou parcialmente, de pagamento de tributo.” A pena aplicada e de detenção, de seis meses a dois anos, e multa. Ocorre que, de modo geral, os empresários responsáveis pela transferência de jogadores deixam de declarar os ganhos obtidos nessa transação. 2. Crime contra o sistema financeiro nacional, previsto no parágrafo único do art. 22 da Lei nº 7.492/86, cujo teor é o seguinte: “Art. 22. Efetuar operação de câmbio não autorizada, com o fim de promover evasão de divisas do País. Pena. Reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa. Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem, a qualquer título, promove, sem autorização legal, a saída de moeda ou divisa para o exterior, ou nele mantiver depósitos não declarados à repartição federal competente.” Ao que se pode apurar, os intermediadores de atletas para o exterior costumam manter o dinheiro obtido nessa atividade em contas no exterior, sem a devida declaração prevista em Lei. 3. Crime de falsificação de documento público, tipificado no art. 297 do Código Penal, nos seguintes termos: “Art. 297. Falsificar, no todo ou em parte, documento público, ou alterar documento público verdadeiro: Pena – reclusão, de dois a seis anos, e multa. § 1º. Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, aumenta-se a pena de sexta parte.” A falsificação de passaporte inclui-se nesta tipificação. 4. Crime de falsidade ideológica, assim disposto no art. 299 do Código Penal: “Art. 299. Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa do que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante. Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público, e reclusão, de um a três anos, e multa, se o documento é particular. Parágrafo único. Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, ou se a falsificação ou alteração é de assentamento civil, aumenta-se a pena de sexta parte.” Desse modo, a prestação de informações falsas, inclusive a adulteração de certidão de nascimento, para fim de aquisição de passaportes, constitui o crime aqui descrito. 5. Envio de criança e adolescente ao exterior de forma irregular. O art. 239 da Lei nº 8.069, de 1990, dispõe: “Art. 239. Promover ou auxiliar a efetivação de ato destinado ao envio de criança ou adolescente para o exterior com inobservância das formalidades legais ou com o fito de obter lucro: Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 6 (seis) anos, e multa.” Caracteriza este delito o envio de jogadores adolescentes para o exterior, em desacordo com a legislação pátria. 5. Aliciamento para o fim de emigração. É a hipótese prevista no art. 206 do Código Penal que dispõe: “Art. 206. Aliciar trabalhadores, para o fim de emigração: Pena – detenção, de um a três anos, e multa.” Este e o caso dos agenciadores que aliciam jogadores para trabalhar no exterior, os quais, muitas vezes, nem mesmo são colocados em times de futebol, passando a trabalhar como motoristas de táxi, entre outras atividades. Desse modo, o entendimento é de que o Relatório Final da Comissão, com os documentos e depoimentos que comprovam esses ilícitos, devem ser encaminhados ao Ministério Público, à Polícia Federal e à Receita Federal para promoção da responsabilidade penal desses agentes. Com estas investigações, a CPI dá um passo importante no sentido de extirpar esta prática criminosa que depõe contra as glórias do futebol brasileiro. CAPÍTULO XII - FÁBRICA DE “ GATOS ”. F ALSIFICAÇÃO DE IDENTIDADES E TRÁFICO DE MENORES PARA O EXTERIOR . TRÁFICO DE ATLETAS MENORES Numa referência ao Seminário Internacional sobre o Tráfico de Seres Humanos, realizada em Brasília, a jornalista Ana Beatriz Magno 22, identifica três modalidades de tráfico de pessoas: o comércio de mulheres e crianças para a prostituição; o comércio de homens, mulheres e crianças para o trabalho escravo em diversos países; e o comércio de crianças para a adoção internacional: “O comércio de seres humanos, comentava, é a terceira atividade mais rentável praticada pelo crime organizado internacional. Perde apenas para a venda de drogas e armas e movimenta algo em torno de U$ 5 a U$7 bilhões, segundo dados do Programa das Nações Unidas para o Controle Internacional de Drogas (ANDCP), departamento da ONU que trata da criminalidade transnacional”. A reportagem “Vende-se gente” lembra outra, intitulado “Meninos do Brasil”, que o Estado de Minas publicou na segunda quinzena de julho do ano anterior e que revelou a situação de miséria e abandono em que se encontram muitos dos atletas mirins levados à Europa por agentes de jogadores. Trata-se de garotos de origem humilde, que sonham com uma vida melhor, buscam o sucesso e a fortuna, têm vontade de fazer a independência financeira e de dar uma condição digna à família. A situação de carência em que vivem no Brasil e a falta de oportunidades de trabalho aqui facilmente os tornam vítimas de empresários inescrupulosos. Em síntese, o esquema desse tipo de tráfico de menores funcionaria da seguinte maneira: O empresário, pessoalmente ou através de olheiros, sai pelo País afora à cata de menores que demonstram algum potencial desportivo, mas ainda não têm vínculo contratual com algum clube. Daí entra em contato com a família, à qual oferece dinheiro em troca de uma procuração pela qual consegue