UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
FACULDADE DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS
CURSO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS
João Gabriel Burmann da Costa
ANÁLISE CRÍTICA-DESCRITIVA DA OBRA
“HISTÓRIA ECONÔMICA DO BRASIL” DE CAIO PRADO JÚNIOR
Porto Alegre
2011
HISTÓRIA ECONÔMICA DO BRASIL
PRADO JUNIOR, Caio. História Econômica do Brasil. São Paulo: Brasiliense,
2006.
1. Introdução
A obra História Econômica do Brasil, escrita em 1945, pelo historiador paulista Caio
Prado Júnior é uma das principais obras historiográficas da economia brasileira. Abordando
desde os tempos em que éramos colônia, sob comando de Portugal, até o processo de
industrialização e de estabelecimento de nossa economia de mercado interno, a obra se
constitui fonte fundamental
para se compreender a formação e o desenvolvimento da
economia brasileira.
Considerando a importância da obra, este trabalho tem por objetivo fazer uma análise
tanto crítica, quanto descritiva da obra de Caio Prado Júnior. No que diz respeito à parte
crítica, procurar-se-á ressaltar os métodos de observação e de explicação dos fatos pelo autor,
quando possível recorrendo a comparação com outro grande economista brasileiro, Celso
Furtado. Descritivamente, buscar-se-á rever a análise temporal e causal apresentada pelo autor
durante a obra.
Estas duas etapas de análise justificam-se por serem etapas importantes na tentativa de
entender quais aspectos na história do Brasil foram, na perspectiva do autor, fundamentais
para determinar o tipo de desenvolvimento pelo qual nosso país passou em algumas décadas
do século XX.
2. Revisão crítica dos métodos de análise do autor
Caio Prado Júnior (1907-1990) foi um importante historiador, geógrafo, político e
escritor brasileiro. Com formação acadêmica na área das ciências jurídicas e sociais, e um
interesse particular por geografia – foi um dos fundadores da Associação dos Geógrafos
Brasileiros na década de 1930 – Prado Júnior identificava-se fortemente com as idéias
socialistas. Filiado ao Partido Comunista Brasileiro, chegou a ser eleito deputado federal em
1945.
Esta aproximação das idéias socialistas, mais especificamente da
filosofia política
marxista, é o que caracterizará as obras do autor, inclusive História Econômica do Brasil. Em
alguns momentos este marxismo irá se mostrar explícito, como nos capítulos dedicados à
transição do Império para a República e as relações com o capital estrangeiro - principalmente
inglês - e no capítulo que se refere ao imperialismo econômico. Contudo, a presença deste
caráter marxista exacerbado, é totalmente justificável considerando-se a época em que o livro
foi escrito e as idéias em voga nos círculos intelectuais daquele período. Assim, o autor nos
apresenta os fatos sob um ponto de vista teórico diferente, que nos incita a pensar sobre a real
exploração que nosso país sofreu. Exploração esta não tanto por parte de Portugal - nossa
metrópole e figura de segundo escalão na economia mundial desde o século XVIII - mas sim
pelos países de capitalismo desenvolvido, possuidores de capital suficiente para se arriscarem
em atividades especulativas exteriores e ávidos por recursos largamente disponíveis em nosso
país.
O interesse do autor pela geografia será um ponto marcante na obra, inclusive que a
diferenciará da outra obra referência no assunto, Formação Econômica do Brasil, de Celso
Furtado. Os fatores geográficos do Brasil já se mostram presentes no primeiro capítulo da
obra, quando o autor recorre a uma explanação da geografia regional do país. Enquanto isto,
Furtado tratará em seu primeiro capítulo sobre os processos das “Grandes Navegações”, da
conquista do “Novo Mundo” por espanhóis e portugueses, da primeira atividade econômica
realizada no Brasil, até o estabelecimento da empresa agrícola produtora de cana-de-açúcar. A
utilização da geografia será um recurso freqüente de Prado Júnior, como por exemplo, quando
se refere aos ciclos dos produtos – açúcar, ouro, café -, onde influenciarão questões
relacionadas ao clima e ao solo; e na localização geográfica dos centros populacionais e
produtivos, intrinsecamente ligados ao problema dos sistemas de transporte. A presença deste
caráter geográfico de análise pode ser interpretado, por alguns, como uma forma de
determinismo, expresso em condições que estariam naturalmente impostas ao país e que,
portanto irão influenciar no seu posterior desenvolvimento. Este é um risco a que o autor se
sujeita, mas que considerando a inovação no método de análise, deve ser valorizada na leitura.
