UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS
MICROMORFOLOGIA DE SÍTIOS CONCHEIROS DA AMÉRICA
DO SUL: ARQUEOESTRATIGRAFIA E PROCESSOS DE
FORMAÇÃO DE SAMBAQUIS (SANTA CATARINA, BRASIL) E
CONCHEROS (TERRA DO FOGO, ARGENTINA)
Ximena Suarez Villagran
Orientador: Prof. Dr. Paulo C. F. Giannini
Co-orientador: Prof. Dr. Jordi Estevez Escalera
TESE DE DOUTORAMENTO
Programa de Pós-Graduação em Geoquímica e Geotectônica
Em convênio de dupla-titulação com a Universidad Autónoma de
Barcelona, Programa de Doctorado en Arqueología Prehistórica
São Paulo
2012 A mi padre
2 Agradecimentos
Agradeço à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP,
processo 08/ 51264-0) e CNPq (processo142532/2008-9) pela ajuda na realização desta
tese. Ao meu querido orientador Prof. Paulo C.F. Giannini, quem modelou a minha
transformação em cientista. Ao Prof. Paulo DeBlasis, por ter me dado a grande
oportunidade de ingressar no mundo dos sambaquis. Aos professores do Museu de
Arqueologia e Etnologia da USP (MAE/USP) que me apoiaram nas minhas pesquisas
de mestrado e doutorado: Marisa Afonso, Levy Figuti, Astolfo Araujo, Eduardo Neves,
Fabíola Silva e Verônica Wesolowski. À Prof. Madu Gaspar (MN/UFRJ) e Prof. Jose
Maria Lopez Mazz (UdelaR) pelo continuo apoio e confiança no meu trabalho.
Devo agradecer a diversos pesquisadores que colaboraram com bibliografias e
comentários: Julieta Gomes Otero (CONICET), Florencia Borella (UNICEN), Cristian
Favier Dubois (UNICEN), Walter Neves (IB/USP), Manuel Arroyo-Kalin (UCL), Jose
Iriarte (University of Exeter), Sergio Netto (UNISUL) e Myrian Alvarez (CONICET).
Agradeço o apoio dos laboratórios de sedimentologia (Labsed), petrografia sedimentar
(Labpetro), microscopia eletrônica de varredura (MEV), tratamento de amostras (LTA)
e laminação do Instituto de Geociências (IGc/USP). Especial agradecimento aos
técnicos Isaac Sayeg, Elaine, José Paulo e Paulinho. Agradeço ao laboratório de
isótopos estáveis (CENA/USP) e ao serviço de microscopia (UAB).
Ao meu co-orientador de tese pela Universitat Autónoma de Barcelona, Prof. Jordi
Estevez e aos colegas da UAB e Departamento de Arqueologia e Antropologia da
Institució Milá i Fontanals (CSIC/ Barcelona): Assumpció Vila, Marco Madella, Andrea
Balbo, Débora Zurro, Juan Jose Ibañez, Xavier Terradas, Ignacio Clemente, David
Ortega, Manuela Perez e Ivan Briz. Aos bons amigos que deixei na Espanha Joana
Boix, Ivana Dragicevic, Ivan Armenteroz, Laura Caruso, Diana Gomes de la Rua, Eva
Benitez, André Colonese e Ester Verdún.
A Danilo Assunção e Kiristen Bright pela colaboração no trabalho de campo. A Profa.
Rosa Maria Poch (UdL) pela imensa ajuda na análise micromorfológica. Ao Prof.
Marco Marquez (UNC), Prof. Luis C.R. Pessenda (CENA/USP), Profa. Deisi Farias
(UNISUL) e Prof. Andres Zarankin (UFMG). A Luciana Scherer, Gina Bianchini,
Tiago Atorre e Josiane Millani Lopez. A Tobias pelas distrações nos finalmentes.
Aos meus amigos! Paula Nishida, Célia Boayadjian, Milene Fornari, Paula Amaral,
Daniela Klokler, Lucelene Martins, Mirian Forancelli, Patricia Fisher, Gislaine da Costa
Fernandez, Jordana Zampelli, Elisangela Morais, Camila Agostini, Caroline Borges,
Camila Constatino, Vanessa Pestana, Sara Nomura, André Sawakuchi, Adriano
Ferreira, Daniel Rodrigues, Glória Garcia, Paula Sucerquia, Johanna Mendez. E as
minhas irmãs do Uruguai Maria Jose Malet, Daniela Perez, Ana Díaz, Tatiana Bulla,
Magella Tiscornia e Lorena Laporta.
Finalmente, o maior gracias à minha linda familia.
3
Resumo O estudo de oito sambaquis do litoral sul do Estado de Santa Catarina e de um
concheiro da Terra do Fogo permitiu entender a dinâmica dos processos de formação de
diferentes tipos de concheiros. No caso dos sambaquis catarinenses, o objetivo principal foi
compreender os processos de formação culturais (atividades humanas) e naturais (tafonômicos)
e suas mudanças ao longo do tempo, a partir da análise estratigráfica de sítios cuja cronologia
envolve todo o período de ocupação humana pré-histórica da região (c. 7400-1000 anos AP).
No caso fueguino, realizou-se o estudo micro-estratigráfico de um concheiro etno-histórico,
para servir como modelo interpretativo na formulação de hipóteses sobre a formação dos
concheiros. Os métodos utilizados para caracterização dos sedimentos arqueológicos incluíram:
granulometria, zooarqueologia, isotopia de C e N (δ13C e δ15N), micromorfologia e microscopia
eletrônica de varredura. Utilizou-se também a analogia experimental com fogueiras acesas em
diversos contextos conhecidos e queima controlada de moluscos.
Três tipos de sambaquis foram analisados: quatro de padrão estratigráfico conchífero;
dois de núcleo arenoso; e dois em montículo ictiológico. A formação do primeiro e terceiro
tipos seguiu um padrão recorrente e contínuo que envolve retrabalhamento de elementos
depositados e queimados em local diferente do final. Estes elementos incluem resíduos
alimentares, como conchas, restos de peixe (ossos e tecidos) e material vegetais (carvões e
plantas de ciclo fotossintético C3), assim como componentes terrígenos relacionados com o
substrato sedimentar nos arredores do sambaqui e com sedimentos provenientes dos bancos de
moluscos explorados. Os sambaquis de núcleo arenoso representam ocupações efêmeras, mas
planejadas. A sua formação envolveu levantamento de montículos de areia e/ou aproveitamento
de dunas eólicas, com posterior deposição de moluscos e resíduos de fogueiras.
Desta análise, extraem-se duas implicações substanciais: 1) o hábito de retrabalhamento
de resíduos pode ter incluído a destruição dos locais de moradia, nunca achados até o momento,
associados aos grandes sambaquis; 2) a correspondência entre o processo de formação
identificado nos montículos ictiológicos e nos sambaquis conchíferos sugere continuidade na
atividade deposicional, apesar da mudança de matéria prima (substituição das conchas por
restos de peixe) e da adoção da tecnologia cerâmica em tempos recentes.
O concheiro etno-histórico analisado para comparação geo-etnoarqueológica foi
formado a partir de ocupações domésticas, recorrentes durante pelo menos um século. A análise
do anel de conchas periférico possibilitou caracterizar micromorfologicamente os episódios de
deposição massiva de conchas, pisoteamento e abandono do sítio. A análise das fogueiras
localizadas na área central do concheiro permitiu identificar estruturas de combustão de
temperatura alta e moderada (superior e inferior a 500° C, respectivamente). A comparação das
microfácies do concheiro fueguino com as microfácies identificadas nos sambaquis catarinenses
mostra diferentes trajetórias pré-deposicionais, relacionadas, no primeiro caso, com a deposição
imediata e secundária de detritos de alimentação nos arredores do local de moradia, e, no caso
dos sambaquis, com a sucessão intrincada de ações de deposição, queima e transporte, associada
à formação de depósitos terciários. Estas observações corroboram a maior complexidade no
processo de formação dos sambaquis.
Palavras-chave: Geoarqueologia; micromorfologia; Santa Catarina; Terra do Fogo; sambaquis;
concheiros; estratigrafia.
4 Micromorphoogy of South American shell sites: archaeostratigraphy and
formation processes of sambaquis (Santa Catarina, Brazil) and concheros (Tierra
del Fuego, Argentina)
Abstract To understand site formation processes in shell sites, eight sambaquis (shell mounds)
from the southern coast of Santa Catarina and one shell midden (conchero) from Tierra del
Fuego were studied. For the sambaquis of Santa Catarina, the aim was to understand the cultural
and natural formation processes (human activities and taphonomy) and the way they changed
through time through the whole period of prehistoric human occupation in the region (c. 74001000 years BP). In Tierra del Fuego, the micro-stratgraphic study of an ethnohistoric shell
midden was done to serve as model for hypothesis on formation processes of shell sites. The
methods used for characterization of archaeological sediments included: grain-size analyses,
zooarchaeology, C and N isotopy (δ13C e δ15N), micromorphology and scanning electron
microscopy. Experimental archaeology was done using different hearths lit on known contexts
and by controlled burning of mollusk shell.
Three types of sambaquis were analyzed: four shell mounds; two sand mounds; and two
fish mounds. Formation of the first and third group followed a recurrent and continuous pattern
of reworking of items, accumulated and burnt in a different location than the final. These items
included food refuse, like shell, fish remains (bone and tissue) and plant material (charcoal and
residues of C3 plants), as well as terrigenous components from the sedimentary substrate of the
surroundings of the site and from the explored shell beds. Sand mounds are ephemeral but
planned occupations. Their formation involved rising of a sand mound and/or occupation over
sand dunes, with deposition of shells and plant remains on top.
Two substantial implications are extracted from this analyses: 1) the reworking of food
residues may be destructing the remains of daily occupations associated with the large
sambaquis, that have never been found to this moment; 2) the correspondence of formation
process in shell mounds and fish mounds suggests continuity in the depositional activities,
besides the change in material (substitution of shell by fish remains) and adoption of ceramic
technology in recent times.
The ethnohistorical site analyzed for geo-ethnoarchaeological comparison was formed
by recurrent domestic occupations that lasted for a century. Analyses of the peripheral shell ring
allowed the micromorphological characterization of episodes of massive shell deposition,
trampling and site abandonment. Analyses of hearths located in the central habitation area
showed micromorphological indicators of high temperature and moderate temperature
combustion structures (over and under 500° C, respectivley). Comparison of microfacies from
the fueguian shell midden and microfacies from the sambaquis shows different pre-depositional
trajectories. In the first case, deposition is related with the immediate and secondary discard of
food refuse around the living space. In the second case, formation is related with an intricate
succession of deposition, burning and transport of items that resulted in a tertiary deposit. These
observations corroborate the great complexity in the formation processes of sambaquis.
Key-words: Geoarchaeology; micromorphology; Santa Catarina; Tierra del Fuego; shell
mounds; shell middens; stratigraphy.
5 Micromorfología de concheros sudamericanos: arqueoestratigrafía y procesos de
formación de sambaquís (Santa Catarina, Brasil) y concheros (Tierra del Fuego,
Argentina)
Resumen
El estudio de ocho sambaquís del litoral sur del Estado de Santa Catarina y de un
conchero de Tierra del Fuego permitió entender los procesos de formación de diferentes tipos de
concheros. En el caso de los sambaquís, el objetivo fue comprender los procesos de formación
culturales (actividades humanas) y naturales (tafonómicos) y sus cambios a lo largo del tiempo,
a partir del análisis estratigráfico de sitios cuya cronología abarca todo el período de ocupación
humana prehistórica de la región (c. 7400-1000 años AP). En el caso fueguino se realizó el
estudio micro-estratigráfico de un conchero etnohistórico, para servir como modelo
interpretativo en la formulación de hipótesis sobre la formación de los concheros. Los métodos
utilizados para caracterización de sedimentos arqueológicos incluyeron: granulometría,
zooarqueología, isotopía de C y N (δ13C e δ15N), micromocrfología y microscopia electrónica
de barrido. Se utilizo también la analogía experimental, con fogones prendidos en diversos
contextos conocidos, y quema controlada de moluscos.
Tres tipos de sambaquís fueron analizados: cuatro sitios de patrón estratigráfico
conchífero; dos de núcleo arenoso; y dos montículos ictiológicos. La formación del primer y
tercer grupo siguió un patrón recurrente y continuo de retrabajamiento de elementos depositados
y quemados en local diferente del final. Estos elementos incluyen residuos alimenticios, como
conchas, restos de pescado (huesos y tejidos) y componentes vegetales (carbones y restos de
plantas C3), así como componentes terrígenos relacionados con el substrato de las
inmediaciones del sambaquí y sedimentos provenientes de los bancos de moluscos explotados.
Los sambaquís de núcleo arenoso representan ocupaciones efímeras, pero planeadas. Su
formación envolvió el levantamiento de montículos de arena y/o aprovechamiento de dunas
eólicas, con posterior depositación de moluscos y residuos vegetales.
De este análisis se extraen dos implicaciones substanciales: 1) el habito de
retrabajamiento de residuos puede ser el agente de destrucción de las áreas de habitación
asociadas a los grandes sambaquís, nunca encontradas hasta el momento; 2) la correspondencia
en el proceso de formación de montículos ictiológicos y sambaquís conchíferos sugiere
continuidad en la actividad depositacional, a pesar del cambio en el material (substitución de las
conchas por restos de pescado) y adopción de la tecnología cerámica en tiempos recientes.
El conchero etnohistórico analizado para comparación geo-etnoarqueológica se formó a
partir de ocupaciones domésticas recurrentes. El análisis del anillo de conchas periférico
ceracterizó micromorfológicamente a los episodios de depositación de conchas, pisoteo y
abandono del sitio. El análisis de los fogones del área central del conchero identifico estructuras
de combustión de temperatura alta y moderada (superior e inferior a 500° C, respectivamente).
La comparación entre las microfacies del conchero fueguino y de los sambaquís muestra
diferentes trayectorias pre-depositacionales. En el primer caso, relacionadas con la depositación
inmediata y secundaria de detritos de alimentación alrededor del área de habitación y, en el
segundo caso, con una intrincada sucesión de acciones de depositacion, quema y transporte
asociada a la formación de depósitos terciarios. Estas observaciones corroboran la mayor
complejidad del proceso de formación de sambaquís.
Palabras clave: Geoarqueología; micromorfología; Santa Catarina; Tierra del Fuego;
sambaquís; concheros; estratigrafía.
6 ÍNDICE Agradecimentos .............................................................................................................. 3
Resumo ............................................................................................................................ 4
Abstract ........................................................................................................................... 5
Resumen .......................................................................................................................... 6
ÍNDICE............................................................................................................................ 7
ÍNDICE DE ILUSTRAÇÕES ..................................................................................... 11
ÍNDICE DE QUADROS E TABELAS....................................................................... 23
CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO .................................................................................. 26
1. PREMISSAS TEÓRICAS ....................................................................................... 26
2. GEOARQUEOLOGIA DE CONCHEIROS ......................................................... 29
2.1. PRINCIPAIS TEMAS DE ESTUDO .................................................................. 29
2.2. GEOARQUEOLOGIA DE SAMBAQUIS ......................................................... 31
3. A PROPOSTA .......................................................................................................... 33
3.1. ANÁLISE DE ARQUEOFÁCIES....................................................................... 34
3.2. CONSTRUÇÃO DE MODELOS INTERPRETATIVOS .................................. 35
3.2.1. Arqueologia experimental ............................................................................. 35
3.2.2. Comparação intercultural .............................................................................. 36
4. OBJETIVOS ............................................................................................................. 37
CAPÍTULO 2: CONCHEIROS E SAMBAQUIS ..................................................... 38
1. DEFINIÇÃO ............................................................................................................. 39
2. CONCHEIROS DO HOLOCENO INICIAL E MÉDIO DA AMÉRICA DO SUL
........................................................................................................................................ 40
3. SAMBAQUIS DO LITORAL BRASILEIRO ....................................................... 43
3.1. A OCUPAÇAO SAMBAQUIEIRA DA COSTA ............................................... 45
3.2. MODELO DE POVOAMENTO DA COSTA BRASILEIRA............................ 47
3.3. AS CULTURAS MARÍTIMAS DO LITORAL BRASILEIRO ......................... 48
3.4. O COLAPSO DA CULTURA SAMBAQUIEIRA ............................................. 51
3.5. SAMBAQUIEIROS DO LITORAL E GRUPOS CERAMISTAS DO
PLANALTO ............................................................................................................... 52
3.5.1. Os sítios costeiros com cerâmica Taquara/Itararé......................................... 54
3.5.2. Domínio e miscigenação ............................................................................... 55
4. A FORMAÇÃO DOS SAMBAQUIS...................................................................... 56
4.1. MODELOS DE CONSTRUÇÃO........................................................................ 57
4.2. ARQUITETURA DE SAMBAQUIS .................................................................. 59
4.3. OS SÍTIOS MENORES....................................................................................... 61
5. CASO DE ESTUDO COMPARATIVO: CONCHEIROS ETNO-HISTÓRICOS
DA TERRA DO FOGO................................................................................................ 64
5.1. A INFORMAÇÃO ETNOGRÁFICA SOBRE OS YAMANA .......................... 66
5.1.1. Os assentamentos domésticos ....................................................................... 67
5.1.2. A formação dos concheiros ........................................................................... 71
6. SUMÁRIO................................................................................................................. 73
CAPÍTULO 3: SAMBAQUIS DO LITORAL SUL CATARINENSE .................... 75
1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 75
2. UMA PAISAGEM HISTÓRICA ............................................................................ 79
7 2.1. EVOLUÇÃO HOLOCÊNICA DO LITORAL.................................................... 79
2.2. FASES DE OCUPAÇÃO .................................................................................... 82
3. OS SAMBAQUIS ANALISADOS .......................................................................... 85
3.1. CAIPORA ............................................................................................................ 89
3.2. SANTA MARTA 10............................................................................................ 90
3.3. MORRINHOS ..................................................................................................... 93
3.4. JABUTICABEIRA 1 ........................................................................................... 94
3.5. CUBÍCULO 1 ...................................................................................................... 95
3.6. CARNIÇA 3 ........................................................................................................ 96
3.7. SANTA MARTA 8.............................................................................................. 99
3.8. GALHETA 4...................................................................................................... 100
4. CASO DE ESTUDO COMPARATIVO ............................................................... 101
4.1. EVOLUÇÃO HOLOCÊNICA DO CANAL BEAGLE .................................... 103
4.2. O CONCHEIRO TÚNEL 7 ............................................................................... 104
3. SUMÁRIO............................................................................................................... 107
CAPÍTULO 4: MATERIAIS E MÉTODOS ........................................................... 108
1. ANÁLISE DE FÁCIES E MICROFÁCIES ARQUEOLÓGICAS.................... 108
1.1. FUNDAMENTOS DA ANÁLISE DE ARQUEOFÁCIES............................... 108
1.1.1. Descrição, caracterização e interpretação ................................................... 110
1.1.2. Estratigrafia e pedogênese........................................................................... 111
1.2. FUNDAMENTOS DA ANÁLISE DE MICROFÁCIES .................................. 113
1.2.1. Arqueofácies e microfácies arqueológicas.................................................. 114
1.2.2. Identificação e classificação........................................................................ 115
1.3. NOMENCLATURA .......................................................................................... 117
2. AMOSTRAGEM .................................................................................................... 118
2.1. SAMBAQUIS .................................................................................................... 118
2.1.1. Amostragem arqueológica .......................................................................... 118
2.1.2. Amostragem externa ................................................................................... 119
2.1.3. Experimental ............................................................................................... 121
2.2. CASO DE ESTUDO COMPARATIVO: CONCHEIRO TÚNEL 7................. 123
2.2.1. Amostragem arqueológica .......................................................................... 123
2.2.2. Amostragem externa ................................................................................... 123
2.2.3. Experimental ............................................................................................... 124
3. PROCEDIMENTOS ANALÍTICOS .................................................................... 125
3.1. MICROMORFOLOGIA.................................................................................... 125
3.2. GRANULOMETRIA DA FRAÇÃO TERRÍGENA ......................................... 128
3.3. ISOTOPIA DE CARBONO (δ13C) E NITROGÊNIO (δ15N) ........................... 129
3.4. MICROSCOPIA ELETRÔNICA DE VARREDURA...................................... 131
3.5. ZOOARQUEOLOGIA ...................................................................................... 132
4. SUMÁRIO............................................................................................................... 133
CAPÍTULO 5: GEOARQUEOLOGIA DE SAMBAQUIS DO LITORAL SUL DE
SANTA CATARINA E CONCHEIRO ETNOHISTÓRICO DA TERRA DO
FOGO .......................................................................................................................... 134
1. COLEÇÃO DE REFERÊNCIA EXPERIMENTAL .......................................... 135
1.1. FOGUEIRAS ..................................................................................................... 135
1.1.1. Temperatura ................................................................................................ 135
1.1.2. Forma e composição ................................................................................... 137
8 1.1.3. Alteração do substrato e preservação.......................................................... 140
1.1.4. Micromorfologia de fogueira sobre substrato conchífero ........................... 141
1.2. QUEIMA CONTROLADA DE ANOMALOCARDIA BRASILIANA........... 143
2. SAMBAQUIS DO LITORAL CATARINENSE ................................................. 148
2.1. PADRÃO ESTRATIGRÁFICO CONCHÍFERO.............................................. 149
2.1.1. Caipora ........................................................................................................ 149
2.1.2. Cubículo 1 ................................................................................................... 173
2.1.3. Morrinhos .................................................................................................... 184
2.1.4. Jabuticabeira 1............................................................................................. 211
2.2. SAMBAQUIS DE NÚCLEO ARENOSO ........................................................ 239
2.2.1. Santa Marta 10 ............................................................................................ 239
2.2.2. Carniça 3 ..................................................................................................... 254
2.3. MONTÍCULOS ICTIOLÓGICOS .................................................................... 264
2.3.1. Santa Marta 8 .............................................................................................. 264
2.3.2. Galheta 4 ..................................................................................................... 281
3. GEOARQUEOLOGIA DE UM CONCHEIRO ETNO-HISTÓRICO NA
TERRA DO FOGO .................................................................................................... 293
3.1. COLEÇÃO DE REFERÊNCIA EXPERIMENTAL ......................................... 293
3.1.1. Indicadores de pisoteamento ....................................................................... 294
3.1.2. Tafonomia de ossos..................................................................................... 295
3.1.3. Alteração microbiana .................................................................................. 295
3.1.4. Fogueiras: tafonomia e preservação............................................................ 297
3.1.5. Queima controlada de Mytilus edulis ......................................................... 300
3.2. MICROMORFOLOGIA DO CONCHEIRO TÚNEL 7 ................................... 304
3.2.1. Microestratigrafia do anel de conchas......................................................... 305
3.2.2. Micromorfologia da área central de habitação............................................ 314
CAPÍTULO 6: DISCUSSÃO..................................................................................... 321
1. PADRÃO ESTRATIGRÁFICO CONCHÍFERO ............................................... 321
1.1. SEDIMENTOS TERRÍGENOS ........................................................................ 323
1.1.1. Proveniência das areias terrígenas............................................................... 324
1.1.2. Relação entre arqueofácies.......................................................................... 326
1.2. ASSEMBLEIA MALACOLÓGICA ................................................................. 327
1.2.1. Relação entre espécies predominantes ........................................................ 330
1.2.2. Disponibilidade de espécies: comparação com concheiros naturais........... 332
1.2.3. Coleta seletiva ............................................................................................. 336
1.3. COMPONENTES ORGÂNICOS...................................................................... 338
1.3.1. Componentes vegetais................................................................................. 338
1.3.2 Resíduos de origem animal ......................................................................... 342
1.3.3. Relação com sedimentos naturais ............................................................... 346
1.3.4. Relação entre arqueofácies.......................................................................... 347
1.4. MICRO-COMPONENTES ............................................................................... 349
1.4.1. Componentes minerais ................................................................................ 350
1.4.2. Componentes biológicos principais: conchas e ossos................................. 352
1.4.3. Componentes biológicos secundários ......................................................... 356
1.4.4. Produtos da alteração antrópica .................................................................. 359
1.4.5. Fração fina................................................................................................... 360
1.5. ALTERAÇÃO PÓS-DEPOSICIONAL ............................................................ 363
1.6. MICROFÁCIES................................................................................................. 365
9 1.6.1. Recorrência de microfácies intra e inter-sítio ............................................. 367
1.6.3. Microfácies tipo B: retrabalhamento de fogueiras ...................................... 372
1.6.4. Microfácies tipo C: agregados de lama de depósitos paleolagunares ......... 374
1.7. FORMAÇÃO DE SAMBAQUIS CONCHÍFEROS ......................................... 376
2. NÚCLEO ARENOSO ............................................................................................ 378
2.1. SEDIMENTOS TERRÍGENOS ........................................................................ 379
2.2. ASSEMBLEIA MALACOLÓGICA ................................................................. 380
2.3. COMPONENTES VEGETAIS ......................................................................... 383
2.4. MICRO-COMPONENTES ............................................................................... 385
2.5. ESPODOSSOLOS SOBRE DUNAS EÓLICAS............................................... 387
2.5.1. Definição ..................................................................................................... 387
2.5.2. Formação de espodossolos em sambaquis de núcleo arenoso ................... 388
2.5.3. Microcarvões e formação de horizontes espódicos..................................... 390
2.6. MICROFÁCIES................................................................................................. 392
2.6.1. Microfácies tipo F: horizonte espódico iluvial............................................ 392
2.6.2. Microfácies tipo G: horizonte espódico em matriz de conchas e areia....... 393
2.6.3. Microfácies tipo H: duna eólica .................................................................. 394
2.7. FORMAÇÃO DE SAMBAQUIS DE NÚCLEO ARENOSO .......................... 394
3. MONTÍCULOS ICTIOLÓGICOS ....................................................................... 396
3.1. SEDIMENTOS TERRÍGENOS ........................................................................ 397
3.2. RESÍDUOS VEGETAIS E ANIMAIS.............................................................. 398
3.3. MICRO-COMPONENTES ............................................................................... 399
3.3.1. Componentes minerais ................................................................................ 399
3.3.2. Componentes biológicos, biominerais e produtos da alteração antrópica .. 400
3.3.3. Fração fina................................................................................................... 402
3.4. MICROFÁCIES................................................................................................. 405
3.4.1. Microfácies tipo I: retrabalhamento de resíduos com predomínio de ossos 405
3.4.2. Microfácies tipo J: ocupação sobre depósito arenoso ................................. 407
3.4.3. Microfácies tipo K: substrato arenoso......................................................... 407
3.4.4. Microfácies tipo L: horizonte espódico em matriz de ossos e areia............ 408
3.5. FORMAÇÃO DE MONTÍCULOS ICTIOLÓGICOS ...................................... 410
4. CONCHEIRO ETNOHISTÓRICO NA TERRA DO FOGO ............................ 412
4.1. MICRO-COMPONENTES ............................................................................... 412
4.2. TAFONOMIA DE CONCHEIROS EM CLIMA FRIO.................................... 413
4.3. MICROFÁCIES................................................................................................. 415
4.3.1. Microfácies estratigráficas .......................................................................... 415
4.3.2. Microfácies centrais (fogueiras).................................................................. 419
4.4. FORMAÇÃO DO CONCHEIRO DOMÉSTICO ............................................. 422
5. ANALOGIA GEO-ETNOARQUEOLÓGICA.................................................... 424
CAPÍTULO 7. CONCLUSÕES ................................................................................ 433
1. COMEÇO E AUGE DOS SAMBAQUIS ............................................................. 434
2. COLAPSO E SURGIMENTO DA UMA NOVA ORDEM ................................ 437
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................... 440
ANEXO 1: Figuras e tabelas complementares ........................................................ 475
ANEXO 2: Publicações, prêmios, participação em eventos ................................... 490
10 ÍNDICE DE ILUSTRAÇÕES Figura 2.1. Mapa da América do sul com localização dos concheiros/sambaquis mais antigos, e sítios
datados da transição Pleistoceno/Holoceno com evidências do uso de recursos aquáticos. As duas flechas
indicam possíveis rotas migratórias de colonização das áreas litorâneas do continente.............................43
Figura 2.2. Fotografias etnográficas dos Yamana que habitaram as costas do Canal Beagle: A) costa do
Canal Beagle, com localização de três cabanas Yamana (indicadas com uma flecha), em fotografia
tomada por Greten Motsny; B) cabana Yamana fotografiada pela Mission Scientifique Du Cap Horn em
1882-1883; note-se a acumulação de conchas que conduz à entrada da cabana; C) família Yamana fora da
residência (Mission Scientifique Du Cap Horn em 1882-1883); D) Mulher Yamana sentada sobre um
concheiro (Mission Scientifique Du Cap Horn em 1882-1883); E) cabana Yamana coberta pela neve com
menina e cachorro, fotografia tomada por Greten Motsny; F) canoas nas águas do Canal Beagle (Mission
Scientifique Du Cap Horn em 1882-1883).................................................................................................70
Figura 3.1. Sambaquis do litoral sul catarinense: A) mapa de localização da área de estudo; B) sambaqui
Garopaba do Sul, o maior sambaqui que existe atualmente na região; C) sambaqui do Ipoã; D) sambaquis
de Encantada; E) sambaqui de Jabuticabeira 2; F) retirada de sepultamento humano do sambaqui
Garopaba do Sul (B, D e E: fotografias de Paulo Giannini; F: fotografia de Armando Coimbra). ............78
Figura 3.2. Sistemas deposicionais costeiros do litoral centro-sul de Santa Catarina, identificados por
Giannini (1993, 2002) (modificado de Giannini & Santos 1994). .............................................................82
Figura 3.3. Fases de ocupação do litoral sul catarinense definidas por Giannini et al. (2010) em base em
um conjunto de 129 datações 14C de 48 sambaquis prospectados e datados pelo projeto Sambaquis e
Paisagem. ...................................................................................................................................................85
Figura 3.4. Imagem de satélite com a localização e vista aérea dos oito sambaquis estudados: Caipora,
Santa Marta 10, Morrinhos, Jabuticabeira 1, Cubículo 1, Carniça 3, Santa Marta 8 e Galheta 4. A linha
ponteada na imagem central indica a divisória entre os setor interno e externo segundo Giannini et al.
(2010). ........................................................................................................................................................87
Figura 3.5. Vista do entorno de localização do sítio Caipora (superior esquerda), desde o topo do sítio, em
primeiro plano, até a planície lagunar, ao fundo, com seção vertical analisada (superior direita), de direção
NW-SE. Sítio Santa Marta 10, em contexto de paleodunas eólicas das gerações 1, 2 e 3 (inferior
esquerda) e vista da seção analisada, de sul a norte, com área de escavação do anel de conchas (inferior
direita). .......................................................................................................................................................91
Figura 3.6. Vista do entorno de localização do sítio Morrinhos (superior esquerda), com trincheira
trabalhada à direita da foto e seção estudada (superior direita), de direção N-S. Seção inferior de
Jabuticabeira (inferior esquerda), de norte a sul, e seção estudada no nível superior (inferior direita), de
direção SE-NW...........................................................................................................................................92
Figura 3.7. Vista do entorno de localização do sítio Cubículo (superior esquerda), vendo-se o sambaqui na
direita da foto e a planície lagunar na esquerda, com seção vertical analisada (superior direita), de direção
S-N. Vista do sítio Carniça 3 (inferior esquerda) e seção estudada, com bloco amostrado para
micromorfologia (inferior direita), de direção NE-SW. .............................................................................97
Figura 3.8. Vista da região de Santa Marta, a partir do sítio Santa Marta 8, com vista do sítio coberto por
vegetação densa. Vista da Ponta da Galheta a partir da praia da Galheta, setor norte, com indicação da
localização do sítio Galheta 4 (flecha amarela) e seção estudada, de direção NW-SE...............................98
11 Figura 3.9. Concheiros etno-históricos da Terra do Fogo: A) Mapa de localização da área de estudo, no
litoral norte do Canal Beagle. B) Vista do Canal Beagle, a partir da escavação do concheiro Túnel 7. C)
Vista do sítio Túnel 7 durante o outono. D) Concheiro Túnel 7 observado desde a morena glacial sobre o
qual acha-se parcialmente assentado, de oeste para leste. E) Escavação no concheiro Lanashuaia,
localizado embaixo da estrutura branca de cobertura. F) Depressões no terreno, indicativas da localização
de antigos concheiros na Baía Cambaceres (B, D, E e F: fotografias de Jordi Estevez e Assumpció Vila;
C: fotografia de Myrian Alvarez). ............................................................................................................102
Figura 3.10. Sul da Patagônia e Terra do Fogo, com localização dos campos de gelo modernos, seus
limites máximos de extensão durante o último máximo glacial (UMG, 20 kA) e o alcance das morenas no
final do período glacial (Pleistoceno tardio). Adaptado de Coronato et al. (1999: 79) e McCulloch et al.
(2005: 358). ..............................................................................................................................................104
Figura 3.11. Concheiro Túnel 7: A) Vista do sítio, com área escavada embaixo da estrutura de cobertura
branca. B) Escavação do concheiro, com localização das duas colunas de amostragem no anel de conchas
e delimitação da área central de coupação (linha ponteada). C) Topografia segundo Orquera & Piana
(1995). Na topografia, as quadras delimitam a área do sítio escavado. Quadras I a IV correspondem ao
componente moderno, e VII a XI, ao componente antigo. .......................................................................106
Figura 5.1. Gráfico e tabela com as temperaturas atingidas no centro de combustão e no substrato (a 5 cm
da superfície), durante uma hora de queima, em duas fogueiras experimentais (sobre paleoduna eólica e
sobre depósito de retrabalhamento de sambaqui). ....................................................................................136
Figura 5.2. Fotografias das duas fogueiras experimentais: A) fogueira sobre paleoduna eólica, com
indicação da temperatura atingida a 60 minutos do inicio da queima; B) fogueira sobre depósito de
retrabalhamento de sambaqui, com indicação da temperatura atingida a 45 minutos do inicio da queima;
C) fogueira sobre paleoduna eólica, apagada, com indicação da temperatura do substrato, quatro horas
depois do apagado o fogo; D) fogueira sobre depósito de retrabalhamento de sambaqui, apagada, com
indiicação das temperaturas do substrato e a diferentes profundidades, 12 horas depois de apagado o fogo.
..................................................................................................................................................................137
Figura 5.3. Fogueira sobre paleoduna eólica: A) esquema de alteração do substrato produzido por
fogueiras em forma de bacia, como a realizada, nesta pesquisa, sobre areia dunar (modificado de March,
1996); as setas brancas indicam a trajetória do calor no inicio do fogo (esquema superior) e algumas horas
depois, enquanto as setas prets indicam a trajetória do calor subaéreo; B) duas cabeças de peixe
queimadas na fogueira; C) conchas de Anomalocardia brasiliana, após retiradas da fogueira; D)
configuração da fogueira após apagada. Note-se o escurecimento do perímetro da bacia onde foi acesa a
fogueira, como previsto no modelo de March (1996). .............................................................................138
Figura 5.4. Fogueira sobre depósito de retrabalhamento do sambaqui Cabeçuda: A) esquema de alteração
do substrato produzido por fogueiras planas (modificado de March, 1996); as setas brancas indicam a
trajetória do calor sob a perspectiva horizontal da fogueira (esquema superior) e em seção vertical
(esquema inferior); B) fogueira plana sobre o sambaqui, apagada; C) seção de alteração térmica; D)
detalhe da alteração do substrato, em que se vê camada lenticular decimétrica de cinzas sobre lâmina
milimétrica de material carbonizado. Notem-se os formatos horizontal e vertical da fogueira plana,
coincidentes com o previsto no modelo de March (1996)........................................................................139
Figura 5.5. Fotomicrografias de seção delgada coletada na periferia da fogueira acesa sobre substrato
conchífero (depósito de retrabalhamento do sambaqui Cabeçuda): (A, B) massa basal composta por grãos
de quartzo, fragmentos de osso queimados e carbonizados e fragmentos de concha, a PPL e XPL; C, D)
detalhe da fração fina composta por fragmentos de osso queimado na fração silte entre áreas de micrita
carbonática, a PPL e XPL; E) concha com sinais de alteração térmica (coloração cinza escuro e fissuras
12 internas) em matriz micrítica associada a cinzas de madeira, a PPL. F) carvão em processo de
transformação para cinza, a PPL. .............................................................................................................142
Figura 5.6. Alteração de Anomalocardia brasiliana a temperaturas de 200°C e 300°C: A1) concha
queimada a 200°C, com preservação do perióstraco; A2) borda enegrecida da face interna da valva; A3)
detalhe da superfície queimada da face externa da valva; A4-5) fotomicrografias da valva queimada, com
camadas de crescimento, a PPL e XPL; B1) concha queimada a 300° C; B2) borda enegrecida e superfície
escurecida da face interior da valva; B3) fotomicrografia da superfície da valva, com perióstraco
preservado; B4-5) detalhe do perióstraco ainda aderido à valva. .............................................................145
Figura 5.7. Alteração de Anomalocardia brasiliana a 400°C e 500°C: A1) concha queimada a 400°C,
com preservação do perióstraco; A2) borda carbonizada da face interna da valva e superfície enegrecida;
A3) fotomicrografia da concha queimada, com perióstraco ainda preservado; A4) fotomicrografia da
valva escurecida; 5) detalhe do perióstraco queimado; B1) concha queimada a 500° C; B2) borda
acinzentada e superfície esbranquiçada da face interna da valva; B3) fotomicrografia da superfície cor
marrom escuro; B4) fotomicrografia da valva queimada, com escurecimento pronunciado na face interna;
B5) detalhe do perióstraco, ainda aderido à valva. ...................................................................................146
Figura 5.8. Alteração de Anomalocardia brasiliana a 600°C e 700°C: A1) concha queimada a 600°C; A2)
borda acinzentada da face interna da valva; A3) fotomicrografia da concha queimada enegrecida, sem
perióstraco, com fissuras longitudinais e transversais; A4-5) fotomicrografia da valva escurecida a PPL e
XPL. B1) concha quemada a 700° C; B2) borda acinzentada da face interna da valva; B3) fotomicrografia
da concha queimada, preta a cinza escuro; B4-5) fotomicrografia da valva a PPL e XPL.......................147
Figura 5.9. Alteração de Anomalocardia brasiliana a 800°C: A1) concha queimada a 800°C, tão
fragilizada que não se manteve inteira; A2) valva calcinada; A3) fotomicrografia da valva calcinada, de
cor cinza, com pseudo-vacúolos; A4-5) fotomicrografia da valva calcinada, a PPL e XPL ....................148
Figura 5.10. Seção vertical estudada do sítio Caipora; A) localização dos pontos de amostragem e
descrição das arqueofácies identificadas; B) seção transversal esquemática (sem escala) da área de
localização do sítio. ..................................................................................................................................151
Figura 5.11. Amostragem externa ao sítio Caipora: A) localização do ponto de amostragem; B) entorno de
localização do sítio com afloramento granítico localizado a SE do sambaqui; C) descrição das fácies
identificadas; D) trincheira amostrada com localização das fácies...........................................................152
Figura 5.12. Histogramas da distribuição granulométrica para a Fácies A do ponto de amostragem externo
ao sambaqui Caipora e da AF 1 do mesmo sambaqui. Note-se o domínio dos pelíticos na Fácies A e das
frações grânulo, areia muito grossa e areia fina na AF 1..........................................................................153
Figura 5.13. Fotomicrografias à lupa estereoscópica dos grãos retidos nas malhas de 1,0 mm e 0,5 mm da
arqueofacies 1 do sítio Caipora. Note-se a presença de ossos (o), conchas (ch), fragmentos líticos (fl) e
quartzo (q). ...............................................................................................................................................153
Figura 5.14. Análises isotópicas (δ13C e δ15N e razão C/N) de duas amostras provenientes da AF 1 do sítio
Caipora, e uma amostra da Fácies A da trincheira aberta em área externa ao sítio: A) gráfico de valores de
δ13C e razão C/N com intervalos definidos para plantas de ciclo fotossintético C3 e algas, segundo
parâmetros de Boutton (1996), Lamb et al. (2006), Meyers (1997), De Niro e Epstein (1978), De Niro e
Hastrof (1985) e Sifeddine et al. (2004); B) gráfico dos valores de δ15N e δ13C com intervalos definidos
para plantas de ciclo fotossintético C3 e animais marinhos, segundo parâmetros definidos por Ben-David
et al. (1998), Commisso & Nelson (2006), Fogg et al. (1998), Morris et al. (2005) e De Niro (1987). ...154
Figura 5.15. Desenho esquemático das cinco seções delgadas analisadas no sítio Caipora, com localização
do bloco de amostragem na sucessão vertical e identificação de microfácies na lâmina. ........................156
13 Figura 5.16. Gráficos com porcentagens dos diferentes componentes microscópicos das mF 2, 3, 4 e
horizonte de solo superficial (Hz A) do sítio Caipora: A) freqüências de componentes da fração grossa; B)
relação de porcentagens de poros, fração grossa e fração fina. Note-se a diminuição da porosidade e
aumento da fração fina no horizonte superficial.......................................................................................165
Figura 5.17. Fotomicrografias de moluscos encontrados no sítio Caipora: A) gastrópode; B) fragmentos
de concha de craca; C) bivalve indeterminado; D) fragmentos de ostra, identificados pela fibrosidade
longitudinal da concha; E, F) concha queimada a temperatura maior que 600° C, a PPL e XPL. ...........165
Figura 5.18. Fotomicrografias de ossos queimados no sítio Caipora: A, B) ossos queimados, reconhecidos
respectivamente por bordas avermelhadas, a PPL, e birrefringência baixa, a XPL; C, D) vértebras de
peixe, freqüentemente encontradas e facilmente identificáveis em seção delgada, a PPL e XPL............166
Figura 5.19. Fotomicrografias da mF 3: A) seção vertical esquemática com localização da amostra para
micromorfologia; B) massa basal composta por fragmentos de concha, osso, e grãos minerais, PPL; C, D)
microestrutura de microagregados intergranulares interligados, composta por mistura de argilominerais
com micrita secundária, a PPL e XPL; E, F) detalhe da micromassa, com finos fragmentos de osso
queimado e agregados de microcarvões no interior, a PPL e XPL...........................................................169
Figura 5.20. Fotomicrografias da mF 4: A) seção vertical esquemática com localização da amostra para
micromorfologia; B) massa basal composta por fragmentos de concha, conchas queimadas, ossos, e grãos
minerais, PPL; C, D) microestrutura de microagregados integranulares interligados, composta por mistura
de argilominerais com micrita secundária a PPL e XPL; E, F) detalhe da micromassa, com fragmentos de
osso queimado, concha e grãos de quartzo, a PPL e XPL. .......................................................................170
Figura 5.21. Fotomicografias de espinhos de equinoide encontrados na mF 4b do sítio Caipora, a PPL
(A,C) e XPL (B,D). ..................................................................................................................................171
Figura 5.22. Feições pedológicas do sítio Caipora: A, B) revestimentos de micrita e argilominerais
impuros, a PPL e XPL; C, D) enchimentos de micrita límpida, a PPL e XPL. Os enchimentos
caracterizam-se por ocuparem a totalidade do poro ou vazio em que infiltram, enquanto os revetimentos
cobrem apenas as paredes dos poros e/ou a superfície dos componentes da fração grossa. .....................171
Figura 5.23. Fotomicrografias da transição entre mF 4 e horizonte de solo na superfície da seção vertical
analisada: A) seção vertical esquemática com localização da amostra para micromorfologia; B) massa
basal composta principalmente por grãos de quartzo, feldspato e fragmentos líticos, com presença
subordinada de conchas e ossos no horizonte A superficial, PPL; C, D) transição entre o horizonte de
solo, sem conchas, e a mF 4, com fragmentos de conchas e maior porosidade, a PPL e XPL; E, F) detalhe
da massa basal da mF 4, com fragmentos de concha de diverso tamanho, a PPL e XPL.........................172
Figura 5.24. Seção vertical estudada do sítio Cubículo 1: A) localização dos pontos de amostragem e
descrição das arqueofácies identificadas; B) seção transversal esquemática (sem escala) da área de
localização do sítio. ..................................................................................................................................175
Figura 5.25. Amostragem externa ao sítio Cubículo 1: A) localização do ponto de coleta; B) entorno de
localização; C) descrição das fácies identificadas; D) trincheira amostrada, com posição das fácies......176
Figura 5.26. Histogramas da distribuição granulométrica para as Fácies A e B do ponto de amostragem
externa ao sambaqui Cubículo 1, e da AF 5 do mesmo sambaqui. Note-se o domínio de grânulos e
pelíticos nas Fácies A e B, respectivamente, e a distribuição bimodal na AF 5.......................................177
Figura 5.27. Fotomicrografias à lupa estereoscópica dos grãos retidos nas malhas de 1,0 mm e 0,5 mm da
AF 5 do sítio Cubículo 1. Note-se presença de ossos (o), conchas (ch), carvão (cr) e quartzo (q)...........177
14 5.28. Análises isotópicas (δ13C e δ15N e razão C/N) de amostra proveniente da AF 5 do sítio Cubículo 1, e
de amostras das Fácies A e B da trincheira aberta em área externa ao sítio: A) gráfico de valores de δ13C e
razão C/N com intervalos definidos para plantas de ciclo fotossintético C3 e algas; B) gráfico dos valores
de δ15N e δ13C com intervalos definidos para plantas de ciclo fotossintético C3 e animais marinhos. ....178
Figura 5.29. Desenho esquemático da seção delgada analisada no sítio Cubículo 1, com localização do
bloco de amostragem na sucessão vertical e identificação de microfácies na lâmina. .............................179
Figura 5.30. Gráficos com porcentagens dos diferentes componentes microscópicos da mF 9 e do
horizonte de solo superficial (Hz A) do sítio Cubículo 1: A) frequências de componentes da fração grossa;
B) relação entre as porcentagens de poros, fração grossa e fração fina. Note-se o aumento da porosidade e
da fração fina no horizonte superficial. ....................................................................................................179
Figura 5.31. Fotomicrografias da mF 9 e mF HzA do sítio Cubículo 1: A) seção vertical esquemática com
localização da amostra para micromorfologia; B) massa basal do horizonte superficial (mF HzA) com
maior freqüência de raízes e poucas conchas em relação a mF 9, PPL; C, D) massa basal da mF 9 com
microestrutura de grumos coesivos e fragmentos de concha e ossos, PPL e XPL; E, F) detalhe da
micromassa composta por argilominerais e MO, com fragmentos de osso e carvão, PPL e XPL. ..........183
Figura 5.32. Fotomicrografias de elementos encontrados no sítio Cubículo: A, B) concha queimada e
fragmento de osso com sinais de dissolução, PPL e XPL; C, D) fragmento de concha de Ostrea sp., PPL e
XPL; E) excrementos elipsóides no horizonte de solo superficial, PPL; F) fragmentos de concha, concha
queimada (fragmentos pretos) e ossos na mF 9, PPL. ..............................................................................184
Figura 5.33. Seção vertical estudada do sítio Morrinhos: A) localização dos pontos de amostragem e
descrição das arqueofácies identificadas; B) seção transversal esquemática (sem escala) da área de
localização do sítio. ..................................................................................................................................187
Figura 5.34. Gráficos das distribuições granulométricas e parâmetros estatísticos para o sítio Morrinhos e
amostragem em sedimentos naturais das proximidades: A) histogramas da distribuição granulométrica
para as AF 2, 3 e 4 do sambaqui Morrinhos; note-se o domínio da fração areia média, fina e muito fina
para as AF 2, 3 e 4, respectivamente; B) diagramas em caixa (boxplot) dos parâmetros estatísticos
diâmetro médio, desvio padrão e assimetria para o conjunto de amostras do sítio Morrinhos e amostras
deltaicas (DL) e paleolagunares (PL) do testemunho TB2 (Nascimento, 2010) coletado a
aproximadamente 2 km do sambaqui. ......................................................................................................188
Figura 5.35. Fotomicrografias à lupa estereoscópica dos grãos retidos nas malhas de 1,0 mm e 0,5 mm das
arqueofacies 2, 3 e 4 do sítio Morrinhos. Note-se a presença de ossos (o), conchas (ch), carvão (cr) e
quartzo (q). ...............................................................................................................................................189
Figura 5.36. Análises isotópicas (δ13C e δ15N e razão C/N) de amostras provenientes das AF 2 e 4 do sítio
Morrinhos: A) gráfico de valores de δ13C e razão C/N com intervalos definidos para plantas de ciclo
fotossintético C3 e algas; B) gráfico dos valores de δ15N e δ13C com intervalos definidos para plantas de
ciclo fotossintético C3 e animais marinhos. .............................................................................................190
Figura 5.37. Desenho esquemático das quatro seções delgadas analisadas no sítio Morrinhos, com
localização do bloco de amostragem na sucessão vertical e identificação de microfácies na lâmina. =
significa equivalência entre microfácies identificadas em lâminas diferentes; + significa microfácies que
envolve atributos de microfácies diferentes identificadas em outras lâminas. .........................................191
Figura 5.38. Gráficos com porcentagens dos diferentes componentes microscópicos das microfácies
identificadas nas AF 3 (mF 3a.1, 3a.2 e 3b) e 4 (mf 4a.1, 4a.2, 4a.3 e 4b) do sítio Morrinhos: A)
freqüências de componentes da fração grossa; B) relação entre as porcentagens de poros, fração grossa e
fração fina.................................................................................................................................................192
15 Figura 5.39. Fotomicrografias da mF 3, amostra 3a, do sítio Morrinhos: A) seção vertical esquemática
com localização da amostra para micromorfologia; B) massa basal da mF 3a.1, formada principalmente
por conchas de distribuição sub-horizontal e fragmentos de osso, PPL; C, D) detalhe da massa basal da
mF 3a.1, com fragmentos de concha e osso em meio a micromassa fosfática com áreas de concentração
de micrita associada à dissolução das conchas, PPL e XPL; E, F) massa basal da mf 3a.2, com grãos de
quartzo e feldspato em micromassa de argilominerais, com diatomáceas, PPL e XPL............................203
Figura 5.40. Fotomicrografias da micromassa da mF 3a.1: A, B) fragmento de osso com sinais de
dissolução e revestimento de micrita, PPL e XPL. C, D) fragmentos de osso, em micromassa fosfática de
baixa birrefringência, PPL e XPL.............................................................................................................204
Figura 5.41. Fotomicrografias da mF 3, amostra 3b, do sítio Morrinhos: A) seção vertical esquemática
com localização da amostra para micromorfologia; B) massa basal composta por fragmentos de concha e
ossos, com alguns indivíduos queimados, com microestrutura de microagregados intergranulares e
presença de raízes frescas, PPL; C, D) área de concentração de conchas e ossos queimados, carvão e
cinzas sobre concha de molusco sem evidências de queima, PPL, XPL; E, F) micromassa composta por
micrita com argilominerais, fosfatos e microcarvões entre finos fragmentos de osso queimado, PPL e
XPL. .........................................................................................................................................................205
Figura 5.42. Fotomicrografias de cinzas de madeira identificadas na seção delgada 3a do sítio Morrinhos:
A, B) área de concentração de cinzas entre restos de tecido silicificado, com concentração de fragmentos
de osso queimados na porção superior em meio a micromassa de argila rubefacta, PPL e XPL; C, D)
concentração de cinzas rubefactas, PPL e XPL........................................................................................206
Figura 5.43. Fotomicrografias da mF 4, amostra 4a, do sítio Morrinhos; A) seção vertical esquemática,
com localização da amostra para micromorfologia; B) porção da seção delgada com as três microfácies
identificadas, PPL; C) concentração de conchas queimadas a temperatura superior a 600° C na mF 4a.1,
PPL; D) massa basal da mF 4a.2 com microestrutura de grãos de quartzo e feldspato revestidos
interligados, com alguns fragmentos de concha, PPL; E) detalhe da mF 4a.2 com micromassa composta
por argilominerais, PPL; F) agregado milimétrico de lama que caracteriza à mF 4a.3, PPL. ..................207
Figura 5.44. Fotomicrografias de elementos de destaque na mF 4a.1: A) agregado de argila rubefacta
associado a conchas queimadas a diferentes temperaturas de, pelo menos, duas espécies de moluscos,
PPL; B) concha queimada a 800° C em micromassa composta por cinzas e argila rubefacta, PPL; C)
escória vítrea, PPL; D) concha com fragmentos de perióstraco carbonizado, alguns já separados da valva
e outros ainda aderidos, PPL. ...................................................................................................................208
Figura 5.45. Restos de tecidos silicificados na mF 4a.1: A-C) intercalação entre células alongadas e
arredondadas, PPL; D) detalhe dos tecidos vegetais observados, PPL.....................................................208
Figura 5.46. Componentes inorgânicos de origem biológica dentro dos agregados de lama da mF 4a.3: A,
B) gastrópode, PPL; C, D) espécie de diatomácea encontrada com maior freqüência nos agregados de
lama (Paralia sulcata), PPL. ....................................................................................................................209
Figura 5.47. Fotomicrografias da mF 4, amostra 4b, do sítio Morrinhos: A) seção vertical esquemática
com localização da amostra para micromorfologia; B) agregado de lama, PPL; C, D) massa basal com
fragmentos de concha e ossos com sinais de queima, em microestrutura esponjosa com microagregados
intergranulares interligados, PPL e XPL; E, F) detalhe da micromassa formada por micrita com
argilominerais, nódulos órticos de óxi-hidróxido de ferro e enchimentos de micrita, PPL e XPL...........210
Figura 5.48. Feições pedológicas do sítio Morrinhos: A) revestimento pendular de micrita, PPL; B)
Revestimento contínuo, não laminado de microespato redor de um vazio, PPL; C, D) enchimento denso
incompleto de micrita proveniente da dissolução e precipitação do carbonato de cálcio das conchas, PPL e
16 XPL; E) revestimento de espato, PPL; F) nódulo órtico de óxi-hidróxido de ferro em agregado de lama,
PPL...........................................................................................................................................................211
Figura 5.49. Seções verticais estudadas do sítio Jabuticabeira 1, com localização dos pontos de
amostragem e descrição das arqueofácies identificadas. ..........................................................................212
Figura 5.50. Gráficos das distribuições granulométricas e parâmetros estatísticos para o sítio Jabuticabeira
1 e amostragem em sedimentos naturais das proximidades: A) histogramas da distribuição granulométrica
para as AF 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7 e 9 do sambaqui Jabuticabeira 1. Note-se o domínio da fração areia média
para as arqueofácies analisadas na seção inferior (AF 1 a AF 5) e aumento progressivo da fração areia
fina no topo da seção inferior (AF 6) e na seção superior (AF 7 e AF 9); B) diagramas em caixa (boxplot)
das estatísticas diâmetro médio, desvio padrão e assimetria para o conjunto de amostras do sítio
Jabuticabeira 1 e amostras paleolagunares (PL) das sondagens realizadas nas proximidades do sambaqui
Jabuticabeira 2 (Villagran, 2010) localizado a pouco mais de 2 km de Jabuticabeira 1...........................215
Figura 5.51. Fotomicrografias à lupa estereoscópica dos grãos retidos nas malhas de 1,0 mm e 0,5 mm das
arqueofacies 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7 e 9 do sítio Jabuticabeira 1. Note-se a presença de ossos (o), conchas (ch),
carvão (cr), grãos de quartzo (q) e fragmentos de osso carbonizado (oc). ...............................................216
Figura 5.52. Análises isotópicas (δ13C e δ15N e razão C/N) de amostras provenientes das AF 1, 2, 3, 4, 5,
6 e 7 do sítio Jabuticabeira 1: A) gráfico de valores de δ13C e razão C/N com intervalos definidos para
plantas de ciclo fotossintético C3 e algas; B) gráfico dos valores de δ15N e δ13C, com intervalos definidos
para plantas de ciclo fotossintético C3 e animais marinhos. ....................................................................219
Figura 5.54. Gráficos com porcentagens dos diferentes componentes microscópicos das microfácies
identificadas nas AF 5 (mF 5), 6 (mF 6), 7 (mF 7.1, 7.2, 7.3 e 7.4), 8 (mF 8) e 9 (mF 9) do sítio
Jabuticabeira 1: A) freqüências de componentes da fração grossa; B) relação entre as porcentagens de
poros, fração grossa e fração fina. ............................................................................................................219
Figura 5.53. Desenho esquemático das cinco seções delgadas analisadas no sítio Jabuticabeira 1, com
localização do bloco de amostragem na sucessão vertical inferior (esquerda) e superior (direita) e
identificação de microfácies na lâmina. ...................................................................................................220
Figura 5.55. Fotomicrografias da mF 5, amostras 5 e 5/6, do sítio Jabuticabeira 1: A) seção vertical
esquemática, com localização da amostra para micromorfologia; B) massa basal da mF 5 formada por
conchas de distribuição sub-horizontal com alguns fragmentos de osso e carvão, PPL; C) agregado
milimétrico de argilomineral, PPL; D) agregado de argilominerais associado à face côncava de concha de
Anomalocardia brasiliana; E, F) micromassa de grãos revestidos interligados, PPL e XPL...................233
Figura 5.56. Fotomicrografias de elementos de componentes da fração grossa da mF 5 (PPL): A) escória
vítrea; B) concentração de diatomáceas da espécie Paralia sulcata em agregado de argilominerais; C)
gastrópode; D) fragmento de osso, com sinais de dissolução...................................................................234
Figura 5.57. Fotomicrografias da mF 6, amostra 5/6, do sítio Jabuticabeira 1: A) seção vertical
esquemática com localização da amostra para micromorfologia; B) massa basal formada por fragmentos
de concha, osso e grãos de quartzo em microestrutura de microagregados intergranulares, PPL; C, D)
detalhe da micromassa composta por argilominerais, MO e fosfatos, com inclusões de fragmentos de osso
na fração silte, PPL e XPL. ......................................................................................................................234
Figura 5.58. Fotomicrografias da mF 7 do sítio Jabuticabeira 1: A) seção vertical esquemática com
localização da amostra para micromorfologia; B) massa basal da mF 7.1, formada por agregados de
argilominerais rubefactos e carbonizados com camada de conchas queimadas a temperaturas maiores que
600°C, PPL; C) detalhe de agregado de argila rubefacta, PPL; D) massa basal da mF 7.2, formada por
fragmentos de concha de distribuição horizontal entre microagregados intergranulares, PPL; E) massa
17 basal da mF 7.3, composta por argilominerais com micrita e MO em microestrutura de grânulos coesivos,
PPL; F) massa basal da mF 7.4 formada por agregados centimétricos de argilominerais, PPL. ..............235
Figura 5.59. Fotomicrografias de elementos de destaque na mF 7.1: A, B) agregado de argila rubefacta,
PPL e XPL; C) agregado de argila queimada com gastrópode, PPL; D) interior de agregado de argila
queimada com diatomáceas da espécie Paralia sulcata; E) concha queimada a temperatura superior a
700° C, PPL; F) detalhe de concha queimada a temperatura superior a 800° C, com concentração de
espato associada a degradação da concha calcinada, PPL........................................................................236
Figura 5.60. Fotomicrografias de elementos de destaque nas mF 7.3 e 7.4: A) gastrópodes na mF 7.3,
PPL; B) concha queimada a temperatura superior a 600° C na mF 7.3, PPL; C) agregado de argila da mF
7.4, com diatomácea de espécie Triceratum flavus, PPL; D) concentração de diatomáceas das espécies
Paralia sulcata, Actinoptycus vulgaris e Coscinodiscus sp., na mF 7.3, PPL; E, F) grão de argila
glauconítica em agregado de argilominerais da mF 7.4, PPL e XPL. ......................................................237
Figura 5.61. Fotomicrografias da mF 8 do sítio Jabuticabeira 1: A) seção vertical esquemática com
localização da amostra para micromorfologia; B) massa basal da mF 8, formada por fragmentos de
concha com distribuição aleatória; C, D) micromassa formada por argilominerais e micrita, PPL e XPL.
..................................................................................................................................................................238
Figura 5.62. Fotomicrografias da mF 9 do sítio Jabuticabeira 1: A) seção vertical esquemática com
localização da amostra para micromorfologia; B) massa basal da mF 9 formada por fragmentos de concha
de distribuição horizontal com agregados milimétricos de argilominerais, PPL; C, D) micromassa
formada por argilominerais e micrita, com agregados de argilominerais, PPL e XPL.............................238
Figura 5.63. Seção vertical estudada do sítio Santa Marta 10: A) localização dos pontos de amostragem e
descrição das arqueofácies identificadas; B) seção transversal esquemática (sem escala) da área de
localização do sítio. ..................................................................................................................................241
Figura 5.64. Amostragem externa ao sítio Santa Marta 10: A) localização do ponto de amostragem; B)
entorno de localização; C) descrição das fácies identificadas; D) trincheira amostrada com localização das
fácies.........................................................................................................................................................242
Figura 5.65. Gráficos das distribuições granulométricas e estatísticas descritivas para o sítio Santa Marta
10 e amostras de sedimentos naturais das proximidades: A) histogramas da distribuição granulométrica
para as Fácies A e B identificadas no sítio Santa Marta 10 e Fácies B2 do ponto de amostragem externa
ao sambaqui; note-se o domínio da fração areia fina em todas as amostras; B) diagramas em caixa
(boxplot) das estatísticas diâmetro médio, desvio padrão e assimetria para amostra da Fácies B do sítio
Santa Marta 10 (SM10), das Fácies A e B2 da amostragem externa (SM10*) e das amostras da geração
de dunas eólicas 2 (G2) tomadas de Giannini et al. (2007), Giannini (1993), Martinho (2004) e Sawakuchi
(2003). ......................................................................................................................................................243
Figura 5.66. Análises isotópicas (δ13C e δ15N e razão C/N) de amostras provenientes das Fácies B e B2 do
sítio Santa Marta 10: A) gráfico de valores de δ13C e razão C/N com intervalos definidos para plantas de
ciclo fotossintético C3 e algas; B) gráfico dos valores de δ15N e δ13C, com intervalos definidos para
plantas de ciclo fotossintético C3 e animais marinhos. ............................................................................244
Figura 5.67. Seções delgadas analisadas no sítio Santa Marta 10 (amotras SM 10 A e SM 10 A/B) e fora
do sítio (SM 10 B2), com localização dos blocos de amostragem na sucessão vertical e identificação de
microfácies na lâmina...............................................................................................................................245
Figura 5.68. Gráficos com porcentagens dos diferentes componentes microscópicos das microfácies
identificadas nas Fácies A (mF A), B (mF B), A2 (mF A2) e B2 (mF B2) do sítio Santa Marta 10: A)
18 freqüências de componentes da fração grossa; B) relação entre as porcentagens de poros, fração grossa e
fração fina.................................................................................................................................................245
Figura 5.69. Fotomicrografias de grãos minerais no sítio Santa Marta 10: A, B) mineral opaco e mineral
pesado anisotrópico, PPL e XPL; C, D) clasto de argila. Pelas suas propriedades ópticas, como coloração
esverdeada (PPL) e cor de interferência laranja os clastos de argila poderiam ser esmectita ou glauconita.
..................................................................................................................................................................251
Figura 5.70. Fotomicrografias da mF A do sítio Santa Marta 10: A) seção vertical esquemática, com
localização da amostra para micromorfologia; B) massa basal composta por grãos de quartzo, feldspato,
minerais pesados e opacos, PPL; C, D) detalhe dos revestimentos delgados de MO ao redor dos grãos
minerais, PPL e XPL. ...............................................................................................................................252
Figura 5.71. Fotomicrografias da mF B do sítio Santa Marta 10: A) seção vertical esquemática, com
localização da amostra para micromorfologia; B) massa basal composta por grãos de quartzo, feldspato,
minerais pesados e opacos, PPL; C, D) microestrutura de grãos revestidos, PPL e XPL; E, F) detalhe dos
revestimentos de MO ao redor dos grãos da fração grossa, PPL..............................................................253
Figura 5.72. Fotomicrografias da mF B2 nas proximidades do sítio Santa Marta 10: A, B) massa basal
composta por grãos simples e interligados, PPL e XPL; C-F) detalhe dos revestimentos de argila microlaminada, PPL e XPL. ..............................................................................................................................254
Figura 5.73. Seção vertical estudada do sítio Carniça 3: A) localização dos pontos de amostragem e
descrição das arqueofácies identificadas; B) seção transversal esquemática (sem escala) da área de
localização do sítio. ..................................................................................................................................255
Figura 5.74. Gráficos das distribuições granulométricas e parâmetros estatísticos para o sítio Carniça 3 e
amostragem em sedimentos naturais das proximidades: A) histogramas da distribuição granulométrica
para as Fácies A e B identificadas no sítio Carniça 3; os dados referentes à AF A foram tomados de
Tanaka (2007); note-se o domínio da fração areia fina na AF 1 e de areia muito fina na AF 2; B)
diagramas em caixa (boxplot) das estatísticas diâmetro médio, desvio padrão e assimetria para AF 2 de
Carniça 3 (CR3), dunas de geração 2 (G3) e amostras de cordões litorâneos (CL) tomados de Tanaka
(2007). ......................................................................................................................................................256
Figura 5.75. Fotomicrografias à lupa estereoscópica de grãos retidos nas malhas de 1,0 mm e 0,5 mm, da
arqueofacies 2 do sítio Carniça 3. Note-se a presença de ossos (o), conchas (ch), carvão (cr) e dente de
miraguaia (d). ...........................................................................................................................................257
Figura 5.76. Análises isotópicas (δ13C e δ15N e razão C/N) de amostra proveniente da AF 2 do sítio
Carniça 3: A) gráfico de valores de δ13C e razão C/N com intervalos definidos para plantas de ciclo
fotossintético C3 e algas; B) gráfico dos valores de δ15N e δ13C com intervalos definidos para plantas de
ciclo fotossintético C3 e animais marinhos. .............................................................................................258
Figura 5.77. Desenho esquemático da seção delgada analisada no sítio Carniça 3, com localização do
bloco de amostragem na sucessão vertical e identificação de microfácies na lâmina. .............................259
Figura 5.78. Gráficos com porcentagens dos diferentes componentes microscópicos da mF 2 do sítio
Carniça 3: A) freqüências de componentes da fração grossa; B) relação entre as porcentagens de poros,
fração grossa e fração fina........................................................................................................................259
Figura 5.79. Fotomicrografias da mF 2 do sítio Carniça: A) seção vertical esquemática, com localização
da amostra para micromorfologia; B) massa basal composta por conchas de Anomalocardia brasiliana
inteiras com distribuição (trama/ arranjo) sub-horizontal, PPL; C, D) massa basal com conchas inteiras e
19 fragmentadas, a PPL e XPL; E, F) micromassa composta por agregados de MO polimórfica em forma de
pellets, a PPL e XPL.................................................................................................................................263
Figura 5.80. Fotomigrografias de elementos de interesse na mF 2 do sítio Carniça 3: A) fragmento de osso
com sinais de queima; B, C) conchas com bioerosão; D) excrementos elipsóides de ácaros dentro de raiz,
PPL...........................................................................................................................................................264
Figura 5.81. Seção vertical estudada do sítio Santa Marta 8: A) localização dos pontos de amostragem e
descrição das arqueofácies identificadas; B) seção transversal esquemática (sem escala) da área de
localização do sítio. ..................................................................................................................................265
Figura 5.82. Amostragem externa ao sítio Santa Marta 8: A) localização do ponto de amostragem; B)
entorno de localização; C) descrição das fácies identificadas; D) trincheira amostrada com localização das
fácies.........................................................................................................................................................266
Figura 5.83. Histogramas da distribuição granulométrica para as AF 1, 2 e 3 do sítio Santa Marta 8 e
Fácies A e B identificadas na trincheira de amostragem externa ao sítio. Note-se o domínio da fração
areia fina em todas as amostras. ...............................................................................................................267
Figura 5.84. Fotomicrografias à lupa estereoscópica de grãos retidos nas malhas de 1,0 mm e 0,5 mm, da
arqueofacies 1, 2 e 3 do sítio Santa Marta 8 e Fácies B da trincheira aberta em área externa ao sítio. Notese a presença de ossos (o), osso carbonizado (or), e osso calcinado (oc) e dente (d). ..............................268
Figura 5.85. Análises isotópicas (δ13C e δ15N) e razão C/N de amostras provenientes das AF 2 e 3 do sítio
Santa Marta 8 e Fácies B da amostragem extra-sítio: A) gráfico de valores de δ13C e razão C/N com
intervalos definidos para plantas de ciclo fotossintético C3 e algas; B) gráfico dos valores de δ15N e δ13C
com intervalos definidos para plantas de ciclo fotossintético C3 e animais marinhos. ............................269
Figura 5.86. Seções delgadas analisadas no sítio Santa Marta 8, com localização do bloco de amostragem
na sucessão vertical e identificação de microfácies na lâmina. ................................................................270
Figura 5.87. Gráficos com porcentagens dos diferentes componentes microscópicos das mF 1, 2, 3a e 3b
do sítio Santa Marta 8. A) freqüências de componentes da fração grossa; B) relação entre as porcentagens
de poros, fração grossa e fração fina. .......................................................................................................270
Figura 5.88. Fotomicrografias das mF 1 e 2 do sítio Santa Marta 8: A) seção vertical esquemática, com
localização da amostra para micromorfologia; B) contato entre a mF 1, inferior, e a mF 2, superior, PPL;
C) massa basal da mF 1 composta por grãos de quartzo, PPL; D) microestrutura de grãos interligados da
mF 1, formada por micromassa de argilominerais com micro-fragmentos de osso e microcarvão, PPL; E)
massa basal da mF 2 formada por ossos, fragmentados e inteiros, carvão e grãos de quartzo, PPL; F)
microestrutura da mF 2 formada por microagregados intergranulares e grãos revestidos, PPL...............277
Figura 5.89. Fotomicrografias de elementos de interesse na mF 2 do sítio Santa Marta 8: A) agregado de
argilominerais com diatomáceas, PPL; B) concentração de espículas de esponja e diatomáceas, PPL; C)
agregado de escória vítrea, PPL; D) micromassa transparente com microcarvão e micro-fragmentos de
osso, PPL; E, F) revestimentos impuros, micro-laminados, PPL. ............................................................278
Figura 5.90. Fotomicrografias da mF 3 do sítio Santa Marta 8: A) seção vertical esquemática, com
localização das amostras para micromorfologia; B, C) massa basal composta por bolsões de fragmentos
de osso milimétricos, carvão e grãos de quartzo, PPL; D) áreas com microestrutura de microagregados
intergranulares, PPL; E, F) detalhe da micromassa formada por micro-fragmentos de osso, agregados de
fosfato secundário e microcarvão, PPL. ...................................................................................................279
20 Figura 5.91. Fotomicrografias de fragmentos de osso na mF 3 com birrefringência baixa, de primeira
ordem, a PPL (A, C) e XPL (B, D)...........................................................................................................280
Figura 5.92. Fotomicrografias de partículas silicosas na mF 2 e 3: A) detalhe de agregado de espículas de
esponja e diatomáceas na mF 2, PPL; B) diatomáceas e fitólitos entre fragmentos de osso de peixe na mF
2, PPL; C) detalhe de B, com frústula da diatomácea Coscinodiscus excentricus; D) fitólito alongado na
mF 3, com sinais de derretimento, PPL....................................................................................................280
Figura 5.93. Seção vertical estudada do sítio Galheta 4: A) localização dos pontos de amostragem e
descrição das arqueofácies identificadas; B) seção transversal esquemática (sem escala) da área de
localização do sítio. ..................................................................................................................................283
Figura 5.94. Gráficos das distribuições granulométricas e parâmetros estatísticos para o sítio Galheta 4 e
amostragem em sedimentos naturais das proximidades: A) histogramas da distribuição granulométrica
para as Fácies A, B e AF 1; note-se o domínio da fração areia muito fina na Fácies A e areia fina na AF 1
e Fácies B; B) diagramas em caixa (boxplot) das estatísticas diâmetro médio, desvio padrão e assimetria
para AF 1 do sítio Galheta 4 (GA4), Fácies A (GA4*) e geração de dunas eólicas 1 (G1), 2 (G2), 3 (G3) e
4 (G4) tomadas de Giannini et al., (2007), Giannini (1993), Martinho (2004) e Sawakuchi (2003)........284
Figura 5.95. Fotomicrografias à lupa estereoscópica de grãos retidos nas malhas de 1,0 mm e 0,5 mm, da
arqueofacies 1 do sítio Galheta 4. Note-se a presença de ossos (o), osso carbonizado (Os.car. = or) e osso
calcinado (Os.cal. = oc)............................................................................................................................285
Figura 5. 96. Análises isotópicas (δ13C e δ15N e razão C/N) de amostras provenientes da AF 1 e Fácies B
do sítio Galheta 4: A) gráfico de valores de δ13C e razão C/N com intervalos definidos para plantas de
ciclo fotossintético C3 e algas; B) Gráfico dos valores de δ15N e δ13C com intervalos definidos para
plantas de ciclo fotossintético C3 e animais marinhos. ............................................................................286
Figura 5.97. Desenho esquemático das seções delgadas analisadas no sítio Galheta 4, com localização dos
blocos de amostragem na sucessão vertical e identificação de microfácies nas lâminas..........................287
Figura 5.98. Gráficos com porcentagens dos diferentes componentes microscópicos da mF 1 do sítio
Galheta 4: A) frequências de componentes da fração grossa; B) relação entre as porcentagens de poros,
fração grossa e fração fina........................................................................................................................287
Figura 5.99. Fotomicrografias da mF 1 do sítio Galheta 4: A) seção vertical esquemática, com localização
da amostra para micromorfologia; B) massa basal composta por grãos de areia quartzosa e fragmentos de
osso queimado, PPL; C, D) micromassa composta por MO monomórfica, PPL e XPL; E) detalhe da
micromassa com inclusões de fragmentos de osso, PPL; F) revestimento de MO monomórfica ao redor de
grão de quartzo, PPL. ...............................................................................................................................291
Figura 5.100. Fotomicrografias de elementos identificados na mF 1 do sítio Galhera 4: A) revestimento de
MO monomórfica ao redor de escória vítrea, PPL; B, C) fitólito PPL; D) revestimento de MO
monomórfica com inclusões de finos fragmentos de osso ao redor de fragmento de osso, PPL..............292
Figura 5.101. Fotomicrografias da coleção de referência experimental: A) microfácies superior da
amostra do caminho de animais, com agregados lenticulares, PPL; B) microfácies intermediária do
caminho de animais, com detalhe da concentração de esporas de fungos (e); C) praia de seixos próxima
aos concheiros, notando-se o predomínio de ossos de mamífero marinho, com detalhe de ósteons
dissolvidos, PPL; D) praia de seixos com fragmentos de concha de coloração diversa, PPL; E)
serrapilheira sob a floresta de Nothofagus sp., em que se nota concentração de excrementos de ácaros
dentro de tecido de madeira, PPL; F) camada de substâncias húmicas (camada H) sob a floresta, com
agregados de matéria orgânica decomposta, PPL.....................................................................................297
21 Figura 5.102. Fotomicrografias das três fogueiras experimentais estudadas na Terra do Fogo: A) camada
milimétrica de cinzas e resíduos vegetais oxidados na fogueira sobre o prado, PPL; B) fogueira na praia,
com fragmentos de osso de mamífero marinho queimados, PPL; C) fogueira no acampamento dos
arqueólogos, formada por cinzas, carvão e argila rubefacta, PPL; D) agregados de POCC.....................298
Figura 5.103. Alteração de Mytilus edulis a 200°C e 300°C: A1) concha queimada a 200°C com
superfície avermelhada; A2-4) fotomicrografias das camada interna e externa ainda preservadas, com
escurecimento das bordas, PPL e XPL; A5) detalhe de perióstraco preservado; B1) concha queimada a
200° C; B2-5) fotomicrografias da concha queimada; note-se camada interna avermelhada e com fissuras
incipientes, PPL e XPL. ...........................................................................................................................301
Figura 5.104. Alteração de Mytilus edulis a 400°C e 500°C: A1) concha queimada a 400°C, com
coloração acinzentada; A2-5) fotomicrografias da concha queimada com formação de fissuras
longitudinais, escurecimento e coloração avermelhada da camada interna e mudança no tamanho dos
cristais da calcita que compõe a camada exterior, PPL e XPL; B1) concha queimada a 500°C de
coloração acinzentada e alta fragilidade; B2-5) fotomicrografias mostrando separação completa da valva
interna e externa e múltiplas fissuras longitudinais e transversais à superfície da valva, PPL e XPL......302
Figura 5.105. Alteração de Mytilus edulis a 700°C e 800°C: A1) concha queimada a 600°C, com
coloração acinzentada; A2-5) fotomicrografias da concha queimada de coloração castanho escuro a preta
(PPL) e manchas escuras a XPL, com fissuras na camada interior e calcita fibrosa na camada exterior da
valva; B1) concha queimada a 800°C, com cor branca; B2-5) valva completamente deformada de
coloração preta (PPL) com pseudo-vacuólos. ..........................................................................................303
Figura 5.106. Macro e microestratigrafia do concheiro Túnel 7: A) sucessão vertical esquemática, a partir
de informações disponíveis em Orquera (1996), com localização das duas colunas de amostragem para
micromorfologia (C11 e C12); B) microfácies identificadas na C11 e C12, com correlação entre as
sucessões estratigráficas de cada coluna. Note-se correspondência da unidade B35. ..............................308
Figura 5.107. Fotomicrografias de elementos encontrados no concheiro Túnel 7: A) concha com
perióstraco preservado, acompanhada de micromassa de agregados mamilares pretos, PPL; B) fragmento
de osso intemperizado, identificado graças à seção delgada de referência coletada da praia de seixos, PPL;
C) detalhe de agregados em blocos angulares que caracterizam à mF 2, com cristais aciculares de calcita
na micromassa, PPL e XPL; D) mesmo agregado de C, a XPL; E, F) fragmento de concha com cristais
aciculares de calcita que se desprendem, PPL e XPL...............................................................................311
Figura 5.108. Fotomicrografias das seções delgadas 2B e 3B da coluna 12 do sítio Túnel 7 (PPL): A)
desenho esquemático da seção delgada 2B; B) mF 1, com fragmentos de concha (c) e fragmentos líticos
(fl); C) mF 2, com blocos angulosos de argila organomineral com finos fragmentos de concha e osso; D)
mF 3, com fragmentos de concha de espécie indeterminada e fragmentos de concha de gastrópode (g); E)
desenho esquemático da seção delgada 3B; F) mF 4, formada por conchas de espécie indeterminada,
conchas de mexilhão (m) e fragmentos líticos de distribuição horizontal e empacotamento fechado......312
Figura 5.109. Fotomicrografias das seções delgadas 4B, 5B e 6B da coluna 12 do sítio Túnel 7 (PPL): A)
desenho esquemático da seção delgada 4B; B) mF com conchas de mexilhão (m) inteiras; C) desenho
esquemático da seção delgada 5B; D) mF 4, com conchas de mexilhão e carvão (cr) de distribuição
horizontal; E) desenho esquemático da seção delgada 6B; F) mF 3 com conchas de mexilhão
fragmentadas in situ, fragmentos líticos (fl) e concha queimada (cq). .....................................................313
Figura 5.110. Fotomicrografias das seções delgadas 7B e 8B da coluna 12 do sítio Túnel 7 (PPL): A)
desenho esquemático da seção delgada 7B; B) mF 3, com conchas inteiras de mexilhão (m) e conchas
fragmentadas in situ; C) detalhe de bloco anguloso da mF 2 com fragmento de osso no interior (o); D) mF
22 5, composta por camada de seixos (fl); E) desenho esquemático da seção delgada 8B; F) mF 4, composta
por conchas de mexilhão de distribuição horizontal e empacotamento fechado. .....................................314
Figura 5.111. Seção esquemática, sem escala, do sítio Túnel 7, com localização das cinco fogueiras
estudadas (AC4, 5, 6, 8 e 10) e desenho esquemático das seções delgadas de cada fogueira, com
identificação de microfácies. ....................................................................................................................318
Figura 5.112. Fotomicrografias da mF 7 (AC4, 5 e 6): A) seção vertical esquemática, com localização das
fogueiras amostradas para micromorfologia; B) micromassa da AC 4, composta por fragmentos de
concha queimados com grânulos soltos de microcarvão, PPL; C) micromassa da AC5 composta por
fragmentos de concha queimados e carvão, entre grânulos finos de microcarvão, PPL; D) revestimento
pendente de calcita na AC 6, PPL; E, F) parte da micromassa da AC 6 formada por cinzas e argila
rubefacta, PPL e XPL. ..............................................................................................................................319
Figura 5.113. Fotomicrografias da mF 8 (AC 8 e 10): A) seção vertical esquemática, com localização das
fogueiras amostradas para micromorfologia; B, C) massa basal da AC8, com microestrutura em câmara
com conchas e ossos queimados, fragmentos líticos e vazios em canal e em câmara, PPL; D) massa basal
da AC10, com microestrutura em câmera e fração grossa composta por conchas queimadas e fragmentos
líticos, PPL; E, F) micromassa da AC8, formada por cinzas e argila rubefacta, PPL e XPL. ..................320
Figura 6.1. Mapa da área de estudo, com localização dos concheiros naturais identificados por Hurt
(1974), Caruso Jr. (1995), Fornari (2010) e Nascimento (2011). .............................................................335
Figura 6.2. Análises isotópicas (δ13C e δ15N e razão C/N) de amostras provenientes dos oito sambaquis
analisados nesta tese e de trincheiras de amostragem externas a cinco deles: Caipora, Cubículo 1, Galheta
4, Santa Marta 8 e Santa Marta 10: A) gráfico de valores de δ13C e razão C/N para amostras coletadas em
sambaquis conchíferos, com intervalos definidos para plantas de ciclo fotossintético C3, C4 e algas; B)
gráfico dos valores de δ15N e δ13C para amostras coletadas em sambaquis conchíferos, com intervalos
definidos para plantas de ciclo fotossintético C3, C4, animais marinhos e animais terrestres; C) gráfico de
valores de δ13C e razão C/N para todas as amostras analisadas nesta tese, com intervalos definidos para
plantas de ciclo fotossintético C3 e algas; D) gráfico dos valores de δ15N e δ13C para todas as amostras
analisadas nesta tese, com intervalos definidos para plantas de ciclo fotossintético C3 e animais marinhos;
E) gráfico de valores de δ13C e razão C/N com intervalos definidos para plantas de ciclo fotossintético C3,
C4 e algas para amostras provenientes dos oito sambaquis analisados nesta tese e amostras de testemunhos
coletados por Amaral (2008), Amaral et al. (2012) e Nascimento (2011) em fácies lagunares e deltaicas
da região de estudo; F) gráfico dos valores de δ15N e δ13C com intervalos definidos para plantas de ciclo
fotossintético C3, C4 e animais marinhos..................................................................................................341
Figura 6.3. Gráfico dos valores de δ13C e δ15N de amostras provenientes dos quatro sambaquis
conchíferos analisados, com intervalos de referência para plantas de ciclo fotossintético C3, moluscos,
peixes de água doce, peixes marinhos e mamíferos marinhos..................................................................342
Figura 6.4. Gráfico de componentes principais para 23 seções delgadas dos quatro sambaquis conchíferos
analisados. ................................................................................................................................................369
Figura 6.5. Concheiros do Canal Beagle: A) perfil do sítio Túnel 1 (Orquera & Piana 1999: 33); B) perfil
de um concheiro na Ilha Navarino (Handbook of South American Indians, volume 1, 1945: 28); C) perfil
estratigráfico do sítio Túnel 7; D) concheiros anelares na Baía Cambaceres; E) sítio Kurakani (Orquera &
Piana 1999: 25); E) concheiros da Ilha Navarino (Handbook of South American Indians, volume 1, 1945:
27). ...........................................................................................................................................................426
23 ÍNDICE DE QUADROS E TABELAS Quadro 3.1. Sambaquis do litoral sul de Santa Catarina estudados neste trabalho. As idades e setores de
loclaização foram tomados de Giannini et al. (2010). ................................................................................88 Quadro 3.2. Informações sobre contexto geológico-geomorfológico, coordenadas UTM e cronologia do
concheiro etno-histórico Túnel 7 estudado neste trabalho........................................................................105 Quadro 4.1 Amostragem experimental em fogueiras e queima controlada de moluscos para atuar como
referência na identificação de fogueiras in situ e de resíduos queimados remanejados nos sambaquis. ..122 Quadro 4.2. Amostragem experimental em fogueiras e queima controlada de moluscos para atuar como
referência na identificação de fogueiras in situ e resíduos queimados remanejados em concheiros do
Canal Beagle. ...........................................................................................................................................125 Quadro 4.3. Síntese das diferentes análises realizadas por sítio arqueológico, na amostragem externa aos
sítios e na amostragem experimental (fogueiras e queima controlada de moluscos). TdF: Terra do Fogo;
SC: Santa Catarina....................................................................................................................................133 Quadro 5.1. Descrição das alterações térmicas observadas nas conchas de Anomalocardia brasiliana,
queimadas na mufla a temperaturas de 200 a 800° C. ..............................................................................144 Tabela 5.1. Descrição micromorfológica do sambaqui Caipora...............................................................157 Tabela 5.2. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra CA 2-3..............................159 Tabela 5.3. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra CA 3.................................160 Tabela 5.4. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra CA 4a. ..............................161 Tabela 5.5. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra CA 4b...............................162 Tabela 5.6. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra CA HA-4..........................163 Tabela 5.7. Descrição micromorfológica do sambaqui Cubículo 1..........................................................180 Tabela 5.8. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra CB1-9...............................181 Tabela 5.9. Descrição micromorfológica do sambaqui Morrinhos...........................................................193 Tabela 5.10. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra MO-3a............................195 Tabela 5.11. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra MO-3b............................196 Tabela 5.12. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra MO-4a............................197 Tabela 5.13. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra MO-4b............................198 Tabela 5.14. Descrição micromorfológica do sambaqui Jabuticabeira 1. ................................................221 Tabela 5.15. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra JB1-5..............................224 Tabela 5.16. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra JB1-5/6...........................225 Tabela 5.17. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra JB1-7..............................226 Tabela 5.18. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra JB1-8..............................228 Tabela 5.19. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra JB1-9..............................228 Tabela 5.20. Descrição micromorfológica do sambaqui Santa Marta 10. ................................................246 Tabela 5.21. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra SM10 A/B. .....................247 Tabela 5.22. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra SM10 B. .........................248 Tabela 5.23. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra SM10 B2. .......................249 Tabela 5.24. Descrição micromorfológica do sambaqui Carniça 3 ..........................................................260 Tabela 5.25. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra CR 3 2. ...........................261 Tabela 5.26. Descrição micromorfológica do sítio Santa Marta 8............................................................271 Tabela 5.27. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra SM8-1/2. ........................272 Tabela 5.28. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra SM8-3a...........................273 Tabela 5.29. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra SM8-3b. .........................273 Tabela 5.30 . Descrição micromorfológica do sítio Galheta 4. ................................................................288 Tabela 5.31. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra GA4-1. ...........................289 Tabela. 5.32. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra GA4-A/1. ......................289 Quadro 5.2. Alterações microscópicas de valvas de Mytilus edulis, queimadas de 200 a 800 º C. ..........304 Tabela 5.33. Descrição micromorfológica da coluna de amostragem do sítio Túnel 7. ...........................309 Tabela 5.34. Descrição micromorfológica das fogueiras (AC) identificadas na área central de Tunel 7. 317 Quadro 6.1. Espécies de moluscos identificadas nos sambaquis Caipora, Cubículo 1, Morrinhos e
Jabuticabeira 1, com descrição do substrato e ambiente onde a espécie vive. Dados de vermetídeos e
cirripídeos tomados de Laborel and Laborel-Deguen (1996). Demais moluscos tomados de Rios (1985).
..................................................................................................................................................................328 Quadro 6.2. Distribuição de espécies de moluscos nos sítios Caipora, Cubículo 1, Morrinhos e
Jabuticabeira 1. •••• = espécie dominante (50-70 %); ••• = espécie freqüente (10-50%); •• = poucos
24 indivíduos ou fragmentos (1-10%); • = ocasionais (<1%). As espécies identificadas em negrito são
aquelas que vivem aderidas a substrato rochoso em mar aberto..............................................................329 Quadro 6.3. Características da microfácies tipo A. ..................................................................................370 Quadro 6.4. Características da microfácies tipo B....................................................................................372 Quadro 6.5. Características da microfácies tipo C....................................................................................374 Quadro 6.6. Características da microfácies tipo D. ..................................................................................375 Quadro 6.7. Características da microfácies tipo E....................................................................................376 Quadro 6.8. Espécies de moluscos identificadas nos sambaquis Santa Marta 10 e carniça 3, com descrição
do substrato e ambiente onde a espécie vive. Dados sobre vermetídeos e cirripídeos tomados de Laborel
and Laborel-Deguen (1996). Demais moluscos tomados de Rios (1985). ...............................................382 Quadro 6.9. Distribuição de espécies de moluscos nos sítios Santa Marta 10 e Carniça 3. •••• = espécie
dominante (50-70 %); ••• = espécie frequente (10-50%); •• = poucos indivíduos ou fragmentos (1-10%); •
= ocasionais (<1%)...................................................................................................................................382 Quadro 6.10. Características da microfácies tipo F. .................................................................................393 Quadro 6.11. Características da microfácies tipo G. ................................................................................393 Quadro 6.12. Características da microfácies tipo H. ................................................................................394 Quadro 6.13. Características da microfácies tipo I...................................................................................405 Quadro 6.14. Características da microfácies tipo J...................................................................................407 Quadro 6.15. Características da microfácies tipo K. ................................................................................408 Quadro 6.16. Características da microfácies tipo L..................................................................................409 Quadro 6.17. Características da microfácies 1, 2 e 3 da C12 no concheiro Túnel 7.................................416 Quadro 6.18. Características da microfácies 4 e 5 da C12 no concheiro Túnel 7. ...................................418 Quadro 6.19. Características da microfácies 7 e 8 na área central do concheiro Túnel 7.........................420 25 CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO 1. PREMISSAS TEÓRICAS Este trabalho fundamenta-se no diálogo contínuo entre arqueologia e geociências,
voltado principalmente à interpretação cultural, a ser construída a partir da articulação
entre teorias ou programas de pesquisa arqueológica e teorias e métodos das
geociências. Os sambaquis ou concheiros, objeto de estudo desta tese, são definidos
como sítios monticulares construídos, já que resultam da ação humana de transporte
massivo de partículas, deposição em local específico e ocupação reiterada desse local,
independente da função atribuída à esta ocupação.
Sítios monticulares construídos podem incluir: 1) acumulações de resíduos
associados a ocupações domésticas, como, por exemplo, os numerosos middens situados
atrás das cabanas, nas aldeias circulares dos Kuikuro no Alto Xingu (Heckenberger,
1996; Schmidt and Heckenberger, 2009); 2) estruturas em terra de até 2 metros de
altura, a exemplo dos montículos funerários e áreas entaipadas associados à tradição
Taquara/ Itararé (Beber, 2004; Iriarte et al., 2008); e 3) estruturas maiores em terra, de
dezenas de metros de cumprimento, como plataformas cerimoniais, de residência,
cultivo etc., como as que existem em diversas áreas da Amazônia central até a Ilha do
Marajó (Erickson, 2000, 2008; Erickson & Balée, 2006; Schaan, 2008, 2010).
Frequentemente, a função de acúmulo residual é utilizada como argumento contra
a visão dos sítios de menor tamanho como construções ou produtos intencionais. Por
exemplo, no caso de assentamentos domésticos, a formação de montículos como
resultado da acumulação de resíduos é concebida como produto acidental e não como
projeto construtivo. No entanto, a intencionalidade na formação destes depósitos é
manifesta, já que, independente de seu uso ou função, resultam da ação humana
deliberada de acumulação de materiais em local selecionado, e não de agentes naturais
ou desconhecidos. Todos estes depósitos, sejam grandes lixões sejam plataformas
cerimoniais, são decorrência material da organização social do espaço e representam
construções dentro de sistemas culturalmente específicos.
26 A isto vincula-se outra premissa importante neste estudo: a concepção dos
sedimentos arqueológicos em sítios monticulares construídos, a exemplo dos
sambaquis, como produto humano e fonte de informações sobre a dinâmica cultural.
Estes sedimentos transformam-se em cultura material por terem sido deliberadamente
produzidos por um grupo com significados e finalidades próprios. Esta visão deriva da
abordagem de estudo de antropossolos, ou solos formados e caracterizados pelos efeitos
da influência humana (Eidt, 1984; French, 2003; Limbrey, 1975; Woods, 2003), e de
sedimentos (Butzer, 1989; Hassan, 1978; Stein and Farrand, 1985; Stein, 1985, 1987)
como parte do registro arqueológico. O estudo dos sedimentos arqueológicos,
especialmente em sítios construídos, é equiparável e complementar à análise artefatual.
A abordagem geoarqueológica proposta não se alinha com a perspectiva
adaptacionista e naturalizadora, frequentemente usada na geoarquelogia de concheiros e
no estudo de sítios costeiros do Holoceno inferior (ver Bailey & Flemming, 2008;
Bicho, 1994; Erlandson, 1994; Erlandson, 2001; Fa, 2008; Kennett, 2005; Orquera et
al., 2011; Piana & Orquera, 2009). O adaptacionismo concebe a unilateralidade da
relação entre meio ambiente e cultura e vê aos grupos humanos como em processo
constante de adaptação às alterações impostas pela natureza (Gnecco, 2003), enquanto a
perspectiva naturalizadora concebe os grupos caçador-coletores como em constante
procura da maximização do gasto energético (Ingold, 2000, 2002). Sob esta visão, os
grupos humanos definiriam o sistema de assentamento, densidade populacional,
estratégia de subsistência, entre outros, a partir da necessidade de obter o maior
rendimento das características e das eventuais mudanças do meio físico que ocupam.
Neste trabalho, os humanos são considerados agentes de transformação e parte
ativa na dinâmica das paisagens, entendidas como produto histórico da dialética entre
natureza e cultura (Balée, 1988; Balée & Erickson, 2006; Balée, 2006). O enfoque da
ecologia histórica, cada vez mais crescente na arqueologia da América do Sul, e
especialmente na da Amazônia (Arroyo-Kalin, 2008, 2010; Balée, 1994; Denevan,
1992; Erickson & Balée, 2006; Heckenberger et al., 2003; Neves & Petersen, 2006;
Schaan, 2010), traz uma mudança fundamental na antropologia de caçador-coletores e
revela a complexa dinâmica de interação e co-evolução entre os humanos e os sistemas
naturais.
À visão antropocêntrica segundo a qual humanos e processos naturais atuariam
como forças conjuntas na formação das paisagens, articulam-se, neste trabalho, as
27 considerações feitas a partir da arqueologia da paisagem sobre o valor simbólico e o
significado sociopolítico dos ambientes construídos (Criado-Boado, 1989, 1993, 1999;
Ingold, 1993). Os sambaquis do litoral sul de Santa Catarina (Brasil), objeto de estudo
deste trabalho, associam-se a transformações profundas de ordem social, onde gerações
de indivíduos eram agrupadas para. A construção destes sítios, e de sambaquis de menor
escala, envolve modificações do meio físico a partir da criação de estruturas que, na sua
forma atual e no seu significado pretérito, projetam o passado e incorporam atividades
que são essencialmente cíclicas (ver Stewart et al., 2004). Estes sítios serão utilizados
para contar a história do grupo envolvido na sua formação e da paisagem que eles
modelam e integram.
Na análise aqui proposta, seguem-se as linhas de interpretação avançadas por
Estevez et al. (1998) Estevez (2002), Gassiot & Estevez (2002), Fiore & Zangrando
(2006) e Zangrando (2009) para os concheiros fueguinos, e Gaspar 1 (2004), Gaspar et
al. (2007) e Klokler (2001, 2008), para os sambaquis catarinenses. Em termos gerais,
estes autores, desde a análise de diferentes componentes do registro arqueológico
(fauna, artefatos líticos e ósseos) e de marcos teóricos diversos, questionam a visão
normativa entre mudanças ambientais e processos de câmbio social, e disponibilidade
de recursos e estratégia de subsistência. Neste sentido, fatores ideológicos, simbólicos e
pressões ou conflitos sociais (intra e intergrupo), são considerados agentes fundamentais
nas mudanças observadas no registro arqueológico.
Em resumo, as premissas teóricas que nortearão esta tese incluem: 1) o uso dos
sedimentos arqueológicos como instrumento de interpretação arqueológica; 2) a visão
dialética dos humanos e o entorno físico que ocupam, com a paisagem como produto
histórico e recipiente de significados sociais; 3) a importância dos fatores ideológicos
nos processos de mudança em caçador-coletores.
1
Na arqueologia de sambaquis, a tese de Gaspar (1991) iniciou a visão destes concheiros como artefatos,
construído pelos indivíduos que o ocuparam a partir da deposição deliberada de materiais, resultado de
ações pertinentes ao sistema sócio-cultural sambaquieiro (Gaspar 1991: 85). 28 2. GEOARQUEOLOGIA DE CONCHEIROS Pela sua composição rica em restos faunísticos, principalmente malacológicos, os
sítios concheiros são tradicionalmente utilizados para reconstituir as atividades de
subsistência do grupo e as adaptações ecológicas a ambientes costeiros (Andrus &
Crowe, 2000; Bicho, 1994; Bird, 2002; Claasen, 1986a, 1986b; Erlandson, 1988, 1994;
Jerardino et al., 1992; D. Kennett, 2005; De Masi, 2001; Milner et al. 2007; Reitz, 1988;
Stiner et al., 2003; Waselkov, 1987). A ubiquidade cronológica e geográfica dos
concheiros serve para estudar a evolução das ocupações costeiras e o desenvolvimento
das primeiras economias marítimas, assim como para afirmar a importância das áreas
litorâneas no desenvolvimento cultural de caçador-coletores (Erlandson, 2001;
Erlandson et al., 2008; Fa, 2008; Jones et al., 2002; Mannino & Thomas, 2002; Rick et
al., 2005; Sandweiss, 2003; Waselkov, 1987; Yesner, 1980)
No entanto, a complexidade estratigráfica e composicional e os múltiplos
significados e processos associados à formação destes sítios abrem um leque maior de
estudos não exclusivamente focados na subsistência e adaptação. Por exemplo, estudos
recentes chamaram a atenção sobre o valor ritual da fauna recuperada em alguns
concheiros e no uso do próprio concheiro como área cerimonial (Bird and Bliege Bird,
1997, 2000; Claassen, 1991, 1996, 1998; DeBlasis et al., 2007; Klokler, 2008;
Lightfoot and Cerrato, 1988; Luby and Gruber, 1999; Luby, 2004; Russo, 2004). A
seguir, apresentam-se os principais temas de estudo em geoarqueologia de concheiros e
uma breve revisão dos trabalhos geoarqueológicos realizados na arqueologia de
sambaquis.
2.1. PRINCIPAIS TEMAS DE ESTUDO Na geoarqueologia de concheiros, o foco das análises, em geral, tem envolvido o
estudo da assembleia de moluscos como evidência da evolução geológica de áreas
costeiras e ribeirinhas. Os fatores ambientais, que influenciam o tipo e a disponibilidade
29 de recursos malacológicos, foram o principal objeto de estudo, em oposição aos fatores
comportamentais de manejo e descarte de resíduos que, ao longo ou curto prazo,
acabam formando o concheiro.
Em termos gerais, a geoarqueologia de concheiros envolve seis temáticas
fundamentais: 1) variações no nível relativo do mar (NRM) e sua influência na
localização dos depósitos e na exploração de recursos (Bailey & Craighead, 2003;
Cannon, 2000; Emery & Edwards, 1966; Erlandson, 1988 b; Fa, 2008; Fedje &
Christensen, 1999; Miller et al., 1995; Sandweiss, 2003); 2) dinâmica e geomorfologia
costeira, evolução sedimentar e ocupação humana (Bailey & Flemming, 2008; Bicho &
Haws, 2008; Fa, 2008; Mason, 1993; Whittacker & Stein, 1992); 3) reconstrução
paleoambiental, mediante articulação de informações produzidas a partir da análise de
moluscos provenientes de concheiros com dados geológicos, botânicos, isotópicos, etc.
(Cortez-Sanchez et al., 2008; Fa, 2008; Morey & Crothers, 1998; Sandweiss, 1996,
2003; Van der Schriek et al., 2007, 2008); 4) métodos para distinguir entre concheiros
naturais e antrópicos (Attenbrow, 1992; Bailey, 1977; Henderson et al., 2002;
Rosendahl et al., 2007; Rowland, 1994; Stone, 1995; Sullivan & Connor, 1993); 5)
datação de conchas carbonáticas para construir cronologias de ocupação (Bateman et
al., 2008; Deo et al., 2004; Erlandson & Rick, 2002); 6) métodos de estudo
estratigráfico e processos de formação de sítio (Arnold et al., 1997; Chadwick &
Madsen, 2000; Dalan et al., 1992; Morey et al., 2002; Stein, 1992 a– c, 1996; Stein et
al., 1992).
Dos seis grandes temas expostos, este trabalho concentra-se no último da lista.
Estudos pioneiros sobre arqueoestratigrafia de concheiros foram conduzidos por Julie
Stein desde a década de 1980. Os trabalhos da autora estabeleceram um marco de
referência para o estudo de concheiros no mundo. A sua contribuição mais importante
refere-se ao estabelecimento de um método de estudo estratigráfico que contempla a
caracterização dos sedimentos que compõem os concheiros, mediante ensaios
laboratoriais, e interpretação dos processos de formação dos sítios 2 (Morey et al., 2002;
Stein, 1992a- c, 1996; Stein et al., 1992).
Apesar dos trabalhos de Julie Stein, o uso da geoarqueologia na escala de sítio é o
tema de menor produção bibliográfica. Provavelmente, isto se relaciona ao fato da
2
A autora propôs também um método para determinação de taxas de acumulação/crescimento de
concheiros, a partir de datações 14C de carvão recuperado em áreas escavadas (Stein, 2003).
30 zooarqueologia, em vista da própria composição dos concheiros, ser considerada mais
adequada na caracterização e estudo estratigráfico-temporal deste tipo de sítio. Análises
faunísticas têm-se mostrado frequentemente suficientes para a interpretação de
mudanças em estratégias de subsistência e exploração dos recursos. Quando os
resultados da zooarqueologia são articulados com estudos geoarqueológicos, estes são
realizados não na escala de sítio, mas na de paisagem, a partir da combinação de
diversas análises faunísticas (taxonômicas, esclerocronológicas, isotópicas etc.) com
dados geológicos, botânicos etc., voltados à reconstrução do panorama de evolução
ecológico-geográfica e sua interação com as comunidades humanas.
Este trabalho adota uma abordagem geoarqueológica para o estudo de sambaquis
na escala de sítio a partir da análise padronizada das sucessões verticais, com o objetivo
de explorar os fatores comportamentais envolvidos na construção dos sambaquis e suas
mudanças ao longo do tempo. Contribui-se ao desenvolvimento de estudos
estratigráficos em concheiros e testa-se o uso de técnicas de análise sedimentar
(granulometria, isotopia, micromorfologia e microscopia eletrônica de varredura),
combinadas com dados zooarqueológicos, na completa caracterização dos sítios.
2.2. GEOARQUEOLOGIA DE SAMBAQUIS No Brasil, trabalhos de caráter geoarqueológico em sambaquis aparecem desde a
primeira metade do século XX. Segundo Afonso (2008), as pesquisas de Leonardos
(1938) sobre artificialidade dos sambaquis e os trabalhos de Duarte (1968), Emperaire
& Laming-Emperaire (1956a, 1956b), nos sambaquis da costa do Paraná e São Paulo,
constituem abordagens implicitamente geoarqueológicas. A estes autores, deve somarse o trabalho de Biocca et al. (1947), sobre análises químicas e bacteriológicas em
sedimentos de três sambaquis na Ilha de Santo Amaro (SP), a proposta de Guerra (1950)
sobre a diferenciação entre terraços e sambaquis. Também cabe mencionar os trabalhos
de Castro Faria na região de Laguna (SC) que, segundo Lima (1999), foi pioneiro na
aliança entre arqueologia e geomorfologia (Castro Faria, 1952, 1959). Posteriormente,
a pesquisa de Hurt (1974), em sambaquis do litoral sul de Santa Catarina, e os trabalhos
interdisciplinares de Kneip (Kneip et al., 1975), nos sambaquis do Rio de Janeiro,
31 também vêm representar abordagens pioneiras no estudo de sambaquis ancorado nas
geociências.
Outros
trabalhos
também
podem
ser
considerados
implicitamente
geoarqueológicos, apesar de estarem vinculados à produção de conhecimento na área
das geociências e não terem por objetivo o estudo da pré-história. Exemplo disso são as
numerosas publicações sobre o uso da localização dos sambaquis e sua cronologia como
indicadores de paleoníveis de mar (Bigarella, 1965, 1976; Fairbridge, 1976; Martin &
Suguio, 1976a, 1976b; Martin et al., 1986; Suguio et al., 1976, 1992; Suguio, 1993).
Pesquisas geoarqueológicas relacionadas com flutuações do NRM e localização
de sambaquis foram realizadas em várias áreas do Brasil, nos últimos 10 anos,
seguindo, basicamente, os mesmos lineamentos dos trabalhos realizados desde a década
de 1950, tanto na arqueologia (Emperaire & Laming-Emperaire, 1956 b; Hurt & Blasi,
1960; Hurt, 1974; Laming, 1960; Laming-Emperaire, 1975), como nas geociências
(Bigarella, 1965, 1976; Fairbridge, 1976; Martin & Suguio, 1976a, 1976b; Martin et al.,
1986; Suguio et al., 1976, 1992; Suguio, 1993). Todos estes trabalhos partem da
premissa, frequentemente implícita, de que a evolução espacial na ocupação do
território por parte dos sambaquieiros está diretamente relacionada com a configuração
da paisagem, resultado das oscilações do NRM durante o Holoceno. Estes trabalhos
foram realizados no litoral de regiões como: norte da Bahia (Amâncio & Dominguez,
2003; Santana, 2007; Santana et al., 2003); Rio de Janeiro, nos sambaquis da Ilha do
Cabo Frio (Tenório et al., 2005) e complexo lagunar de Saquarema (Barbosa, 2007); sul
de São Paulo (Calippo, 2004, 2010); sul do Paraná e norte de Santa Catarina (Oliveira,
2000); centro-sul de Santa Catarina (Kneip, 2004); e norte do Rio Grande do Sul (Kern,
1982; Perreti, 2009).
As pesquisas geoarqueológicas na escala do sítio, em geral, focaram no
desenvolvimento de métodos não invasivos para delimitação dos sambaquis e no estudo
dos processos de formação de sítio. Métodos geofísicos foram utilizados para identificar
a verdadeira extensão de sambaquis e reconhecer feições especificas no seu interior
(fogueiras, concentração de artefatos líticos, entre outros) no Rio de Janeiro (Mello,
2001), em sambaquis fluviais de São Paulo (Gomes, 2003; Schimmel et al., 2002), e no
litoral sul de Santa Catarina (Rodrigues, 2009; Rodrigues et al., 2009; Santos et al.,
2009).
32 Trabalhos geoarqueológicos sobre formação de concheiros foram desenvolvidos
por Afonso & DeBlasis (1994) e Afonso (1999), no sambaqui Espinheiros II (Joinville),
e por Amenomori (2001, 2005), nos sítios Mar Virado, Couves I e Montão de Trigo,
situados em ilhas do litoral norte de São Paulo. Um completo estudo pedológico foi
realizado por Corrêa (2007) em sambaquis da Região dos Lagos (RJ), com aplicação de
técnicas pouco usuais na arqueologia de sambaquis, como micromorfologia, e
microscopia eletrônica de varredura. Apesar de não declaradamente geoarqueológico,
este estudo contribuiu com informações que permitem a caracterização dos sambaquis
como arqueo-antropossolos (sensu Kampf and Kern, 2005).
Recentemente, o trabalho de Brochier (2009) sobre modelos geoarqueológicos
para detecção de sítios soterrados, trouxe importantes questionamentos quanto ao
potencial de preservação de sítios costeiros em geral. Os trabalhos de Giannini et al.
(2005), Villagran (2008) e Villagran et al. (2009a), no sítio Jabuticabeira 2, litoral
centro-sul de Santa Catarina, apesar de focalizarem um único sítio, oferecem métodos
de análise e modelos interpretativos que podem ser utilizados em outros concheiros,
independentemente do contexto geográfico e cronológico de localização (química de
sedimentos, micromorfologia, análise de fácies, arquitetura deposicional, entre outros).
O método de análise proposto para Jabuticabeira 2 será expandido, nesta tese, a
outros sambaquis da região, com a finalidade de testar e refinar o método de estudo
estratigráfico de sambaquis, padronizar a abordagem e habilitar a comparação inter e
intra-sítio.
3. A PROPOSTA Neste trabalho a geoarqueologia será utilizada para estudar os processos de
formação de sambaquis na escala de sítio, com aplicação de um método estratigráfico,
denominado análise de arqueofácies (Villagran 2008; Villagran et al. 2009), que
permitirá a comparação entre diferentes tipos de sambaquis de diversa cronologia. Esta
abordagem permitirá avaliar o desenvolvimento da ocupação humana da área de estudo,
suas mudanças ao longo do tempo, e sua relação com a evolução dos sistemas naturais
do Holoceno. Na construção de modelos interpretativos, será utilizada a analogia
33 experimental e a comparação com um contexto arqueológico submoderno
etnograficamente conhecido.
3.1. ANÁLISE DE ARQUEOFÁCIES A análise de arqueofácies, método de estudo estratigráfico desenvolvido na
interface entre arqueologia e geociências (Villagran 2008; Villagran et al. 2009a), será
aplicada ao estudo de oito sambaquis do litoral sul do Estado de Santa Catarina. Este
método aponta à identificação de produtos de deposição antrópicos nas sucessões
verticais para interpretar a atividade, ou sucessão de atividades, associadas a formação e
evolução dos sítios. As três etapas fundamentais da análise de arqueofácies são: 1)
identificação de fácies arqueológicas em campo (segundo lista de atributos
deposicionais); 2) caracterização, em laboratório, das propriedades de cada fácies (com
ênfase na análise micromorfológica); 3) e interpretação das fácies e seu arranjo espacial
com base em modelos de arqueofácies (construídos a partir de analogia arqueológica
intecultural e experimental). A meta desta pesquisa será utilizar a informação produzida
pela análise de arqueofácies para estudar a formação dos sítios e a evolução da
ocupação sambaquieira na região durante o Holoceno.
