SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, 10(2) 1996 MERCADO DE TRABALHO E MIGRAÇÃO NA GRANDE SÃO PAULO PAULA MONTAGNER Economista, Analista da Fundação Seade SANDRA MÁRCIA CHAGAS BRANDÃO Economista, Analista da Fundação Seade E nquanto movimento de deslocamento populacional inter e intra-regional, a migração é usualmente associada à busca, por indivíduos e famílias, de melhores oportunidades socioeconômicas. Além dos fatores de expulsão identificáveis na região de origem, esta motivação pode ser associada a vários fatores de atração, dentre os quais cabe destacar: - o acesso a bens e serviços de consumo coletivo mais modernos e/ou adequados, o que, no caso brasileiro, tendeu a significar a migração do campo e de pequenas cidades para os grandes centros urbanos. Na década de 80, a direção deste movimento sofreu relativa alteração e as cidades de porte médio adquiriram maior importância como destino dos fluxos migratórios. Em parte, esta mudança pode ser relacionada aos crescentes custos, em termos de qualidade de vida, de residir em grandes metrópoles; 50 anos precedentes. Deve ser destacado que esta reversão pode ser explicada, em grande medida, pela forte evasão populacional observada na capital paulista, que registrou saldo migratório negativo de 756 mil pessoas no período 1980-91. Explicar os determinantes desta reversão de tendência e identificar as possibilidades de sua continuidade nas próximas décadas são tarefas instigantes que permitirão subsidiar o planejamento de múltiplas políticas e ações na região. Uma das formas de tentar compreender os resultados migratórios da década de 80 e pensar suas características no futuro é a análise do comportamento do mercado de trabalho regional, visto que um dos determinantes da intensa migração dos anos 70 foi o extraordinário ritmo de criação de postos de trabalho na RMSP. Trata-se, contudo, de um exercício sujeito a grandes incertezas, devido à instabilidade que ainda caracteriza a economia brasileira, na qual a idéia de longo prazo persiste como uma referência muito abstrata, e às possibilidades de transformações estruturais colocadas pela crescente abertura ao comércio exterior e pelo atual momento tecnológico e produtivo internacional. Consideradas estas questões, o objetivo do presente artigo é estudar a evolução do mercado de trabalho metropolitano no período 1985-95, buscando discutir as características do processo de demanda e de oferta de postos de trabalho e identificar comportamentos que possam ter provocado fragilização do potencial de atração de migrantes pela RMSP. A escolha da segunda metade dos anos 80 como ponto de partida do estudo decorre do fato de a Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED), fonte de informações utilizada no trabalho, ter sido iniciada em outubro de 1984. - a tentativa de obter um posto de trabalho qualitativamente melhor, que viabilize maior renda individual e familiar, propiciando ampliação da cesta de consumo passível de aquisição, e permita a ascensão social, movimento que, no Brasil, tem sido determinado fundamentalmente pela forma de inserção no mercado de trabalho. Considerados estes dois aspectos, a Região Metropolitana de São Paulo (RMSP) foi, até os anos 70, o principal pólo de atração populacional no Brasil. No período 1970-80, por exemplo, o saldo migratório superou dois milhões de pessoas, tornando a migração o principal fator explicativo do crescimento da população na metrópole (Fundação Seade, 1993). Nos anos 80, ao contrário, o saldo migratório tornou-se negativo e a região perdeu 275 mil habitantes entre 1980 e 1991, movimento inédito nos 42 MERCADO DE TRABALHO E MIGRAÇÃO NA GRANDE SÃO PAULO O artigo é subdividido em quatro itens. No primeiro, são descritos os aspectos centrais da evolução do mercado de trabalho da RMSP no período 1985-95, com ênfase na mudança de patamar da taxa de desemprego e na perda de participação do emprego industrial, fenômenos observados na década de 90. No segundo, são analisadas as tendências básicas da evolução das taxas de participação e de ocupação por sexo e faixa etária, visando associar mudanças na possibilidade de obter trabalho verificadas para determinadas parcelas populacionais e seus possíveis efeitos sobre os movimentos migratórios. No terceiro, é estudada a trajetória do nível ocupacional das diversas atividades desenvolvidas na região, de forma a caracterizar a inserção dos indivíduos no contingente de ocupados e identificar as principais alterações ocorridas no período em análise. O último item apresenta a evolução do perfil dos desempregados, buscando enfatizar as transformações ocorridas na primeira metade dos anos 90 e suas conseqüências sobre a situação socioeconômica de indivíduos e famílias. a atratividade da região, que o desempenho do nível ocupacional fosse bastante expressivo. A participação dos ocupados na População em Idade Ativa (PIA) mostra que o intenso dinamismo do emprego na década de 70, quando o nível de ocupação chegou a expandir-se a taxas superiores às de crescimento da população, não se repetiu. Na comparação entre os anos extremos do período em análise, a parcela ocupada da PIA era idêntica (53,0%). Isto indica que a maior demanda por postos de trabalho teve como contrapartida o aumento do desemprego. Assim, a parcela desempregada da PIA cresceu de 7,3%, em 1985, para 8,1%, em 1995, após ter atingido 5,3%, em 1989, e 9,4%, em 1992, melhor e pior ano, respectivamente, quanto ao desempenho desta variável na RMSP. A estimativa do contingente desempregado passou de 777.000 pessoas para 1.085.000 pessoas, nos anos extremos da série. Em termos quantitativos, ocorreu, portanto, uma significativa deterioração das condições do mercado de trabalho na RMSP. O distanciamento entre o crescimento da força de trabalho e o do nível ocupacional, tendo como conseqüência a elevação do desemprego, tenderia a atuar – isolados todos os demais fatores – como um desestímulo ao deslocamento inter-regional em busca de oportunidades de trabalho. Como o perfil ocupacional da região também se alterou, cabe analisar qual o sentido deste movimento. A composição setorial da ocupação sofreu acentuadas mudanças, sinalizando um rompimento da imagem de metrópole industrial, sob o aspecto do emprego. Entre 1985 e 1995, a ocupação na indústria decresceu de 17,4% para 13,2% da PIA. Embora tenha havido ampliação da parcela da PIA ocupada no comércio e nos serviços, 2 estes setores foram incapazes de gerar postos em volume suficiente de modo a evitar que o ajuste no emprego industrial resultasse em maior desemprego. Também aumentou a fragilidade das formas de inserção dos ocupados, tendendo a relativizar também a imagem de predomínio de emprego de maior qualidade na região. As formas regulamentadas de inserção – assalariamento com carteira de trabalho assinada no setor privado e emprego no setor público – perderam