Temporalmente, Caio Prado Júnior desenvolve uma análise bem estruturada, partindo de
antes do descobrimento do Brasil, com os motivos que levaram aos processos de
“descobrimento do Novo Mundo’, passando pela fase de pura exploração do pau-brasil
brasileiro; a ocupação efetiva do território; os ciclos do açúcar, mineração e café; até o início
da industrialização do país e a crise do sistema cafeeiro. Apesar disto, em alguns momentos a
transição de um período para outro se torna um pouco confusa, com as causas de algum fato
sendo apresentadas em outro capítulo ou sessão. Esta dificuldade na transição temporal fica
mais clara quando comparada à obra de Furtado, onde a organização temporal dos fatos é bem
distribuída nos capítulos e partes do livro.
Característica importante na escrita de Caio Prado Júnior é a presença de fatores que vão
além da esfera puramente econômica. Ao tratar do desenvolvimento da economia brasileira, o
autor consegue com grande mérito, abordar também a situação política e social da época
tratada. Esta relação história- economia- sociedade é bem explorada nas passagens acerca da
chegada da família real portuguesa ao Brasil e principalmente na transição Império –
República e escravidão - assalariamento, quando há o nascimento de um proto-modelo de
capitalismo nacional, com grandes mudanças nos ideais e objetivos dos homens de negócio e
uma dinâmica social de classes completamente distinta do período de escravidão. Neste
aspecto a obra de Prado Júnior consegue abordar melhor os campos político e social da
história brasileira do que Formação Econômica do Brasil, preferenciando a segunda,
dinâmicas, causas e conseqüências mais diretamente econômicas.
Talvez a característica que mais aproxima Prado Júnior de Furtado quanto ao método de
análise seja o grande valor dado às relações do Brasil com a economia mundial, isto é, o
papel de fatores externos como condicionantes do posterior processo de desenvolvimento
econômico brasileiro. Junto com Simonsen, – citado como umas das principais fontes em
Furtado – os dois autores formam uma linha de interpretação da história brasileira que se
difere da outra mais tradicional, que privilegiava em sua análise os fatores internos do país,
vendo nele características semelhantes ao feudalismo europeu. Apesar de privilegiar fatores
externos ao país em suas análises, nem Furtado nem Caio Prado Júnior caem no problema de
apresentar uma análise incompleta. Pelo contrário, conseguem passar aos leitores um
panorama bastante abrangente do Brasil, relacionando os fatores externos com implicações na
organização interna do país, e vice-versa.
Narrativamente, História Econômica do Brasil é muito bem escrito, com longas
passagens descritivas, que o tornam de uma leitura fácil, dedicada a um público mais
abrangente, leigo, do que a obra de Celso Furtado – com passagens bastante econômicas e que
podem afastar o leito comum. Porém, Formação Econômica do Brasil apresentará uma
síntese melhor dos acontecimentos, detendo-se em descrições nos capítulos destinados a
conceitos considerados chave para o autor, geralmente aqueles de caráter puramente
econômico. Destaca-se durante o texto de Prado Júnior, a capacidade do autor em descrever
alguns processos específicos como o plantio das diversas culturas que ocorreram no Brasil, e
o desenvolvimento de tecnologias que provocaram mudanças em técnicas de cultivo e de
produção, como o descaroçador de algodão e os vulcanizadores da borracha.
De modo comparativo a obra de Caio Prado Júnior aborda algumas práticas econômicas
de menor expressão na história do Brasil, que são apenas mencionadas – quando isto – na
obra de Celso Furtado.
Temos como exemplo:
o plantio de tabaco; a exploração de
diamantes e de minério de ferro; a especificidade nos gêneros de plantio destinados a
alimentação da população; a pesca da baleia; a coleta de ovos de tartaruga; as práticas
manufatureiras do final do século XVII; a extração de erva- mate nas províncias sulinas; etc.
Cientes da relação existente entre Caio Prado Júnior e Celso Furtado quanto a seus
métodos de análise e quanto à problemática teórica básica – a saber, a transição do país de
uma ordem colonial para uma economia nacional, atentando para as dinâmicas desta transição
e a estrutura de cada uma destas fases – podemos compreender melhor a importância destes
dois autores para a historiografia não só econômica, mas também política e social, do Brasil.