A verticalidade dos processos de deposição antrópicos, a partir da relação entre
arqueofácies em uma sucessão estratigráfica, além de oferecer uma visão cronológicoevolutiva dos processos de formação, mostra permanências ou mudanças na dinâmica
de formação dos sítios. A horizontalidade dos processos de deposição antrópicos,
através da relação inter-sítio entre fácies arqueológicas de uma mesma região, permite
construir o panorama de ocupação a partir de práticas de diferente escala e natureza
(domésticas, rituais ou uma fusão de ambas) que participaram na construção do espaço.
A verticalidade e horizontalidade no estudo das sucessões estratigráficas outorgam
dinamismo e significado aos processos de deposição antrópicos, no tempo e espaço.
A caracterização dos sedimentos arqueológicos, segundo o método proposto,
prioriza a análise micromorfológica. A observação na escala microscópica permite
conhecer a história deposicional e pós-deposicional dos sítios construídos a partir da
configuração atual dos sedimentos. A análise micromorfológica será complementada
34 com outros ensaios que ajudem a explorar o seu potencial interpretativo. Análises
granulométricas, razão de isótopos de carbono e nitrogênio (δ13C e δ15N) da matéria
orgânica dos sedimentos arqueológicos e naturais, composição química multi-elemental
e dados micromorfológicos e de química pontual via microscopia eletrônica de
varredura serão empregados na completa caracterização das fácies naturais e
arqueofácies sob estudo.
3.2. CONSTRUÇÃO DE MODELOS INTERPRETATIVOS A explicação das sucessões estratigráficas, após a fase de caracterização das
arqueofácies, realiza-se a partir da construção de modelos interpretativos. O importante
não é unicamente estabelecer as propriedades de cada arqueofácies, mas conhecer a
relação destas com as características composicionais e tafonômicas das outras fácies que
compõem a mesma sucessão vertical ou mesmo das identificadas em sítios próximos da
região. Na construção de modelos que expliquem os atributos observados nas sucessões
estratigráficas, utilizam-se analogias, mediante confronto com casos similares na
literatura, uso de abordagens experimentais e comparações interculturais.
3.2.1. Arqueologia experimental Neste trabalho, a arqueologia experimental será empregada para estudar os
produtos materiais de processos atuais conhecidos e interpretar a potencial ação desses
processos no passado, a partir de produtos com atributos semelhantes observados no
registro arqueológico. Especificamente, a arqueologia experimental será utilizada para
aprofundar a identificação de estruturas de combustão in situ ou resíduos de queima
retrabalhados, a partir de fogueiras experimentais e queima controlada de moluscos.
Esta abordagem baseia-se no atualismo como método de inferência de eventos
passados por analogia com processos observados no presente (Rudwick, 1976). No
entanto, o atualismo aqui mencionado não se refere a comportamentos nem leis sociais e
35 culturais, mas restringe-se a processos naturais, ainda que estes possam em parte surgir
de interferência humana.
3.2.2. Comparação intercultural A analogia também será utilizada entre dois contextos arqueológicos: os
sambaquis de Santa Catarina e um concheiro etno-histórico da Terra do Fogo
(Argentina). Esta estratégia será aplicada como auxílio na formulação de hipóteses
sobre o comportamento humano e o significado dos vestígios materiais que dele
resultam, apesar das diferenças étnicas, cronológicas e geográficas das duas culturas em
estudo. O sítio utilizado para comparação é um concheiro do período histórico
construído por grupos caçador-coletores etnograficamente conhecidos: os Yamana. A
possibilidade de correlacionar a formação do sítio arqueológico com os relatos sobre a
vida cotidiana dos Yamana, inexistente para os grupos construtores de sambaquis,
permite outorgar significado social ao registro arqueológico, sempre através da
avaliação crítica dos fatores condicionantes de cada registro (arqueológico e
etnográfico) 3 .
Os argumentos de relevância que vão permitir a correspondência analógica estão
fundamentados na teoria dos processos de formação de sítio (Schiffer 1972, 1983, 1987)
e referem-se ao processo de formação cultural que se encontra por trás dos dois
contextos a serem estudados: o descarte e a construção de concheiros. No entanto, vale
esclarecer que a analogia será realizada, numa primeira instância, sobre o processo de
construção dos concheiros e sambaquis enquanto ação mecânica sujeita a modificações
físico-químicas, e não quanto ao significado deste processo. O significado do processo
será analisado numa ultima instância interpretativa, após a avaliação das semelhanças e
diferenças entre ambas as culturas de caçador-coletores associadas à formação de
concheiros. O significado do descarte não é equivalente de uma cultura a outra (Hodder
3
Estudos etnoarqueológicos realizados nos concheiros históricos do Canal Beagle demonstram o viés e a
subjetividade do registro etnográfico que também é passível de mudar ao longo do tempo. Isto significa
que a analogia etnográfica direta unicamente pode ser utilizada no estágio de formulação de hipóteses,
mas não na construção de explicações sobre o comportamento social pré-histórico a partir da comparação
do registro arqueológico com o etnográfico (Estevez & Vila 2007; Vila et al. 2007).
36 1982b) e, portanto, será estudado no seu contexto cultural específico, como possível
fator condicionante dos atributos observados.
4. OBJETIVOS O objetivo geral desta pesquisa é compreender detalhadamente os processos de
formação culturais (atividades humanas) e naturais (tafonômicos) de sambaquis e
suas mudanças ao longo do tempo, mediante o estudo, na escala meso e
microscópica, de oito sambaquis localizados no litoral sul catarinense, cuja
cronologia envolve todo o período de ocupação humana pré-histórica da região.
Deste modo, propõe-se aprofundar os conhecimentos sobre configuração da paisagem e
formação dos sambaquis em diferentes momentos da história dos grupos humanos que
habitaram o litoral catarinense, desde a sua chegada até o abandono do projeto
construtivo com conchas.
A estratégia de abordagem proposta é a de explorar a análise de arqueofácies
como ferramenta padronizada para o estudo dos processos de formação de
sambaquis, com ênfase na micromorfologia, como técnica primordial na
caracterização de fácies deposicionais antrópicas, e na arqueologia experimental e
comparação
intercultural,
como
auxiliares
na
construção
de
modelos
interpretativos. Assim, aspira-se ao uso da análise de arqueofácies como ferramenta no
estudo dos processos de formação de sítios concheiros em geral.
37 CAPÍTULO 2: CONCHEIROS E SAMBAQUIS As informações agrupadas neste capítulo apresentam uma visão geral dos
principais tópicos a serem tratados na tese. Começa-se pela definição dos sítios
concheiros e os diferentes contextos e cronologias que estes sítios apresentam na
América do Sul. Das cronologias mais antigas, passa-se à realidade brasileira e ao
objeto de estudo desta tese: os sambaquis. Por ser um dos objetivos deste trabalho a
avaliação das mudanças, ao longo do tempo, na formação dos sambaquis catarinenses,
discute-e a chegada das culturas marítimas ao litoral brasileiro, os diferentes tipos de
sítio associados a esta cultura e as causas do colapso da acumulação social de conchas.
O processo de colapso relaciona-se frequentemente à chegada ao litoral de grupos
ceramistas do planalto. Esta migração é interpretada a partir de sítios costeiros com
cerâmica interiorana. Como dentro do conjunto amostral desta tese incluem-se, além
dos sambaquis, sítios costeiros com cerâmica, apresenta-se brevemente uma explicação
alternativa sobre a relação entre ambos os grupos que será retomada na conclusão.
As teorias e modelos vigentes sobre formação de sambaquis são apresentados,
com as propostas desenvolvidas em sítios de Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná e Santa
Catarina, que enfatizam na relação centro-periferia para explicar a formação dos
montículos de conchas (formação dos concheiros como resultado do descarte de
resíduos ao redor do local de moradia). A visão interpretativa sobre a formação dos
sítios enuncia-se na arquitetura de sambaquis, que define os sítios como objetos que
outorgam significado ao ambiente construído, através da conspicuidade das estruturas, o
simbolismo funerário, a multifuncionalidade e a recorrência na ocupação.
Por último, introduzem-se as particularidades do caso de estudo comparativo que
será utilizado como complemento na construção de modelos interpretativos para
sambaquis: os concheiros etno-históricos do Canal Beagle (Terra do Fogo, Argentina).
Estes sítios estão associados a grupos etnograficamente conhecidos, que foram
extensamente descritos pelos cronistas dos séculos XIX e XX. As crônicas provêm de
informações detalhadas sobre o processo de formação dos concheiros fueguinos e do
cotidiano das culturas litorâneas.
38 1. DEFINIÇÃO A palavra concheiro, neste trabalho, define um tipo de depósito arqueológico que
possui como características comuns: 1) composição essencialmente malacológica; 2)
origem vinculada à deposição antrópica, independente de sua localização geográfica e
cronologia. Estes depósitos podem apresentar-se como sítios específicos, com ou sem
estratificação, compostos na sua totalidade por mais de 30% de conchas, ou como
estratos discretos na sucessão estratigráfica de sítios maiores. No Brasil, estes depósitos
são popularmente chamados de “sambaquis”, enquanto no resto da América do Sul são
referidos como concheros ou conchales.
Os concheiros mais antigos que se conhecem datam do Pleistoceno, com idade de
até 250 kA, e localizam-se em áreas costeiras da África e Europa 4 . Na América, os
concheiros mais antigos são datados da transição Pleistoceno-Holoceno e estão
localizados na costa pacifica (Cannon, 2000; DeFrance et al., 2001, 2009; Erlandson,
2007; Keefer, 1998; Rick et al., 2001; Sandweiss, 2003). A frequência de concheiros
aumenta consideravelmente durante o Holoceno, quando aparecem em áreas costeiras
dos cinco continentes. Atualmente grupos na Nova Zelândia, Austrália e África, ainda
incluem a formação de concheiros como remanescente material na paisagem (Bird,
2002; Bird & Bliege Bird, 1997, 2000; Bowlder, 1976; Lasiak, 1991; Meehan, 1982;
Moss, 1993).
4
No norte africano, costa do estreito de Gibraltar, foram encontradas evidências do consumo de moluscos
no abrigo Banzu, desde 250 até 70 kA (Ramos et al., 2008). O concheiro mais antigo, com idade máxima
de ca. 164 kA, está no sítio PP13B no litoral da África do Sul (Marean et al., 2007), onde se encontraram
as primeiras evidências do uso de moluscos na dieta do Homo sapiens. Na Itália, a gruta dei Moscerini,
habitada por populações neandertais, apresentou evidências da exploração de moluscos desde 110 kA
(Stiner et al., 1999). No continente asiático, no sudeste e ilhas da Melanésia, evidências do consumo de
moluscos aparecem associadas à chegada dos primeiros Homo sapiens na região, desde 45 kA (Szabó and
Amesbury, 2011). Cabe destacar que em todos estes casos, os concheiros referidos são camadas discretas
na estratigrafia de sítios em cavernas. Os concheiros a céu aberto mais antigos localizam-se na África do
Sul, Sea Harvest e Hoedjies Punt, datados entre 60-70 kA (Volman, 1978).
39 2. CONCHEIROS DO HOLOCENO INICIAL E MÉDIO DA AMÉRICA DO SUL Os sítios concheiros estão entre as manifestações mais antigas de ocupações
litorâneas com economias marítimas nas Américas. No litoral pacífico dos Estados
Unidos (Califórnia), existem concheiros a céu aberto e em caverna com idades máximas
de até 12 kA (sítios Daisy Cave e Cardwell Bluffs, respectivamente) (Erlandson, 2007;
Erlandson et al., 2008; Rick et al., 2001). No Canadá, o concheiro EITa-18 tem
cronologia semelhante, datado em 11,6-11,2 kA (Cannon, 2000). Na América do Sul,
costa sul do Peru, o concheiro estratificado Ring Site é o mais antigo do continente,
datado em 11,2 kA (Sandweiss, 2003). No entanto, as evidências de economias
marítimas antecedem estas ocupações em até dois mil anos. Tal é o caso do sítio
Arlington Springs, na Califórnia (ilha de Santa Rosa), datado em 13,1 kA (Johnson et
al., 2007), o sítio Monte Verde, na costa sul do Chile, datado em 14,6 kA (Dillehay,
1999) e o sítio Quebrada Jaguay, na costa central do Peru, com idade máxima de 13 kA
(Sandweiss 2003) (Figura 2.1).
As evidências de ocupações costeiras anteriores ao inicio do Holoceno são usadas
para reforçar a hipótese de uma via litorânea de chegada dos primeiros grupos humanos
às Américas durante o Pleistoceno (entre 20 e 15 kA) através da borda do Pacífico
(Beck & Jones, 2010; Dixon, 2001; Erlandson & Braje, 2011; Erlandson, 2001, 2002,
2007; Erlandson et al., 2007; Fagundes et al., 2008; Fladmark, 1979; González-José et
al., 2008; Heusser, 1960; Hubbe et al., 2011; Mandryk et al., 2001; Pitblado, 2011).
Uma vez na América do Sul, a migração costeira teria seguido uma rota atlântica e outra
pacífica de colonização, com ingresso ao interior do continente pelos vales fluviais que
desembocavam no oceano (Dixon, 2001; Hubbe et al., 2011; Miotti & Salemme, 2004;
Miotti, 2003; Neves et al., 2003) (Figura 2.1).
Da suposta rota atlântica, as ocupações litorâneas mais antigas do Brasil podem
ser remanentes (ver tópico 3.2.). Os sambaquis mais antigos do litoral brasileiro
localizam-se nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro. Estes correspondem,
respectivamente, aos sambaquis Cambriu Grande, datado em 7,8 kA (Calippo, 2004), e
o sambaqui do Algodão, datado em 8,7 kA (Lima et al., 2002 b). No estado de Santa
Catarina, o sambaqui mais antigo, o sítio Caipora, está localizado a aproximadamente
40 20 km da atual linha de costa e foi datado em 7,4 kA (Giannini et al., 2010) (Figura
2.1).
Sambaquis mais antigos ainda se encontram em áreas interioranas associadas a
contextos fluviais no estado de São Paulo e na Amazônia. O sítio Capelinha 5 , de pouco
mais de 10.000 anos cal. AP é o sambaqui fluvial 6 mais antigo do vale do rio Ribeira de
Iguape (São Paulo) (Neves et al., 2005), enquanto o sambaqui Taperinha é o sambaqui
fluvial mais antigo da Amazônia, com cerca de 8000 anos cal. AP (Roosevelt, 1991)
(Figura 2.1).
Os concheiros mais austrais do litoral brasileiro encontram-se no Rio Grande do
Sul. A sul, com exceção do sítio La Esmeralda, no litoral leste do Uruguai (datado de
3200 anos AP) (Bracco, 1999; Lopez Mazz et al., 1996), sítios concheiros só voltam a
se encontrar no trecho no litoral atlântico compreendido entre o sul da província de
Buenos Aires e a Terra do Fogo, inclusive. Baixas frequências de restos malacológicos
existem em sítios do litoral das províncias de Buenos Aires e La Pampa, mas nenhum
destes sítios corresponde a concheiros (Bonomo & Aguirre, 2009) tais como definidos
neste trabalho 7 .
Após os sítios do litoral do Peru e do litoral brasileiro, as cronologias mais antigas
para sítios concheiros aparecem na Patagônia argentina, na região do Golfo de São
Matias 8 (Borella & Favier Dubois, 2008; Favier Dubois et al., 2009; Gomez Otero,
2006; Zubimendi, 2007) e na Patagônia chilena (Flores & Lira, 2006; Jerardino et al.,
1992; Legoupil, 2005; Rivas et al., 1999; San Roman et al., 2009). No litoral atlântico, a
ausência de sítios anteriores com traços de adaptações costeiras é associada ao aumento
do NRM durante o Holoceno, que teria deixado embaixo da água aqueles sítios
localizados próximos às antigas margens ou paleo-desembocaduras dos rios Paraná,
Uruguai, Colorado, Negro, Chubut, Deseado, Santa Cruz e Chico, na plataforma
5
O sítio Capelinha, o mais antigo do litoral sudeste, seria na verdade um sítio raso a céu aberto onde
predominam as conchas (DeBlasis, 1988) e não um montículo malacológico estratificado. As
particularidades deste sítio também incluem a existência de pelo menos dois componentes ocupacionais
(Penin, 2005) e a presença de um indivíduo de morfologia craniana paleoamericana, associado aos
indivíduos da região de Lagoa Santa (Neves et al., 2005; Neves & Okumura, 2005).
6
A denominação de sambaqui fluvial vincula-se à localização do concheiro nas proximidades de rios e ao
conteúdo malacológico no qual predomina a presença de espécies de moluscos terrestres, como
Megalobulimus sp. ou Strophocelius sp. (Leonardos, 1938).
7
Segundo Bonomo & Aguirre (2009), estes moluscos teriam sido coletados dos cordões litorâneos e a sua
presença nos sítios estaria associada a motivos simbólicos e ornamentais, e não ao seu aproveitamento
como recurso alimentício ou matéria prima construtiva.
8
O sítio Arroyo Verde 1, datado de ca. 7750 anos AP, é o concheiro mais antigo da Patagônia (Gomez
Otero, 2006)
41 continental agora submersa (Gomez Otero, 2006; Gomez Otero et al., 1998; Miotti &
Salemme, 2004; Miotti, 2003; Salemme & Miotti, 2008) (Figura 2.1).
No extremo mais austral do continente, as primeiras evidências do uso de recursos
marinhos também antecedem à aparição de concheiros. O sítio Tres Arroyos, datado em
ca. 11 kA, é a ocupação humana mais antiga da região com restos de moluscos e lobo
marinho, apesar de estar fundamentalmente associado a grupos dedicados à caça de
mamíferos terrestres (guanaco) e de espécies já extintas (cavalo americano, preguiça
gigante, entre outros) (Massone, 1987, 1996). Os concheiros apresentam cronologias
levemente mais modernas que os sítios do Brasil e Argentina 9 . Ocampo & Rivas (2000)
dataram um nível de concheiro no litoral sul do Canal Beagle (sítio 136 Áridos
Guerrico) localizado a 8 m sobre o nível do mar, porém próximo à praia, em ca. 7200
anos cal. AP (datação em concha, ca. 6800 AP idade convencional). No litoral norte do
Canal Beagle, populações de caçador-coletores construíram o concheiro mais antigo da
região, o sítio Túnel I, datado em ca. 6400 anos AP (Orquera et al., 2011) 10 (Figura
2.1).
9
Os concheiros são posteriores à separação da Terra do Fogo da Patagônia continental, que aconteceu há
8 kA (Clapperton et al., 1995; Coronato et al., 1999; Rabassa et al., 2000).
10
O sítio Túnel I também possui um componente pré-concheiro, de ca. 6700 AP, com evidências da
exploração de recursos continentais (guanaco) e sem indícios do uso de recursos aquáticos (Orquera and
Piana, 1999; Piana and Orquera, 2009).
42 Figura 2.1. Mapa da América do sul com localização dos concheiros/sambaquis mais antigos, e sítios
datados da transição Pleistoceno/Holoceno com evidências do uso de recursos aquáticos. As duas flechas
indicam possíveis rotas migratórias de colonização das áreas litorâneas do continente.
3. SAMBAQUIS DO LITORAL BRASILEIRO A palavra “sambaqui” está etimologicamente relacionada a duas palavras de
origem tupi: “tambá”, que significa moluscos, e “qui”, que significa monte (LamingEmperaire, 1975; Prous, 1992). Serrano (1938) menciona que cada autor dá uma
interpretação diferente para o vocábulo sambaqui. Por exemplo, Capanema propõe que
o término deriva de “hambá-quî”, molusco esparzido, enquanto Baptista Caetano o
43 associa a “h´ambá-kyp”, que significa lixo de molusco. Hure, por outro lado, sugere que
a palavra resulta da conjunção de “taba” e “quig”, que significaria “é aqui a aldeia”
(Serrano, 1938).
Independente da sua origem, o termo sambaqui é utilizado desde o século XVI
para referir-se aos concheiros antrópicos que se localizam ao longo da costa brasileira
(Mendonça de Souza, 1991), desde o Rio Grande do Sul até a Bahia, e do Maranhão ao
Pará (Gaspar, 1998). Os sambaquis são frequentemente estratificados, mas não
exclusivamente, compostos principalmente por carapaças de moluscos, fragmentos de
osso, carvão e sedimentos terrígenos. Em alguns casos, contêm estruturas de
habitação11, assim como vários sepultamentos humanos no seu interior, o que levou a
sua interpretação como espaços multifuncionais (Gaspar, 1991).
Apesar de estes sítios mostrarem certa diversidade regional, quanto a tamanho,
forma e composição, a cultura material dos grupos sambaquieiros permanece constante
ao longo da faixa costeira, caracterizada, em termos gerais, por tecnologia lítica e óssea
polida (DeBlasis et al., 1998; Tenório, 2004). Da mesma maneira, as práticas de
subsistência não apresentam grandes mudanças ao longo do litoral e mostram
dependência no consumo de peixes, junto com a exploração de moluscos, vegetais e
alguns mamíferos terrestres e marinhos (Bandeira, 1992; Castilho, 2005; Figuti, 1992;
Klokler, 2008; Scheel-Ybert et al., 2003; Wesolowski et al., 2007).
A associação entre área de moradia, descarte de alimentos e sepultamentos
humanos em sambaquis levou a considerar estes grupos costeiros como único sistema
ou unidade cultural 12 , chegado ao litoral por volta de 10.000 AP, de grande expansão ao
longo da costa brasileira, embora com desenvolvimentos regionais específicos (Gaspar,
1991, 1998, 2000; Tenório, 2004).
As diferenças morfológicas, composicionais e inclusive artefatuais, observadas
por trás da aparente homogeneidade dos sambaquis, também foram propostas como
evidência de uma multiplicidade de sistemas socioculturais que, vindos do interior em
tempos remotos, se expandiram ao longo da costa (Lima, 1991, 1999). Neste sentido,
estudos bioantropológicos mostram a homogeneidade genética entre os indivíduos
11
Estruturas de habitação em sambaquis são identificadas a partir da associação entre marcas de poste,
superfícies compactadas, estruturas de combustão e artefatos (Gaspar 1991).
12
A unidade cultural entre os grupos construtores de sambaquis tinha sido sugerida, inicialmente, por
Serrano (1946), e posteriormente por Prous (1974), este último a partir do estudo tipológico das esculturas
zoomórficas em pedra achadas em vários sambaquis do litoral sul.
44 sepultados em sambaquis e a diferença entre eles e os esqueletos achados em sítios do
interior, inclusive da região de Lagoa Santa, com existência de microdiferenciações
regionais na costa (Alvim et al., 1975; Mendonça de Souza, 1995; Neves, 1988;
Okumura,
2007;
Prous,
1992). Estudos
isotópicos
recentes, realizados em
sambaquieiros do litoral paulista, também identificaram microdiferenciações na costa,
explicadas como produto do desenvolvimento local de grupos que, chegados do interior
ou do litoral, habitaram a plataforma continental hoje submersa 13 (Calippo, 2010).
3.1. A OCUPAÇAO SAMBAQUIEIRA DA COSTA Os registros sobre ocupação sambaquieira são mais numerosos nos estados de
Santa Catarina (região de Laguna, Florianópolis e Joinville), Paraná (baías de Paranaguá
e Guaratuba), São Paulo (Cananéia-Iguape e Santos) e Rio de Janeiro (baía de
Guanabara e Região dos Lagos), onde as pesquisas são igualmente mais abundantes. No
litoral nordeste e equatorial, a presença de sambaquis é considerável, principalmente
nos estados de Pará e Maranhão (Bandeira, 2008; Simões, 1975). Atualmente, propõe-se
que teriam existido dois blocos maiores, embora não exclusivos, de desenvolvimento da
cultura sambaquieira: 1) Rio de Janeiro, onde os sítios são de mediano porte (até 5 m de
altura) com associação entre áreas de habitação e locais de sepultamento (Barbosa,
2001,
2007; Gaspar, 1991); 2) Santa Catarina, onde os sítios são frequentemente
monumentais (mais de 5 m de altura), com maior quantidade de sepultamentos humanos
e presença de zoólitos 14 (Fish et al., 2000; Gaspar et al., 2008; Gaspar, 1998). Alguns
autores propõem que estas duas áreas corresponderiam a dois prováveis eixos, norte e
sul respectivamente, de povoamento do litoral brasileiro desde o interior. O local de
origem desta leva migratória estaria localizado entre o norte do Estado de Paraná e sul
de São Paulo, segundo Neves (1988), ou entre o norte do Estado de Santa Catarina e o
sul do Paraná, segundo Oliveira (2000).
13
A hipótese de existência de sambaquis na plataforma continental atlântica que se acha atualmente
embaixo das águas oceânicas já tinha sido proposta por Laming (1960) no estudo sobre os sambaquis dos
estados de São Paulo e Paraná, assim como por Beltrão & Kneip (1967) para os sambaquis mais antigos
do litoral do Rio de Janeiro, que se encontram hoje total ou parcialmente submersos.
14
Figuras zoomorfas de pedra polida recuperados em vários sambaquis do litoral meridional do Brasil (e
até em sítios no Uruguai).
45 Estudos craniométricos realizados por Okumura (2007), em sambaquis do litoral
do Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná e Santa Catarina, reforçaram a hipótese de
Schmitz (1981), verificada por Neves (1988), do desenvolvimento de duas populações
costeiras, uma ao norte e outra ao sul do Estado de Paraná. Os mesmos ensaios mostram
ausência de afinidade genética entre os grupos costeiros (sambaquis) e interioranos
(sítios Umbú, Itararé e Tupiguarani) 15 , o que refutaria a origem interiorana das
populações costeiras.
Esta constatação respalda a hipótese dos grupos sambaquieiros do litoral atlântico
como entidade independente, que não guardaria relação evolutiva, genética nem
cultural, com os grupos do planalto. Os sambaquieiros sim estão vinculados com as
populações ribeirinhas que exploraram igualmente moluscos, porém terrestres, no
começo do Holoceno. Segundo pesquisas recentes, os grupos associados à formação dos
sambaquis fluviais do vale do Ribeira de Iguape, apesar de subsistirem de espécies
faunísticas e vegetais da Mata Atlântica16 e não litorâneas (ver Alves, 2008 e Plens,
2007, para análises zooarqueológicas em sambaquis fluviais), apresentam associação
genética (Neves and Okumura, 2005; Okumura, 2007) e cultural com os grupos
costeiros.
A relação entre sambaquis litorâneos e fluviais foi explicada por Collet & Prous
(1977) como resultado de intrusões sazonais dos grupos litorâneos até o interior. Uma
explicação semelhante foi dada por Barreto (1988), a partir da análise do sistema de
assentamento de sambaquis fluviais. A autora propõe que a presença humana no interior
do vale do rio Ribeira de Iguape estaria ligada à ocupação prévia do litoral, na região
paleoestuarina do vale, e não do planalto. Segundo Barreto (1988), os sambaquis
fluviais do Vale do Ribeira apresentam mais vinculação com os sambaquis litorâneos,
em termos de tecnologia lítica, óssea, padrão de assentamento e práticas funerárias (com
associação entre local de residência e deposição dos mortos) de que com qualquer sítio
do interior, inclusive com aqueles que apresentam evidências do consumo de moluscos.
Lima (1999) concorda em colocar a ocupação do Vale do Ribeira como resultado
de intrusões oportunistas até o interior de grupos eficientemente adaptados à vida no
15
Os dados craniométricos que trabalha Okumura (2007), a pesar de receber algumas críticas quanto à
sua suscetibilidade a variação por fatores ambientais (Churchill, 1996; Lieberman, 2000), são
considerados diagnósticos da relação genética entre populações (Sparks and Jantz, 2002).
16
Bioma que se estende ao longo do litoral atlântico do Brasil e inclui a Floresta Ombrófila Densa,
Floresta Ombrófila Mista, Floresta Ombrófila Aberta, Floresta Estacional Semidecidual, Floresta
Estacional Decidual, Manguezais e Restingas (www.ibge.gov.br).
46 litoral. Estas intrusões teriam seguido os vales fluviais que cortam a serra do Mar e
atuam como portais naturais que facilitam o deslocamento entre a costa e o interior
(Lima, 1999; Lima & Lopez Mazz, 1999). Uma hipótese semelhante foi proposta por
Calippo (2010), que também defende a relação entre sambaquis fluviais e litorâneos do
Estado de São Paulo, com uma possível origem comum vinculada à ocupação dos
paleovales fluviais e paleoplanícies litorâneas do Pleistoceno. Esta relação original teria
desembocado, ao longo do tempo, em uma diferenciação entre os grupos que
permaneceram no ambiente fluvial e os que se especializaram no ambiente litorâneo.
3.2. MODELO DE POVOAMENTO DA COSTA BRASILEIRA Contrário ao esperado nos modelos de Neves (1988) e Oliveira (2000), os
sambaquis antigos, do início do Holoceno, não se encontram no litoral paranaense, onde
a data mais recuada alcança os 6500 anos AP (Garcia 1979 em Brochier, 2009), mas
sim nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Santa Catarina. No entanto, apesar de
terem sido prospectados mais de 300 sambaquis no litoral do Paraná, somente 13
possuem datação (Brochier 2009). Assim, as cronologias disponíveis ainda não são
suficientes para contradizer os modelos hipotéticos de povoamento do litoral. Ao
mesmo tempo, as pesquisas sobre sambaquis na plataforma continental submersa (ver
Calippo 2010), ou sobre sítios soterrados por depósitos holocênicos (ver Brochier
2009), podem ainda trazer ocorrências mais antigas que corroborem, ou refutem, os
modelos de dispersão existentes.
A ausência de afinidade biológica demonstrada para indivíduos do interior (sítios
com cronologias de 6000 a 1700 anos AP) e litoral (sambaquis), junto com a
similaridade entre sambaquis fluviais e litorâneos do Estado de São Paulo (Okumura
2007), afasta a necessidade de explicar o povoamento da costa através de corredores
naturais que quebram a barreira imposta pela serra do Mar. De fato, deslocamentos
desde a costa até o interior foram propostos para explicar a ocupação do interior norteamericano através dos rios que desembocam no Pacífico (Fix, 2005; Kelly, 2003), assim
como para o povoamento da Patagônia a partir de populações que ocuparam, no
47 Pleistoceno, as costas pacífica e atlântica da América do Sul (Miotti 2003; Miotti &
Salemme 2004).
Vários indícios já apontam à possível existência de uma antiga via de chegada e
ocupação da costa brasileira, de origem exclusivamente litorânea, como, por exemplo:
1) a falta de relações genéticas entre indivíduos do interior e litoral; 2) e o vinculo
genético e cultural entre os grupos litorâneos e aqueles que ocuparam um dos corredores
mais importantes de comunicação entre o planalto e litoral (os sambaquis fluviais do
vale do Ribeira de Iguape). Somado a isso, a lacuna de datas recuadas para o estado do
Paraná (suposta via de entrada do interior à costa), apesar de ser potencialmente uma
ausência metodológica, como mencionado antes, atualmente apoia a via litorânea de
migração. Esta via litorânea poderia estar vinculada com a rota atlântica de colonização
da América do Sul (Hubbe et al., 2011; Neves et al., 2003; Rothhammer & Dillehay,
2009). Os seus remanentes estariam hoje submersos devido ao aumento do NRM
durante o Pleistoceno e Holoceno (ver modelo de paleolinhas de costa com áreas
potenciais de localização de sambaquis antigos em Calippo 2010). As culturas
marítimas que já se encontravam na América há pelo menos 13 kA podem estar
relacionadas com os grupos que, no Holoceno inferior e médio, dedicavam-se a
exploração intensiva dos recursos costeiros e deixaram os sambaquis que caracterizam o
litoral do Brasil. 3.3. AS CULTURAS MARÍTIMAS DO LITORAL BRASILEIRO
A arqueologia de sambaquis tem mais de cem anos de vida. Nos últimos vinte
anos, as pesquisas concentraram-se em três tipos de estudos (Villagran 2010): 1)
sistêmico-funcionais, de influência processual, com foco na investigação de padrão de
assentamento, função dos sítios, práticas de subsistência e organização social, entre
outros; 2) trabalhos especializados sobre componentes particulares dos sítios, que
incluem os estudos bioantropológicos em esqueletos sepultados em sambaquis e os
trabalhos da arqueobotânica (antracologia e análise de restos vegetais no cálculo
dentário); 3) e trabalhos de influência pós-moderna, que apontam a aspectos simbólicos
48 do ritual funerário associado à formação de alguns sambaquis e à percepção da
paisagem litorânea por parte dos seus habitantes.
As pesquisas pertencentes ao primeiro grupo produziram informações de base que
permitiram caracterizar os grupos costeiros quanto a seu padrão de assentamento, dieta
e acervo artefatual. O assentamento teria sido preferencial em franjas do litoral que
incluíram a formação de estuários, baías e sistemas de lagunas costeiras durante sua
evolução no Holoceno 17 (Ab´Saber, 1984; Calippo, 2010; DeBlasis et al., 1998; Figuti,
1993; Fish et al., 2000; Gaspar, 1991; Lima and Lopez Mazz, 1999; Lima, 1999; Prous,
1992). A distribuição dos sítios formaria grupamentos ao redor dos grandes corpos de
água, fonte dos recursos alimentícios (Barbosa, 2007; Gaspar, 1991; Kneip, 2004). A
ocupação dos sambaquis teria sido continua, sem táticas sazonais de mobilidade 18 , com
sítios que serviam de local de residência contínua e outros que eram ocupados como
acampamento temporário (De Masi, 1999, 2001). Apesar do volume de moluscos
acumulados nos sambaquis, os peixes seriam a principal fonte de proteína para estas
populações (Bandeira, 1992; Figuti & Klokler, 1996; Figuti, 1992, 1993; Klokler, 2001,
2008; De Masi, 1999, 2001), com consumo complementar de espécies vegetais
(Boyadjian 2007; Scheel-Ybert et al. 2003, 2009a; Wesolowski 2000; Wesolowski et al.
2007) e consumo ocasional de mamíferos marinhos (focas, golfinhos e baleias)
19
(Castilho, 2005; Castilho & Simões-Lopes, 2008; Klokler, 2008; Prous, 1992).
Os conjuntos artefatuais recuperados em sambaquis, como arpões e redes de
pesca, confirmam a dependência dos recursos aquáticos 20 (DeBlasis et al., 1998; Prous,
17
Os contextos aquático-costeiros caracterizam-se por grande biodiversidade e disponibilidade de
recursos ao longo do ano. Esta perspectiva é utilizada para explicar a ausência de sambaquis em alguns
estados do Nordeste brasileiro, como Sergipe. Segundo Amâncio e Dominguez (2003), as características
fisiográficas e ecossistemas associados a esta porção da costa brasileira não teriam oferecido contexto
propício para o desenvolvimento da cultura sambaquieira, pela impossibilidade geológica de
desenvolvimento de sistemas lagunares costeiros. Calippo (2010) oferece uma explicação semelhante
para justificar a ausência de sambaquis nos estados de Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba e
Pernambuco, onde a plataforma continental é estreita e impede a formação de sistemas estuarinos e
lagunares. No entanto, sambaquis existem sob dunas eólicas em estados do sul e sudeste e cabe pensar na
sua existência sob dunas eólicas nos estados de Piauí, por exemplo, Ceará ou Rio Grande do Norte.
18
Para os sambaquis fluviais ou concheiros localizados no vale do Ribeira de Iguape, Barreto (1988)
mostrou igualmente evidências da permanência ininterrupta do grupo nos sítios, tanto no inverno quanto
no verão.
19
Os mamíferos marinhos menores podiam ter sido capturados ocasionalmente nas redes de pesca,
enquanto que as baleias encalhavam na praia e eram provavelmente forrageadas in situ (Castilho and
Simões-Lopes, 2008).
20
Associados à tecnologia lítica polida que se encontra em sambaquis, estão os sítios denominados de
“estações ou oficinas líticas”, lugares onde acontecia a preparação dos instrumentos (Rohr 1984), também
chamados de “amoladores polidores fixos” por Tenório (2003). Estes locais aparecem na forma de
pequenas bacias (de 20 a 40 cm de comprimento) em afloramentos rochosos sobre ou próximos ao litoral.
49 1992; Tiburtius, 1996). A existência de embarcações para deslocamento e pesca foi
proposta por Gaspar (1991) e inferida de maneira indireta em vários trabalhos
posteriores. As inferências baseiam-se na existência de sambaquis em ilhas, paleoilhas
hoje ancorados à terra firme por tômbolos, ou em morros testemunho do embasamento
cristalino que antigamente se achavam em meio a grandes corpos de água atualmente
assoreados (Amenomori, 2005; Calippo, 2010; Giannini et al., 2010; Nishida, 2001;
Prous, 1992; Tenorio, 2003).
Dentro do segundo grupo de pesquisas, estudos bioantropológicos confirmaram a
prática cotidiana de pesca e mergulho através de marcadores osteológicos específicos,
tanto em homens quanto mulheres (Alvim & Seyfreth, 1968; Mendonça de Souza,
1995; Neves, 1988; Okumura & Eggers, 2005; Rodrigues-Carvalho, 2003), junto com
evidências de sedentarismo e alta densidade populacional (Alvim & Gomes, 1989;
Mendonça de Souza, 1995; Neves & Wesolowski, 2002; Okumura & Eggers, 2005).
Quanto aos padrões de residência, os estudos bioantropológicos mostram duas
realidades opostas. Alvim observou uma maior variabilidade em esqueletos femininos, e
interpretou esta constatação como evidência de exogâmia com residência patrilocal
(casamento fora do grupo e residência do casal na casa do pai do homem). Já o trabalho
de Neves (1988) oferece uma interpretação oposta ao basear-se na observação de maior
homogeneidade entre os esqueletos de mulheres que de homens. Isto leva o autor a
concluir pela existência de um padrão de residência matrilocal entre os sambaquieiros
(residência do casal na casa da família da mulher), que reflete a importância das
mulheres na sociedade. Prous (1992) coloca esta divergência como sinal dos vários
padrões de exogâmia que existiram no litoral. Recentemente, Hubbe et al. (2009)
corroboraram a proposta de Neves (1998) a partir de uma amostragem mais extensa que
inclui tanto sambaquis, como sítios com cerâmica Taquara/Itararé nos estados de Paraná
e Santa Catarina, incluindo também um caso no Rio Grande do Sul.
O terceiro grupo de pesquisas mostra a influência dos ambientes costeiros e seus
recursos no ritual e simbolismo funerário dos grupos litorâneos (Gaspar, 2000, 2004;
Gaspar et al., 2007; Klokler, 2008). Dentre estes trabalhos, destaca-se uma nova linha
de pesquisa que se refere a estudos de gênero. O estudo pioneiro foi realizado por
Escórcio & Gaspar (2010) a partir da análise do mobiliário funerário em homens e
mulheres sepultados em sambaquis do litoral do Rio de Janeiro. As autoras indicam a
ausência de divisões rígidas entre os gêneros e grande variabilidade nas frequências de
50 tipos artefatuais associados a cada gênero. Neste sentido, cabe ressaltar a alta ocorrência
de lesões ósseas observada em mulheres enterradas no sambaqui Zé Espinho, litoral do
Rio de Janeiro, interpretada como indicador de violência doméstica ou sequestro
(Rodrigues-Carvalho et al., 2009).
Estas informações permitem definir os grupos sambaquieiros como culturas
marítimas, como estabelecido por Calippo (2010) a partir das propostas de Muckelroy
(1978), Adams (2002) e Diegues (2004). Na antropologia marítima 21 , defende-se o
particularismo dos pescadores, possuidores de práticas sociais, culturais, rituais e
simbólicas construídas a partir da relação profunda com o mar (Diegues 2004). A
relação dos sambaquieiros com as fontes de recursos aquáticos (mar, lagunas, estuários)
iria além da exploração dos seus componentes bióticos para subsistência do grupo. A
exploração dos ambientes litorâneos comportaria uma visão específica do mundo,
desenvolvida a partir do vínculo e da “apropriação” não exclusivamente econômica,
mas também política, social e simbólica do meio físico e suas particularidades.
3.4. O COLAPSO DA CULTURA SAMBAQUIEIRA Os processos que conduziram ao fim da cultura sambaquieira compreendem uma
combinação de fatores ambientais e culturais. Entre os fatores ambientais, propõem-se:
o impacto que teve nos bancos de moluscos a mudança na salinidade dos corpos de
águas devido às flutuações do nível relativo do mar no Holoceno (Barbosa, 2007;
Calippo, 2010; Gaspar et al., 2008; Hurt, 1974); e a predação antrópica dos moluscos,
que teria provocado a completa exaustão deste recurso (Hurt 1974; Lima 1999). Os
fatores culturais referem-se à migração até o litoral dos grupos ceramistas do tronco
linguístico Jê, vindos do planalto há aproximadamente 1500-1000 anos atrás, o que teria
provocado a completa desestabilização do sistema sociocultural dos sambaquieiros e
posto fim ao projeto de acumulação social de conchas (Barbosa, 2007; Beck, 1972;
DeBlasis et al., 2007; Gaspar, 1991; Gaspar et al., 2007, 2008; Hurt, 1974; Lima, 1999;
21
“A antropologia Marítima é, hoje um campo de pesquisa especializado de estudo etnológico sobre
comunidades que vivem do mar, principalmente da pesca” (Diegues 2004: 53).
51 Neves, 1988; Schmitz et al., 1993) de modo aparentemente violento e conflituoso
(Lessa, 2005; Lessa & Scherer, 2008).
A relação entre os grupos litorâneos e interioranos pode observar-se nos sítios
costeiros com cerâmica Taquara/Itararé 22 , definidos nesta tese com “sítios mistos”.
Estes sítios, datados entre 1500 e 500 AP, apresentam ritual funerário e conteúdo
faunístico e artefatual semelhantes aos da cultura sambaquieira, juntamente com
cerâmica Taquara/Itararé (por exemplo, camada superficial dos sambaquis Enseada I e
Forte Marechal Luz, e sítios Praia das Laranjeiras II, Tapera, Base Aérea e Armação do
Sul 23 ) (Beck, 1971, 1972; Bryan, 1961; Rohr, 1984; Schmitz et al., 1992, 1993).
Alguns autores propõem que os grupos ceramistas interioranos, possivelmente
assimilados com os antigos habitantes da costa, incorporaram parte das práticas e
costumes dos sambaquieiros (Schmitz, 1996; Schmitz et al., 1993), e tornaram-se os
novos habitantes do litoral até a massiva migração pelo Atlântico dos grupos
Tupiguarani. Nesta tese, oferece-se uma visão alternativa do processo de contato entre
grupos do interior e do litoral (ver tópico 3.5.3)
3.5. SAMBAQUIEIROS DO LITORAL E GRUPOS CERAMISTAS DO PLANALTO No litoral norte e nordeste do Brasil, as culturas sambaquieiras desenvolveram
tecnologias cerâmicas conhecidas como tradição Mina, cuja data máxima é de
aproximadamente 5500 anos AP (Bandeira, 2008; Gaspar, 1995; Silva, 2000). No litoral
centro-sul e sudeste, estes grupos nunca teriam desenvolvido tecnologias de fabricação
de cerâmica. Os únicos vestígios cerâmicos que se recuperam em sambaquis aparecem
nos estratos superiores dos montículos e são associados à chegada ao litoral de grupos
ceramistas do tronco linguístico Jê, vindos do planalto aproximadamente 1500 a 1000
anos atrás (Beck, 1972; Bryan, 1961; Chmyz, 1976; Deblasis et al., 1998; Gaspar et al.,
2008; Lima, 1999; Rohr, 1972, 1984; Schmitz et al., 1993). Alguns autores mencionam
22
A cerâmica Taquara/Itararé caracteriza os grupos Jê meridionais (Brochado, 1984; Noelli, 2000;
Schmitz, 1988). Estes ceramistas pertencem ao tronco lingüístico Macro-Jê e teriam chegado ao Brasil
meridional há pelo menos 3000 anos, desde o planalto central brasileiro (Noelli, 2000; Urban, 1992).
23
Os indivíduos do sambaqui Forte Marechal Luz são anatomicamente diferentes dos sambaquieiros
(Prous 1992), já os indivíduos enterrados em Praia da Laranjeiras II, Tapera, Base Aérea e Armação do
Sul não apresenta diferenças morfológicas com os sambaquieiros (Okumura 2007).
52 a existência de recipientes de argila não cozida, escavadas nas camadas de conchas dos
sambaquis, anteriores à aparição de cerâmicas do planalto (Beck, 1972; Bryan, 1961;
De Masi, 2001).
Redes de intercâmbio entre planalto e litoral existiram desde antes da influência
massiva dos ceramistas de tradição Taquara/Itararé, em Santa Catarina, Paraná e São
Paulo (este último com menor frequência de ocorrências), ou tradição Una, no Rio de
Janeiro, e posteriormente tradição Tupiguarani em todo o litoral. No Rio de Janeiro, por
exemplo, fragmentos de cerâmica Una foram recuperados em sambaquis antes da
influência massiva dos Jê. No sambaqui do Moa, encontrou-se cerâmica num nível
estratigráfico datado em ca. 3600 anos AP (Kneip, 1994) e na camada superficial do
sambaqui da Pontinha, datada em ca. 1790 anos AP (Crancio & Kneip, 1994) 24 .
Valvas de molusco, dentes de tubarão e restos faunísticos de espécies marinhas
recuperaram-se em diversos sítios do interior. Indústria lítica típica do planalto também
foi achada em sítios costeiros, como bolas mamilares, pedras geométricas e diversas
matérias primas líticas que não afloram no litoral (Barreto, 1988; Batista da Silva et al.,
1990; Beck, 1971, 1972; Chmyz, 1976; Dias, 1987; Dias & Carvalho, 1980; Piazza & A
Prous, 1979; Prous, 1992; Reis, 1980; Schmitz, 1984; Tiburtius et al., 1950). Zoólitos
também foram achados em sítios do planalto (Mentz Ribeiro et al., 1977; Prous, 1992;
Schmitz, 1984). Outra evidência de contato pretérito entre planalto e litoral está
representada pelo achado de grânulos de amido de araucária no cálculo dentário de
indivíduos sepultados em sambaquis (Wesolowski et al., 2007).
Segundo o estudo realizado por Okumura (2007), o vínculo interior-litoral teria
ficado limitado, durante milênios, a trocas de materiais, contatos sociais e políticos, mas
não genéticos, já que análises bioantropológicas mostram não ter existido intercâmbio
de indivíduos entre ambas as regiões.
24
Da mesma maneira, dois fragmentos de cerâmica com tempero de concha, típico da região amazônica,
foram recuperados em camada de ca. 3200 anos no sambaqui Corondó (Carvalho, 1987).
53 3.5.1. Os sítios costeiros com cerâmica Taquara/Itararé No Estado de Santa Catarina (e também Paraná 25 ) existem acampamentos
litorâneos com restos de cerâmica de tradição Taquara/Itararé, aqui denominados de
“sítios mistos”. Estes sítios foram tradicionalmente associados à chegada dos grupos
ceramistas que, uma vez na costa, teriam adotado estratégias de captação de recursos
que incluíam a pesca e coleta de moluscos (Bandeira, 1999; Batista da Silva et al., 1990;
Beck, 1972; Chmyz, 1976; Fossari, 2004; Rohr, 1972b; Schmitz, 1996, 1999c; Schmitz
et al., 1993; Uchôa, 1981). A interpretação baseia-se na diferença morfológica e
composicional entre sítios mistos e sambaquis, junto com a presença de cerâmica e
maior diversidade na indústria óssea que se observa em alguns sítios mistos. No entanto,
estudos recentes indicam um panorama algo distinto.
Wesolowski (2000), a partir de análise de marcadores osteológicos, observa
padrão típico de grupos caçador-coletores tanto em indivíduos sepultados em sambaquis
como em sítios mistos do litoral norte de Santa Catarina. Existiria uma continuidade na
dieta dos habitantes da costa, sem adoção da horticultura quando da chegada da
tecnologia cerâmica. Isto leva a autora a construir duas hipóteses: 1) que os grupos que
ocuparam os sítios mistos não guardariam relação com os grupos do planalto; 2) que os
grupos do planalto, horticultores, abandonaram esta prática ao chegar ao litoral.
Análises craniométricas realizadas por Okumura (2007) reafirmam o proposto
por Neves (1988) sobre afinidade genética entre indivíduos sepultados em sítios mistos
e sambaquis da ilha de Santa Catarina. Os mesmos estudos mostram semelhanças entre
séries ceramistas e sambaquis do litoral norte e sul do estado. Já no litoral norte e sul de
Santa Catarina, a continuidade genética não é tão clara e a associação entre indivíduos
sepultados em sambaquis e sítios mistos é variável (Okumura 2007).
As análises isotópicas realizadas por Bastos (2009) em indivíduos sepultados
nos níveis pré-cerâmicos e cerâmicos do sambaqui Forte Marechal Luz (ilha de São
Francisco do Sul, SC) indicaram que, do conjunto de 32 indivíduos analisados,
unicamente três não eram locais. Dois destes indivíduos alóctones estavam enterrados
25
No estado de Paraná, Rauth (1963) reporta a existência de um sambaqui , o sítio Ilha das Cobras (Baía
de Paranaguá) de 70 cm de altura e 30 m de cumprimento, com cerâmica Itararé até 20 cm de
profundidade. No sambaqui Ilha das Pedras (Baía de Antonina), Beber (2004) menciona a existência de
uma camada preta no topo do sambaqui de 3,5 m de altura, com cerâmica Itararé e Tupiguarani.
54 no nível cerâmico do sambaqui, e um no nível pré-cerâmico. Os três possuem a mesma
procedência interiorana. Estas análises também mostraram leves mudanças no padrão
alimentar dos indivíduos enterrados no nível cerâmico do sítio, que Bastos (2009)
interpreta como resultado de maior deslocamento até o interior em busca de recursos.
No sítio misto praia da Tapera (ilha de Santa Catarina), frequentemente
associado a grupos Itararé (Batista da Silva et al. 1990; Fossari 2004; Schmitz et al.
1993), estudos sobre marcadores de estresse realizados por Scherer et al. (2006) indicam
a prática de atividades vinculadas à captação de recursos marinhos (natação, remo,
arremesso de redes etc.). Estes mesmos indicadores foram amplamente identificados
entre sambaquieiros de Santa Catarina e Rio de Janeiro (ver Mendonça de Souza 1995;
Rodrigues-Carvalho 2003).
As evidências indicam continuidade entre os indivíduos sepultados em
sambaquis e sítios mistos e apontam a confirmar a primeira das hipóteses propostas por
Wesolowski (2000). Assim como observado para os acampamentos litorâneos sem
cerâmica, os sítios mistos teriam sido produzidos pela mesma população costeira e não
por migrantes ceramistas do interior que velozmente desenvolveram uma vida marítima,
como já mencionado por Prous (1992).
3.5.2. Domínio e miscigenação Existem duas diferenças maiores entre sambaquis e sítios mistos: a primeira
refere-se ao padrão de residência pós-marital observado em cada tipo de sítio; a
segunda, às marcas de violência detectadas nos indivíduos enterrados em sítios mistos.
Hubbe et al. (2009) identificaram que, em vários sítios mistos, entre os quais se
incluem o da Tapera e Forte Marechal Luz, discutidos anteriormente, o padrão de
residência é patrilocal, em oposição ao padrão matrilocal observado em sambaquis. O
novo padrão de residência pode ser interpretado como resultado da chegada de novas
populações. No entanto, entre os Jê meridionais do período histórico (Xokleng e
Kaigang) menciona-se padrão de residência matrilocal (Urban 1978) e também bilateral
(Santos, 1973), este último relacionado à reestruturação, produto das pressões exercidas
pela sociedade nacional, como salienta Santos (1973). Portanto, Jê e sambaquieiros
podem possuir o mesmo padrão de residência.
55 Em indivíduos sepultados em sítios mistos de Santa Catarina detecta-se um
aumento nas marcas de violência (Lessa 2005; Lessa & Scherer 2008). No entanto, estes
indivíduos apresentam as mesmas marcas osteológicas de atividade e a mesma dieta que
os ocupantes dos sambaquis (Bastos, 2009; Okumura, 2007; Scherer et al., 2006;
Wesolowski, 2000).
A mudança observada no padrão de residência é infinitamente mais significativa
que a adoção da cerâmica, já que influi em vários aspectos da organização social,
política e econômica do grupo. Isto significa que, apesar de predominar a continuidade
genética e cultural entre ocupações cerâmicas no litoral e sambaquis, a influência
interiorana há 1500-1000 anos foi mais complexa que a simples transmissão de uma
inovação tecnológica como a cerâmica. Tal influência teria envolvido mudanças radicas
na organização social, intercâmbio de indivíduos, assim como aumento na violência
inter e intra-grupal (como mostrado por Lessa, 2005, e Lessa & Scherer, 2008).
Nesta tese, a partir de uma revisão das pesquisas mais recentes sobre ocupação do
planalto e do litoral (principalmente no Estado de Santa Catarina), propõe-se que o
crescimento populacional e o poderio alcançado pelas populações do planalto, há 1500
anos, provocou um aumento nas redes de interação entre planalto e litoral (ver Prous
1992). O domínio dos Jê sobre os sambaquieiros, que provocou uma intensa reestruturação e transformação do sistema sociocultural das comunidades litorâneas (ver
Gaspar et al. 2007), pode ser uma resposta à pressão exercida pelos Guaranis sobre as
populações interioranas (ver Noelli 1999, 2004). Assim, seriam estes indivíduos
miscigenados no último milênio, sob o domínio da influência interiorana, os que
encontraram os guaranis na costa, e não os descendentes de uma suposta leva migratória
de grupos do planalto que se adaptaram rapidamente à vida litorânea há 1500-1000
anos.
4. A FORMAÇÃO DOS SAMBAQUIS Desde o abandono do debate inicial sobre o caráter antrópico ou natural dos
sambaquis, a intencionalidade na formação dos sítios tomou o papel principal nas
56 discussões científicas. Na década de 1990, vários autores postularam que os sambaquis
podem ser considerados como artefatos, por terem sido deliberadamente construídos
pelo grupo (Afonso and DeBlasis, 1994; Figuti and Klokler, 1996; Gaspar and
DeBlasis, 1992; Gaspar, 1991).
Atualmente considera-se que as conchas que constituem a matriz dos sambaquis
teriam sido utilizadas, na sua maioria, como elemento construtivo 26 que outorga volume
às estruturas, utilizadas tanto como local de habitação como de deposição dos mortos
(Afonso & DeBlasis, 1994; Figuti & Klokler, 1996; Gaspar, 1991, 2004; Gaspar et al.,
1994; Gaspar & DeBlasis, 1992; Klokler, 2001, 2008). A escolha dos locais de coleta
das conchas nem sempre estaria associada à proximidade do recurso, senão a
preferências culturalmente determinadas (Calippo 2010).
Nos tópicos a seguir, discute-se a construção dos sambaquis como ação mecânica
e como elemento simbólico. Apresentam-se os primeiros modelos sobre o processo de
formação dos sambaquis como resultado da acumulação de resíduos na periferia de
cabanas, do levantamento de plataformas etc. Posteriormente, apresenta-se a arquitetura
de sambaquis, como ação simbólica de construção da paisagem a partir da acumulação
de conchas. Além dos grandes sítios monumentais, existem sítios menores,
tradicionalmente tomados como evidência de intensificação da pesca entre os grupos da
costa. No entanto, pesquisas recentes indicam contemporaneidade e concomitância na
ocupação de sítios de ambos os portes.
4.1. MODELOS DE CONSTRUÇÃO Diversas hipóteses e modelos foram propostos para explicar o processo de
construção dos sambaquis. Em todos os modelos, predomina a visão dicotômica centro
vs. periferia como estrutura subjacente à ordenação do espaço nos sítios (Barbosa, 1999;
Gaspar et al., 1994). Um deles, elaborado por Tiburtius (1966) a partir de observações
realizadas no sítio Conquista 9, perto de Joinville, postula a formação de um anel de
detritos periférico sem estratificação interna, que circunda uma área central
26
Ab´Saber & Bernard (1953) tinham mencionado o uso do berbigão (Anomalocardia brasiliana) como
possível material de entulho nos sambaquis de Cananéia, utilizado para completar e aplainar a superfície
de cada camada.
57 caracterizada por uma sucessão de camadas horizontais de ocupação. Uma área de
menor altura no anel foi interpretada pelo autor como porta de saída da área central de
ocupação. O mesmo padrão de anel periférico foi observado no sítio Mar Casado, no
litoral de São Paulo (Guidon, 1964) e proposto por Laming-Emperaire (1975) como
modelo geral de formação de todos os sambaquis. No sambaqui Araújo II, Estado do
Paraná, Orssich (1977) igualmente propõe a ocupação cotidiana do centro, onde observa
maior concentração de fogueiras, camadas de cinzas e buracos de estaca, com descarte
de conchas e demais resíduos até as laterais do sambaqui. Esta dinâmica resultaria na
formação de diques ao redor das áreas de habitação que, frequentemente, deviam ser
aplainados para obter uma nova superfície de ocupação.
O modelo elaborado por Gaspar & DeBlasis (1992) segue as diretrizes propostas
por Tiburtius (1966) e Orssich (1977) sobre a formação do dique de detritos ou anel de
conchas periférico. Os autores propõem o crescimento do sambaqui a partir da
construção prévia de uma plataforma, sobre a qual acontecia a acumulação progressiva
de restos alimentares depositados na periferia da área central de habitação. O anel de
detritos seria eventualmente terraplenado para formar uma nova plataforma aplainada
sobre a qual se estabeleceria uma nova área de habitação.
No sambaqui Ilhote do Leste, Tenório et al. (2008) interpretam a mesma oposição
centro/periferia a partir da observação de camadas mais espessas na área central do
sambaqui. Na porção central do sítio, também se acharam fogueiras cercadas por seixos,
interpretados pelas autoras como indicador do local de habitação, além de camadas mais
finas com bolsões de conchas esparsos. Resíduos de lascamento foram encontrados
unicamente na área periférica. Os autores também interpretam o habito de limpeza e
varrido da área de habitação.
No sambaqui Ilha da Boa Vista 4 (Rio de Janeiro), Barbosa (2001) identificou
dois espaços principais e subordinados no sambaqui. A proposta da autora, apesar de
continuar com a oposição centro vs. periferia, não segue o padrão de anel periférico dos
trabalhos anteriores. Um dos espaços identificados está formado por uma área central de
ocupação, com maior concentração de artefatos ósseos e malacológicos, etapas de
fabricação de artefatos, restos faunísticos, botânicos e humanos. Nesta área, agrupavamse montículos, de 5 a 10 m de diâmetro, do lado de áreas de habitação (identificadas por
pisos de argila). O outro espaço identificado é a periferia, caracterizada por maior
ocorrência de refugo de lascamento de quartzo.
58 Outro formato de sítio e modelo de crescimento foi proposto por Hurt & Blasi
(1960) para explicar a formação do sambaqui de Macedo, no Paraná. Segundo os
autores, os sambaquieiros construíam um monte de conchas sobre o qual habitavam. No
entanto, a moradia não teria envolvido cabanas, já que não foram identificados buracos
de estaca neste sambaqui, unicamente fogueiras e extensas camadas de cinza e carvão,
tomadas como evidência de habitação em supostos abrigos de galhos. O sambaqui
estaria assim formado por um conjunto de montículos-habitação arranjados em torno de
um espaço central ou praça 27 . Um modelo de formação diferente foi também proposto
por Bryan (1993) para o sítio Forte Marechal Luz, na ilha de São Francisco do Sul (SC).
Este sambaqui ter-se-ia desenvolvido a partir da ocupação de um degrau natural
(possível terraço marinho) e da acumulação subsequente de detritos no sopé do terraço.
4.2. ARQUITETURA DE SAMBAQUIS A arquitetura de sambaquis refere-se tanto ao processo mecânico quanto ao
significado da construção dos sítios. O sambaqui, como elemento arquitetônico, é
transmissor de significados e expressa os princípios de ordem e classificação que regem
o funcionamento da sociedade (ver Fletcher, 1989; Parker Pearson and Richards, 1994).
Por isso, a arquitetura de sambaquis discute-se separadamente dos modelos elaborados
para explicar a sequência construtiva dos sambaquis como ação mecânica.
O sambaqui com informações mais detalhadas sobre sua arquitetura é o
Jabuticabeira 2, localizado no litoral sul de Santa Catarina. Composto por duas camadas
estratificadas de espessura métrica (conchífera na base e ictiológica no topo), este
sambaqui ofereceu as seguintes informações e interpretações: 1) a construção do sítio
seguiu um padrão de levantamento de pequenos montículos funerários, que se
superpõem no tempo e no espaço (Bendazzoli, 2007; DeBlasis et al., 1998; Fish et al.,
2000; Karl, 2000; Klokler, 2001, 2008; Nishida, 2007); 2) os sepultamentos humanos
eram acompanhados por resíduos de festins celebrados em honra aos mortos (Klokler
2001, 2008); 3) a queima de materiais vegetais e faunísticos foi uma prática recorrente
27
As interpretações de Hurt & Blasi (1960) sobre as estruturas de habitação no sambaqui do Macedo
baseiam-se, em grande medida, em comparações com observações etnográficas dos índios Seta (ou Xeta)
que ocupam a serra dos Dourados, no Paraná.
59 (Bianchini, 2008; Klokler, 2008; Nishida, 2007; Villagran, 2008; Villagran et al., 2009,
2010) e algumas espécies vegetais podem ter sido queimadas graças a suas
características aromáticas, vinculadas com atividades rituais no sambaqui (Bianchini et
al., 2007); 4) os materiais que compõem tanto a camada conchífera como a ictiológica
representam uma somatória de episódios de queima, acumulação e descarte de resíduos
alimentares para construção dos montículos funerários, através de um processo que
expressa a ritualização dos elementos descartados em contexto doméstico ou cerimonial
(Villagran, 2008, 2010; Villagran et al., 2009; Villagran et al., 2009a; Villagran et al.,
2010).
A partir dos trabalhos desenvolvidos no sítio Jabuticabeira 2 (Santa Catarina), o
ritual funerário passou a ser considerado eixo do crescimento dos sambaquis
conchíferos e monumentais. Porém, as características funcionais de outros sambaquis e
seu significado podem exibir variações intra-sítio 28 e inter-sítio que merecem estudos
mais aprofundados. Principalmente no que refere à categorização dos sambaquis
monumentais como espaço exclusivo de funérea ritual, como tinha sido proposto por
Wiener (1875) e por Duarte (1968) para os sambaquis com sepultamentos. As
evidências de estruturas de habitação em numerosos sambaquis com corpos humanos
desde a ilha de Santa Catarina até Rio de Janeiro indicam que ritual e cotidiano de fato
teriam ocupado o mesmo espaço físico e simbólico, tanto no sambaqui, como elemento
arquitetônico, como nos sambaquieiros, como sistema cultural.
No litoral sul de Santa Catarina, onde não existem evidências claras de áreas de
habitação, nem no sambaqui 29 nem nas suas imediações, a reunião entre o mundo dos
mortos e dos vivos poderia ter sido a norma (ver Wesolowsky 2000 para o litoral norte
do estado). Jabuticabeira 2 é claramente um sítio funerário (ver Klokler, 2008), mas a
sua construção envolveu o remanejamento de resíduos domésticos, para dar volume à
estrutura, assim como de restos de festins, para cobrir os corpos. O hábito de acumular e
queimar resíduos para posterior deposição no sambaqui, na construção dos montículos
funerários, pode ter destruído as evidências dos locais de moradia onde acontecia a
28
Já Gaspar (1991) questionou a suposta homogeneidade horizontal dos sambaquis que tinha conduzido,
nas décadas de 70 e 80, à identificação de tradições, fases e subfases dentre os sambaquis do Rio de
Janeiro por diversos autores, que basearam a sua tipologia em diferentes áreas escavadas do mesmo sítio.
29
Castro Faria (1959) menciona evidências da ocupação do sambaqui Cabeçuda como área de habitação,
junto com local de sepultamento dos mortos. Hurt (1974) relata o achado de quatro fundos de habitação
delimitados por buracos de poste no sítio de Caieira.
60 acumulação prévia à deposição no sambaqui (Villagran 2008, 2010; Villagran et al.
2009a, 2009b).
4.3. OS SÍTIOS MENORES As evidências de ocupação humana pré-histórica no litoral sul e sudeste do
Brasil não se restringem aos sambaquis que até hoje caracterizam a paisagem costeira.
Contemporâneo aos sambaquis existe outro tipo de sítio, denominado na bibliografia de
“acampamento litorâneo” 30 , formado por acumulações rasas (de menos de 1 m de
altura) e superfície variável (de 200 até 2000 m2) de sedimentos finos, frequentemente
referidos como “terra preta”, ossos de peixe e escasso, senão nulo, conteúdo de conchas
de moluscos. As conchas, quando presentes, acontecem na forma de bolsões ou lentes
de extensão limitada. Em alguns casos, apresentam cerâmica de tradição Taquara/Itararé
e correspondem aos sítios mistos discutidos no tópico 3.5.2.
Este tipo de depósito pode acontecer seja como sítio isolado, seja superposto a
sambaquis (Lima 1999; Prous 1992). Encontra-se desde o Rio de Janeiro até o Rio
Grande do Sul. No Rio de Janeiro, foram associados à tradição Itaipu 31 (Dias, 1976;
Mendonça de Souza, 1991). Em São Paulo, encontram-se nas ilhas e apresentam
associação entre área de moradia e sepultamento dos mortos (Amenomori, 2005;
Nishida, 2001). No Paraná, as informações são escassas, mas Bigarella (1950) menciona
a existência de duas jazidas paleoetnográficas em terreno de manguezal e de um
sambaqui com camada de terra preta acima. Em Santa Catarina os acampamentos
litorâneos são abundantes, especialmente na ilha de Santa Catarina e no litoral norte do
estado. Apresentam vastas áreas habitacionais, identificadas a partir da associação entre
estruturas de combustão (de grande tamanho e rodeadas de seixos), buracos de estaca,
30
Estes sítios também podem ser referidos com o nome de paradero (Serrano), sítio paleoetnográfico
(Rohr; Tiburtius), sítios rasos (Chmyz), sambaquis sujos (Garcia; Laming & Emperaire), acampamentos
conchíferos (Prous & Piazza), concheiros (Barreto) e mesmo como sambaquis (Beck) (Prous 1992). A
inerente conotação funcional do termo acampamento, que dá a idéia de ocupação esporádica e de curta
duração, pode ser enganosa para se referir às amplas e complexas estruturas habitacionais e funerárias que
caracterizam estes depósitos. Neste sentido, Prous (2006) adota a denominação de “sítio de pesca e coleta
não construído” para referir-se aos antigos acampamentos litorâneos, embora tal terminologia adicione
mais contradições ao termo ao negar a sua construção em oposição à construção dos sambaquis.
31
Este esquema classificatório apresenta numerosas falhas e encontra-se atualmente em desuso Segundo
Gaspar (1991), existem mais semelhanças que diferenças entre os sítios e conjuntos artefatuais da tradição
Itaipu e da tradição Macaé, associada aos construtores de sambaquis.
61 pisos de argila compactada, “fornos polinésios” e artefatual lítico e ósseo. Grandes
concentrações de sepultamentos humanos são igualmente comuns (Beck, 1971, 1972;
Prous, 1992; Rohr, 1984).
Por serem compostos primordialmente de restos de peixe, os acampamentos
litorâneos foram tradicionalmente interpretados como produto de uma mudança na dieta
das populações costeiras. Esta mudança teria envolvido a substituição da coleta de
moluscos pelo desenvolvimento de pesca especializada, motivada por câmbios
ambientais e/ou super-exploração dos bancos de moluscos (Beck, 1972; Lima, 1991,
1999; Mendonça de Souza, 1995; Rohr, 1984; Schmitz et al., 1988; Schmitz et al.,
1993). Na mesma linha interpretativa, a nova estratégia de subsistência indicaria a
transformação dos coletores de moluscos em grupos mais sedentários, com economia de
pesca e organização de tipo tribal (Lima, 1999).
No entanto, estudos zooarqueológicos (Bandeira, 1992; Figuti, 1992; Nishida,
2001, 2007) e isotópicos (De Masi 1999, 2001) demonstraram que a pesca foi a
atividade econômica principal tanto em sambaquis como em acampamentos litorâneos,
e o consumo de peixe a fonte básica de proteína entre todos os grupos costeiros.
Outro argumento utilizado para admitir a dicotomia sambaqui vs. acampamento
era que os acampamentos se encontram sobre dunas e em praias de mar aberto,
afastadas das áreas lagunares, local de preferência para a construção de sambaquis
(Dias, 1976; Lima, 1999). No entanto, esta aparente diferença na distribuição geográfica
pode resultar de um viés de observação e/ou preservação, isto é, a baixa visibilidade dos
sítios superficiais e sua suscetibilidade ao preenchimento sedimentar característico das
porções do litoral brasileiro submetidas ao efeito das variações do NRM no Holoceno
(Brochier, 2009; Giannini et al., 2010). De fato, existem informações sobre sítios
sepultados por sedimentos holocênicos no litoral do Paraná 32 . Estes achados permitem
cogitar a possibilidade, aventada por Giannini et al. (2010), de sítios assemelháveis aos
acampamentos litorâneos terem existido também em áreas mais afastadas da atual linha
de costa, associados a sambaquis conchíferos. Pela escassa altura e alta vulnerabilidade
32
No litoral do Paraná, Bigarella encontrou um sítio soterrado por sedimentos holocênicos a pouco mais
de 1 km do sambaqui Matinhos, datado em 2750 ± 250 anos AP (Chmyz et al., 2003). Em contexto
similar, foi achado outro sítio, nas proximidades de Paranaguá, sobre uma camada compacta, de cor
marrom a preta, entre camadas arenosas com estratificações paralelas e cruzadas na barreira pleistocênica
(Chmyz, 1975).
62 dos sítios rasos, se comparados com os grandes e resistentes sambaquis, o seu registro
pode ter sido destruído ou estar obliterado pela evolução geológica do litoral.
Nem sequer a cronologia dos sítios pode ser utilizada como argumento favorável
à separação entre acampamentos e sambaquis, já que frequentemente se trata de sítios
contemporâneos 33 . Além disso, estudos craniométricos mostraram afinidade genética
entre os indivíduos sepultados nos acampamentos das ilhas paulistas e nos sambaquis
do litoral continental do estado, mesmo padrão observado entre acampamentos na ilha
de Santa Catarina e sambaquis continentais (Okumura, 2007). No Estado de São Paulo,
a afinidade biológica teria se transformado, com o tempo, em estratégias de subsistência
diferenciadas para ocupações em sambaquis e acampamentos, como demonstrado por
Calippo (2010) a partir de análises isotópicas.
As evidências parecem confirmar a hipótese de Gaspar (1991) da existência de
uma única unidade sócio-cultural na costa, com variações regionais. A associação entre
áreas de moradia, descarte de alimentos e enterramento dos mortos que se observa em
sambaquis e acampamentos litorâneos, junto com a similaridade nas indústrias líticas,
ósseas e malacológicas e afinidade biológica nos indivíduos sepultados em ambos os
tipos de sítio, sugere que sambaquis e acampamentos foram produzidos por uma mesma
população e que se tratava de realidades coetâneas.
33
O sítio Pântano do Sul, na ilha de Santa Catarina, é um sambaqui que apresenta continuidade lateral
com acampamento com sepultamentos e tem idade máxima de 4460 ± 110 anos AP (Schmitz &
Bittencourt, 1996b). Também na ilha de Santa Catarina, o sítio Armação do Sul, acampamento précerâmico, foi datado em 2670 ± 90 (Schmitz et al., 1992). O sítio Mar Virado, na ilha do mesmo nome no
litoral norte de São Paulo, data de 2640 ± 70 anos AP (2480-2140 anos cal. AP) (Nishida, 2001). No Rio
de Janeiro o sítio Ilha dos Macacos, na margem da laguna de Saquarema, foi datado em 2160 ± 40 anos
AP (Barbosa, 2007).
63 5. CASO DE ESTUDO COMPARATIVO: CONCHEIROS ETNO­
HISTÓRICOS DA TERRA DO FOGO Concheiros com cronologias que vão dos 6400 anos AP até o período do contato
com os europeus caracterizam as costas do Canal Beagle (Terra do Fogo, Argentina).
Estes sítios associam-se a populações canoeiras especializadas na exploração de
recursos marítimos 34 (Miotti and Salemme, 2004; Orquera and Piana, 1996 a, 1999 a;
Orquera, 2005; Piana and Orquera, 2009; Salemme and Miotti, 2008). Os concheiros
fueguinos são rasos, poucos superam o metro de altura, e são geralmente estratificados.
Costumam apresentar forma de anel com depressão central, embora também existam
concheiros em forma de domo e meia-lua (Orquera and Piana, 1996 a, b, 1992, 1999 a,
2000; Piana and Orquera, 2009; Zangrando et al., 2009) 35 . Em todos os sítios, existem
evidências de consumo de pinípedes (lobo marinho) (ver Schiavini, 1993), com
exploração complementar de recursos terrestres (guanaco), aves marinhas (pinguim,
cormoran e petrel), peixes e moluscos (mexilhão), além de restos de cetáceos.
De acordo com as crônicas etnográficas, no momento de chegada dos europeus
(séculos XVII-XVIII) a Terra do Fogo estava ocupada por quatro grupos étnicos
principais: Ona ou Selknam; Yahgan ou Yamana; Alakaluf ou Kaweshkar; e Haush ou
Manneken 36 . Os Selknam habitavam a região norte da ilha e subsistiam da caça de
guanacos das estepes e exploração complementar do litoral. Os Alakaluf habitavam as
ilhas ocidentais do arquipélago fueguino e compartilhavam com os Yamana o estilo de
vida essencialmente marítimo, apesar de manter diferenças linguísticas. Os Haush
34
Segundo Orquera & Piana (1999, 2006, 2009), o elemento tecnológico mais destacável desta cultura
litorânea foram os arpões com ponta separável, que permitiam a caça de animais a distância,
provavelmente desde canoas. Segundo os autores, as culturas marítimas do canal Beagle só se
desenvolveram quando a floresta de Nothofagus sp. colonizou a região há 6000-5500 anos AP. Com as
matérias primas lenhosas construíram-se as canoas e fabricavam-se os arpões.
35
Concheiros monticulares, de maior expressão horizontal, aparecem no arquipélago chileno. Na ilha de
Chiloé, por exemplo, existem concheiros com até 3 m de altura e 50 m de extensão (Legoupil, 2005);
inluem, na região de Arica, norte do Chile, concheiros de até 10 m de altura associados à cultura
Chincorro, conhecida por representar as evidências mais antigas de mumificação intencional no mundo
(Arriaza et al., 2001).
36
A subdivisão em grupos étnicos é atualmente questionável. É possível que, por um lado, esses quatro
grupos lingüísticos existissem, embora com variantes dialetais dentro de cada um; por outro lado, havia
grande permeabillidade e transferência de pessoas entre as diferentes agrupações mencionadas. Estudos
cranionmétricos indicaram o vínculo genético entre os Alakaluf, Selknam e Yamana (Cocilovo & Di
Rienzo 1985), com diferenças morfológicas evidentes entre eles no momento da chegada dos europeus à
região (Varela et al., 1996).
64 habitavam a porção sudeste da ilha e teriam subsistido a partir da exploração combinada
de espécies terrestres e marítimas. (Bridges, 1885, 1893; Gusinde, 1982, 1986; Hyades
and Deniker, 1891; Lothrop, 1928; Martial, 2005).
Os Yamana, que ocupavam as costas do Canal Beagle e ilhas menores do
arquipélago chileno e cabo de Hornos, eram grupos canoeiros (ver tópico 5.1) cuja vida
e subsistência estava voltada à exploração de recursos aquáticos (mamíferos marinhos,
peixes, moluscos e aves), com consumo complementar de guanaco (Estevez and
Martinez, 1997; Estevez et al., 1996,
2001; Juan-Muns, 1992; Mameli, 2000). A
formação de concheiros era parte da dinâmica de ocupação dos Yamana até tempos
históricos. Muitos dos cronistas que visitaram a região associaram estas acumulações de
valvas de moluscos com o local de moradia dos indígenas (Bridges, 1975; Darwin,
1839; Spears, 1895; Spegazzini, 1882; Wilkes, 1844).
Os concheiros associados aos grupos yamana estudam-se, desde 1986, sob uma
perspectiva que visa confrontar a informação etnográfica com a informação recuperada
das escavações arqueológicas 37 (Estevez and Vila, 1998). O objetivo maior do grupo de
pesquisa é estudar os fenômenos sociais a partir do registro arqueológico (Estevez and
Vila, 2007; Vila et al., 2006; Vila et al., 2007). Nesta abordagem, etnoarqueologia é
entendida como instrumento de desenvolvimento de teoria e método com base na
contrastação de métodos e teorias arqueológicas e etnográfico-antropológicas 38 (Briz,
2004; Estevez and Vila, 1996; Estevez et al., 1998).
Partindo da base de que as atividades humanas se organizam no tempo e no
espaço e que seus produtos (o registro arqueológico como resto da atividade social)
também são organizados, os concheiros foram escavados em extensão seguindo um
método microestratigráfico específico para este tipo de sítio (Estevez & Vila 2007;
Orquera & Piana 1992; Vila et al. 2007, 2010). Esta estratégia visa mostrar a
heterogeneidade dos concheiros para que, a partir do estudo da sua variabilidade interna,
37
Terra do Fogo representa um contexto propício para tal finalidade, já que existem documentações
etnográficas completas sobre as populações indígenas que ocupavam o território no momento de contato
com os europeus, assim como sítios arqueológicos antigos (Estevez and Vila, 2007; Estevez et al., 1998;
Estevez, 2009; Vila et al., 2007).
38
O primeiro sítio escavado sob a perspectiva etnoarqueológica foi o concheiro Túnel 7, seguido dos
sítios Alashawaia e Lanashuaia, todos associados aos grupos Yamana (Estevez and Vila, 1998; Alvarez et
al., 2009; Estevez et al., 2001; Piana et al., 2000). Além destes sítios, foram escavados sítios rituais e
funerários (Estancia Remolino e Mischiwen III) e sítios domésticos e rituais associados aos grupos
Selknam, no litoral norte da Terra do Fogo (sítios Ewan 1 e 2) (Bogdanovic et al., 2009; Camarós et al.,
2009; Caruso et al., 2009; Estevez and Vila, 2007; Mansur et al., 2007; Vila et al., 2006 a, 2007, 2004).
65 entenda-se o sistema econômico e social que produziu o sítio (Estevez 2009; Vila et al.
2010).
Com o auxilio das informações etnográficas disponíveis e da abordagem
etnoarqueológica referida, será estudado um concheiro yamana utilizando a mesma
abordagem proposta para sambaquis. A possibilidade de estender o método proposto a
um contexto no qual o registro sedimentar possa ser relacionado com informações de
primeira mão sobre a cotidianidade dos grupos, sempre considerando o viés do registro
etnográfico, permite aprofundar a formulação de hipóteses sobre o significado dos
processos de deposição antrópicos vinculados com a formação dos concheiros.
5.1. A INFORMAÇÃO ETNOGRÁFICA SOBRE OS YAMANA Os grupos canoeiros do Canal Beagle organizavam-se em famílias nucleares ou
em grupos de duas a três famílias que viviam e se deslocavam conjuntamente (Fitz-Roy,
1839; Gusinde, 1951,
1986 a; Lothrop, 1928; Lovisato, 1884; Martial, 2005;
Spegazzini, 1882; Wilkes, 1844). A cabana, os alimentos capturados e a canoa eram
propriedade da família ou grupo, enquanto o território, seus recursos e as cabanas
cerimoniais (enquanto durasse a cerimônia) eram bens comunitários (Gusinde 1986).
Os grupos yamana eram nômades e permaneciam por curtos períodos de tempo,
de dias e até semanas, em cada local de acampamento (Fitz-Roy, 1839; Darwin, 1839;
Despard, 1863; Hyades & Deniker, 1891; Martial, 2005; Lothrop, 1928; Gusinde,
1986). Unicamente eventos excepcionais, como o encalhamento de uma baleia na costa
ou a realização de cerimônias (chiejaus ou kina) 39 , motivavam períodos mais
prolongados de permanência num local (Gusinde 1986).
39
Chiejaus e Kina referem aos dois tipos de cerimônias realizadas pelos Yamana, a primeira incluía
homens e mulheres jovens, enquanto a segunda era somente realizada entre os homens jovens. Durante
estas cerimônias, ensinava-se aos jovens o comportamento moral e se lhes instruíam as tradições e tarefas
que realizariam quando adultos. As cerimônias reuniam vários grupos (formados por um conjunto de
famílias nucleares), celebravam-se em cabanas espacialmente confeccionadas para tal finalidade e
duravam até dois meses, ou até que a comida, freqüentemente proveniente de uma baleia encalhada,
acabasse (Chapman, 1997).
66 Os deslocamentos estavam igualmente favorecidos pela posse de canoas (Figura
2.3 F), que lhes permitiam navegar longas distâncias até lugares inacessíveis por terra 40
(Orquera & Piana 1999b). Por esse motivo, os acampamentos freqüentemente se
localizavam na costa (Figura 2.2 A) (Gusinde 1986; Hyades & Deniker 1891; Lovisato
1884; Martial 2005; Wilkes 1844). No entanto, existem relatos que mencionam a
existência de acampamentos yamana longe da costa, em áreas protegidas na beira da
floresta (Gusinde 1986; Spegazzini 1882).
Um atributo chamativo das canoas yamana era o transporte de pequenos fogos e
brasas que seriam desembarcados no local escolhido para o próximo acampamento. Para
isso, construía-se uma pequena plataforma no chão central da canoa com seixos, terra
argilosa, areia, conchas moídas e grama compactada (Bridges 1975; Gusinde 1986;
Forster 1777; Hyades & Deniker 1891; Lothrop 1928; Lovisato 1884; Martial 2005;
Wilkes 1844). No final do século XIX , as canoas de córtex dos Yamana foram
substituídas por canoas monóxilas (feitas com um tronco de árvore) (Gusinde 1986).
Apesar de cobrirem-se com capas de couro de animais para protegerem-se do frio,
os Yamana frequentemente andavam nus e/ou cobertos com um pequeno encobre-sexo
de couro ou uma pequena capa (Bridges, 1975; Darwin, 1839; Despard, 1863; Fitz-Roy,
1839; Gusinde, 1951, 1986 b; Hyades & Deniker, 1891; Lothrop, 1928; Lovisato,
1884; Martial, 2005; Wilkes, 1844).
5.1.1. Os assentamentos domésticos A alta mobilidade dos Yamana fazia com que as choças que construíam fossem
precárias e pouco duradouras. Elas eram ocupadas por uma ou até três famílias e
podiam ser de dois tipos: em forma de domo, de aproximadamente 2,5 m de diâmetro e
1,7 m de altura; ou cônicas, com cerca de 3 m de diâmetro e 2 m de altura (Orquera &
Piana 1999b). As cabanas possuíam estrutura de madeira e/ou troncos, coberta com
folhas, grama, algas, terra, córtex de árvore e couros de animais (Figura 2.2 B, C, E)
(Bridges 1987; Darwin 1839; Despard 1863; Fitz-Roy 1839; Gusinde 1986, 1951;
40
Apesar de a construção e o concerto da canoas serem atividades realizadas pelos homens do grupo, sua
condução, guia e remada eram realizada pelas mulheres (Bridges 1987; Despard 1863; Fitz-Roy 1839;
Gusinde 1986, 1951; Hyades & Deniker 1891; Lovisato 1884; Martial 2005; Spears 1895; Weddell 1825;
Wilkes 1844).
67 Hyades & Deniker 1891; Martial 2005; Lothrop 1928; Lovisato 1884; Spegazzini 1882;
Wilkes 1844).
Em ambos os tipos de residência era sempre mantida uma fogueira central como
meio de aquecimento (Gusinde 1986, 1951; Hyades & Deniker 1891; Lovisato 1884;
Martial 2005; Wilker 1844), e também algumas fogueiras periféricas para aquecer aos
indivíduos que ficassem fora da área central (especialmente as crianças) (Hyades &
Deniker 1891; Martial 2005) e, inclusive, fora da cabana (Gusinde 1986). As fogueiras
eram acesas sobre seixos (Lovisato 1884), incluindo conchas (Bridges 1987).
Dentro da cabana, aconteciam todas as atividades cotidianas: dormia-se, comia-se,
os homens confeccionavam artefatos em pedra, concha e osso, e as mulheres fabricavam
cestos, colares, artefatos em couro, preparavam a comida, limpavam e cuidavam do
fogo (Haydes & Deniker 1891). Apesar de que as gentes yamana costumavam jogar os
restos de alimento no fogo, conservavam a carne do lado de fora da cabana (Gusinde
1986). Os métodos utilizados para preparação dos alimentos envolviam o aquecimento
diretamente no fogo ou acima das brasas e cinzas 41 (Bridges, 1885, 1987; Gusinde,
1986 a; Hyades, 1887). A prática de cozimento, especialmente de carne, sobre pedras
quentes aquecidas com fogo foi também mencionada por alguns cronistas (Stambuk,
1986), ou colocação direta do animal sobre as brasas (Gusinde 1986). Segundo a
maioria dos cronistas, os moluscos eram jogados diretamente ao fogo ou às brasas e
cinzas para abrirem-se as valvas e extrair-se a carne 42 (Fitz-Roy 1839; Gusinde 1986;
Martial 2005; Wilkes 1844).
O abandono de uma cabana não envolvia sua destruição intencional (Fitz-Roy
1839; Gusinde 1986; Hyades & Deniker 1891; Martial 2005), já que freqüentemente a
cabana podia ser re-ocupada pelo mesmo grupo familiar ou outro diferente. Em
contraste às cabanas de uso doméstico, aquelas construídas para a realização de
cerimônias eram propriedade de toda a comunidade e, após a finalização da cerimônia,
eram abandonadas e deixadas a deteriorar. As cabanas cerimoniais também diferiam dos
assentamentos domésticos em dimensões, já que deviam albergar a vários indivíduos
em pé, pelo que podiam chegar a alcançar até 12 m de comprimento, 3,5 m de largura e
2,5 m de altura (Gusinde 1986).
41
O termo utilizado pelos Yamana para se referir à ação de cozinhas sobre as brasas ou cinzas era
pushana (Bridges 1933), enquanto o termo pukwia (Bridges 1987) ou puku (Hyades & Deniker 1891) era
usado para se referir a ação de cozinhar em geral.
42
A palavra köpuku (Bridges 1987) referia ao cozimento dos moluscos.
68 Nos relatos de vários cronistas, menciona-se que cada cabana ocupada por uma ou
várias famílias yamana era acompanhada de um monte de conchas e outros resíduos
(Bridges 1975; Despard 1863; Gusinde 1986; Lovisato 1884; Martial 2005; Spears
1895; Spegazzini 1882; Wilkes 1844). Fala-se do fato desta acumulação de detritos ter
função de proteção dos fortes ventos do litoral (Bridges 1975; Gusinde 1986; Martial
2005). Os relatos dos cronistas também sempre localizam os conchales ou concheiros
ao longo da costa, em enseadas, áreas protegidas do vento e também em locais expostos
à ação das ondas, mas nunca no interior (Gusinde 1986; Lovisato 1884).
69 Figura 2.2. Fotografias etnográficas dos Yamana que habitaram as costas do Canal Beagle: A) costa do
Canal Beagle, com localização de três cabanas Yamana (indicadas com uma flecha), em fotografia
tomada por Greten Motsny; B) cabana Yamana fotografiada pela Mission Scientifique Du Cap Horn em
1882-1883; note-se a acumulação de conchas que conduz à entrada da cabana; C) família Yamana fora da
residência (Mission Scientifique Du Cap Horn em 1882-1883); D) Mulher Yamana sentada sobre um
concheiro (Mission Scientifique Du Cap Horn em 1882-1883); E) cabana Yamana coberta pela neve com
menina e cachorro, fotografia tomada por Greten Motsny; F) canoas nas águas do Canal Beagle (Mission
Scientifique Du Cap Horn em 1882-1883).
70 5.1.2. A formação dos concheiros Segundo Orquera & Piana (1999b), o primeiro autor a associar os concheiros que
se distribuem ao longo da costa do Canal Beagle com a moradia dos indígenas da região
foi Darwin (1839), e os que relacionaram diretamente o material que compõe os
concheiros com resíduos de cozinha, especificamente, foram Despard (1863),
Spegazzini (1882) e Lothrop (1928). A forma e a localização dos concheiros em relação
à cabana de moradia variam segundo os cronistas. Alguns mencionam que a cabana
construía-se acima do concheiro (Gusinde 1986; Lovisato 1884); outros, que os
concheiros eram pequenos montículos ao lado da entrada da cabana (Martial 2005;
Spears 1895; Wilkes 1844); e outros ainda, que se tratava de terraplenos que
circundavam a área ocupada pela cabana (Bridges 1975; Despard 1863). As dimensões
dos concheiros também variam de acordo com os autores. Fala-se de montículos de até
4,5 m de diâmetro e 3,5 m de altura (Bridges 1975; Gusinde 1986; Lovisato 1884).
Gusinde (1986) menciona que a reocupação dos concheiros, pela mesma família ou por
outras gerações, fazia com que as suas dimensões aumentassem ano a ano (Figura 2.2 B,
D).
A formação dos concheiros é citada como resultado da superposição de estratos
compostos dos resíduos alimentícios que eram jogados fora de área de moradia, com
predomínio de mexilhão, entre outros bivalves e gastrópodes, e alguns ossos de animais.
O próprio Gusinde (1986), ao narrar os achados em concheiros antigos, especifica que
todos os restos faunísticos que se recuperam nesses concheiros correspondem ás
mesmas espécies das quais os grupos yamana se alimentam atualmente, o que serve para
corroborar sua filiação étnica.
A observação dos concheiros antigos também ofereceu descrições de alterações
tafonômicas nos concheiros da região. A formação de concreções carbonáticas é
mencionada por Gusinde (1986) e Lothrop (1929), ao referirem-se à presença de “capas
de brecha” (com 5 a 35 cm de espessura) próximo à base dos concheiros e até em
estratos superiores. Todas as fontes etnográficas mencionam a importância que o
consumo de moluscos tinha entre as populações yamana (Orquera & Piana, 1999 b;
Orquera, 1999), especialmente da espécie Mytilus edulis (Linneaus) (popularmente
conhecido como mejillón, em Espanhol, ou mexilhão, em Português), muito freqüente
nas costas do Canal Beagle. Estimativas realizadas por Segers (1908), que trabalhou
71 como médico em Ushuaia entre 1886 e 1889, indicam um consumo médio diária 8 a 10
kg de Mytilus por indivíduo yamana.
Esta visão levou a interpretar que tanto a localização da área de residência, como a
grande mobilidade dos grupos, estavam motivados pela continua procura de novos
bancos de moluscos após o esgotamento daqueles já explorados (Lovisato 1884; Martial
2005; Wilkes 1844). No entanto, outros autores sugerem que não seria o esgotamento
em si que motivaria o deslocamento, senão a intenção de impedir a sobre-exploração
dos bancos (Steager, 1965). Segundo Gusinde (1986), a presença de bancos de
moluscos não teria sido definitiva na escolha do local de acampamento e muitas vezes
os grupos yamana podiam percorrer grandes distâncias em busca de moluscos.
Apesar da maioria dos cronistas relatarem o papel primordial dos moluscos na
alimentação das populações costeiras, a exploração deste recurso devia ter atuado como
complemento na dieta e/ou como recurso de fácil captura em tempos de escassez
(Orquera 1999; Orquera & Piana 1999b, 2001). Além disso, tanto o material faunístico
recuperado dos concheiros do período histórico, associados às populações yamana,
como as análises isotópicas realizadas em ossos de indígenas da região, apontam ao
consumo primordial de mamíferos marinhos e guanaco (Estevez et al., 2001; Mameli
and Estevez, 2004; Orquera & Piana, 2000; Orquera, 1999; Panarello et al., 2006;
Yesner et al., 2003).
A grande maioria dos cronistas relata que a coleta de moluscos era
exclusivamente realizada pelas mulheres do grupo, acompanhadas às vezes pelas
crianças (Fitz-Roy, 1839; Gusinde, 1986 b; Hyades & Deniker, 1891; Hyades, 1885,
1887; Martial, 2005; Spears, 1895; Weddell, 1825).
Enterramentos humanos em concheiros não eram frequentes entre os grupos
yamana, apesar de que alguns cronistas falam desta prática. Segundo Hyades & Deniker
(1891), o defunto era enterrado no concheiro na entrada da cabana; já Martial (2005)
descreve que o defunto ea enterrado onde finalizava o montículo de conchas. E, de
acordo com Koppers (1997), somente as crianças eram enterradas nos concheiros.
No geral, os grupos yamana praticavam a cremação dos corpos na cabana ou no
interior da floresta, nunca sobre a praia (Bridges, 1975, 1886; Despard, 1863; Gusinde,
1986 a; Hyades & Deniker, 1891; Lovisato, 1884; Spegazzini, 1882), mas este costume
não teria perdurado após o contato com os europeus (Orquera & Piana 1999b). Como
afirmaram Lovisato (1884) e Koppers (1997), antigamente todos os corpos eram
72 cremados; o hábito de enterrá-los em fossas de pequena profundidade teria começado
somente após a chegada dos missioneiros anglicanos. No entanto, também existem
relatos que mencionam a prática do enterramento de indivíduos adultos, mulheres e
crianças na própria cabana de moradia, no concheiro, fora da área de residência, em
pequenas ilhas, em cavernas, ou em bancos de areia (Bridges 1886; Despard 1863; FitzRoy 1839; Gusinde 1951, 1986; Martial 2005; Lothrop 1928; Lovisato 1884;
Spegazzini 1882).
No entanto, na Terra do Fogo e ilhas do arquipélago do Cabo de Hornos as
evidências arqueologias mostram sepultamentos humanos em concheiros e em
afloramentos rochosos próximos a concheiros 43 (Alvarez et al., 2008; Piana et al.,
2006). Na síntese realizada por Piana et al. (2006), mencionam-se achados de
sepultamentos humanos em concheiros na Ilha Navarino (Spencer 1951; Ocampo et al.
2001 em Piana et al. 2006), nas ilhas Wollaston e Bayly (Cabo de Hornos) (Legoupil,
1993), em três concheiros no Canal Beagle (sítios Shamakush I, Shamakush X e
Acatushún), assim como dois enterramentos em abrigo rochoso que estavam cobertos
por camada de conchas. Em todos os casos trata-se de enterramentos em posição
primária. A estes casos soma-se o esqueleto de uma criança achado no sítio Ajej I
(Piana et al., 2007, 2000, 2008; Piana & Vazquez, 2009) e os o esqueleto recuperado
no sítio Harberton (Piana and Vazquez, 2008; Vila, comunicação pessoal). Na costa
noroeste e nordeste da ilha, foram achados sepultamentos em 2 concheiros rasos
compostos de Mytilus edulis: o sítio Marazzi 1 (6170 ± 50), no litoral da Baía Inútil que
contém uma cremação parcial; e Laguna Arcillosa 2 (5508 ± 48) na costa Atlântica
(Morello et al. 2012; Salemme & Bujalesky 2000; Salemme et al. 2007).
6. SUMÁRIO Sítios concheiros, a exemplo dos sambaquis brasileiros, aparecem desde o
Pleistoceno Superior. Nas Américas, as economias marítimas surgem durante a
43
Na ilha de Chiloé também se recuperaram ossos humanos de um concheiro (sítio Yaldad 2) datado de
ca. 5900 anos AP (Legoupil, 2005).
73 transição Pleistoceno-Holoceno e incluem, dentre os seus remanentes, concheiros rasos,
a céu aberto e em cavernas, localizados no litoral pacifico do continente. No Brasil, os
primeiros sambaquis aparecem há cerca de 10.000 anos em áreas interioranas dos
estados de São Paulo e Amazônia. No litoral atlântico, as ocupações mais antigas não
ultrapassam os 8000 anos AP e encontram-se nos estados de Rio de Janeiro, São Paulo e
Santa Catarina.
Os grupos associados aos sambaquis brasileiros eram, desde o primeiro momento
de ocupação do litoral até o abandono da prática social de acumulação de conchas,
culturas marítimas. A evidência arqueológica mostra que estes grupos possuíam práticas
sociais, culturais, rituais e simbólicas, elaboradas a partir da relação profunda com os
ambientes aquáticos (mar, estuários e lagoas). Além dos grandes sambaquis de
composição essencialmente conchífera, outros tipos de sítios estão associados às
culturas litorâneas. Tradicionalmente concebidos como resultado de mudanças nas
estratégias de subsistência, estes sítios, de menores dimensões e conteúdo malacológico
desprezível, integravam o sistema de assentamento sambaquieiro.
Vários modelos foram propostos para explicar o crescimento dos sambaquis, a
partir de exemplos que se fundamentam na dicotomia entre área central de ocupação e
área periférica de descarte de resíduos. Nestes modelos, explica-se a ação mecânica,
produto da organização social do espaço, que ao longo do tempo teria resultado na
configuração atual dos sítios. A arquitetura de sambaquis, pelo contrário, deriva da
interpretação dos processos de formação dos sambaquis como elementos que
simbolizam e determinam a percepção do ambiente pelas comunidades litorâneas.
Na construção de modelos interpretativos que ajudem a explicar as sucessões
verticais nos sambaquis, será utilizada a analogia arqueológica intercultural com um
grupo conhecido etnograficamente. Os grupos yamana da Terra do Fogo formavam
concheiros nos assentamentos domésticos, na forma de anel periférico à área central de
moradia. A partir de uma perspectiva etnoarqueológica que examine as informações
etnográficas em contraste com o registro arqueológico, propõe-se estudar um concheiro
yamana com os mesmos métodos utilizados para sambaquis. A correspondência nos
métodos aplicados a ambos os tipos de sítio habilitará a comparação intercultural e o
uso de informações derivadas da análise do concheiro etno-histórico na formulação de
hipótese sobre o significado da construção dos sambaquis.
74 CAPÍTULO 3: SAMBAQUIS DO LITORAL SUL CATARINENSE 1. INTRODUÇÃO No litoral do Estado de Santa Catarina, onde se encontram os sambaquis mais
volumosos do Brasil, as características da ocupação sambaquieira não foram
homogêneas. Por exemplo, na costa norte (região de Joinville) e centro do estado (ilha
de Santa Catarina), os sítios são menores, com alturas que não ultrapassam 5 m, e
apresentam associação entre áreas de moradia e de sepultamento (Afonso & DeBlasis,
1994; De Masi, 1999, 2001; Schmitz & Bittencourt, 1996). Já no litoral sul, área de
estudo desta pesquisa, destaca-se a conspicuidade dos sítios, com dimensões que
atingem atualmente os 30 m de altura e 500 m de cumprimento, bem como a alta
freqüência de sepultamentos humanos (Beck, 1971; Carvalho & Seyfreth, 1971;
DeBlasis et al., 1998; Fish et al., 2000; Hurt, 1974) (Figura 3.1).
Porém, dentro da própria área de localização dos sítios monumentais, existe uma
variedade de sítios menores (menos de 5 m de altura), também categorizadas como
sambaquis, que receberam menos atenção nas pesquisas. Estes sítios pequenos estão
sendo recentemente revalorizados como satélites aos sambaquis monumentais e com
funções específicas, embora ainda não completamente elucidadas (Assunçao, 2010;
Klokler et al., 2011; Peixoto, 2008).
Um caso que merece ser mencionado é o do sambaqui Encantada 3, cujo
reduzido tamanho (menos de 1,5 m de altura) e estratigrafia composta por núcleo
arenoso e camada superficial de conchas com sedimentos pretos (Klokler et al., 2011;
Peixoto, 2008) teriam conduzido, no esquema tradicional, à sua colocação na categoria
de acampamento litorâneo 44 (ver Capítulo 2, tópico 4.3). No entanto, a sua datação
recuada, de 5265-4835 anos cal. AP (Giannini et al. 2010) e a localização nas
44
Sítios rasos sem cerâmica, formados por camadas pretas de areia com conchas, aparecem também no
litoral central do Rio Grande do Sul. Estes sítios são freqüentemente interpretados como assentamentos
ceramistas Tupiguarani (Rogge, 2006), apesar de muitas vezes não conterem nenhum resto cerâmico nem
datação que confirme a associação étnica. Estes sítios poderiam ser semelhantes, em forma e composição,
ao Encantada 3, no litoral sul de Santa Catarina, apesar de serem mais recentes. Um dos sítios rasos do
Rio Grande do Sul apresenta uma ocupação pré-cerâmica que foi datada em 2170 ± 70 AP (Rogge 2006).
75 proximidades de sambaquis maiores permitem integrá-lo ao sistema sambaquieiro de
ocupação da costa (ver Peixoto 2008).
Segundo Kneip (2004) e DeBlasis et al. (2007), as lagunas costeiras que
caracterizam a região funcionaram como epicentro da distribuição dos sambaquis e
provavelmente atuaram como referência essencial no assentamento das comunidades. A
escolha do local de implantação dos sambaquis estaria influenciada pela visibilidade aos
grandes corpos de água, que atuavam como fonte de recursos protéicos (peixes) e de
matéria prima construtiva (conchas).
No estudo realizado por Giannini et al. (2010), identificou-se a clara preferência
destas comunidades em se estabelecer em locais secos e protegidos das inundações
periódicas 45 . Entre estes locais de assentamento, incluíam-se, além das margens
lagunares, pontais rochosos (de mar aberto e entre a planície lagunar), paleodunas
eólicas e paleotômbolos de retrobarreira (que se desenvolvem à retaguarda dos pontões
rochosos). Pela demonstrada preferência de estabelecimento dos sambaquis em locais
secos, os autores respaldam a hipótese de que o crescimento vertical dos sítios não
estaria guiado pela elevação de uma plataforma para proteção da ação destrutiva das
águas, como pode ter acontecido em outras áreas litorâneas, senão como estratégia de
construção da paisagem (DeBlasis et al. 2007; Fish et al. 2000; Gaspar 1998, 2004).
Pesquisas arqueológicas na área de estudo desta tese focalizaram na localização
de sambaquis e no estabelecimento de cronologias de ocupação, a partir de amostras
datadas do topo e da base dos montículos 46 . A robusta cronologia construída mostrou
que a ocupação da área teria começado em cerca de 7500 AP e perdurado por
aproximadamente 6000 anos (DeBlasis et al. 2007; Giannini et al. 2010).
Giannini et al. (2010) advertem para o fato de que as cronologias de ocupação
devem ser tomadas como evidência parcial, por três motivos: 1) sítios mais antigos,
anteriores ao máximo transgressivo (atingido na região entre 5700-5100 anos AP,
segundo Angulo et al., 1999, 2006), podem ter sido afogados pelo mar ou laguna e
45
Guerra (1953) estabelecia que a ocupação acontecia em zonas emersas e locais protegidos das águas.
As pesquisas recentes sobre sambaquis do litoral sul do estado de Santa Catarina incluem o “Projeto
Arqueológico do Camacho” (FAPESP processo 97/03831-6, Wenner-Gren Foundation, Heinz Foundation,
University of Arizona, Museu Nacional UFRJ e CNPq), o auxílio à pesquisa “Processos formativos nos
sambaquis do Camacho, SC: padrões funerários e atividades cotidianas” (FAPESP, processo 03/02059-0)
e o projeto temático “Sambaquis e paisagem: modelando a inter-relação entre processos formativos
culturais e naturais no litoral sul de Santa Catarina” (FAPESP, processo 04/11038-0); este último
coordenado pelos Profs. Drs. Paulo DeBlasis (Museu de Arqueologia e Etnologia MAE/USP), Madu
Gaspar (Museu Nacional MN/UFRJ) e Paulo C.F. Giannini (Instituto de Geociências IGc/USP).
46
76 posteriormente recobertos pelo assoreamento da região após a descida do NRM; 2) pela
intensa mineração que os sambaquis sofreram durante as décadas de 1950 e 60, o nível
superior atual do sambaqui, tomado como data final da sua formação, pode representar
um momento intermediário na sua formação, exposto pela atividade mineradora; 3) no
caso dos sambaquis maiores, a sua formação a partir da disposição de pequenos
montículos concomitantes e justapostos sugere que amostras da base do sítio podem não
representar o início da formação do sambaqui como um todo, e sim desse montículo
particular.
No litoral sul de Santa Catarina, poucos sítios foram escavados e o único
sambaqui que foi objeto de escavações parciais, mas sistemáticas, foi o Jabuticabeira 2.
Os estudos multidisciplinares realizados neste sambaqui permitiram interpretar o
processo e significado da sua formação (Bendazzoli, 2007; DeBlasis et al., 1998; Fish et
al., 2000; Karl, 2000; Klokler, 2001, 2008; Nishida, 2007; Villagran, 2008, 2010;
Villagran et al., 2010) (ver capítulo 2, tópico 5.2), assim como inferir sobre dieta,
patologias e relações genéticas entre os indivíduos nele sepultados (Bartolomucci, 2006;
Boyadjian, 2007; Filippini and Eggers, 2005; Filippini, 2004; Klokler, 2001, 2008;
Nishida, 2007; Okumura and Eggers, 2005; Petronilho, 2005; Storto et al., 1999).
77 Figura 3.1. Sambaquis do litoral sul catarinense: A) mapa de localização da área de estudo; B) sambaqui
Garopaba do Sul, o maior sambaqui que existe atualmente na região; C) sambaqui do Ipoã; D) sambaquis
de Encantada; E) sambaqui de Jabuticabeira 2; F) retirada de sepultamento humano do sambaqui
Garopaba do Sul (B, D e E: fotografias de Paulo Giannini; F: fotografia de Armando Coimbra).
78 2. UMA PAISAGEM HISTÓRICA A evolução geológica do litoral catarinense durante o Holoceno teve uma
influência marcante, porém não determinante, nas mudanças observadas no registro
arqueológico quanto à escolha do local de levantamento dos sítios. A preferência por
assentamentos próximos às margens lagunares, fonte de recursos protéicos e matéria
prima construtiva, foi constante durante os quase 6000 anos de ocupação da área. Para
entender detalhadamente a relação entre evolução geológica e ocupação humana
apresenta-se, nos tópicos a seguir, o modelo de evolução holocênica da área de estudo e
as quatro fases de ocupação humana, identificadas a partir da datações de topo e base de
48 sambaquis da região.
2.1. EVOLUÇÃO HOLOCÊNICA DO LITORAL A área de estudo deste trabalho abrange parte dos municípios de Laguna e
Jaguaruna. Esta faixa do litoral centro-sul catarinense, no trecho que vai desde
Jaguaruna até Garopaba, apresenta quatro grandes sistemas deposicionais quaternários
definidos por Giannini (1993, 2002) como: lagunar, barra-barreira, planície costeira e
eólico 47 (Figura 3.2). O sistema lagunar holocênico envolve as lagunas Mirim, Imaruí,
Santo Antônio, Santa Marta, Camacho e Garopaba do Sul, todas intercomunicáveis
entre si e com o mar, assim como um conjunto de lagos residuais de antigas lagunas.
Este sistema foi produto da ação de dois processos mais ou menos simultâneos,
resultantes das mudanças no NRM, cujo máximo na região data de mais de 5700 anos
AP (Angulo et al., 1999, 2006). Estes processos consistem no crescimento de uma
barreira arenosa, com isolamento parcial dos corpos de água à retaguarda, e no
afogamento de vales de dissecação previamente escavados em terraços marinhos
47
Segundo (Hesp et al., 2009), existiriam apenas dois sistemas deposicionais holocênicos na região:
planícies de cordões; e barreiras holocênicas que inclui tanto ás lagunas como os depósitos eólicos. No
entanto, Tanaka et al. (Tanaka et al., 2009) ressaltam que lagunas e depósitos eólicos não estão
exclusivamente relacionados ao sistema barreira e seriam, portanto, sistemas deposicionais
independentes.
79 pleistocênicos. Tal distinção permite a diferenciação entre dois tipos de associações de
fácies lagunares, a “baía-laguna” (Santa Marta, Camacho e Garopaba do Sul) e a “valelaguna” (Garopaba, Ibiraquera, Mirim e Imaruí), respectivamente (Giannini 1993,
2002).
A baía-laguna constitui a baía receptora principal do delta do rio Tubarão, o qual,
por volta de 5000 anos atrás, ingressou na antiga baía lagunar e ramificou-se em sete
distributários principais. A progradação do delta provocou a fragmentação da baía
lagunar em lagos e lagunas menores, em cujas margens ergueram-se grande parte dos
sambaquis que ainda se preservam na região (Nascimento, 2010). A porção vale-laguna
do sistema lagunar envolve as lagoas a norte da Passagem da Barra (Santo Antônio,
Imaruí e Mirim) e os atuais vales de inundação dos rios Sangão e Riachinho. O estudo
sedimentológico e micropaleontológico de amostras provenientes dos rios Sangão e
Riachinho indicam que a desconexão final da laguna com o oceano ocorreu entre ca.
2700-2300 anos AP (Amaral, 2008; Amaral et al., 2012).
O sistema barra-barreira (Giannini 1993, 2002), ou simplesmente barreira
(Giannini et al. 2007), com mais de 20 km de comprimento e até 2 km de largura,
constitui-se de sedimentos arenosos holocênicos depositados sob a ação das ondas, que
isolaram atrás de si o complexo de lagunas anteriormente mencionado. Este sistema
estende-se de Jaguaruna até Laguna. No sistema retrobarreria adjacente, foram
identificadas três fases evolutivas: fase 1, anterior ao máximo transgressivo holocênico,
com predomínio da dinâmica sedimentar marinha; fase 2, entre cerca de 5500 e 3000
anos AP, caracterizada pelo progressivo declínio do NRM, aporte sedimentar terrestre e
redução da influência das águas marinhas; e fase 3, de 3000 AP até o presente, com o
fechamento da desembocadura lagunar e formação de áreas de marismas e pântanos
sobre a margem da retrobarreira (Fornari, 2010).
