ESTRATÉGIAS DAS EMPRESAS AVÍCOLAS E A INTEGRAÇÃO LATINO-AMERICANA Vitor Alberto Matos Universidade Federal de Uberlândia Av. Levino de Souza 2028, Cep. 38405-383, Fone/Fax (034) 232-0742 ABSTRACT: This article analyses the strategical process developed by the Brazilian poultry segments field’s leader firms, focusing the behavior of the agricultural industries groups. Givin emphasis to Mercosul, the inicial goal broadens itself to the interrelationship of poultry firms in this market and the future perspectives for the development of member countries. In Brazil s case, beside building an excellent opportunity for the realization of learning in terms of integration process, to increase the bargain power in the international negotiations and to provide a more advantaged participation in global economy, it also permits a translocalization of agricultural industries capitals according to the perspective of profits of each company. KEY WORDS: Firms Strategies, Competitive Advantage, Poultry, Learning. 1 - INTRODUÇÃO No período recente, da década de 90, estamos assistindo à consolidação de um movimento de reestruturação e rearticulação das empresas iniciado durante os anos 60 e 70 e caracterizado por ajustes planejados na estrutura produtiva (Coutinho e Ferraz, 1994), buscando ganhos de competitividade que permitam o enfrentamento concorrencial nos mercados externos1. Este artigo procura resgatar as principais estratégias das empresas líderes da avicultura brasileira dando ênfase às assimetrias e disparidades entre os concorrentes geradores de alterações na estrutura de mercado e nos seus padrões competitivos. No tocante às empresas, esse comportamento caracterizou-se por reorganização de suas atividades enfatizando a intensificação da coerência e sinergia entre elas (Dosi, Teece e Winter, 1990: 239) e por redefinição das inter-relações entre os agentes produtivos2. No setor avícola, as principais transformações restringiram-se à intensificação dos movimentos de externalização de suas atividades, ao maior aprofundamento das relações com fornecedores, distribuidores e clientes e ao estabelecimento e consolidação de alianças estratégicas entre concorrentes3. O sentido principal desses comportamentos era a cooperação (Carvalho Jr., 1996). Inicialmente, apresentamos as principais estratégias dos grupos líderes do segmento, explicitando as capacidades, habilidades e competências adquiridas por cada um ao longo de sua experiência produtiva. Em seguida, analisamos o inter-relacionamento entre as agroindústrias e a produção agrária integrada, enfatizando a aprendizagem e a aquisição de capacidades tecnológicas. 1 As grandes empresas procuraram enfrentar a concorrência utilizando-se não só de estratégias de expansão, diferenciação e diversificação de sua produção, mas também da introdução constante de novas tecnologias de processo e de produto e da capacitação tecnológica de seus quadros de colaboradores 2 Em Matos (1996), verifica-se que a avicultura brasileira passa de um estágio estratégico imitativo e dependente centrado na compra de pacotes tecnológicos oriundos de multinacionais ligadas aos setores de genética animal e de insumos fármaco-químicos para o defensivo, cuja característica principal é a elevação da capacidade interna de incorporar progresso técnico de forma a manter e aumentar seus índices de desenvolvimento procurando acompanhar os países mais desenvolvidos. 3 Ao longo do processo de desenvolvimento tecnológico dos grupos líderes do setor de carnes, também foram sendo criadas e acumuladas diversas capacidades tecnológicas próprias. Ao mesmo tempo, o acesso aos mercados externos tornou-se fonte de informações tecnológicas necessárias ao desenvolvimento de processos de aprendizagem e capacitação das mesmas. Um dos mais significativos exemplos de movimentos de cooperação realizado pelas empresas avícolas líderes foi a saída para o Mercosul. Nesse sentido, dando prosseguimento, queremos apresentar alguns questionamentos relativos a essa integração, destacando as assimetrias que poderão surgir no desenvolvimento regional. Concluindo, procuramos sintetizar algumas propostas a serem melhor estudadas para o desenvolvimento das regiões marginais nesse processo. 