Os Sete Vales
OSHO
O homem é um paradoxo. O homem é o único animal, o único ser que é
paradoxal - essa é a singularidade do homem. A natureza especial do homem é o seu
paradoxo interno. Todos os outros animais são não-paradoxais.
Uma árvore é uma árvore, um cachorro é um cachorro, mas um homem nunca
tem tal singularidade. Ele está sempre em formação, crescendo. O homem está sempre se
superando; este é o seu paradoxo. E isto existe no mais profundo do seu ser. Não é acidental,
é absolutamente fundamental. Uma vez que você entende este paradoxo, você tem o
primeiro vislumbre sobre a humanidade - sobre o que é o homem.
O homem é sempre um projeto, um vir a ser. Seu ser consiste em vir a ser - este
é o paradoxo. Ele está sempre entre aquilo que ele foi e o que vai vir a ser. Ele está sempre
entre seu passado e o seu futuro - uma ponte pendendo entre seu passado e seu futuro. Ele é
uma surpresa, uma surpresa contínua. O homem nunca está contente com aquilo que ele é;
ele está tentando ir além, sempre tentando ir além. Seja o que for que esteja fazendo, o seu
esforço é, basicamente, como se tornar algo mais, algo maior, algo melhor.
O homem é um desenvolvimento, um viajante, um peregrino - e a sua vida é
uma peregrinação, uma peregrinação sem fim, que continua indefinidamente. Um cachorro
nasce, uma árvore nasce...A árvore nasce com toda sua "arboridade" e o cachorro nasce
com toda a sua "cachorrez". O homem não é um fato acabado, ele nasce apenas com a
possibilidade, com um potencial. O homem nasce como espaço vazio, como uma não
existência, nada está escrito.
Todos os outros seres tem uma certa essência, uma certa alma. No homem é
exatamente o oposto. A sua existência vem primeiro e depois ele começa a buscar a sua
essência. Nos outros animais a essência vem primeiro e a existência depois. Eles trazem um
programa pré-determinado; eles nunca crescem, eles permanecem os mesmos. É por isso
que parecem tão inocentes, tão despreocupados, tão sem tensão. Olhe para os olhos de uma
vaca - quão pacífica, calma e tranqüila ela é. Não há ansiedade, angústia, nuvens. Olhe para
os olhos de um homem - eles estão sempre anuviados. Eles sempre tem angústia, estão
sempre estremecendo, o tremor de "será que eu estarei apto a encontrar-me ou não?" - o
tremor de "será que eu me realizarei ou não?".
Os animais são tranqüilos, o homem é tensão. Esta é a sua glória e a sua
angústia também. Esta é a sua dignidade e o seu problema também. É a sua glória porque ele
é capaz de criar a si próprio - ele é um deus. E é a sua angústia porque a possibilidade de que
ele possa falhar sempre existe, de que ele não seja capaz de criar a si próprio. Quem sabe? É
a glória por causa da liberdade - ele não foi programado. Ele é o único animal que permanece
sem programa. Não lhe foi dado um mapa, ele não foi ordenado.
O homem é o único ser que não é dirigido, que não tem comandos. Ele chega à
existência vazio e então começa a buscar o seu ser as apalpadelas. Ele começa a
experimentar, a criar e buscar. O homem é uma aventura.
Mas com a aventura está a incerteza, a insegurança, o fracasso e o medo.
Sempre se pode errar. Há maiores possibilidades de se estar errado do que de estar certo.
Há mil e um caminhos - qual é o certo? Você está sempre ansioso. E seja o que for que você
escolha, a escolha é incerta, porque você nunca poderá ter certeza se este caminho o levará
ao seu objetivo ou terminará num beco sem saída - se chegará a algum lugar ou terminará
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num deserto.
A glória do homem é a sua liberdade: ele pode criar-se, ele pode ser ele mesmo,
nada lhe é forçado, ele é livre. E a miséria do homem é a de que ele não pode ter certeza, ele
nunca pode ter a certeza de estar no caminho certo, de estar fazendo o que é significativo ou
não.
O homem é o único animal que fica louco. Ele tem que encarar problemas,
resolvê-los, ir além deles. Esta é a primeira coisa que eu gostaria que vocês
compreendessem.
Havia um grande mestre sufi - um dos maiores de todos os tempos - Al
Ghazzali. Ele dizia: "No caminho do homem até Deus - do homem potencial ao homem
verdadeiro, da possibilidade até a realidade - há sete vales". Estes sete vales são de imensa
importância. Tente entendê-los, pois você terá que passar através destes sete vales.
Se você compreender corretamente o que fazer com um vale, você será capaz
de ir além dele, e você chegará a um pico - porque cada vale é cercado por montanhas. Se
você puder passar através do vale, não ficar emaranhado, perdido, se não ficar muito ligado
no vale, permanecer indiferente, separado, uma testemunha, e se você continuar a se
lembrar que este não é o seu lar, que você é um estranho aqui, e continuar lembrando que o
pico tem que ser alcançado, e você não esquecer o pico - você chegará ao pico. Com cada
vale cruzado há uma grande celebração.