O sistema planície costeira, que apresenta na região pelo menos duas gerações,
uma pleistocênica e outra holocênica, diferencia-se por não estar associado
geneticamente a corpos lagunares adjacentes e por poder apresentar alinhamentos de
cordões litorâneos (Giannini 1993, 2002). Exemplo disso são os cordões litorâneos que
ocorrem na planície do Ji, imediatamente a norte de Laguna (Giannini 1993, 2002;
Tanaka, 2010). Cordões regressivos ocorrem também dentro do sistema lagunar, na
região situada entre as desembocaduras das lagunas de Santa Marta e Santo Antônio,
local conhecido como planície de Campos Verdes (Giannini 1993). Estes cordões, de
80 posição transversal à atual linha de costa, representam o crescimento progradacional da
planície sentido NW. Este crescimento teria sido a partir do paleopontal lagunar situado
na margem NE da laguna de Santa Marta, pela ação de ondas na região de
paleodesembocadura lagunar (Tanaka, 2007, 2010; Tanaka et al., 2009).
O sistema eólico, o de maior extensão, superpõe-se aos sistemas barreira, planície
costeira e lagunar e divide-se em quatro gerações de depósitos eólicos denominadas
gerações 1, 2, 3 e 4, em ordem de idade decrescente. A geração eólica 1 é seguramente
pré-último máximo glacial e, pelo menos em parte, anterior a última máxima inundação
do Pleistoceno, a 2 é essencialmente anterior à máxima inundação holocênica, a 3 foi
formada quase inteiramente nos últimos três milênios e a 4 corresponde às dunas ativas
48
(Giannini, 1993, 2002; Giannini et al., 2007; Giannini & Suguio, 1994; Martinho,
2004; Sawakuchi, 2003).
O estudo polínico realizado por Amaral (2008) e Amaral et al. (2012) em
testemunhos coletados da região de Jaguaruna indicou que, pelo menos nos últimos
4000 anos, o clima era semelhante ao atual, sem registro de mudanças na vegetação.
Desde o Holoceno Médio-Tardío, a região apresenta vegetação aberta com predomínio
de Poaceae, do tipo característico de áreas de pântano e margem lagunar, e vegetação
arbórea/arbustiva de mata de restinga (Amaral, 2008; Amaral et al., 2012). Estudos
isotópicos na matéria orgânica em amostras de região, comparados com modelos
propostos para outras áreas do Estado de Santa Catarina (Cruz et al., 2006; Wang et al.,
2006), indicam a mudança de condições mais secas no começo do Holoceno, até
condições mais úmidas no Holoceno Médio, até o momento atual, com dois períodos
maiores de aumento da paleoprecipitação (Amaral, 2008; Amaral et al., 2012;
Nascimento, 2010).
48
Giannini et al. (2007, 2001) e Sawakuchi (2003) agruparam as gerações eólicas em duas seqüências
deposicionais: uma mais antiga (seqüência A) compreendendo a geração eólica 1, e outra mais recente
(seqüência B) abrangendo as gerações eólicas 2, 3 e 4. Este agrupamento é reforçado por datações pelo
método da luminescência (Sawakuchi, 2003; Giannini et al., 2007).
81 Figura 3.2. Sistemas deposicionais costeiros do litoral centro-sul de Santa Catarina, identificados por
Giannini (1993, 2002) (modificado de Giannini & Santos 1994).
2.2. FASES DE OCUPAÇÃO Segundo Giannini et al. (2010), os sambaquis do litoral sul de Sana Catarina
distribuem-se em dois compartimentos geográficos principais: 1) setor interno, ou
deltaico, associado às bordas e morros-testemunho do delta lagunar do rio Tubarão,
onde aparecem os sítios mais antigos; 2) e setor externo, ou litorâneo, associado aos
pontões costeiros e à barreira arenosa holocênica e respectiva margem lagunar
retrobarreira, onde aparecem os sítios associados à fase final da cultura sambaquieira.
Por sua vez, os sambaquis da área de estudo apresentam três padrões estratigráficos: 1)
padrão conchífero, formado por interestratificação de lâminas conchíferas centimétricas
a decimétricas e lâminas mais delgadas de sedimentos pretos; 2) sambaquis de núcleo
quarzto-arenoso, de formato monticular, maciço, coberto por camada decimétrca de
areia com conchas rica em matéria orgânica; 3) e montículos ictiológicos (sensu
Villagran et al. 2010), formados por misturas maciças ou mal estratificadas de areia com
ossos de peixe, carvão, conchas ocasionais e, em alguns casos, fragmentos cerâmicos
(Giannini et al. 2010). Estes sítios são agrupados na categoria sambaquis apesar de
82 serem, na realidade, sítios mistos, como aqueles descritos no Capítulo 2, tópicos 3.4 e
3.5.1.
Em termos gerais, os sambaquis mais antigos apresentam padrão estratigráfico de
tipo conchífero e localizam-se no setor interno, ou deltaico. Estes sítios são, atualmente,
os mais afastados da linha de costa. No setor externo, ou litorâneo, existe a maior
concentração de sítios, porém, estes são posteriores ao máximo transgressivo na região,
atingido há cerca de 5700 anos AP (Angulo et al., 1999, 2006). Os sambaquis de
núcleo arenoso e os montículos ictiológicos são exclusivos do setor externo, embora
contemporâneos, em muitos casos, a sambaquis de padrão estratigráfico conchífero do
setor interno.
No litoral sul de Santa Catarina 48 sambaquis foram datados por
14
C. Destes
sítios, 28 possuem apenas uma datação, enquanto os 20 restantes têm idades máximas,
tomadas de amostras localizadas próximas à base dos sítios, e idades mínimas, tomadas
do topo do montículo. Giannini et al. (2010) analisaram a distribuição de frequências de
sambaquis no litoral sul catarinense quanto à cronologia de início da deposição, usando
unicamente as idades máximas em sambaquis com mais de uma datação 49 . O
histograma da distribuição de freqüências de idades por sambaqui permitiu identificar
quatro marcos cronológicos importantes de formação de sambaquis, que definem, a
partir da correlação das idades com a configuração peleogeográfica da área de estudo,
quatro fases maiores de ocupação: Fase 1, de 7500 a 5500 anos cal AP; Fase 2, de 5500
a 4000 anos cal AP; Fase 3, de 4000 a 1700 anos cal AP; e Fase 4, de 1700 anos cal AP
até o presente (Figura 3.3).
Na Fase 1 (7500-5500 anos cal AP), que inclui os sítios mais antigos, anteriores e
contemporâneos ao máximo transgressivo, a região estava coberta de água na forma de
uma paleobaía cujo limite alcançava a encosta da serra que bordeja o atual delta do rio
Tubarão. No pé da serra e a poucos metros da paleolinha de costa, localizavam-se os
primeiros sambaquis de padrão estratigráfico conchífero, assim como em morros
testemunhos do embasamento pré-cenozoico em meio à paleobaía. Existe um único sítio
com núcleo arenoso contemporâneo ao máximo transgressivo no setor externo, o sítio
Santa Marta 10, localizado sobre costão rochoso em campo de dunas eólicas. O
49
Todas datações 14C foram calibradas para variação isotópica do carbono atmosférico ao longo do tempo
no Hemisfério Sul pelo programa CALIB 6.0 (Stuiver and Reimer, 1993), com protocolo SHCal04
(McCormac et al., 2004). As 42 datações realizadas em conchas carbonáticas foram calibradas para
correção do efeito reservatório com uso do protocolo Marine 04 (Hughen et al., 2004).
83 isolamento deste sítio, sem conexão emersa com o continente, como também acontece
com sítios localizados em morros testemunhos em meio á paleobaía, evidencia a
existência de embarcações desde os registros mais antigos de ocupação humana.
Durante a Fase 2 (5500-4000 anos cal AP), posterior ao máximo transgressivo,
intensifica-se o levantamento de sambaquis, tanto conchíferos como de núcleo arenoso,
no setor externo. O assentamento humano no setor externo esteve favorecido pelo
surgimento de terrenos propícios para ocupação, a partir da formação da barreira
arenosa, de paleotômbolos à retaguarda dos costões rochosos e do campo de cordões
litorâneos da região de Campos Verdes. No setor interno, o assoreamento da região
produzido pela retirada das águas e descenso do NRM após 5700 anos AP, levou à
formação do sistema lagunar e provocou o deslocamento dos pontos escolhidos para
construção dos sambaquis até as margens da paleolaguna.
Na Fase 3 (4000-1700 anos cal AP), registra-se a o auge da ocupação
sambaquieira, com incremento notório da quantidade de sítios, principalmente de
padrão estratigráfico conchífero, mas também de sambaquis de núcleo arenoso. Nesta
fase, destaca-se o incremento na concentração de sítios nos arredores do morro das
Congonhas, no setor interno, e à retaguarda do Cabo de Santa Marta e região de
Campos Verdes, no setor externo.
Os últimos 1700 anos estão representados pela Fase 4, caracterizada pela
ocupação exclusiva do setor externo e pelo surgimento de sítios de padrão estratigráfico
de tipo montículo ictiológico, que inclui também a camada areno-lamosa preta do topo
do sambaqui Jabuticabeira 2. Este último momento de ocupação relaciona-se com a
suposta chegada dos grupos interioranos de tronco lingüístico Jê até o litoral, como
evidenciaria a presença de cerâmica Taquara/Itararé nos sítio Santa Marta 8, Galheta 4 e
Costão do Ilhote. No entanto, durante esta fase sítios de padrão conchífero ainda
permaneciam ativos, como indicam as datações mínimas dos sambaquis Cabeçuda,
Morrote e Caieira, assim como sítios de núcleo arenoso, como o sambaqui Lagoa dos
Bichos 2 e Santa Marta 5, todos estes no setor externo.
84 Figura 3.3. Fases de ocupação do litoral sul catarinense definidas por Giannini et al. (2010) em base em
um conjunto de 129 datações 14C de 48 sambaquis prospectados e datados pelo projeto Sambaquis e
Paisagem.
3. OS SAMBAQUIS ANALISADOS Os sambaquis do litoral sul de Santa Catarina escolhidos para este estudo foram
selecionados
seguindo
os
critérios
de
diversidade
estratigráfica,
contexto
geomorfológico de localização e diversidade cronológica propostos na classificação de
Giannini et al. (2010). Estes critérios apontaram abranger as quatro fases de ocupação
sambaquieira, assim como a diversidade de padrões estratigráficos e contextos
geomorfológicos de localização de sambaquis na região.
Foram selecionados oito sambaquis para este estudo. Do conjunto de sítios, dois
sambaquis representam a ocupação do setor interno e externo durante a Fase 1, os sítios
Caipora e Santa Marta 10, de padrão estratigráfico conchífero e núcleo arenoso,
respectivamente. Da Fase 2, foram analisados dois sambaquis, um no setor interno, o
sítio Morrinhos, e outro no setor externo, representado pela porção inferior do sambaqui
85 Jabuticabeira 1. Da Fase 3, escolheu-se um sítio no setor interno, o sambaqui
Cubículo1, e dois no setor externo, o sítio Carniça 3 e a porção superior de Jabuticabeira
1. A Fase 4, final da ocupação da área, esta representada pelos sítios Santa Marta 8 e
Galheta 4, ambos no setor externo (Figura 3.4). No Quadro 3.1, apresentam-se as
informações sobre coordenadas UTM, contexto geológico de localização e idade
calibrada dos oito sambaquis estudados.
86 Figura 3.4. Imagem de satélite com a localização e vista aérea dos oito sambaquis estudados: Caipora, Santa Marta 10, Morrinhos, Jabuticabeira 1, Cubículo 1, Carniça 3,
Santa Marta 8 e Galheta 4. A linha ponteada na imagem central indica a divisória entre os setor interno e externo segundo Giannini et al. (2010).
87 Quadro 3.1. Sambaquis do litoral sul de Santa Catarina estudados neste trabalho. As idades e setores de
loclaização foram tomados de Giannini et al. (2010).
Sítio
Setor
Contexto geológicogeomorfológico
Coord.
UTM
Fase
Idade 14C
Idade
calibrada 50
Caipora
Interno
Sobre embasamento
granitóide que
bordeja a oeste o
delta do rio Tubarão
685972/
6838795
1
7570-7320 /
6280-5950
anos cal. AP
Santa Marta 10
Externo
Sobre dunas de
geração eólica 2,
empoleiradas no
embasamento précenozóico
713010/
6834345
1
6590 ± 60
(Beta
234199);
5410 ± 60
(Beta
234198)
5240 ± 70
(Beta
248571)
Morrinhos
Interno
Na base da face norte
do morro das
Congonhas,
testemunho granítico
em meio ao delta do
rio Tubarão
698169/
6844181
2/3
4480 ± 60
(Beta
209714);
3230 ± 70
(Beta
209713)
5290-4860 /
3570-3220
anos cal. AP
Jabuticabeira 1
Externo
697334/
6837666
2/3
4185 ± 90
(Az10639);
2430 ± 125
(Az10642)
4850-4430 /
2750-2130
anos cal AP
Cubículo 1
Interno
689508/
6838876
3
3500 ± 50
(Beta
248575)
4078-3716 /
3845-3568
anos cal. AP
Carniça 3
Externo
Sobre morrote
testemunho na
paleobaía lagunar no
bairro da
Jabuticabeira
Em pé de encosta
coluvionar, no limite
oeste do delta do rio
Tubarão
Em paleopontal
lagunar na região de
Campos Verdes
714519/
6840380
3
3360 ± 50
(Beta
248567)
3810-3360
anos cal. AP
Santa Marta 8
Externo
No paleotômbolo à
retaguarda do Cabo
de Santa Marta
711563/
6835181
4
1710 ± 40
(Beta
253668)
1691-1416
anos cal. AP
Galheta 4
Externo
Sobre a ponta da
Galheta
716313/
6838045
4
980 ± 40
(Beta
211734)
927-763 anos
cal. AP
51
6180-5750
anos cal. AP
50
Calibração realizada a 2 sigma com programa CALIB 6.0 (Stuiver and Reimer, 1993) e protocolo
SHCal04 (McCormac et al., 2004) tomadas de Giannini et al. (2010).
51
A rigor, o sítio Jabuticabeira I pode pertencer igualmente ao setor interno, já que se encontra a vários
quilômetros da costa e sobre morro testemunho do embasamento cristalino. No entanto, foi colocado no
setor externo por estar localizado na margem sudoeste da laguna Garopaba do Sul.
88
3.1. CAIPORA O sítio Caipora foi escolhido por ser o sambaqui mais antigo da área de estudo,
datado de 7570-7320 anos cal. AP, na base, e 6280-5950 no topo. Pertencente à Fase 1
de ocupação 52 (7500-5500 anos cal AP), este sambaqui tem 25 m de cumprimento, 20
m de largura e 3 m de altura (Assunção 2010), está localizado no setor interno (Giannini
et al. 2010) sobre embasamento granitóide e possui boa visibilidade da planície
paleolagunar que se encontra ao norte e nordeste (Figura 3.5). Na época em que o sítio
era ativo, esta planície correspondia à grande paleobaía que caracterizava a região após
à máxima transgressão holocênica (Giannini 1993, 2002; Fornari 2010). A presença de
um forno de cal imediatamente ao lado do sítio, no seu contato com o depósito
paleolagunar, é indicador da exploração que o sambaqui sofreu no passado recente. Ao
mesmo tempo, o sítio é atravessado por uma pequena estrada, de uns 2 m de largura,
que desemboca próxima ao forno de cal anteriormente mencionado. Assim, parece
lógico pensar que nem sua forma e extensão, hoje, nem sua estratigrafia atual refletem
completamente a condição do sítio pós-abandono.
Na seção vertical estudada, localizada a nordeste do sítio, o sítio apresenta
constituição essencialmente conchífera, com fragmentos de rocha. Possui pelo menos
um sepultamento humano na base da seção. Análises faunísticas realizadas por Ferraz
(2010) mostram que, além do componente terrígeno (~25% do volume total), a
assembléia faunística deste sambaqui é dominada por Ostrea sp. (~42%), seguida de
Anomalocardia brasiliana (Gmelin, 1971) (~13%) e outros bivalves e gastrópodes, com
somente 0,4 % de ossos.
52
Os sambaquis da Fase 1, ocorrem sobre terrenos elevados, sobre o embasamento cristalino précenozoico ou sobre paleodunas eólicas de geração 1 ou 2, pré-máxima inundação holocênica (Giannini et
al. 2010).
89
3.2. SANTA MARTA 10 O sítio Santa Marta 10 é o mais antigo da região de Santa Marta e um dos mais
antigos da área de estudo. Do setor externo, é o único sítio que pertence à Fase 1 de
ocupação (5500-4000 anos cal AP), junto com o sítio Santa Marta 9 (Giannini et al.
2010). Apesar da sua antiguidade, trata-se de um sambaqui pequeno, com cerca de 10 m
de cumprimento, 10 m de largura e 0,2 m de altura (Assunçao, 2010).
Tanto sua forma como composição destoam das características gerais dos
sambaquis estudados neste trabalho. Nele se observa um bolsão de conchas que se
estende em forma de anel, datado em 6180-5750 anos cal. AP (Figura 3.5) inserido em
camada de areia lamosa preta sobre núcleo arenoso. No esquema tradicional, este sítio
teria sido definido como acampamento litorâneo (ver Capítulo 2, tópico 4.3).
Durante o período de formação do sítio, a ponta de Santa Marta estava isolada,
sem comunicação permanente com o continente, o que sugere a chegada dos
sambaquieiros até o local com ajuda de embarcações (Kneip 2004; Giannini et al.
2010). O sítio localiza-se sobre paleodunas de geração eólica 2, empoleiradas no
embasamento pré-cenozóico (Giannini 1993, Giannini et al. 2007). Na área de
implantação, observaram-se afloramentos de paleodunas da geração eólica 1 (compactas
e vermelhas), 2 (acima da geração 1, com bandas de impregnação e coloração amarela
cinzenta) e 3 (amarelas, com bandas de impregnação muito tênues) (Giannini 1993;
Giannini et al. 2007; Martinho & Giannini 2001a, 2001b; Sawakuchi 2003).
Assunção (2010) identificou nas proximidades do sambaqui Santa Marta 10,
assim como nos sambaquis Santa Marta 1, 3 e 9, um extenso sítio lítico a céu aberto,
denominado Morro do Céu. Este sítio contém artefatos líticos lascados e polidos em
quartzo, quartzito, granito, arenito e basalto, que são constantemente soterrados e
descobertos pelo processo de deflação eólica. Uma situação semelhante foi observada
no sítio Lagoa dos Bichos 2 (Peixoto, 2008) onde se acharam artefatos líticos dispersos
ao redor do sambaqui 53 .
53
O intenso desgaste relatado em artefatos recuperados destes contextos (Assunçao, 2010; Peixoto, 2008)
pode ser em parte resposta à erosão eólica (Rick, 2002), o que dificulta a análise funcional efetuada
macroscopicamente.
90
Figura 3.5. Vista do entorno de localização do sítio Caipora (superior esquerda), desde o topo do sítio, em
primeiro plano, até a planície lagunar, ao fundo, com seção vertical analisada (superior direita), de direção
NW-SE. Sítio Santa Marta 10, em contexto de paleodunas eólicas das gerações 1, 2 e 3 (inferior
esquerda) e vista da seção analisada, de sul a norte, com área de escavação do anel de conchas (inferior
direita).
91
Figura 3.6. Vista do entorno de localização do sítio Morrinhos (superior esquerda), com trincheira
trabalhada à direita da foto e seção estudada (superior direita), de direção N-S. Seção inferior de
Jabuticabeira (inferior esquerda), de norte a sul, e seção estudada no nível superior (inferior direita), de
direção SE-NW.
92
3.3. MORRINHOS O sítio Morrinhos, datado entre 5290-4860 anos cal. AP, na base, e 3570-3220
anos cal. AP, no topo atual, pertence às Fases 2 e 3 de ocupação da área de estudo
(5500-4000 anos cal AP e 4000-1700 anos cal AP, respectivamente), momento em que
se observa o deslocamento da distribuição dos sítios em direção ao sistema lagunar 54
(Giannini et al. 2010; Kneip 2004).
Trata-se de um sambaqui de 130 m de cumprimento, 100 m de largura e 10 m de
altura (Assunção 2010) localizado na face norte do morro das Congonhas, no setor
interno ou deltaico (Giannini et al. 2010). Este sítio conta com seção de
aproximadamente 20 m, acompanhando a borda do testemunho cristalino, previamente
exposta para finalidades de exploração mineral. No local escolhido para estudo, a seção
está composta por quatro grandes degraus de 80, 65, 100 e 100 cm de altura e
aproximadamente 1 m de largura (Figura 3.6). No total, a seção trabalhada tem 3,45 m
de altura, mas o seu ponto mais alto não alcança o topo atual do sambaqui, que se
encontra a aproximadamente 1 m acima da superfície do último degrau.
A cobertura vegetal no topo do sambaqui é de floresta densa, como a que
caracteriza a totalidade do morro das Congonhas. Um solo profundo desenvolve-se na
superfície do sítio. Sua estratigrafia é essencialmente conchífera, monótona e repetitiva,
apesar da grande altura do depósito.
54
A ocupação do setor externo, sobre substrato do sistema barreira e lagunar, intensifica-se na fase 2
(5500-4000 anos cal AP) (Giannini et al. 2010).
93
3.4. JABUTICABEIRA 1 O sítio Jabuticabeira 1, datado entre 4850-4430 anos cal. AP, na base, e 27502130 anos cal AP, próximo ao topo atual, encontra-se parcialmente assentado sobre
morrote testemunho do embasamento cristalino na paleobaía lagunar, e sobre
paleodunas da geração 2. Apresenta 400 m de cumprimento, 150 m de largura e 7 m de
altura (Assunção 2010). Este sambaqui localiza-se no limite entee os setores interno e
externo e sua deposição abrange tanto a fase 2 (5500-4000 anos cal AP) como a fase 3
(4000-1700) de ocupação da região. A fase 3 é identificada como momento de auge dos
sambaquis de padrão estratigráfico conchífero (Giannini et al. 2010).
A formação deste sambaqui precede ao sítio mais conhecido da região, o
Jabuticabeira 2. Durante o inicio da ocupação do local, o sítio encontrava-se localizado
sobre um istmo arenoso fixado no morrote testemunho. Os dois sambaquis de
Jabuticabeira foram contemporâneos por mais de mil anos, sendo o Jabuticabeira 1
abandonado quando a margem da paleobaía lagunar ainda se encontrava próxima.
Porém, pelos mesmos motivos explicados para os sítios descritos anteriormente, a
intensa exploração sofrida impede considerar a sua data mínima disponível como
indicador do momento final de ocupação. Conforme Bocchi & Liberatore (1968), na
década de 1960 este sambaqui tinha 15 m de altura e estava em franca exploração
clandestina pelos proprietários do terreno. Ainda de acordo com esses autores, até
aquela data 50% do volume original do sítio já haviam sido explorados. Segundo Rohr
(1984), em 1983 restavam apenas 5% do volume total do sambaqui. Atualmente, ao
sudeste do sítio, existe uma plantação de milho que atinge parte da área ocupada pelo
sambaqui, sinal de que ele continua sendo alterado.
Duas seções foram estudadas (Figura 3.6), uma delas numa trincheira inferior no
centro do sítio, cuja base atinge o contato com o granito subjacente, e a outra numa
trincheira superior a oeste, a poucos metros da anterior. O topo desta seção, a julgar pela
grande compactação e fragmentação dos componentes, parece tratar-se de resíduo de
moinha. A seção superior está totalmente concrecionada e não alcança a superfície atual
do sítio, que se encontra a aproximadamente 1 m do topo do perfil. Em ambos as
seções, a interdigitação de lentes na estratigrafia permite inferir a constituição do sítio
por grandes montículos que se desenvolvem de maneira sincrônica e, muitas vezes,
superposta.
94
Análises faunísticas efetuadas por Ferraz (2010) nas mesmas seções que serão
trabalhadas neste estudo mostraram o predomínio de Anomalocardia brasiliana (~66%),
seguido de Ostrea sp (~20%), Thais haemastoma (~5%), mariscos (~4%) e ossos de
peixe (~1,5%). Pelo menos dois sepultamentos humanos foram encontrados por mesmo
autor nas seções verticais analisadas, um deles próximo à base da trincheira inferior e
outro a cerca de 50 cm acima da base da trincheira superior. No entanto, descrições de
Bocchi & Liberatore (1968) confirmam a existência de maior número de sepultamentos
no sítio, assim como de estruturas de combustão e diversos artefatos líticos (machados,
pontas de flecha).
3.5. CUBÍCULO 1 O sítio Cubículo 1 localiza-se a nordeste do sítio Caipora, em pé da encosta
coluvionar do Ilhote do Cubículo, também no setor interno (Giannini et al. 2010).
Destaca pela sua grande extensão atual, com 550 m de cumprimento, 150 m de largura e
8 m de altura (Assunção 2010). Amostras coletadas da base e do topo do sambaqui
indicam deposição rápida, que teria começado cerca de 3800 anos cal. AP e finalizado
há aproximadamente 3600 anos cal. AP. O sítio Cubículo 1 pertence à fase 3 de
ocupação 55 (4000-1700 anos cal AP) (Giannini et al. 2010). No entanto, este sítio
também mostra claras evidências de exploração e alteração modernas. Ele encontra-se
atravessado por duas estradas, que o dividem em quatro porções; além disso, uma
plantação de milho existe a sudoeste e uma grande cratera foi aberta próximo a atual
porção central do sítio, onde se localiza o corte estudado. Estas alterações são
indicadores indiscutíveis da devastação que ainda sofre o sambaqui. Portanto, a curta
cronologia disponível entre as amostras de base e topo não é necessariamente
representativa do tempo total de formação do sítio.
A seção estudada, localizada na parte norte do sambaqui, permite observar a
geometria monticular das camadas conchíferas que o compõem (Figura 3.7). Neste sítio,
a exemplo do sambaqui Caipora, destaca-se a alta concentração de valvas de Ostrea sp.,
55
Nesta fase, observa-se uma tendência de deslocamento dos pólos de ocupação tanto no setor interno
quanto externo. No setor interno, aumenta a ocupação nas imediações do morro das Congonhas e, no
setor externo, tem-se incremento da ocupação no centro e nordeste da franja litorânea.
95
com menor freqüência de Anomalocardia brasiliana. As camadas são pouco compactas
e altamente friáveis, com concentração de sepultamentos humanos visível nas seções. A
sua proximidade com a atual planície paleolagunar, e a idade máxima disponível
indicam que, desde o início, o sítio teria estado próximo à beira da baía-laguna.
3.6. CARNIÇA 3 O sítio Carniça 3, com 40 m de cumprimento, 30 m de largura e 5 m de altura
(Assunção 2010) possui uma única datação, de 3810-3360 anos cal. AP, proveniente de
amostra de Anomalocardia brasiliana coletada no topo. Trata-se de típico sambaqui do
setor externo, localizado em paleopontal lagunar (Figura 3.7) e pertencente à fase 3 de
ocupação (4000-1700 anos cal AP), momento em que já estava em formação a planície
de cordões litorâneos da região de Campos Verdes (Tanaka et al. 2009; Giannini et al.
2010). A planície de Campos Verdes está formada por feixes de cordões litorâneos,
dispostos de maneira transversal à costa atual superpostos, em parte, por paleodunas de
geração 3 (posteriores à máxima inundação holocênica). A SW, limita-se por uma faixa
arenosa correspondente a um paleopontal cuja presença favoreceu o acumulo
sedimentar e formação dos cordões (Giannini 1993; Tanaka 2007; Tanaka et al. 2009).
Sobre o paleopontal, encontram-se localizados quatro sambaquis (Carniça 1, 2, 3 e 4)
(Hurt 1974), enquanto nos cordões encontram-se outros três (Carniça 5, 6 e 7)
(Assunçao, 2010).
Sua estratigrafia relativamente simples, composta por camada lamosa preta com
conchas sobre núcleo arenoso, é característica comum a vários dos sítios da região de
Campos Verdes e Santa Marta, assim como ao Encantada 3, localizado a sudeste da
margem atual da laguna Garopaba do Sul. Segundo Rohr (1984), em 1975 o sítio ainda
encontrava-se intacto, apesar de estar localizado próximo às caieiras. A altura atual do
sambaqui possui uma diferença de apenas 1 m em relação à suas dimensões relatadas
por Rohr (1984) para a década de 1970. Este sítio salvou-se da exploração intensiva
pelo seu escasso valor econômico, relacionado com a alta quantidade de areia misturada
com as conchas.
96
Tanaka (2007) e Tanaka et al. (2009) ressaltam que tanto a ausência de estruturas
sedimentares internas indicativas de deposição eólica na porção arenosa, quanto a forma
e altura do depósito, incompatíveis com as de dunas eólicas existentes na região,
sugerem origem antrópica para o núcleo arenoso deste sambaqui. As areias utilizadas
para levantamento do montículo teriam sido coletadas de sedimentos de cordões
litorâneos e/ou depósitos eólicos próximos, como constatado por Tanaka (2007) e
Tanaka et al. (2009) a partir de análises granulométricas comparação. Quanto à matéria
orgânica que compõe a camada lamosa superior, análises isotópicas de δ13C e razão C/N
realizadas por Menezes (2009) mostraram uma possível relação genética com a matéria
orgânica dos depósitos lagunares da região.
Figura 3.7. Vista do entorno de localização do sítio Cubículo (superior esquerda), vendo-se o sambaqui na
direita da foto e a planície lagunar na esquerda, com seção vertical analisada (superior direita), de direção
S-N. Vista do sítio Carniça 3 (inferior esquerda) e seção estudada, com bloco amostrado para
micromorfologia (inferior direita), de direção NE-SW.
97
Figura 3.8. Vista da região de Santa Marta, a partir do sítio Santa Marta 8, com vista do sítio coberto por
vegetação densa. Vista da Ponta da Galheta a partir da praia da Galheta, setor norte, com indicação da
localização do sítio Galheta 4 (flecha amarela) e seção estudada, de direção NW-SE.
98
3.7. SANTA MARTA 8 O sítio Santa Marta 8 encontra-se localizado no paleotômbolo à retaguarda da
ponta de Santa Marta, a aproximadamente 820 m da atual margem da laguna de
Camacho. Foi caracterizado pelos pesquisadores do projeto Sambaquis e Paisagem
como sítio Jê, devido à presença de cerâmica de tradição Taquara/Itararé, tanto em
superfície como em subsuperfície. Uma única idade é disponível para este sítio, que
corresponde a um sepultamento humano próximo à base, datado em 1691-1416 anos
cal. AP. Trata-se de um sítio misto, como definido no Capítulo 2, tópico 3.4.1, e que
possui a datação mais antiga da região dentre os associados à presença dos grupos do
planalto. Sua idade e padrão estratigráfico permitiram definir o início da última fase de
ocupação da área de estudo, a fase 4 (1700-0 anos cal AP), caracterizada pela aparição
de sítios unicamente no setor externo (Giannini et al. 2010).
A composição do sítio Santa Marta 8, à base de ossos de peixe, areias terrígenas e
carvão, lembra a camada preta superior que caracteriza o sítio Jabuticabeira 2 (Villagran
2008). A única diferença reside na ausência da intercalação entre camadas de materiais
completamente queimados e camadas de restos intemperizados, observada no
Jabuticabeira 2. No Santa Marta 8, estes materiais parecem estar mais intensamente
misturados, sem acamamento diferencial. Na área de localização do sítio, no
paleotômbolo à retaguarda da ponta de Santa Marta (Figura 3.8), foram mapeados mais
três sambaquis de padrão estratigráfico conchífero e núcleo arenoso, facilmente visíveis
deste local (Santa Marta 5, 6 e 7).
Segundo Assunção (2010), parte deste sítio teria sido explorada para construção
de uma estrada que se encontra atualmente em desuso, por ter sido coberta pela
sedimentação eólica.
99
3.8. GALHETA 4 O sítio Galheta 4 localiza-se na ponta da Galheta, setor externo, entre os
sambaquis Galheta 1 e 2. Apresenta 30 m de cumprimento, 30 m de largura e 10 m de
altura (Assunçao, 2010). É atribuído à ocupação Jê, em vista da presença de cerâmica
de tradição Taquara/Itararé e de corpos com marcas de queima, associada à prática da
cremação (DeBlasis & Farias, 2007). Não seria um sambaqui, propriamente dito, mas
um sítio misto (ver Capítulo 2, tópico 3.4.1). Pertence à fase 4 de ocupação segundo
Giannini et al. (2010) e representa, dentro da linha cronológica estudada nesta tese, o
momento final da ocupação pré-colonial da costa (Figura 3.8).
Foram recuperados durante as escavações neste sítio nove sepultamentos
humanos, um dos quais foi datado em 927-763 anos cal. AP. Três destes nove
sepultamentos encontraram-se nas proximidades da seção vertical estudada: dois a
aproximadamente 1,5 m de distância a noroeste da seção e um cerca de 3 m a sudeste.
Todos os sepultamentos apareceram em camada de areia lamosa preta, localizada a
partir de 40-50 cm de profundidade, com 20-30 cm de espessura.
Na escavação do sítio, observaram-se também grandes concentrações de fauna
associada aos sepultamentos (peixes, aves, moluscos e mamíferos marinhos e
terrestres), assim como artefatos líticos (polido e lascado) e ósseos (em osso de ave),
além de fragmentos cerâmicos. Artefatos líticos polidos foram encontrados igualmente
em áreas distantes dos sepultamentos, a profundidades de 30 até 60 cm (DeBlasis &
Farias, 2007).
Segundo DeBlasis & Farias (2007), a função do sítio teria sido essencialmente
cerimonial, relacionada com a celebração de rituais funerários e festins, com fogueiras
acesas nas proximidades dos enterramentos e deposição massiva de fauna
(freqüentemente articulada) sobre os corpos. Com base nas datações disponíveis para os
sambaquis e sítios de associação Jê que se encontraram na ponta da Galheta, Assunção
(2010) propõe que o local seria um complexo arqueológico de ocupação recorrente
durante milhares de anos. O autor interpreta que a escolha de implantação de cemitérios
em área elevada e de grande visibilidade, com baixo potencial como local de residência
dada a grande distância a fontes de água doce, responde a motivos simbólicos. Seguindo
100
esse raciocínio, postula que a implantação em tempos tardios de um cemitério Jê, fora
dos sambaquis que já existiam no local, representaria uma estratégia de domínio
territorial dos novos grupos que se instalaram na região.
4. CASO DE ESTUDO COMPARATIVO Com o objetivo de comparar as análises realizadas em sambaquis com concheiros
que estivessem etnograficamente documentados na América do Sul, escolheu-se um
concheiro submoderno localizado no litoral norte do Canal Beagle (Terra do Fogo,
Argentina). Este concheiro etno-histórico foi adstrito aos grupos yamana (Orquera &
Piana, 1996a; Orquera & Piana, 1999a; Estevez & Vila, 2006; Estevez et al., 2001),
canoeiros de recente desaparição na região (entre os séculos XVIII-XIX).
A associação do concheiro com um grupo conhecido, a partir das crônicas e
relatos etnográficos, transforma o sítio em objeto de estudo etnoarqueológico. Esta
associação permite que as informações registradas nas crônicas, coletadas a partir da
observação direta destas sociedades então ativas, possam ser contrastadas e
complementadas com os dados recuperados na escavação arqueológica.
101
Figura 3.9. Concheiros etno-históricos da Terra do Fogo: A) Mapa de localização da área de estudo, no
litoral norte do Canal Beagle. B) Vista do Canal Beagle, a partir da escavação do concheiro Túnel 7. C)
Vista do sítio Túnel 7 durante o outono. D) Concheiro Túnel 7 observado desde a morena glacial sobre o
qual acha-se parcialmente assentado, de oeste para leste. E) Escavação no concheiro Lanashuaia,
localizado embaixo da estrutura branca de cobertura. F) Depressões no terreno, indicativas da localização
de antigos concheiros na Baía Cambaceres (B, D, E e F: fotografias de Jordi Estevez e Assumpció Vila;
C: fotografia de Myrian Alvarez).
102
4.1. EVOLUÇÃO HOLOCÊNICA DO CANAL BEAGLE O Canal Beagle (Terra do Fogo, Argentina) tem aproximadamente 200 km de
comprimento e divide a ilha Grande de Terra do Fogo, ao norte, da ilha Navarino e ilhas
menores, ao sul. Consiste num vale glacial afogado que une o oceano Atlântico com o
Pacífico. A costa do canal é rochosa e caracteriza-se pela presença de pequenas baías
com praias de seixos (Rabassa et al., 2000).
Após o final das glaciações pleistocênicas, no Holoceno inicial (há 9.4 kA), um
grande lago glacial ocupava o Canal Beagle, cujas águas alcançaram os 30 m sobre o
atual nível do mar. Pouco antes dos 8.2 kA o canal se abriu e, progressivamente, as
águas marinhas passaram a substituir as lacustres. Por volta de 8 kA, o ambiente
marinho já tinha se estabelecido completamente no canal (Rabassa et al., 1986) (Figura
3.10).
No litoral norte do Canal Beagle, existe um sistema de paleopraias suspensas, ou
terraços marinhos do Holoceno, que se estendem sub-paralelamente à atual linha de
costa. A mais antiga destas paleopraias, datada em ca. 6000 anos AP, localiza-se a 10 m
acima do nível do mar atual, enquanto a mais recente (posterior a 3000 anos AP) possui
cota de 1,3 a 3 m. A variação do NRM responsável pela formação destes terraços teria
envolvido tanto soerguimento tectônico, para os terraços mais recentes, como reajuste
glácio-isostático, para os mais antigos (Bujalesky et al., 2004; Gordillo et al., 1992,
1993; Isla and Bujalesky, 2000; Rabassa et al., 2000).
A cronologia e a magnitude da máxima transgressão marinha holocênica no Canal
Beagle ainda é tema de discussão. Segundo Porter et al. (1984), o máximo NRM na
Terra do Fogo teria alcançado 3,5 m cerca de 7000 anos AP. Morner (1987, 1991)
indica que o nível máximo do mar teria sido apenas 0,5 a 1,0 m mais alto entre 9000 e
4000 anos AP, enquanto Rabassa et al. (2000) mencionam evidências de alturas
máximas de 8 m a 12 m em 6000 anos AP.
Gordillo et al. (1992, 1993) indicaram que a diminuição do NRM desde o
Holoceno Médio é concomitante à estabilidade na permanência da floresta de
Nothofagus sp. e do clima frio e úmido, com pequenas variações relacionadas a eventos
de avanço e retrocesso neoglaciais (Candel et al., 2009; Coronato et al., 1999; Markgraf,
1993).
103
Figura 3.10. Sul da Patagônia e Terra do Fogo, com localização dos campos de gelo modernos, seus
limites máximos de extensão durante o último máximo glacial (UMG, 20 kA) e o alcance das morenas no
final do período glacial (Pleistoceno tardio). Adaptado de Coronato et al. (1999: 79) e McCulloch et al.
(2005: 358).
4.2. O CONCHEIRO TÚNEL 7 O sítio Túnel 7 esta localizado no litoral norte do Canal Beagle, a 20 km da cidade
de Ushuaia (capital da Terra do Fogo), no sopé de uma morena glacial de forma
semilunar sobre a praia de seixos (Figura 3.11 A, C). De formato anelar, com 30-60 cm
de altura, o concheiro representa o remanente de uma ocupação doméstica, com 100 a
200 anos de antiguidade (Estevez et al. 2006). Este sítio foi escavado e estudado desde a
década de 1990 sob uma perspectiva que enfatiza a organização espacial das atividades
associadas com sua formação (Balbo et al., 2010; Briz et al., 2005; Estevez et al., 2001;
Estevez & Vila, 1998, 2006, 2007; Orquera, 1996; Orquera & Piana, 1992, 1996a,
1996b, 1999, 2000, 2001; Piqué, 1999, 2006; Vila et al., 2010, 2007, 2004; Zurro et al.,
2009) (Figura 3.11 B). No Quadro 3.2, apresentam-se as coordenadas UTM, contexto
geológico de localização e idade calibrada do concheiro Túnel 7.
104
Quadro 3.2. Informações sobre contexto geológico-geomorfológico, coordenadas UTM e cronologia do
concheiro etno-histórico Túnel 7 estudado neste trabalho.
Localização
Contexto geológico-geomorfológico
Canal
Beagle
Sobre praia de seixos no pé de morena glacial a
poucos metros da atual linha de costa
Coordenadas
UTM
554388/
3924868
Cronologia
1835-1898 anos
DC
A área escavada do concheiro, localizado na porção mais próxima da praia atual,
ofereceu data histórica por dendrocronologia. Adjacente à área escavada, existe uma
concheiro mais antigo, datado em ca. 2000 e 1300 anos AP, que apoia também sobre
terraço marinho mais elevado (Piana & Orquea 1996). Nesta tese, refere-se
especificamente a seção vertical na área central do componente moderno do sítio, onde
se focalizaram os trabalhos de escavação.
O método de escavação utilizado envolveu a retirada cuidadosa de cada unidade
estratigráfica identificada, tanto em planta como em seção vertical, sem uso de níveis de
escavação artificiais (a cada 5 cm , por exemplo). O objetivo deste método foi coletar a
maior quantidade de informação possível da escavação do sítio 56 já que, em concheiros,
as unidades de deposição estão em tese bem preservadas, sempre que não tiverem sido
objeto de processos pós-deposicionais maiores, como bioturbações por mesofauna ou
escavação moderna da estrutura, entre outros (Orquera & Piana 1992, 1996b).
A estratigrafia do sítio caracteriza-se por apresentar interestratificação de
lâminas conchíferas centimétricas e lâminas delgadas de sedimentos pretos e areias.
Como descrito nas crônicas etnográficas, na área central encontrou-se a estrutura
remanente de uma cabana de moradia, identificada por marcas de poste e pelo “efeito
parede” na distribuição dos artefatos. A análise de superposição de estruturas de
combustão evidenciou a existência de, pelo menos, dez ocupações sucessivas neste local
(Estevez & Vila 2006). As estruturas de combustão correspondem aos momentos de
ocupação do sítio, nos quais sempre era mantida uma fogueira central junto com
fogueiras secundárias na periferia, e às vezes fora, da cabana. As lâminas centimétricas
de sedimentos finos e pretos que geralmente recobrem as estruturas de combustão,
56
Segundo este modelo, unidades discretas de deposição podem identificar-se em sítios concheiros
através da percepção, na escavação, de superfícies de diferente resistência estrutural (sedimentos mais ou
menos fáceis de retirar durante a escavação por decapagem) e finas lentes de sedimento terrígeno preto
entre as camadas.
105
foram tomadas como evidência de abandono do local, que se daria após visitas
temporais ao sítio (Estevez & Vila 2006).
A recorrência do uso do local foi responsável pela formação do anel de conchas
circundante, pela ação de descarte e varrido de resíduos alimentícios fora da cabana. Em
cada visita ao sítio, construíram-se cabanas praticamente sobre o mesmo lugar,
aproveitando a concavidade deixada pela acumulação anelar de conchas (Estevez &
Vila 2006). Segundo Verdún (2006, 2010), existia uma intencionalidade na deposição
das conchas ao redor da cabana, relacionada com a vontade de construir uma estrutura
de proteção.
Figura 3.11. Concheiro Túnel 7: A) Vista do sítio, com área escavada embaixo da estrutura de cobertura
branca. B) Escavação do concheiro, com localização das duas colunas de amostragem no anel de conchas
e delimitação da área central de coupação (linha ponteada). C) Topografia segundo Orquera & Piana
(1995). Na topografia, as quadras delimitam a área do sítio escavado. Quadras I a IV correspondem ao
componente moderno, e VII a XI, ao componente antigo.
106
3. SUMÁRIO Neste capítulo, apresentou-se a área de estudo desta tese, no litoral sul catarinense,
junto com a proposta de Giannini et al. (2010) sobre as quatro fases de ocupação
sambaquieira da região e as informações introdutórias sobre os oito sambaquis
escolhidos para análise. Apresentou-se, também, a área de estudo no litoral do Canal
Beagle (Terra do Fogo), com breve revisão da evolução holocênica do canal e descrição
do concheiro etno-histórico que será usado como estudo de caso comparativo.
Das informações aqui apresentadas sobre sambaquis de Santa Catarina extraem-se
algumas das problemáticas que serão exploradas neste trabalho. Estas temáticas
incluem: a relação entre o processo de formação dos sambaquis e a paleogeografia do
local de implantação dos sítios, com uso dos sedimentos arqueológicos como registro
das mudanças paleoambientais; o significado da mudança deposicional possivelmente
associada à chegada dos grupos Jê ao litoral, e caracterizada pelo aparecimento de sítios
mistos e ictio-montículos (sensu Villagran et al., 2010); a função dos sambaquis de
menores dimensões e com estratigrafia caracterizada por núcleo arenoso e camada
superficial preta, que frequentemente aparecem como estruturas satélite dos sambaquis
maiores (ver Assunçao, 2010; Peixoto, 2008); o detalhamento da sucessão de atividades
associadas à formação dos sítios; os indicadores sobre proveniência do material
construtivo que corroborem o uso de conchas como matéria prima para a elevação das
estruturas, como demonstrado por Figuti (1992), e não unicamente como elemento
alimentício; e a tafonomia de sambaquis em clima subtropical úmido. No caso do
concheiro fueguino, do qual se possui um controle maior sobre a dinâmica cultural
envolvida na sua configuração, as temáticas de interesse incluem, entre outras:
detalhamento da análise intra-sítio, com identificação, a partir do registro
arqueossedimentar, de áreas de atividade dentro do espaço delimitado pelo concheiro;
correlação entre os relatos etnográficos e o registro arqueossedimentar, para elaboração
de modelos geoarqueológicos que permitam interpretações comportamentais em
contextos onde não há disponibilidade de relatos etnográficos; tafonomia de concheiros
em climas frios.
107
CAPÍTULO 4: MATERIAIS E MÉTODOS A proposta metodológica deste trabalho é essencialmente estratigráfica, ou seja,
visa entender os processos de formação dos sambaquis, a partir da avaliação das
sucessões verticais em seções expostas. Tanto nos sambaquis catarinenses como no
concheiro fueguino utilizado como estudo de caso comparativo, o método de análise e
interpretação que será aplicado, incluindo etapas de campo e de laboratório, será a
análise de fácies arqueológicas, ou arqueofácies, desenvolvida por Villagran (2008,
2010) e Villagran et al. (2009a). Este método foi elaborado com base em propostas de
Orquera & Piana (1992), Stein (1992) e Courty (2001).
1. ANÁLISE DE FÁCIES E MICROFÁCIES ARQUEOLÓGICAS A análise de fácies arqueológicas é um método de estudo estratigráfico que
contempla tanto a descrição como a interpretação das sucessões verticais em sítios onde
existe recorrência tempo-espacial de unidades arqueológicas. Este método representa
uma adaptação da análise de fácies desenvolvida na sedimentologia moderna (Anderton,
1985; Walker, 1983) e foi inspirado nas propostas de Stein (1992) e Courty (2001) na
arqueologia. O objetivo é estudar os processos de formação, culturais e naturais, em
depósitos arqueológicos estratificados.
1.1. FUNDAMENTOS DA ANÁLISE DE ARQUEOFÁCIES A análise de arqueofácies foi desenhada para aplicação em depósitos
arqueológicos construídos, como concheiros ou montículos de terra. Estes depósitos são
108
resultado do trabalho humano de acumulação e/ou transporte e deposição massiva de
partículas, naturais e artefatuais, em local específico. Na formação de concheiros
estratificados, existe um padrão de processos deposicionais recorrentes, relativos à
deposição antrópica de materiais. Esses processos são definidos como processos
deposicionais antrópicos que, dentro da dinâmica construtiva de cada sítio, podem
repetir-se no tempo e no espaço, dentro do mesmo sítio ou entre sítios diferentes da
região. Os produtos sedimentares desses processos são definidos como fácies
arqueológicas ou arqueofácies 57 . A fácies arqueológica é uma unidade sedimentar, não
confinada estratigraficamente, caracterizada por um conjunto de atributos deposicionais
que permitirão interpretar a atividade responsável pela sua formação.
A análise de arqueofácies é entendida como a descrição e classificação de uma
sucessão vertical ou perfil estratigráfico seguida da interpretação dos processos
antrópicos, ou sucessão de atividades de deposição. Esta análise permite a descrição
padronizada das sucessões verticais e auxilia no estabelecimento de relações entre as
diferentes arqueofácies identificadas. As características descritas e os atributos
estudados auxiliam na interpretação das atividades associadas à evolução (formação e
alteração) e/ou construção dos sítios. Deve-se lembrar que, apesar de ser realizada na
escala bidimensional, a partir das sucessões estratigráficas, a análise de arqueofácies
aponta à reconstrução tridimensional da dinâmica de formação e evolução dos sítios
construídos (ver Courty 2001).
57
O conceito de fácies arqueológica não é equiparável à camada ou unidade arqueológica definidas por
Harris (1991). A fácies arqueológica não possui valor necessariamente cronológico, nem meramente
descritivo, mas sim também interpretativo.
109
1.1.1. Descrição, caracterização e interpretação A análise de arqueofácies envolve quatro etapas fundamentais:
1. Descrição detalhada em campo das sucessões verticais segundo a identificação
de cinco atributos principais. Variações em qualquer um dos cinco atributos já
é requisito suficiente para distinguir entre fácies arqueológicas na sucessão
vertical:
• Composição da matriz (incluindo textura, cor e mineralogia).
• Componentes macroscópicos (grãos de areia, concha, ossos de peixe,
carvão, artefatos, enterramentos humanos etc. com estimativa visual de
porcentagem).
• Forma das fácies (natureza dos limites, se abruptos, graduais, difusos
etc., e espessura).
• Estruturas internas (estruturas de combustão, fossas, buracos de estaca,
lentes de areia, cinzas, carvão etc.).
• Orientação (fábrica ou tama) dos componentes macroscópicos na matriz.
2. Caracterização das arqueofácies através de análise, no laboratório, das suas
propriedades
físicas,
químicas,
isotópicas,
biológicas,
mineralógicas,
micromorfológicas etc.
3. Construção de modelos de arqueofácies, a partir da literatura disponível sobre
depósitos semelhantes, com a possibilidade de coleta de amostras
experimentais sobre feições antrópicas conhecidas (fogueiras, superfícies de
pisoteamento, áreas de preparação de alimentos etc.) e de comparaçãoes
interculturais.
4. Interpretação das arqueofácies em termos de processos deposicionais e pósdeposicionais, tanto naturais como antrópicos, e uso dos dados produzidos na
construção de explicações culturais e ambientais.
Apesar de não serem critérios utilizados na identificação de arqueofácies, outras
propriedades devem ser incluídas na descrição como, por exemplo: abundância e
espessura de raízes; presença de estruturas pedogênicas; consistência e compactação.
Estas propriedades referem-se à alteração dos sedimentos por processos pedológicos.
110
Sua consideração complementa o estudo da formação dos depósitos com informações
sobre sua alteração pós-abandono.
A identificação de arqueofácies em campo é sempre complementada com análises
no laboratório. Este aprofundamento na composição de cada arqueofácies permitirá
caracterizar completamente as semelhanças e diferenças entre elas. A partir do arranjo
espacial relativo de cada arqueofácies na sucessão vertical, pode-se identificar a
existência de uma ou mais associações de arqueofácies. Cada associação expressa a
mudança ou permanência de fácies arqueológicas em termos de atividades ou
comportamentos que podem corresponder a uma mesma atividade.
Na interpretação da composição e arranjo espacial das diferentes arqueofácies na
sucessão vertical, utiliza-se a comparação arqueológica intercultural, a arqueologia
experimental e análises de macro-vestígios. Este complemento é necessário na
elaboração de modelos que expliquem os atributos das diferentes arqueofácies e do
depósito arqueológico em conjunto, interpretados em termos de processos de deposição
antrópicos, processos de alteração natural e dinâmica da ocupação do espaço. Nesta
etapa, é importante avaliar o efeito da equifinalidade, segundo o qual resultados
semelhantes podem ter origens distintas. Para isso, toda comparação intercultural deve
restringir-se ao processo de deposição enquanto ação mecânica, física ou química, sem
avançar, porém, no significado desse processo. A interpretação dos significados
associados a cada atividade construtiva (ou deposição de cada arqueofácies) é realizada
no contexto cultural específico de estudo.
1.1.2. Estratigrafia e pedogênese Em alguns depósitos arqueológicos pode-se observar uma estratigrafia complexa
que envolve a combinação de quatro processos: 1) episódios deposicionais, com
crescimento vertical do depósito; 2) deposição e crescimento vertical por agentes
naturais (e.g. processos eólicos); 3) alteração pedogênica de sedimentos naturais ou
antrópicos a partir da decomposição de resíduos depositados em superfície pela
ocupação humana; 4) extração de sedimentos, com escavação de covas, nivelação do
terreno etc. No primeiro caso, o depósito ou camada será descrito em termos de
arqueofácies, por se tratar de produtos de deposição antrópica. No segundo caso, o
111
depósito ou camada se descreverá em termos de fácies sedimentares, por derivar de
agentes de deposição naturais. No terceiro caso, o depósito ou camada apresentará uma
combinação de fácies antrópicas e naturais alteradas pela pedogênese e será tratado em
termos de fácies ou arqueofácies com desenvolvimento de antropossolo 58 .
Este tipo de depósito é frequente em arqueologia e o mais complexo de abordar,
devido a que abrange uma fusão entre conceitos de estratificação e pedogênese. Podem
ser tratados como “perfis pedoestratigráficos”, segundo a terminologia adotada por
Arroyo-Kalin (2008) para as terras pretas amazônicas, que envolvem conjuntamente
processos de sedimentação e formação de horizontes de solo. No geral, toda sucessão
estratigráfica em depósitos arqueológicos construídos pode ser descrita em termos de
pedoestratificação, por incluir tanto os processos antrópicos de deposição do sítio, como
a alteração pedogênica durante e após o abandono.
No caso dos sambaquis e concheiros, o processo dominante é a deposição
antrópica e, pela composição dos sítios, existe boa preservação da estratificação, cuja
visibilidade não é obliterada pela pedogênese. Neste trabalho, os sambaquis e
concheiros são tratados em termos de arqueofácies. No caso em que a formação do
depósito e sua configuração atual estejam marcadas pela pedogênese (formação de
horizontes de solo) sobre sedimentos antrópicos ou naturais, o sítio será tratado em
termos de pedoestratificação, com desenvolvimento de antropossolo.
Cabe ressaltar que em estratigrafia, o termo pedoestratigrafia usa-se com
significado diferente do uso dado em arqueologia. No código norte-americano de
estratigrafia (NACSN, 1983), uma unidade pedoestratigráfica define-se como um corpo
de rocha enterrado com um ou mais horizontes de solo, desenvolvido sobre unidades
litoestratigráficas, aloestratigráficas ou litodérmicas antigas e cobertos por outras
unidades litoestratigráficas, aloestratigráficas ou litodérmicas 59 . Outro termo que pode
se confundir com a abordagem aqui proposta é o de pedofácies. Diferente de unidades
pedoestratigráficas, uma pedofácies refere-se a paleossolos lateralmente contíguos, que
se diferenciam como resultado da sua posição diferencial em relação a uma planície de
inundação antiga (Bown and Kraus, 1987).
58
Antrossolos são entendidos como solos, ou horizontes de solo, cuja formação e características foram
influenciadas pela ação humana (Eidt, 1984; Limbrey, 1975).
59
As unidades pedoestratigráficas diferenciam-se de outras unidades estratigráficas por serem produtos da
alteração de uma ou mais unidades estratigráficas antigas, como resultado da ação de processos em
superfície (Cremeens and Hart, 1995).
112
Neste trabalho, adota-se a terminologia proposta por Arroyo-Kalin (2008), de
perfis pedoestratigráficos, chamando à atenção para as diferenças que existem entre o
uso do mesmo termo em arqueologia e sedimentologia.
1.2. FUNDAMENTOS DA ANÁLISE DE MICROFÁCIES A análise de microfácies realiza-se a partir do estudo micromorfológico dos
sedimentos arqueológicos. Responde aos mesmos objetivos da analise de fácies, com a
diferença de que as descrições e interpretações são realizadas na escala microscópica.
As interpretações no nível microscópico envolvem igualmente uma aproximação
dialética com outras informações derivadas da análise estratigráfica (identificação de
fácies e arqueofácies na sucessão vertical), materiais faunísticos, artefatuais e demais
componentes orgânicos e inorgânicos do depósito. Modelos sobre formação e alteração
de outros contextos arqueológicos, etnoarqueológicos, experimentais e naturais,
assimiláveis ao caso de estudo, também são úteis na sua interpretação das microfácies
arqueológicas (ver Matthews et al., 1997).
O conceito de microfácies é tradicionalmente utilizado para estudar as histórias
deposicionais e diagenéticas de rochas carbonáticas, através de dados sedimentológicos
e paleontológicos que podem ser unicamente extraídos da análise de seções delgadas
(Flugel 2004). O conceito de microfácies arqueológicas 60 foi adotado por Courty (2001)
como ferramenta para entender a formação das unidades ou camadas arqueológicas e
sua variabilidade tempo-espacial.
60
Nos últimos tempos, trabalhos geoarqueológicos utilizaram o conceito de microfácies para estudar a
evolução e formação de sítios arqueológicos, principalmente em cavernas, mas também em contextos
urbanos do Neolítico, entre outros (ver Ge et al., 1993; Goldberg et al., 2009; Macphail et al., 1997;
Matthews et al., 1997 a; Vallverdu, 2009; Wattez, 1990).
113
1.2.1. Arqueofácies e microfácies arqueológicas As microfácies arqueológicas, assim como as arqueofácies, possuem valor
descritivo e interpretativo, e definem-se a partir do agrupamento de características
micromorfológicas semelhantes em seções delgadas. Estas características servem para
inferir o processo responsável pela formação da microfácies a partir da identificação da
origem, meio de transporte e evolução pós-deposicional ou diagenética do sedimento na
escala microscópica (Courty et al., 1989; Vallverdu, 2009). As similaridades indicam
uma origem análoga para as microfácies, ou seja, que o mesmo processo de deposição
teria sido responsável pela formação de microfácies semelhantes (Courty 2001).
Associações de microfácies também podem ser identificadas e relacionadas com
processos específicos de formação de sítio, como por exemplo, episódios sucessivos de
deposição e abandono do sítio, desenvolvimento recorrente de antrossolo sobre um tipo
de substrato, entre outros.
Existe uma relação bilateral entre a identificação de arqueofácies em campo e a
identificação de microfácies na seção delgada. Por um lado, a identificação de
microfácies é fundamental na completa caracterização de arqueofácies e interpretação
dos processos antrópicos e naturais vinculados com sua formação e alteração. Por outro
lado, uma análise de microfácies completa tem como requisito fundamental o trabalho
de campo prévio e a descrição macroscópica dos perfis.
No entanto, a relação entre arqueofácies e microfácies, apesar de bilateral, não é
necessariamente direta. Uma arqueofácies identificada em campo é formada, no
mínimo, por uma microfácies, mas pode também incluir múltiplas microfácies na sua
composição. Isto porque a avaliação microscópica das arqueofácies pode mostrar uma
maior complexidade do que o observado a olho nu, com presença de
microestratificações ou componentes sedimentares de origem diversa em uma única
arqueofácies.
114
1.2.2. Identificação e classificação Os critérios utilizados para identificação e distinção de microfácies em uma
mesma seção delgada ou em diferentes seções delgadas do mesmo sítio são ainda
variáveis em arqueologia. Segundo Courty (2001), as microfácies se classificam de
acordo ao grau de alteração antrópica que apresentam os sedimentos a respeito do solo
ou sedimento natural. Esta estratégia de classificação é freqüentemente utilizada no
estudo micromorfológico de sítios arqueológicos em cavernas do Paleolítico e em tells
do próximo oriente (Courty, 2001; Courty et al., 2012; Vallverdu, 2009). No entanto, a
diversidade de contextos arqueológicos e a falta de modelos abrangentes fazem com que
cada sítio seja tomado como único, e que os critérios sejam definidos em função das
características de contextos específicos.
Para o caso dos sambaquis e concheiros, que representam depósitos
completamente antrópicos e não solos ou sedimentos naturais alterados pela ação
humana, os critérios para a diferenciação de microfácies seguem a lógica proposta para
a identificação de arqueofácies no campo. Ou seja, priorizam-se os atributos
deposicionais ou penecontemporâneos à deposição na identificação de microfácies e não
o grau de alteração antrópica de um sedimento natural, como proposto por Courty
(2001). Esta estratégia vincula-se com a proposta de (Goldberg et al., 2009), que usam o
conceito de microfácies acunhado por Courty (2001), mas no sentido sedimentológico
de Flugel (2001), como mudanças litológicas numa mesma seção delgada. Assim,
definem-se os seguintes atributos diagnósticos na diferenciação de microfácies em
seções delgadas de sambaquis e concheiros. Qualquer variação em um dos atributos é
suficiente para a diferenciação entre microfácies:
•
Fração grossa: a diversidade, freqüência, completitude, orientação e
distribuição dos componentes grossos, principalmente malacológicos, é
fundamental na interpretação da atividade deposicional e da alteração
pós-deposicional produzida durante a ocupação ou após o abandono do
sítio.
•
Micromassa: sua composição é chave no entendimento dos processos
deposicionais e tafonômicos. Na descrição, consideram-se suas
115
propriedades ópticas a PPL (limpidez) e XPL (b-fábrica ou fábrica de
birrefringência).
•
Microestrutura: oferece informação sobre o grau e tipo de alteração pósdeposicional e pedogênica.
•
Porosidade: ajuda a esclarecer a compactação antropogênica e/ou
alteração biológica dos sedimentos arqueológicos.
•
Razão g/f: define a proporção numérica, dada em porcentagem, entre a
fração fina e grossa, permite avaliar a variação entre microfácies que
apresentam a mesma composição, mas que podem ter sido produzidas
por atividades diferentes. A distribuição relacionada g/f define o arranjo
e relação entre componentes finos e grosos na lâmina, que pode ser de
quatro tipos: mónica, quitónica, gefúrica, enáulica ou porfírica (Anexo,
Figura A.1).
Após a identificação de microfácies, segundo os critérios mencionados, realizase sua classificação a partir da comparação sistemática de todas as microfácies
identificadas em um mesmo sítio, ou em sítios da mesma região. Esta classificação
permite identificar tendências gerais na origem, modo e/ou condições de deposição de
cada microfácies (Courty 2001). Seguindo Courty (2001), para classificação de
microfácies serão considerados três aspectos: 1) relação entre as propriedades
identificadas no campo e na escala microscópica; 2) propriedades micromorfológicas
que sejam comuns a todas, ou pelo menos parte, das arqueofácies identificadas na
sucessão vertical; 3) propriedades micromorfológicas que sejam comuns às microfácies
identificadas em uma mesma arqueofácies ou em arqueofácies discretas na em
diferentes porções do sítio (variação lateral).
Na etapa de classificação, pode-se chegar á conclusão de que microfácies
semelhantes aparecem em arqueofácies identificadas em campo como diferentes. As
semelhanças micromorfológicas entre arqueofácies discretas podem ser interpretadas
como indicador de origens similares ou, no mínimo, de modos de deposição
semelhantes (Courty 2001). Assim, a mesma microfácies pode acontecer reiteradas
vezes no mesmo perfil estratigráfico, em diferentes perfis dentro de um mesmo sítio, ou
em perfis de sítios distintos, indicando processos análogos na formação dos depósitos.
A analogia na escala microscópica pode decorrer de similaridade de fonte ou de
processo deposicional, mas não necessariamente de forma, posição, espessuras e taxas
116
de deposição. Assim, microfácies análogas em fácies distintas não significam
necessariamente que as fácies devam ser redefinidas totalmente como análogas.
1.3. NOMENCLATURA Para diferenciar as fácies arqueológicas (AF) das fácies naturais na descrição das
sucessões verticais em campo, serão utilizadas duas nomenclaturas diferentes. As
arqueofácies serão classificadas segundo sistema numérico da base até o topo da
sucessão (AF 1, AF 2, AF 3, ...), enquanto as fácies naturais serão classificadas segundo
sistema alfabético seqüencial da base até o topo da sucessão (Fácies A, Fácies B, Fácies
C, ...). Quando mais de uma amostra é coletada da mesma arqueofácies, será utilizada
uma nomenclatura alfanumérica para identificar as diferentes amostras. Por exemplo, se
três blocos inalterados são coletados da AF 1, cada amostra será identificada como 1a,
1b e 1c.
Na descrição micromorfológica, será utilizado o conceito de microfácies (mF).
Arqueofácies (AF) e microfácies (mF) serão utilizadas de maneira complementar neste
trabalho. Como explicado no tópico 1.2.2, a relação entre arqueofácies e microfácies
não é direta, e sempre existe a possibilidade de uma arqueofácies incluir mais de uma
microfácies em seção delgada. Quando uma única microfácies é identificada, o número
da mF corresponderá com o da AF, ou seja, se na AF 2 identificou-se uma única
microfácies, esta será classificada como mF 2. Nos casos em que existir mais de uma
microfácies por arqueofácies, a classificação incluirá sempre o número da arqueofácies,
mais uma subclassificação numérica da microfácies à qual pertence. Por exemplo, se na
AF 3 observaram-se três microfácies, cada microfácies será identificada da seguinte
maneira: mF 3.1, mF 3.2 e mF 3.3. Nos casos em que a mesma microfácies seja descrita
em diferentes amostras da mesma arqueofácies, utiliza-se o sistema alfanumérico de
classificação, ou seja, se duas amostras foram coletadas da arqueofácies 4 (amostras 4a
e 4b), então as microfácies correspondentes serão identificadas como mF 4a e mF 4b.
117
2. AMOSTRAGEM O trabalho de campo e amostragem realizados nesta tese foram dirigidos à
caracterização e interpretação de arqueofácies nos oito sambaquis analisados.
Coletaram-se amostras de sedimento total, para análises granulométricas e isotópicas,
amostras de sedimento por volume padrão, para zooarqueologia, e amostras
indeformadas para micromorfologia e microscopia eletrônica de varredura. Como
complemento à caracterização e interpretação das arqueofácies, amostras extra-sítio
foram coletadas de depósitos naturais nas proximidades de alguns sambaquis, assim
como coleções experimentais foram confeccionadas para fornecer parâmetros de
referência na leitura e interpretação de arqueofácies e microfácies.
Para o estudo de caso comparativo, o do concheiro etno-histórico Tunel 7, foi
utilizada uma coleção de amostras arqueológicas, naturais e experimentais para análise
micromorfológica, coletadas na década de 1990 e nunca antes analisadas. Os diferentes
procedimentos serão apresentados conforme os dois contextos geográficos de estudo:
Santa Catarina e Terra do Fogo.
2.1. SAMBAQUIS 2.1.1. Amostragem arqueológica Em todos os sambaquis estudados, foram realizadas as seguintes atividades em
campo: 1) descrição do contexto geológico-geomorfológico de localização; 2) escolha
das seções verticais que melhor representam a composição do sambaqui; 3) descrição e
identificação de arqueofácies, segundo critérios definidos no tópico 1.2; 4) amostragem
de sedimento total (~300 g) e de blocos coesivos indeformados (10 x 5 x 6 cm) em cada
uma das arqueofácies identificadas nos perfis; 5) coleta, por volume padrão, para
zooarqueologia, realizada somente nos sítios que, até o momento, não foram
caracterizados quanto ao conteúdo faunístico; 6) amostragem na área de controle fora do
118
sítio (~200 g de sedimento) para identificação de fácies deposicionais naturais e
reconhecimento de áreas fonte de materiais constituintes dos sambaquis.
A amostragem de sedimento total foi realizada naquelas arqueofácies nas quais o
conteúdo faunístico não era predominante, ou seja, nas quais se identificaram
sedimentos terrígenos em porcentagem estimada visualmente superior a 20 %. Coletouse um total de 21 amostras de sedimento total para análise granulométrica, das quais 18
foram utilizadas para análises isotópicas. A coleta de amostras por volume para análise
zooarqueológica seguiu a proposta de Scheel-Ybert et al. (2005) e visou caracterizar o
conteúdo faunístico das arqueofácies.
Um total de 23 blocos inalterados para análise micromorfológica foi coletado das
diferentes arqueofácies identificadas nos oito sambaquis estudados. Para coleta no
campo de cada amostra destinada à micromorfologia, um bloco de material foi
esculpido cuidadosamente na seção exposta, com ajuda de canivete e espátula. Uma vez
esculpido, encaixou-se nele o recipiente de amostragem (que neste caso foram caixas de
papelão de 10 x 6 x 4 cm) e efetuou-se a extração do bloco, com a mínima alteração
possível das amostras. Uma vez extraídos, os blocos foram embrulhados com filme de
PVC e fita crepe, e sua orientação (topo e base) indicada com uma seta. A escolha das
posições de amostragem fez-se de modo a abranger a totalidade das mudanças
estratigráficas observadas nas seções verticais dos sambaquis estudados (ver Courty et
al., 1989; Goldberg & Macphail, 2008), com ênfase nos limites entre arqueofácies.
2.1.2. Amostragem externa O componente natural mais recorrente na composição dos sambaquis, embora
menos conspícuo que as conchas, são as areias terrígenas, principalmente quartzosas.
Este componente é primordial nos sistemas deposicionais da região, identificados por
Giannini (1993) como lagunar, barreira e eólico. Para avaliar os componentes naturais
nos sedimentos que compõem os sambaquis optou-se por estudar a fração areia
terrígena e comparar as areias no sambaqui com as areias dos depósitos naturais. Desta
maneira, evita-se a interferência de sedimentos finos na comparação, suscetíveis a
lixiviação, e elementos orgânicos, sempre mais abundantes nos sítios arqueológicos que
nos depósitos naturais.
119
Em quatro dos sítios estudados (Caipora, Santa Marta 8, Santa Marta 10 e
Cubículo1), foram abertas trincheiras em depósitos naturais a poucas dezenas de metros
dos sítios. Em todas as trincheiras abertas, foram coletadas amostras de sedimento total
para realização de análises granulométrica e isotópica. Unicamente na fácies superior
(crosta orgânica) da trincheira externa ao sítio Santa Marta 10, coletou-se também uma
amostra indeformada para micromorfologia. Na trincheira aberta nas proximidades do
sítio Caipora, coletou-se amostra apenas da fácies superior. No sítio Cubículo 1,
coletaram-se amostras das duas fácies identificadas, assim como no sítio Santa Marta
10. Na trincheira próxima ao sítio Santa Marta 8, foram coletadas amostras de todas as
fácies, exceto da superior.
Apesar de não se contar com datações nos sedimentos naturais que permitam
correlacionar a idade do depósito com o intervalo de formação dos sambaquis, a
comparação entre a fração areia terrígena do depósito natural e arqueológico, em termos
de proveniência e disponibilidade de sedimentos no momento de funcionamento dos
sítios, ainda é possível; especialmente naqueles sítios localizados no sistema lagunar,
como Caipora e Cubículo 1, sistema que se caracteriza por taxa de sedimentação baixa,
o que significa que amostras superficiais não são necessariamente mais recentes que os
sambaquis localizados nas proximidades (ver Fornari, 2010; Nascimento, 2010).
Nos sambaquis localizados no sistema deposicional eólico, a comparação
granulométrica e cronológica está respaldada pela idade inferida do depósito natural
amostrado a partir da identificação da geração de dunas à qual pertence, como no caso
de Santa Marta 10. No sítio Santa Marta 8, a identificação de uma camada arqueológica
centimétrica na trincheira aberta para amostragem externa, da mesma composição que o
sambaqui, estabeleceu um limite cronológico, para o depósito natural amostrado, que
habilita a comparação. Para os demais sambaquis onde não houve necessidade de
amostragem externa (Morrinhos, Jabuticabeira 1 e Galheta 4), a comparação
granulométrica foi realizada com dados disponíveis na bibliografia (Fornari, 2010;
Giannini, 1993; Giannini et al., 2007; Martinho, 2004; Nascimento, 2010; Sawakuchi,
2003; Tanaka, 2007; Villagran, 2008) em trincheiras e testemunhos localizados
próximos aos sambaquis e de cronologia semelhante.
120
2.1.3. Experimental O uso de abordagens experimentais é ainda incipiente na micromorfologia
arqueológica 61 . Neste trabalho, a amostragem experimental visa fornecer parâmetros de
referência sobre elementos conhecidos que podem ser encontrados no registro
arqueológico. Especialmente no que refere a estruturas de combustão, a sua
identificação no campo pode ser enganosa em sambaquis, onde a granulação grossa do
substrato da fogueira, composto principalmente por conchas, areia e ossos de peixe,
pode comprometer a preservação dos subprodutos da queima, como cinzas e
microcarvões. Ao mesmo tempo, a ubiqüidade de resíduos de queima, que formam parte
da matriz sedimentar destes sítios (ver Bianchini 2008; Klokler 2008; Villagran 2008,
2010; Villagran et al. 2009, 2010), pode levar a conclusões precipitadas quanto à
presença de fogueiras estruturadas. Os resíduos da queima podem apresentar diversas
configurações em contextos arqueológicos (e.g. fogueiras in situ vs. fogueiras
retrabalhadas), assim como seguir diferentes trajetórias de alteração sin e pósdeposicionais. Para a identificação certeira de contextos de queima in situ ou de seus
restos remanejados, foram confeccionadas duas coleções de queima experimentais.
A primeira coleção de amostras obteve-se a partir de duas fogueiras
experimentais, uma acesa sobre paleoduna eólica e outra sobre sedimentos
retrabalhados de sambaqui. A primeira fogueira trata-se de uma pequena depressão
escavada na areia, de 30 cm de diâmetro, sobre depósito de geração eólica 2 (prémáxima inundação holocênica conforme Giannini, 1993 e Giannini et al., 2007) na
localidade de Bentos, cerca de 5 km a norte da cidade de Laguna. A segunda foi acesa
sobre restos de retrabalhamento do sambaqui da Cabeçuda, situado na ponta de mesmo
nome, também em Laguna. A temperatura de ambas foi medida a intervalos de 15
minutos, com uso de termopares conectados a termômetro digital. O combustível
61
Os antecedentes que existem sobre micromorfologia experimental incluem o trabalho de Macphail et al.
(2003), no montículo experimental de Wareham e em pisos de ocupação na Bretanha (Macphail, 2004),
os estudos geo-etnoarqueológicos de Shahack-Gross (2003, 2004) e Shahack-Gross et al. (2008), em
sítios pastoris, e de Mallol et al. (2007) em fogueiras dos grupos Hadza. Em fogueiras experimentais, o
trabalho de Miller et al. (2010) apresenta parâmetros para a identificação de fogueiras in situ e
retrabalhadas, a partir do estudo, na escala microscópica, de seis contextos de retrabalhamento antrópico
dos resíduos de queima. Em concheiros, fogueiras experimentais foram realizadas por March & Ferreri
(1989), com importante aporte de informações a respeito da morfologia e gradiente de alteração térmica
de fogueiras planas em substrato conchífero, porém, sem dados quanto às características
micromorfológicas desse tipo específico de estrutura de combustão.
121
utilizado para as fogueiras incluiu unicamente troncos, galhos e grama seca de espécies
locais coletadas dos arredores de cada local escolhido para a experiência. Uma vez
acesas as fogueiras, a elas adicionaram-se conchas de Anomalocardia brasiliana recémcoletadas no seu ambiente de vida, assim como restos de peixe, principalmente ossos de
esqueletos descarnados. As conchas foram compradas em mercado local de
Florianópolis e os restos de peixe foram obtidos de uma indústria local de
processamento dos peixes pescados das lagoas da região. Cada vez que estes materiais
eram jogados no fogo, mediu-se a temperatura das chamas e observou-se a alteração
térmica superficial (abertura das conchas, desidratação dos ossos, carbonização,
calcinação e queima superficial com coloração avermelhada a marrom). A descrição das
fogueiras e objetivos da amostragem encontra-se no Quadro 4.1.
A segunda coleção experimental visou completar a caracterização de estruturas de
combustão em sambaquis da região, com um estudo específico sobre os efeitos da
queima em conchas da espécie de molusco neles mais freqüente, a Anomalocardia
brasiliana. A proposta é que os atributos observados na alteração térmica das conchas
desta espécie possam auxiliar na inferência da temperatura de queima em fogueiras in
situ, ou na identificação de materiais retrabalhados de contextos de queima diferentes (a
partir da mistura de materiais com temperaturas de queima diversas).
A coleção foi elaborada a partir da queima controlada das conchas de A.
brasiliana, em mufla, a intervalos de temperatura de 200, 300, 400, 500, 600, 700 e
800º C.
Quadro 4.1 Amostragem experimental em fogueiras e queima controlada de moluscos para atuar como
referência na identificação de fogueiras in situ e de resíduos queimados remanejados nos sambaquis.
Contexto
Fogueira sobre
paleoduna
eólica
Fogueira sobre
substrato
conchífero
Queima
controlada de A.
brasiliana Descrição
Na localidade de Bentos,
Laguna, sobre depósitos
arenosos de geração eólica 2
Sobre depósito de
retrabalhamento do sambaqui
Cabeçuda, Laguna
Em mufla, a 200, 300, 400,
500, 600, 700 e 800° C
Objetivo
Caracterizar fogueiras in situ em substrato arenoso.
Avaliar a temperatura máxima de queima em areias.
Caracterizar fogueiras in situ em substrato
conchífero. Avaliar as características macro e
microscópicas da queima em sambaquis
Identificar conchas queimadas em seção delgada,
registrar as características ópticas de sua queima a
diferentes temperaturas, obter parâmetros para
reconhecer fogueiras retrabalhadas e in situ 122
2.2. CASO DE ESTUDO COMPARATIVO: CONCHEIRO TÚNEL 7 2.2.1. Amostragem arqueológica No concheiro Túnel 7, foram estudadas duas coleções micromorfológicas que
provêm de coletas realizadas durante os trabalhos de campo de 1990 e 1992, no litoral
norte do Canal Beagle. Consistem em uma coluna de amostragem no anel de conchas
periférico (sete amostras), e nove seções delgadas de amostras coletadas, em planta, em
cinco fogueiras antrópicas identificadas durante a escavação na área central do
concheiro. Esta estratégia de amostragem é pouco freqüente em estudos
micromorfológicos, que geralmente enfatizam variações verticais. Seu valor reside na
possibilidade de entender tanto as características estratigráficas como as variações
espaciais laterais do sítio, o que permitirá articular melhor a informação sedimentar com
a diversidade de comportamentos e atividades associadas à formação do concheiro.
2.2.2. Amostragem externa O uso de análogos modernos recuperados de feições e elementos conhecidos,
como fogueiras ou áreas de pisoteamento, apesar de ser extremamente útil na
interpretação dos múltiplos significados que caracterizam as microfácies arqueológicas,
não é freqüente. Em alguns casos, utilizam-se amostras coletadas de solos das
proximidades dos sítios arqueológicos para atuar como material de controle e identificar
os aportes e modificações introduzidos no substrato pela atividade antrópica (ver
Arroyo-Kalin, 2008; Macphail et al., 2003; Shahack-Gross, 2003; Vallverdu, 2009).
Uma coleção de amostras de controle foi feita durante o trabalho de campo de
1995 no litoral norte do Canal Beagle. Esta coleção inclui uma série de feições e
elementos deposicionais regionais conhecidos, com destaque para contextos naturais. O
objetivo desta coleta é avaliar os processos de alteração locais, vinculados
principalmente a fatores climáticos, e caracterizar em seção delgada materiais
conhecidos, para facilitar sua posterior identificação nas seções provenientes dos sítios
arqueológicos.
123
A coleção de referência em questão consiste em cinco amostras coletadas do
seguinte grupo de elementos naturais: 1) caminho de animais, pisoteado pelo gado
diaramente, para avaliar os efeitos físicos do pisoteamento; 2) praia de seixos, próxima
ao concheiro Lanashuaia, para caracterização do depósito e identificação de
componentes da praia no sítio arqueológico; 3) solo sob floresta de Nothofagus sp., a
poucos metros da costa, para avaliar as condições locais de decomposição, bioturbação
e pedogênese.
2.2.3. Experimental A amostragem experimental foi realizada durante a atividade de campo de 1995.
Esta amostragem foi pioneira em estudos micromorfológicos e motivou e serviu como
modelo para a realização das fogueiras experimentais e da coleção de valvas queimadas
de A. brasiliana voltadas ao estudo dos sambaquis catarinenses. A coleção inclui três
fogueiras de função diferente, acesas sobre substratos diversos: 1) fogueira efêmera
sobre grama; 2) fogueira efêmera sobre praia de seixos; 3) fogueira do acampamento
dos arqueólogos. A descrição das fogueiras aparece no Quadro 4.2. Todas as amostras
foram impregnadas logo após a coleta, segundo procedimento descrito por Solé (1991),
e laminadas em 2009 no laboratório Earthslides (Cambridge, Inglaterra).
Junto com as fogueiras, elaborou-se uma coleção de conchas de Mytilus edulis,
principal componente malacológico dos concheiros do Canal Beagle, queimadas sob
condições controladas em mufla a intervalos de temperatura de 200, 300, 400, 500, 600,
700 e 800º C.
124
Quadro 4.2. Amostragem experimental em fogueiras e queima controlada de moluscos para atuar como
referência na identificação de fogueiras in situ e resíduos queimados remanejados em concheiros do
Canal Beagle.
Contexto
Fogueira acesa no
prado
Fogueira acesa na
praia de seixos
Fogueira acesa no
acampamento dos
arqueólogos
Combustão
controlada de
Mytilus edulis Descrição
De curta duração, sobre
grama em área costeira
De curta duração,
próxima ao concheiro
Lanashuaia
Utilizada pela equipe
durante um mês de
campo
Em mufla, a 200, 300,
400, 500, 600, 700 e
800° C
Objetivo
Caracterizar a configuração e preservação de fogueiras
efêmeras sobre gramíneas
Caracterizar a configuração e preservação de fogueiras
efêmeras sobre praia de cascalho
Caracterizar a configuração e preservação de fogueiras
de longa duração
Identificar conchas queimadas em seção delgada,
registrar as características ópticas de sua queima a
diferentes temperaturas, obter parâmetros para
reconhecer fogueiras retrabalhadas e in situ 3. PROCEDIMENTOS ANALÍTICOS A etapa de caracterização laboratorial é fundamental na análise de arqueofácies
e consiste na realização de ensaios que proporcionem informações mais detalhadas
sobre a natureza das fácies arqueológicas identificadas em campo. As características
composicionais dos sedimentos permitirão confirmar a identificação de fácies realizada
no campo e aprofundar ou refinar a descrição das propriedades de cada arqueofácies,
para contar com parâmetros de comparação intra e inter-sítio. As análises que serão
realizadas neste trabalho se descrevem nos próximos tópicos.
3.1. MICROMORFOLOGIA Neste trabalho, a micromorfologia tem um papel fundamental na caracterização de
arqueofácies. Esta técnica envolve a descrição microscópica dos componentes de solos e
sedimentos, a maneira em que estes se relacionam entre si e as hierarquias existentes
entre os diferentes processos atuantes nos depósitos (Courty, 2001; Courty et al., 1989;
Goldberg and Macphail, 2008). A integração da micromorfologia ao acervo das
125
ferramentas geoarqueológicas padrão é cada vez maior. Apesar do seu primeiro uso em
arqueologia remontar à década de 1950 (Cornwall, 1958; Darlymple, 1958), é nos
últimos 20 anos que houve uma explosão do seu uso em pesquisas arqueológicas. Esta
recente valorização da micromorfologia deve-se principalmente à sua resposta a
demandas de pesquisas de alta resolução, no que se refere à reconstrução
paleoambiental e processos de formação de sítio62 .
Apesar da crescente quantidade de pesquisas em micromorfologia de depósitos
arqueológicos, ainda existem contextos nos quais a técnica é pouco utilizada. Entre estes
se encontram os sítios concheiros, caracterizados por estratigrafias complexas formadas
por sedimentos porosos, nos quais domina a fração grossa formada por valvas de
diversas espécies de moluscos e gastrópodes. A primeira aproximação à
micromorfologia de concheiros foi realizada pela equipe de pesquisa que trabalha com
os concheiros do Canal Beagle desde 1986. Para estes pesquisadores, estudos
microestratigráficos são fundamentais como complemento da análise de processos de
formação de sítio, ao prover com informações de alta definição a identificação de
episódios de acumulação de conchas, áreas de pisoteamento, períodos de abandono,
alterações tafonômicas etc.
Até o momento, os únicos trabalhos sobre micromorfologia de concheiros da
América do Sul derivam da análise dos concheiros fueguinos (Balbo et al., 2010; Taulé,
1996) e do estudo do sítio Jabuticabeira II realizado por Villagran (2008) e Menezes
(2009). Neste sentido, a pesquisa aqui proposta dá continuidade a estes trabalhos, que
têm demonstrado o valor da micromorfologia como ferramenta no estudo de concheiros.
Dos oito sambaquis estudados nesta tese, foram coletados 24 blocos inalterados
para micromorfologia. As amostras foram secas em estufa a 50° C, impregnadas com
mistura de resina, endurecedor e solvente, e laminadas em seções delgadas de 14 x 6.7
cm, de 11 x 7.6 e de 7.5 x 5 cm, todas com 30 µm de espessura, no laboratório
62
Nas últimas décadas, a técnica tem sido aplicada em grande variedade de contextos culturais, que
incluem: sítios em cavernas e abrigos (Araujo et al., 2008; Courty & Vallverdu, 2001; Goldberg, 2000;
Goldberg & Arpin, 1999; Homsey & Capo, 2006; Karkanas, 2000; Karkanas et al., 2007; Mallol et al.,
2009; Schiegl, 1996); pisos de ocupação ( Courty, 2001; Ge et al., 1993; Gebhardt & Langohr, 1999;
Goldberg & Whitbred, 1993; Macphail, 2004; Matthews et al., 1997; Shahack-Gross et al., 2005);
atividades agrícolas e de adubação (Adderley et al., 2006; Guttmann, 2005; Macphail et al., 1990);
depósitos ictiológicos (fish middens) (Simpson, 1996; Simpson et al., 2005; Simpson & Milek, 1999;
Villagran et al., 2009a); montículos de terra (earthen mounds) (Cremeens, 2005; Macphail et al., 2003);
sítios de pastoreio (Goldberg & Whitbred, 1993; Shahack-Gross, 2003; Shahack-Gross, 2004; ShahackGross & Finkelstein, 2008); terras pretas antropogênicas (Arroyo-Kalin, 2008; Devos et al., 2009; Lima,
2002; Schaefer et al. 2004); sítios paleoíndios a céu aberto ( Macphail & McAvoy, 2008); entre outros.
126
Earthslides (Cambridge, Inglaterra). As amostras para micromorfologia coletadas das
fogueiras experimentais e da queima controlada de A. brasiliana foram impregnadas a
vácuo com mistura de resina epóxi, endurecedor e álcool etílico como diluente, segundo
procedimento descrito por de Paula et al. (1991) e laminadas em seções delgadas de 4.5
x 2.5 cm no laboratório de laminação do Instituto de Geociências (IGc/USP). A análise
micromorfológica foi realizada ao estereomicroscópio Zeiss Stemi SV11 e microscópio
óptico petrográfico Zeiss Axioplan 2, sob luz polarizada plana (PPL), luz polarizada
cruzada (XPL) e luz ultravioleta (UVL) no laboratório de petrografia do Instituto de
Geociências (IGc/USP).
As amostras do concheiro Tunel 7 (coluna e fogueiras) e valvas queimadas de
M. edulis foram impregnadas segundo procedimento exposto por Solé (1991) e
laminadas no Instituto de Geologia Jaume Almera (CSIC, Espanha) em seções de 7 x 5
cm. As amostras de contextos naturais foram impregnadas no Instituto de Geologia
Jaume Almera (CSIC, Espanha) e laminadas em 2009 no laboratório Earthslides
(Cambridge, Inglaterra). Todas as amostras foram analisadas sob PPL, XPL e luz
incidente oblíqua (OIL) com ajuda de um estereomicroscópio Leica MZ95 e
microscópio óptico de luz polarizada Olympus BX51, no Laboratório de Arqueologia
da Institução Milá i Fontanals (CSIC, Barcelona).
A descrição das lâminas foi feita segundo roteiros sugeridos por Bullock et al.
(1985), Courty et al. (1989), Fitzpatrick (1993) e Stoops (2003). As porcentagens de
porosidade e components da fração grossa foram realizadas por estimação visual
auxiliada por diagramas de referência tomados de Stoops (2003). A porcentagem de
porosidade foi estimada em relação ao volume total da amostra e as porcentagens da
fração grossa foram estimadas em relação aos diversos componentes.
A identificação de conchas com alteração térmica foi realizada em case aos
parâmetros definidos pelos experimentos de queima de A. brasiliana e Mytilus edulis.
Alem das propriedades ópticas da queima (a PPL e XPL), conchas queimadas a diversa
temperatura também foram identificadas pela coloração amarela dos fragmentos na luz
ultravioleta (Courty et al., 1989). A queima em ossos foi identificada, em seção delgada,
quando os fragmentos apresentam coloração avermelhada, castanha ou preta (PPL) nas
bordas ou superfície, assim como alta birrefringência (XPL) e ausência de
fosforescência na luz ultravioleta (Courty et al., 1989; Schiegl et al., 2003).
127
3.2. GRANULOMETRIA DA FRAÇÃO TERRÍGENA A granulometria será utilizada como parâmetro de comparação entre sedimentos
arqueológicos e sedimentos naturais, para conhecer a origem das areias terrígenas que
compõem os sedimentos dos sambaquis. Para isso, é necessário descartar o componente
orgânico e inorgânico bioclástico dos sedimentos arqueológicos e naturais e assim poder
relacionar ambos os grupos de amostras com base exclusivamente na fração areia
terrígena.
O método desenvolvido para separação da fração terrígena, em amostras de
sedimentos arqueológicos e naturais, requer o ataque químico, primeiro com HCl (50%)
a frio, para eliminar carbonatos de cálcio (CaCO3) e ossos, e depois com peróxido de
hidrogênio (H2O2) em chapa quente a 90ºC, para retirar a matéria orgânica (MO). Nos
sedimentos arqueológicos, as amostras são em seguida desagregadas em almofariz com
pistilo de borracha e os carvões presentes na fração areia (escolhida para comparação)
são intencionalmente fragmentados até alcançar a fração fina (silte/ argila), para ser
posteriormente retirados por lavagem em peneira. Em ambos os conjuntos de amostras,
somente a fração areia do material resistente restante, supostamente dominado por
terrígenos silicáticos, principalmente quartzo e feldspato, será peneirado e sua
granulometria determinada.
As distribuições granulométricas obtidas por este método serão utilizadas para
determinação de estatísticas descritivas (assimetria, desvio padrão, diâmetro médio e
curtose)
pelo
método
analítico
dos
momentos
de
Pearson,
no
programa
MOMENTOS.xls. Todas as amostras foram processadas no laboratório de
sedimentologia do Instituo de Geociências da Universidade de São Paulo (IGc/USP). Os
resultados das análises granulométricas encontram-se no Anexo, Tabela A.1.
Na amostragem externa, a comparação entre a fração terrígena do sambaqui e dos
sedimentos naturais será realizada a partir da apreciação visual dos histogramas de
distribuição granulométrica. Nos casos em que é possível a comparação dos dados dos
sambaquis com dados obtidos na bibliografia sobre os depósitos naturais das
proximidades dos sítios, serão comparadas as estatísticas descritivas entre sedimentos
arqueológicos e naturais mediante o uso de diagramas de caixa (boxplot). No caso dos
sítios Morrinhos e Jabuticabeira 1, utilizou-se na construção de gráficos, dados
128
provenientes de diferentes fácies identificadas no sistema lagunar, assim como
diferentes arqueofácies no sambaqui, com número de amostras equivalente ou pouco
superior no depósito natural.
3.3. ISOTOPIA DE CARBONO (δ13C) E NITROGÊNIO (δ15N) A análise de isótopos estáveis de carbono e nitrogênio (δ13C e δ15N) na matéria
orgânica (MO) de solos e sedimentos, junto com a determinação da razão C/N, permite
rastrear a origem dos materiais orgânicos. A razão C/N (Corgânico/ Ntotal) possibilita
diferenciar o aporte de MO de origem aquática ou marinha (algas e fitoplâncton) e de
MO terrestre (plantas em geral). Os valores de δ13C utilizam-se para refinar, na
identificação de plantas terrestres, as que pertencem ao tipo C3 (espécies arbóreas,
arbustivas e algumas Poaceae) ou C4 (maioria das Poaceae). Estes tipos referem-se ao
ciclo fotossintético de captura de CO2 da planta e sua identificação ajuda, em termos
gerais, a inferir a presença de vegetação arbórea e de gramíneas, respectivamente. Os
valores de δ15N, por sua vez, permitem identificar a fonte de nitratos nos sedimentos,
que podem derivar da decomposição de resíduos vegetais ou animais, tanto marinhos
como terrestres (animais ou vegetais) (Kendall, 1998; Meyers, 1997; Sifeddine et al.,
2004; White, 2001).
Em sedimentos naturais, estas informações auxiliam na reconstrução
paleoambiental e paleoclimática, a partir das mudanças detectadas no tipo de vegetação
associada à composição isotópica da MO no depósito 63 (Sifeddine et al., 2004; White,
2001). Em arqueologia, análises isotópicas são utilizadas na determinação da dieta de
populações humanas, a partir de dados obtidos do colágeno nos ossos. Estes estudos
permitem diferenciar entre o consumo prioritário de espécies terrestres ou marinhas
(Bogaard et al., 2007; Fogel et al., 1997; De Niro and Epstein, 1978; De Niro, 1987;
Schoeninger and De Niro, 1984). Em sedimentos arqueológicos, análises isotópicas de
C e N na MO (total e fração húmica) são utilizadas na identificação e delimitação de
63
Em áreas costeiras, o uso de indicadores isotópicos permite também determinar, a partir de abordagens
multiproxy, o contexto de deposição do material sedimentar que acompanha a matéria orgânica no
depósito, em termos de maior ou menor influência de sedimentos continentais ou marinhos (Lamb et al.,
2006; Wilson et al., 2005).
129
antigas áreas de cultivo de milho (Fernández et al., 2005; Webb et al., 2004; Wright et
al., 2009), por exemplo, e na identificação de áreas de pastoreio (Shahack-Gross and
Finkelstein, 2008; Shahack-Gross et al., 2008).
Na área de estudo desta pesquisa, trabalhos recentes usaram análises isotópicas de
δ13C e δ15N para estudar a evolução sedimentar do litoral centro-sul catarinense a partir
da combinação dos dados isotópicos com análises micropaleontológicas de pólen e
diatomáceas (Amaral, 2008; Amaral et al., 2012) e sedimentológicas (Nascimento,
2010). Em contexto arqueológico, análises isotópicas foram realizadas nos sambaquis
Jabuticabeira 2, Encantada 3 e Carniça 3 (Menezes, 2009), no que constituiu o primeiro
estudo isotópico de MO em sambaquis. Os resultados promissores obtidos por Menezes
(2009) motivaram a utilização da técnica neste trabalho.
Para estudar a origem e o tipo de MO contida nas arqueofácies identificadas nos
oito sambaquis estudados, foi realizada a determinação das porcentagens de C orgânico
e N total e determinação dos isótopos estáveis δ13C e δ15N e razão C/N. A preparação de
amostras para isotopia de C e N na MO envolve a secagem e peneiramento prévios, em
malha de 0,250 mm, para recuperação da fração areia muito fina. Em seguida, procedese a remoção de material vegetal (madeira, raízes) e de carbonato macroscópico com
pinça e por flotação em solução de HCl de 0,01M. Uma vez extraídos os restos visíveis
de biodetritos, as amostras são lavadas com água destilada, desagregadas em almofariz
de ágata com pistilo de porcelana, e secas em estufa a 50 °C. Para amostras
provenientes de arqueofácies ricas em carbonatos cálcicos, associados à degradação das
valvas de moluscos, o sedimento foi pré-tratado com HCl a 30% para remoção dos
carbonatos. Este tratamento é realizado para evitar a influência do CaCO3 na
determinação do C orgânico total (ver Megens, 2002; Xu et al., 2006)
Do material já seco, são feitas duas séries de cápsulas de tungstênio: uma para
determinação de N total e δ15N; e outra para determinação de C total e δ13C. No
primeiro caso, separam-se entre 20 e 30 g de sedimento para amostras mais lamosas e
ricas em MO, e entre 50 e 60 g para amostras arenosas, pobres em MO. No segundo
caso, foram separados entre 5 e 15 g de material em amostras com maior concentração
de MO, e entre 25 e 30 g em amostras arenosas, com menor conteúdo orgânico.
A análise elementar e de isótopos estáveis de C e N foi realizada no laboratório de
isótopos estáveis do Centro de Energia Nucelar na Agricultura da Universidade de São
Paulo, campus Piracicaba (CENA/USP), com analisador elementar acoplado a um
130
espectrômetro de massa ANCA SL 2020 da Europa Scientific. Os resultados de C e N
serão apresentados em porcentagem de peso seco e os dados de razão isotópica
determinada em relação ao padrão internacional PDB para 13C e em relação ao ar para
15
N, com precisão analítica de +/- 0,2 ‰.
Os resultados das análises isotópicas apresentam-se no Anexo, Tabela A.2. A
alta correlação entre os valores de C orgânico e N total (Anexo, Figura A.2), indica que
os valores de N podem ser utilizados como representativos do conteúdo de N orgânico
nas amostras analisadas.
3.4. MICROSCOPIA ELETRÔNICA DE VARREDURA Análises de microscopia eletrônica de varredura (MEV), com espectrometria de
energia dispersiva (sistema MEV-EED) foram realizadas com a finalidade de conhecer a
composição química de componentes específicos da fração fina em amostras de
interesse. Estas análises utilizam-se de sensores de elétrons secundários (SE), para
obtenção de imagens de microrelevo, e sensores de elétrons retroespalhados (QSBD),
para obtenção de imagens de concentração de elementos químicos mais leves (tons de
cinza mais escuros) ou mais pesados. O uso do detector de EED permite ainda inferir a
composição química qualitativa (ou semiquantitativa, no caso de amostras de superfície
plana, como seções delgadas) dos materiais estudados.
Para esta análise, foram utilizadas seções delgadas sem lamínula recobertas com
ouro ou carbono. Ao serem as seções delgadas confeccionadas com impregnação prévia
por resina, uma amostra da resina é sempre estudada para conhecer sua composição
química e estabelecer um parâmetro composicional de referência.
As seções delgadas polidas em amostras de sambaquis foram confeccionadas no
laboratório de laminação do Instituto de Geociências (IGc/USP). A análise foi realizada
no laboratório de microscopia eletrônica de varredura do Instituto de Geociências
(IGc/USP) com microscópio eletrônico Leo 441i, com detector EED (Oxford) para
determinação de composição química semiqualitativa. O estudo de microscopia
eletrônica de amostras do concheiro Tunel 7 foi realizado sobre blocos polidos, para as
seções delgadas provenientes da coluna de amostragem no anel de conchas periférico, e
131
em seções delgadas, sem lamínula, para as amostras de fogueiras centrais. As análises
foram realizadas no serviço de microscopia da Universidade Autônoma de Barcelona
(UAB), com microscópio eletrônico JSM-6300.
3.5. ZOOARQUEOLOGIA Amostragem para zooarqueologia foi realizada naqueles sambaquis que não
foram objeto de estudos faunísticos prévios. Esta amostragem seguiu a proposta de
Scheel-Ybert et al. (2005), adaptada de Figuti (1992), que enfatiza a padronização de
coletas faunísticas para habilitar a comparação intra e inter-sítio. Este procedimento
evita a coleta seletiva, freqüentemente realizada em amostragens zooarqueológicas,
através da extração de volumes padronizados de sedimento das seções verticais dos
sítios. Neste trabalho, a amostragem por volumes dirige-se unicamente à identificação e
quantificação das diferentes espécies de moluscos em cada arqueofácies amostrada na
sucessão vertical, e o tratamento das amostras no laboratório segue tal finalidade.
Meio balde de sedimento de cada arqueofácies foi coletada dos sítios Cubículo
1, Morrinhos e Santa Marta 10. As amostras foram pesadas e posteriormente peneiradas
e lavadas simultaneamente em malhas de 4,0 mm e 2,0 mm. O material retido nestas
malhas foi deixado para secar a temperatura ambiente e, em seguida, pesado.
Unicamente o material retido na malha de 4,0 mm foi triado por espécie de molusco
identificada. O retido na malha de 2,0 foi pesado, para estimação do grau de
fragmentação dos componentes, e submetido a estimativa visual da porcentagem de
fragmentos de osso de peixe. As subamostras por espécie foram pesadas e, com o valor
do peso total coletado no balde, calculou-se a concentração de espécie de molusco por
amostra de cada arqueofácies. Os resultados da análise zooarqueológica nos sítios Santa
Marta 10, Morrinhos, Cubículo 1 e Carniça 3 encontra-se no Anexo, Tabela A.3.
132
4. SUMÁRIO No Quadro 4.3. apresentam-se as diferentes análises propostas neste trabalho e a
quantidade de amostras, por ensaio laboratorial. O quadro contém o detalhamento de
análises nos oito sambaquis estudados e no concheiro fueguino, junto com as análises
realizadas nos locais de amostragem externa ao sítio em quatro dos sambaquis
estudados e com a amostragem experimental em fogueiras e queima controlada de
moluscos.
Quadro 4.3. Síntese das diferentes análises realizadas por sítio arqueológico, na amostragem externa aos
sítios e na amostragem experimental (fogueiras e queima controlada de moluscos). TdF: Terra do Fogo;
SC: Santa Catarina.
Micromorfologia
Granulometria
Química
multielementar
Zooarqueologia
SÍTIOS
Caipora
Cubiculo 1
Morrinhos
Jabuticabeira 1
Santa Marta 10
Carniça 3
Galheta 4
Santa Marta 8
Tunel 7
Sub-total
5
1
4
5
2
1
2
3
16
39
2
1
3
8
2
1
2
2
21
1
1
1
1
1
1
2
8
5
3
1
1
10
AMOSTRAGEM
EXTERNA
Caipora
Cubiculo 1
Santa Marta 8
Santa Marta 10
Túnel 7
Sub-total
1
5
1
1
2
2
1
6
1
2
1
1
5
1
2
2
1
6
-
4
2
11
-
-
-
-
-
-
-
-
27
23
14
10
AMOSTRAGEM
EXPERIMENTAL
Fogueiras TdF
Fogueiras SC
Queima de Mytilus
edulis
Queima de A.
brasiliana
TOTAL
7
58
133
Isotopia
de C e N
No de amostras
2
1
2
7
1
1
2
2
18
CAPÍTULO 5: GEOARQUEOLOGIA DE SAMBAQUIS DO LITORAL SUL DE SANTA CATARINA E CONCHEIRO ETNOHISTÓRICO DA TERRA DO FOGO A análise de arqueofácies proposta para este trabalho contemplou a descrição
das sucessões estratigráficas em sambaquis, de acordo com atributos deposicionais
definidos por Villagran (2008) e Villagran et al. (2009). A identificação de arqueofácies
representa o primeiro passo para o reconhecimento de processos deposicionais
recorrentes na formação de um sambaqui, ou de vários da mesma região. Esta
identificação no campo é seguida da caracterização das fácies arqueológicas através de
procedimentos de laboratório que, neste trabalho, incluíram granulometria da fração
terrígena, isotopia de carbono (δ13C) e nitrogênio (δ15N) da MO no sedimento,
micromorfologia e microscopia eletrônica de varredura. Para complementar o estudo
das microfácies arqueológicas e fornecer parâmetros de referência que auxiliem na sua
descrição e interpretação, foram elaboradas duas coleções experimentais, uma de
fogueiras em substrato arenoso e conchífero, e outra de queima controlada de
Anomalocardia brasiliana, principal componente malacológico dos sambaquis da
região.
Nos próximos tópicos, apresentam-se primeiro os resultados da abordagem
experimental em sambaquis catarinenses, seguida da análise geoarqueológica dos oito
sambaquis analisados, agrupados quanto ao padrão estratigráfico, dentro da
classificação proposta por Giannini et al. (2010), em sambaquis conchíferos, de núcleo
quartzo-arenoso e montículos ictiológicos. Encerra este capítulo a análise das coleções
de micromorfologia experimental (fogueiras e queima controlada de Mytilus edulis) e
arqueológica (anel de conchas e fogueiras centrais) no concheiro etno-histórico Túnel 7.
134
1. COLEÇÃO DE REFERÊNCIA EXPERIMENTAL 1.1. FOGUEIRAS Foram realizadas duas fogueiras experimentais sobre substrato conhecido no
litoral sul de Santa Catarina. A primeira fogueira foi feita em forma de bacia, escavada
sobre substrato arenoso em paleoduna eólica. A segunda fogueira experimental foi acesa
em superfície plana, sobre depósito de retrabalhamento do sambaqui Cabeçuda. Em
ambos os casos, utilizaram-se espécies de árvores locais como combustível, assim como
conchas e restos de peixe, para aproximar-se o máximo possível da realidade encontrada
no registro arqueológico.
1.1.1. Temperatura Na Figura 5.1, apresentam-se as temperaturas alcançadas pelas duas fogueiras
experimentais, tanto no centro da combustão como no substrato (sob o meio da
fogueira, a cerca de 5 cm de profundidade). As informações apresentadas indicam que
altas temperaturas, no entorno dos 900°C, podem ser rapidamente alcançadas, inclusive
em fogueiras efêmeras, de uma hora de duração, como as realizadas neste experimento.
Na fogueira sobre paleoduna, a elevada temperatura máxima alcançada, de 900°C, foi
possivelmente favorecida pela ação do vento no local. Situação diferente foi observada
na fogueira sobre depósito retrabalhado de sambaqui. Acesa em local protegido da ação
dos ventos, esta fogueira, além de demandar maior quantidade de combustível, atingiu
temperaturas menores, inferiores a 800°C (Figura 5.2 A-B).
135
Figura 5.1. Gráfico e tabela com as temperaturas atingidas no centro de combustão e no substrato (a 5 cm
da superfície), durante uma hora de queima, em duas fogueiras experimentais (sobre paleoduna eólica e
sobre depósito de retrabalhamento de sambaqui).
Apesar do substrato a 5 cm de profundidade ter atingido temperaturas cerca de
700 a 800°C menores que o epicentro da fogueira, tanto o sedimento arenoso como o
conchífero apresentaram preservação de calor até 12 horas após a finalização da
queima. A fogueira em paleoduna alcançou temperaturas de até 100°C, nas cinzas,
quatro horas depois de apagada (Figura 5.2 C). A fogueira no substrato conchífero
apresentou temperaturas de até 81°C nas cinzas, 12 horas depois de apagada, com
107°C a 2 cm e 304°C a 5 cm de profundidade do epicentro da fogueira. A 10 cm de
profundidade, a temperatura diminuía para 50°C e a 15 cm não ultrapassava 32°C
(Figura 5.2 D).
136
Figura 5.2. Fotografias das duas fogueiras experimentais: A) fogueira sobre paleoduna eólica, com
indicação da temperatura atingida a 60 minutos do inicio da queima; B) fogueira sobre depósito de
retrabalhamento de sambaqui, com indicação da temperatura atingida a 45 minutos do inicio da queima;
C) fogueira sobre paleoduna eólica, apagada, com indicação da temperatura do substrato, quatro horas
depois do apagado o fogo; D) fogueira sobre depósito de retrabalhamento de sambaqui, apagada, com
indiicação das temperaturas do substrato e a diferentes profundidades, 12 horas depois de apagado o fogo.
1.1.2. Forma e composição Na fogueira em paleoduna observou-se a formação de crosta delgada
(milimétrica), de coloração marrom escuro na areia das bordas e laterais da área atingida
pelas chamas no interior desta cavidade, o (Figura 5.3 A,D). Nesta fogueira, todos os
componentes faunísticos (conchas e restos de peixe) sofreram calcinação e carbonização
(Figura 5.3 B,C).
137
Figura 5.3. Fogueira sobre paleoduna eólica: A) esquema de alteração do substrato produzido por
fogueiras em forma de bacia, como a realizada, nesta pesquisa, sobre areia dunar (modificado de March,
1996); as setas brancas indicam a trajetória do calor no inicio do fogo (esquema superior) e algumas horas
depois, enquanto as setas prets indicam a trajetória do calor subaéreo; B) duas cabeças de peixe
queimadas na fogueira; C) conchas de Anomalocardia brasiliana, após retiradas da fogueira; D)
configuração da fogueira após apagada. Note-se o escurecimento do perímetro da bacia onde foi acesa a
fogueira, como previsto no modelo de March (1996).
As fogueiras feitas sobre depósito de retrabalhamento de sambaqui e sobre
paleoduna eólica diferiram entre si quanto à forma e quanto ao padrão observado de
alteração térmica dos materiais. A primeira diferença refere-se ao fato de a fogueira no
sambaqui ter sido acesa sobre substrato conchífero plano. De acordo com March (1996),
isto provoca diferenças substanciais não somente quanto à forma da distribuição do
produto de queima, mas também no tipo de alteração térmica de seus componentes
(March, 1996). Assim, na paleoduna, todos os materiais foram calcinados ou
carbonizados. Já na fogueira plana, observou-se uma área sub-circular de 30 a 40 cm de
diâmetro, onde todos os componentes (conchas e ossos) estavam calcinados, bordejada
por uma faixa de cerca de 10 cm de largura, com restos carbonizados (Figura 5.4 A,B).
Fora da área de calcinação-carbonização desta fogueira, não se observaram alterações
térmicas nos materiais na forma de mudanças texturais ou de coloração.
138
A friabilidade do sedimento arenoso da paleoduna eólica impossibilitou o corte
transversal da fogueira, que visaria observar em secção vertical as características da
respectiva estrutura de combustão. Na fogueira sobre substrato conchífero, o corte
vertical foi possível, e permitiu notar a forma lenticular típica de estruturas de
combustão (Schiegl, 1996; Weiner, 2002), com núcleo de cor cinza claro, formado por
cinzas, conchas e ossos calcinados, carvões e ossos carbonizados (Figura 5.4 C,D).