2 - ESTRATÉGIAS DAS EMPRESAS LÍDERES A intensa concorrência tem orientado as empresas em direção a comportamentos estratégicos marcados por intensificação tecnológica, atenção às necessidades da empresa e satisfação dos seus clientes. Em primeiro lugar, seu comportamento típico é a expansão dos mercados atuais por desenvolvimento de produtos ou de mercados, onde a ênfase estratégica é a diferenciação. Em segundo lugar, ao optar por novos mercados, procura diversificar suas atividades. De um lado, a análise da diversificação acentua os fatores relacionados ao ambiente interno da firma e representados pelos mecanismos de aprendizado e consolidação de rotinas, que imprimem cumulativamente um nível de capacitação, permitindo a incorporação de inovações e a expansão para novos mercados (Brito, 1993:198). De outro, essa análise também deve estar atenta aos fatores externos ou ao ambiente tecnológico externo à firma, que afeta sua decisão, por definir oportunidades a serem exploradas como reflexo do processo cumulativo de desenvolvimento tecnológico (padrões específicos de inovações) e que podem orientar o avanço para direções mais atrativas e relevantes4. 2.1 - A Liderança e a Aquisição de Capacidades e Competências A aprendizagem adquirida ao longo da experiência produtiva das firmas conformou um conjunto de habilidades e competências possibilitando a descoberta de novas oportunidades de negócio. Nesse sentido, as estratégias empresariais constituem os mecanismos destinados a criar, desenvolver e reforçar as capacidades tecnológicas próprias e as oportunidades de apropriabilidade decorrentes da contínua geração e difusão de inovações (Dosi, 1988). Da diversidade das bases de conhecimentos técnicos e científicos existentes decorrem níveis de capacitação muito diversos que resultam em uma estrutura industrial muito diversificada. Portanto, essas especificidades definem padrões de comportamento inovador, também específicos, que refletem os diferentes graus de aversão a riscos implícitos na mudança tecnológica. Em relação à produção5, as firmas líderes orientaram-se sempre em direção à maior agregação de valor aos produtos primários. A segmentação de seus mercados, seja por exigência de seus clientes, seja em decorrência de ações agressivas de diferenciação de produtos, criou e elevou os níveis de barreiras à entrada de novos participantes reforçando as posições de liderança adquiridas. A Tabela 1 revela que apesar de, em alguns casos, terem seguido processos opostos, a diversificação produtiva e a integração vertical ocorreram dentro das cadeias de grãos e carnes, com resultados que refletem o crescimento da produção à montante e à jusante em cada uma delas. 4 A análise do quadro IX (Matos, 1996: 233) revela que o crescimento das empresas líderes acentuou as assimetrias entre as empresas no interior do segmento avícola. A diversificação para as atividades de elevada coerência interna e sinergia (Dosi et al., 1990 e Gaffard, 1989) reforçou o processo de incorporação tecnológica, transformando-se no elemento determinante das diversidades no interior da indústria, dando origem a um conjunto de vantagens competitivas que lhes deram capacidade para enfrentar a competição nesse segmento 5 Em Matos (1966), as estratégias das empresas líderes são mais detalhadamente analisadas e acompanhadas de dados referentes ao desempenho de cada empresa. Conscientes de que a introdução de inovações tecnológicas é um dos elementos centrais na busca de competitividade, as empresas procuraram ampliar a atuação de seus departamentos de P & D com o objetivo de dar suporte técnico e científico ao desenvolvimento de processos e produtos. O treinamento do pessoal da empresa e a atenção constante à produção agrária integrada demonstram a preocupação com a técnica de produção e com a qualidade dos produtos. TABELA 1 - EMPRESAS LÍDERES DA AVICULTURA EVOLUÇÃO DA PRODUÇÃO DA SADIA, PERDIGÃO E CEVAL POR PRODUTOS PRINCIPAIS em 1000 Ton. 1985 1990 1995 Produtos Sadia Perdigão Ceval Sadia Perdigão Ceval Sadia Perdigão Ceval Industrializados 86 181 43 260 316 80 Rações (1) 1250 1504 755 414 2170 842 659 Carnes (2) 562 612 88 320 768 119 305 Esmagam. Soja 661 1170 1000 281 7901 1622 113 3721 Moag. de Trigo 74 81 171 Óleos 223 118 95 875 211 37 1099 Hidrogenados 14 43 43 Massas 16 Fonte: Relatórios Anuais