participação na PIA, decrescendo de 32,7% para 28,7%, 3 no período 1985-95. Em contraposição, as formas de inserção mais precárias – como o assalariamento sem carteira assinada e o trabalho do autônomo para o público – passaram a representar parcela mais substantiva do conjunto de ocupados na PIA, elevando-se de 8% para 12%, no período. Já a construção civil e o emprego doméstico, usualmente tratados como as principais portas de entrada no A DINÂMICA DO MERCADO DE TRABALHO NO PERÍODO 1985-95 Nos onze anos que compõem o período em análise, ocorreram profundas mudanças no cenário econômico, determinadas por inúmeras tentativas de estabilização da economia, por transformações na forma de relacionamento do país com o setor externo e por ajustes nos padrões produtivos e gerenciais das empresas. No caso da RMSP, os efeitos deste conjunto de movimentos sobre o mercado de trabalho foram promovendo alterações em sua estrutura e dinâmica que, em grande medida, relativizaram características usualmente atribuíveis à região. Ademais, atenuaram as diferenças existentes frente ao restante do país, em especial quanto à potencialidade de criação de postos de trabalho de alta qualidade. O ritmo de ampliação da força de trabalho regional pode ser avaliado através da evolução da taxa de participação global 1 que, entre 1985 e 1995, apresentou pequeno crescimento, passando de 60,3% para 61,1%. Este movimento foi determinado pelo aumento da participação feminina no mercado de trabalho (de 44,7% para 48,8%), pois houve diminuição desta taxa entre a população masculina (de 77,1% para 74,6%). A elevação da taxa de participação das mulheres, observada também em outras regiões do país, neutralizou, em parte, os efeitos do menor ritmo do movimento migratório e do crescimento vegetativo da população regional. Como a demanda por postos de trabalho permaneceu em trajetória ascendente, seria necessário, para se manter 43 SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, 10(2) 1996 mercado de trabalho para o migrante recém-chegado, perderam progressivamente participação entre os ocupados na PIA. Na construção civil, a queda foi de 3,3%, em 1985, para 2,7%, em 1995, e nos serviços domésticos, de 8,2% para 7,7%, no mesmo período. Estes movimentos não ocorreram, no entanto, de forma contínua ou linear, visto que um dos traços mais característicos do período 1985-95 foi a grande instabilidade das condições de funcionamento do mercado de trabalho. Podem ser identificadas duas fases distintas, tomando como marco divisório a política de abertura comercial e de estabilização implementadas em 1990, cuja combinação resultou em um processo de forte recessão e em transformações na forma de organização da produção, com reflexos importantes sobre o nível e a composição do emprego, principalmente no setor industrial. O Período 1990-95 A primeira metade dos anos 90 foi marcada por variações acentuadas na taxa de participação global, que decresceu em 1990, atingindo 60,2%, ampliou-se no biênio 1991-92 e voltou a diminuir nos anos seguintes, alcançando 61,1%, em 1995. Neste período, ocorreu contínua redução da taxa de participação masculina, que passou de 76,4% para 74,5%, entre 1990 e 1995, enquanto a feminina manteve-se em ascensão, evoluindo de 45,2% para 48,8%, em 1995. Como decorrência do comportamento adverso da ocupação, a parcela de ocupados na PIA manteve-se, em todos os anos, inferior ao percentual registrado em 1989, alcançando os mais baixos patamares de todo o período analisado. Por esta razão, o contingente de desempregados permaneceu, em todos os anos, acima de um milhão de pessoas. A parcela em desemprego na PIA cresceu dos 5,3%, em 1989, para 9,4%, em 1992, apresentando leve tendência de decréscimo nos anos finais do período e alcançando 8,1%, em 1995. As principais variáveis relativas a este subperíodo mostram que houve uma redução do espaço ocupacional na região, não revertida a despeito da recuperação da economia, a partir de 1993. Mesmo tendo ocorrido uma diminuição relativa da taxa de participação global, equivalendo a menor de demanda por postos de trabalho, a permanência da taxa de desemprego em elevados patamares indica que o ritmo de criação de postos de trabalho tem sido insuficiente para propiciar o retorno às condições anteriores à crise, situação relativamente inédita na RMSP. Além desta deterioração quantitativa, ocorreu também uma fragilização das condições ocupacionais neste subperíodo, cujo desempenho foi determinante para a alteração da estrutura de emprego regional. Nestes anos, houve redução em termos relativos e absolutos do nível de ocupação industrial, não compensada pela criação de postos no comércio e em serviços. Foi também nesta primeira metade dos anos 90 que ocorreu o mencionado declínio das formas regulamentadas de inserção ocupacional, com a contrapartida do aumento da participação de postos de trabalho precários na estrutura ocupacional. Na medida em que estes movimentos estão associados a mudanças na configuração da economia, em resposta ao novo padrão competitivo e de preços, este cenário geral coloca em questão a possibilidade de o mercado de trabalho da RMSP continuar exercendo atração sobre as correntes migratórias. Em especial, se considerada a possibilidade de as atividades industriais e de vários ramos de serviços virem a sofrer transformações mais intensas em seus processos de trabalho, voltando a excluir mão-de-obra. O Período 1985-89 Entre 1985 e 1989, a taxa de participação global elevou-se de 60,3% para 61,1%, devido à ampliação das taxas de participação feminina – de 44,7% para 46,1% – e masculina – 77,1% para 77,3%. A despeito do crescimento da força de trabalho, foi criado um número de postos suficiente para permitir o aumento da parcela de ocupados na PIA, que passou de 53,0% para 55,8%, no período. Como conseqüência deste bom desempenho do emprego, a participação dos desempregados na PIA decresceu de 7,3%, em 1985, para 5,3%, em 1989, o mais baixo patamar para todo o período analisado. Em números absolutos, isto significou a diminuição do contingente em desemprego de 777.000 para 614.000 pessoas. Neste período teria ocorrido, portanto, um saldo positivo do processo de geração de postos de trabalho na região, em especial se considerada a ampliação da demanda por trabalho, expressa no aumento da taxa de participação. Ademais, a Indústria manteve sua participação no total de postos de trabalho existentes, criando 291.000 novos postos, entre 1985 e 1989. As formas regulamentadas de inserção no mercado também adquiriram maior expressão na estrutura ocupacional, com um aumento de 61,8%, em 1985, para 62,8%, em 1989, da parcela de ocupados com acesso aos direitos definidos pela legislação trabalhista. Apesar da instabilidade monetário-financeira e econômica do período, não houve um processo de precarização do mercado de trabalho regional, que foi capaz de incorporar a crescente oferta de força de trabalho sem ampliação do desemprego ou de formas mais frágeis de inserção. O ajuste incidiu, fundamentalmente, sobre o nível e a distribuição dos rendimentos do trabalho, cuja deterioração foi acelerada neste período. 