Mas, após cada vale, você terá que entrar no outro vale. E isso continua. Há
sete vales. Uma vez que você alcance o sétimo, não há mais. O homem atingiu seu ser, ele
não é mais paradoxal. Não há tensão, não há angústia. É isto que no oriente nós chamamos
de estado búdico. É isto que os cristão chamam de estado crístico. É isto que os jainas
chamam de estado "jainico" - tornar-se vitorioso. Há muitos nomes, mas idéia básica é a de
que, a menos que o homem se torne Deus, ele permanece em ansiedade. E, para se tornar
Deus, estes sete vales precisam ser atravessados.
E cada vale tem as suas próprias tentações. É muito provável que você possa
ficar atraído por alguma coisa e não seja capaz de deixar o vale. Você tem que deixá-lo se
quiser entrar no segundo vale. E, após cada vale há um pico, um grande pico. Após cada vale
há júbilo e o júbilo vai ficando mais e mais intenso. E então, finalmente, no sétimo vale você
atinge o orgasmo cósmico - você desaparece. Apenas Deus existe.
Observe estes sete vales e tente compreendê-los. E eu não penso que Al
Ghazzali esteja falando sobre algo filosófico. Sufis não estão interessados em filosofia. Eles
são um povo muito prático. Se eles dizem alguma coisa é isso que eles querem dizer. Se eles
dizem alguma coisa, isso é dito para o buscador. Isso não é dito para os curiosos, para os
intelectuais, mas para aqueles que estão no caminho, para aqueles que estão realmente
trabalhando duro para ter um vislumbre da verdade. Isso é para os buscadores.
O primeiro vale...O primeiro vale é chamado o vale do conhecimento.
Naturalmente, o conhecimento tem que vir primeiro porque o homem começa
pela instrução. Nenhum outro animal tem conhecimento; apenas o homem sabe, apenas o
homem coleta conhecimento. Apenas o homem tem linguagem, escrituras, teorias. Então, o
conhecimento tem de ser o primeiro vale.
A parte negativa deste vale é que você pode se tornar instruído, você pode se
engendrar no conhecimento. Você pode esquecer a verdadeira proposta do conhecimento e
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pode ficar ligado ao próprio conhecimento. Aí, acumulará mais e mais conhecimento e pode
ficar por várias vidas acumulando conhecimento. Você se tornará um grande estudante, um
especialista, mas não se tornará um conhecedor.
O caminho do conhecedor é totalmente diferente do caminho do conhecimento.
Há duas coisas quando o conhecimento acontece: o conteúdo do
conhecimento - você sabe algo - e a consciência, o espelho, aquele que sabe. Se você ficar
muito preso ao conteúdo do conhecimento ao invés de se ligar na capacidade de conhecer,
você estará perdido no vale. A parte que pode fazê-lo ficar emaranhado, fisgado, preso, eu
chamo de negativa.
Se você se tornar instruído está perdido; não pode cruzar o primeiro vale. E
quanto mais conhecimento você tiver, mais confuso ficará - porque não há meios de decidir o
que é verdade. Tudo que você ouve, se corretamente posto frente a você, se for feita a
colocação lógica, parecerá certo. Não há outro jeito de decidir, não há critério. É por isso que
continua acontecendo. Você vai a um mestre, ouve-o e ele parece certo. Então, vai até outro
mestre, ouve-o e ele também parece certo. Você lê um livro e ele lhe parece certo; lê outro
livro e lhe parece certo; você lê outro livro - talvez o oposto - e isso também tem a sua lógica,
parece certo. Não há jeito de decidir o que é certo. E se você for acumulando, você irá
acumulando contradições - relatos opostos. E há milhões de pontos de vista e, cedo ou tarde,
você se tornará uma multidão de muitas filosofias e sistemas. Isso não vai ajudar. Isso se
tornará o grande obstáculo.
A primeira coisa no vale do conhecimento é que é necessário permanecer
alerta e estar enfaticamente interessado na capacidade de conhecer - não com o objeto, não
com o conteúdo. A ênfase é no testemunho, é preciso estar mais e mais alerta e consciente
para se tornar um conhecedor. Não por saber mais coisas, mas apenas por se tornar mais
alerta é possível se tornar verdadeiramente um conhecedor.
O caminho do conhecimento não tem nada a ver com escrituras, opiniões,
sistemas, crenças. Tem a ver com a capacidade de conhecer - você pode conhecer. Você tem
uma imensa energia de tornar-se consciente. Não se preocupe com o conhecido, interessese pelo conhecedor. O conhecimento é um fenômeno de duas setas. Uma seta aponta para o
conhecido e outra aponta para o conhecedor. Se você continuar a olhar para o conhecido,
estará perdido no vale. Se começar a olhar para o conhecedor, você não pode estar perdido,
você estará apto a transcender o vale. E uma vez que você transcenda o vale do
conhecimento, haverá uma imensa alegria - porque você compreendeu algo muito essencial
em você, algo que vai permanecer até o fim, algo que é muito fundamental: a capacidade de
conhecer, a capacidade de ser consciente.
Então, se você examinar o conhecedor, se se tornar mais alerta sobre o
conhecedor, você usou o positivo.
O segundo vale é chamado o vale do arrependimento.
