1 catalogoSF232.indd 1 11/4/14 11:40 SE NOITE FOSSE ÁGUA S E Q U Ê N C I A S Sergio Fingermann 2 catalogoSF232.indd 2-3 3 11/4/14 11:40 Apresentação O Museu Nacional de Belas Artes, herdeiro do bicentenário acervo da Pinacoteca da Academia Imperial de Belas Artes, por sua tradição histórica no panorama da arte brasileira, estabelecida ao longo dos anos, vem desenvolvendo uma criteriosa reflexão a respeito da arte produzida no Brasil e no exterior, por meio de cursos, exposições e intercâmbio com instituições culturais. Referência no campo da museologia e da história da arte, o Museu Nacional de Belas Artes é um dos pilares da memória nacional. Localizado no centro histórico do Rio de Janeiro, abriga em sua coleção ícones da arte brasileira produzidos do século xviii à arte contemporânea. Este prestigioso acervo convive com obras de arte estrangeiras de relevante significação. Historicamente, o Museu Nacional de Belas Artes abrigou memoráveis exposições nas últimas décadas, proporcionando ao público a possibilidade de contemplar e conhecer segmentos importantes da história artística. Neste contexto, a exposição Se noite fosse água – Sequências, com trabalhos de Sergio Fingermann, é apresentada ao visitante para fruição. Sergio Fingermann é um dos raros artistas de sua geração com sólida e erudita formação. Transita entre a pintura e a gravura, agregando aos seus trabalhos, sempre que possível, sua experiência literária. Percorre suas lembranças, escreve e propõe reflexões a respeito de sua trajetória artística e do exercício do olhar. Suas pinturas pulsam e transmitem poesia. Sergio experimenta novos materiais e texturas, recorre ao seu conhecimento de arquitetura para criar em alguns de seus trabalhos, paisagens e lugares imaginários. Desloca e distorce os espaços com maestria, devolvendo ao expectador uma composição plena de elementos, com luz própria, que nos convida muitas vezes a mergulhar em suas obras. Os nossos agradecimentos a todos que tornaram possível a realização desta exposição que comemora os trinta e cinco anos de carreira de Sergio Fingermann, autor de uma obra construída com rigor e profundo sentimento humanista. Sejam todos muito bem-vindos ao museu. Monica F. Braunschweiger Xexéo Diretora do MNBA/IBRAM/MinC 4 catalogoSF232.indd 4-5 5 11/4/14 11:40 6 catalogoSF232.indd 6-7 7 11/4/14 11:40 Conversas de ateliê Toda criança, às vezes, fala com seu cão, com seu gato, com suas coisas de estimação. Fala com muitas coisas que a cercam. Fala mesmo com tudo e todos que estão ao seu redor, e ouve seus segredos, que ficam guardados consigo. Ela sabe como entrar em muitas coisas. Fala e escuta. Recorda. E com o pintor acontece o mesmo. Lembrei-me disso, agora, na tentativa de escrever sobre as pinturas que estou escolhendo para compor a exposição Se noite fosse água – Sequências, no Museu Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro. O título, tomei-o emprestado de um poema de Mário de Andrade Meditações sobre o Tietê, de 1945, pelo seu caráter enigmático, pela sua potência sugestiva. Gosto muito dessa partícula reflexiva e hipotética – se – como condição para se ver esse conjunto de pinturas. Falar de pinturas é falar da experiência da contemplação, é falar do jogo do saber olhar. É falar do esforço para olhar claramente, sem querer encontrar nas coisas o que nos dizem que deve haver, mas simplesmente o que há. Mas, afinal, nesses anos todos, o que venho tentando fazer como pintor? Pinturas. Pinturas que evoquem a poesia do efêmero, que despertem sensações líricas: paisagens mentais. Outrora meu ateliê foi uma marcenaria. No fim de uma jornada de trabalho, restavam lá, encostados às paredes, fragmentos de móveis para serem vistos e finalizados no dia seguinte. Esse trabalho tinha como objetivo fazer objetos ou mobiliário com funções definidas. Tanto tempo depois, hoje em dia, nas paredes do meu ateliê, no mesmo lugar, estão encostadas telas, desenhos, esperando meu olhar, minhas mãos, para serem vistos e trabalhados. 8 catalogoSF232.indd 8-9 Trabalhos novos, outros nem tanto, formam um conjunto nem sempre compreensível para mim, mas que evocam realidades escondidas. São as partes de um todo. Ficam ali, sem destino certo. Olho para eles como alguém que aguarda sussurros como respostas. Ficam ali, à espera de ações e decisões que respondam aos questionamentos que o próprio fazer apresenta. Ficam à espera da aprovação do olhar. É comum encontrar lá séries distintas de trabalhos, aguardando uma solução plástica que articule o conjunto. Algumas nascem ou fazem referências a ilustrações técnicas de velhos livros, tratados de perspectiva, gravuras antigas. Do plano pictórico emergem esboços de desenhos, como a visão de um lugar. Nele, às vezes, faço referências ao mundo da cultura, da arte. Eles me servem para fazer perceber o que separa o visto do ver. O pintor sabe que não consegue controlar a pintura de fora: ele precisa habitá-la, morar nela. Fazer dela um lugar. Nesse lugar há formas visuais compostas num pedaço de espaço. A pintura pode ser tudo. É sempre um olhar sobre o mundo. Pode ser um sopro de vento, pode ser uma luminosidade. Pode ser uma extravagância, pode ser um ato de resistência para dar esperança. A pintura pode ser uma nuvem de dia chuvoso, pode ser uma ferida, pode ser manchas de sangue. Azul, amarela, branca... O que quero é tocar uma sensação de ausência, que provavelmente não perceberíamos sem ela. Sergio Fingermann 9 11/4/14 11:40 Se noite fosse água no 30, 2011 Óleo sobre tela 1,80 m x 1,80 m Se noite fosse água no 31, 2011 Óleo sobre tela 1,80 m x 1,80 m P 14-15 Se noite fosse água no 35, 2013 (tríptico) Óleo sobre tela 2,40 m x 3,60 m 10 catalogoSF232.indd 10-11 11 11/4/14 11:41 12 catalogoSF232.indd 12-13 13 11/4/14 11:41 14 