44 MERCADO DE TRABALHO E MIGRAÇÃO NA GRANDE SÃO PAULO patíveis com determinadas faixas etárias, seja por características físicas ou por habilidades atribuídas pelo senso comum a determinado gênero e/ou faixa etária; - mudanças na probabilidade de conseguir um posto de trabalho, dependendo de quais segmentos populacionais tenham suas chances de obter ocupação alteradas, afetam de forma distinta o processo de migração. Assim, por exemplo, a redução da possibilidade de adolescentes obterem emprego não deve ter impacto tão expressivo sobre a decisão familiar de migrar quanto a diminuição do espaço ocupacional para homens de 25 a 30 anos. Como o comportamento das taxas de participação específicas, entre 1985 e 1995, foi bastante diferenciado por gênero, o indicador de taxa de ocupação utilizado na análise equivale à relação4 A EVOLUÇÃO DAS TAXAS DE PARTICIPAÇÃO E DE OCUPAÇÃO Embora no nível agregado a configuração do mercado de trabalho da RMSP mostre-se, no presente, adversa, é possível que, para segmentos específicos da população ativa, existam mais oportunidades ocupacionais que as vislumbradas para o conjunto. Como as decisões de deslocamento são tomadas por indivíduos ou unidades familiares, considerada a potencialidade específica de obter um posto de trabalho de maior qualidade, que está determinada por fatores de mercado e por atributos pessoais, faz-se necessário analisar o impacto dos movimentos antes descritos sobre parcelas específicas da população. Um recorte que pode oferecer informações mais precisas sobre a alteração das oportunidades ocupacionais na RMSP pode ser a desagregação das taxas de participação e de ocupação por sexo e faixa etária, de modo a se identificar tendências de longo prazo e alterações associáveis aos movimentos conjunturais. A opção por centrar a análise nestes atributos está assentada em três supostos: - a inserção na força de trabalho tem importância diferenciada para os segmentos populacionais, pois, para alguns, o retorno à inatividade pode ser a alternativa à perda da ocupação. Desta forma, haveria segmentos para os quais a importância do fluxo inatividade-ocupação-inatividade é maior, enquanto, para outros, predominariam fluxos desemprego-ocupação-desemprego; ocupadosgênero i, faixa etária j população em idade ativa gênero i, faixa etária j que permite: - avaliar em que medida o aumento da taxa de participação de segmentos específicos tem resultado em ampliação da parcela ocupada ou daquela em desemprego, ou seja, se a crescente população economicamente ativa de determinada parcela populacional tem encontrado maiores oportunidades ocupacionais. Isto é possível porque a diferença entre a taxa de participação e a taxa de ocupação assim calculada equivale à proporção do segmento em idade ativa que se encontra desempregada e, portanto, o distanciamento entre os dois indicadores corresponde ao crescimento da taxa de desemprego específica; - a possibilidade de obtenção de um posto de trabalho é variável segundo sexo e faixa etária, seja por demandas mínimas de formação educacional e profissional incom- TABELA 1 Evolução das Taxas de Participação e de Ocupação, por Gênero Região Metropolitana de São Paulo – 1985-95 Em porcentagem Gênero 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 Total Taxa de Participação Taxa de Ocupação Taxa de Desemprego 60,3 53,0 6,7 61,9 55,9 6,0 61,7 56,0 5,7 61,4 55,5 5,9 61,1 55,8 5,3 60,2 54,0 6,2 61,3 54,1 7,2 61,5 52,1 9,4 61,4 52,5 8,9 60,7 52,1 8,6 61,1 53,0 8,1 Homens Taxa de Participação Taxa de Ocupação Taxa de Desemprego 77,1 69,3 7,8 78,5 72,5 6,0 78,4 72,7 5,7 77,8 71,5 6,3 77,3 71,5 5,8 76,3 69,4 6,9 76,2 68,0 8,2 75,7 65,2 10,5 75,3 65,2 10,1 74,7 65,3 9,4 74,5 65,7 8,8 Mulheres Taxa de Participação Taxa de Ocupação Taxa de Desemprego 44,7 37,8 6,9 46,6 40,6 6,0 45,9 40,3 5,6 46,2 40,6 5,6 46,1 41,2 4,9 45,4 39,9 5,5 47,7 41,5 6,2 48,4 40,1 8,3 48,8 40,9 7,9 47,9 40,1 7,8 48,8 41,4 7,4 Fonte: SEP. Convênio Seade — Dieese. 45 SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, 10(2) 1996 - verificar em que medida as evoluções diferenciadas das taxas de participação masculina e feminina, quando desagregadas por faixas etárias, estão relacionadas a alterações na taxa de ocupação específica ou se podem ser explicadas como tendências de mais longo prazo, que apresentam relativa independência da evolução desta variável. Em outras palavras, se as variações nas taxas de participação respondem às oportunidades ocupacionais existentes ou são resultado de tendências estruturais. GRÁFICO 1 Evolução das Taxas de Participação e de Ocupação da População em Idade Ativa Região Metropolitana de São Paulo — 1985-95 Em % Para exemplificar o significado deste indicador, podese analisar a evolução das taxas de participação e de ocupação para o conjunto da PIA da RMSP no período 198595 (Tabela 1 e Gráfico 1). Como já comentado, houve um pequeno aumento da participação global entre os anos extremos, tendo sido registrada, em 1990, a mais baixa participação de toda a série. Embora idêntica nos extremos do período, a taxa de ocupação apresentou comportamento bastante diverso. Após ter aumentado em 1986, permaneceu relativamente estável até 1989, sofrendo uma primeira redução em 1990 e novo e mais intenso decréscimo em 1992. Somente em 1995 registraram-se sinais de recuperação do espaço ocupacional na região. O resultado destes movimentos distintos foi a ampliação da diferença entre os dois indicadores (ou da distância entre as curvas, no caso do gráfico), indicando um crescente desemprego na região, como já analisado. Em outras palavras, a crescente população disponível para o trabalho não encontrou oportunidades ocupacionais em volume e ritmo necessários à sua demanda. Anos Fonte: SEP. Convênio Seade – Dieese. GRÁFICO 2 Evolução das Taxas de Participação e de Ocupação da População Masculina em Idade Ativa Região Metropolitana de São Paulo — 1985-95 Em % Anos Evolução das Taxas de Participação e de Ocupação por Gênero Fonte: SEP. Convênio Seade – Dieese. No caso da população masculina em idade ativa, verifica-se que, após relativa estabilidade entre 1986 e 1989, a taxa de ocupação decresceu intensamente até 1992, experimentando uma pequena recuperação, a partir de 1993 (Tabela 1, Gráfico 2). Isto indica que parte substancial do ajuste do nível ocupacional na RMSP, ocorrido nos primeiros anos da década de 90, recaiu sobre este segmento populacional, o que pode ser explicado pelo fato de a indústria, que emprega majoritariamente homens, ter sido a responsável pelo maior volume de demissões. Frente à intensidade do declínio das oportunidades ocupacionais para os homens, nem mesmo a contínua redução de sua taxa de participação, indicativa de sua saída do mercado de trabalho, foi suficiente para impedir acentuado e rápido aumento de sua taxa de desemprego. Assim, a parcela de homens em idade ativa desempregados, que oscilou em torno de 6% no período 1985-89, saltou GRÁFICO 3 Evolução das Taxas de Participação e de Ocupação da População Feminina em Idade Ativa Região Metropolitana de São Paulo — 1985-95 Em % Anos Fonte: SEP. Convênio Seade – Dieese. 