Escrevendo em um período anterior a Furtado, é notável o quanto o pensamento de Caio
Prado Júnior influenciou no pensamento do primeiro. Apesar de Formação Econômica do
Brasil possuir um caráter econômico, com linguagem mais técnica, acentuado, Furtado de
muito – e reconheceu isto em sua tese de doutorado – ao exame anterior da sociedade, da
política e da história brasileira, realizado por Caio Prado Júnior
3. Análise descritiva da obra: o processo de formação da economia brasileira
Conhecendo as características gerais do sistema analítico de Caio Prado Júnior,
partiremos a uma análise mais conceitual e teórica da obra. O objetivo mais do que sintetizar
as idéias desenvolvidas pelo autor durante todo o livro, é organizar os principais conceitos
presentes na obra. Portanto tentar-se-á compreender como se deu a dinâmica do
desenvolvimento econômico do Brasil, passando de pura e simples colônia de exploração e
exportação a uma economia de considerável mercado interno até a época em que o livro
aborda.
Como já mencionado o autor dedica uma atenção especial as características geográficas
do Brasil. Assim, a primeiras observações da obra se dão acerca do meio geográfico como
fator condicionante da fixação populacional nas regiões do país. Sobre a região Nordeste,
Caio Prado nos diz que a faixa litorânea da região é extremamente favorável ao povoamento,
graças ao clima propício e qualidade do solo, que beneficiam a cultura de produtos tropicais.
Na mesma região, destaca que o clima semi-árido do sertão nordestino foi um fator que
conteve a expansão do colonizador em um primeiro momento. Em oposição ao interior
nordestino apresenta-se o planalto centro meridional, com condições naturais esplêndidas para
povoamento, uma vez que conta com regime regular de chuvas, solos férteis, boa hidrografia,
e, além disso, grande quantidade de recursos minerais. Dividida em três sub-regiões –
setentrional ( Minas Gerais), meridional (de São Paulo ao Rio Grande do Sul) e ocidental – o
planalto centro meridional será posteriormente o local onde se desenvolverão atividades
econômicas diversas, desde a mineração, passando pela agricultura, até a pecuária. Por último,
nos é apresentada a região do Extremo-Norte, caracterizada pela grande floresta Amazônica e
pela existência de uma extensa rede hidrográfica.
Ao contrário de Furtado, Caio Prado Júnior fala a respeito do contexto internacional na
época dos descobrimentos posteriormente na primeira sessão de seu livro. Após tratar
rapidamente sobre a revolução comercial ocorrida na Europa, e da expansão portuguesa em
direção às ilhas do Atlântico e à costa da África, o autor diz que o principal foco de interesse
para Portugal era as Índias Orientais, de onde comercializavam especiarias. Mesmo após o
descobrimento do Brasil, de acordo com o autor, tentou-se através do Pacífico, descobrir uma
rota que os levassem para lá. Após se mostrar irrealizável este objetivo, voltaram-se as
atenções para o que as novas terras poderiam oferecer de lucrativo.
Neste momento, o entendimento por “colonizar” ainda possuía o caráter de simples
exploração mercantil, como acontecia nas colônias da costa africana ou nas Índias. Além
disso, a baixa população européia não possibilitava que se promovesse um povoamento das
novas terras, principalmente por parte de Portugal. Assim, é natural que o primeiro produto
que se comercializou da nova colônia fosse algo que não exigisse uma grande mobilização
nem de mão-de-obra, nem de capital. Nestes moldes, a extração do pau-brasil foi a primeira
atividade econômica do Brasil colônia. Ainda que menos expressivas, o autor menciona
também a extração de peles e a atividade da pesca.
Apesar de altamente rentável, - visto especialmente pela curta duração do ciclo de
extração deste produto, que logo se tornou cada vez mais escasso – esta atividade econômica,
o autor menciona a sorte que tiveram os espanhóis a se destinarem para os territórios com
grande disponibilidade recursos minerais de fácil exploração como Peru e México. Nestes
locais a exploração propriamente dita irá perdurar por tempo maior do que no Brasil, o que se
por um lado rendeu maiores lucros para a Espanha, por outro manteve estes países em
situação econômica de subdesenvolvimento durante um tempo maior. Outra região com que
há freqüentes comparações nesta parte do livro é a parte norte da América, que ficaram sob
colonização inglesa. Sobre esta região a análise de Caio Prado Júnior é semelhante à de
Furtado, que diz que o clima temperado da região – semelhante ao da Europa – e os processos
de cercamento das terras na Inglaterra – que liberou uma grande quantidade de trabalhadores
disponíveis – propiciavam e possibilitavam o povoamento precoce da região.
Desta primeira parte de História Econômica do Brasil podemos compreender o
surgimento do Brasil para o resto da economia global. Surgimento este que foi de acordo com
as condições das economias européias do momento, de despertar do capitalismo mercantil. É
neste momento que segundo o autor surge o chamado Antigo Sistema Colonial, ou seja, um
sistema pré-capitalista de produção ( na visão marxista) onde há um Estado que controla as
atividades de exportação de produtos agrícolas da colônia para atender os interesses das
classes mercantilistas. Neste contexto, a ocupação da colônia servia apenas como forma de
sanar a necessidade expansionista do capital mercantil europeu.