Figura 5.4. Fogueira sobre depósito de retrabalhamento do sambaqui Cabeçuda: A) esquema de alteração
do substrato produzido por fogueiras planas (modificado de March, 1996); as setas brancas indicam a
trajetória do calor sob a perspectiva horizontal da fogueira (esquema superior) e em seção vertical
(esquema inferior); B) fogueira plana sobre o sambaqui, apagada; C) seção de alteração térmica; D)
detalhe da alteração do substrato, em que se vê camada lenticular decimétrica de cinzas sobre lâmina
milimétrica de material carbonizado. Notem-se os formatos horizontal e vertical da fogueira plana,
coincidentes com o previsto no modelo de March (1996).
139
1.1.3. Alteração do substrato e preservação As experiências de queima controlada em substrato arenoso e conchífero
ofereceram observações de primeira mão que auxiliarão na interpretação do registro
arqueológico. Constatou-se, por exemplo, que a preservação de restos de fogueiras em
sedimentos arenosos (eólicos, no caso) é comprometida pela baixa coesão do substrato,
independentemente da quantidade de materiais utilizados na combustão e da
temperatura atingida pela fogueira. Ao mesmo tempo, apesar das elevadas temperaturas
(de até 900°C) alcançadas na fogueira em paleoduna, não se provocaram grandes
alterações no substrato sedimentar, como rubefação ou carbonização (ver Berna et al.,
2007; Mallol et al., 2007; Schiegl et al., 2003), o que pode ser atribuído à escassez de
argilominerais e de MO na sua constituição. Desse modo, estruturas de combustão em
substrato arenoso, como dunas ou paleodunas eólicas pouco cimentadas, devem
caracterizar-se por baixo impacto da temperatura sobre o substrato e por potencial
elevado de deflação eólica, o que implica dificuldades para sua preservação e/ou
identificação no registro arqueológico 64 .
No caso da fogueira sobre substrato conchífero, a experimentação permitiu
identificar com maior clareza a forma e o gradiente de alteração térmica de estruturas de
combustão in situ. Estas informações poderão ser extrapoladas ao contexto arqueológico
para melhor caracterização e identificação de fogueiras em sambaquis. Assim, uma
fogueira in situ no sambaqui deverá apresentar o formato lenticular típico, oval em
planta e côncavo-plano na seção vertical (Figura 5.4 A,C), com núcleo composto por
material calcinado de coloração cinza claro e periferia carbonizada de cor preta, tanto na
seção vertical como na horizontal. A rubefação do substrato não se observou nesta
experiência (Figura 5.4 D). Admitida a presença, neste caso, de argilominerais e MO
fina passíveis de sofrer rubefação, o não evidenciamento deste efeito pode ser atribuído
à curta duração da fogueira. Assim, fogueiras de curta duração (poucas horas) não
provocariam este tipo específico de alteração térmica, e sim aquelas que ficam acesas
64
No trabalho de Compton & Franceschini (2005) descrevem-se fogueiras antrópicas identificadas na
área de deflação de dunas aólicas da costa da oeste da África do Sul, formadas por concentrações de
quartzo termoalterado sobre sedimentos calcáreos. Nesse caso particular, a presença de fragmentos de
quartzo e o substrato calcáreo teria favorecido a preservação das fogueiras. 140
por períodos de tempo longos o suficiente para transferência mais efetiva de calor ao
sedimento.
1.1.4. Micromorfologia de fogueira sobre substrato conchífero Amostras para análise micromorfológica foram coletadas unicamente da fogueira
sobre substrato conchífero, uma vez que na fogueira sobre substrato eólico a friabilidade
do sedimento impossibilitou a coleta de blocos inalterados. Esta amostragem visa à
identificação, a partir da análise micromorfológica, de contextos de queima in situ nos
sambaquis da região, já que as amostras coletadas representam microfácies de
combustão primária na definição de Wattez (1992), isto é, que não sofreram
retrabalhamento pós-deposicional.
Uma amostra de bloco inalterado para micromorfologia foi tomada da periferia
da fogueira, em local onde o material apresentava coesão suficiente isso. Já no epicentro
da estrutura de combustão, o alto teor de areia e cinzas impossibilitou a coleta dos
blocos. Na Figura 5.5, reúnem-se fotomicrografias da massa basal da estrutura de
combustão e de elementos de destaque na assembleia de componentes da fração grossa.
A partir da avaliação microscópica da fogueira sobre substrato conchífero, extraem-se
os seguintes indicadores de contextos primários de queima:
•
Padrão de distribuição aleatório dos componentes da fração grossa.
•
Alta fragmentação dos ossos, chegando à fração silte.
•
Sinais de queima nas conchas, tanto inteiras quanto fragmentadas (ver
tópico 1.2).
•
Homogeneidade no grau de alteração térmica dos fragmentos de osso,
apesar de distribuídos aleatoriamente.
•
Baixa freqüência de micromassa, formada principalmente por material
carbonático fino, possivelmente associado a cinzas de madeira.
141
Figura 5.5. Fotomicrografias de seção delgada coletada na periferia da fogueira acesa sobre substrato
conchífero (depósito de retrabalhamento do sambaqui Cabeçuda): (A, B) massa basal composta por grãos
de quartzo, fragmentos de osso queimados e carbonizados e fragmentos de concha, a PPL e XPL; C, D)
detalhe da fração fina composta por fragmentos de osso queimado na fração silte entre áreas de micrita
carbonática, a PPL e XPL; E) concha com sinais de alteração térmica (coloração cinza escuro e fissuras
internas) em matriz micrítica associada a cinzas de madeira, a PPL. F) carvão em processo de
transformação para cinza, a PPL.
142
1.2. QUEIMA CONTROLADA DE ANOMALOCARDIA BRASILIANA A segunda etapa da experimentação envolveu a criação de uma coleção de
referência de queima do bivalve Anomalocardia brasiliana, principal componente
malacológico dos sambaquis catarinenses. No Quadro 5.1, apresentam-se as
observações das diferentes seções delgadas de queima de Anomalocardia brasiliana a
temperaturas de 200°C até 800°C.
Análises de difratometria de raios-X realizadas por Colonese nas faces interna e
externa da valva de Anomalocardia brasiliana fresca confirmaram a aragonítica de
ambas (Anexo, Figura A.3), como já mostrado em outros estudos (Bezerra et al., 2009).
A face interna das valvas de A. brasiliana corresponde a camada nacarada, composta
por plateletas poligonais (tijolos) de aragonita, ligadas entre se por um biopolímero.
Esta camada interna transforma-se totalmente em calcita a 500°C, e em óxido de cálcio
(CaO) a 1000°C (Balmain et al., 1999; Bourrat et al., 2007; Huang and Li, 2009). Já a
aragonita que compõe a face externa da valva transforma-se em calcita a temperaturas
levemente menores, na ordem dos 360-380° C. A maior temperatura de mudança de
fase da camada interna, nacarada, em relação à externa, deve-se à maior influência de
matriz orgânica na sua constituição (Ren et al., 2009).
No nível de observação macroscópico, a transformação térmica de A. brasiliana
envolve o escurecimento geral da concha, desde a superfície até o interior. O
escurecimento vai de marrom escuro, a 200° C, passando por preto, a 400° C, até cinza
e branco, a temperaturas maiores que 500° C. No nível microscópico de observação, o
escurecimento da valva vai de laranja escuro (PPL) até 300° C, passando por marrom
escuro, até 600° C, e preto, a 800° C. Paralelo ao escurecimento da concha, ocorre a
carbonização e volatilização do perióstraco, a partir de 500° C, e a formação de
pequenas fissuras longitudinais e transversais à superfície da valva, possivelmente
relacionadas com a perda de água e outros voláteis da matriz orgânica da concha
(Gaffey et al., 1991). A formação de pseudo-vacúolos ocorre a partir dos 800° C.
As descrições agrupadas no Quadro 5.1 podem ajudar a interpretar fogueiras in
situ ou retrabalhadas em termos de pirotecnologia e processos de formação. Por
exemplo, cada vez que uma valva de Anomalocardia brasiliana em contexto
arqueológico seja encontrada com intensa deformação de suas lâminas internas, fissuras
143
alongadas, coloração preta (PPL) e opacidade (XPL), pode-se inferir que ela sofreu
queima sob temperatura superior a 800º C. Se um conjunto de valvas queimadas a altas
temperaturas é encontrado em associação gradual até valvas queimadas a temperaturas
menores, junto com restos de cinzas, carvões e agregados de argila rubefacta, pode-se
inferir a presença de uma fogueira in situ.
Quadro 5.1. Descrição das alterações térmicas observadas nas conchas de Anomalocardia brasiliana,
queimadas na mufla a temperaturas de 200 a 800° C.
Temperatura
200°C
300°C
400°C
500°C
600°C
700°C
800°C
Descrição
Valva bem preservada. Sem alterações evidentes.
Semelhante à anterior. Perióstraco bem preservado, com cor laranja escuro
(PPL).
Leve escurecimento. Perióstraco totalmente preto, descolado da valva em
algumas partes.
Perióstraco preto e quebradiço. Valva com fissuras longitudinais, paralelas
à face interna.
Escurecimento geral da valva, cor marrom escuro (PPL), marrom escuro
avermelhado (XPL), mais atenuado na face externa da valva.
Desaparecimento do perióstraco. Aumento em frequência das fissuras
longitudinais paralelas à face interna da valva e aparecimento de fissuras
transversais à valva, desenvolvidas do exterior até o interior.
Escurecimento geral da valva, mais atenuado na face exterior. Aumento em
frequência das fissuras longitudinais.
Deterioração geral da valva. Borda preta na face externa e cor cinza
transparente (PPL) no restante da valva. Fissuras longitudinais com
morfologia de pseudo-vacúolos. Fissuras transversais.
144
Figura
5.6
5.6
5.7
5.7
5.8
5.8
5.9
Figura 5.6. Alteração de Anomalocardia brasiliana a temperaturas de 200°C e 300°C: A1) concha queimada a 200°C, com preservação do perióstraco; A2) borda enegrecida
da face interna da valva; A3) detalhe da superfície queimada da face externa da valva; A4-5) fotomicrografias da valva queimada, com camadas de crescimento, a PPL e XPL;
B1) concha queimada a 300° C; B2) borda enegrecida e superfície escurecida da face interior da valva; B3) fotomicrografia da superfície da valva, com perióstraco
preservado; B4-5) detalhe do perióstraco ainda aderido à valva.
145
Figura 5.7. Alteração de Anomalocardia brasiliana a 400°C e 500°C: A1) concha queimada a 400°C, com preservação do perióstraco; A2) borda carbonizada da face interna
da valva e superfície enegrecida; A3) fotomicrografia da concha queimada, com perióstraco ainda preservado; A4) fotomicrografia da valva escurecida; 5) detalhe do
perióstraco queimado; B1) concha queimada a 500° C; B2) borda acinzentada e superfície esbranquiçada da face interna da valva; B3) fotomicrografia da superfície cor
marrom escuro; B4) fotomicrografia da valva queimada, com escurecimento pronunciado na face interna; B5) detalhe do perióstraco, ainda aderido à valva.
146
Figura 5.8. Alteração de Anomalocardia brasiliana a 600°C e 700°C: A1) concha queimada a 600°C; A2) borda acinzentada da face interna da valva; A3) fotomicrografia da
concha queimada enegrecida, sem perióstraco, com fissuras longitudinais e transversais; A4-5) fotomicrografia da valva escurecida a PPL e XPL. B1) concha quemada a 700°
C; B2) borda acinzentada da face interna da valva; B3) fotomicrografia da concha queimada, preta a cinza escuro; B4-5) fotomicrografia da valva a PPL e XPL.
147
Figura 5.9. Alteração de Anomalocardia brasiliana a 800°C: A1) concha queimada a 800°C, tão
fragilizada que não se manteve inteira; A2) valva calcinada; A3) fotomicrografia da valva calcinada, de
cor cinza, com pseudo-vacúolos; A4-5) fotomicrografia da valva calcinada, a PPL e XPL
2. SAMBAQUIS DO LITORAL CATARINENSE Neste tópico, apresentam-se os resultados da análise estratigráfica, isotópica,
granulométrica e micromorfológica dos oito sambaquis estudados na tese. Os dados
serão organizados conforme os três padrões estratigráficos identificados por Giannini et
al. (2010) nos sambaquis da área de estudo. Os quatro primeiros sítios, Caipora,
Cubículo 1, Morrinhos e Jabuticabeira 1, pertencem ao padrão estratigráfico conchífero,
os dois seguintes, Santa Marta 10 e Carniça 3, são classificados como sambaquis de
núcleo quartzo-arenoso, enquanto os dois últimos, Santa Marta 8 e Galheta 4, são
montículos ictiológicos.
148
2.1. PADRÃO ESTRATIGRÁFICO CONCHÍFERO 2.1.1. Caipora Neste sambaqui, localizado sobre embasamento granitóide, a aproximadamente 16
km da atual linha de costa, foram identificadas quatro arqueofácies, mais um horizonte
pedogênico A desenvolvido no topo da sucessão estratigráfica (Figura 5.10). Trata-se de
sítio característico do setor interno, já que compartilha com outros sítios desse setor a
presença predominante de Ostrea sp. e Anomalocardia brasiliana.
A AF 1, na base do sambaqui, abrange um sepultamento humano próximo ao
contato com o granito. Diferencia-se do resto das arqueofácies identificadas por
apresentar menor freqüência de conchas e maior conteúdo terrígeno. De fato, no estudo
zooarqueológico realizado por Ferraz (2010), a AF 1 65 apresenta fragmentos líticos na
fração cascalho em mais de 50% da sua composição.
A AF 2, de espessura centimétrica e formada por areia lamosa preta, apresenta
semelhanças, quanto à composição e forma de ocorrência, com as camadas pretas
centimétricas que aparecem intercaladamente na camada conchífera e no depósito
ictiológico do sítio Jabuticabeira 2 (Fish et al., 2000; Klokler, 2008; Villagran, 2008).
No sítio Caipora, não foram observados sepultamentos associados a esta arqueofácies,
ainda que isto possa se dever à limitação da sucessão vertical analisada.
A AF 3, que aparece intercalada com a AF 2 a partir dos 80 cm de profundidade,
apresenta conchas inteiras de moluscos, misturadas com fragmentos de concha de
tamanho diverso (3 cm até 1 mm). Na identificação faunística realizada por Ferraz
(2010), a AF 3 66 é constituída por cerca de 60% de conchas de Ostrea sp., pouco mais
de 10% de Anomalocardia brasiliana, 5% de gastrópodes indeterminados e
aproximadamente 15% de fragmentos líticos.
A AF 4, superior, é composta principalmente por fragmentos de conchas de
diversas espécies e fragmentos de ossos de peixe. Na sua porção superior, apresenta
desenvolvimento de solo incipiente de estrutura granular, com maior freqüência de
65
A arqueofácies 1, identificada neste trabalho, corresponde à camada 6 da descrição estratigráfica
realizada por Ferraz (2010).
66
A arqueofácies 3, identificada neste trabalho, corresponde à 4 da descrição estratigráfica realizada por
Ferraz (2010).
149
raízes finas (<5 mm). A assembléia faunística da AF 4 67 é semelhante a da AF 3, com
pouco mais de 60% de Ostrea sp., menos de 10% de Anomalocardia brasiliana e quase
10% de fragmentos líticos, com porcentagem menor que 5% de gastrópodes
indeterminados e de marisco (Ferraz 2010).
Granulometria
Análises granulométricas foram realizadas para verificar o vínculo da fração
terrígena presente no sambaqui com aquela disponível nas imediações do sítio,
relacionada com sedimentos coluvionares, provenientes dos morros graníticos das
proximidades, e lagunares. Para realizar a comparação, coletaram-se amostras de
trincheira aberta a cerca de 80 m a nordeste da seção estudada do sambaqui Caipora
(Figura 5.11). Nesta trincheira, observa-se mudança gradual, da base até o topo, de
fácies de argila siltosa (Fácies A) a argila arenosa (Fácies B). Destaca-se a presença de
areia grossa e muita grossa, grânulos e pequenos seixos, inclusive de feldspato e líticos
granitóides. Esta sucessão pode ser interpretada como uma fácies de margem lagunar
com maior aporte de colúvio (formado por areias angulosas) até o topo.
67
A arqueofácies 4, identificada neste trabalho, corresponde à camada 3 da descrição estratigráfica
realizada por Ferraz (2010).
150
Figura 5.10. Seção vertical estudada do sítio Caipora; A) localização dos pontos de amostragem e
descrição das arqueofácies identificadas; B) seção transversal esquemática (sem escala) da área de
localização do sítio.
151
Figura 5.11. Amostragem externa ao sítio Caipora: A) localização do ponto de amostragem; B) entorno de
localização do sítio com afloramento granítico localizado a SE do sambaqui; C) descrição das fácies
identificadas; D) trincheira amostrada com localização das fácies.
O histograma da distribuição granulométrica da Fácies A (Figura 5.12 A),
comparado com o histograma da distribuição granulométrica da AF 1 do sambaqui
Caipora, mostra maior presença de grânulos no sambaqui e domínio das frações areia
média e areia muito fina no depósito natural. A diferença nas distribuições
granulométricas evidencia a escassa relação do depósito antrópico com os sedimentos
naturais de paleolaguna adjacentes; em contrapartida, o depósito antrópico é dominado
pelas classes grânulos e areia muito grossa, atribuídas ao aporte coluvionar. Ao mesmo
tempo, a distribuição granulométrica da AF 1 apresenta a polimodalidade e assimetria
que, segundo Brochier (2002), caracteriza os sedimentos arqueológicos 68 . Distribuições
granulométricas polimodais assimétricas são típicas de misturas de várias populações de
sedimentos (Spencer, 1963; Visher, 1969).
68
Distribuições polimodais foram constatadas também nos sedimentos do sambaqui Jabuticabeira 2
(Villagran, 2008).
152
Figura 5.12. Histogramas da distribuição granulométrica para a Fácies A do ponto de amostragem externo
ao sambaqui Caipora e da AF 1 do mesmo sambaqui. Note-se o domínio dos pelíticos na Fácies A e das
frações grânulo, areia muito grossa e areia fina na AF 1.
A análise com microscópio estereoscópico dos grãos que compõem os sedimentos
da AF 1, retidos nas malhas de 1 mm (areia muito grossa) e 0,5 mm (areia grossa),
indica o predomínio da fração terrígena (fragmentos líticos, quartzo, feldspato). A
observação dos grãos na lupa confirma o domínio de componentes mineralógicos
angulosos, junto com feldspatos euédricos e fragmentos líticos granitóides, que
corrobora a origem coluvionar já detectada na análise ganulométrica. Dentre os
componentes biológicos (concha, osso e carvão), observa-se leve predomínio de
conchas, neste caso fragmentadas, sobre restos ósseos (Figura 5.13). Nesta escala de
análise, as proporções de conchas e de ossos não aparecem tão díspares quanto na
análise zooarqueológica, onde se constatou predomínio marcante das conchas.
Figura 5.13. Fotomicrografias à lupa estereoscópica dos grãos retidos nas malhas de 1,0 mm e 0,5 mm da
arqueofacies 1 do sítio Caipora. Note-se a presença de ossos (o), conchas (ch), fragmentos líticos (fl) e
quartzo (q).
153
Isótopos de C e N (δ13C e δ53N)
Análises de isótopos de C e N foram realizadas exclusivamente na AF 1 e na
Fácies A da amostragem externa. Os valores de δ13C indicam a presença de MO
derivada de algas ou da decomposição de plantas de ciclo fotossintético C3. Para
diferenciar entre as duas fontes possíveis de MO, combinaram-se os dados de δ13C com
os de razão C/N. Os valores de razão C/N confirmam a presença de plantas C3 no
sedimento do sambaqui e excluem a possibilidade de se encontrarem algas como
componente orgânico principal no sítio (Figura 5.14 A).
Figura 5.14. Análises isotópicas (δ13C e δ15N e razão C/N) de duas amostras provenientes da AF 1 do sítio
Caipora, e uma amostra da Fácies A da trincheira aberta em área externa ao sítio: A) gráfico de valores de
δ13C e razão C/N com intervalos definidos para plantas de ciclo fotossintético C3 e algas, segundo
parâmetros de Boutton (1996), Lamb et al. (2006), Meyers (1997), De Niro e Epstein (1978), De Niro e
Hastrof (1985) e Sifeddine et al. (2004); B) gráfico dos valores de δ15N e δ13C com intervalos definidos
para plantas de ciclo fotossintético C3 e animais marinhos, segundo parâmetros definidos por Ben-David
et al. (1998), Commisso & Nelson (2006), Fogg et al. (1998), Morris et al. (2005) e De Niro (1987).
Os valores de δ15N na AF 1 mostram que, além do componente vegetal, pode
existir aporte de nitratos de origem animal nos sedimentos do sambaqui (Figura 5.14 B).
Solos onde houve aporte de tecidos animais apresentam valores de δ15N de +8‰ a
+20‰, devido ao enriquecimento metabólico de δ15N nos animais com relação à sua
dieta (Fogg et al., 1998; Kendall, 1998). Assim, o sítio Caipora apresenta mistura de
fontes de MO: plantas C3 e resíduos derivados da decomposição de tecidos animais.
Dentre os diferentes tipos de resíduos animais que podem existir na MO de solos e
sedimentos, os valores encontrados no sambaqui Caipora correspondem ao intervalo
definido para resíduos de animais marinhos, segundo dados de referência em Ben-David
et al. (1998), Commisso & Nelson (2006), Fogg et al. (1998), Morris et al. (2005) e De
154
Niro (1987). Isto é condizente com a assembleia arqueofaunística do sítio, caracterizada
pelo predomínio de moluscos (Ferraz, 2010), e com as constatações realizadas a partir
da descrição macroscópica das sucessões estratigráficas, onde se observou a presença de
conchas e ossos de peixe.
Cabe ressaltar que, na amostra coletada na trincheira externa ao sítio Caipora
(Fácies A), os valores de δ13C e δ15N indicam unicamente presença de plantas C3
(Figura 5.14 A,B). Em relação a esses valores, a MO do sambaqui mostra
enriquecimento em nitrogênio derivado da ação antrópica, associada com a deposição
de restos de animais, ricos em nitratos de origem animal.
Micromorfologia
Amostras para micromorfologia foram coletadas das AF 3 e 4, assim como da
transição entre as AF 2 e 3, e da AF 4 com o horizonte pedogênico A. Na Figura 5.15,
apresenta-se o desenho esquemático das cinco seções delgadas analisadas no sambaqui,
com a identificação das microfácies observadas em cada lâmina. Nas amostras 3, 4a e
4b foi identificada uma única microfácies, correspondente às AF 3 e 4, respectivamente.
Na amostra 2/3 foram identificadas duas microfácies, correspondentes às AF 2 e 3,
assim como na amostra 4/HzA identificaram-se duas microfácies, que representam a AF
4 e o horizonte de solo superficial que se desenvolve no topo da sucessão vertical. A
Tabela 5.1 reúne a descrição geral de porosidade, microestrutura, razão g/f
(grosso/fino), distribuição relacionada g/f, componentes inorgânicos e orgânicos da
fração grossa, micromassa, limpidez, b-fábrica e feições pedológicas das cinco lâminas
analisadas do sítio Caipora, com as microfácies identificadas em cada lâmina.
155
Figura 5.15. Desenho esquemático das cinco seções delgadas analisadas no sítio Caipora, com localização
do bloco de amostragem na sucessão vertical e identificação de microfácies na lâmina.
156
Tabela 5.1. Descrição micromorfológica do sambaqui Caipora.
••••
•••
•••
••
•
••
••
100300µm
Microagregados
interligados
intergranulares
en,
80/20 por
quit
••••
150450µm
Microagregados
interligados
intergranulares
80/20
quit
gef
••••
•••
•••
•••
•••
••
••
•
••
••
Fábrica b
en,
80/20 por
quit
%
Limpidez
Microagregados
interligados
intergranulares
Microestrutura
Micromassa
Cor
Dist. rel. g/f
Carvão
gr
25
Osso
e-cx
100300µm
Tam.
razão g/f
Agregados
gr
Ag. argila
3
e-cx
40
vs
Frag lítico
3
gr
Feldspato
3
e-cx 30
Quartzo
2
%
Concha
2-3
mF
Porosidade
Am.
Tecidos
Raízes
Fr. org.
gr.
Fr. min. gr.
Composição
95
pt
cri
Micrita e argila
5
op
ind Microcarvão
95
pt
cri
5
op
ind Microcarvão
95
pt
cri
5
op
ind Microcarvão
95
pt
cri
5
op
Micrita e argila
Micrita e argila
•••
FP
rev
Fe-nod
rev
Fe-nod
rev
Fe-nod
•
4a
4
e-cx
vs
40
gr
100350µm
Microagregados
interligados
intergranulares
en
80/20 gef
quit
••••
•••
•••
••
••
•
Micrita e argila rev
hiporev
Fe-nod
ind Microcavão
Freqüências de classes segundo Bullock et al. (1985): • Muito Poucas (< 5%); •• Poucas (5-15%) ; ••• Comum (15-30%) ; •••• Freqüente (30-50%); ••••• Dominante (50-70%);
•••••• Muito dominante (>70%). Am. = amostra; mF = microfácies; Tam.= tamanho; Fr. min. gr. = fração mineral grossa; Fr. org. gr. = fração orgânica grossa; FP = feições
pedológicas. O singificado das demais abreviações utilizadas nesta tabela encontra-se no Anexo, Tabela A.5.
157
Tabela 5.1. continuação.
Hz
A
e-cx
vs
cm
cn
fs
30
15
gr
250gr
500µm
Grânulos
coesivos
50/50
por
•••
•••
••
•
••
••••
•••
•••
••••
••
•••
••
••
••
••
Cor
••••
Tecidos
Raízes
Osso
gef
70/30 quit
en
Equinóide
150450µm
Microagregados
interligados
intergranulares
Frag lítico
en
80/20 gef
quit
Feldspato
Microagregados
interligados
intergranulares
Quartzo
100300µm
Concha
Dist. rel. g/f
razão g/f
gr
Microestrutura
%
Fábrica b
4
30
Tam.
Micromassa
Limpidez
HzA/4
4
e-cx
cn
fs
%
Agregados
4b
mF
Porosidade
Am
Carvão
Fr. org.
gr.
Fr. min. gr.
95
pt
cri
5
op
Micrita e argila rev
Fe-nod
ind Microcavão
95
pt
cri
5
op
•
••
pt
Composição
FP
rev
Micrita e argila hiporev
Fe-nod
ind Microcavão
ench
exc
cri
rev
hiporev
Argila e micrita
Fe-nod
exc
158
Tabela 5.2. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra CA 2-3.
CA 2-3
mF
%
Tamanho
Forma
Arredondamento
Seleção
Distribuição
básica
Concha
2
43
Vários
-
-
Não selecionado
Aleatória/ linear
Quartzo
2
20
Equidimensional
Subanguloso
Seleção moderada
Aleatória
Feldspato
2
Equidimensional
Subanguloso
Bem selecionado
Aleatória
15
5
Areia grossa a
fina
Areia média
Frag. Lít.
2
Osso
2
10
Grânulo, areia
muito grossa
Vários
Ag. argila
Carvão
2
2
2
5
Concha
3
43
Quartzo
3
20
Feldspato
3
Frag. Lít.
3
15
5
Osso
3
10
Areia grossa a
fina
Areia média
Grânulo, areia
muito grossa
Vários
Ag. argila
Carvão
3
3
2
5
Grânulo
Vários
Orientação
básica
80% paralelismo
de ângulo baixo
Distribuição
referenciada
Inclinado á
superfície
Alteração
Queima e
dissolução
-
-
-
-
Queima e
dissolução
-
-
Equidimensional
Subanguloso
Bem selecionado
Aleatória
-
-
Não selecionado
Aleatória
-
-
Grânulo
Vários
Equidimensional
-
Anguloso
Anguloso
Não selecionado
Não selecionado
Aleatória
Aleatória
-
-
Vários
-
-
Não selecionado
Aleatória
-
-
Queima e
dissolução
Equidimensional
Subanguloso
Bem selecionado
Aleatória
-
-
-
Equidimensional
Subanguloso
Seleção moderada
Aleatória
-
-
Equidimensional
Subanguloso
Bem selecionado
Aleatória
-
-
-
Não selecionado
Aleatória
-
-
Equidimensional
-
Anguloso
Anguloso
Não selecionado
Não selecionado
Aleatória
Aleatória
-
-
Queima e
dissolução
-
159
Tabela 5.3. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra CA 3.
CA 3
mF
Concha
Quartzo
%
Tamanho
Forma
Arredondamento
Seleção
Distribuição
básica
Orientação
básica
Distribuição
referenciada
40
Vários
-
-
Não selecionado
Aleatória
-
-
Equidimensional
Subanguloso
Seleção moderada
Aleatória
-
-
-
Equidimensional
Subanguloso
Bem selecionado
Aleatória
-
-
Equidimensional
Subanguloso
Bem selecionado
Aleatória
-
-
-
-
Não selecionado
Aleatória
-
-
-
Não selecionado
Aleatória
-
Queima e
dissolução
-
Feldspato
Frag. Lít.
14
10
Osso
10
Areia grossa a
fina
Areia média
Grânulo, areia
mto. grossa
Vários
Carvão
1
Vários
25
-
Alteração
Queima e
dissolução
160
Tabela 5.4. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra CA 4a.
CA 4a
mF
Concha
Quartzo
%
Tamanho
Forma
Arredondamento
Seleção
Distribuição
básica
30
Vários
-
-
Não selecionado
Aleatória/ linear
Equidimensional
Subanguloso
Seleção moderada
Equidimensional
Subanguloso
Equidimensional
Feldspato
Frag. Lít.
28
10
Osso
5
Areia grossa a
fina
Areia média
Grânulo, areia
mto. grossa
Vários
Carvão
2
Vários
25
Orientação
básica
30% paralelismo
de ângulo baixio
Distribuição
referenciada
Inclinado á
superfície
Alteração
Queima e
dissolução
Aleatória
-
-
-
Bem selecionado
Aleatória
-
-
Subanguloso
Bem selecionado
Aleatória
-
-
-
-
Não selecionado
Aleatória
-
-
-
Não selecionado
Aleatória
-
Queima e
dissolução
-
-
161
Tabela 5.5. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra CA 4b.
CA 4b
mF
Concha
Quartzo
%
Tamanho
Forma
Arredondamento
Seleção
Distribuição
básica
Orientação
básica
50% paralelismo
de ângulo baixo
Distribuição
referenciada
Inclinado á
superfície
Alteração
Queima e
dissolução
33
Vários
-
-
Não selecionado
Aleatória/ linear
Equidimensional
Subanguloso
Seleção moderada
Aleatória
-
-
-
Equidimensional
Subanguloso
Bem selecionado
Aleatória
-
-
Subanguloso
Bem selecionado
Aleatória
-
Equidimensional
-
-
-
Não selecionado
Aleatória
-
Queima e
dissolução
Muito bem
selecionado
Não selecionado
Aleatória
-
Aleatória
-
-
-
Feldspato
Frag. Lít.
20
9
Osso
10
Areia grossa a
fina
Areia média
Grânulo, areia
mto. grossa
Vários
Equinóide
1
625-645 µm
-
-
Carvão
2
Vários
-
-
25
162
Tabela 5.6. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra CA HA-4.
CA HA-4
%
Tamanho
Forma
Grau de
Arredondamento
Seleção
Distribuição
básica
Orientação
básica
Distribuição
referenciada
15
Vários
-
-
Não selecionado
Aleatória
-
-
Equidimensional
Subanguloso
Bem selecionado
Aleatória
-
-
-
Equidimensional
Subanguloso
Bem selecionado
Aleatória
Equidimensional
-
Subanguloso
-
Bem selecionado
Não selecionado
Aleatória
Aleatória
-
-
-
-
Queima e
dissolução
-
-
Queima e
dissolução
-
-
-
-
-
Queima e
dissolução
-
Concha
mF
HzA
Quartzo
HzA
Feldspato
HzA
20
Frag. Lít.
Osso
HzA
HzA
5
10
Areia média a
fina
Areia média a
fina
Grânulo
Vários
Raízes
HzA
5
~300 µm
-
-
-
Aleatória
Concha
4
43
Vários
-
-
Não selecionado
Aleatória
Equidimensional
Subanguloso
Seleção moderada
Aleatória
45
Quartzo
4
30
Feldspato
4
10
Frag. Lít.
4
5
Osso
4
10
Areia grossa a
fina
Areia média a
fina
Grânulo, areia
muito grossa
Vários
Raízes
4
2
~200 µm
Equidimensional
Subanguloso
Bem selecionado
Aleatória
Alteração
Queima e
dissolução
-
-
Equidimensional
Subanguloso
Bem selecionado
Aleatória
-
-
Não selecionado
Aleatória
-
-
-
-
Aleatória
-
-
163
Em todas as microfácies estudadas, a fração grossa aparece composta por
conchas, grãos de quartzo, feldspato, fragmentos líticos e ósseos. Todas as microfácies
têm distribuição espacial aleatória da fração grossa, exceto nas mF 2 e 4, onde se
observam conchas com trama sub-horizontal (Tabelas 5.2 a 5.4).
Poucas diferenças se observam na proporção dos diversos componentes da
fração grossa, com domínio constante de fragmentos de concha e terrígenos (Figura
5.16A). A fração mineral terrígena grossa inclui quartzo, feldspato e fragmentos líticos
subangulosos; relaciona-se com o transporte de sedimentos oriundos do afloramento
granítico das proximidades do sítio.
Dentre as conchas, observam-se espécies diversas de bivalves (Figura 5.16 C,
D) e gastrópodes (Figura 5.16 A, B). Em todos os casos, observam-se proporções
variáveis, entre 10 e 20%, de conchas com sinais de queima (Tabelas 5.2 a 5.6). A
identificação de efeito de queima nas conchas foi realizada segundo as observações do
experimento apresentado no tópico 1.2. Na Figura 5.17 E e F, mostra-se um exemplo de
fragmento de concha queimado possivelmente a temperaturas maiores que 600°C, dada
a coloração marrom escura a preta, a birrefringência baixa e a presença de fissuras
longitudinais. Além das conchas, que representam o componente mais conspícuo do
sítio, observaram-se igualmente numerosos fragmentos de osso. Os ossos apresentam
sinais de queima, com coloração vermelho escuro (PPL) (Figura 5.17 A, B, E, F) e
dissolução, como bordas suaves e birrefringência baixa nos fragmentos aparentemente
não queimados. Em alguns casos, é possível identificar o tipo de osso, como no caso da
vértebra da Figura 5.17 C, D.
164
Figura 5.16. Gráficos com porcentagens dos diferentes componentes microscópicos das mF 2, 3, 4 e
horizonte de solo superficial (Hz A) do sítio Caipora: A) freqüências de componentes da fração grossa; B)
relação de porcentagens de poros, fração grossa e fração fina. Note-se a diminuição da porosidade e
aumento da fração fina no horizonte superficial.
Figura 5.17. Fotomicrografias de moluscos encontrados no sítio Caipora: A) gastrópode; B) fragmentos
de concha de craca; C) bivalve indeterminado; D) fragmentos de ostra, identificados pela fibrosidade
longitudinal da concha; E, F) concha queimada a temperatura maior que 600° C, a PPL e XPL.
165
Figura 5.18. Fotomicrografias de ossos queimados no sítio Caipora: A, B) ossos queimados, reconhecidos
respectivamente por bordas avermelhadas, a PPL, e birrefringência baixa, a XPL; C, D) vértebras de
peixe, freqüentemente encontradas e facilmente identificáveis em seção delgada, a PPL e XPL.
Em toda a seção vertical, a micromassa é formada por grânulos69 mamilares
coesivos, microestrutura de microagregados intergranulares interligados e vazios de
empacotamento complexo, com presença subordinada de vazios vesiculares, canais,
fissuras e vazios em câmara. A distribuição relacionada g/f varia entre gefúrica,
quitónica e enáulica em todas as amostras, menos na microfácies correspondente ao
horizonte A incipiente, que apresenta tipo porfírico (Tabela 5.1).
69
Em micromorfologia, o termo grânulo usa-se para referir a agregados massivos de material fino, sem
relação com o uso do termo como classe granulométrica (partículas de 2-4 mm).
166
A micromassa predominante é cristalítica e pontuada, às vezes turva, formada
por mistura entre argila organomineral 70 e micrita derivada da dissolução e precipitação
do carbonato de cálcio das conchas (Figura 5.19 C-F, 5.20 C-F. 5.22 C-F). Dentre os
agregados, observam-se, em todos os casos, fragmentos na fração silte de ossos e
conchas, junto com microcarvões e nódulos de óxi-hidróxidos de ferro. As diferenças de
coloração na micromassa, que vai de marrom escuro a marrom cinzento, devem-se à
maior ou menor quantidade de argila organomineral na fração fina. Quanto maior o
conteúdo de argila organomineral, mais amarronzada é a coloração, e, quanto menor, e
com maior proporção de micrita, mais cinzenta ela é. Em toda a seção vertical, exceto
na microfácies correspondente ao horizonte A incipiente, existe outra micromassa
subordinada, de coloração preta, opaca e indiferenciada, formada por microcarvões que
se apresentam na forma de agregados (<300 μm) e revestimentos (Tabela 5.1).
Análises com microscopia eletrônica de varredura (MEV) e espectrometria de
energia dispersiva (EED) foram realizadas unicamente na seção delgada CA 2/3 para
checar a composição da fração fina inferida pelas propriedades ópticas. As
microanálises semiquantitativas no sistema MEV-EED mostram predomínio de sílica na
micromassa (~30 %), seguido de Ca (~9 %), Al (~7-8 %), Fe (~3 %) e P (~1-2 %) com
concentração menor a 1% de outros elementos (K, Mg, Ti, Na, Mn) (Anexo, Figura
A.4). Esta composição confirma a presença de argilominerais com carbonato de cálcio
derivado da dissolução das conchas, junto a minerais secundários formados a partir da
dissolução e precipitação da apatita dos ossos.
As mF 2 diferencia-se da mF3 unicamente na maior concentração de fragmentos
de concha com orientação sub-horizontal. No restante de atributos, ambas as
microfácies apresentam a mesma porosidade, tipo de agregados, microestrutura e
distribuição relacionada g/f (Figura 5.19 B; Tabela 5.1). A composição da fração grossa
e micromassa não variam (Tabela 5.2). Na mF 3, destaca-se a alta fragmentação das
conchas, apesar de que, no campo, a AF 3 parecia conter mais conchas inteiras que o
restante da seção (Figura 5.19 C, D). Os ossos aparecem igualmente muito
fragmentados e com sinais de queima (cor vermelho escuro a preto) (Figura 5.19 E, F).
A mF 4 apresenta características semelhantes nas três seções estudadas (Figura
5.20). Destaca-se a maior proporção de conchas com traços de queima a temperatura
70
Entende-se por argila organomineral a fração fina formada por argilominerais ligados a particulas de
MO coloidal. 167
superior aos 500°C (cor cinza escuro a preto, fissuras internas, baixa birrefringência).
As conchas e ossos estão muito fragmentados, com poucos indivíduos inteiros e todos
com marcas de dissolução na forma de micrita e espato precipitado na borda dos
fragmentos (Figura 5.20 C, D). A assembléia faunística inclui restos de bivalves e
gastrópodes. Entre 30 e 50% das conchas inteiras, mais fragmentos grossos de concha,
identificados na mF 4, apresentam distribuição sub-horizontal. O restante dos
componentes ocorre aleatoriamente distribuído (Tabela 5.1, 5.4 e 5.5).
Na amostra CA 4b, identificaram-se dois espinhos de equinóide (Figura 5.21),
associados à presença de restos de ouriço do mar no sítio. Este achado sugere transporte
até o sítio de espécies que vivem tipicamente em costões rochosos.
A microfácies mais diferenciada do restante da seção corresponde à porção
superficial da amostra CA HzA-4, que representa a formação de solo incipiente no topo
da coluna (Figura 5.23). Esta microfácies apresenta microestrutura de grânulos
coesivos, interligados, maior compactação, menor conteúdo de conchas e micromassa
marrom avermelhado composta principalmente por argila organomineral, com micrita
(Figura 5.23). Os fragmentos de concha e osso apresentam também sinais de queima. A
transição entre o horizonte de solo e a mF 4 é abrupta, formada por microestrutura
granular com alta separação.
As feições pedológicas incluem, em todos os casos, alta freqüência de
revestimentos típicos e descontínuos, não laminados, de coloração marrom escuro,
formados por micrita impura com argila organomineral e microcarvões (Figura 5.22 A,
B). Também existem, em menor proporção, revestimentos não laminados, cor cinza
escuro, de micrita com inclusões de partículas opacas. Na micromassa, observam-se
nódulos de óxi-hidróxidos de ferro órticos, com tamanhos entre 50 a 100 µm e
impregnação moderada a alta. Na mF 4, além dos revestimentos de micrita e nódulos de
ferro, também aparecem hiporrevestimentos-revestimentos de óxidos de ferro de
impregnação moderada e enchimentos densos e incompletos de micrita (Figura 5.22 C,
D). Excrementos elipsóides foram observados unicamente na amostra mais superficial,
tanto na mF 4 como na mF Hz A (Tabela 5.1).
168
Figura 5.19. Fotomicrografias da mF 3: A) seção vertical esquemática com localização da amostra para
micromorfologia; B) massa basal composta por fragmentos de concha, osso, e grãos minerais, PPL; C, D)
microestrutura de microagregados intergranulares interligados, composta por mistura de argilominerais
com micrita secundária, a PPL e XPL; E, F) detalhe da micromassa, com finos fragmentos de osso
queimado e agregados de microcarvões no interior, a PPL e XPL.
169
Figura 5.20. Fotomicrografias da mF 4: A) seção vertical esquemática com localização da amostra para
micromorfologia; B) massa basal composta por fragmentos de concha, conchas queimadas, ossos, e grãos
minerais, PPL; C, D) microestrutura de microagregados integranulares interligados, composta por mistura
de argilominerais com micrita secundária a PPL e XPL; E, F) detalhe da micromassa, com fragmentos de
osso queimado, concha e grãos de quartzo, a PPL e XPL.
170
Figura 5.21. Fotomicografias de espinhos de equinoide encontrados na mF 4b do sítio Caipora, a PPL
(A,C) e XPL (B,D).
Figura 5.22. Feições pedológicas do sítio Caipora: A, B) revestimentos de micrita e argilominerais
impuros, a PPL e XPL; C, D) enchimentos de micrita límpida, a PPL e XPL. Os enchimentos
caracterizam-se por ocuparem a totalidade do poro ou vazio em que infiltram, enquanto os revetimentos
cobrem apenas as paredes dos poros e/ou a superfície dos componentes da fração grossa.
171
Figura 5.23. Fotomicrografias da transição entre mF 4 e horizonte de solo na superfície da seção vertical
analisada: A) seção vertical esquemática com localização da amostra para micromorfologia; B) massa
basal composta principalmente por grãos de quartzo, feldspato e fragmentos líticos, com presença
subordinada de conchas e ossos no horizonte A superficial, PPL; C, D) transição entre o horizonte de
solo, sem conchas, e a mF 4, com fragmentos de conchas e maior porosidade, a PPL e XPL; E, F) detalhe
da massa basal da mF 4, com fragmentos de concha de diverso tamanho, a PPL e XPL.
Em termos gerais, toda a coluna do sítio Caipora caracteriza-se pela intensa
dissolução e precipitação do carbonato de cálcio das conchas que compõem o sambaqui.
Este processo não biogênico de formação de microfábricas carbonáticas está
relacionado com a existência de solução de solo hiper-saturada em carbonato de cálcio,
derivada da alteração química das conchas, que causa precipitação e cristalização na
forma de micromassas cristalinas de carbonato de cálcio (Brewer, 1964). Estas
172
micromassas, também chamadas de micromassas alfa em calcretes (Alonso-Zarza and
Wright, 2010), podem incluir cristais de tamanho micrítico até espático e inclusive
partes de cristais mais grossos distribuídos entre a micrita ou microesparita.
A precipitação e cristalização de carbonato de cálcio observam-se na
micromassa micrítica que caracteriza o sítio Caipora e na recorrência de feições
pedológicas como revestimentos, hiporrevestimentos-revestimentos e enchimentos de
micrita, com conteúdo variável de argila organomineral e microcarvões. A
microestrutura formada por carbonato de cálcio secundário na forma de microagregados
interligados (pontes/ meniscos), indica condições vadosas de formação, ou seja,
formação em condições de não saturação de água em ambiente de percolação. As
mesmas condições de formação são sugeridas pelos nódulos de óxi-hidróxido de ferro
que se observam recorrentemente da base ao topo do perfil.
2.1.2. Cubículo 1 O sítio Cubículo 1, localizado a aproximadamente 4 km a nordeste do sítio
Caipora e aproximadamente 15 km da atual linha de costa, apresenta forma lenticular,
com topo convexo. As camadas estão compostas por material solto e muito friável, com
alta concentração de sepultamentos humanos visíveis nas seções expostas. Na seção
escolhida para estudo, identificaram-se nove arqueofácies, com desenvolvimento de
horizonte de solo no topo do sambaqui (Figura 5.24). A base da seção não chega a
expor o contato inferior do sambaqui, provavelmente com o embasamento granítico.
A AF 1, na base, diferencia-se do resto da sucessão pela alta freqüência de
conchas e ossos de peixe muito fragmentados (>50%). Na AF 2, aumenta a presença de
conchas inteiras e fragmentos grossos (> 1cm) de conchas e ossos de peixe. Na
assembleia arqueofaunística, dominam Ostrea sp. (70%) e A. brasiliana (14%), com
frequência subordinada de Chione cancelata (1%), otólitos de bagre e corvina e
gastrópodes (<1%). A AF 3 contém o mesmo tipo de areia de ossos fragmentados que
se observou na AF 1, porém, com maior frequência de conchas (61% de Ostrea sp. e 20
% de A. brasiliana e 2% Chione cancelata) e com lentes de carvão.
Na AF 4, aumenta a quantidade de conchas inteiras que também aparecem
fragmentadas em matriz de areia bioclástica e ossos moídos. Predomina Ostrea sp.
173
(~80%), com frequência menor a 1% de A. brasiliana e outros bivalves e gastrópodes 71 .
A AF 5 destaca-se pela espessura centimétrica, coloração preta e maior conteúdo de
lama. A concentração de sepultamentos humanos aumenta tanto sobre como nas
proximidades desta arqueofácies. Neste sentido, AF 5 apresenta características
semelhantes às camadas pretas centimétricas descritas nos sítios Jabuticabeira 2 e
Caipora. Acima da AF 5, observa-se uma camada de areia bioclástica, composta
principalmente por fragmentos de ossos de peixe, identificada como AF 6. A AF 7
diferencia-se pela alta frequência de conchas inteiras (90%), com presença subordinada
de ossos de peixe e carvões. Na assembleia arqueofaunística desta arqueofácies,
predomina Ostrea sp. (77%), seguida de A. brasiliana (5%). Na AF 8, o predomínio é
de Ostrea sp. (93% na análise arqueofáunística 72 ), sem A. brasiliana, e com
porcentagens menores que 0,5% de outros bivalves e gastrópodes. Na AF 9, no topo da
sucessão, observa-se a alteração pedogênica do depósito arqueológico, com maior teor
de lama que de cascalho bioclástico, e transição cortante (de 2 a 5 cm) com a
arqueofácies subjacente.
Granulometria
Na amostragem externa ao sítio, realizada em trincheira aberta a cerca de 40 m a
noroeste da seção estudada do sambaqui, identificaram-se duas fácies. A sucessão
observada corresponde a fácies de areia grossa com lama sobreposta por fácies de argila
arenosa (Figura 5.25). Esta sucessão pode ser interpretada como fácies de margem
lagunar, onde a ação das ondas consegue transportar grãos de areia maiores, seguida de
fácies de brejo, onde as águas são rasas e calmas e sedimentam materiais finos
armadilhados em meio à vegetação rasteira. As areias angulosas e grossas que
caracterizam a fácies inferior teriam chegado à paleolaguna por escoamento superficial
(enxurradas desconfinadas) a partir dos morros graníticos das proximidades, localizados
cerca de 120 m a SE da seção amostrada.
71
72
Análise zooarqueológica da AF 1 realizada por Daniela Klokler. Análise zooarqueológica da AF 4 realizada por Daniela Klokler. 174
Figura 5.24. Seção vertical estudada do sítio Cubículo 1: A) localização dos pontos de amostragem e
descrição das arqueofácies identificadas; B) seção transversal esquemática (sem escala) da área de
localização do sítio.
Análises granulométricas da fração terrígena foram realizadas nas amostras
provenientes da AF 5, assim como das duas fácies identificadas na amostragem externa
ao sítio. Estas análises confirmam as observações realizadas em campo, ao mostrar o
domínio das classes grânulo e areia muito grossa, supostamente ligadas ao aporte
coluvionar, na Fácies A, inferior, e a diminuição destas duas classes, acompanhada de
aumento no teor de areia grossa a areia fina na Fácies B, superior (Figura 5.26 A, C). Na
AF 5, observa-se a distribuição granulométrica bimodal que caracteriza os sedimentos
arqueológicos de sambaquis, com moda nas frações areia muito grossa e areia fina.
175
Como observado no sítio Caipora, a distribuição bimodal indica aporte de várias
populações de sedimentos na fração terrígena do sambaqui.
Diferente do sítio Caipora, a observação no microscópio estereoscópico das
frações areia muito grossa e grosssa da AF 5 mostra o predomínio de fragmentos de
conchas, com freqüência subordinada de ossos, terrígenos (grãos de quartzo, feldspato e
fragmentos líticos) e carvão (Figura 5.27).
Figura 5.25. Amostragem externa ao sítio Cubículo 1: A) localização do ponto de coleta; B) entorno de
localização; C) descrição das fácies identificadas; D) trincheira amostrada, com posição das fácies.
176
Figura 5.26. Histogramas da distribuição granulométrica para as Fácies A e B do ponto de amostragem
externa ao sambaqui Cubículo 1, e da AF 5 do mesmo sambaqui. Note-se o domínio de grânulos e
pelíticos nas Fácies A e B, respectivamente, e a distribuição bimodal na AF 5.
Figura 5.27. Fotomicrografias à lupa estereoscópica dos grãos retidos nas malhas de 1,0 mm e 0,5 mm da
AF 5 do sítio Cubículo 1. Note-se presença de ossos (o), conchas (ch), carvão (cr) e quartzo (q).
Isótopos de C e N (δ13C e δ53N)
Os valores de razão C/N da MO que compõe a AF 5 sugerem presença de restos
vegetais de plantas terrestres de ciclo fotossintético C3 no sambaqui (Figura 5.28 A;
Tabela A.1). Ao combinar os valores de δ13C com os de δ15N da MO, tem-se indicação
de possível mistura de restos vegetais com resíduos derivados de decomposição de
tecido animal, como no sitio Caipora (Figura 5.28 B). O valor de δ15N da AF 5
aproxima-se do intervalo definido para solos enriquecidos em restos de tecidos de
animais marinhos (valores de δ15N superiores a +11‰), segundo Ben-David et al.
(1998), Commisso & Nelson (2006), Fogg et al. (1998), Morris et al. (2005) e De Niro
(1987). No entanto, apesar do enriquecimento em δ15N, é provável que a MO da AF 5
derive principalmente de espécies arbustivas já que os valores isotópicos posicionam a
amostra próximo ao intervalo definido para plantas C3. O domínio de vegetais
possivelmente relaciona-se à alta frequência de carvões no sedimento, com aporte
177
subordinado de resíduos da decomposição de tecido animal, vinculados à presença
conspícua de ossos de peixe.
Diferente da situação observada no sambaqui, os valores de δ13C e δ15N das fácies
naturais, na trincheira externa ao sítio, indicam aporte exclusivo de MO de origem
vegetal. Os valores de δ13C e δ15N da Fácies A são muito próximos daqueles registrados
para a Fácies B e indicam mistura de MO de origem terrestre e aquática (Figura 5.28 A,
B).
5.28. Análises isotópicas (δ13C e δ15N e razão C/N) de amostra proveniente da AF 5 do sítio Cubículo 1, e
de amostras das Fácies A e B da trincheira aberta em área externa ao sítio: A) gráfico de valores de δ13C e
razão C/N com intervalos definidos para plantas de ciclo fotossintético C3 e algas; B) gráfico dos valores
de δ15N e δ13C com intervalos definidos para plantas de ciclo fotossintético C3 e animais marinhos.
Micromorfologia
A alta friabilidade dos sedimentos que compõem este sambaqui, formados
principalmente por bioclastos (conchas e ossos de peixe) inteiros e fragmentados, sob
presença subordinada de fração fina coesiva, inviabilizou a coleta de amostras
indeformadas para micromorfologia, exceto na AF 9, a mais coesiva da seção estudada,
onde se conseguiu coletar um bloco de sedimento.
Na seção delgada da AF 9 observaram-se duas microfácies, que correspondem ao
horizonte de solo superficial do topo do sambaqui (mF HzA) e à AF 9 propriamente dita
(mF 9) (Figura 5.29; Tabela 5.7). Os componentes da fração grossa incluem conchas,
quartzo, feldspato, fragmentos líticos, ossos, raízes frescas, carvão e restos de tecidos
(Tabela 5.8; Figura 5.30). Ambas as microfácies apresentam microestrutura grumosa
(Figura 31 B, C), com micromassa formada por mistura, de cor marrom (PPL), de argila
178
organomineral (Figura 31 E, F). A granulometria, grau de isotropia e o arredondamento
dos grãos minerais (quartzo, feldspato e fragmentos líticos) confirmam a relação dos
sedimentos terrígenos do sambaqui com depósitos coluvionares associados aos morros
graníticos da região (Tabela 5.8).
Figura 5.29. Desenho esquemático da seção delgada analisada no sítio Cubículo 1, com localização do
bloco de amostragem na sucessão vertical e identificação de microfácies na lâmina.
Figura 5.30. Gráficos com porcentagens dos diferentes componentes microscópicos da mF 9 e do
horizonte de solo superficial (Hz A) do sítio Cubículo 1: A) frequências de componentes da fração grossa;
B) relação entre as porcentagens de poros, fração grossa e fração fina. Note-se o aumento da porosidade e
da fração fina no horizonte superficial.
179
Tabela 5.7. Descrição micromorfológica do sambaqui Cubículo 1.
10/90
mon
••
•••
•
••
••••
cr
<1 mm
Grumosa coesiva
30/70
en
••••
•••
•
••
•••
•
•
Fábrica b
Grumosa solta e
coesiva
%
Limpidez
Osso
2-5 mm
Micromassa
Cor
Frag lítico
cr
Raízes
Feldspato
30
Quartzo
9
e-cx
fs
vs
cn
Concha
40
Microestrutura
Dist. rel. g/f
HA
Tam.
razão g/f
%
vs
re
cn
fs
Agregados
HA-9
mF
Porosidade
Am
Carvão
Tecidos
Fr. org.
gr.
Fr. min. gr.
Composição
FP
••
pt
ind
ms
Argila e matéria
orgânica
Fe-nod
rev
exc
•
pt
ind
ms
Argila e matéria
orgânica
Fe-nod
rev
exc
Freqüências de classes segundo Bullock et al. (1985): • Muito Poucas (< 5%); •• Poucas (5-15%) ; ••• Comum (15-30%) ; •••• Freqüente (30-50%); ••••• Dominante (50-70%);
•••••• Muito dominante (>70%). Am. = amostra; mF = microfácies; Tam.= tamanho; Fr. min. gr. = fração mineral grossa; Fr. org. gr. = fração orgânica grossa; FP = feições
pedológicas. O singificado das demais abreviações utilizadas nesta tabela encontra-se no Anexo, Tabela A.5.
180
Tabela 5.8. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra CB1-9.
CB1-9
mF
%
Tamanho
Forma
Arredondamento
Seleção
Distribuição
básica
Orientação
básica
Distribuição
referenciada
Concha
HA
10
Vários
-
-
Não selecionado
Aleatória
-
-
Quartzo
HA
25
-
-
-
Feldspato
HA
3
-
-
-
Queima e
dissolução
-
Frag.lítico HA
7
Areia média a
fina
Areia média a
mto. fina
Areia fina
Osso
HA
40
Tecidos
Raízes
HA
HÁ
5
10
Silte, areia
média
~300 µm
300-500 µm
Concha
9
40
Vários
Quartzo
9
20
Feldspato
9
3
Frag.lítico
9
7
Osso
9
20
Carvão
Raízes
9
9
5
5
Alteração
Dissolução
Subanguloso e
subarredondado
Subanguloso e
subarredondado
Subanguloso e
subarredondado
Seleção moderada
Aleatória
Seleção moderada
Aleatória
Bem selecionado
Aleatória
-
-
Seleção moderada
Aleatória
-
-
-
-
Não selecionado
-
Aleatória
Aleatória
-
-
-
-
Não selecionado
Linear
Paralelismo de
ângulo baixo
Inclinado à
superfície
Dissolução
Seleção moderada
Aleatória
-
-
-
Seleção moderada
Aleatória
-
-
-
-
Equidimensional
Equidimensional
Equidimensional
Areia média a
Equidimensional
fina
Areia média a
Equidimensional
mto. fina
Areia mto.
Equidimensional
grossa, grânulo
Silte, areia
média
5mm
300-500 µm
-
Subanguloso e
subarredondado
Subanguloso e
subarredondado
-
-
Subanguloso
Seleção moderada
Aleatória
-
Seleção moderada
Aleatória
-
-
-
Anguloso
-
Não selecionado
-
Aleatória
Aleatória
-
-
-
181
Na mF HzA, ressalta a proporção elevada de fração fina, com razão g/f de 10:90
(Tabela 5.7). A microestrutura é formada pela combinação de grumos porosos coesivos,
de tamanho variável (Figura 5.31 B). Dentro destes grumos, observam-se diversos
bioporos, regulares, vesículas, canais e fissuras (Figura 5.31 E, F). Fora dos grumos,
observam-se numerosos canais associados com a atividade biológica do solo (fauna e
raízes). A presença de conchas na fração grossa é subordinada (10%) (Tabela 5.8), em
contraste à de fragmentos de osso (40%). Ambos os componentes apresentam sinais de
queima e de dissolução.
Na mF 9, os grumos são de tamanho menor que no horizonte de alteração, apesar
de igualmente coesivos (Figura 5.31 C, D). A porosidade é de empacotamento
complexo e a microestrutura varia entre grumosa e de agregados intergranulares (Tabela
5.7). A freqüência de conchas aumenta em comparação com o horizonte A, enquanto a
presença de ossos diminui (Tabela 5.8). Tanto as conchas quanto os ossos apresentam
sinais de queima e dissolução (Figura 5.32 A, B, F). Nesta microfácies, as conchas estão
distribuídas sub-horizontalmente (Tabela 5.8).
As feições pedológicas incluem nódulos de óxi-hidróxidos de ferro órticos, de
impregnação forte a moderada, revestimentos contínuos de argila organomineral, sem
laminação, ao redor dos fragmentos de osso e grãos minerais, assim como excrementos
esféricos, de coloração vermelho escuro (Figura 5.32 E), e excrementos mamilares, de
coloração marrom e composição igual à da micromassa.
182
Figura 5.31. Fotomicrografias da mF 9 e mF HzA do sítio Cubículo 1: A) seção vertical esquemática com
localização da amostra para micromorfologia; B) massa basal do horizonte superficial (mF HzA) com
maior freqüência de raízes e poucas conchas em relação a mF 9, PPL; C, D) massa basal da mF 9 com
microestrutura de grumos coesivos e fragmentos de concha e ossos, PPL e XPL; E, F) detalhe da
micromassa composta por argilominerais e MO, com fragmentos de osso e carvão, PPL e XPL.
183
Figura 5.32. Fotomicrografias de elementos encontrados no sítio Cubículo: A, B) concha queimada e
fragmento de osso com sinais de dissolução, PPL e XPL; C, D) fragmento de concha de Ostrea sp., PPL e
XPL; E) excrementos elipsóides no horizonte de solo superficial, PPL; F) fragmentos de concha, concha
queimada (fragmentos pretos) e ossos na mF 9, PPL.
2.1.3. Morrinhos O sítio Morrinhos é um dos maiores sambaquis da área de estudo, com
aproximadamente 130 m de cumprimento, 100 m de largura e 10 m de altura (Assunção
2010). A porção do sítio atualmente preservada localiza-se na face norte do morro das
Congonhas, onde se observa uma seção exposta de aproximadamente 20 m que
acompanha a borda do testemunho cristalino. A seção trabalhada neste estudo, de 3,45
m de altura, representa a porção média do sambaqui em termos de espessura, já que não
184
alcança o contato com o embasamento granitóide, nem o topo atual do sítio, este situado
aproximadamente 1 m acima.
Apesar da altura métrica da seção, foram nela identificadas somente quatro
arqueofácies (Figura 5.33). A AF 1, na base da seção, é composta principalmente por
valvas de Anomalocardia brasiliana inteiras (60%), com freqüência subordinada de
fragmentos de ossos de peixe e de mariscos (20%). A análise zooarqueológica confirma
o predomínio de A. brasiliana (38%), seguido de mariscos (13%) e cerca de 45% de
fragmentos de concha de tamanho menor que 2 mm 73 . A AF 2, de espessura
centimétrica, geometria lenticular e composta por lama preta com ossos de peixe, é
semelhante às camadas pretas também observadas nos sambaquis Caipora, Cubículo1 e
Jabuticabeira 2. Porém, no sítio Morrinhos, assim como em Caipora, não foram
identificados sepultamentos humanos nesta arqueofácies.
A AF 3, associada em todos os casos à AF 2, constitui-se de uma mistura de
conchas inteiras e fragmentadas, principalmente de Anomalocardia brasiliana, entre
outras espécies de moluscos. Acompanha o componente conchífero uma areia
bioclástica, composta por fragmentos de concha e ossos de peixe (50%). De espessura
decimétrica, AF 3 apresenta áreas esparsas com maior concentração de conchas inteiras.
A análise zooarqueológica corrobora o domínio de A. brasiliana (64%), com cerca de
2% de Ostrea sp., 1 % de marisco e menos de 1% de otólitos de bagre e corvina. Os
restantes 32% estão formados por fragmentos indeterminados de molusco.
A AF 4, no topo da sucessão estratigráfica, é composta quase exclusivamente de
fragmentos de concha e osso (50%) com orientação sub-horizontal, junto com areia
bioclástica e lama (50%). Sua composição assemelha-se à AF 4 do sítio Caipora,
também no topo da sucessão estratigráfica. Pela posição superficial de ambas
arqueofácies, a semelhança pode significar que a alta degradação dos componentes
bioclásticos e a compactação das arqueofácies possa ser um atributo pós-deposicional
associado com a alteração pedogênica dos sedimentos arqueológicos. Apesar de
apresentar alta frequência de fragmentos de concha de tamanho menor a 2 mm (~42%),
como AF 1, AF 4 é a única arqueofácies da sucessão com domínio de Ostrea sp. (26%),
seguido de mariscos (~17%), ossos (2%) e, por último, A. brasiliana (~1%) 74 .
73
74
Análise zooarqueológica da AF 1 realizada por Daniela Klokler.
Análise zooarqueológica da AF 4 realizada por Daniela Klokler. 185
Granulometria
Análises granulométricas da fração terrígena foram realizadas unicamente nas
amostras provenientes das AF 2, 3 e 4. Na Figura 5.34 A, apresentam-se os histogramas
da distribuição granulométrica das três arqueofácies analisadas. Diferente dos
sambaquis Caipora e Cubículo, o sítio Morrinhos tem distribuições unimodais. Isto
sugere o aporte de uma única fonte de sedimentos terrígenos em cada arqueofácies, ao
contrário do observado nos sambaquis Caipora e Cubículo. As modas ocorrem nas
classes areia média, areia fina e areia muito fina, para AF 2, 3 e 4, respectivamente, o
que pode significar mudança da fonte de sedimentos terrígenos de uma arqueofácies
para outra.
Para aprofundar na determinação da possível fonte de sedimentos terrígenos no
sambaqui, compararam-se as estatísticas descritivas (diâmetro médio, desvio padrão e
assimetria) da distribuição granulométrica das três arqueofácies do sambaqui Morrinhos
com as de amostras paleolagunares e deltaicas extraídas de um testemunho localizado a
cerca de 2 km do sambaqui (Nascimento 2011). Este testemunho foi escolhido para
comparação pela sua proximidade com o sítio arqueológico e porque sua cronologia
corresponde com o intervalo de ocupação do sítio. Os diagramas da Figura 5.34 B
mostram que o intervalo interquartis da fração terrígena do sítio Morrinhos apresenta
maior sobreposição com o de depósitos paleolagunares de que com o de depósitos
deltaicos, pelo menos em relação a diâmetro médio e assimetria. Especificamente, o
diagrama de caixa para o desvio padrão indica maior variabilidade de grau de seleção
nos sedimentos arqueológicos de que nos naturais, o que pode ser interpretado como
resultado da variação nas fontes de material terrígeno que compõe as diferentes
arqueofácies, como já sugerido pela análise da Figura 5.34 A. Em contrapartida, o grau
de seleção é em média ligeiramente mais alto nas arqueofácies de que nos sedimentos
naturais, sejam os deltaicos sejam os paleolagunares, o que pode talvez indicar que a
derivação de cada arqueofácies, em termos de fração terrígena, é a partir de fontes
sedimentares bem determinadas no espaço e pouco variáveis no tempo.
186
Figura 5.33. Seção vertical estudada do sítio Morrinhos: A) localização dos pontos de amostragem e
descrição das arqueofácies identificadas; B) seção transversal esquemática (sem escala) da área de
localização do sítio.
187
Figura 5.34. Gráficos das distribuições granulométricas e parâmetros estatísticos para o sítio Morrinhos e
amostragem em sedimentos naturais das proximidades: A) histogramas da distribuição granulométrica
para as AF 2, 3 e 4 do sambaqui Morrinhos; note-se o domínio da fração areia média, fina e muito fina
para as AF 2, 3 e 4, respectivamente; B) diagramas em caixa (boxplot) dos parâmetros estatísticos
diâmetro médio, desvio padrão e assimetria para o conjunto de amostras do sítio Morrinhos e amostras
deltaicas (DL) e paleolagunares (PL) do testemunho TB2 (Nascimento, 2010) coletado a
aproximadamente 2 km do sambaqui.
A avaliação no microscópio estereoscópico da fração retida nas malhas de 1,0
mm (areia grossa) e 0,5 mm (areia média) das AF 2, 3 e 4 mostra o predomínio de
fragmentos de concha na composição do sambaqui (Figura 5.35). Na classe
granulométrica areia grossa, a composição é essencialmente conchífera, enquanto na
areia média a porcentagem de ossos aumenta. Unicamente na AF 3, o conteúdo de ossos
é considerável também na classe areia grossa. Os resultados indicam que as AF 2, 3 e 4
diferenciam-se pelo conteúdo de conchas, majoritário na AF 2, e de ossos de peixe,
dominante na AF 3. Apesar de estar igualmente localizado sobre embasamento
cristalino, o sambaqui Morrinhos diferencia-se do Caipora pelo teor comparativamente
baixo de terrígenos.
188
Figura 5.35. Fotomicrografias à lupa estereoscópica dos grãos retidos nas malhas de 1,0 mm e 0,5 mm das
arqueofacies 2, 3 e 4 do sítio Morrinhos. Note-se a presença de ossos (o), conchas (ch), carvão (cr) e
quartzo (q).
Isótopos de C e N (δ13C e δ53N)
A análise isotópica dos sedimentos das AF 2 e 4 permite observar clara diferença
composicional na MO. Na AF 2, de geometria lenticular e composta por lama preta, os
189
valores de δ13C e razão C/N
indicam deposição de plantas terrestres de ciclo
fotossintético C3 (Figura 5.36 A). O valor de δ15N, semelhante ao relatado na AF 5 de
Cubículo 1, indica influência de plantas C3, com leve enriquecimento de N,
possivelmente associado à presença de restos de tecidos animais (Figura 5.36 B).
Na AF 4, os valores de δ13C e razão C/N indicam igualmente presença de plantas
C3 (Figura 5.36 A). No entanto, ao combinar estes dados com o valor de δ15N torna-se
notório o enriquecimento de N associado à presença de restos de animais marinhos
(Figura 5.36 B), como igualmente relatado na AF 4 do sitio Caipora. Esta situação
reforça a diferença observada no nível macroscópico entre as AF 2 e 4. Assim, a MO da
AF 2, centimétrica e composta por lama preta e ossos de peixe fragmentados, é
essencialmente vegetal, diferente da AF 4, decimétrica e com conteúdo conspícuo de
conchas de moluscos, composta por uma mistura entre resíduos vegetais e restos de
tecidos animais.
Figura 5.36. Análises isotópicas (δ13C e δ15N e razão C/N) de amostras provenientes das AF 2 e 4 do sítio
Morrinhos: A) gráfico de valores de δ13C e razão C/N com intervalos definidos para plantas de ciclo
fotossintético C3 e algas; B) gráfico dos valores de δ15N e δ13C com intervalos definidos para plantas de
ciclo fotossintético C3 e animais marinhos.
Micromorfologia
Para análise micromorfológica, foram coletadas quatro amostras indeformadas
da seção vertical estudada, duas correspondentes à AF 3 e duas à AF 4 (Figura 5.33). Na
Figura 5.37, apresenta-se o desenho esquemático das quatro lâminas analisadas, com as
diferentes microfácies identificadas. A Tabela 5.9 agrupa a descrição geral destas quatro
lâminas. Em conjunto, AF 3 e 4 apresentam grande heterogeneidade, muitas vezes com
190
mais de uma microfácies identificada em cada seção delgada (Figura 5.37; Tabela 5.9).
Destaca-se igualmente a variação lateral observada neste sítio, já que seções delgadas da
mesma arqueofácies, coletadas a pouco mais de 1 m de distância uma da outra,
apresentam diferentes sucessões de microfácies.
A diferenciação de microfácies levou em consideração quatro parâmetros
básicos: a microestrutura, que varia entre microagregados intergranulares, grãos
revestidos interligados e maciça; a distribuição relacionada g/f, que pode ser enáulica,
quitônica ou porfírica; a diversidade de componentes da fração grossa, com microfácies
de maior conteúdo conchífero vs. microfácies compostas essencialmente por areia
quartzosa; e a composição da micromassa, que varia de micrita com argilominerais e
microcarvões a argila maciça com diatomáceas.
Figura 5.37. Desenho esquemático das quatro seções delgadas analisadas no sítio Morrinhos, com
localização do bloco de amostragem na sucessão vertical e identificação de microfácies na lâmina. =
significa equivalência entre microfácies identificadas em lâminas diferentes; + significa microfácies que
envolve atributos de microfácies diferentes identificadas em outras lâminas.
O sítio Morrinhos destaca-se pela diversidade de componentes da fração grossa
que, além dos fragmentos de concha, grãos minerais e ossos, característicos de
191
sambaquis, inclui outros elementos como escória vítrea 75 , grãos de argila glauconítica,
agregados de argila queimada, diatomáceas e inclusive restos de perióstraco queimado
(Figura 5.38 A). Em todos os casos, a fração mineral apresenta granulometria areia fina
a areia muito fina, distribuição aleatória, boa seleção e morfometria caracterizada por
grãos equidimensionais subangulosos a subarredondados. Os fragmentos de concha e
ossos apresentam, em todos os casos, frequências variáveis de queima e dissolução. Em
ambas arqueofácies estudadas, existem microfácies com distribuição sub-horizontal dos
fragmentos de concha (Tabela 5.10-5.13). Na maioria dos casos, a porosidade apresenta
freqüências entre 20 e 40 %, com duas exceções de porosidade baixa, entre 10 e 20 %,
nas microfácies em que domina a fração fina sobre a fração grossa (Figura 5.38 B).
Figura 5.38. Gráficos com porcentagens dos diferentes componentes microscópicos das microfácies
identificadas nas AF 3 (mF 3a.1, 3a.2 e 3b) e 4 (mf 4a.1, 4a.2, 4a.3 e 4b) do sítio Morrinhos: A)
freqüências de componentes da fração grossa; B) relação entre as porcentagens de poros, fração grossa e
fração fina.
75
A escória vítrea forma parte dos resíduos gerados a partir da queima de tecidos de plantas, junto com
agregados microcristalinos de carbonato de cálcio (POCC), estruturas de sílica inalterada e material
criptocristalino. Forma-se pelo derretimento da sílica biogênica, um fenômeno de escala restrita à zona de
maior temperatura de uma fogueira (Canti 2003).
192
Tabela 5.9. Descrição micromorfológica do sambaqui Morrinhos.
3a.2
3b
30
e-cx 35
e-cx
cm
s-s
25
100gr 300µm
gr
100µm
100gr
300µm
Microagregados
integranulares
Microagregados
intergranulares
Grãos revestidos
interligados
Microagregados
integranulares
70/30
en
en
40/50 quit
gef
70/30 en
•••
•
••••
••
•••••
••
•
••
•
•
••
•
•••
••
• •
Cor
Tecidos
Raízes
Osso
Outros min.
Frag lítico
Feldspato
Quartzo
Concha
Dist. rel. g/f
Microestrutura
razão g/f
Agregados
Tam.
%
Fábrica b
3a.1
e-cx
fs
cm
cn
s-s
%
Micromassa
Limpidez
3a
mF
Porosidade
Am.
Carvão
Fr. org.
gr.
Fr. min. gr.
45
tr
cri
Micrita com
argila
45
pt
cri
Fosfatos
10
lp
cri
Microcarvão
pt
m-g
Argila com
diatomáceas
40
tr
cris
Micrita com
argila
40
pt
cri
Fosfatos
•
•••
••
Composição
FP
rev
cris
Fe-nod
rev
Fe-nod
rev
Fe-nod
• •
10
lp
ind
Microcarvões
10
lp
cris
Cinzas
Freqüências de classes segundo Bullock et al. (1985): • Muito Poucas (< 5%); •• Poucas (5-15%) ; ••• Comum (15-30%) ; •••• Freqüente (30-50%); ••••• Dominante (50-70%);
•••••• Muito dominante (>70%). Am. = amostra; mF = microfácies; Tam.= tamanho; Fr. min. gr. = fração mineral grossa; Fr. org. gr. = fração orgânica grossa; FP = feições
pedológicas. O singificado das demais abreviações utilizadas nesta tabela encontra-se no Anexo, Tabela A.5.
193
Tabela 5.9. Continuação.
4a.1
4a.2
4a.3
4b
e-cx 40
cm
re
s-s
fs
e-c
fs
cm
s-s
e-cx
ca
cn
s-s
fs
30
10
25
gr
gr
100400µm
100400µm
gr 1-2 mm
gr
100400µm
Microagregados
intergranulares
Grãos revestidos
e interligados
Maciça
Esponjosa com
microagregados
integranulares
interligados
85/15 en,
90/10
quit
gef
10/90 por
60/40
en
por
gef
•••••
••
•••
••••
••
••••
••
•
•••••
••
••
•
%
45
tr
cri
45
tr
m-g Argila e mat.
orgânica
10
lp
ind
pt
m-g Argila com
diatomáceas
pt
m-g Argila com
diatomáceas
•
••
•
•• •••
••
•
Fábrica b
Cor
Tecidos
Raízes
Osso
Outros min.
Frag lítico
Feldspato
Quartzo
Concha
Microestrutura
Dist. rel. g/f
Tam.
razão g/f
Agregados
%
Micromassa
Limpidez
4a
mF
Porosidade
Am.
Carvão
Fr. org.
gr.
Fr. min. gr.
50
tr
cri
50
tr
m-g
Composição
FP
Micrita
Fe-nod
Microcarvão
Micrita com
argila
Argila com
diatomáceas
rev
Fe-nod
rev
hiporev
ench
Fe-nod
rev
hiporev
ench
cris
Fe-nod
194
Tabela 5.10. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra MO-3a.
MO-3a
mF
%
Tamanho
Forma
Arredondamento
Seleção
Distribuição
básica
Orientação
básica
20% paralelismo
de ângulo baixo
Distribuição
referenciada
Inclinada à
superfície
Conchas
3a.1
30
Vários
-
-
Não selecionado
Aleatória/ linear
Quartzo
3a.1
10
Areia média a
mto. fina
Equidimensional
Seleção moderada
Aleatória
-
-
Feldspato
3a.1
5
Areia mto. fina Equidimensional
Bem selecionado
Aleatória
-
-
Glauco.
3a.1
3
Areia mto. fina Equidimensional
Arredondado
Bem selecionado
Aleatória
-
-
Ossos
3a.1
30
Vários
-
-
Não selecionado
Aleatória
-
-
Carvão
3a.1
15
Vários
-
-
Não selecionado
Aleatória
-
-
Tecidos
3a.1
2
300 µm
-
-
Não selecionado
Aleatória
-
-
Raízes
3a.1
5
Vários
-
-
Não selecionado
Aleatória
-
-
Gastróp.
3a.2
5
220µm
-
-
Bem selecionado
Aleatória
-
-
Quartzo
3a.2
65
Subarredondado
Seleção moderada
Aleatória
-
-
-
Feldspato
3a.2
15
Aleatória
-
-
-
3a.2
3
Bem selecionado
Aleatória
Min. op.
Glauco.
Diatom.
Osso
3a.2
3a.2
3a.2
3a.2
3
4
3
2
Areia mto. fina Equidimensional
Areia mto. fina Equidimensional
Silte
Areia mto. fina
-
Subarredondado
Arredondado
subarredondado
Arredondado
Arredondado
-
Bem selecionado
Min. pes.
Areia média a
Equidimensional
mto. fina
Areia mto. fina Equidimensional
Areia mto. fina
Equidimensional
Bem selecionado
Bem selecionado
Bem selecionado
Seleção pobre
Aleatória
Aleatória
Aleatória
Aleatória
-
-
Subanguloso
subarredondado
Subanguloso
subarredondado
195
Alteração
Dissolução
Queima e
dissolução
Silicificado
Dissolução
Tabela 5.11. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra MO-3b.
MO-3b
%
Tamanho
Forma
Arredondamento
Seleção
Distribuição
básica
Orientação
básica
Distribuição
referenciada
Concha
35
Vários
-
-
Não selecionado
Aleatória/ linear
10% paralelismo
de ângulo baixo
Inclinada à
superfície
Quartzo
15
Bem selecionado
Seleção
moderada
-
-
-
Feldspato
5
Bem selecionado
Aleatória
-
Osso
29
Vários
-
-
Não selecionado
Aleatória
-
-
Carvão
Tecidos
Raízes
10
3
3
2-5mm
300µm
Vários
-
-
Seleção moderada
Não selecionado
-
Aleatória
Aleatória
Aleatória
-
-
Queima e
dissolução
-
mF
Areia média a
mto. fina
Areia fina
Equidimensional
Equidimensional
Subanguloso
subarredondado
Subanguloso
subarredondado
196
Alteração
10%
queimado a
T>600°C
-
Tabela 5.12. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra MO-4a.
MO-4a
mF
%
Tamanho
Forma
Arredondamento
Seleção
Distribuição
básica
Orientação
básica
Distribuição
referenciada
Concha
4a.1
65
Vários
-
-
Seleção moderada
Linear
Paralelismo de
ângulo baixo
Inclinado à
superfície
Es. vítrea
Osso
Carvão
Tecidos
Peri. carb.
Arg. quei.
4a.1
4a.1
4a.1
4a.1
4a.1
4a.1
5
7
3
10
5
5
Vários
Vários
Vários
Vários
Vários
1-3mm
Vários
Vários
Arredondado
Anguloso
Não selecionado
Não selecionado
Não selecionado
Não selecionado
Não selecionado
Aleatória
Aleatória
Aleatória
Aleatória
Aleatória
Aleatória
-
-
Concha
4a.2
11
Vários
-
-
Não selecionado
Linear
Micro-ga.
4a.2
3
100µm
-
Bem selecionado
Aleatória
Inclinado à
superfície
-
Quartzo
4a.2
56
Areia fina
Equidimensional
Bem selecionado
Aleatória
-
-
-
Feldspato
4a.2
15
Subanguloso
subarredondado
Subanguloso
subarredondado
Subanguloso
subarredondado
Suarredondado
Arredondado
-
Paralelismo de
ângulo baixo
-
Seleção moderada
Aleatória
-
-
Subanguloso
Arredondado
-
Areia fina
Equidimensional
Frag.lítico
4a.2
6
Min. pes.
Glauco.
Osso
4a.2
4a.2
4a.2
4
3
2
Areia média e
Equidimensional
fina
Areia mto. fina Equidimensional
Areia mto. fina Equidimensionaç
Vários
-
Concha
Quartzo
Gastróp.
Glauco.
Diatom.
4a.3
4a.3
4a.3
4a.3
4a.3
13
70
7
5
5
Vários
Areia mto. fina Equidimensional
100µm
Areia mto. fina Equidimensional
Silte
-
5% queima
-
-
Seleção moderada
Aleatória
Bem selecionado
Bem selecionado
Não selecionado
Aleatória
Aleatória
Aleatória
-
-
Queimado
Não selecionado
Bem selecionado
Bem selecionado
Bem selecionado
Bem selecionado
Aleatória
Aleatória
Aleatória
Aleatória
Aleatória
-
-
-
197
Alteração
30%
queimado a
T>600°C
Queima
-
Tabela 5.13. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra MO-4b.
MO-4b
mF
Concha
Quartzo
%
Tamanho
Forma
Arredondamento
Seleção
Distribuição
básica
Orientação
básica
Distribuição
referenciada
37
Vários
-
-
Não selecionado
Aleatória
10% paralelismo
de ângulo baixo
Inclinada à
superfície
Seleção moderada
Aleatória
-
-
-
Bem selecionado
Aleatória
Bem selecionado
Não selecionado
Não selecionado
Aleatória
Aleatória
Aleatória
-
-
Fissuras
Queima e
dissolução
-
Feldspato
3
Frag. lít.
Esc. vít.
Ag. argila
5
2
10
Areia média
200-300µm
1-5mm
Equidimensional
Vários
Vários
Subanguloso
subarredondado
Subanguloso
subarredondado
Subanguloso
Arredondado
Arredondado
Osso
20
Vários
-
-
Não selecionado
Aleatória
-
-
Carvão
Raízes
10
3
Vários
Vários
-
-
Não selecionado
-
Aleatória
Aleatória
-
-
10
Areia média a
fina
Areia fina
Equidimensional
Equidimensionap
Alteração
10%
queimado a
T>600°C
-
198
A AF 3 apresenta pelo menos duas microfácies. Na lâmina 3a, a microfácies
dominante (mF 3a.1) compõe-se de fragmentos de concha com distribuição subhorizontal, fragmentos de osso com sinais de queima e dissolução, grãos de quartzo,
feldspato e carvão, entre outros componentes (Figura 5.39 A, B). A microestrutura desta
microfácies é de microagregados integranulares e micromassa composta por mistura de
micrita com argilominerais, fosfatos secundários e microcarvões (Figura 5.39 C, D;
Tabela 5.9). Os fosfatos secundários derivam da intensa dissolução dos ossos e
aparecem freqüentemente associados a finos fragmentos na fração silte (Figura 5.40 AD). A formação de fosfatos secundários é favorecida pelas condições de pH e regime
hidrológico do depósito, que provocam dissolução e recristalização do mineral do osso
(Berna et al., 2004; Lucas and Prévôt, 1991; Trueman et al., 2004).
A segunda microfácies da seção delgada 3a (mF 3a.2) apresenta baixa
frequência de conchas e ossos (<5%) e fração grossa formada por grãos minerais,
revestidos e interligados, de quartzo e feldspato. Não contém conchas de bivalves, mas
de uma espécie de gastrópode, de aproximadamente 250 µm de comprimento. Este
gastrópode corresponde com indivíduos juvenis da espécie Heleobia sp. (Stimpson
1865), espécie tipicamente estuarina-lagunar que habita substrato argilo-arenoso (Rios,
1985). Entre o componente mineral, observam-se frequências que, no total, são menores
que 5 % de minerais pesados, minerais opacos, grãos de argila glauconítica e diversas
espécies de diatomáceas (Figura 5.39 E, F).
A identificação de argila glauconítica foi realizada pelas suas propriedades
ópticas, tais como aspecto criptocristalino, coloração verde e cor de interferência de
primeira ordem (birrefringência máxima estimada em torno de 0,020) em padrão
pontilhado. Contribuiu para a identificação a ocorrência na forma de grãos com
tamanho entre 20 e 30 µm e forma subequidimensinal subarredondada, hábito frequente
dentre clastos de glauconita descritos na literatura (Dillemburg et al., 2000). A
diatomácea que predomina na mF 3a.2 é Paralia sulcata, espécie euritrópica, que tolera
variações de salinidade das águas de 5 até 40 ‰ (Amaral 2011, comunicação pessoal),
muito freqüente em sedimento paleolagunares da região (Amaral 2008; Amaral et al.
2012).
A seção 3b apresenta uma única microfácies, semelhante à mF 3a.1 (Figura
5.37), composta por fragmentos de concha, ossos e grãos de quartzo, todos de
distribuição aleatória (Figura 5.41 A, B). Aproximadamente 10% dos fragmentos de
199
concha apresentam distribuição sub-horizontal. Os ossos apresentam distribuição
aleatória, alta fragmentação, sinais de dissolução e queima (Figura 5.41 C, D). A
micromassa constitui-se de micrita com argilominerais, fosfatos e microcavões (Figura
5.41 E, F). Esta microfácies contém áreas de concentração de conchas queimadas a
temperaturas maiores aos 600° C (10% do total de conchas) associadas a fração fina
composta por cinzas de madeira. A identificação de cinzas baseia-se na presença de
agregados microcristalinos de cristais romboédricos de calcita, desenvolvidos como
pseudomorfos de oxalato de cálcio (POCC) (Brochier, 1983; Canti, 2003). Estes cristais
identificam-se em seção delgada pela forma e coloração cinzenta em PPL, com a
birrefringência do carbonato de cálcio sob polarizadores cruzados (Figura 5.42). Junto
com as cinzas, observam-se restos de tecidos vegetais silicificados. A existência de
cinzas bem preservadas nesta seção delgada reforça a idéia de que a micrita que compõe
a fração fina resulta da precipitação do carbonato de cálcio dissolvido das conchas, e
não da dissolução e precipitação de cinzas não preservadas.
Na seção delgada 4a, destaca-se a presença de três microfácies claramente
diferenciadas pela microestrutura, composição da fração grossa e composição da
micromassa (mF 4a.1, 4a.2 e 4a.3) (Figura 5.43 B). Destas microfácies, mF 4a.1 é
semelhante às mF 3a.1 e 3b, mas com maior freqüência de materiais queimados (30%
do total de conchas) e menor proporção de ossos (7%) e fosfatos secundários (Figura
5.43 C). A mF 4a.2 assemelha-se à mF 3a.2 (Figura 5.43 D, E) e a mF 4a.3 é formada
por agregados de lama milimétricos a centimétricos, nos quais se observam as mesmas
espécies de diatomáceas e gastrópodes das mF 4a.2 e 3a.2 (Figura 5.37; Figura 5.43 F).
A mF 4a.1 é formada por uma mistura de conchas de diversas espécies de
moluscos, distribuídas sub-horizontalmente (Figura 5.44 A), com sinais de queima a
temperatura superior aos 600° C em 30% dos casos (Figura 5.44 B). Os demais
componentes da fração grossa incluem fragmentos de ossos queimados, resíduos de
escória vítrea (Figura 5.44 C), carvão e restos de perióstraco carbonizado (Figura 5.44
D, E). Todos os componentes encontram-se em meio a micromassa essencialmente
micrítica, relacionada com a dissolução das conchas e com a presença de cinzas, com
áreas de concentração de argila organomineral, argila rubefacta (Figura 5.44 A) e
microcarvões.
O elemento de maior destaque na mF 4a.1 está representado por uma
acumulação milimétrica de tecidos silicificados de distribuição horizontal a sub200
horizontal (Figura 5.45). Estes tecidos correspondem a restos de epidermis e mesofilo
de plantas, possivelmente Juncaceae (Madella 2010, comunicação pessoal). Observa-se
intercalação entre fitólitos alongados e arredondados que poderia representar diferentes
cortes do mesmo tecido, ou seja, cortes transversais intercalados com cortes
longitudinais. Este tipo de combinação do mesmo tecido poderia corresponder a
material trançado, como tapetes ou cestaria.
A mF 4a.2 é constituída por grãos de quartzo, feldspato e fragmentos líticos
revestidos e interligados (~70%), com freqüência subordinada de conchas, gastrópodes,
fragmentos de osso, minerais pesados e grãos de argila glauconítica. A mF 4a.3
apresenta agregados milimétricos a centimétricos de lama maciça, formada por argila
mosqueada granida (stiple-speckled), com gastrópodes (Figura 5.46 A, B) e
diatomáceas (Figura 5.46 C, D). Na assembleia de diatomáceas, domina a espécie
Paralia sulcata (Amaral 2011, comunicação pessoal).
A seção delgada correspondente à amostra 4b apresenta mistura entre as mF 3a.1
e 4a.3 (Figura 5.37). A massa basal inclui conchas de moluscos, ossos queimados, grãos
minerais (quartzo, feldspato e fragmentos líticos) e carvão (Figura 5.47 C, D), assim
como agregados milimétricos de argila da mesma composição que a mf 4a.3, com
gastrópodes e diatomáceas (Figura 5.47 B). A micromassa é uma mistura de micrita
com argilominerais (Figura 5.47 E, F).
Ao longo da seção vertical estudada, e nas diferentes arqueofácies amostradas,
as feições pedológicas não variam. Destaca-se a presença constante de revestimentos
não laminados, de carbonato de cálcio, tanto ao redor dos componentes da fração grossa
como em vazios (Figura 5.48 A-D), e de nódulos de óxi-hidróxidos de ferro órticos, seja
na micromassa de micrita com argilominerais seja na argila mosqueada granida que
compõe os agregados de lama (Figura 5.48 F). Nas microfácies com maior conteúdo de
argilominerais, observam-se, igualmente, hiporrevestimentos de óxi-hidróxidos de ferro
e, em alguns casos, enchimentos densos e incompletos de micrita. As cristalizações
aparecem na forma de espato (Figura 5.48 E). Apesar de não terem sido observados
excrementos da fauna do solo, a microestrutura esponjosa e de agregados
intergranulares interligados, assim como os vazios em câmera e canais, indicam
bioturbação no sedimento.
Assim como observado no sitio Caipora, as feições pedológicas do sítio
Morrinhos indicam intensa precipitação do carbonato de cálcio das conchas que
201
compõem o sambaqui. Da mesma maneira, os nódulos e hiporrevestimentos de óxihidróxido de ferro indicam ciclos de alagamento e dessecação dos sedimentos, junto
com condições vadosas de formação. No entanto, este processo de alteração da fábrica
original ainda preserva relativamente intactas as relações entre diferentes microfácies, a
exemplo das seções delgadas 3a e 4a, assim como aquelas microfácies associadas com a
queima de materiais, como observado na mF 3b e 4a.1. As cinzas de madeira que, pela
sua composição carbonática, seriam suscetíveis à dissolução, preservaram-se neste
sambaqui, em associação com conchas e ossos queimados, tecidos silicificados e argila
rubefacta.
Portanto, pode-se pensar que, apesar da precipitação dos componentes
biológicos do sambaqui (conchas e ossos), existe boa preservação das microfácies
associadas com eventos de deposição específicos. Da mesma maneira, a maior
diversidade de microfácies que se observa no setor de coleta das amostras 3a e 4a, em
oposição às amostras 3b e 4b, situadas a pouco mais de 1m de distância, indica
variabilidade lateral. Neste sentido, as seções delgadas 3a e 4a poderiam abranger áreas
de maior intensidade de ocupação, enquanto as amostras 3b e 4b estariam localizadas
em áreas periféricas de deposição massiva de resíduos retrabalhados.
202
Figura 5.39. Fotomicrografias da mF 3, amostra 3a, do sítio Morrinhos: A) seção vertical esquemática
com localização da amostra para micromorfologia; B) massa basal da mF 3a.1, formada principalmente
por conchas de distribuição sub-horizontal e fragmentos de osso, PPL; C, D) detalhe da massa basal da
mF 3a.1, com fragmentos de concha e osso em meio a micromassa fosfática com áreas de concentração
de micrita associada à dissolução das conchas, PPL e XPL; E, F) massa basal da mf 3a.2, com grãos de
quartzo e feldspato em micromassa de argilominerais, com diatomáceas, PPL e XPL.
203
Figura 5.40. Fotomicrografias da micromassa da mF 3a.1: A, B) fragmento de osso com sinais de
dissolução e revestimento de micrita, PPL e XPL. C, D) fragmentos de osso, em micromassa fosfática de
baixa birrefringência, PPL e XPL.
204
Figura 5.41. Fotomicrografias da mF 3, amostra 3b, do sítio Morrinhos: A) seção vertical esquemática
com localização da amostra para micromorfologia; B) massa basal composta por fragmentos de concha e
ossos, com alguns indivíduos queimados, com microestrutura de microagregados intergranulares e
presença de raízes frescas, PPL; C, D) área de concentração de conchas e ossos queimados, carvão e
cinzas sobre concha de molusco sem evidências de queima, PPL, XPL; E, F) micromassa composta por
micrita com argilominerais, fosfatos e microcarvões entre finos fragmentos de osso queimado, PPL e
XPL.
205
Figura 5.42. Fotomicrografias de cinzas de madeira identificadas na seção delgada 3a do sítio Morrinhos:
A, B) área de concentração de cinzas entre restos de tecido silicificado, com concentração de fragmentos
de osso queimados na porção superior em meio a micromassa de argila rubefacta, PPL e XPL; C, D)
concentração de cinzas rubefactas, PPL e XPL.
206
Figura 5.43. Fotomicrografias da mF 4, amostra 4a, do sítio Morrinhos; A) seção vertical esquemática,
com localização da amostra para micromorfologia; B) porção da seção delgada com as três microfácies
identificadas, PPL; C) concentração de conchas queimadas a temperatura superior a 600° C na mF 4a.1,
PPL; D) massa basal da mF 4a.2 com microestrutura de grãos de quartzo e feldspato revestidos
interligados, com alguns fragmentos de concha, PPL; E) detalhe da mF 4a.2 com micromassa composta
por argilominerais, PPL; F) agregado milimétrico de lama que caracteriza à mF 4a.3, PPL.
207
Figura 5.44. Fotomicrografias de elementos de destaque na mF 4a.1: A) agregado de argila rubefacta
associado a conchas queimadas a diferentes temperaturas de, pelo menos, duas espécies de moluscos,
PPL; B) concha queimada a 800° C em micromassa composta por cinzas e argila rubefacta, PPL; C)
escória vítrea, PPL; D) concha com fragmentos de perióstraco carbonizado, alguns já separados da valva
e outros ainda aderidos, PPL.
Figura 5.45. Restos de tecidos silicificados na mF 4a.1: A-C) intercalação entre células alongadas e
arredondadas, PPL; D) detalhe dos tecidos vegetais observados, PPL.
208
Figura 5.46. Componentes inorgânicos de origem biológica dentro dos agregados de lama da mF 4a.3: A,
B) gastrópode, PPL; C, D) espécie de diatomácea encontrada com maior freqüência nos agregados de
lama (Paralia sulcata), PPL.
209
Figura 5.47. Fotomicrografias da mF 4, amostra 4b, do sítio Morrinhos: A) seção vertical esquemática
com localização da amostra para micromorfologia; B) agregado de lama, PPL; C, D) massa basal com
fragmentos de concha e ossos com sinais de queima, em microestrutura esponjosa com microagregados
intergranulares interligados, PPL e XPL; E, F) detalhe da micromassa formada por micrita com
argilominerais, nódulos órticos de óxi-hidróxido de ferro e enchimentos de micrita, PPL e XPL.
210
Figura 5.48. Feições pedológicas do sítio Morrinhos: A) revestimento pendular de micrita, PPL; B)
Revestimento contínuo, não laminado de microespato redor de um vazio, PPL; C, D) enchimento denso
incompleto de micrita proveniente da dissolução e precipitação do carbonato de cálcio das conchas, PPL e
XPL; E) revestimento de espato, PPL; F) nódulo órtico de óxi-hidróxido de ferro em agregado de lama,
PPL.
2.1.4. Jabuticabeira 1 Devido à exploração sofrida no século XX, existem atualmente várias seções
verticais expostas para observação da constituição interna do sambaqui Jabuticabeira 1.
Nas duas seções escolhidas para este estudo, localizadas na porção central, podem-se
observar as camadas centimétricas e decimétricas, de morfologia lenticular convexa,
que compõem o sambaqui. Esta estratificação permite interpretar a sua formação a partir
211
da superposição e do incremento de grandes montículos de conchas, como igualmente
observado no sítio Jabuticabeira 2 (Bendazzoli, 2007; Fish et al., 2000; Klokler, 2008)
localizado a pouco mais de 2 km a sudeste 76 .
Figura 5.49. Seções verticais estudadas do sítio Jabuticabeira 1, com localização dos pontos de
amostragem e descrição das arqueofácies identificadas.
76
Estas mesmas constatações já tinham sido realizadas na década de 1960 por Bocchi & Liberatore
(1968: 3) ao descrever a estratigrafia dos dois sambaquis de Jabuticabeira: “Ambos os sambaquis não
apresentam estratificações paralelas, mas sim uma estratificação descontínua que nos lembra
amontoamentos, mostrando uma inclinação de repouso natural.” 212
Na seção inferior, de 2 m de altura, identificaram-se seis arqueofácies (Figura
5.49). Esta seção apresenta sedimentos soltos ou de escassa coesão, diferente da seção
superior onde as camadas encontram-se concrecionadas. A AF 1, base da seção, é
composta por areia, lama e conchas inteiras, principalmente de A. brasiliana, com
alguns indivíduos de Ostrea sp. e frequência subordinada de ossos de peixe. Na AF 2,
aumenta a quantidade de conchas, tanto inteiras como fragmentadas. A AF 3 apresenta
predomínio de ossos de peixe (50%), seguido de conchas inteiras e fragmentadas de A.
brasiliana e Ostrea sp., em matriz composta por areia média e fina em lama carbonosa
preta. A AF 4, de morfologia lenticular e espessura centimétrica, composta por areia
lamosa e ossos de peixe, apresenta semelhança de forma e composição com as camadas
pretas já observadas nos sambaquis Jabuticabeira 2 (Fish et al., 2000; Klokler, 2008;
Villagran, 2008), Caipora, Cubículo 1 e Morrinhos.
A AF 5 aparece uma única vez na seção vertical inferior, associada à AF 4.
Diferencia-se das AF 4 e 2 pela espessura (maior que AF 4 e menor que AF 2) e por
apresentar maior freqüência de conchas inteiras (80%), principalmente A. brasiliana, e
de fragmentos de osso de peixe (10%). O topo da seção inferior, representado pela AF
6, mostra sinais de se tratar de resíduos de moinha, pela alta compactação do sedimento
e fragmentação das conchas.
Na análise zooarqueológica realizada por Ferraz (2010) na mesma seção vertical
estudada nesta tese, determinou-se igualmente o predomínio de A. brasiliana. Nas
camadas identificadas por Ferraz (2010) que puderam ser correlacionadas com as
arqueofácies deste estudo, observaram-se as seguintes frequências por espécie: AF 1 77
contém cerca de 95% de A. brasiliana; AF 2 78 , nas suas três ocorrências, apresenta
freqüência entre 90 e 95 % de A. brasiliana, com 5 a 10% de Ostrea sp.; AF 3 79
apresenta cerca de 70 % de A. brasiliana, menos de 5 % de gastrópodes e ossos de
peixe, e 20 % de Ostrea sp.; AF 5 80 apresenta cerca de 75 % de A. brasiliana e 20 % de
Ostrea sp.
77
A arqueofácies 1, identificada neste trabalho, corresponde à
realizada por Ferraz (2010). 78
A arqueofácies 2, identificada neste trabalho, corresponde
estratigráfica realizada por Ferraz (2010). 79
A arqueofácies 3, identificada neste trabalho, corresponde à
realizada por Ferraz (2010). 80
A arqueofácies 5, identificada neste trabalho, corresponde à
realizada por Ferraz (2010). 213
camada 1 da descrição estratigráfica
às camadas 2, 5 e 6 da descrição
camada 4 da descrição estratigráfica
camada 7 da descrição estratigráfica
Na seção superior foram identificadas unicamente três arqueofácies (Figura 5.49).
Na base desta seção, aparece uma única vez a AF 7, composta por conchas inteiras,
principalmente de Ostrea sp. e A. brasiliana, em matriz formada por farinha
carbonática, interpretada como produto da alteração pós-deposicional das conchas.
Apresenta bolsões dispersos de Ostrea sp. e lentes centimétricas de carvão. A AF 8 é
essencialmente concrecionada e formada por conchas inteiras e fragmentadas (80%),
ossos de peixe fragmentados (10%) e carvão. Assim como na AF 7, a fração fina
compõe-se principalmente por uma farinha carbonática. A AF 9 diferencia-se da AF 8
por três motivos: é mais friável e, portanto, menos concrecionada; sua fração grossa
(conchas de Ostrea sp. e marisco) apresenta orientação sub-horizontal; e contém lentes
centimétricas de fragmentos de osso de peixe. Na porção superior desta seção, observase uma intercalação entre as AF 8 e 9 que se repete até o topo do corte vertical.
Análises zooarqueológicas realizadas por Ferraz (2010) igualmente mostram o
aumento na proporção de Ostrea sp. em relação A. brasiliana na seção superior. A AF
7 81 é composta por cerca de 30 % de Ostrea sp. e pouco mais de 50% de A. brasiliana.
Na AF 8 82 , há cerca de 80 % de A. brasiliana, 10 % de Ostrea sp. e menos de 5% de
gastrópodes, marisco e ossos de peixe. Na AF 9 83 , Ostrea sp. alcança aproximadamente
55% da concentração total de conchas, com 20% de A. brasiliana, quase 25% de
gastrópodes e mais de 10% de mariscos.
Granulometria
Análises granulométricas da fração terrígena foram realizadas nas amostras
provenientes das AF 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7 e 9. Na Figura 5.50, apresentam-se os histogramas
da distribuição granulométrica das oito arqueofácies analisadas. Como observado no
sítio Morrinhos, este sambaqui apresenta distribuições unimodais em cinco das seis
arqueofácies analisadas na seção inferior (AF 1 a AF 5). No topo da seção inferior,
representado pela AF 6, a porcentagem de areia fina iguala-se à de areia média e nas
duas arqueofácies analisadas na seção superior (AF 7 e AF 9), a porcentagem de areia
81
A arqueofácies 7, identificada neste trabalho, corresponde às camadas 17 e 18 da descrição
estratigráfica realizada por Ferraz (2010). 82
A arqueofácies 8, identificada neste trabalho, corresponde à camada 19 da descrição estratigráfica
realizada por Ferraz (2010). 83
A arqueofácies 9, identificada neste trabalho, corresponde à camada 20 da descrição estratigráfica
realizada por Ferraz (2010). 214
fina ultrapassa a de areia média. Esta variação na moda da fração terrígena, ao longo da
seção vertical do sambaqui, pode indicar uma mudança na fonte de sedimentos
terrígenos, ou uma mudança de processo deposicional no local onde os sedimentos e
moluscos eram coletados.
Figura 5.50. Gráficos das distribuições granulométricas e parâmetros estatísticos para o sítio Jabuticabeira
1 e amostragem em sedimentos naturais das proximidades: A) histogramas da distribuição granulométrica
para as AF 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7 e 9 do sambaqui Jabuticabeira 1. Note-se o domínio da fração areia média
para as arqueofácies analisadas na seção inferior (AF 1 a AF 5) e aumento progressivo da fração areia
fina no topo da seção inferior (AF 6) e na seção superior (AF 7 e AF 9); B) diagramas em caixa (boxplot)
das estatísticas diâmetro médio, desvio padrão e assimetria para o conjunto de amostras do sítio
Jabuticabeira 1 e amostras paleolagunares (PL) das sondagens realizadas nas proximidades do sambaqui
Jabuticabeira 2 (Villagran, 2010) localizado a pouco mais de 2 km de Jabuticabeira 1.
215
Figura 5.51. Fotomicrografias à lupa estereoscópica dos grãos retidos nas malhas de 1,0 mm e 0,5 mm das
arqueofacies 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7 e 9 do sítio Jabuticabeira 1. Note-se a presença de ossos (o), conchas (ch),
carvão (cr), grãos de quartzo (q) e fragmentos de osso carbonizado (oc).
216
A comparação da fração terrígena de Jabuticabeira 1 com sedimentos naturais foi
realizada com os dados obtidos para trincheiras superficiais abertas nas proximidades do
sambaqui Jabuticabeira 2, localizado a pouco mais de 2 km de Jabuticabeira 1. Os
depósitos das proximidades de Jabuticabeira 2 foram caracterizados como
paleolagunares (Villagran, 2008), e sua idade é contemporânea com a formação de
Jabuticabeira 1 84 (Menezes, 2009). Os diagramas da Figura 5.50 B mostram que a
variabilidade do diâmetro médio, representada pelo intervalo interquartis, é menor no
sambaqui que nos depósitos paleolagunares, com clara tendência para sedimentos mais
grossos no sambaqui. A maior frequência de grossos no sambaqui, em relação aos
sedimentos paleolagunares, pode-se dever a dois fatores: a presença de restos de
conchas mal digeridos no tratamento prévio das amostras para remosão de bioclastos,
que aparecem como fragmentos grossos na análise granulométrica; ou sedimentos
coluvionares no sítio, provenientes do morro granítico das proximidades de
Jabuticabeira 1. Já a variabilidade para desvio padrão e assimetria é maior no sambaqui
que nos depósitos paleolagunares, com leve tendência para menor grau de seleção
granulométrica e assimetria mais negativa no sambaqui.
Das AF 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7 e 9, foi realizada a observação no microscópio
estereoscópico da fração retida nas malhas de 1,0 mm (areia grossa) e 0,5 mm (areia
média). Na Figura 5.51, podem-se observar as diferenças na composição da fração
grossa das arqueofácies que compõem o sambaqui Jabuticabeira 1, com variações que
envolvem principalmente as frequências de fragmentos de concha e osso de peixe. A
AF 1 destaca-se pela alta porcentagem de fragmentos de carvão na classe areia grossa
(20%) e de terrígenos na classe areia média (50%). As AF 2 e 3 diferenciam-se
principalmente pela proporção de ossos de peixe na fração areia média, maior em AF 3
(60%) que em AF 2 (30%).
Na AF 4, a frequência de ossos na fração areia média diminui até a metade
(35%), enquanto a freqüência de fragmentos de conchas se mantém estável em
comparação com AF 2 e AF 3 (~50%). Poucas mudanças se observam entre as AF 5, 6
e 7, que registram incremento na porcentagem de fragmentos de concha na classe areia
grossa (~70%) e na frequência de fragmentos de osso (entre 30 e 40%) na classe areia
média. Por último, AF 9 destaca-se pelo domínio de fragmentos de osso de peixe nas
84
Uma camada de conchas de Anomalocardia brasiliana, localizada a 60 cm de profundidade em uma
trincheira aberta nas proximidades de Jabuticabeira 2, foi datada em 3698-4104 anos cal (Menezes 2009).
217
classes areia grossa e média (70% e 60%, respectivamente). A freqüência de conchas
em AF 9 é de 25% em ambas as classes granulométricas, semelhante ao observado na
AF 1.
Isótopos de C e N (δ13C e δ53N)
Amostras de sedimento total para análise de isótopos de C e N (δ13C e δ15N)
foram coletadas em todas as arqueofácies identificadas na seção vertical inferior (AF 1 a
6) e unicamente na AF 7 da seção superior. Isto se deve à maior friabilidade dos
sedimentos da seção inferior em contraste ao concrecionamento das arqueofácies
identificadas na seção superior, o qual dificultou a coleta de amostras. Na Figura 5.52
A, pode-se observar o agrupamento de todas as arqueofácies no campo definido para
plantas de ciclo fotossintético C3. Somente AF 1 mostra proximidade ao campo
corresponde a algas (razão C/N entre 4 e 10 segundo Lamb et al., 2006 e Meyers, 1997).
No entanto, no gráfico da Figura 5.52 B fica claro como nenhuma das amostras do sítio
apresenta valores de δ15N e δ13C correspondente a plantas aquáticas (δ15N entre +5 e +9
‰). Portanto, parece mais provável que AF 1 apresente a mesma tendência do resto de
arqueofácies analisadas e possua MO de plantas terrestres C3.
Como se discutiu para os outros sambaquis de padrão estratigráfico conchífero
analisados (Caipora, Cubículo 1 e Morrinhos), a assinatura isotópica de todas as
arqueofácies do sítio Jabuticabeira 1 indica mistura de restos de origem vegetal (plantas
C3) e resíduos vinculados à decomposição de tecidos de animais marinhos
(possivelmente peixes e moluscos). Apenas AF 4 desloca-se claramente do conjunto
arqueofácies no gráfico da Figura 5.52 A, onde se combinam os valores de δ13C e razão
C/N. Já no gráfico da Figura 5.52 B, onde se relacionam os valores δ13C e δ15N, AF 4
agrupa-se com o restante de amostras. Isto pode indicar o predomínio de plantas C3 na
MO de AF 4, com leve influência de N de origem aquática.
A AF 4 tem a particularidade de pertencer ao conjunto de camadas pretas,
lenticulares e centimétricas, que se observam intercaladamente nas seções verticais dos
sambaquis de padrão estratigráfico conchífero (AF 5 do sítio Cubículo 1 e AF 2 do sítio
Morrinhos). Isto determina um padrão composicional intra e inter-sítio nas arqueofácies
lenticulares e pretas, compostas por carvões e ossos queimados, cujo teor de MO se
diferencia das arqueofácies decimétricas conchíferas que representam grande parte do
volume dos grandes sambaquis.
218
Figura 5.52. Análises isotópicas (δ13C e δ15N e razão C/N) de amostras provenientes das AF 1, 2, 3, 4, 5,
6 e 7 do sítio Jabuticabeira 1: A) gráfico de valores de δ13C e razão C/N com intervalos definidos para
plantas de ciclo fotossintético C3 e algas; B) gráfico dos valores de δ15N e δ13C, com intervalos definidos
para plantas de ciclo fotossintético C3 e animais marinhos.
