REPERCUSSÕES DA GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA PARA A JOVEM MÃE Ângela Mª da Silva1 Nailde Gonçalves da Silva 1 Mª dos Prazeres Albuquerque1 Luciana Mª do Nascimento1 Daisyvângela Eucrêmia da Silva Lima 2 RESUMO A ocorrência da gravidez na adolescência tem aumentando de forma significativa na faixa etária compreendida entre 10 a 19 anos. Os riscos advindos dessa gravidez expõem a jovem mãe a problemas de saúde e socioeconômicos, causando não somente, hipertensão, infecção do trato geniturinário, riscos de anemia, e complicações pós-parto como exclusão social. Assim este trabalho teve como objetivo verificar os métodos contraceptivos utilizados por adolescentes grávidas ou que já engravidaram, se as mesmas tinham conhecimento sobre algum método contraceptivo e qual a participação do parceiro durante a gravidez. Foram aplicados formulários semi-estruturados a trinta e seis adolescentes grávidas. O universo da pesquisa compreendeu adolescentes com idade entre doze e dezoito anos. As adolescentes tinham o conhecimento sobre algum método contraceptivo, porém durante a relação sexual não fizeram uso dos mesmos. Alto nível de conhecimento sobre métodos anticoncepcionais não determinará nenhuma mudança de comportamento se os métodos contraceptivos não estiverem acessíveis à livre escolha dos adolescentes. PALAVRAS-CHAVE: Gênero. Métodos anticoncepcionais. Adolescente. 1 INTRODUÇÃO A população mundial de adolescentes já passou de um bilhão e 60 em cada 1000 meninas de 10 a 19 anos tornam-se mães, correspondendo ao nascimento de 17 milhões de bebês a cada ano. No Brasil, a população feminina entre 10 e 19 anos já ultrapassa os 17 milhões (IBGE apud CAPUTO e BORDIN, 2008). As repercussões da gravidez precoce, trás riscos nutricionais para a gestante, uma vez que há uma necessidade de maiores calorias, vitaminas, sais minerais, aliando-se a estas necessidades há ainda a exigência fetal que demanda a aquisição desses nutrientes necessários ao crescimento do feto. Assim como também existem outros agravantes como, por exemplo, problemas socioeconômicos conforme a situação de cada gestante e/ou família. Para adolescentes de classe 1 Graduando em Economia Doméstica. Universidade Federal Rural de Pernambuco/UFRPE. [email protected] 1 baixa, uma gravidez indesejada pode ser o inicio dos mais temidos problemas na vida do ser humano. O abandono dos estudos e a falta de conhecimento para conseguir um emprego de boa qualidade, com um salário digno é o problema mais dramático, propiciando para que surjam os bolsões de pobreza (NATHYANE GONÇALVES, 2009). Demograficamente a gravidez precoce acarreta num maior contingente populacional, gerando um crescimento acelerado da população onde as adolescentes (sexo feminino) são as mais prejudicadas porque dependendo da sua condição socioeconômica podem renunciar principalmente aos estudos o que possivelmente poderá prejudicar a sua inserção futura no mercado de trabalho, pois a educação é um dos principais fatores de mobilidade social de indivíduos. De acordo com o contexto acima, a gravidez na adolescência tem se mostrado um problema preocupante, pois traz repercussões para a vida das adolescentes de um modo geral. Assim este trabalho teve como objetivo verificar os métodos contraceptivos utilizados por adolescentes grávidas ou que já engravidaram, se as mesmas tinham conhecimento sobre algum método contraceptivo e qual a participação do parceiro durante a gravidez. 2 REVISÃO DE LITERATURA A gravidez na adolescência é um problema de saúde pública tanto no Brasil como em muitos outros países do mundo. Sua importância transcendeu a prática assistencial, dado seu aumento no final do século passado. Para entender os possíveis fatores etiológicos ligados ao incremento das gestações nessa faixa etária, é preciso perceber a complexidade e a multicasualidade desses fatores, que tornam os/as adolescentes especialmente vulneráveis a essa situação (BELO e SILVA, 2004) A maternidade no início da vida reprodutiva antecipa a maturidade biológica, e abrevia momentos socialmente institucionalizados para a reprodução, com claras implicações para a constituição da família e a organização social dominante (BELO e SILVA, 2004). Nessa perspectiva, a gravidez na adolescência tem sido alvo de inúmeros estudos e reflexões por 2 Técnica e Graduada em Economista Doméstica, Mestra em Nutrição/UFPE e Professora Assistente do Departamento de Ciências Domésticas/UFRPE. 