A segunda sessão do livro se dedicará a explicar o contexto, os interesses e o modo em
como se deu a ocupação efetivas do território brasileiro a partir de 1530. Neste período, já
cientes das riquezas contidas nas novas terras, os países que ficaram de fora da “partilha da
América”, França e Holanda, irão voltar seus interesses para a região. Com a ameaça externa
próxima do seu território, há o entendimento em Portugal de que só a pequena ocupação
promovida pela extração de madeira, ou o direito divino concedido pelo Papa, não eram
suficientes para se garantir a posse das terras.
Assim, começará a se ocupar o território brasileiro. Essa ocupação acontecerá
basicamente nas áreas litorâneas, devido a motivos já apresentados. Sendo o território, mesmo
o costeiro, uma área de grandes extensões será necessário um grande contingente de pessoas
para ocupá-lo. Porém, Portugal dispunha de pouco ou quase nenhum – o autor menciona
apenas doze - interessado em se aventurar neste tipo de investimento pouco seguro. Este fator
justificará a histórica característica latifundiária brasileira. Mesmo com grandes quantidades
de terras, era necessário que a Coroa portuguesa concedesse diversas vantagens aos
administradores das “capitanias hereditárias”, em sua maioria indivíduos de pequena
expressão social e econômica. O pau-brasil já começava a se tornar escasso e não condizia
com as novas características de ocupação.
A expectativa de retorno do investimento por parte destes novos senhores de terra,
encontrava-se na cultura da cana-de-açúcar. Este era um produto de grande valor comercial na
Europa, escasso nos mercados mundiais, e que os portugueses já possuíam alguma
experiência no cultivo e no comércio. Além disso, o clima e o solo brasileiro eram propícios a
esta cultura, e ainda havia a abundante mão-de-obra indígena disponível, que já havia sido
utilizada na extração do pau-brasil. A cana-de-açúcar foi cultivada em toda a extensão da
costa brasileira, tendo se destacado nas capitanias de Pernambuco e Bahia. O regime
latifundiário e quem as terras foram distribuídas também era adequado as técnicas de cultivo
do produto, somente lucrativo quando cultivado em extensão. A produção de açúcar seria toda
ela destinada aos mercados europeus, o que novamente demonstra o sistema colonial
brasileiro como dependente do sistema europeu.
A expansão do cultivo de cana-de-açúcar durante os séculos XVII e XVII, que acabou
por tornar este o principal produto de nossa economia, só se tornou viável após a utilização do
escravo africano como mão-de-obra. De acordo com o autor – e este pensamento de cunho
racista é presente tanto em Prado Júnior quanto em Furtado – o índio era menos capacitado
para o trabalho do que o negro africano. Estes últimos eram mais resistentes as árduas
condições de trabalho, propiciando uma maior produtividade do que o indígena, que irá
preferir sobrevir da coleta e de sua agricultura de subsistência do que se submeter ao trabalho
escravo. A introdução do escravo africano ocorrerá por volta do início do século XVII, e irá
resolver todos os problemas posteriores de mão-de-obra. Porém ele terá um alto custo, devido
à necessidade de transporte da África para a América. Este alto custo o viabilizará apenas
naqueles engenhos de alta produtividade, enquanto que nos de menos lucratividade
frequentemente o índio será utilizado como escravo.
A descrição do ciclo do açúcar de Caio Prado Júnior se assemelha bastante a de Celso
Furtado. Ambos explicam as características gerais deste ciclo de acordo com as características
do produto, da estrutura fundiária do país e da disponibilidade de mão-de-obra. É frisada por
ambos a dependência do mercado externo desta economia de simples exportação de produtos
agrícolas. Esta dependência é mais bem abordada por Furtado, que destaca o papel do capital
holandês como financiador tanto das lavouras, quanto da mão-de-obra escrava africana, e dos
engenhos de açúcar, ponto que Caio Prado não menciona.
Ainda dentro da economia do açúcar o autor mencionará o tabaco como segundo produto
de exportação do país, usado principalmente para trocar por escravos na África. Juntamente
com a economia açucareira se desenvolverão outras economias, em diferentes regiões do país.
Estas terão papel principalmente de subsistência, não cabendo a elas promover mudanças
dinâmicas no todo econômico do país. Na região do interior nordestino se desenvolverá uma
agricultura destinada a atender as necessidades dos engenhos e dos pequenos centros
populacionais, onde não havia espaço nem interesse de se dedicar a atividades que não
dessem o lucro do açúcar. A mão-de-obra desta economia era dos próprios donos das terras,
trabalhadores que haviam estado em regime servil-temporário. É mencionada também a
atividade pecuária de quase nenhuma expressão na época e que ocorria no sertão do Nordeste
e na porção setentrional do planalto centro meridional.