autorização tanto para, em nome dos pais, assinar um contrato de trabalho ou de estágio com um clube estrangeiro, quanto para levar o menor ao exterior. Seriam conhecidos diversos casos em que o contrato está redigido em língua estrangeira. Os garotos viajam como turistas 23. Correio Braziliense, 28.11.2000. Há notícia também de “tráfico” de atletas menores vinculados a clubes brasileiros, inclusive com o uso de passaportes “comunitários” falsos, que valorizam o passe. Pela lei brasileira, o atleta pode ser profissional a partir dos 17 anos de idade. A transferência do atleta profissional para clubes estrangeiro é processado segundo regras estabelecidas pela CBF e pela Fifa, devendo as condições dessa transferência constar do contrato de trabalho. Neste caso, pois, pelo menos em tese, as próprias entidades desportivas dispõem de mecanismo de controle 22 23 No exterior, o menor é entregue ao clube que o “contratou”, cuja primeira providência é tomar-lhe o passaporte “a fim de legalizar sua situação”. O garoto, então, passa a jogar bola, em competições onde o estilo de jogo é muito diferente daquele a que estava acostumado aqui no Brasil. Por ser estrangeiro (e, pior, sulamericano), é socialmente discriminado. O empresário dá sua missão por encerrada, literalmente some no mundo, deixando o menor entregue à própria sorte. As condições de trabalho são tão miseráveis (salário de fome, comida ruim, inexistência de plano de saúde, comunicação difícil) que não há como viver fora do alojamento do clube. Se, porém, assim mesmo resolver sair, para tentar a sorte em outro clube ou outro emprego, ou, ainda, se resolver voltar para casa, não adianta: o prazo do contrato (que assinou sem ler) é de longo prazo, podendo chegar a dez anos, e, assim, ele está contratualmente preso ao clube em razão da “lei do passe”. A não ser, claro, que pague a indenização por rescisão unilateral de contrato, cujo valor pode chegar a U$ 15 mil. O autor da reportagem discutiu o problema com diversas autoridades. Um delegado da Polícia Federal (órgão que, como se sabe, controla a saída dos brasileiros do Brasil para o exterior), disse que os menores têm sua documentação devidamente inspecionada e que a PF não pode fazer nada, uma vez que a autorização dos pais torna a saída do menor perfeitamente legal. Disse mais: que a Polícia Federal e o Ministério Público só poderiam entrar no circuito, inclusive para investigar criminalmente os agentes de jogadores, se o Juizado da Infância e da Juventude tomasse a iniciativa de acioná-los. Para um Juiz da Infância e da Juventude, os maiores responsáveis pela saída desses menores são os pais: “O fato de uma família ser pobre ou ignorante em determinados assuntos não atenua a responsabilidade”. Essa autoridade também disse que é preciso identificar, prender e punir (os agentes), para que fatos como esses não ocorram mais. Finalmente afirmou que “para se dar uma autorização judicial para a viagem de um menor ao exterior é preciso uma análise mais detalhada de cada caso”, cabendo investigar para onde o menino vai e com quem vai. Foi ouvido ainda o chefe do Departamento de Assistência a Brasileiros no Exterior, do Ministério de Relações Exteriores. O diplomata observou que, se um garoto ou seus pais assinaram um contrato em língua estrangeira, “automaticamente esse documento não tem valor legal e pode ser anulado facilmente”. Ele também estranha que “alguém com uma procuração consiga obter do juiz autorização para levar um menor ao exterior”. De qualquer forma, se uma prevenção é difícil, na medida em que a decisão de deixar um cidadão entrar em seu território cabe exclusivamente a cada País, o Ministério reconhece que pode e deve dar toda a assistência possível aos menores. A respeito do problema foi consultado, ainda, um advogado que se manifestou disposto a representar os jovens na luta pelo passe. Segundo ele, é possível anular os contratos porque: sobre a saída do atleta para o exterior. No caso de menores sem vínculo com clube, o contrato é firmado entre o clube estrangeiro e a família, e, aí, só resta apelar para as autoridades civis. Já que foram assinados no Brasil, devem obedecer à legislação do País. Além disso, na época em que foram assinados, a lei não permitia contrato com um clube por tempo superior a dois anos. Não tem valor jurídico o contrato em língua estrangeira sem a tradução. E se tiver a assinatura de pessoa responsável, ela deve conhecer o idioma, caso contrário, o documento não tem valor. Os contratos não contêm o que os agentes prometeram, principalmente em termos de salários. Isso fere o princípio da boa-fé. Os garotos foram contratados para a prática do futebol em locais que oferecem boas condições de trabalho. Submete-los a tratamento sub-humano é proibido pela Declaração dos Direito Humanos. Brunoro24 define o empresário do futebol como um profissional independente, que atua na intermediação de jogadores entre os clubes. Fora do Brasil, o empresário é conhecido como agente de jogadores. A intermediação consiste na compra e venda de passes de jogadores, ou seja, na negociação das condições de transferência do jogador de um clube a outro, obviamente em nome do próprio. Pela reportagem anteriormente citada, há empresários que (também?) se dedicam ao recrutamento