das Empresas Sadia, Perdigão e Ceval - Vários Anos (1) A partir dos anos 90 a produção de rações está toda dirigida ao consumo interno (2) Para a Perdigão os dados disponíveis referem-se às exportações A atenção à tecnologia levou as empresas à informatização e automação dos processos industriais e administrativos, investimentos decisivos por permitirem maior controle da produção à montante (matrizes e animais de corte), do abate e processamento das carnes, da alimentação animal, do gerenciamento dos padrões genéticos e da logística, principalmente na otimização de seus processos de distribuição. No tocante às vantagens competitivas oriundas da distribuição, as empresas enfatizam a qualidade, a entrega no prazo, a racionalização dos serviços da frota, a distribuição mais capilarizada, a flexibilização das margens operacionais para manter posições de mercado, a assistência permanente aos clientes e a extensão do controle de qualidade aos pontos de venda. Os investimentos em unidades de distribuição junto aos mercados principais e próximas às unidades de industrialização permitem atendimento rápido aos clientes, uma vez que as programações de comercialização e produção podem se integrar e proporcionar maior racionalização da entrega dos produtos. No tocante à matéria-prima, a necessidade de trabalhar com um fluxo constante, padronizado e em grande quantidade, em decorrência das especificidades técnicas do material genético, das características dos equipamentos de abate e processamento e das exigências dos mercados consumidores, obriga as empresas agroalimentares a implementarem um crescente inter-relacionamento com os fornecedores. O desenvolvimento da integração incrementou a produção de aves e suínos, beneficiou o produtor rural proporcionando-lhe renda complementar, ocupou e manteve toda sua família dentro da propriedade e incentivou-o a continuar na atividade. Por outro lado, também gerou grandes benefícios à indústria, garantindo-lhe os insumos para a continuidade da produção. A necessidade de contar com fornecimento constante e contínuo da matéria-prima para abate impôs, às empresas produtoras, estratégias de ocupação espacial voltadas para as regiões onde são mais fáceis e abundantes os insumos agrícolas e pecuários. Em relação às exportações, as ações de algumas empresas refletem as vantagens competitivas adquiridas na exportação de grãos. A Tabela 2 demonstra não só a performance de cada uma das empresas, mas também revela a especialização e a evolução de cada uma no tempo em direção ao enfrentamento da elevada concorrência internacional no setor de carnes. TABELA 2 - EMPRESAS LÍDERES DA AVICULTURA EVOLUÇÃO DAS EXPORTAÇÕES DA SADIA, PERDIGÃO E CEVAL POR PRODUTOS PRINCIPAIS em US$ milhões 1985 1990 1995 Produtos Sadia Perdigão Ceval Sadia Perdigão Ceval Sadia Perdigão Ceval Cárneos 140 190 56 32 430 129 Soja 122 176 90 88 458 170 119 821 Outros 6 10 Total 262 176 280 144 496 600 119 960 Fonte: Relatórios Anuais das Empresas Sadia, Perdigão e Ceval - Vários Anos A opção pelo mercado externo visava não só à obtenção de vantagens neste setor, mas também a incrementar o nível de capacitação tecnológica própria, seja a partir da intensa relação com os clientes externos, seja a partir da tecnologia que acompanha os equipamentos mais modernos. A exportação de cárneos ainda se concentra em produtos de pequena elaboração, embora algumas estratégias destinadas ao crescimento das exportações de produtos de maior elaboração e sofisticação já estejam sendo implantadas. 2.2 - Agroindústria e Produção Agrária Integrada O processo de modernização do agro brasileiro atingiu seus vários ramos produtivos da forma mais diversa. Em relação à pequena produção agrária familiar, baseou-se na integração direta às agroindústrias processadoras. O objetivo dessas empresas era o de procurar dotá-la, a um só tempo, de melhor acompanhamento e assistência técnica, de animais geneticamente melhorados e de maior resposta e de sua autonomização em matéria de insumos e de produção, para sobrevivência familiar. Estamos certos de que a necessidade de ampliação das atividades situadas à jusante do processamento redirecionou os objetivos das empresas no sentido de uma reestruturação dos setores à montante, principalmente no tocante à