catalogoSF232.indd 14-15 15 11/4/14 11:41 16 catalogoSF232.indd 16-17 17 11/4/14 11:41 Se noite fosse água no 3, 2011 Óleo sobre tela 1,80 m x 1,80 m Se noite fosse água no 1, 2011 Óleo sobre tela 1,80 m x 1,80 m 18 catalogoSF232.indd 18-19 19 11/4/14 11:41 A experiência do olhar Entre as margens de um rio surgiu a nova exposição de Sergio Fingermann, intitulada Se noite fosse água, nome inspirado no poema Meditações sobre o Tietê, do escritor Mário de Andrade. A mostra se desvela como se seguisse o curso das águas, num movimento incessante provocado pelo dizer das obras e pelo que elas podem provocar em nossos sentidos, reunidas assim pela primeira vez. A percepção desse fluxo constante da vida significou para o filósofo grego Heráclito uma das explicações sobre a sua natureza. Para o filósofo, “ninguém se banha duas vezes no mesmo rio”. Em sua interpretação, o ato de entrar no rio podia se repetir, mas este não seria mais o mesmo. Para ele, o universo estava em constante movimento, num processo de contínuas mudanças. Essa é uma questão que interessa ao artista e seu fazer, e pode também nos pertencer, à medida que nos colocamos disponíveis diante da capacidade transformadora da arte. As obras de Sergio Fingermann foram criadas pela vontade do artista de se realizar na sua experienciação no universo da arte. Para Aristóteles, ao falar sobre o princípio motor da práxis, entendida como ação ou toda a atividade do homem,1 a potência da alma que move é a vontade,2 e universo é o que constitui a unidade das coisas.3 Refiro-me à arte, aqui, no sentido do todo, que nos instiga e seduz, e onde habita o mistério. As águas desse rio não são transparentes, mas sim escuras como a noite, como as sombras, velando o que nelas passa ou o que nelas se contém, apesar dos breves momentos em que as luzes das margens permitem que algo se mostre. O que ela – a água do rio – contém? O que ela esconde ou revela? Essas são também questões que podemos partilhar com o mundo da arte, como um todo, ou num particular, com o trabalho de Sergio Fingermann. Nesse percurso que o artista constrói existem questões que são colocadas e que, para serem respon1 Para a definição de práxis ver Ivan Gobry. Vocabulário grego de filosofia. SP: WMF/Martins Fontes Editora, 2001, p. 120. O filósofo italiano Giorgio Agamben ressalta que “Todas as tentativas que se sucederam na época moderna para fundar de modo novo o ‘fazer’ do homem permaneceram sempre ancoradas nessa interpretação da práxis como vontade e impulso vital, isto é, em última análise, em uma interpretação da vida, do homem enquanto ser vivente.” (Giorgio Agamben, O homem sem conteúdo. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2012. p. 121). Mais adiante, o autor comenta que práxis tem a mesma raiz da palavra experiência. (op. cit., p. 125). 2 Agamben, op. cit., p. 127. 3 Universo em grego é hólon e fui novamente à procura da raiz da palavra, na sua origem grega, não à toa. Devemos aos gregos a criação de quase todas as categorias por meio das quais pensamos sobre nós mesmos e a realidade que nos cerca. (Agamben, op. cit., p. 117). 20 catalogoSF232.indd 20-21 21 11/4/14 11:41 didas, se é que é possível, o observador – ou seja, nós – é também chamado a fazer parte. Esta exposição nos proporciona um tempo de reflexão sobre a obra do artista, a contemporaneidade da arte e as conexões que estabelecem. As pinturas representam investigações e releituras feitas a partir de antigos tratados de perspectiva, documentos atemporais que definiram princípios teóricos do fazer da arquitetura; fragmentos de cenários ilusórios, em que qualquer um de nós poderia desempenhar um papel de um enredo imaginado; paisagens feitas a partir do contraste de cor, que criam o caminho das águas noturnas do rio; séries criadas a partir de intervenções que Fingermann fez sobre fotografias ampliadas de gravuras, representando o retrato dos autores de diversas publicações antigas e manuscritos anônimos, dos séculos xviii e xix, achados em sebos de Buenos Aires e Paris. Também nos trabalhos do artista existem os materiais e as técnicas que ele escolheu para dar-lhes forma, ou seja, para trazê-los à nossa presença. Em grego, isso é a poiesis, ou seja, trazer algo à presença,4 o que envolve a ação do artista, a matéria e a técnica. Consolidando tudo, há a vontade, a força vital que nos coloca em movimento. Esta exposição nos proporciona o estar junto à sua obra. Na proximidade da pintura, podemos perceber a trama que reveste a tela, a pincelada, a tinta, a cor, as figuras. Ao nos afastarmos dela, a vemos em seu todo e em conjunto, nessa experiência do olhar que percorre as superfícies buscando perceber aquilo que pode estar oculto em uma camada mais profunda. E nos perguntamos: o que o artista quis nos dizer? Será que só apreendemos a obra se ela tiver algum significado para nós? Podemos usufruir de muitas maneiras dessa experiência que o ato de olhar uma obra de arte provoca. A obra, ali, na nossa frente, representa também o lugar do outro, ou seja, o do artista se dando a conhecer e nos propondo uma interlocução, uma experienciação. Essa experiência única e especial que vivenciamos nos faz exercer em plenitude os elementos existentes nas relações do fazer artístico: o artista, a obra e o observador. Se é difícil definir a arte, nos colocarmos como um de seus agentes nos aproxima de sua verdade. Faz parte da exposição a obra denominada Se noite fosse água, um políptico de 7 metros de extensão. Essa pintura particularmente provocadora propõe uma inversão de lugares e nos faz pensar no que está além do que vemos. São silhuetas, sombras projetadas, vultos de massas corpóreas opacas que vislumbramos através de uma espécie de vidro que as mostra, mas nos impede de enxergá-las com nitidez. Elas