Quando você começa a examinar quem você é surge, naturalmente, grande
arrependimento. Devido a tudo que você tem feito de errado, devido a tudo que você fez e não
devia ter feito, você começa a sentir arrependimento. Um grande pico vem com a percepção mas, de repente, com a percepção, a consciência surge. Lembre-se, a consciência que você
tem não é consciência verdadeira. É uma moeda falsa; ela é dada pela sociedade.
As pessoas lhe disseram o que é certo e o que é errado; o que é moral e o que é
imoral. Você não sabe exatamente o que é moral e o que é imoral. Mas, após cruzar o
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primeiro vale, você terá capacidade de saber exatamente o que é certo e o que é errado. E de
repente, você verá o que tem feito de errado - quantas pessoas você tem machucado, quão
sádico você tem sido com os outros, quão masoquista tem sido com você mesmo, quão
destrutivo, violento, agressivo, raivoso, ciumento você tem sido até agora. Tudo isso virá para
a sua visão. Isso é um produto secundário do tornar-se consciente - a consciência surge.
Esta consciência não tem nada a ver com a consciência comum que você tem essa é emprestada. Você pode tê-la e entretanto, ela não magoa; ela não lhe dá uma dor tão
verdadeira que pode transformá-lo através dela. Você apenas sabe mais ou menos o que é
certo e continua a fazer o errado, continua a fazer o que você quer. O seu conhecimento do
certo não faz a menor diferença para você. Você sabe que a raiva é mau, mas você continua
raivoso. De um lado, você sabe que a raiva é má, de um lado você continua a ser raivoso, não
há problema. De um lado você sabe que a possessividade não é boa, e de outro lado, você vai
amontoando, você vai possuindo - não apenas coisas, mas começa a possuir pessoas. Você
possui a sua esposa, o seu marido, seus filhos - come se eles fossem coisas, como se
pudessem ser possuídos. Você destrói através da sua possessividade, e você sabe que é
errado.
Esta consciência emprestada não ajuda, ela simplesmente oprime você. Com a
passagem pelo primeiro vale, a sua própria consciência surge. Agora voce sabe exatamente
o que está errado e se torna impossível ser de outra maneira.. É aqui que o ditado socrático se
torna significante - "conhecimento é virtude".
Agora, a parte negativa do vale do arrependimento...A parte negativa é que
você pode se tornar muito preocupado com a culpa referente ao passado - que você fez isto e
aquilo errado, que você tem feito milhões de coisas erradas. Você tem estado inconsciente
aqui por tanto tempo que, se começar a contar tudo, criará uma espécie de morbidez. Você se
tornará tão culpado que, em vez de crescer, cairá em profunda escuridão. Então, se a culpa
surgir e você se tornar muito mórbido e muito preocupado com o passado, você permanecerá
no segundo vale. Você não será capaz de ultrapassá-lo. Se o passado se torna tão
importante, então, naturalmente você começará a chorar e gemer continuamente, batendo
no peito e dizendo "quão errado eu tenho sido!!!".
A parte positiva tem a ver com o futuro, não com o passado. Sim, você percebeu
que tem sido errado, mas isso era natural, porque você era inconsciente. Não há
necessidade de sentir culpa. Como se pode ser certo quando se é inconsciente? Você
percebeu isso - que todo seu passado foi errado - mas isso não cria um peso em seu peito.
Você percebeu. Esse perceber ajuda-o, porque você não será capaz de fazê-lo novamente você parou com isso. Você sente tristeza por ter magoado tantas pessoas de tantas
maneiras, mas sente alegria também; simultaneamente, porque agora isto não acontecerá
mais. Você se livrou do passado e da culpa! Você não está preocupado sobre isso, você está
interessado no futuro, na nova abertura.
Agora você tem a sua própria consciência; agora, o futuro vai ser totalmente
diferente, qualitativamente diferente, radicalmente diferente. Você estará vibrando com a
aventura. Agora você tem a sua própria consciência e a sua consciência nunca permitirá que
você erre novamente. Não é que você tenha que controlar - quando a consciência verdadeira
surge, não há necessidade de controlar, não há necessidade de disciplinar. O certo se torna a
coisa natural. Então, o fácil é o certo e o certo é o fácil.
De fato, quando a consciência surgir em você, se você quiser agir errado, terá
de fazer grande esforço. E mesmo assim não há muita possibilidade de ter sucesso.
Sem a sua própria consciência, você tem que fazer muito esforço para ser
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certo, e mesmo assim não tem sucesso. Então, se fica estremecido. A pessoa se sente triste
pelo passado, mas não mais se está oprimido, porque o passado não existe mais. Esta é a
parte positiva - se pode sentir que a transformação ocorreu, que as bênçãos chegaram, que
Deus lhe deu o imenso presente da consciência. Agora, a sua vida se moverá numa
dimensão totalmente nova, numa rota nova.
Isso acontece quando a verdadeira moralidade nasce, a virtude, sheela.
O terceiro vale...o terceiro vale é chamado de vale das pedras de tropeço.
Uma vez que a consciência tenha surgido, agora você estará apto para ver
quantas pedras de tropeço existem. Você terá olhos para ver quantos obstáculos existem. Há
paredes sobre paredes. Há portas também, mas são poucas e longe umas das outras. Você
estará apto para ver todas as pedras de tropeço.
