Caso Clínico: Convulsão Febril Coordenação: Dra Luciana Sugai Apresentação: André M. Souza www.paulomargotto.com.br Brasília, 29 de julho de 2011 Identificação • DSM, masculino, 1 ano e 1 mês, natural e procedente de Taguatinga-DF; • Admissão: 11/06/07; • Queixa principal: “Crise convulsiva há 1 hora”. História da Doença Atual • Mãe refere que há cerca de 9 dias criança recebeu diagnóstico de Otite Média Aguda (OMA) à Direita. • Fez uso de Amoxacilina por 9 dias, evoluindo com melhora do quadro, permanecendo afebril por 6 dias. • Em 11/06/07 refere pico febril de 38.1°C, que cedeu com uso de ibuprofeno. • No período noturno apresentou novo pico febril de 39.9°C, associado a crise convulsiva: – Desvio conjugado do olhar; – Tremor de extremidades; – Sialorréia; – Nega liberação esfincteriana. • Procurou atendimento imediato. Antecedentes Pessoais • Mãe: G4P3A1, realizou pré-natal (cartão com questionamento de toxoplasmose na gestação); • Parto normal, sem intercorrências: • APGAR 8/9; • Peso ao nascer: 2420g; • Estatura: 44,5cm; • PC: 33cm; • Amamentação exclusiva até 5 meses; • Calendário Vacinal atualizado. Antecedentes Patólogicos • 1 mês – pneumonia aspirativa associado a crise convulsiva; • 10 meses – crise convulsiva febril; • Nega doenças exantemáticas; • Pais e irmãos saudáveis. História Social • Reside em apartamento com mais de 5 cômodos; • Possui animais de estimação em domicílio. Exame Físico • FC: 120bpm - Tax: 38,6°C; • BEG, corado, hidratado, eupnéico, ativo, acianótico, anictérico, febril; • ACV: RCR, 2T, BNF, s/ sopros; • AR: MVF, s/ RA. • ABD: Semigloboso, flácido, fígado a 1,5cm do rebordo costal direito. Traube livre. RHA presentes. Exame Físico • Extremidades bem perfundidas, sem edemas; • Pele: dermatite em área de fraldas, sem petéquias; • SNC: ausência de sinais meníngeos. Exames Complementares • Hemograma completo (12/06/07) : – Hb: 12,4g/dL – Ht: 35,2%; – Leuc.: 30.300/uL – Seg (79%), Bst (10%), Linf (8%), Mono (2%), Eos (1%); – Plaq: 434.000/uL; – VHS: 37mm; – Na: 133 - K: 3,9 - Cl: 105; • Punção Lombar: líquor normal. Convulsão Febril Descrição • As convulsões febris (CFs) ocorrem com febre na ausência de uma causa identificável para a convulsão, como: – Infecção do SNC – Anormalidade neurológica ou metabólica – Toxicidade por drogas • Ocorrem em crianças de 6 meses – 5 anos de idade (alguns extendem de 3 meses – 7 anos). • Geralmente são benignas e têm um bom prognóstico. Descrição • • • • É a causa mais comum de convulsão na infância. Normalmente ocorre no primeiro dia de febre. Febres >38°C, sendo que 75% são >39°C. Nenhuma outra etiologia para a convulsão pode ser identificada. Descrição • Subdividida em 2 grupos: – Simples/típicas (85%): são generalizadas, duração < 15 min, ocorrem dentro de 24h do início da febre. – Complexas (15%): > 15 min, ocorrem depois de 24h do início da febre, ou quando ocorrem várias convulsões em 24h. • O período pós-ictal em geral é breve. • Convulsões complexas devem ser bem investigadas. Epidemiologia • Prevalência: 2 – 4% das crianças abaixo de 5 anos nos EUA. • Idade: em torno dos 6 meses – 5 anos, com maior incidência durante o segundo ano de vida. • Gênero: leve predominância do sexo masculino. Epidemiologia • Genética: incidência aumentada (2-3X) nos parentes de primeiro grau dos pacientes com CF ou com alguma desordem convulsiva. • Um padrão autossômico dominante foi demonstrado em algumas famílias, mas a expressão é variável e a penetrância é incompleta. Epidemiologia • Geografia: ocorre ao redor do mundo, algumas populações do Pacífico têm taxas mais elevadas (150/1000). • Condição sócio-econômica: condições que favorecem doenças febris podem levar a um aumento da incidência. Possíveis Causas • A febre diminui o limiar em crianças susceptíveis, podendo estar relacionada com: – A imaturidade do SNC – Fatores induzidos pela febre (ex: interleucina 1 beta), que podem atuar como pró-convulsivantes – Canais iônicos cerebrais sensíveis à temperatura • Obs: hiperventilação e alcalose induzidas pela hipertermia também podem estar relacionados às CFs. Fatores de Risco • Fatores de risco: – História de convulsão febril em outro filho < 5 anos – Febre alta e história familiar de convulsões febris • História prévia de desenvolvimento neurológico anormal não necessariamente aumenta o risco para uma convulsão febril