46 MERCADO DE TRABALHO E MIGRAÇÃO NA GRANDE SÃO PAULO para 6,9%, em 1991, passando a variar, nos anos seguintes, entre 8% e 10%. Em termos relativos, não parece ter-se ampliado, no período 1985-95, a disponibilidade de postos de trabalho para as mulheres. Sua taxa de ocupação oscilou entre 40% e 41% em todos os anos, excetuando 1985, quando estava no mais baixo patamar (Tabela 1). Com esta relativa estabilidade de sua taxa de ocupação, as variações na parcela de mulheres em idade ativa desempregadas foram determinadas, nos anos em questão, basicamente pelas mudanças no patamar de sua taxa de participação, ou seja, no tamanho da oferta de mãode-obra feminina. Esta variou em torno de 46% no período 1986-89 e, após pequeno declínio em 1990, cresceu de forma mais intensa nos anos seguintes. A parcela em desemprego apresentou evolução muito semelhante e, como pode ser visto no Gráfico 3, o aumento da distância entre as duas curvas deveu-se à tendência da taxa de participação. Assim, do ponto de vista quantitativo, a experiência de homens e mulheres no mercado de trabalho da RMSP tem sido bastante diversa, em especial no período mais recente, a partir de 1990. Ainda que para os dois segmentos tenha havido ampliação da parcela em idade ativa desempregada, os determinantes foram distintos; no caso dos homens, isto se explica pela menor disponibilidade de postos de trabalho e, no das mulheres, pela maior oferta de mão-de-obra. Além de diferentes do período final da década de 80, estes movimentos têm importantes implicações quanto à capacidade do mercado de trabalho regional de atrair migrantes, principalmente dependendo de quais faixas etárias da população masculina tenham sido mais afetadas pela retração do espaço ocupacional. anos; a taxa para os homens de 50 anos e mais não sofreu redução tão brusca a partir de 1990, ainda que também tenha apresentado ligeira diminuição a partir daquele ano; - para as mulheres, a tendência ascendente da taxa de participação, descrita para o conjunto da população, foi registrada para todas aquelas com 25 anos e mais, com menor intensidade para aquelas acima de 50 anos (Tabela 2). Para as crianças e adolescentes, houve declínio da participação e para as jovens de 18 a 24 anos, após mudança para um patamar mais elevado em 1991, a taxa de participação apresentou leve tendência de declínio. Quanto à taxa de ocupação, repetiu-se, para as mulheres de 10 a 24 anos, o movimento descrito para a população masculina, enquanto, para as demais, a tendência foi de ampliação desta taxa, ainda que em ritmo inferior ao do aumento da participação, com a conseqüente elevação do desemprego. Parecem existir, portanto, comportamentos das taxas de participação e de ocupação para determinadas faixas etárias que se reproduzem nas populações masculina e feminina. Assim, tomando-se a variável faixa etária como referência, destacam-se as seguintes características da trajetória das taxas de participação e de ocupação ao longo do período 1985-95 (Tabela 2): - entre as crianças e adolescentes de 10 a 17 anos, o declínio simultâneo das taxas de participação e de ocupação pode ser observado para homens e mulheres. Apesar do retorno à inatividade, ocorreu também aumento do desemprego (medido pela diferença entre os dois indicadores) para esta parcela da população, em maior proporção entre os homens. A diminuição das oportunidades ocupacionais para os indivíduos desta faixa etária, independente do gênero, parece ser, portanto, o traço básico da evolução no período em análise; - para os jovens de 18 a 24 anos, o comportamento da taxa de ocupação apresenta, por gênero, mais semelhanças que o da taxa de participação. Quanto à primeira, permaneceu relativamente estável, para os homens, até 1989 e, para as mulheres, até 1991, apresentando queda substantiva em 1992 para ambos e estabilidade em novo patamar, mais baixo que o anterior, nos anos seguintes. Quanto à taxa de participação, ao contrário dos homens, para os quais a tendência de redução é contínua, entre as mulheres houve diminuição em 1987, nova elevação em 1991 e, a partir de então, declínio suave. A despeito destas diferenças, como marca do período, haveria também uma dificuldade crescente para indivíduos desta faixa etária de obter um posto de trabalho, expressa no aumento da parcela em desemprego nas duas populações; - as populações de 25 a 30 anos e de 31 a 39 anos registram movimentos semelhantes para as taxas de participa- Evolução das Taxas de Participação e de Ocupação por Gênero e Faixa Etária Ao combinar os atributos gênero e faixa etária, tornase possível identificar se os movimentos observados para o conjunto das populações masculina e feminina são comuns a todas as idades ou se existem comportamentos para determinados segmentos etários que independam do gênero. Assumindo, em um primeiro momento, a variável gênero como referência, observam-se os seguintes traços na evolução das taxas de participação e de ocupação por faixa etária: - o declínio da taxa de participação global dos homens foi determinado pelo decréscimo registrado para todos aqueles que têm de 10 a 39 anos (Tabela 2). Somente para os homens com mais de 40 anos não houve decréscimo. Quanto à taxa de ocupação, o comportamento observado para o total da população masculina é reproduzido, com diferenças muito pequenas, para todos os homens com até 49 47 SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, 10(2) 1996 TABELA 2 Evolução das Taxas de Participação e de Ocupação, segundo Gênero e Faixa Etária Região Metropolitana de São Paulo – 1985-95 Em porcentagem Gênero e Faixa Etária 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 Homens 10 a 17 Anos Taxa de Participação Taxa de Ocupação 39,0 26,5 42,4 30,9 39,9 31,1 38,7 28,8 38,5 29,8 35,7 26,4 34,7 25,4 34,4 21,9 33,1 20,7 30,7 19,4 31,7 21,7 18 a 24 Anos Taxa de Participação Taxa de Ocupação 93,4 80,5 93,7 84,5 93,2 83,1 93,0 82,7 92,6 83,0 91,3 79,2 91,2 78,0 91,2 73,8 90,4 73,4 90,2 73,7 88,7 73,5 25 a 30 Anos Taxa de Participação Taxa de Ocupação 97,1 89,9 97,1 92,4 96,8 91,3 96,7 90,2 96,3 90,8 96,3 88,9 95,6 86,5 95,8 84,5 95,7 84,9 95,6 85,6 94,8 84,8 31 a 39 Anos Taxa de Participação Taxa de Ocupação 96,8 91,8 96,6 93,1 97,0 93,4 96,5 92 96,4 91,9 96,2 90,6 96,1 88,6 95,8 86,2 96,0 87,1 95,9 87,5 95,3 88,0 40 a 49 Anos Taxa de Participação Taxa de Ocupação 91,0 86,4 92,3 89,6 92,3 89,5 92,7 