Micromorfologia
Para análise micromorfológica, coletaram-se cinco amostras indeformadas das AF
5, 6, 7, 8 e 9. Na Tabela 5.14, apresenta-se a descrição geral das cinco lâminas
analisadas. De todas as seções delgadas, apenas a correspondente à AF 7 apresentou
quatro microfácies. No restante de lâminas, cada arqueofácies identificada em campo
correspondeu uma única microfácies.
Figura 5.54. Gráficos com porcentagens dos diferentes componentes microscópicos das microfácies
identificadas nas AF 5 (mF 5), 6 (mF 6), 7 (mF 7.1, 7.2, 7.3 e 7.4), 8 (mF 8) e 9 (mF 9) do sítio
Jabuticabeira 1: A) freqüências de componentes da fração grossa; B) relação entre as porcentagens de
poros, fração grossa e fração fina.
219
Figura 5.53. Desenho esquemático das cinco seções delgadas analisadas no sítio Jabuticabeira 1, com localização do bloco de amostragem na sucessão vertical inferior
(esquerda) e superior (direita) e identificação de microfácies na lâmina.
220
Tabela 5.14. Descrição micromorfológica do sambaqui Jabuticabeira 1.
5
e-cx 10
gr
20200µm
Grãos revestidos
interligados/
Microagregados
intergranulares
85/15
gef
quit
••••
5
e-cx
cm
fs
5/6
5
gr
vários
Grãos revestidos
interligados/
Microagregados
intergranulares
•••
•••
60/40
gef
quit
•
•
••
••
••
••
•
•
85
pt/tr
Fábrica b
%
Limpidez
Micromassa
Cor
Tecidos
Raízes
Osso
Escória
Frag. lít
Ag. argila
Quartzo
Concha
Microestrutura
Dist. rel. g/f
Tam.
razão g/f
%
Agregados
mF
Porosidade
Am.
Carvão
Fr. org.
gr.
Fr. min. gr.
cri
Composição
Argila, mat.
orgânica e
fosfatos
10
ms
m-g Argila com
diatomáceas
5
lp
ind
80
pt/tr
cri
••••
20
ms
m-g
FP
rev
hiporev
ench
microcarvão
Argila, mat.
orgânica e
fosfatos
hiporev
Fe-nod
Argila com
diatomáceas
Argila, mat. hiporev
orgânica e
Fe-nod
fosfatos
exc
Freqüências de classes segundo Bullock et al. (1985): • Muito Poucas (< 5%); •• Poucas (5-15%) ; ••• Comum (15-30%) ; •••• Freqüente (30-50%); ••••• Dominante (50-70%);
•••••• Muito dominante (>70%). Am. = amostra; mF = microfácies; Tam.= tamanho; Fr. min. gr. = fração mineral grossa; Fr. org. gr. = fração orgânica grossa; FP = feições
pedológicas. O singificado das demais abreviações utilizadas nesta tabela encontra-se no Anexo, Tabela A.5.
6
e-cx
25
gr
150120µm
Microagregados
intergranulares
80/20
en
••••
•••
221
•
••
•
pt/tr
cri
Tabela 5.14. Continuação. 7
7.1
7.2
7.3
7.4
50/50
Maciça
10/90
50
e-cx
fs
cm
20
e-cx
50
e-cx
fs
cm
cn
20
fs
10
gr
gr
gr
ag 0,5-1cm
en
por
••••
en
••••••
en
por
••
••
•••••
•
•••
••
•
•••
cri
Composição
Argila
rubefactada
ind
Argila
carbonizada
••
50
•
pt
pt
••
cri
80
pt
cri
20
ms
m-g
FP
Cris
Argila, micrita
e mat.
orgânica
Argila, micrita
e mat.
hiporev
orgânica
ench
Fe-nod
Argila com
diatomáceas
por
•••
•••
222
••••
pt
Fábrica b
vários
Microagregados
intergranulares/
grânulos
coesivos
%
Limpidez
90/10
Micromassa
Cor
Microagregados
intergranulares
Tecidos
Raízes
100-200
µm
Osso
30/70
Frag. lít
Outros min.
Microagregados
intergranulares
Argila queim.
50100µm
Quartzo
Microestrutura
Concha
Tam.
Dist. rel. g/f
razão g/f
%
Agregados
mF
Porosidade
Am.
Carvão
Fr. org.
gr.
Fr. min. gr.
•
ms
m-g
Argila com
diatomáceas
rev
hiporev
Fe-nod
Tabela 5.14. Continuação. 30
gr
vários
en
•••••
•••••
•••
223
••
••
••
••
•
pt
cri
•
pt
cri
Cor
••
Tecidos
Raízes
Frag. lít
Escória
70/30
Ag. argila
Microagregados
intergranulares/
grânulos
coesivos
••••
Quartzo
en
Concha
70/30
Carvão
vários
Osso
gr
Microagregados
intergranulares/
grânulos
coesivos
Microestrutura
Fábrica b
9
e-cx
cm
fs
35
Dist. rel. g/f
8
Tam.
razão g/f
e-cx
cm
fs
%
Agregados
mF
Porosidade
Am.
Micromassa
Limpidez
Fr. org.
gr.
Fr. min. gr.
%
Composição
Argila, micrita
e mat.
orgânica
FP
rev
Fe-nod
Argila, micrita
rev
e mat.
ench
orgânica
Fe-nod
Tabela 5.15. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra JB1-5.
JB1-5
%
Tamanho
Forma
Arredondamento
Seleção
Distribuição
básica
Concha
30
Vários
-
-
Não selecionado
Linear
Gastróp.
3
-
-
Bem selecionado
Quartzo
40
Equidimensional
Arredondado
Esc. vítrea
Ag. argila
2
3
100 µm
Areia média e
fina
Vários
1-2 mm
Vários
Vários
Osso
15
Vários
Carvão
Raízes
5
2
Vários
Vários
mF
Aleatória
Orientação
básica
Paralelismo de
ângulo baixo
-
Distribuição
referenciada
Inclinado à
superfície
-
Bem selecionado
Aleatória
-
-
-
Arredondado
Anguloso
Não selecionado
Não selecionado
Aleatória
Aleatória
-
-
-
Subanguloso
Não selecionado
Aleatória
-
-
-
-
Não selecionado
-
Aleatória
Aleatória
-
-
Queima e
dissolução
-
224
Alteração
-
Tabela 5.16. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra JB1-5/6.
JB1-5/6
mF
%
Tamanho
Forma
Arredondamento
Seleção
Distribuição
básica
Orientação
básica
Distribuição
referenciada
Alteração
Concha
5
40
Vários
-
-
Não selecionado
Aleatória
-
-
Dissolução
Gastróp.
5
2
-
Aleatória
-
-
-
5
30
Bem selecionado
Aleatória
-
-
-
Ag. argila
6
10
-
Arredondadosubarredondado
-
Bem selecionado
Quartzo
Não selecionado
Aleatória
-
-
Osso
5
15
-
-
Seleção pobre
Aleatória
-
-
Carvão
5
3
100 µm
Areia média e
fina
1 cm
Areia fina a
média
Areia grossa
-
Anguloso
Não selecionado
Aleatória
-
-
Queima e
dissolução
-
Concha
6
50
-
Não selecionado
Aleatória
-
-
Dissolução
Quartzo
6
30
Bem selecionado
Aleatória
-
-
-
Frag. lít.
6
3
Lenticular
Arredondadosubarredondado
Subanguloso
Não selecionado
Aleatória
-
-
Osso
6
15
-
-
Seleção pobre
Aleatória
-
-
Carvão
6
2
-
Anguloso
Não selecionado
Aleatória
-
-
Queima e
dissolução
-
Vários
Areia média e
fina
Areia grossa
Areia fina a
média
Areia grossa
Equidimensional
Equidimensional
225
Tabela 5.17. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra JB1-7
JB1-7
mF
%
Tamanho
Forma
Arredondamento
Seleção
Distribuição
básica
Orientação
básica
Distribuição
referenciada
Concha
7.1
45
Vários
-
-
Não selecionado
Linear
Paralela
Paralela à
superfície
Quartzo
7.1
5
Areia média e
fina
Equidimensional
Arredondadosubarredondado
Bem selecionado
Aleatória
-
-
Arg. quei.
7.1
35
0,5-1,0 cm
-
-
Não selecionado
Aleatória
-
-
Osso
Carvão
7.1
7.1
5
10
Vários
Vários
-
-
Não selecionado
Não selecionado
Aleatória
Aleatória
-
-
Concha
7.2
85
Vários
-
-
Não selecionado
Linear
Paralela
Paralela à
superfície
10%
queimado a
T>600°C
Quartzo
7.2
5
Bem selecionado
Aleatória
-
-
-
Osso
Carvão
7.2
7.2
8
2
Não selecionado
Não selecionado
Aleatória
Aleatória
-
-
Queima
-
Areia média e
fina
Vários
Vários
Equidimensional
-
Arredondadosubarredondado
-
226
Alteração
30%
queimado a
T>600°C
Carbonizado
e rubificado
Queima
-
Tabela 5.17. Continuação.
JB1-7
mF
%
Tamanho
Forma
Arredondamento
Seleção
Distribuição
básica
Orientação
básica
Distribuição
referenciada
Concha
7.3
50
Vários
-
-
Não selecionado
Aleatória/Linear
20% paralela
Paralela à
superfície
Quartzo
7.3
20
Bem selecionado
Aleatória
-
-
Arg. quei.
Osso
Carvão
7.3
7.3
7.3
3
20
7
Areia média e
fina
2 mm
Vários
Vários
Não selecionado
Não selecionado
Não selecionado
Aleatória
Aleatória
Aleatória
-
-
Concha
7.4
35
Gastróp.
7.4
5
Quartzo
7.4
45
Glauco.
Diatom.
7.4
7.4
5
10
Alteração
10%
queimado a
T>600°C
-
Arredondadosubarredondado
-
Vários
-
-
Não selecionado
Linear
Paralela
Paralela à
superfície
100 µm
Areia média e
fina
50-100 µm
Silte
-
Arredondadosubarredondado
Arredondado
-
Bem selecionado
Aleatória
-
-
5%
queimado a
T>600°C
-
Bem selecionado
Aleatória
-
-
-
Bem selecionado
Bem selecionado
Aleatória
Aleatória
-
-
-
Equidimensional
Equidimensional
Equidimensional
-
Rubificado
Queima
-
227
Tabela 5.18. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra JB1-8.
JB1-8
%
Tamanho
Forma
Arredondamento
Seleção
Distribuição
básica
Concha
35
Vários
-
-
Não selecionado
Aleatória/Linear
Quartzo
50
Bem selecionado
Osso
Carvão
Raízes
10
3
2
mF
Areia média e
fina
Vários
Vários
Vários
Equidimensional
-
Arredondadosubarredondado
-
Orientação
básica
10% paralelismo
de ângulo baixo
Distribuição
referenciada
Inclinada à
superfície
Aleatória
-
-
-
Não selecionado
Não selecionado
-
Aleatória
Aleatória
Aleatória
-
-
Queima
-
Orientação
básica
70% paralelismo
de ângulo baixo
Distribuição
referenciada
Inclinada à
superfície
Alteração
Dissolução
Tabela 5.19. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra JB1-9.
JB1-9
%
Tamanho
Forma
Arredondamento
Seleção
Distribuição
básica
Concha
53
Vários
-
-
Não selecionado
Aleatória/Linear
Quartzo
20
Bem selecionado
Aleatória
-
-
-
Ag. argila
10
Areia média e
fina
1-4 mm
Não selecionado
Aleatória
-
-
Osso
10
Carvão
Raízes
5
2
Queima e
dissolução
-
mF
-
Arredondadosubarredondado
-
Vários
-
-
Não selecionado
Aleatória
-
-
Vários
Vários
-
-
Não selecionado
-
Aleatória
Aleatória
-
-
Equidimensional
Alteração
Dissolução
228
O sambaqui Jabuticabeira 1 apresenta semelhanças com o sítio Morrinhos em
termos da diversidade de componentes da fração grossa. Incluem-se: fragmentos de
concha, com 10 a 100% distribuídas sub-horizontalmente; areia quartzosa de
granulometria média a fina; fragmentos de osso (com sinais de queima e dissolução);
carvão; escória vítrea; e agregados milimétricos de argilominerais contendo grãos de
argila glauconítica, gastrópodes e diatomáceas (Figura 5.54 A; Tabelas 5.15 a 5.19). Os
agregados de argilomineral apresentam a mesma composição que os agregados que
compõem a mF 4a.3 e que foram identificados na fração grossa da mF 4b do sítio
Morrinhos.
Diferente do sítio Morrinhos, Jabuticabeira 1 não contém feldspatos na fração
grossa e é muito pobre em fragmentos líticos (um único fragmento lítico foi observado
na mF 6). A fração grossa mineral é composta principalmente por grãos
equidimensionais, arredondados a subarredondados de quartzo de granulometria areia
média a fina (Tabelas 5.15 a 5.19). Isto sugere que a fração grossa mineral de
Jabuticabeira 1 não estaria relacionada com o afloramento granítico sobre o qual
repousa parte do sítio, como no caso do sítio Morrinhos, mas com outra fonte de
sedimentos próxima ao local de levantamento do sambaqui. Isto sustenta a hipótese,
levantada anteriormente, sobre a areia gossa e muito grossa terrígen evidenciada na
análise granulométrica ser um artefato laboratorial, associado com ossos e conchas mal
digeridos pelo ataque ácido.
A porosidade varia entre 5 e 50 % nas diferentes microfácies analisadas, com
freqüências menores que 20% em cinco casos (mF 5, mF 7.1, mF 7.3 e mF 7.4) e
freqüências superiores a 20% nos quatro casos restantes (mF 6, mF 8 e mF 9). A fração
grossa predomina em todas as microfácies, exceto naquelas formadas principalmente
por agregados de argilominerais com diatomáceas (mF 7.1, onde os agregados estão
queimados e mF 7.4) (Figura 5.54 B). A fração fina é, no geral, uma mistura de
argilominerais com fosfatos, micrita e MO. Dependendo da microfácies, predominam os
fosfatos sobre a micrita.
Análises com sistema MEV-EED realizadas em lâmina sem lamínula da amostra
JB1-8 (mF 8) confirmam a composição da micromassa inferida a partir das propriedades
ópticas. O cálcio é o elemento químico predominante na fração fina (~24%), seguido de
Si (~14%), P (~11%), Sr (~1.9%) e Na (~1.5%), com teores menores que 1% de outros
elementos (Fe, Al e Mg). A proporção entre Ca e P (razão Ca/P de 2.18) indica presença
229
de fosfatos derivados da dissolução dos ossos (Adderley et al., 2004; Le Geros and Le
Geros, 1984; Schaefer et al., 2004). A concentração de Si na fração fina sugere mistura
com resíduos silicosos associados à queima de material vegetal. As micro-análises com
sistema MEV-EES também corroboraram a composição aluminossilicática dos
agregados de argila (Anexo, Figura A.5).
A mF 5 é formada por uma mistura de argilominerais com fosfatos secundários,
MO e microcarvões. Todos os componentes malacológicos da fração grossa, inclusive
os fragmentos menores (cumprimento inferior a 500 µm), apresentam distribuição
horizontal a sub-horizontal (Figura 5.55 B). Observam-se, nesta microfácies, agregados
de argilominerais com diatomáceas. (Figura 5.55 C-D; Figura 5.56 B). Na micromassa,
observam-se enchimentos, revestimentos e hiporrevestimentos de micrita associados
com a precipitação de carbonato atribuído à dissolução das conchas (Figura 5.55 E-F).
Dentre os componentes da fração grossa, destacam-se os agregados de escória vítrea,
produzidos pela fusão térmica de material silicoso, como fitólitos e diatomáceas (Figura
5.56 A). Uma espécie de gastrópode foi encontrada na mF 5, semelhante ao observado
nas AF 3 e 4 do sítio Morrinhos (Figura 5.56 C). Os fragmentos de osso apresentam
sinais de queima e dissolução (Figura 5.56 D).
A mF 6 diferencia-se da mF 5 pela distribuição aleatória dos fragmentos de
concha, microestrutura de microagregados intergranulares e ausência de agregados de
argilominerais com diatomáceas (Figura 5.57 B). A micromassa é a mesma que na mF
5, com mistura de argilominerais, MO e fosfatos derivados da precipitação do fosfato
dissolvido dos ossos (Figura 5.57 C-D).
A seção delgada correspondente à AF 7 é a que apresentou maior complexidade
dentro do perfil analisadom apesar de, na descrição macroscópica, não mostrar indícios
de micro-estratificação. Foram identificadas quatro microfácies sucessivas nesta lâmina
(Figura 5.53; Tabela 5.14). A mF 7.1, de 1 cm de espessura, caracteriza-se por estar
completamente queimada (Figura 5.58 A-B). Os fragmentos de concha apresentam, em
todos os casos, sinais de alteração térmica, com 30% dos fragmentos a temperaturas
superiores a 600°C (Tabela 5.17). Os agregados de argilominerais com diatomáceas,
que perfazem 50% da fração fina desta microfácies, estão carbonizados ou rubificados
(Figura 5.59 A-D). O restante da fração fina compõe-se de argilominerais, micrita e
MO. Apesar de se tratar de uma microfácies completamente queimada, não se
observaram áreas de concentração de cinzas de madeira. As áreas de concentração de
230
micrita estão relacionadas com a alteração de conchas queimadas a temperaturas no
entorno dos 800° C (Figura 5.59 E-F). Dentro dos agregados de argila queimada,
identificam-se as mesmas espécies de diatomáceas que se observaram nos agregados de
lama do sítio Morrinhos e da mF 5 de Jabuticabeira 1 (Figura 5.59 D).
A mF 7.2, de 0,7 cm de espessura, imediatamente inferior a mF 7.1, apresenta
microestrutura de microagregados intergranulares com fragmentos de concha de
distribuição horizontal (Figura 5.58 D), 10% dos quais contêm evidências de queima a
temperatura superior a 600° C. Nesta microfácies, domina a fração grossa, formada por
conchas, grãos de quartzo, fragmentos de osso e carvão. A mF 7.3, com 2,6 cm de
espessura, apresenta, em 80% da sua área, microestrutura de microagregados
intergranulares com grãos coesivos e 20% de microestrutura maciça formada por
macro-agregados
de
argilominerais
com
diatomáceas
(Figura
5.58
E).
Aproximadamente 20% dos fragmentos de concha estão orientados sub-horizontalmente
e cerca de 10% apresentam sinais de queima a temperatura superior a 600° C (Tabela
5.17). Abaixo da mF 7.3 volta a aparecer a mF 7.2, com aproximadamente 2 cm de
espessura.
A última microfácies identificada na AF 7 (mF 7.4) é formada por agregados
milimétricos a centimétricos de argilominerais (Figura 5.58 F). Entre os agregados,
observam-se gastrópodes (Figura 5.60 A), fragmentos de concha de distribuição
horizontal, 5% deles queimados a temperaturas maiores que 600°C (Figura 5.60 B),
diatomáceas (Figura 5.60 C-D) e grãos de argila glauconítica (Figura 5.60 E-F).
A identificação das espécies de diatomáceas que aparecem na mF 7.4 mostra a
existência de Triceratium flavus, Actinoptycus vulgaris e fragmentos de Biddulphia
pulchella e Coscinodiscus sp (Amaral 2011, comunicação pessoal). O predomínio de
Paralia sulcata já foi detectado em sedimentos paleolagunares da região (Amaral, 2008;
Amaral et al., 2012). Trata-se de uma espécie marinha euritrópica, que tolera variações
de salinidade das águas de 5 até 40 ‰. Biddulphia pulchella é igualmente euritrópica,
enquanto Triceratium flavus e Actinoptycus vulgaris são espécies marinhas
estenotópicas, que não toleram grandes variações na salinidade das águas (vivem em
condições de salinidade entre 30 e 40‰). Assim, a assembleia de diatomáceas
encontrada nos agregados de lama indica águas meso a eusalinas (>5 a 40‰). Estes
agregados de argila devem corresponder, portanto, a sedimentos associados a fundo
231
estuarino-lagunar, hipótese reforçada pela granulação fina e pela alta freqüência de
Paralia sulcata.
As microfácies mF 8 e mF 9 apresentam muitas semelhanças entre si em termos
de microestrutura (microagregados integranulares e grânulos coesivos), composição da
fração grossa (conchas, grãos de quartzo, ossos e carvões) e da micromassa
(argilominerais com micrita e MO) (Figura 5.61 C-D; Tabela 5.14). A diferença reside
nos agregados de argilominerais com diatomáceas na mF 9 (Figura 5.62 B-D , junto
com maior freqüência de fragmentos de concha de distribuição sub-horizontal também
na mF 9, diferente da mF 8, onde as conchas estão distribuídas aleatoriamente (Figura
5.61 B, Figura 5.62 B; Tabela 5.18, 5.19).
O sítio Jabuticabeira 1 possui as mesmas feições pedológicas observadas em
outros sambaquis de padrão estratigráfico conchífero (Caipora, Morrinhos). As mais
recorrentes são os revestimentos, hiporrevestimentos e enchimentos de carbonato de
cálcio relacionado com a precipitação do carbonato dissolvido das conchas. Além destas
feições carbonáticas, observaram-se ainda nódulos órticos de óxi-hidróxido de ferro,
cuja formação pode relacionar-se com o regime hidrológico local, sendo favorecida por
chuvas sazonais e episódios de alagamento e ressecação dos sedimentos. Como
observado no sambaqui Morrinhos, a alteração intempérica dos sedimentos
arqueológicos não destrói totalmente as microfácies e é possível identificar no sambaqui
áreas de atividade bem preservadas. A diferença entre as mF 5, 6, 8 e 9, de composição
relativamente homogênea, e a mF 7, microestratificada, indica a existência de pelo
menos dois tipos de episódios deposicionais na formação do sambaqui: deposição
massiva de material retrabalhado; e deposição de finas lentes de materiais de
proveniência diversa, atribuídos a períodos de ocupação mais intensa.
232
Figura 5.55. Fotomicrografias da mF 5, amostras 5 e 5/6, do sítio Jabuticabeira 1: A) seção vertical
esquemática, com localização da amostra para micromorfologia; B) massa basal da mF 5 formada por
conchas de distribuição sub-horizontal com alguns fragmentos de osso e carvão, PPL; C) agregado
milimétrico de argilomineral, PPL; D) agregado de argilominerais associado à face côncava de concha de
Anomalocardia brasiliana; E, F) micromassa de grãos revestidos interligados, PPL e XPL.
233
Figura 5.56. Fotomicrografias de elementos de componentes da fração grossa da mF 5 (PPL): A) escória
vítrea; B) concentração de diatomáceas da espécie Paralia sulcata em agregado de argilominerais; C)
gastrópode; D) fragmento de osso, com sinais de dissolução.
Figura 5.57. Fotomicrografias da mF 6, amostra 5/6, do sítio Jabuticabeira 1: A) seção vertical
esquemática com localização da amostra para micromorfologia; B) massa basal formada por fragmentos
de concha, osso e grãos de quartzo em microestrutura de microagregados intergranulares, PPL; C, D)
detalhe da micromassa composta por argilominerais, MO e fosfatos, com inclusões de fragmentos de osso
na fração silte, PPL e XPL.
234
Figura 5.58. Fotomicrografias da mF 7 do sítio Jabuticabeira 1: A) seção vertical esquemática com
localização da amostra para micromorfologia; B) massa basal da mF 7.1, formada por agregados de
argilominerais rubefactos e carbonizados com camada de conchas queimadas a temperaturas maiores que
600°C, PPL; C) detalhe de agregado de argila rubefacta, PPL; D) massa basal da mF 7.2, formada por
fragmentos de concha de distribuição horizontal entre microagregados intergranulares, PPL; E) massa
basal da mF 7.3, composta por argilominerais com micrita e MO em microestrutura de grânulos coesivos,
PPL; F) massa basal da mF 7.4 formada por agregados centimétricos de argilominerais, PPL.
235
Figura 5.59. Fotomicrografias de elementos de destaque na mF 7.1: A, B) agregado de argila rubefacta,
PPL e XPL; C) agregado de argila queimada com gastrópode, PPL; D) interior de agregado de argila
queimada com diatomáceas da espécie Paralia sulcata; E) concha queimada a temperatura superior a
700° C, PPL; F) detalhe de concha queimada a temperatura superior a 800° C, com concentração de
espato associada a degradação da concha calcinada, PPL.
236
Figura 5.60. Fotomicrografias de elementos de destaque nas mF 7.3 e 7.4: A) gastrópodes na mF 7.3,
PPL; B) concha queimada a temperatura superior a 600° C na mF 7.3, PPL; C) agregado de argila da mF
7.4, com diatomácea de espécie Triceratum flavus, PPL; D) concentração de diatomáceas das espécies
Paralia sulcata, Actinoptycus vulgaris e Coscinodiscus sp., na mF 7.3, PPL; E, F) grão de argila
glauconítica em agregado de argilominerais da mF 7.4, PPL e XPL.
237
Figura 5.61. Fotomicrografias da mF 8 do sítio Jabuticabeira 1: A) seção vertical esquemática com
localização da amostra para micromorfologia; B) massa basal da mF 8, formada por fragmentos de
concha com distribuição aleatória; C, D) micromassa formada por argilominerais e micrita, PPL e XPL.
Figura 5.62. Fotomicrografias da mF 9 do sítio Jabuticabeira 1: A) seção vertical esquemática com
localização da amostra para micromorfologia; B) massa basal da mF 9 formada por fragmentos de concha
de distribuição horizontal com agregados milimétricos de argilominerais, PPL; C, D) micromassa
formada por argilominerais e micrita, com agregados de argilominerais, PPL e XPL.
238
2.2. SAMBAQUIS DE NÚCLEO ARENOSO
2.2.1. Santa Marta 10 Este sambaqui é o mais antigo do setor externo. Contém uma única datação
(6180-5750 anos cal AP) que indicaria a data possível de formação do anel de conchas
que compõe o sítio. Este anel, identificado em campo como AF 1, encontra-se inserido
em uma camada de areia lamosa preta (Fácies B) (Figura 5.63). Ambos os depósitos se
situam sobre núcleo arenoso correspondente a paleoduna de geração eólica 2,
identificada com base na coloração amarelada, no grau moderado de cimentação e
coesão (menor que o da geração 1 do mesmo local) e na presença de bandas de
impregnação (Giannini et al., 2007). Esta geração é tipicamente formada, na região,
antes do máximo transgressivo holocênico (Giannini e Suguio, 1994; Giannini et al.,
2007; Giannini, 1993).
A análise zooarqueológica mostra o predomínio de A. brasiliana, tanto inteira
(~50%)
como
fragmentada
(~48%),
no
anel
de
conchas.
Na
assembleia
arqueofaunística, destaca-se a frequência elevada de indivíduos juvenis de A. brasiliana,
mais de 4% da porcentagem total desta espécie.
O núcleo arenoso do sambaqui é referido como Fácies A. Tanto a Fácies A como
a B apresentam a mesma granulação, formada por areia fina a muito fina bem
selecionada, com a única diferença de que B contém acumulação de MO coloidal. A
transição entre uma fácies e outra é abrupta e caracterizada pela presença de
bioturbações, como pedotúbulos. Isto sugere que ambas as fácies poderiam formar parte
do mesmo tipo de depósito arenoso sobre o qual se desenvolveu um horizonte de solo
iluvial (B de espodossolo), correspondente à Fácies B, a partir da migração de solutos
orgânicos gerados em superfície.
A acumulação de MO que caracteriza a Fácies B, identificada pela coloração
preta, é mais intensa na área compreendida pelo sítio arqueológico, onde atinge 20 a 30
cm de espessura. Uma acumulação semelhante se observa também em toda a área
adjacente ao sítio, sobre as paleodunas que afloram no local, na forma de um fino
horizonte de 2 a 3 cm de espessura, de coloração marrom escuro, sobre o qual se
desenvolve vegetação de musgos. Na área externa ao sítio Santa Marta 10, esta sucessão
239
foi identificada como fácies de areia fina, de formato côncavo, sobreposta por fácies
centimétrica de areia lamosa preta. Esta seqüência de fácies é interpretada como
depósito eólico (Fácies A2), com acumulação de MO e argilominerais no topo (Fácies
B2).
Ao considerar que a diferenciação entre as Fácies A e B se deve e processos
pedogênicos, a relação entre a Fácies B e AF 1 (anel de conchas), que recobre em toda a
sua extensão, poderia ser explicada pela seguinte sucessão de eventos:
1) A ocupação humana sobre a paleoduna, então possivelmente uma duna
ativa, ocasionou a presença da AF 1 (anel de conchas).
2) Esta ocupação pode ter sido concomitante ou prévia à deposição de um
segundo evento de deposição eólica, representado pela Fácies B, no setor que
cobre a camada de conchas; esta fácies ocorre com cor preta somente neste
local, o que pode ser atribuído à acumulação de MO, que causou pedogênese
diferenciada, por atividade humana.
3) Os processos pedogênicos que ocasionaram a formação do horizonte
preto superior na Fácies B teriam sido posteriores à ocupação, como sugerido
pela ausência localizada de bandas de impregnação embaixo da AF1 (as
conchas teriam retardado ou dificultado a infiltração de materiais finos).
4) O horizonte pedogênico superior, que tem continuidade fora do sítio
porém com menor espessura, ter-se-ia formado com maior intensidade e
penetração vertical na área ocupada, devido ao aporte antrópico de material
orgânico no sítio arqueológico.
5) As evidências de pedogênese sobre a Fácies B, atribuída ao segundo
evento de deposição eólica, sugerem que o aporte de material orgânico teria
sido concomitante ou penecontemporâneo a este evento.
A combinação de episódios de deposição e pedogênse identificados no sítio Santa
Marta 10, com ênfase para a formação de horizonte de solo, transformam este sambaqui
em exemplo de perfil pedo-estratigráfio, como definido no capítulo 4 tópico 1.1.2.
240
Figura 5.63. Seção vertical estudada do sítio Santa Marta 10: A) localização dos pontos de amostragem e
descrição das arqueofácies identificadas; B) seção transversal esquemática (sem escala) da área de
localização do sítio.
Granulometria
Análises granulométricas da fração terrígena foram realizadas nas Fácies A e B,
identificadas no sambaqui, e na Fácies B2 em área externa ao sítio onde se observou
uma sucessão de fácies de areia fina (Fácies A2) sobreposta por fácies centimétrica de
areia lamosa preta (Fácies B2) (Figura 5.64). As distribuições granulométricas da Figura
5.65 têm moda na fração areia fina. O leve aumento na concentração de areia média, em
detrimento da areia muito fina, nas Fácies B e B2 em comparação com A, permite
sugerir que estas fácies, mais expostas, possuem caráter mais deflacionar que a
subjacente. O fato de esta concentração de areia média ser mais pronunciada em B,
situada no sambaqui, de que em B2, fora dele, indica também que o sítio pode ter
funcionado como armadilha de material grosso. Esta tendência de acumulação de fração
grossa no sítio é confirmada mediante o exame do diâmetro médio, cujo valor é mais
grosso no sambaqui (Fácies A e B, identificadas como SM10) que na amostra externa a
ele (Fácies B2, identificada como SM10*) (Figura 5.65 B). A comparação das
estatísticas das análises granulométricas das Fácies A, B e B2, com os dados
241
recuperados de Giannini (1993), Giannini et al. (2007), Martinho (2004) e Sawakuchi
(2003) em sedimentos de geração eólica 2, na porção que vai do Cabo de Santa Marta
até a praia Grande do Sul, mostram certa afinidade destes sedimentos com os depósitos
eólicos (Figura 5.65 B).
No entanto, os dados para a geração eólica 2 mostram maior teor de grossos que
nas amostras coletadas dentro e nas proximidades do sambaqui Santa Marta 10. Esta
diferença pode-se dever ao fato de que só areia eólica mais fina consegue chegar no alto
do morro. A comparação foi feita com base a distribuições de fração areia de amostras
coletadas em vários afloramentos de geração eólica 2 e não exclusivamente do Morro de
Santa Marta.
Figura 5.64. Amostragem externa ao sítio Santa Marta 10: A) localização do ponto de amostragem; B)
entorno de localização; C) descrição das fácies identificadas; D) trincheira amostrada com localização das
fácies.
242
Figura 5.65. Gráficos das distribuições granulométricas e estatísticas descritivas para o sítio Santa Marta
10 e amostras de sedimentos naturais das proximidades: A) histogramas da distribuição granulométrica
para as Fácies A e B identificadas no sítio Santa Marta 10 e Fácies B2 do ponto de amostragem externa
ao sambaqui; note-se o domínio da fração areia fina em todas as amostras; B) diagramas em caixa
(boxplot) das estatísticas diâmetro médio, desvio padrão e assimetria para amostra da Fácies B do sítio
Santa Marta 10 (SM10), das Fácies A e B2 da amostragem externa (SM10*) e das amostras da geração
de dunas eólicas 2 (G2) tomadas de Giannini et al. (2007), Giannini (1993), Martinho (2004) e Sawakuchi
(2003).
Isótopos de C e N (δ13C e δ53N)
Os estudos isotópicos (δ13C, δ15N e razão C/N) realizados na MO das Fácies B e
B2 (Anexo, Tabela A.1) mostram que, em ambos os casos, existem restos de plantas de
ciclo fotossintético C3, segundo intervalos definidos por Boutton (1996), Lamb et al.
(2006), Meyers (1997), Sifeddine et al. (2004) e White (2001) (Figura 5.66).
No caso da Fácies B2, a assinatura isotópica de plantas C3 pode representar a
vegetação que atualmente se desenvolve sobre as paleodunas de geração 2 no local de
estudo. No campo, observou-se sobre os afloramentos de paleodunas a presença de
243
musgos, que pertencem ao grupo de plantas de ciclo fotossintético C3 (Raven et al.,
1998; Skrzypek et al., 2007 a, 2007b). Na Fácies B, que se limita à área compreendida
pelo sítio arqueológico, a diferença em coloração e espessura do horizonte orgânico em
relação à Fácies B2, fora do sítio, indica que outro processo, diferente da colonização da
duna por musgos, poderia ser também responsável pela acumulação de espécies C3 no
local. Este processo estaria vinculado á ocupação humana e deposição antrópica de
restos vegetais derivados, principalmente, de espécies arbustivas. Estes resíduos podem
vincular-se à deposição antrópica direta das plantas, ou aos remanentes da queima de
tronco e galhos no sambaqui.
Figura 5.66. Análises isotópicas (δ13C e δ15N e razão C/N) de amostras provenientes das Fácies B e B2 do
sítio Santa Marta 10: A) gráfico de valores de δ13C e razão C/N com intervalos definidos para plantas de
ciclo fotossintético C3 e algas; B) gráfico dos valores de δ15N e δ13C, com intervalos definidos para
plantas de ciclo fotossintético C3 e animais marinhos.
Micromorfologia
Três amostras para micromorfologia foram coletadas do sítio Santa Marta 10: uma
da transição entra as Fácies A e B, outra da Fácies B e uma última da Fácies B2, obtida,
em área externa ao sítio, da camada superficial marrom escuro sobre paleoduna (Figura
5.67; Tabela 5.20). Duas microfácies foram identificadas na amostra SM10 A/B (mF A
e mF B) assim como na amostra SM10 B2 (mF A2 e B2). A composição, freqüência,
distribuição, granulometria, forma e arredondamento dos componentes da fração grossa
(quartzo, feldspato, minerais pesados, minerais opacos e clastos de argila) de todas as
amostras são semelhantes entre si (Figura 5.68 A; Tabela 5.21-5.23).
244
Figura 5.67. Seções delgadas analisadas no sítio Santa Marta 10 (amotras SM 10 A e SM 10 A/B) e fora
do sítio (SM 10 B2), com localização dos blocos de amostragem na sucessão vertical e identificação de
microfácies na lâmina.
Figura 5.68. Gráficos com porcentagens dos diferentes componentes microscópicos das microfácies
identificadas nas Fácies A (mF A), B (mF B), A2 (mF A2) e B2 (mF B2) do sítio Santa Marta 10: A)
freqüências de componentes da fração grossa; B) relação entre as porcentagens de poros, fração grossa e
fração fina.
245
Tabela 5.20. Descrição micromorfológica do sambaqui Santa Marta 10.
B2
•
e-cx
cn 20
vs
gr
50100µm
Grãos revestidos
85/15
quit ••••••
•
•
•
•
e-cx
gr
50100µm
Grãos revestidos
quit
e microagregados 80/20 gef
intergranulares
en
••••••
•
•
•
•
10
B2
e-s
gr ~50µm
Grãos simples e
revestidos
95/5
mon
••••••
quit
•
•
•
•
•
A2
e-cx
gr ~50µm
Grãos revestidos
e interligados
85/15
quit
gef
•
•
•
•
•
••••••
Fábrica b
•
%
Limpidez
•
Micromassa
Cor
•
Tecidos
Raízes
quit ••••••
Frag lítico
95/5
Feldspato
Grãos simples e
revestidos
Quartzo
~50µm
Microestrutura
Dist. rel. g/f
gr
%
e-s
e-cx
40
cn
razão g/f
Clasto.argila
B
Min. opaco
B
Tam.
Min. pesado
A
Agregados
A-B
mF
Porosidade
Am.
Carvão
Fr. org.
gr.
Fr. min. gr.
FP
Matéria
orgânica
monomórfica
rev
Matéria
orgânica
monomórfica
rev
ind Matéria
orgânica
monomórfica
rev
Matéria
orgânica
monomórfica
rev
op ind
op ind
op
Composição
op ind
cri mo Argila iluvial,
rev
ench
Freqüências de classes segundo Bullock et al. (1985): • Muito Poucas (< 5%); •• Poucas (5-15%) ; ••• Comum (15-30%) ; •••• Freqüente (30-50%); ••••• Dominante (50-70%);
•••••• Muito dominante (>70%). Am. = amostra; mF = microfácies; Tam.= tamanho; Fr. min. gr. = fração mineral grossa; Fr. org. gr. = fração orgânica grossa; FP = feições
pedológicas. O singificado das demais abreviações utilizadas nesta tabela encontra-se no Anexo, Tabela A.5.
246
Tabela 5.21. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra SM10 A/B.
SM10
A-B
Feldspato
B
3
Min. pes.
B
1
Tamanho
Forma
Arredondamento
Areia fina a
Subarredondado e
Equidimensional
mto. fina
subanguloso
Areia mto. fina
Subarredondado e
Equidimensional
subanguloso
Areia mto. fina Equidimensional
Arredondado
Min. op.
B
2
Areia mto. fina Equidimensional
Clas. arg.
B
Quartzo
mF
B
%
90
4
Areia mto. fina Equidimensional
Quartzo
A
Feldspato
A
Min. pes.
A
1
Min. op.
A
2
Areia mto. fina
Clas. arg.
A
4
Areia mto. fina Equidimensional
90
3
Areia fina a
mto. fina
Arredondado
Arredondado
Arredondado e
subarredondado
Subarredondado e
Areia mto. fina Equidimensional
subanguloso
Areia mto. fina
Equidimensional
Arredondado
Equidimensional
-
Arredondado
Arredondado
Seleção
Distribuição
básica
Orientação
básica
Distribuição
referenciada
Alteração
Bem selecionado
Aleatória
-
-
-
-
-
-
-
-
-
Mto. bem
selecionado
Mto. bem
selecionado
Mto. bem
selecionado
Mto. bem
selecionado
Bem selecionado
Mto. bem
selecionado
Mto. bem
selecionado
Mto. bem
selecionado
Mto. bem
selecionado
Aleatória
-
Aleatória
-
Aleatória
-
Aleatória
-
-
-
Aleatória
-
-
-
Aleatória
-
-
-
-
-
-
-
-
-
Aleatória
-
Aleatória
-
Aleatória
-
247
Tabela 5.22. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra SM10 B.
SM10 B
mF
Feldspato
3
Min. pes.
1
Tamanho
Forma
Arredondamento
Areia fina a
Subarredondado e
Equidimensional
mto. fina
subanguloso
Areia mto. fina
Subarredondado e
Equidimensional
subanguloso
Areia mto. fina Equidimensional
Arredondado
Min. op.
2
Areia mto. fina Equidimensional
Quartzo
%
90
Arredondado
Clas. arg.
4
Areia mto. fina Equidimensional
Arredondado
Seleção
Distribuição
básica
Orientação
básica
Distribuição
referenciada
Alteração
Bem selecionado
Aleatória
-
-
-
-
-
-
-
-
-
-
-
Mto. bem
selecionado
Mto. bem
selecionado
Mto. bem
selecionado
Mto. bem
selecionado
Aleatória
-
Aleatória
-
Aleatória
-
Aleatória
-
248
Tabela 5.23. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra SM10 B2.
SM10 B2
Quartzo
mF
B2
%
Feldspato
B2
3
Frag.lítico
B2
1
Min. pes.
B2
2
Tamanho
Forma
Arredondamento
Areia fina a
Subarredondado e
Equidimensional
mto. fina
subanguloso
Areia mto. fina
Subarredondado e
Equidimensional
subanguloso
Areia mto. fina Equidimensional
Arredondado e
cilíndrico
subarredondado
Areia mto. fina Equidimensional
Arredondado
Min. op.
B2
1
Areia mto. fina Equidimensional
Clas. arg.
B2
90
3
Areia mto. fina Equidimensional
Arredondado
Arredondado
Quartzo
A2
Feldspato
A2
3
Frag.lítico
A2
1
Min. pes.
A2
2
Areia fina a
Subarredondado e
Equidimensional
mto. fina
subanguloso
Areia mto. fina
Subarredondado e
Equidimensional
subanguloso
Areia mto. fina Equidimensional
Arredondado e
cilíndrico
subarredondado
Areia mto. fina Equidimensional
Arredondado
Min. op.
A2
1
Areia mto. fina Equidimensional
Clas. arg.
A2
90
3
Areia mto. fina Equidimensional
Arredondado
Arredondado
Seleção
Distribuição
básica
Orientação
básica
Distribuição
referenciada
Alteração
Bem selecionado
Aleatória
-
-
-
Mto. bem
selecionado
Aleatória
-
-
-
-
-
-
-
-
-
Bem selecionado
Aleatória
Mto. bem
selecionado
Mto. bem
selecionado
Mto. bem
selecionado
Aleatória
-
Aleatória
-
Aleatória
-
-
-
Bem selecionado
Aleatória
-
-
-
Mto. bem
selecionado
Aleatória
-
-
-
-
-
-
-
-
-
-
-
Bem selecionado
Aleatória
Mto. bem
selecionado
Mto. bem
selecionado
Mto. bem
selecionado
Aleatória
-
Aleatória
-
Aleatória
-
249
As características da fração grossa são condizentes com as encontradas por
Martinho e Giannini (2001), em estudo petrográfico, nas paleodunas de geração eólica 2
do Morro de Santa Marta. Segundo os autores, a granulometria modal destes depósitos
eólicos é areia fina a muito fina, com empacotamento aberto e cimento formado por
argilominerais. A fração grossa, ou arcabouço segundo a terminologia utilizada na
petrografia sedimentar, é formada por quartzo (83-89%), seguido de componentes
líticos extra e intraclásticos (8 a 13 %) e grãos de feldspato (2 %). Dentre os
componentes líticos que se mencionam no trabalho de Martinho e Giannini (2001),
predominam os clastos de argila arredondados, assim como nas observações realizadas
nesta tese (Figura 5.68 A; Figura 5.69 A, B), junto com minerais pessados opacos e
anisotrópicos (Figura 5.68 A; Figura 5.69 C,D). As mF A e A2 são as que apresentam a
maior semelhança com as descrições de Martinho & Giannini (2001) para dunas de
geração eólica 2, com microestrutura de grãos simples e revestidos por MO, em A, e
argilominerais, em A2 (Figura 5.70).
Todas as amostras analisadas apresentam fração fina na forma de revestimentos
contínuos ao redor dos grãos minerais, que resulta em microestrutura de grãos
revestidos e/ou interligados e distribuição relacionada g/f de tipo quitônico e gefúrico,
com ocasionais agregados integranulares na Fácies B (com microestrutura de
microagregados intergranulares e distribuição relacionada g/f de tipo enáulico). A
diferença maior entre as amostras refere à presença de fração fina composta por MO
monomórfica na sucessão estratigráfica do sítio Santa Marta 10 (mF A e B), contrário à
matriz de argila mineral que caracteriza os sedimentos eólicos extra-sítio (mF A2 e B2).
Em termos gerais, as mF A e A2 são mais porosas e com menor teor de fração fina que
as mF B e B2 (Figura 5.68 B).
Na mF B, observou-se a presença de revestimentos de MO monomórfica ao redor
dos grãos minerais. Estes revestimentos são indicadores de horizontes B espódicos
(Buurman and Jongmans, 2005; Wilson and Righi, 2010) (Figuras 5.71). As gretas que
se observam nos revestimentos e em alguns dos agregados de MO são interpretadas
como feições de dessecamento de gels de MO altamente hidratados (Buurman &
Jongmans, 2005; De Connick 1980). Nos agregados, as gretas de dessecação, formadas
pela dissecação e dissolução de finos, são descritas como porosidade cavitária
policôncava e indicam, junto com a subdivisão dos agregados de MO em unidades
menores, processos de despodzolização (Coelho, 2008) (Figura 5.71 F).
250
Na mF B2, observaram-se múltiplos revestimentos de argila microlaminados, de
cor marrom avermelhado (PPL), contínuos ao redor dos grãos e pendentes nos poros,
junto com alguns enchimentos de argila microlaminada (Figura 5.72). Na mF A2,
encontraram-se revestimentos de MO monomórfica, mas em quantidade e espessura
menor que o observado na Fácies B.
As mF B e B2, apesar de terem sido desenvolvidas sobre o mesmo substrato de
paleoduna eólica, diferenciam-se pela microestrutura e composição da fração fina. Na
mF B2, a microestrutura é de grãos revestidos e interligados por revestimentos de
argilominerais, enquanto na mF B a microestrutura é de grãos revestidos por MO
monomórfica. A composição semiquantitativa da fração fina na mF B foi determinada
por sistema MEV-EED. Os agregados e revestimentos pretos que se observam na seção
delgada estão compostos por Si (~34%), Al (~11%), Fe (~2-3%), Na (~2%), Ca
(~1.5%), K (~1%) e Mg (0.8%) (Anexo, Figura A.6). A composição indica a presença
de compostos de Al junto à MO, como seria esperável em horizontes espódicos
cimentados, nos quais a MO monomórfica aparece complexada a compostos metálicos
(Van Breemen and Buurman, 2003; De Connick, 1980).
Figura 5.69. Fotomicrografias de grãos minerais no sítio Santa Marta 10: A, B) mineral opaco e mineral
pesado anisotrópico, PPL e XPL; C, D) clasto de argila. Pelas suas propriedades ópticas, como coloração
esverdeada (PPL) e cor de interferência laranja os clastos de argila poderiam ser esmectita ou glauconita.
251
A presença de revestimentos orgânicos no sítio arqueológico e de revestimentos
de argilominerais na área imediatamente externa deve-se à ação do mesmo processo de
transporte de MO e compostos de Al e/ou Fe em solução ao longo do perfil. A única
diferença está em que, na área externa ao sítio, existiu uma acumulação de
argilominerais que foi erodida, e que favoreceu a migração de argila em dispersão ao
longo do perfil pela ação das chuvas; enquanto no sambaqui, foi a acumulação de
resíduos orgânicos o que favoreceu a produção e migração de ácidos orgânicos. A
disponibilidade de cátions de Fe ou Al em certas partes do perfil, derivados do
intemperismo dos feldspatos ou minerais pesados, teria provocado a floculação da MO e
dos argilominerais, na forma de agregados intergranulares e/ou revestimentos ao redor
dos grãos.
Figura 5.70. Fotomicrografias da mF A do sítio Santa Marta 10: A) seção vertical esquemática, com
localização da amostra para micromorfologia; B) massa basal composta por grãos de quartzo, feldspato,
minerais pesados e opacos, PPL; C, D) detalhe dos revestimentos delgados de MO ao redor dos grãos
minerais, PPL e XPL.
252
Figura 5.71. Fotomicrografias da mF B do sítio Santa Marta 10: A) seção vertical esquemática, com
localização da amostra para micromorfologia; B) massa basal composta por grãos de quartzo, feldspato,
minerais pesados e opacos, PPL; C, D) microestrutura de grãos revestidos, PPL e XPL; E, F) detalhe dos
revestimentos de MO ao redor dos grãos da fração grossa, PPL.
253
Figura 5.72. Fotomicrografias da mF B2 nas proximidades do sítio Santa Marta 10: A, B) massa basal
composta por grãos simples e interligados, PPL e XPL; C-F) detalhe dos revestimentos de argila microlaminada, PPL e XPL.
2.2.2. Carniça 3 Localizado sobre paleopontal lagunar, na região de Campos Verdes, este
sambaqui apresenta estratigrafia simples, semelhante à observada no sítio Santa Marta
10. No entanto, apesar da similaridade visual de ambos os sítios, existem duas
diferenças importantes entre eles, referentes a seus processos de formação: no Carniça
3, as conchas estão dispersas na camada preta superficial e não aglutinadas em forma de
anel; apesar de ambos apresentarem núcleo arenoso, estudos sedimentológicos
254
mostraram que, no sítio Carniça 3, este núcleo teria origem antrópica (Tanaka 2007;
Tanaka et al; 2009) e não eólica como no caso do Santa Marta 10.
Assim, o sítio Carniça 3, com estratigrafia e composição semelhantes a outros
sambaquis de núcleo arenoso que se localizam exclusivamente no setor externo, é
formado por uma arqueofácies monticular de areia fina, maciça e amarela (AF 1),
sobreposta por arqueofácies de areia lamosa preta com conchas (AF 2) (Figura 5.73).
Análises zooarqueológicas mostram composição quase exclusiva de A. brasiliana, com
indivíduos inteiros, às vezes fechados, e também fragmentos.
Figura 5.73. Seção vertical estudada do sítio Carniça 3: A) localização dos pontos de amostragem e
descrição das arqueofácies identificadas; B) seção transversal esquemática (sem escala) da área de
localização do sítio.
Granulometria
Na Figura 5.74 A, apresenta-se o histograma da distribuição granulométrica das
AF 1 e 2 do sambaqui Carniça 3. Os dados referentes à AF 1 foram tomados de Tanaka
(2007). Ambas as distribuições têm moda na fração areia fina. Os parâmetros
estatísticos da distribuição granulométrica da AF 2 fram comparados com dados da
255
geração de dunas eólicas 3 que, segundo Tanaka et al. (2009), se superpõem aos cordões
litorâneos de Campos Verdes na porção sudeste. Os dados foram tomados de Giannini
(1993), Giannini et al. (2007), Martinho (2004) e Sawakuchi (2003), junto com dados
extraídos de Tanaka (2007) sobre os cordões litorâneos. A comparação dos parâmetros
estatísticos (diâmetro médio, desvio padrão, assimetria) (Figura 5.74 B) mostra a
afinidade do sedimento terrígeno da AF 2 com depósitos eólicos de geração 3 e cordões
litorâneos, como já constatado por Tanaka (2007, 2009) e Menezes (2009).
A comparação das estatísticas descritivas (diâmetro médio, desvio padrão,
assimetria) (Figura 5.74 B) mostra leve afinidade do sedimento terrígeno da AF 2 com
depósitos eólicos e cordões litorâneos, como já constatado por Tanaka (2007, 2009) e
Menezes (2009). No entanto, a afinidade não é completa e pode-se estar diante de outro
caso de artefato laboratorial, como já mencionado para Jabuticabeira 1, por exemplo,
com possível presença de restos de biodetritos aumentando os grossos das AF 1 e 2.
Figura 5.74. Gráficos das distribuições granulométricas e parâmetros estatísticos para o sítio Carniça 3 e
amostragem em sedimentos naturais das proximidades: A) histogramas da distribuição granulométrica
para as Fácies A e B identificadas no sítio Carniça 3; os dados referentes à AF A foram tomados de
Tanaka (2007); note-se o domínio da fração areia fina na AF 1 e de areia muito fina na AF 2; B)
diagramas em caixa (boxplot) das estatísticas diâmetro médio, desvio padrão e assimetria para AF 2 de
Carniça 3 (CR3), dunas de geração 2 (G3) e amostras de cordões litorâneos (CL) tomados de Tanaka
(2007).
A observação no microscópio estereoscópico das frações areia muito grossa
(retida na malha de 1,0 mm) e areia grossa (malha de 0,5 mm) da AF 2 confirma o
256
predomínio dos fragmentos de concha na composição da camada superior do sambaqui,
com presença subordinada de ossos e carvão (Figura 5.75). A maior parte dos
fragmentos encontra-se recoberta por um fino revestimento preto que, pela coloração e
textura, parece ser do mesmo tipo de material argiloso preto e orgânico que compõe esta
arqueofácies. Entre os ossos de peixe, de baixa freqüência de aparição, identificaram-se
fragmentos com sinais de carbonização (coloração preta) e calcinação (coloração cinza
a branco) (Figura 5. 75).
Figura 5.75. Fotomicrografias à lupa estereoscópica de grãos retidos nas malhas de 1,0 mm e 0,5 mm, da
arqueofacies 2 do sítio Carniça 3. Note-se a presença de ossos (o), conchas (ch), carvão (cr) e dente de
miraguaia (d).
Isótopos de C e N (δ13C e δ53N)
As análises isotópicas realizadas na MO da AF 2 (δ13C, δ15N e razão C/N)
confirmam o relatado por Menezes (2009) da presença, no sambaqui, de resíduos de
plantas de ciclo fotossintético C3. Os valores de δ13C e razão C/N, situam esta amostra
no intervalo definido para plantas C3. A combinação dos dados de δ13C com δ15N
voltam a confirmar esta composição (Figura 5.76).
257
No trabalho de Menezes (2009), a semelhança no sinal isotópico da MO de
outro sambaqui de núcleo arenoso, o sítio Encantada 3, e de depósitos paleolagunares
(cordões litorâneos paleolagunares) das proximidades, é interpretada como indicador de
origem análoga para a MO do depósito arqueológico e natural. Pela semelhança
estratigráfica e composicional entre sambaquis de núcleo arenoso, a autora estende a
interpretação ao sítio Carniça 3. Isto significa que, em sambaquis de núcleo arenoso,
sedimentos paleolagunares eram retransportados para deposição no sítio. No entanto, a
presença de plantas C3 em Carniça 3, detectada neste trabalho, pode estar vinculada
também à existência de resíduos de queima no depósito, derivados da combustão de
espécies arbustivas, como sugerem a presença de carvões na AF 2. Apesar de não se
terem evidências de fogueiras estruturadas no sambaqui, os carvões, ossos carbonizados
e ossos calcinados, indicam existência de resíduos de queima no sítio.
Figura 5.76. Análises isotópicas (δ13C e δ15N e razão C/N) de amostra proveniente da AF 2 do sítio
Carniça 3: A) gráfico de valores de δ13C e razão C/N com intervalos definidos para plantas de ciclo
fotossintético C3 e algas; B) gráfico dos valores de δ15N e δ13C com intervalos definidos para plantas de
ciclo fotossintético C3 e animais marinhos.
Micromorfologia
Para análise micromorfológica, coletou-se uma única amostra da AF 2 (Figura
5.77). Na mF 2 destaca a alta porosidade (60%) e a presença de conchas inteiras junto
com grãos de quartzo, com freqüência menor que 10% de feldspatos, fragmentos de
osso e raízes (Figura 5.78; Tabela 5.24). Na assembleia malacológica, domina a espécie
A. brasiliana, com cerca de 10% das valvas distribuídas sub-horizontalmente (Figura
5.79 B-D; Tabela 5.25).
258
Figura 5.77. Desenho esquemático da seção delgada analisada no sítio Carniça 3, com localização do
bloco de amostragem na sucessão vertical e identificação de microfácies na lâmina.
Figura 5.78. Gráficos com porcentagens dos diferentes componentes microscópicos da mF 2 do sítio
Carniça 3: A) freqüências de componentes da fração grossa; B) relação entre as porcentagens de poros,
fração grossa e fração fina.
259
Tabela 5.24. Descrição micromorfológica do sambaqui Carniça 3. •
•
tr
Fábrica b
•
%
Limpidez
••••
Micromassa
Cor
••••
Tecidos
Raízes
en
Osso
80/20
Frag lítico
Feldspato
Agregados
intergranulares
Quartzo
50200µm
Microestrutura
Concha
gr
Tam.
Dist. rel. g/f
e-cx 60
Agregados
%
razão g/f
2
mF
Porosidade
Am
Carvão
Fr. org.
gr.
Fr. min. gr.
Composição
FP
Matéria
orgânica mono
ind
e polimórfica
exc
Freqüências de classes segundo Bullock et al. (1985): • Muito Poucas (< 5%); •• Poucas (5-15%) ; ••• Comum (15-30%) ; •••• Freqüente (30-50%); ••••• Dominante (50-70%);
•••••• Muito dominante (>70%). Am. = amostra; mF = microfácies; Tam.= tamanho; Fr. min. gr. = fração mineral grossa; Fr. org. gr. = fração orgânica grossa; FP = feições
pedológicas. O singificado das demais abreviações utilizadas nesta tabela encontra-se no Anexo, Tabela A.5.
260
Tabela 5.25. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra CR 3 2.
CR3 2
%
Tamanho
Forma
Arredondamento
Seleção
Distribuição
básica
50
Vários
-
-
Bem selecionado
Aleatória/linear
40
Areia fina
Equidimensional
Feldspato
5
Areia mto. fina
Arredondado e
subarredondado
Arredondado e
subarredondado
Mto. bem
selecionado
Mto. bem
selecionado
Osso
3
Raízes
2
Areia fina a
grossa
~300μm
mF
Concha
Quartzo
Equidimensional
Aleatória
Aleatória
-
-
Seleção moderada
Aleatória
-
-
-
Aleatória
Orientação
básica
10% paralelismo
de ângulo baixo
Distribuição
referenciada
Inclinada à
superfície
Alteração
Queima e
dissolução
-
-
-
-
Queima e
dissolução
-
-
-
261
A microestrutura de microagregados intergranulares é formada pela atividade
biológica que produz grânulos pretos, mamilares e muito finos (de 50 a 200μm de
diâmetro) em forma de pellets soldados de MO polimórfica (Figura 5.79 E-F). A
presença desta micromassa, somado à existência de pseudo-revestimentos de MO
polimórfica e de revestimentos contínuos e descontínuos de MO preta, monomórfica,
em cerca de 80% dos componentes da fração grossa, permite associar a AF 2 com
horizonte B espódico, incipiente (Van Breemen and Buurman, 2003). As evidências de
podzolização que se observam nos sambaquis Carniça 3 e Santa Marta 10, sugerem que
recorrência deste processo, tanto em sambaquis de núcleo arenoso, como em outros
tipos de ocupação humana sobre substrato semelhante, como dunas ou paleodunas
eólicas.
O fato de a fração fina orgânica do sítio Carniça 3 apresentar microestrutura
assimilável a horizonte espódico permite sugerir que a AF 2 registraria um episódio
deposicional de resíduos orgânicos, junto com areia e conchas, com posterior alteração
pedogênica e formação de solo. Isto transforma a sucessão estratigráfica deste sambaqui
em perfil pedo-estratigráfico (sensu Arroyo-Kalin 2010), como também observado em
Santa Marta 10.
Parte dos fragmentos de osso mostra sinais de queima (Figura 5.80 A), enquanto
algumas conchas apresentam traços de bioerosão, na forma de finos canais superficiais,
conhecidos como microborings (Bromley, 1992; Glaub, 2004)(Figura 5.80 B-C). Estes
icnofósseis, de diâmetro menor que 100 μm e muito comuns em substrato calcáreo, são
produzidos em ambiente subaquático por pequenas esponjas, briozoários, algas
vermelhas, algas verdes, cianobactérias, fungos e outros micróbios (Bromley, 1992;
Glaub, 2004). A presença de bioerosões nas conchas do sambaqui é um atributo herdado
do depósito onde o molusco vivia.
Dentro e associado às raízes, destaca-se a presença recorrente de excrementos
elipsoidais de ácaros (Figura 5.80 D).
262
Figura 5.79. Fotomicrografias da mF 2 do sítio Carniça: A) seção vertical esquemática, com localização
da amostra para micromorfologia; B) massa basal composta por conchas de Anomalocardia brasiliana
inteiras com distribuição (trama/ arranjo) sub-horizontal, PPL; C, D) massa basal com conchas inteiras e
fragmentadas, a PPL e XPL; E, F) micromassa composta por agregados de MO polimórfica em forma de
pellets, a PPL e XPL.
263
Figura 5.80. Fotomigrografias de elementos de interesse na mF 2 do sítio Carniça 3: A) fragmento de osso
com sinais de queima; B, C) conchas com bioerosão; D) excrementos elipsóides de ácaros dentro de raiz,
PPL.
2.3. MONTÍCULOS ICTIOLÓGICOS 2.3.1. Santa Marta 8 O sítio Santa Marta 8, localizado no paleotômbolo à retaguarda da ponta de Santa
Marta, apresenta três particularidades que o posicionam como sítio chave no
entendimento do processo de mudança na ocupação pré-colonial do litoral sul
catarinense: é o montículo ictiológico mais antigo da região, com cerca de 1500 anos;
contém cultura material associada aos grupos do planalto (cerâmica de tradição
Taquara/Itararé), mas não se encontra sobre costão rochoso, como os demais sítios da
região com esta característica, como Costão do Ilhote e Galheta 4; e apresenta
semelhanças composicionais com a camada preta do sambaqui Jabuticabeira 2, dada a
presença em ambos de acumulação massiva de ossos de peixe, carvão e areia associada
a enterramentos humanos.
264
A sucessão estratigráfica estudada mostra uma mistura maciça de ossos de peixe
com areia e carvão, sobre areia amarela com poucos elementos antrópicos (conchas,
ossos e carvão). Três arqueofácies foram identificadas, sendo que a AF 1, inferior,
parece corresponder ao substrato arenoso natural, com alguns artefatos intrusivos da
arqueofácies superior. A AF 2, intermediária, é composta por areia lamosa preta com
aproximadamente 10% de ossos de peixe e algumas conchas (<3%). AF 2 pode
representar uma feição pós-deposicional formada por iluviação do material fino da AF
3, superior. A AF 3 abrange a maior parte da sucessão estratigráfica e trata-se de areia
cascalho-lamosa com aproximadamente 30% de ossos de peixe, que também se
distribuem em forma de bolsões (Figura 5.81).
Figura 5.81. Seção vertical estudada do sítio Santa Marta 8: A) localização dos pontos de amostragem e
descrição das arqueofácies identificadas; B) seção transversal esquemática (sem escala) da área de
localização do sítio.
265
Granulometria
Na trincheira aberta a sudeste do sítio Santa Marta 8, a sucessão observada
apresenta uma fácies arenosa inferior (Fácies A), seguida de fácies centimétrica de areia
lamosa preta (Fácies B) e areia fina marrom no topo (Fácies C) (Figura 5.82). A
interpretação desta sucessão resulta ambígua já que a fácies inferior parece corresponder
a areias eólicas, mas as duas fácies superiores podem corresponder tanto a depósitos
naturais quanto a culturais modernos, haja vista os relatos sobre aterramento desta área.
A Fácies B preta, intermediária, poderia ser tanto um depósito natural, de tipo brejo,
quanto um sedimento orgânico de aterro moderno, ou inclusive um remanescente de
ocupação pré-colonial contemporâneo à ocupação do sambaqui. A fácies arenosa
superior também admite uma origem tanto natural, já que poderia tratar-se de areia
eólica, quanto antrópica, como componente do mesmo aterro.
Figura 5.82. Amostragem externa ao sítio Santa Marta 8: A) localização do ponto de amostragem; B)
entorno de localização; C) descrição das fácies identificadas; D) trincheira amostrada com localização das
fácies.
Amostras para análises granulométricas foram coletadas das AF 1, 2 e 3 e das
Fácies A e B identificadas na trincheira aberta em área externa ao sítio. Em todas as
266
amostras, tanto no sítio como na trincheira externa, observa-se moda na fração areia
fina, com presença subordinada de areia muito fina, e de areia média e grossa
unicamente na Fácies B (Figura 5.83). A observação no microscópio estereoscópico das
frações areia muito grossa e areia grossa das AF 1, 2 e 3 confirmam o predomínio dos
fragmentos de osso, inclusive carbonizados e calcinados, na composição do sambaqui,
com presença subordinada de carvão (Figura 5.84). Cabe destacar que a observação no
microscópio estereoscópico da Fácies B determina a origem antrópica destes sedimentos
(Figura 5.85). Na Fácies B, as frações areia grossa e areia média estão composta quase
totalmente por fragmentos de osso, em frequências semelhantes às observadas no
sambaqui. Isto indica que os sedimentos do sambaqui e da Fácies B fora do sítio têm
origens semelhantes e, portanto, podem ser contemporâneas.
Figura 5.83. Histogramas da distribuição granulométrica para as AF 1, 2 e 3 do sítio Santa Marta 8 e
Fácies A e B identificadas na trincheira de amostragem externa ao sítio. Note-se o domínio da fração
areia fina em todas as amostras.
267
Figura 5.84. Fotomicrografias à lupa estereoscópica de grãos retidos nas malhas de 1,0 mm e 0,5 mm, da
arqueofacies 1, 2 e 3 do sítio Santa Marta 8 e Fácies B da trincheira aberta em área externa ao sítio. Notese a presença de ossos (o), osso carbonizado (or), e osso calcinado (oc) e dente (d).
Isótopos de C e N (δ13C e δ53N)
Análises isotópicas foram realizadas na MO das AF 2 e 3 e da Fácies B da
trincheira de amostragem externa ao sítio (Figura 5.85; Anexo, Tabela A.1). Nos
sedimentos arqueológicos, observa-se mistura de restos vegetais e resíduos de origem
animal. Esta tendência já foi relatada por Menezes (2008) na camada preta de
Jabuticabeira 2, com a qual este sambaqui apresenta grandes semelhanças
composicionais, onde existe uma. Os resíduos de animais, neste caso marinhos (Figura
5.86 B), vinculam-se ao conteúdo faunístico deste sambaqui, composto principalmente
por ossos de peixe.
A amostra correspondente à Fácies B da sondagem próxima ao sítio Santa Marta
8 apresenta valores de δ13C e δ15N semelhantes ao observado no sambaqui, ou seja,
presença de resíduos de origem animal decompostos. Isto, somado às observações na
lupa, que indicaram presença exclusiva de fragmentos de ossos de peixe nas frações
areia muito grossa e grossa dos sedimentos da Fácies B, indica que esta fácies, de
espessura centimétrica, inter-estratificada entre depósitos arenosos, possa ser parte da
área ocupada pelo grupo construtor do sítio Santa Marta 8. De fato, estudos geofísicos
realizados na região compreendida entre os sítios Santa Marta 4, 5, 7 e 8 indicaram a
268
presença de anomalias em subsuperfície associadas à existência de vestígios de
ocupação em locais externos aos sítios (Rodrigues 2009).
Figura 5.85. Análises isotópicas (δ13C e δ15N) e razão C/N de amostras provenientes das AF 2 e 3 do sítio
Santa Marta 8 e Fácies B da amostragem extra-sítio: A) gráfico de valores de δ13C e razão C/N com
intervalos definidos para plantas de ciclo fotossintético C3 e algas; B) gráfico dos valores de δ15N e δ13C
com intervalos definidos para plantas de ciclo fotossintético C3 e animais marinhos.
Micromorfologia
Três amostras para micromorfologia foram extraídas da seção vertical analisada.
A primeira abrange o contato entre as AF 1 e AF 2 (amostra 1/2), e as outras duas foram
coletadas da AF 3 (amostras 3a e 3b). Duas microfácies foram identificadas na amostra
1/2, e correspondem às mF 1 e 2, respectivamente. Nas amostras 3a e 3b, a única
microfácies identificada (mF 3) caracteriza-se por bolsões de concentração de ossos de
peixe (Figura 5.86).
Na Tabela 5.26, apresenta-se a descrição micromorfológica das três seções
delgadas analisadas no sítio Santa Marta 8. As três microfácies identificadas compõe-se
principalmente de fragmentos de ossos de peixe e grãos de quartzo (que, juntos,
totalizam ~90%), com freqüência menor que 10% de feldspatos, carvão, fragmentos
líticos, escória vítrea e minerais pesados (Figura 5.87 A). Cabe ressaltar que a mF 1
diferencia-se das restantes por ser essencialmente mineral, com alguns elementos
antrópicos (ossos, carvão e escória). A porosidade varia pouco ao longo da seção
vertical (entre 40 e 45 %), com valor mínimo na mF 2 (20%) (Figura 5.87 B). A
porcentagem de fração fina é mínima na mF 1 (<5%).
269
Os fragmentos de osso apresentam distribuição horizontal a sub-horizontal em
todas as microfácies, exceto mF 1, onde sua frequência é a mínima no perfil e a
distribuição aleatória (Tabela 27 a 28). Esta distribuição preferencial dos macrofragmentos sugere compactação do depósito e boa preservação da fábrica original.
Figura 5.86. Seções delgadas analisadas no sítio Santa Marta 8, com localização do bloco de amostragem
na sucessão vertical e identificação de microfácies na lâmina.
Figura 5.87. Gráficos com porcentagens dos diferentes componentes microscópicos das mF 1, 2, 3a e 3b
do sítio Santa Marta 8. A) freqüências de componentes da fração grossa; B) relação entre as porcentagens
de poros, fração grossa e fração fina.
270
Tabela 5.26. Descrição micromorfológica do sítio Santa Marta 8.
3a
3
e-cx
40
gr
50150μm
Microagregados
intergranulares
•••
••
•
••
•
•••••
•
90
pt
cri
90
pt
cri
10
tr
cri
3
e-cx
45
gr
50200μm
Microagregados
intergranulares
Composição
Argilomineral
com microfragmentos de
osso e carvão
Argilomineral
com microfragmentos de
osso e carvão
FP
rev
rev
ench
Argila com
diatomáceas
80/20
en
•••
••
•
•
••••••
••
•
90
10
3b
Fábrica b
en
70/30 mon
gef
•
%
Limpidez
Grãos
interligados/
Microagregados
intergranulares
••
Micromassa
Cor
gr
50150μm
mon
••••••
en
Min. pés.
95/5
Frag. lítico
Grãos simples/
microagregados
intergranulares
Feldspato
50100μm
Quartzo
gr
Carvão
20
Microestrutura
Osso
e-cx
40
Tam.
Escória
2
e-s
e-cx
Dist. rel. g/f
1
razão g/f
1/2
%
Agregados
mF
Porosidade
Am
Tecidos
Raízes
Fr. org.
gr.
Fr. min. gr.
80/20
en
•••
•
••••••
••
pt
cri
lp
ind
pt
cri
Microfragmentos de
osso
rev
exc
Microcarvão
Microfragmentos de
osso
rev
exc
Freqüências de classes segundo Bullock et al. (1985): • Muito Poucas (< 5%); •• Poucas (5-15%) ; ••• Comum (15-30%) ; •••• Freqüente (30-50%); ••••• Dominante (50-70%);
•••••• Muito dominante (>70%). Am. = amostra; mF = microfácies; Tam.= tamanho; Fr. min. gr. = fração mineral grossa; Fr. org. gr. = fração orgânica grossa; FP = feições
pedológicas. O singificado das demais abreviações utilizadas nesta tabela encontra-se no Anexo, Tabela A.5.
271
Tabela 5.27. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra SM8-1/2.
SM8 1/2
Quartzo
Feldspato
Escória
Osso
Carvão
Quartzo
Feldspato
Escória
Osso
Carvão
mF
1
Seleção
Distribuição
básica
Orientação
básica
Distribuição
referenciada
Alteração
Bem selecionado
Aleatória
-
-
-
Bem selecionado
Aleatória
-
-
-
Seleção pobre
Aleatória
-
-
-
Não selecionado
Aleatória
-
-
-
Não selecionado
Aleatória
-
-
Queima e
dissolução
-
Bem selecionado
Aleatória
-
-
-
Bem selecionado
Aleatória
-
-
-
Seleção pobre
Aleatória
-
Não selecionado
Linear/ Aleatória
-
Não selecionado
Aleatória
80% paralelismo
de ângulo baixo
-
Inclinada à
superfície
-
Queima e
dissolução
-
%
Tamanho
80
Areia fina e
5
Areia fina
1
1
2
10
50-100 μm
Vários
-
1
3
Vários
-
2
20
Areia fina e
mto. fina
Equidimensional
2
5
Areia fina
Equidimensional
2
2
2
70
50-100 μm
Vários
Arredondadosubarredondado
Arredondadosubarredondado
Arredondado
Vários
-
2
3
Vários
-
1
Forma
Arredondamento
ArredondadoEquidimensional
subarredondado
ArredondadoEquidimensional
subarredondado
Vários
Arredondado
272
Tabela 5.28. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra SM8-3a.
SM8 3a
Quartzo
Feldspato
Farg. lít.
Min. pes.
Osso
Carvão
mF
3
3
%
Tamanho
Forma
20
Areia fina
Equidimensional
3
Areia fina
Equidimensional
Areia fina
Equidimensional
3
3
3
1
3
70
3
3
Areia mto. fina Equidimensional
Arredondamento
Arredondadosubarredondado
Arredondadosubarredondado
Arredondadosubarredondado
Arredondadosubarredondado
Seleção
Distribuição
básica
Orientação
básica
Distribuição
referenciada
Alteração
Bem selecionado
Aleatória
-
-
-
Bem selecionado
Aleatória
-
-
-
Bem selecionado
Aleatória
-
-
-
Bem selecionado
Aleatória
-
-
-
Inclinada à
superfície
-
Queima e
dissolução
-
Vários
-
-
Não selecionado
Linear/ Aleatória
Vários
-
-
Não selecionado
Aleatória
80% paralelismo
de ângulo baixo
-
Seleção
Distribuição
básica
Orientação
básica
Distribuição
referenciada
Alteração
Bem selecionado
Aleatória
-
-
-
Bem selecionado
Aleatória
-
-
-
80% paralelismo
de ângulo baixo
-
Inclinada à
superfície
-
Queima e
dissolução
-
Tabela 5.29. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra SM8-3b.
SM8 3b
Quartzo
Feldspato
mF
3
3
%
Tamanho
20
Areia fina
3
Areia fina
Forma
Arredondamento
ArredondadoEquidimensional
subarredondado
ArredondadoEquidimensional
subarredondado
Osso
3
72
Vários
-
-
Não selecionado
Linear/ Aleatória
Carvão
3
5
Vários
-
-
Não selecionado
Aleatória
273
O substrato arenoso do sítio Santa Marta 8 é representado pela mF 1, composta
principalmente por grãos de areia quartzosa com 10% de ossos e 3% de carvões. A
baixa frequência de componentes antrópicos (osso e carvão) confirma a suposição
realizada no trabalho de campo, sobre a natureza intrusiva dos componentes antrópicos
desta arqueofácies. A mF 1 apresenta microestrutura de grãos simples (Figura 5.88 C)
com finos microagregados intergranulares formados por mistura de argilomineral
castanho claro a transparente (PPL) com micro-fragmentos de osso e micro-carvão
(Figura 5.88 D). O contato com a mF 2, superior, caracteriza-se pelo incremento de
fragmentos maiores de osso e carvão, aumento na proporção de fração fina e
microestrutura de grãos interligados e microagregados intergranulares (Figura 5.88 A,
E).
A fração fina da mF 2 permanece a mesma da mF 1, mas aumenta em proporção
(Figura 5.88 F) e inclui também concentrações maciças de argilominerais com
diatomáceas (Figura 5.89 A), e agregados transparentes (PPL) de espículas de esponja e
diatomáceas (Figura 5.90 B; 5.92 A). Em algumas partes, a micromassa é totalmente
transparente, com micro-fragmentos de osso e microcarvão, associada a resíduos
silícáticos e escória vítrea (Figura 5.89 C, D). Diatomáceas são também observadas
isoladamente ou formando pequenos agrupamentos associados aos fragmentos de osso
(5.92 B, C). Entre as espécies identificadas na mF 2 está Grammatophora oceânica,
espécie eusalina, euritópica, que indica presença de espécies marinhas no sambaqui. Na
mF 2, destaca-se a presença de revestimentos e enchimentos, impuros, microlaminados, mosqueados e de birrefringência baixa (XPL) de argilominerais (Figura 5.89
E, F). Estes revestimentos formam meniscos entre os componentes da fração grossa, o
que resulta na microestrutura de grãos interligados que caracteriza à mF 2. Todos os
fragmentos de osso nesta microfácies apresentam perda de colágeno relacionada com a
queima.
A mF 3 possui características semelhantes nas duas seções delgadas analisadas.
Apresenta microestrutura de microagregados intergranulares e fração grossa composta
em mais de 70% por fragmentos de osso, com grãos minerais na fração areia fina
(Figura 5.90 A-D). As feições pedológicas incluem revestimentos descontínuos,
pontuados (PPL) e indiferenciados (XPL), formados pelo transporte da fração fina, e
excrementos esferoides na forma de microagregados densos. Os fragmentos de osso de
tamanho milimétrico até centimétrico aparecem formando bolsões discretos nas
274
lâminas, com distribuição sub-horizontal e evidências de fragmentação in situ. Os
fragmentos de osso menores estão distribuídos aleatoriamente.
A fração fina da mF 3 deriva-se da degradação de fragmentos de osso em finas
partículas fosfáticas. Trata-se de agregados de microfragmentos de osso que formam
matriz castanha claro amarelada (PPL), de birrefringência baixa até indiferenciada
(XPL) (Figura 5.90 E, F). Em alguns casos, observam-se agregados entre os
componentes da fração grossa e como finos revestimentos, formados pelo que parece
ser mineral fosfático secundário, de limpidez pontuada (PPL) pela presença de microcarvão. A composição semi-quantitativa da fração fina desta microfácies foi
determinada com sistema MEV-EED. O domínio de P e Ca (~15% e 27-28%,
respectivamente), seguido de Si (~9-11%) indicam presença de fosfatos secundários e
resíduos silicáticos derivados da queima de plantas (Anexo, Figura A.7).
Assim como na mF 2, identificaram-se na mF 3 diatomáceas dispersas
misturadas entre os fragmentos de osso e entre fitólitos. Foram identificadas as espécies
Actinoptychus senarius, espécie eusalina euritópica, e Diploneis ovalis, espécie
oligosalina, entre outras (Amaral, comunicação pessoal).
Os fragmentos de osso apresentam birrefringência mais baixa que aquela
associada aos ossos frescos. A alteração na birrefringência associa-se à deterioração do
colágeno por queima, dissolução ou alteração microbiana (Figura 5.91 A-D).
Aproximadamente 15% deles apresentam sinais de queima na coloração avermelhada e
nas bordas pretas (PPL) e entre 70-90% dos ossos não tem fluorescência (UV). A alta
porcentagem de ossos sem fluorescência confirma a degradação do colágeno por
queima ou bioerosão. Fragmentos maiores apresentam fluorescência unicamente na
porção interna, que ter-se-ia preservado da degradação do colágeno. Pela dificuldade de
distinguir, unicamente com base em propriedades ópticas, entre ossos com sinais de
queima e/ou dissolução, possivelmente a porcentagem de ossos queimados neste
depósito esteja subestimada.
No entanto, a alta fragmentação dos ossos que se observa na mF 3 sugere,
indiretamente, duas trajetórias de ateração: que grande parte dos fragmentos sofreu, de
fato, alteração térmica, já que a queima torna o mineral do osso mais resistente à
alteração química (Karkanas, 2000), porém, mais suscetível à fragmentação por
pressões físicas (Steiner et al., 1995); ou que o intemperismo prolongado favoreceu a
fragmentação, ao provocar mudanças cristalográficas na fração mineral do osso que lhe
275
outorgam as mesmas propriedades que a queima, como resistência à dissolução e
suscetibilidade à quebra (Berna et al., 2004). Pelas evidências de queima e dissolução
observadas nos fragmentos ósseos de todo o depósito, uma combinação de ambos os
processos parece ser a trajetória mais provável.
A queima de ossos observada na mF 3 não foi realizada no local. Isto pode ser
inferido a partir de três indicadores: não se identificaram fogueiras estruturadas no perfil
estratigráfico; a microfácies apresenta mistura de ossos queimados a diversas
temperaturas (ver Schiegl et al., 2003); e não se observa substrato carbonizado ou
rubificado embaixo da mF 3 (ver Mallol et al., 2007; Schiegl, 1996; Weiner, 2002). Os
três indicadores micromorfológicos de queima in situ, observados na experiência de
queima discutida no tópico 1.1.4, estão ausentes na mF 3.
Em termos gerais, mF 3 caracteriza-se pela mistura de: bolsões de ossos
milimétricos, associados a micro-estratificação formada por sucessão de micro-camadas
de osso e carvão esmagados, em associação com agregados de diatomáceas; e áreas com
microestrutura de agregados intergranulares, formadas por finos fragmentos de osso,
fosfatos secundários e microcarvão, de distribuição aleatória, que indicam
retrabalhamento biológico do depósito. Esta massa basal sugere que mF 3 formou-se
pela deposição de resíduos faunísticos alterados por queima e/ou dissolução e de outros
tipos de resíduos de queima, como escória vítrea e carvões, misturados com material
terrígeno contendo agregados de diatomáceas.
A massa basal da mF 3 indica a mesma re-deposição de resíduos já observada na
camada preta de Jabuticabeira 2 (Villagran 2008). Assim, as semelhanças que se
observaram em campo entre Santa Marta 8 e a camada preta de Jabuticabeira 2 se
correspondem na escala microscópica. A alta concentração de ossos, muitos deles
queimados, junto com a presença de diatomáceas e micromassa formada por microfragmentos de osso, microcarvão e agregados de fosfatos secundários são atributos de
ambos os sítios.
276
Figura 5.88. Fotomicrografias das mF 1 e 2 do sítio Santa Marta 8: A) seção vertical esquemática, com
localização da amostra para micromorfologia; B) contato entre a mF 1, inferior, e a mF 2, superior, PPL;
C) massa basal da mF 1 composta por grãos de quartzo, PPL; D) microestrutura de grãos interligados da
mF 1, formada por micromassa de argilominerais com micro-fragmentos de osso e microcarvão, PPL; E)
massa basal da mF 2 formada por ossos, fragmentados e inteiros, carvão e grãos de quartzo, PPL; F)
microestrutura da mF 2 formada por microagregados intergranulares e grãos revestidos, PPL.
277
Figura 5.89. Fotomicrografias de elementos de interesse na mF 2 do sítio Santa Marta 8: A) agregado de
argilominerais com diatomáceas, PPL; B) concentração de espículas de esponja e diatomáceas, PPL; C)
agregado de escória vítrea, PPL; D) micromassa transparente com microcarvão e micro-fragmentos de
osso, PPL; E, F) revestimentos impuros, micro-laminados, PPL.
278
Figura 5.90. Fotomicrografias da mF 3 do sítio Santa Marta 8: A) seção vertical esquemática, com
localização das amostras para micromorfologia; B, C) massa basal composta por bolsões de fragmentos
de osso milimétricos, carvão e grãos de quartzo, PPL; D) áreas com microestrutura de microagregados
intergranulares, PPL; E, F) detalhe da micromassa formada por micro-fragmentos de osso, agregados de
fosfato secundário e microcarvão, PPL.
279
Figura 5.91. Fotomicrografias de fragmentos de osso na mF 3 com birrefringência baixa, de primeira
ordem, a PPL (A, C) e XPL (B, D).
Figura 5.92. Fotomicrografias de partículas silicosas na mF 2 e 3: A) detalhe de agregado de espículas de
esponja e diatomáceas na mF 2, PPL; B) diatomáceas e fitólitos entre fragmentos de osso de peixe na mF
2, PPL; C) detalhe de B, com frústula da diatomácea Coscinodiscus excentricus; D) fitólito alongado na
mF 3, com sinais de derretimento, PPL.
280
2.3.2. Galheta 4 O sítio Galheta 4 cobre uma área extensa da ponta da Galheta, onde também se
encontram dois sambaquis de padrão estratigráfico conchífero (Galheta 1 e 2). A
sucessão estratigráfica é composta por fácies arenosa, com bandas de impregnação
(Fácies A), superposta por camada de areia lamosa preta com ossos de peixe e carvão
(AF 1) e camada de areia amarelo claro (Fácies B) (Figura 5.93)
Apesar de corresponder à categoria de montículo ictiológico pela sua cronologia
(aproximadamente 800 anos AP) e composição (predomínio de ossos de peixe), este
sítio assemelha-se a Santa Marta 10 por apresentar características de perfil pedoestratigráfico. Assim, todos estes sítios teriam sido formados a partir da combinação de
episódios de deposição antrópica e natural, e alteração do substrato por ocupação
superficial, sem episódio construtivo. No caso de Santa Marta 10, o anel de conchas
evidencia a deposição antrópica, enquanto a Fácies B, superficial, mostra a incorporação
ao substrato eólico de resíduos orgânicos vinculados com a ocupação humana.
No sítio Galheta 4, a areia que compõe a Fácies A, inferior, poderia ter sido
depositada antropicamente, para formar um montículo, assim como a AF 1, preta e
intermediária, e a Fácies B, superior. No entanto, as observações de campo sugerem que
a Fácies A seria natural (areia eólica) e que a própria ocupação humana no local teria
favorecido, a partir de deposição de diversos resíduos orgânicos, a formação de um
antropossolo no topo desta duna, representado pela AF 1. A presença da AF 1 relacionase provavelmente à posterior formação de bandas de impregnação na Fácies A,
formadas pelo transporte vertical e cimentação de Fe ou Fe e Mn (com ou sem MO). A
Fácies B também seria naturalmente depositada, e corresponderia a areia eólica recente.
A ocupação superficial teria resultado na formação de uma extensa camada de
areia lamosa preta com bioclastos (principalmente ossos de peixe) sobre as dunas
empoleiradas que cobrem o costão rochoso. Os episódios construtivos estariam
associados com a deposição de quantidades massivas de restos faunísticos acima dos
sepultamentos identificados no local. Neste caso, a deposição eólica atua como fator
determinante no crescimento vertical do sítio.
Deve-se esclarecer que, no caso de Santa Marta 10, a camada superficial preta é
denominada de Fácies, e não arqueofácies, por não mostrar nenhuma evidência
macroscópica de se tratar de episódio deposicional de origem antrópica, e sim
281
meramente eólico. No sítio Carniça 3, esta camada é denominada de arqueofácies já
que, pelo seu conteúdo bioclástico, trata-se do produto da deposição antrópica. No sítio
Galheta 4, observa-se uma situação semelhante a Carniça 3. A camada superficial preta
é denominada de arqueofácies por incluir na sua composição numerosos fragmentos de
osso e carvão, visíveis na avaliação macroscópica dos perfis, indicadores de deposição
antrópica no local.
Granulometria
Análises granulométricas realizadas na fração terrígena das Fácies A e B e da
AF 1 mostram o predomínio da fração areia muito fina na Fácies A, inferior, e aumento
da fração areia fina na AF 1 e na Fácies B, superiores (Figura 5.94). As distribuições
granulométricas das três amostras foram comparadas com dados das quatro gerações de
dunas eólicas identificadas na região que vai do cabo de Santa Marta até a praia Grande
do Sul (Giannini, 1993; Giannini et al., 2007; Martinho, 2004; Sawakuchi, 2003). Para o
parâmetro diâmetro médio existe pouca afinidade das Fácies A, B e AF 1 com dunas
eólicas. Para o desvio padrão observa-se afinidade da Fácies A com dunas de geração 2
e da AF 1 e Fácies B com dunas de geração 3. No parâmetro assimetria, unicamente a
AF 1 e Fácies B voltam a mostrar afinidade com dunas de geração 3 (Figura 5.94 B).
A observação ao microscópio estereoscópico das frações retidas na malha de 1,0
e 0,5 mm da AF 1 constata o predomínio de restos antrópicos, como fragmentos de osso
carbonizados e calcinados (Figura 5.95).
282
Figura 5.93. Seção vertical estudada do sítio Galheta 4: A) localização dos pontos de amostragem e
descrição das arqueofácies identificadas; B) seção transversal esquemática (sem escala) da área de
localização do sítio.
283
Figura 5.94. Gráficos das distribuições granulométricas e parâmetros estatísticos para o sítio Galheta 4 e
amostragem em sedimentos naturais das proximidades: A) histogramas da distribuição granulométrica
para as Fácies A, B e AF 1; note-se o domínio da fração areia muito fina na Fácies A e areia fina na AF 1
e Fácies B; B) diagramas em caixa (boxplot) das estatísticas diâmetro médio, desvio padrão e assimetria
para AF 1 do sítio Galheta 4 (GA4), Fácies A (GA4*) e geração de dunas eólicas 1 (G1), 2 (G2), 3 (G3) e
4 (G4) tomadas de Giannini et al., (2007), Giannini (1993), Martinho (2004) e Sawakuchi (2003).
284
Figura 5.95. Fotomicrografias à lupa estereoscópica de grãos retidos nas malhas de 1,0 mm e 0,5 mm, da
arqueofacies 1 do sítio Galheta 4. Note-se a presença de ossos (o), osso carbonizado (Os.car. = or) e osso
calcinado (Os.cal. = oc).
Isótopos de C e N (δ13C e δ53N)
Análises isotópicas foram realizadas na MO da AF1 e Fácies B (Figura 5.96;
Anexo, Tabela A.1). Como observado em outros sambaquis conchíferos e montículos
ictiológicos da região, a assinatura isotópica da AF 1 indica presença de resíduos de
origem animal. Especialmente o sítio Galheta 4 e Santa Marta 8 apresentam os valores
mais positivos de δ15N e mais negativos de δ13C de todos os sítios analisados. A amostra
proveniente da Fácies B, interpretada como depósito eólico que cobriu a área de
ocupação, diferencia-se claramente da camada de ocupação por conter MO de origem
vegetal, especificamente plantas C3, associada à vegetação que cresce atualmente sobre
o depósito.
285
Figura 5. 96. Análises isotópicas (δ13C e δ15N e razão C/N) de amostras provenientes da AF 1 e Fácies B
do sítio Galheta 4: A) gráfico de valores de δ13C e razão C/N com intervalos definidos para plantas de
ciclo fotossintético C3 e algas; B) Gráfico dos valores de δ15N e δ13C com intervalos definidos para
plantas de ciclo fotossintético C3 e animais marinhos.
Micromorfologia
Duas seções delgadas para análise micromorfológica foram coletadas do sítio
Galheta 4. Uma delas abrange o contato gradual entre a Fácies A e AF 1 (amostra A/1),
e outra a porção superior da AF 1 (amostra 1). Como o contato entre a Fácies A e a AF
1 é gradual, não se observaram microfácies diferenciadas na seção delgada A/1 (Figura
5.97). Na Tabela 5.30, apresenta-se a descrição micromorfológica das duas seções
delgadas analisadas.
286
Figura 5.97. Desenho esquemático das seções delgadas analisadas no sítio Galheta 4, com localização dos
blocos de amostragem na sucessão vertical e identificação de microfácies nas lâminas.
Figura 5.98. Gráficos com porcentagens dos diferentes componentes microscópicos da mF 1 do sítio
Galheta 4: A) frequências de componentes da fração grossa; B) relação entre as porcentagens de poros,
fração grossa e fração fina.
287
Tabela 5.30 . Descrição micromorfológica do sítio Galheta 4.
Fr. org.
gr.
••
gr
50200µm
Microagregados
intergranulares/
grãos revestidos
70/30
en
•••••
quit
••
•
•
•
•••
••
•
Fábrica b
en
•••••
quit
Limpidez
70/30
Micromassa
tr
ind
Mat. orgânica
monomórfica
rev
•••
••
tr
ind
Mat. orgânica
monomórfica
rev
Cor
Microagregados
intergranulares/
grãos revestidos
Tecidos
Raízes
50200µm
Frag. lítico
Feldspato
Quartzo
Dist. rel. g/f
55
gr
Carvão
1
Microestrutura
Osso
A/1
55
Tam.
Escória
1
%
Min. pesado
1
e-cx
vs
cm
cn
e-cx
cn
cm
razão g/f
mF
Agregados
Am
Porosidade
Fr. min. gr.
%
Composição
FP
Freqüências de classes segundo Bullock et al. (1985): • Muito Poucas (< 5%); •• Poucas (5-15%) ; ••• Comum (15-30%) ; •••• Freqüente (30-50%); ••••• Dominante (50-70%);
•••••• Muito dominante (>70%). Am. = amostra; mF = microfácies; Tam.= tamanho; Fr. min. gr. = fração mineral grossa; Fr. org. gr. = fração orgânica grossa; FP = feições
pedológicas. O singificado das demais abreviações utilizadas nesta tabela encontra-se no Anexo, Tabela A.5.
288
Tabela 5.31. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra GA4-1.
GA4 1
mF
Quartzo
Feldspato
Min. pes.
Escória
%
55
10
4
3
Osso
23
Carvão
5
Distribuição
básica
Aleatória
Aleatória
Aleatória
Aleatória
Orientação
básica
-
Distribuição
referenciada
-
Aleatória
-
-
Aletória
-
-
Seleção
Bem selecionado
Bem selecionado
Não selecionado
Bem selecionado
Distribuição
básica
Aleatória
Aleatória
Aleatória
Aleatória
Orientação
básica
-
Distribuição
referenciada
-
Tamanho
Forma
Arredondamento
Seleção
Areia fina
Equidimensional
Arredondado
Bem selecionado
Areia fina
Equidimensional
Arredondado
Bem selecionado
Areia mto. fina Equidimensional
Arredondado
Bem selecionado
100 µm
Bem selecionado
Areia fina a
Seleção moderada
mto. fina
Vários
Não selecionado
Alteração
Queima e
dissolução
-
Tabela. 5.32. Componentes minerais e orgânicos da fração grossa da amostra GA4-A/1.
GA4 1
mF
Quartzo
Feldspato
Frag. lít.
Min. pes
%
53
15
5
2
Osso
20
Carvão
5
Tamanho
Areia fina
Areia fina
Cascalho
Areia mto. fina
Areia fina a
mto. fina
Vários
Forma
Arredondamento
Equidimensional
Arredondado
Equidimensional
Arredondado
Equidimensional
Subanguloso
Equidimensional
Arredondado
-
-
Seleção moderada
Aleatória
-
-
-
-
Não selecionado
Aletória
-
-
Alteração
Queima e
dissolução
-
289
A mF 1 apresenta as mesmas características micromorfológicas nas duas seções
delgadas analisadas. A fração grossa é composta por grãos de quartzo (~50%) e
feldspato (10-15%) arredondados, na fração areia fina, com freqüência menor que 5%
de minerais pesados e fragmentos líticos. Os componentes antrópicos incluem cerca de
20% de fragmentos de osso, 5% de carvão e 3% de escória vítrea (Figura 5.98 A; Tabela
5.31, 5.32). A mF 1 apresenta porosidade superior a 50%, com cerca de 25% de fração
fina (Figura 5.98 B) distribuída em microestrutura de microagregados intergranulares e
grãos revestidos, composta de MO monomórfica e microcarvão (Figura 5.99 A-F;
Tabela 5.30). Destaca-se na fração grossa a aparição recorrente de escória vítrea e
fitólitos (Figura 5.100 A-C).
A micromassa de grãos revestidos, formada por MO monomórfica, com
microagregados intergranulares em forma de pellets, permite associar a mF 1 com
horizonte espódico incipiente (Van Breemen and Buurman, 2003; Wilson and Righi,
2010). Os revestimentos ao redor dos componentes antrópicos da fração grossa, como
ossos e escória vítrea (Figura 5.100 A, D), indicam que o processo de migração da MO
teria sido posterior à deposição destes materiais. Evidências de podzolização já foram
identificadas na análise micromorfológica da AF 2 do sambaqui Carniça 3 e da Fácies B
de Santa Marta 10. A sua identificação no sítio Galheta 4 confirma a ubiquidade deste
processo em ocupações humanas sobre dunas eólicas.
Assim como no sítio Santa Marta 10, análises com sistema MEV-EED
confirmam a presença de compostos de Fe e Al junto à MO da AF 1 (Anexo, Figura
A.8).
Figura 5.99. Fotomicrografias da mF 1 do sítio Galheta 4: A) seção vertical esquemática, com localização
da amostra para micromorfologia; B) massa basal composta por grãos de areia quartzosa e fragmentos de
osso queimado, PPL; C, D) micromassa composta por MO monomórfica, PPL e XPL; E) detalhe da
micromassa com inclusões de fragmentos de osso, PPL; F) revestimento de MO monomórfica ao redor de
grão de quartzo, PPL.
291
Figura 5.100. Fotomicrografias de elementos identificados na mF 1 do sítio Galhera 4: A) revestimento de
MO monomórfica ao redor de escória vítrea, PPL; B, C) fitólito PPL; D) revestimento de MO
monomórfica com inclusões de finos fragmentos de osso ao redor de fragmento de osso, PPL.
292
3. GEOARQUEOLOGIA DE UM CONCHEIRO ETNO­HISTÓRICO NA TERRA DO FOGO As informações produzidas a partir da análise geoarqueológica dos sambaquis
catarinenses serão comparadas com outro contexto arqueológico semelhante, com a
finalidade de testar o método desenvolvido para estudo dos sambaquis em outros
contextos, neste caso, em concheiros de climas frios, e poder achar possíveis relações no
registro geoarqueológico de ambos. Um único concheiro será tomado como caso de
estudo, o sítio Túnel 7, descrito no Capítulo 3, tópico 4.2, associado aos grupos Yamana
que habitaram as costas do Canal Beagle em tempos históricos (ver Capítulo 2, tópico
5.1). Assim como para os sambaquis catarinenses, combinaram-se os resultados da
abordagem experimental com a análise do sítio arqueológico. A seguir, apresentam-se
os resultados da coleção de referência experimental de amostras para micromorfologia,
elaborada sobre contextos naturais, fogueiras e queima controlada de moluscos, seguido
dos resultados da análise micro-estratigráfica do sítio Túnel 7.
3.1. COLEÇÃO DE REFERÊNCIA EXPERIMENTAL A coleção de referência de contextos naturais e elementos conhecidos consiste
em cinco amostras coletadas do seguinte grupo de elementos: 1) caminho de animais,
pisoteado pelo gado diariamente; 2) depósito de praia, próxima a um dos concheiros
escavados; 3) e horizonte A sob floresta de Nothofagus sp. A coleção de fogueiras
experimentais inclui duas fogueiras efêmeras, acesas por menos de uma hora e
amostradas imediatamente após o esfriamento, no prado na praia de seixos; e uma
fogueira utilizada durante um mês de campo no acampamento dos arqueólogos. Para
realização do experimento de queima de Mytilus edulis, oito valvas do molusco foram
queimadas na mufla a temperaturas entre 200 e 800º C. A seguir, apresenta-se a
discussão da análise micromorfológica da amostragem experimental organizada
segundo os objetivos da amostragem.
293
3.1.1. Indicadores de pisoteamento A amostra do caminho de animais permitiu observar alguns dos indicadores de
pisoteamento animal a céu aberto mencionados em Courty et al. (1989) e ShahackGross (2003), tais como: compactação laminar da camada de grama superficial;
desenvolvimento de microestrutura laminar próxima à superfície do solo; distribuição
linear e paralela à superfície dos resíduos vegetais; fissuras; e atividade de fungos,
observada pela presença de esporos e hifas (filamentos de fungos).
Esta seção delgada apresenta três microfácies sucessivas. A microfácies
superficial tem microestrutura formada por agregados lenticulares, de até 5 mm de
cumprimento, compostos de tecidos vegetais frescos, matéria orgânica e fragmentos
líticos (Figura 5.101 A). A microfácies intermediária representa a transição entre a
porção de solo com aporte de resíduos orgânicos frescos, e o solo natural com matéria
orgânica decomposta e maior freqüência de fragmentos líticos. Contém uma
concentração linear de esporos de fungo (200-220 µm cada conjunto de esporos)
paralela à superfície (Figura 5.101 B). A microfácies inferior apresenta microestrutura
de microagregados intergranulares (200-300 µm de largura) de composição orgânica, e
fração grossa com maior quantidade e tamanho de fragmentos líticos.
Pelo contexto climático onde foi coletada a amostra, a formação dos vazios e
agregados lenticulares pode também ter sido provocada, ou incrementada, pelo
congelamento sazonal do solo (ver Van Vliet-Lanoe, 2010; Fitzpatrick, 1993; Van
Vliet-Lanoe, 1998). No entanto, pela proximidade com a superfície do solo e pela
ausência de traços de lentes de gelo nos poros e de segregação granulométrica nos
agregados lenticulares (Van Vliet-Lanoe and Coward, 1984; Van Vliet-Lanoe, 1998),
parece mais provável a microestrutura laminar ter sido provocada por pisoteamento de
que por congelamento do solo.
294
3.1.2. Tafonomia de ossos As praias do Canal Beagle contêm, além de seixos arredondados, fragmentos de
ossos de mamíferos marinhos e conchas. Na seção delgada, os fragmentos de ossos são
de cor cinza (PPL), com baixa birrefringência (XPL), bordas arredondadas e muitas
marcas de dissolução, especialmente aumento dos canais (Figura 5.101 C). Os
fragmentos de concha são angulosos com diferentes colorações (roxo, cinza, cinza claro,
marrom claro) a PPL (Figura 5.101 D). A micromassa é mínima e aparece na forma de
agregados organominerais, de dimensões diversas.
Os ossos mostram amplas áreas de dissolução, na forma de aumento dos canais
internos e espaços trabeculares e destruções focais microscópicas (microscopical focal
destructions) causadas pelo ataque microbiano (ver Hacket, 1981; Hedges, 1995; Jans,
2004; Piepenbrink, 1989; Trueman and Martill, 2002). Estes ossos não estão compostos
de hidroxiapatita, como seria esperado em ossos frescos, mas de um mineral autígeno de
composição calcítica e birrefringência alta, que se desenvolve como calcita espática, no
preenchimento de poros, e como calcita microcristalina, nas áreas dissolvidas ao redor
dos ósteons.
Trueman et al. (2004) determinaram que a substituição mineral em ossos
expostos a condições subaéreas é um processo rápido, inclusive em climas úmidos, e
que em condições evaporíticas o processo seria ainda mais intenso. Nas praias do Canal
Beagle, a intensa ação do vento promoveria condições de evaporação que podem ter
favorecido a precipitação do carbonato autígeno, a partir da dissolução dos ossos, em
pouco tempo. Pode-se pensar que unicamente os ossos depositados nas praias da região
teriam sofrido intemperismo físico-químico por exposição subaérea. Em contexto
arqueológico, especificamente nos concheiros da região, onde os ossos são soterrados
em ambiente alcalino (pela presença de conchas) e protegidos dos efeitos da
evaporação, não se observaria esta característica.
3.1.3. Alteração microbiana A amostra de solo sob a floresta apresenta três microfácies. A primeira é a
camada de decomposição de topo (camada F, apud Babel 1975), que corresponde à
295
serrapilheira, com resíduos de tecidos frescos, raízes e madeira em decomposição. Nesta
microfácies, destacam-se tecidos com flobafenos e tecidos melanizados pela ação de
fungos (ver Todisco and Bhiry, 2008) (Figura 5.101 E). A segunda microfácies, de
posição intermediária, consiste de camada de substâncias húmicas (camada H, apud
Babel 1975), porosa, com microestrutura de agregados mamilares e coloração castanha
avermelhada brilhante (PPL). Contém raízes frescas, resíduos de tecidos com flobafenos
e fragmentos de madeira. A alta birrefringência dos tecidos de celulose denota a
presença de material não completamente decomposto. A micromassa é castanha escura
(PPL), formada por material vegetal em decomposição, com aproximadamente 5% de
grãos minerais na fração silte (Figura 5.101 F). A terceira microfácies, inferior,
identificada como horizonte A húmico (Ah) subjacente (Babel 1975), é menos porosa
até a base e apresenta microestrutura esponjosa a grumosa com cavidades, vazios em
câmara e estrela. Fragmentos líticos são abundantes, com traços de alteração in situ.
Contém fragmentos de carvão, bem selecionados (areia fina a média) remanescentes de
incêndios nas proximidades. A fração fina é marrom-amarela (PPL) ponteada, formada
por mistura de argilominerais com matéria orgânica. As feições pedológicas incluem
nódulos de óxi- hidróxidos de ferro, nódulos alteromórficos e excrementos de ácaros.
Ao juntar as evidências oferecidas pelas amostras de praia com a do solo,
configuram-se vários indicadores de intensa atividade biológica na região, apesar da
temperatura subpolar. Usualmente, climas frios são associados com a inibição da ação
dos microrganismos (Hedges, 2002; Nicholson, 1993), mas no caso da coleção
experimental analisada, resulta claro que os microrganismos (fungos e bactérias) são
importantes agentes tafonômicos tanto em contexto subaéreo como subsuperficial. As
destruições focais microscópicas observadas em ossos da praia e as características
micromorfológicas das amostras de solo (decomposição dos tecidos vegetais, tipo de
microestrutura e feições pedológicas) confirmam esta observação 85 . Isto significa que,
nos sítios arqueológicos da região, há de se encontrar bioturbações intensas, contrário ao
que se esperaria do contexto climático no qual se localizam.
85
Observações semelhantes foram realizadas por Todisco & Bhiry (2008) no estudo de sítios de paleoesquimós em contexto periglacial. Os autores identificaram destruições focais microscópicas
(microscopical focal destructions) causadas pelo ataque microbiano nos ossos, apesar das temperaturas
extremamente baixas.
296
Figura 5.101. Fotomicrografias da coleção de referência experimental: A) microfácies superior da
amostra do caminho de animais, com agregados lenticulares, PPL; B) microfácies intermediária do
caminho de animais, com detalhe da concentração de esporas de fungos (e); C) praia de seixos próxima
aos concheiros, notando-se o predomínio de ossos de mamífero marinho, com detalhe de ósteons
dissolvidos, PPL; D) praia de seixos com fragmentos de concha de coloração diversa, PPL; E)
serrapilheira sob a floresta de Nothofagus sp., em que se nota concentração de excrementos de ácaros
dentro de tecido de madeira, PPL; F) camada de substâncias húmicas (camada H) sob a floresta, com
agregados de matéria orgânica decomposta, PPL.
3.1.4. Fogueiras: tafonomia e preservação Fogueira sobre o prado: a microfácies resultante desta fogueira inclui uma
acumulação, na porção inferior da lâmina, de fragmentos de carvão centimétricos, com
fitólitos e resíduos de tecidos. A micromassa é cinzenta (PPL) com b-fábrica cristalítica
de composição calcítica associada às cinzas de madeira (Figura 5.102 A).
297
Figura 5.102. Fotomicrografias das três fogueiras experimentais estudadas na Terra do Fogo: A) camada
milimétrica de cinzas e resíduos vegetais oxidados na fogueira sobre o prado, PPL; B) fogueira na praia,
com fragmentos de osso de mamífero marinho queimados, PPL; C) fogueira no acampamento dos
arqueólogos, formada por cinzas, carvão e argila rubefacta, PPL; D) agregados de POCC.
Fogueira na praia de seixos: na camada de cinzas, a fração grossa encontra-se
quase exclusivamente composta por fragmentos de osso pouco birrefringentes (XPL) e
com marcas de dissolução. Alguns ossos são completamente isótropos e outros, ainda
anisótropos, apresentam manchas escuras de birrefringência baixa, que corresponderiam
a áreas queimadas. A fração fina é uma mistura mosqueada de calcita e material
orgânico, de coloração marrom-acinzentada (Figura 5.102 C).
Fogueira no acampamento dos arqueólogos: apresenta microestrutura maciça,
marrom acinzentada (PPL) e mosqueada, de argilominerais e calcita, com b-fábrica
cristalítica. A fração grossa é composta de fragmentos de carvão, madeiras parcialmente
queimadas e fitólitos. As feições pedológicas incluem canais de fauna e nódulos de óxihidróxidos de ferro. Nesta lâmina, destaca-se o fato de poder observar-se a distribuição
in situ dos agregados de POCC (segundo Canti, 2003) (Figura 5.102 C, D).
As estruturas de combustão analisadas foram amostradas imediatamente após o
esfriamento e, portanto, trata-se de estruturas in situ, ou fácies de combustão primárias,
como definido por Wattez (1992). Isto permite extrair informações quanto à preservação
de camadas queimadas em condições frias e sua alteração tafonômica após o abandono.
298
As fogueiras efêmeras, de curta duração e baixa intensidade de queima (350-450º
C), resultam em camadas finas e milimétricas de cinzas misturadas com resíduos
vegetais oxidados e microcarvões, sobre camada de material carbonizado (ver Wattez
1992). Estes atributos são independentes do substrato e as fogueiras, tanto na praia
quanto no prado, apresentam a mesma configuração. A única diferença está na fração
grossa, composta de carvões de Dymis winteri, no prado, e de ossos de mamífero
marinho queimados, na praia.
Amostras não foram coletadas do substrato na fogueira sobre o prado, mas a
espessura centimétrica da amostra e a presença de pequenos agregados de argila
rubefacta permitem sugerir que este episódio de queima não induziu maiores alterações
no solo preexistente. Os ossos da fogueira na praia foram oxidados e manchados na
superfície. Os efeitos do fogo nestes ossos altamente intemperizados não foi tão
evidente devido a que, antes da queima, a maior parte da matriz de colágeno já tinha
sido perdida por intemperismo, com recristalização mineral parcial. Amplas áreas de
dissolução e intensa alteração microbiana indicam intemperismo bioquímico dos ossos
na praia. A observação destas feições em ossos com birrefringência elevada, de calcita,
pode auxiliar a evitar erros na interpretação de contextos arqueológicos, como por
exemplo, assumir que ossos com estas características estiveram expostos a altas
temperaturas (calcinados) quando, de fato, só teriam sido transportados ao sítio da praia.
O longo período de tempo durante o qual ficou acesa a fogueira no acampamento
dos arqueólogos conduziu à formação de uma camada de cinzas centimétrica, que
representa uma mistura de diferentes episódios de queima. O longo tempo de uso da
fogueira também pode ser observado em feições pedológicas, como canais de fauna e
nódulos ferruginosos. A estrutura maciça composta de cristais de carbonato de cálcio,
alguns fitólitos e pouco carvão e microcarvão, indicam temperaturas de queima elevadas
(> 500º C) e combustão completa da madeira utilizada como combustível (ver Wattez
1992; Mallol et al. 2007).