de possíveis talentos desportivos e cuidam de seu encaminhamento ao primeiro emprego, não se tratando, pois, de transferência entre clubes. Existe uma Associação Internacional de Agentes de Jogadores (Iafa). Freqüentemente, a intermediação é exercida paralelamente a (ou confundida com) as atividades de procurador ou olheiro. O primeiro é o profissional que cuida da imagem do atleta, administra suas rendas, agenda os compromissos sociais, negocia a renovação do contrato de trabalho e cobra a parte que cabe ao atleta no direito de arena; o segundo é especialista na identificação de bons negócios na área de compra e venda de passes A atividade do empresário desportivo ou agente de jogadores é regulamentada pela Fifa, desde 1990. O Estado de Minas de 23 de julho de 2000 informa que, segundo pesquisa feita na Internet, a Fifa teria atualmente registrados 573 agentes de jogadores. Na relação oficial, o Brasil aparece com 18 nomes de agentes credenciados e autorizados pela Fifa para atuar no Brasil como intermediários nas transferências de jogadores de futebol. O processo de credenciamento do agente é iniciado na CBF, mediante solicitação escrita de concessão de licença. O candidato não pode ocupar qualquer cargo em entidade desportiva. Os critérios de avaliação da aptidão para atuar como intermediário são livremente estabelecidas pela própria CBF. A concessão da licença é comunicada à Fifa, que pode reconhecê-la ou não. No primeiro caso, a licença só se torna efetiva se o candidato fizer um depósito 24 Parágrafos baseados em BRUNORO, José Carlos & AFIF, Antônio. Futebol 100% profissional. São Paulo: Editora Gente, 1997. no valor de 200 mil francos suíços, como garantia de que, caso o jogador que sofrer danos nas suas relações contratuais com o agente possa ser indenizado. Pelas normas da Fifa, é de dois anos a duração máxima do contrato entre o agente e o jogador; não pode o clube negociar contrato de trabalho com agente não credenciado, nem o atleta utilizar seus serviços; é vedado o agente de jogadores estabelecer contato com o jogador que tenha vínculo empregatício com qualquer clube, na intenção deliberada de persuadi-lo a romper o contrato de trabalho; pode a Fifa punir o mau agente, bem como o jogador de futebol e o clube que transacionarem com intermediário não credenciado. No que se refere ao problema dos menores acima descrito, dispõe o Estatuto da Criança e do Adolescente: “Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais. Art. 18. É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor. Art. 83. Nenhuma criança poderá viajar para fora da comarca onde reside, desacompanhada dos pais ou responsável, sem expressa autorização judicial. Art. 84. Quando se tratar de viagem ao exterior, a autorização é dispensável se a criança ou adolescente: I – estiver acompanhado de ambos os pais ou responsável; II – viajar na companhia de um dos pais, autorizado expressamente pelo outro através de documento com firma reconhecida. Art. 85. Sem prévia e expressa autorização judicial, nenhuma criança ou adolescente nascido em território nacional poderá sair do País em companhia de estrangeiro residente ou domiciliado no exterior. Art. 136. São atribuições do Conselho Tutelar: IV – encaminhar ao Ministério Público notícia de fato que constitua infração administrativa ou penal contra os direitos da criança e do adolescente. Art. 201. Compete ao Ministério Público: X – representar ao juízo visando à aplicação de penalidade por infrações cometidas contra as normas de proteção à infância e à juventude, sem prejuízo da promoção da responsabilidade civil e penal do infrator, quando cabível; Art. 238. Prometer ou efetivar a entrega de filho ou pupilo a terceiro, mediante paga ou recompensa: Pena - reclusão de um a quatro anos, e multa. Parágrafo único. Incide nas mesmas penas quem oferece ou efetiva a paga ou recompensa. Art. 239. Promover ou auxiliar a efetivação de ato destinado ao envio de criança ou adolescente para o exterior com inobservância das formalidades legais ou com o fito de obter lucro: Pena - reclusão de quatro a seis anos, e multa. Art. 251. Transportar criança ou adolescente, por qualquer meio, com inobservância do disposto nos arts. 83, 84 e 85 desta Lei: Pena – multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência.” Do que precede, extrai-se a) que a saída de menores do País, sejam atletas ou não, está disciplinada no Estatuto da Criança e do Adolescente; b) que a Fifa tem normas específicas para atuação dos agentes de jogadores (empresários). Não compete à lei brasileira estabelecer regras para a entrada de brasileiros nos diversos países, mas nada impede que, pelas vias diplomáticas, o Brasil sugira a adoção de normas disciplinadoras da concessão de visto a atletas estrangeiros menores de idade faça acordos específicos para um controle mais rigoroso 25, e discuta alternativas de prevenção. De qualquer forma, a CPI considerou a apuração dos fatos relativos ao tráfico atletas menores de idade um ponto de honra, ainda mais em razão dos fortes indícios de que essa imoralidade prospera na medida em que está associada aos crimes de falsificação de passaporte e de emissão fraudulenta de certidões de nascimento, os quais, respectivamente, valorizam o passe do atleta (maior liberdade de circulação nos países da Comunidade Européia) e tornam mais lucrativa a ação de olheiros e empresários 25 A Resolução Normativa nº 26, de 25.11.98, do Conselho Nacional de Imigração disciplina a concessão de visto destinado à prática intensiva de treinamento na área desportiva por atletas por atletas estrangeiros menores de 21 anos. Normas semelhantes poderão ser sugeridas a outros países. SUB-RELATÓRIO DEPUTADO EDUARDO CAMPOS SUB-RELATOR PARA TRANSAÇÕES IRREGULARES DE MENORES NO FUTEBOL I - I NTRODUÇÃO No contexto sócio-econômico brasileiro o futebol tem tido papel relevante. O Brasil possui mais de 153 milhões de habitantes, dos quais 49 milhões são crianças de 0 a 14 anos. Desse total, 19,8 milhões (40,4%) vivem em famílias com renda per capita inferior a meio salário mínimo. Essa dura realidade faz com que cada vez mais milhares de crianças em todo o país, incentivados pelos pais, sonhem com a ascenção social através do futebol, se sujeitando, na maioria das vezes, à exploração de empresários inescrupulosos, a maus tratos e a outras práticas criminosas. Esta Subcomissão do menor foi criada para aprofundar as investigações e a descrição das diversas formas de atuação, bem como o registro de casos e, por fim, a propositura de sugestões para evitar os ilícitos aqui consignados. As investigações realizadas têm apontado para a existência de verdadeiras máfias de transferência de jogadores de futebol do Brasil para outros países. Os jovens, geralmente com menos de 15 anos de idade, se destacam em “peneiras”, uma espécie de avaliação, realizadas por todo o País, através de olheiros de clubes com tradição nas categorias de base. Estados como Maranhão e Tocantins estão entre os mais visados. Um exemplo foi levantado por esta comissão na cidade de São Luiz – Maranhão, onde o esquema funciona dentro da própria Federação Maranhense de Futebol, com a participação do diretor do departamento de registros e transferências, Sr. Raimundo Nonato Pereira e a conivência do seu presidente, Sr. Carlos Alberto Ferreira. Com o interesse dos clubes, os pais e empresários desses jogadores “diminuem” a idade dos atletas, falsificando a certidão de nascimento e depois tirando os outros documentos, de forma "normal”, com a certidão adulterada. Sem a fiscalização dos clubes, que, na maioria dos casos não checam a validade dos documentos apresentados, os jogadores são inscritos em categorias com a data de nascimento acima do limite. Com isso, acabam se destacando pela vantagem física. Dada a valorização dos jogadores de futebol, as adulterações são comandadas por pessoas quase sempre alheias ao dia a dia dos clubes, visando, exclusivamente, à obtenção de elevados ganhos financeiros. “Máfias”, verdadeiras quadrilhas, com conexões que vão de locais remotos do interior do Brasil até capitais européias, foram montadas para negociar atletas menores tanto para o Brasil, como para o Exterior. A realização de algumas investigações, e a oitiva de testemunhas, tornaram possível entender o funcionamento desse esquema de falsificação de documentos, com o objetivo de transacionar jogadores com times estrangeiros. “Gato” é o jargão utilizado no Futebol para definir o jovem portador de documentos alterados para burlar os limites de idade em torneios. MODO DE ATUAÇÃO principais. O esquema montado para traficar atletas menores tem duas vertentes A primeira é formada por “olheiros”, técnicos das categorias de base, empresários e seus prepostos. Utilizam a estrutura de clubes filiados a federações, garimpando “mercadoria” entre jovens que tentam chance no profissionalismo. A segunda, que opera a partir dos chamados centros de treinamento, financiados por empresários, ou clubes nacionais e estrangeiros, promovem o recrutamento e a seleção de garotos para depois vendê-los a clubes do Brasil ou do Exterior. O esquema de “exportação” é claramente segmentado em dois tipos de mercados: o que trabalha com adolescentes ainda sem projeção nos meios futebolísticos e o que atua junto aos jovens atletas cujos nomes já despontaram no cenário esportivo, muitas vezes através de um processo de valorização que inclui convocação para as seleções sub – 17 e sub – 20. O “gato”, em razão do maior amadurecimento, tem mais chance de se destacar em competições nas quais os outros jogadores são fisicamente mais frágeis. Esse fato possibilita sua promoção para as categorias principais ou mesmo às seleções brasileiras sub – 17, sub – 20, o que eleva o valor do seu passe a milhões de dólares. II - SUÍÇA Em Zurique, os parlamentares entregaram relatório preliminar ao Presidente da FIFA, Joseph Blatter, sobre as investigações referentes à falsificação de passaportes e à transferência de menores. Algumas sugestões da comissão já serão adotadas, de pronto, pela FIFA: a criação de um cadastro internacional dos jogadores de futebol que atuam no exterior; a padronização dos contratos com cópia no idioma do atleta III - HOLANDA O CASO LEONARDO Em Roterdã, os deputados foram conhecer detalhes da história do jogador Leonardo Santiago, de 17 anos, do Rio de Janeiro, que foi condenado pela justiça daquele país, pelo uso de passaporte falso para jogar no Feyenoord. O brasileiro foi condenado a uma pena de prestação de serviços comunitários (40 