Após explicar os princípios da ocupação do território brasileiro, situada basicamente na
região litorânea, o autor irá expor o processo de expansão desta ocupação, para áreas do
interior do país, como a região de Minas Gerais e da floresta amazônica. Após passar por um
período sob o governo da Coroa espanhola, o governo português passa a dar ainda mais
atenção a sua colônia americana. Na verdade, já naquela época a existência econômica de
Portugal passava a depender do Brasil, uma vez que havia perdido suas possessões asiáticas,
antes responsáveis pela maior parte do fluxo de renda para a colônia. Até mesmo as
migrações de portugueses para o Brasil aumentaram neste período. É montada uma
administração colonial mais elaborada, que defendesse melhor os interesses da metrópole.
Houve um maior liberalismo com estrangeiros, porém um maior controle para que a colônia
não competisse com produtos que a metrópole produzia, como especiarias, azeite de oliva, e
aguardente – que competiria com o vinho do porto. Muitos monopólios a nacionais e a
estrangeiros também foram concedidos. O objetivo de Portugal passa a ser retirar da colônia
os produtos que melhor possam ser comercializados na Europa, gerando riqueza à metrópole.
Os principais gêneros são o açúcar, o algodão e o cacau.
No início do século XVII são descobertas primeiras jazidas de ouro na região de Minas
Gerais. Estas descobertas iniciarão um período de grande prosperidade na economia da
colônia. Deve-se principalmente às expedições dos bandeirantes o título de descobridores
destes metais, uma vez que foram os responsáveis pela ampliação de boa parte dos territórios
portugueses para além do Tratado de Tordesilhas, ao saírem atrás de índios para abastecerem
as lavouras de cana de São Vicente.
A estrutura produtiva da mineração irá girar em torno de dois agentes: os escravos das
minas de lavra, abundantes na época áurea da mineração; e os faiscadores, trabalhadores
livres que andavam de um local para outro praticando a mineração de baixa produtividade,
tanto no tempo de prosperidade, quanto – principalmente – nos tempos de crise. Caio Prado
Júnior destaca também a extração de diamantes como um processo concomitante ao do ouro.
As minas de ouro provocaram o crescimento de outras regiões da colônia, uma vez que
era necessário abastecer esta região com alimentos e produtos que não eram produzidos ali. A
agricultura de subsistência e a pecuária tanto do nordeste quanto das províncias do sul irão ter
importante desenvolvimento nesta época. Mudanças políticas também ocorrerão devido ao
ciclo do ouro, como por exemplo, a transferência da capital de Salvador para o Rio de Janeiro
já que dinâmico se deslocou da região do açúcar para a mineração, era necessária uma
administração mais presente no local onde se exportava produção do ouro.
A crise do ouro se deu basicamente pelo esgotamento das reservas do metal e pela
técnica deficiente de exploração – em grande parte culpa da administração portuguesa que
mantinha a colônia isolada das inovações tecnológicas, inclusive de produção. Uma vez que
nos tempos prósperos as minas de ouro retiraram muita mão-de-obra escrava das plantações
de cana-de-açúcar do Nordeste, pode-se dizer que a crise da mineração foi parcialmente
responsável pela crise do açúcar. Já enfrentando altos preços do produto nos mercados
internacionais, e a perda do monopólio para as Antilhas holandesas o açúcar entrará em uma
crise momentânea. Para ressurgir algumas décadas depois, embora sem a mesma importância
anterior.
Um ponto interessante na análise do autor é o desenvolvimento e ocupação da região
amazônica no Extremo-Norte do país. Esta se deu com o objetivo de expulsar os holandeses e
ingleses da região, e aproveitou-se da hidrografia da região para vencer as dificuldades
impostas pela floresta equatorial. Irá se desenvolver economicamente baseada na extração de
produtos exóticos, como o cravo, a canela, a castanha, o cacau, e o peixe. Não foram
utilizados escravos africanos apenas indígenas, já em processo de “domesticação” pelos
jesuítas – os quais o autor se dedicará em explicar a função e o processo de expulsão destes
daquela região.
O período de apogeu colonial do Brasil será na fase que está submetido ao pacto colonial
português. Essa política estabelecia que a colônia deveria ofertar produtos agrícolas a
metrópole, enquanto fica submetida a consumir somente a manufatura oriunda da metrópole.