A preservação de cinzas em contextos arqueológicos na costa do Canal Beagle
estaria condicionada por dois fatores: o regime hidrológico; e a alta suscetibilidade à
dissolução deste material calcítico. Embora a pluviosidade média anual da região seja
de 500 mm, não existe estação seca e as chuvas são constantes ao longo do ano. Por este
motivo, as condições favoráveis para preservação de cinzas demandariam substrato
argiloso, para evitar a lixiviação, ou solução do solo saturada em cálcio, para evitar a
dissolução. Igualmente, a intensa atividade biológica, cujos efeitos se observaram em
299
todas as amostras de diversos contextos (praia, prado, solo de floresta) também seria um
importante agente de perturbação.
3.1.5. Queima controlada de Mytilus edulis Cada valva de Mytilus edulis é formada por duas camadas carbonáticas recobertas
por uma lâmina externa orgânica (o perióstraco). A concha carbonática é composta por
uma camada exterior de calcita e uma camada interior nacarada de aragonita. A camada
externa constitui-se de prismas de calcita colunares, enquanto que a camada interior tem
textura laminar de cristais de aragonita paralelos ao interior da valva (Burgoin, 1988). A
análise dos efeitos microscópicos da queima de Mytilus edulis mostra uma seqüência de
alterações que vão desde a perda da lâmina orgânica (perióstraco) e separação da
camada interior (aragonitica) da exterior (calcítica), até a completa deformação da
concha. No Quadro 5.2, apresenta-se a descrição da transformação sequencial das
conchas a temperaturas entre 200 e 800 º C, e as Figuras 5.103-5.105 mostram as
fotografias e fotomicrografias do processo de queima.
A queima sequencial de Mytilus edulis oferece indicadores para estimar a
temperatura de queima das fogueiras a partir da coloração, forma, textura e
características mineralógicas das conchas em seção delgada. A informação sobre
intensidade da queima pode ser igualmente associada à função da estrutura de
combustão (ver Mallol et al., 2007) que, junto com a evidência artefatual associada à
fogueira, pode ajudar a interpretar a função do sítio como um todo.
300
Figura 5.103. Alteração de Mytilus edulis a 200°C e 300°C: A1) concha queimada a 200°C com superfície avermelhada; A2-4) fotomicrografias das camada interna e externa
ainda preservadas, com escurecimento das bordas, PPL e XPL; A5) detalhe de perióstraco preservado; B1) concha queimada a 200° C; B2-5) fotomicrografias da concha
queimada; note-se camada interna avermelhada e com fissuras incipientes, PPL e XPL.
301
Figura 5.104. Alteração de Mytilus edulis a 400°C e 500°C: A1) concha queimada a 400°C, com coloração acinzentada; A2-5) fotomicrografias da concha queimada com
formação de fissuras longitudinais, escurecimento e coloração avermelhada da camada interna e mudança no tamanho dos cristais da calcita que compõe a camada exterior,
PPL e XPL; B1) concha queimada a 500°C de coloração acinzentada e alta fragilidade; B2-5) fotomicrografias mostrando separação completa da valva interna e externa e
múltiplas fissuras longitudinais e transversais à superfície da valva, PPL e XPL.
302
Figura 5.105. Alteração de Mytilus edulis a 700°C e 800°C: A1) concha queimada a 600°C, com coloração acinzentada; A2-5) fotomicrografias da concha queimada de
coloração castanho escuro a preta (PPL) e manchas escuras a XPL, com fissuras na camada interior e calcita fibrosa na camada exterior da valva; B1) concha queimada a
800°C, com cor branca; B2-5) valva completamente deformada de coloração preta (PPL) com pseudo-vacuólos.
303
Quadro 5.2. Alterações microscópicas de valvas de Mytilus edulis, queimadas de 200 a 800 º C.
Temperatura
200 º C
Descrição
Partes do perióstraco ainda preservadas.
Camadas interna e externa da concha ainda interconectadas.
Figura
5.103
300 º C
Perda total do perióstraco.
Camada interna com início de fissuras ao longo do contato entre
lâminas, aquisição de coloração avermelhada (PPL) e começo de
separação da camada externa.
Separação quase completa entre camadas interna e externa.
Mudança na orientação dos cristais de calcita na camada externa.
Camada interna com mais fissuras e textura rugosa, cor marrom escura
(PPL) no lado côncavo, e vermelha (PPL) no lado convexo.
Ausência de extinção óptica a XPL (ambos os lados da concha).
5.103
400 º C
500 º C
600 º C
700 º C
800 º C
Aparência desgastada das camadas interna e externa.
Buracos e fissuras, manchas pretas, textura rugosa e coloração marrom
escura a preta e PPL.
Transformação da camada externa em calcita fibrosa, cor cinza escuro
a preto (PPL).
Camada interna com cor marrom escura (PPL), extensamente fissurada.
Amostra muito polida, descartada para análise.
Fim do experimento: completa perda da forma da valva, cor preta a
PPL e opacidade aumentada a XPL (marrom escuro grisáceo).
Lâminas da camada interna completamente deformadas, com pseudovacúolos em seu interior.
5.104
5.104
5.105
5.105
3.2. MICROMORFOLOGIA DO CONCHEIRO TÚNEL 7 A análise geoarqueológica do concheiro etno-histórico Túnel 7 foi feita a partir
de coleção de amostras para micromorfologia que não tinha sido analisada até o
momento. Como não houve trabalho de campo prévio com o objetivo de identificar
arqueofácies, os resultados da análise micromorfológica serão apresentados de maneira
diferente da adotada nos sambaquis, com ênfase nas microfácies arqueológicas
identificadas nas seções delgadas. Além disso, a amostragem neste concheiro não foi
feita unicamente a partir de seções verticais expostas, mas também de seções planas
horizontais, amostradas durante a escavação do sítio, em cinco das dez fogueiras
centrais identificadas no local onde teria estado a cabana de moradia. Assim, os
resultados da análise do sítio Túnel 7 serão apresentados na segguinte ordem: primeiro,
a análise micro-estratigráfica realizada sobre uma coluna de amostragem coletada no
anel de conchas periférico; segundo, o estudo das cinco fogueiras localizadas na área
central de moradia.
304
3.2.1. Microestratigrafia do anel de conchas A sucessão vertical do sítio Túnel 7, de 30 a 60 cm de altura, é composta pela
seguinte sucessão, do topo à base: camada de sedimentos castanho avermelhados, que
corresponde a depósito coluvionar com formação de solo no topo; camada de concheiro,
formada por inter-estratificação de lâminas de concheiro compacto, terras conchíferas
(concheiro compacto com 20-50% de sedimentos), terras pretas (sedimentos finos e
orgânicos) e lâminas de seixos; e substrato de paleopraia de seixos (Orquera 1996,
Orquera & Piana 1996b) (Figura 5.106 A).
Para análise micromorfológica, coletaram-se duas colunas, de 60 cm cada uma,
da sucessão vertical exposta pela escavação do sítio, localizada próxima à praia atual. A
coluna 11 (C11) situa-se numa área identificada como passagem, através do anel de
conchas, desde o exterior até a área central de moradia (Figura 5.106 A). A análise
micromorfológica da C11 foi realizada por Balbo et al. (2010). Estes autores
identificaram três tipos de atividades a partir dos atributos micromorfológicos das 11
seções delgadas analisadas: 1) eventos discretos de deposição de resíduos,
caracterizados por baixa fragmentação das conchas, distribuídas sub-horizontalmente;
2) fases de frequentação, identificadas pela alta fragmentação das conchas com
distribuição aleatória; 3) abandono temporário do sítio, com desenvolvimento de solo
em blocos angulosos.
Nesta tese, será analisada a coluna 12 (C12), localizada no anel de conchas a
menos de 1 m de distância a leste da C11 (Figura 5.106 A). A descrição e análise foi
realizada segundo os princípios da análise de microfácies arqueológicas explicados no
Capítulo 4, tópico 1.2.1. A coluna de amostragem será tomada como uma grande
amostra, apesar de ter sido subdividida em sete seções delgadas para sua análise. Assim,
a identificação de microfácies será realizada por lâmina, com referência à coluna como
um todo. Desse modo, na apresentação dos resultados serão discutidos primeiro os
atributos comuns a toda a coluna, seguido dos atributos próprios de cada microfácies.
Na Tabela 5.33, apresenta-se a descrição micromorfológica das sete seções
delgadas analisadas da coluna de amostragem no anel de conchas. Cinco microfacies
foram identificadas na seção vertical da C12. A identificação baseou-se nas diferenças
entre os componentes da fração grossa (frequência, completitude, orientação e
distribuição), microestrutura, porosidade e razão g/f. Na Figura 5.106 B, mostra-se o
desenho esquemático da C12 junto com o desenho esquemático da C11, estudada por
305
Balbo et al. (2010), com identificação de microfácies em cada coluna e correlação entre
as duas sucessões verticais.
A fração grossa de todas as lâminas é composta por conchas (principalmente
mexilhão), fragmentos líticos arredondados na fração cascalho, carvão e alguns ossos
queimados. A maioria das conchas está inteira e, quando fragmentada, existe
continuidade entre os fragmentos, o que indica quebra in situ. Os fragmentos líticos
estão igualmente fissurados mas não deslocados. A micromassa é preta (PPL), opaca a
turva e indiferenciada, formada por finos grânulos de matéria orgânica polimórfica,
restos de tecidos, microcarvão e, às vezes, finos fragmentos de osso (Figura 5.107 A-B).
A microestrutura predominante, de grânulos mamilares interligados, resulta da
atividade biológica, como observado na amostragem de referência em solos da região
(ver tópico 3.1.3). A recente cronologia do sítio teria permitido a boa preservação dos
componentes orgânicos originais na forma de madeira e serrapilheira parcialmente
decomposta. Uma feição pedológica recorrente na sucessão analisada são cristais
aciculares de carbonato de cálcio, de poucos micrômetros de espessura e 20-40 µm de
comprimento (Figura 5.107 C-F).
A mF 1 corresponde à camada superficial do anel de conchas e aparece uma
única vez na sucessão vertical (Figura 5.106 B; Tabela 5.33). Caracteriza-se pela baixa
porosidade (20%) e alta compactação da massa basal. Quase 50% das conchas estão
distribuídas sub-horizontalmente, a maioria fragmentada, mas com cotinuidade entre os
fragmentos. Os demais componentes da fração grossa (cascalho, carvão e restos de
tecidos) apresentam distribuição aleatória. A micromassa compõe-se de grânulos interconectados compostos de matéria orgânica polimórfica, microcarvão, madeira
decomposta e restos de plantas oxidados (Figura 5.108 A, B).
A mF 2 representa um tipo de solo de microestrutura em blocos angulosos que
se desenvolve nos concheiros da região, definido como middensol por Balbo et al.
(2010). Este solo caracteriza-se pela microestrutura de blocos angulosos formada por
prismas, de 5 x 5 mm, com finas fissuras no interior (Figura 5.108 A, C; Tabela 5.33).
Os blocos incluem abundantes fragmentos de concha e osso (na fração areia fina a silte)
em fração fina organomineral, de cor castanha escura (PPL), com restos de tecidos e
cristais aciculares de carbonato de cálcio dentro, que lhe outorgam uma fábrica-b
cristalítica (Figura 5.110 A,C).
A mF 3 caracteriza-se pela alta frequência de conchas inteiras, sempre com
continuidade dos fragmentos quando quebradas (Figura 5.110 D, E). A distribuição das
306
conchas é sub-horizontal na maioria dos casos (60 %), às vezes oblíquas (30%) ou,
numa minoria, subverticais (20%) (Figura 5.109 A, B, E, F). Os fragmentos de concha
menores também estão orientados. Menos de 2% dos fragmentos de concha apresentam
sinais de queima. Em alguns casos, o perióstraco esta ainda preservado. Os fragmentos
de carvão são mais grossos e melhor preservados que nas microfácies restantes. Os
fragmentos líticos apresentam-se fissurados, o que indica alteração pós-deposicional
pelo intemperismo físico (Van Vliet-Lanoe, 2010), sem retrabalhamento. A fração fina
compõe-se de grânulos finos mamilares, formados por uma mistura de matéria orgânica
polimórfica, microcarvão, e restos de plantas oxidados (Figura 5.110 A, B; Tabela
5.33). Unicamente nas partes mais inferiores da sucessão vertical, a micromassa
apresenta áreas de micrita e esparita.
A mF 4 caracteriza-se por alta razão g/f (90/10) e distribuição horizontal dos
fragmentos de concha, sempre com empacotamento fechado (Figura 5.108 E, F; Figura
5.110 E, F). A fração fina é semelhante à descrita para a mF 3, mas em menor
abundância e na forma de grânulos muito finos (100-150 µm) e soltos (Figura 5.109 C,
D; Tabela 5.33).
A última microfacies identificada, mF 5, corresponde a uma faixa de seixos de
aproximadamente 2 cm de espessura. Os espaços entre os clastos estão parcialmente
recheados de grânulos mamilares, de composição orgânica, como descritos para as mF 3
e 4 (Figura 5.110 A, D; Tabela 5.33).
A partir da análise realizada por Balbo et al. (2010), adiciona-se mais uma
microfácies, classificada como mF 6, que aparece unicamente na metade inferior da
C11. Esta microfácies é dominada pela fração fina, da mesma composição que as mF 3
e 4, com fragmentos de concha de distribuição aleatória (aproximadamente 10%
queimados), fragmentos líticos arredondados e carvão.
307
Figura 5.106. Macro e microestratigrafia do concheiro Túnel 7: A) sucessão vertical esquemática, a partir
de informações disponíveis em Orquera (1996), com localização das duas colunas de amostragem para
micromorfologia (C11 e C12); B) microfácies identificadas na C11 e C12, com correlação entre as
sucessões estratigráficas de cada coluna. Note-se correspondência da unidade B35.
308
Tabela 5.33. Descrição micromorfológica da coluna de amostragem do sítio Túnel 7.
gr
250μm
50/50
en
••••
•••
20
pr
5x5 mm
Microagregados
intergranulares
Blocos
2
fs
30/70
por
••
••
3
e-cx
40
gr
150-250μm
60/40
en
••••
•••
4
e-cx
30
gr
100-150μm
90/10
en
•••••
•••
4B
3
e-cx
40
gr
150-250μm
70/30
en
••••
•••
5B
3
e-cx
40
gr
150-250μm
70/30
en
••••
4
e-cx
50
gr
100-150μm
90/10
en
3
e-cx
40
gr
150-250μm
Microagregados
intergranulares
Microagregados
intergranulares
Microagregados
intergranulares
Microagregados
intergranulares
Microagregados
intergranulares
Microagregados
intergranulares
60/40
en
3B
6B
Agregados
•••
••
•
••
••
•
••
•
•••
••
•••
•••
•
•••••
••
•••
•
••••
••
•••
•
•
Fábrica b
20
Limpidez
e-cx
Micromassa
Composição
Cor
1
Tecidos
Frag. lítico
2B
Fr. org. gr.
Carvão
Concha
%
Osso
Microestrutura
Dist. rel. g/f
mF
Porosidade
Tam.
razão g/f
Fr. min. gr
Am
op
tr
op
tr
op
tr
op
tr
op
tr
op
tr
op
tr
op
tr
ind
cri
ind
ind
ind
ind
ind
ind
Mat. orgânica
polimórfica
Argila
organomineral
Mat. orgânica
polimórfica
Mat. orgânica
polimórfica
Mat. orgânica
polimórfica
Mat. orgânica
polimórfica
Mat. orgânica
polimórfica
Mat. orgânica
polimórfica
FP
10% cris
50% cris
30% cris
30% cris
40% cris
20% cris
20% cris
20% cris
Freqüências de classes segundo Bullock et al. (1985): • Muito Poucas (< 5%); •• Poucas (5-15%) ; ••• Comum (15-30%) ; •••• Freqüente (30-50%); ••••• Dominante (50-70%);
•••••• Muito dominante (>70%). O singificado das abreviações utilizadas nesta tabela encontra-se no Anexo, Tabela A.5.
309
Continuação Tabela 5.33.
Osso
Carvão
Tecidos
e-cx
40
gr
150-250μm
50/50
en
••••
••
•
••
••
60
gr
100-150μm
80/20
mon
••
••••••
fs
30
pr
3x5 mm
Microagregados
intergranulares
Microagregados
Intergranulares
Blocos
5
e-cx
2
60/40
por
••
••
•
••
8B
2
fs
30
pr
5x6 mm
Blocos
30/70
por
••
••
•
••
3
e-cx
40
gr
150-250μm
50/50
en
••••••
•••
•
•••
4
e-cx
50
gr
100-250μm
Microagregados
intergranulares
Microagregados
intergranulares
90/10
en
••••
••
••
•••
310
•
Agregados
Fábrica b
Frag. lítico
3
Limpidez
Concha
7B
Micromassa
Composição
Cor
Microestrutura
Dist. rel. g/f
%
Porosidade
mF
Fr. org. gr.
Tam.
razão g/f
Fr. min. gr
Am
op
tr
op
tr
op
tr
op
tr
op
tr
op
tr
ind
ind
cri
cri
ind
ind
Mat. orgânica
polimórfica
Mat. orgânica
polimórfica
Argila
organomineral
Argila
organomineral
Mat. orgânica
polimórfica
Mat. orgânica
polimórfica
FP
10% cris
50% cris
50% cris
20% cris
20% cris
Figura 5.107. Fotomicrografias de elementos encontrados no concheiro Túnel 7: A) concha com
perióstraco preservado, acompanhada de micromassa de agregados mamilares pretos, PPL; B) fragmento
de osso intemperizado, identificado graças à seção delgada de referência coletada da praia de seixos, PPL;
C) detalhe de agregados em blocos angulares que caracterizam à mF 2, com cristais aciculares de calcita
na micromassa, PPL e XPL; D) mesmo agregado de C, a XPL; E, F) fragmento de concha com cristais
aciculares de calcita que se desprendem, PPL e XPL.
311
Figura 5.108. Fotomicrografias das seções delgadas 2B e 3B da coluna 12 do sítio Túnel 7 (PPL): A)
desenho esquemático da seção delgada 2B; B) mF 1, com fragmentos de concha (c) e fragmentos líticos
(fl); C) mF 2, com blocos angulosos de argila organomineral com finos fragmentos de concha e osso; D)
mF 3, com fragmentos de concha de espécie indeterminada e fragmentos de concha de gastrópode (g); E)
desenho esquemático da seção delgada 3B; F) mF 4, formada por conchas de espécie indeterminada,
conchas de mexilhão (m) e fragmentos líticos de distribuição horizontal e empacotamento fechado.
312
Figura 5.109. Fotomicrografias das seções delgadas 4B, 5B e 6B da coluna 12 do sítio Túnel 7 (PPL): A)
desenho esquemático da seção delgada 4B; B) mF com conchas de mexilhão (m) inteiras; C) desenho
esquemático da seção delgada 5B; D) mF 4, com conchas de mexilhão e carvão (cr) de distribuição
horizontal; E) desenho esquemático da seção delgada 6B; F) mF 3 com conchas de mexilhão
fragmentadas in situ, fragmentos líticos (fl) e concha queimada (cq).
313
Figura 5.110. Fotomicrografias das seções delgadas 7B e 8B da coluna 12 do sítio Túnel 7 (PPL): A)
desenho esquemático da seção delgada 7B; B) mF 3, com conchas inteiras de mexilhão (m) e conchas
fragmentadas in situ; C) detalhe de bloco anguloso da mF 2 com fragmento de osso no interior (o); D) mF
5, composta por camada de seixos (fl); E) desenho esquemático da seção delgada 8B; F) mF 4, composta
por conchas de mexilhão de distribuição horizontal e empacotamento fechado.
3.2.2. Micromorfologia da área central de habitação Na área central do concheiro Túnel 7, onde teria estado localizada a cabana de
moradia, foi identificada uma sucessão de dez estruturas de combustão. Segundo
Estevez & Vila (2006), as fogueiras representam dez reocupações do sítio. Para análise
micromorfológica, foram coletadas nove amostras provenientes das fogueiras
identificadas, do topo até a base do concheiro, como AC4, AC5, AC6, AC8 e AC10
(Figura 5.111). Estas fogueiras foram analisadas espacialmente em trabalhos prévios
314
(Estevez and Vila, 2006; Piqué, 1999; Wunsch, 1996) e correspondem a cinco das dez
fases de ocupação do sítio definidas por Estevez & Vila (1996).
A fogueira mais antiga (AC10), que corresponde ao primeiro episódio de
ocupação do concheiro na primavera, contém grande concentração de ossos de cetáceo e
guanaco. A fogueira AC8 representa o quinto episódio de ocupação, do qual se
encontraram resíduos de lascamento, tanto dentro como fora da área de habitação. Da
quinta ocupação, foram identificadas fogueiras periféricas à fogueira central amostrada,
o que foi interpretado como indicador de uso do sítio no inverno. A sexta ocupação está
representada pela fogueira AC6, que teria acontecido no começo do verão. A sétima
ocupação, representada pela fogueira AC5, contém lascas de osso, derivadas da
confecção de pontas de flecha. As ocupações oito e nove, que teriam acontecido muito
próximas no tempo, estão representadas pela fogueira AC4, que contém artefatos líticos
com restos de cetáceo, guanaco, peixe e ave, interpretado como ocupação do sítio no
verão (Estevez and Vila, 2006).
A descrição micromorfológica das cinco fogueiras centrais analisadas do sítio
Túnel 7 aparece na Tabela 5.34. Em todas as fogueiras destaca a presença de fragmentos
e conchas inteiras queimadas, identificadas graças à experiência apresentada no tópico
3.1.5. Conchas queimadas foram identificadas a partir da presença de fissuras
longitudianis, deformação das valvas, presença de pseudo-vacúolos, textura irregular e
coloração avermelhada, marrom escura e preta a PPL. A fração fina das fogueiras
superiores (AC4, 5 e parte da AC6) esta composta de finos grânulos e grumos de
microcarvão, com fragmentos grossos de carvão. A micromassa das fogueiras inferiores
(AC8 e 10) é composta por argila rubefacta e micrita, com baixa frequência de carvões
inteiros e microestrutura esponjosa e em câmara. Restos de tecidos ou resíduos
orgânicos estão ausentes. Todos os fragmentos líticos encontram-se oxidados e com
fissuras, o que indica intemperismo químico e físico, possivelmente relacionado com a
exposição a ciclos repetitivos de aquecimento e esfriamento. As feições pedológicas
incluem revestimentos impuros de calcita e microcarvão, nódulos órticos de óxihidróxido de ferro (mais freqüentes nas fogueiras inferiores, AC8 e AC10) e ocasionais
cristais aciculares de calcita (unicamente nas fogueiras superiores, AC4 e AC5).
Em geral, todas as fogueiras são similares quanto aos componentes da fração
grossa e as feições pedológicas. No entanto, as cinco fogueiras podem ser agrupadas em
duas microfácies (definidas como mF 7 e mF 8), de acordo com suas diferenças quanto
315
a frequência de conchas queimadas a temperatura superior aos 500° C, porosidade,
microestrutura e composição da micromassa (Figura 5.111).
A mF 7 (AC4, AC5 e AC6) é porosa e apresenta uma mistura de conchas
queimadas a diversas temperaturas (mas sempre acima dos 200°C), fragmentos líticos
(muitos deles oxidados e fissurados), ossos queimados e carvão. Aproximadamente
20% das conchas mostram evidências de terem sido queimadas a temperatura superior a
500°C. As conchas têm distribuição sub-horizontal e seus fragmentos apresentam
continuidade lateral. A fração fina é composta por grãos de areia muito fina a média
(100-300 μm) e grumos pretos inter-conectados (~600 μm), compostos de microcarvão,
tecido oxidado e áreas de concentração de micrita.
A mF 8 (AC6, AC8 e AC10) é mais compacta e caracteriza-se pela fração grossa
composta de fragmentos de concha queimados a temperatura superior a 500°C, de
distribuição aleatória. Inclui componentes líticos oxidados e quebrados, ossos
queimados e ossos alterados provenientes das praias das proximidades. A micromassa
compõe-se de cinzas, na forma de micrita impura, com microcarvão e argila rubefacta,
em microestrutura em câmera. A presença dos agregados de POCC sugere a boa
preservação das cinzas (ver Canti, 2003). Os fragmentos grossos de carvão são escassos
(<2%). Existem numerosos nódulos e hiporrevestimentos impregnantes de óxihidróxidos de ferro, assim como revestimentos calcíticos micro-laminados em forma de
crescente. As bioturbações são evidentes, na forma de canais e câmaras.
As seções delgadas da AC6 mostram uma composição mista, que combina os
atributos descritos para a mF 7 (grânulos soltos de microcarvão) e para a mF 8
(agregados grossos de argila rubefacta e micrita). A fração grossa mineral também é
uma combinação das duas microfácies anteriores, com conchas queimadas a
temepratura média e alta, fragmentos líticos oxidados e fissurados, carvão e ossos
queimados. Isto sugere que AC6 pode ser produto do retrabalhamento da microfácies
identificada nas fogueiras superiores (mF 7) e inferiores (mF 8).
Em termos gerais, a maior diferença que se destaca entre as microfácies
identificadas no anel de conchas (mF 1-6) e as da área central (mF 7 e 8) refere-se à
micromassa e à maior freqüência de conchas queimadas e muito fragmentadas na área
central. A queima das conchas foi identificada graças aos atributos apresentados no
tópico 3.1.5, como presença de fissuras longitudinais, deformação da valva, textura
irregular, coloração avermelhada, castanho escuro a preto e pseudo-vacúolos.
316
Tabela 5.34. Descrição micromorfológica das fogueiras (AC) identificadas na área central de Tunel 7.
8
cm
cn
fs
cm
cn
Microagregados
Intergranulares/
esponjosa
80/20
en
••••
••
•
•••
25
15
25
gr
cr
100300μm
~600 μm
Microagregados
Intergranulares/
esponjosa
90/10
gr
250500μm
Microagregados
Intergranulares
60/40
Vários
Vários
Em câmera
Em câmera
55/45
40/60
en
en
por
por
••••
••••
••••
•••
••
••
••••
•••
•
••
••
•••
•
•
•
Composição
FP
80%
conchas
queimadas
90
op
ind
Microcarvão
10
pt
cri
95
op
ind
Micrita com
argilomineral
Microcarvão
5
pt
cri
50
pt
cri
50
pt
cri
90
pt
tr
cri
10
pt
70
pt
tr
Cor
100300μm
~600 μm
Tecidos
Carvão
45
gr
cr
%
Fábrica b
10
8
e-cx
35
Micromassa
Limpidez
8
7/8
e-cx
Osso
6
7
Frag. lítico
5
e-cx
Microestrutura
Concha
7
Tam.
Dist. rel. g/f
4
%
Fr. org.
gr.
razão g/f
mF
Agregados
Am
Porosidade
Fr. min. gr.
cri
cri
Micrita com
argilomineral
Microcarvão
Argila
rubificada
Argila
rubificada
com micrita
Micrita
Argila
rubificada
com micrita
80%
conchas
queimadas
80%
conchas
queimadas
100%
conchas
queimadas
100%
conchas
queimadas
30
pt
cri
micrita
Freqüências de classes segundo Bullock et al. (1985): • Muito Poucas (< 5%); •• Poucas (5-15%) ; ••• Comum (15-30%) ; •••• Freqüente (30-50%); ••••• Dominante (50-70%);
•••••• Muito dominante (>70%). O singificado das abreviações utilizadas nesta tabela encontra-se no Anexo, Tabela A.5.
317
Figura 5.111. Seção esquemática, sem escala, do sítio Túnel 7, com localização das cinco fogueiras
estudadas (AC4, 5, 6, 8 e 10) e desenho esquemático das seções delgadas de cada fogueira, com
identificação de microfácies.
318
Figura 5.112. Fotomicrografias da mF 7 (AC4, 5 e 6): A) seção vertical esquemática, com localização das
fogueiras amostradas para micromorfologia; B) micromassa da AC 4, composta por fragmentos de
concha queimados com grânulos soltos de microcarvão, PPL; C) micromassa da AC5 composta por
fragmentos de concha queimados e carvão, entre grânulos finos de microcarvão, PPL; D) revestimento
pendente de calcita na AC 6, PPL; E, F) parte da micromassa da AC 6 formada por cinzas e argila
rubefacta, PPL e XPL.
319
Figura 5.113. Fotomicrografias da mF 8 (AC 8 e 10): A) seção vertical esquemática, com localização das
fogueiras amostradas para micromorfologia; B, C) massa basal da AC8, com microestrutura em câmara
com conchas e ossos queimados, fragmentos líticos e vazios em canal e em câmara, PPL; D) massa basal
da AC10, com microestrutura em câmera e fração grossa composta por conchas queimadas e fragmentos
líticos, PPL; E, F) micromassa da AC8, formada por cinzas e argila rubefacta, PPL e XPL.
320
CAPÍTULO 6: DISCUSSÃO A discussão dos resultados apresentados no Capítulo 5 começará pela
composição dos sedimentos arqueológicos, desde a matéria orgânica até os
componentes inorgânicos (sedimentos terrígenos) e faunísticos (conchas e ossos de
peixe). A seguir, será discutida a alteração pós-deposicional ou tafonomia dos
sedimentos arqueológicos, para finalizar com as informações micromorfológicas. Uma
vez discutidos os diferentes aspectos da composição e formação dos sedimentos
arqueológicos nos três tipos de sambaquis estudados, apresenta-se a avaliação conjunta
das evidências composicionais (macro e microscópicas) em relação à estratigrafia,
morfologia dos sítios e contexto geológico-geomorfológico de localização.
1. PADRÃO ESTRATIGRÁFICO CONCHÍFERO A partir da descrição macroscópica feita em campo, existem três grupos de
arqueofácies diferentes nos sambaquis conchíferos analisados. Dentre as arqueofácies
amostradas para análises granulométricas, faunísticas, isotópicas e micromorfológicas,
distinguem-se: 1) as de espessura decimétrica, compostas principalmente por
sedimentos terrígenos (AF 1 de Caipora e AF 1 de Jabuticabeira 1); 2) as de espessura
decimétrica, compostas principalmente por conchas e ossos (AF 3 e 4 de Caipora, AF 2,
3, 4, 7, 8 e 9 de Cubículo 1; AF 3 e 4 de Morrinhos, e AF 2, 3, 5, 6, 7 e 9 de
Jabuticabeira 1); e 3) as de espessura centimétrica pretas, compostas por MO e
fragmentos de osso queimado (AF 2 de Caipora, AF 2 de Morrinhos, AF 5 de Cubículo
1 e AF 4 de Jabuticabeira 1).
O primeiro grupo inclui as arqueofácies que contêm mais de 50 % de sedimentos
terrígenos na fração areia grossa (no restante de arqueofácies a porcentagem de
terrígenos não supera 15%) (Figura 5.13 e 5.51). A semelhança entre ambas as
arqueofácies também se evidencia na composição faunística, dominada por conchas
inteiras (20-30%), e na posição basal que estas conchas ocupam na sucessão vertical.
Estas evidências sugerem atividades e propósitos possivelmente análogos na formação
321
das arqueofácies inaugurais dos sítios, diferentes daqueles que originaram as demais
arqueofácies identificadas nas sucessões verticais.
Nos restantes sambaquis conchíferos analisados (Cubículo 1 e Morrinhos), não
se alcançou o contato do sítio com o depósito natural subjacente e, portanto,
desconhece-se se o padrão observado em Caipora e Jabuticabeira 1 é a eles extensivo.
Porém, cabe mencionar que no sítio Jabuticabeira 2, formado por sedimentos terrígenos
e conchas inteiras, observou-se o mesmo tipo de depósito inaugural sobre a paleoduna
que compõe seu substrato.
O segundo conjunto é o mais numeroso e agrupa a maior parte de arqueofácies
descritas nos quatro sambaquis analisados. Estas arqueofácies não só predominam em
numero, más também no volume que ocupam nas sucessões verticais analisadas.
Variações dentro deste grupo incluem diferenças na forma da arqueofácies,
porcentagem de ossos de peixe, espécie de molusco dominante, proporção de conchas
fragmentadas vs. conchas inteiras e presença de estruturas internas, como lâminas de
carvão, cinzas ou areia.
O terceiro conjunto agrupa as arqueofácies que apresentam semelhança, em
coloração, composição e forma, com as denominadas camadas funerárias do sítio
Jabuticabeira 2. Aparecem nos quatro sambaquis analisados, sempre intercaladas com
arqueofácies do segundo grupo. Assim, a modo de síntese pode-se dizer que:
Três grandes conjuntos de arqueofácies compõem os sítios Caipora, Cubículo 1,
Morrinhos e Jabuticabeira 1 (a seguir ordenadas por freqüência de aparição):
1) Arqueofácies com predomínio de conchas.
2) Arqueofácies lenticulares pretas.
3) Arqueofácies com predomínio de sedimentos terrígenos.
Nos tópicos a seguir, apresenta-se a discussão das análises laboratoriais
realizadas nas arqueofácies amostradas dos quatro sambaquis conchíferos analisados.
322
1.1. SEDIMENTOS TERRÍGENOS Nos sambaquis de padrão estratigráfico conchífero identificou-se um padrão na
proveniência das areias terrígenas, com presença de materiais provenientes dos
depósitos naturais situados nas proximidades. Alguns sítios (Caipora e Cubículo 1)
mostram distribuições bimodais, o que pode estar relacionado à existência de duas
fontes sedimentares. Outros sambaquis (Morrinhos e Jabuticabeira 1) apresentam
distribuição unimodal e, portanto, possuem maior probabilidade de terem uma única
fonte para as areias terrígenas.
No sítio Caipora, a bimodalidade da distribuição granulométrica (grânulos com
areia muito grossa; e areia fina) indica duas fontes de sedimentos terrígenos. A moda
mais grossa está associada a depósitos coluvionares do afloramento granítico que existe
nas proximidades. A outra moda, na classe areia fina, pode estar associada a depósitos
paleolagunares próximos ao sambaqui, que têm moda nas frações areia média e muito
fina. No sítio Cubículo 1, a moda nas classes areia grossa e areia fina sugerem duas
possibilidades: duas fontes de sedimentos diferenciadas, coluvionar, por um lado, e
lagunar, por outro; uma única fonte, de sedimentos da fácies de brejo lagunar com
aporte de colúvio, como observado na fácies superior da trincheira aberta nas
proximidades do sambaqui.
As estatísticas descritivas das distribuições granulométricas do sítio Morrinhos,
comparadas com as de amostras naturais de um testemunho localizado a 2 km do sítio
(ver Nascimento 2011), indicam leve afinidade com sedimentos paleolagunares. Em
duas das estatísticas, diâmetro médio e assimetria, os sedimentos do sambaqui
apresentam sobreposição com os sedimentos paleolagunares, mas não com os deltaicos.
No sítio Jabuticabeira 1, identificou-se maior relação das areias terrígenas com
depósitos paleolagunares das proximidades do sítio Jabuticabeira 2 e tendência para
sedimentos mais grossos no sambaqui. A maior frequência de grossos no sítio pode ter
resultado da digestão incompleta das conchas e ossos no tratamento prévio às análises
granulométricas; ou à presença de sedimentos coluvionares, haja vista a presença de
granitos aflorando a menos de 5 m do sítio. Assim:
323
Análises
granulométricas
mostram
afinidade
com
sedimentos
coluvionares,
relacionados com afloramentos graníticos das proximidades, nos sítios Caipora e
Cubículo 1; e principalmente com sedimentos paleolagunares nos sítios Morrinhos e
Jabuticabeira 1.
O próximo tópico será reservado à discussão das variações intra e inter-sítio nas
distribuições granulométricas dos quatro sambaquis conchíferos estudados.
1.1.1. Proveniência das areias terrígenas As areias terrígenas representam um componente fortuito dos sambaquis e não
sedimentos intencionalmente coletados e depositados nos sítios. Isto se interpreta pela
aleatoriedade na distribuição dos sedimentos terrígenos que se misturam com os restos
faunísticos e carvão, entre outros. Caso se tratasse de depósitos arenosos intencionais e
discretos, observar-se-iam camadas espessas de areia na estratigrafia e, pelo momento,
não se conhece nenhum sambaqui conchífero que apresente depósitos desse tipo.
Camadas de areia restringem-se a lentes centimétricas ocasionais em meio a camadas
conchíferas maiores ou associadas às camadas centimétricas pretas 86 .
Ao considerar que as areias terrígenas se incorporaram casualmente aos
sedimentos dos sambaquis, pode-se pensar que a sua chegada até os sítios esteja
relacionada aos componentes mais abundantes dos sambaquis: moluscos, ossos e
carvão. Esta relação pode-se dever a dois fatores que, por sua vez, indicam
comportamentos diferenciados: 1) as areias terrígenas refletem o substrato onde habita a
espécie de moluscos predominante nos sítios; 2) as areias terrígenas refletem o substrato
onde moluscos e demais restos biológicos (ossos e carvão) foram acumulados pelos
humanos antes de serem depositados no sambaqui.
A primeira das hipóteses é sugerida pela relação observada entre espécie
predominante de moluscos e moda da distribuição granulométrica. Por exemplo, as AF
1, 2, 3 e 5 de Jabuticabeira 1 têm moda na fração areia média e são compostas
principalmente por Anomalocardia brasiliana (70-95 %). Já nas AF 7 e 9, observa-se
86
Cabe ressaltar que em vários concheiros naturais da área de estudo, observam-se estratificações planoparalelas ou cruzadas com alternância de lâminas de areia pura, sem bioclastos, e lâminas de conchas com
areia (Guerra, 1953; Giannini, 1993; Caruso Jr., 1995; Caruso Jr. et al., 2000).
324
aumento no teor de areia fina e muito fina e composição à base de A. brasiliana junto
com Ostrea sp. (40-60 % de ambas as espécies) e mariscos. Neste caso, pode-se pensar
que a mudança na moda das distribuições granulométricas esteja relacionada, em parte,
com a malacofauna predominante em cada arqueofácies.
No geral, naquelas arqueofácies onde domina Ostrea sp. junto com marisco (AF
1 do sítio Caipora, AF 4 do sitio Morrinhos e AF 7 e 9 de Jabuticabeira 1), as classes
areia fina e areia muito fina igualam ou superam a areia média. Já nas arqueofácies onde
Anomalocardia brasiliana predomina (AF 1, 2, 3 e 5 de Jabuticabeira 1), a moda é em
areia média. Uma exceção se observa na AF 3 do sítio Morrinhos, com predomínio de
A. brasiliana e moda em areia fina.
A associação entre arqueofácies com moda na classe areia media e conchas de A.
brasiliana, observada no sítio Jabuticabeira 1, pode-se explicar pela localização do
banco de moluscos explorado para levantamento do sítio dentro do sistema lagunar. Por
exemplo, em trincheiras abertas entre 50 e 100 m a sul do sambaqui Jabuticabeira 2,
identificaram-se fácies de areia com conchas de A. brasiliana, associadas ao sistema
lagunar, com moda na fração areia média (Villagran 2008). Depósitos semelhantes
podem ter existido nas proximidades de Jabuticabeira 1, situado menos de 2 km a NW
de Jabuticabeira 2 87 . Isto explicaria o domínio de grossos registrado na análise
granulométrica dos sedimentos de Jabuticabeira 1, suposto anteriormente como
resultado da presença de sedimentos coluvionares e/ou como artefato laboratorial.
Já a associação de A. brasiliana e sedimentos com moda na fração areia fina
observada na AF 3 do sítio Morrinhos é coerente com os dados de Fornari (2010) para
concheiros naturais nas margens da laguna de Garopaba do Sul. Nestes depósitos, a
autora identificou predomínio de A. brasiliana em fácies com moda em areia fina. A
associação das arqueofácies com predomínio de Ostrea sp. e as classes areia fina e
muito fina é mais difícil de explicar já que Ostrea sp. vive sempre fixada a substrato
duro, como costões rochosos ou outras conchas, e não em substrato arenoso. No
entanto, estas arqueofácies apresentam conteúdo de mariscos superior ao de A.
brasiliana, o que pode sugerir que a moda detectada esteja relacionada a este
componente faunístico e não às ostras.
87
Neste sentido, cabe mencionar um caso estudado no litoral de São Paulo, onde encontrou-se banco de
A. brasiliana em praia localizada dentro de uma enseada protegida, cujos sedimentos apresentam moda na
fração areia média (Schaeffer-Novelli, 1976).
325
A hipótese sobre retrabalhamento do substrato onde os componentes antrópicos
eram acumulados antes da deposição no sambaqui é sugerida pela presença recorrente
de sedimentos coluvionares, associados com afloramentos graníticos das proximidades,
em dois dos quatro sambaquis conchíferos analisados. Estes sedimentos podem
representar o substrato do local de habitação, em locais naturalmente elevados, como
morros granitoides, onde moluscos e ossos eram acumulados antes da deposição no
sambaqui. Pelas evidências disponíveis, não há como afirmar que as duas hipóteses
sejam excludentes entre si. Assim, cabe supor que:
A fração terrígena nos sambaquis conchíferos inclui tanto sedimentos do banco de
moluscos explorado quanto sedimentos das áreas de ocupação próximas aos sambaquis,
nas quais os materiais que compõem os sítios (moluscos, ossos, carvão etc.) eram
acumulados pelos sambaquieiros.
1.1.2. Relação entre arqueofácies Não se observaram diferenças destacáveis entre os três grupos de arqueofácies
descritos no começo deste tópico, no que se refere aos dados granulométricos da fração
terrígena. A única diferença notável é quanto ao teor de terrígenos, no que as
arqueofácies pertencentes ao terceiro grupo separam-se das demais pelos valores mais
altos. Na comparação entre o segundo e terceiro grupo, não se constatou um padrão
inter ou intra-sítio. Dos sítios que tiveram mais de uma arqueofácies analisada
(Morrinhos e Jabuticabeira 1), apenas o Morrinhos apresentou distribuição diferenciada
entre as arqueofácies conchíferas e lenticulares pretas, o que, segundo o raciocínio
apresentado no tópico anterior, pode indicar diferentes locais de coleta para as distintas
espécies faunísticas que compõem cada arqueofácies.
326
1.2. ASSEMBLEIA MALACOLÓGICA Em termos gerais, os moluscos predominantes nos sambaquis do litoral Sudeste
brasileiro, que podem perfazer de 80 até 90% da assembleia faunística, são somente
três: ostras (Ostrea sp. ou Crassostrea sp.); berbigão (Anomalocardia brasiliana); e
marisco (Mytella guyanensis ou Brachiodontes sp.). Outras espécies de moluscos
aparecem nos sítios, mas em frequência inferior a 10% (Figuti, 2008).
A espécie de moluscos dominante é usualmente usada como indicador indireto
do ambiente, nas adjacências do sambaqui, de onde os moluscos eram coletados. Por
exemplo, sambaquis compostos principalmente por A. brasiliana são associados ao
sistema de lagunas costeiras, já que estes bivalves habitam fundos arenosos e arenolodosos de águas salobras (salinidade de 16-35 ‰) 88 , enquanto sítios compostos por
Crassostrea sp. associam-se a ecossistemas de mangue. Nesta tese, o componente
malacológico principal toma-se unicamente como indicador do ambiente no local de
coleta, não definido a priori como próximo ao sítio.
Nos sambaquis analisados, duas espécies são dominantes: Anomalocardia
brasiliana e Ostrea sp. Não existem grandes diferenças em termos de frequência de
espécies entre as arqueofácies do mesmo sítio (ver Anexo, Tabela A.3 para os sítios
Cubículo 1 e Morrinhos e Ferraz, 2010, para Caipora e Jabuticabeira 1). No geral, a
espécie dominante distribui-se homogeneamente ao longo das sucessões verticais, com
variação máxima de 20 % entre as arqueofácies. Exceções ocorrem no sítio
Jabuticabeira 1, entre as arqueofácies identificadas na seção inferior (AF 1 a 5),
dominadas por A. brasiliana, e na seção superior (AF 7 a 9), com domínio de Ostrea
sp. (tópico 1.1.2), e no sítio Morrinhos, onde Ostrea sp. domina na AF 4, superior,
enquanto A. brasiliana domina em AF 1 e 3.
No Quadro 6.1, listam-se todas as espécies de moluscos identificadas nos sítios
Caipora, Cubículo 1, Morrinhos e Jabuticabeira 1, acompanhadas de breve descrição do
substrato e ambiente de vida. No Quadro 6.2, apresenta-se a frequência de distribuição
de espécies de moluscos por sítio, com destaque, em negrito, para as espécies que vivem
sobre substrato rochoso.
88
A. brasiliana é encontrada desde lagunas e estuários salobros (salinidade de 16 ‰), e em manguezais
associados, até lagunas salinas (valores de 38 ‰) (Grotta and Lunetta, 1980; Monti et al., 1991; Narchi,
1972, 1976; Schaeffer-Novelli, 1976).
327
Quadro 6.1. Espécies de moluscos identificadas nos sambaquis Caipora, Cubículo 1, Morrinhos e
Jabuticabeira 1, com descrição do substrato e ambiente onde a espécie vive. Dados de vermetídeos e
cirripídeos tomados de Laborel and Laborel-Deguen (1996). Demais moluscos tomados de Rios (1985).
Espécie
Anomalocardia brasiliana
(Gmelin 1791)
Ostrea sp.
Heleobia sp.
(Stimpson 1865)
Macoma sp.
(Orbigny 1846)
Nassarius vivex
(Say 1822)
Ceritium sp.
(Born 1778)
Chione cancelata
(Linnaeus 1767)
Bula striata
(Bruguiere 1792)
Littorina flava
(King & Broderip 1832)
Thais haemastoma
(Linnaeus 1767)
Neritina virginea
(Linnaeus 1758)
Crepídula sp.
(Gmelin 1791)
Lucina pectinata
(Gmelin 1791)
Trachycardium muricatum
(Linnaeus 1758)
Lirophora paphia
(Linnaeus 1767)
Tellina angulosa
(Linnaeus 1758)
Cyrtopleura costata
(Linnaeus 1758)
Marisco (Mytella sp. e
Brachiondontes sp.)
Vermetídeos
Substrato
Areia ou areia lamosa
Rocha, conchas mortas ou
bancos de mexilhões
Lama, areia lamosa ou
algas verdes
Areia lamosa
Estuários e lagunas até 5 cm de
profundidade
Região entremarés, em estuários e lagunas Lama ou planície arenosa
Água rasa e salobra, em estuários e lagunas.
Areia, lama ou rocha
Região entremarés, até 80 m de
profundidade
Região entremarés até 140 m de
profundidade
Região entremarés
Areia, areia lamosa ou areia
entre rochas
Areia Rocha ou vegetação de
mangue
Rocha
Lama, raízes de mangue,
rocha e conchas
Rocha, corais ou mangue
Areia lamosa
Areia, areia lamosa ou areia
entre rochas
Areia
Areia ou areia lamosa
Perfurante em substratos
lodosos e rochas de baixa
resistência
Fundo lodoso de lagoas e/ou
substratos duros
Rocha
Craca (cirripídeos)
Olivela sp.
Dosinia sp.
Mesodesma sp.
(Deshayes 1854)
Mactra sp.
Anadara sp.
Rocha
Areia ou areia lamosa
Areia
Areia
Donax sp.
Praias arenosas
Ambiente
Baías ou estuários e regiões entremarés, até
5 m de profundidade. Eurihalina
De 1 até 100 m de profundidade. Eurihalina
Areia
Areia, cascalho ou lama
328
Região supramaré
Região entremarés, próxima a bancos de
ostras.
Águas salobras, também em praias rochosas
abrigadas
12 a 36 m de profundidade. Ambiente
marinho de baixa energia
Água rasa, de 15 a 20 cm de profundidade,
em estuários e lagunas. Eurihalina
Baixios de enseadas e baías
De 10 a 100 m de profundidade
Região entremarés, até 10 m de
profundidade.
Ambiente marinho, até 10 m de
profundidade
Região entremarés.
Topo da zona infralitoral, com alta energia
de impacto das ondas.
Região entremarés
Águas rasas e profundas
Até 60 m de profundidade
Região entremarés Região inframaré
Região inframaré, de 5 a 75 m de
profundidade
Região entremarés. Ambiente marinho de
alta energia
Quadro 6.2. Distribuição de espécies de moluscos nos sítios Caipora, Cubículo 1, Morrinhos e
Jabuticabeira 1. •••• = espécie dominante (50-70 %); ••• = espécie freqüente (10-50%); •• = poucos
indivíduos ou fragmentos (1-10%); • = ocasionais (<1%). As espécies identificadas em negrito são
aquelas que vivem aderidas a substrato rochoso em mar aberto.
Espécie
Anomalocardia brasiliana
Ostrea sp.
Macoma sp.
Nassarius vivex
Ceritium sp.
Chione cancelata
Bula striata
Littorina flava
Thais haemastoma
Neritina virginea
Crepídula sp.
Lucina pectinata
Trachycardium muricatum
Lirophora paphia
Tellina angulosa
Cyrtopleura costata
Marisco
Vermetídeos
Craca
Olivela sp.
Pinctada radiata
Dosinia sp.
Mesodesma sp.
Mactra sp.
Anadara sp.
Donax sp.
Ossos
Malha de 2 mm
Caipora
••
•••••
•
•
•
•
Cubículo 1
••
•••••
•
•
•
••
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
••
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•••
•
••
Morrinhos
•••••
••
•
•
•
•
•
•
•
•
•
Jabuticabeira 1
•••••
•••
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
••
•
••
•
•
•
•
•••
•
•
•
•
•
•
•••
A partir das informações agrupadas nos Quadros 6.1 e 6.2, inferem-se quatro
questões maiores sobre a assembleia malacológica dos sambaquis analisados: 1) existe
coleta seletiva de espécies em cada sítio, com preferência por Anomalocardia brasiliana
ou Ostrea sp., exceto no sítio Jabuticabeira 1 onde metade do sítio (seção inferior) é
composta por A. brasiliana e outra metade (seção superior), por Ostrea sp. e marisco; 2)
a frequência comparativamente baixa (<1%) de espécies, que, mesmo adultas, possuem
carapaça com tamanho menor que 1,5 cm (Nassarius vivex, Littorina flava, Neritina
virginea, entre outras) sugere que estes indivíduos teriam sido incorporados
acidentalmente no ato da coleta, por se acharem no banco de moluscos onde a espécie
dominante foi extraída; 3) na maior parte dos sítios, observa-se mistura de espécies que
habitam substrato arenoso e areno-lodoso em águas salobras, junto com espécies que
vivem aderidas a rochas em águas marinhas, o que indica mais de uma proveniência
para a fauna encontrada nos sedimentos do sambaqui; 4) alguns sítios (Caipora,
329
Cubículo 1 e seção superior de Jabuticabeira 1) apresentam maior frequência que os
outros de espécies exclusivas de costões rochosos de mar aberto (Ostrea sp.,
vermetídeos), interpretada como escolha preferencial por estes locais de coleta,
associada ou não à proximidade dos costões rochosos aos sambaquis.
1.2.1. Relação entre espécies predominantes A preferência por A. brasiliana como para levantamento de sambaquis do litoral
sul de Santa Catarina já fora constatada em trabalhos zooarqueológicos anteriores
(Klokler 2001, 2008; Ferraz 2010). Em alguns casos, como os sambaquis Caipora e
Cubículo 1, a preferência é dada por Ostrea sp., enquanto em outros dois, Jabuticabeira
1 e Morrinhos, passa-se do uso preferencial de A. brasiliana, nas camadas basais do
sambaqui, para o de Ostrea sp., no topo.
Esta mudança, registrada ao longo da seção vertical de dois grandes sambaquis
conchíferos da região, de cronologia entre 5000 e 2000 anos AP, opõe-se à tradicional
associação entre sambaquis antigos e composição predominante de ostra. Tal associação
foi proposta originalmente por Krone (1914) para o litoral de São Paulo e depois
adotada por vários autores (Bigarella, 1949; Fairbridge, 1976; Hurt, 1974; Piazza, 1982;
Prous, 1992; Rohr, 1969). Para esses autores, esta suposta associação estaria vinculada à
evolução geológica da costa durante o Holoceno, e sobretudo às mudanças do NRM.
Segundo esta visão, os sistemas costeiros, antes da máxima transgressão holocênica,
teriam sido mais abertos, com maior oceanidade das águas, o que favoreceria o
desenvolvimento de Ostrea sp. e Crassostrea sp. (ostra do mangue) sobre A. brasiliana.
As mudanças resultantes da descida do NRM após o máximo transgressivo holocênico,
com formação de lagunas costeiras, teriam favorecido o desenvolvimento de grandes
bancos de A. brasiliana que passariam a ser intensamente explorados pelas populações
pré-históricas.
Nos sambaquis antigos, como Caipora, tanto o contexto geológicogeomorfológico de localização do sítio quanto o NRM no momento em que ele era
construído explicariam o domínio de Ostrea sp. Há cerca de 7500 anos atrás, os morros
granitoides circundantes teriam estado em contato direto com as águas da antiga
paleobaía que caracterizava a região, provavelmente antes mesmo do máximo
transgressivo holocênico. A presença de águas marinhas teria favorecido o
330
desenvolvimento de Ostrea sp. no costões, o sistema lagunar não estava ainda
configuradao e, portanto, eram rados ou asutens os fundos favoráveis para
desenvolvimento de A.brasiliana.
A presença de vermetídeos nos sambaquis Caipora e Cubículo 1, frequentemente
aderidos às carapaças de Ostrea sp., corrobora a exploração de costões de mar aberto já
que, apesar de Ostrea sp. admitir variações na salinidade das águas (Rios, 1985), os
vermetídeos habitam unicamente costões de águas francamente marinhas. Outras
espécies de gastrópodos bentônicos de costa rochosa, como Litorina flava, Crepídula
sp., Thais haemastoma e algumas de marisco (Brachiodontes sp.) reforçam a
interpretação da exploração de costões.
A inversão observada nos sítios Morrinhos e Jabuticabeira 1, também registrada
em sambaquis conchíferos do litoral norte de Santa Catarina (sítio Espinheiros 2, por
exemplo) (Figuti and Klokler, 1996; Figuti, 2008), indica que a opção por um ou outro
tipo de molusco (Ostrea sp. ou A. brasiliana) responde, também, a escolhas culturais 89 .
Isto significa que a presença de Ostrea sp. nos sambaquis vai além da correlação com
fatores ambientais, que restringiram ou favoreceram a disponibilidade de certas espécies
de moluscos nas proximidades dos sítios ao longo do tempo, mas envolve também a
exploração intencional de espécies de costões rochosos, inclusive afastados do local.
A exploração conjunta de espécies de costões rochosos com a macrofauna
estuarino-lagunar é clara quando se observam sambaquis com camadas compostos por
A. brasiliana junto com Ostrea sp. e marisco, ou alternância de camadas com
predomínio de uma ou outra espécie. Tal é o caso, por exemplo, dos sítios Jabuticabeira
2 (Klokler 2008) e Ponta do Morro Azul (Kneip 2004) e, especificamente, da AF 7 do
Jabuticabeira 1. Isto porque Ostrea sp. e A. brasiliana não convivem frequentemente no
mesmo ambiente, embora existam algumas exceções. A. brasiliana vive exclusivamente
enterrada (até 10 cm de profundidade) em fundos areno-lodosos a arenosos, em águas
salobras 90 , rasas, com pouco material em suspensão (Narchi, 1972; Schaeffer-Novelli,
89
Segundo Figuti (2012, comunicação pessoal) a associação dos sítios mais antigos com Ostrea sp. podese dever à diferença na taxa de reprodução desta espécie em relação a Anomalocardia brasiliana. As
ostras reproduzem-se mais lentamente e, para não causar a exaustão do recurso, deve ser coletada em
intervalos de tempo suficientes para permitir que os moluscos cheguem à idade reprodutiva. Já A.
brasiliana tem taxa de reprodução alta e admite exploração contínua. Esta constatação teria provocado,
segundo Figuti, o troca da coleta de Ostrea sp. por A. brasiliana. Uma hipótese semelhante foi proposta
por Hurt (1974) para explicar a presença de Crassostrea sp. unicamente nos níveis inferiores dos
sambaquis.
90
A. brasiliana é encontrada desde lagunas e estuários salobros (salinidade de 16 ‰), e em manguezais
associados, até lagunas salinas (valores de 38 ‰) (Grotta and Lunetta, 1980; Monti et al., 1991; Narchi,
1972, 1976; Schaeffer-Novelli, 1976). Ocorre na forma de manchas com grande densidade de indivíduos
331
1976), enquanto Ostrea sp. habita aderida a substrato duro em mar de alta energia (Rios,
1985).
O domínio de A. brasiliana nos sambaquis da área de estudo está ligado à
proliferação desta espécie no sistema lagunar, cujo fechamento caracterizou a região
desde o Holoceno Médio. Tal proliferação teria conduzido à exploração mais intensa.
Porém, apesar do incremento no uso de A. brasiliana, não ter-se-ia abandonado a
exploração de recursos de costões rochosos. Os costões, apesar de estarem localizados
progressivamente a maior distância dos sítios, agora construídos nas margens
paleolagunares, ainda proviam de ostras, espécies exploradas desde o começo da
ocupação humana na região, . Isto pode ser constatado no sítio Cubículo 1, cuja idade
corresponde com o momento posterior ao fechamento do sistema lagunar e está, no
entanto, composto predominantemente de Ostrea sp.
Existe sempre predomínio de uma espécie de molusco em cada arqueofácies amostrada,
que pode ser A. brasiliana, coletada em depósitos paleolagunares, ou Ostrea sp.,
coletada em costões rochosos. O domínio de uma ou outra espécie relaciona-se com o
contexto geológico-geomorfológico de localização do sítio, com fatores ambientais,
relacionados com a descida do NRM durante o Holoceno, e com escolhas culturais.
1.2.2. Disponibilidade de espécies: comparação com concheiros naturais A espécie A. brasiliana é predominante tanto nos sambaquis do litoral sul de
Santa Catarina como na maioria dos concheiros naturais que existem na região. Estes
depósitos de acumulação massiva de conchas encontram-se em fácies arenosas e
lamosas associadas ao sistema lagunar. Podem conter grande concentração de
indivíduos inteiros como fragmentados e estão datados entre 8000 e 1600 anos AP
(Caruso Jr., 1995; Fornari, 2010; Nascimento, 2010).
(Schaeffer-Novelli, 1976) e, apesar de se reproduzir continuamente ao longo do ano, estudos realizados
no litoral de São Paulo observaram dois picos reprodutivos maiores ao ano, um no outono (fevereiro a
abril) e outro na primavera (agosto a novembro) (Grotta and Lunetta, 1982; Narchi, 1976).
332
Segundo Caruso Jr. (1995) e Caruso Jr. et al. (2000), os grandes concheiros que
caracterizam a região de Tubarão, Garopaba do Sul e Jaguaruna são constituídos de
conchas retrabalhadas, originalmente depositadas em fácies lamosas do sistema lagunar
ou fácies arenosas marinhas. Eventos de alta energia teriam provocado o
retrabalhamento e acumulação das conchas, como mostrado pela mistura de espécies de
habitats distintos (estuarinas, lagunares e marinhas) e de conchas inteiras com
fragmentadas e pela presença de estruturas sedimentares sugestivas da ação de ondas ou
correntes.
Na região de Jabuticabeira, encontra-se um dos concheiros naturais mais
extensos da área de estudo, onde predomina A. brasiliana. Este depósito envolve
diferentes jazidas, e aparece mesmo ancorado na elevação granítica da região de Mato
Alto (Figura 6.1). Na sua porção central, no bairro de Jabuticabeira, ele apresenta 1300
m de cumprimento em direção NW-SE, largura de 150 até 1000 m e espessura de 0,5 a
4,5 m. Neste local, obteve-se uma datação de 3720 ± 60 anos AP (Caruso Jr., 1995;
Caruso Jr. et al., 2000). Na porção próxima à Laguna Delfino, Martin et al. (1986)
dataram o depósito em 3830 ± 180 anos AP. Em toda sua extensão, o concheiro
encontra-se coberto por camada de areia lamosa, rica me detritos vegetais e, em
algumas porções, apresenta laminação plano-paralela e gradação inversa. Em coleta
realizada por Klokler (2008) numa porção deste concheiro localizado nas proximidades
do sambaqui Encantada 3, constatou-se proporção de 86% de A. brasiliana na
composição, com frequências menores que 10% de outras espécies (Macoma sp.,
Lucina sp., ostras, gastrópodes etc.).
Outro extenso concheiro natural aparece na região do Camacho, a leste da
Laguna de Garopaba do Sul, sob a barreira arenosa. Este depósito tem 3000 m de
cumprimento, em direção NE-SW, 900 a 1650 m de largura e 0,2 até 2,0 m de espessura
(Figura 6.1). Na região de Campos Verdes, outro grande concheiro natural foi
localizado por Hurt (1974) nas proximidades, e inclusive subjacente, ao grande
sambaqui Carniça 1. O depósito foi datado em 3350 ± 150 anos AP a uma profundidade
de 1,5 m.
Segundo Caruso Jr. (1995), as idades dos moluscos nos concheiros naturais não
representam
fielmente
a
idade
de
deposição,
por
terem-se
formado
pelo
retrabalhamento, em eventos de tempestade, de depósitos de concha preexistentes. O
autor vincula estes eventos com a existência de um sistema mais aberto suscetível às
flutuações do NRM do mar no Holoceno. No entanto, análises sedimentológicas e
333
tafonômicas realizadas por Fornari (2010) oferecem evidencias sobre a formação dos
concheiros como resultado de eventos de alta energia dentro do sistema lagunar,
especificamente nas margens lagunares, o que permitiria associar a assembleia de
moluscos no concheiro com aquela que habitava a antiga paleolaguna. A autora
encontrou fácies com bivalves fechados e articulados, indivíduos em posição de vida,
sinais de pouco transporte etc., o que sugere que parte das conchas pode ser usada para
indicar a idade do depósito em que se encontram 91 .
Fornari (2010) localizou concheiros naturais em trincheiras e testemunhos
próximos às margens da laguna Garopaba do Sul (Figura 6.1). Este depósitos
apresentam idades de 5560-5320 até 2645-2165 anos cal AP e profundidade de 0,3 até
2,6 m 92 . O molusco predominante, em todos os casos, é sempre A. brasiliana, seguido
de Crassostrea sp., com frequência inferior a 10% de outros bivalves e gastrópodes 93 .
Na região do Rio do Meio, mesmos autores identificam concheiros com idades de 22501850 até 2680-2300 anos cal AP e profundidades de 0,3 até 2,4 m. Nestes depósitos,
também detectam o domínio de A. brasiliana. Em termos gerais, a maior mistura entre
espécies lagunares/estuarinas e espécies marinhas foi achada naqueles concheiros
localizados próximos às paleodesembocaduras da laguna Garopaba do Sul. Na margem
oeste da mesma laguna, os concheiros estão compostos majoritariamente por espécies
lagunares, apesar de existirem alguns indivíduos de espécies marinhas.
Nas fácies lagunares associadas ao delta do Rio Tubarão, Nascimento (2011)
também encontra concheiros naturais em sondagens e testemunhos, a profundidades de
0,1 até 1,8 m e com idades que vão de 8013-7800 até 1918-1645 anos cal AP (Figura
6.1). Nestes concheiros, a espécie melhor distribuída é Divaricella quadrisulcata,
especialmente a profundidades maiores, com aumento na proporção de A. brasiliana ate
91
Neste sentido, cabe mencionar as observações realizadas por Hurt (1974) no concheiro natural da
região de Campos Verdes. Dos trabalhos anteriores ao ano 2000, o autor é o único em oferecer
informações sobre a tafonomia das conchas no depósito ao mencionar que, no concheiro natural, as
conchas estão inteiras, algumas articuladas e “limpas”, em contraste com as conchas “sujas” do
sambaquis e as conchas fragmentadas dos depósitos de praia.
92
Em sondagens até 13 m de profundidade, Fornari (2010) também identifica concheiros com idade de
8185-7990 anos cal AP.
93
A identificação de Crassostrea sp. nos testemunhos abertos nas proximidades da margem oeste da
Laguna de Garopaba do Sul (Fornari, 2010), é coerente com o achado de carvão de espécies de mangue
realizado por Scheel-Ybert et al. (2009) no sambaqui Encantada 3, localizado na mesma área amostrada
por Fornari (2010). Ambas as evidências tornam mais robusta a inferência da presença de mangue na
região há cerca de 5000 anos atrás. A convivência de Crassostrea sp. com A. brasiliana já foi constatada
em uma laguna salobra do Caribe, onde ambas espécies habitam em ecossistema de mangue (Monti et al.,
1991). 334
o topo dos testemunhos. Divaricella quadrisulcata habitaria águas francamente
marinhas (Rios, 1985) e, em vista disso, sua presença é interpretada pelo autor como
indicação da existência de sistema deposicional mais aberto antes da chegada dos
sedimentos deltaicos.
Figura 6.1. Mapa da área de estudo, com localização dos concheiros naturais identificados por Hurt
(1974), Caruso Jr. (1995), Fornari (2010) e Nascimento (2011).
Pela cronologia dos depósitos naturais e assembleia malacológica que
apresentam, cabe pensar que alguns deles teriam sido contemporâneos ao momento em
que os sambaquis conchíferos eram ativos. Nesse momento, os bancos de moluscos que
deram origem aos concheiros naturais estariam em superfície e os seus componentes
malacológicos estariam disponíveis para exploração. Isto não significa que conchas
mortas foram usadas no levantamento dos sambaquis, possibilidade já refutada em
trabalhos anteriores (Giannini et al. 2010). De acordo com o processo de formação dos
concheiros, o que hoje em dia se vê como depósitos massivos de conchas mortas,
relacionados aos eventos de mais alta energia dentro do respectivo sistema deposicional,
pode agrupar indivíduos contemporâneos que viviam dentro do sistema lagunar. Assim,
alguns dos concheiros, especialmente aqueles que contêm acumulações de conchas
335
inteiras, refletem o retrabalhamento de moluscos que, na época de formação dos sítios,
estavam vivos e se achavam disponíveis para coleta pelas populações pré-históricas. No
entanto, existem também na região concheiros cuja assembleia malacológica foi
retrabalhada sucessivas vezes e são, portanto, oriundas de eventos muito mais antigos e
de sistemas abertos, onde as tempestades podem ter transporte maior. Neste segundo
caso, não haveria disponibilidade, seja física ou cronológica, para exploração humana
pré-histórica.
Cabe mencionar uma importante diferença tafonômica entre os concheiros
naturais e os sambaquis. As conchas no concheiro natural estão melhor preservadas,
enquanto nos sambaquis apresentam sinais de queima, dissolução, manchas amareladas
e películas de coloração escura ao redor (Klokler et al. 2011). Por exemplo, no sítio
Morrinhos, observaram-se fragmentos e carapaças inteiras de A. brasiliana queimados,
misturados com carapaças inteiras deste molusco, bem preservadas. No sítio Cubículo
1, foram também achados fragmentos de vermetídeos com sinais de queima. Esta
diferença pode-se relacionar com o processamento antrópico ao qual foram expostas
antes da deposição no sambaquis, e com o intemperismo e/ou pedodiagênese mais
intensa que sofrem as conchas carbonáticas em depósitos subaéreos e altamente
porosos.
Pela cronologia, composição faunística, tafonomia e posição estratigráfica, pode-se
supor que parte dos concheiros naturais da área de estudo, mas não necessariamente
todos, são produto do retrabalhamento restrito ao sistema lagunar, e podem ser usados
como reflexo da assembleia de moluscos disponível para as populações costeiras nos
bancos que eram ativos durante a formação dos sambaquis.
1.2.3. Coleta seletiva A mistura, em uma mesma arqueofácies, entre espécies que habitam diferentes
substratos, mostra a heterogeneidade da assembleia malacológica dos sambaquis. Este
atributo já havia sido constatado por Klokler (2001, 2008) no sambaqui Jabuticabeira 2,
para o qual a autora interpreta mistura de proveniências, usos e processamentos nas
conchas utilizadas, em última instância, para elevação do sítio.
336
Em todas as arqueofácies estudadas observa-se presença de espécies que
habitam fundos areno-lodosos, em águas calmas, com espécies que vivem em costões
rochosos
sob
mais
alta
energia
hidrodinâmica.
Há
mistura
de
espécies
estuarinas/lagunares e espécies. Esta variedade sugere que cada arqueofácies no
sambaqui represente o produto da coleta de moluscos oriundos de diferentes fontes ou
contextos de ocorrência, desde margens lagunares até costões rochosos. Assim, os
sedimentos dos sambaquis não resultam do transporte direto de um único local.
Se se soma a isso o fato de que, apesar da diversidade de espécies, sempre há
predomínio de A. brasiliana ou Ostrea sp., isto pode indicar que o comportamento de
coleta dos grupos litorâneos envolvia exploração de diversos contextos onde há
proliferação de moluscos, mas sempre direcionados à captura de uma espécie. A
exploração sequencial e/ou simultânea de diversos contextos, fundos lagunares e
costões rochosos, pode estar relacionada com uma medida de prevenção da superexploração dos depósitos, como proposto por Mannino and Thomas (2002) para
concheiros do Mesolítico no litoral sul da Grã Bretanha.
Nos concheiros naturais, a assembleia também apresenta heterogeneidade de
proveniências, mas a mistura no sambaqui parece não refletir diretamente a mistura
própria do depósito natural. Neste sentido, cabe mencionar a comparação, realizada por
Klokler (2008), entre a assembleia malacológica do sambaqui Jabuticabeira 2 e o
concheiro natural localizado nas proximidades do sambaqui Encantada 3. Em ambos os
depósitos predomina A. brasiliana (86 % no sambaqui vs. 89 % no concheiro natural)
junto com outras espécies de moluscos. No entanto, no sambaqui existem altas
concentrações de mariscos, espécie de bivalve que não é achada nos concheiros naturais
da região (Caruso Jr., 1995; Fornari, 2010; Hurt, 1974; Nascimento, 2010) (ver tópico
1.2.2).Da mesma maneira, nos sambaquis existe mistura de conchas com ossos inteiros
e fragmentados de peixe, situação que tampouco existe nos concheiros naturais.
Outro elemento que corrobora a coleta seletiva realizada nos sambaquis é a
baixa frequência de aparição de indivíduos juvenis. Por exemplo, as populações de A.
brasiliana nos depósitos naturais são multimodais, já que o ciclo reprodutivo desta
espécie é quase continuo (apesar de existirem pulsos maiores no outono e na
primavera), com mistura de indivíduos maiores e fluxos irregulares de juvenis (Narchi
1972, 1976). Isto significa que, nos depósitos naturais onde este molusco se desenvolve,
existe mistura de indivíduos adultos e juvenis. De tivesse ocorrido coleta não seletiva e
transporte direto a partir do banco de moluscos, existiriam indivíduos juvenis nos
337
sambaquis. No entanto, na análise arqueofaunística observaram-se frequências mínimas
de A. brasiliana juvenis, menores que 1% nas AF 2 e 3 do sítio Morrinhos, e total
ausência de juvenis nas AF 2, 3, 4, 7 e 8 do sítio Cubículo 1.
Apesar de existir coleta seletiva de espécies em cada sítio, com preferência por
Anomalocardia brasiliana ou Ostrea sp., há mistura de espécies que habitam substrato
arenoso e areno-lodoso em águas salobras, junto com espécies que vivem aderidas a
rochas em ambiente marinho, o que indica mistura de proveniências na assembleia
faunística dos sambaqui. Esta mistura também indica que não há redeposição direta do
material faunístico coletado nos bancos de moluscos, mas mistura com espécies de
ambientes diversos e com outros componentes não pertencentes aos depósitos naturais.
1.3. COMPONENTES ORGÂNICOS Apesar dos restos malacológicos serem o elemento de maior destaque nas
sucessões estratigráficas de sambaquis conchíferos, existem nos sítios também restos
orgânicos, identificados pela sua grnulação fina e/ou coloração preta, que podem incluir
desde resíduos vegetais até microfragmentos de carvão. Nos sítios maiores, com
conteúdo malacológico proeminente, como Jabuticabeira 1 ou Morrinhos, o aporte de
resíduos orgânicos é, a simples vista, pouco conspícuo. No entanto, conhecer o tipo de
resíduo orgânico que acompanha o conteúdo faunístico é diagnóstico na interpretação
das atividades associadas à deposição de cada arqueofácies e à formação do sambaqui.
1.3.1. Componentes vegetais A determinação da composição orgânica dos sambaquis foi realizada a partir de
análises isotópicas de C e N (δ13C e δ15N) e razão C/N. Os valores de δ13C nos quatro
sambaquis conchíferos analisados varia entre -26,93‰ e -22,74‰. O valor mínimo
corresponde à AF 5 do sambaqui Cubículo 1, enquanto o valor máximo corresponde à
AF 3 do sambaqui Jabuticabeira 1. Como aparece na Figura 6.2 A, C, em todos os casos
os valores de δ13C e razão C/N encontram-se dentro do intervalo definido para plantas
338
terrestres de ciclo fotossintético C3 (δ13C entre -21‰ a -34‰ e razão C/N superior a 12)
(Boutton, 1996; Lamb et al., 2006 b; Meyers, 1997; De Niro and Epstein, 1978; De Niro
and Hastrof, 1985; Sifeddine et al., 2004). Um único caso situa-se próximo ao campo
correspondente às algas (AF 1 de Jabuticabeira 1), mas o valor de δ15N (+14,99) permite
refutar a associação com plantas aquáticas e confirmar a presença de plantas terrestres
C3.
As plantas de ciclo fotossintético C3 formam quase 90% das espécies vegetais do
planeta e incluem, majoritariamente, espécies arbóreas e arbustivas, espécies cultivadas
e algumas Poaceae. As plantas de ciclo fotossintético C4 incluem as Poceaea de climas
tropicais, subtropicais e temperados, em áreas com precipitação intensa durante o verão,
assim como algumas espécies cultivadas, tais como o milho (Cabido et al., 1997;
Collatz et al., 1998; Ehleringer et al., 1997; Rundel, 1980; White, 2001). Nos
sambaquis, o predomínio de plantas C3 estaria, em parte, relacionado com a presença de
espécies arbóreas e arbustivas, como demonstrado pela alta frequência de carvões e
microcarvões que se identifica em campo e em seção delgada. Estas madeiras teriam
sido coletadas, para uso como combustível, das matas de restinga existentes nas
proximidades dos sítios, assim como de espécies da floresta pluvial de encosta
Atlântica, como já mostrado pelas análises antracológicas realizadas por Bianchini
(2008), no sítio Jabuticabeira 2, e por Scheel-Ybert (2000, 2001), em outros sambaquis
do litoral brasileiro. Não se pode excluir a possibilidade dos valores de δ13C e razão C/N
indicarem, igualmente, a presença de Poaceae C3, além das espécies arbustivas. Apesar
de serem tradicionalmente associadas a climas frios e altitude elevada (Cabido et al.,
1997; Cavagnaro, 1988; Ehleringer et al., 1997; Rundel, 1980; Tieszen, 1991), as
Poaceae C3 podem existir em áreas pantanosas e inundáveis do sistema lagunar e
deltaico associadas a gramíneas C4 ou a espécies arbustivas C3 94 . Neste caso, estas
espécies poderiam ter sido utilizadas na confecção de artefatos (cestaria) e/ou mobiliário
(trançados de fibras vegetais, tapetes).
94
De fato, em áreas litorâneas da Guiana Francesa existem espécies de Poaceae C3 em associação com
Poaceae C4, que se desenvolvem em áreas inundáveis associadas a manguezais, como pântanos e brejos
(Iriarte et al., 2010).
339
Há presença de MO associada a espécies de ciclo fotossintético C3 em todas as
arqueofácies analisadas. Isto pode estar relacionado à presença de carvões e
microcarvões derivados da combustão de espécies arbóreas e arbustivas da mata de
restinga ou da floresta pluvial de encosta Atlântica. Outra explicação possível refere à
presença de Poacea C3 relacionada com a presença de restos de artefatos confeccionados
em fibra vegetal (cestaria) e/ou mobiliário elaborado com a mesma técnica (tapetes).
340
Figura 6.2. Análises isotópicas (δ13C e δ15N e razão C/N) de amostras provenientes dos oito sambaquis
analisados nesta tese e de trincheiras de amostragem externas a cinco deles: Caipora, Cubículo 1, Galheta
4, Santa Marta 8 e Santa Marta 10: A) gráfico de valores de δ13C e razão C/N para amostras coletadas em
sambaquis conchíferos, com intervalos definidos para plantas de ciclo fotossintético C3, C4 e algas; B)
gráfico dos valores de δ15N e δ13C para amostras coletadas em sambaquis conchíferos, com intervalos
definidos para plantas de ciclo fotossintético C3, C4, animais marinhos e animais terrestres; C) gráfico de
valores de δ13C e razão C/N para todas as amostras analisadas nesta tese, com intervalos definidos para
plantas de ciclo fotossintético C3 e algas; D) gráfico dos valores de δ15N e δ13C para todas as amostras
analisadas nesta tese, com intervalos definidos para plantas de ciclo fotossintético C3 e animais marinhos;
E) gráfico de valores de δ13C e razão C/N com intervalos definidos para plantas de ciclo fotossintético C3,
C4 e algas para amostras provenientes dos oito sambaquis analisados nesta tese e amostras de testemunhos
coletados por Amaral (2008), Amaral et al. (2012) e Nascimento (2011) em fácies lagunares e deltaicas
da região de estudo; F) gráfico dos valores de δ15N e δ13C com intervalos definidos para plantas de ciclo
fotossintético C3, C4 e animais marinhos.
341
Figura 6.3. Gráfico dos valores de δ13C e δ15N de amostras provenientes dos quatro sambaquis
conchíferos analisados, com intervalos de referência para plantas de ciclo fotossintético C3, moluscos,
peixes de água doce, peixes marinhos e mamíferos marinhos.
1.3.2 Resíduos de origem animal Nos sambaquis conchíferos, assim como nos montículos ictiológicos que serão
discutidos no tópico 3.1, destacam-se os altos valores de δ15N, que variam entre
+10,05‰ e +15,23‰. O valor mínimo corresponde à AF 2 do sambaqui Morrinhos e o
valor máximo à AF 3 do sítio Jabuticabeira 1. Valores elevados de δ15N podem se
relacionar a dois fatores fundamentais: enriquecimento pós-deposicional, que em
tecidos vegetais pode ser de até 20‰, segundo De Niro & Hastrof (1985); ou presença
de resíduos de organismos de nível trófico maior que as plantas, ou seja, resíduos de
origem animal (De Niro, 1987).
A primeira opção parece a menos plausível, neste caso. Isto porque o
enriquecimento de até 20‰ referido por De Niro & Hastrof (1985) foi detectado em
tecidos vegetais preservados e não na MO total do solo ou sedimento. Outros estudos
mostram que as alterações diagenéticas na composição isotópica da MO de solos e
sedimentos não seria intensa o suficiente para impedir a diferenciação da sua origem
(Meyers and Lallier-Vergés, 1999; Wilson et al., 2005). Ao mesmo tempo, a detecção
de MO derivada de espécies arbustivas nos sedimentos de sambaquis, relacionada com a
presença de carvão na fração orgânica fina, também refuta o enriquecimento diagenético
342
de nitratos. Os resíduos vegetais carbonizados têm maior potencial para preservação da
assinatura isotópica da planta prévia à queima e, portanto, são bons indicadores de
origem da MO (Hall et al., 2008; De Niro and Hastrof, 1985).
Isto significa que os altos valores de δ15N não estariam relacionados à
contaminação dos resíduos vegetais pelo tempo de deposição, mas à mistura de MO de
origem vegetal com um componente rico em nitratos: os resíduos de origem animal.
Esta hipótese já foi proposta por Menezes (2009) a partir do estudo isotópico das
camadas centimétricas pretas que aparecem intercaladas às camadas conchíferas no
sambaqui Jabuticabeira 2, onde a autora detecta mistura entre MO de origem vegetal e
animal.
Segundo Fogg et al. (1998), os valores de δ15N são úteis na diferenciação entre
resíduos de origem animal e MO do solo. O δ15N na MO varia de -5‰ a +10‰ (até
+13‰ em alguns casos) (Kendall, 1998; White, 2001), enquanto em solos enriquecidos
com nitratos de origem animal, o δ15N varia de +8‰ a +20‰. Isto porque os tecidos
animais estão enriquecidos em δ15N em relação a sua dieta, devido ao processo de
fracionamento isotópico (Schoeller, 1999; Schoeninger and De Niro, 1984). Somado a
isso, os subprodutos dos resíduos animais podem estar inclusive mais enriquecidos em
δ15N que o próprio tecido e, em alguns casos, resíduos animais com δ15N de +5‰
podem ser converter em nitrato com δ15N entre +10 e +20‰ (Kendall, 1998).
Os animais marinhos, que representam a base alimentícia das populações
costeiras e cujos restos acumularam-se nos sambaquis, apresentam valores de
fracionamento e enriquecimento de
15
N maiores em comparação com os animais
terrestres (ver Commisso and Nelson, 2006; Schoeninger and De Niro, 1984). A cadeia
alimentar da fauna marinha tem até sete níveis tróficos, o que resulta em enriquecimento
no δ15N de até +7‰ entre produtores primários e predadores; diferente da fauna
terrestre que, por ter no máximo três níveis tróficos, tem enriquecimento de apenas
+3‰ 95 (Schoeninger and De Niro, 1984; White, 2001). A influência do nitrogênio de
origem marinha em solos e sedimentos é tal que, na vegetação terrestre que cresce
associada a corpos de água, sobre substrato onde houve deposição de fezes e urina de
peixes, a assinatura isotópica apresenta valores de δ15N até 10‰ mais altos que a
95
Animais marinhos apresentam, em média, um enriquecimento médio de δ15N de +9‰ em relação aos
animais terrestres. O δ15N de animais marinhos (aves, peixes e mamíferos) varia de +9.4 a +23‰,
enquanto os valores para animais terrestres (aves e mamíferos) não ultrapassam +10‰, ficando, em
média, em torno de +5.9 ± 2.2‰ (Schoeninger and De Niro, 1984).
343
vegetação que cresce fora da influência da fauna marinha, assim como valores de δ13C
mais negativos que o esperado (Ben-David et al., 1998; Wainright et al., 1998) 96 .
Valores de δ15N superiores a +10‰ também foram identificados como
indicadores da presença de adubo animal (animal manure) e excrementos em solos
naturais (Bol et al., 2005; Choi et al., 2002; Kendall, 1998) e arqueológicos (Bogaard et
al., 2007; Commisso and Nelson, 2006; Shahack-Gross and Finkelstein, 2008; ShahackGross et al., 2008). Shahack-Gross & Finkelstein (2008) associam valores de δ15N
superiores +9‰ na MO de sedimentos arqueológicos com a deposição de excrementos
de animais herbívoros (associação respaldada pela comparação com amostras de
excrementos modernos). Os autores utilizam os isótopos de C e N, entre outras
evidências, na detecção de sítios associados à ocupação de grupos pastoris.
No entanto, a presença de excrementos de herbívoros, como os estudados por
Shahack-Gross & Finkelstein (2008), é descartada para os sedimentos dos sambaquis
por dois motivos: em primeiro lugar, em seção delgada não se encontraram esferulitas
de calcita, indicadores micromorfológicos de excrementos de animais herbívoros
(Brochier, 1992; Canti, 1998,
1997; Shahack-Gross et al., 2008) que, pela sua
composição calcítica, teriam sido bem preservados em sedimentos ricos em carbonato
de cálcio (Canti, 1999; Shahack-Gross, 2011); tampouco se encontraram concentrações
de fitólitos de gramíneas, componente mineral conspícuo nos excrementos destes
animais (Albert et al., 2008; Shahack-Gross, 2011); em segundo lugar, e mais
importante, existe total ausência de evidências arqueológicas de fauna herbívora
associada aos grupos construtores de sambaquis.
A presença de excrementos de animais omnívoros, que inclui os humanos, não
pode ser totalmente descartada com base exclusivamente em dados isotópicos, já que
excrementos de onívoros também apresentam valores altos de δ15N, no entorno de +10 a
+22‰ (Choi et al., 2002; Heaton, 1986). Porém, em seção delgada, não se observaram
indícios da existência de excrementos humanos ou de outro animal omnívoro (ou
herbívoro) nos sedimentos dos sambaquis. Para detecção certeira de excrementos em
sedimentos arqueológicos, utilizam-se biomarcadores específicos, como o coprostanol,
indicador da existência de fezes em solos e sedimentos (Van Bergen et al., 1999; Birk et
al., 2011; Bull et al., 2002; Shillito et al., 2011).
96
Em contexto arqueológico, Commisso & Nelson (2006) identificam incrementos nos valores de δ15N
(superiores a +10‰) na vegetação que cresce sobre middens formados pela acumulação de restos ósseos
de animais marinhos.
344
Nos gráficos da Figura 6.2 B, D e da Figura 6.3, apresenta-se o diagrama de
dispersão de δ15N e δ13C dos sambaquis conchíferos analisados junto com os campos
definidos na bibliografia para plantas terrestres de ciclo fotossintético C3, animais
terrestres e animais marinhos (mamíferos, peixes e moluscos). Para construção dos
quadros de referência, foram unicamente utilizados dados disponíveis na literatura
correspondentes a MO vegetal, tecidos e resíduos animais, e não os dados obtidos a
partir da análise isotópica do colágeno dos ossos. A distribuição dos pontos, com altos
valores de δ15N e valores negativos de δ13C, evidencia um padrão, na composição destes
sedimentos, indicativo de mistura de resíduos de plantas C3 com resíduos animais
marinhos; isto é coerente com a natureza heterogênea dos sedimentos de sambaquis,
como estabelecido em trabalhos anteriores (Villagran et al., 2009 b).
De fato, os quatro sambaquis conchíferos apresentam valores de δ15N e δ13C
semelhantes aos relatados em depósitos secundários de acumulação de resíduos
(middens ou trash pits) estudados por Shahack-Gross et al. (2008), onde os altos valores
de δ15N (entre +10 e +12‰) se correspondem com valores mínimos de δ13C (entre -22 e
-20‰). Estes depósitos contêm uma grande quantidade de carvões, cinzas de madeira e
fragmentos de osso misturados (Shahack-Gross, 2004), assim como os sambaquis
analisados.
A assinatura de animais marinhos nos sedimentos de sambaquis é condizente
com a composição faunística dos sítios, dominada por conchas de moluscos e ossos de
peixe. Porém, os dados isotópicos também assinalam que os resíduos derivam
principalmente da decomposição de restos de peixes, mas não de moluscos. Os
moluscos apresentam valores negativos de δ13C (-15 a -30‰) em contraposição a
valores baixos de δ15N, entre +6 e +12‰, por se tratar de consumidores primários
(Compton et al., 2008; France, 1994; Gustafson et al., 2007; De Masi, 1999; Richards
and Hedges, 1999; Wen et al., 2010; Yesner et al., 2003). Peixes marinhos apresentam
valores de δ13C de -11 a -20‰ e δ15N de +11 a +19‰, enquanto peixes de água doce
têm, comparativamente, δ13C mais negativo (de -35 a -18‰) e δ15N menor (de +5 a
+15‰) (Barrett et al., 2011; Dufour et al., 1999; Gomez Otero, 2006; De Masi, 1999;
Richards and Hedges, 1999; Schoeninger and De Niro, 1984; Walker and DeNiro, 1986;
Yesner et al., 2003).
A posição intermediária da nuvem de pontos da amostragem em sambaquis,
situada entre os intervalos definidos para peixes de água doce e de água salgada (Figura
6.3), pode indicar a presença de resíduos de peixes que se alimentaram em ambos os
345
ambientes aquáticos, como sugerem Schoeninger & De Niro (1984). Tal mistura de
águas é típica de estuários e lagunas costeiras, de onde teriam sido coletados os peixes
consumidos pelas populações litorâneas, como indicam as análises zooarqueológicas
(Klokler, 2001, 2008; Nishida, 2007).
Além de MO de origem vegetal, há nos sedimentos dos sambaquis analisados resíduos
derivados da decomposição de tecido animal, vinculado com a presença de restos de
peixe e moluscos nos sítios.
1.3.3. Relação com sedimentos naturais Para investigar a relação entre a MO dos sambaquis com o contexto de
localização dos sítios, realizaram-se análises isotópicas das fácies argila siltosa e argila
arenosa das trincheiras abertas nas proximidades dos sítios Caipora e Cubiculo 1,
respectivamente. Os gráficos de dispersão da Figura 6.2 C e D mostram a distribuição
das amostras coletadas em sambaquis e sedimentos naturais. Especialmente no gráfico
da Figura 6.2 D, pode-se observar o agrupamento das amostras naturais no intervalo
definido para MO vegetal, especificamente para plantas de ciclo fotossintético C3;
diferente das amostras arqueológicas que, como discutido no tópico anterior,
apresentam enriquecimento de nitratos de origem marinha.
Para fortalecer o conjunto de amostras extra-sítio e observar mais claramente a
diferença composicional entre sedimentos arqueológicos e naturais, foram lançados nos
gráficos de dispersão de δ13C, razão C/N e δ15N, dados disponíveis na bibliografia sobre
composição isotópica de sedimentos naturais da região de estudo, tomados dos
trabalhos de Amaral (2008), Amaral et al. (2012) e Nascimento (2010). Dos
testemunhos coletados e sondagens realizadas pelos autores, foram selecionadas para
comparação unicamente aquelas amostras de idade igual ou inferior ao intervalo de
ocupação sambaquieira na região. No Anexo, Tabela A.5, apresentam-se as coordenadas
UTM dos testemunhos realizados pelos autores mencionados, utilizados para
comparação. No Anexo, Tabela A.6, agrupam-se os resultados da análise isotópica em
depósitos naturais (δ13C, δ15N e razão C/N) com descrição das características texturais
da fácies analisada e sistema deposicional associado.
346
No gráfico da Figura 6.2 E, observa-se a maior diversidade de componentes
vegetais, tanto terrestres como aquáticos, que caracteriza os sedimentos naturais,
diferente dos sambaquis que se agrupam no campo correspondente a plantas terrestres
C3. Já no gráfico da Figura 6.2 F, nota-se clara diferenciação entre amostras naturais e
arqueológicas, com gradiente de distribuição dos pontos desde as amostras lagunares e
deltaicas, passando pelas amostras naturais nas proximidades dos sambaquis até as
amostras arqueológicas. As amostras naturais agrupam-se nos campos definidos para
plantas terrestres e aquáticas, enquanto as amostras arqueológicas deslocam-se até o
campo definido para plantas C3 e resíduos de animais marinhos.
A MO associada aos locais de ocupação humana caracteriza-se pelo enriquecimento, em
relação à MO dos depósitos naturais de mesma idade, em nitratos de origem marinha, o
que se deve à mistura de resíduos animais (e.g., peixes e moluscos) e vegetais.
1.3.4. Relação entre arqueofácies Embora os limites para cada componente-fonte de MO (plantas C3 e animais
marinhos) não sejam rígidos, as doze amostras analisadas dos sambaquis conchíferos
podem ser agrupadas, de maneira geral, em três conjuntos de acordo com a sua posição
no gráfico da Figura 6.1 D: 1) sedimentos com MO vegetal (uma amostra); 2) mistura
de resíduos vegetais e animais com predomínio de componentes vegetais (seis
amostras); 3) mistura de resíduos vegetais e animais com predomínio de restos da
decomposição de tecidos de animais marinhos (cinco amostras).
A amostra pertencente ao primeiro conjunto corresponde à AF 2 do sítio
Morrinhos. As amostras do segundo conjunto correspondem a AF 5 do Cubículo 1, AF
1 do Caipora e AF 4, 5 e 6 de Jabuticabeira 1. Com base na observação macroscópica
em campo, estas arqueofácies apresentam coloração preta a castanha escura, que indica
predomínio de componentes orgânicos, junto a conchas e ossos. O terceiro conjunto de
amostras (AF 1, 2, 3 e 7 de Jabuticabeira 1 e AF 4 do sítio Morrinhos) posiciona-se fora
do quadro correspondente a plantas terrestres C3, no intervalo definido pela variação
isotópica de animais marinhos, principalmente peixes e moluscos.
347
Estes três grupos se relacionam, por sua vez, com dois dos três grupos de
arqueofácies que caracterizam os sambaquis de padrão estratigráfico conchífero. As
arqueofácies predominantemente conchíferas mostram, na maioria dos casos,
predomínio de resíduos animais sobre os vegetais. Isto sugere que conchas e ossos
teriam chegado ao depósito ainda com resíduos da carne. As arqueofácies lenticulares
pretas (AF 2 do sítio Morrinhos, AF 5 do Cubículo 1 e AF 4 de Jabuticabeira 1)
mostram predomínio e/ou exclusividade de restos vegetais associados a queima e
decomposição de espécies C3.
O predomínio de espécies vegetais nas arqueofácies lenticulares pretas pode ser
explicado pelo fato de os componentes animais, representados por fragmentos ósseos,
estarem maiormente queimados, ou seja, despojados da carne. Cabe mencionar que no
sambaqui Jabuticabeira 2, as arqueofácies pretas também estão compostas
majoritariamente por ossos queimados (~70% de ossos queimados em oposição a 5%
nas arqueofácies conchíferas) (Klokler, 2008; Nishida, 2007; Villagran et al., 2010,
2011 b) e apresentam maior diversidade de espécies lenhosas que as arqueofácies
conchíferas (Bianchini, 2008). No entanto, outra explicação possível refere à maior
concentração de restos vegetais nas arqueofácies pretas. Como discutido no tópico
1.3.1., o predomínio de resíduos vegetais pode-se relacionar à maior deposição de restos
de plantas usadas como combustível (madeiras) e/ou com a presença de plantas com uso
mobiliário e/ou artefatual nesta arqueofácies.
O potencial uso mobiliário de plantas foi observado nos perfis estratigráficos dos
sítios Espinheiros 2 (Afonso and DeBlasis, 1994) e Cubatão 1 (Petrykowski et al.,
2007), localizados na região de Joinville, onde camadas de extensão métrica compostas
por de fibras trançadas afloram. Nestes sítios, os restos vegetais preservaram nas
porções inferiores dos perfis graças às condições redutoras oferecidas pelo alagamento
constante e/ou intermitente do substrato. Nas porções superiores dos perfis,
permanentemente em condição subaérea, o material vegetal não preservou. Isto permite
interpretar que as arqueofácies centimétricas pretas possam ser o resultado da
degradação de superfícies cobertas por trançados de fibras vegetais, sobre as quais se
realizaram atividades diferenciadas das arqueofácies conchíferas; como evidencia a
maior concentração de ossos queimados e carvão nas arqueofácies pretas em relação ás
arqueofácies conchíferas.
348
As arqueofácies predominantemente conchíferas mostram, no geral, predomínio de
resíduos de origem animal sobre os de MO vegetal. As arqueofácies lenticulares pretas
mostram predomínio, e até exclusividade, de resíduos de origem vegetal de espécies C3.
Isto pode ser explicado pela maior deposição de restos de combustível (material
lenhoso) nas arqueofácies pretas, ou pela existência dos subprodutos da degradação de
antigas superfícies cobertas por trançados de fibras vegetais, como se observa em outros
sambaquis da região, sobre os quais ter-se-iam realizado atividades diferenciadas das
arqueofácies conchíferas, como indica a maior concentração de ossos queimados e
carvões.
1.4. MICRO­COMPONENTES Análises micromorfológicas foram realizadas em 15 seções delgadas dos quatro
sambaquis de padrão estratigráfico conchífero. Nesta análise, identificaram-se microcomponentes recorrentes nos quatro sítios, assim como componentes específicos para
cada sítio ou subgrupo de sítios. Os componentes gerais, que aparecem em todos os
sambaquis, servem para entender padrões espaço-temporais na construção dos sítios. Os
componentes específicos, que se encontram unicamente em alguns dos sambaquis
analisados, servem para identificar diferenças entre eles. Estas diferenças não são
necessariamente funcionais, mas também podem refletir mudanças nos processos de
formação, relacionadas com fatores como cronologia dos sítios, localização na paisagem
e alteração tafonômica, entre outros.
Dentre os componentes comuns a todos os sambaquis, identificam-se dois
grupos:
1. Componentes minerais: grãos de quartzo, com distribuição aleatória.
2. Componentes orgânicos: conchas inteiras e fragmentadas de diversas
espécies de moluscos e gastrópodes; fragmentos de osso de peixe de
tamanho diverso; e carvão. Conchas e ossos apresentam sinais de
dissolução e frequências variáveis (de 5 a 30 %) de espécimes com
evidência de queima a temperatura superior a 600° C. Ambos possuem
349
distribuição aleatória e unicamente as conchas podem também apresentar,
em algumas microfácies, distribuição horizontal e/ou sub-horizontal.
Outros componentes minerais e orgânicos aparecem unicamente em alguns dos
sítios analisados, como fragmentos líticos, grãos de feldspato, minerais pesados, pelotas
de argila glauconítica, diatomáceas, raízes frescas, entre outros. Dentre o grupo de
componentes específicos, existe um subconjunto de materiais biológicos e minerais
alterados antrAs duas coisas?opicamente mediante queima, que inclui escória vítrea e
agregados de argila queimada. Estes materiais são referidos como produtos de alteração
antrópica e servem para inferir comportamentos relacionados com o uso do fogo. Nos
tópicos a seguir, discutem-se os componentes minerais, biológicos, produto da alteração
antrópica e fração fina dos quatro sambaquis conchíferos analisados.
1.4.1. Componentes minerais Grãos de quartzo e feldspato, principalmente, e fragmentos líticos, em menor
abundância, são os componentes minerais mais frequentes nos quatro sítios analisados.
Como discutido no tópico 1.1.1, estes materiais incorporam-se aos sedimentos dos
sambaquis por transporte antrópico e podem ter duas proveniências: areias terrígenas
associadas ao substrato onde habita o molusco predominante, no caso dos grãos de
quartzo e feldspato; e/ou sedimentos coluvionares das proximidades do sítio, e onde os
materiais teriam sido acumulados previamente à deposição no sambaqui, no caso de
frações grossas (grãos de quartzo, feldspato e fragmentos líticos). A influência de uma e
outra fonte de sedimentos varia nos diferentes sítios, com maior frequência de
sedimentos coluvionares em Caipora, Cubículo 1 e Morrinhos, e areias quartzosas em
Jabuticabeira 1.
A observação microscópica dos componentes minerais corrobora as informações
aventadas pela análise granulométrica e observação na lupa e permite aprofundar
questões levantadas pelas análises quantitativas, mas que não podem ser respondidas
por esse tipo de análise. De fato, existe maior aporte de sedimentos coluvionares em
Caipora que, além de estar dominado pelas frações grossas, apresenta teor de feldspatos
e fragmentos líticos que iguala, ou até ultrapassa, a frequência de grãos de quartzo. Em
Cubículo 1, aumenta a diferença entre a porcentagem de grãos de quartzo, por um lado,
e grãos de feldspato e fragmentos líticos, por outro (relação de 2:1). Isto sugere aporte
350
conjunto de sedimentos coluvionares e de areias quartzosas relacionadas, como sugerido
pelas análises granulométricas, com sedimentos paleolagunares das proximidades. Em
Morrinhos, diminui a incidência de fragmentos líticos e aumenta a diferença entre
quartzo e feldspato (relação de 3:1). Já em Jabuticabeira 1, há presença exclusiva de
areias quartzosas, nas frações areia média e areia fina, o que indica, como proposto pela
comparação granulométrica, domínio de sedimentos paleolagunares. A ausência de
feldspatos e/ou fragmentos líticos permite descartar a hipótese de aporte coluvionar,
suposto com base no domínio de grossos no sambaqui, e reafirma a hipótese sugerida
pela análise malacológica, de coleta em bancos de moluscos com moda da fração
terrígena situada na classe areia média.
A observação microscópica dos sedimentos permitiu identificar outra diferença
composicional entre as arqueofácies dos quatro sítios estudados. Aquelas arqueofácies
que contêm agregados de lama com areias quartzosas finas correspondem com as
arqueofácies dominadas por Ostrea sp. e marisco, nas quais a análise granulométrica
indicou moda na fração areia fina e muito fina (AF 4 do sitio Morrinhos e AF 7 e 9 de
Jabuticabeira 1). Assim, a presença dos agregados pode ser determinante na moda
registrada pelas análises granulométricas e, ao mesmo tempo, sugere uma relação entre
o domínio de Ostrea sp. e marisco e a presença de agregados de lama em determinadas
arqueofácies. A associação entre os agregados de lama e arqueofácies com Ostrea sp.
não reflete o substrato de coleta desta espécie, mas indica a multi-proveniência dos
materiais sedimentários e faunísticos que caracteriza os sambaquis. Em depósitos
naturais não existe coexistência de Ostrea sp. com Heleobia sp. e diatomáceas
estuarinas em substrato lamoso.
Outros componentes minerais identificados incluem: pesados, opacos, agregados
de argila, incluindo grãos de argila glauconítica. Como a porcentagem total destes
componentes é geralmente baixa (<5 %), sua presença em alguns sítios e ausência em
outros não responderia a escolhas relacionadas com o processo de formação, mas às
características dos depósitos naturais que, intencionalmente ou não, eram retransportados até os sambaquis
Dentre os componentes minerais minoritários, cabe mencionar a importância,
em termos de significado paleoambiental, dos grãos de argila glauconítica que se
observam dentro dos agregados de lama dos sítios Morrinhos e Jabuticabeira 1. O
adjetivo glauconítico refere-se a um conjunto de argilominerais 2:1 formados na
eodiagênese, sob baixa taxa de sedimentação e influência de águas marinhas, em
351
condições moderadamente redutoras (Odin and Fullagar, 1988; Odin and Matter, 1981;
Odin, 1988). As pelotilhas glauconíticas são mais encontradas hoje na plataforma
continental, no entanto, foram observadas nos sítios Morrinhos e Jabuticabeira 1 dentro
de agregados de lama associados a depósitos paleolagunares, conforme interpretado
pela sua granulometria fina e assembleia de diatomáceas. Isto indica retrabalhamento
mecânico
das
argilas
glauconíticas
a
partir
da
plataforma
continental
e,
conseqüentemente, origem alóctone ao sistema lagunar, via aporte marinho 97 .
A análise micromorfológica corrobora e refina as constatações realizadas pelas análises
quantitativas (granulometria e zooarqueologia). Confirma-se predomínio de sedimentos
coluvionares em Caipora e Cubículo 1 e de sedimentos paleolagunares em Morrinhos e
Jabuticabeira 1. Observa-se associação entre arqueofácies com moda nas frações areia
fina e muito fina, com domínio de Ostrea sp. e mariscos, e presença de agregados de
lama de origem paleolagunar.
1.4.2. Componentes biológicos principais: conchas e ossos O componente biológico mais conspícuo dos sambaquis analisados são as
conchas de moluscos. Conchas podem aparecer tanto inteiras como fragmentadas e em
diversos tamanhos, desde areia fina até, no caso de conchas completas bem preservadas,
vários centímetros de cumprimento. Conchas queimadas a temperatura superior aos
600° C, identificadas a partir do experimento apresentado no Capítulo 5, tópico 1.2,
aparecem comumente misturadas entre materiais sem evidências de queima ou com
indícios de queima a temperatura menor.
Traços de dissolução do carbonato das conchas são igualmente visíveis em todos
os sambaquis conchíferos. A dissolução do carbonato é observada na forma de
revestimentos de micrita e micro-espato ao redor dos fragmentos de concha,
enchimentos de micrita que se desprendem de fragmentos de concha e ingressam em
97
No trabalho realizado por Dillenburg et al. (2000) na laguna costeira de Tramandaí (Rio Grande do
Sul), constatou-se presença de minerais glauconíticos unicamente nos depósitos marinhos que constituem
o substrato da sedimentação lagunar na região. Esse substrato, de idade pleistocênica, é formado por
areias finas depositadas em antepraia. Toda a sucessão de sedimentação lagunar, com fácies de margem e
fundo, não contêm minerais glauconíticos, ou estes ocorrem como traços.
352
agregados de matriz argilosa, e na forma de cristais de espato aderidos às bordas de
fragmentos de concha. Na maioria dos casos, as conchas apresentam distribuição
aleatória, especialmente quando os fragmentos são menores. Em algumas microfácies
específicas, observou-se distribuição horizontal e/ou sub-horizontal de conchas inteiras
e fragmentadas.
A distribuição horizontal ou sub-horizontal das conchas pode estar relacionada
ao ato da depositação ou aos efeitos da compressão dos sedimentos na medida em que
camadas construtivas são sucessivamente depositadas sobre o sítio (ver Andrews,
2006). A consolidação pode estar igualmente associada à compactação do substrato por
pisoteamento
humano
sobre
o
sambaqui.
No
entanto,
outros
indicadores
micromorfológicos de pisoteamento em concheiros, como continuidade lateral dos
fragmentos (ver Balbo et al., 2010; Villagran et al., 2011 a), ou indicadores de
pisoteamento em outros contextos, como distribuição linear/paralela à superfície dos
demais componentes da fração grossa, ossos fissurados in situ, microestrutura laminar
ou massiva (Goldberg et al., 2009, 2012; Miller et al., 2010; Schiegl et al., 2003) não
foram identificados.
A dissolução e reprecipitação do carbonato de cálcio das conchas são constantes ao
longo dos quatro sambaquis conchíferos analisados. A orientação horizontal e subhorizontal que apresentam as conchas inteiras, e fragmentos maiores na seção delgada,
não estaria relacionada à compactação por pisoteamento, mas possivelmente à
consolidação pós-deposicional do sedimento pelo peso exercido pelas camadas
superiores.
Os ossos, segundo componente biológico mais frequente em sambaquis
conchíferos, aparecem sempre fragmentados em diversos tamanhos, com predomínio de
fragmentos finos até a fração silte. Em algumas ocasiões, identificam-se ossos inteiros,
como vértebras, por exemplo, que, pela sua forma, são mais resistentes à fragmentação.
Na maioria dos casos, a fragmentação não parece ser in situ, já que não existe
continuidade lateral entre fragmentos de ossos adjacentes. Além disso, fragmentos
contíguos mostram diferenças de coloração (PPL) e birrefringência (XPL) entre si.
353
Pela variação de coloração que apresentam os ossos em seção delgada, tanto a
PPL como XPL, infere-se mistura de materiais com diversos graus de queima 98 .
Exemplares com graus variáveis de queima foram observados em todas as amostras
analisadas, misturados com os demais componentes da fração grossa. Especialmente
nos fragmentos grossos de osso, é possível observar traços de dissolução no interior do
osso na forma de micro-canais sinuosos de espessura variável; apesar disso, os
fragmentos maiores são também os que mais frequentemente apresentam fosforescência
vinculada com a preservação do colágeno.
Ossos com sinais de queima indicam contato direto com o fogo (Shipman et al.,
1984), o que pode ser relacionado com a ação de jogar os ossos nas fogueiras, ou com a
de acender a fogueira sobre substrato rico em ossos (Bennett, 1999). Independentemente
da intenção ou não na queima dos materiais, existe um gradiente de alteração térmica
dos ossos em condições subaéreas e no substrato. Apenas os ossos em contato direto
com o fogo sofrem calcinação e, quanto mais afastados da ação das chamas, menor será
a alteração. O grau de alteração térmica de ossos enterrados sob fogueiras depende do
tempo de queima, da textura do substrato (arenoso, argiloso) e da temperatura da
fogueira 99 . (Bennett, 1999; Steiner et al., 1995). Isto foi constatado na fogueira
experimental acesa sobre depósito de retrabalhamento do sambaqui Cabeçuda, descrita
no Capítulo 5, tópico 1.1.4. Nesta fogueira, observou-se alta fragmentação dos ossos
que estavam inteiros quando jogados ao fogo, juntamente com calcinação dos ossos
localizados em contato com as chamas, e carbonização e rubefação daqueles mais
afastados do fogo 100 .
A alteração térmica dos ossos, direta ou indireta, pode significar três atividades:
1) uso dos ossos como combustível nas fogueiras; 2) deposição de restos consumidos
nas fogueiras, vinculado com noções de higiene e limpeza; 3) queima acidental de
98
As mudanças na coloração estão relacionadas com a destruição térmica da matriz orgânica dos ossos
(Bennett, 1999; Steiner et al., 1995).
99
Bennett (1999) identificou que a carbonização dos ossos não é resultado somente da distância às
chamas, mas também do tempo de exposição indireta à fonte de calor. No experimento realizado pelo
autor, ossos enterrados em substrato arenoso estavam carbonizados a 5 cm de profundidade e não
mostravam alteração nenhuma a mais de 15 cm. Já na experiência de Steiner et al. (1995), a carbonização
observou-se até os 5 cm de profundidade.
100
A fragmentação dos ossos resulta das alterações físico-químicas induzidas pela queima, a qual pode
provocar tanto tensões internas capazes de quebrar o material quanto aumento de fragilidade às pressões
físicas (Steiner et al., 1995).
354
resíduos já descartados presentes no substrato das fogueiras (Cain, 2005; Costamagno et
al., 2002).
A queima de ossos como combustível complementar à madeira é sustentada por
trabalhos em arqueologia experimental que demonstraram que o ato de jogar ossos em
fogueiras já acesas estende a durabilidade do fogo, além de economizar o uso de
madeiras e assim reduzir a produção de resíduos orgânicos (Costamagno et al., 1998;
Thery-Parisot, 2002; Yravedra et al., 2005). No entanto, o uso de ossos como
combustível é geralmente associado à não disponibilidade de materiais lenhosos nas
proximidades dos sítios. Além disso, o relato mais comum é de que os ossos utilizados
sejam de mamíferos, e não de peixes. Nos contextos em que infere o uso de ossos como
combustível, os restos de fogueiras apresentam acumulações de ossos e cinzas, com
raros carvões. Entretanto, nos sambaquis estudados nesta tese, e no sítio Jabuticabeira 2,
onde se realizaram previamente estudos antracológicos (Bianchini, 2008; Bianchini et
al., 2007), os carvões são frequentes.
A segunda hipótese, de queima vinculada com práticas de higiene, implica que
todos, ou a grande maioria dos ossos, devam estar completamente queimados, no
mínimo até a carbonização. No entanto, apesar da quantidade de ossos com sinais de
alteração térmica ser alta nas seções delgadas analisadas, diferenças na coloração (a
PPL e XPL) e fluorescência indicam variabilidade nas temperaturas de queima,
inclusive com presença de restos não queimados. Além disso, a assinatura isotópica de
restos de tecido animal, conforme mostrado no tópico 1.3.2, indica que nem todos os
ossos eram despojados da carne na hora da deposição no sambaqui.