produção agrária, As estratégias das agroindústrias visavam não só a garantir estabilidade à produção de suínos e aves para a indústria, elevar os níveis de qualidade dos produtos, aproveitar e manter a produção de matéria prima próxima da indústria, estimular a produtividade na criação, fomentar a produção de insumos, conjugar atividades produtivas, melhor aproveitar o potencial das propriedades, além de criar alternativas produtivas claras para o produtor rural e dar nova dimensão à assistência técnica e ao fomento agropecuário. Neste sentido, a idéia da diversificação produtiva da propriedade procura dar nova motivação ao seu fornecedor de insumos e permitir uma maior estabilidade de sua renda mensal. Portanto, o produtor estaria construindo uma nova propriedade, mais flexível e menos vulnerável às incertezas, em função de suas diversas atividades. Este padrão estratégico significava também forte atenção à pesquisa e desenvolvimento direcionada quer para a obtenção de animais perfeitamente adaptados às condições do produtor nacional, quer para o fornecimento de matéria prima e produtos apropriados às exigências de seus mercados. 3 - A AVICULTURA BRASILEIRA E O MERCOSUL No geral, a análise das políticas de abertura comercial implementadas na América Latina voltam-se não só para a eliminação ou redução das barreiras não tarifárias, como também para a redução do nível médio das tarifas de exportação e da dispersão da estrutura tarifária, além da diminuição ou extinção de impostos sobre exportações. Essas ações procuram eliminar o viés anti-exportador gerado durante seus processos de industrialização. As vantagens dessa política situam-se no realinhamento dos preços relativos e realocação de fatores de produção entre setores, nos ganhos comerciais e busca de eficiência produtiva do produtor doméstico, no crescimento da produtividade por especialização e acesso a mercados mais dinâmicos, além de acentuado crescimento dos níveis de aprendizado e conhecimento tecnológico (Canuto, 1994:44). Entretanto, a atração exercida pelos mercados mais amplos, geradores de economias de escala e o custo mais baixo das áreas de união aduaneira, embora estimulem as grandes firmas a realizarem investimentos nessas regiões, também podem acentuar desequilíbrios regionais e desigualdades de estruturas produtivas dentro de um mesmo país ou entre países-membros dos blocos. Nessa seção, com relação à avicultura, pretendemos unicamente levantar algumas questões, de caráter introdutório, originárias do relacionamento criado com a formação dos blocos regionais. Em primeiro lugar, quando os países do bloco possuem crescimento regional polarizado, os novos mercados resultantes podem adquirir uma dinâmica centrada nas regiões pólo de cada um deles. Nesse sentido, a integração econômica dar-se-ia ao nível dos pólos de crescimento e em menor dimensão nas regiões periféricas. Os dados da Tabela 3, para as exportações brasileiras aos países do Mercosul por setores de atividade produtiva, parecem confirmar as idéias de que a integração reforçaria as desigualdades inter-regionais, uma vez que os setores de maior participação no comércio do Mercosul estariam situados nas regiões Sul e Sudeste. TABELA 3 - EXPORTAÇÕES BRASILEIRAS PARA O MERCOSUL em US$ 1000 FOB - 1993 Setores Produtivos Material de Transporte Máquinas e Aparelhos Mecânicos e Elétricos Produtos Químicos Produtos Metalúrgicos e Ferramentas Produtos Minerais Borracha Materiais Têxteis Papel e Celulose Produtos da Indústria Alimentar Outros Total % 21,8 19,1 13,4 9,5 5,3 3,1 5,7 4,9 6,2 11,0 100,0 Fonte: Guilhoto e Montoya (1996) a partir de dados da Secex Os setores e produtos ligados aos complexos eletrônico, automobilístico e máquinas ferramenta, possuidores de maior dinamismo tecnológico e de mercado, respondem pela maior parcela das exportações brasileiras, seguidos dos setores de “commodities” industriais de processamento contínuo com base em recursos naturais e dos de produtos agroalimentares. Mesmo com participação muito pequena nas exportações para o Mercosul, os produtos industrializados respondem por boa parte desse comércio das empresas avícolas líderes. Certamente, as assimetrias regionais crescem, uma vez que essas empresas estão concentradas nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste. Em