89,5 92,6 89,2 92,9 88,8 93,5 87,1 93,1 85 93,0 85,7 92,7 85,9 93,6 87,1 50 Anos e Mais Taxa de Participação Taxa de Ocupação 52,7 50,1 55,7 53,6 57,0 55,3 57,1 55,4 57,0 55,3 55,7 53,5 57,6 54,4 56,6 52,7 56,4 52,9 57,1 53,8 56,4 53,1 Mulheres 10 a 17 Anos Taxa de Participação Taxa de Ocupação 26,4 17,5 28,5 19,3 26,7 19,2 26,8 18,5 26,3 18,9 23,6 16,3 24,1 16,6 23,7 13,7 23,8 13,9 22,5 12,9 23,0 13,8 18 a 24 Anos Taxa de Participação Taxa de Ocupação 69,0 56,0 70,3 59,2 67,5 57,0 67,3 57,0 67,8 58,4 67,5 56,8 69,9 57,5 70,1 54,0 69,8 54,6 69,3 53,7 68,7 54,0 25 a 30 Anos Taxa de Participação Taxa de Ocupação 57,5 49,6 59,2 53,1 58,3 51,9 58,9 52,9 59,7 54,3 58,9 52,3 63,0 55,7 65,3 55,4 67,1 57,3 66,4 56,6 67,2 58,7 31 a 39 Anos Taxa de Participação Taxa de Ocupação 54,4 48,5 56,0 51,6 55,7 51,2 57,1 52,4 56,9 52,9 57,3 53,0 61,6 56,0 62,6 55,0 63,6 56,0 63,0 55,6 65,0 58,1 40 a 49 Anos Taxa de Participação Taxa de Ocupação 45,4 41,7 47,9 45,0 50,1 46,9 51,6 48,8 50,9 48,6 51,3 48,2 55,0 51,3 56,1 50,9 57,3 52,5 55,8 51,5 59,0 54,2 50 Anos e Mais Taxa de Participação Taxa de Ocupação 17,6 16,6 20,4 19,4 21,6 20,7 20,9 20,1 21,2 20,6 21,0 20,2 21,8 20,7 22,6 21,1 22,7 21,3 22,3 20,9 22,2 20,8 Fonte: SEP. Convênio Seade – Dieese. 48 MERCADO DE TRABALHO E MIGRAÇÃO NA GRANDE SÃO PAULO peito da diminuição da parcela disponível para o trabalho, conformou-se uma tendência de aumento do desemprego para este segmento, independente do gênero. Isto parece indicar que, em um momento de menor dinamismo do nível de emprego, esta parcela populacional, possivelmente pela falta e/ou pequena experiência profissional, tem sido preterida nas contratações, mesmo apresentando, em média, nível de instrução mais elevado que o do total da população ativa.5 Na análise da relação entre emprego e migração, este movimento tem importantes implicações, em especial por gerar um cenário desfavorável à obtenção de emprego para uma parcela da população que, pelos vínculos relativamente mais tênues com suas regiões de origem, tenderia mais à migração motivada por mobilidade ocupacional ascendente. A segunda questão está relacionada ao crescimento do desemprego entre a população masculina de 25 a 39 anos, a despeito da redução, no período, de sua taxa de participação. Diretamente relacionada ao desempenho desfavorável do nível de emprego na indústria e na construção civil, esta retração do espaço ocupacional para os indivíduos que constituem a chamada força de trabalho primária sinaliza uma mudança no perfil de mão-de-obra regional. Este processo produz forte impacto sobre a situação socioeconômica das famílias, principalmente se se considerar que, na região, cerca de 40% dos domicílios são chefiados por homens nesta faixa etária (Fundação Seade, 1992). Como a estrutura familiar no país ainda tende a centrar-se no chefe, basicamente do sexo masculino, terse-ia, também sob este aspecto, um fator de desestímulo à mobilização das famílias para a RMSP. A terceira questão relaciona-se à população feminina, para a qual se verificou uma tendência de aumento da participação no mercado de trabalho. Ao desagregar este movimento por faixa etária, pode-se perceber que, exceto para as mulheres de 50 anos e mais, ele não pode ser tomado como resposta ao surgimento de oportunidades ocupacionais, fator tradicionalmente utilizado como explicação para as oscilações da participação feminina simultaneamente às variações do nível de emprego. Embora venha assumindo, na RMSP, um caráter estrutural, a elevação da taxa de participação das mulheres no mercado de trabalho não tem sido acompanhada, em termos relativos, por maior disponibilidade de postos de trabalho, como demonstra a estabilidade de sua taxa de ocupação. Esta ausência de resposta do mercado a uma demanda crescente por emprego pode também atuar como desestímulo ao movimento migratório, visto que o trabalho das chefes de família, cônjuges e filhas tem se tornado fonte imprescindível de rendimento familiar. ção e de ocupação, mas que se distinguem por gênero. Para a população masculina nestas faixas etárias, houve leve mas contínua tendência de declínio da taxa de participação, enquanto para as mulheres, o movimento foi de ampliação da parcela economicamente ativa, adquirindo maior intensidade a partir de 1990. Quanto à taxa de ocupação dos homens de 25 a 39 anos, houve intenso declínio, no triênio 1990-92, e recuperação a partir de 1993. No caso das mulheres de 25 a 39 anos, o aumento da taxa de ocupação persistiu ao longo de todo o período 198595, excetuando pequena queda, em 1990, entre as mulheres de 25 a 30 anos. Desta forma, o aumento do desemprego para indivíduos destas duas faixas etárias, observado na comparação entre os anos extremos da série, teve determinantes bastantes distintos por gênero; no caso dos homens, explica-se pela redução da parcela que conseguiu obter ocupação e, no das mulheres, pela ampliação da oferta de força de trabalho; - para a faixa etária de 40 a 49 anos, ocorreu ampliação da taxa de participação entre as populações masculina e feminina, mais expressiva entre as mulheres (de 41,7%, em 1985, para 54,2%, em 1995). A evolução das taxas de ocupação por gênero apresenta, contudo, grandes diferenças; entre os homens, verifica-se relativa estabilidade até 1990, queda intensa no biênio 1991-92 e tendência de recuperação nos anos seguintes; entre as mulheres, o movimento foi de contínua elevação. Como conseqüência, o aumento da parcela de homens de 40 a 49 anos em desemprego foi muito mais intenso que entre as mulheres, apesar da ampliação da oferta de mão-de-obra feminina nesta faixa etária; - para os indivíduos de 50 anos e mais, o comportamento das duas taxas apresenta mais oscilações que para as demais faixas etárias. No caso dos homens, a taxa de participação, após elevar-se em 1986, passou a oscilar em torno de 57% e a taxa de ocupação, depois do crescimento no período 1985-87, manteve-se estável até 1989, decresceu em 1990, passando a variar em torno de 53% a partir de então. No caso das mulheres, chama a atenção a semelhança quanto ao comportamento – ligeira tendência de crescimento – e à magnitude entre as taxas de participação e de ocupação, parecendo demonstrar que sua inserção no mercado de trabalho supõe basicamente o fluxo entre inatividade e ocupação, ou seja, que sua entrada na força de trabalho ocorre se existir oportunidade de trabalho adequada à sua qualificação. Há três grandes questões que emergem da descrição anterior. A primeira refere-se à menor disponibilidade de postos de trabalho para os jovens de 18 a 24 anos. A des- 49 SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, 10(2) 1996 sua importância para o conjunto da região não tenha se alterado substancialmente (passou de 0,9% para 1,1% da PIA, entre 1985-95). Do ponto de vista quantitativo, a redução mais expressiva de postos de trabalho ocorreu na cadeia