horas de trabalho alternativo) e a uma multa de 3 mil florins, equivalente a R$ 2,55 mil. IV - BÉLGICA Dados da imprensa e informações prestadas perante esta Comissão indicaram a Bélgica como rota principal desse tráfico, em virtude da ausência de cotas para a participação de atletas estrangeiros em seus clubes, e pelo fato de a lei belga privilegiar atletas amadores de menor idade. Na Bélgica, a CPI manteve contato com seu Parlamento; com jornalistas dos maiores periódicos da área de esporte, treinadores brasileiros e estudantes, o que nos permitiu vislumbrar melhor o esquema montado de tráfico de jogadores, como relataremos a seguir: Esses garotos (muitos deles não registrados) são recrutados nos famosos centros de treinamento através de olheiros, empresários e prepostos de empresários. Há diversos agentes envolvidos nessa atividade criminosa, distribuídos em duas categorias bem claras. Uns que trabalham com jogadores ainda não revelados, ou seja, recrutam os menores ainda antes de serem jogadores notórios e conhecidos. Na rota Brasil/Bélgica, nessa área, foram citados os nomes de Expedito da Silva Júnior, o Ted Júnior, que trabalha em parceria com o Sr. Rachid Tasmuth, marroquino, dono de café em Bruxelas, Emílio Ferreira. Outros que atuam na área de valores já conhecidos, e em articulação com os times da primeira divisão, onde se destacam o Sr. Giuseppe Robolotta, em parceria com o agente de nome Enéas, hoje radicado na Inglaterra, o ex-jogador Wagner, o Sr. Braid Ribeiro, Rogério Henrotay, o espanhol Emílio Ferreira e Daniel Gurard. Na categoria dos que já se projetaram, atua o empresário Juan Finger, cuja atuação indica ações suspeitas de elisão fiscal e burla à Lei 9.615/98 (Lei Pelé). A Bélgica funciona como um grande entreposto para os demais países da Europa, entre eles, a Itália, Holanda, Espanha, França e Portugal, porque apresenta o controle de fronteira mais democrático da União Européia: não existe restrição de cota, de participação de estrangeiros extracomunidade européia nos times de futebol, podendo chegar a até 11 jogadores, se assim entenderem os dirigentes e o técnico. Além do mais, a Bélgica concede tratamento ao menor atleta estrangeiro diferenciado dos outros países, pois o considera como se tivesse um visto de estudante, ou seja, confere-lhe tratamento de cidadão. Outro grande atrativo é a existência de muitos times belgas de segunda e terceira divisão, que têm uma visão unicamente empresarial de preparar essas crianças para fazer negócio com o futebol europeu. Para os brasileiros a Bélgica ainda é mais atrativa, pela experiência bem sucedida do Oliveira, do Maranhão; pela presença de muitos brasileiros, ex-jogadores atuando nesse esquema e, ainda, pela existência de um vôo direto São Paulo-Bruxelas, da VASP. Esse processo vivido na Bélgica é sentido já há alguns anos, tanto que há um livro do jornalista Daniel Renard, com quem estivemos, baseado na experiência de quatro brasileiros que foram levados pelo Robolotta e abandonados por ele. Um livro bastante conhecido no mundo do futebol. A exploração de jogadores brasileiros na Bélgica assumiu proporções tais que já despertou interesse da Comissão de Direitos Humanos do Parlamento Belga. Recentemente, houve mudança em sua legislação: os times belgas estão proibidos de contratar menores de 18 anos e são obrigados a atribuir aos contratos valor de, no mínimo, US$ 3,000.00 mensais, como uma maneira de barrar a iniciativa dos times de trazer jogadores irregulares. V - O ESQUEMA O esquema funciona com a recepção de meninos brasileiros, que são levados para o exterior, pelo esquema do empresário brasileiro com o empresário estrangeiro, sendo mantidos em apartamentos ou repúblicas, enquanto treinam em equipes inexpressivas, via de regra, sem remuneração, recebendo apenas a alimentação. Aqueles que vão já como jogadores assinam contrato, alguns, inclusive, em Flamengo ou Francês, sem conhecer o idioma e conseqüentemente o teor das cláusulas. Esses contratos muitas vezes são rescindidos sem o conhecimento do jogador. Os menores são levados para esses times, que aqui nós chamaríamos de times de várzea, com campos para treinamento, e são colocados sob a guarda do empresário ou do preposto local do empresário, que fica fazendo a supervisão deles. Os que são aprovados (minoria) são negociados com clubes, dentro e fora da Bélgica. Os times geralmente querem selecionar apenas um jogador, enquanto que o empresário quer negociar o grupo todo. Quando não dá certo, o empresário acaba abandonando todo o grupo ou parte dele. Assim, a maioria, por não ser aproveitada, é abandonada à própria sorte, sem qualquer indenização, sequer direito à passagem de volta. Isso em um País estranho, sem o conhecimento do idioma local, enfrentando toda sorte de dificuldades. Essas vítimas ou são apoiadas por algum brasileiro ou vão trabalhar na construção civil, no comércio ou em outra atividade, em situação ilegal. Termina sendo esse o caminho para obter algum recurso para voltar, quando é possível. Nós encontramos muitos jogadores brasileiros nessa situação. A maioria deles levados por agentes. Com a nossa chegada, houve um grande número de jogadores que queriam voltar para o Brasil, tanto que foi solicitado à funcionária da embaixada que