Al-Ghazzali diz que elas são quatro: em primeiro lugar, o mundo sedutor - o
mundo das coisas. Elas são muito fascinantes. A ambição é criada. Porque todas as religiões
vem dizendo que é necessário ir além das tentações mundanas? Porque se você está
tentado pelas coisas do mundo e você deseja demais coisas mundanas, você não terá
energia suficiente para desejar Deus. Seu desejo será perdido em coisas.
Um homem que deseja uma grande casa, uma grande conta bancária, grande
poder no mundo e prestígio, põe todo seu desejo, suas energias, no mundo. Nada é deixado
para buscar Deus.
As coisas, em si próprias, não são más. Os sufis não são contra as coisas,
lembre-se. Os sufis dizem que as coisas são boas em si próprias, mas quem começou a
buscar Deus e a verdade definitiva não pode ter recursos para elas. Você tem uma certa
qualidade e uma certa quantidade de energia. Toda a energia precisa ser dirigida para um
desejo. Todos os desejos tem que se tornar um, só assim se pode chegar a Deus, só assim
você pode superar este terceiro vale.
Comumente, nós temos muitos desejos. A pessoa religiosa é aquela que tem
um único desejo, em que todos os outros desejos deságuam num único desejo imenso como pequenos rios que deságuam formando o Ganges. - desse jeito. Uma pessoa religiosa
é aquela em que todos os outros desejos se tornaram um: ela deseja apenas Deus, ela
deseja apenas transcendência.
Assim, a primeira é o mundo das tentações; a segunda é gente - a fixação, a
atração por pessoas.
De novo, lembre-se, os sufis não são contra pessoas, mas dizem que não se
pode ficar ligado as pessoas. De outro modo, a própria fixação se transforma num obstáculo,
uma pedra no caminho de Deus. Esteja com a sua mulher, com o seu homem, com os seus
filhos, com os seus amigos, mas lembre-se que somos todos estranhos aqui e que a nossa
proximidade é acidental. Nós somos viajantes e nos encontramos na estrada. Por alguns dias
talvez fiquemos juntos - agradeça a isso - mas, cedo ou tarde os caminhos se separam. Sua
esposa morre, ela vai no seu próprio caminho e você não sabe aonde. Ou, sua esposa se
apaixona por outra pessoa e seus caminhos se separam. Ou você se apaixona por outra
pessoa. Ou seu filho cresce e toma a direção da própria vida e se afasta de você - todo filho
precisa se mover para longe dos pais.
Nós estamos juntos nesta estrada apenas por uns poucos dias e o nosso estar
juntos é acidental. Não há nada eterno. Esteja com as pessoas, seja afetuoso, tenha
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compaixão com as pessoas, mas não se torne apegado - de outro modo, o apego não lhe
permitirá liberdade suficiente para ir além.
Então, o segundo é pessoas, ligações. O terceiro Al-Ghazzali chama satan e o
quarto, ego.
Por satan fica entendido que é a mente - a mente que você acumulou no
passado. Embora a consciência tenha surgido, embora você tenha se tornado mais
consciente do que nunca, o mecanismo da mente ainda existe, a espreita. Ela ainda ficará a
espreita por algum tempo. Esteve com você tanto tempo que não pode deixá-lo
repentinamente. Leva tempo. E a mente espera e vigia - se alguma oportunidade surgir, ela
imediatamente saltará e tomará posse de você. Ela tem sido o seu mestre, você tem atuado
como um escravo. A mente não pode aceitar que você tenha se tornado um mestre tão de
repente. Leva tempo.
A mente é um mecanismo, existe sempre. Para o buscador, a mente é o
demônio. Todas as histórias sobre o demônio não são nada mais que histórias sobre a mente.
O demônio - ou satan, como os sufis chamam o demônio - é apenas um nome mitológico para
a mente.
Quando o demônio tenta Jesus, você pensa que algum demônio está lá, em
algum lugar? Não seja tolo! Não há nenhum demônio do lado de fora. A tentação estava vindo
da própria mente de Jesus. A mente diz: "Agora que você se tornou tão miraculosamente
poderoso, porque se preocupar com as outras coisas? Porque não ter o reino do mundo
todo? Você pode tê-lo! Está dentro dos seus escopos. Voce pode possuir o mundo todo, você
tem muito poder. Você está muito alto espiritualmente. Seus siddhis estão quitados. Você
pode ter todo o dinheiro e todo o prestígio que quiser. Porque se preocupar com Deus e
religião? Use esta oportunidade. A mente está tentando.
E quando Jesus diz: "Não venha em minha direção! Vá embora!" ele não está
falando para algum demônio externo. Ele está simplesmente dizendo a mente: "por favor,
não se aproxime do meu caminho. Eu não estou mais preocupado com os seus desejos, eu
não estou preocupado com os seus projetos eu estou em uma jornada totalmente diferente.
Voce não sabe nada a respeito dela, fique quieta!".