se colocam como se nos observassem, nos tornando aqueles que são observados. Somos nós a ver ou estamos sendo vistos? Mas não é próprio da obra ser observada? Que experiência nova é essa? Uma das possibilidades é vivenciá-la com o olhar disponível para o que esse momento pode nos proporcionar. No exercício de ora ser o observador e ora ser o observado, podemos talvez dizer que o essencial é, de fato, estarmos sensíveis ao que pode nos acontecer no próximo instante. Essa sensação me fez lembrar da obra do artista espanhol Diego Velásquez, As meninas, pintada em 1656. O autor, numa ousadia histórica, provocou as expectativas de quem a observava. Quem, na verdade, era o modelo do retrato que estava sendo pintado? E, na exaustão da procura do modelo dentro da obra, Velásquez nos levou a considerar a possibilidade de sermos nós em quem ele mantém o olhar fixo até hoje. Nessa aventura ou viagem pelo universo infindável da arte, Sergio Fingermann trabalha sondando sua essência, sua história e experimentando suas possibilidades, elaborando projetos de vida, aprofundando-se na tentativa de sua compreensão. Imersa nessa reflexão, lembrei-me de uma frase de Charles Baudelaire que, mesmo fora de seu contexto, continua a fazer sentido: “Quand partons-nous pour le bonheur?”5, que numa tradução livre quer dizer: “Quando partimos para a felicidade?” Essa indagação continua atual e pertinente, e poderia fazer parte dos questionamentos de cada um de nós. Refiro-me a ela ao pensar que a Arte pode ser também a escolha e o caminho de alguns para se pôr, a si mesmos, em movimento. 4 Agamben, op. cit, p. 124. 5 Charles Baudelaire (1860). “IV – L’Homme-Dieu” In: Les paradis artificiels. 22 catalogoSF232.indd 22-23 Laura Abreu, historiadora e curadora do Museu Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro – MNBA-RJ 23 11/4/14 11:41 Se noite fosse água no 36, 2013/14 Óleo sobre tela 1,88 m x 1,20 m 24 catalogoSF232.indd 24-25 Se noite fosse água no 37, 2013/14 Óleo sobre tela 2,23 m x 1,17 m 25 11/4/14 11:41 Interferências de pintura sobre impressão fotográfica 0,56 m x 0,76 m (cada) 26 catalogoSF232.indd 26-27 27 11/4/14 11:41 28 catalogoSF232.indd 28-29 29 11/4/14 11:41 Interferências de pintura sobre impressão fotográfica 0,60 m x 0,45 m (cada) 30 catalogoSF232.indd 30-31 31 11/4/14 11:41 Se beleza fosse tempo Termina sempre assim. Com a morte. Mas primeiro havia a vida. Escondida sob o blá, blá, blá, blá, blá. Está tudo sedimentado sob o falatório e o rumor. O silêncio e o sentimento. A emoção e o medo. Os insignificantes inconstantes lampejos de beleza. Depois a miséria desgraçada e o homem miserável. Tudo sepultado sob a capa do embaraço de estar no mundo. Jep Gambardella, em A grande beleza. A última sequência do filme A grande beleza1 narra um momento da juventude do protagonista, o escritor Jep Gambardella, de delicado significado. Sob uma suave luz noturna, a jovem que o acompanha à beira-mar desabotoa a blusa para expor, diante de seus ávidos olhos, os seios quase imaturos: é o prelúdio da iniciação sexual do escritor. E com a lembrança desse inocente amor, restaurada aos sessenta e cinco anos pela notícia da morte dessa mulher, aflui um jorro de reflexões que talvez recupere sua vocação para a literatura, deixada entre os excessos da alta sociedade romana. A noção de beleza ali evocada pelo diretor, ligada às sutilezas da vida, aos silêncios contemplativos e às reminiscências do vivido, sempre reinventadas no tempo entre as nossas lembranças, é a mesma que interessa ao repousar o olhar sobre o trabalho de Sergio Fingermann, tal como a que surge na relação que ele estabelece com uma pintura de Aldo Bonadei. A obra, em posse de sua família por décadas, habitou diferentes espaços, ocupando continuamente seu pensamento em uma troca que parece ter sempre pertencido à ordem do pedagógico. Observar reiteradamente aquela pintura cuidou de educar o olho do artista em formação, permitindo-lhe entrar no ambiente onde era possível perceber o labor da concepção de uma imagem, seja como conceito, seja como artesania, e a especificidade do processo pictórico, até que essa relação pudesse evoluir para um diálogo entre pares. “A imagem nesse quadro vem ao meu encontro, algo como um silêncio interrompido, e me desperta sensações indefinidas de convicção.”2 Há que se creditar o papel dessa pintura na sua educação, ou melhor, na sua compreensão do que é que se passa, ou do que se deve passar, na construção do trabalho de uma vida. “[Uma pintura] é também o resultado de múltiplas criações, em que as precedentes são sempre completa1 A grande beleza, Paolo Sorrentino (diretor), 142 min, cor, Itália, 2013. 2 Sergio Fingermann. Uma aprendizagem. São Paulo: BEĨ, 2010, p. 23. 32 catalogoSF232.indd 32-33 das pelas seguintes. Assim, uma pintura consiste numa série de outras pinturas superpostas.”3 Essa sensibilidade ligada à costura do tempo e ao imediatamente inapreensível transforma-se em valor, em moeda de troca entre o artista e o observador de sua obra. O sentido que se pode construir no seu trabalho vem com um exercício conjunto, com uma vontade partilhada para se chegar além da superfície da pintura, de sua materialidade crua. E tal vontade é que leva pelas mãos aquele que pacientemente deseja perscrutar o caminho que se abre obra após obra. Tempo aqui é matéria-prima. Como eco de uma sensibilidade, vale evocar a literatura do italiano Antonio Tabucchi, tão dedicada que é à imaterialidade, como também tomada de uma vocação certeira para o mal-estar em relação ao mundo contemporâneo. No pequeno conto Yo me enamoré del aire, o protagonista, passeando por um jardim botânico, busca por detalhes que lhe confirmem estar no lugar certo, como pistas para chegar a um passado já muito distante. “Por que veio