fizesse uma lista desses jogadores. A Comissão escolheu o Fábio, um desses jogadores, por ter sido um dos primeiros a fazer contato conosco. O CASO FÁBIO O depoente FÁBIO FARIA DOS SANTOS conta que, em 1999, foi para a capital paulista tentar “alguma coisa no futebol”. Lá ficou treinando no Juventus durante três meses, quando foi apresentado, através do Sr. Jota, de São Paulo, a Ted Júnior e a convite do empresário foi treinar em seu centro desportivo em Pouso AlegreMG (o treinador, o preparador físico, etc. era o Sr. Fidelis). Relata que o centro possuía apenas o campo, o alojamento e o lugar das refeições e que por lá permaneceu por 15 dias. Ao voltar para São Paulo recebeu o convite do empresário para viajar para a Bélgica (quando teve que desembolsar, no total, cerca de R$ 7.100,00). Chegando à Bélgica, levado pelo Sr. Ted Júnior, foi morar em um apartamento juntamente com outras cinco pessoas em cima de um café de nome Go Go Bar, de propriedade do Sr. Rachid. Treinou em alguns times até se acidentar, ficando um mês e meio parado, sem receber tratamento algum. Dois meses depois, o Sr. Ted parou de visitá-lo, abandonando-o, quando Paulo, um brasileiro que mora lá, o amparou. Relata, ainda, que seu pai assinou procuração dando poderes ao empresário para negociar seu passe e que durante sua permanência naquele país nunca lhe fora dado nenhuma quantia para custear suas despesas pessoais. Informou, também, que lhe fora dito que com um passaporte português ficaria mais fácil jogar, mas que teria que pagar uma taxa exigida pela federação belga para obtê-lo. Declarou que em solo Belga manteve contato com alguns atletas brasileiros, são eles: Pithon Júnior, dois Eduardos, Emerson, Fábio, Lima e Rogério. Informou, também, que não conhecia nada a respeito do Ted Júnior, ou melhor, a única referência conhecida a respeito do empresário era a de que ele teria ouvido, no ano de 2000, que no ano de 1994, o Sr. Ted levou jogadores para Europa. Em seu depoimento, o atleta Fábio registrou que o Sr. Ted morou com o grupo em Bruxelas, mas, o seu domicílio era no Brasil - Santo André/SP. O depoente embarcou sozinho para a Europa, com 16 anos de idade, mediante uma autorização de viagem dada ao Sr. Ted, que já se encontrava na Bélgica, que concedialhe poderes para manter o atleta naquele país, o que torna o empresário responsável pelo menor. Quando indagado se fora alvo de alguma agressão, respondeu que não, mas que fora testemunha de uma agressão física praticada pelo Ted Júnior - um tapa, contra um garoto, Emerson, motivado por um comentário do menor de que o tempo da escravidão já tinha passado, isso em contraposição a uma ordem sua. Inquirido o atleta sobre se tinha conhecido ou ouvido falar de um certo Sr. de nome Wagner, respondeu que não conheceu tal pessoa, somente ouvira falar dele nos comentários feitos pelo Ted Júnior; que era para ele (depoente) tomar cuidado, porque aquele empresário pegava jogadores e levava para outros times; este empresário, segundo seu depoimento, vive na Bélgica. Entretanto, quando perguntado se ele teria conhecimento da existência de um outro menor jogador de nome Pablo, respondera que só o conhecera por fotografia e que a história que se contava, na Bélgica, era que ele havia sido levado pelo Ted Júnior para a Bélgica, mas teria sido aliciado pelo Wagner que o levou para jogar no futebol francês. DEPOIMENTO DE GEORLAN GOMES BASTOS - GIL O depoente admitiu ter utilizado documentos falsos durante o período que jogou na Espanha, “no momento em que usei documentos falsos eu só pensei em jogar na Europa, que é o sonho de todo jogador do interior do Brasil, e também porque queria ajudar minha família”. Informou que o então Vice-Presidente do Clube Americano de Bacabal no Maranhão, o Sr. Francisco Alves de Araújo, providenciou para que ele arranjasse uma outra identidade antes de contratá-lo, para escapar do cerco do Clube Santo André de São Paulo, que era o dono de seu passe. O jogador passou a se chamar Jucerlan Rodrigues e a possuir dois anos a menos. Contou, ainda, que o “Araújo disse que aquele documento era de uma pessoa morta lá do interiorzão, que ninguém conhecia.” De posse da nova documentação, viajou de Maranhão para Fortaleza, onde foi recebido pelo presidente do Americano de Bacabal, Sr. Clóvis Dias, que o embarcou para a Espanha, entrando por Portugal, portando dois passaportes. Um dele próprio e outro que foi apresentado na Aduana, em nome de Jucerlan. Com esse passaporte fez teste no Hércules, um time de segunda divisão, como a preferência era por um jogador mais alto, Gil foi emprestado pelo Americano para o Lorca, onde, segundo ele, recebeu outro passaporte somente para jogar. Em suas férias, retornou à Matinhas-MA, sua cidade natal, quando conheceu pessoalmente o verdadeiro dono dos documentos que disse ter entregue sua certidão de nascimento a uma outra pessoa para que ela o ajudasse a tirar a carteira de identidade e o CPF. Conforme o depoente, o esquema foi denunciado pelo próprio Araújo aos jornais e rádios do Maranhão, após sua destituição da vice-presidência do Clube. DEPOIMENTO DE SÉRGIO FERREIRA DA SILVA O depoente declarou que no ano de 2000, durante a realização do campeonato pernambucano de futebol - Juniores, foi convidado por um empresário