E o quarto é o ego - uma das maiores pedras de tropeço no caminho dos
buscadores. Quando você se torna um pouco consciente, quando a sua consciência surge, e
você começa a ver as pedras de tropeço, um grande ego - não se sabe de onde - de repente,
toma posse de você: "eu tornei um santo, um homem muito sábio! Eu não sou mais comum,
eu sou extraordinário!" E o problema é que você é extraordinário! É verdade! O ego pode
prová-lo. Este é o grande problema, porque o ego não está falando coisas sem sentido. Ele é
sensível. É exatamente assim!
Entretanto, é necessário estar alerta, porque se você se atrapalha com o ego,
com a idéia de que "Eu sou extraordinário!", então você ficará sempre no terceiro vale. Você
nunca será capaz de chegar ao quarto, e o quarto trará mais flores e mais picos, picos mais
altos e grandes alegrias - e você perderá.
Este é o lugar onde siddhis - forças espirituais - tornam-se a mais
obstaculizante coisa.
A parte negativa é começar a lutar com essas pedras de tropeço. Se começar a
lutar, você ficará perdido no vale. Não há necessidade de lutar. Não crie inimizade.
Compreender, apenas, é suficiente.
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Lutar significa repressão. Você pode reprimir o ego, você pode reprimir a sua
ligação com as pessoas, você pode reprimir a sua ambição por coisas, você pode reprimir o
seu satan, mas aquilo que for reprimido permanecerá, e você não será capaz de entrar no
quarto vale.
Apenas aqueles que não tem repressões entrarão no quarto vale. Então, não
comece reprimindo.
A parte positiva é: tome o desafio - que o ego está desafiando você. Não tome
isso como uma inimizade, em vez disso, tome-o como um desafio para ir além. Não lute com
ele; compreenda-o. Olhe profundamente dentro dele. Olhe para o mecanismo: como ele
funciona, como este novo ego está surgindo em você, como a mente continua a jogar com
você, como você se torna ligado as pessoas, como você se torna ligado as coisas. Olhe como
ele é com fria observação, sem antagonismos. Se você se tornar antagônico, está pego. Se
você se tornar indulgente, está pego. E estas são as duas coisas mais fáceis. As pessoas
conhecem apenas duas coisas: ou sabem como se tornaram amigas, ou como se tornaram
inimigas. Esta é a única compreensão comum possível.
A terceira coisa ajudará. Seja vigilante, uma testemunha; nem amigo, nem
inimigo. Seja indiferente. Apenas perceba que eles existem, porque se tomar qualquer
atitude sentimental - contra ou a favor - os sentimentos se transformarão em cadeias.
Sentimento quer dizer que você se atou. Lembre-se, você está tão atado aos seus inimigos
quanto aos seus amigos. Se seu inimigo morre, você sentirá tanta saudade quanto você
sentiria do seu amigo - as vezes até mais, porque ele estava dando algum sentido a sua vida.
Lutando com ele você estava curtindo uma viagem. Agora ele não mais existe. O ego que
estava sendo preenchido pela luta nunca mais será preenchido novamente. Você terá que
encontrar um novo inimigo.
Então, não faça inimigos e não faça amigos. Apenas veja. Seja muito científico
no observar. Esta é a coisa positiva a fazer. Explore o que é o ego, e explore alegremente.
Então, chega o quarto vale: o vale das tribulações.
A entrada dentro do inconsciente acontece no quarto vale. Até agora você
estava confinado no mundo do consciente. Agora, pela primeira vez, você entrará nos mais
profundos campos do seu ser, o inconsciente, a parte mais escura, a parte da noite. Até
agora, você estava na parte do dia. Era mais fácil. Agora, as coisas se tornarão mais difíceis.
Quanto mais alto você vai, mais terá que pagar. Com cada degrau mais alto, a jornada se
torna mais árdua e a queda mais perigosa. E se precisa estar mais alerta. Em cada degrau,
mais consciência será necessária, porque você estará se movendo em planos mais altos.
O vale das tribulações é a entrada no inconsciente. É a entrada naquilo que os
místicos cristão chamam de "a noite escura da alma". É a entrada dentro do mundo louco que
você esconde de você mesmo. É muito misterioso, é muito caprichoso, bizarro. Até o terceiro
vale, um homem pode seguir sem um mestre, mas não além do terceiro. Até o terceiro pode
se ir por conta própria. No quarto vale um mestre é uma necessidade.
E quando eu digo que se pode ir até o terceiro por conta própria, não quero dizer
que se tem que ir e também não quero dizer que todo mundo estará apto a ir. Eu estou
simplesmente falando de uma possibilidade teórica. Até o terceiro vale é teoricamente
possível que se possa seguir sem um mestre. Mas com o quarto um mestre se torna uma
necessidade absoluta. - porque agora você estará as apalpadelas num quarto escuro. Você
não tem nenhuma luz própria que possa usar nesta escuridão. A luz de alguém será
necessária - alguém que entrou dentro desta noite escura e pelo qual se tornou possível ver
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nessa escuridão.
A parte negativa do vale das tribulações é a dúvida - grande dúvida surge! Você
não sabe o que é a dúvida, você não sabe ainda! Tudo o que você pensa que é dúvida não é
mais que cepticismo, não é dúvida. A dúvida é um fenômeno completamente diferente.