aqui, disse a si mesmo, o que procura? Desapareceu tudo, evaporaram-se todos, pudera!”4 Então, levado por um caminho ao terraço de onde podia observar toda a cidade, chega até ele uma voz cantante de mulher. Localizando-a por trás do muro do jardim, ela não mais canta e se entrega à tarefa de pendurar roupas no varal. “A voz que tinha escutado e que agora não mais escutava não se apagara, ainda a escutava dentro de si, como se ela tivesse lançado um eco que continuava, e que ao mesmo tempo experimentava uma espécie de comoção estranha, uma sensação realmente curiosa, como se seu corpo tivesse perdido peso e estivesse fugindo para algum lugar distante que não identificava.”5 Tirado do eixo mais pela sensação causada pela sonoridade da música que por sua lembrança, regressa ao tempo de infância. Aparece então um menino que, se jogando nos braços da jovem, faz com que ela volte a cantar enquanto giram como um carrossel: “Yo me enamoré del aire, del aire de una mujer, como una mujer era aire, con el aire me quedé.”6 Em um gesto sublime, o protagonista abre então a boca para respirar e engolir o azul celeste. O texto, delicado e de estranha conclusão, acolhe uma noção de tempo que não retorna na evocação, mas no conjunto da paisagem, da música, de todo um ambiente que envolve o personagem. 3 Sergio Fingermann. Fragmentos de um dia extenso. São Paulo: BEĨ, 2001, p. 73. 4 Antonio Tabucchi. O tempo envelhece depressa. São Paulo: Cosac Naify, 2010, p. 111. 5 Ibid, p. 112. 6 “Eu me apaixonei pelo ar, pelo ar de uma mulher, como a mulher era ar, com o ar fiquei.” [Canção tradicional sefardita]. 33 11/4/14 11:41 Essa atmosfera que se cria, às vezes com elementos que podem parecer díspares, é algo como um método para se chegar à obra de Sergio Fingermann. A projeção para dentro desse espaço construído à frente do observador, ou desse cenário, para usar um termo caro ao artista, é o pressuposto para fundar as bases do entendimento, da conversa. Trazendo à tona elementos que são como testemunhos dos dias, uma obra é um artifício possível que vai se instaurando no mundo. Das leituras da revista italiana L’Arti à viagem para a Itália em 1973, o caminho de dúvidas a serem investigadas em seu trabalho se forma a partir de uma argila arenosa, que tem a ver com aquilo que passa pela mente tanto quanto pelas mãos, e em certo sentido, um tanto díspar das indagações que direcionam os rumos da arte desde a década de 1960. Acaba por erigir uma obra autônoma e calcada na dedicada atenção de seu observador. A referência à história da arte articula as passagens e declara um interesse inesgotável pelas matrizes do conhecimento que escora seu trabalho. Basta lembrar a pesquisa com os tratados de perspectiva, que evocam objetivamente a riqueza das discussões sobre o conceito do belo, assim como os diversos cruzamentos da imagem com a palavra, seja no seu exercício autocrítico, seja na inserção direta nas obras, lembrando o antigo paralelo do ut pictura poesis, comparação tradicional que atravessa séculos de teorizações sobre a arte. Uma sensação acaba se impondo ao se permitir adentrar em sua obra, que parece lembrar a estranheza e o mal-estar do texto de Tabucchi. Algo que faz com que nos perguntemos: O que se procura? Ou mesmo, por que se procura? A capacidade de perceber essa beleza sutil e tão essencial que Fingermann propõe, por meio de uma narrativa (porque é tempo) puramente visual, nada tem a ver com os imediatismos do mundo contemporâneo, às vezes tão distraído para o que não está explícito, mas precisa ser descortinado. Como o Tietê de Mario de Andrade, que inspira o título da mostra, esse é um rio que corre para dentro, contra as expectativas, podendo ser melancólico e reflexivo, mas sempre reconhecendo a necessidade de se seguir fiel ao próprio curso. E nesse sentido reverte-se no elogio maior à vida, na abertura máxima para todas as mínimas possibilidades de driblar a morte: uma abertura compartilhada. Daniel Barretto, museólogo e curador do Museu Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro – MNBA-RJ 34 catalogoSF232.indd 34-35 35 11/4/14 11:41 P. 35 Se noite fosse água no 38, 2013 Óleo sobre tela 2,30 m x 1,80 m P. 37 Se noite fosse água no 40, 2013 Óleo sobre tela 2,30 m x 1,80 m Se noite fosse água no 39, 2013 Óleo sobre tela 1,80 m x 1,80 m 36 catalogoSF232.indd 36-37 37 11/4/14 11:41 Se noite fosse água no 41, 2014 (tríptico) Óleo sobre tela 1,00 m x 4,50 m 38 flap Catalogo Se noite.indd 1 39 11/4/14 13:18 38 flap Catalogo Se noite.indd 2 39 11/4/14 13:18 Se noite fosse água no 10, 2011 (tríptico) Óleo sobre tela 1,65 m x 3,60 m P. 44-45 Se noite fosse água no 42, 2014 (políptico) Óleo sobre tela 2,40 m x 7,00 m 42 catalogoSF232.indd 42-43 43 11/4/14 13:20 44 flap Catalogo Se noite.indd 3 45 11/4/14 13:18 Presentation Atelier conversations The National Fine Arts Museum is the heir of the bicentennial collection belonging to the Pinacoteca museum of the Fine Arts Imperial Academy. Following its historical tradition established along the years in the Brazilian art scene, it has been developing a careful reflection about the art produced in Brazil and abroad, through courses, exhibitions and a two-way exchange with cultural institutions. A reference in the field of museology and art history, the National Fine Arts Museum is one of the pillars of the national memory. Located in Rio de Janeiro’s historical center, it hosts in its collection icons of Brazilian art produced from the 18th century to nowadays. Such prestigious collection shares the spotlight with relevant foreign art works. Historically, the National Fine Arts Museum has hosted memorable exhibitions in the past decades, offering to the audience the possibility of admiring and getting to know important segments of art