2 ameaçar o bem-estar e futuro dos/as adolescentes devido aos riscos físicos, emocionais e sociais que acarreta. A gestação na adolescência provoca certas alterações nas transformações já vivenciadas pela jovem, a qual ocorre de forma natural para a sociedade, implicando num maior esforço fisiológico e tudo se dando num mesmo momento, ou seja, ser adolescente e estar grávida. Atrelado a isso ainda há os problemas psicológicos que a jovem mãe pode vivenciar, como: o confronto com a família; dificuldades na relação com o companheiro; maternidade como projeto de vida; interesses de adolescente; a vergonha na hora de se relacionar com seu grupo de amigos; desistência de si mesma; a fuga; acarretando muitas vezes estados depressivos nas mesmas. Atrelado aos aspectos supracitados, ainda se tem o desafio de derrubar barreiras que foram construídas ao longo do tempo, através da questão de gênero. Gênero é um conceito útil para explicar muito dos comportamentos de mulher e homem em nossa sociedade, nos ajudando a compreender grande parte dos problemas e dificuldades que as mulheres enfrentam no trabalho, na vida política, na vida sexual reprodutiva e na família (SCOTT, 1991; GOUVEIA e CAMURÇA, 1999). Segundo Santos e Buarque (2006) as mulheres são responsabilizadas por toda tarefa reprodutiva porque ficam grávidas e amamentam. A gravidez é resultado de um ato de desejo entre um homem e uma mulher. A gestação e a amamentação são funções do aparelho reprodutivo das fêmeas, próprios da maternidade. Depois, cuidar das crianças, alimentá-las, constitui um conjunto de atividades que compõe o exercício social da maternagem. Para essas atividades, não é exigida uma condição biológica especifica, podendo essas ser, também, realizadas pelos homens, no exercício social da paternagem. As normas de gênero produzem para as mulheres poucas esperanças e possibilidades, como ter no casamento um destino desejado. Mesmo hoje em dia, ser mãe e esposa ainda se configura como parte principal na vida da mulher e traz conseqüências como mais trabalho para as mulheres; exclusão das mulheres da vida pública e dependência financeira (GOUVEIA e CAMURÇA, 1999; SANTOS E BUARQUE, 2006). Considerando as condições especificas de cada mulher, de cada família, de cada região e de cada país, os níveis de desvantagens variam. No entanto, esta situação transcende as questões de classe social, de raça e etnia. Mulheres negras, pobres e ricas, profissionalizadas ou não, sofrem as conseqüências de uma relação desigual, estruturada e mantida por relações de poder 3 entre os sexos (SANTOS E BUARQUE, 2006). Assim as conseqüências se agravam quando a maternidade acontece com as adolescentes, pois a gravidez precoce acarreta danos tanto à saúde física, psicológica, social e econômica. 3 METODOLOGIA A pesquisa foi realizada em Instituições de Saúde: Instituto Materno Infantil de Pernambuco (IMIP), sendo um centro de referência nacional para a saúde da mulher e da criança carente e o Hospital Barão de Lucena, considerado hospital de referência para gravidez de alto risco. Essas duas instituições de saúde prestam serviços de atendimento a população conveniada ao Sistema Único de Saúde (SUS). Foram aplicados formulários semi-estruturados a trinta e seis adolescentes grávidas. O universo da pesquisa compreendeu adolescentes com idade entre doze e dezoito anos, essa é a faixa etária considerada pela Lei 8.069 de 13 de julho de 1990 que institui o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO A média de idade das entrevistadas foi de 12 e 18 anos, algumas encontravam-se grávidas ou já haviam engravidado na adolescência. No que se refere a escolaridade, 30% concluiu o ensino fundamental, enquanto 69% abandonou a escola ao descobrirem a gestação, e apenas 1% completou o ensino médio. O apoio da família era muito valorizado, mas nem sempre ocorria da forma como esperavam. No tocante á educação, a interrupção temporária ou definitiva, no processo de educação formal, acarretará prejuízo na qualidade de vida e nas oportunidades futuras. Não é raro que aconteça com a conivência do agrupamento familiar e social a adolescente se afastar da escola, frente a gravidez indesejada, quer por vergonha, quer por medo da reação de seus pares (MCGOLDRICH, 1985; ALIAGA et. al., 1985; FERNADÉZ et al., 1998; SOUZA, 1999). Evidenciou-se ainda que 80% das adolescentes tiveram outras gestações, ou seja, engravidaram mais de uma vez e quando argüidas sobre o que achavam de ter engravidado as respostas foram semelhantes. “Estou feliz é normal engravidar” (adolescente). No entanto durante o 4 momento da entrevista percebemos nas falas de algumas delas que o que estava sendo pronunciado não correspondia ao verdadeiro sentimento das mesmas, pois em algumas pudemos perceber certo ar de tristeza e resignação da nova condição da maternidade. Nas respostas de algumas ficou evidenciada que a maioria, 90%, conhecia algum método contraceptivo, porém durante a relação sexual não fizeram uso dos mesmos, como pode ser visto nos pronunciamentos seguintes, ou porque não gostavam, ou faltava no posto de saúde: “Eu conhecia pílula, camisinha, e outros métodos, aprendi no curso de Auxiliar de Enfermagem” “Conheço