Alguém diz: "Deus existe!"; você diz: "Eu duvido". Você não duvida. Como você
pode duvidar? Você está sendo apenas céptico. Você está só dizendo "Eu não sei". Em vez
de dizer "eu não sei", você está usando a palavra muito forte "dúvida". Como você pode
duvidar? A dúvida é possível quando você está encarando uma realidade.
Por exemplo, você nunca viu um fantasma. E você diz: "Eu duvido da existência
de fantasmas". Isto não é dúvida, é apenas ser céptico. Você está simplesmente dizendo: "eu
nunca cruzei com nenhum, então, como posso acreditar? Eu duvido. "Isso não é dúvida.
Dúvida será quando, um dia passando pelo cemitério, você de repente cruza com um
fantasma! Então todo o seu ser será sacudido. Aí sim você estará em verdadeira dúvida,
tentando saber se aquilo que vê é realidade ou alucinação.
A dúvida é muito existencial; o cepticismo é intelectual. O cepticismo está só na
mente; a dúvida entra no seu próprio ser, todo o seu corpo-mente-alma. Sua estabilidade é
sacudida.
Nessa noite escura da alma, a dúvida surge. Dúvida sobre Deus - por você
estava buscando por mais luz e acontece isso, justo o oposto. Você estava procurando por
êxtase e caiu na noite escura. Uma grande dúvida surge sobre se você está certo, sobre se
esta procura tem valor - porque você buscava ouro, você buscava luz, e iluminação, e
nirvana, e samadhi, e satori, e ao invés de satori e samadhi, esta noite escura envolveu você.
Mesmo aquelas luzes que costumavam existir não existem mais. Mesmo aquelas certezas
que costumavam existir não existem mais.
Você costumava saber algumas coisas; agora você não sabe nada. Você tinha
certa segurança. Até isso se foi. A própria terra escorregou sob os seus pés; você está se
afogando. Então, a dúvida surge. Aí, você começa a sentir que talvez toda esta imagem
religiosa seja insensata, talvez não haja Deus, talvez você esteja se enganando, talvez você
tenha escolhido algo absurdo. Seria melhor viver no mundo, ser do mundo. Seria melhor ter
muito mais coisas: curtir o poder, o dinheiro, o sexo. O que eu fiz? Eu perdi tudo e este é o
resultado?
Para todo buscador este momento chega. E se surge esta dúvida, então,
naturalmente, o buscador começa a defender-se contra a escuridão. Cria-se uma armadura
em volta de si mesmo contra a escuridão, a escuridão invasora. É preciso proteger-se, se
você fizer isso, será jogado de volta a parte consciente da mente. Você perderá o mistério da
escuridão. A luz é linda, mas não é comparável com a escuridão. A escuridão é mais linda,
mais fria, mais profunda. A escuridão tem profundidade, a luz é rasa. E a menos que você seja
capaz de dar as boas vindas a escuridão, você não será capaz de dar as boas vindas a morte.
Então, a primeira coisa é que você tem que dar as boas vindas, aceitar, relaxar.
Esta escuridão é o primeiro vislumbre de Deus. É escuro, mas, mais tarde, você
compreenderá que não era escuro. É que, na verdade, pela primeira vez você abriu os olhos
em direção a Deus e era muito deslumbrante, é por isso que parece escuro. Não era escuro; a
escuridão era a sua interpretação.
Olhe para o sol por alguns segundos e logo você estará cercado pela escuridão.
É demais, você não pode encará-lo. Um homem pode ficar cego se olhar muito para o sol.
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Olhe para o sol durante alguns segundos e então entre em casa: você encontrará toda a casa
cheia de escuridão. Há um momento, você estava lá e podia ver tudo. Agora, não pode ver
nada; você tropeçará nas coisas.
Aquilo que está escuro é interpretação. É natural. Mais tarde, quando
ultrapassar o vale, você estará apto para olhar para trás e ver a realidade. Só um mestre pode
pegar na sua mão nesta noite escura da alma e torná-lo confiante, pode dizer e convencê-lo: "Não se preocupe. Apenas parece escuro, não é escuro. É o primeiro encontro com Deus.
Você está chegando mais perto."
Há três coisas para serem compreendidas: sono, morte e samadhi.
O sono é como a morte. No oriente, nós dizemos que ele é uma morte pequena,
minúscula. Nós morremos toda noite e desaparecemos na noite escura. Então, chega a
morte - uma morte muito maior que o sono. O corpo desaparece, mas a mente permanece e
nasce novamente. Aí, vem a última morte, a morte definitiva - samadhi - quando o corpo
desaparece, a mente desaparece e apenas o mais recôndito cerne, a consciência,
permanece. Esta é a morte definitiva.
No quarto vale você se depara com o primeiro vislumbre de como a morte
definitiva vai lhe acontecer. Se você a rejeitar, se você defender-se contra ela, se você criar
uma armadura, você será jogado de volta ao terceiro vale e você perderá. E uma vez que
tenha perdido o quarto, você sempre terá medo de ir novamente através dele.
Minha observação sobre as pessoas é que as que entraram no quarto vale em
alguma de suas vidas passadas e ficaram muito amedrontadas e escaparam, são as pessoas
que sempre tem medo de alguma coisa mais profunda. Amor - e eles tem medo. Orgasmo - e
eles terão medo. Amizade - e assim por diante; além disso, eles terão medo. Discipulado - e
eles terão medo. Rendição - e eles terão medo. Prece - e eles terão medo. Eles terão medo de
todas aquelas coisas que poderão traze-los de volta ao quarto vale. Eles podem não estar
conscientes do que é que tem medo.