Esta política somada ao fato de o açúcar estar em crise – devido aos fatores supracitados e a
técnicas ineficientes de uso do solo, e dos resíduos de produção – irá promover uma
diversificação dos produtos agrícolas produzidos no Brasil. No contexto da época, de
Revolução Industrial, principalmente nas indústrias têxteis, nos países desenvolvidos, o
algodão irá assumir um importante papel na economia da colônia. Desenvolvido no interior
do território – especialmente no Maranhão - não era um produção que exigisse muita mão-deobra. A exportação ocorrerá basicamente para a Inglaterra.
Seguindo sua tendência de abordar processos de menor expressão, Prado Júnior também trata
do cultivo do arroz ( Maranhão e Pará) que foi o segundo maior produto em importância no
período; do anil; e do café, ainda expoente.
Como no período da mineração com a ocupação da Amazônia, o autor prossegue com a
explicação do processo de incorporação do Rio Grande do Sul. Contará economicamente após
1750, irá basear sua economia na atividade pecuária e em suas variações diretas: a exploração
do couro; a venda de carne seca (charque); e a venda de muares e cavalos. O tipo de
propriedade era o latifúndio, principalmente nas regiões próximas a fronteira com o território
espanhol. A economia do sul foi muito importante, pois abasteceu os mercados do centro e te
mesmo nordeste, e se constituía uma economia voltada para o abastecimento do mercado
colonial, não de exportação metropolitana.
No capítulo dedicado a fazer um balanço da era colonial do Brasil, Prado Júnior trata
mais especificamente de algumas atividades, como as manufaturas ( muito pouco
desenvolvidas); as indústrias extrativas de madeira, erva-mate, sal; dos transportes e
comunicações dentro da colônia; entre outros processos. Cabe destacar neste capítulo o
diagrama demonstrativo do caráter geral da economia colonial brasileira. Pode-se perceber
que toda a organização econômica do país- seja esta estrutural, de trabalho, de propriedade – é
elaborada para atender às exportações dos produtos coloniais e receber produtos
manufaturados e fatores de serviço, como escravos. Nas palavras do autor, “ o regime colonial
representa um obstáculo intolerável oposto ao desenvolvimento do país.
O sucesso da Revolução Industrial nos países desenvolvidos e a conseqüente substituição
do capital comercial pelo capital financeiro promoverão uma revolta contra os monopólios e a
quebra do Pacto Colonial. Assim, Portugal e Espanha que ficaram para trás na corrida pela
industrialização entrarão em grave declínio econômico, passando para uma condição de
parasitismo de suas colônias. Todas estas mudanças para Caio Prado Júnior se constituem
como “um primeiro passo nesta grande transformação que se ia operar no país”.
A vinda da Família Real portuguesa para o Brasil e a Abertura dos Portos em 1809 são na
visão do autor marcos da independência do país, pois ali se rompiam os laços que nos ligavam
à metrópole. A Abertura dos Portos irá privilegiar enormemente a Inglaterra e a Brasil, já que
a primeira que ficava livre para suprir nosso mercado com produtos manufaturados, dos quais
necessitávamos e que Portugal não era capaz de nos suprir. Além disso, a infra-estrutura
urbana, de comunicações e de transporte do Brasil irão melhorar consideravelmente. Estas
mudanças físicas eram simultâneas a uma sofisticação das elites locais.
Porém, como se já não fossem altos os volumes de importações de produtos básicos a
subsistência haverá um aumento nos volumes de importação de produtos de luxo, o que
colocará a economia brasileira em situações constantes de déficit orçamentário. Esses déficits
não poderão ser cobertos por meio de impostos alfandegários, uma vez que os tratados com a
Inglaterra os inviabilizavam. Outro fator que trazia déficits ao Brasil eram os grandes
volumes de exportação como uma forma de conseguir excedente para programar melhorias na
capacidade produtiva do país e atender uma demanda crescente por bens de consumo. Isto nos
fazia recorrer a empréstimos internacionais.
Será a situação inerente de déficit orçamentário da economia brasileira uma das grandes
responsáveis pelo fim do regime de escravidão, que ainda permanecia como a mola mestra da
nossa economia, mas que o capitalismo industrial exigia que se posse um fim. Como
argumento econômico o autor expõem o caráter fundamental de se promover o comércio
interno, algo somente possível em uma economia assalariada. Além do mais, havia uma perda
da base moral da escravidão nos círculos intelectuais, que fazia grande pressão para a abolição
da escravatura. Em 1850 será decretada a abolição do tráfico negreiro, o que coloca de vez o
Brasil como um Estado soberano aberto à livre concorrência.