history. In such context, the exhibition If The Night Were Water – Sequels, with works by Sergio Fingermann, is presented for the visitor’s enjoyment. Sergio Fingermann is one the rare artists of his generation possessing a solid erudite basis. He dedicates himself to painting and print, adding to his works, whenever possible, his literary experience. He visits his memories, writes and proposes reflections about his artistic trajectory and practice of observation. His paintings pulsate and transmit poetry. Sergio experiments with new materials and textures, and applies his knowledge in architecture to create imaginary landscapes and places in some of his works. He moves and distorts spatial elements with mastery, giving back to the observer compositions brimming with their own light, which often invite us to get immersed in his works. We would like to thank all of those who made this exhibition possible for celebrating thirty five years in the career of Sergio Fingermann, the author of a body of work built with rigor and deep humanistic feeling. We welcome you all to the museum. Monica F. Braunschweiger Xexéo Director of the National Fine Arts Museum, the Brazilian Institute of Museums, and the Ministery of Culture Every child sometimes talks to her dog, cat or the things she cherishes. The child speaks to many things surrounding her. Indeed, she speaks with everything and everyone around her, listening to their secrets and keeping them. She knows how to enter many things. She talks and listens. She remembers. And this is also what happens to a painter. I recall this now as I attempt to write about the paintings I am selecting for the exhibition If the Night Were Water – Sequels, to be held at the National Museum of Arts in Rio de Janeiro. That title is borrowed from a poem by Brazilian writer Mário de Andrade (Meditations about the Tietê, dating back to 1945), for its enigmatic trait, for its suggestive strength. I very much like this reflective and hipotetic particle – if – as a condition to perceive this set of paintings. To speak of paintings is to speak of the contemplative experience, is to speak of the game involved in knowing how to look. It is to speak of the effort of seeing with clarity what is simply there, without trying to find in things what people tell us they should imply. So, after all, in all those years, what is that I am attempting to do as a painter? Paintings. Paintings that evoke the poetry of the ephemeral, that awake lyrical sensations: mental landscapes. My atelier was once a carpentry workshop. At the end of a working day, what was left, leaning against the walls, were the fragments of furniture to be inspected and finished the next day. Such work aimed at the making of objects or pieces of furniture with definite functions. After such a long time, leaning against my atelier’s walls, in the same place, now there are canvases and drawings waiting for my regard, for my hands, to be seen and worked on. Some works are new, others not so much, and they all form a set that is not always comprehensible to me but evoke hidden realities. They are parts of the whole. And remain there, with no definite fate. I look at them as someone waiting for whispers as answers. They remain there, waiting for actions and decisions that will answer the questions raised by the act itself of making something. They keep waiting for the approval of the regard. It is common to find different work series there, waiting for a plastic solution that will articulate the entire set. Some paintings are born from, or reference to, technical illustrations in old books, perspective treatises, vintage gravures. From the pictorial plane emerge drawing drafts, like the vision of a place. In it, sometimes I refer to the worlds of culture and art. They help me discern the line between what is seen and the act of seeing. 46 flap Catalogo Se noite.indd 4 47 11/4/14 13:18 The painter cannot control a painting from the outside: he needs to inhabit it, to live in it. He needs to convert it into a place. In that place, there are visual forms composed in a piece of space. A painting can be everything. It is always a gaze at the world. It can be a whisper of the wind, it can be luminousness. It can be extravagance, or an act of resistance for sowing hope. A painting can be a cloud in a rainy day, it can be a wound, or blood stains. Blue, yellow, white… What I wish through painting is to touch a sensation of absence, which we would probably not perceive without it. Sergio Fingermann The experience of the regard In between riverbanks, emerged the new exhibition by Sergio Fingermann, named If the Night Were Water, a title inspired by writer Mário de Andrade’s poem Meditations about the Tietê. The exhibition unfolds as if it followed the course of the waters, in an incessant motion stirred by the sayings of the works—thus reunited for the first time—and by what they can trigger in our senses. The perception of this constant flow of life has meant for Greek philosopher Heraclitus one of the explanations for its own nature. To the philosopher, “No one bathes twice in the same river.” In his interpretation, the act of entering a river could be repeated, albeit not the river would ever be the same. To him, the universe was in constant motion, in process of continuous change. This is a matter that interests the artist and his creative process, and that can also belong to us as we become available to the transforming power of art. The works by Sergio Fingermann are triggered by the artist’s wish to find fulfillment in his experience in the universe of art. To Aristotle, as the philosopher spoke of the praxis’ drive as action or all activity performed by men,1 will is the potency of the soul that moves,2 