metal-mecânica, cuja participação na PIA declinou de 7,7% para 5,3% no período em análise, movimento de retração que afetou principalmente homens de 25 a 39 anos, segmento populacional predominante entre os ocupados do setor. Ainda que devam ser consideradas a redução das atividades eletroeletrônicas e as especificidades das empresas produtoras de máquinas da região, o principal elemento explicativo do desempenho da cadeia encontra-se nas mudanças em curso nas montadoras de veículos e nas indústrias de autopeças. Também neste caso, a retomada do volume de produção sem o correspondente crescimento do emprego parece sinalizar que não deve ocorrer ampliação do número de postos de trabalho nestas indústrias. Além disso, frente às tendências internacionais, os postos remanescentes tendem a passar por importantes transformações, principalmente no que diz respeito à ampliação de responsabilidades individuais e das equipes de trabalho, diminuição do retrabalho das peças, supressão de níveis hierárquicos intermediários e redefinição do tipo de contato intra-hierarquia, demandando mão-de-obra com perfil distinto dos momentos anteriores. A ampliação dos cursos de alfabetização e a maior utilização dos cursos modulares oferecidos pelo Senai são indicativos das mudanças no tipo de qualificação dos ocupados nestes postos de trabalho. A eliminação de postos de trabalho na indústria tem importante papel no movimento de diminuição do assalariamento na RMSP. Em 1985, 52% dos ocupados eram assalariados com carteira de trabalho assinada no segmento privado, decrescendo para cerca de 45% em 1995. Na indústria, onde o assalariamento sempre foi predominante, já em 1995 havia decrescido para 75% o percentual de seus ocupados que tinham esta forma de inserção, provocando uma forte queda dos rendimentos médios do setor e do conjunto da região. O aumento das ocupações nos serviços e no comércio, cuja participação no conjunto da PIA cresceu de 22% e 8% para 25% e 9%, respectivamente, no período em análise, deve ser visto com atenção, pois a compensação relativa encobre importantes diferenças quanto ao tipo de inserção, mão-de-obra contratada e rendimentos pagos. Para efeito de análise, os ramos de serviços podem ser agrupados segundo a finalidade principal de suas atividades (Fundação Seade/Dieese, 1991), isto é, prestação de serviços a outras empresas produtivas (serviços ligados à produção), a indivíduos e famílias (serviços ligados ao consumo) e ao conjunto da população (serviços CARACTERÍSTICAS DO PROCESSO DE GERAÇÃO DE OCUPAÇÕES O objetivo deste item é identificar as principais alterações ocorridas no dinamismo setorial da criação de postos de trabalho da RMSP, indicando assim as possibilidades de inserção dos indivíduos que buscam atuar neste mercado de trabalho. Um primeiro aspecto, já mencionado, diz respeito à menor intensidade de geração de postos na região, na primeira metade dos anos 90. No período 1986-89, apesar das oscilações provocadas pelas diversas tentativas de implementar planos de estabilização, a taxa de ocupação variou em torno de 56% da população em idade ativa, declinando para 54%, no biênio 1990-91, e para pouco mais de 52%, no biênio subseqüente. Entre 1994 e 1995, período marcado pelo crescimento do nível de produção, a taxa de ocupação teve um crescimento relativamente restrito, atingindo, no final do período, 53% da PIA, mesma taxa observada em 1985. A fragilidade deste desempenho obedeceu a dois determinantes. De um lado, está associado às medidas restritivas ao crescimento das atividades econômicas, impostas pela política macroeconômica voltada a garantir a estabilidade dos preços.6 De outro, resulta do tipo de ajuste realizado por alguns ramos de atividade durante a crise dos anos 90, dentre os quais se destacam os setores automotivo e bancário. A racionalização das atividades nas empresas destes ramos não apenas eliminou um número expressivo de postos de trabalho, como permitiu que estas ampliassem a produção de bens e serviços com uma demanda menor de mão-de-obra em comparação com a década passada. Ainda que esta tendência possa ser entendida como específica de algumas empresas mais expostas à concorrência externa ou de atividades que vêm passando por importantes mudanças técnicas e institucionais, os resultados são sugestivos do crescente descolamento entre a capacidade de geração de produto e de ampliação de empregos estáveis e bem remunerados. A combinação destes dois determinantes pode ser avaliada mediante a comparação entre as estruturas ocupacionais de 1985 e 1995, anos em que se observou a mesma taxa de ocupação (53%). A diminuição do emprego industrial foi notável; sua participação relativa diminuiu de 33%, em 1985, para 25%, em 1995. Esta perda de participação relativa correspondeu a uma redução do contingente de ocupados, entre estes anos, de cerca de 72.000 postos de trabalho. Este desempenho setorial desfavorável também se verifica na maior parte dos ramos que o compõem, sendo a indústria gráfica e papeleira a principal exceção, ainda que 50 MERCADO DE TRABALHO E MIGRAÇÃO NA GRANDE SÃO PAULO para a coletividade). Considerando esta desagregação, embora se verifique aumento da ocupação em todos os segmentos, este foi menor no último, onde se concentram os serviços públicos. A ampliação do número de postos de trabalho nos serviços de educação e de saúde (de 3% para 4% da PIA), nos quais predominam mulheres, mais que contrabalançou a redução da participação do emprego nas atividades de administração, segurança e utilidade pública (de 2,7% para 2,4%), nas quais os homens são majoritários. A redução da participação deste último ramo resulta da deterioração da situação financeira do estado e a reposição destes postos contrasta não apenas com a redefinição das funções das diferentes esferas do setor público, mas também com as necessidades crescentes de informatização em muitas destas atividades. Além da tendência apontada, deve-se considerar ainda o impacto representado pela diminuição do número de postos que exigiam concurso público e que, mesmo para cargos com baixos rendimentos, permitiam a estabilidade no trabalho, ao contrário da maior parte dos postos similares no segmento privado. O aumento das ocupações nos serviços ligados à produção encobre importante declínio do nível ocupacional do setor bancário, mais que compensadas pela ampliação ocorridas nos serviços especializados, auxiliares e de transportes. A reestruturação das atividades bancárias – pela automação crescente de suas atividades, pela fusão de empresas regionais e pelo rearranjo administrativo permitido pela unificação das carteiras em bancos múltiplos – tem como reflexo o decréscimo da participação dos ocupados nestas atividades na região de 2,7% para 1,7% da PIA, apesar da ampliação do número de agências e serviços oferecidos aos clientes ao longo do período. Adicionalmente, vale notar