No mesmo período e quem é abolido o tráfico de escravos, grandes inovações
tecnológicas chegam a o Brasil, o que torna mais dinâmico o processo de desenvolvimento
agrícola. Contudo, a abolição do tráfico, irá por em cheque a estrutura de produção extensiva,
brasileira, especialmente do Nordeste. O sudeste do país – Rio de Janeiro, Vale do Paraíba, e
interior de São Paulo - onde desde o final do século XVIII se cultivava o café – neste ponto
Prado Júnior descreve todas as características do produto e sua evolução histórica – estava em
uma situação mais próspera, já que possuía uma grande aceitação no mercado europeu, por
isso não é tão afetado. O cultivo do café na região propiciou uma ascensão no padrão de vida
da população, com a construção de manufaturas, estradas de ferro e a mecanização da
indústria rural. O café – e a região sudeste- ocupava agora o posto de centro dinâmico da
economia do país que no passado havia pertencido ao açúcar e ao ouro. Até mesmo superávits
na balança comercial foram obtido graças a esse produto.
Ao contrário da economia do açúcar no Nordeste, a economia cafeeira se beneficiou do
tráfico de escravo, uma vez que pode comprar escravos da primeira região, e possuía
condições que atraiam aos imigrantes que vieram para substituir os escravos nas ampliações
das lavouras.
A situação sem poder se ampliar os empreendimentos por falta de mão-de-obra estava
ficando insustentável. Até mesmo a crescente leva de imigrante vinda para as lavouras de
café- em regimes de parceira – a partir de 1850 não estavam sendo suficientes para atender a
demanda por mão-de-obra. As manufaturas mais desenvolvidas que nasciam também exigiam
mão-de-obra mais qualificada o que o escravo africano. Finalmente em 1888 é declarada a
abolição da escravatura. Aqui o autor faz uma crítica a uma das leis anteriores a Lei Áurea, a
Lei dos Sexagenários, que estabelecia que escravos acima dos 60 anos deveriam ser libertos.
De acordo com ele, esta foi uma lei ineficiente, se não desnecessária, uma vez que
dificilmente um escravo a chegava a esta idade, e mesmo que chegasse, por não conseguir
arrumar seu sustento de modo livre, provavelmente preferiria continuar na escravidão.
A Proclamação da República em 1889, para o autor não passa de um golpe militar, onde
se rompeu com o equilíbrio conservador do império e desenvolveu na mente do homem de
negócio a “ânsia de enriquecimento, e de propriedade material. Outro fato que beneficiou a
criação deste ideal foi o Brasil ter passado a ser o maior produtor de matérias primas do
mundo. Este novo agente da economia irá ter uma posição central na República.
A introdução do trabalhador assalariado resolveu o problema da mão-de-obra, entretanto,
não sem prejudicar a o regime de grande propriedade, principalmente no norte e nordeste.
Todas estas mudanças trouxeram uma política de cunho liberal para a economia do país.
Assim de não é de se surpreender que tenha acontecido uma grande crise econômica em
nosso pai, causada por diversos fatores, como: a transição para uma economia assalariada que
tornou necessária uma quantidade muito maior de moeda no mercado para pagar os
trabalhadores; o incremento das lavouras de café, baseadas em empréstimos de capital
internacionais; e a maior autonomia dos estados para dirigir suas próprias políticas de emissão
de moeda e de tomada de empréstimos.
Apesar destes desequilíbrios houve uma maior diversificação das atividades, o que
motivou a indústria manufatureira principalmente em São Paulo, e tornou ainda mais
próspera, as lavouras de café e de cacau ( Bahia). Mas ainda assim havia um déficit na
balança exterior. Vivíamos uma crise externa.
A solução do governo foi uma política monetária expansionista, o que não funcionou,
porque os produtores continuavam a plantar café e a situação estava chegando a níveis de
superprodução. A grande participação do Brasil nos negócios mundiais do café e a
característica de inelasticidade do produto permitiam que a oferta fosse controlada pelo
governo. Porém as vendas do estoque não acompanhavam o ritmo de produção das lavouras.
O governo mantém este controle sobre a oferta do produto durante cerca de três décadas
do século XX, onde se passam por momentos de crise e outros de maior tranqüilidade, como
durante a Primeira Guerra Mundial. Todas estas ações do governo eram financiadas com
capital estrangeiro.
Às vésperas da Crise da Bolsa de Nova York em 1929, diminuem drasticamente a
disponibilidade de capital estrangeiro para empréstimo. A política de financiamento do café é
parada pelo governo, que tenta proceder com a quitação dos débitos.
Em meio à análise da crise do café, Caio Prado Júnior ainda trata de outros três pontos
muito importantes: o imperialismo dos capitais sobre o Brasil; o desenvolvimento de outros
produtos agrícolas; e a industrialização.