inicial, mas aumenta o risco de recorrência. Medidas Preventivas • Prevenção de doenças infecciosas. • Boa higiene familiar, evitar ambientes onde existe maior chance de contaminação. • Boa nutrição e ingesta adequada de vitaminas e minerais (ex: ferro). • Aleitamento materno. • Não há restrições vacinais. • Prudente dar antipiréticos nas 24 – 48h após as imunizações (principalmente DTP e SCR) a fim de reduzir chance de febre. Diagnóstico • Em geral, é de exclusão. • Critérios: – O diagnóstico, em geral, pode ser feito a partir de cuidadosa história e exame físico. – Convulsão associada à febre > 38°C em crianças de 6 meses – 5 anos, sem outra etiologia. – Em < 18 meses e, principalmente, em < 12 meses deve-se considerar fortemente a punção lombar para excluir chance de meningite. Outros testes diagnósticos são raramente necessários. Quadro Clínico • Sintomas: – 25% dos casos, não haverão outros sintomas além da febre. – O paciente pode ter sintomas da doença subjacente. • Sinais: – Normalmente febre >38°C – 75% dos pacientes têm febre >39°C Quadro Clínico • A maioria dos pacientes têm convulsões tônico-clônicas, mas quadros tônicos, clônicos, ou atônicos, isoladamente, podem ser observados. • 85% dos pacientes têm crises simples: – Generalizada, < 15 minutos, dentro de 24 horas do início da febre, e um episódio em 24h. • 15% têm convulsões complexas: – Episódios múltiplos dentro de 24h, >15 minutos de duração, e/ou com sinais focais (<5%). – Nestes casos, lembrar de considerar outras causas de convulsões. • O padrão usual é um breve estado pós-ictal com rápida recuperação. Quadro Clínico / Exame Físico • Avaliar sinais de meningismo. • Avaliar sinais de trauma ou aspiração devido à convulsão. • Avaliar sinais neurológicos focais. Testes Diagnósticos • HC, glicemia, eletrólitos, EAS, avaliação toxicológica. • Punção lombar: – Suspeita de infecção do SNC – < 12, < 18 meses podem não demonstrar sinais clínicos • EEG: – Complexas, sinais focais, história de desenvolvimento neurológico anormal. – Após 2 semanas do quadro inicial. • TC / RNM: – Suspeita de lesões cerebrais traumáticas – Déficits neurológicos focais Diagnóstico Diferencial • • • • Infecção do SNC Outras infecções Outras desordens convulsivas Convulsões devido à arquitetura cerebral anormal • Toxicidade • Defeitos metabólicos • Encefalopatias Tratamento Medidas gerais (5-10 min) Estabilização cervical VAS pérvias – aspiração e intubação, se necessário Oxigenoterapia Posicionamento do paciente – prevenção contra a broncoaspiração Medidas gerais (5-10 min) Estabilidade Cardiocirculatória. Acesso venoso para exames diagnósticos, glicemia capilar e administração de drogas. Buscar abaixar a febre (fisicamente ou com antipiréticos) ao passo em que a crise convulsiva for controlada. Diazepam (dose 1) 0,3 mg/kg/dose P x 0,06 ml EV 5 min Diazepam (dose 2) 5 min Diazepam (dose 3) Pós-BZD (3 doses) Fenitoína (Dose ATAQUE EV) 20 mg/kg P x 0,4 ml 20 min Fenitoína (Dose ADICIONAL EV) até 2 x 5mg/kg Máx: 30mg/kg pós – fenitoína ou pós BZD Fenobarbital sódico (Dose ATAQUE EV) 20mg- 40mg/kg P x 0,2 ml 20 min Fenobarbital sódico (Dose ADICIONAL) 5mg/kg Máx: 30 mg/kg Diazepam Fenitoína Fenobarbital ESTADO DE MAL EPILÉTICO UTI Terapia Intensiva • Midazolam em bomba de infusão contínua. • Entubação orotraqueal e suporte ventilatório. • Investigação mais detalhada do quadro. Tratamento Profilático • Controverso, deve ser acompanhado por especialista. • Tratamento contínuo: – Fenobarbital, 4mg/kg/dia – Ácido Valpróico, 15mg/kg/dia, 2-3x • Tratamento Intermitente (no início da febre): – Diazepam, 0,5 – 1 mg/kg/dia, 2-3x – Clobazam, 0,01-0,09 mg/kg/dia, 2-3x Referências • http://www.paulomargotto.com.br/busca_resulta do.php?busca=convulsao+febril&Submit=Buscar – 09/02/2011, “Convulsão Febril”, Rafael Correia Lopes, orientação Dra Luciana Sugai. – 11/04/2008, “Convulsão Febril”, Vanessa Macedo Silveira Fuck, orientação de Dra Denize Bomfim. • “Febrile seizures”, www.uptodate.com • “Febrile seizures”, www.mdconsult.com • Harrison, TR et al.; Harrison Medicina Interna, 17ªed. Rio de Janeiro: McGraw-Hill, 2008, Vol II, pg. 2502. Consultem também: CRIANÇA QUE CHEGA NO PS EM CONVULSÃO E NÃO SE CONSEGUE ACESSO VENOSO IMEDIATO Midazolam intramuscular versus diazepam endovenoso nas crises convulsivas Joana Cecília, Narcela Maia, Paulo R. Margotto