que a redução de postos nestes ramos atingiu de forma mais intensa os homens que as mulheres, destacando-se também a diminuição da participação de jovens ocupados em atividades bancárias. O aumento de 2% para 3% da PIA da participação dos postos de trabalho nos serviços especializados, que agrupam atividades de informática, assessorias e consultorias técnicas e administrativas, propaganda, pesquisa de mercado e outros serviços predominantemente direcionados às empresas produtivas, caracteriza as necessidades da malha produtiva da região e, em parte, os processos de terceirização. No entanto, por envolverem maior grau de escolaridade e aquisição de aptidões técnicas mais amplas, em geral demandam maior experiência anterior de trabalho, o que explica a tendência de os ocupados encontrarem-se em faixas etárias mais elevadas. Nos serviços destinados a indivíduos e famílias, destaca-se a expansão de ocupações em que predominam jovens de 18 a 24 anos. No entanto, estas atividades en- contram-se entre as que apresentam os menores rendimentos médios da RMSP, além de predominar o assalariamento sem carteira assinada e jornadas de trabalho mais extensas, como é o casos dos serviços de alimentação (cuja participação cresceu de 2% para cerca de 3% da PIA, entre 1985 e 1995). No comércio, o crescimento do contingente de ocupados de 7,5% para 9% da PIA, no período em análise, ocorreu com a ampliação do número de ocupados com idade superior a 31 anos e diminuição na participação daqueles em faixas etárias mais jovens. Contudo, as oportunidades para indivíduos com menor grau de qualificação, representadas, por exemplo, pelo emprego na construção civil e nos serviços domésticos, também diminuíram, pois ambos os segmentos apresentaram declínio em sua participação na PIA da RMSP. Além destas características da situação ocupacional, há outros elementos que também devem ser considerados ao se avaliar o quadro com que se defrontam aqueles que buscam inserção no mercado de trabalho na região. A elevação contínua do nível de escolaridade entre os ocupados – cerca de 52% haviam concluído pelo menos a 8a série do 1o grau e cerca de 33% haviam completado o 2o grau, em 1995 – é um aspecto importante. Embora esta situação reflita, em parte, maior nível de escolaridade para o conjunto da população, está associada também à busca de trabalhadores com capacidade crescente de intervir em situações relativamente novas e que precisam de solução imediata, para atender a uma clientela cada vez mais exigente. Neste sentido, talvez possa ser encontrada uma explicação para um dos aspectos mais intrigantes das mudanças na estrutura ocupacional ao longo do período em análise. Entre o conjunto dos ocupados, verifica-se uma tendência à menor participação relativa dos estratos mais jovens (menos de 30 anos), que declinou de 52% para pouco menos de 45%, entre 1985 e 1995. Se esta situação pode estar associada, em parte, ao envelhecimento da população, em alguma medida decorre do tipo e dos requisitos dos novos postos de trabalho na região. Entre os jovens nas faixas etárias de 18 a 24 e 25 a 30 anos, houve decréscimo da participação no conjunto de postos na indústria e nos serviços ligados à produção, que não foram compensados pelo aumento de sua participação no comércio, nos serviços ligados ao consumo e na construção civil. Para aqueles com idade mais elevada, verificou-se ampliação da participação nos serviços e no comércio. Este quadro sugere, portanto, que o mercado de trabalho regional não tem sido capaz de criar postos de trabalho no volume e no ritmo demandados pela população ativa disponível para o trabalho. Os ramos dinâmicos ou 51 SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, 10(2) 1996 contra 60% no período anterior, principalmente pelo aumento da proporção de pessoas com 40 anos e mais (10% para 15%) nesta condição. Considerado o grau de instrução dos desempregados, observa-se que, embora 53% ainda não possuíssem o 1o grau completo, sua participação decrescera em 12 pontos percentuais em relação a 1985. Ampliou-se, neste período, principalmente, o percentual de pessoas com o 2o grau completo (de 14% para 23%). Nesta primeira metade dos anos 90, a permanência da taxa de desemprego em patamar elevado e a longa duração média em desemprego na RMSP mostram que as dificuldades para reinserção são expressivas. Além disto, este problema não tem se limitado a segmentos com baixa qualificação ou sem experiência, atingindo principalmente pessoas que já tiveram trabalho assalariado e crescentemente aquelas com nível relativamente elevado de instrução. Estas características parecem configurar o desemprego como decorrência de alterações no modo de funcionamento do mercado de trabalho regional, não cabendo atribuí-lo a uma inadequação entre os atributos da força de trabalho e os requisitos demandados pelas empresas. mais estruturados, por determinantes conjunturais ou por mudanças na forma de organização de seus processos produtivos e/ou gerenciais, vêm contribuindo cada vez menos para o aumento do emprego na região. Ademais, as alterações na composição do contingente de ocupados têm sinalizado crescente dificuldade para a inserção de alguns segmentos, em especial os jovens. Combinados ao crescimento do desemprego no início dos anos 90, estes movimentos tendem a desestimular a migração para a região em busca de oportunidades ocupacionais mais adequadas. O DESEMPREGO CRESCENTE E O PERFIL DOS DESEMPREGADOS O conjunto de desempregados na RMSP equivalia, em 1989, a 614.000 pessoas, que despendiam, em média, 15 semanas para obter uma nova ocupação. Durante o período 1992-95, este contingente permaneceu superior a um milhão de pessoas, oscilando entre 13% e 16% da PEA.7 Entre suas principais características, destacam-se a elevada proporção (85%) dos que possuíam experiência de trabalho anterior – dos quais aproximadamente dois terços eram assalariados no último emprego – e o fato de cerca de 63% terem sido demitidos. O tempo médio utilizado na procura por um novo trabalho cresceu progressivamente entre 1989 e 1993, quando atingiu seu ponto máximo (26 semanas), diminuindo expressivamente entre 1994 e 1995, quando, em média, representava 22 semanas. No entanto, devido às peculiaridades de um mercado pouco estruturado como o brasileiro, em que freqüentemente ocorrem interrupções na procura de trabalho, seja por motivos pessoais (doença, falta de dinheiro para locomoção, etc.), ou por falta de estímulo frente à conjuntura difícil, vale destacar o comportamento de um indicador complementar, o tempo em desemprego. O tempo médio em desemprego na RMSP é, em geral, cerca de duas vezes maior que o tempo de procura. Entre 1989 e 1993, passou de 36 para 55 semanas, mantendose nesse patamar em 1994 e caindo para 48 semanas em 1995. A mediana atingiu 29 semanas em 1993, seu ponto máximo, tendo diminuído para 26 semanas em 