and the universe is what constitutes the unity of things.3 Here I refer to art in a sense of the whole, which instigates and seduces us, and where mystery dwells. The waters in this river are not transparent, they are rather dark as the night, as the shadows, veiling what flows or is contained in them, despite the brief moments when the lights on the margins allow something to be glimpsed. What does it—the water in the river—contain? Through Sergio Fingermann’s works, these are questions we can also share with the world of art, as a whole or in a particular instance. Along this course built by the artist, there are questions raised that, in order to be answered (if there is such possibility) require the participation of the observer—that is, of each of us. This exhibition provides us with time to reflect about the artist’s works, the contemporary facet of art and the connections they establish. The paintings represent investigations and reinterpretations taken from the starting point of old treatises of perspective, timeless documents that have defined theoretical principles of the making of architecture; fragments of illusory sceneries, where any of us could take a role in an imaginary plot; landscapes made of color contrast, which lay the path of nocturne waters in the river; series created from interventions that Sergio Fingermann has made in blown-out photographs of gravures, representing the portrait of the authors of several vintage publications and anonymous manuscripts, dating back to the 18th and 19th centuries, which were found in secondhand stores in Buenos Aires and Paris. In the artist’s works there are also the materials and the techniques he had chosen to give them form, that is, to bring them to us. In Greek, that is equivalent to poiesis, to bringing something to the presence of someone,4 which involves the artist’s action, the matter and the technique. Consolidating everything, there is the will, the vital force that sets us in motion. 1 For a definition of praxis, please refer to Ivan Gobry. Vocabulário grego da filosofia [“A Greek Vocabulary of Philosophy”]. São Paulo: WMF/Martins Fontes Editora, 2001, p. 120. Italian philosopher Giorgio Agamben stresses in his book O homem sem conteúdo [“The Man without Content”] that “All attempts carried out in modern times to find a new way of the ‘making’ by man remained always anchored in such interpretation of praxis as a vital will and impulse, that is to say, ultimately, in an interpretation of life, of man as a living being” (Giorgio Agamben, Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2012. p. 121). Further ahead, the author comments that praxis shares the same root with the word experience. (op. cit., p. 124-125). 2 Agamben, op. cit., p. 127. 3 Universe in Greek is hólon, and not by chance I proceeded again to search for its root, for its Greek origin. We owe to the Greeks the creation of almost all categories through which we think about ourselves and the reality surrounding us. (Agamben, op. cit., p. 117). 4 Agamben, op. cit., p. 124. 48 catalogoSF232.indd 48-49 49 11/4/14 11:42 If beauty were time This exhibition allows us to be close to the works. In the proximity of a painting, we can notice the tapestry that covers the canvas, the brushstroke, the paint, the color, the figures. When we draw back from it, we see it in its entirety, in this experience of the eye trailing its surfaces in an attempt to perceive what could be hidden in a deeper layer. So we ask ourselves: what did the artist want to tell us? Could it be that we can only apprehend a work if it has a meaning to us? We can enjoy in many ways such experience triggered by the action of looking at an art work. The piece of work before us also represents the place of the other, that is, of the artist revealing himself and proposing a dialogue, an experience. Such experience lived by us, unique and special, makes us exert entirely the existing elements in the relations implied in the making of art: the artist, the work and the observer. If it is difficult to define what art is, stepping in as one of its agents brings us closer to the truth. Included in this exhibition is the work If The Night Were Water, a 7-meter long polypticus. This painting, particularly provoking, proposes trading places and makes us think about what is beyond what we see. It consists of silhouettes, projected shadows, opaque forms of bodily masses that we glimpse through some sort of glass, which displays them without allowing us to see clearly. Such forms present themselves as if they were observing us, converting us in objects of observation. Are we the ones looking, or are we being looked at? What is this new experience? One possibility is to enjoy it with an open mind to what this moment can bring to us. In the exercise of being the observer and then being observed, we can say that the essential is, in fact, keeping oneself available to what can happen in the next moment. Such sensation reminds me of the work by Spanish artist Diego Velásquez, The Maids of Honor, painted in 1656. At the time, the author, with historical boldness, provoked the expectations of who watched his painting. Who, in truth, was the model of the portrait being painted? And, through the exhaustion of searching for the model within the work, Velásquez made us consider the possibility of us being the ones at whom he fixes his gaze to this day. In such adventure, or endless travel in the universe of art, Sergio Fingermann works probing its essence, its history, and experimenting with its possibilities, elaborating life projects, going deeper in the attempt of understanding it. Immersed in this reflection, I recall a phrase by Charles Baudelaire that, even out of context, still makes sense: “Quand partons-nous pour le bonheur?”5 Which, loosely translated, means: “When are we going to depart to happiness?” Such musing is still pertinent and up to date, and could be part of the questionings of each of us. I refer to it for I think Art can also be the choice and the path for some to set themselves in motion. Laura Abreu, historian and curator for the MNBA-RJ (Museu Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro) 5 Charles Baudelaire. “IV – L’Homme-Dieu” In: Les Paradis Artificiels, Paris, 1860. 