de nome “Nino”, que se dizia angolano, naturalizado português, a embarcar para a Europa com dois garotos treinados por ele: o menor Gustavo (17 anos) e o Wilton (18 anos), para jogarem num time da Alemanha. O convite foi aceito, porém os três foram detidos no aeroporto em Bruxelas, onde iriam fazer a conexão para Berlim. Contou que eles recorreram à embaixada brasileira que alegou nada poder fazer. Nesse período da detenção conheceram outros dois garotos paulistas na mesma condição (Ígor e Rodolfo), levados por Ted Júnior. No décimo segundo dia de espera, apareceu Otávio Monteiro Barros, funcionário da embaixada, que prometeu ajudá-los, desde que pudesse negociar o passe dos quatro atletas. Otávio liberou-os apresentando cinco cartas-convites de um clube belga, prometendo contratá-los. Ficaram nove meses na Bélgica, sem nada conseguir, mantidos por Monteiro Barros e por um espanhol de nome Ramom, que o depoente afirma serem sócios num café de nome CEBESG, onde havia jogo. O depoente confirmou também conhecer o marroquino Rachid, que logo nos primeiros dias de sua chegada na Bélgica, havia ido pegar os atletas Igor e Rodolfo no aeroporto. Sérgio revelou ter conhecido um garoto brasileiro que sobrevivia tocando pandeiro no metrô e que soube de uns 4 ou 5 casos de garotos que haviam se prostituído para se manter. Um fato que chamou bastante atenção em seu depoimento é que o Sr. Sérgio diz manter uma instituição que recebe patrocínio do conselho da Criança e do Adolescente e, entretanto, leva garotos para fora do país, irregularmente, sem nunca ter recebido qualquer advertência ou punição. O funcionário OTÁVIO MONTEIRO BARROS, ao ser interrogado pelos deputados, tendo vista a acusação de negociar jogadores menores, negou que tenha feito negócios no esporte, entretanto, declarou que os depósitos de US$ 10 mil e US$ 70 mil efetuados em sua conta, referentes à compra dos passes do jogador Jeferson pelo Lense e do goleiro Pablo pelo Saint Germaim, foram repassados integralmente aos atletas, que não teriam contas. DEPOIMENTO DE MARCOS ANTÔNIO COSTA - PRETO Declarou que o Juventus teria depois da copa São Paulo de 2000, emprestado o seu passe para o Santos por um ano, quando foi verificado que a documentação do jogador continha datas de nascimento alteradas. O original de nascimento do jogador é de 1978 e o jogador estava registrado na Federação Paulista de Futebol, como sendo do ano de 1980. Conforme contou, entregou sua documentação ao Sr. Peçanha (empresário responsável pela sua transferência do Primavera de Indaiatuba para o Juventus) e ele a alterou. DEPOIMENTO DE MARLON DA SILVA SANTOS Em depoimento na Assembléia Legislativa de São Paulo, os Sr. Marlon, do São Caetano, admitiu que teve a certidão de nascimento adulterada por um Cartório de São Luis do Maranhão. Revelou que foi levado pelo procurador Valmir Pinheiro Bastos, do Clube Boa Vontade, do Maranhão, para o União São João, de Araras, no interior de São Paulo e que a partir desta venda, a data de seu nascimento foi alterada em quatro anos, assim como seus dados relativos à filiação. DEPOIMENTO DE RAUL MENEZES Segundo o depoimento do Senhor Raul Menezes, o senhor Antônio Benedito Braid Ribeiro intermediava a saída de jogadores menores do futebol do Maranhão para o exterior. Informou também que Alessandro, jogador menor, foi levado para a Tunísia sendo posteriormente descoberto na Grécia com documentos arranjados e fraudados pelo referido senhor. Esclareceu, ainda, que o Sr. Braid teve a ajuda de Giuseppe Robolota. Contou que o Sr. Braid vive disso: é preparador físico e que seu principal objetivo de se empregar no exterior, é a obtenção de facilidades para transferir jogadores de futebol do Maranhão para fora do país. O depoente afirma possuir um bilhete assinado pelo Sr. Braid, onde ele lhe manda um jogador para treinar no Moto e ser observado, com o objetivo de levá-lo para o exterior. DEPOIMENTO DE ESTELMAR BASTOS Em seu depoimento, o Sr. Estelmar Bastos informa que o Sr. Sérgio Alves da Silva leva jogadores, menores, para a Bélgica e que possui um sócio com a alcunha de Preto. Que, inclusive, pegou um monte de jogadores dele, em 1996, uma vez que seu time, o Expressinho, havia sido eliminado da Federação durante três anos. Informou, ainda, que Serginho era dono do Américo. Depoimento de Antônio Henrique Em seu depoimento, o Sr. Antônio Henrique afirma que Antônio Cassas de Lima é um dos chefes do esquema de falsificação de documentos de jogadores do Maranhão. Informa, ainda, que há suspeita de que existam várias ramificações de exportação de jogadores, e que ele seja um dos mais atuantes. Confirmou que a documentação do jogador Kleber João Boás Pereira, foi adulterada pelo Cassas e pelo Gambasto (Roberto Gambaster), um empresário, provavelmente, belga. Afirma, também, que Cassas enviou dezenas de jogadores para a Bélgica e que Cassas é amigo da Dra. Margarida, titular de cartório em São Luiz, de onde foram roubadas mil certidões de nascimento. Por último, declarou que acredita que Cassas não tem relação com a embaixada na Bélgica, pois não necessita já que falsifica tudo. DEPOIMENTO DE JAECI CAVALCANTE DE CARVALHO Em seu depoimento, o jornalista Jaeci de Carvalho denunciou que os empresários Adailton Nunes e Antônio