1994 e para 17 semanas em 1995. Outro aspecto a ser considerado refere-se às alterações nas características individuais dos desempregados. Acompanhando o envelhecimento da população, verifica-se o aumento da participação de desempregados em faixas etárias mais elevadas. Entre 1989 e 1995, os jovens com até 24 anos passaram a representar 53% dos desempregados, CONSIDERAÇÕES FINAIS O desempenho do mercado de trabalho da RMSP, na primeira metade dos anos 90, foi muito desfavorável, ao contrário da década anterior. A ausência de dinamismo do emprego industrial, os processos de racionalização dos ramos de atividade dinâmicos e/ou organizados dos serviços, a evolução adversa da ocupação na construção civil, em decorrência das limitações das políticas de obras públicas e habitacionais, e as mudanças no perfil etário e educacional da população ocupada são características que sintetizam este movimento. Este quadro tende a oferecer menores atrativos à migração para a RMSP, se este deslocamento for determinado pela busca de melhores oportunidades ocupacionais. Ignorando, em um primeiro momento, todos os demais fatores e caso se mantivesse a mesma trajetória do nível ocupacional na segunda metade da década de 90, seria de se esperar a reprodução de resultado similar ao dos anos 80, quando o saldo migratório regional mostrou-se negativo. Ou seja, a região não voltaria a ser pólo de atração de migrantes no volume e com o perfil observado em períodos anteriores. No entanto, frente às incertezas que ainda cercam a evolução da economia e do emprego no país nos demais anos da década de 90, esta conclusão deve ser relativizada. 52 MERCADO DE TRABALHO E MIGRAÇÃO NA GRANDE SÃO PAULO Como a migração é determinada também pela situação econômica vigente no lugar de origem, isto é, pelos fatores de expulsão, a evolução dos níveis de produção e de emprego em outras regiões pode vir a ser mais desfavorável que a registrada na RMSP, contribuindo, desta forma, para incentivar a retomada do fluxo migratório. Acrescente-se que, diante da precariedade da infra-estrutura urbana e, em especial, dos serviços sociais básicos, é possível que os fluxos migratórios passem a ser influenciados também pela tentativa de obter acesso a programas de maior qualidade e amplitude, tipicamente oferecidos em cidades de médio e grande portes. Caso venha a se acentuar a diferenciação da RMSP em relação a outras regiões quanto à implementação deste tipo de política, pode-se supor a existência de um novo fator de incentivo à migração. Embora não deva ser desconsiderada, a influência do comportamento do mercado de trabalho na RMSP sobre os movimentos migratórios deve ser redimensionada, não cabendo atribuir-lhe o mesmo papel da década de 70. Além de poder atrair (e expulsar) pessoas com perfil distinto do anteriormente observado, gerando fluxos para segmentos populacionais e ocupacionais específicos, a evolução deste mercado tende a se combinar crescentemente com outros fatores, problematizando a elaboração de cenários sintéticos para subsidiar as projeções demográficas. 3. Isto significa que estes postos regulamentados passaram de cerca de 62% para 54% do total da ocupação regional. Embora ainda pouco mais da metade dos ocupados disponha de acesso às garantias trabalhistas, trata-se de uma redução substancial, principalmente por se tratar de um dos mercados de trabalho mais organizados do país. 4. A opção por utilizar esta relação justifica-se pelo fato de os indicadores usualmente utilizados para acompanhar o comportamento do nível ocupacional – a distribuição da ocupação por características produtivas ou por atributos pessoais e a construção de séries de índices, tomando um ponto qualquer no tempo como base – fornecerem informações incompletas ou distorcidas, quando o propósito é avaliar a evolução desta variável para um segmento específico da população. No primeiro caso, isto pode ocorrer devido ao peso diferenciado de cada parcela na população e à possibilidade de aumentos (diminuições) na participação de um segmento resultarem de comportamentos observados para qualquer outro, refletindo apenas um ajuste de caráter estatístico na distribuição. No segundo, por não considerar variações no tamanho do segmento em análise que, embora não afetem o resultado verificado, transferem parte dos movimentos de ajuste para outras variáveis não analisadas. Ver Seghin (1995). 5. Entre a população ativa de 18 a 24 anos na RMSP, cerca de 53% completaram pelo menos o 1 o grau. No total da PIA metropolitana, a participação de pessoas com, no mínimo, este nível de escolaridade equivale a 38%. Ver Fundação Seade – Dieese (1994). 6. Apesar das dificuldades de realizar comparações, não deixa de ser ilustrativo considerar que, entre 1985-86, quando a economia cresceu em ritmo mais intenso, a taxa de ocupação ampliou-se em 1,9 pontos percentuais. 7. Destaque-se que cerca de 67% destes desempregados encontravam-se em desemprego aberto, o que significa não ter nenhum trabalho regular no período de referência da pesquisa (sete dias) e ter realizado procura efetiva de trabalho nos 30 dias anteriores. Cerca de 25%, em simultâneo à procura de trabalho, realizavam algum tipo de trabalho descontínuo e sem regularidade, que lhes tomava, em média, uma hora na semana, como forma de obter algum tipo de remuneração, enquanto os demais encontravam-se desestimulados a continuar procurando, apesar de ainda necessitar de trabalho. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS FUNDAÇÃO SEADE. Pesquisa de Condições de Vida – definição e mensuração da pobreza na Região Metropolitana de São Paulo: uma abordagem multissetorial. São Paulo, Fundação Seade, 1992. __________ . O Novo Retrato de São Paulo – avaliação dos primeiros resultados do Censo Demográfico de 1991. São Paulo, 1993. FUNDAÇÃO SEADE – DIEESE. O terciário na Região Metropolitana de São Paulo. Como entender sua evolução. Boletim n. 81 da Pesquisa de Emprego e Desemprego. São Paulo, 1991 p. B21-B26. __________ . Educação formal e mercado de trabalho. Suplemento do Boletim n. 112 da Pesquisa de Emprego e Desemprego. São Paulo, 1994. SEGHIN, A. “Les taux d´occupation en Europe – Le choix des indicateurs pertinents”. Futuribles. Paris, Sage, maio 1995, p. 17-41. NOTAS 1. A taxa de participação corresponde ao quociente entre a População Economicamente Ativa e a População em Idade Ativa, a primeira englobando os contingentes de ocupados e desempregados e a segunda, toda a população de 10 anos e mais. A taxa de participação global fornece esta relação para o conjunto destas populações, e a específica estabelece esta relação para um determinado segmento populacional, por exemplo, as mulheres ocupadas e desempregadas em relação a todas as mulheres de 10 anos e mais. 2. A participação na PIA dos ocupados pelo comércio cresceu de 7,5% para 9,0%, entre 1985 e 1995, e a dos serviços, de 21,6% para 25,2%. 53