50 catalogoSF232.indd 50-51 It ends like this: with death. However, first there was life. Hidden under the blah, blah, blah, blah. Everything is sedimented beneath the talk and the rustle. The silence and the feeling. The emotion and the fear. The insignificant, inconstant flashes of beauty. Then the disgraced misery and the miserable man. Everything buried under the veil of embarrassment for being in the world. Jep Gambardella, in The Great Beauty. The last scene of The Great Beauty1 narrates a moment from the youth of the protagonist, writer Jep Gambardella, that holds a delicate meaning. Under a soft nocturne light, the girl walking with him on the waterfront unbuttons her blouse to expose, before his hungry eyes, her nearly pubescent breasts: it is the prelude to the writer’s sexual initiation. And, with the memory of such innocent love, retrieved when at the age of sixty five he receives the news of that woman’s passing, an outpour of reflections streams and may restore his vocation to literature, lost amid the excesses of the Roman elite. The notion of beauty evoked by the film director, linked to life’s subtleties, to contemplative silences and reminiscences of what was lived—always reinvented through time among our memories—is the same that interests us when we lay our gaze on Sergio Fingermann’s works, as is the beauty that emerges in the relation that he establishes with Aldo Bonadei’s painting. That work, in possession of his family for decades, has inhabited different spaces, continuously occupying his thoughts in an exchange pertaining seemingly to a pedagogical aspect. Observing that painting over and over has educated the eye of the artist in the making, allowing him to enter the ambient where it was possible to perceive the labor in the conception of an image—be it as a concept, be it as a craft—, as well as the specificity of the pictorial process, until such relation could evolve into a dialogue between peers. “The image in this painting comes to me, as something like an interrupted silence, and stirs in me vague sensations of determination.” 2 One must credit this painting’s role in his education, or to put it another way, in his comprehension of what happens or should happen in the making of a lifetime work. “[A painting] is also the result of multiple creations, in which the precedent ones are always completed by those following them. Thus, a painting consists of a series of superimposed paintings.” 3 Such sensitivity associated to the sewing of time and to what is immediately inapprehensible becomes value, an exchange token between the artist and the observer of his works. The meaning that can be constructed in his work comes from a joint exercise, with a shared desire of reaching beyond the painting surface and its raw materiality. And such desire is the one that guides those who patiently wish to peer through the path that opens up work after work. Here, time is raw material. As an echo of sensitivity, it is worth evoking here Italian writer Antonio Tabucchi’s literature, so dedicated to immateriality, as well as possessing a sure vocation to uneasiness regarding the contemporary world. In the short story Yo me enamoré del aire, as the protagonist strolls in a botanical garden, he searches for details confirming he is in the right place, like clues to arrive at a very distant past. “Why did you come here, he said to himself, what are you looking for? Why, everything has disappeared, everyone has evaporated!” 4 Then, following a path to the terrace where he could contemplate the entire city, he heard the singing voice of a 1 2 3 4 The Great Beauty, by Paolo Sorrentino (director), 142 min, color, 2013, Italian. Sergio Fingermann. Uma aprendizagem [“A Learning”]. São Paulo: BEĨ, 2010, p. 23. Sergio Fingermann. Fragmentos de um dia extenso [“Fragments of a Long Day”]. São Paulo: BEĨ, 2001, p. 73. Antonio Tabucchi. Time ages in a hurry. New York: Archipelago Books, 2014. 51 11/4/14 11:42 woman. Finding her behind the garden wall, he sees she is no longer singing and occupies herself with the task of hanging clothes on a line. “The voice he had heard and now he no longer could hear had not faded, he still listened to it within himself, as if it had cast a lingering echo; and at the same time he felt a strange commotion, a really curious sensation, as if his body had lost weight and was running away to a distant place he could not identify.” 