Carvalho negociaram 23 jogadores brasileiros de futebol menores de idade para a Polônia, durante o ano de 1997, inclusive o jornalista apresentou contratos assinados pelo Sr. Adailton Nunes, com o percentual que recebeu por cada garoto, comprovadamente. Segundo o depoente, os empresários prometiam casa e conforto para os garotos. Mas chegando lá, o salário era apenas de US$ 250 e eles dormiam na arquibancada do clube Polonês LKS. Admitiu o depoente que os jogadores são orientados pelos empresários inescrupulosos a não procurarem as embaixadas e nem os consulados brasileiros no exterior. Afirmou, ainda, que existem mais de cinco mil jogadores estrangeiros menores de idade espalhados pelo mundo sem qualquer tipo de assessoria. VI - NO BRASIL No Brasil há uma extensa rede de empresários e prepostos deles, com fortes ligações com presidentes de federações e de clubes de futebol, técnicos das categorias de base, etc. Como ficou amplamente noticiado nos trabalhos da CPI da CBF/NIKE, vários ex-jogadores famosos, intermediam a ida de jogadores para fora do país, a exemplo de Careca, Edinho e outros. Esta CPI, em viagem à Europa, conseguiu reunir documentos sobre a participação de Careca, Edmar e do presidente do Clube União São João na venda do passe de Jedaias Capucho, o Jeda. O jogador possuiu um passaporte falso, joga atualmente no Clube Vicenza, na Itália. DEPOIMENTOS DE ANTÔNIO DE OLIVEIRA FILHO (CARECA), EDMAR BERNARDES, ANDRÉ AUGUSTO LEONE (DEDÉ), ELISEU OLIVEIRA (TIROGA) E JOSÉ MÁRIO PAVAN (PRESIDENTE DO UNIÃO SÃO JOÃO ESPORTE CLUBE ) Desses vários depoimentos pode-se depreender que Jeda, jogador oriundo do clube União São João, do interior do Estado de São Paulo, foi vendido por seu então procurador Eliseu Oliveira (Tiroga), para um clube na Ítalia, Vicenza. A operação foi intermediada, no Brasil, pelo Campinas Futebol Clube, através de Antônio de Oliveira Filho (Careca) e, no exterior, pelo Senhor Máximo Briaschi, com a participação da venda do passe pelo então Presidente do União São João o Senhor José Mário Pavan. No contrato de Jeda há uma cláusula fixando em US$ 300 mil o passe do jogador e, em seguida, a informação de que esse valor poderia subir para US$ 1 milhão caso Jeda deixasse de ser um atleta extracomunitário (com cidadania de um dos países da União Européia). Assim, existe uma distinção com relação ao valor dos passes na Europa, baseada na origem do jogador. Quando surge Jimmy Martins, cujo verdadeiro nome é Afonso Martins Costa Filho, que segundo Careca, se apresenta como agente FIFA, (esse apresenta um cartão de visita “FIFA Play, Bernardo Chalen e Mr. Jimmy Martins FIFA, agentes representantes”) pessoa contratada para providenciar o passaporte comunitário tanto do Jeda quanto do Dedé. Assim, o passaporte é emitido, elevando, sobremaneira, o valor de venda do atleta. O jogador Alex Dias de Almeida, do Saint Etiènne da França, em depoimento à CPI, confirmou que foi induzido pela direção do clube a usar o passaporte comunitário, e que Edinho, ex-jogador da seleção brasileira, providenciou seu passaporte português, sem que ele tenha pago por isso. Alex esclareceu, ainda que não possui ascendência portuguesa. Depoimento de Leandro Quesada O Sr. Leandro Quesada, comentarista esportivo, baseou seu depoimento em histórias de garotos brasileiros que vão tentar a vida de jogador de futebol em outros países, influenciados por pseudo-empresários e acabam se decepcionando. O ÔNIBUS DE GOIÂNIA Contou o comentarista que, em conversa com o delegado Sr. Alfredo Luís Ondas, descobriu que ele investigava o Sr. Edson Cristino de Sousa que é um fabricante de “gatos”. Esse fato lhe foi confirmado por SAMUEL MOTA, um garoto de 17 anos, de Santa Helena de Goiás, que lhe contou que o Sr. Edson Cristino de Sousa passava com um ônibus em sua cidade, recrutando alguns garotos com a promessa de que eles se dariam bem no futebol de São Paulo, jogando em grandes clubes. Esse senhor levou um monte de garotos para a cidade de Americana e de lá fugiu, ao ser descoberto, estando foragido. A COPA DE SÃO PAULO No painel para ouvir convidados sobre o tema “ O futebol de várzea” realizado pela CPI, o Sr. JOSÉ FIOQUE, Secretário Municipal de Esportes, da cidade de Americana-SP, declarou que a organização da Copa São Paulo tomou um perfil diferente, tornou-se uma competição praticamente profissionalizada. Perdeu o seu principal objetivo de mostrar atletas para o futuro. Nesse mesmo painel, o Sr. FLÁVIO ADAUTO IÓRIO LOPES declarou acreditar que o poder público já perdeu o controle sobre essa competição que hoje tem muito pouco a ver com o futebol de base. É uma competição elitizada por grandes equipes do futebol brasileiro como o Corinthians, Flamengo, Vitória, Bahia. Informou que ali os garotos já são comercializados com 16, 17 e 18 anos de idade. A CPI recebeu denúncias relativas à Copa São Paulo de Futebol Júnior. Uma delas trata da existência de gatos, entre os participantes do torneio, o alvo são os jogadores do Roma, equipe campeã da competição em 2000. Em matéria divulgada pelo jornal Estado de São Paulo do dia 31/01/01, Ílton José da Costa, dirigente do Roma, contou que os clubes não são obrigados a fiscalizar a documentação de seus atletas e não sofrem punição por isto. A outra é sobre a inscriç