Assim, pode-se concluir que a terceira hipótese, de queima acidental causada por
uma fogueira acesa acima da acumulação de ossos, seja a mais provável. A queima
indireta provocaria diversos graus de alteração térmica, como carbonização, calcinação
e superfícies avermelhadas naqueles materiais próximos ao núcleo da queima. Em
outros, mais afastados da fonte do calor, haveria preservação das características
texturais originais. Como se discutirá no próximo tópico, a ausência de fogueiras
estruturadas nas seções em sambaquis aqui analisadas, assim como a ausência, nessas
seções, do gradiente de alteração térmica que se registra habitualmente em ossos e
sedimentos sob fogueiras (ver Bennett, 1999; Berna et al., 2007; Canti and Linford,
2000; Steiner et al., 1995), sugere que o sambaqui contenha restos de retrabalhamento
de depósitos, onde ossos e demais resíduos orgânicos teriam sido previamente
acumulados e queimados.
355
Misturas de conchas e ossos queimados a temperatura diversa, distribuídos, na maioria
dos casos, aleatoriamente na seção delgada, indicam retrabalhamento de resíduos
queimados em outro local.
1.4.3. Componentes biológicos secundários O terceiro componente biológico mais frequente em sambaquis são os carvões,
que sempre apresentam distribuição aleatória. Em alguns casos, sua fragmentação por
pressão física provoca o aparecimento de zonas com concentração de fração fina (na
fração argila) preta e opaca.
Outros componentes biológicos incluem: raízes frescas, diatomáceas, tecidos
silicificados, gastrópodes e espinhos de equinóide. As raízes frescas são mais
abundantes naquelas microfácies que apresentam desenvolvimento de solo de estrutura
granular, ou em microfácies próximas à superfície das seções verticais analisadas.
Restos de tecidos silicificados, ou fitólitos dispersos, foram menos frequentes que o
esperado, já que as análises isotópicas mostram presença de restos vegetais. Os restos de
tecidos estão ausentes em todas as amostras estudadas, com exceção das mF 3.1 e mF
4.1 do sítio Morrinhos, onde aparecem em frequência de 3 % e 10 %, respectivamente.
Os tecidos silicificados são compostos por células de plantas (fitólitos),
articuladas segundo a morfologia do tecido original da qual derivam. Os fitólitos,
compostos por opala, são biomineralizações comuns nos órgãos aéreos das plantas,
especialmente nas Poaceae (gramíneas) (Albert et al., 2000; Brochier, 2002; Courty et
al., 1989). Apenas os sítios Cubículo 1 e Morrinhos apresentaram este componente, em
baixa frequência. No sítio Morrinhos, os restos de tecidos estão sempre associados a
microfácies compostas por materiais queimados, como conchas, ossos e argila
rubificada ou carbonizada.
Com exceção dos carvões, que são mais resistentes à degradação bioquímica
(Schmidt and Noack, 2000; De Souza Falcão et al., 2003), outros restos vegetais
derivados da queima, como tecidos silicificados ou fitólitos dispersos (Albert and
Cabanes, 2008; Albert et al., 2000, 2008; Schiegl, 1996), são praticamente ausentes nos
sambaquis analisados. A ausência destes restos pode resultar de fatores deposicionais
(baixa quantidade destes materiais nos sítios) ou tafonômicos (má preservação e/ou
356
percolação). Material vegetal não lenhoso, especialmente gramíneas, pode ter sido
utilizado principalmente para acender as fogueiras e, portanto, constituiriam uma porção
menor do volume do combustível usado e dos restos das estruturas de combustão (ver
Albert et al., 2012; Mallol et al., 2007; Schiegl et al., 2003).
Por outro lado, a ausência de fitólitos pode-se dever igualmente a motivos
tafonômicos, vinculados com a lavagem destes componentes, favorecida pelas chuvas e
porosidade do depósito, e/ou com a alcalinidade da solução intersticial dos sedimentos
dos sambaquis. A grande concentração de conchas no depósito resulta em pH elevado
(maior que 7), o que favorece a dissolução dos componentes silicosos opalinos (Albert
et al., 2000; Karkanas, 2000; Karkanas et al., 2007; Shahackgross et al., 2004);
especialmente se existe passagem eficiente de água através dos sedimentos (Karkanas,
2010). No entanto, a boa preservação de diatomáceas dentro dos agregados de lama nos
sítios Morrinhos e Jabuticabeira 1, também compostas de opala, permite refutar a
possibilidade dos fitólitos estarem ausentes por dissolução e reforça a hipótese de pouca
deposição destes materiais nos sambaquis.
Agregados de diatomáceas foram observadas nos sítios Morrinhos e
Jabuticabeira 1. A identificação realizada por Amaral (2011, comunicação pessoal)
indica espécies diagnósticas de águas estuarino/lagunares. A espécie de diatomáceas
dominante, Paralia sulcata, é um táxon marinho euritrópico, que tolera variações na
salinidade das águas de 5 até 40 ‰ (Moreira-Filho et al., 1985). Em sedimentos
paleolagunares da região de estudo, Amaral (2008) e Amaral et al. (2012) identificaram
predomínio desta espécie em fácies de argila arenosa, inclusive com conchas, datadas de
ca. 4200 até 2700 AP. O domínio desta espécie, junto com as variações em espécies
subordinadas, é interpretado por mesmos autores como indicador da redução na
salinidade das águas, associada ao fechamento da conexão do sistema lagunar com o
oceano.
O segundo componente biológico dos agregados de lama são indivíduos juvenis
da espécie Heleobia sp. Nos concheiros naturais estudados por Fornari (2010), nas
margens da laguna Garopaba do Sul, a espécie Heleobia australis predomina sobre A.
brasiliana quando há redução na salinidade das águas, produto do fechamento do
sistema lagunar. Em trabalho realizado por Netto et al. (2012) com populações vivas
deste gastrópode na mesma laguna, observou-se tendência de proliferação da espécie
quando a salinidade das águas é reduzida (0.2-1.6 ‰). Assim, o domínio de Paralia
sulcata em agregados de lama com Heleobia sp. confirma a associação destes
357
sedimentos com o sistema lagunar, com significativo aporte de água doce. Neste
sentido, diatomáceas e gastrópodes nos agregados servem como bioindicadores do
contexto deposicional de onde os sedimentos foram coletados.
Outro elemento potencialmente diagnóstico para inferir comportamentos de
coleta são os espinhos de equinóide, associados a ouriços do mar, identificados
unicamente no sítio Caipora. Os espinhos de equinoides correspondem aí a 2% do total
da fração grossa e foram identificados apenas na sua seção basal, onde apresentam
diâmetro entre 625 e 645 µm e composição carbonática. Como a identificação na seção
longitudinal é mais difícil, é provável que sua concentração na lâmina esteja
subestimada.
Os equinodermos são invertebrados marinhos que vivem em águas rasas ou
profundas de salinidade normal. Dentre eles, os equinoides destacam-se como típicos
integrantes da associação biológica infralitoral de costões rochosos de mar aberto
(Laborel 1986), embora possam ocorrer também na zona mesolitoral, em poças
permanentes de água de borrifo sobre a rocha. A presença destas espécies marinhas nos
sedimentos do sambaqui permite sugerir que, durante o uso do sítio (que, pela idade de
7570-7320 anos cal. AP, na base, teria começado antes do máximo transgressivo na
região), o sistema era aberto à influência direta do mar. Isto significa que, nas
proximidades do sambaqui, teriam existido costões rochosos em contato com o mar, o
qual se encontrava, na época, em progressivo avanço sobre o continente. Estes costões
estariam associados ao embasamento granitoide que atualmente delimita, a NW e W, a
planície deltaica do rio Tubarão.
Dos componentes biológicos secundários, podem-se extrair as seguintes informações:
os carvões são onipresentes em todas as seções verticais analisadas; a baixa freqüência
de fitólitos e/ou tecidos silificados sugere escassa deposição destes materiais nos sítios,
possivelmente associada ao uso de gramíneas unicamente para acender as fogueiras e/ou
lavagem pela ação das chuvas; espécies de diatomáceas e gastrópode identificadas nos
agregados de lama dos sítios Morrinhos e Jabuticabeira 1 confirmam a associação destes
agregados com sedimentos paleolagunares; presença de espinhos de equinóide em
Caipora indicam influência de águas marinhas nas proximdiades do sambaqui.
358
1.4.4. Produtos da alteração antrópica Na categoria definida como produtos da alteração antrópica, agrupam-se aqueles
elementos que aparecem em concentração total menor que 3% e que sofreram alteração
térmica por ação humana. Estes componentes incluem: escória vítrea; perióstraco
carbonizado; e agregados de argila queimada.
Como escória vítrea, também chamada de agregados de material silicoso,
agrupam-se aqueles resíduos da queima de madeiras a altas temperaturas formados por
agregados de sílica amorfa com textura vesicular (Berna et al., 2004; Canti, 2003;
Courty et al., 1989; Schiegl, 1996; Schiegl et al., 1994; Weiner, 2002). Estes microagregados formam-se pela fusão de células silicificadas das plantas, quando submetidas
a temperaturas superiores a 800° C.
Os restos de perióstraco carbonizado identificaram-se unicamente no sítio
Morrinhos, em microfácies compostas por conchas queimadas, tecidos silicificados e
argila rubificada. Pelo experimento apresentado no Capítulo 5, tópico 1.2, pode-se
inferir que a presença do perióstraco carbonizado associado à superfície da concha
queimada, indica temperaturas de aquecimento de até 400 ou 500° C.
Por último, os agregados de argila rubefacta 101 , observados nos sítio Morrinhos
e Jabuticabeira 1, sempre associados às microfácies compostas por conchas queimadas a
altas temperaturas, carvão e tecidos silicificados, resultam da combustão dos agregados
de lama que aparecem nos mesmos sítios. Isto infere-se pela semelhança entre ambos
agregados (queimados e não queimados) compostos pela mesma assembleia de
diatomáceas e espécie de gastrópode. Substrato rubefacto é um claro indicador de
queima in situ (Berna et al., 2007; Canti and Linford, 2000; Mallol et al., 2007; Schiegl
et al., 2003; Wattez, 1992), no entanto, em Morrinhos e Jabuticabeira 1, encontram-se
unicamente alguns agregados rubefactos, junto com agregados carbonizados, misturados
com outros materiais queimados. Este arranjo não parece indicar queima in situ no
sambaqui, mas sim retrabalhamento de materiais queimados em outro local.
101
A rubefação da argila produz-se pela oxidação do ferro que compõe os argilominerais e matéria
orgânica durante a queima dos agregados, neste caso, em fogueiras antrópica.
359
Existem diversos materiais produzidos pela queima antrópica nos sambaquis, além das
conchas e ossos. Incluem-se agregados de argila rubefacta, escória vítrea, tecidos
silicificados e períostraco carbonizado.
1.4.5. Fração fina A fração fina dominante nos quatro sambaquis conchíferos analisados é formada
por dois componentes principais: 1) argila organomineral; e 2) micrita. Como
componentes subordinados, registra-se a existência de fosfatos secundários, cinzas de
madeira e agregados de lama com diatomáceas (nos sítios Morrinhos e Jabuticabeira 1).
Em todos os sambaquis, observa-se predomínio de microestrutura de microagregados
intergranulares, vazios de empacotamento complexo e distribuição relacionada g/f de
tipo enáulica. Em algumas microfácies, aparece microestrutura grumosa, como naquelas
associadas a desenvolvimento de solos, nos sítios Caipora e Cubículo 1, e de grãos
revestidos interligados. Poros relacionados com a ação biológica de raízes e fauna do
solo, como vesículas, canais e vazios em câmera, foram identificados em todos os casos
estudados.
A fração fina do sítio Caipora é cristalítica, às vezes turva, formada por mistura
entre argila organomineral e micrita. A micrita é considerada parte da micromassa pela
sua distribuição, mas possui, de fato, caráter pós-deposicional autígeno, de cimento, já
que deriva da dissolução e reprecipitação do carbonato de cálcio das conchas que
compõem os sítios. Esta composição silicática/carbonática, inferida pelos atributos
ópticos à luz polarizada do material fino, foi confirmada por análises com sistema
MEV-EED da micromassa, onde se detectou sílica e alumínio, associados a
argilominerais, assim como cálcio, relacionado com a micrita. Uma pequena
porcentagem de fósforo foi igualmente detectada (1-2 %), o que sugere dissolução e
precipitação da apatita dos ossos ou de outros resíduos fosfáticos de origem orgânica.
O sítio Cubículo 1 apresenta micromassa de argila organomineral marrom
escura (PPL), sem a micrita que caracteriza a massa basal fina dos outros sambaquis.
Isto pode estar relacionado ao fato da amostra analisada estar próxima à superfície do
sambaqui, onde se observou também desenvolvimento de solo de estrutura granular
com poucas conchas. Neste sentido, a dissolução do material conchífero por processos
360
intempéricos e pedogênicos teria provocado a percolação do carbonato de cálcio em
solução até os níveis inferiores do sambaqui, não amostrados neste estudo.
Os sítios Morrinhos e Jabuticabeira 1 apresentam micromassa semelhante,
formada por mistura de micrita com argilominerais, fosfatos secundários e
microcarvões. Esta micromassa cristalítica, pontuada a turva, aparece misturada com
agregados milimétricos de lama com diatomáceas que, em alguns casos, formam
microfácies discretas nas seções delgadas. Os agregados de lama estão compostos por
argila mineral castanho claro (PPL), são maciços (distribuição relacionada g/f de tipo
porfírico) e contêm fissuras produzidas pelo ressecamento dos argilominerais.
Análises com sistema MEV-EED numa das amostras de Jabuticabeira 1
confirmaram que a micromassa apresenta domínio de cálcio, sílica e fósforo na sua
composição. A concentração de Ca está associada à precipitação do carbonato
dissolvido das conchas. No entanto, os altos valores de P indicam também minerais
secundários derivados da alteração dos ossos de peixe e outros resíduos orgânicos e
parte do Ca pode provir daí. A alta porcentagem de sílica e baixo teor de alumínio
sugerem que a sílica pode estar relacionada a resíduos silicosos derivados da queima de
material vegetal (ver Canti, 2003; Schiegl et al., 1994) e não à presença de
argilominerais.
De modo geral, a composição da fração fina dos sítios Caipora e Cubículo 1
distingue-se da situação observada nos sítios Jabuticabeira 1 e Morrinhos. Em Caipora e
Cubículo 1, destacam-se os argilominerais, enquanto a micromassa dos sítios Morrinhos
e Jabuticabeira 1 é essencialmente micrítica e fosfática, com MO e argilominerais em
menor abundância. Isto significa que, nos primeiros dois sítios, existe maior teor de
materiais terrígenos finos, enquanto nos últimos domina a fração fina pós-deposicional,
relacionada com a alteração das conchas e ossos. Esta diferença pode estar associada
aos padrões composicionais já notados a partir das análises granulométricas.
O aporte coluvionar detectado em Caipora e Cubículo 1, com presença de
sedimentos de brejo lagunar no segundo, estaria associado à maior porcentagem de
argilominerais nestes dois sambaquis. Isto suporta a hipótese de coleta acidental do
substrato de acumulação de materiais próximo ao sítio. Já nos sítios Morrinhos e
Jabuticabeira 1, há maior frequência de areias quartzosas, escassez de argilominerais e
afinidade granulométrica das areias terrígenas com sedimentos paleolagunares. Nestes
sítios, os argilominerais aparecem unicamente nos agregados de lama com diatomáceas.
361
Em seção delgada, os agregados de lama aparecem incrustados e delimitados por
concentrações horizontais e sub-horizontais de fragmentos de marisco e, em raras
ocasiões, associam-se a conchas de A. brasiliana. Pela associação com lama de origem
paleolagunar, pode-se inferir que os fragmentos de marisco correspondem à espécie
Mytella sp., que vive em fundos lodosos de lagunas em regiões entremarés102 (De Souza
et al., 2011).
A fração fina dos sambaquis conchíferos reflete o tipo de sedimento que foi
retrabalhado para formação do sambaqui. No caso dos sítios Caipora e Cubículo 1, há
presença de areias terrígenas e argilominerais associados com depósitos coluvionares e,
no caso de Cubículo 1, também de brejo lagunar. Nos sítios Morrinhos e Jabuticabeira 1
não teria havido retrabalhamento de sedimentos finos, mas somente de depósitos
arenosos. A fração fina de estes sítios é essencialmente resultado da alteração pósdeposicional de conchas e ossos, associados a agregados de lama de origem
paleolagunar.
A presença de cinzas de madeira no sítio Morrinhos serve como indicador da
boa preservação deste componente nos sambaquis. Pela sua composição carbonática, os
cristais de POCC que compõem as cinzas seriam facilmente dissolvidos em depósitos
subaéreos porosos sob clima sub-tropical. A preservação das cinzas estaria relacionada
com o pH elevado (9-13.5) dos sedimentos dos sambaquis, determinado pela alta
concentração de conchas, já que cinzas são altamente alcalinas (Etiégni and Campbell,
1991). A preservação de cinzas e baixa concentração nos sítios analisados sugere,
indiretamente, que a ausência de cinzas em outras áreas amostradas dos quatro
sambaquis conchíferos deve-se menos a processos tafonômicos, como dissolução, que à
não deposição destes materiais. Esta interpretação fundamenta-se na baixa frequência de
fitólitos, mencionada anteriormente.
No entanto, não se pode descartar a possibilidade de parte das cinzas ter sido
dissolvida e recristalizada com outros componentes solúveis dos depósitos, como
fosfato de cálcio dos ossos (ver Berna et al., 2004; Karkanas, 2000; Schiegl, 1996;
Weiner, 2002) ou carbonato de cálcio das conchas. Esta hipótese não pôde ser
102
Mytella sp. também aparece enterrada em lama siltosa e lama húmica em manguezais, a profundidade
média de 1,0 cm, associada a estuários e lagunas (Bacon, 1975; Nishida et al., 1995).
362
confirmada com base em análises ópticas e de composição elementar realizadas neste
trabalho. Para isso, seriam necessários outros ensaios como DRX (difratometria de
raios-x) ou FTIR (espectroscopia de infravermelho por transformada de Fourier).
A baixa freqüência de cinzas de madeira indica escassa deposição deste material nos
sambaquis e/ou dissolução e reprecipitação destes materiais em neoformações minerais.
1.5. ALTERAÇÃO PÓS­DEPOSICIONAL Na alteração pós-deposicional dos sedimentos que compõem os sambaquis
conchíferos, identificam-se dois agentes: intempéricos (abióticos) e biológicos. Os
agentes intempéricos estão relacionados com pH e regime hidrológico do depósito. O
processo de maior destaque é a dissolução e reprecipitação do carbonato de cálcio das
conchas. Este mineral precipita na forma de micrita, que aparece misturada com a
matriz de argilominerais e, em ocasiões, na forma de espato ou micro-espato. Outras
tramas do carbonato precipitado são na forma de revestimentos, hipo-revestimentos e
enchimentos, densos e incompletos, de micrita cinza escura (PPL), com inclusões de
partículas opacas (possivelmente microcarvões). Observam-se também revestimentos de
micrita impura, com argila organomineral e microcarvões.
A microestrutura micrítica, na forma de microagregados interligados ou grãos
revestidos interligados indica formação em condições de não saturação da água, em
ambiente de percolação. O mesmo tipo de ambiente é sugerido por outras evidências de
alteração intempérica, como nódulos de oxi-hidróxido de ferro órticos, e alguns
hiporevestimentos de oxi-hidróxido de ferro, de impregnação moderada a alta que se
observam ao longo dos perfis dos quatro sambaquis conchíferos analisados. Estes
nódulos aparecem tanto na micromassa de micrita com argilominerais, como nos
agregados de lama e indicam ciclos de alagamento e dessecação dos sedimentos, junto
com condições vadosas de formação.
Além da dissolução do carbonato de cálcio das conchas, observam-se nos sítios
Morrinhos e Jabuticabeira 1 micromassas formadas por fosfatos secundários. Pelas
propriedades ópticas do material (Adderley et al., 2004; Goldberg and Nathan, 1975;
Lucas and Prévôt, 1991; Simpson et al., 2000) e pela proporção entre Ca e P detectadas
363
nas análises com sistema MEV-EED (Le Geros and Le Geros, 1984; Schaefer et al.,
2004), estas micromassas derivariam da dissolução do mineral do osso 103 . Somado a
isso, o regime hidrológico nos sambaquis e a alta porosidade dos sedimentos favorecem
a dissolução e recristalização do fosfato do osso nas porções inferiores da sucessão
vertical (ver Berna et al., 2004; Gordon and Buikstra, 1981; Lucas and Prévôt, 1991;
Schiegl, 1996; Trueman et al., 2004; Weiner, 2002) 104 . Cabe mencionar que a alteração
dos ossos e restos de tecidos pode ser mediada, igualmente, pela ação de
microrganismos nos sedimentos (ver Gilinskaya et al., 2007).
No entanto, ao constatar-se que grande parte dos fragmentos de osso estão
queimados, o que lhes outorga maior resistência à alteração química (Shahack-Gross,
1997; Steiner et al., 1995), e que existe intensa dissolução do carbonato de cálcio das
conchas, que alcaliniza o pH do depósito e favorece a preservação dos ossos (Berna et
al., 2004; Gordon and Buikstra, 1981; Nielsen-Marsh et al., 2007) (ver tópico 1.7.5),
pode-se pensar que os fosfatos secundários derivem, também, do fósforo liberado na
degradação de resíduos orgânicos. A presença de tecidos animais nos sambaquis foi
constatada pelas análises isotópicas. O nível de análises aqui realizadas não permite
diferenciar se a origem dos fosfatos é óssea, ou se existe uma combinação com outros
resíduos orgânicos, como carne ou fluidos. Para isso, outras análises seriam necessárias,
como, por exemplo, FTIR, GS/MS (cromatografia gasosa acoplada à espectrometria de
massa) e espectroscopia Raman.
Evidências de alteração biológica observam-se na forma de excrementos
elipsóides, esféricos e mamilares, de composição semelhante à da micromassa,
frequentes nas amostras superficiais dos sítios Caipora e Cubículo 1. Outros indicadores
da ação biológica são os vazios em câmera e canais, assim como os agregados
mamilares, frequentemente interligados, que compõem a micromassa.
Apesar dos processos de alteração mencionados, existe preservação das relações
entre diferentes microfácies naquelas arqueofácies que apresentam micro-estratificação.
Tal é o caso da AF 4 do sítio Morrinhos e da AF 7 de Jabuticabeira 1. Isto significa que
não existem perturbações físicas maiores no depósito, capazes de ocasionar
103
A alteração dos ossos enterrados começa pela degradação da matriz orgânica (colágeno), que acontece
rapidamente pela ação microbiana, em simultaneidade com a lenta degradação química. Uma vez
despojado do colágeno, o fosfato do osso fica exposto e começa a alteração química da fração inorgânica
através da dissolução e reprecipitação mineral, aumento da porosidade etc. (Berna et al., 2004; Hedges,
2002; Jans et al., 2002; Jans, 2004; Nielsen-Marsh et al., 2007; Smith et al., 2007; Trueman and Martill,
2002; White and Hannus, 1983).
104
Por exemplo, no sítio Jabuticabeira 2 constatou-se a presença de uma concreção fosfática embaixo da
camada preta superior deste sambaqui, formada por 80-90 % de ossos de peixe (Mazini, 2007).
364
redistribuição de componentes. Permite interpretar assim, indiretamente, que o alto grau
de mistura de componentes no sambaqui seja um atributo deposicional e não pósdeposicional.
A alteração tafonômica dos sambaquis conchíferos envolve, principalmente, a
dissolução e precipitação do carbonato de cálcio das conchas, favorecido pelo regime
hidrológico e porosidade dos depósitos. Também há dissolução e precipitação do
fosfato dos ossos de peixe e de outros resíduos biológicos. Alterações de origem
biológica observam-se na forma de excrementos e de vazios em câmara, canais e
vesículas, que indicam passagem de raízes e da fauna do solo.
1.6. MICROFÁCIES A identificação de microfácies levou em consideração os cinco parâmetros
mencionados no Capítulo 4, tópico 1.2.2 (fração grossa, micromassa, microestrutura,
porosidade e razão g/f). No sítio Caipora, identificaram-se quatro microfácies
correspondentes às AF 2 (mF 2), 3 (mF 3), 4 (mF 4) e horizonte de solo superficial (mF
HzA). Após avaliação em conjunto das seções delgadas, o número de microfácies podese reduzir a somente três: mF 2, mF 3/4 e mF HzA. A mF 2 diferencia-se das mF 3 e 4
pela orientação sub-horizontal das conchas e fragmentos de concha. A mF 4 difere da
mF 3 pelo maior conteúdo de conchas com traços de queima a temperatura superior aos
500°C. A microfácies que mais se distingue do conjunto, em termos de microestrutura,
compactação, frequência de conchas e micromassa, materializa a formação de solo
incipiente no topo da coluna (mF HzA).
Na seção delgada do sítio Cubículo 1, identificaram-se duas microfácies,
correspondentes à AF 9 (mF 9) e ao horizonte de solo no topo da coluna (mF HzA).
Como observado no sítio Caipora, a mF HzA caracteriza-se pelo domínio da fração fina
sobre a fração grossa, com baixa frequência de componentes biológicos (conchas e
osso), grumos soltos e também coesivos de argila organomineral. As microfácies
superficiais das seções verticais dos sítios Caipora e Cubículo apresentam características
semlhantes entre si, relacionadas, possivelmente, à alteração pedogênica.
365
No sítio Morrinhos, foram identificadas oito microfácies a partir das quatro
seções delgadas analisadas (correspondentes às AF 3 e 4). O atributo mais interessante
foi a variedade lateral detectada nas duas arqueofácies amostradas. No caso da AF 3,
identificaram-se duas microfácies (mF 3.1 e mF 3.2), enquanto na AF 4 identificaram-se
quatro (mF 4.1, mF 4.2, mF 4.3 e mF 4b). Do conjunto de microfácies observadas na
AF 4, a mF 4.2 é assimilável à mF 3.2, enquanto a mF 4b é composta pela combinação
da mF 3.1 e mF 4.3. Isto significa que na AF 4 existem unicamente duas microfácies.
A microfácies dominante na seção do sítio Morrinhos, em termos de superfície
nas lâminas delgadas, é a mF 3.1. Esta microfácies representa a típica composição e
microestrutura de sambaquis conchíferos, já observada nos sítios Caipora e Cubículo 1
(concha, osso, grãos minerais, carvão, microagregados integranulares, micrita,
argilominerais, fosfatos e microcarvões). A segunda microfácies mais frequente
corresponde à mF 3.2/4.2, composta por grãos minerais revestidos e interligados por
argilominerais. A terceira microfácies destacável corresponde aos agregados de lama
com diatomáceas que aparecem como camadas discretas (no caso da mF 4.3) e inclusive
misturados dentro de microfácies do tipo mF 3.1.
No sítio Morrinhos, identificou-se também uma microfácies composta
completamente por material queimado. A mF 4.1 contém conchas distribuídas subhorizontalmente e queimadas a temperatura superior a 600° C, ossos queimados, escória
vítrea, carvão e conchas com restos de perióstraco carbonizado. A micromassa é
essencialmente micrítica, relacionada principalmente com a presença de cinzas, com
alguns agregados de argila rubefacta. Destaca-se uma concentração de tecidos
silicificados que, pelo arranjo interno, pode corresponder a restos de material trançado.
Por último, no sambaqui Jabuticabeira 1 identificaram-se nove microfácies.
Quatro destas microfácies apareceram em uma única seção. Em termos gerais, as
microfácies que compõem este sambaqui apresentam a mesma mistura de materiais
observada nos sítios Caipora, Cubículo 1 e Morrinhos. A maior diferença com os
demais sambaquis conchíferos analisados reside na maior porcentagem de conchas, com
distribuição paralela à superfície, no sítio Jabuticabeira 1.
As microfácies 5 e 6 apresentam composição, microestrutura e micromassa
semelhantes. A mF 5 diferencia-se da mF 6 pela distribuição paralela a sub-horizontal
das conchas e pela presença dos agregados de lama com diatomáceas, também
observados na mF 4.3 e 4b de Morrinhos. A AF 7 foi a única do sítio a apresentar
micro-estratificação em seção delgada. Nesta lâmina, foram descritas quatro microfácies
366
sucessivas. A mF 7.1 é similar à mF 4.1 do sítio Morrinhos, composta por material
queimado (conchas submetidas a temperaturas de 800° C), ossos e agregados de argila
rubefacta e carbonizada. A mF 7.2
é formada por concentração de conchas com
empacotamento fechado e distribuição horizontal, com alguns fragmentos de concha
queimados. A mF 7.3 é semelhante à mF 5, e também à mF 4b do sítio Morrinhos, por
conter conchas em microestrutura de microagregados intergranulares com agregados de
lama. A mF 7.4 compõe-se exclusivamente por agregados de lama com diatomáceas e
gastrópode. As mF 8 e 9 são quase idênticas, diferenciando-se unicamente pela presença
de agregados de lama e maior frequência de conchas com distribuição sub-horizontal na
mF 9.
1.6.1. Recorrência de microfácies intra e inter­sítio A avaliação geral das 23 microfácies descritas nos quatro sambaquis conchíferos
analisados mostrou semelhanças e correspondências entre microfácies do mesmo sítio e
de sítios diferentes. Por exemplo, microfácies compostas por agregados de lama com
diatomáceas, argila glauconítica e gastrópodes foram identificadas no sítio Morrinhos e
Jabuticabeira 1. Da mesma maneira, microfácies compostas por mistura de conchas
inteiras e fragmentadas, ossos, carvão e grãos minerais em matriz composta de
argilominerais, micrita e fosfatos são dominantes nos quatro sambaquis estudados.
Em termos gerais, as diferenças entre as 23 microfácies referem-se a variações
nas porcentagens de três elementos: 1) conchas, ossos e grãos minerais na fração grossa;
2) porosidade; e 3) fração fina. O predomínio de um ou outro destes fatores está
diretamente associado aos demais atributos listados no Capitulo 4, tópico 1.2.2 como
diagnósticos na diferenciação de microfácies em sambaquis. Estes fatores incluem
microestrutura e distribuição relacionada g/f. Por exemplo, as microfácies compostas
por agregados de lama estão associadas a maiores teores de fração fina, menor
frequência de grãos minerais, microestrutura maciça e distribuição relacionada porfírica.
Já as microfácies com maior porcentagem de conchas e menor teor de fração fina são
aquelas com microestrutura de microagregados intergranulares e distribuição
relacionada g/f de tipo enáulica.
Para aprofundar-se no exame da existência de microfácies recorrentes inter e
intra-sítio, realizou-se a análise de componentes principais, que levou em consideração
367
os cinco parâmetros de maior peso na diferenciação quantitativa e qualitativa das 23
microfácies descritas. Estes parâmetros referem-se a porcentagem de: 1) conchas; 2)
ossos; 3) grãos minerais (somatória de grãos de quartzo, feldspato e fragmentos líticos);
4) porosidade; 5) fração fina. As variáveis escolhidas tiveram que ser normalizadas já
que, na descrição micromorfológica, foram estimadas em relação à porcentagem total
por categoria 105 .
A partir da análise de componentes principais assim realizada, identificaram-se,
pelo menos, três agrupamentos de microfácies (Figura 6.4). O primeiro agrupamento
envolve as microfácies 4.3 do sítio Morrinhos e 7.4 de Jabuticabeira 1, compostas por
agregados de lama com diatomáceas (grupo A da Figura 6.4). Este grupo caracteriza-se
por ter a maior porcentagem de fração fina do conjunto (46-47%). O segundo
agrupamento abarca as microfácies 3.2 e 4.2 do sítio Morrinhos, já descritas como
semelhantes (grupo B da Figura 6.4) por conter grãos de quartzo revestidos por
argilominerais (53-60 %), com pouquíssimas conchas (0-8 %). O terceiro agrupamento
envolve as microfácies compostas por conchas com empacotamento fechado e
distribuição horizontal, que têm os valores máximos de frequência de conchas (53-55
%) e porosidade (32-33 %) e os valores mínimos de fração fina (3-7 %). Estas são a mF
4.1 do sítio Morrinhos, onde as conchas estão completamente queimadas, e a mF 7.2 de
Jabuticabeira 1, onde apenas 5 % das conchas encontram-se queimadas (grupo C da
Figura 6.4).
O quarto agrupamento abrange a nuvem de pontos localizada na área central do
gráfico da Figura 6.4 (grupo D) na qual, em termos gerais, distinguem-se dois
subconjuntos de microfácies com frequência de conchas entre 20 e 40 % e teores
variáveis de grãos minerais (11-42 %) e ossos (3-24%): 1) um subconjunto envolve as
mF 2, 3, 4a, 4b e 4 do sítio Caipora e a mF 8 de Jabuticabeira 1, com porcentagem de
ossos no entorno de 7 %; 2) o outro agrupa as mF 9 e HzA, do sítios Cubículo 1, mF
3.1, 3b e 4b, do sítio Morrinhos, e mF 5, 6, 7.3 e 9, do Jabuticabeira 1, com frequência
de ossos de 10 a 23 %. Somente duas microfácies não se agrupam em nenhum dos
105
A estimação dos componentes da fração grossa foi realizada em relação à sua porcentagem total, sem
considerar à porosidade ou fração fina. Da mesma maneira, a estimação da porosidade levou em
consideração a frequência de vazios em relação à somatória da fração grossa e fina; assim como a
estimação da fração fina somente considerou a relação da micromassa com a fração grossa, sem ponderar
a porosidade. Portanto, prévio à análise estatística, as cinco variáveis foram normalizadas em relação a
um valor total de 100. Desta maneira, permite-se avaliar a relação entre as variáveis utilizadas para
comparação e agrupamento das amostras.
368
conjuntos anteriores. Estas correspondem à mF HzA do sítio Caipora e mF 7.1 do
Jabuticabeira 1.
Os quatro grandes grupos identificados pela análise de componentes principais
servem de base para definir microfácies maiores nos sambaquis de padrão estratigráfico
conchífero. No próximo tópico, discute-se o significado dos conjuntos maiores de
microfácies em termos de atividade de deposição e proveniência do material.
Figura 6.4. Gráfico de componentes principais para 23 seções delgadas dos quatro sambaquis conchíferos
analisados.
1.6.2. Microfácies tipo A: retrabalhamento de resíduos com predomínio de conchas
Este tipo de microfácies foi identificado em mais da metade das lâminas
analisadas por sítio. No diagrama da Figura 6.4, agrupa-se nos dois subconjuntos
localizados no centro do gráfico (identificados como grupo D): Caipora mF 3 e 4;
369
Cubículo1 mF 9; Morrinhos mF 3.1 e 4b; Jabuticabeira 1 mF 5, 6, 8 e 9. características
desta microfácies listam-se no Quadro 6.3.
Quadro 6.3. Características da microfácies tipo A.
Microestrutura
Dist. rel. g/f
Vazios
Porosidade
Razão g/f
Fração grossa
Distribuição da
fração grossa
Comp. menores
Micromassa
MICROFÁCIES TIPO A
Microagregados intergranulares e grãos revestidos e interligados, com grânulos
coesivos (100-300 µm)
Enáulica, com áreas de tipo gefúrica e quitónica
De empacotamento complexo, com canais, vazios em câmara e vesículas
20-30 %
70/30
1) Conchas (20-40%) inteiras e fragmentadas com conchas queimadas; 2) grãos
minerais (~10-40 %), com domínio de areias quartzosas, seguido de grãos de
feldspato e fragmentos líticos; 3) fragmentos de osso de diverso tamanho (3-24 %),
com domínio na fração areia muito fina e sinais de queima e dissolução
Grãos minerais e ossos com distribuição aleatória. Conchas com frequência
variável (10-100 %), de distribuição horizontal a sub-horizontal
Ocasional presença de agregados de lama com diatomáceas, fragmentos de carvão.
Frequência total menor que 1 % de escórias vítreas, espinhos de equinoide e restos
de tecidos
Mistura de argilominerais com MO e micrita, mais fosfatos secundários
As microfácies agrupadas no tipo A são as que apresentam a maior
complexidade pré-deposicional das sucessões analisadas, por conter uma mistura de
materiais inteiros, fragmentados, queimados a diversa temperatura e distribuídos, na
maior parte dos casos, aleatoriamente. Apenas as conchas inteiras ou em fragmentos
maiores apresentam distribuição horizontal e sub-horizontal. Isto provavelmente se
relaciona com o a deposição do material e/ou consolidação pós-deposicional dos
sedimentos (ver Andrews 2005).
Como discutido no tópico 1.4.2, a maior parte dos fragmentos de osso, bem
como alguns fragmentos de concha, estão queimados. Porém, a queima não teria
acontecido no local, já que não se observam outros indicadores macro e microscópicos
de fogueiras in situ. Por exemplo, nas sucessões verticais analisadas, não há evidências
de estruturas de combustão semelhantes à fogueira experimental acesa sobre substrato
conchífero, apresentada no Capítulo 5, tópico 1.1.2. Tampouco se observaram fogueiras
como as identificadas no sítio Jabuticabeira 2, sempre associadas a sepultamentos
humanos (ver Bendazzoli, 2007; Fish et al., 2000; Klokler, 2001, 2008; Nishida, 2007;
Villagran, 2008).
Em seção delgada, as microfácies tipo A envolvem uma mistura de restos
queimados a temperaturas diversas, junto com materiais não queimados. Os restos
queimados incluem: conchas aquecidas a temperatura de 400° C até 800° C (segundo
370
experiência mostrada no Capítulo 5, tópico 1.2); fragmentos de osso com alteração
superficial (temperaturas menores que 400° C); fragmentos carbonizados (400-500° C)
ou calcinados (600-700° C); carvões (280° C); e, ocasionalmente, escória vítrea (+800°
C). A micromassa compóe-se de mistura de argilominerais com micrita derivada da
precipitação do carbonato dissolvido das conchas, assim como fosfatos secundários
associados à alteração dos ossos ou resíduos biológicos. Ocasionalmente, observam-se
finas lentes (até 5 mm de cumprimento e 1 mm de espessura) de micromassa carbonoas,
resultado da quebra de fragmentos isolados de carvão. Outras evidências
micromorfológicas de fogueiras in situ, como substrato rubefacto, acumulação de cinzas
de madeira e/ou gramíneas, agregados silicosos ou micromassa carbonosa associada à
deposição massiva de microcarvões (ver Berna et al., 2004; Courty et al., 1989, 2012;
Goldberg et al., 2009, 2012; Karkanas et al., 2007; Mallol et al., 2007; Miller et al.,
2010; Schiegl, 1996) não foram observadas na microfácies tipo A.
Apesar de que lentes discretas de cinzas, acompanhadas de material queimado
(Courty et al., 1989; Wattez, 1992), são frequentemente usadas como evidência de
queima no local, a pequena acumulação de cinzas de madeira encontrada na seção
delgada MO 3b tampouco indica queima in situ. Neste caso, as cinzas formam uma
lente centimétrica que repousa sobre a face externa de uma concha de A. brasiliana
inteira, sem evidências de queima. Se as cinzas tivessem sido produzidas no local, a
concha sobre a qual se depositaram também apresentaria evidências de alteração
térmica. Por outro lado, o fato de cinzas de madeira terem-se preservado neste local
indica que sua ausência não se deve à dissolução, mas sim ao fato de não terem sido
depositadas massivamente nos sambaquis.
Isto vincula-se com a ausência de fitólitos, mencionada no tópico 1.5.2, e a baixa
frequência de escória vítrea e/ou agregados de material silicoso. Carvão, cinzas de
madeira ou gramíneas, fitólitos e agregados de material silicoso são típicos subprodutos
da queima de material vegetal (Albert and Cabanes, 2008; Canti, 2003; Schiegl, 1996;
Schiegl et al., 1994). A baixa frequência destes componentes nos sambaquis, com
exceção dos carvões, sugere baixa taxa de deposição nos sítios.
Portanto, as características micromorfológicas permitem inferir que a
microfácies de tipo A contém os produtos do retrabalhamento, seja por varrido ou
redepositação, de materiais depositados e também queimados em local diferente do de
acúmulo final (ver Courty et al., 2012; Goldberg et al., 2009, 2012; Miller et al., 2010;
Schiegl et al., 2003). Esta área de queima poderia estar localizada sobre o sambaqui ou
371
fora do sítio, sobre o depósito natural de onde teriam vindo, casualmente, parte dos
componentes terrígenos.
O empacotamento aberto dos componentes e a porosidade desta microfácies
excluem a possibilidade de retrabalhamento por pisoteamento. Nenhum indicador
micromorfológico de pisoteamento, tanto em concheiros (ver Balbo et al., 2010;
Villagran et al., 2011 a) como em outros contextos (ver Goldberg et al., 2009, 2012;
Miller et al., 2010; Schiegl et al., 2003) foi identificado nesta microfácies.
1.6.3. Microfácies tipo B: retrabalhamento de fogueiras Na categoria B, incluem-se as microfácies que apresentam assembleia de
componentes alterados termicamente, como cinzas, conchas e ossos queimados,
agregados de argila rubefacta e carvão. No gráfico da Figura 6.4, estas microfácies não
mostram agrupamento claro, já que materiais queimados não foram considerados como
variáveis na análise de componentes principais. No mesmo gráfico, a mF 7.1 de
Jabuticabeira 1 aparece separada dos quatro agrupamentos principais, enquanto a mF
4.1 de Morrinhos agrupa-se com a mF 7.2 de Jabuticabeira 1, localizada, na lâmina,
imediatamente abaixo de mF 7.1. As características desta microfácies agrupam-se no
Quadro 6.4.
Quadro 6.4. Características da microfácies tipo B.
Microestrutura
Dist. rel. g/f
Vazios
Porosidade
Razão g/f
Fração grossa
Distribuição da
fração grossa
Comp. menores
Micromassa
MICROFÁCIES TIPO B
Microagregados intergranulares
Enáulica e porfírica
Vazios de empacotamento complexo
20-40 %
30/70 e 85/15
1) Conchas (53-55%), 30% da quais apresentam queima a temperatura superior a
600° C; 2) fragmentos de osso (5 %) com sinais de queima.
Conchas com distribuição sub-horizontal; ossos com distribuição aleatória
Perióstraco queimado, restos de tecidos silicificados
Agregados de argila rubefacta e carbonizada, cinzas e microcarvões.
Pela assembleia de componentes e características micromorfológicas, estas
microfácies podem ser interpretadas como resíduos de fogueiras in situ (ver Aldeias et
al., 2012; Courty et al., 2012; Goldberg et al., 2009,
2012; Miller et al., 2010;
Vallverdú et al., 2012). No entanto, assim como discutido para as microfácies tipo A,
372
existem evidências que impedem a associação direta da microfácies B com estruturas de
combustão. O primeiro indicador é o contato abrupto que apresentam com as
microfácies inferiores, sem evidências de alteração térmica. Na hipótese de a queima ter
acontecido no local, existiria um gradiente de alteração dos materiais desde o núcleo da
queima até alguns centímetros no substrato (Berna et al., 2007; Canti and Linford, 2000;
Miller et al., 2010). No caso dos sambaquis, esta alteração envolveria conchas
queimadas junto com concentrações de carvões e cinzas.
Apesar de a rubefação do substrato ser frequentemente usada como indicador de
sedimentos expostos a altas temperaturas e de fogueiras in situ (Mallol et al., 2007;
Schiegl et al., 2003; Wattez, 1992; Weiner, 2002), este atributo não necessariamente
aparece em fogueiras de curta duração sobre substrato conchífero, como mostrado na
fogueira experimental discutida no Capítulo 5, tópico 1.1.3. No entanto, não é
unicamente a falta de substrato rubefacto o que impede a associação com queima in situ
na microfácies tipo B, mas sim também a ausência de estruturas de combustão visíveis
no perfil, como mostrado no Capítulo 5, tópico 1.1.2.
Além disso, na microfácies tipo B do sítio Morrinhos, existe uma concentração
milimétrica de agregados de argila queimada, com um grande agregado de argila
rubefacta, acima de conchas com evidências de queima a temperatura superior aos 600°
C. Isto indicaria uma inversão na estratificação típica de queima in situ, na qual as
conchas queimadas repousariam sobre a argila queimada e rubefacta. Na microfácies B
do sítio Jabuticabeira 1, observa-se uma inversão semelhante, já que existe concentração
de agregados milimétricos de argila rubefacta acima da lente de conchas queimadas que
se misturam com agregados de argila carbonizada.
Todos estes indicadores sugerem que, apesar de conter uma associação de
componentes com indiscutível alteração térmica, a microfácies tipo B não representa
fogueiras in situ e sim, novamente, o retrabalhamento de materiais. A grande diferença
com a microfácies tipo A é que, no caso da microfácies B, todos os componentes estão
queimados, tanto da fração grossa como da fração fina. Esta diferença pode sugerir que
o transporte desde o local original onde a fogueira teria estado acesa não seria longo, o
que favoreceu a manutenção do arranjo relativo de materiais. Ao mesmo tempo, a
associação com microfácies de tipo A sugere que a microfácies de tipo B possa ter
resultado da queima sobre depósitos de microfácies de tipo A.
Concentração de materiais queimados sobre substrato não queimado foi descrita
por Schiegl et al. (2003) em um sítio em caverna do Paleolítico. Os autores interpretam
373
tal associação como produto da deposição secundária (dumping) de restos de uma
fogueira localizada a poucos metros de distância, na entrada da caverna. Miller et al.
(2010) também identificaram associação ente materiais queimados sobre substrato não
alterado em fogueiras experimentais varridas a pouca distância da área de queima. Isto
pode significar que a microfácies de tipo B possa ter resultado do retrabalhamento do
materrial de fogueiras localizadas a pouca distância da área final de deposição.
1.6.4. Microfácies tipo C: agregados de lama de depósitos paleolagunares O tipo C concentra as microfácies compostas por agregados de lama com
diatomáceas, grãos de argila glauconítica e gastrópode. No gráfico da Figura 6.4,
corresponde ao grupo A que inclui: Morrinhos mF 4.3 e Jabuticabeira 1 mF 7.4. As
características desta microfácies agrupam-se no Quadro 6.5.
Quadro 6.5. Características da microfácies tipo C.
Microestrutura
Dist. rel. g/f
Vazios
Porosidade
Razão g/f
Fração grossa
Distribuição da
fração grossa
Micromassa
MICROFÁCIES TIPO C
Maciça
Porfírico
Em câmara, regulares, em fissuras, de empacotamento composto
10 %
10/90
1) Grãos de quartzo e argila glauconítica (26-40 %) na fração areia muito fina; 2)
conchas de bivalve e de Heleobia sp. (7-20 %); 3) diatomáceas (3-5%), com
predomínio de Paralia sulcata
Aleatória
Argilominerais castanho claro (PPL), com fissuras de dessecação
Pela granulometria e assembleia faunística (diatomáceas e gastrópode), os
agregados de lama teriam sido coletados em fundos lagunares lamosos. Estes agregados
teriam vindo junto com as conchas de marisco, da espécie Mytella sp., que aparecem em
alta frequência nos dois sambaquis onde os agregados foram observados (Morrinhos e
Jabuticabeira 1). Estes mesmos agregados aparecem queimados, rubefactos e
carbonizados nas microfácies de tipo B, em associação com conchas queimadas e
tecidos silicificados.
374
1.6.5. Microfácies tipo D: areia com revestimentos de argila As microfácies do tipo D concentram-se no grupo B do gráfico da Figura 6.4:
Morrinhos mF 3.2 e 4.2. Aparece, portanto, unicamente no sambaqui Morrinhos,
composta por areias quartzosas e feldspáticas, com poucas conchas, revestidas por
argilominerais com concentrações de diatomáceas. As características desta microfácies
agrupam-se no Quadro 6.6.
Quadro 6.6. Características da microfácies tipo D.
Microestrutura
Dist. rel. g/f
Vazios
Porosidade
Razão g/f
Fração grossa
Distribuição da
fração grossa
Micromassa
MICROFÁCIES TIPO D
Microagregados intergranulares e grãos revestidos interligados
Enáulica, quitónica e gefúrica
Vazios de empacotamento complexo
30 %
90/10
1) Grãos de quartzo (55-65 %) e feldspato (15%), na fração areia fina; 2) conchas
inteiras e fragmentadas (10-15 %); 3) minerais pesados anisotrópicos, opacos,
grãos de argila glauconítica (total <10 %), na fração areia muito fina; 4) Heleobia
sp. (3-5 %); 5) diatomáceas (3 %); fragmentos de osso (2 %)
Aleatória
Argilominerais castanho claro (PPL) na forma de revestimentos e agregados
esféricos
As microfácies do tipo D representam lâminas de areia com presença intrusiva
de conchas e micromassa formada pela compactação mecânica e iluviação de agregados
de argilominerais, do mesmo tipo que compõe os agregados de lama da microfácies tipo
B.
1.6.6. Microfácies tipo E: desenvolvimento de solo no topo do sambaqui
Na categoria E, agrupam-se as microfácies localizadas no topo das sucessões
estratigráficas dos sítios Caipora e Cubículo 1, nos quais já tinha sido constatado, em
campo, o desenvolvimento de solo incipiente: Caipora mF HzA e Cubículo 1 mF HzA.
As características desta microfácies agrupam-se no Quadro 6.7.
375
Quadro 6.7. Características da microfácies tipo E.
Microestrutura
Dist. rel. g/f
Vazios
Porosidade
Razão g/f
Fração grossa
Distribuição da
fração grossa
Micromassa
MICROFÁCIES TIPO E
Grânulos coesivos (250-500 µm de cumprimento) e/ou microestrutura grumosa
coesiva (agregados de 2-5 mm)
Porfírico e mônico
Em câmara, canais, fissuras e vesículas
10-20 %
50/50 até 10/90
1) Grãos de quartzo, feldspato e fragmentos líticos (20-45 %); 2) fragmentos de
osso (6-20 %) com sinais de dissolução e queima a temperatura diversa; 3)
fragmentos de concha (10%)
Aleatória
Argilominerais com MO e micrita
Pela sua posição superficial na sucessão vertical e contato abrupto com
microfácies de tipo A, este tipo de microfácies teria resultado da deposição sobre os
sambaquis de materials terrígenos dos arredores (grãos de quartzo e argilominerais) com
sedimento retrabalhado da superfície do sambaqui (fragmentos finos de concha e osso).
1.7. FORMAÇÃO DE SAMBAQUIS CONCHÍFEROS A partir das informações reunidas nos tópicos anteriores, derivadas da
interpretação dos dados de campo, análises granulométricas, faunísticas, isotópicas e
micromorfológicas, pode-se dizer, a modo de síntese, que os sambaquis conchíferos são
depósitos produzidos pelo retrabalhamento de materiais de proveniência diversa. Isto
significa que existem poucos indicadores de depósitos primários e robustas evidências
que apontam à deposição massiva de resíduos alimentares.
A identificação de arqueofácies feita no campo mostra que a estratigrafia
aparentemente complexa dos sítios pode ser resumida em três arqueofácies maiores: 1)
com predomínio de conchas e ossos; 2) lenticulares pretas com restos vegetais, carvão e
ossos queimados; 3) com predomínio de sedimentos terrígenos, com conchas inteiras na
base dos depósitos. Os materiais terrígenos que compõem as arqueofácies refletem o
contexto geológico-geomorfológico imediato de localização dos sítios (afloramentos
graníticos e depósitos paleolagunares), assim como os sedimentos do banco de
moluscos explorado. As arqueofácies com predomínio de conchas apresentam, além dos
macro-moluscos predominantes (A. brasiliana ou Ostrea sp.), ossos de peixe, resíduos
376
da decomposição de tecidos animais e plantas arbustivas. Estas arqueofácies seriam
produto do retrabalhamento e concentração de resíduos. Já as arqueofácies lenticulares
pretas estão compostas, principalmente, por restos de plantas, com influência de nitratos
de origem animal. Estas arqueofácies poderiam representar superfícies de ocupação
diferenciadas, formadas pelos resíduos da hipotética existência de fibras vegetais
trançadas.
Dos três conjuntos de arqueofácies, o primeiro apresenta a maior diversidade no
nível micromorfológico. Cinco tipos de microfácies foram identificados neste grupo,
recorrentes tanto no nível intra-sítio e inter-sítio, o que sugere a existência de processos
deposicionais de formação de sambaquis repetidos no tempo e no espaço. As
características micromorfológicas gerais dos sambaquis conchíferos permitem atribuir
as microfácies predominantes (microfácies tipo A e B) a depósitos secundários de tipo
midden, definidos como depósitos de acumulação de elementos descartados após uso ou
consumo (Beck and Hill Jr, 2004; Needham and Spence, 1997; Schiffer, 1972, 1983;
Wilson, 1994). Estes depósitos assumem a forma de montículo ou camada espessa
dentro da estratigrafia dos sítios, compostos por uma mistura aleatória de materiais
orgânicos (tecidos vegetais, carvão), restos não comestíveis de alimentos (ossos e
conchas) e detritos associados à produção de artefatos 106 .
A mistura de materiais, que envolve desde sedimentos naturais, resíduos de
fogueiras (cinzas, escória vítrea, carvão), ossos com diversos graus de queima,
fragmentação e decomposição, conchas inteiras ou fragmentadas, com dissolução
intensa e queima, sugere retrabalhamento de materiais vindos de fontes diversas. Ou
seja, os sambaquis conchíferos estão compostos, majoritariamente, de materiais
retrabalhados de depósitos naturais e de depósitos de acumulação de resíduos e
fogueiras. Isto significa que, nestes sítios, material descartado imediatamente após uso
ou coleta encontra-se depositado junto com material que já sofreu processos de
alteração, seja antrópica, como queima, seja natural, como intemperismo. A complexa
história pré-deposicional dos componentes permite associar estes sítios com depósitos
terciários ou de midden secundário (ver Courty et al., 1989; Schiffer, 1983). Observação
106
Em seção delgada, os middens apresentam microestrutura de microagregados intergranulares, vazios
de empacotamento complexo, porosidade alta, componentes biológicos e biominerais com bordas
angulosas, distribuição aleatória da fração grossa e micromassa heterogênea formada por matéria
orgânica, fosfatos e argilominerais (Courty et al., 1989; Goldberg and Whitbred, 1993; Matthews et al.,
1997; Simpson, 1996).
377
semelhante foi realizada na camada preta do sítio Jabuticabeira 2, onde existe a mesma
mistura de materiais queimados a diversa temperatura, com materiais intemperizados
em matriz predominantemente fosfática (Villagran, 2008, 2010; Villagran et al., 2009
a, 2010). Apesar de não conter conchas na sua composição, as características dos
componentes da camada preta, em termos de história deposicional, são assemelháveis
ao observado nos quatro sambaquis conchíferos analisados.
A prática de acumular resíduos na formação dos sítios mostra uma permanência
milenar no sistema sócio-cultural das populações costeiras, já que se observa desde o
sambaqui conchífero mais antigo da área de estudo (datado em ca. 7500 AP) até sítios
com cerca de 2000 anos de antiguidade. Este período abrange as fases 1, 2 e 3 de
ocupação sambaquieira do litoral sul catarinense (segundo Giannini et al. 2010), com
mais de 5500 anos de duração total. A extensão geográfica e temporal deste padrão
deposicional resulta chave para entender o significado das práticas associadas à
formação dos sambaquis, com deposição continua de conchas e demais resíduos.
Cabe ressaltar que as evidências apontam à acumulação de materiais em área
externa ao sambaquis (especificamente para as microfácies de tipo A) junto com redeposição de restos de fogueiras acesas, provavelmente, sobre o sítio (para as
microfácies de tipo B). Isto indica que áreas de habitação e/ou acumulação/queima de
resíduos associadas aos grandes sambaquis podem se encontrar fora do sítio e não
seriam detectáveis a simples vista, pela ação de retrabalhamento até os sambaquis. Além
disso, pela intensa dinâmica de assoreamento do sistema lagunar que caracterizou a
região desde o Holoceno Médio, estas superfícies estariam, atualmente, soterradas por
sedimentos modernos.
2. NÚCLEO ARENOSO Os sambaquis de núcleo arenoso (Santa Marta 10 e Carniça 3) estão todos
localizados no setor externo e situados sobre, ou em meio a, dunas e paleodunas eólicas.
A partir da identificação de fácies e arqueofácies realizada em campo, identificaram-se
duas unidades maiores nestes sítios: 1) arqueofácies decimétrica superficial preta, com
MO e conchas (AF 2 de Carniça 3 e Fácies B mais AF 1 de Santa Marta 10); 2) fácies
378
ou arqueofácies métrica inferior, composta por areias quartzosas (AF 1 de Carniça 3 e
Fácies A de Santa Marta 10).
A escolha pela denominação de fácies ou arqueofácies em cada sítio é dada pela
origem antrópica ou natural do depósito. No caso do sítio Carniça 3, estudos
sedimentológicos indicaram que a deposição do núcleo arenoso é de origem antrópica, e
não eólica (Tanaka 2007; Tanaka et al. 2009). A sua cronologia, 3810-3360 anos cal.
AP, é contemporânea às paleodunas de geração 3 da região, posteriores à máxima
transgressão holocênica. Pelo contrário, o sítio Santa Marta 10 está localizado sobre
paleodunas de geração 2 formadas, segundo Giannini (1993) e Giannini et al. (2007),
antes do máximo transgressivo na região, por sua vez datado como anterior a 5700 anos
AP (Angulo et al. 1999, 2006). A cronologia do sítio, 6180-5750 anos cal AP, é
coerente com a idade proposta para os depósitos eólicos.
Duas arqueofácies compõem os sítios Carniça 3 e Santa Marta 10:
1) Arqueofácies superficial preta, com MO e conchas
2) Arqueofácies/fácies inferior, formada por areias quartzosas
Nos tópicos a seguir, apresenta-se a discussão das análises laboratoriais
realizadas nas arqueofácies e fácies amostradas dos dois sambaquis de núcleo arenoso
analisados.
2.1. SEDIMENTOS TERRÍGENOS Nos sambaquis de núcleo arenoso, a relação entre depósitos arqueológicos e
naturais é mais facilmente observável, graças à menor influência antrópica na
composição dos sedimentos arqueológicos. Tanto no sambaqui Santa Marta 10 como
Carniça 3, a comparação entre as distribuições granulométricas das frações arenosas
terrígenas presentes no núcleo arenoso e na camada de areia lamosa preta superior
(Fácies B e AF 2, respectivamente) indica similaridade entre ambos. Isto é interpretado
como indicador de proveniências análogas para os sedimentos terrígenos que compõem
o núcleo arenoso e a camada de areia lamosa superficial.
379
No caso de Santa Marta 10, a estratigrafia do sítio sugere deposição eólica para
as areias que compõem a Fácies B, e deposição antrópica apenas para o anel de conchas,
identificado como AF 1. Estas areias estariam associadas às paleodunas eólicas de
geração 2 que afloram nas proximidades do sítio, como mostrado pela comparação com
os dados sedimentológicos tomados de Giannini (1993), Sawakuchi (2003), Martinho
(2004), Giannini et al. (2007). Em Carniça 3, a presença de conchas de A. brasiliana e
de fragmentos de osso e carvão em meio às areias quartzosas que compõem a AF 2
indica deposição antrópica para os sedimentos terrígenos. Estas areias teriam sido
coletadas em depósitos paleolagunares da planície de Campos Verdes.
As areias quartzosas que compõem a arqueofácies superficial e núcleo arenoso mostram
afinidade com depósitos eólicos e/ou paleolagunares das proximidades dos sambaquis.
2.2. ASSEMBLEIA MALACOLÓGICA Três espécies de moluscos e um gastrópode (Quadro 6.8) foram identificados na
assembleia malacológica dos sambaquis de núcleo arenoso. A escassa diversidade
associa-se ao domínio, e quase exclusividade, de A. brasiliana. A exclusividade de uma
espécie contrasta com a diversidade relatada para os sambaquis conchíferos nos quais,
apesar de existirem pelo menos duas espécies dominantes (A. brasiliana ou Ostrea sp.)
a maior diversidade específica permitiu interpretar multi-preveniência para os moluscos
que compõem os sítios.
As conchas de A. brasiliana aparecem comumente inteiras, com frequência de
~50 %, em Santa Marta 10, e ~86 %, em Carniça 3 (Quadro 6.9). A porcentagem de
fragmentos de conchas desta espécie é maior em Santa Marta 10 (48 % contra 12 % em
Carniça 3). Pela cronologia de Santa Marta 10 (cerca de 6000 AP) e Carnila Carniça 3
(3500 AP) pode-se inferir que o uso de A. brasiliana caracteriza os sambaquis de núcleo
arenoso desde os momentos mais remotos de ocupação sambaquieira na região. Isto
corrobora as observações de Peixoto (2009), realizada nos sambaquis de núcleo arenoso
Encantada 3, Canto da Lagoa 1 e 2, Lagoa dos Bixos 2 e Carniça 3, 6 e 7. Observação
380
semelhante foi realizada por Assunção (2010), que realizou sondagens em vários
sambaquis de núcleo arenoso da região de Campos Verdes e Santa Marta.
O fato de se achar alta concentração de A. brasiliana em Santa Marta 10, o sítio
mais antigo do setor externo, com conchas datadas em 6180-5750 anos cal AP, indica
que havia disponibilidade desta espécie na região desde a época aproximada da máxima
transgressão holocênica, quando o sistema era supostamejnte mais aberto. Em praias de
mar aberto, é possível achar bancos de A. brasiliana, sempre que existam as condições
de salinidade das águas (entre 38 e 16 partes por mil) e de energia (moderada)
favoráveis ao desenvolvimento deste molusco. Tais condições são encontradas em
praias protegidas, de enseadas e baías, como reporta Schaeffer-Novelli (1976) no litoral
norte de São Paulo. Nos concheiros naturais estudados por Fornari (2010), localizados
na margem sudoeste da atual laguna Garopaba do Sul, achou-se domínio de A.
brasiliana a profundidades de até 2,2 m e idades de 5560-5320 anos cal AP. Nos
testemunhos analisados por Nascimento (2011), também se encontraram concheiros
naturais com A. brasiliana datados de 8013-7800 anos cal. AP. Estes depósitos
encontram-se em locais que, há 7900 ou 4700 anos atrás, seriam costas protegidas da
ação direta do mar, com aporte de água doce por rios que drenavam a paleobaía.
Apesar da semelhança composicional entre os dois sambaquis de núcleo arenoso
estudados, destaca-se uma divergência marcante na frequência de indivíduos de A.
brasiliana juvenis. Como representativos de indivíduos juvenis, foram consideradas as
conchas de A. brasiliana de cumprimento menor que 1 cm já que, acima do intervalo de
comprimento entre 0,8 e 1,0 cm, os indivíduos já são considerados sexualmente
maduros (Grotta and Lunetta, 1980). Em Santa Marta 10, conchas inteiras e menores
que 1 cm de comprimento, inclusive fechadas, perfazem mais de 4 % do total desta
espécie. Em Carniça 3, pelo contrário, nenhum indivíduo juvenil foi recuperado. Isto
pode indicar uma diferença na estratégia de acumulação e coleta para formação de cada
sítio, com coleta direcionada a indivíduos adultos em Carniça 3, vs. coleta sem seleção,
embora focada na recuperação de A. brasiliana, em Santa Marta 10.
Esta diferença pode relacionar-se com o contraste no formato do depósito
faunístico de cada sítio. O anel de conchas que caracteriza Santa Marta 10, e que não foi
observado em nenhum outro sambaqui da região, parece representar o produto direto da
coleta, transporte e acumulação dos componentes a partir de um concheiro natural,
possivelmente ativo durante a formação do sambaqui. Já em Carniça 3, onde se destaca
a quase exclusividade de A. brasiliana adultas na assembléia faunística, as conchas
381
estão misturadas com areia, alguns ossos de peixe e matéria orgânica; existe, portanto,
coleta seletiva com processamento dos moluscos, junto com outros restos orgânicos,
prévio à deposição. A maior seleção observada em Carniça 3 pode-se dever, também, ao
desenvolvimento de estratégias de coleta de moluscos com uso de instrumentos mais
elaborados e seletivos, como redes, por exemplo. Estes artefatos não afetariam os
indivíduos juvenis e, desta maneira, favoreceriam a reprodução do banco de moluscos.
Quadro 6.8. Espécies de moluscos identificadas nos sambaquis Santa Marta 10 e carniça 3, com descrição
do substrato e ambiente onde a espécie vive. Dados sobre vermetídeos e cirripídeos tomados de Laborel
and Laborel-Deguen (1996). Demais moluscos tomados de Rios (1985).
Espécie
Anomalocardia brasiliana
(Gmelin 1791)
Substrato
Arenoso e areno-lamoso
Ambiente
Até 5 m de profundidade, em regiões
entremarés ede baías, estuários e lagunas.
Eurihalina
Estuários e lagunas.
Heleobia sp.
(Stimpson 1865)
Macoma sp.
(Orbigny 1846)
Nassarius vivex
(Say 1822)
Lamoso ou areno-lamoso,
também sobre algas verdes
Areno-lodoso
Região entremarés em estuários e lagunas.
Lamosos e de planícies
arenosas
Água rasa e salobra, em estuários e lagunas. Quadro 6.9. Distribuição de espécies de moluscos nos sítios Santa Marta 10 e Carniça 3. •••• = espécie
dominante (50-70 %); ••• = espécie frequente (10-50%); •• = poucos indivíduos ou fragmentos (1-10%); •
= ocasionais (<1%).
Espécie
Anomalocardia brasiliana
Heleobia sp.
Macoma sp.
Nassarius vivex
Malha de 2 mm
Santa Marta 10
••••
•
•
•
•••
382
Carniça 3
•••••
•
•••
Nos sambaquis de núcleo arenoso, há domínio, e quase exclusividade, da espécie A.
brasiliana. A presença desta espécie no sítio Santa Marta 10, o mais antigo do setor
externo, indica disponibilidade deste molusco desde antes do máximo transgressivo
holocênico, assim como seu uso na construção de sítios desde o início da ocupação
sambaquieira na região. O formato anelar da acumulação de conchas observado em
Santa Marta 10, com freqüência considerável de indivíduos juvenis, sugere coleta não
selecionada, embora direcionada a captura desta espécie. A aleatoriedade da disposição
das conchas em Carniça 3 indica deposição conjunta com sedimentos terrígenos e
outros resíduos antrópicos derivados da queima. A ausência de indivíduos juvenis,
contrário ao observado em Santa Marta 10, sugere coleta seletiva e/ou uso de
instrumentos de coleta que favorecem a captura de indivíduos adultos.
2.3. COMPONENTES VEGETAIS Análises isotópicas de C e N (δ13C e δ15N) realizadas nos sítios Santa Marta 10 e
Carniça 3 indicaram a presença exclusiva de plantas de ciclo fotossintético C3 na
camada de areia lamosa preta (com conchas, no caso de Carniça 3) que recobre os
sambaquis. Estes sambaquis apresentam os menores valores de δ15N dos oito sambaquis
analisados nesta tese: +7,39 e +8,5, para Santa Marta 10 e Carniça 3, respectivamente
(Figura 6.2 D). Isto significa que, diferente do observado nos sambaquis conchíferos,
não existe MO derivada de resíduos animais nos sambaquis de núcleo arenoso e sim
unicamente MO vegetal. Esta MO estaria vinculada principalmente à decomposição de
espécies C3 sobre o montículo arenoso.
Interpreta-se que a MO está associada à ação humana no local e não corresponde
à vegetação que atualmente cobre os montículos por dois motivos: espessura
decimétrica e coloração preta das arqueofácies amostradas, que não se corresponde com
o delgado horizonte de solo castanho claro que se desenvolve atualmente nos depósitos
eólicos da região; e presença de conchas de moluscos misturadas com areia e material
orgânico, no caso do Carniça 3, e na forma de bolsão de forma anelar, no caso de Santa
Marta 10.
383
Unicamente em Santa Marta 10, coletou-se amostra do horizonte de solo
superficial que se desenvolve sobre as paleodunas próximas ao sítio. A assinatura
isotópica da MO no sambaqui e na paleoduna apresentaram valores muito próximos de
δ13C e δ15N (Figura 6.2 D), o que poderia ser interpretado como indicação de origem
análoga. No entanto, existe uma diferença importante de razão C/N entre a amostra
arqueológica e a natural, com valores de 19.11 e 10.00, respectivamente. Esta diferença
está vinculada ao teor de C orgânico, com concentração de 1,72 % no sambaqui e de
0,20 % no depósito natural. Os valores de nitrogênio total não apresentam diferenças
consideráveis (valores de 7,39 % e 7,82 % no sambaqui e depósito natural,
respectivamente). Isto significa que existe uma fração de C no sambaqui diferente da
que compõe o solo sobre a paleoduna, que resulta no enriquecimento de quase 100 % do
valor de C orgânico no sítio arqueológico, apesar de ambos os depósitos estarem
compostos por MO derivada de espécies C3.
Na paleoduna, a MO estaria vinculada a musgos que crescem no topo,
pertencentes ao grupo de plantas de ciclo fotossintético C3 (Raven et al., 1998; Skrzypek
et al., 2007 a, 2007b). No sambaqui, a diferença nos valores de C orgânico podem
dever-se à presença de resíduos da queima de espécies arbustivas, como carvões e
micro-carvões. Pelo método utilizado para determinação da porcentagem de C orgânico,
que envolve o aquecimento das amostras a 550° C, é possível que parte do C dos
carvões tenha sido volatilizado e medido como componente do CO2 liberado na
combustão, o que provocou a super-estimação do teor de C orgânico no sambaqui.
No trabalho de Menezes (2009), valores semelhantes de δ13C e δ15N foram
observados na MO do sítio Encantada 3 e no depósito paleolagunar das proximidades,
com presença de plantas C3 em ambos. A autora interpreta isso como indicador de
origens análogas para a MO dos depósitos arqueológicos e paleolagunares das
proximidades, interpretação que é extrapolada ao sítio Carniça 3 pela semelhança
estratigráfica e composicional com Encantada 3. No entanto, apesar da assinatura
isotópica de Carniça 3 corresponder com plantas C3, a razão C/N é tão alta quanto em
Santa Marta 10, com valores de 17, neste trabalho, e 21-22, em Menezes (2009). Isto
sugere que o mesmo enriquecimento por C elementar, interpretado para Santa Marta 10
como derivado da presença de microcarvões, pode ter causado a super-estimação do
valor de C orgânico em Carniça 3. De fato, em Carniça 3, existem outras evidências,
neste caso diretas, da presença de materiais queimados na arqueofácies superficial,
como ossos de peixe calcinados, carbonizados e carvões.
384
A MO da arqueofácies superficial preta em Carniça 3 e Santa Marta 10 compõe-se por
restos de plantas C3. Estes restos incluem, além da MO resultante da decomposição de
tecidos frescos, microcarvões derivados da queima de espécies arbustivas.
2.4. MICRO­COMPONENTES Análises micromorfológicas foram realizadas em quatro seções delgadas. Três
amostras correspondem ao sítio Santa Marta 10 e incluem lâminas do sambaqui e de
depósito de paleoduna eólica das proximidades. Do sambaqui Carniça 3 coletou-se uma
única amostra da camada superior de areia lamosa com conchas. Apesar da semelhança
aparente entre ambos os sambaquis, diferenças macroscópicas observam-se na
distribuição dos componentes malacológicos, aglomerados em anel de conchas em
Santa Marta 10 e misturados à matriz arenosa e orgânica em Carniça 3. No nível
microscópico, outras diferenças foram observadas, relativas à presença de componentes
de origem antrópica, como ossos e carvão, e à MO da camada superficial.
O componente mineral comum aos dois sítios estudados são os grãos de quartzo
e feldspato, arredondados a subarredondados, na fração areia fina e muito fina. Em
Santa Marta 10, aparecem fragmentos líticos, minerais pesados anisotrópicos, minerais
opacos e clastos de argila em frequencia total menor que 3 %. Estes componentes já
haviam sido identificados em seção delgada por Martinho & Giannini (2001) em
paleodunas eólicas de geração 2 no morro Santa Marta.
Entre os componentes biológicos e biominerais, destacam-se as conchas de A.
brasiliana, que perfazem 50 % da fração grossa de Carniça 3, e os fragmentos de osso
(3 %), queimados e com marcas de dissolução. Nenhum destes componentes biológicos
foi identificado em Santa Marta 10. Neste sambaqui, a influência antrópica identifica-se
pelo anel de conchas e pela espessura da fácies de areia lamosa preta superior (Fácies
B), que representa resíduos de acumulação humana de material vegetal sobre o depósito
eólico. A diferença de componentes biológicos em ambos os sambaquis sugere
divergências nos processos de formação de ambos, apesar das similaridades
macroscópicas aparentes.
385
A fração fina de Santa Marta 10 é formada por revestimentos de MO
monomórfica e agregados de MO polimórfica. Em Carniça 3, a MO é polimórfica com
ocasionais revestimentos de MO monomórifca e pseudo-revestimentos de MO
polimórfica. A microestrutura em ambos os sambaquis é de microagregados
intergranulares, na forma de pellets, com grãos revestidos de MO. Revestimentos de
MO monomórfica e microestrutura de microagregados integranulares na forma de
pellets de MO polimórfica são indicadores de horizontes de solo espódicos (Van
Breemen and Buurman, 2003; Buurman and Jongmans, 2005; Wilson and Righi, 2010).
O desenvolvimento de horizontes espódicos é um atributo característico dos
sambaquis de núcleo arenoso, independente da função ou uso dos sítios no passado 107 .
No entanto, o tipo de horizonte espódico pode ajudar a entender melhor o processo de
formação de cada sítio. Os horizontes espódicos representam os produtos da
modificação de restos orgânicos depositados no topo dos montículos arenosos, e sua
migração vertical, ou a decomposição in situ de resíduos vegetais. A formação de
horizontes espódicos em sedimentos arenosos e bem drenados, como os sambaquis aqui
analisados, será discutida no próximo tópico.
A análise micromorfológica mostra duas semelhanças e duas diferenças fundamentais
entre os sítios Santa Marta 10 e Carniça 3. As semelhanças são o predomínio de areias
quartzosas na fração grossa mineral e de fácies/arqueofácies lamosas pretas superiores.
As diferenças referem-se a: 1) presença de conchas de A. brasiliana, junto com
fragmentos de osso queimado e carvão, unicamente em Carniça 3; 2) MO de tipo
monomórfica em Santa Marta 10, na forma de revestimentos, e de tipo polimórfica em
Carniça 3, na forma de pellets.
107
O processo de podzolização ocorre naturalmente na região costeira estudada. No mapa de solos do
estado de Santa Catarina, escala 1:250.000 (<http://mapoteca.cnps.embrapa.br>), espodossolos são
mapeados na área de estudo associados a antigos depósitos lagunares e eólicos ao oeste da laguna
Garopaba do Sul e nas regiões de Rio do Meio (entre as lagunas Camacho e Santa Marta) e Campos
Verdes, associados a relevos planos sob vegetação de mata e campos de restinga. Da mesma maneira, os
revestimentos de argila mineral identificados na Fácies A2 da paleoduna eólica nas proximidades de
Santa Marta 10 evidenciam a iluviação de materiais finos em perfis arenosos e bem drenados.
386
2.5. ESPODOSSOLOS SOBRE DUNAS EÓLICAS 2.5.1. Definição Os espodossolos são solos minerais, desenvolvidos maiormente em substrato
arenoso, que se caracterizam por apresentar uma sucessão de três horizontes sobre o
horizonte C mineral: horizonte A superficial escuro; seguido de horizonte eluvial (E) de
coloração cinza claro ou branca (neste último caso, dito E álbico); e horizonte iluvial B,
espódico (Bh, Bs ou Bhs) de cor preta a marrom avermelhado, enriquecido em matéria
orgânica, Al e/ou Fe (Van Breemen and Buurman, 2003; Lundström et al., 2000).
Segundo os sistemas de classificação de solos da FAO-Unesco (1997) e a
taxonomia de solos americana (Soil-Survey-Staff, 1998), os espodossolos definem-se
pela presença de horizonte B espódico a partir dos 12 cm de profundidade, com
acumulação iluvial de MO associada a complexos de sílica-alumínio ou húmusalumínio, com ou sem ferro. Este horizonte desenvolve-se debaixo de horizonte O, A,
Ap ou E, com mais de 2,5 cm de espessura. A MO e complexos organometálicos no
horizonte B aparecem na forma de revestimentos ao redor dos grãos minerais ou de
pellets entre os grãos (Van Breemen and Buurman, 2003).
Os espodossolos, tradicionalmente descritos sob florestas boreais, são também
comuns em climas temperados e tropicais, desenvolvidos em materiais parentais pobres
e silicáticos, como dunas eólicas, cordões litorâneos e terraços marinhos sob florestas de
restinga (Van Breemen and Buurman, 2003; Coelho, 2008; Embrapa, 2006; Skjemstad
et al., 1992). Sua formação envolve diversos processos físico-químicos e existem pelo
menos duas teorias sobre a formação dos horizontes espódicos. A mais popular refere-se
à produção de ácidos orgânicos no horizonte superficial que, na ausência de cátions
divalentes neutralizantes, são transportados em solução como carbono orgânico
dissolvido (DOC) (também referido como MO altamente humificada) que pode estar
complexada, ou não, a Al e/ou Fe 108 . Este processo resulta na formação de
108
A produção de ácidos orgânicos solúveis é favorecida pela decomposição incompleta da liteira e pela
alta exsudação de ácidos orgânicos por plantas e fungos. Quando o material parental é pobre em minerais
intemperizáveis, como no caso de solos arenosos, a capacidade tamponante é insuficiente para neutralizar
os ácidos orgânicos formados pela decomposição da vegetação. Estes ácidos também intemperizam os
minerais primários, liberando Si e íons metálicos (Fe, Al). Estes componentes migrarão favorecidos pela
ação da água da chuva percolante até porções inferiores do perfil. O transporte cessa quando a matéria
orgânica, ou complexos de matéria orgânica com com Al e/ou Fe, precipitam por saturação, ou por
387
revestimentos de MO monomórfica ao redor dos grãos minerais, no horizonte B
espódico, freqüentemente com gretas de dessecação.
A segunda teoria refere-se à produção in situ de MO no horizonte B pela
degradação microbiana de raízes ou detritos vegetais, sem solubilização ou
deslocamento na fase líquida. Este processo daria lugar à formação de pellets de MO
polimórfica, que podem aparecer soldados (welded), na forma de agregados, ou perder a
sua forma original (flowed pellets) e aparecer como pseudo-revestimentos ao redor dos
grãos de areia (Van Breemen and Buurman, 2003; Buurman and Jongmans, 2005,
2002; Buurman et al., 2005; De Connick, 1980; Phillips and Fitzpatrick, 2008).
Segundo Buurman & Jongmans (2002, 2005), ambos os processos aventados
podem explicar a formação de horizontes espódicos em solos arenosos e bem drenados.
Tal é o caso dos sambaquis de núcleo arenoso, nos quais a MO aparece tanto na forma
de revestimentos monomórficos, como de pellets de MO polimórfica.
2.5.2. Formação de espodossolos em sambaquis de núcleo arenoso No caso de Santa Marta 10, a MO na fácies B superior, que representa o horizonte
B espódico, aparece maiormente na forma de revestimentos de MO monomórfica com
gretas. Isto significa que houve iluviação de MO desde o horizonte superficial
(Buurman & Jongmans 2002, 2005; De Connick 1980; Phillips & Fitzpatrick 1999). A
presença de bandas de impregnação no horizonte C (identificado como fácies A)
também corrobora este processo, já que a formação das bandas (ou horizontes plácicos)
deve-se igualmente ao transporte e precipitação da MO no frente de percolação, em
locais onde a água perde a capacidade de transporte 109 .
Em Carniça 3, o horizonte espódico está representado pela AF 2. Na AF 1, que
representa o horizonte C, não se observaram bandas de impregnação. Neste sambaqui, a
MO aparece maiormente na forma de pellets de MO polimórfica, mas também como
pseudo-revestimentos formados pela lavagem e desagregação dos pellets, junto com
alguns revestimentos de MO monomórfica. Isto significa que houve tanto iluviação de
detenção natural do fluxo de água. Esta precipitação resulta no horizonte iluvial rico em matéria orgânica
e metais solúveis, conhecido como horizonte espódico (Bh) (Van Breemen and Buurman, 2003).
109
Em espodossolos bem drenados, formam-se finas bandas de morfologia irregular debaixo do horizonte
B, que refletem descontinuidades no sistema de poros do solo, como canais de raízes, estratificação
sedimentar etc. (Van Breemen and Buurman, 2003; Buurman and Jongmans, 2005).
388
MO como decomposição de materiais orgânicos in situ no horizonte B. Portanto, podese pensar que a acumulação de MO na AF 2 de Carniça 3 derive da decomposição de
materiais vegetais (principalmente espécies arbustivas, como indicado pela análise
isotópica) que foram depositados junto com as areias quartzosas e conchas de molusco.
A iluviação de MO solúvel foi menor neste sambaqui, dada a menor freqüência de
revestimentos de MO monomórfica, além de ter sido possivelmente dificultada pela
presença das conchas de molusco inteiras.
No Brasil, espodossolos em terraços marinhos do Quaternário costeiro foram
estudados para o Estado de São Paulo, nos municípios de Bertioga, Cananéia e Ilha
Cumprida (Coelho et al., 2010; Coelho, 2008; Gomes, 2005; Lopes, 2010). Nestes
solos, identificou-se a formação de horizontes espódicos a partir da mobilização,
transporte e precipitação de MO iluvial e da decomposição in situ de raízes. Identificouse também uma correlação entre a idade dos depósitos e os atributos morfológicos dos
espodossolos, com menor espessura dos horizontes espódicos e ausência de cimentação
nos depósitos mais recentes. Ao extrapolar tais conclusões aos sambaquis estudados,
pode-se pensar que de fato a maior cimentação e espessura do horizonte espódico em
Santa Marta 10 é condizente com a maior antiguidade do sítio. Santa Marta 10 é mais de
3000 anos anterior a Carniça 3. Em Carniça 3, pelo contrário, não há cimentação por
revestimentos orgânicos, o sedimento é mais friável e o horizonte espódico menos
espesso.
Nos dois sambaquis analisados, o horizonte B aflora em superfície e não há
horizonte superficial de acumulação de restos orgânicos, nem horizonte eluvial. Esta
ausência relaciona-se à interrupção no suplemento de material orgânico no topo do
depósito arenoso. O abandono do sítio e o cessar da deposição antrópica de material
vegetal provocaram o desaparecimento do horizonte O, fonte dos ácidos orgânicos e
agente de retenção de sedimentos. Quando há interrupção no suprimento de material
vegetal fresco, a química da MO no horizonte A adota os atributos do horizonte E, onde
os metais são removidos pela MO iluvial e transportados até o horizonte B inferior.
Também no horizonte E, os restos orgânicos, não complexados por metais, são
consumidos pelos microrganismos do solo (Buurman & Jongmans, 2005; Buurman et
al. 2005). Isto deixa o horizonte A, agora com as características de horizonte E,
389
desprovido de componentes orgânicos e metálicos que outorguem coesão ao sedimento
que, ao ficar exposto, será erodido pela ação eólica até o total desaparecimento 110 .
O fenômeno de decapitação de horizontes de solo é frequente em áreas expostas
como esta, onde a erosão eólica é intensa. A perda de horizontes A e E por erosão eólica
foi quantificada em espodossolos arenosos, usados para agricultura, na Alemanha.
Medidas de erosão eólica indicaram que até 172 toneladas do material de solo por
hectare podem ser removidas pelo vento quando o solo está desprovido da vegetação
(Sauer et al., 2007).
2.5.3. Microcarvões e formação de horizontes espódicos Unicamente em Carniça 3 foram achados carvões macroscópicos na observação à
lupa da fração retida na malha de 1 mm, assim como fragmentos de osso calcinado e
carbonizado, tanto na malha de 1 mm como na de 0,5 mm. Fragmentos de osso também
foram identificados em seção delgada, junto com partículas opacas, pretas, que podem
corresponder a microcarvões. Em Santa Marta 10, apesar de não terem sido observados
carvões macro ou microscópicos, a alta concentração de C orgânico sugere a presença
destas partículas no sedimento. A presença de C derivado de microcarvões é de
interesse na discussão sobre a formação do horizonte espódico nos sambaquis de núcleo
arenoso.
Existem relatos, na literatura, da presença de carvões e microcarvões (como finas
partículas de 50-100 μm) na MO de horizontes B espódicos em solos arenosos, e que
perfazem a fração dominante de carbono nos horizontes B e C (Buurman et al., 2008). O
carvão, também denominado de carbono preto 111 , é resistente à decomposição por ser
quimicamente recalcitrante, o que favorece a sua permanência nos sedimentos
(Czimczik and Masiello, 2007), além de contribuir com a estabilização e retenção da
MO (Glaser, 2000; Liang et al., 2006; Lima et al., 2002 a).
110
Como o horizonte E pode ser erodido por causas naturais ou antrópicas (lavoura), ou pode estar
mascarado pela coloração do material parental ou pela presença de MO ou atividade biológica, a sua
existência não é usada como critério diagnóstico de espodossolos nos sistemas de classificação da FAOUnesco ou na taxonomia de solos norte-americana. Nestes sistemas, a identificação de MO, Al ou Fe
iluvial são suficientes para identificação dos horizontes espódicos (Stutzer, 1998).
111
O carbono preto (black carbon) produz-se a partir da combustão de materiais orgânicos tais como
combustíveis fósseis, madeira e vegetação (Schmidt and Noack, 2000). Do ponto de vista químico é
considerado inerte, embora estudos recentes mostraram que pode ser suscetível a alterações diagenéticas
(Cohen-Ofri et al., 2006). 390
Na Amazônia, fragmentos de carvão nas frações areia e silte, junto com
fragmentos de argila rubefacta, foram identificados em espodossolo arenoso associado
ao sítio arqueológico Dona Stella (Arroyo-Kalin, 2008). Neste local, identificou-se um
extenso sítio lítico, pré-cerâmico, datado entre 10,8-10,6 e 5,3-5,1 kA cal. AP, em
horizonte espódico que se localiza sob horizonte eluvial de até 1.5 m de profundidade.
O estudo macromorfológico, geoquímico e micromorfológico realizado por ArroyoKalin (2008) concluiu que o perfil de solo atual resultou da transformação de um
latossolo argilico (clayey Oxisol), com seqüência A+AB+B, em um gigantesco
espodossolo. A ocupação humana, cujos restos se observam atualmente no horizonte B
espódico, teria acontecido sobre um antigo perfil A+AB, que hoje se observa como
sequência EB+Bh. Este horizonte teria sido podzolizado e gradualmente soterrado por
sedimentos arenosos derivados da erosão de horizontes eluviais a partir de porções mais
altas do relevo. Pela análise micromorfológica, o autor observou que no atual horizonte
espódico a MO não é exclusivamente de origem iluvial, como propõe a teoria clássica
sobre formação de espodossolos (ver Burrman & Jongmans, 2005), mas que inclui uma
porção considerável de microcarvões que aparecem como agregados intergranulares,
cuja origem não seria iluvial, mas deposicional e associada à ocupação humana
pretérita.
Na Dinamarca, foi encontrada uma pequena ocorrência de espodossolo, de 2 m de
diâmetro, em área de neossolos quartzarênicos (Arenosol) utilizados em tempos préhistóricos para agricultura (Kristiansen, 2001). O espodossolo está associado a um local
de queima de carvão, datado de tempos medievais. No entanto, como a influência do
carvão no processo de podzolização é ainda um tema pouco desenvolvido na literatura,
os autores não aprofundam na temática.
Assim, espodossolos podem formar-se a partir de acumulações de MO não
necessariamente derivadas da liteira superficial pobre em nutrientes em solos arenosos e
bem drenados, mas também de acumulações de carbono preto derivado da queima de
plantas, como se observou tanto em solos naturais como em solos associados à
ocupação humana. Nos sambaquis de núcleo arenoso, microcarvões associados a
fogueiras antrópicas podem vir a fazer parte da MO que perfaz o horizonte espódico,
especialmente da MO que aparece na forma de agregados intergranulares (ver ArroyoKalin 2008). Microcarvões são essencialmente deposicionais e podem fazer parte da
MO polimórfica, mas se a sua granulação é fina o suficiente, podem ser transportados
desde horizontes superiores junto com a água de chuva que percola no solo.
391
A influência humana como agente na formação de espodossolos também foi
observada na Grã Bretanha, Dinamarca, Holanda, Alemanha, França e Bélgica, em
solos deflorestados para práticas agrícolas que remontam até o Neolítico (ver
referências em Macphail, 1989; Mikkelsen et al., 2007; Sauer et al., 2007). Por
exemplo, grandes áreas de floresta foram transformadas em campos para agricultura
através do desmatamento e queima durante a Idade do Bronze na Inglaterra. Isto teria
desencadeado a remoção dos nutrientes do solo, acidificação e incremento da iluviação
que, em última instância, provocou a transformação de antigos solos de areia argilosa,
associados a florestas, em espodossolos (Dimbleby, 1962).
2.6. MICROFÁCIES A identificação de microfácies nos sambaquis de núcleo arenoso foi mais
simples que nos sambaquis de padrão estratigráfico conchífero, devido à maior
simplicidade e semelhança das microfábricas. Segundo os cinco parâmetros
mencionados no Capítulo 4, tópico 1.2.2, no sítio Santa Marta 10 foram identificadas
duas microfácies, uma correspondente a Fácies B e outra a Fácies A, subjacente. A
Fácies B foi descrita como horizonte espódico. A Fácies A representa o núcleo arenoso
de paleoduna de geração 2. No sambaqui Carniça 3, identificou-se uma única
microfácies correspondente à AF 2, também descrita como horizonte espódico, na qual
aparecem conchas inteiras de A. brasiliana, fragmentos de osso queimado e carvões.
Assim, existem três microfácies nos sambaquis de núcleo arenoso estudados: 1)
horizonte B espódico com revestimentos de MO monomórfica; 2) horizonte B espódico
com pellets de MO polimórfica em arcabouço de conchas; 3) sedimentos eólicos.
2.6.1. Microfácies tipo F: horizonte espódico iluvial A microfácies tipo F refere-se à amostra coletada da Fácies B do sítio Santa
Marta 10, interpretada como horizonte espódico desenvolvido sobre sedimentos eólicos.
Suas características micromorfológicas agrupam-se no Quadro 6.10.
392
Quadro 6.10. Características da microfácies tipo F.
Microestrutura
Dist. rel. g/f
Vazios
Porosidade
Razão g/f
Fração grossa
Distribuição da
fração grossa
Micromassa
MICROFÁCIES TIPO F
Grãos revestidos e microagregados intergranulares (50-100 μm de comprimento)
Quitónica, com áreas de distribuição gefúrica e enáulica
De empacotamento complexo, canais e vesículas
10-20 %
90/20
1) Grãos de quartzo subarredondados e subangulosos, nas classes areia fina e areia
muito fina (90 %); 2) grãos de feldspato (3 %); 3) minerais pesados anisótropos e
opacos (3 %); 4) clastos de argila (4 %). 2 a 4 na fração areia muito fina.
Aleatória
Revestimentos de MO monomórfica e alguns pellets de MO polimórfica
Pela presença de MO iluvial, esta microfácies ter-se-ia formado a partir da
degradação de resíduos vegetais depositados no topo do sítio, sobre um episódio de
deposição eólica que soterrou o anel de conchas que caracteriza este sambaqui como
sugere a análise estratigráfica do sítio apresentada no Capítulo 5, tópico 2.2.1.
2.6.2. Microfácies tipo G: horizonte espódico em matriz de conchas e areia Esta microfácies representa a AF 2 do sambaqui Carniça 3, interpretada como
horizonte
espódico
desenvolvido
sobre
montículo
arenoso
formado
pelo
retrabalhamento antrópico de sedimentos eólicos ou de cordões litorâneos. As suas
características micromorfológicas agrupam-se no Quadro 6.11.
Quadro 6.11. Características da microfácies tipo G.
Microestrutura
Dist. rel. g/f
Vazios
Porosidade
Razão g/f
Fração grossa
Distribuição da
fração grossa
Com. menores
Micromassa
MICROFÁCIES TIPO G
Microagregados intergranulares (50-200 μm de comprimento) com pseudorevestimentos
Enáulica
De empacotamento complexo
60 %
80/20
1) Conchas inteiras e fragmentadas de A. brasiliana (3% com sinais de alteração
térmica a baixa temperatura); 2) grãos de quartzo arredondados e subarredondados
na fração areia fina (40 %); 2) grãos de feldspato na fração areia muito fina (5 %);
3) fragmentos de osso na fração areia fina a grossa (3 %)
Conchas com distribuição sub-horizontal; ossos com distribuição aleatória
Raízes frescas
MO polimórfica na forma de pellets, com pseudo-revestimentos de pellets soldados
e ocasionais revestimentos de MO monomórfica
393
Nesta microfácies, domina a micromassa de agregados tipo pellets de MO
polimórfica, entre e aderidos à fração grossa, sobre os revestimentos de MO
monomórfica. Isto significa que o teor de MO iluvial neste horizonte é menor que em
Santa Marta 10, por exemplo, e que a MO presente é maiormente deposicional. Assim,
pode-se pensar que a formação de AF 2 envolveu a deposição de conchas inteiras, com
resíduos da queima, como ossos e carvões.
2.6.3. Microfácies tipo H: duna eólica Esta microfácies, de origem natural, corresponde à Fácies A de Santa Marta 10 e
representa sedimentos eólicos de geração 2. Suas características micromorfológicas
agrupam-se no Quadro 6.12.
Quadro 6.12. Características da microfácies tipo H.
Microestrutura
Dist. rel. g/f
Vazios
Porosidade
Razão g/f
Fração grossa
Distribuição
fração grossa
Micromassa
da
MICROFÁCIES TIPO H
Grãos simples e revestidos
Mónica e quitónica
De empacotamento simples
40 %
95/5
1) Grãos de quartzo arredondados e subarredondados na fração areia fina a muito
fina (90 %); 2) grãos de feldspato (3 %); 3) minerais pesados anisotrópicos e
opacos (3 %); 4) clastos de argila (4 %). 2 a 4 na fração areia muito fina.
Aleatória
MO monomórfica na forma de revestimentos
2.7. FORMAÇÃO DE SAMBAQUIS DE NÚCLEO ARENOSO Os sambaquis de núcleo arenoso são sítios concomitantes aos conchíferos, desde
as épocas mais remotas, até hoje documentadas, de ocupação da costa catarinense pelos
grupos sambaquieiros. Apesar de serem comumente considerados estruturas satélite aos
grandes sambaquis conchíferos (ver Assunção 2010 e Peixoto 2008), os sambaquis de
núcleo arenoso comportam características únicas que os definem como locais exclusivos
para a realização de atividades específicas. Com isto, quer-se dizer que não parece haver
relação direta entre os sambaquis de núcleo arenoso e os grandes sambaquis
394
conchíferos, pelo menos em termos de processos de formação, apesar da proximidade
frequentemente observada entre ambos os tipos de sítio.
No caso de Santa Marta 10, o sambaqui de núcleo arenoso mais antigo da
região, a ocupação consistiu na deposição massiva de conchas de moluscos, na forma de
anel, sobre paleoduna eólica. Esta estrutura particular teria sido soterrada
posteriormente por areia, de transporte eólico ou antrópico das proximidades, e
recoberto com material vegetal, possivelmente queimado, como indica a análise
estratigráfica do sítio. Já Carniça 3 teria sido completamente erguido pela ação humana,
com transporte de sedimentos arenosos, para construir o núcleo do sítio, e deposição, no
topo, de conchas com areia e alguns resíduos de queima.
Em ambos os casos, resulta clara a natureza efêmera da ocupação em
comparação com os grandes sambaquis conchíferos, no entanto, alguns indicadores
servem para entender que, apesar da simplicidade, existiu planejamento e intenção na
construção dos sítios. Em Santa Marta 10, a coleta e transporte de moluscos desde a
costa, provavelmente de baía, até o topo do morro de Santa Marta, a quase 25 m de
altura sobre o nível do mar, teria sido a ação mais planejada e demorada na formação do
sítio. Da mesma maneira, em Carniça 3, a coleta e transporte de areias para elevação de
um montículo de quase 5 m de altura, também responde a um projeto planificado de
construção de formas antrópicas na paisagem. Estes processos eram culminados, e
fechados, pela deposição de restos vegetais, principalmente, e restos ósseos queimados.
Como mostrado no Capítulo 5, tópico 1.1, é extremamente difícil identificar fogueiras
antigas acesas sobre substrato arenoso, o que impossibilita o reconhecimento do local
original onde teria sido efetuada a queima, seja nas proximidades ou sobre Carniça 3 e
Santa Marta 10. Outra alternativa seria pensar na queima e/ou deterioro in situ, de
estruturas de cobertura feitas com materiais vegetais (troncos, folhas, galhos).
395
Como já proposto para o sambaqui de núcleo arenoso Encantada 3 (Klokler et
al., 2011; Villagran et al., 2011 b) a pouca diversidade de atividades identificadas neste
tipo de sítio impedem a sua associação com sítios de habitação ou sítios funerários. No
entanto, existe um propósito claro na sua construção, como mencionado antes, que pode
estar vinculado ao levantamento de marcadores territoriais, ou à realização de rituais de
caráter esporádico, como cerimônias de iniciação ou ritos de passagem 112 .
3. MONTÍCULOS ICTIOLÓGICOS Os sítios analisados que se agrupam na categoria de montículos ictiológicos
estão localizados no setor externo e pertencem à fase 4 de ocupação pré-histórica do
litoral (Giannini et al. 2010), momento associado à intensificação do contato com os
grupos Jê do interior. Ambos os sítios são definidos nesta tese como “mistos” por
apresentarem uma conjunção de atributos próprios das culturas litorâneas, como
economias marítimas e sepultamentos em montículos compostos por restos faunísticos,
com elementos dos grupos do planalto, como cerâmica Taquara/ Itararé.
A partir da descrição macroscópica feita em campo, existem três grupos de
arqueofácies diferentes nos sambaquis conchíferos analisados. Dois grupos agrupam
depósitos de caráter antrópico e um inclui o substrato natural, de natureza arenosa, onde
se estabelece a ocupação. Entre as fácies ou arqueofácies descritas e amostradas,
distinguem-se entre: 1) arqueofácies decimétricas com predomínio de fragmentos de
osso (AF 2 e 3 de Santa Marta 8); e 2) arqueofácies decimétricas pretas com restos
112
A modo de exemplo, cabe citar o caso dos sítios associados com os rituais conhecidos como Chiejaus
e Kina, praticados entre os Yamana da Terra do Fogo. Estas cerimônias realizavam-se a cada três ou
cinco anos e tinham o propósito, no caso do Chiejaus, de instruir os jovens homens e mulheres do grupo
quanto a seus papéis na sociedade e, no caso do Kina, de reforçar o papel dos homens como líderes do
grupo. Apesar de serem realizados com regularidade, estes rituais não possuíam momentos ou
circunstâncias fixas e preestabelecidas para sua realização; mas existiam algumas preferências, como
disponibilidade de madeiras nas proximidades, cercania com outras cabanas etc. (Vila et al., 2004). Neste
sentido, pode-se pensar que os sambaquis de núcleo arenoso podem ser remanescentes dos rituais de
funcionamento interno da comunidade sambaquieira, onde se instruía aos jovens membros do grupo as
suas funções socialmente estabelecidas.
396
ósseos e vegetais queimados (AF 1 de Galheta 4); 3) fácies/arqueofácies arenosa com
elementos antrópicos intrusivos (Fácies A de Galheta 4 e AF 1 de Santa Marta 8).
Três grupos de arqueofácies/fácies compõem os sítios Santa Marta 8 e Galheta 4:
1) Decimétrica, com domínio de fragmentos de osso
2) Decimétrica preta, com restos (ósseos e vegetais) queimados
3) Arqueofácies/fácies arenosa, com elementos antrópicos intrusivos (fragmentos
de osso e carvão).
Nos tópicos a seguir, apresenta-se a discussão das análises laboratoriais
realizadas nas arqueofácies amostradas nos dois montículos ictiológicos.
3.1. SEDIMENTOS TERRÍGENOS As análises granulométricas realizadas nos sítios Santa Marta 8 e Galheta 4
confirmam a tendência, observada tanto nos sambaquis conchíferos como nos
sambaquis de núcleo arenoso, de controle geográfico nas areias terrígenas dos sítios
arqueológicos.
No sítio Santa Marta 8, existe afinidade entre o depósito arqueológico e o
sedimento natural amostrado na trincheira extra-sítio, ambos com moda na fração areia
fina. No Galheta 4, o depósito eólico subjacente (Fácies A) apresenta moda na fração
areia muito fina, enquanto a camada de ocupação e o depósito eólico superior têm moda
na fração areia fina. A comparação da estatística descritiva das distribuições
granulométricas no sítio arqueológico com as quatro gerações de dunas eólicas
identificadas na região indica afinidade com paleodunas de geração eólica 3, para a AF
1 e fácies B, e com paleodunas de geração 2, para a Fácies A. A afinidade da Fácies A
com as dunas de geração 2 é reforçada pela coloração amarelada e presença de bandas
de impregnação, características frequentes nesta geração de dunas segundo Giannini
(1993). Esta observação é também coerente com a cronologia do sítio, já que a
ocupação em Galheta 4 teria acontecido sobre dunas de geração 2 já estabilizadas,
momento em que dunas de geração 3, cuja formação inclui os últimos séculos (Giannini
1993), estavam ainda ativas.
397
As areias terrígenas dos montículos Santa Marta 8 e Galheta 4 assemelham-se, em
termos granulométricos, aos depósitos arenosos das proximidades dos sítios.
3.2. RESÍDUOS VEGETAIS E ANIMAIS Análises isotópicas de C e N (δ13C e δ15N) e razão C/N foram realizadas em três
amostras arqueológicas e duas amostras de sedimento natural. No sítio Santa Marta 8,
analisou-se a MO das AF 2 e 3, e da Fácies B extra-sítio, enquanto no Galheta 4 foi
analisada a MO da AF 1 e da Facies B, depósito arenoso que cobre a camada de
ocupação.
Os valores de δ13C nas amostras arqueológicas variam de -20,80‰ a -22,83‰, o
que indica presença de plantas C3 tanto no sítio Santa Marta 8 como no Galheta 4
(segundo valores de referência em: Boutton, 1996; Lamb et al., 2006; Meyers, 1997; De
Niro and Epstein, 1978; De Niro and Hastrof, 1985; Sifeddine et al., 2004). Os valores
de δ15N são os mais altos do conjunto de amostras analisadas nesta tese, com valor
mínimo de 13,52‰, para a AF 3 de Santa Marta 8, e valor máximo de 15,94‰, na AF 1
de Galheta 4. Estes valores indicam alta concentração de resíduos de origem animal na
MO (Fogg et al. 1998; Kendall 1998; Schoeninger & DeNiro 1984), especialmente de
animais marinhos (Bem-David et al. 1998; Comisso & Nelson 2006; Schoeninger &
DeNiro 1984; Wainright et al. 1998), misturados com restos de plantas C3. Esta
constatação é condizente com a assembleia faunística dos dois montículos ictiológicos,
onde destaca a concentração de ossos de peixe, especialmente em Santa Marta 8, junto
com carvões.
Como mostrado no Capítulo 5, tópico 2.3.1, as análises isotópicas, junto com a
observação à lupa da amostra proveniente da Fácies B da trincheira aberta nas
proximidades de Santa Marta 8, indicam ocupação humana na região em local externo
aos sambaquis e sem construção de estrutura monticular. A Fácies B, de areia lamosa
preta, foi identificada em campo entre duas fácies arenosas, uma de areia clara
subjacente (Fácies A) e outra de areia fina marrom superior (Fácies C). A assinatura
isotópica de δ13C e δ15N neste depósito indica presença de resíduos de origem animal
398
decompostos (δ15N de 13,54‰). Isto mostra a influência antrópica na sua formação e
uma possível contemporaneidade à ocupação de Santa Marta 8 (embora seja necessária
uma datação para corroborar essa hipótese). A existência de locais de ocupação fora dos
sambaquis na região do paleotômbolo de Santa Marta é igualmente sugerida pelos
estudos geofísicos realizados por Rodrigues (2009), onde observaram-se anomalias em
sub-superfície interpretadas como possíveis áreas de ocupação humana pré-colonial.
As arqueofácies que constituem os montículos ictiológicos estão compostas por uma
mistura entre resíduos derivados da decomposição de restos de animais marinhos e
plantas C3. A aproximadamente 100 m a NE de Santa Marta 8, detectou-se uma camada
de ocupação soterrada por sedimentos arenosos modernos, com o mesmo predomínio de
resíduos de origem animal observado na MO do sambaqui. Isto demonstra a existência
de áreas de ocupação localizadas nas proximidades dos sambaquis, como já sugerido
para os sambaquis de padrão estratigráfico conchífero.
3.3. MICRO­COMPONENTES Nos dois montículos estudados, coletaram-se cinco amostras para análise
micromorfológica. No Santa Marta 8, uma amostra é do contato entre as AF 1 e 2 e
outras duas amostras são da AF 3. No Galheta 4, uma amostra foi coletada da transição
entre a Fácies A e AF 1, e outra da AF 1. A observação na escala microscópica permite
definir que, em termos gerais, Santa Marta 8 apresenta semelhanças com os sambaquis
conchíferos, enquanto Galheta 4 é similar aos sambaquis de núcleo arenoso pela
presença de sedimentação eólica. A maior diferença que se observa entre os montículos
ictiológicos e os sambaquis conchíferos e de núcleo arenoso refere-se à substituição das
conchas por ossos inteiros e fragmentados.
3.3.1. Componentes minerais A fração mineral em ambos os sítios é dominada por grãos de quartzo,
arredondados a subarredondados na fração areia fina a muito fina, com presença
399
subordinada de feldspatos arredondados, minerais pesados e ocasionais fragmentos
líticos. Estes componentes são predominantes nas fácies e arqueofácies que representam
o substrato de ocupação dos dois sítios analisados (Fácies A em Galheta 4 e AF 1 em
Santa Marta 8), onde também aparecem misturados com componentes biológicos
(ossos, carvão) e produtos da alteração antrópica (escória vítrea) intrusivos,
provenientes das arqueofácies superiores.
Em termos quantitativos, grãos de quartzo dominam a fração mineral da AF 1 de
Santa Marta 8 (80%), junto com grãos de feldspato (5%). A concentração de grãos
minerais diminui nas AF 2 e 3, com redução de até 25%. Em Galheta 4, grãos de
quartzo predominam tanto na Fácies A, como na AF1 (~55 %).
A análise micromorfológica corrobora as constatações realizadas pela análise
granulométrica, ao confirmar o predomínio de areias quartzosas em ambos os
montículos ictiológicos. No Santa Marta 8, existe diminuição na porcentagem de
sedimentos terrígenos entre o substrato de ocupação (AF 1) e os depósitos antrópicos
(AF 2 e 3). Já no Galheta 4, existe paridade na porcentagem de areias.
3.3.2. Componentes biológicos, biominerais e produtos da alteração antrópica Os componentes biológicos e produtos da alteração antrópica, como fragmentos
de osso, carvão e escória vítrea, representam 80% da fração grossa das AF 2 e 3 do sítio
Santa Marta 8, e cerca de 50 % da AF 1 do Galheta 4. Destes componentes, os
fragmentos de osso predominam em ambos os sítios, no entanto, existem algumas
diferenças, que se referem a: 1) frequência de aparição; 2) tamanho dos fragmentos; 3)
distribuição básica; 4) estado de alteração.
Tanto na observação macroscópica em campo como no estudo microscópico, a
concentração de ossos é sempre maior no sítio Santa Marta 8, onde eles perfazem a
maior parte da fração grossa (70% vs. 20 % no Galheta 4). Esta diferença está associada
ao tamanho dos fragmentos, com predomínio de espécimes centimétricos, incluindo
ossos inteiros, no Santa Marta 8. No Galheta 4, há predomínio de fragmentos menores,
na fração areia fina a muito fina, com seleção granulométrica moderada. As diferenças
de frequência e tamanho dos ossos observam-se-se, igualmente, na distribuição deste
400
componente nas lâminas. Nas AF 2 e 3 de Santa Marta 8, cerca de 80% dos ossos têm
distribuição horizontal, enquanto no Galheta 4 todos os fragmentos, maiores e menores,
estão distribuídos aleatoriamente. Por último, outra diferença refere-se ao estado de
alteração dos ossos, com predomínio de ossos queimados, no sítio Galheta 4, versus
intemperizados, no Santa Marta 8.
Em termos gerais, a distribuição e alteração dos componentes do sítio Santa
Marta 8 são semelhantes ao descrito para sambaquis de padrão estratigráfico conchífero.
Por exemplo, a maioria dos ossos apresenta birrefringência e fosforescência variáveis,
inclusive fragmentos contíguos, associadas à perda de colágeno e mudanças
mineralógicas relacionadas com a queima (Mccutcheon, 1992; Schiegl et al., 2003), ou
à degradação do colágeno por dissolução ou ataque microbiano (Schoeninger et al.,
1989; Trueman and Martill, 2002; Trueman et al., 2004).
No sítio Santa Marta 8, há evidências de contato direto dos ossos com o fogo,
mistura de materiais com diversos graus de queima (identificados pelas suas
propriedades ópticas a PPL, XPL e UV), alta fragmentação dos ossos menores (produto
da fragilidade provocada pela queima) e nenhuma evidência, no perfil analisado, de
fogueira in situ. Isto indica retrabalhamento de restos queimados, localizados a
diferentes distâncias da fonte de calor, desde uma área de acumulação e queima. Como
também discutido para os sambaquis conchíferos, a assinatura isotópica de restos de
tecido animal indica que existe aporte de tecidos moles e não unicamente ossos.