5 Set out of his axe rather by the sound of the music than by his memories, he goes back to his childhood. A boy shows up then, who, throwing himself in the young woman’s arms, makes her resume singing as they spin together like in a carousel: “Yo me enamoré del aire, del aire de una mujer, como una mujer era aire, con el aire me quedé.”6 In a sublime gesture, the protagonist opens his mouth to inhale and swallow the azure. The text, delicate and bearing this strange conclusion, embraces a notion of time that does not come back in an invocation, but in the ensemble of the scenery, of the music, of an entire ambiance surrounding the character. This atmosphere that is created, sometimes with seemingly disparate elements, is something like a method for approaching Sergio Fingermann’s work. The projection into this space built in front of the observer—or into this scenario, to use a word cherished by the artist—is the tenet for establishing the understanding, the conversation. Bringing to surface elements that are like witnesses of time, a piece of work is a possible gimmick that establishes itself gradually in the world. From readings of the Italian magazine L’Arti to the trip to Italy in 1973, the path of questions to be investigated in his works takes shape from sandy clay, which has relation with what crosses the mind as well as with what is touched by the hands, and in a sense, quite different from the questionings that have been directing art since the 1960s. It ends up building an autonomous work based on the dedicated attention of its observer. The reference to the history of art articulates the passages, and states an endless interest for the matrixes of knowledge that support his work. All one has to do is remember the research of perspective treatises, which objectively evoke the richness of debates about the concept of beauty, as well as the various crossings of images and words—be it in its exercise of self-criticism, be it in the direct insertion in the works—, reminding us of the old parallel of ut pictura poesis, a traditional comparison that crosses centuries of theories about art. A sensation ends up imposing itself as we allow ourselves to get immersed in his work, which seem to conjure the oddness and uneasiness in Tabucchi’s text. Something that makes us wonder: what is sought? Or even, why is it sought? The ability to perceive such subtle and crucial beauty proposed by Fingermann, through a purely visual narrative (because it is time), has nothing to do with the short-termisms of the contemporary world, sometimes so distracted to what is not explicit; yet it needs to be unveiled. Like Mário de Andrade’s Tietê, which inspires the title of this exhibition, this is a river that flows to the inside, against expectations, and can be melancholic and reflective, but always recognizes the need to remain faithful to its own course. In that sense, it reverts to the larger homage to life, to the maximum aperture opening up to all minimum possibilities of dribbling death: a shared aperture. Daniel Barretto, museologist and curator for the MNBA-RJ (Museu Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro) Presidenta da República Dilma Vana Rousseff Ministra de Estado da Cultura Marta Suplicy Presidente do Instituto Brasileiro de Museus Ângelo Oswaldo de Araújo Santos Diretora do Museu Nacional de Belas Artes Monica F. Braunschweiger Xexéo Assessoria de Imprensa Nelson Moreira Junior Lucélia Santos de Paiva Coordenação Técnica Daniela Matera José Antonio Patané Filho (apoio) Ingrid Vidal (estagiária) Roberta Fontes (estagiária) Curadoria de Escultura e Arte Africana Daniel Barretto da Silva (curador) Anaildo Baraçal Arnaldo Alonso (estagiário) Curadoria de Gravura Laura Abreu (curadora) Mariana Virgílio Rocha (estagiária) Coleções Especiais Amauri Rodrigues Dias Coordenação de Conservação e Restauração Larissa Long Jadir de Souza (apoio) Reserva Técnica Nilsélia Diogo Cláudia Ribeiro Gabriela Rodrigues (estagiária) Restauração Pintura Larissa Long Adelaide Ferreira (estagiária) Coordenação de Comunicação Sheila Salewski Exposições Temporárias Sheila Salewski Laís Quintanilha (estagiária) Sistema de Informações do Acervo do Museu Nacional de Belas Artes – Simba Gilson Gemente Educativa - Responsabilidade Social Rossano Antenuzzi Simone Bibian Jéssica de Castro (estagiária) Seção de Registro Cláudia Regina da Rocha Cinda Alcântara Ana Paula Rocha (estagiária) Educativa - Educação Patrimonial Amandio Miguel dos Santos Henrique Guilherme Vianna Reginaldo Tobias de Oliveira Núcleo de Imagem Andrea Pedreira Vicente do Carmo Comunicação Visual Guilherme Sarmento Biblioteca Mary Komatsu Ângela Cirene Teles Júlia Bastos Márcia Rebelo Vicência Mendes Pollyana Sales Thaís Freitas Lusia Soares (apoio) Juliana Carolinne de Souza (estagiária) Jéssica Santos Prado Cabral (estagiária) Coordenação Administrativa Jose Rodrigues Neto Financeiro Adriana Fontes Lavinas Recursos Humanos Cláudia Regina Pessino Priscila Silva Patrimônio Waldir Luiz Lane Paulo Roberto da Silva Licitação e Compras Lúcio Roberto Machado Waldir Luiz Lane Protocolo Sérgio Alcântara Mário Luís Pinto Apoio Administrativo Adilson da Silva Edemilson Barbosa Segurança Interna Ilmar de Barros (chefe) Janilson dos Santos Vieira Luiz Carlos Bezerra Luiz Silva de Mendonça Wagner Vasques Manutenção Predial Altair Dantas (chefe) Armando Carvalho Manhães Conselho Científico de Exposições Amandio Miguel dos Santos Antônio Grosso Cláudio Valério Teixeira Daniel Barretto da Silva George Kornis Luciano Migliaccio Morris Braun Pedro Xexéo Renata Lessa Sheila Salewski Suzana Queiroga Almoxarifado João Carlos Esteves Jorgival Freire Robson Simões 5 Ibid, p. 112. 6 “I fell in love with the air, with a woman’s air, as the woman was air, with air I remained.” [Traditional Sephardic song]. 52 catalogoSF232.indd 52-53 11/4/14 11:42 Agradeço a todos que colaboraram com generosidade e entusiasmo e tornaram possível a realização desta publicação e da exposição Se noite fosse água – Sequências Curadoria da exposição Laura Abreu e Daniel Barretto Monica F. Braunschweiger Xexéo Fernando Ullmann (gráfica Ipsis) Karl Rafael Wollny (Atlantis Moving Logistics & Relocation) Flávio Cohn (Dan Galeria) Cícero Oliveira Marcus Tadeu Daniel Ribeiro Ensaio fotográfico Marcelo Greco Reprodução das obras Sergio Guerini Versão para o Ingles Nicole Anne Collet Revisão Laura Aguiar Projeto gráfico Yumi Saneshigue Tratamento de imagens Eduardo Monezi Impressão Ipsis Transporte das obras Atlantis Moving Logistics & Relocation 2014 catalogoSF232.indd 54 11/4/14 11:42