segundo lugar, o intercâmbio comercial entre os países tem demonstrado uma tendência à “especialização”, que é facilmente verificada através da orientação dos investimentos, na sua maioria, centrados nas vantagens comparativas de cada país, basicamente exportação brasileira de agroindustrializados e importação de “commodities” agrícolas dos outros países. TABELA 4 - BALANÇA COMERCIAL DO MERCOSUL em US$ milhões - 1996 PAÍS 1995 Argentina 3015 Paraguai 974 Uruguai 636 Mercosul 4626 EXPORTAÇÕES 1996 3784 954 602 5431 Var. % 25,48 -2,03 -5,30 15,45 1995 4275 388 547 5211 IMPORTAÇÕES 1996 4809 401 659 5870 Var. % 12,50 3,27 20,52 12,64 Fonte: Ministério da Indústria, do Comércio e do Turismo Apesar de a Tabela 4 demonstrar o peso das importações sobre as exportações e que a abertura comercial tem sido a responsável por déficits comerciais do Brasil com os outros países do bloco, as exportações estariam reforçando as disparidades regionais, uma vez que aquelas regiões ou países, cuja produção não estivesse centrada na transformação industrial de insumos, estariam mais expostas a perdas para aqueles de maior produtividade e modernidade. Uma terceira questão associada às relações entre os países do Mercosul refere-se aos tipos de produtos transacionados e seus reflexos sobre cada uma das economias. Ao observarmos a estrutura das exportações dos membros do Mercosul, verifica-se uma acentuada participação dos produtos agrícolas e agro-industriais de primeiro processamento em relação aos produtos manufaturados ou de maior elaboração. A dependência em relação aos produtos de pouco valor agregado impede o crescimento por reduzir vantagens competitivas da região. TABELA 5 - EXPORTAÇÕES DO MERCOSUL em % do Total PRODUTOS DE POUCA AGREGAÇÃO PAISES 1970 1980 1990 Argentina 85,2 71,2 61,4 Brasil 75,2 50,3 32,6 Paraguai 91,1 88,2 90,0 Uruguai 78,6 61,0 60,4 PRODUTOS MANUFATURADOS 1970 1980 1990 13,9 23,1 33,4 13,2 37,2 50,3 9,0 11,8 9,9 20,0 37,9 38,8 Fonte: Unctad (1992) in Gazeta Mercantil 02/12/96 O movimento de reestruturação produtiva e diversificação de exportações implementado nos países do bloco tem revelado resultados muito diferentes. A Tabela 5 deixa claro que o Brasil é o país de performance mais positiva, uma vez que conseguiu reduzir significativamente a participação da produção de pouca agregação de valor nas exportações, centrando-se mais nos produtos manufaturados. Os resultados de Argentina e Uruguai demonstram pequenos avanços, embora eles ainda estejam em situação de elevada dependência quanto aos produtos “commodities”. A posição do Paraguai é mais preocupante, uma vez que muito pouco foi realizado com vistas a reduções da participação da produção de pouca agregação. A ampliação dos negócios com os países do Mercado Comum do Sul foi a principal estratégia dos grupos líderes da avicultura brasileira, embora sua implantação tenha sido muito cautelosa. Inicialmente, tanto a Sadia como a Ceval voltaram-se para a especialização - a exportação de produtos industrializados e importação de grãos - um dos problemas que ora destacamos. Posteriormente, seguindo uma tendência internacional, essas empresas procuraram construir alianças estratégicas com grupos locais visando a melhor atuarem nos mercados externos. A Sadia, no início dos anos 90, associou-se à Granja Tres Arroyos da Argentina para a distribuição de industrializados. Mais tarde, em 1992, abriu um escritório comercial em Buenos Aires. Atualmente, acaba de inaugurar na capital “portenha” uma central de distribuição e uma fábrica de corte e embalagem de derivados de frangos e suínos visando a abastecer o mercado local e os países vizinhos, uma vez que o mercado local indica possibilidade de crescimento para o produto agrícola brasileiro. A estratégia da empresa é comercializar um produto específico e plenamente adaptado ao consumidor local. A Ceval Alimentos, apesar de sua vasta experiência como exportadora de grãos e derivados de soja, atualmente concentra suas atividades de aquisição de grãos no mercado do Paraguai. Na Argentina, ela possui um escritório comercial por onde realiza muitas de suas vendas, apesar de possuir planos para uma ação comercial mais agressiva naquele mercado. A estratégia da Ceval para o Mercosul dá