O quarto vale é muito importante porque está no meio. Há sete vales, o quarto
está bem no meio. Três estão deste lado e três estão daquele lado. O quarto é imensamente
importante; ele é a ponte. O mestre é necessário nesta ponte porque você passa do
conhecido para o desconhecido, do finito ao infinito, do insignificante ao profundo.
A parte positiva é a confiança, a rendição. A parte negativa é a dúvida, a defesa.
O mestre começa a ensinar você sobre confiança e rendição desde o começo, então, aos
poucos, isso se torna a sua atmosfera - porque isso será necessário quando você entrar no
quarto vale.
Às vezes, as pessoas vem a mim e dizem: "Porque não podemos ficar aqui sem
rendição? Porque não podemos meditar e ouvir o senhor e sermos beneficiados o tanto
quanto quisermos? Qual é o objetivo da rendição?"
Eles não compreendem. No começo, pode não parecer tão relevante. Porque?
Para que? Você pode me ouvir sem se render e você pode meditar aqui sem rendição. Parece
perfeitamente ok . A rendição parece não ser necessária. Mas, você não sabe o que vai
acontecer no futuro. Para isso, a preparação tem que começar agora mesmo. Você não pode
esperar por aquele momento. Se a preparação não for feita antes, você perderá. Então,
quando o tempo chegar, quando a sua casa estiver em chamas e você ainda não tiver cavado
o poço, você começará a cavá-lo, mas só irá terminá-lo quando a casa já tenha se
transformado em cinzas.
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É necessário cavar o poço antes da casa pegar fogo! Agora, pode não parecer
relevante. Eu posso entender. Logicamente, isso não é relevante neste momento. Ouvindome, porque é necessária a rendição? Mas, quando você entrar no quarto vale, a rendição
será necessária. E você não pode aprender repentinamente os caminhos da rendição. Você
tem que ir aprendendo antes da necessidade surgir. A rendição tem que se tornar a sua
atmosfera.
O Quinto Vale...o vale trovejante.
No quinto vale você entra na morte. No quarto vale você entrou no sono, na
escuridão; no quinto você entra na morte. Ou, se você gostar de usar terminologia moderna,
no quarto você entra no inconsciente pessoal, no quinto você entra no inconsciente coletivo.
Surge um grande medo porque voce está perdendo a sua individualidade.
No quarto você estava perdendo luz, dia, mas você existia. No quinto você está
se perdendo - você não sente como se existisse, você está se dispersando, você está se
fundindo. Seu sentimento de que "eu sou um centro" começa a se tornar vago, enevoado.
Com a entrada na morte, com a entrada no inconsciente coletivo surge um
grande medo, grande angústia é sentida - a maior angústia que você jamais sentiu - porque
surge a questão: ser ou não ser? Você está desaparecendo, todo o seu ser desejará ser. Você
gostaria de voltar ao quarto vale. Era escuro, mas pelo menos era bom - você existia lá.
Agora, a escuridão se tornou mais densa. Não apenas isso, você está desaparecendo dentro
dela. Logo, nenhum traço seu existirá.
A parte negativa é agarrar-se ao ser. É por isso que grandes professores - Buda
ou Jalaludin Rumi - insistiam: - "Lembre-se, não-ser, "anatta". Os sufis o chamavam de fana desaparece-se. E podemos estar preparados para este desaparecimento, podemos estar
prontos - não apenas prontos mas muito receptivos. Isso trará grande alegria , porque toda a
sua miséria está contida no seu ego. A própria idéia de que "Eu sou" cria todos os tipos de
ansiedade e problemas para você. O ego é o inferno.
Jean Paul Sartre disse: "O inferno são os outros". Isso não é verdade. O inferno
é você, o inferno é o ego! Se os outros parecem o inferno, eles parecem o inferno também por
causa do ego - porque eles machucam continuamente. Eles vão apertando os seus botões.
Porque você tem esta ferida do ego, todos parecem machucar você. É apenas sua a idéia de
que 'Eu sou especial" e quando alguém não o reconhece, isso provoca dor. Quando você não
tem nenhuma idéia de ser especial - o que o povo zen chama de "tornar-se comum" - se você
se torna comum, então este vale pode ser cruzado. Se você se torna ninguém, então este
vale pode ser facilmente cruzado.
Então, a parte negativa é agarrar-se ao ser e a parte positiva é relaxar no nãoser, dentro do nada - estando pronto para morrer, desejosamente, alegremente,
voluntariamente.
Aí vem O Sexto Vale - o vale abismal.
Desaparece-se. No quinto estava desaparecendo; no sexto não mais existe.
Desaparece-se se é apenas memória do passado. No quinto você estava entrando na morte;
no sexto, a morte aconteceu, morreu-se, não mais se existe. É por isso que é chamado de
'vale abismal". É o mais doloroso, porque é o sexto, o penúltimo. Passa-se pela grande dor de
não ser, do nada. Não se pode acreditar - porque em certo sentido , se existe, e num outro
sentido, não mais se existe. O paradoxo chegou ao pico definitivo. Existe-se e não se existe.