comprimido, quando fui ao ginecologista, mas não usava” “Conhecia e usava, mas engravidei por acidente” “Conhecia mais nunca quis usar” “Conhecia injeção, remédio, mas aconteceu por acaso” “Conhecia, através de televisão” “Conhecia, através da escola, lá eu tinha aula sobre sexo” O acesso à informação de boa qualidade e a disponibilidade de alternativas contraceptivas são aspectos fundamentais nos programas de planejamento familiar, destinados não apenas aos adolescentes, mas à população em geral. O conhecimento inadequado sobre qualquer método anticoncepcional pode ser um fator de resistência à aceitabilidade e uso desse método. Do mesmo modo, alto nível de conhecimento sobre métodos anticoncepcionais não determinará nenhuma mudança de comportamento se os métodos contraceptivos não estiverem acessíveis à livre escolha dos adolescentes (MARTINS et. al. 2004). Quando indagadas sobre a reação dos parceiros, quanto a descoberta da paternidade, a maioria afirmou que os companheiros demonstraram alegria ao receberem a notícia, enquanto para algumas foi exigido que realizassem o aborto porque o pai da criança não queria assumir a responsabilidade. “Eles ficaram felizes ao saber que iria ser pai”. (adolescente) Contudo o descompromisso dos homens, em relação à paternagem, tem criado situações agravantes especificamente de exclusão das mulheres no espaço público, pois a jovem mãe terá que trabalhar para atender as necessidades básicas do/a filho/a e se tornar responsável pelo cuidado e educação do rebento, tendo que cumprir muitas vezes uma dupla jornada de trabalho, como trabalho no espaço privado/trabalho no espaço público/escola. Sabe-se que durante um ato 5 de desejo entre o homem e a mulher uma criança poderá ser gerada, sendo responsabilidade de ambos os sexos e não simplesmente da fêmea onde as diferenças biológicas não devem ser fatores determinantes para o estabelecimento de papéis de homem e da mulher na sociedade. Na nossa sociedade, a matriz de gênero não só define que homens e mulheres cumprem diferentes papéis, mas estabelece uma hierarquia entre esses papéis, atribuindo aos homens um lugar de autoridade e de posse sobre as mulheres, construindo as desigualdades entre eles, que não podem ser justificadas nas simples diferenças biológicas (SANTOS e BUARQUE, 2006). Uma das perguntas que não se sentiram a vontade para responder foi se havia possibilidade entre seus pais para conversar assuntos relacionados a sexualidade. Um grande número respondeu que nunca tiveram espaço para conversar sobre tal assunto, nem mesmo com colegas, relataram ter vergonha de dialogar sobre o assunto. As jovens gestantes estavam realizando o pré-natal e sendo orientadas pelos/as médicos/as para participarem do planejamento familiar. Quando indagadas sobre o que era ser mãe? As respostas foram diversas: “Tem que ter responsabilidade” “É tudo” “Ser mãe é coisa boa” “Se sentir completa” “Se sentir realizada”. As adolescentes acreditam que ser mãe é meta principal das mulheres, preterindo sua vida profissional, e as perspectivas pessoais (DADOORIAN, 2000). 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS De acordo com os resultados obtidos percebe-se que apenas através do conhecimento das adolescentes sobre método contraceptivo não possível prevenir a gestação na adolescência. Por isso a prática de orientação adotada pelos serviços de saúde deveria estar atrelada a uma política efetiva de saúde para as mulheres, refletindo e buscando propostas do público-alvo incorporando a família neste processo. Assim um trabalho conjunto entre família e unidades de saúde seria uma oportunidade para transformar conhecimento em atitudes e atitudes em comportamento. Pode-se dizer ainda que os resultados apontam para uma sociedade machista distante de um marco igualitário entre homens e mulheres. 6 REFERÊNCIAS BELO, M. A. V.; SILVA, J. L. P. Conhecimento, atitude e prática sobre métodos anticoncepcionais entre adolescentes gestantes. Rev. Saúde Pública, Ago 2004, vol.38, no. 4, p.479-487. CAPUTO, V. G.; BORDIN, I. A. Gravidez na adolescência e uso freqüente de álcool e drogas no contexto familiar. Rev. Saúde Pública, Jun 2008, vol.42, no. 3, p.402-410. DADOORIAN, D. Um Novo Olhar Sobre a Gravidez na Adolescência. Rio de Janeiro: Rocco. 2000. 173 p. GOUVEIA, T.; CAMURÇA, S. O que é gênero. Recife: SOS Corpo, 1999. MARTINS, M. F.; COSTA, J. S; SAFORCADA, E. T.; CUNHA, M. D. C. Qualidade do ambiente e fatores associados: um estudo em crianças de Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil. Caderno de Saúde Púbica. 2004, vol.20, n. 3, p. 710-718. SANTOS, G.; BUARQUE, C. O que é gênero? In: VANIN, I. M.; GONÇALVES, T. Caderno de textos gênero e trabalho. Salvador: REDOR, 2006. 2009p. SCOTT, J. Gênero: categoria útil para análise histórica. Recife: SOS Corpo, 1991. 7