ênfase às ampliações no parque industrial da Guipeba Ceval S.A., onde a capacidade operacional será duplicada passando a processar nesse ano de 1997 até 6 mil toneladas/dia de soja, o que equivale a um processamento anual, na Argentina, de 2 milhões de toneladas. Segundo dados da própria empresa, a Ceval é a maior exportadora de carnes para o Mercosul. A Perdigão, uma das grandes empresas do setor6, ainda não participa do comércio com o Mercado Comum do Sul. No entanto, os investimentos dos últimos anos deram-lhe a capacidade produtiva necessária para enfrentar sua tradicional concorrente também nesse mercado. Neste ano de 1997, a Perdigão S.A. entrará na disputa pelo mercado argentino de alimentos industrializados. Após um intenso processo de reestruturação interna, ela está buscando implementar um audacioso projeto de expansão em direção ao Centro-Oeste, com vista à recuperação e ampliação tanto dos mercados, quanto da capacidade operacional. Sua estratégia inclui tanto o mercado de produtos semi-prontos, congelados e processados, donos de margens muito elevadas em comparação com os “in natura”, quanto os mercados externos, onde o Mercosul apresenta-se como a alternativa mais viável. 4 - CONSIDERAÇÕES FINAIS A associação entre a incerteza intrínseca ao ambiente competitivo e a complexidade inerente ao processo decisório das empresas resultou em diversidade: ao nível tecnológico, representada pela variedade de métodos tecnológicos utilizados e produtos apresentados ao mercado; ao nível competitivo, caracterizada por diferentes capacidades concorrenciais em termos de custos, controle de qualidade e níveis de lucratividade, e ao nível das estratégias, evidenciado pelas diferentes formas de aquisição de habilidades e capacidades de enfrentamento concorrencial analisadas. A relação - pequeno produtor/agroindústria - propicia ao produtor rural novos espaços de competição e melhores condições de aproveitamento rentável e diversificado de sua área de terra. Assim, cria-se um novo padrão de produção - agregar constantemente valor à produção agrícola. Novas alternativas de emprego sem a necessidade de afastamento permanente ou temporário dos membros da família surgem em decorrência da facilidade que essa atividade apresenta, permitindo que todas as funções sejam realizadas no local da propriedade. O aprendizado e a absorção de tecnologia serão os fatores determinantes das assimetrias entre os parceiros, ocorrendo basicamente no manejo das aves. O Mercosul, além de se constituir em excelente oportunidade de aumentar o poder de barganha nas negociações internacionais, de propiciar uma participação mais vantajosa 6 O mercado de carnes industrializadas e congeladas é dominado pela Sadia que possuía 51 % do mercado em 1996. A Perdigão, considerando o período 92-96 dobrou sua participação e hoje situa-se em segundo lugar no ranking das empresas. na economia global e de permitir maior especialização, também poderá causar uma exacerbação das assimetrias regionais já existentes ao invés de contribuir para sua redução. Nesse sentido, algumas políticas de caráter acomodativo devem ser pensadas e implementadas. Dentre elas, os programas de melhoria e sustentação dos empreendimentos locais de pequeno e médio porte - principalmente os que congregam comunidades de produtores - destinados ao atendimento de mercados localizados com produtos e serviços pouco diferenciados. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRITO, J., “O Processo de Diversificação da Firma: uma abordagem dinâmica exploratória”, In Nova Economia, Belo Horizonte, v. 31, n. 1 pp. 195-224, 1993. CANUTO,O., “Abertura Comercial, estrutura produtiva e crescimento econômico na América Latina”, Campinas, n.3, pp.85-97, 1994. 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GAFFARD, J.L., “Le dévéloppement des activités de service aux entreprises et dans les entreprises”, In: Revue d’Economie Industrielle, Paris: n. 48 pp. 16-28, 2º Trim. 1989, mímeo. GUILHOTO, J.J.M. & MONTOYA, M. A., Os efeitos da Integração, In: Gazeta Mercantil Latino Americana, São Paulo Dez.1996 MATOS, V.A., Estratégias Empresariais no setor avícola: estudo comparativo de duas regiões produtoras, São Paulo: Escola de Administração de Empresas de São Paulo FGV, 1996. Tese (Doutorado).