Pode-se ver o próprio cadáver - morremos - e ainda assim, sabe-se que estamos vendo, que
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estamos resistindo de algum modo, em algum sentido. Todas as idéias do passado do ser se
tornaram irrelevantes. Uma nova idéia de ser surge.
A morte acontece, desaparecemos. É isso que os cristão chamam de
crucificação. Alcançamos o nada, somos apenas um céu vazio. Os hindus o chamam de
samadhi, o povo zen o chama de satori.
E a parte negativa reclama. Será bom relembrar vocês. Na crucificação, Jesus
Cristo mostrou ambas as atitudes. Primeiro ele reclamou. Ele olhou para o céu e disse:
"Porque? Porque o Senhor me desamparou? "Porque o Senhor me abandonou? Esta é a
parte negativa. Ele está reclamando. Ele está morrendo e não chega nenhuma ajuda. Ele
está na cruz - e bem lá no fundo devia haver um desejo a espreita, um desejo de que a mào de
Deus viria e tudo estaria ok, e a cruz se tornaria uma coroa e ele desceria numa nova glória.
Em algum lugar devia haver um desejo a espreita, no mais profundo inconsciente de sua
mente - ele poderia nem estar consciente dele. Ele esperou suficientemente, a última
questão chegou. Ele carregou a cruz nas montanhas, ele sofreu todos os tipos de
humilhação, mas ele esperou, esperou pacientemente - esperou por este momento. Agora as
suas mãos foram pregadas. É uma questão de segundos e ele terá ido. Não há mais tempo
para esperar e a ajuda não veio...e Deus não está visível. Por isso o grito "Porque me
desamparaste? Porque me abandonaste?" Esta é a parte negativa, natural até num homem
como Jesus.
Se você pensa no seu passado e reclama - "Eu tenho feito tudo o que me foi
pedido, tudo o que me foi ordenado fazer. Eu o segui cegamente, e é este o resultado? É esta
a realização?"
A parte positiva é gratidão profunda. Com a segunda parte, a parte positiva,
esquecemos o passado, olhamos para o futuro e confiamos. O último teste chegou, o teste
definitivo, e nos sentimos gratos de que "se for este o seu desejo, seja feita a sua vontade". É
isso o que Jesus fez. Ele mostrou ambas as atitudes. Primeiro, ele mostrou a negativa - o que
é muito humano. É por isso que ele costumava dizer sempre :"Eu sou o filho do homem".
Tantas vezes quantas disse "Eu sou o filho de Deus" , ele disse "eu sou o filho do homem".
Ele era a eternidade entrando no tempo; ele era o além vindo para o mundo. Ele
pertencia a ambos, o mundo e o além. É como cada mestre se relaciona - com ambos. Um pé
está num mundo, o outro pé está no outro mundo. E no dia da crucificação naquele momento
em que tudo estava desaparecendo, Jesus mostrou as duas atitudes. Primeiro ele mostra a
atitude de ser "Filho do Homem". Ele diz :"Porque? Porque me abandonaste? Eu esperei, eu
orei, eu vivi uma vida de virtude - e essa é a realização? Essa é a recompensa?"
Mas imediatamente ele compreende que está se perdendo. Se é esse o desejo
de Deus, então tem que ser assim. Ele se rende. A parte positiva é gratidão, rendição.
Com "Porque me abandonaste?" ele reconhece a sua queixa, a sua
humanidade. Ele deve ter rido naquele momento, ele deve ter visto a sua limitação como ser
humano, e jogou-a fora. Imediatamente ele disse, sua declaração imediata: "O reino veio.
Assim seja". Agora ele não mais existe. Agora ele não tem desejo próprio.
E então vem O Sétimo Vale, que é o último, o definitivo o vale dos hinos, o vale
da celebração.
Renascimento, ressurreição, acontecem no sétimo vale. É esse o significado
da idéia cristã da ressurreição - que Cristo renasceu, renasceu num corpo de glória, renasceu
num corpo de luz, renasceu num corpo divino. Agora, não há positivo, não há negativo. Agora,
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não há dualidade. Um é um. A unidade surgiu - o que os hindus chamam de adwaita. O dual
desapareceu. Chegamos em casa.
O vale dos hinos...Al-Ghazzali lhe deu um bonito nome. Nada restou - apenas
uma canção, uma canção de celebração, de louvor a Deus, total êxtase. É isto o que eu
chamo de orgasmo definitivo.
Se eu fosse dar um nome a este vale, eu o chamaria vale do orgasmo total. Há
apenas celebração. Florescemos, florimos. A fragrância foi liberta. Agora, não há lugar algum
para ir. O homem se tornou aquilo que estava buscando, procurando, lutando.
O homem é um paradoxo. Ele não é o que é. Mas, no dia em que você
compreender o definitivo, você sentirá um sorriso surgindo no seu próprio coração, porque aí
você saberá que você sempre foi isso. Era apenas desconhecido. O futuro estava contido em
você, escondido. Você teve que descobri-lo. Estes sete vales são os vales da descoberta.
Este é um lindo mapa. É o mapa sufi.
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Os Sete Vales: por Osho