Apesar da distribuição horizontal dos restos ósseos na AF 3, não existem
evidências de pisoteamento intenso sobre o depósito, como empacotamento fechado ou
baixa porosidade. Pelo contrário, os fragmentos de osso maiores estão bem preservados
e não há indícios de alterações físicas, além das produzidas pela passagem da fauna e
raízes no solo. No entanto, na AF 2 a situação é diferente, já que aí se encontra menor
porosidade e empacotamento fechado dos componentes da fração grossa (grãos de
quartzo e fragmentos de osso). Além disso, a micromassa é essencialmente mineral,
com microcarvões e matéria orgânica. Isto sugere que AF 2 possa representar o
substrato da primeira ocupação do sítio, sem episódio construtivo. Acima deste terreno,
teria começado a atividade de deposição de resíduos.
A distribuição aleatória e seleção mderada dos fragmentos de osso e carvão no
montículo Galheta 4, junto com a espessura decimétrica da camada de ocupação (AF 1)
(menos espessa que na porção do sítio onde foram achados sepultamentos recobertos
por ossos de peixe), sugerem que a área de amostragem representa um local periférico
401
do núcleo de ocupação. A esta porção do sítio, chegariam os fragmentos mais finos,
transportados pelo intenso vento do local, e ocasionais fragmentos maiores. Na camada
de ocupação, cerca de 90% dos fragmentos de osso estão queimados, enquanto os 10 %
restantes apresentam graus variáveis de destruição do colágeno, devida tanto à queima
como à alteração microbiana. A cotidianidade da ocupação e transporte eólico de
partículas teria formado uma camada delgada de restos de queima associados a
ocupação sobre o substrato de duna eólica estabilizada.
As características microscópicas dos componentes biológicos e produtos da alteração
antrópica no montículo Santa Marta 8 indicam retrabalhamento de materiais
acumulados, e queimados, em local diferente da deposição final. Estas evidências
também sugerem presença de um episódio de ocupação sobre os substrato arenoso
prévio ao levantamento do montículo. No Galheta 4, a granulometria e seleção
moderada dos fragmentos de osso, junto com a pouca espessura da camada de ocupação
(AF 1), sugerem que a seção vertical amostrada representa uma área periférica do
núcleo da ocupação, com transporte eólico de materiais antrópicos a partir das
proximidades.
3.3.3. Fração fina Em Santa Marta 8, a fração fina é essencialmente fosfática, derivada da
fragmentação dos ossos em finas partículas na fração silte e da dissolução e precipitação
do mineral dos ossos (inferido pelas propriedades ópticas e pela proporção entre Ca e P
detectadas nas análises com sistema MEV-EED). A maior vulnerabilidade dos ossos de
peixe à dissolução (Szpak, 2011), junto com o regime hidrológico da área de estudo,
teriam favorecido a alteração diagenética destes materiais (ver Berna et al., 2004;
Gordon and Buikstra, 1981; Lucas and Prévôt, 1991; Schiegl, 1996; Trueman et al.,
2004; Weiner, 2002). A alteração dos ossos teria sido mais intensa no montículo
ictiológico que nos sambaquis conchíferos, devido à ausência de conchas que
alcalinizem o pH e protejam os ossos da dissolução (ver Berna et al., 2004; Gordon and
Buikstra, 1981; Nielsen-Marsh et al., 2007).
Unicamente na AF 2, que se encontra no contato entre o substrato arenoso e o
montículo ictiológico (AF 3), observou-se matriz de argilominerais misturada com
402
microcarvões e fragmentos de osso, inclusive na forma de revestimentos impuros ao
redor dos componentes da fração grossa e das paredes dos poros. A presença de
revestimentos impuros, micro-laminados, indica iluviação de componentes finos até as
arqueofácies inferiores. Este processo é semelhante ao observado na duna eólica
amostrada nas proximidades de Santa Marta 10 e é característico do desenvolvimento de
solos sobre depósitos arenosos em áreas com pluviosidade constante 113 .
Os revestimentos impuros que caracterizam a AF 2 indicam deslocamento de
partículas de argila junto com MO em dispersão desde a superfície do solo. A formação
de revestimentos impuros associa-se a fatores naturais e também antrópicas. Entre os
fatores naturais, os revestimentos impuros consideram-se indicadores das fases iniciais
do deslocamento de argilas (Kuhn et al., 2010). Entre os antrópicas, está o
desmatamento, cultivo, ou pisoteamento (animal ou humano) sobre superfície do solo
sem vegetação (Beckman and Smith, 1974; Carter and Davidson, 1998; Courty et al.,
1989; Gebhardt and Langohr, 1999; Jongerius, 1983; Macphail, 1989; Macphail et al.,
1987, 1990). Após a retirada da vegetação, quando a superfície do solo fica exposta, o
impacto da água da chuva nos agregados torna-se maior e provoca sua destruição, com
migração da lama resultante até a subsuperfície. Os indicadores de compactação na AF
2, junto com a presença de revestimentos impuros, reforçam a hipótese da AF 2 se tratar
de uma superfície de ocupação anterior à construção do montículo, sobre a qual houve
pisoteamento humano.
A fração fina de Santa Marta 8 também apresenta áreas de concentração de
materiais silicosos, como agregados de escória vítrea e alguns fitólitos, que representam
os resíduos da queima de material vegetal. Estes materiais foram também identificados
na micromassa da camada preta de Jabuticabeira 2 (Villagran, 2008; Villgran et al.
2009, 2010), em microfácies compostas por ossos alterados intempérica e termicamente.
A associação entre resíduos de material vegetal e ósseo queimados, tanto em Santa
113
Solos arenosos e silicáticos oferecem as condições de pH, cátions disponíveis e MO dissolvida para a
dispersão das argilas e migração vertical, favorecida pela porosidade e água das chuvas. As argilas
depositam-se quando há interrupção no suprimento de água, quando diminui a porosidade ou quando uma
alta concentração de eletrólitos favorece a floculação. A água das argilas é sugada até as paredes dos
poros e os minerais de argila permanecem com orientação paralela às paredes dos poros (Dorronsoro and
Aguiar, 1988). A repetição deste ciclo, durante o próximo episódio de chuvas, resulta no alargamento do
revestimento, com deposição de micro-camadas de argila límpida ou impura de acordo com as mudanças
no regime hidrológico e transporte de MO dispersa. A formação de meniscos e revestimentos contínuos
ao redor dos grãos de areia, que se observam principalmente nos revestimentos da AF 2, deve-se a sucção
e evaporação lenta da água das argilas, com retenção por adsorção e capilaridade de argilominerais em
suspensão ao redor dos grãos de areia (Kuhn et al., 2010).
403
Marta 8 como na camada preta de Jabuticabeira 2, pode ser tomada como indicativa de
afinidade nos processos de formação de ambos os depósitos.
No sítio Galheta 4, a fração fina apresenta as mesmas características descritas
para os sambaquis de núcleo arenoso, com micromassa de grãos revestidos de MO
monomórfica, indicativa de iluviação de MO dissolvida, e pellets de MO polimórfica
com microcarvões, que aponta à decomposição in situ de resíduos vegetais (Van
Breemen and Buurman, 2003; Buurman and Jongmans, 2005; Wilson and Righi, 2010).
A inclusão de finos fragmentos de osso nos revestimentos de MO sugere que a iluviação
do material orgânico foi posterior à deposição dos resíduos, neste caso ossos, carvão e
microcarvão.
Na observação macroscópica do perfil estudado no Galheta 4, observa-se a
formação de um horizonte eluvial incipiente embaixo do horizonte espódico (ver Figura
5.94). Este tipo de horizonte eluvial forma-se pela percolação lateral da água no solo,
responsável, também, pela presença de bifurcações nas bandas de impregnação que se
observam na fácies A (Wilson and Righi, 2010).
No sítio Santa Marta 8, a composição da micromassa evidencia a dissolução e
precipitação de minerais fosfáticos derivados, principalmente, da alteração química dos
ossos e da decomposição de resíduos orgânicos. A mistura do material fosfático com
resíduos silicosos derivados da queima de material vegetal aponta à semelhança do
Santa Marta 8 com a camada preta do Jabuticabeira 2. Unicamente na AF 2, que se
encontra no contato entre o substrato arenoso natural (AF 1) e a arqueofácies
construtiva (AF 3), acharam-se evidências de pisoteamento em superfície. Estas
evidências, junto com a alta compactação do depósito, apóiam a hipótese da AF 2 se
tratar de uma superfície de ocupação, anterior ao levantamento do montículo. No sítio
Galheta 4, existem evidências de formação de horizonte espódico na AF 1 a partir da
degradação e iluviação de MO depositada em superfície, e junto com os fragmentos de
osso, carvão e microcarvão.
404
3.4. MICROFÁCIES Nas cinco seções delgadas analisadas nos sítios Santa Marta 8 e Galheta 4,
foram identificadas quatro microfácies, três das quais aparecem exclusivamente no
Santa Marta 8. A quarta representa a camada de ocupação no Galheta 4. As três
microfácies identificadas no Santa Marta 8 correspondem com as arqueofácies descritas
em campo: substrato arenoso sobre o qual se estabelece a ocupação (AF 1); camada de
ocupação pré-levantamento do montículo (AF 2 ); e montículo ictiológico propriamente
dito (AF 3). No Galheta 4, as duas seções delgadas analisadas envolvem a AF 1 e a
transição com a paleoduna eólica subjacente.
3.4.1. Microfácies tipo I: retrabalhamento de resíduos com predomínio de ossos A microfácies tipo I agrupa as duas seções delgadas coletadas na AF 3 no sítio
Santa Marta 8 (mF 3a e 3b), que representam acumulação monticular de ossos de peixe
e demais detritos antrópicos. As suas características micromorfológicas agrupam-se no
Quadro 6.13.
Quadro 6.13. Características da microfácies tipo I.
Microestrutura
Dist. rel. g/f
Vazios
Porosidade
Razão g/f
Fração grossa
Distribuição da
fração grossa
Comp. menores
Micromassa
MICROFÁCIES TIPO I
Microagregados intergranulares
Enáulica
De empacotamento complexo
40-45 %
80/20
1) Fragmentos de osso (70 %) de tamanho variável, com perda de colágeno
associada a queima, alteração microbiana e dissolução; 2) grãos de quartzo
arredondados e subarredondados na fração areia fina e muito fina (20 %); 3) grãos
de feldspato na fração areia fina (3 %); ocasionais fragmentos líticos na fração areia
fina e fragmentos de carvão (total de 3 %).
Ossos com distribuição horizontal e sub-horizontal (80 %). Grãos minerais e carvão
com distribuição aleatória
Ocasional presença de fitólitos, agregados de diatomáceas e diatomáceas dispersas
Agregados de micro-fragmentos de apatita biogênica com fosfato secundário, áreas
de micromassa carbonosa (produto da compactação física de carvões) e de
micromassa silicosa associada à combustão de plantas
Esta microfácies representa o produto da deposição massiva de restos,
principalmente ósseos, com evidência de queima em local diferente do de deposição
405
final. Assemelha-se à microfácies de tipo A, descrita para os sambaquis de padrão
estratigráfico conchífero, sem a presença de conchas e da micrita relacionada com a sua
degradação. A alta porosidade do depósito e a boa preservação dos fragmentos maiores
de osso sugerem que não houve pisoteamento. A distribuição horizontal dos osso está
possivelmente associada ao momento de deposição do material e consolidação posterior
dos sedimentos (ver Andrews 2005). A micromassa é essencialmente composta por
finos agregados de fragmentos de osso que possuem aparência de fosfatos secundários,
mas que, na realidade, formaram-se pela debilitação do osso por processos bioquímicos
e fragmentação física posterior.
A pesar da semelhança, em termos de processo de formação cultural, entre a
microfácies tipo I e a microfácies tipo A, descrita para os sambaquis conchíferos, existe
uma diferença entre ambas. No sítio Santa Marta 8, há mais restos vegetais que nos
sambaquis conchíferos, na forma de resíduos silicosos e fitólitos. Isto sugere que houve
maior aporte de plantas na formação dos montículos ictiológicos. Frequências
comparáveis de matriz silicosa e resíduos associados a epiderme de gramíneas foram
identificados também na camada preta de Jabuticabera 2, semelhante em composição e
cronologia com Santa Marta 8.
Assim como proposto para a camada preta de Jabuticabeira 2 e para a
microfácies tipo A dos sambaquis conchíferos, as características macro e
micromorfológicas da microfácies tipo I são assemelháveis a depósitos secundários de
tipo midden. Isto estende ainda mais, no tempo, a prática de acumulação de resíduos na
construção dos sítios da região, o que teria perdurado até e após a intensificação do
contato com os grupos do planalto. Neste sentido, a continuidade desta prática, já
mostrada para Jabuticabeira 2 (Villagran et al. 2010), deve ser explicada no contexto de
interação entre as duas populações, já que não existem montículos formados por ossos
de peixe em sítios do planalto associados às populações Jê. Isto sugere que, apesar da
intensificação dos contatos e chegada da cerâmica Taquara/Itararé ao litoral, seria a
mesma população litorânea a responsável pelo levantamento dos sambaquis a que
formou os montículos ictiológicos.
406
3.4.2. Microfácies tipo J: ocupação sobre depósito arenoso A microfácies tipo J aparece unicamente no sítio Santa Marta 8 e corresponde
com a AF 2 (mF 2), localizada entre o substrato arenoso (AF 1) e o montículo
propriamente dito (AF 3). Suas características agrupam-se no Quadro 6.14.
Quadro 6.14. Características da microfácies tipo J.
Microestrutura
Dist. rel. g/f
Vazios
Porosidade
Razão g/f
Fração grossa
Distribuição da
fração grossa
Comp. menores
Micromassa
MICROFÁCIES TIPO J
Grãos interligados e microagregados intergranulares
Enáulica-mónica e gefúrica
De empacotamento complexo
20 %
70/30
1) Fragmentos de osso (70 %) de tamanho variável, todos queimados; 2) grãos de
quartzo arredondados na fração areia fina a muito fina (20 %); 3) grãos de
feldspato arredondados na fração areia fina; 4) fragmentos de carvão de tamanho
diverso (3 %)
Ossos com distribuição aleatória e sub-horizontal. Grãos minerais e carvões
distribuídos aleatoriamente
Escória vítrea (2 %) com 50 a 100 μm de comprimento
Argilominerais com micro-fragmentos de osso e microcarvões na forma de
agregados intergranulares e de revestimentos
Esta microfácies foi interpretada como resultado da ocupação humana sobre o
substrato arenoso, que representa a base natural do sítio. Este depósito, composto
principalmente por resíduos ósseos e vegetais queimados, teria sido compactado por
pisoteamento pelos ocupantes do local. Tal inferência baseia-se na distribuição
horizontal dos fragmentos de osso, no empactoamento fechado dos componente da
fração grossa e na baixa porosidade do depósito, em comparação com as microfácies
sub e sobrejacente, além da presença de revestimentos e enchimentos de argila impura.
Os revestimentos de argila impura são associados à quebra física de agregados de lama
em solo exposto, sem vegetação, e à lavagem e deslocamento vertical destes materiais,
até a sub-superficie, produzida pela passagem da água de chuva.
3.4.3. Microfácies tipo K: substrato arenoso A microfácies tipo K aparece unicamente no sítio Santa Marta 8 e representa o
substrato arenoso da ocupação no local (mF 1) com elementos antrópicos intrusivos
vindos depósito de ocupação superior. Suas características agrupam-se no Quadro 6.15.
407
Quadro 6.15. Características da microfácies tipo K.
Microestrutura
Dist. rel. g/f
Vazios
Porosidade
Razão g/f
Fração grossa
Distribuição da
fração grossa
Comp. menores
Micromassa
MICROFÁCIES TIPO K
Grãos simples e microagregados intergranulares
Mónica e enáulica
De empacotamento simples e complexo
40 %
95/5
1) Grãos de quartzo arredondados na fração areia fina (80 %); 2) grãos de
feldspato arredondados na fração areia fina (5 %); 3) fragmentos de osso de
tamanho variável (10 %); 4) carvão (3 %)
Grãos minerais, fragmentos de osso e carvão com distribuição aleatória
Escória vítrea (2 %) de 50 a 100 μm de comprimento
Argilominerais com micro-fragmentos de osso e microcarvões na forma de
revestimentos e finos agregados intergranulares
Esta microfácies formou-se a partir do deslocamento vertical dos restos de
ocupação na superfície do depósito arenoso, que serve de base ao sítio Santa Marta 8. A
formação da microfácies tipo J provocou a infiltração e intrusão de elementos
antrópicos, como fragmentos de osso, carvão e escória vítrea, no depósito arenoso. Os
revestimentos de argila impuros, micro-laminados, não são autóctones do depósito e terse-iam formado como resultado do pisoteamento humano em superfície, como
explicado no tópico 3.3.3.
3.4.4. Microfácies tipo L: horizonte espódico em matriz de ossos e areia A microfácies do tipo L representa a camada de ocupação analisada no sítio
Galheta 4, que corresponde com a AF 1 (mF 1). Suas características agrupam-se no
Quadro 6.16.
408
Quadro 6.16. Características da microfácies tipo L.
Microestrutura
Dist. rel. g/f
Vazios
Porosidade
Razão g/f
Fração grossa
Distribuição da
fração grossa
Comp. menores
Micromassa
MICROFÁCIES TIPO L
Microagregados intergranulares e grãos revestidos
Enáulica e quitónica
De empacotamento complexo, com vazioes em vesículas, em câmara e canais
55 %
70/30
1) Grãos de quartzo arredondados na fração areia fina (55 %); 2) grãos de feldspato
arredondados na fração areia fina (10 %); 3) fragmentos de osso, principalmente na
fração areia fina a muito fina, com alguns fragmentos maiores (20 %) em sua
maioria queimados (90 % do total); 4) minerais pesados e fragmentos líticos
(frequência total menor que 5 %)
Grãos minerais, fragmentos de osso e carvão com distribuição aleatória
Escória vítrea (3 %)
MO monomórfica na forma de revestimentos e MO polimórfica, com incrustações
de finos fragmentos de osso, na forma de agregados intergranulares e pseudorevestimentos
A camada de ocupação no sítio Galheta 4 apresenta características semelhantes
às descritas para os sambaquis de núcleo arenoso Santa Marta 10 e Carniça 3. Este sítio,
possui em comum com aqueles dois o fato de ser produto de ocupação sobre depósito
arenoso, nesta caso, eólico. A formação de horizontes espódicos, já aventada pela
análise micromorfológica nos sambaquis de núcleo arenoso, repete-se no sítio Galheta
4. As evidências de podzolização estão na presença de revestimentos de MO
monomôrfica ao redor dos componentes da fração grossa, de agregados soldados de MO
polimórfica na forma de pellets (welded aggregates) e de pseudo-revestimentos de MO
monomórfica.
Pela natureza dos revestimentos de MO, que abrangem inclusões de finos
fragmentos de osso, pode-se pensar que há tanto MO dissolvida, que chegou por
iluviação desde a superfície do depósito, como MO derivada da transformação de
tecidos vegetais in situ. As análises realizadas com MEV-EED, que detectaram
enriquecimento em alumínio e ferro nos agregados integranulares, permitem interpretar
a presença de MO iluvial nos pellets de MO polimórfica. Estes agregados formam-se
pela ação da fauna do solo, que mistura restos de plantas e qualquer outro material na
fração silte (Wilson and Righi, 2010). A formação de bandas de impregnação na AF 1
também atesta a iluviação de componentes, apesar de que horizontes espódicos e
plácicos não se formam pelo mesmo processo (Conry et al., 1996).
A MO momonórfica e a polimórfica podem formar simultaneamente no solo,
mas o predomínio de MO monomórfica é geralmente associado a estágios mais
avançados de podzolização (De Connick, 1980). Isto corresponde com as observações
409
realizadas nesta tese, onde a MO monomórfica é dominante em Santa Marta 10, o mais
antigo dos sambaquis com horizonte espódico, enquanto MO polmórfica predomina nos
sítios Carniça 3 e Galheta 4. Outra semelhança entre Galheta 4 e Carniça 3 refere-se à
presença efetiva carvão, no primeiro, e inferida a partir das análises isotópicas, no
segundo, junto com ossos queimados, carbonizados e calcinados na camada de
ocupação, com frequencias maiores no Galheta 4 onde não há aporte de conchas. Isto
leva a pensar, novamente, na influência de microcarvões na formação de horizontes
espódicos em depósitos arenosos.
3.5. FORMAÇÃO DE MONTÍCULOS ICTIOLÓGICOS O sítio Santa Marta 8 contém os restos mais antigos de cerâmica Taquara/
Itararé do litoral sul catarinense. Datado em 1691-1416 anos cal. AP, este sítio apresenta
semelhanças de forma e composição com a camada preta de Jabuticabeira 2; com a
diferença de que, no Santa Marta 8, não há sobreposição a sambaqui conchífero. De
fato, a camada preta no Jabuticabeira 2 é cerca de 100 anos mais antiga que Santa Marta
8 e a ocupação de ambos seria contemporânea. Ambos os depósitos mostram claras
semelhanças no processo de formação, com deposição de restos ósseos queimados em
local diferente do final, junto com sedimentos terrígenos, carvão e resíduos da queima
de plantas. Nesta dinâmica, os sedimentos terrígenos são componente casual por
representar o substrato de acumulação e queima de materiais prévios à deposição no
sambaqui. O mesmo padrão de retrabalhamento de resíduos foi observado nos
sambaquis conchíferos, o que indica continuidade no processo acumulatico, apesar da
substituição das conchas por ossos de peixe.
O sítio Galheta 4, fundado 700 anos depois do início da ocupação em Santa
Marta 8, cerca de 100-200 anos após o abandono da camada preta de Jabuticabeira 2, é
um montículo ictiológico sobre depósito arenoso com sepultamentos humanos e
cerâmica. Apesar das diferenças composicionais com Santa Marta 8, que o aproximam
aos sambaquis de núcleo arenoso, a cronologia do sítio, a presença de cerâmica
Taquara/ Itararé, os sepultamentos humanos e os ossos de peixe misturados na matriz
arenosa, sem conchas, permitem agrupá-lo na categoria de montículo ictiológico. A
formação deste sítio sugere acumulação de resíduos de queima (ossos e microcarvão)
410
sobre duna eólica estabilizada, com aporte eólico constante de outros resíduos desde o
núcleo da ocupação, onde se encontraram os sepultamentos humanos.
Os montículos ictiológicos são os sítios de menor representação na área de
estudo, com unicamente quatro sítios; dois correspondem aos sambaquis analisados
nesta tese; outro é o sítio Costão do Ilhote, com estratigrafia e composição semelhante
a Galheta 4; e o último corresponde à camada preta de Jabuticabeira 2. A mudança
composicional relacionada com o aparecimento dos montículos ictiológicos coincide
cronologicamente com dois fatores fundamentais na evolução da área: a dessalinização
e assoreamento progressivo das grandes lagunas costeiras; e a chegada dos grupos Jê
provenientes do planalto.
Visitas realizadas em vários sambaquis conchíferos da região indicam que a
sobreposição de montículo ictiológico sobre sambaqui conchífero é atributo exclusivo
de Jabuticabeira 2, e não um fenômeno de extensão regional, como tinha sido
inicialmente suposto. Pode-se pensar que os próprios montículos ictiológicos (ou
camadas pretas) tenham sido aproveitados também pela atividade mineradora que
explorou os sambaquis até pelo menos a década de 1960; ou inclusive removidos para
atingir as camadas conchíferas subjacentes, de maior valor econômico. No entanto, as
descrições de camadas superiores compostas principalmente por fragmentos ósseos, que
aparecem em relatórios do Ministério de Minas e Energia (Bocchi and Liberatore,
1968), tampouco coincidem com a situação observada nos montículos ictiológicos,
Nestes relatórios, descreve-se a presença de camadas de até 30 cm no topo de sítios
como Garopaba do Sul 1, por exemplo, com alta concentração de ossos de peixe,
levemente litificada, cor cinza escuro a preto e distribuição restrita no sambaqui.
Pelas características estratigráficas, composicionais e micromorfológicas descritas
neste tópico, os montículos ictiológicos, também definidos como sítios mistos pela
presença de cerâmica Taquara/ Itararé, mostram evidências de continuidade no processo
de formação em relação aos sambaquis conchíferos. A única e maior diferença refere-se
à substituição das conchas por ossos de peixe como material construtivo. Isto resulta
fundamental na discussão da relação entre os grupos do planalto e do litoral há 1500
anos.
Como discutido no Capítulo 2, tópico 3.5.2, não há ainda evidências contundentes
que apoiem a tradicional visão dos grupos interioranos chegando ao litoral em tempos
recentes. Além das evidências artefatuais e bioantropológicas que sustentam uma
relação de continuidade entre sambaquis e sítios mistos, os resultados aqui apresentados
411
sobre processos de formação dos sítios tampouco apoiam à hipótese de migração dos
grupos Jê até o litoral. A semelhança no processo de formação de sambaquis
conchíferos e montículos ictiológicos indicam continuidade do padrão e mudança
possivelmente relacionada com pressões externas ao grupo. Estas pressões teriam
motivado o abandono das conchas, que não deve ser considerado elemento menor na
avaliação da intensidade e consequências do contato entre os dois grupos em questão.
Para que o símbolo mais característico das culturas litorâneas, as conchas, fosse
substituído formação dos sítios, as pressões e conflitos com os grupos Jê devem ter
provavelmente ultrapassado um nível de tolerância na interação dos grupos.
4. CONCHEIRO ETNOHISTÓRICO NA TERRA DO FOGO O estudo micromorfológico das amostras coletadas no sítio Túnel 7, tanto da
sucessão vertical do concheiro como da planta de escavação, foi realizado seguindo a
identificação de microfácies, a partir do arranjo de componentes nas seções delgadas
analisadas. Esta abordagem geoarquelógica, junto com a informação etnográfica,
permite unir a evidência sedimentar com atividades conhecidas associadas à formação
dos sítios, além do consumo e descarte de alimentos.
4.1. MICRO­COMPONENTES A fração grossa do sítio Tunel 7 é composta majoritariamente por conchas de
molusco, fragmentos líticos, carvão e, em último lugar, fragmentos de osso. A maior
parte das conchas corresponde ao gênero Mytilidae, o mexilhão (cerca de 95%), junto
com Nacella sp. e outras espécies de gastrópodes (5%). Ambas as espécies são
facilmente identificáveis em seção delgada pela sua forma e coloração. As conchas de
Mytilidae apresentam cor roxa a rosa escuro, enquanto as conchas de Nacella sp. são
retas no corte longitudinal e de cor amarela a marrom. A alta proporção de mexilhões
observada em seção delgada corresponde com os estudos arqueofaunísticos realizados
412
no sítio, que mostraram cerca de 95% de moluscos e 5% de ossos de mamífero, peixe e
ave (Estevez et al., 1996; Orquera and Piana, 2001; Verdún, 2006, 2010).
Os restos de osso macroscópicos estão bem preservados e apenas uma pequena
porção apresenta sinais de queima (Orquera & Piana 2001). Em seção delgada, a maior
parte dos ossos apresenta evidências de queima, o que pode ter favorecido a preservação
destes finos fragmentos, já que a queima aumenta a resistência da hidroxiapatita à
dissolução (Berna et al., 2004; Karkanas, 2000). A escassa representação de restos de
ossos em seção delgada pode estar associada a atividades de limpeza e redeposição dos
materiais queimados, com o descarte de fragmentos maiores até uma porção do sítio;
com isto, sobraria, no anel de conchas, unicamente aqueles micro-fragmentos que não
foram selecionados para descarte em outro local.
4.2. TAFONOMIA DE CONCHEIROS EM CLIMA FRIO Diferentemente dos sambaquis brasileiros, onde a dissolução química de
carbonatos e fosfatos é intensa devido ao clima e regime hidrológico predominante, no
concheiro fueguino as alterações físicas, relacionadas com as baixas temperaturas, são o
processo tafonômico de maior atuação. Atualmente, o clima no litoral do Canal Beagle
é frío subantártico, com temperaturas médias de 5° C e precipitação anual média de 570
mm (Rabassa et al. 2000). O contexto climático traz consequências detectáveis na
análise micromorfológica, tanto na microestrutra como na distribuição espacial e
alteração dos componentes da fração grossa.
Os agregados angulosos que caracterizam a mF 2 indicam a ação de processos
de congelamento-derretimento dentro do concheiro (Van Vliet-Lanoe, 2010). O
predomínio da fração fina argilosa na mF 2 teria favorecido a formação destes blocos
angulosos, em oposição a escassa fração fina detectada em outras microfácies.
Igualmente, a distribuição aleatória e às vezes perpendicular ao substrato de vários
fragmentos de concha na mF 3 e especialmente na mF 6 também pode ser considerada
evidência da ação do congelamento do sedimento do concheiro. A formação de grandes
cristais de gelo nos poros, e seu derretimento posterior, provocaria a reorganização dos
componentes maiores.
413
O efeito mais interessante de alteração física associada com as baixas
temperaturas dentro do concheiro observa-se, em micro-escala, nas valvas de moluscos.
Os numerosos cristais de carbonato acicular, que aparecem tanto no anel de conchas
como nas camadas superiores da área central de habitação, derivam do intemperismo
físico das conchas de molusco. Estes cristais aciculares assemelham-se a finas agulhas
carbonáticas que se desprendem das conchas de molusco. Os cristais aparecem na forma
de agregados de agulhas orientadas ou como acumulações de cristais isolados dentro da
fração fina, que teriam se formado por retrabalhamento dos agregados originais. Estes
cristais são semelhantes, e podem ser confundidos, com a calcita acicular fibrosa
(needle-fiber calcite), um tipo de biomineralização carbonática autigênica formada por
fungos na rizosfera durante as fases iniciais de pedogênese (Bajnóczi and Kovács-Kis,
2006; Becze-Deàk, 1997; Jones et al., 1993; Verrecchia et al., 1994).
No sítio Túnel 7, os carbonatos aciculares são produto do congelamento das
conchas, que provoca a desagregação das finas lâminas de cristais de carbonato de
cálcio que compõem as valvas de molusco. A formação dos cristais pode ser explicada
pelo seguinte processo: a superfície intemperizada das conchas absorve as moléculas de
água, as quais ingressam no espaço inter-cristalino; quando as temperaturas caem até o
ponto de congelamento da água, o fluido que ingressou no espaço inter-cristalino
congela e expande, o que provoca a quebra das lâminas de cristais de carbonato de
cálcio e libera, assim, milhares de agulhas carbonáticas ao sedimento. De fato, a fração
fina da mF 2, onde a ação do congelamento é mais evidente, apresenta a maior
concentração de cristais aciculares, o que corrobora a maior intensidade de processos de
congelamento-derretimento nesta microfácies, afetando tanto o sedimento como a
integridade das conchas.
A preservação deste finos cristais carbonáticos no Túnel 7, apesar das baixas
temperaturas das costas do Canal Beagle (que favoreceriam a dissolução dos
carbonatos), pode dever-se à presença de solução de solo saturada em carbonato de
cálcio dentro do concheiro.
Os processos de congelamento e derretimento não são o unico agente tafonômico
que atua neste concheiro. A ação biológica, apesar das baixas temperaturas da região, é
um agente de alteração ativo tanto no anel de concha como na área central do concheiro.
No anel de conchas, a microestrutura de grânulos interconectados denota a ação de
microrganismos no solo, possivelmente favorecida pela alta concentração de detritos
orgânicos nesta área de descarte de resíduos. Nas fogueiras centrais, a presença de
414
vazios em câmara e canais também indica a ação da fauna do solo dentro do concheiro.
Estas evidências, junto com aquelas apresentadas no Capítulo 5, tópico 3.1.3 no estudo
micromorfológico de amostras de solo sob floresta, indicam ação biológica intensa,
apesar das baixas temperaturas que caracterizam a região.
Feições pedológicas na área central do concheiro incluem revestimentos de calcita
impuros, revestimentos de microcarvão, nódulos órticos de óxi-hidróxidos ferro e hiporevestimentos impregnativos de óxi-hidróxidos de ferro. Neste sentido, os nódulos e
hipo-revestimentos de óxi-hidróxido de ferro denotam episódios de saturação de água
na área central do concheiro, mais compactada que o resto do concheiro, de duração
moderada (até alguns dias). Dse fossem mais duradouros os epsódios de saturação,
haveria indicadores de redução do ferro (Lindbo et al., 2010).
4.3. MICROFÁCIES A identificação de microfácies no Túnel 7 foi realizada de acordo aos mesmos
critérios utilizados para os sambaquis catarinenses. A fração grossa de todas as lâminas
é composta por conchas (principalmente mexilhão), fragmentos líticos arredondados na
fração cascalho, carvão e alguns ossos queimados. A proporção relativa entre os quatro
componentes da fração grossa varia ao longo da sucessão vertical, o que permitiu a
identificação de cinco microfácies na coluna estratigráfica coletada no anel de conchas.
Na porção central do concheiro, onde se coletaram amostras de quatro fogueiras,
identificaram-se duas microfácies de acordo com a alteração térmica das conchas e
mudanças na fração fina.
4.3.1. Microfácies estratigráficas Trabalhos anteriores realizados com seções delgadas do Túnel 7, coletadas em
uma área de passagem localizada no anel de conchas periférico (coluna de amostragem
identificada como C11) (Figura 5.107 A), identificaram três atividades cotidianas na
sucessão vertical. Esta identificação foi realizada a partir da correlação entre os dados
micromorfológicos (características da fração grossa, microestrutura e razão g/f) e as
415
informações etnográficas disponíveis para as populações yamana (Gusinde, 1937). As
atividades são: 1) eventos de deposição de resíduos fora da cabana central; 2)
freqüentação do sítio; 3) e abandono do concheiro (Balbo et al., 2010). Para esta tese, as
atividades identificadas por Balbo et al. (2010) na análise de C11 foram extrapoladas às
microfácies descritas na C12. A extrapolação foi realizada com base na semelhança nas
características micromorfológicas utilizadas para identificação de atividades cotidianas
na coluna C11.
Nos Quadro 6.17 e 6.18, agrupam-se as características micromorfológicas das
cinco microfácies identificadas na sucessão vertical da coluna C12.
Quadro 6.17. Características da microfácies 1, 2 e 3 da C12 no concheiro Túnel 7.
Microestrutura
Dist. rel. g/f
Vazios
Porosidade
Razão g/f
Fração grossa
Distribuição da
frração grossa
Micromassa
Microestrutura
Dist. rel. g/f
Vazios
Porosidade
Razão g/f
Fração grossa
Distribuição da
frração grossa
Micromassa
Microestrutura
Dist. rel. g/f
Vazios
Porosidade
Razão g/f
Fração grossa
Distribuição da
frração grossa
Micromassa
MICROFÁCIES 1
Microagregados intergranulares, com grânulos coesivos (250 μm de
comprimento)
Enáulica
De empacotamento complexo
20 %
50/50
1) Fragmentos de concha (50 %); 2) fragmentos líticos na fração grânulo e
seixo (20 %); 3) carvão (20%); 4) tecidos (10 %)
Conchas com distribuição sub-horizontal (50 %); outros componentes com
distribuição aleatória
MO polimórfica, microcarvões, madeira decomposta, restos de plantas oxidados
MICROFÁCIES 2
Blocos angulosos na forma de prismas (5x5 mm de comprimento)
Porfírica
Fissuras
20 %
30/70
1) Fragmentos de concha na fração areia muito fina (5 %); 2) fragmentos de
osso na fração areia muito fina (2 %); 3) carvão (5 %); 4) restos de tecidos (5
%)
Aleatória
Argila organomineral castanho escuro (PPL) com cristais de calcita acicular
MICROFÁCIES 3
Microagregados intergranulares, com grânulos (150-250 μm de comprimento)
Enáulica
Vazios de empacotamento complexo
40 %
70/30
1) Conchas inteiras e fragmentadas (30-40 % frescas e 5 % queimadas); 2)
fragmentos líticos na fração grânulo (20 %); 3) carvão (10-15 %); 4) ossos
queimados (5 %)
Conchas com distribuição sub-horizontal (60 %); outros componentes com
distribuição aleatória
MO polimórfica, microcarvão, restos de tecidos e cristais de calcita aciculares
416
A microfácies superior, que fecha a sucessão vertical, corresponde a mF 1, que
aparece uma única vez na C12. Apresenta mistura de componentes do concheiro
(conchas e carvão) com matéria orgânica e liteira fresca, o que indica que não
representa uma microfácies original do concheiro e sim a deposição de sedimentos do
concheiro erodidos, junto com liteira da floresta circundante sobre a microfácies de
abandono final do sítio.
Os momentos de abandono do concheiro são identificados como mF 2, que
aparece duas vezes na C12 e três na C11. O abandono do sítio caracteriza-se pelo
desenvolvimento de solo raso com microestrutura de blocos angulosos. Este solo
desenvolve-se a partir da deposição sobre o concheiro, especialmente na área central, de
sedimentos coluvionares ou eólicos durante os momentos de abandono. O predomínio
de fração fina na mF 2 favoreceu o desenvolvimento de blocos angulosos, como
resultado da retração por dessecação associada ao congelamento do solo (Van VlietLanoe, 2010).
A correlação estratigráfica entre a C11 e C12 (ver Figura 5.107 B) indica três
momentos de abandono do concheiro com desenvolvimento de solo em blocos
angulosos: um episódio próximo à base do concheiro; outro no centro da C11, que se
correlaciona com o topo da C12; e o último no topo da C11. A correlação entre a mF 2
no meio da C11 com a mF 2 no topo da C12 está representada pela unidade B35,
identificada desde 1990 nos trabalhos de campo no Túnel 7. A unidade B35 é uma
camada côncava, de 2 a 3 cm de espessura, composta por material fino e orgânico que
cobre quase a totalidade do concheiro. Esta camada é importante, já que dela foram
extraídos os fragmentos de carvão utilizados para datação dendrocronológica do sítio
(1776 e 1898 AD) (Piana & Orquera, 1996). A seqüência de dez ocupações do
concheiro identificadas por Estevez & Vila (2006) e as cinco fogueiras centrais
estudadas nesta tese estão todas situadas por debaixo da unidade B35. Isto mostra a
diferença que existe entre as taxas de sedimentação na área central de ocupação, com 25
cm de altura, e o anel de conchas periférico, com mais de 40 cm .
A mF 3 domina a sucessão vertical das duas colunas analisadas. Representa
quase a metade da sucessão vertical da C12 e mais de um terço da sucessão na C11. A
maior frequência de conchas inteiras, junto com a diversidade e distribuição aleatória de
componentes da fração grossa (carvão, seixos e ossos queimados) e os finos agregados
que compõem a micromassa levam a interpretar esta microfácies como resultado do
descarte de detritos na periferia da cabana de habitação, onde os Yamana costumavam
417
jogar os resíduos cotidianos. Esta acumulação rápida e conspícua estava motivada pela
intenção de manter limpa a área de habitação, mas também pode responder à intenção
de construir uma elevação ao redor da cabana para proteção contra os ventos, a
infiltração da água etc, como mencionado por vários cronistas (Bridges 1947; Gusinde
1986; Martial 2005).
Quadro 6.18. Características da microfácies 4 e 5 da C12 no concheiro Túnel 7.
Microestrutura
Dist. rel. g/f
Vazios
Porosidade
Razão g/f
Fração grossa
Distribuição da frração
grossa
Micromassa
Microestrutura
Dist. rel. g/f
Vazios
Porosidade
Razão g/f
Fração grossa
Distribuição da frração
grossa
Micromassa
MICROFÁCIES 4
Microagregados intergranulares, com grânulos finos e soltos (150-300 μm
de comprimento)
Enáulica
De empacotamento complexo
30 %
90/10
1) Fragmentos de concha (70 %); 2) fragmentos líticos (10-15 %); 3)
carvão (5-10 %; 4) tecidos (2 %)
Fragmentos de concha com distribuição sub-horizontal. Outros
componentes com distribuição aleatória
MO polimórfica, microcarvão, restos de tecidos e cristais de calcita
aciculares
MICROFÁCIES 5
Microagregados intergranulares com grânulos finos e soltos (150-300 μm
de comprimento)
Enáulica, mónica
Empacotamento complexo
60 %
80/20
1) Fragmentos líticos na fração seixo (90 %); 2) fragmentos de concha de
tamanho diverso (10%)
Aleatória
MO polimórfica, microcarvão, restos de tecidos e cristais de calcita
aciculares
A mF 4 aparece como lentes de 1 a 2 cm de espessura intercaladas na mF 3 ao
longo da sucessão vertical e também na base do concheiro. Nesta microfácies, as
conchas estão mais compactadas, com distribuição sub-horizontal, empacotamento
fechado e fragmentação in situ. A fração fina é menos abundante que na mF 3. Isto leva
a interpretar a mF 4 como ligada a episódios de pressão superficial sobre o concheiro,
possivelmente por pisoteamento, que conduziram à compactação e fragmentação das
conchas. A natureza episódica destes eventos de pisoteamento é deduzida pelo fato de
que se manteve a continuidade dos fragmentos laterais. Se tivesse havido
retrabalhamento intenso, não se preservaria esta continuidade.
Na mF 4, localizada na base da C12, foram identificados cerca de 5% de ossos
de mamífero, com birrefringência característica de calcita, e amplas áreas de dissolução
418
ao redor dos ósteons. Estes atributos mineralógicos e morfológicos foram descritos no
Capítulo 5, tópico 3.1.2, para os ossos de mamífero que compõem naturalmente os
sedimentos das praias do Canal Beagle. A presença destes ossos intemperizados na base
do concheiro é condizente com a proximidade dos sedimentos praiais subjacentes. A mF
5 representa uma lente de seixos que se estende pelas duas colunas amostradas no anel
de conchas.
A mF 6 é a única microfácies que foi identificada na área de passagem sobre o
concheiro (C11), mas não no anel de conchas periférico (C12). Esta microfácies foi
interpretada por Balbo et al. (2010) como momentos de frequentação mais intensa do
sítio, com reorganização dos componentes microscópicos. Dentre as suas características
micromorfológicas está razão g/f baixa (maior teor de fração fina), fragmentos de
concha, seixos e carvão aleatoriamente distribuídos. Contém a maior quantidade de
fragmentos de concha queimados, identificados graças à experimentação apresentada do
Capítulo 5, tópico 3.1.5, o que serve como indicador da sua conexão direta com a área
central onde se localizavam as fogueiras.
A mF 6 esta presente unicamente na porção inferior da C11 e desaparece na
porção superior da sucessão vertical, onde mF 3 é dominante. Esta transição
corresponde a momento de abandono do sítio, identificado pela mF 2 correspondente à
unidade B35, onde houve deslocamento da cabana central, o que provocou mudança na
localização da área de passagem através do concheiro. Assim, a transição entre a mF 6 e
mF 3 indica que houve deslocamento da cabana central e que a área de passagem passou
a receber o descarte de conchas e detritos de ocupação (mF 3), integrando-se ao anel
periférico.
4.3.2. Microfácies centrais (fogueiras) As características micromorfológicas das cinco fogueiras centrais de Túnel 7
analisadas nesta tese foram agrupadas em duas microfácies principais: mF 7 e mF 8. No
Quadro 6.19, agrupam-se as características micromorfológicas das mF 7 e 8
identificadas na área central do Túnel 7.
419
Quadro 6.19. Características da microfácies 7 e 8 na área central do concheiro Túnel 7.
Microestrutura
Dist. rel. g/f
Vazios
Porosidade
Razão g/f
Fração grossa
Distribuição da
frração grossa
Micromassa
Microestrutura
Dist. rel. g/f
Vazios
Porosidade
Razão g/f
Fração grossa
Distribuição da
frração grossa
Micromassa
MICROFÁCIES 7
Microagregados intergranulares (100-300 μm de cumprimento) e áreas de
microestrutura esponjosa (~600 μm)
Enáulica
De empacotamento complexo
40 %
80/20
1) Fragmentos de concha (50 %) queimados a diversas temperaturas (20 % do
total a temperatura superior aos 500°C); 2) fragmentos líticos na fração seixo,
queimados (20 %); 3) carvão (30 %); 4) ossos queimados (2 %)
Fragmentos de concha com distribuição sub-horizontal; demais elementos com
distribuição aleatória
Microcarvoes, tecidos de plantas oxidados, micrita
MICROFÁCIES 8
Em câmara
Porfírica
Em canal, câmara e fissuras
20 %
50/50
1) Fragmentos de concha queimados a temperatura superior a 500° C (20-30 %);
2) fragmentos líticos na fração seixo, queimados (30-40 %); 3) ossos queimados
(5 %)
Aleatória
Cinzas com argila rubefacta
A mF 7 está associada às fogueiras superiores (AC 4 e AC 5), caracterizadas por
conter conchas queimadas, seixos, carvão e fragmentos de osso em micromassa
composta por agregados finos (100-300 µm) de microcarvão. A partir da comparação
com o experimento de queima de conchas de Mytilus edulis apresentado no Capítulo 5,
tópico 3.1.5, infere-se que as conchas na mF 7 foram queimadas a temperatura não
superior a 500° C. O padrão de alteração térmica das conchas e a ausência de substrato
rubefacto confirmam assim temperatura moderada para as fogueiras da mF 7 (categoria
de fogueiras dentre 350-450° C segundo classificação de Wattez 1992).
A mF 8 agrupa as fogueiras inferiores (AC 8 e AC 10), que contêm seixos,
conchas queimadas e fragmentos de osso em meio a micromassa micrítica com argila
rubefacta de baixa porosidade. De acordo com o modelo experimental de queima de
Mytilus edulis, os fragmentos de concha teriam sido queimados a altas temperaturas,
superiores a 500-600° C. A presença de conchas queimadas a estas temperaturas e a
rubefação da micromassa indicam que estas fogueiras são estruturas de combustão de
alta intensidade (ver Mallol et al. 2007; Schiegl et al. 1996; Wattez 1992; Weiner et al.
2002). A boa preservação das características microscópicas da mF 8 correspondem ao
420
modelo tafonômico desenvolvido a partir da análise de fogueiras experimentais,
apresentado no Capítulo 5, tópico 3.1.4. Este modelo postula que, pela alta porosidade
dos concheiros e o regime hidrológico do Canal Beagle, as estruturas de combustão ou
camadas de cinzas só se preservam se situadas sobre substrato argiloso em solução de
solo saturada em carbonato de cálcio, que evite a dissolução e lixiviação dos carbonatos.
Esta situação corresponde ao encontrado nas fogueiras inferiores analisadas. A
bioturbação, indicada pelos vazios em câmara e canais, não teria obliterado
completamente o arranjo original de materiais.
A transição entre a mF 8 e a mF 7 é marcada por uma camada preta de
sedimentos coluvionares, que aparece unicamente na área central de habitação e não é
visível em nenhuma das colunas estudadas no anel de conchas periférico. O fato de que
a mF 7 seja a única microfácies observada acima desta unidade pode ser explicada pela
tafonomia do sítio ou pela própria formação cultural do depósito, embora uma
combinação de ambos os fatores seja mais provável. Na hipótese tafonômica, o
predomínio de mF 7 nas fogueiras superiores pode estar relacionado com a possível
redução na acumulação de sedimentos coluvionares, na medida em que o sítio
aumentava em altura. Isto teria prejudicado a boa preservação das estruturas de
combustão, já que, ao diminuir a chegada de sedimentos finos, o substrato fica mais
poroso, o que aumenta erosão e lavagem de componentes. Esta situação é contrária ao
que acontece nas fogueiras inferiores, onde a presença de sedimentos coluvionares ou
eólicos sugere maior sedimentação, menos erosão e, portanto, melhor preservação (ver
Mallol et al. 2007).
No entanto, esta situação não explica o predomínio de conchas queimadas a altas
temperaturas nas fogueiras inferiores (mF 8). A segunda hipótese, de caráter cultural,
aponta para diferenças na temperatura alcançada pelas fogueiras inferiores e superiores
relacionada, por sua vez, com funções diferentes. De fato, análises faunísticas e
isotópicas mostraram que as fases de ocupação associadas com as fogueiras AC 5 e AC
4 correspondem a ocupações no outono e na primavera/verão. Pelo contrário, a fogueira
AC 8 representa ocupação no inverno (Colonese et al., 2011; Estevez and Vila, 2006;
Juan-Muns, 1992; Mameli and Estevez, 2004). Isto sugere que as diferenças entre a mF
7 e a mF 8 podem estar relacionadas com mudanças nas necessidades de aquecimento
dos habitantes da cabana, vinculadas com a estação de freqüentação do sítio (as
fogueiras de inverno demandam maior intensidade de queima) ou com a localização das
fogueiras dentro da cabana (fogueiras secundárias são menos intensas).
421
Neste sentido, a mistura entre mF 7 e mF 8, que se observa na AC 6, pode
indicar retrabalhamento de resíduos oriundos de uma fogueira de alta intensidade com
resíduos de fogueira de baixa temperatura. Ambas as estruturas de combustão, central e
secundária, podem ter sido acessadas simultaneamente dentro da cabana durante a
ocupação do sítio representado pela fogueira AC 6. A mistura pode ter sido causada
pela ocupação cotidiana e pelo pisoteamento na cabana central.
4.4. FORMAÇÃO DO CONCHEIRO DOMÉSTICO O concheiro Túnel 7 compõe-se de duas áreas principais, as quais podem ser
definidas, com base em suas propriedades morfológicas e composicionais, como sendo:
1) anel de conchas periférico; e 2) área central de moradia. A análise micromorfológica
aqui proposta, em combinação com os relatos etnográficos sobre os assentamentos
yamana, mostram a complexidade espacial e sedimentológica dos concheiros. Apesar da
maioria dos componentes ser comum tanto ao anel de conchas quanto às fogueiras
centrais, diferenças na freqüência relativa dos componentes, alterações pósdeposicionais, arranjo etc., servem como indicadores da rede de eventos que caracteriza
a construção dos concheiros.
Diferenças espaciais dentro do concheiro Túnel 7 já tinham sido detectadas pelas
análises zooarqueológicas (Estevez et al. 1996; Estevez & Vila 2006; Verdún 2006,
2010). Verdún (2010), a partir de análises de componentes principais, concluiu que
densidades maiores de conchas apareciam na periferia do sítio (no anel de conchas) em
relação à área central, onde dominam os seixos e os sedimentos finos. Neste sentido, a
análise micromorfológica aqui apresentada corrobora as constatações anteriores e
mostra outras diferenças significativas entre a área central e a periferia do concheiro.
Por exemplo, conchas queimadas estão quase ausentes no anel de conchas, com exceção
da mF 6 na C11, que representa a área de passagem entre o exterior e a cabana de
moradia através do anel de conchas. Pelo contrário, conchas queimadas caracterizam a
área central de moradia.
Apesar de que os cronistas descrevem a prática de jogar moluscos ao fogo para
abrir a concha e extrair a carne (Gusinde 1986; Martial 2005; Wilkes 1844), a baixa
frequência de conchas queimadas no anel periférico permite aventar duas
422
possibilidades: que as conchas no anel periférico não foram jogadas ao fogo, o que
implica, como corolário, que não teriam sido consumidas; ou que a temperatura de
aquecimento dos moluscos para abertura não foi alta o bastante para alterar as conchas.
A segunda hipótese parece a mais provável, já que as conchas de mexilhão se abrem
facilmente a temperaturas no entorno dos 100° C. O achado de conchas queimadas a
temperatura superior aos 500° C sugere que foram jogadas à fogueira ou que se
encontravam no substrato onde foi acesso o fogo.
O anel de conchas periférico ter-se-ia formado a partir da deposição massiva de
conchas, dominantemente frescas, seixos, restos de plantas, carvão, ossos queimados e
demais detritos cotidianos. Os cronistas têm descrito estes episódios como parte da
rotina de manutenção da área de moradia que, com o tempo, leva à formação de
montículos e anéis de conchas tão altos quanto as próprias cabanas (Bridges 1975;
Despard 1863; Gusinde 1986; Martial 2005). A concentração de cinzas, argila e seixos é
maior na área central, onde os sedimentos são também mais compactos. Estas
observações também coincidem com os relatos etnográficos que descrevem as fogueiras
yamana acesas sobre acumulações de seixos (Lovisato, 1884) e conchas (Bridges,
1987), com os restos de comida sendo ocasionalmente jogados no fogo (Gusinde 1986).
A existência de dois tipos de fogueiras surge da análise de microfácies aqui
proposta. Diferentes estruturas de combustão parecem ter atendido a funções diferentes
de acordo com as necessidades de aquecimento dos moradores da cabana, expressas na
temperatura máxima de combustão. Assim, fogueiras acesas durante a ocupação do sítio
no inverno atingem temperaturas maiores de queima, enquanto fogueiras acesas no
verão, assim como fogueiras periféricas, atingem temperaturas moderadas.
A existência de áreas periféricas e centrais dentro dos concheiros yamana não
necessariamente significa a discriminação de um espaço a favor do outro. A formação
do concheiro assume a forma de um continuum de processos cotidianos, onde há uma
sucessão de processos de produção de detritos, na área central de moradia, e descarte de
resíduos fora da cabana, no anel periférico.
423
5. ANALOGIA GEO­ETNOARQUEOLÓGICA Como proposto no Capítulo 1, tópico 3.2.2, os resultados da análise
micromorfológica dos sambaquis catarinenses será contrastado com os resultados do
estudo micro-estratigráfico realizado no concheiro etnohistórico Túnel 7. A comparação
entre ambos os registros será realizada com base no processo de formação dos
concheiros, como ação mecânica. O significado do processo será avaliado como
corolário à formação dos sítios, através do filtro imposto pelas diferenças étnicas,
cronológicas e geográficas entre ambas as culturas.
Dos três padrões estratigráficos estudados nesta tese, os sambaquis conchíferos
são os que apresentam maior semelhança macroscópica com os concheiros do Canal
Beagle. Apesar das diferenças volumétricas entre ambos, trata-se de concheiros
estratificados, compostos maiormente por conchas de espécies locais (Mytilus edulis, no
caso fueguino, e A. brasiliana, no caso catarinense), com ossos, carvões e grãos
minerais (seixos e areias, na Terra do Fogo e Santa Catarina, respectivamente). No caso
dos concheiros do Holoceno médio, como o sítio Túnel 1, os perfis estratigráficos
apresentam semelhanças, em termos de forma e composição das camadas, com os
sambaquis catarinenses (ver Figura 6.5 A e B). Já o concheiro etno-histórico analisado
nesta tese, com escassos 30 cm de altura, na área central, e 60 cm de altura, no anel de
conchas, assemelha-se aos sambaquis catarinenses principalmente pela composição;
com predomínio de conchas e outros resíduos (carvão, ossos e grãos minerais).
Pela idade recente do concheiro Túnel 7, não se pode saber se a ocupação
contínua deste concheiro teria levado à formação de estruturas maiores, a longo prazo,
como as apresentadas na Figura 6.5 A e B. De fato, a ocupação diacrônica de concheiros
menores, como os agrupamentos da Figura 6.5 D-F, podem servir de imagem ilustrativa
para a formação dos grandes sambaquis conchíferos. No entanto, uma diferença chave
refere ao sistema de assentamento estabelecido em ambas as regiões. Na Terra do Fogo,
há maior dispersão horizontal nas ocupações, com formação de concheiros espalhados,
próximos um do outro, todo ao longo da costa do Canal Beagle. Já em Santa Catarina,
há maior focalização das ocupações com maior reiteração e, conseqüentemente,
crescimento vertical dos sítios. O que não pode-se saber, a partir das evidências
apresentadas neste trabalho, é se essa focalização dos sambaquieiros devia-se à
424
identificação e/ou domínio do território a partir de áreas de sepultamento comunais, ou
à marcação de lugares ótimos de captação de recursos, ou uma combinação dos dois.
A comparação com o concheiro Túnel 7 resulta de interesse para refinamento
dos processos de formação dos sambaquis conchíferos devido ao controle etnográfico
que existe sobre a formação do sítio. Este concheiro, de associação étnica conhecida, foi
formado a partir de ocupações domésticas descontinuas, mas recorrentes ao longo de,
pelo menos, um século, como explicado no Capítulo 2, tópico 5.1.2 e no Capítulo 3,
tópico 4.2. O registro arqueológico, tanto dos concheiros históricos como de alguns
concheiros pré-históricos (embora nos concheiros pré-históricos as evidências ainda
sejam questionáveis), é indicativo da existência de uma cabana na área central do sítio,
onde se mantinham fogueiras ativas e realizavam-se demais atividades cotidianas
(Estévez & Vila 2006; Estévez et al. 2001; Orquera 1996; Orquera & Piana 1996a,
1999a, 2000; Piana et al. 2000).
425
Figura 6.5. Concheiros do Canal Beagle: A) perfil do sítio Túnel 1 (Orquera & Piana 1999: 33); B) perfil
de um concheiro na Ilha Navarino (Handbook of South American Indians, volume 1, 1945: 28); C) perfil
estratigráfico do sítio Túnel 7; D) concheiros anelares na Baía Cambaceres; E) sítio Kurakani (Orquera &
Piana 1999: 25); E) concheiros da Ilha Navarino (Handbook of South American Indians, volume 1, 1945:
27).
Em termos de processos de formação, avaliados a partir da análise
micromorfológica, vários elementos são comuns aos dois contextos analisados. Das
cinco microfácies identificadas nos sambaquis conchíferos, três podem ser comparadas
com as microfácies identificadas no sítio Túnel 7. Por exemplo, a alteração pedogênica
de ambos os concheiros é observável a partir da formação de microestrutura de blocos
subangulosos, no caso de Túnel 7 (mF 2), e de microestrutra de grânulos coesivos, nos
426
sambaquis conchíferos (mF E). A razão g/f nestas microfácies apresenta, em ambos os
casos, tendência ao predomínio da fração fina sobre a fração grossa (10/90 em
sambaquis e 30/70 em Túnel 7). As diferenças em termos de pedogênese relacionam-se
com o contexto climático no qual se localizam os sítios, com maior incidência de
agentes de congelamento e derretimento na Terra do Fogo, e de dissolução e lixiviação
de solutos, em Santa Catarina. O congelamento do substrato é identificado através dos
blocos subangulares da mF 2 e dos cristais de calcita acicular que se distribuem ao
longo do sedimento, associados à fragmentação física das lâminas que compõem as
valvas de moluscos. A dissolução de carbonatos e fosfatos, associada ao regime
hidrológico e contexto climático dos sambaquis catarinenses, observa-se através da
baixa frequência de conchas na mF E e nas micromassas micríticas, com diversas
feições pedológicas (como revestimentos e enchimentos de micrita e espato) que
aparecem nas porções inferiores do perfil.
Nos dois contextos, identifica-se, igualmente, a microfácies típica de eventos de
deposição massiva de elementos descartados, com predomínio de conchas, o que
caracteriza os sítios concheiros em geral. No caso dos sambaquis catarinenses, os
episódios de descarte estão representados pela mF A, enquanto no concheiro fueguino
estão representados pela mF 3. Ambas as microfácies assemelham-se na microestrutura
de agregados intergranulares, na distribuição relacionada g/f de tipo enáulica, na razão
g/f de 70/30 e na distribuição sub-horizontal das conchas inteiras. Embora a ação de
deposição massiva de resíduos seja a mesma em ambos os casos, existem diferenças
entre ambas as microfácies, além daquela produzida pela alteração pós-deposicional do
sedimento, com feições de precipitação de carbonatos nos sambaquis e de congelamento
no Túnel 7. Uma das diferenças refere-se à maior quantidade de conchas e ossos
queimados nos sambaquis conchíferos, com quantidades desprezíveis no Túnel 7.
Esta diferença resulta chave para respaldar a interpretação dada à mF A. A mF 3
é associada ao descarte secundário dos resíduos produzidos dentro da cabana de
moradia, localizada na área central do concheiro, do lado do anel de conchas. A
ausência de conchas queimadas foi interpretada como devida à não alteração térmica
dos moluscos ou baixa incidência do fogo na textura das valvas, quando jogada nas
brasas para abertura e extração da carne. Nos sambaquis conchíferos, existe
retrabalhamento e mistura de conchas e ossos queimados a temperaturas diversas, cujo
aquecimento não aconteceu no local. Isto foi interpretado como evidência da complexa
história pré-deposicional dos elementos que compõem os sambaquis.
427
Assim, pelos relatos etnográficos e evidência micromorfológica, pode-se supor
que o concheiro fueguino é, de fato, um depósito secundário formado pelo descarte
imediato dos resíduos produzidos na área central de moradia. Se o sambaqui fosse
igualmente um depósito secundário, nele haveria apenas resíduos cuja história prédeposicional envolvesse consumo e descarte, como no caso fueguino, e não descarte,
queima e retrabalhamento para deposição última no sambaqui, como aqui evidenciado.
Estas características são as que permitem associar os sambaquis conchíferos com
depósitos terciários, o que representa uma diferença chave entre os dois contextos aqui
discutidos.
Em síntese, a história deposicional dos sambaquis é muito mais complexa que a
do concheiro fueguino. No litoral brasileiro, a acumulação de resíduos no mesmo local
prolonga-se durante milhares de anos, enquanto no concheiro Túnel 7 somente se
registraram dez momentos breves de acumulação ao longo de, no máximo, um século.
Esta diferencia substancial, evidenciada pela análise geoarqueológica, respalda as
propostas de uma estrutura social mais numerosa entre os sambaquieiros, com maior
densidade populacional e com sedentarismo, como também sugere a grande
concentração de sepultamentos que caracteriza aos sambaquis catarinenses (ver Fish et
al., 2000; DeBlasis et al., 2007; Gaspar et al. 2008). Essa sedentarização pode envolver
a realização de tarefas muito mais diversificadas na costa do Brasil que na Terra do
Fogo. Além disso, na Terra do Fogo não houve consumo de vegetais e não se realizaram
os processos culinários que envolvem o processamento de plantas para consumo, como
teria acontecido entre os sambaquieiros.
Neste sentido, a mF G descrita para o sambaqui de núcleo arenoso Carniça 3
assemelha-se também, em termos de composição e arranjo dos materiais, à mF 3.
Ambas as microfácies apresentam microestrutura de microagregados intergranulares,
formados por MO e microcarvões, distribuição relacionada g/f de tipo enáulica, vazios
de empacotamento complexo, conchas inteiras bem preservadas, com distribuição subhorizontal e demais elementos (grãos minerais, carvões, ossos queimados, fragmentos
de concha) com distribuição aleatória. A maior semelhança entre ambas as microfácies,
que as diferencia da mF A dos sambaquis conchíferos, é a baixa, senão nula, frequência
de conchas queimadas. Isto pode ser interpretado como sinal de afinidade, em termos de
proveniência dos materiais e atividade de deposição. Assim, a mF G também representa
o produto de descarte secundário, sobre o núcleo arenoso, de materiais processados nas
proximidades do sítio, assim como a mF 3 representa o descarte imediato de materiais
428
consumidos na cabana de moradia. Em ambos os casos, há mistura entre conchas
frescas com resíduos de queima. A associação entre a ação de descarte secundário que
caracteriza às mF G e mF 3 não significa, necessariamente, que os sambaquis de núcleo
arenoso possam ser assimilados a ocupações domésticas, como Túnel 7. Como discutido
no tópico 2.7, os sambaquis de núcleo arenoso resultam de ocupações efêmeras mais
planejadas, aparentemente não relacionadas com contextos domésticos nem funerários.
Outro elemento que contribui à discussão da relação entre microfácies estudadas
em sambaquis e no sítio Túnel 7 são as fogueiras da cabana de moradia do concheiro
fueguino. Estas fogueiras foram identificadas como mF 7, quando a temperatura de
combustão é moderada, e mF 8, quando atinge temperaturas superiores a 600° C.
Nenhuma microfácies semelhante foi identificada nos sambaquis conchíferos. Isto
porque fogueiras in situ não foram observadas nas sucessões verticais analisadas, mas
unicamente os produtos do retrabalhamento a curta distância de fogueiras acesas sobre o
sambaqui, categorizados como mF B. As mF B e mF 7 e 8 são aparentemente
semelhantes, mas com algumas diferenças. Entre as semelhanças, cabe mencionar a
microestrutura de microagregados intergranulares e a presença de agregados de argila
rubefacta, cinzas de madeira e conchas queimadas, com porcentagem superior a 20-30
% de conchas aquecidas a temperatura superior a 500° C. As diferenças referem-se ao
arranjo dos materiais, com evidências de inversão entre agregados queimados e
rubefactos na mF B que, ao mesmo tempo, apresenta menor espessura (cerca de 1 cm)
que as mF 7 e 8 (4 cm). Pode-se dizer que a mF B apresenta maiores semelhanças com a
mF 7, o que indica que, a fogueira original da qual provêm os materiais, teria atingido
temperaturas moderadas.
Por último, microfácies de pisoteamento sobre os sítios, como a mF 4
identificada no anel de conchas do Túnel 7, não foram observadas nos sambaquis
conchíferos estudados. Isto sugere que, pelo menos nas seções verticais analisadas, não
se identificaram áreas de pisoteamento ou trânsito de pessoas sobre o sambaqui. Pelo
grande volume dos sambaquis analisados, resulta ousado extrapolar esta observação ao
total dos sítios e admitir que não teria havido pisoteamento sobre os sambaquis. O que
pode ser dito, pelo momento, é que evidências de pisos de ocupação não foram
observadas, ainda, nestes sítios.
Assim, a comparação geo-etnoarqueológica entre ambos os contextos confirma
as diferenças intrínsecas à formação dos dois tipos de concheiros aqui analisados. A
observação da dinâmica de formação de um pequeno concheiro doméstico, comparado
429
com os grandes sambaquis catarinenses, destaca o complexo processo de formação dos
sambaquis que, como corolário, pode também evidenciar a complexidade de sua função
e de seu significado. Isto remete aos modelos de construção de sambaquis apresentados
no Capítulo 2, tópico 4.1. A formação de anéis de conchas periféricos à área central de
ocupação, que caracteriza o concheiro Túnel 7, foi proposto por diversos autores como
modelo para a construção de alguns sambaquis (sítios Conquista 9, Mar Casado, Araujo
II e Ilhote do Leste) (Guidon 1964; Orssich 1977; Tenório et al. 2008; Tiburtius 1966) e
como modelo geral para a formação destes sítios (Gaspar & DeBlasis 1992). No
entanto, a evidência geoarqueológica mostra a intrincada sucessão de ações envolvidas
na formação dos sambaquis, que vai além da deposição imediata, e secundária, de
detritos de alimentação nos arredores do local de moradia.
Tanto os aborígenes fueguinos como os sambaquis brasileiros foram, por muitos
anos, comparados e considerados análogos a tribos marginais a partir da proposta do
Handbook of South American Indians. Nos oito volumes que constituem esta obra, a
América do Sul foi subdividida em quatro grandes áreas culturais que correspondiam,
também, a estágios evolutivos, com a região andina como grande centro as inovações
culturais e, as áreas litorâneas, como regiões marginais (Steward, 1946). Assim, a
assimilação de ambas as culturas parecia conveniente, por se localizarem ambas em
áreas costeiras, consideradas como marginais; mas trazia como consequência a visão do
sambaqui como estrutura tão simples quanto a cultura humana que a produziu. Da
mesma maneira, os aborígenes fueguinos foram tomados como estereótipo e imagem
etnográfica do escasso potencial evolutivo das culturas litorâneas.
Deixando de lado os estereótipos evolucionistas, pode-se dizer que a cultura de
construtores de sambaquis e os aborígenes fueguinos compartilham vários traços, tanto
em termos organizacionais como materiais. Por exemplo: 1) em ambos os casos o
acervo artefatual inclui objetos líticos, lascados e polidos, assim como em concha e
osso; 2) enterramentos humanos são achados em numerosos sambaquis e também foram
relatados para concheiros da ilha Navarino, ilhas do arquipélago do Cabo de Hornos,
Chiloé, costa norte do Canal Beagle e litoral nordeste e noroeste da ilha Grande de Terra
do Fogo; 3) apesar das diferenças volumétricas, concheiros fueguinos e sambaquis são
estratificados, diferentemente dos concheiros da Patagônia, por exemplo, onde os sítios
costumam ter pouca expressão vertical (menos de 1 m) e consistir de camadas delgadas
de concheiro aflorantes em dunas ou voçorocas, ou ainda montículos pequenos, sem
estratificação interna, depositados sobre dunas eólicas (Borella & Favier Dubois 2008;
430
Caracotche et al. 2005; Gomez Otero et al. 1998; Gomez Otero 2006; Muñoz et al.
2009; Zubimendi 2007; Zubimendi et al. 2005); 4) ambas as culturas podem ser
definidas como caçadores-coletores marítimos, segundo a definição (Yesner, 1980) ou
culturas marítimas (sensu Diegues, 2004), ou seja, grupos com subsistência e tecnologia
baseadas na exploração de espécies aquáticas (segundo definição de Alvarez et al.,
2011); 4) a existência de canoas é comprovada para os aborígenes fueguinos e,
evidências indiretas, como discutidas no Capítulo 2, tópico 3.3, sugerem a existência
desta tecnologia entre os sambaquieiros; 5) apesar dos concheiros serem o remanescente
cultural mais conspícuo de ambas as culturas litorâneas, a subsistência dos grupos não
estava baseada no consumo de moluscos, mas de peixes, no caso dos sambaquis, e de
guanaco e lobo marinho, no caso fueguino; 6) por último, ambas as sociedades têm
escassa ou limitada incidência na reprodução dos recursos, denominador comum que
pode desembocar, em sociedades de pescadores-caçadores-coletores, em estratégias
sociais muito diferentes (Vila and Estevez, 2010).
Apesar das diferenças a respeito do tamanho dos concheiros deixados por ambas
as populações, Yamana e sambaquieiros, não há diferenças quanto ao valor simbólico e
papel social destas estruturas. Tanto o local de moradia quanto os locais de deposição
dos mortos (interpretação mais freqüente dada para os sambaquis catarinenses) são
elementos sociais em si mesmos, agentes ativos na transmissão de normas, crenças e
tradições. A grande diferença entre ambos diz respeito às evidências da complexa
história pré-deposicional dos sedimentos que compõem os sambaquis, em oposição ao
concheiro fueguino, cuja repetição manteve-se durante milhares de anos, até deixar na
paisagem grandiosas estruturas em concha. O volume dos sambaquis conchíferos e a
longa vida de ocupação dos sítios sugere maior quantidade de pessoas envolvidas na
formação dos sambaquis. Na Terra do Fogo, pelo contrário, nunca se chegaram a
alcançar as dimensões de acumulação de conchas que caracterizam o litoral catarinense.
Inclusive os concheiros mais antigos da Terra do Fogo não alcançam as dimensões dos
sambaquis catarinenses, atingida pela reiteração da ocupação dos sítios e acumulação
continua e ininterrupta. Nos sambaquis, acumulação está frequentemente associada ao
sepultamento dos mortos, mas não se pode saber, ainda, se o objetivo de sepultamento
doss mortos foi causa da acumulação ou a conseqüência da reiteração da ocupação e uso
do sítio.
Para finalizar, a análise geoarqueológica dos sambaquis catarinenses mostra que
a complexidade na formação dos sítios não se interpreta unicamente a partir do tamanho
431
e/ou presença de sepultamentos humanos, mas também a partir da intrincada sucessão
de eventos de consumo, alteração e deposição que permite caracterizar os sedimentos
dos sítios como depósitos terciários. Assim, a partir da comparação geoetnoarqueológica aqui proposta, detectam-se diferenças entre o concheiro fueguino e os
sambaquis que se referem à diversidade de atividades representadas, tamanho,
reiteração e continuidade da ocupação. Isto leva a pensar que as diferenças possam estar
relacionadas ao maior número de pessoas envolvidas e à maior diversidade de
atividades produtivas (como processamento de vegetais, por exemplo) associadas com
os grupos sambaquieiros.
432
CAPÍTULO 7. CONCLUSÕES Os processos de formação dos oito sambaquis estudados nesta tese foram
discutidos de acordo com o padrão estratigráfico ao qual pertencem (conchífero, de
núcleo arenoso ou em montículo ictiológico). As diferenças de morfologia, estratigrafia
e composição, agrupadas nos três padrões mencionados, expressam contrastes e
semelhanças no processo de formação. A relação sincrônica e diacrônica entre eles
reflete modelos concomitantes e sucessivos de ocupação do espaço, que serão
explicados a partir da permanência e mudança nos processos de formação.
A combinação dos dados micromorfológicos com os dados provenientes de
outras análises (física, isotópica, zooarqueológica) permite descomplicar a estratigrafia
de sambaquis ao mostrar que muitas das diferenças observadas a olho nu respondem a
processos comuns. Por exemplo, na maior parte dos casos, como nos sambaquis de
padrão estratigráfico conchífero e montículos ictiológicos, observa-se que os sítios
representam depósitos terciários de retrabalhamento de resíduos. No entanto, a
descomplicação da intrincada estratigrafia dos sítios não significa simplicidade de
formação. Como mostrado a partir da comparação etno-geoarqueológica com o
concheiro Túnel 7, existe sucessão de atividades na história pré-deposicional dos
sedimentos que compõem os sambaquis, cujo reconhecimento afasta interpretações da
sua formação baseadas na mera deposição secundária de resíduos descartados.
O número de pesquisas que mostram a complexidade na formação e simbolismo
associado aos sambaquis é crescente. A análise apresentada nesta tese soma-se a este
corpo de dados e reafirma que não há simplicidade nem unidirecionalidade na formação
e crescimento dos sambaquis.
433
1. COMEÇO E AUGE DOS SAMBAQUIS
Os sítios mais antigos da região de estudo são os sambaquis Caipora e Santa
Marta 10, localizados respectivamente no setor interno e externo da planície litorânea. O
sítio Caipora testemunha a presença humana na região há cerca de 7500 anos e
evidencia que a construção de sambaquis conchíferos muito provavelmente já acontecia
antes do máximo transgressivo holocênico na região. Como proposto no Capítulo 2,
tópicos 3.1 e 3.2, atualmente as evidências apontam para a hipótese dos grupos
sambaquieiros do litoral atlântico representarem uma unidade cultural independente dos
grupos do interior. Outras evidências também indicam que a colonização da costa teria
acontecido exclusivamente por via litorânea e os grupos construtores de sambaquis
seriam herdeiros dessa tradição.
Se for tomado o sítio Caipora como representante dos primeiros sambaquis
conchíferos desta porção do litoral, chega-se a uma conclusão substancial: desde o
começo da cultura de sambaquieira na região, o levantamento dos sítios consistia no
retrabalhamento de materiais descartados e queimados em outro local, que seriam
retransportados para deposição final no sambaqui. Esta tradição teria perdurado por
milhares de anos até, e inclusive durante, a intensificação do contato com os grupos
interioranos, entre 1700 e 1500 anos atrás. Esta evidência é extremamente importante na
discussão sobre a ausência de áreas de moradia associadas aos grandes sambaquis
conchíferos. A identificação destas áreas pode estar sendo mascarada pelo hábito de
retrabalhamento de resíduos que existe desde os momentos mais remotos de ocupação
sambaquieira na região.
O ritmo de uso e formação dos sambaquis conchíferos sugere padrões semisedentários de ocupação e permite identificar três elementos comuns no que se refere à
sua localização na paisagem: 1) todos se encontram próximos a bancos de moluscos; 2)
todos foram erguidos próximos a praias de baías ou mar aberto ou praias lagunares; 3)
todos foram construídos a partir da acumulação de resíduos, com ênfase na deposição de
conchas e restos de peixe.
As evidências apresentadas neste trabalho, sobre o processo de formação dos
sambaquis desde o sítio mais antigo até os mais novos (Cubículo 1, Morrinhos e
434
Jabuticabeira 1), vão contra a crença tradicional de que o levantamento de montículos
de conchas é uma tarefa simples. Há clara diferença entre transporte direto de conchas a
partir de um banco de moluscos e a formação de sambaquis. Como mostrado na
discussão do Capítulo 6, as evidências apontam para a possibilidade de coleta e
transporte a partir de diversos contextos onde há proliferação de moluscos, e não desde
um único local. Além disso, a queima de alguns moluscos e preservação de outros, a
alta frequência de resíduos de origem animal, como ossos de peixe, principalmente
queimados, os resíduos da queima de plantas e os indícios de fogueiras acesas sobre o
sítio e varridas a curta distância são alguns dos indicadores da complexa história prédeposicional dos sedimentos. Neste sentido, a formação do sambaqui teria requerido
mais esforços e trabalho que a simples coleta, consumo e descarte de moluscos e restos
de peixe usados como alimento.
A complexidade envolvida na elevação dos sambaquis conchíferos, mostrada
pelas análises geoarqueológicas, serve como indicador de que o próprio sedimento do
sambaqui, e não unicamente o seu volume ou presença de enterramentos, é reflexo da
significância social destas estruturas (ver Sherwood & Kidder, 2011, para os mounds do
Arcaico e Formativo da América do Norte). Considerar os sambaquis unicamente como
recipientes para sepultamento dos mortos do grupo significa, em última instância,
assumir que o sambaqui não representa um objetivo em si mesmo, mas simplesmente o
meio para alcançar um objetivo. No entanto, e seguindo o argumento de Sherwood &
Kidder (2011), esta visão corre o risco de desconsiderar ao sedimento formado pela
prática recorrente de deposição de resíduos, seja ou não relacionada a sepultamentos,
como de igual valor social e simbólico.
O levantamento dos sambaquis conchíferos, embora tenha durado, em alguns
casos, milhares de anos, é produto de esforços repetitivos. Há recorrência de espessas
camadas que respondem ao mesmo processo de formação, em sítios cuja cronologia se
estende por mais de 5000 anos. Há também intercalação com camadas de poucos
centímetros de espessura compostas por restos de plantas e ósseos queimados, que
indica, pelo menos, dois diferentes tipos de processos deposicionais associados à
formação dos sítios. A repetição na formação dos sambaquis pode ter-se transformado,
ao longo do tempo e na medida em que aumentava o volume dos sítios, em projeto
arquitetônico. Os sambaquis conchíferos podem ter começado como construções
espontâneas que, posteriormente, adquiriram uma identidade própria.
435
Inclusive em tempos recentes, a grandiosidade dos sambaquis impõe-se na nossa
percepção do ambiente e resulta impossível não imaginar o impacto visual que estes
sítios teriam tido para os visitantes de sua época, ou mesmo entre os próprios
sambaquieiros. No entanto, não se pode ter certeza, a partir da análise geoarqueológica
aqui apresentada, se o significado destas estruturas teria sido o mesmo desde os
primeiros sambaquis conchíferos ou se mudou na medida em que crescia o
estabelecimento e/ou poder do grupo na região. O que é claramente identificável é a
recorrência no processo de formação dos sítios. È possível que, no início, não tenha
existido ainda o valor normativo e simbólico dos depósitos como estruturas conspícuas
na paisagem. Uma atividade rotineira, como a acumulação de resíduos e subprodutos
alimentares, pode ter-se transformado em uma prática cerimonial cíclica, relacionada
com o retrabalhamento de substâncias vitais que refletem a vida econômica do grupo
(conchas e peixes) (ver Johansen, 2004), direcionada aos sepultamentos de mortos
como estratégia de marcação do lugar de vida ancestral.
Concomitante ao levantamento dos sambaquis conchíferos, erguia-se outro tipo de
sítio cujo processo de formação é mais direcional e simples. Estes são os sambaquis de
núcleo arenoso, representados nesta tese pelos sítios Santa Marta 10 e Carniça 3. O
retrabalhamento de materiais também está evidenciado nestes depósitos, mas a história
pré-deposicional é menos complexa que para os sambaquis conchíferos. Parece haver,
nos sambaquis de núcleo arenoso, evidências da destruição de restos de fogueiras, nas
quais eram queimadas plantas, principalmente, e alguns resíduos animais, em segunda
instância. No entanto, tal destruição favorecia a construção de uma nova estrutura na
paisagem, que teria ficado como memória dos acontecimentos.
Pelas suas características físicas e composicionais, estes sítios teriam resultado de
ocupações efêmeras, mas planejadas. Estes sítios, que aparecem unicamente no setor
externo, não apresentam ainda evidências claras de se tratar de áreas de moradia e
podem ser, entre outras explicações possíveis, os remanescentes de antigas estruturas de
cobertura, ou antigas áreas de celebração de rituais esporádicos (como ritos de iniciação
ou passagem). Neste sentido, tenta-se reforçar que ritual em caçadores-coletores não se
limita apenas às práticas associadas com o tratamento dos mortos.
436
2. COLAPSO E SURGIMENTO DA UMA NOVA ORDEM
O final do projeto de arquitetura em conchas está marcado, arqueologicamente,
pela aparição, sobre os sambaquis, de restos cerâmicos da tradição Taquara/ Itararé,
associados com os grupos Jê do planalto, e pelo surgimento dos aqui denominados sítios
mistos (ver definição em Capítulo 2, tópico 3.5.1). Na área de estudo, tanto os sítios
Santa Marta 8 como Galheta 4 pertencem a esta categoria e foram estudados com a
finalidade de entender a sua relação, em termos de processos de formação, com os
sambaquis conchíferos e de núcleo arenoso.
Antes de passar à discussão dos resultados apresentados nesta tese, é necessário
expor a perspectiva adotada para a suposta chegada dos grupos ceramistas ao litoral.
Como mencionado no Capítulo 2, tópico 3.5.2, acredita-se que não teria havido chegada
massiva dos Jê à costa, mas sim uma intensificação no contato e domínio dos ceramistas
sobre os pescadores-caçadores-coletores do litoral, evidenciada pela adoção da
tecnologia cerâmica e pelo abandono da deposição de conchas. Isto se interpreta a partir
das diferenças entre os sítios mistos do litoral e os sítios típicos dos Jê do planalto
meridional. No litoral há evidências de pesca intensiva e acumulação de restos de
resíduos, inclusive para sepultar os mortos, com tecnologia em osso e concha (ausente
na tradição Taquara/Itararé); no planalto há assentamentos semi-permanentes,
subsistência baseada na caça de mamíferos da mata de araucárias e de encosta, coleta de
pinhão e inclusive agricultura, com práticas funerárias que envolvem a cremação dos
corpos (Beber, 2004; Behling et al., 2007; Gessert et al., em prensa; Iriarte and Behling,
2007; Iriarte et al., 2008; Lavina, 1994; De Masi, 1999, 2007; Reis, 1980; Rohr, 1971;
Schmitz and Becker, 1991). Unicamente em tempos históricos, os Jê meridionais
transformaram a sua dinâmica de ocupação, por causa do contato com os colonizadores
e, possivelmente, com grupos guaranis em expansão, até organizações nômades e de
alta mobilidade, em fluxo sazonal entre a mata atlântica e a floresta de araucárias, com
algumas incursões até o litoral. (Farias, 2005; Lavina, 1994; Noelli, 1999; Paula, 1924;
Ploetz and Métraux, 1930; Santos, 1973).
Pelas características dos sítios mistos, como os estudados nesta tese, parece difícil
pensar que grupos Jê tivessem mudado radicalmente após a suposta descida do planalto
até o litoral há 1500 anos. Esta situação, como já mencionado por Prous (1992), parece
437
pouco provável. Neste sentido, comunidades marítimas, dependentes da pesca, como
também assinalam as análises isotópicas (Bastos 2009) e bioantropológicas (Neves
1988; Okumura 2007; Scherer et al. 2006; Wesolowsky 2000) realizados em indivíduos
sepultados nos sítios mistos, não se desenvolvem em alguns anos, mas são processos
históricos que se constroem através da inter-relação socioeconômica e simbólica do
grupo com o mar (Diegues, 2004).
O que parece ter havido no litoral é a introdução de uma tecnologia, sem
modificação no sistema de produção característico das comunidades pescadoras, mas
com intensificação na violência e com abandono do simbolismo associado à arquitetura
em conchas. Neste sentido, a adoção da tecnologia cerâmica não necessariamente
envolveu mudanças irreversíveis nas práticas de subsistência entre grupos coletorespescadores, mas mostra continuidade com o processamento de recursos marinhos (ver
Craig et al., 2011). Antes de associar a desaparição de uma tradição cultural com a
desaparição de um grupo, é necessário considerar também que as crenças e tradições
associadas aos símbolos e padrões materiais que se utilizam para identificar grupos
sociais no passado estão sujeitos a mudanças (Nelson and Hegmon, 2001). Da mesma
maneira, a inviabilidade do hábito de formação de sambaquis, causada pelas diferenças
idiossincráticas essenciais entre os sambaquieiros e os grupos ceramistas (Gaspar et al.
2007), poderia estar vinculada a uma mudança ideológica associada a um novo contexto
político, e não necessariamente à invasão do território e desaparição do grupo
sambaquieiro. Isso testemunha as marcas de violência, claros indicadores de poder de
um grupo sobre outro (Angelbeck, 2009).
A análise geoarqueológica aqui proposta vai ao encontro das hipóteses propostas.
No caso do sítio Santa Marta 8, demonstrou-se a continuidade no processo de formação
com os sambaquis conchíferos, além da aparição da tecnologia cerâmica. O mesmo
padrão de retrabalhamento de resíduos acumulados e queimados em local diferente do
final observa-se não unicamente neste sambaqui, mas também na camada preta que
recobre grande parte do sambaqui Jabuticabeira 2. Ambos os depósitos, de idade e
composição semelhante, podem servir de evidência para entender o tipo de contato
estabelecido entre os grupos costeiros e interioranos em tempo recente, que desembocou
na obsolescência da arquitetura em conchas. Já no sítio Galheta 4, não se identifica o
mesmo padrão dos sambaquis conchíferos, mas sim a exploração intensa de recursos
aquáticos e deposição de seus resíduos sobre os mortos.
438
Assim, apenas o material teria sido abandonado, junto com a adoção da tecnologia
cerâmica, mas não o habito de retrabalhamento de resíduos. Esta mudança certamente
acarretou uma alteração no papel social dos montículos, não unicamente em forma, mas
também em significado. Pode-se pensar, hipoteticamente, que o abandono do uso das
conchas representa uma reação às mudanças impostas no sistema social e político das
comunidades costeiras a partir da intensificação dos contatos com os grupos do interior.
O surgimento dos montículos ictiológicos pode responder a uma intencionalidade de
querer diferenciar a nova ordem sociopolítica imposta pela tensões com os grupos
ceramistas.
Pode-se pensar que sambaquieiros e Jê compartilhavam um sistema relativamente
pacífico de intercâmbio desde a chegada dos Jê ao planalto meridional, cerca de 3000
anos atrás, em pleno auge da cultura sambaquieira na costa. Este sistema de interação
social poderia ter-se intensificado como resultado do crescimento demográfico, do
estabelecimento de aldeias mais permanentes no planalto, por volta de 1400 a 900 anos
AP (Iriarte & Behling, 2007), e da expansão dos Jê até o sul do país provocada pela
pressão guarani (Noelli 1999). O crescimento no interior associar-se-ia a um aumento
nas ocupações na encosta e no contato com a planície litorânea, que exercia maior
pressão sobre os grupos costeiros. Neste momento, começam a aparecer as
concentrações de cerâmica no litoral, o que coincide com a desestabilização da cultura
clássica sambaquieiros, com menor número de sítios e declínio da arquitetura em
conchas. Este período, após 1500 AP, caracteriza-se também pelo aumento nos conflitos
na costa (ver Lessa, 2005; Lessa & Scherer, 2008), bem como do intercâmbio de
indivíduos com o interior (ver Bastos 2009; Okumura 2007), com mudança radical no
padrão de residência pós-marital (Hubbe et al. 2009).
Não se trataria, portanto, de a invasão do litoral por grupos do planalto meridional
ter provocado a desestabilização de uma suposta arquitetura monumental; mas sim de a
pressão geográfica, política e, principalmente, ideológica, exercida pelos ceramistas
interioranos, ter motivado uma reestruturação da cultura tradicional da costa.
439
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474
ANEXO 1: Figuras e tabelas complementares 475
Figura A.1. Diferentes tipos de distribuições relacionadas g/f (adaptado de Stoops, 2003).
476
Figura A.2. Diagrama de regressão linear entre os valores de C orgânico e N total. O elevado índice de
correlação indica que os dados de N total podem ser usados como reflexo da concentração de N orgânico
na MO.
477
Figura A.3. Análise mineralógica e óptica da concha de Anomalocardia brasiliana: A) difratograma
obtido a partir de amostra da concha, com picos correspondentes a aragonita; B) imagem tomada com
microscópio esteoreosópico de seção da concha de Anomalocardia brasiliana. Note-se as camadas de
crescimento da valva.
478
Figura A.4. Análise de seção delgada da amostra CA 2-3 (sítio Caipora) em microscópio eletrônico de
varredura: A) mapeamento elementar; B) imagem de elétrons retroespalhados (QSBD) com pontos de
microanálise e tabela com resultados da análise semi-quantitativa.
479
Figura A.5. Análise de seção delgada da amostra JB1-8 (sítio Jabuticabeira 1) em microscópio eletrônico
de varredura: A) imagem de elétrons retroespalhados (QSBD) com pontos de microanálise e tabela com
resultados da análise semi-quantitativa; B) mapeamento elementar.
480
Figura A.6. Análise de seção delgada da amostra SM10-B (sítio Santa Marta 10) em microscópio
eletrônico de varredura: A) imagem de elétrons retroespalhados (QSBD) com pontos de microanálise e
tabela com resultados da análise semi-quantitativa; B) mapeamento elementar.
481
Figura A.7. Análise de seção delgada da amostra SM8-3 (sítio Santa Marta 8) em microscópio eletrônico
de varredura: A) imagem de elétrons retroespalhados (QSBD) com pontos de microanálise e tabela com
resultados da análise semi-quantitativa; B) mapeamento elementar.
482
Figura A.8. Análise de seção delgada da amostra GA4-1 (sítio Galheta 4) em microscópio eletrônico de
varredura: A) mapeamento elementar; B) imagem de elétrons retroespalhados (QSBD) com pontos de
microanálise e gráfico com picos da análise semi-quantitativa.
483
Tabela A.1. Resultados das análises granulométricas e parâmetros estatísticos para sedimentos arqueológicos e depósitos naturais. Todas as amostras arqueológicas foram
tratadas segundo procedimento descrito no Capítulo 4, tópico 3.2. No calculo dos momentos não foram considerados os sedimentos pelíticos.
PARÂMETROS ESTATÍSTICOS DA DISTRIBUIÇÃO GRANULOMÉTRICA
(Phi)
CÓDIGO
DIÃMETRO
MÉDIO
DESVIO
PADRÃO
CASCALHO
ASSIMETRIA
CURTOSE
CA-1a
1,76
0,84
-1,17
4,21
CA-1b
0,35
1,78
0,59
1,70
CA-A
1,82
1,37
-0,41
2,17
CB1-5
0,95
1,44
0,10
1,50
CB1-A
-0,43
1,27
1,61
4,38
CB1-B
0,59
1,49
0,38
1,86
MO-2
3,02
0,72
-1,46
5,10
MO-3
1,67
1,25
-0,19
2,14
MO-4
1,85
1,10
-0,56
2,71
JAB1-1
1,74
0,84
-0,72
5,01
JAB1-2
1,68
0,88
-0,51
4,56
JAB1-3
1,89
0,43
0,55
8,40
JAB1-4
1,74
0,37
-1,04
15,32
JAB1-5
1,83
0,83
-0,19
3,99
JAB1-6
1,90
1,02
-0,29
2,62
JAB1-7
2,04
0,95
-0,06
2,35
JAB1-9
2,13
0,58
0,21
3,18
SM10-A
2,80
0,47
-2,12
16,97
SM10-B
2,64
0,42
0,01
3,23
SM10-B2
2,87
0,42
-1,28
10,11
CR3-2
2,83
0,63
-0,90
2,77
SM8-1
2,51
0,58
-0,67
4,76
SM8-2
2,60
0,69
-1,11
6,92
SM8-3
2,72
0,30
-0,44
6,76
SM8-A
2,68
0,30
-0,11
3,18
SM8-B
2,43
0,80
-1,08
4,05
GA4-1
2,80
0,32
-0,63
7,44
GA4-A
3,03
0,31
-0,69
5,23
GA4-B
2,88
0,38
-2,28
21,93
Programa Momentos4, de Paulo Cesar Fonseca Giannini IGc/USP
FAIXA GRANULOMÉTRICA (%)
AREIA
SEIXOS
GRÂNULO
TOTAL
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,03
36,42
1,26
0,00
48,13
8,45
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,08
0,03
36,42
1,26
0,00
48,13
8,45
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,08
484
MUITO
GROSSA
5,33
22,82
4,80
37,29
22,72
12,07
0,22
12,76
8,00
6,07
6,85
0,19
0,53
4,14
5,91
0,00
0,08
0,45
0,00
0,14
0,00
0,00
1,22
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,07
PELÍTICOS
GROSSA
MÉDIA
FINA
10,44
4,71
7,65
11,61
5,89
7,57
1,87
17,52
13,07
6,33
7,15
0,59
1,12
8,53
12,43
15,02
1,65
0,13
0,07
0,12
0,00
3,19
2,47
0,05
0,00
8,60
0,09
0,04
0,21
31,31
6,14
12,41
17,36
4,79
7,09
8,63
28,65
27,25
57,47
62,63
65,57
84,42
52,51
34,13
31,07
43,29
0,99
3,51
0,89
11,11
7,05
3,27
1,56
0,67
10,21
1,50
0,19
0,57
50,46
21,14
9,39
24,81
7,37
7,69
21,38
21,69
39,74
24,00
16,23
31,44
13,21
26,12
33,58
35,97
47,20
63,29
74,48
53,61
28,74
77,14
76,15
87,09
87,51
63,59
76,72
42,62
62,16
MUITO
FINA
2,43
8,76
12,30
8,93
1,76
2,92
67,90
19,38
11,94
6,13
7,14
2,21
0,72
8,70
13,96
17,94
7,77
31,61
17,77
37,46
60,14
12,61
16,89
11,29
11,82
17,61
21,70
55,35
35,96
TOTAL
SILTE
ARGILA
99,97
63,58
46,54
100,00
42,53
37,34
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
96,47
95,82
92,23
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
98,21
98,96
0,00
0,00
36,44
0,00
6,46
30,45
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,07
0,29
2,49
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,69
0,14
0,00
0,00
52,20
0,00
9,34
54,21
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
3,53
4,18
7,77
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
1,79
0,95
Tabela A.2. Concentrações de carbono e nitrogênio total (%), δ13C e δ15N (‰) nas arqueofácies
identificadas nos 8 sambaquis estudados e nos pontos de amostragem extra-sítio.
Sítio
CA-4
CA-5
CB1-5
MO-2
MO-4
JB1-1
JB1-2
JB1-3
JB1-4
JB1-5
JB1-6
JB1-7
CR3-1
SM8-2
SM8-3
SM10-B
GA4-1
Extra-sítio
CA-A
CB1-A
CB1-B
SM8-B
SM10-B2
GA4-B
C orgânico (%)
13
C (δPDB)
0,54
0,84
9,94
3,41
1,76
0,42
2,43
2,90
3,37
2,26
3,00
2,11
4,08
0,76
1,22
1,72
1,57
C orgânico (%)
1,23
1,22
3,40
1,17
0,20
0,36
-24,47
-23,40
-26,93
-23,91
-24,35
-23,53
-24,76
-22,74
-25,48
-24,65
-23,72
-23,14
-28,17
-23,65
-24,73
-24,19
-23,28
15
N (δar)
0,04
0,07
0,29
0,17
0,11
0,04
0,15
0,18
0,11
0,14
0,18
0,13
0,24
0,06
0,10
0,09
0,11
13
C (δPDB)
-22,36
-24,55
-24,44
-20,89
-24,97
-21,50
N total (%)
0,12
0,10
0,29
0,09
0,02
0,02
N total (%)
485
12,31
11,36
10,82
10,05
13,32
14,03
13,97
15,23
12,10
11,70
11,59
14,99
8,50
15,34
13,52
7,39
15,94
15
N (δar)
9,78
8,40
8,75
13,54
7,82
8,91
Razão C/N
13,50
12,00
34,28
20,06
16,00
10,50
16,20
16,11
30,64
16,14
16,67
16,23
17,00
12,67
12,20
19,11
14,27
Razão C/N
10,25
12,20
11,72
13,00
10,00
18,00
Tabela A.3. Porcentagens de espécies malacológicas identificadas a partir da análise zooarqueológica dos sítios Santa Marta 10, Morrinhos, Cubículo 1 e Carniça 3. A
identificação e estimação das frequências foram realizadas a partir de volumes padronizados de sedimento extraído das arqueofácies de interesse, as porcentagens foram
calculadas a partir do peso de cada espécie e elemento identificado em relação ao peso total.
86,53
0,14
0,17
0,01
0,24
0,40
Concreção de conchas
0,06
Concreção de areia
0,50
0,04
Frag. líticos
Gastrópodes indeterm.
0,05
0,12
Bivalves indeterm.
Otólitos
Ossos
Vermetídeos
Craca
Cyrtopleura costata
1,20
0,38
0,14
0,17
0,04
0,05
0,30
0,11
1,01
2,61
0,01
0,35
0,51
0,01
0,02
0,01
0,20
0,29
0,80
0,12
0,06
0,12
0,01
0,01
0,01
0,01
0,15
0,06
0,04
0,19
0,07
0,20
13,23
1,55
17,85
0,05
0,00
0,81
0,18
Tellina angulosa
0,02
Lirophora paphia
Crepídula sp.
0,04
Marisco
Neritina virginea
0,31
Lucina pectinata
Thais haemastoma
0,19
Littorina flava
0,29
Trachycardium
muricatum
0,03
0,13
0,17
0,06
0,14
0,02
0,09
0,02
0,02
0,07
0,57
Bula striata
0,07
0,01
0,24
0,13
Cerítium sp.
0,13
Chione cancellata
50,46
38,19
64,18
1,35
14,42
20,69
0,47
5,42
Nassarius vivex
1,36
2,32
26,13
70,65
61,69
79,49
77,16
92,94
Macoma sp.
48,83
45,10
29,03
42,72
11,40
13,06
17,74
13,70
5,55
12,90
Heleobia sp.
Ostrea sp.
1535,81
1607,54
912,8
1603,42
1210,15
1110,31
1065,57
1036,76
828,45
266,73
Anomalocardiabrasilian
a
Malha 2mm
SM10-1
MO-1
MO-3
MO-4
CB1-2
CB1-3
CB1-4
CB1-7
CB1-8
CR3-2
Peso total das
conchas(g)
(%)
486
0,10
0,51
0,79
0,24
0,09
0,03
0,03
0,08
0,01
0,12
0,02
0,36
0,00
0,16
0,23
2,04
0,02
0,29
0,73
0,16
0,01
0,06
0,26
8,16
1,47
0,75
0,09
2,26
0,02
Tabela A.5. Lista de abreviações utilizadas nas tabelas de descrição micromorfológica do Capítulo 5.
Porosidade
Agregados/peds
Empacotamento complexo
Empacotamento composto
Empacotamento simples
Câmara
Vesícula
Canal
Fissura
Star-shaped
regulares
e-cx
e-cm
e-s
cm
vs
cn
fs
s-s
re
Limpidez
Ponteado
Mosqueado
Límpido
Turvo
Opaco
pt
ms
lp
tr
op
Grânulos
Grumos
Apedal
gr
cm
ap
Fabrica b
Indiferenciada
Cristalítica
Mosqueada-granida
ind
cri
m-g
Dustribuição
relacionada g/f
Porfírica
Gefúrica
Quitónica
Mónica
Enáulica
Fechada
Espaçamento simples
Espaçamento duplo
Grosso
Fino
por
gef
quit
mon
en
f
e-s
e-d
gr
fn
Feições pedológicas
Revestimentos
Nódulos de ferro
Enchimentos
Hiporevestimentos
Excrementos
Cristais
rev
Fe-nod
ench
hiporev
exc
cris
Tabela A.6. Coordenadas UTM das trincheiras de amostragem extra-sítio abertas nesta tese e dos
testemunhos analisados por Nascimento (2011) e Amaral (2008) usados como referência.
Código
CA
CB1
SM8
SM10
GA4
TB1
TB2
GD1
GD2
GD3
MD1
SB1
FIG
RIA
Coord.
(UTM, zona 22J)
E685967/S6838087
E689428/S6838934
E711562/S6835102
E713010/S6834346
E716313/S6838045
E698254/S6850006
E699341/S6842426
E700803/S6840860
E700288/S6839248
E703168/S6837206
E706608/S6839550
E707924/S6844218
E696144/S6828081
E695659/S6829937
N° amostras
1
2
1
1
1
2
2
2
2
4
2
4
2
2
488
Referência
*
*
*
*
*
(Nascimento 2011)
(Nascimento 2011)
(Nascimento 2011)
(Nascimento 2011)
(Nascimento 2011)
(Nascimento 2011)
(Nascimento 2011)
(Amaral 2008)
(Amaral 2008)
Tabela A.7. Fácies amostradas para análises isotópicas em trincheiras extra-sítio e provenientes dos
testemunhos analisados por Nascimento (2011) e Amaral (2008), com descrição da textura, sistema
deposicional associado e concentração de δ13C, δ15N e razão C/N (S = sistema deposicional; L = lagunar,
D = deltaico, E = eólico, C = coluvio).
Amostra
CA-A
CB1-A
CB1-B
SM8-B
SM10-B2
GA4-B
TB1-725
TB1-795
TB2-750
TB2-875
GD1-10
GD1-50
GD2-26
GD2-106
GD3-79
GD3-199
GD3-279
GD3-359
MD1-40
MD1-127
SB1-325
SB1-425
SB1-625
SB1-975
SB1-1225
FIG-40
FIG-70
RIA-110
RIA-210
Descrição
Argila lamosa
Areia lamosa
Argila arenosa
Areia lamosa
Areia lamosa
Areia
Areia fina lamosa com conchas
Areia fina lamosa com conchas
Lama com conchas
Lama com conchas
Turfa
Lama com detritos vegetais
Lama
Lama
Turfa
Areia fina lamosa com detritos vegetais
Lama com areia lamosa e conchas
Lama com areia lamosa e conchas
Areia fina com lâminas de lama e detritos vegetais
Areia fina lamosa
Lama
Areia fina lamosa com conchas
Lama com conchas
Lama com conchas
Lama com conchas
Argila arenosa com fragmentos vegetais
Areia fina argilosa maciça
Argila arenosa maciça
Argila arenosa maciça
489
S
L
C
L
E
E
L
L
L
L
D
D
D
D
D
D
L
L
D
L
D
L
L
L
L
L
L
L
L
δ13C
-22,36
-24,55
-24,44
-20,89
-24,97
-21,50
-26,68
-26,50
-25,54
-23,52
-25,88
-22,05
-26,36
-26,48
-18,41
-26,94
-20,04
-19,68
-26,83
-21,47
-24,54
-23,43
-21,92
-18,94
-11,82
-22,5
-18,2
-17,9
-10,1
δ15N
9,78
8,40
8,75
13,54
7,82
8,91
3,29
4,24
2,11
4,32
4,08
4,97
4,82
3,4
0,09
3,52
7,5
5,4
4,33
5,52
5,4
6,06
7,34
8,02
8,98
2,31
3,7
7,01
10,6
C/N
10,25
12,20
11,72
13,00
10,00
18,00
12,20
16,12
4,80
9,53
9,40
11,91
8,86
10,87
14,22
16,14
11,03
15,22
14,41
8,77
12,63
10,83
11.06
8,455
14,543
14,15
10,02
17,61
8,17
ANEXO 2: Publicações, prêmios, participação em eventos 490
Publicações vinculadas com o projeto de doutorado:
1. VILLAGRAN, Ximena S., BALBO, Andrea L., MADELLA, Marco, VILA,
Assumpció, ESTEVEZ, Jordi. Stratigraphic and spatial variability in shell
middens: microfacies identification at the ethnohistoric site Tunel VII (Tierra del
Fuego, Argentina). Archaeological and Anthropological Sciences, v.3, p.357 378, 2011.
2. VILLAGRAN, Ximena S., BALBO, Andrea L., MADELLA, Marco, VILA,
Assumpció, ESTEVEZ, Jordi. Experimental Micromorphology in Tierra del
Fuego (Argentina): building a reference collection for the study of shell middens
in cold climates. Journal of Archaeological Science, v.38, p.588 - 604, 2010.
3. GODINO, Ivan Briz, ALVAREZ, Myrian, BALBO, Andrea, ZURRO, Débora,
MADELLA, Marco, VILLAGRAN, Ximena S., FRENCH, Charles. Towards
high-resolution shell midden archaeology: experimental and ethno-archaeology
in Tierra del Fuego (Argentina). Quaternary International, v.239, p.125 - 134,
2011.
4. GIANNINI, Paulo C. F., VILLAGRAN, Ximena S., FORNARI, M.,
NASCIMENTO, D. R., MENEZES, P. M. L., TANAKA, Ana Paula B.,
ASSUNCAO, D. C., DEBLASIS, P., AMARAL, P. G. C. Interações entre
evolução sedimentar e ocupação humana pré-histórica na costa centro-sul de
Santa Catarina. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências
Humanas, v.5, p.105 - 128, 2010.
Publicações vinculadas com projetos paralelos ao doutorado
1. VILLAGRAN, Ximena S., KLOKLER, Daniela, PEIXOTO, Silvia, DEBLASIS,
Paulo, GIANNINI, Paulo C. F. Building Coastal Landscapes: Zooarchaeology
and Geoarchaeology of Brazilian Shell Mounds. The Journal of Island and
Coastal Archaeology, v.6, p.211 - 234, 2011.
2. VILLAGRAN, Ximena S. With an Eye on the Southern Shores: Insights Into
South American Coastal Archaeology. The Journal of Island and Coastal
Archaeology, v.6, p.173 - 175, 2011.
3. VILLAGRAN, Ximena S., SCHAEFER, Carlos E.G.R. Geoarqueologia das
primeiras ocupações humanas na Antartica. Vestígios. Revista latino-americana
de arqueologia histórica, v.5, p.115 - 136, 2011.
4. FORANCELLI PACHECO, Mírian L.A., VILLAGRAN, Ximena S.,
MARTINS, Gilson R. Macroscopic and microbiological alterations of bird and
small mammal bones buried in a Cerrado biome (south western Brazil). Journal
of Archaeological Science, v.39, p.1394 - 1400, 2011.
5. KLOKLER, Daniela, VILLAGRAN, Ximena S., GIANNINI, Paulo Cesar
Fonseca, PEIXOTO, Silvia, DEBLASIS, Paulo. Juntos na costa: zooarqueologia
e geoarqueologia de sambaquis do litoral sul catarinense. Revista do Museu de
Arqueologia e Etnologia, v.20, p.53 - 76, 2010.
491
Prêmios
Young Micromorphologist´s Publication Award 2012, International Union of Soil
Sciences, Comission 1.1 Soil Morphology & Micromorphology
Participação em eventos
1. Apresentação Oral no(a) 14th International Working Meeting on Soil
Micromorphology, 2012. (Congresso). Mounded landscapes of the Brazilian
coast: shell, sand and fish mounds from the macro- to the micro-scale.
2. Apresentação de Poster / Painel no(a) 14th International Working Meeting on
Soil Micromorphology, 2012. (Congresso). The geoarchaeology of the first
human settlements in Antartica.
3. Apresentação de Poster / Painel no(a) XIII Congresso da Associação
Brasileira de Estudos do Quaternário - ABEQUA, 2011. (Congresso). A
EVOLUÇÃO GEOLÓGICA DO LITORAL SUL DE SANTA CATARINA,
VISTA ATRAVÉS DA MICROMORFOLOGIA DE SAMBAQUIS.
4. Apresentação Oral no(a) XVI Congresso da Sociedade de Arqueologia
Brasileira / XVI World Congress of UISPP, 2011. (Congresso). A
interpretação de estruturas de combustão e resíduos queimados em sítios
concheiros do litoral catarinense (Brasil) e de Tierra del Fuego (Argentina).
5. Apresentação Oral no(a) II Semana de Arqueologia do MAE, 2011.
(Congresso). Até o mínimo detalhe: microscopia de concheiros arqueológicos.
6. Apresentação Oral no(a) 75th Annual Meeting of the Society for American
Archaeology, 2011. (Congresso). Optimal foraging or exceptional feasting:
from environmental adaptation to social integration.
7. Apresentação Oral no(a) XVI Congresso da Sociedade de Arqueologia
Brasileira / XVI World Congress of UISPP, 2011. (Congresso). Primeiros
estudos micro-estratigráficos em "cerritos" conjunto Pago Lindo
(Tacuarembó), Uruguai.
8. Apresentação de Poster / Painel no(a) European Geosciences Union - General
Assembly, 2010. (Congresso). An experimental approach for archaeological
soil micromophology: building a model for site taphonomy in coastal shell
middens of the Beagle Channel (Argentina).
9. Apresentação Oral no(a) V Reunion de Teoría Arqueológica en América del
Sur, 2010. (Congresso). Un micro-mundo a orillas del Beagle: Aproximación
micromorfológica para el estudio de concheros fueguinos.
10. Conferencista no(a) V Ciclo de Conversaciones en el Raval. Institución Milá
y Fontanals (CSIC/ Barcelona), 2009. (Seminário). Arqueología de la costa de
Brasil.
11. Apresentação Oral no(a) 74th Annual Meeting of the Society for American
Archaeology, 2009. (Congresso). Building coastal landscapes: zooarchaeology
and geoarchaeology as tools to understand ritual shell deposits.
12. Apresentação de Poster / Painel no(a) XV Congresso da Sociedade de
Arqueologia Brasileira, 2009.
(Congresso). Dinâmica espacial e
assentamentos domésticos nos sambaquis da Ilha do Cabo Frio (Rio de Janeiro).
492
13. Apresentação Oral no(a) XV Congresso da Sociedade de Arqueologia
Brasileira, 2009. (Congresso). Evolução geológica e ocupação sambaquieira no
litoral centro-sul de Santa Catarina: padrões estratigráficos e distribuição tempoespacial.
14. Apresentação Oral no(a) XV Congresso da Sociedade de Arqueologia
Brasileira, 2009.
(Congresso). Tafonomia microbiológica em carcaças
enterradas em bioma de Cerrado.
Organização de evento
1. KLOKLER, D., VILLAGRAN, Ximena Suarez, GASPAR, M. D. Interpreting
and detecting ritual in archaeological sites, 2011. Organized session at the
76th Conference of the Society for American Archaeology (SAA).
2. VILLAGRAN, Ximena Suarez, Peixoto, Silvia. Envisioning the shore: New
insights into the occupation and anthropic configuration of coastal settings,
2009. Organized session at the 74th Conference of the Society for American
Archaeology (SAA).
493
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MICROMORFOLOGIA DE SÍTIOS CONCHEIROS DA AMÉRICA DO