O primeiro ponto é na verdade, ponto de destaque durante boa parte de História
Econômica do Brasil. O capital estrangeiro sempre teve uma posição central na economia
brasileira, desde os empréstimos holandeses para financiar a estrutura produtiva do açúcar, até
os capitais financeiros da Inglaterra.
No geral, dentro da tradição do pensamento marxista estes capitais serão responsáveis por
abrir mercados para nossa indústria nacional em troca da exploração da mais-valia, e por nos
por a disposição matérias primas que precisávamos.
O segundo ponto, diz respeito a uma visão geral da agricultura da República Nova,
abordando mais produtos que não o café. Sobre o açúcar o autor nos diz que o fim da
economia escravista, a queda dos preços internacionais e a concorrência do café por mão-deobra, aumentaram a crise no setor. Apesar disto o produto ainda era base em muitas regiões
do país, que perdido o mercado externo, irão voltar sua produção para o mercado interno,
especialmente a zona do café. A existência de donos de engenho com maiores produtividades
do que outro acabará por criar usinas, onde o refino do produto é mais centralizado.
Ainda havia a borracha, cuja produção mundial chegamos a possui 40%. Este produto
desenvolvido na região do Extremo-Norte, especialmente no Acre, decolou na pauta de
exportação brasileira a partir de 1880. A crise deste produto, proveniente da concorrência de
países asiáticos, irá dissipar a riqueza acumulada na região e promover êxodo do povoamento
que ali havia.
Por último, Caio Prado Júnior nos traz sua visão sobre o processo de industrialização
brasileira. Para ele, os principais deflagradores da indústria no Brasil foram: o declínio da taxa
de câmbio – que favorecia a exportação e dificultava a importação e r promovida muitas vezes
pelo governo; as altas tarifas alfandegárias – recurso para sanar déficit público; a
disponibilidade de mão-de-obra barata – maior parte desta formada por imigrantes; e a
produção de algodão – que propiciou o desenvolvimento da indústria têxtil. A Primeira
Guerra Mundial também teria cumprido importante papel, ao diminuir a concorrência
estrangeira.
Os primeiros ímpetos industriais se derma na década de 1880 e 1890, com o surgimento de
indústrias metalúrgicas depois da 1ª Guerra Mundial. Algumas dificuldades encontradas no
desenvolvimento da nossa indústria de acordo com o autor teriam sido a falta de um mercado
consumidor interno, e a concorrência das mercadorias estrangeiras.
4. Conclusão
Cientes da relação existente entre Caio Prado Júnior e Celso Furtado quanto a seus
métodos de análise e quanto à problemática teórica básica – a saber, a transição do país de
uma ordem colonial para uma economia nacional, atentando para as dinâmicas desta transição
e a estrutura de cada uma destas fases – podemos compreender melhor a importância destes
dois autores para a historiografia não só econômica, mas também política e social, do Brasil.
Escrevendo em um período anterior a Furtado, é notável o quanto o pensamento de Caio
Prado Júnior influenciou no pensamento do primeiro. Apesar de Formação Econômica do
Brasil possuir um caráter econômico acentuado, com linguagem mais técnica, Furtado deve
muito – e reconheceu isto em sua tese de doutorado – ao exame anterior da sociedade, da
política e da história brasileira, realizado por Caio Prado Júnior.
5. Referências
DILLENBURG, Fabricio Gustavo. História econômica do Brasil: sobre a obra de
Caio Prado Júnior e sua contribuição para a história brasileira. Disponível em
<http://www.dominus3000.com/art-bra_caioprado.htm>. Acesso em: 18 de novembro de
2011.
FABER, Marcos; WOLF, Ismael. Resenha de História Econômica do Brasil de Caio
Prado Junior. Disponível em: <http://www.historialivre.com/brasil/caiopradojr.htm> Acesso
em: 18 de novembro de 2011.
FURTADO, Celso. Formação Econômica do Brasil, 34º. ed. São Paulo: Cia.
Das Letras, 2007.
LEÃO, Igor Zanoni Constant Carneiro . Economia colonial e economia nacional em Caio
Prado Junior e Celso Furtado. In: VII Encontro Nacional de Economia Política / II Coloquio
Latino Americano de Economistas Políticos, 2002, Curitiba. Disponível em: <
http://www.sep.org.br/artigo/7_congresso_old/LEAO_IGOR.pdf>. Acesso em:
18 de
novembro de 2011.
PRADO JUNIOR, Caio. História Econômica do Brasil. São Paulo: Brasiliense, 2006.
Download

Resenha de História Econômica do Brasil de Caio Prado Júnior